Sucesso e Fracasso Organizacional: um estudo - Coppead

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Sucesso e Fracasso Organizacional: um estudo - Coppead
Sucesso e Fracasso Organizacional: um estudo de
caso da General Motors
Renato Silva de Rezende
Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ
Instituto Coppead de Administração
Mestrado em Adminisração
ORIENTADORA: DENISE LIMA FLECK, Ph D.
Rio de Janeiro – Brasil
2009
Sucesso e Fracasso Organizacional: um estudo de
caso da General Motors
Renato Silva de Rezende
Dissertação apresentada ao corpo docente do Instituto COPPEAD de
Administração, Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ, como parte dos
requisitos necessários para a obtenção do grau de Mestre em Ciências (M.Sc.).
Aprovada por:
___________________________________________ - Orientadora
Profª. Denise Lima Fleck, Ph.D. (COPPEAD, UFRJ)
___________________________________________
Prof. Agrícola de Sousa Bethlem, D.Sc. (COPPEAD, UFRJ)
___________________________________________
Prof. Pedro Lincoln Carneiro Leão de Mattos, Ph.D. (UFPE)
Rio de Janeiro – Brasil
2009
ii
FICHA CATALOGRÁFICA
Rezende, Renato Silva de R.
Sucesso e Fracasso Organizacional: Um estudo de caso da
General Motors. – Rio de Janeiro, 2009.
xii, 264 f. f.: il
Dissertação (Mestrado em Administração) – Universidade Federal
do Rio de Janeiro – UFRJ, Instituto COPPEAD de Administração, 2008.
Orientadora: Denise Lima Fleck
1. Estratégia Empresarial. 2. Crescimento da Firma. 3. Indústria
Automobilística. – Teses. I. Fleck, Denise Lima (Orientadora). II.
Universidade Federal do Rio de Janeiro. Instituto COPPEAD de
Administração. III. Sucesso e Fracasso Organizacional: Um estudo de caso
da General Motors.
iii
DEDICATÓRIA
Dedico este trabalho...
... à minha esposa Fernanda, que me deu uma verdadeira demonstração de amor ao
me apoiar e contribuir de forma decisiva para a conclusão deste mestrado;
... aos meus país, Joaquim e Marly, por me ensinarem o prazer da busca pelo
conhecimento;
... aos meus irmãos Gustavo e Daniela, por compartilharem comigo os primeiros e
mais profundos exercícios de apredizado;
... às minhas avós Joana e Tereza, que puderam acompanhar a conquista de mais
uma etapa, que de certa forma também é fruto de seus esforços.
iv
AGRADECIMENTOS
A decisão de fazer o COPPEAD representou uma grande mudança para mim e
para Fernanda, quando ainda éramos namorados e tivemos de enfrentar o recomeço
da vida profissional e a construção de um lar, tudo em uma nova cidade. Juntamente
com o rigoroso processo de aprendizado, a inqueitação dos sonhos de ambos em
estruturar uma família levou-nos a um período intenso em realizações, repleto de
desafios, e que culminou com a celebração do nosso casamento e a conclusão do
mestrado.
A realização de tantos sonhos não teria sido possível sem a dedicação e o
amor que recebi da Fernanda, hoje minha esposa. A ela devo eterno agradecimento,
não só pelo amor e companheirismo vividos em momentos de grandes alegrias, mas
também por compartilhar intimamente as angústias latentes nas horas mais difícies.
Sempre com muito carinho e paciência, ela ajudou-me na superação de cada
obstáculo.
Agradeço especialmente aos meus pais, Joaquim e Marly, pelos exemplos,
pelo incentivo e apoio que sempre me deram para que buscasse aprender, crescer e
me tornar uma pessoa melhor. Aos meus irmãos Gustavo e Daniela. Junto com eles
aprendi as lições mais marcantes da minha vida e guardo as lembranças de nossa
infância com muito carinho.
Quero agradecer também à professora Denise Fleck, pelo empenho em fazer
deste um processo de busca e desenvolvimento de nossa identidade. Sua dedicação
para tornar o aprendizado um desafio enriquecedor servirá como inspiração sobre o
papel e o compromisso de um educador.
Não posso deixar de agradecer aos colegas de Seminário de Pesquisa, Paula,
Luiz Gustavo e, especialmente, Luiz Eduardo e Gustavo pela valiosa troca de
conhecimentos e pelo companheirismo reconfortante ao longo dos inúmeros dias de
confinamento e dedicação ao trabalho.
Agradeço ainda à turma 2007 do mestrado do COPPEAD, pois o rico processo
de aprendizado que compartilhamos não seria possível sem a dedicação de todos.
Aos professores e funcionários do COPPEAD, especialmente às meninas da
Secretaria Acadêmica, por se empenharem no desenvolvimento desta instituição.
v
A minha família, em especial, meus avós Roque (in memorian) e Tereza,
Laurindo (in memorian) e Joana, meus padrinhos Maria e Flávio, e primos Tiago e
Mariana. Agradeço, pois embora estivessem distantes, foram pessoas muito
importantes para o meu desenvolvimento.
Gostaria de agradecer também aos meus novos familiares, por parte da minha
esposa, especialmente meu sogro e sogra, Fernando e Ruth, que vibram com cada
uma de nossas conquistas. À tia Margariada, que nos acolheu no Rio de Janeiro e
ajudou de forma incansável sempre que precisamos. E também à famíla da Clarissa,
Ricardo, Pedro e Maria Clara por acompanharem e torcerem por nós.
Agradeço a todos os demais familiares e amigos que em função das distâncias
ficam saber bem o que estou fazendo, mas ainda assim torcem por mim. Também
agradeço à Valnice, que carinhosamente se preocupou em cuidar para que eu não me
esquecesse das refeições em momentos de grande concentração.
Por fim, agradeço aos professores Agrícola Bethlem e Pedro Lincoln de Mattos
pelas valiosas contribuições a esta pesquisa.
vi
RESUMO
Rezende, Renato Silva de. Sucesso e fracasso organizacional: um estudo
de caso da General Motors. Orientadora: Denise Lima Fleck. Rio de Janeiro:
UFRJ/COPPEAD 2009. Dissertação (Mestrado em Administração)
A General Motors foi fundada por William Durant em 1908, quando ele liderou o
processo de aquisição de diversas empresas fabricantes de veículos automotores e
suas partes. Ao longo de um século, a organização expandiu suas atividades e ocupou
uma posição de destaque na indústria automobilística. Desde o final do século 1920
até 2007, a General Motors manteve-se como maior fabricante mundial de veículos,
além de ter ocupado o topo da lista de maiores empresas em faturamento dos Estados
Unidos. Apesar do prolongado sucesso em termos de receita, lucros, participação de
mercado e prestígio de suas marcas, a General Motors não foi capaz de evitar uma
degeneração de sua posição na indústria e enfrentou um processo de declínio que
levou a organização a um estado de fracasso, com a abertura de concordata em junho
de 2009.
O fenômeno ocorrido com a General Motors torna relevante o estudo de fatores
que contribuíram para a organização ter alcançado um reconhecido sucesso e
posteriormente encontrar-se em um estado de fracasso. Diante desse desafio, este
trabalho utilizou o arcabouço teórico dos arquétipos do sucesso e do fracasso
organizacional de Fleck (2009) para entender as condições desenvolvidas pela
General Motors que a conduziram entre uma situação e outra.
A pesquisa levantou registros históricos para reconstituir a trajetória da
organização entre 1908 a 2009 e realizou uma análise longitudinal dos padrões de
ação em relação às respostas aos desafios à longevidade saudável (FLECK, 2009).
As conclusões do trabalho indicaram que a ausência de capacitações de coordenação
levou a General Motors a responder de forma auto-destrutiva ao desafio da gestão da
diversidade.
O caráter fragmentador das ações de coordenação da organização apresentou
raízes que remontam a sua formação. Portanto, apesar das condições favoráveis
desenvolvidas em outros desafios, combinadas com o ambiente competitivo e
institucional, terem viabilizado a evolução para uma posição hegemônica, tais fatores
não foram suficientes para promover uma propensão à auto-perpetuação.
vii
ABSTRACT
Rezende, Renato Silva de. Sucesso e fracasso organizacional: um estudo
de caso da General Motors. Orientadora: Denise Lima Fleck. Rio de Janeiro:
UFRJ/COPPEAD 2009. Dissertação (Mestrado em Administração)
General Motors was created by William Durant in 1908, when he led the
acquisition process of several manufacturers of automobile and parts. Throughout a
century, the organization expanded its activities and reached a remarkable position in
the automobile industry. From 1928 until 2007, General Motors maintained the position
of biggest carmaker in the world, besides occupying the top of the list in total revenue
among all corporations in the United States. Despite the long success in terms of
revenues, profits, market share and prestige of its brands, General Motors couldn’t
avoid the degeneration of its position in the industry and faced a decline process, which
led the filling for the Chapter 11 rehabilitation request in June, 2009.
The phenomenon occurred with General Motors made relevant the study of the
factors that contributed for the organization to reach a recognized success, and
afterwards find itself in a state of failure. Given such challenge, this work has used the
theoretical framework of the archetypes of organizational success and failure of Fleck
(2009) to understand the conditions developed by General Motors that conducted it
between one situation and the other
The research raised historical facts and data to reconstruct the trajectory of
General Motors from 1908 to 2009, and conducted a longitudinal analysis of the
organization patterns of action relating them to the responses to the longevity’s
challenge (FLECK, 2009). The conclusions of the study indicate that the lack of
coordination capabilities led General Motors to respond in a self-destructive way to the
challenge of diversity management.
The fragmenting character of the organization’s coordination actions presents
roots that recall its formation. Therefore, in spite of the competitive and institutional
environment combined with the favorable conditions developed on other challenges
have enabled a hegemonic position, these factors were not sufficient to promote a selfperpetuating propensity.
viii
LISTA DE TABELAS
Tabela 4-1 Receita e Lucro líquido da GM de 1909 a 1915 (em milhões de
dólares)......................................................................................................................... 52
Tabela 4-2 Receita e Lucro líquido da GM durante a segunda guerra
mundial. ...................................................................................................................... 107
Tabela 9-1 Receita Líquida, Lucro e Ativo Total da General Motors entre
1917 e 2008 ................................................................................................................ 258
Tabela 9-2 Produto nacional bruto do Estados Unidos entre 1917 e 2009
...................................................................................................................................... 260
Tabela 9-3 Vendas de veículos nos Estados Unidos entre 1900 e 2008... 262
LISTA DE GRÁFICOS
Gráfico 3-1 Fontes secundárias obtidas através do levantamento das
bibliotecas da HEC e McGill ................................................................................... 21
Gráfico 4-1 Evolução da participação da carroceria fechada nas vendas da
indústria de 1919 a 1927 (em porcentagem) ...................................................... 81
Gráfico 4-2 Receita líquida e participação de mercado da GM ................... 190
Gráfico 4-3 Evolução do crescimento da General Motors 1904 a 2008 .... 192
Gráfico 4-4 Evolução das vendas de veículos da indústria e da General
Motors nos Estados Unidos, entre 1900 e 2008 .............................................. 193
Gráfico 4-5 Lucro Líquido sobre ativo total, corrente e média móvel em 10
anos ............................................................................................................................. 196
LISTA DE FIGURAS
Figura 2-1 Modelo dos requisitos para o desenvolvimento da propensãa
auto-perpetuação organizacional ........................................................................... 8
Figura 4-1 Posicionamento de preço dos veículos de Ford e GM em 1926
........................................................................................................................................ 82
Figura 4-2 Fluxograma do processo de desenvolvimento de novos
modelos entre 1935 e 1962 ..................................................................................... 92
Figura 4-3 Trajetória das respostas aos desafios do crescimento, no
continuum entre auto-destruição e auto-perpetuação. ................................. 230
Figura 8-1 Processos encontrados nas ações em resposta ao desafio do
empreendedorismo ................................................................................................. 250
Figura 8-2 Processos encontrados nas ações em resposta ao desafio da
Navegação no Ambiente Dinâmico..................................................................... 252
Figura 8-3 Padrões encontrados nas ações em resposta ao desafio da
Gestão da diversidade ........................................................................................... 253
Figura 8-4 Processos encontrados nas ações em resposta ao desafio do
Aprovisionamento de Recursos Humanos....................................................... 255
Figura 8-5 Processos encontrados nas ações em resposta ao desafio da
Gestão da Complexidade ...................................................................................... 256
ix
LISTA DE QUADROS
Quadro 2-1 Cinco desafios organizacionais ........................................................ 9
Quadro 2-2 Elementos da dinâmica organizacional de Selznick (1957) e
Cyert e March (1963) ................................................................................................. 17
Quadro 3-1 Extrato exemplificativo da tabela de entrada de fatos
históricos da General Motors ................................................................................. 24
Quadro 3-2 Extrato exemplificativo da tabela de codificação dos fatos .... 25
Quadro 4-1 Empresas integrantes da General Motors Company, em 191044
Quadro 4-2 Faixas de preços dos modelos oferecidos pelas divisões da
General Motors em 1921 (em U$) .......................................................................... 71
Quadro 4-3 Segmentação por preços recomendadas pelo comitê especial
(em U$) ......................................................................................................................... 71
Quadro 4-4 Margem líquida de GM, Ford e Chrysler e vendas da indústria
entre 1946 e 1950 ..................................................................................................... 117
Quadro 4-5 Classes de veículos no início da década de 1970, segundo o
comprimento ............................................................................................................. 151
Quadro 4-6 Síntese das respostas da GM aos desafios em duas fases
distintas ...................................................................................................................... 228
x
SUMÁRIO
1. INTRODUÇÃO .............................................................................. 1
2. REFERENCIAL TEÓRICO ............................................................ 6
2.1.
OS ARQUÉTIPOS DO SUCESSO E DO FRACASSO ............................................................................ 9
2.1.1. Desafio do empreendedorismo ........................................................................................... 10
2.1.2.
Desafio da navegação no ambiente dinâmico .................................................................... 11
2.1.3.
Desafio da gestão da diversidade ....................................................................................... 14
2.1.4.
Desafio do aprovisionamento de RH .................................................................................. 15
2.1.5.
Desafio da gestão da complexidade ................................................................................... 15
2.2.
DINÂMICA DE MUDANÇA NAS ORGANIZAÇÕES ........................................................................ 16
3. METODO .....................................................................................19
3.1.
DELIMITAÇÃO DO TEMA E DO OBJETO DE ESTUDO .................................................................... 19
3.2.
ESTRATÉGIA DE PESQUISA ........................................................................................................ 20
3.3.
COLETA DE DADOS ................................................................................................................... 20
3.4.
PROCESSAMENTO E CODIFICAÇÃO DOS DADOS ......................................................................... 22
2.5 ANÁLISE DAS EVIDÊNCIAS ............................................................................................................ 26
4. RESULTADOS DA ANÁLISE ......................................................29
4.1.
HISTÓRICO DA GENERAL MOTORS E DA INDÚSTRIA AUTOMOBILÍSTICA .................................. 29
4.1.1. O nascimento da indústria .................................................................................................. 29
4.1.2.
Da Buick a General Motors................................................................................................ 33
4.1.3.
A gestão dos bancos de 1910 a 1915 .................................................................................. 48
4.1.4.
O Surgimento da Chevrolet e o Retorno de Durant à GM ................................................. 54
4.1.5.
Primeira Guerra Mundial, retomada da expansão e o fim da era Durant ......................... 58
4.1.6.
A gestão de Pierre S. du Pont ............................................................................................. 69
4.1.7.
Sloan no comando, rumo ao topo ....................................................................................... 76
4.1.8.
A grande depressão e a consolidação dos comitês ............................................................. 86
4.1.9.
Relações trabalhistas e a greve de ocupação de 1936-1937 (sit-down strike) ................... 96
4.1.10. General Motors na Segunda Guerra Mundial .................................................................. 100
4.1.11. A expansão do pós-guerra ................................................................................................ 108
4.1.12. Negociações com a UAW e o contrato de 1948 ................................................................ 112
4.1.13. Hegemonia recuperada na gestão Wilson ........................................................................ 115
4.1.14. Gestão Harlom Curtice .................................................................................................... 121
4.1.15. Fim do ciclo Sloan-Du Pont e a reorganização ............................................................... 127
4.1.16. O legado de Harlom Curtice ............................................................................................ 130
4.1.17. Hegemonia de Finanças ................................................................................................... 132
4.1.18. Segurança veicular e controle de emissões ...................................................................... 137
4.1.19. A Gestão de James Roche ................................................................................................. 140
4.1.20. Desafios na primeira metade da década de 1970 ............................................................. 151
4.1.21. Choque do petróleo e o início da gestão de Thomas Murphy .......................................... 156
4.1.22. Recuperação da indústria até o 2º choque do petróleo .................................................... 159
xi
4.1.23. A organização do século XXI de Roger Smith .................................................................. 165
4.1.24. General Motors e suas mudanças questionadas ............................................................... 179
4.1.25. Rota ajustada e o fim da gestão Smith .............................................................................. 185
4.1.26. Redução de custos, venda de ativos e concordata ............................................................ 189
4.2.
ANÁLISE DAS RESPOSTAS AOS DESAFIOS À LONGEVIDADE ..................................................... 191
4.2.1. Desafio do Empreendedorismo......................................................................................... 192
4.2.2.
Desafio da Navegação no Ambiente Dinâmico ................................................................ 204
4.2.3.
Desafio da Gestão da Diversidade ................................................................................... 210
4.2.4.
Desafio do Aprovisionamento de Recursos Humanos ...................................................... 218
4.2.5.
Desafio da Gestão da Complexidade................................................................................ 221
4.3.
SÍNTESE DAS RESPOSTAS AOS DESAFIOS ................................................................................ 226
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS .......................................................234
5.1
5.2
5.3
5.4
CONSIDERAÇÕES SOBRE O SUCESSO E O FRACASSO DA GENERAL MOTORS................................. 235
IMPLICAÇÕES DO CASO DA GM PARA OUTRAS ORGANIZAÇÕES ................................................... 238
CONTRIBUIÇÕES AO ARCABOUÇO TEÓRICO ................................................................................. 239
SUGESTÕES PARA ESTUDOS FUTUROS ......................................................................................... 239
6
REFERÊNCIAS ..........................................................................241
7
APÊNDICE A .............................................................................250
7.1
8
MAPAS VISUAIS DA TRAJETÓRIA DA GENERAL MOTORS ............................................................. 250
ANEXOS ....................................................................................258
xii
1. INTRODUÇÃO
O sucesso e o fracasso das organizações é um tema de potencial interesse
para os administradores, dado que grande parte do trabalho que executam no dia-adia é permeada pela idéia de que este deve contribuir para que a organização seja
conduzida para o sucesso e, conseqüentemente, evite encontrar o fracasso. O esforço
de gestores e pesquisadores, ao longo história das organizações industriais, produziu
uma quantidade de indicadores e ferramentas de administração visando prover meios
de identificar objetivos e controlar as ações na direção desejada. Entretanto, apesar de
inúmeras organizações terem encontrado mecanismos que permitiram atingir objetivos
lançados, acumulando riqueza e prestígio, algumas destas mesmas empresas se
viram incapazes de sustentar tal estado e, eventualmente, enfrentaram o que se
considerou o fracasso.
A inexistência de uma fórmula gerencial unânime e a falta de consenso sobre
os conceitos que definem os dois extremos dos possíveis destinos faz com que as
noções que organizações têm sobre seu próprio sucesso ou fracasso sejam
heterogêneas e com certo nível de abstração, embora freqüentemente sejam
associados a situações concretas e medidas de desempenho, tais como rentabilidade,
participação de mercado, valor de ativos e faturamento. Porém, independentemente
do conjunto de conceitos que se admita para configurar um ou outro estado, os
estudos e a prática das empresas apontam duas grandes vertentes no que diz respeito
aos fatores determinantes do destino das organizações. Uma delas estaria relacionada
ao ambiente externo, repleto de demandas e restrições fora do controle do gestor.
Outra vertente trata da atuação da organização em si, ou seja, como ela adquire e
utiliza recursos para oferecer produtos e serviços de maneira eficaz.
Diversos estudos e publicações na literatura acadêmica e de negócios buscam
descrever e prescrever ações que visam alcançar o sucesso. Nestes casos, enfatizase o processo de formação da estratégia, seja ela deliberada ou emergente, com
mudanças adaptativas ou radicais, como fator determinante no destino das
organizações. No extremo oposto, certas abordagens defendem a predominância dos
fatores ambientais sobre as empresas, atribuindo aos gestores o papel de reféns do
ambiente. Por exemplo, alguns estudos que adotam metodologias de ecologia das
populações (também denominada como ecologia das organizações (MELLAHI, K. &
WILLKINSON, 2004, p. 24))
sugerem a incapacidade de adaptação das organizações a
alterações nos fatores externos. Outras linhas de pesquisadores ressaltam o controle
externo das coalizões que legitimam a existência da organização, evidenciando uma
1
dinâmica interação entre gestor e ambiente, composta de diversas respostas
estratégicas aos processos de isomorfismo das organizações (Pfeffer & Salancic,
1978; Oliver, C. 1991).
Em uma visão conciliadora dos fundamentos que sustentam desde os
deterministas aos defensores da administração estratégica, Mintzberg et al (2000)
sintetizaram o que chamaram de escola de configuração. Iniciada a partir de uma
abordagem histórica, esta escola vê a estratégia como um padrão estável de ações
por um dado período de tempo, com eventuais movimentos de transição para outro
período de estabilidade, na busca de uma sincronia com novas condições do
ambiente. Neste sentido, o sucesso e o fracasso estariam associados com a
adequação de um determinado conjunto de padrões de ações, a configuração, de uma
organização ao seu ambiente, bem como com a capacidade desta organização adotar
nova configuração à medida que o ambiente se transforma.
Avançando no sentido de relacionar a estratégia das organizações ao sucesso
e ao fracasso, Fleck (2009) propõe um modelo que coloca a capacidade de a empresa
criar configurações vantajosas ou inapropriadas sobre um contínuo cujos pólos
opostos contemplam estados ideais, arquétipos, do sucesso (auto-perpetuação) e do
fracasso (auto-destruição) organizacional. A propensão para que a organização
sobreviva a seus membros possui duas condições necessárias que devem ser
providas por seus mecanismos. Uma das condições trata do processo de crescimento
contínuo e a outra da continuidade da existência.
Para Fleck (2009) o sucesso organizacional não é um estado final, mas sim um
estado potencial, do qual organizações podem se aproximar na medida em que
nutram uma propensão para a auto-perpetuação. Por outro lado, o fracasso
organizacional é tido como o estágio final do processo de declínio. O modelo teórico
sugere que a capacitação (ou incompetência) para prover as duas condições
necessárias está relacionada à resposta da organização a cinco desafios do
crescimento. Portanto, uma posição mais próxima de um ou outro pólo pode ser
evidenciada a partir dos padrões de ações, positivos ou negativos, com que a
organização responde a cada um desses desafios.
Motivado pela idéia de melhor compreender os elementos e a dinâmica que
contribuem para que uma organização encontre o sucesso ou o fracasso, este
trabalho utiliza-se da construção teórica proposta por Fleck (2009) para investigar
como organizações que por um considerável período de tempo conviveram o
reconhecido sucesso, um dia se deparam com o declínio e, por vezes se vêem atadas
2
a um processo crônico de incapacidade para alcançar resultados, em uma trajetória
voltada para o fracasso.
A pesquisa adota uma visão de processo (Langley, 1999; 2007) e, a partir do
estudo de caso em uma perspectiva histórica, realiza análise longitudinal por meio da
identificação dos padrões de ações, confrontando-os com o que a proposição teórica
oferece (YIN, 1989). Ao final, é possível identificar a trajetória da organização em
termos de suas respostas aos desafios, podendo entender melhor os mecanismos que
a levaram de uma situação a outra.
A organização escolhida para servir como unidade de análise deste estudo é a
General Motors Company (GM). O interesse inicial por esta empresa e também pela
indústria automobilística é devido à intenção de melhor compreender a formação de
uma das maiores indústrias do mundo, que viabilizou a construção de algumas das
maiores empresas existentes. Apesar de poder contar com os benefícios do tamanho
em uma indústria madura, algumas empresas do setor, em especial as norteamericanas, enfrentam um difícil ambiente competitivo e vêem sua condição de
liderança ser ameaçada por concorrentes que ocuparam ou ocupam posições
intermediárias e até mesmo periféricas nesta atividade.
A General Motors Company (GM) possui atributos que a credenciam como um
caso apropriado para o questionamento proposto. Formada em 1908 a partir de um
intenso processo de aquisições, a empresa participou desde os anos iniciais de sua
indústria nos Estados Unidos e desempenhou um papel central nesta atividade, tanto
no período de formação, quanto na fase de crescimento e consolidação do setor. A
General Motors foi a maior empresa na fabricação e comercialização de automóveis
durante quase todos os anos de sua existência. Em número de automóveis
produzidos, a GM manteve-se numa seqüência ininterrupta como maior fabricante
desde 1931 até 2008, enquanto que em anos anteriores a esse período a empresa já
intercalava com a Ford a liderança neste quesito.
Extrapolando a comparação de tamanho e crescimento para outras atividades
da economia, a General Motors acumulou também uma posição de destaque entre as
maiores empresa do mundo. Dentre os 56 levantamentos das maiores empresas
americanas, realizado pela revista Fortune anualmente, o fortune 500, a General
Motors apareceu todas as vezes entre as três maiores em faturamento. Sendo que em
37 das 56 edições do ranking ela esteve na primeira colocação.
Apesar da consistência das evidências que colocaram a General Motors como
uma empresa de sucesso durante um considerável período de tempo, a organização
3
enfrentou um crônico processo de declínio que se tornou aparente a partir da década
de 1970 e que culminou com um processo de concordata no ano de 2009.
A partir desta verificação preliminar, induzida pela grande exposição que a
General Motors e os fatos que a cercam recebem, um estudo que possa revelar os
mecanismos que contribuíram para ambas as situações de sucesso e de declínio
torna-se relevante, pelo fato de poder, ao final, oferecer esclarecimento sobre o
processo de construção e degeneração de uma empresa que esteve desde seus
primeiros anos, portanto, durante quase um século, entre as maiores organizações de
seu tempo.
Este estudo de caso também se faz significativo dado que o modelo teórico a
ser utilizado contempla uma ampla base de escolas e perspectivas da ciência que
estuda as organizações e é respaldado por verificações empíricas que indicam sua
validade. O trabalho de síntese oferecido por Fleck (2009) fornece tanto uma visão
alinhada com um consistente arcabouço teórico, quanto contribui de forma original
para a construção de teoria sobre o processo de desenvolvimento da propensão a
auto-perpetuação em organizações.
Tendo em vista a alta disponibilidade de relatos, notícias e informações a
respeito da General Motors referentes a todos os períodos de sua história, é esperado
que as evidências encontradas sejam suficientes para construir
uma descrição
fidedigna do histórico da organização. A partir dos fatos será possível reconstituir
traços e padrões de ação que alimentarão as análises e, portanto, encontrar
elementos que contribuíram para que a GM tenha desenvolvido tamanho crescimento
e em seguida o declínio. Os resultados encontrados neste trabalho poderão não
somente contribuir para o fortalecimento do modelo teórico adotado, como também
produzir por si só, ou combinado com a repetição deste estudo em outras
organizações, novas idéias e questionamentos a serem explorados em pesquisas
futuras.
O trabalho foi organizado em seis capítulos. O capítulo presente introduz a
proposta da pesquisa. O capítulo 2 traz o referencial teórico utilizado no trabalho,
apresentando as idéias de Fleck (2009), Penrose (2006), Chandler (1977), Selznick
(1957), Cyert e March (1963), dentre outros que contribuem para compor o arcabouço
utilizado na análise. O capítulo 3 apresenta a metodologia utilizada para a pesquisa.
Os resultados da análise são apresentados no capítulo 4, onde constam o
histórico da empresa, a identificação dos padrões de ação em relação ao referencial
teórico, e a síntese das condições desenvolvidas pela GM em relação ao sucesso e ao
4
fracasso. Por fim, as considerações sobre os resulados encontrados frente às
intenções de pesquisa acima propostos são discutidos no capítulo 5, no qual também
são comentadas as limitações da pesquisa e contribuições para estudos futuros.
5
2. REFERENCIAL TEÓRICO
Dado que o objeto deste estudo é uma organização, cabe inicialmente
considerações sobre os conceitos que a definem. Coase (1937) tratou da firma como
sendo uma forma de organização da produção, que era resultante de um processo de
internalização de serviços movidos pela economia nos custos de transação. Os limites
da organização seriam determinados quando os contratos de serviços deixassem de
ser estáveis e passassem a ser negociados por sistemas de livre mercado. Por este
conceito, a firma existe e cresce à medida que a economia nos custos de transação é
maior do que os custos de coordenação e decresce ou deixam de existir à medida que
a eficiência na coordenação das atividades internalizadas é menor do que os custos
de contratação dos serviços no mercado aberto.
Barnard (1938), por sua vez, apresentou a noção de que os integrantes de
uma organização são dotados de uma propensão à cooperação1, a qual torna os
indivíduos dispostos a agir de forma a abnegar da maximização do benefício individual
com o objetivo de manter a força da organização. A disposição dos indivíduos em
cooperar estaria relacionada ao alinhamento de sua tarefa com o propósito da
organização. Porém, Cyert e March (1963), ao escreverem sobre uma teoria
comportamental da firma, sugeriram que a organização não possui apenas um
propósito, mas que a sua própria existência é o resultado da formação de uma
coalizão, composta de sub-coalizões com diferentes objetivos. Portanto, a formação
dos objetivos comuns da organização é resultado de um processo de negociação
entre os grupos que a compõem. Cyert e March (1963) também afirmaram que os
objetivos dos participantes da organização mudam à medida que estes adquirem
experiência. Assim sendo, a existência continuada estaria relacionada à capacidade
de a organização constantemente atender às demandas dos grupos que a compõem.
Penrose (2006) definiu a firma produtiva como sendo, além das pessoas que
compõem a organização administrativa, o conjunto de recursos (físicos e humanos) e
a forma como eles são dispostos dentre os diversos usos possíveis, a fim de produzir
e vender bens e serviços. Em relação aos objetivos da firma, Penrose (2006)
apresenta a idéia de que todos eles podem, na maioria das vezes, ser associados à
capacidade e ao desejo da mesma em gerar lucros a longo prazo. A autora ainda se
refere a lucro em longo prazo e a crescimento como sendo sinônimos, uma vez que a
1
Traduçào livre do termo “willingness to cooperate”
6
própria aplicação de recursos gera a expansão da firma e, ao mesmo tempo, é uma
condição necessária para produzir lucro.
Tendo em vista os argumentos acima, temos que a capacidade da organização
atender às demandas de seus membros e a de gerar lucros a longo prazo está
associada à idéia de crescimento. Desta forma, a existência da organização está
diretamente vinculada a sua expansão. Contudo, o sucesso não pode ser associado
apenas ao aumento de tamanho da organização. Uma firma pode aumentar de
tamanho e, em seguida, falir, trazendo contratempos indesejados para seus
integrantes. A respeito do crescimento e da continuidade de organização, Chandler
(1977) argumenta que a capacidade da organização em se auto-perpetuar está
relacionada a dois processos. O primeiro, de crescimento contínuo, onde a realização
de uma expansão traz novas oportunidades para o crescimento e para a renovação. O
segundo trata da existência continuada, que está relacionada à capacidade de a
organização manter sua integridade.
Fleck (2009), em linha com os conceitos desenvolvidos por Penrose (2006) e
Chandler (1977), apresenta um arcabouço teórico que relaciona o sucesso da
organização com a capacidade de desenvolver a propensão à auto-perpetuação. Para
Fleck (2009), tal propensão possui duas condições necessárias. Uma está relacionada
ao desenvolvimento de um processo de crescimento e renovação organizacional. A
segunda condição decorre da manutenção da integridade organizacional. Estes dois
processos, por conseguinte, são decorrentes da maneira como a organização
desenvolve respostas a cinco desafios do crescimento: empreendedorismo,
navegação no ambiente dinâmico, aprovisionamento de recursos humanos, gestão da
diversidade e gestão da complexidade.
Há uma diversidade de autores que propuseram outros esquemas teóricos
para analisar o sucesso ou do crescimento das organizações, dentre eles Starbuck
(1965), Peters & Waterman (1982), Greiner (1998) e Collins & Porras (2002). Um
número menor de referências tem como tema o declínio e o fracasso de organizações,
como por exemplo, Weitzel (1989) e Miller (1990 e 1993). No entanto, o modelo
apresentado por Fleck (2009) foi selecionado para este trabalho por oferecer uma
alternativa abrangente em relação aos aspectos que envolvem a atividade
organizacional, e também por incorporar dentro de um mesmo modelo a possibilidade
de analisar os processos que conduzem a organização ao longo de dois extremos
possíveis, o sucesso e o fracasso. Na figura 2-1, a seguir, é apresentada de forma
esquemática a relação entre os desafios do crescimento e o sucesso de longo-prazo,
proposta por Fleck (2009).
7
Figura 2-1 Modelo dos requisitos para o desenvolvimento da propensãa auto-perpetuação organizacional
DESAFIOS DO
CRESCIMENTO
7
7
7
8
EMPREENDEDORISMO
+/-
CN
CRESCIMENTO
ORGANIZACIONAL
E RENOVAÇÃO
CN
NAVEGAÇÃO NO
AMBIENTE
DINÂMICO
4
CN
6
CN
FOLGA
APROVISIONAMENTO
DE RECURSOS
HUMANOS
+/-
CN
8
1
+/-
GESTÃO DA
COMPLEXIDADE
7
CN
2
3
SUCESSO DE LONGO
PRAZO:
Propensão a AutoPerpetuação da
Organização
+/-
CN
+/GESTÃO DA
DIVERSIDADE
INTEGRIDADE
ORGANIZACIONAL
5
8
8
CN: Condições Necessárias
Fonte: Adaptação de Fleck (2009)
8
2.1.
Os arquétipos do sucesso e do fracasso
A teoria de Fleck (2009) fornece uma perspectiva sobre a organização, na qual
dois arquétipos posicionados nos extremos de um contínuo representam respostas a
desafios que conduzem a organização para o sucesso de longo prazo – a autoperpetuação – ou para o fracasso – a autodestruição. Cada um dos arquétipos
contempla um conjunto de capacitações e vulnerabilidades2 para cada desafio. Estes
conjuntos definem estados ideais de organizações auto-perpetuadoras de um lado do
contínuo, e organizações auto-destrutivas, no lado oposto.
A representação dos arquétipos posicionados no contínuo das respostas aos
desafios e a descrição de cada conjunto de respostas são apresentadas no quadro 2.1
abaixo. Na prática, as respostas das empresas estarão posicionadas entre os dois
pólos, variando sua proximidade a um extremo ou outro, dependendo de cada desafio.
Além disso, é necessário considerar a natureza dinâmica do desenvolvimento de
capacitações, que faz com que uma empresa possa se aproximar ou se distanciar de
um pólo à medida que nutre a formação de novas capacitações.
Quadro 2-1 Cinco desafios organizacionais
Categoria do
desafio
Pólo de respostas aos desafios
Descrição do desafio
Auto-destruição
Baixo
(baixos níveis de ambição,
versatilidade, imaginação,
visão,capacidade de levantar
recursos financeiros, e
realização de expansões nulas
ou defensivas)
Promoção de contínuo
empreendedorismo a
partir da disposição da
empresa de realizar
expansões com
mecanismos de reforço e
criação de valor sem
expô-la a riscos
desnecessários.
Navegação no ambiente
dinâmico
Tratar com múltiplas
partes interessadas para
assegurar captura de valor
e legitimidade.
Passivo
(Monitoramento ruim, mal uso
de estratégias de navegação)
Ativo
(Monitoramento regular, uso
correto de estratégias de
navegação)
Gestão da
diversidade
Manter a integridade da
firma diante de aumento
de conflitos e rivalidades
Fragmentação
(Fracasso no estabelecimento
de relacionamentos de
integração e de capacitações
em coordenação)
Integração
(Estabelecimento bem sucedido
de relacionamentos de
integração e de capacitações
em coordenação)
Aprovisionamento de
recursos humanos
Fornecer à firma
recursos humanos
qualificados de forma
estável
Tarde
(Ações no momento que existe
necessidade ou depois dela)
Gestão da
complexidade
Gerenciar problemas
complexos e solucioná-los
diante de aumento de
complexidade
Ad-hoc
(Baixa capacitação para
solução de problemas,
utilizando rápida análise e
sem aprendizado)
Fonte:Tradução livre de Fleck (2009)
2
Auto-perpetuação
Alto
(altos níveis de ambição,
versatilidade, imaginação, visão,
capacidade de levantar recursos
financeiros, e realização de
expansões produtivas ou
híbridas)
Empreendedorismo
Tradução livre do termo usado pela autora: (liabilities)
9
Planejado
(Ações planejadas com
antecedência)
Sistemático
(Capacitação para solução de
problemas, promovendo busca
correta por soluções e
aprendizado)
A seguir, serão apresentados mais detalhadamente cada um dos desafios e as
respostas a partir das quais serão desenvolvidos paremetros para identificação de
padrões durante a análise.
2.1.1. Desafio do empreendedorismo
De acordo com Fleck (2009), o desafio do empreendedorismo consiste em
promover o crescimento da empresa em base contínua, e não apenas momentâneo.
Respostas positivas a este desafio estão relacionadas ao desenvolvimento de serviços
empreendedores (PENROSE, 2006) que priorizem o crescimento produtivo – com
motivação de promover a mudança e aumentar a produtividade – em relação ao
crescimento defensivo, que tem o propósito de conter a mudança e proteger contra o
avanço de competidores (CHANDLER, 1977).
O crescimento da firma é condicionado pela existência de serviços
empresariais. Estes serviços atuam na identificação de novas oportunidades
produtivas, que permitam a combinação dos serviços oferecidos pelos recursos
internos e outros adquiridos fora da organização, de forma a oferecer bens e serviços
à sociedade de maneira mais eficiente, criando valor que pode ser capturado pela
organização. (PENROSE, 2006). De acordo com Penrose (2006), são quatro os
serviços empresariais:
a) Ambição: está no cerne da atividade empresarial. Constitui-se na predisposição
psicológica de assumir riscos e dedicar esforços e recursos na expectativa de
ganho. A ambição é uma característica difícil de ser medida, pelo fato de tratar de
traços pessoais evidentes apenas a partir de seu efeito nas ações dos indivíduos.
Atividades de especulação de novas oportunidades ou a mera aplicação de
recursos para tal indicam a presença da ambição.
b) Versatilidade: está relacionada à imaginação e à visão de possibilidades viáveis
de combinar os serviços produtivos a partir dos recursos existentes, ou de adquirir
novos recursos, de forma a oferecer bens e serviços e criar valor para a
organização.
c) Mobilização de recursos financeiros: trata de desenvolver os meios para
empresa obter recursos financeiros, necessários para a expansão e operação do
negócio. De maneira geral, depende da capacidade em gerar confiança e
interesse de fornecedores de capital. Porém, empresas pequenas ou recémcriadas podem não ter a mesma facilidade de empresas grandes. A falta de
recursos financeiros normalmente é apontada como a razão da falência de
empresas, no entanto, na maioria dos casos, a razão não é exatamente a
10
escassez de oferta de recursos, mas sim a baixa qualidade dos serviços
empresariais.
d) Julgamento diante do risco e da incerteza: está menos relacionado a traços
pessoais do que os serviços anteriores. A capacidade de emitir julgamentos
depende mais da correta aplicação de recursos para coleta de informação,
consultas e realização de projeções do entorno da organização, de forma a
produzir uma melhor interpretação dos riscos e das incertezas.
2.1.2. Desafio da navegação no ambiente dinâmico
De acordo com Fleck (2007), o desafio da navegação no ambiente dinâmico diz
respeito ao sucesso em lidar com os múltiplos stakeholders da organização, de forma
a assegurar captura de valor e legitimidade organizacional. Respostas positivas a este
desafio contemplam um ativo monitoramento do ambiente, mapeando adequadamente
suas mudanças, bem como o uso de respostas estratégicas (OLIVER, 1991)
apropriadas, a fim de neutralizar pressões externas e assegurar o fluxo de recursos.
O trabalho de Pfeffer e Salancik (1978), intitulado O Controle Externo das
Organizações3, estabelece diversos conceitos que contribuem para fundamentar
dimensões de análise sobre o desafio da navegação no ambiente. Segundo os
autores, a organização pode ser entendida como um conjunto de coalizões, entre
grupos e indivíduos, engajadas em trocar suas contribuições por algum incentivo,
adotando um comportamento que seja estável e contínuo ao longo do tempo. Assim
sendo, a organização se torna dependente dos recursos providos pelos seus
participantes, enquanto as coalizões se tornam interdependentes. Dado que alguns
recursos são mais valiosos do que outros, determinados grupos possuem maior ou
menor controle sobre a organização.
Os grupos que sustentam a atividade da organização, como governo,
comunidade, fornecedores, empregados, clientes, credores e proprietários, mantêm
seu apoio a tal coalizão na medida em que percebem que isto lhe será vantajoso e a
abandonam quando qualquer vantagem percebida deixa de existir. No entanto,
pessoas e grupos possuem interesses e preferências variados, e por isso adotam
diferentes critérios para avaliar os benefícios que recebem da organização. Isto,
eventualmente, cria um problema de demandas conflitantes. Neste sentido, é plausível
a idéia de que à medida que uma organização cresce e amplia a coalizão que a
sustenta, amplia também o potencial para que exista incompatibilidade entre os
3
Tradução livre do inglês: The external control of organizations
11
critérios de avaliação de seus stakeholders, tornando maior o desafio dos gestores em
encontrar uma combinação eficaz, ou seja, que satisfaça todas as demandas externas.
Esta noção de dependência de recursos destaca a relevância em se observar a
organização também sob a perspectiva de suas relações externas, ou seja, além das
fronteiras de sua autoridade. Freqüentemente, conflitos entre stakeholders ou
mudanças no ambiente, como racionamento de recursos, controle de preços ou o
surgimento de novas tecnologias, impõem restrições à ação dos gestores, limitando o
leque de alternativas a sua disposição e, por vezes, tornando sua atuação meramente
ritualística. Contudo, a atividade gerencial não se resume a desempenhar um papel
simbólico. Embora o gestor seja limitado por restrições do ambiente, a interação entre
organização e coalizões ocorre em uma dinâmica de quase resolução de conflitos
(Cyert & March, 1963). Portanto, o gerente exerce um papel de mediador, buscando
conciliar o conflito entre demandas, já que os interesses dos stakeholdres, em geral,
tendem a buscar satisfação e não maximização, criando uma zona de tolerância
(Doyle, 1994) a partir do ponto em que as mínimas expectativas dos múltiplos atores
são atendidas.
Segundo Pfeffer & Salancik (1978), dado que muitas restrições ao gestor
derivam da ação de outros, torna-se uma importante função do gestor influenciar estes
outros, de modo a determinar seu próprio ambiente. Para tanto, o reconhecimento do
contexto social e das restrições dentro da qual a organização deve operar passa a ser
um componente da ação gerencial igualmente importante. Uma falha da organização
em obter um correto entendimento do ambiente pode significar sua incapacidade, seja
de realizar ajustes em suas atividades para entrar em conformidade com as restrições,
seja para guiar e controlar o processo de manipulação do ambiente.
Em um artigo que combina a perspectiva de dependência de recursos com a
teoria institucional, Oliver (1991) apresenta um conjunto de respostas estratégicas ao
processo institucional. A gama de possibilidades utilizadas pelas organizações
contempla respostas que variam de acordo com o grau de passividade, consciência,
resistência, controle e oportunismo com que a organização procura moldar ou entrar
em conformidade com o ambiente. Abaixo, segue uma descrição resumida de cada
uma das tipologias apresentadas por Oliver (1991):
a)
Estratégia de aceitação: A organização cede às pressões institucionais do
ambiente. As táticas utilizadas para essa estratégia podem ser de hábito:
aderência inconsciente; imitação: mimetismo consciente ou não de modelos
institucionais; conformidade: obediência consciente na incorporação de valores,
12
normas ou requerimentos institucionais, a fim de assegurar benefícios de apoio
social ou estabilidade de recursos.
b)
Estratégia de negociação: A negociação normalmente se posiciona em um
tênue limite para resistência à pressão institucional. Organizações normalmente
se deparam com situações de conflito entre demandas institucionais,
circunstâncias nas quais podem procurar conciliar interesses e expectativas de
atores externos. As táticas são: balancear: acomodação das demandas de
múltiplos
atores
em
resposta
às
pressões
institucionais;
pacificação:
conformidade parcial com expectativas de um ou mais atores, porém mantendo
um mínimo de resistência; barganha: é uma forma mais ativa de negociação,
pois envolve o esforço da organização em obter concessões de um ator externo
sobre suas demandas e expectativas.
c)
Estratégia de evitar: a organização tenta evitar a necessidade de conformidade
com pressões institucionais. As táticas são: táticas de ocultação: envolve o
disfarce de uma não-conformidade. A organização apresenta uma resposta de
fachada, mas não chega a implementá-la; prevenção: tentativa de reduzir a
freqüência com a qual a organização é fiscalizada por atores externos, por meio
do afastamento e isolamento de áreas críticas ao contato externo; fuga: a
organização deixa o domínio sobre o qual a pressão é exercida ou altera
significativamente seus objetivos, atividades ou domínios para evitar a
necessidade de conformidade.
d)
Estratégia de desafio: essa é a forma mais ativa de resistência, pois representa
uma rejeição inequívoca de normas e expectativas nos processos institucionais.
São mais prováveis de ocorrer quando o custo de abandono da estratégia é
percebido como baixo: quando interesses internos divergem de valores externos,
quando a organização considera possuir argumentação consistente ou quando
percebe o custo de desafiar como sendo baixo. As táticas são: ignorar: a
organização ignora normas e valores institucionais; contestar: a organização se
envolve em um desafio ofensivo contra normas e expectativas institucionais,
normalmente acreditando na consistência de suas convicções; atacar: diferenciase da tática de contestar pela intensidade e agressividade que a organização se
distancia
das
expectativas
e
pressões
externas,
denunciando
valores
institucionalizados e atores que os expressam.
e)
Estratégia de moldagem: moldagem é a forma mais ativa de resposta a
pressões externas, pois tem a intenção de ativamente mudar ou exercer poder
13
sobre o conteúdo e a origem das pressões externas. As táticas são: cooptar:
persuadir atores externos a juntarem-se à organização ou ao conselho de
administração dos diretores da empresa; influenciar: é mais direcionado a
valores e crenças institucionalizados, mudando a percepção pública sobre a
indústria onde a empresa atua, por exemplo, fazer lobby sobre órgãos
reguladores para alteração de regras; controlar: esforços específicos para
estabelecer poder e dominância sobre atores externos que exercem pressão na
organização.
2.1.3. Desafio da gestão da diversidade
Segundo Fleck (2009), o desafio da gestão da diversidade está relacionado à
manutenção da integridade da organização, à medida que ela experimenta o aumento
da diversidade. O próprio crescimento da organização aumenta a diversidade, como a
ampliação de mercados, novas linhas de produtos, diversificação não-relacionada,
aquisições de outras empresas ou o mero aumento do número de empregados. Além
da diversidade gerada pelo crescimento, as coalizões que compõem a organização
possuem demandas conflitantes (CYERT e MARCH, 1963) e produzem rivalidade
organizacional (SELZNICK, 1957). De acordo com Fleck (2009), respostas positivas
ao desafio da gestão da diversidade dizem respeito ao desenvolvimento de relações
de compartilhamento de recursos e de capacitações de coordenação. As respostas
devem resultar na neutralização de pressões para fragmentação, sendo orientadas
para sustentar a integridade.
A gestão bem-sucedida da diversidade organizacional distingue elementos
homogêneos e heterogêneos da organização e fomenta a relação de ligação
adequada (Stickland, 1998; apud Fleck, 2006). Os recursos homogêneos quando
compartilhados podem fornecer economias de escala, escopo e velocidade
(CHANDLER, 1977), enquanto que recursos heterogêneos levam a relações de
intercâmbio. Nos dois casos a organização necessita da criação de capacitações de
coordenação. Segundo Porter (1987) o compartilhamento de recursos requer
colaboração entre unidades da organização. Caso a organização falhe em fomentar a
cooperação, ela poderá comprometer suas vantagens competitivas ao invés de
beneficiar-se os das relações entre as unidades.
As relações de compartilhamento de recursos incluem não somente prédios,
patentes e serviços administrativos como também outros menos tangíveis, como
reputação, mitos e percepções comuns sobre a organização (SELZNICK, 1957). O uso
14
compartilhado de recursos pode não só promover maior aproximação entre os
membros da organização, mas também produzir economias de escala e escopo. Além
disso, o compartilhamento de recursos pode criar um sistema complexo de relações
entre as atividades da organização, criando uma vantagem competitiva difícil de ser
replicada por concorrentes (PORTER, 1996; BARNEY 1997).
Os
mecanismos
de
coordenação,
por
sua
vez,
não
eliminam
a
heterogeneidade. Ao invés disso, faz o uso construtivo dos elementos heterogêneos,
estimulando a integração da organização (FLECK, 2009). Tais mecanismos podem
ser, por exemplo, comitês multidisciplinares, gerentes de projeto ou departamentos de
integração.
2.1.4. Desafio do aprovisionamento de RH
O desafio do aprovisionamento de recursos humanos trata de prover a
organização com pessoas qualificadas para exercer as funções gerenciais. Os
recursos gerenciais são condição necessária para o crescimento (PENROSE, 2006) e
para a existência continuada (CHANDLER, 1977). Recursos humanos não entram na
organização prontos para exercer plenamente as funções gerenciais. Segundo
Penrose (2006) a medida que os recursos humanos aprendem sobre suas funções
novos serviços podem ser desenvolvidos a partir deles, porém é necessário tempo
para que isto ocorra.
De acordo com Fleck, respostas positivas para este desafio estão relacionadas
ao abastecimento permanente dos recursos gerenciais a organização, promovendo as
atividades o recrutamento e formação, a retenção e a preparação para sucessão de
forma
antecipada.
Já
as
respostas
negativas
estão
dizem
respeito
ao
aprovisionamento atrasado dos recursos gerenciais.
2.1.5. Desafio da gestão da complexidade
De acordo com Fleck (2009) conforme a empresa cresce a complexidade dos
problemas com que ela se depara também aumenta. As respostas ao desafio da
gestão da complexidade, portanto, estão relacionados a capacidade de a organização
lidar com situações cada vez mais complexas. Respostas positivas a este desafio
envolvem a adoção de procedimentos sistemáticos para a busca de solução dos
problemas e, portanto, afeta a qualidade das respostas aos demais desafios.
15
As capacitações para busca de solução de problemas dizem respeito à
presença de uma orientação para solução de problemas, incentivando a ampliação da
área de busca por soluções promovendo o aprendizado organizacional (CYERT &
MARCH, 1963), associada à Sistematização de procedimentos, que inclui a
codificação de processos de coleta e análise de dados, bem como, a adoção de
métodos para tomadas de decisão e implementação.
2.2.
Dinâmica de Mudança nas Organizações
O referencial teórico baseado no modelo dos desafios a longevidade de Fleck
(2009) servirá como uma lente para analisar os padrões de ação da General Motors e
relacioná-los aos arquétipos do sucesso, propensos a auto-perpetuação, ou de
fracasso, propensos a auto-destruição. Tal análise buscará identificar padrões em
torno dos quais se desenvolvem as ações da General Motors ao longo do tempo.
Dado a perspectiva longitudinal em que se desenha a pesquisa e a suposta
ocorrência de movimentação de um extremo ao outro do contínuo. Passa a ser
relevante também para a maior clareza na condução do estudo algumas referências
relacionadas às dinâmicas que formam e alteram o comportamento e as instituições
das organizações.
Cyert e March (1963) apresentaram um importante referencial para entender a
formação do comportamento da firma. Segundo os autores, a natureza de evolução
desigual das demandas dos integrantes da organização cria uma dinâmica de quase
resolução de conflito na definição dos objetivos da organização. A busca de novos
objetivos da organização é orientada pelo surgimento de problemas, que nesta visão
indica o fracasso de um objetivo anunciado. Algumas regras básicas da busca de
soluções determinam o seqüenciamento da hierarquia dos problemas e os princípios
que norteiam este aprendizado:
a) A busca por soluções ocorre inicialmente nas imediações - do
problema e expande a área (e complexidade) da busca a medida que os
objetivos fracassam. Portanto, se há um problema na área de vendas, a
organização
vai
direcionar
buscas
dentro
equipe
de
vendas
e,
eventualmente, expandir, por exemplo, para marketing caso a primeira
solução (objetivo) fracasse.
b) A busca também começa pelas vizinhanças das alternativas já
conhecidas e eventualmente se expandem para áreas menos conhecidas.
16
c) A expansão das buscas tende a seguir para áreas mais vulneráveis da
organização e, conseqüentemente evitar questionar áreas mais fortes da
organização.
d) A expansão tende a seguir para áreas onde há folga organizacional.
Por exemplo, um laboratório de desenvolvimento pode ser um freqüente
criador de soluções para os problemas da firma.
Em um estudo com o objetivo de compreender o executivo em seus papéis
gerenciais e de liderança, Selznick (1957) produziu um importante referencial sobre o
processo de institucionalização nas organizações. De acordo com o autor, as decisões
administrativas são menos relevantes, pois tratam de rotinas e de problemas do dia-adia, que não conferem um caráter distintivo e fazem do gerente uma peça dispensável.
Por outro lado, o gestor deve se ocupar das decisões críticas, pois estas permitem a
institucionalização, um processo infusão de valores além dos requisitos técnicos de
uma atividade.
As instituições conferem uma proteção às organizações, que passam a contar
com o esforço de seus membros para manter a representação de seus valores,
criando um caráter que a distingue das demais. Contudo, as instituições tornam-se
também fonte de resistência à mudança e, neste caso, o papel do líder é novamente
essencial, pois é ele que, através de decisões críticas, é capaz de perceber valores
emergentes nos grupos internos e externos da organização e promover sua infusão
em substituição a instituições em declínio.
Os arcabouços teóricos de Selznick (1957) e Cyert e March (1963) adotam
perspectivas diferentes acerca da atividade organizacional, um com foco sobre a
atuação das lideranças e o outro sobre o comportamento da firma. No entanto, alguns
elementos principais apresentados pelos autores são complementares naquilo que
descrevem sobre a dinâmica organizacional. O quadro 2-2 abaixo apresenta a
comparação entre esses elementos:
Quadro 2-2 Elementos da dinâmica organizacional de Selznick (1957) e Cyert e
March (1963)
Autor
Elemento
Eficácia
Selznick (1957)
Cyert e March (1963)
Infusão de valores que atrai o
compromisso dos grupos que
sustentam a organização
Coalizão de consenso entre
membros da organização em
torno de objetivos
17
Padrões de
ação
Instituições organizacionais
mantêm um caráter distintivo
estável, sustentado por seus
membros
Busca de novos objetivos
somente quando surgem novos
problemas
Rivalidade
organizacional
Valores heterogêneos entre
grupos gerando rivalidade
Objetivos diferentes, quase
resolução de conflitos
Pressões para
mudanças
Valores dos grupos internos e
externos são dinâmicos,
conflitando com instituições
Objetivos dos integrantes
mudam conforme passam por
novas experiências
Adaptação
Líder estadista conduz
processo de Institucionalização
lento e gradual
Busca orientada pelo surgimento
de problemas; inicialmente nas
imediações de dos problemas e
das alternativas conhecidas
Resistência a
mudança
Desenvolvimento de ideologias
administrativas; criação e
proteção de elites; e formação
de grupos políticos rivais
Busca de soluções se expande
em direção a áreas mais
vulneráveis, afastando-se das
áreas mais fortes
18
3. Método
3.1.
Delimitação do tema e do objeto de estudo
Entender os elementos que contribuem para o sucesso ou o fracasso de
organizações é um problema central da atividade gerencial. A partir desta questão
genérica desenvolveu-se o interesse em pesquisar como organizações que
alcançaram e se mantiveram por determinado período em um estado reconhecido de
sucesso eventualmente enfrentaram o declínio e, em seguida, o fracasso. Esta
pergunta genérica encontra um relevante objeto de estudo no fenômeno ocorrido com
a General Motors. A GM foi, durante a maior parte dos seus 101 anos de existência, a
maior empresa de seu ramo de atividade e esteve constantemente entre as maiores
empresas em faturamento do mundo. Os inúmeros produtos campeões de venda, a
força de suas marcas, a capacidade de gerar lucros e a credibilidade nos mercados
financeiros comparável aos títulos mais seguros não impediram que a GM entrasse
em um crônico processo de declínio e viesse a pedir concordata. Portanto, a General
Motors configura-se na unidade de análise escolhida para desenvolver as intenções de
pesquisa.
O estudo de caso se mostra adequado para a condução da pesquisa, dado que
segundo Yin (1989), o método é apropriado para casos onde a questão da pesquisa é
do tipo “como e por que”, a investigação não requer controle sobre o evento e o
enfoque trata de um evento contemporâneo.
Diante da abrangência das atividades e da diversidade de países em que a GM
está presente, o estudo priorizou os dados referentes à operação nos Estados Unidos,
onde se localiza sua matriz e, também, onde está a maior parte de suas atividades e
das vendas de seus produtos. Esta delimitação da coleta de dados permite conciliar a
necessidade de trazer o máximo de evidências relevantes e, ao mesmo tempo,
assegurar um volume de informação capaz de ser processado. Outra delimitação do
estudo foi em relação ao uso de fontes secundárias, devido à dificuldade de acesso a
potenciais fornecedores de dados primários relevantes.
Através do estudo de caso, os dados coletados sobre a General Motors são
analisados à luz do modelo teórico de Fleck (2009), a fim de obter explicações para o
fato de a GM ter desenvolvido crescimento e lucros tão expressivos e não ter sido
capaz de evitar o fracasso. Segundo Yin (1989), o método do estudo de caso
apresenta limites quanto ao poder de generalização, porém o mesmo possui
19
vantagens devido à possibilidade de análise mais detalhada e flexível sobre o
fenômeno estudado. Portanto, a principal contribuição deste estudo em relação à
questão genérica da pesquisa será em termos da confirmação da validade do
arcabouço teórico, quando aplicado em um caso de alta relevância, como é o da GM.
3.2.
Estratégia de pesquisa
A pesquisa adota uma visão de processo (LANGLEY, 1999; 2007). As
estratégias genéricas utilizadas foram combinadas de forma a atender objetivos de
precisão e de simplicidade (LANGLEY, 1999) na apresentação dos resultados da
pesquisa. A análise dos dados se apoiou no modelo teórico dos arquétipos da autoperpetuação e auto-destruição, sendo que os cinco desafios à longevidade forneceram
os parâmetros para a identificação de padrões de ação. Assim sendo, a organização
do trabalho se deu da seguinte forma:
•
Coleta de dados – Busca de livros, documentos, artigos, reportagens, estudos de
caso e bases dados.
•
Processamento e codificação dos dados – Leitura, escaneamento de trechos
relevantes, elaboração da tabela de fatos, codificação dos fatos relacionados a
cada desafio
•
Análise das evidências – Elaboração da narrativa histórica, elaboração de séries
quantitativas longitudinais, organização de mapas visuais, comparação de
padrões, elaboração de quadros temporais.
A seguir, é apresentado com maior detalhamento o desenvolvimento de cada
uma dessas etapas.
3.3.
Coleta de dados
A busca por fontes de informação ocorreu em diversas frentes. A principal
delas foi por meio do levantamento feito pelo sistema de bibliotecas da Haute École de
Commerce (HEC) e McGill, em Montreal, no Canadá, que disponibilizou uma grande
quantidade de livros, reportagens e estudos de caso representativos de todos os
períodos da história da General Motors, conforme é apresentado no gráfico 3-1. A
busca ainda foi expandida para as bases de dados eletrônicas do Proquest, Ebsco
Host, portal de periódicos da CAPES, JSTOR e Google Acadêmico.
20
Gráfico 3-1 Fontes secundárias obtidas através do levantamento das bibliotecas
da HEC e McGill
Revista Business Week 1988-2008
Revista Forune 1988-2008
Rubenstein, J. (2001) Making and
Selling Cars
Lee, A. (1988) Call me Roger
Keller, M. (1989) Rude Awakening
the rise, fall and struggle for
recovery of GM
Cray, E. (1980) Chrome Cossus:
General Motors and its times
Wright, J. (1974) On a clear day you
can see General Motors
Freeland, R. (2001) Struggle for
Control of the Modern Corporation
Sloan, A. (1963) My years with
General Motors
Pound, A. (1934) The Turning Wheel
Madsen, A. (1999) The deal maker:
how William Durant made GM
As fontes secundárias na forma de biografias, livros históricos e de negócios,
enciclopédias, artigos acadêmicos, estudos de caso e reportagens de jornais e
revistas são abundantes ao longo da história da General Motors. A falta de relatos
sobre a GM não chegou a ser um problema para a condução da coleta e da análise,
embora dois aspectos tenham exigido cuidados extras. O primeiro aspecto está
relacionado ao potencial viés implícito em algumas das principais fontes de dados,
como biografias de ex-executivos como Alfred Sloan, John Delorean, Roger Smith e
Walter Chrylser. O outro aspecto refere-se às fontes de dados a partir do final da
década de 1980, quando nenhuma outra fonte com conhecimento profundo do dia-adia das decisões da GM publicou suas memórias. Além disso, o trabalho das
assessorias de imprensa a partir da década de 1970 produziu o efeito de filtro sobre a
saída de informações da organização.
Assim sendo, a reconstituição dos fatos a partir das fontes disponíveis contou
com uma atenção especial para tentar identificar afirmações que parecessem pouco
coerentes em relação aos acontecimentos contemporâneos, ou em relação à cadeia
de acontecimentos observada tanto na história que antecedeu a tal fato quanto na que
sucedeu. Para os casos nos quais foi identificada alguma das incoerências
mencionadas, a descrição sobre o referido evento ou ação proveniente daquela fonte
foi descartada para efeito de análise.
21
Outras fontes importantes, tanto para coleta de fatos históricos quanto para os
dados quantitativos, foram:
•
CHANDLER, A. (1964) Giant Enterprise: Ford, GM and the automobile industry
•
CHANDLER, A. (Ed. 1979) Managerial Innovation at GM
•
CHRYSLER, W. (1991) Life o f an American workman
•
IACOCCA, L. (1986) Iacocca: an Autobiography
•
KHUN, A. (1986). GM passes Ford , 1918 – 1938
•
MAY, G. (Ed. 1989) The Automobile Industry, 1920-1980 (Encyclopedia of
American Business History and Biography)
•
MCSHANE, C. (1997) The automobile: a chronology of its antecedents,
development and impact.
•
PASCALE, R (1994) Administrando no Limite
•
Relatórios anuais da General Motors, Sec Fillings, K-10, de 1994 a 2008,
disponível na página da General Motors na internet
•
Relatórios anuais Moody’s sobre a General Motors de 1923 a 1998
3.4.
Processamento e codificação dos dados
Dado que a abundância de fontes gerou grande carga de leitura e que os
trechos identificados como relevantes necessitavam ser frequentemente consultados
ao longo do processo de análise, os dados foram organizados em uma tabela do
Excel, com a utilização de um equipamento de scanner e de um sistema de
reconhecimento óptico instalado no computador. Este método permitiu que a leitura de
livros e artigos ocorresse com maior fluidez, apenas fazendo pequenas marcas no
início e no fim dos trechos a serem extraídos, acompanhado de uma pequena
marcação lateral com ano inicial e final a que o evento destacado se referia.
Os resultados das extrações feitas através do scanner e com sistema IRIS de
reconhecimento
óptico
(em
inglês,
Optical
Character
Recognition,
OCR)
frequentemente exigiu que ajustes fossem feitos nos textos antes que estes fossem
depositados no banco de dados do Excel. Mesmo com trabalho de verificação e
correção dos textos extraídos, este método se mostrou altamente superior às
alternativas de digitação dos textos ou de não utilização de recursos digitais. No total,
foram coletados 2288 fatos, sendo que destes foram efetivamente utilizados na
elaboração da análise 1703 fatos. A tabela de fatos para armazenamento dos trechos
extraídos das fontes de dados foi composta dos seguintes itens:
22
• Número do fato: atribui um número no momento em que o fato é registrado
• Ano inicial: indica o ano em que o evento teve início
• Ano final: indica o ano em que o evento se encerrou
• Fato: reproduz em texto exatamente a descrição do fato como ele é narrado ou
escrito segundo a fonte
• Comentário: apresenta alguma informação adicional que eventualmente pode ter
sido considerada útil para melhor compreensão do fato
• Fonte: descreve a fonte de onde o fato foi obtido
O quadro 3-1, a seguir, apresenta um extrato exemplificativo da tabela de fatos
elaborada para a etapa de análise.
Em virtude da necessidade de se organizar sobreposição das múltiplas fontes
de dados, costurando associações dos trechos extraídos entre si e deles em relação
aos polos das respostas a cada um dos desafios à longevidade, a tabela de entrada
de fatos foi acrescida de mais 14 colunas referentes às dimensões de análise
inicialmente estabelecidas a partir do referencial teórico. Com uma coluna definida
para cada dimensão da resposta a um desafio, foi possível desenvolver uma
codificação dos fatos da tabela, de modo a permitir o uso de filtros e ordenação do
Excel que vieram a facilitar o processo de análise como mostra o quadro 3-2.
•
Desafio do empreendedorismo
o
o
o
o
•
Ambição
Versatilidade
Mobilização de recursos financeiros
Julgamento
Desafio da navegação no ambiente dinâmico: ações de monitoramento e uso de
respostas estratégicas em relação aos stakeholders
•
o Sociedade e economia
o Acionista
o Empregados
o Tecnologia
o Indústria automotiva e concorrentes
o Governo e legislação
Desafio da gestão da diversidade
•
o Compartilhamento de recursos
o Mecanismos de coordenação
Desafio do aprovisionamento de recursos gerenciais
•
o Aprovisionamento antecipado e planejado
Desafio da gestão da complexidade
o Busca sistemática para solução de problemas
23
Quadro 3-1 Extrato exemplificativo da tabela de entrada de fatos históricos da General Motors
ano
fato n° inicial
ano
final
Pg.
Início
Pg Final
Fato
Comentário
Fonte e Pag.
907
1946
1946
208
The proceeds of this borrowing were received on August 1, 1946, and gave the corporation a good deal more
flexibility in meeting its increased capital needs. But the Financial Policy Committee felt that the corporation
needed still more capital of a permanent na¬ture, and on August 5, 1946, it authorized Mr. Bradley to negotiate
with underwriters "with a view to determining the basis upon which it might be possible to sell a new issue of
$125,000,000 pre¬ferred stock." The committee had considered other methods of obtaining permanent capital.
One factor in our decision was that we could market a preferred-stock issue which we could retire at will, under
specified conditions, but which did not have any man¬datory provisions requiring retirement by a certain date.
As things worked out, however, the public market would not absorb as much preferred stock as we had hoped,
except under terms we thought to be too stringent. As a result the issue had to be cut down to $100 million, that
is, one million shares of $3.75 preferred offered at par. The stock was offered on November 27, 1946, and
yielded the corporation $98 million after underwriting discounts and commissions.
908
1948
1949
209
And because our expansion program had been completed, our plant expenditures were relatively modest -$273
million in 1948 and 1949, only $64 million more than our pro¬vision for depreciation. Our capital position
improved so rapidly, in fact, that we decided to prepay the $125-million note issue in December of 1949, thereby
eliminating our debt. We were also able to increase our liquidity and to pay substantial dividends.
SLOAN, A. P. (1963). My years with General Motors. New
York, Currency Doubleday, 1990. p 209
909
1950
1950
209
Our next major expansion was an outgrowth of the Korean War. We had learned from experience that wars
create a backlog of un¬satisfied demand. After a good deal of thought we concluded that the long-run potential
of the cal' market required a large expansion of our productive facilities and justified spending corporation
money on new plant facilities for defense production that ultimately could be used for commercial operations.
SLOAN, A. P. (1963). My years with General Motors. New
York, Currency Doubleday, 1990. p 209
910
1950
1950
209
911
1950
1953
210
912
1953
1954
210
913
1955
1955
211
210
211
I outlined my views in a letter dated November 17, 1950, to the members of the Financial Policy Committee,
with the following recommendations:
1. We should make a survey, which is under way, to determine the quantitative measurements of the trend of
demand over the next ten years, with particular reference to that after five years. Consideration should be given
to such peaks as may develop due to deferred demand resulting from the curtailment of production incidental to
the rearmament program.
2. We should develop a broad outline of a master plan to meet such prospective increase in production, if any,
as our judgment may determine. This should include ways and means to best carry out such expansion. It
should embrace the various categories of production involved in the Corporation's present scheme of thingseach category following its own potential. This broad outline should be [filled] in as more facts become available
...
3. We shall be called upon to provide facilities for the rearmament program. Such needs should be integrated
with the proposed master plans in broad outline so that we shall be able to move more rapidly and efficiently
In the four years 1950 through 1953 we spent $1279 million on new plant and equipment - about one third of it
for defense facilities. During this period, however, our earnings were restricted by the excess-profits tax and by
the fact that the margin on defense business under our policy was lower than on commercial sales.
At the beginning of 1954, with our financial resources already under strain, we announced a forward program of
plant expenditures calling for an outlay of $1 billion in two years. With a plant-expenditure program of this
magnitude, and the in¬flationary pressures an casts, it was clear that we would have to raise new capital if we
were to continue to pay out a substantial part of each year's earnings in the form of dividends. Toward the end
of 1953 the Financial Policy Committee reviewed the problem and determined that a debt issue could be sold to
advantage. In contrast to the situation in 1946, however, the insurance companies and other institutional
investors did not have any excess funds available; they were, instead, committed for some time ahead. Hence
we turned to the public market and in December 1953 sold an issue of $300 million of twenty-five-year 3¹/4 per
cent debentures, netting (after deducting underwriters' fees and commissions) $298.5 million. This, too, was an
In January of 1955 our plant-expenditure program was expanded from $1 billion to $1.5 billion (and later to $2
billion). In analyzing our future capital requirements, therefore, we decided that we would need to raise more
outside capital. And so in February 1955 we offered holders of common stock the right to subscribe to
4,380,683 shares of new stock (five-dollar par value) at the rate of one share for each twenty shares held. The
subscription price for each new share was $75; at the closing date of the offering, the stock was selling at 96
7/8. The stock offer was underwritten by a group of 330 underwriters, but the underwriters had to subscribe to
only 12.8 per cent of the issue. The net pro¬ceeds to the corporation approximated $325 million after payment
of underwriting fees and commissions. This was the largest indus¬trial common-stock issue in the United
States up to that time and was a remarkable success, attesting to the correct evaluation of the market at a time
24
SLOAN, A. P. (1963). My years with General Motors. New
York, Currency Doubleday, 1990. p 208
SLOAN, A. P. (1963). My years with General Motors. New
York, Currency Doubleday, 1990. p 209-210
SLOAN, A. P. (1963). My years with General Motors. New
York, Currency Doubleday, 1990. p 210
SLOAN, A. P. (1963). My years with General Motors. New
York, Currency Doubleday, 1990. p 210-211
SLOAN, A. P. (1963). My years with General Motors. New
York, Currency Doubleday, 1990. p 211
Quadro 3-2 Extrato exemplificativo da tabela de codificação dos fatos
fato n°
livro
ano
inicia ano
l
final
926
Sloan
1924 1924
990
Sloan
1924 1924
992
Sloan
1924 1924
759
Sloan
1924 1925
796
Sloan
1924 1925
808
Sloan
1924 1925
988
Sloan
1924 1931
Empreendedorismo
Fato
General Motors Research Corporation began working in the early twenties on the problem of balancing
engines, and a crankshaft-balancing machine was developed and first used in the production of the 1924
Cadillac engines. This ma¬chine, hundreds of which are now in use throughout the world, was exc1usively a
General Motors devel.9pment and gave us a long lead in engine balancing in the industry.
From this committee carne the corporation's first regular testing program. Cars then were being tested on public
roads, and there was no easy way of telling whether the test driver had pulled up at the side of a road, taken a
nap, and then driven faster than the test schedule called for to make up the necessary mileage...The most
important step we took to standardize and improve test procedures was the establishment in 1924 of the
General Mo¬tors Proving Ground, the first of its kind in the automobile industry the thought was that we would
have a large area, properly protected, and entirely closed to the public. It would be provided with roads of
various types representing all the various demands on the motorcar from the standpoints of high speed, hills of
various grades, smooth roads, rough roads, ability of a car to move through water - which is frequently required
The idea was approved and the necessary capital made available. The next problem was to find out where such
a proving ground could be located. What we wanted was a varied terrain centrally situated with relation to our
manufacturing operations in Lansing, Flint, Pontiac, and Detroit. Michigan is rather flat, and at first we had
difficu1ty locating an area of sufficient size that would give us all the various grades we needed. However,
almost every foot of the United States has been measured topographically, and the rec¬ord was available in
Washington. We went to Washington and from the Geological Survey maps available there we determined a
location that appeared to fulfill our needs. At Milford, Michigan, would meet the requirements we had in mind... I
delegated one of my executive assistants, W. J. Davidson, to take responsibility for developing the Proving
Ground, and he appointed F. M. Holden as the first resident manager. Not long after¬ward Mr. Holden went to
Oakland at his own request and was succeeded at the Proving Ground by O. T. ("Pop") Kreusser. All three of
these men contributed greatly to the success of this project.... The land was surveyed; the straightaways were
In1924 and 1925 the committee gave attention to the education of the dealers and sales departments on the
advertising and sales value of current engineering developments. I asked the committee to develop a series of
criteria by which "car value" of the different makes and models might be objectively determined. In 1924, too, I
gave the committee the task of setting up the broad specifications of the different cars to assist in our efforts to
keep the several Gen¬eral Motors' cars distinct and separate products and in a proper price and cost
relationship to one another.
We worked out in 1924 and 1925 a system of statistical reports to be sent by the dealers to the divisions every
ten days. The core of these reports was the information on dealers' sales of cars and trucks to consumers
during ten-day periods, together with deliveries of used cal's to consumers and the number of both new and
used cars on hand in dealers' lots. Used-car inventories were important because if they backed up in the hands
of dealers they would block the sale of new cars. With this information in hand each ten days, the divisions
thereafter had an up-to-date, comprehensive picture of the situation in the field. The divisions and the
headquarters staff were then able to take corrective action and make new forecasts with greater accuracy....
The headquarters staff assisted the division managers in this task with a seasonal analysis of the year's sales
estimate, and a computa¬tion for each division of an absolute minimum working stock to be maintained and the
maximum seasonal excess over that minimum that was allowable at the end of each four-month forecast
The early return-on-investment form, which with some modifications is still used in General Motors, was the first
step in educating our operating personnel in the meaning and importance of rate of return as a standard of
performance. It provided executives with a quantitative basis for sound decision making, and thereby laid the
foundation for what was to be one of General Motors' most im¬portant characteristics, namely, its effort to
achieve open-minded communication and objective consideration of facts.
The Engineering Staff provides an intermediate, medium-range link between the Research Laboratories and
divisional engineering activities. It chiefly develops new engineering concepts and designs, and appraises them
for commercial application. We did not have a department or section of the corporation under the title
"Engineering Staff" until1931. But the various persons and functions that were brought together to make up this
staff already existed. Some of them went back to the early twenties. When, for example, Mr. Hunt and Mr.
Crane worked up the new Pontiac car in the Chevrolet Division in 1924 and 1925, that was a species of
Versatilid
Ambição
ade
Fund
raising
Navegação no ambiente
Julgamen Sóicioto
economico acionista
gestão da
Resolução
de
problemas
tema
staff de
engenharia
inovação
tecnológica
comite
tecnico geral
campo de
provas
campo de
provas
corporativ
o
comite
tecnico geral
campo de
provas
piramide
de marcas
comite de
vendas
piramide de
marcas
staff
financeiro
sistema de
informação de
vendas
Gestão da diversidade
engenhari
a aplicada
campo de
provas
campo de
provas
piramide
de marcas
comite tecnico
geral
testes com
carros dos
concorrente
s
statísticas
análise
dos
do real vs
fornecedore
projetado
s
análise
de
retorno
da
unidade
retorno
sobre o
capital
staff de
engenhari
a
25
Aprovisiona
Empregad
Concorrên Político- compartil
Antecipado
o
Tecnoligia
cia
legal
hamento coordenação e planejado
supervisão do
desmpenho
das unidades
decisões
baseadas
no ROA
retono
financeiro
mediação do
staff de
engenharia
staff de
engenharia
staff de
engenharia
2.5
Análise das evidências
Para proceder com a análise das evidências reunidas através da tabela de fatos,
diversas estratégias de pesquisa baseadas em processo (LANGLEY, 1999) foram
utilizadas. A primeira das estratégias foi a elaboração de mapas visuais. De acordo com
Langley (1999) esta estratégia não é necessariamente boa para detectar mecanismos, e
requer de cinco a dez casos para poder tornar os padrões evidentes. Apesar de em
princípio não ser uma estratégia recomendada para este tipo de estudo, os mapas visuais
foram utilizados pela facilidade que oferecem para lidar com relacionamentos e com o
tempo. Portanto, em virtude da complexidade das relações entre os fatos, das relações
entre fatos com as dimensões de análises, da sobreposição de fontes e o longo período
analisado, os mapas visuais permitiram a organização visual da sequência dos processos
relacionados a cada desafio, desde o ano de fundação da GM até o final da década de
1980.
Para elaborar os mapas visuais foi utilizada a codificação dos fatos em relação às
respostas aos desafios à longevidade na tabela do Excel. A codificação foi feita através
da leitura de cada fato, atribuindo àqueles que apresentassem alguma relação com
determinada dimensão um título que representasse tal relacionamento, mesmo que este
tenha sido produto de uma reflexão superficial. A maior contribuição deste processo de
codificação não esteve relacionada à qualidade e precisão da identificação de respostas,
mas sim à simplificação de uma primeira triagem dos processos que poderiam conter
alguma informação relevante para uma fase posterior da análise. Com os fatos
codificados na planilha do Excel, foi possível ordenar e filtrá-los por critérios, como data,
fonte, e principalmente relação com determinado desafio. Este método permitiu realizar
uma leitura dos fatos ligados a um determinado desafio de forma contínua e, a partir da
interpretação dos múltiplos relacionamentos, estabelecer mapas visuais que indicaram a
ocorrência de processos estáveis, pontuais ou intermitentes em cada desafio. Esta
estratégia de análise, por ter um papel intermediário na estratégia geral, não é
apresentado no capítulo de resultados da análise, porém os mapas visuais podem ser
consultados no Apêndice A.
Outra estratégia de pesquisa utilizada foi a de quantificação. Para tanto, foram
elaborados, a partir dos demonstrativos financeiros e de indicadores macroeconômicos,
gráficos contendo análises longitudinais da evolução de certos indicadores. Um dos
26
principais indicadores utilizados foi o indicador de tamanho proposto por Fleck (2005). Os
dados obtidos nos relatórios da agência Moody’s e na Securities Exchange Comission
(SEC) e das séries temporais do Federal Reserve permitiram elaborar o cálculo do
indicador de tamanho e de desempenho a partir das seguintes equações:
Tamanho = Vendas * 100
GNP
Desempenho = Lucros * 100
GNP
Outros indicadores quantitativos em perspectiva longitudinal foram elaborados, tais
como vendas de veículos da indústria e da General Motors, e o de retorno sobre o ativo
(Lucro líquido dividido pelo ativo total). Entretanto, esta estratégia de pesquisa, neste caso
contribui pouco para explicação dos eventos, pois estes métodos requerem grande
quantidade de casos para poderem ser generalizados. A existência destes indicadores em
perspectiva longitudinal é relevante apenas na medida em que pode fornecer importantes
questionamentos para pesquisa.
De acordo com Langley (1999) a estratégia de narrativa envolve a construção
detalhada de uma história a partir de dados brutos. Esta estratégia tem os papeis de
análise preliminar, de organização dos dados e potencialmente pode agregar elementos
analíticos. O histórico da General Motors foi elaborado na forma narrativa em seqüência
cronológica. Para redação do texto, todos os fatos selecionados para a análise foram
copiados para o corpo do texto e organizados em de acordo com o evento que
descreviam. Estes blocos de fatos foram diferenciados entre si pelas cores da fonte.
A partir da ordenação dos blocos de fatos em macro assuntos, dentro de cada
bloco os fatos eram novamente organizados em ordem cronológica e de afinidade. Novas
divisões de cores do texto foram utilizadas para organizar os assuntos. Por fim a narrativa
foi redigida em um processo no qual a coerência e a ênfase dada a cada evento era
periodicamente verificada com o auxílio dos mapas visuais elaborados inicialmente.
Tendo constituído a tabela de fatos codificada, a narrativa em ordem cronológica e
os mapas visuais, a etapa seguinte da análise foi a identificação e comparação dos
padrões de ação (YIN, 1989) da General Motors em relação aos padrões estabelecidos
para cada desafio nos pólos de auto-perpetuação e auto-destruição (FLECK, 2009). A
identificação dos padrões partiu inicialmente dos fatos descritos na narrativa histórica da
General Motors, os principais eventos indicativos de padrões de ação da GM foram
27
selecionados e confrontados com os trechos originais dos fatos na tabela de fatos e com
os mapas visuais do respectivo desafio. Os padrões de cada desafio foram então
descritos em uma perspectiva cronológica, e as observações a respeito desses padrões
foram a utilizados para sintetizar as respostas da General Motors a longo de sua
trajetória.
Para elaborar a síntese das respostas duas estratégias de pesquisa foram
utilizadas, a elaboração de quadros temporais permitiu a comparação entre diferentes
fases identificadas em termos dos padrões de resposta aos desafios. Em seguida,
novamente foram utilizados mapas visuais para simplificar a as relações entre respostas,
desafios e a evolução ao longo do tempo.
28
4. Resultados da análise
A análise dos dados recolhidos sobre a evolução da General Motors é
apresentada em três partes. A primeira delas é a reconstituição do histórico dos
acontecimentos dentro da organização e do contexto que a cercou. A segunda parte trata
de analisar as evidências em termos dos padrões de respostas da organização a cada um
dos desafios à longevidade de Fleck (2009). A terceira parte desta análise fornece uma
síntese da evolução das respostas da General Motors, buscando identificar as condições
desenvolvidas pela organização em relação aos pólos da auto-perpetuação e da autodestruição e, por fim, estabelece a ligação destas respostas com a trajetória crescimento
e declínio.
4.1.
Histórico da General Motors e da Indústria
Automobilística
4.1.1. O nascimento da indústria
O surgimento do automóvel – veículo mecânico terrestre, autopropulsado, para o
transporte de cargas e passageiros – ocorreu ao longo da segunda metade do século
XVIII e durante o século XIX, em meio a um contexto de mudanças nos padrões e hábitos
da vida urbana, na Europa e nos Estados Unidos, e quando avanços em diversas áreas
da ciência estimularam experimentações na locomoção dentro e entre cidades. O
crescimento das aglomerações urbanas, em virtude do processo de industrialização,
provocou uma série de reações sociais que desencadearam políticas de urbanização
baseadas na formação de subúrbios - mais comuns na Inglaterra e nos Estados Unidos e no início da verticalização das cidades, como no caso da França. Em ambos os casos,
resultaram destas mudanças maiores esforços na pavimentação de ruas e estradas, bem
como tentativas de melhor organizar os crescentes fluxos de pessoas e de veículos de
transporte.
Concomitante ao desenvolvimento acelerado de centros urbanos, avanços
tecnológicos possibilitaram o surgimento do automóvel e o desenvolvimento de sua
indústria. Novas proposições nas leis da termodinâmica e o domínio sobre manipulações
de materiais petroquímicos, da siderurgia, da metalurgia e da eletricidade impulsionaram
os experimentos. Inicialmente, ciência e engenharia progrediram nos veículos movidos a
29
vapor, como os apresentados por Nicholas Cugnot em 1769, na França, e por Richard
Trevithick em 1801 e 1804, na Inglaterra. Em pouco tempo, foi possível desenvolver
locomotivas a vapor capazes de transitar de forma eficaz sobre um percurso de trilhos de
aço. Assim, a indústria ferroviária emergiu e revolucionou o transporte em longas
distâncias.
Outros esforços da engenharia caminharam na busca de um motor de combustão
interna. As experiências neste sentido se intensificaram a partir da década de 1820 e
diversas patentes foram registradas na Inglaterra, França e Estados Unidos, onde as
novas descobertas eram mais bem asseguradas pela legislação sobre propriedade
intelectual. Uma variedade de modelos foi produzida de 1823 a 1877, quando Nicklaus
Otto, a partir de sua fábrica em Colônia, na Alemanha, recebeu a patente sobre o motor
de quatro tempos (four-stroke cycle), ou motor de ciclo otto, tecnologia que, então, se
tornou dominante. A patente foi caçada nos tribunais anos depois, mas mesmo assim Otto
manteve-se comercial e popularmente reconhecido pela invenção do motor. O alemão
Gottlieb Daimler também é lembrado por sua contribuição ao desenvolvimento do
automóvel. Após dez anos na empresa de Nicklaus Otto, na qual chegou a diretor técnico,
Daimler se demitiu para poder trabalhar a idéia de um motor de alta rotação. A tecnologia
patenteada por Daimler em 1883 viabilizou motores menores e aumentou a rotação de
100 RPM para 900 RPM e apesar da irrelevância histórica dos veículos criados por
Daimler, seus motores tiveram grande influência no surgimento da indústria.
As tentativas de acoplar um motor a um veículo de transporte foram inúmeras e
estiveram espalhadas pela Europa e pelos Estados Unidos, testando tecnologias a vapor,
eletricidade e de combustão interna. A primeira patente de um automóvel a gasolina
comercializável foi concedida a Karl Benz, em 1886. Ele acoplou um motor de ciclo otto a
um veículo de três rodas, batizado de Motorwagen. A Benz and Co. Rhenish Gas Engine
Works, até então fabricante de motores estacionários, passou a fabricar o veículo, que em
1893 atingiu o volume de 45 unidades e, em 1900, de 603. Logo após o início do
desenvolvimento em terras alemãs, o núcleo dos avanços na tecnologia automobilística
migrou para a França, que possuía excelentes estradas, legislação favorável, bom corpo
de engenharia e uma elite disposta a financiar melhorias nos modelos, sobretudo sob a
bandeira de um novo e nobre esporte: a corrida de automóveis.
Nos Estados Unidos, a fabricação e comercialização de automóveis tiveram início
quase dez anos depois da Europa. O primeiro registro histórico de um carro com motor a
30
gasolina foi o pedido de patente de George Baldwin Selden, submetido em 1879. Selden
era um advogado, que mesmo sem ter conseguido construir a máquina que projetou,
obteve, em 1895, os direitos sobre a produção de automóveis. Um automóvel a gasolina
só foi realmente produzido em solo americano em 1893. Charles e Frank Duryea, após
lerem uma descrição do carro do alemão Benz na Scientific American, construíram, em
Massachusetts, um modelo que adaptou uma charrete usada e algumas peças
disponíveis. No entanto, as atividades da The Duryea Motor Wagon Co., fundada em
1895, não foram muito além de 1896. Uma vitória contra três veículos Benz na primeira
corrida dos Estados Unidos, promovida pelo Chicago Herald Tribune, a comercialização
de 13 unidades similares e a participação em uma corrida na Inglaterra foram as
principais marcas alcançadas pelos dois irmãos antes de liquidarem a empresa.
O surgimento da carroça sem cavalos (horseless carriages) despertou atenção e
curiosidade nos Estados Unidos. Em 1893 foram exibidos na Chicago Wolrd’s Fair dois
veículos elétricos, um veículo a vapor, além de um motor Daimler. Visitaram a exibição
internacional de invenções alguns pioneiros da futura indústria, como, os próprios irmãos
Duryea, os fabricante de bicicleta Albert Pope e Alexander Winton, os então engenheiros
Elwood Hayes e Henry Ford, fabricantes de carroças como Willian Durant e os Irmãos
Studebaker, além de Ramson Olds que à época era fabricante de motores a gasolina e
também já dirigia um carro a vapor criado por ele mesmo. Veículos de comunicação já
escreviam sobre o novo meio de transporte, como foi o caso da corrida vencida pelos
Duryea. A loja Macy’s passou a vender o triciclo de Benz importado da Alemanha em
1895, mesmo ano em que o escritório de patentes dos Estados Unidos registrou o
recebimento de 500 pedidos de patentes relacionadas a automóveis.
Nos primeiros anos da indústria automobilística dos Estados Unidos, houve uma
grande quantidade de modelos de veículos surgindo a cada ano, normalmente adotando o
desenho das carroças existentes e acoplando um motor embaixo do assento do
passageiro. As tecnologias para a locomoção do veículo variavam entre as empresas. À
época, veículos a vapor, a eletricidade e a gasolina apresentavam vantagens e
desvantagens entre si e dividiam a preferência de fabricantes e consumidores. O motor a
vapor possuía uma boa relação de potência e controle na aceleração, mas demorava para
iniciar o funcionamento e seu combustível requeria muito espaço. O carro elétrico era
silencioso e de fácil operação, entretanto, era pesado, tinha baixa autonomia e demorava
muito para recarregar. Já o motor a gasolina era de rápida ignição, tinha boa relação peso
31
e eficiência de combustível, mas, por outro lado, a operação era complexa e fazia ruído
em demasia. Além disso, independentemente da motorização, nos primórdios, os veículos
em geral eram pouco confiáveis e exigiam uma manutenção complicada para cidadãos
comuns.
O primeiro carro produzido em grande quantidade na América foi o Curved Dash
Runabout, que vendeu 4.000 unidades em 1903. O pequeno carro a gasolina da
Oldsmobile tinha o desenho de um buggy (uma carroça de quatro rodas para dois
passageiros) e foi desenvolvido em 1901. Com o objetivo de fabricar motores e
automóveis, Ramson Olds fundou a Olds Motor Works em 1897, tendo como acionista S.
L. Smith, um magnata da indústria do cobre, de Detroit. Ramson já vinha trabalhando com
a fabricação de motores e veículos em Lansing, Michigan, desde a década de 1880.
Porém, foi em 1899 que ele inaugurou, em Detroit, uma fábrica exclusivamente
desenhada para a produção de automóveis, a maior existente até então. A Oldsmobile é a
mais antiga empresa de automóvel dentre as absorvidas pela General Motors em sua
formação.
No ano de 1900, diversos eventos podem ser vistos como indicadores da
mobilização que o automóvel e sua indústria criaram nos Estados Unidos. Os fabricantes
de peças e componentes começaram a ser envolvidos no desenvolvimento dos veículos,
a Associação Nacional de Fabricantes de Automóveis (NAAM) foi fundada e o Clube do
Automóvel da América realizou a primeira corrida em Nova York. Neste mesmo ano, o
primeiro anúncio pago de um automóvel apareceu em um jornal de grande circulação, o
Saturday Evening Post, enquanto que a primeira feira nacional do automóvel (National
Automobile Show), realizada em Nova York, atraiu 48.000 pessoas ao Madison Square
Garden para ver 40 fabricantes de veículos e 11 de peças e acessórios, em uma
exposição que contou com aproximadamente 300 carros diferentes.
Até 1902, os veículos a gasolina eram vendidos em menor quantidade do que os
elétricos e os a vapor. Porém, já na virada para o século XX, indícios da superioridade da
tecnologia a gasolina já podiam ser percebidos: em 1900, apenas sete veículos a vapor
foram expostos na feira em Nova York e, pela primeira vez, um veículo a gasolina venceu
uma corrida contra um carro elétrico em Chicago.
Em meio ao ambiente de inovação e à promessa de novas possibilidades que
cercaram o automóvel em seu início, muitos americanos deixaram suas carreiras ou
direcionaram suas empresas, a fim de desbravar a indústria nascente. Henry Ford foi um
32
desses casos. O jovem filho de um fazendeiro foi para a cidade ser aprendiz de mecânico
e, após trilhar breve carreira como engenheiro, desenvolveu seu primeiro quadriciclo em
1896. Em 1903, após algumas tentativas frustradas, Ford incorporou a Ford Motor
Company associando-se a um grupo de investidores de Detroit.
4.1.2. Da Buick a General Motors
Outro pioneiro foi David Dumbar Buick, um escocês que perdeu o pai ainda
criança, pouco depois de a família migrar para os Estados Unidos, e cuja história é
escassa em registros precisos. Buick freqüentemente é descrito como tendo sido uma
pessoa com alta capacidade criativa. Ele e seu colega William Sherwood assumiram a
falida empresa na qual trabalhavam, fabricante de peças para banheiros, e a tornaram um
negócio de sucesso ao desenvolverem uma inovadora técnica para colar cerâmica ao
aço. Os dois sócios entraram em conflito quando Buick, entusiasmado com a idéia de
construir um automóvel a gasolina, passou a se dedicar menos às atividades de sua
empresa. Em 1899, a lucrativa empresa foi vendida por U$ 100.000 (em valores de 2007,
cerca de U$ 2,7 milhões), e Buick aplicou sua metade no desenvolvimento de motores a
gasolina e do automóvel Buick, que, posteriormente, veio a ser o principal pilar de
sustentação nos anos de formação da General Motors.
A General Motors só foi fundada por Willian Crapo Durant em 1908. Enquanto a
indústria automotiva nascia, Durant comandava de Flint, Michigan, a Durant-Dort Carriage
Company (D&D), empresa fabricante de carroças que expandia a passos largos para se
tornar a maior do país. Durant nasceu em Boston, em 1861, e viveu a infância em Flint
após a separação de seus pais. Filho de um especulador fracassado no mercado de
ações e neto, por parte de mãe, do ex-governador do estado de Michigan, Durant
abandonou a escola, aos 17 anos; tornou-se representante de vendas, agente de seguros
e, posteriormente, empreendedor. Em 1885, aos 24 anos de idade, se impressionou com
a suavidade da suspensão da charrete de um amigo e, no dia seguinte, mesmo sem ter o
dinheiro necessário, formalizou um pré-contrato de compra da patente e da empresa
fabricante de carroças da cidade de Coldwater, Michigan.
Willian C. Durant usou a reputação de sua família nos empréstimos bancários e se
associou a Josiah Dallas Dort para compor o capital necessário para iniciar sua empresa U$ 1500 para aquisição, mais U$ 500 para iniciar a operação. Apoiada nas vendas
promovidas por Durant e pelos representantes por ele nomeados, nos primeiros anos a
33
D&D cresceu vertiginosamente em pedidos de compra de seus produtos, equanto a
produção das carroças ainda era terceirizada.
Para viabilizar a busca por escala, Durant arregimentou pessoas nas quais
identificou talentos, seja recrutando em outros fabricantes, seja em seu próprio chão de
fábrica. Foram os casos de Alexander Hardy (A.B.C. Hardy), vindo de um concorrente
vizinho, e de Charles J. Nash, que começou como ferreiro na D&D. Ambos
acompanharam Durant posteriormente na General Motors, ocupando importantes cargos
gerenciais. Além disso, para assegurar o fluxo de produção, Durant abriu novas plantas
subsidiárias e adquiriu outros fabricantes de carroças e fornecedores de componentes,
algumas vezes motivado apenas pela defesa contra cartéis ou desabastecimento. Em
1895, ano inaugural da indústria automotiva, a D&D fabricou 75 mil unidades em 14
plantas, nos Estados Unidos e no Canadá, e era motivo de orgulho para a cidade de Flint.
O sucesso na fabricação de carroças fez com que Durant não participasse da indústria
automobilística desde o seu primeiro momento, mas em 1904 a corrida empreendedora e
a Buick bateram à sua porta oferecendo uma oportunidade.
David Buick havia aplicado todo o dinheiro que conseguiu com a venda, em 1899,
da empresa de peças para banheiros no desenvolvimento de seu veículo. Em 1901,
contratou o mecânico Walter Marr e, em 1903, uniu-se a eles o experiente engenheiro
francês Eugene C. Richard. Juntos, eles patentearam o sistema de válvula no cabeçote
(overhead valve - OHV) que aumentou significativamente o desempenho do motor. A
Buick Auto-Vim & Power Co. esgotou seus recursos ao desenvolver seu veículo, e Buick
teve que recorrer aos irmãos Benjamin and Frank Briscoe, à época fornecedores de folha
de metal, para financiar a empresa. Com o investimento, os irmãos Briscoe tornaram-se
detentores de 99% das ações da Buick Motor Car Co.
Em uma visita aos familiares em Flint, os novos proprietários da Buick souberam
do interesse de James H. Whiting, um dos fabricantes locais de carroças, em trazer para
a cidade a produção de automóveis. Whiting adquiriu a Buick, em 1903, tendo como
sócios David Buick e outros empresários da cidade. A instalação da produção da empresa
em Flint gerou grande repercussão na imprensa local e os experimentos conduzidos por
Buick, Marr e Richards resultaram nos primeiros veículos comercializados: o Modelo A e,
em seguida, o Modelo B. Os novos motores de dois cilindros conferiram ao Buick uma
confiabilidade e potência raras nos demais carros da época, contudo, contrariando as
expectativas de James Whiting, a indústria automotiva se apresentou mais complexa e
34
com maior demanda por capital quando comparada à produção de carroças. Em
setembro de 1904, Whiting apresentou a Durant o Buick Modelo B e, junto com ele, uma
oferta para que o prestigiado e bem sucedido empreendedor tomasse parte no negócio.
Registros autobiográficos dão conta de que Durant dirigiu incessantemente o
veículo, testando à exaustão suas capacidades em diferentes terrenos, e sempre
retornando à oficina da empresa para solucionar os diversos problemas mecânicos que
surgiam. Durant observou em seus testes o interesse que o carro despertava ao passar
pelas cidades, também constatou a necessidade dos serviços de manutenção estarem
disponíveis aos donos dos veículos. Nas negociações com Whiting e Buick, Durant exigiu
total controle sobre a nova empresa, o que foi aceito pelos demais, mas não assumiu a
presidência, nomeando Charles S. Begole para este lugar. Em 1 novembro de 1904 o
negócio foi concluído. Durant ampliou o capital da empresa de U$ 75.000 para U$
300.000, tornando-se o acionista controlador da Buick Motor Company.
Entrar para a indústria automotiva na época em que Durant assumiu a Buick era o
sonho de muitos empreendedores americanos. Em 1903, 88 empresas de automóveis
foram abertas, incluindo Buick, Cadillac e Ford. Porém, apesar das promessas de uma
demanda voraz, poucas empresas estavam fazendo dinheiro e a quantidade que saía de
operação a cada ano quase empatava com os novos entrantes. Nesta época, havia
diversos obstáculos para um iniciante na indústria. Os bancos estavam receosos em
financiar as empresas, e assegurar matéria-prima tornava-se um desafio a mais para os
competidores devido à disputa por fornecimento de componentes. Além disso, a adoção
do motor a gasolina como padrão ampliou o raio de atuação da patente de George Selden
(válida a partir de 1895).
Ainda em 1903, foi formada por alguns fabricantes de veículos a Associação dos
Fabricantes de Automóveis Licenciados (em inglês, ALAM) com o intuito de determinar os
critérios e valores de licenciamento para a produção e comercialização de veículos a
gasolina. Dentre as atribuições da ALAM estavam a fiscalização e a cobrança dos
royalties da patente de Selden e também a moderação da competição, já que a entidade
podia arbitrariamente recusar a entrada de um fabricante, ou impor requisitos mínimos de
capital investido, por exemplo, para eliminar pequenos aventureiros. Porém, nem todas as
empresas fabricantes aderiram à ALAM - a Ford foi uma delas. Ainda mera debutante na
indústria, a Ford se recusou a pagar royalties para o grupo de Selden e foi acionada
judicialmente em um processo que ganhou notoriedade nos Estados Unidos. Após uma
35
vitória em primeira instância da ALAM, em 1909, o recurso da Ford obteve êxito na
suprema corte americana em 1911.
Assim que assumiu a Buick, Durant tratou de acelerar a produção. Sem
instalações adequadas na cidade de Flint, adquiriu uma fazenda de 220 acres para
construir sua planta. Enquanto isso, ele utilizou as instalações da fábrica de rodas da D&D
em Jackson (a 100 milhas de Flint) para a montagem final do Buicks Modelo B. A Buick
montava de cinco a oito veículos por semana e mantinha a fabricação de motores,
transmissões e carrocerias em Flint. Com o primeiro Buick Modelo B pronto, Durant o
levou para o Salão do Automóvel de Nova York, de onde voltou semanas depois com
pedidos de venda para 1108 veículos. A divisão da produção entre Jackson e Flint exigia
grande dedicação de seus gestores. Durant vivia apressado. Entre as duas cidades e
demais viagens, o empreendedor tomava importantes decisões, cuidava de captar
recursos, encontrar fornecedores e distribuidores, além de empurrar as vendas.
Enquanto corria para colocar a Buick entre as grandes fabricantes de veículos,
Durant procurou manter uma relação segura com os detentores da patente de Selden. A
Buick nunca chegou a se associar a ALAM, mas Durant adquiriu uma licença na
liquidação da Pope-Robinson que entrou em falência, em 1904. Posteriormente, em 1908,
já na recém-criada General Motors, aconselhado por advogados, Durant não só
suspendeu o pagamento de royalties a ALAM como, quando processado, contra atacou,
acusando o grupo de empresas de conspiração. Pouco depois, com a derrota judicial da
Ford para a ALAM, em 1909, voltou atrás em sua decisão e pagou U$ 1 milhão em
royalties retroativos.
O fato de a Buick ter sua produção dividida entre duas cidades também trouxe
oportunidades para a empresa. Durant aproveitou-se do prestígio que havia construído
com sua empresa de carroças e, durante o verão de 1905, utilizou-se de uma jogada para
captar recursos e, assim, alavancar seu negócio. Após anunciar que a produção em
cidades com tamanha distância era inviável, Durant passou a estimular lideranças locais
das duas cidades, interessadas em geração de riqueza e empregos, em uma espécie de
competição para ser a sede definitiva da Buick. Durant divulgou em Jackson e em Flint
que a Buick se instalaria em definitivo em uma dessas cidades, caso uma delas fosse
capaz de aumentar o capital da empresa para U$ 1 milhão. Como a cidade de Flint
ultrapassou a marca em U$ 500 mil, ela assegurou a presença da Buick em seu território.
Em 11 de setembro de 1905, os quatro bancos, as empresas e centenas de indivíduos da
36
cidade compraram ações da Buick, aumentando seu capital para U$ 1,5 milhão. A
produção mudou-se para Flint em três meses, tornando-se a maior planta para fabricação
de automóveis da época.
Ao contrário do que ocorria na fabricação de carroças, onde a D&D controlava a
produção de todos os principais componentes, em 1905, na indústria automobilística,
nenhum fabricante possuía recursos suficientes para produzir todos os componentes de
um carro e, com isso, boa parte deles era fabricada por terceiros. Por exemplo, Ford e
Cadillac e Reo compravam motores dos irmãos Dogde. Os rolamentos eram fabricados
pela Hyatt Company, do recém-graduado do MIT, Alfred P. Sloan. Já os radiadores eram
feitos com as folhas de metal dos irmãos Briscoe. Durant logo percebeu que atrasos na
entrega de componentes eram fatais para o fluxo de caixa da empresa. Uma peça mais
simples como um eixo, por exemplo, passava a ser tão crucial quanto um motor.
Pensando nisso, William Durant persuadiu a Charles Mott, dono da Weston-Mott,
fabricante de eixos, a mudar sua fábrica de Utica, no estado de Nova York, para Flint.
Mott concordou com a mudança após Durant assegurar um investimento de U$ 100 mil
para que fosse montada uma fábrica ao lado da Buick.
Com o motor de dois cilindros, o Buick Modelo B foi um sucesso imediato. A
empresa corria atrás para atender a quantidade de pedidos sempre superior à
capacidade. Em 1905, foram entregues 750 unidades e, no ano seguinte, o volume
aumentou para 2.295, cerca de 7% da produção da indústria. Em 1906, Arthur Mason, um
mecânico vindo da Cadillac, desenvolveu um novo motor aumentando a rotação de 1800
rpm para 4000rpm e, conseqüentemente, elevando a potência do Buick. Isto tornou os
veículos de Durant ainda mais atrativos.
Para ampliar a produção, a Buick teve de levar mão-de-obra de fora para a cidade
de Flint. Com cerca de 15.000 habitantes, os cidadão viram sua população dobrar em
cerca de dois anos. Homens iam espontaneamente de outros estados em busca dos
salários mais altos que a indústria prometia, mas também recrutadores percorriam os
Estados Unidos oferecendo aos artesãos e operários a passagem de trem e as refeições
até que recebessem o primeiro salário. Nesta época, cresceu em importância na cidade
de Flint e entre os operários da Buick a Flint Vehicle Workers Mutual Benefit Association,
uma associação formada ainda em 1901, inicialmente como uma sociedade de seguro
mútuo, que gradualmente desenvolveu atividades sociais, atléticas e de entretenimento.
37
A demanda continuou crescendo e a Buick não conseguia acabar com os pedidos
em backlog. Durant corria atrás de recursos para poder aumentar a produção no ritmo em
que o mercado pedia, mas por mais que a cidade de Flint e a D&D fossem generosas
com a Buick, a empresa precisava de maior volume de investimento e, assim, seu dono
saiu a percorrer os demais bancos do estado de Michigan. A limitação de recursos não
impediu o ímpeto expansionista de Willian Durant. A Buick passou a operar em três
turnos de produção e dobrou o volume em 1907. Nesta época, a cidade explodia com a
chegada de novos operários. A falta de estrutura para acomodar o crescimento da
população fez com que os hotéis e pensões de Flint alugassem o mesmo quarto para o
dia ou para a noite.
A Buick abriu pontos de venda em grandes cidades dos Estados Unidos. William
Durant procurou nomear distribuidores que pudessem manter lojas com espaços para
mostrar os veículos e que oferecessem serviços pós-venda, uma novidade no setor.
Durant trouxe o Harry Shiland, distribuidor e crítico da manutenção complexa dos
veículos, para ser diretor de serviços. Um outro distribuidor, H. J. Koeler, em Nova York,
foi responsável por introduzir a Buick no automobilismo. Koeler usava a potência e o bom
desempenho do Buick nas corridas para impulsionar suas vendas. Foi assim que, em
1906, após dois anos e 36 troféus em corridas de automóvel, ele chegou com um pedido
de compra de 500 unidades, aproximadamente 10% de toda produção. Durant logo
percebeu a oportunidade que as corridas representavam em publicidade e, em 1907,
autorizou a criação da Buick Team. A equipe de mecânicos e pilotos passou a representar
a marca nas provas pelo país, contudo, o automobilismo rendeu ainda mais frutos à Buick
do que somente vitórias e publicidade. Durant, por vezes, priorizou testar novas
tecnologias e aproveitar para copiar segredos de concorrentes, mesmo tendo que
comprometer a subida ao pódio. Além disso, por meio das corridas, Durant trouxe para a
Buick o talentoso piloto e mecânico francês, Louis Chevrolet.
Com uma crise no setor bancário, 1907 foi um ano difícil para os Estados Unidos,
sobretudo para sua atividade industrial. A economia americana vinha de vários anos de
crescimento, a produção de automóveis aumentou, de 1900 a 1907, a uma taxa anual
média de 27%. Entretanto, em outubro, o país viu o pânico financeiro e a escassez de
crédito se espalhar. A crise começou em Nova York, depois de uma frustrada fusão entre
bancos em Wall Street. Todos os bancos passaram a cortar linhas de crédito e a não
renovar empréstimos em vencimento, com isso, os fabricantes de automóveis foram
38
atingidos dos dois lados. Havia menos recursos para pagar fornecedores e financiar a
produção e, na outra ponta, consumidores não conseguiam crédito para comprar veículos
por meio de financiamentos. A resposta dos fabricantes em geral foi de reduzir a atividade
produtiva e até demitir funcionários, como fizeram Cadillac e Olds, mas Durant seguiu
pelo caminho contrário.
A Buick ignorou a crise e continuou aumentando sua produção e fazendo estoque
de produtos acabados. Com a exceção da folha de pagamento, Durant passava notas
promissórias que eram aceitas por fornecedores e até descontadas em alguns bancos
locais. Nas vendas, a Buick também aceitava títulos de dívidas dos clientes. Felizmente
para ele, apesar da queda no PIB naquele ano, o pânico acabou rapidamente. Em
fevereiro de 1908, apenas cinco meses depois do início da crise, a situação estava
normalizada. A demanda reprimida de automóveis, somada à escassez de oferta pelos
concorrentes, fizeram explodir as vendas da Buick. Como resultado, Durant obteve ainda
mais prestígio e colocou a Buick entre as empresas mais valorizadas do setor.
Em 1908, a Buick era a segunda fabricante em quantidade, atrás apenas da Ford,
que neste ano lançaria seu popular Ford Modelo T. A empresa de Willian Durant, que
começara com um modelo de dois cilindros, quatro anos antes, agora possuía dois
modelos de dois cilindros, quatro de quatro cilindros, fabricando 8.487 veículos. O rápido
crescimento trouxe desafios gerenciais para a empresa. Para coordenar tantas atividades,
Durant dispunha de um corpo de gerentes e técnicos, alguns vindos das operações da
D&D, como A.B.C. Hardy, outros descobertos na própria indústria, como nos casos de
Walter Marr, Enos Waters, Arthur Mason, Harry Shiland e Charles Van Horne. Willian
Durant, no entanto, centralizava as decisões importantes. Ao se envolver em tantas
atividades, trabalhava mais horas do que qualquer um de seus homens. Ele dormia
pouco, mas mantinha sempre o semblante e um tratamento amigáveis para com seus
subordinados. A autoridade de Durant se refletia na forma como se referiam a ele dentro
de sua empresa: “the man” (o homem). Muitas vezes a referência “the man says” (o
homem diz) acompanhava a transmissão de suas decisões.
Willian Durant acreditava que o mercado de automóveis ainda estava longe de
uma saturação. Um repórter de Detroit, após entrevistá-lo, escreveu “Durant vê –
realmente vê – 90 milhões de pessoas ansiosas para andar em automóveis pelas
estradas deste país” (tradução livre de MADSEN, A. 1999, p 89). Com convicção de um
39
futuro positivo para a indústria automobilística, Durant perseguiu a idéia de uma
consolidação entre empresas do setor.
Durant passou boa parte de 1907 e 1908 arquitetando uma fusão, na tentativa de
consolidar a indústria automobilística. Por meio de Herbert L. Satterlee, advogado e genro
de Jack Pierpont Morgan, Durant chegou à J. P. Morgan & Co. A proposta era que o
grupo financeiro introduzisse a indústria automobilística no circuito de Wall Street,
capitalizando a fusão que envolveria a Buick, a Maxwell-Briscoe, a Ford e a Reo Motor
Works, à época, responsáveis por mais de 60% da produção total de veículos. As
negociações entre os fabricantes avançaram significativamente, com Durant e Frank
Briscoe coordenando as conversações. Os donos das quatro empresas se reuniram pela
primeira vez em Detroit e, na segunda vez, em 24 e 25 de janeiro de 1908, já em Nova
York, chegaram a discutir valores e a possível estrutura gerencial (Durant defendia
apenas a formação de uma empresa holding e Briscoe sugeriu integrar atividades de
vendas, marketing e engenharia). Henry Ford estava inicialmente propenso a vender sua
empresa, supostamente temendo perdas decorrentes da derrota em primeira instância
contra a patente de Selden. Por outro lado, dono da empresa líder da indústria e com a
idéia de popularização do automóvel, Ford provavelmente temia que um natural aumento
dos preços inviabilizasse seus planos para o iminente Modelo T. Além disso, relatos
atestam que o negócio foi inviabilizado quando Henry Ford e Ramson Olds exigiram
receber o pagamento por suas empresas em dinheiro ao invés de ações. Com duas das
quatro empresas exigindo dinheiro, o representante de J. P. Morgan esfriou seu ímpeto e
se afastou da negociação.
Os irmãos Briscoe e Durant não desistiram da idéia de iniciar um processo de
consolidação na indústria, mas seus planos e empresas caminharam em sentidos
diferentes a partir de então. A Maxwell-Briscoe veio a fundir-se com a Columbia Car
Company, formando a United States Motor, porém a nova empresa entrou em concordata
em 1912. Durant ainda manteve conversação com representantes do J. P. Morgan,
entretanto a frieza das expectativas sobre as negociações podem ser deduzidas a partir
da carta enviada por Durant a seu advogado, relatada por Madsen (1999), em tradução
livre abaixo:
"Tive uma longa e acalorada sessão com nossos amigos em Nova York ontem e estava
bem próxima de um encerramento ao final. Se você pensa que é um assunto fácil
conseguir dinheiro de capitalistas de Nova York para financiar uma proposição de uma
40
indústria de carros no Michigan, pode pensar em outra idéia. Não obstante o fato de as
taxas de juros de empresas cotadas [em bolsa] serem bem baixas, o dinheiro é difícil de
conseguir devido a certo inexplicável sentimento de insegurança e a uma descrença
generalizada na proposta automotiva.”
A saída para os planos de Durant surgiu após uma visita a Detroit onde ele esteve
reunido com Samuel e Fred Smith, pai e filho, proprietários da Olds Motor Works. Após
despontar como pioneira na produção em larga escala, sob o comando de Ramson Olds e
com um veículo pequeno e barato, Olds e seus sócios capitalistas divergiram sobre qual
posicionamento a Oldsmobile deveria adotar. Em 1904, Ramson Olds deixou a empresa
para seguir com o projeto próprio na Reo Motor Works, e a Oldsmolbile passou a ser
conduzida pelos Smiths que enfim introduziram o novo modelo de quatro cilindros, quatro
vezes mais caro que o pequeno Curved Dash Runabout. Ironicamente, a partir de então a
Oldsmobile entrou em declínio e, depois de quatro anos lutando, seus proprietários
estavam dispostos a vendê-la para Durant.
Novamente com a oportunidade de consolidação, desta vez de forma
independente, William Durant procurou o mesmo Hebert Saterlee em busca de
orientações para estabelecer sua holding. O advogado aconselhou que a nova empresa
fosse aberta no estado de Nova Jersey, pois, ao contrário de Michigan, as firmas lá
abertas não enfrentavam quase nenhuma restrição sobre suas atividades. Assim sendo,
em 16 de setembro de 1908, foi fundada a General Motors Company (GM), com um
capital de U$ 2.000, tendo William Eaton, gerente de uma firma de investimentos, como
presidente e Durant como vice-presidente. Doze dias depois de fundada, a General
Motors iniciou suas atividades. Com a primeira injeção de capital, foi adquirida a Buick
Motor Company, logo depois a nova holding adquiriu a W. F. Stewart Company, fabricante
de carrocerias, pagando U$ 240.000 em ações da GM e que, em seguida, foi arrendada a
Buick. A General Motors partiu então para concluir a aquisição da Olds Motor Works. Na
negociação ficou acertado o pagamento de aproximadamente U$ 3 milhões em ações da
GM e mais U$ 17.279 em dinheiro. A General Motors poderia nomear a maioria dos
diretores no conselho da Olds e, em contrapartida, seus antigos proprietários teriam
direito a dois assentos no conselho da General Motors.
Para trazer a Oldsmobile novamente à lucratividade, Durant foi para a fábrica de
Lansing com um engenheiro e o gerente de produção. Levou também a carroceria de um
Buick Modelo 10, um veículo de passeio compacto, para quatro passageiros e sucesso de
vendas à época. Durant ordenou que serrassem a do veículo da Buick em quatro partes,
41
cortando ao meio a carcaça de pára-choque a pára-choque, e também de uma lateral a
outra. Assim, o protótipo da Oldsmobile foi montado mais largo e mais comprido do que o
Modelo 10. A Oldsmobile pasou a ter em sua linha de veículos grandes e caros um
modelo mais barato e atraente, porém maior do que o Modelo 10, a ponto de não interferir
nas vendas da Buick. As intervenções de Willian Durant na Oldsmobile pareceram surtir
efeito, a produção cresceu de 1.055 unidades em 1908, para 6.575 em 1909, primeiro ano
sob o guarda-chuva da General Motors.
Em janeiro de 1909, o conselho de diretores da General Motors autorizou a
aquisição de metade das ações da Oakland Motor Car Company. A Oakland havia sido
criada em 1907 por Edward M Murphy, um bem sucedido fabricante de carroças em
Pontiac, Michigan, que, ao ver a iminente substituição dos veículos de tração animal pelo
automóvel, resolveu lançar-se na nova indústria. Quando Willian Durant chegou para
comprar a empresa, a Oakland enfrentava dificuldades com a produção de um veículo de
quatro cilindros que em 1908 vendeu apenas 278 unidades. Com 50% das ações da
empresa adquirido com o pagamento em ações da GM, a Oakland entrou para a holding
de Durant. Pouco depois da aquisição, Edward Murphy faleceu, e Lee Dunlap, número
dois da Oakland desde a época em que fabricava carroças, assumiu como gerente geral
da empresa. Durant desenvolveu na Buick, Oakland e Oldsmobile uma maneira de
comandar as empresas sob a alçada da General Motors, que viria a replicar nas outras
unidades absorvidas pela holding. Normalmente, o fundador da GM mantinha boa parte
dos gestores e das práticas das empresas adquiridas, pouco ou nada exigia em termos de
índices de desempenho ou sistemas de gestão, entretanto centralizava todas as grandes
decisões em suas mãos. O depoimento de Dunlap, gerente da Oakland, sobre a
construção de uma nova fábrica em 1910 ilustra a relação de Durant com as empresas da
General Motors:
Quando o Sr. Durant visitava uma de suas plantas era como a visita de um ciclone. Ele
conduzia o staff para dentro, tirava seu casaco, começava a deliberar ordens, ditar cartas
e ligar para os confins do continente ao telefone; conversando a sua maneira rápida e
fácil com Nova York, Chicago, São Francisco. Este tipo de coisa era menos comum
antes do que é hoje, colocando a maioria de nós curvada a seus pés. Apenas a mais
fenomenal memória poderia cumprir com todos os acordos; ele trabalhava tão rápido que
o registro das coisas estava sempre correndo atrás.
Nesta visita que estou pensando, no início de 1910, eu esperava que ele ficasse vários
dias enquanto discutíamos todo o assunto da expansão da planta. Mas depois de
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poucas horas, Sr. Durant disse, “bem, partiremos para Flint.” Com desânimo eu o levei
para uma rápida inspeção pela planta. Instantaneamente ele concordou que teríamos
que construir e me pediu para ir a Flint e levar os planos de expansão no dia seguinte.
Não havia qualquer plano e nenhum podia ser desenhando em tão pouco tempo, mas
sua vontade sendo lei e nossa necessidade sendo enorme, alguma coisa tinha que ser
feita.
Então eu convoquei dois desenhistas para ajudar-me e naquela noite nós fizemos um
layout de fábrica como um brinquedo – prédios existentes em uma cor, prédios
desejados em outra. Desenhamos um mapa de toda propriedade, mostrando ruas e
linhas de trem, e daí colamos os prédios existentes nos seus exatos lugares. Sentindo
como um garotinho com um novo brinquedo, eu levei este layout para Flint e com certo
medo coloquei-o diante do chefe. Eu não precisava ser avisado do amadorismo de
nosso layout. Ele ficou satisfeitíssimo. Passamos um ótimo momento encaixando no
quadro os novos prédios que estavam espalhados sobre sua mesa. Colocamos esses
prédios primeiro aqui, depois ali, debatendo a situação. Quando concordamos em onde
deveriam ficar, ele disse, “colem as peças e chamem W. E. Woods”
O Sr. Woods chegou minutos depois e recebeu a ordem de iniciar a construção. Em toda
a história da América, até aquele momento, prédios nunca tinham sido levantados tão
agilmente quanto aqueles. Empreiteiro, Woods teve homens, materiais e máquinas se
movendo em direção a Pontiac dentro vinte e quatro horas e nós estávamos instalando o
maquinário em parte das estruturas em três semanas. Mas, obviamente, não
conseguíamos ser igualmente ágeis para pagá-los. Isto era outro assunto. Mas, naquela
época, nenhum de nós se preocupava demais com isso, pensávamos que o “pequeno
camarada” encontraria dinheiro em algum lugar. O que ele de fato fez no final, embora
saibamos que houve muitos problemas antes das contas serem recebidas.
Estes primeiros anos no negócio automotivo foram marcados pela tremenda atividade
pessoal e uma muito grave falta de capital. Qualquer um que fosse direto da fabricação
de carroças para fabricação de automóveis poderia ter pouca noção do enorme uso de
capital requerido no novo campo. (POUND. A, 1933, p 96-96)
As duas primeiras marcas adicionadas à General Motors além da Buick não foram
empresas que contribuíram imediatamente com o caixa. Ambas enfrentavam dificuldades
e, a despeito do valor dos ativos que traziam consigo, ainda levaram um tempo para se
estabelecer. Desta forma, a Buick continuava sendo o pilar de sustentação da Holding. A
primeira aquisição de uma empresa que crescia e apresentava bons resultados
financeiros foi a da Cadillac. Fundada em 1902 por Henry Leland, considerado um grande
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inventor e mestre da precisão, a Cadillac Automobile Company rapidamente conquistou
seu espaço com um veículo de alta qualidade. Em 1908, legitimou sua reputação ao
tornar-se a primeira empresa norte-americana a ganhar na Inglaterra o Dewar Trophy,
importante premiação internacional para contribuições ao automóvel, com seu sistema de
peças intercambiáveis. Durant iniciou as conversas com Wilfred Leland, irmão de Henry,
em 1907, contudo a negociação se desenrolou até julho de 1909, quando finalmente
Durant foi capaz de levantar os recursos suficientes para a transação. Concluída a
compra, paga novamente com ações da GM, ele convidou os Irmãos Leland para
continuarem à frente da empresa. H. Leland respondeu que ficaria somente se os
princípios e padrões que havia estabelecido permanecessem. Isso era exatamente a
forma como Durant pretendia.
A General Motors mantinha em seu líder o centro para a tomada das principais
decisões. William Durant passou os anos de 1909 e 1910 em uma frenética missão de
aquisição de empresas. Em dois anos, a GM adicionou à holding 25 empresas. Neste
período, ele reuniu 11 fabricantes de veículos (caminhões e carros), sendo, na maioria
das vezes, pequenas empresas adquiridas pelo corpo de engenharia que possuíam, por
suas patentes ou por algum novo dispositivo que nelas vinha sendo desenvolvido. Este foi
o caso da Cartercar, que tinha patentes que poderiam se tornar valiosas, enquanto as
tecnologias de transmissão seletiva e motor a fricção ainda disputavam a hegemonia.
Outras empresas eram fabricantes de partes e peças do automóvel, e duas eram
fabricantes de lâmpadas. As empresas de autopeças foram adquiridas primordialmente
para assegurar o fluxo de material para as plantas de automóveis e também de
caminhões. Foi o caso da Champion Ignition Company, que deu origem à AC Spark &
Plug, criada por Albert Champion, um ex-fabricante de bicicletas e piloto de automóveis,
que a convite de Durant mudou-se para Flint juntamente com sua empresa de velas
automotivas. Abaixo segue a relação de empresas que compunham a General Motors e a
cidade em que se localizavam:
Quadro 4-1 Empresas integrantes da General Motors Company, em 1910
Empresa
Localidade
Buick Motor Company
Flint, MI
W.F. Stewart Company plant number 4
Flint, MI
Olds Motor Works
Lansing, MI
Seager Engine Works
Lansing, MI
Oakland Motor Car Company
Pontiac, MI
Marquette Motor Company
Saginaw, MI
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Cadillac Automobile Company
Michigan Motor Casting Company
Randolph Truck Company
Champion Ignition Company
Reliance Motor Truck Company
Rainier Motor Company
Welch Motor Car Company
Welch Detroit Company
Jackson-Church-Wilcox Company
Michigan Auto Parts Company
Rapid Motor Vehicle company
Cartercar Company
Ewing Automobile
Elmore Manufacturing Company
Dow Rim Company
Northway Motor & Manufacturing Company
Bedford Motors Company
National Motor Cab Company
Novelty Incandescent Lamp Company
Heany Lamp Company
Brown-Lipe-Chapin Company
Oak Park Power Company
Detroit, MI
Flint, MI
Flint, MI
Flint, MI
Osowo MI
Saginaw, MI
Pontiac, MI
Detroit, MI
Jackson, MI
Detroit, MI
Pontiac, MI
Pontiac, MI
Geneva, OH
Clyde, OH
New York City
Detroit, MI
London, England
York ,PA
Syracuse, NY
Flint, MI
Outras empresas não foram adicionadas nesta época ao grupo que Willian Durant
construía por ele não encontrar recursos financeiros suficientes para levar adiante a
aquisição. Tentou novamente negociar com Henry Ford para colocar a marca mais
popular do mercado dentro de seu projeto de consolidação da indústria. As negociações
entre Durant e Ford avançaram ao ponto de acertarem em U$ 8 milhões o valor da
empresa. Até a forma de pagamento esteve estipulada: U$ 2 milhões em dinheiro e o
restante em ações da GM. O negócio emperrou quando Durant, após ter a aprovação do
conselho da General Motors, não encontrou bancos dispostos a financiar a operação.
Além disso, algumas empresas tiveram apenas parte de seu controle adquirido. A
Weston-Mott, fabricante de eixos, a qual, em 1905, Durant havia persuadido a mudar-se
para Flint, finalmente colocou um pé dentro da holding em 1910, quando 49% de suas
ações foram compradas. Outro caso foi a fundação da McLaughlin Motor Car Company
Ltd., no Canadá, em 1910. Sucessora da McLaughlin Carriage, empresa licenciada para a
produção de carroças da D&D, a McLaughlin Motor Car tinha 42% de suas ações
pertencentes à Buick e ficou responsável por representá-la no país vizinho.
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Ao seu estilo, William Durant se transformou em um dos ícones da indústria
automobilística. O criador da General Motors era admirado por muitos dentro e fora do
setor. As descrições sobre ele freqüentemente o caracterizam como um gênio, visionário,
uma pessoa capaz de vender qualquer produto ou qualquer idéia em que acreditasse.
Atribuíam a Durant a imagem de um homem de negócios generoso, íntegro e leal às suas
empresas. Por outro lado, pessoas próximas a ele relatam também um homem que
sobrecarregava seu tempo e centralizava o poder, deixava todos sempre à sua espera,
era excessivamente casual em suas decisões e menosprezava a aplicação de
ferramentas de contabilidade, orçamento e medidas de controle.
Em 1910, o império que Durant construía viveu os sinais de sua primeira grande
ameaça. A rápida expansão realizada pela General Motors consumiu os recursos
financeiros que a empresa e seu comandante possuíam. As empresas integrantes do
grupo exigiam capital para girar seus negócios, expandir plantas, desenvolver novos
modelos. Durant seguia sua caçada por aquisições e causou desconforto no conselho da
GM ao anunciar o início de negociações para comprar a Willys-Overland, em um
momento em que a escassez de recursos era evidente. Em maio de 1910, obras de uma
planta da Buick foram suspensas, demissões se tornaram crônicas em Flint e o
pagamento de salários enfrentava dificuldades. Em uma ocasião, o distribuidor Harry
Noyes enviou de Boston o dinheiro em espécie para o pagamento da folha. Noyes
também coletava o dinheiro da Buick para a despesa de pessoal e depositava em sua
conta particular para que não fosse gasto em outra despesa. Até mesmo a Cadillac, que
mantinha uma gestão mais conservadora e contribuiu, em um ano, com um lucro de U$ 2
milhões, foi salva por um empréstimo de emergência no valor de U$ 500 mil, horas antes
de pagar seus empregados. A falta de controle passou a ser notada por alguns agentes
do mercado financeiro, uma vez que não havia um sistema contábil central. Além disso,
alguns financistas se assustavam com as projeções de Durant de que a produção nos
Estados Unidos atingiria 300 mil veículos, quando em 1909 havia sido de 76 mil. Para
alguns banqueiros conservadores, a indústria do automóvel seria somente uma febre de
um brinquedo, mais sofisticado do que a bicicleta havia sido.
Em 19 de setembro de 1910, o conselho de administração da General Motors
admitiu não haver um registro confiável que atestasse qual era a dívida da empresa. Para
tentar reverter a situação da falta de crédito, Durant distribuiu folhetos para divulgação de
títulos de dívida da General Motors em Nova York, comparando a variação dos preços de
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seus papéis com os de outras empresas, como General Electric, US Steel e International
Harvester. Ele também fez apelos aos acionistas para não venderem suas ações,
anunciando que grandes coisas aconteceriam para alavancar seus preços. Mas em 25 de
setembro de 1910, Durant e os principais executivos da General Motors se reuniram com
uma comissão de Bancos Credores, em Nova York, para tratar da situação financeira em
que a empresa se encontrava.
A reunião começou com todos os representantes dos bancos, um a um,
discursando sobre a insustentabilidade da situação e da impossibilidade de ampliar o
crédito para a General Motors. Durant replicou que a empresa necessitava de U$ 15
milhões em empréstimos e passou para a apresentação das finanças da Buick. Apesar do
crescimento nas vendas da Buick, as projeções de ganhos não eram suficientes para
evitar o aumento no endividamento, fato que não soou bem para o grupo credor. Ao final,
os bancos pediram para que Wilfred Leland apresentasse a situação da Cadillac. Leland
conseguiu mudar a perspectiva do grupo que o assistia. Mostrando uma empresa
altamente rentável, com uma gestão mais conservadora, W. Leland e a Cadillac foram
capazes de fazer os banqueiros repensarem a insolvência da GM.
A reunião fez uma pausa até o próximo dia, porém, durante o intervalo uma
comitiva de cinco representantes dos bancos convidou W. Leland, e não Durant, para
uma conversa reservada. Na ocasião, os bancos revelaram a Leland que acreditavam na
possibilidade de salvar a General Motors. Após o primeiro ano de operação, a holding
havia faturado U$ 29 milhões, com um total disponível para dividendos de U$ 9 milhões.
No ano corrente, as receitas estavam por dobrar mesmo com o número de empregados
reduzindo de 14.250 para 10.000. A perspectiva de lucro fez com que o capital já
emprestado às empresas do grupo, mais os U$15 milhões solicitados por Durant,
parecessem uma aplicação financeira aceitável desde que algumas condições pudessem
ser controladas.
No dia seguinte, os bancos apresentaram seus termos, oferecendo um limite
autorizado de U$ 20 milhões para emissão de títulos a 6%, com um prazo de cinco anos.
Como parte do acordo, ações da General Motors seriam entregues aos bancos, dando ao
grupo credor total controle sobre a holding durante o período do empréstimo. Não vendo
outra alternativa para salvar sua empresa da concordata, William Durant engoliu seu
orgulho e aceitou as condições impostas pelos representantes dos bancos. O contrato de
empréstimo foi assinado em 11 de novembro de 1910, e dos U$ 20 milhões em títulos
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autorizados, a General Motors emitiu apenas U$ 15 milhões. Com isso, o caixa da
empresa recebeu os U$ 12,75 milhões que precisava para tirá-la daquela situação, uma
vez que os títulos foram tomados a 85% do valor.
4.1.3. A gestão dos bancos de 1910 a 1915
O novo conselho formado sob o controle do grupo de bancos credores tomou
posse em 15 de novembro de 1910, tendo James J. Storrow como presidente interino.
Neste dia, diversos membros do conselho de administração e diretores fortemente ligados
a Durant, dentre eles W. Leland (fundador da Cadillac), E. R. Campbell (genro), William
Eaton (presidente da GM), Harry Hamilton, C.R. Hatheway (tesoureiro) e R. S. McLaughlin
(presidente da GM do Canadá), se retiraram e deram lugar aos representantes de
instituições financeiras de Boston, Nova York e Detroit. Willian Durant permaneceu ainda
um grande acionista da empresa e, possivelmente em respeito à experiência que
acumulara no setor automobilístico, não só foi mantido no conselho como também foi
indicado presidente do comitê de finanças. Apesar de mantido, William Durant foi forçado
a se conformar com a drástica redução de um patamar onde possuía poder quase
absoluto para outro no qual se tornou apenas um entre vários que exerciam influência nas
decisões. Mesmo assim, James Storrow acatou a sugestão de Durant para nomear o
novo presidente da Buick e, ainda em 1910, Charles Nash assumiu a função. Nash era o
então presidente da fabricante de carroças D&D, onde havia começado como ferreiro e
era reconhecido por sua grande capacidade de organizar atividades gerenciais.
Com o controle passado para as mãos dos banqueiros, a mudança de direção nas
políticas da General Motors foi imediata. A prioridade deixou de ser o crescimento e a
reaplicação dos recursos e passou a ser o controle das atividades e a eliminação de
ineficiências. A nova orientação se justificava com a finalidade de assegurar à GM a
capacidade de pagamento aos credores. Dentre as primeiras medidas do novo corpo de
executivos, ainda em 1910, destacou-se a decisão de se desfazer das empresas que não
apresentavam perspectivas de lucros e vinham consumindo recursos da holding ao
investirem em desenvolvimento de novos produtos ou em produção.
Durante o período de 1910 a 1915 houve intensa reorganização dos ativos da
General Motors. Empresas com fraco desempenho foram vendidas, absorvidas, fundidas
ou simplesmente tiveram suas atividades encerradas e os ativos liquidados.
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Com a reestruturação, foram vendidas a National Motor Cab Company, a
Randolph Truck Company e a Welch Motor Car Company. O caso da Welch ilustra bem
um lado negativo da política de Durant, de se formar uma carteira de empresas,
colocando um grande número de apostas sob o mesmo interesse, como forma de
diversificar o risco. A Welch possuía um veículo de luxo, desenvolvido pelos irmãos
Welch, e que aos olhos de Durant possuíam grande potencial de se tornar um sucesso,
em 1909. Entretanto, três meses após a aquisição, Frederick Welch, a principal força
motora da empresa, morreu afogado em um lago. Não sendo capaz de encontrar alguém
que o substituísse, a empresa em pouco tempo deixou de ser uma promessa, para se
tornar um peso no caixa da GM.
Algumas empresas com fraco desempenho, apesar terem sido rapidamente
colocadas à venda, não encontraram compradores e após algum tempo tiveram suas
atividades encerradas. Esses foram os casos da Elmore Manufacturing Co., da Ewing
Automobile, Dow Rim Company e da Seager Engine Works.
Na General Motors, o foco passou a ser eliminar o que não era essencial a fim de
assegurar a sobrevivência. Logo no primeiro ano em que os bancos assumiram, o salário
de todos os executivos da GM foi reduzido em 50% do valor. Outro fato importante foi
interrupção do famoso Buick Modelo 10, o mais barato de todos os veículos da GM,
marcando a desistência do mercado de veículos compactos. Esta decisão contrariava as
idéias de popularização do automóvel de William Durant e abriu espaço para que Henry
Ford e o Modelo T dominassem este segmento mais facilmente. Sem o Buick, a Ford
passou da produção de 32 mil veículos em 1910 para cerca de 70 mil veículos em 1911,
enquanto que a Buick reduziu seu volume de 30 mil unidades para pouco mais de 13 mil.
A relação de Durant com a nova filosofia da administração da General Motors não
se sustentou por muito tempo. Para ele, havia sido difícil abrir mão do controle de sua
empresa e, com os bancos no comando, além de suportar contestação de tudo que havia
criado, era obrigado a assistir, quase passivamente, a GM perder oportunidades em um
mercado em vigorosa expansão. Willian Durant permaneceu como vice-presidente da
General Motors e presidente do comitê de finanças até 1911. Sua derradeira participação
nesta primeira passagem foi na liquidação dos ativos da Heany Lamp. Após o fracasso de
mais uma de suas apostas, renunciou às suas atividades gerenciais na GM,
permanecendo apenas como membro do conselho de administração. Em 11 de novembro
49
de 1911, Durant foi substituído por J. J. Storrow no comitê de finanças e ficou livre para se
dedicar a novos empreendimentos.
Não obstante o intenso trabalho de eliminação de ativos “fracos” conduzido pelos
controladores, diversas empresas reunidas por Durant mantiveram-se lucrativas,
aproveitando o bom momento da economia norte-americana. Buick, Oldsmobile, Oakland
e Cadillac haviam consolidado suas marcas no mercado. Outras empresas fornecedoras
também dispunham de boa performance econômica, como a A/C Spark & Plug, fabricante
de velas de ignição, a Jackson-Church-Wilcox, fornecedora de caixas de câmbio para a
Buick, a Weston-Mott, que fornecia eixos para parte da indústria, e a Brown-Lipe-Chapin
de Siracusa, Nova York, fornecedora de diferenciais de câmbio. As duas últimas tiveram o
restante de seus ativos comprados pela GM posteriormente.
A GM não se concentrou apenas na limpeza dos ativos, mas também buscou
reaproveitar alguns dos recursos, integrando algumas empresas. Com isso, a Michigan
Motor Company e a Stewart foram incorporadas aos ativos da Buick, da qual já eram
fornecedoras. A Michigan autoparts foi absorvida pela Northway, fabricante de motores e
transmissões para a Oakland e Oldsmobile. As fabricantes de Caminhões Reliance e
Rapid foram fundidas, dando origem a General Motors Truck. Foi fundada a General
Motors Canada, que absorveu a McLaughlin Motor Car Co. E, para as exportações, foi
criada a GM Exports, que centralizou estas atividades antes espalhadas pelas demais
empresas da holding.
A nova administração da GM ainda ampliou os investimentos em algumas das
antigas apostas de Durant, mas que não se concretizaram. A Rainier Motor Company
absorveu os ativos da Marquette Motor Company para fabricação de seu veículo de alto
preço em Saginaw, MI. Em 1911, a GM ainda insistiu na empresa, decidiu comprar o
restante das ações da Rainier e, em seguida, juntou a com a fabricante de peças, WelchDetroit, para formar a Peninsular Motor Company. Anos depois, a Peninsular não se
mostrou viável, suas atividades foram encerradas e os ativos absorvidos por outras
empresas da GM. Outra aposta que o conselho decidiu continuar foi a Cartercar. Em
1912, a GM comprou o restante das ações da empresa, mas com a queda na utilização
da friction drive, seu o maior trunfo, o Cartercar se arrastou até 1916 antes de ter suas
operações encerradas e sua planta vendida.
Durante esta reorganização dos ativos da General Motors, foram adotados
procedimentos mais sistemáticos para a tomada de decisão do que a comum
50
informalidade utilizada por Durant. Um exemplo destes novos métodos
ocorreu na
decisão sobre a remoção do maquinário da Welch-Detroit, de Detroit, para a planta da
Marquette, em Saginaw. Na ocasião, Albert Strauss defendeu o transporte dos
equipamentos pela água, ao descobrir que as duas plantas eram próximas aos portos
fluviais de suas cidades. No entanto, a decisão só foi tomada após a preparação de
relatórios estatísticos comparando as alternativas e demonstrando ser mais barato o
transporte via ferrovia, devido ao alto custo do transporte até o porto.
A orientação adotada pelo conselho da GM também resultou na disseminação de
novas práticas gerenciais nas unidades de negócio. Muitos novos gerentes assumiram as
posições nas empresas e as palavras de ordem eram cortar custos e adotar controles
contábeis. Apesar da grande dificuldade, sobretudo no início, com o tempo e um trabalho
persistente e atento a cada detalhe da operação, os processos de controle das unidades
puderam ser harmonizados, de forma que as empresas que compunham a GM passaram
a dispor de ferramentas e demonstrações contábeis padronizadas.
Ainda no espírito de disseminação da informação, a General Motors circulou pela
primeira vez a Insider, uma das primeiras publicações corporativas existentes. A Insider
passou a ser um importante canal de transmissão da mensagem da GM para seus
empregados, bem como promover certa integração entre diferentes áreas e unidades de
negócio.
Nesta nova fase da GM, muitas pessoas vieram de fora do setor automotivo para
compor os quadros gerenciais. Além de Charles Nash que veio assumir a Buick, dois
meses depois de assumir interinamente a presidência, James J Storrow foi substituído na
por Thomas Neal, então presidente de uma empresa de produtos químicos em Detroit.
Outro que se juntou à GM, para em seguida desenvolver uma carreira de destaque na
empresa e na indústria automobilística, foi Walter Chrysler. Com uma bem sucedida
trajetória como executivo na indústria ferroviária, Chrysler era apaixonado por carros e
aceitou o convite de J. Storrow. Ele deixou o emprego na ferrovia para trabalhar na Buick,
concordando com uma redução de 50% em seu salário.
Mesmo com algumas caras novas, muitos dos que já estavam na GM
permaneceram. George E. Daniels, que havia sido presidente na fundação da GM,
passou pela presidência da Cartercar e, em seguida, assumiu a presidência da Oakland,
no lugar de Lee Dunlap. Outro que permaneceu e teve um papel relevante, foi Henry
Leland. No comando das atividades de pesquisa e desenvolvimento da Cadillac, H.
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Leland persistiu na idéia de desenvolver um sistema de partida elétrica para automóveis.
Com a tecnologia desenvolvida por Charles Kettering, da Dayton Engineering Labs em
1912, a Cadillac lançou seu modelo com partida elétrica, que causou enorme impacto na
indústria, pois atraiu a população feminina para o mercado consumidor de automóveis,
antes afastada pelo rústico mecanismo de partida manual.
Ainda que o foco do grupo controlador da GM estivesse em cortar desperdício e
controlar custos, as atividades de pesquisa e desenvolvimento não foram abandonadas.
Pelo contrário. Contratados pelo presidente J. Storrow, em janeiro de 1911, a consultoria
Artur D. Little Inc. de Massachusetts, aconselhou a criação de um laboratório de pesquisa
e de um departamento técnico que centralizariam os esforços de todas as empresas
dentro da General Motors. O laboratório foi montado em um ano, composto de nove
técnicos e seus assistentes, e os primeiros problemas estudados foram pintura,
lubrificantes, teste de materiais para o departamento de compras e teste de novos
acessórios submetidos à GM. Outras inovações desta época incluem o farol com
acionamento interno, buzina elétrica, roda removível, radiador tipo celular, carroceria
fechada e o primeiro veículo V-8 norte-americano.
Com todos os esforços de redução de custos realizados pelo novo grupo
controlador da GM e um mercado consumidor pujante, rapidamente a empresa recuperou
sua capacidade de pagamento e, conseqüentemente, sua credibilidade nos mercados de
crédito. A presença de grandes agentes financeiros da época, tanto no conselho
administrativo, quanto no corpo executivo da empresa contribuíram para a General Motors
tornar-se a primeira empresa do setor automotivo a emitir ações em Wall Street em 1911.
O resgate do acesso ao crédito fez com que os executivos da GM descobrissem
outra vantagem associada à saúde financeira. O consumidor americano parecia
fortemente influenciado em suas decisões de compra, pela robustez financeira do
fabricante. Especula-se que este comportamento do consumidor estivesse relacionado a
expectativas de garantia de serviços de manutenção, melhor preço de revenda e outras
frustrações anteriores relacionadas à falência do fabricante. Um dado indica que dos
cerca de 300 fabricantes existente nos Estados Unidos em 1910, apenas 50 restavam no
início da Primeira Guerra Mundial em 1914.
Tabela 4-1 Receita e Lucro líquido da GM de 1909 a 1915 (em milhões de dólares)
Ano
Receita total
52
Lucro líquido
1909
1910
1911*
1912
1913
1914
1915
29,0
49,4
42,4
66,9
87,0
85,3
121,1
9,1
10,2
3,3
3,5
7,5
7,2
14,5
Fonte: dados estimados a partir de POUND (1934)
* O ano de 1911 teve o fechamento antecipado de outubro para julho.
Os esforços para conter a crise, iniciados em 1910, em pouco tempo mudaram
para esforços de crescimento. Ao final de 1911, houve um tímido aumento no número de
funcionários, fechando o ano em 11 mil empregados. O resultado das vendas em 1911
ainda foi de U$ 7 milhões, 15% menor do que no ano anterior, porém os prejuízos
puderam ser contidos, e a GM fechou o primeiro ano sob o controle dos bancos com um
lucro de U$ 3 milhões, quantia meramente suficiente para pagar os dividendos das ações
preferenciais. Nos anos seguintes a GM aumentou a produção, as vendas e o número de
funcionários, com exceção de 1914, quando uma depressão na economia produziu uma
estagnação nas vendas (ver tabela 4-1). No entanto, o crescimento da empresa não
acompanhou o ritmo que a indústria como um todo teve nesta época. Ao desistir do
mercado de veículos de baixo preço, a GM, que em 1910 respondia por 21% da produção
americana, em 1915, apesar do crescimento, obteve apenas 8,5% na participação da
produção norte- americana.
Henry Ford com o Modelo T e sua linha de montagem levou ao extremo os
conceitos da administração científica de Taylor e revolucionou os parâmetros de produção
em massa. Ford acreditava na idéia de um veículo de baixo custo que fosse acessível ao
trabalhador médio americano. Com essa idéia em mente, reduziu drasticamente o custo
de seu veículo, em uma busca incessante para otimizar processos de fabricação. Ford se
tornou uma figura emblemática na historia da indústria, e sua empresa, a grande
concorrente da General Motors. A popularização do automóvel era uma tendência
irreversível que escapou aos olhos do grupo que controlava a General Motors na época,
mas não escapou aos olhos de Durant. Embora não pudesse contar com o apoio da
estrutura da GM, Durant ainda encontrou na cidade de Flint, na D&D Carriage e nos
fornecedores de materiais fontes generosas de recursos, capazes de financiar parte de
seus novos negócios automotivos. Durant criou a Chevrolet Motor Company, empresa
que se transformou no caminho para a sua volta ao controle da GM e para o retorno a GM
ao segmento de veículos compactos.
53
4.1.4. O Surgimento da Chevrolet e o Retorno de Durant à GM
Antes mesmo de se desligar das atividades da GM, Durant adquiriu uma antiga
fábrica de motores da Buick, em Flint, e criou inicialmente a Mason Motor Company,
colocando Arthur Mason, autor do primeiro motor de alta compressão da Buick, e vários
outros ex-empregados vindos da Buick para trabalhar em um motor inovador. Logo em
seguida, Durant fundou, em 30 de outubro de 1911, a Little Motor Car Company e, na
mesma fábrica em Flint, começou a produzir o Little runabout, com motor e transmissão
da Mason. Além de Mason, vieram para a Little Motor Car, William H. Little, ex-presidente
da Buick, Charles Begole e William S. Bellenger. O primeiro carro possuía quatro cilindros
e seu preço foi colocado em U$ 650, para competir com o Ford. O veículo até tinha bom
design, mas a potência deixava a desejar. Mesmo assim, no primeiro ano foram vendidas
3.500 unidades.
Enquanto a Little tentava com seu carro, Louis Chevrolet, patrocinado por Durant,
vinha desde 1909 experimentando um modelo de seis cilindros. Dois anos depois,
finalmente desenvolveu o seu Modelo C já em ponto de ser produzido. Com isso, uma
planta foi alugada em Detroit e, em 3 de novembro de 1911, Durant fundou a Chevrolet
Motor Company de Michigan, abrindo lojas em Chicago, Filadélfia e Boston. O Chevrolet
Modelo C teve seu preço estabelecido em U$ 2.500, e as vendas em 1912 ficaram em
torno de 3.000 unidades.
Em 1913, conforme a data do vencimento dos títulos emitidos para os bancos se
aproximava, Durant iniciava seus planos para comprar a GM de volta. O primeiro passo
foi se liberar das atividades gerenciais para se dedicar à campanha de compra de ações.
A gestão de duas empresas, Chevrolet, em Detroit, e Little, em Flint, se mostrou inviável,
pois demandava grande esforço de coordenação. Portanto, em agosto do mesmo ano, a
sede da Chevrolet foi levada de Detroit para Flint e a Little foi incorporada a ela, tendo
A.B.C. Hardy como gerente geral da Chevrolet. Com a venda do terreno reservado para a
Chevrolet em Detroit, Durant comprou uma área em Nova York onde passou a fazer
também a montagem final de parte dos veículos. A fábrica de Nova York, apesar do custo
mais alto, uma vez que os componentes eram despachados de Flint para lá, também
servia como ferramenta de promoção da Chevrolet. As visitas de pessoas e,
principalmente, de financistas ajudavam Durant a conquistar o respeito por sua nova
empresa e assim financiar seu crescimento acentuado.
54
Em 1914, a empresa lançou dois novos modelos, um deles foi o Baby Grand
touring car, que passou a ser o maior carro da marca e era vendido a U$ 875, ou seja, U$
25 a mais do que o popular concorrente da época, o Ford Modelo T. O outro modelo foi o
Royal Mail roadster, um veículo para competir em preço, sendo vendido a U$ 750. A
demanda neste ano de 1914 foi alta e, assim sendo, tudo que pode ser produzido foi
vendido à vista, com alta margem, o que permitiu o acúmulo de recursos. Neste ano,
Durant chegou a anunciar a produção de 25 mil unidades, quando a capacidade da
fábrica era de apenas 5 mil.
Adotando a gravata borboleta como símbolo da marca, a Chevrolet passou a
expandir seus escritórios de vendas e fábricas para outros estados norte-americanos
utilizando-se de uma estratégia de parcerias com capital local para financiar as novas
unidades. Desta forma, Durant inaugurou escritórios na Califórnia, em Kansas City e em
Atlanta. Em uma parceria com Russell Gardner, passou a montar os modelos da
Chevrolet em Saint Louis e o mesmo ocorreu com os já conhecidos McLaughlin, pai e
filho, no Canadá. Além disso, com um empréstimo do Chatham and Phoenix Bank, de
Detroit, e do Marquette National Bank, de Nova York, ambos presididos por seu novo
aliado Louis Kauffman, William Durant comprou também a planta da Maxwell Motor
Company, em Tarrytown, NY, e, com isso, rapidamente alcançou uma produção com
distribuição nacional.
No primeiro dia de 1915, a Chevrolet lançou um novo modelo compacto para
competir com a Ford naquele ano. O Modelo T básico da Ford, que vinha sem pára-brisa,
medidores de velocidade ou de combustível e até sem portas, tinha o preço de U$ 490 na
porta da fábrica. A Chevrolet deu nome e preço ao seu novo modelo exatamente de “490”,
que vinha com a vantagem do sistema de partida elétrica da Cadillac. A resposta de Ford
foi imediata, abaixando o preço do Modelo T para U$ 440. Mesmo assim, o resultado nas
vendas para a Chevrolet nos primeiros seis meses foi considerado fantástico. Em junho
do mesmo ano, havia 46.611 pedidos colocados por distribuidores, já assegurados com
depósitos em dinheiro.
O rápido crescimento da Chevrolet culminou com uma posição financeira
extremamente positiva no relatório apresentado em julho de 1915, ano de vencimento dos
títulos que davam o controle da GM aos bancos. Com um lucro de quase U$ 15 milhões
no ano e com uma disponibilidade de caixa superior a esse valor, William Durant
continuou aplicando os recursos gerados pela Chevrolet na compra das ações da GM. Os
55
preços das ações da GM foram aumentando significativamente durante a implementação
do plano de Durant, e ainda assim ele continuava comprando, não importava o preço. De
uma alta de U$ 40 e uma baixa de U$ 25, em 1913, as ações da General Motors
passaram para uma alta de U$ 99 e uma baixa de U$ 37, em 1914, chegando à alta de
U$ 558 e à baixa de U$ 82, em 1915.
Com a proximidade da reunião dos acionistas da GM em setembro de 1915,
William Durant começou a reunir ações e aliados para consolidar sua posição de detentor
do controle da GM. Durant, que nunca havia vendido as ações que possuía desde a
fundação da GM, trouxe para seu lado familiares, velhos amigos e parceiros de negócio
que também detinham parte da empresa, além de contar, obviamente, com todas as
ações da GM na tesouraria da Chevrolet.
Neste processo, é destacável a relação de confiança entre Durant e seus
parceiros. Primeiramente, detentores das ações da GM atenderam às indicações de
Durant para não vendê-las. Mesmo vendo uma tremenda valorização no mercado,
confiaram em sua proposta de ganhos ainda maiores com a troca das ações da GM pelas
da Chevrolet na base de 1:5. Em segundo lugar, a entrega das ações da GM a Durant foi
feita sem qualquer outra garantia além de sua palavra. A Chevrolet Motor Company, de
Delaware, foi organizada especialmente para realizar a troca das ações da GM pelas suas
próprias. No entanto, esta só foi incorporada em 23 de setembro, ou seja, sete dias
depois da reunião do conselho da GM, quando Durant já possuía todas as ações em
mãos.
Na reunião de 16 de setembro para eleição do conselho de administração da
General Motors, Durant entrou na sala do Hotel Belmont, em Nova York, confiante e
acompanhado de outros acionistas da GM, como Louis Kauffman, Dallas Dort e
McLaughlin. Com o desenrolar da reunião, ele anunciou que naquele momento detinha o
controle da General Motors. O conselho da GM, à época, era composto em sua maioria
por representantes indicados por bancos credores e naturalmente se opôs à reivindicação
de Durant. O conflito foi amenizado, evitando uma disputa judicial, com a indicação de
Pierre Samuel du Pont para presidir uma comissão que se encarregaria de mediar e
encontrar uma solução para o impasse, além de nomear um novo conselho de
administração.
Pierre S. du Pont era membro da família Du Pont, proprietária da E. I. Du Pont de
Nemours, tradicional empresa fabricante de pólvora que, com o estouro da Primeira
56
Guerra Mundial na Europa, expandia sua produção para atender à demanda dos países
aliados. Pierre S. du Pont, aconselhado pelo tesoureiro da Du Pont, John J. Raskob,
adquiriu ações da GM e, ao que se sabe desavisado da iminente disputa pelo controle da
empresa, decidiu atender ao convite para participar da reunião dos acionistas. Pierre S.
du Pont, foi nomeado para presidir a comissão por ser considerado neutro e por possuir
notória experiência nos negócios. A comissão foi composta ainda por John Raskob e
Henry Berlin, primo e cunhado de du Pont.
Na mesma reunião do dia 16 de setembro, foi decidida a distribuição de dividendos
aos acionistas. Pela primeira vez, desde que os bancos haviam assumido o controle, a
GM pagou dividendos às ações ordinárias. A GM desembolsou $ 50 por ação, em um
montante que foi o maior da história de uma empresa de Wall Street até então. Como
detentora da maioria das ações, a Chevrolet foi a maior beneficiada, para o alívio de
credores e acionistas que viram suas contas novamente equilibradas com a injeção de
recursos, recuperando-se do grande esforço de caixa decorrente da campanha de compra
de ações de Durant. O novo conselho de administração, indicado pela comissão de Pierre
du Pont, foi eleito em 16 de novembro de 1915. Na composição de seus dez integrantes,
quatro assentos foram dados a Durant e seus aliados em nome da Chevrolet, três
integrantes, incluindo o presidente da GM, Charles Nash, vinham do lado dos bancos e
outros três eram do interesse de Pierre du Pont que também foi indicado para assumir a
presidência do conselho da empresa. Com a coalizão entre Willaim Durant e Pierre S. du
Pont, o estratagema que norteou a criação da Chevrolet se concretizava e Durant, com
sete dos dez conselheiros retomava o controle sobre a General Motors.
Apesar de a Chevrolet ter alcançado importantes resultados em uma velocidade
espantosa, seu tamanho em relação a General Motors, em 1915, ainda era pequeno e
tornou a realização dos planos de Durant um feito extraordinário. É possível que a
realização de Durant só tenha ocorrido devido a certa desatenção, desdém ou
desarticulação do grupo de bancos credores. Dos U$ 15 milhões em títulos que garantiam
o controle acionário, apenas U$ 2,3 milhões restavam ser pagos em meados de 1915, ou
seja, a participação nas ações da GM reduziu com o passar dos anos. Apesar do esforço
realizado por Durant para levantar recursos e comprar ações, o grupo de credores era
composto de alguns dos maiores investidores da época e, portanto, possuía uma
capacidade de financiamento amplamente superior a de seu oponente. O fato é que o
grupo de credores só se mobilizou quando se aproximou a data para a eleição do novo
57
conselho. No início de 1916, uma circular foi assinada por oito diretores posicionando-se
contrários a cessão do controle à Chevrolet, um desses diretores era Charles Nash. Após
a circular, um significativo número de acionistas assinou em favor da criação de um novo
grupo gestor. Dentre eles, sete casas de investimentos de Boston, Nova York e Detroit,
além de Charles Mott (fundador da Weston-Mott e prefeito de Flint). Mas Durant estava
em vantagem neste momento. Sua manobra propondo a troca de ações da Chevrolet
pelas da GM fez com que muitos de seus oponentes vendessem seus títulos.
Em março de 1916, a renúncia de James Storrow e de dois outros membros do
conselho marcou a desistência do grupo de bancos de retomar o controle da GM. Charles
Nash, então presidente, pediu demissão em 18 de abril e ficou no cargo até 27 junho,
quando William Durant foi eleito presidente da General Motors.
4.1.5. Primeira Guerra Mundial, retomada da expansão e o fim da
era Durant
A retomada do controle da General Motors teve grande repercussão na imprensa
norte-americana. William Durant foi aclamado por sua astúcia, agilidade, visão e
capacidade de realização. Sua luta foi comparada à de Davi contra Golias, e a vitória
afetou positivamente o valor da General Motors no mercado financeiro. Em uma semana,
o preço da ação saiu de U$ 340 para U$ 558. O ano de 1916 foi de forte crescimento para
a indústria, e a General Motors aproveitou para ampliar seu volume de vendas. A
produção totalizou 165 mil carros e 6 mil caminhões, com a participação de mercado
aumentando de 7% para 10%. Adicionalmente, a Chevrolet, que ainda não fazia parte da
Holding, produziu cerca de 70 mil unidades. Apesar do desempenho animador, a GM
ainda assistiu a Ford se distanciar na posição de maior da indústria. Com o Modelo T, a
Ford foi responsável por 50% dos veículos vendidos. Ao final de 1916, as empresas que
formavam a holding General Motors Company foram transformadas em uma única
empresa, a General Motors Corporation, com cada empresa do grupo tornando-se uma
divisão. A mudança de holding para uma empresa operacional não chegou alterar a
dinâmica interna das divisões, que continuaram sendo responsáveis por suas decisões
gerenciais.
O período de expansão da indústria nos Estados Unidos entre 1914 e 1919 esteve
fortemente ligado ao contexto mundial da época. Pouco antes de Durant retomar o poder
na GM, em 1914, teve início na Europa a Primeira Guerra Mundial. A escassez na oferta
58
mundial produziu aumento nos preços de muitos produtos e materiais, embora não tenha
chegado a impedir o suprimento de matéria-prima à indústria americana. A forte demanda
da Europa fez aumentar a produção nos Estados Unidos e contribuiu para o crescimento
da renda do trabalhador americano, impulsionando também as vendas de veículos. Com
a entrada dos Estados Unidos para o lado dos Aliados, em 1917, o governo passou a
estabelecer controles sobre o fluxo de materiais como forma de assegurar suprimentos ao
esforço de guerra. Mesmo assim, a demanda por automóveis seguiu expandindo,
puxados pelo crescimento econômico que as próprias compras do governo geravam.
A General Motors não aderiu imediatamente ao esforço de guerra e, quando o fez,
foi de forma tímida, tal como sua principal concorrente, a Ford. De acordo com Madsen
(1999), a adesão da GM à fabricação de produtos para o uso militar foi motivo de
controvérsias entre Durant e os Leland (Henry e Wilfred), no comando da Cadillac. Henry
Leland insistiu para que a GM contribuísse com os aliados fabricando aviões, enquanto
Durant resistia à idéia de desviar recursos para o esforço de guerra. Apesar das
animosidades, H. Leland persistiu e conseguiu um contrato com o governo para o
fornecimento de 10 mil motores liberty para aviões e iniciou sua produção em uma nova
fábrica em Nova York. A insistência dos Leland com os aviões levou-os a serem demitidos
por Durant. A relação entre Durant e Leland posteriormente ainda foi agravada, quando
uma comissão do Senado questionou atrasos nas entregas dos motores liberator. Os
depoimentos de Henry e Wilfred Leland tornaram públicas as opiniões de Durant,
contrárias ao envolvimento da GM com a guerra.
A hesitação de Durant e da GM se refletiu nos números finais sobre a participação
da empresa no suprimento aos militares durante a guerra. A General Motors declarou que
18 de suas 23 unidades operacionais estiveram envolvidas em contratos de produtos de
defesa, entretanto, a quantidade de motores e veículos vendidas ao governo foi
inexpressiva quando comparada aos volumes da empresa. No biênio 1917-1918, a GM
produziu, para fins militares, 5.000 ambulâncias, 2.350 carros oficiais, 1.157 motores para
tratores e, no caso dos motores liberty, fabricou 2.528, antes de ter o contrato de 10 mil
motores suspenso. A produção para fins civis, no mesmo período, foi superior a 500 mil
automóveis (incluindo a Chevrolet que operou separadamente em 1917). A GM ainda
deixou de participar de um grande contrato do exército americano para o fornecimento de
11.000 caminhões, aproximadamente metade do volume que havia sido produzido por
toda indústria antes da guerra.
59
Mesmo não aproveitando plenamente as oportunidades originadas pela Primeira
Guerra e ainda com a produção sofrendo restrições das agências do governo, a GM deu
continuidade em sua expansão por meio de aquisições. Nesta segunda fase de Durant à
frente da empresa, as aquisições de novos fabricantes de automóveis se tornaram raras.
Somente duas pequenas marcas foram adquiridas, a Scripps-both, em 1918, e a
Interstate Motor Company, em 1919, porém nenhuma efetivamente emplacou seus
modelos no mercado.
Importantes aquisições deste período seguiram o caminho da integração vertical
sobre a cadeia de fornecedores, tendência que também ocorria de forma intensa na
concorrente Ford. Com o apoio do banqueiro Louis G. Kaufman, William Durant
organizou, em 1916, a United Motors Corporation, com o objetivo de consolidar as
empresas fabricantes de autopeças e assegurar os estoques e o suprimento de
componentes, atendendo além das fábricas, a reposição de peças nas ramificações da
GM em todo o território americano. Foram adquiridas no mesmo ano a New Departure
Manufacturing Co (esferas metálicas), a Hyatt Roller Bearing (rolamentos), a Remy
Electric Company (ignição elétrica), a Dayton Engineering Laboratories Co – Delco
(sistemas elétricos e laboratório de pesquisa), e a Perlman Rim (rodas). Alfred P. Sloan,
então dono da Hyatt Roller Bearing, foi nomeado presidente da United Motors. Seu
conselho foi formado pelos antigos proprietários das companhias adquiridas que também
eram sócios na nova empresa, pois haviam recebido parte do pagamento em ações,
assim como Sloan.
Em sua biografia, Sloan (1963) relata que as decisões da United Motors eram
deixadas inteiramente a cargo dele. Não havia qualquer interferência de William Durant
sobre a gestão da nova empresa. Com isso, a United Motors adquiriu e integrou às suas
divisões a Harisson Radiator Corporation e a fabricante de buzinas Klaxon Company. As
peças produzidas por essas divisões da United Motors eram vendidas para a toda
indústria automobilística e não só para a GM. Este nível de autonomia seguiu até 1918,
quando a GM decidiu absorver toda a produção da United Motors. Para tornar a United
Motors uma divisão da GM, John Raskob, presidente do comitê de finanças, negociou a
troca de ações com os demais sócios da United Motors. Alfred Sloan foi mantido no
comando da United Motors dentro da GM, recebendo o cargo de vice-presidente da GM e
sendo nomeado membro do comitê executivo.
60
Pouco antes da incorporação da United Motors, ainda em 1918, a GM havia
passado também a Chevrolet para dentro de sua estrutura. A divisão Chevrolet se tornou
a quinta marca de automóveis relevante da empresa, juntamente com Buick, Cadillac,
Olds e Oakland. Na preparação para a absorção, a Chevrolet passou a comprar a
participação que investidores locais possuíam em algumas de suas subsidiárias, como as
fábricas de montagem de Oakland, Califórinia e Saint Louis, Missouri. Em 2 de maio,
realizando uma troca de ações extremamente vantajosa para os acionistas da Chevrolet,
a GM absorveu seus ativos, dentre eles outras empresas que haviam sido adquiridas por
Durant, como a Samson Tractors (tratores), a National Cycle Company, a National Truck
Motor Company e a Warner Gear Company (fabricantes de autopeças).
A idéia do término do armistício na Europa e a liberação da atividade industrial nos
Estados Unidos estimulou uma importante movimentação dentro da General Motors.
Segundo Chandler (1964), William Durant via no fim da Primeira Guerra o sinal de partida
para que a indústria desenvolvesse todo o potencial do mercado. Para financiar seu plano
de expansão Durant procurou um parceiro que contribuísse para a injeção do capital e
convidou du Pont para este papel. Na mesma época, a E.I Du Pont de Nemours, empresa
fabricante de pólvora e explosivos, via no provável fim da Primeira Guerra a necessidade
de aplicar, em outras atividades, os recursos que havia lucrado com o armistício. Em 10
de dezembro de 1918, após autorização dos conselhos de ambas as empresas, o capital
da General Motors foi ampliado, e a Du Pont adquiriu 23% das ações ordinárias. A
participação da Du Pont no capital da GM ainda veio a ser ampliada por duas vezes, em
1918 e 1919, alcançando 28,5%. Com maior participação da Du Pont, os dois principais
comitês da GM foram divididos entre os dois grandes acionistas. John Raskob, tesoureiro
de Pierre S. du Pont, presidia o comitê de finanças, no qual Durant tinha direito a um
assento. Willian Durant presidia o comitê executivo e du Pont também tinha direito a um
assento.
Se a General Motors aumentou suas operações e o seu capital, o número de
empregados também cresceu. A GM havia passado dos cerca de 10 mil empregados que
permaneceram na GM durante a crise de 1910 para 14 mil em 1914. Com o retorno de
Durant, a GM fechou o ano de 1916 com mais de 25 mil funcionários. Em 1918, quando o
número ultrapassou 49 mil pessoas, a GM implantou um programa de distribuição de
bônus como forma de incentivo aos empregados.
61
Relatos contam que a versão preliminar do programa de bônus da GM ocorreu em
1917, com 56.855 ações preferenciais que restaram da criação da GM Corporation e que
foram distribuídas em reconhecimento às pessoas que prestaram grandes contribuições à
empresa. A partir do ano seguinte, o programa de bônus passou a ser oferecido de forma
sistemática, de modo que 10% dos lucros compunham um fundo que era distribuído aos
funcionários em duas categorias: Sênior Awards para os que recebiam acima de U$
2.400; e Junior Awards para os outros os empregados da empresa. No primeiro ano,
3.884 bônus foram distribuídos.
A preocupação com remuneração e satisfação dos empregados na indústria
automobilística já havia sido manifestada por outra empresa antes desta ação da GM.
Henry Ford, em 1914, em um programa de divisão de lucros e com o intuito de dar melhor
qualidade de vida aos seus empregados, aumentou o salário de seus operários de U$ 2
para U$ 5 por dia e ainda reduziu a jornada para oito horas diárias. Segundo o
depoimento de John Lee, à época responsável pela criação do programa, dentre os
objetivos de tal medida estavam: prover melhores condições de vida e de saúde para que
os funcionários apresentassem melhor desempenho na linha de montagem e, também,
atrair os melhores operários para as frentes de trabalho da Ford.
No caso da Ford, para o plano tornar-se viável, pelo menos duas condições foram
cruciais, ambas derivadas da padronização e sistematização dos processos produtivos de
seu sistema de produção em massa. Uma condição foi a imensa vantagem em custo
obtida, que provia ampla margem de contribuição para ser distribuída aos stakeholders.
Além disso, a produção em massa também possibilitou a uniformização da mão-de-obra,
de modo que as diversas categorias de trabalhadores qualificados, semi-qualificados e
não qualificados praticamente se transformaram em uma grande classe semi-qualificada e
um pequeno corpo de supervisores. Comparativamente, o sistema produtivo da General
Motors era caracterizado pela divisão do processo de produção em áreas ou oficinas de
trabalho. Segundo Chandler (1964), neste tipo de sistema havia mestres ou encarregados
de produção, pessoas mais experientes e conhecedores da operação, que possuíam
parte significativa da responsabilidade de contratar, treinar e decidir sobre a remuneração
em determinado setor. O sistema utilizado pela GM era adotado de forma generalizada na
indústria e a diversidade de categorias de operários e de níveis de salários que esse
sistema produzia dificultava eventuais tentativas de se equiparar ao patamar salarial
adotado pela Ford.
62
Apesar da repercussão que as medidas da Ford produziram entre empresários e
na mídia, não se viu grandes conseqüências para as demais empresas, possivelmente
devido às implicações da Primeira Guerra Mundial. Alguma movimentação da GM no
mesmo sentido ocorreu somente em fevereiro de 1919. A GM encomendou um amplo
estudo sobre as condições sociais de seus empregados, com o intuito de orientar as
ações da empresa para prover melhores condições de vida aos operários nas diversas
cidades norte-americanas em que possuía operações produtivas. Como resultado deste
estudo, foi criado um programa habitacional de grande escala que iniciou a construção de
casas para os empregados em todas as cidades onde a GM estava presente. Além disso,
a GM criou dois fundos de aplicação para funcionários, um de investimentos nas próprias
ações da GM e outro de poupança com remunerações pré-fixadas - ambos os fundos
possuíam uma contrapartida da empresa para cada dólar aplicado pelo empregado.
Com o fim da Primeira Guerra Mundial, a economia americana viu seus recursos
serem liberados e o consumo no país avançar rapidamente. Em 1919, a General Motors
reagiu imediatamente ao fim das restrições à produção e colocou em prática um amplo
plano de expansão. Os projetos incluíam a ampliação da capacidade produtiva de todas
as unidades de negócio, em alguns casos dobrando a capacidade do ano anterior. A GM
também expandiu os prédios administrativos de suas divisões e iniciou a produção de um
grande edifício em Detroit, o Durant Building, que posteriormente passou a chamar-se
The General Motors Building e abrigaria as atividades administrativas das divisões da
empresa.
Os esforços de crescimento nas principais divisões da GM em 1919 foram
apresentadas no relatório anual da General Motors de abril de 1920 (CHANDLER, 1964) e
são resumidos a seguir:
Buick – Capacidade ampliada de 350 carros por dia para 500 carros por dia.
Construções em andamento em Flint e em Saint Louis aumentarão a capacidade
da Buick para 700 carros por dia.
Cadillac – A construção de uma nova fábrica iniciada no começo de 1919 está em
rápido progresso. Quando concluída, terá capacidade de 30 mil veículos por ano.
Chevrolet – Durante 1919, a capacidade das fábricas foi ampliada para um total de
800 carros por dia. Construções adicionais, quando completadas, permitirão a
fabricação de 900 carros e 50 caminhões por dia.
63
Oldsmobile – A capacidade da Olds Motor Works foi ampliada para 300 unidades
por dia, além de operar de forma mais independente, produzindo diversos
componentes que antes eram fornecidos por outras divisões.
Oakland – Quando completada as novas construções iniciadas em 1919, a
capacidade será ampliada para 350 carros por dia. Diversos outros departamentos
também darão maior autonomia assegurando o suprimento dos principais
componentes.
GM Trucks – Com o rearranjo da fábrica em Pontiac, a planta atual permitirá a
produção de vinte mil unidades por ano. O congestionamento da planta será
largamente aliviado com a construção de uma nova fábrica durante 1920.
Scripps Booth – Esta companhia foi recentemente removida para uma moderna
fábrica. A capacidade da nova planta permitirá a fabricação de 100 carros por dia.
Samson Tractor – A General Motors tem se dedicado ativamente a fabricação de
tratores e implementos agrícolas. Novas dependências, praticamente concluídas,
permitirão a fabricação de cem mil tratores por ano.
O impulso expansionista liderado por William Durant não se restringiu à expansão
das unidades fabris. Em março de 1919, com o auxílio de John Raskob, Durant criou a
General Motors Acceptance Corporation (GMAC) para ser o braço fornecedor de crédito
ao consumidor para toda a rede concessionária sob suas bandeiras. O crédito ao
consumo não era novidade em outras indústrias nos Estados Unidos. No caso do
automóvel, embora incipiente até o surgimento da GMAC, há indícios de vendas
financiadas esporadicamente por bancos a partir de 1910. Em 1915, John Willys,
presidente da Willys-Overland, criou a primeira instituição de crédito para automóveis, a
Guaranty Securities Company. Segundo o relatório anual de 1920 (CHANDLER, 1964), o
total negociado pela GMAC em seu primeiro ano foi de U$ 20 milhões. Nos anos
seguintes, rapidamente o crédito passaria a representar uma parte significativa das
vendas. Líder de mercado à época, a Ford não adotou um sistema de crédito ao consumo
até 1928 e, apenas em 1950, criou uma agência própria para este fim, a Ford Motor
Credit.
Durant ainda buscou investimentos não relacionados à indústria automobilística.
Em 1918, seguindo a indicação de investidores, William Durant foi visitar o engenheiro
Alfred Mellowes. Ele lutava para manter aberta a empresa que tentava comercializar sua
invenção, uma caixa de gelo elétrica. Com a informalidade que era característica dos
negócios que realizava, Durant comprou a Guardian Frigerator Corporation com um
64
cheque pessoal. Em março de 1919, ele batizou o novo produto de Frigidaire e incorporou
a empresa à General Motors, alocando-a na planta de autopeças da Northway, e
colocando A.B.C. Hardy para gerenciar a empresa, que possuía alguns clientes na cidade
de Detroit dispostos a pagar pelo serviço de manutenção do complicado e instável
eletrodoméstico.
Dentro da estratégia para 1919, em 25 de setembro, a GM adquiriu 60% controle
acionário da Fisher Body Corporation, importante fabricante de carrocerias, em uma ação
que teve como objetivo assegurar o suprimento para os carros com carrocerias fechadas.
No mesmo dia, a empresa ainda autorizou o investimento de U$ 500 mil na Goodyear Tire
& Rubber Company, que acabou sendo vendida tempos depois. O interesse pelo carro
fechado vinha crescendo desde 1917. Pontiac e Oldsmobile foram algumas das primeiras
a adotarem a tecnologia em seus modelos. Inicialmente, as divisões tiveram que enviar
compulsoriamente alguns modelos fechados nos carregamentos que saíam da planta
para os distribuidores. Porém, a perspectiva de poder utilizar o veículo inclusive no
período de inverno despertou rapidamente o interesse de muitos consumidores, e as
vendas cresceram de forma acelerada.
Com a onda de crescimento, uma preocupação que foi tema freqüente nas
reuniões do comitê de finanças foi a de como financiar tamanha expansão. Em uma
estimativa de gastos preparada por Raskob para a reunião do comitê de finanças, o
investimento de capital para o ano de 1919 seria de U$ 52,8 milhões, sendo que U$ 36,1
em caráter urgente, por se tratarem de obras com início imediato. Como solução, Raskob
sugeriu a ampliação do capital em 15%, equivalente a U$ 28,6 milhões, que juntamente
com o caixa resultante da operação saldariam os gastos do período. Para o ano de 1920,
com todas as divisões almejando expansão, a conta de Raskob para fechar as
necessidades de caixa requeria a emissão de U$ 64 milhões em novas ações para um
investimento total de U$ 100 milhões. Porém, a indisponibilidade de recursos no mercado
no começo do ano anunciava as dificuldades que a GM viria a enfrentar no fechamento do
período. Do total previsto, apenas U$ 21 milhões em ações encontraram compradores na
Inglaterra e no Canadá. O restante foi obtido em arranjos emergenciais que envolveram
subsidiárias da Du Pont e um sindicato encabeçado pelo J. P. Morgan.
Ao final de 1920, a economia americana viu uma forte depressão no consumo, e o
solavanco na indústria automobilística expôs a fragilidade causada pela falta de controles
na operação da General Motors. A crise econômica durou até meados de 1921, custou
65
caro para General Motors e principalmente a William Durant. A divisão de tratores
Samson, Scripps-Both e a Scheridan foram encerradas. A GM recorreu a um empréstimo
emergencial junto ao J. P. Morgan de U$ 83 milhões para cobrir a liquidação de ativos de
cerca U$ 90 milhões, com isso o balanço de 1921 registrou prejuízo de U$ 38 milhões.
Apesar dos prejuízos, a conseqüência que mais marcou esta crise foi o desligamento de
William Durant da gestão da GM, como condição de uma operação de resgate às suas
finanças pessoais, que ele vinha utilizando em imprudentes operações no mercado
financeiro para manter em alta as ações da GM.
Mesmo antes da crise de 1920, a ausência de controles e os riscos a que a
operação da GM estava exposta já haviam alarmado os representantes da Du Pont que
gradualmente vinham sendo incorporados à gestão de William Durant. Em 1919, o
consultor E. L. Bergland foi contratado pela Du Pont para fazer um diagnóstico da gestão
da General Motors. Um trecho deste relatório é apresentado a seguir:
O Sr. Durant aparentemente tem total comando de todo o planejamento e dita amplamente
as políticas a serem seguidas. Sua opinião é consultada para decisão em uma grande
quantidade de casos, de forma a não haver nenhuma outra instância para arbitrar sobre os
vários planos e novos desenvolvimentos... Quando novas plantas estão para serem
construídas, Durant freqüentemente supervisiona pessoalmente a confecção do contrato e
os detalhes de engenharia com as firmas contratadas, mas os detalhes de design
recebem pouca atenção e muito poucas informações detalhadas são conhecidas pelos
membros da organização... Não há qualquer sistema semelhante ao nosso sistema de
ordem de trabalho para fazer sugestões e não há organização central de engenharia. Há
também, certa falta de espírito de cooperação entre as diferentes plantas. Estas plantas
são praticamente independentes em relação a compras, contabilidade e outras
organizações. Como elas eram operações independentes antes de a GM ser formada e
vêm funcionando da mesma forma desde então, é fácil entender um espírito deste tipo, já
que não há organização central direcionando-as, exceto de maneira mais geral. (tradução
livre de MADSEN,1999 - p197-198)
Dentre as recomendações de Bergland a Du Pont estava o envio de especialistas
da Du Pont para levar técnicas de centralização de registros contábeis, unificação de
tarefas e procedimentos de supervisão. Um dos primeiros enviados para compor o staff
de William Durant foi John L. Pratt, um engenheiro experiente nos processos gerenciais
da Du Pont. Pratt passou rapidamente da condição de consultor para a de assistente
66
especial do presidente e iniciou na GM os primeiros trabalhos de análises estatísticas na
área de compras, como preços de alumínio, vidro e outros componentes.
A centralização das decisões mencionada no relatório de Bergland, em 1920,
havia se tornado um problema grave dentro da GM. Os casos de gerentes aguardando a
visita de Durant para ter minutos de sua atenção, como o caso relatado por Lee Dunlap
anteriormente, tornaram-se raros. Com o aumento da complexidade das atribuições de
Durant, executivos com John Raskob e Walter Chrysler viajavam para onde Durant
estivesse para poder se reunir com ele. Em certa ocasião, Chrysler foi de Flint para a
Califórnia para encontrar Durant e, depois de passar um dia todo na sala de espera,
desistiu e retornou sem ter sua reunião. Este e outros desencontros em seguida
motivaram Chrysler - então presidente da Buick e a quem Durant ofereceu um aumento
de salário de U$ 25 mil para U$ 500 mil por ano para que ele permanecesse na empresa
após a saída dos bancos em 1915 - a pedir demissão e a iniciar planos para uma nova
empresa.
A falta de controle e de procedimentos gerenciais criou um efeito bola de neve
nos gastos da GM nos anos que precederam a crise de 1920. Com divisões
independentes e uma orientação geral de Durant para expansão, projetos para
ampliações e construções de novas fábricas foram submetidos simultaneamente pelos
gerentes das divisões em 1918 e em 1919. Para solucionar a restrição de caixa, novas
ações eram emitidas ao invés de qualquer tipo de racionamento. Além dos programas de
expansão, não havia qualquer controle para formação de estoques. Os gerentes das
divisões faziam a programação da produção e as compras de matérias-primas no início
do outono para que a produção e os estoques formados no inverno abastecessem a
temporada de vendas na primavera e verão do ano seguinte. Com os estoques
aumentados para viabilizar o crescimento, agravava-se ainda mais a necessidade de
capital para a GM.
Dois comitês especiais, dentro do comitê executivo, foram criados em 1919 para
tentar conter o aumento nos gastos. Em dezembro de 1919, Alfred Sloan foi indicado para
presidir um comitê que estabeleceria regras de aquisição (incluindo projetos de
expansão). Outro comitê foi criado em maio de 1920 para estabelecer regras para a
alocação de estoques. Como resultado, um teto de U$ 150 milhões foi determinado para
toda a corporação. Porém, com as divisões controlando o próprio caixa e os pedidos de
compra, os estoques chegaram a U$ 209 milhões em outubro. O comitê de finanças ainda
67
nomeou outro comitê para tentar solucionar o problema dos altos estoques em outubro,
mas era tarde demais. A crise teve inicio em setembro de 1920. Com a queda nas
vendas, a Ford, líder de mercado com o barato Modelo T, reduziu seus preços entre 20%
e 30%. Durant e a GM tentaram resistir à redução de preços, mas os gerentes das
divisões tiveram dificuldades para cumprir suas folhas de pagamento, e já em outubro
todas as fábricas, exceto Buick e Cadillac, tiveram as atividades suspensas.
Enquanto a recessão econômica impunha dificuldades às divisões da GM e
provocava estragos na indústria em Detroit, com a demissão de 150 mil operários, em
Nova York, centro financeiro dos Estados Unidos, William Durant enfrentou graves
problemas também decorrentes da ausência de controles, só que neste caso, em suas
contas pessoais. As tentativas sem sucesso de emissão de ações em 1919 e 1920
indicavam que mesmo para uma empresa como a GM, que produzia retornos de 30%
sobre o investimento e que fazia questão de manter constantes os altos dividendos, a
escassez de capitais afetaria o preço de suas ações. Não está claro se a intenção de
Durant foi de evitar ataques especulativos contra as ações da GM e assim proteger seus
investidores ou se ele próprio ensaiou uma arbitragem para lucrar com ações
artificialmente desvalorizadas. O fato é que ele empreendeu uma grande operação de
compra de ações da GM nos meses que precederam a crise. Durant mobilizou uma vasta
rede de brokers e agentes financeiros fazendo empréstimos para compra de ações e
colocando as suas próprias como garantia. Quando a recessão se instaurou, logo em
seguida veio uma quebra na bolsa de valores, e a sua posição junto a diversos
operadores deu origem a rumores sobre sua solvência.
Os rumores chegaram aos ouvidos de Pierre du Pont e John Raskob em
novembro de 1920. Ao apertarem Durant sobre o assunto, descobriram que ele temia
sobre a própria capacidade de saldar os compromissos feitos e reconhecia não ter
condições de afirmar qual era a real posição de suas ações e empréstimos junto aos
brokers. Em uma operação arquitetada em conjunto com o J.P. Morgan, du Pont e
Raskob levantaram U$ 60 milhões para criar uma nova empresa, que assumiu todas as
dívidas e ações de Durant. As ações da nova empresa foram distribuídas em 40% para
Durant, 40% para a Du Pont e 20% para um grupo de bancos organizados pelo
J.P.Morgan. Como resultado da operação, Durant se viu salvo da situação que construíra
para si, porém teve seu patrimônio drasticamente reduzido, além de ser forçado a
renunciar seu posto de presidente, o que ocorreu em 30 de novembro de 1920. Para a Du
68
Pont, o risco de ver um contágio no controle e na reputação da GM foi evitado. Restou o
desafio de encontrar um novo presidente para a General Motors e, simultaneamente,
retirá-la da situação de crise em que se encontrava.
4.1.6. A gestão de Pierre S. du Pont
Após a renúncia de William Durant, Pierre S. du Pont, então presidente do
conselho de administração (chairman), emergiu como a alternativa mais óbvia para
assumir a presidência da General Motors. Apesar de não ter experiência significativa no
setor automotivo, du Pont era um executivo experiente, que havia se aposentado da
presidência da E. I. Du Pont de Nemours e dispunha de excelente reputação como
executivo sério e bem-sucedido, especialmente junto aos agentes financeiro que estavam
apreensivos após a saída de Durant. As dúvidas sobre a capacidade de a GM se reerguer
sem Durant também pairavam sobre as mentes dos prefeitos das cidades onde havia
fábricas das divisões. Dentre suas primeiras atividades, du Pont teve de cumprir uma
agenda de viagens e encontros com governadores, prefeitos e credores reafirmando a
confiança no futuro da GM e da indústria automobilística.
Para obter controle sobre a organização, du Pont reduziu a composição do CE
para quatro integrantes. A ele se juntaram John Raskob, então presidente do CF; J.A.
Haskell, executivo indicado pela Du Pont que ocupava assento no CE desde 1919 e
passou a ser o vice-presidente de operações; e Alfred Sloan, o único com carreira na
indústria, tornando-se vice-presidente encarregado do que passaria a ser o staff
consultivo. Sloan já vinha elaborando um detalhando estudo da organização, desde sua
indicação para presidir o comitê de apropriação em 1919. O “Organization Study”, como
foi chamado, havia sido apresentado a Durant e a du Pont, embora não tivesse
despertado grande interesse. Entretanto, sob a liderança de Pierre du Pont, uma nova
estrutura para a organização, amplamente baseada na proposta do estudo de Sloan, foi
submetida para consideração do CE e aprovada depois de pouco mais de um mês de sua
gestão, em 3 de janeiro de 1921.
A nova estrutura manteve os comitês de finanças e executivo respondendo ao
conselho de administração, bem como a autonomia administrativa das divisões que
deveriam prestar contas ao CE. Duas organizações de staff foram criadas para auxiliar os
comitês, o staff financeiro e o staff consultivo, com a incumbência de realizar estudos e
análises, um em finanças e o outro em operações, como forma de prover informações e
69
propostas de medidas a serem deliberadas pelos respectivos comitês. Para chefiar o staff
financeiro, Donaldson Brown foi trazido da Du Pont. Brown ocupava a função de
tesoureiro e havia sido responsável por criar avançados mecanismos de controle
financeiro que permitiam avaliar o retorno sobre o capital investido nas divisões da Du
Pont. Juntamente com Brown, os controllers, que já haviam sido trazidos para as divisões
pela Du Pont, em 1919, teriam a incumbência de desenvolver um sistema de controle
financeiro sobre as operações.
A movimentação em direção ao controle das finanças das divisões causou a saída,
logo no início de 1921, dos gerentes gerais que haviam sido nomeados por Durant. Na
Oakland e Cadillac, Fred Warner e Richard Collins foram demitidos após fazerem
retiradas de suas participações nos lucros antes da realização das auditorias. Na
Oldsmobile, Edward Ver Linden foi demitido por fazer o mesmo, embora neste caso seu
contrato não previsse este tipo de remuneração variável. A.B.C Hardy, fiel escudeiro de
Durant em seus empreendimentos, foi removido da gerência da Chevrolet, mas ainda foi
mantido no staff consultivo. Apenas no caso da Buick, Harry Bassett foi mantido, após a
insistência de Sloan com Pierre du Pont, que temia os riscos de efetuar tal mudança na
maior e mais lucrativa das divisões.
O passo seguinte foi reavaliar a linha de produtos, até então deixada a cargo das
divisões, que decidiam quais carros fabricar e como posicionar seus produtos, geralmente
causando grande canibalização entre as divisões. O CE deliberou a criação de um comitê
especial do staff consultivo, auxiliado por consultores externos, a fim de avaliar imagem,
qualidade e competitividade dos veículos sob as bandeiras da GM e propor uma nova
política de produtos corporativa. A recomendação do CE era de que a GM deveria entrar
no mercado de veículos de baixo preço, para competir com a Ford com seu Modelo T.
A conclusão dos consultores foi devastadora: apenas duas das sete marcas, Buick
e Cadillac, eram percebidas pelos consumidores com alguma distinção de qualidade,
enquanto as demais eram vistas como carros desatualizados e pobres em qualidade.
Além disso, diversos modelos oferecidos pela GM competiam de forma ilógica em uma
estreita faixa de preços, entre U$ 1000 e U$ 2000, enquanto o Chevrolet 490 competia só
no mercado de inferior a U$ 1000, como mostra a o quadro X abaixo. O modelo da
Chevrolet custava o dobro do concorrente Ford e detinha 4% de participação de mercado,
contra os 60% do Modelo T.
70
Quadro 4-2 Faixas de preços dos modelos oferecidos pelas divisões da General
Motors em 1921 (em U$)
Faixa de
Marca
Modelo
preços
Chevrolet
Oakland
Oldsmobile
Scipps-Booth
Sheridan
Buick
Cadillac
490 - quatro cilindros
FB - quatro cilindros
seis cilindros
quatro cilindros (FB)
seis cilindros
oito cilindros
seis cilindros
quatro cilindros (FB)
seis cilindros
oito cilindros
795
1320
1395
1445
1450
2100
1545
1685
1795
3790
-
1375
2075
2065
2145
2145
3300
2295
- 3295
- 5690
Fonte: tabela adaptada a partir de Sloan (1963) p. 59
A proposta da nova política de produtos definiu segmentos em função de faixas de
preços, conforme o quadro 4-2 acima, onde a General Motors deveria posicionar seis
modelos básicos de forma a competir no topo de cada faixa. Construídos com tal
qualidade, os veículos atrairiam compradores de concorrentes com preços inferiores, que
apreciassem melhores benefícios com um pequeno aumento no preço. Por outro lado, os
carros no topo de uma faixa poderiam conquistar consumidores da faixa superior que
buscassem um produto com preço menor. Foi recomendado ainda que Scripps-Booth e
Sheridan fossem descontinuadas, já que seria necessário reduzir a diversidade da oferta,
dado que estas divisões não dispunham de instalações para fabricar seus próprios
motores. A orientação de estabelecer uma pirâmide de marcas (RUBENSTEIN, 2001),
sem competição entre divisões, não chegou a ser seguida exatamente à risca, porém os
princípios definidos por este comitê deram origem a uma estratégia de produtos da GM
que perdurou por décadas e ficou famosa por seu slogan “Um carro para todo bolso e
propósito” 4.
Quadro 4-3 Segmentação por preços recomendadas pelo comitê especial (em U$)
Segmento
(a)
(b)
(c)
(d)
(e)
4
Faixa de preço
450
600
900
1200
1700
- 600
- 900
- 1200
- 1700
- 2500
Tradução livre do original em inglês: “A car for every purse and purpose”
71
(f)
2500 - 3500
Fonte: tabela adaptada a partir de Sloan (1963) p. 67
Mesmo antes de iniciar os estudos para uma política de produtos, o CE da General
Motors iniciou as atividades para o desenvolvimento de um novo veículo, que contaria
com um motor refrigerado a ar (air cooled engine) e permitiria significativa redução de
peso e de custo. Os experimentos com motor a ar vinham sendo conduzidos por Charles
F. Kettering, dos laboratórios da Delco, em Daytona, desde 1918. Kettering já dispunha de
considerável reputação como inventor quando Durant adquiriu sua empresa de sistemas
elétricos, em 1916, e em uma apresentação para o CF, em 1919, ele impressionou os
executivos da GM com seus projetos. No ano seguinte, Durant criou a General Motors
Research Labs (GMRL), com o intuito de fomentar as pesquisas de Kettering e seus
engenheiros.
No dia seguinte ao que du Pont assumiu como presidente, em dezembro de 1920,
Kettering enviou-lhe um relatório afirmando que o motor a ar poderia ficar pronto para ser
oferecido ao mercado ainda em 1921, caso os desenvolvimentos apropriados fossem
completados. Uma comissão de executivos foi até Daytona para avaliar os
desenvolvimentos no motor a ar. Após a visita, o CE decidiu que o carro em
desenvolvimento deveria passar por testes rigorosos e que seria lançado pela Chevrolet
par substituir o modelo 490. Em poucas semanas, o projeto do motor a ar aumentaria em
abrangência. O CE decidiu ampliar também para a Oakland a utilização de um motor de
seis cilindros, que seria desenvolvido juntamente com o de quatro cilindros, para a
Chevrolet. A empolgação do CE e de du Pont com o motor a ar levaria a GM a persistir
por 2 anos e meio, contra as resistências e desencontros que emergiram ao longo do
desenvolvimento, até a desistência, em 1923. O fracasso no lançamento do motor a ar,
posteriormente batizado de “copper cooled”, marcou o que talvez tenha sido o primeiro
grande fiasco de lançamento da GM.
O desenvolvimento do motor a ar evoluiu de forma conturbada dentro da GM. O
presidente du Pont decidiu que o veículo seria lançado pela Chevrolet, enquanto que o
seu desenvolvimento seria conduzido pela equipe de Kettering e não pelos engenheiros
da divisão, o que provocou imediata resistência por parte de K. Zimmerschied, gerente
geral
da
Chevrolet.
Sentindo
que
a
indisposição
da
divisão
atravancava
o
desenvolvimento naquele ano, o CE deliberou que o veículo fosse lançado em 1922, com
prioridade para o modelo de seis cilindros da Oakland. Porém, ao final de 1921, quando o
72
GM Research Labs enviou os primeiros protótipos para testes na Oakland, os resultados
foram desanimadores. O carro possuía graves problemas de durabilidade, e o projeto teve
de retroceder algumas etapas em seu desenvolvimento.
Diante da decepção inicial com o desempenho do motor a ar, as ações na GM se
dividiram em duas direções. Discretamente, Sloan, que passara a vice-presidente
corporativo de operações, recomendou que engenheiros da Chevrolet começassem a
trabalhar em melhorias na linha de produtos existente, para o caso de nova decepção
com o motor a ar. De outro lado, Pierre du Pont decidiu relançar o programa do motor a
ar, em fevereiro de 1922, posteriormente batizando-o de “copper-cooled”5. O novo
programa concentrava-se no desenvolvimento do modelo da Chevrolet, cujo lançamento
foi agendado para junho de 1923. William Knudsen, que renunciara a um alto posto na
gestão da fábrica da Ford, foi contratado como vice-presidente de operações da
Chevrolet. O gerente geral da divisão, K. Zimmerschied, foi transferido para o staff
consultivo, e Pierre S. du Pont passou a acumular as presidências do conselho de
administração da General Motors e a gerência geral da Chevrolet.
O novo motor copper-cooled foi apresentado em veículos protótipos da Chevrolet
no salão do automóvel de Nova York, em janeiro de 1923. O otimismo com a boa
repercussão no evento contagiou os planos de fabricação do novo produto. A data para o
início da produção foi agendada para fevereiro, começando em 1000 unidades por mês e
com a capacidade aumentando gradualmente até outubro, quando chegaria ao pico de 50
mil unidades por mês. O copper-cooled dividiria a linha da Chevrolet com o tradicional
modelo refrigerado a água com a capacidade de 30 mil unidades por mês.
Apesar de em fevereiro encontrar problemas na produção, os modelos coppercooled da Chevrolet começaram a ser oferecidos no mercado nos meses de março e
abril, porém duas situações determinaram um novo fracasso no projeto tão defendido por
du Pont e Kettering. Logo os primeiros carros que saíram das fábricas da Chevrolet
apresentaram novamente problemas de qualidade e desempenho que e os relatórios
sobre os defeitos no campo confirmaram a necessidade de melhor desenvolvimento.
Paralelamente, a indústria que em 1922 apenas havia recuperado os níveis de vendas
anteriores à crise, em 1923 viu a demanda explodir, praticamente dobrando o volume do
ano anterior e esgotando todos os modelos Chevrolet com motores a água. Tal situação
5
O nome fazia referência às placas de cobre (em inglês copper) usadas para refrigeração através de um
sistema de ventilação, em substituição a sistema tradicional de refrigeração usando água armazenada em um
radiador
73
exigiu que a GM tomasse uma decisão sobre como alocar a capacidade de suas plantas
para aquele ano.
Talvez motivado pelo fracasso de seu principal projeto, Pierre S. du Pont
renunciou à presidência em maio de 1923, permanecendo como presidente do conselho
de administração e indicando Alfred Sloan para sua sucessão. A decisão sobre continuar
com o copper-cooled finalmente foi deixada para a próxima gestão.
A despeito do fiasco com as tentativas do motor a ar, a gestão de du Pont
produziu grandes avanços nos controles financeiros e administrativos. O staff financeiro
iniciado sob a regência de Donaldson Brown foi responsável pela sistematização de uma
série de ferramentas que aumentaram significativamente a eficiência das divisões. Além
das pessoas recrutadas na Du Pont, a GM iniciou uma prática que perdurou por muitos
anos ao recorrer às universidades americanas na seleção de jovens considerados de alto
potencial para preencher seu staff de finanças. O primeiro deles talvez tenha sido Albert
Bradley, um Ph. D. em economia da universidade de Michigan, que iniciou como
assistente de controller e, depois de escalar gradualmente as posições na organização de
finanças, finalmente ocupou a presidência do conselho de administração da GM, em
1956.
O alto nível de estoques, que havia sido um dos complicadores da crise em 1920,
foi um dos primeiros problemas a serem combatidos pelo novo staff. O empréstimo de
cerca de U$ 80 milhões junto a bancos ligados ao J. P. Morgan havia ajudado a resolver
as emergências de caixa. Além disso, o novo comitê de estoques, liderado por J. Pratt,
determinou a suspensão de toda e qualquer compra pelas divisões. Por um período de
sete meses, o plano de compras mensal de cada divisão devia ser previamente aprovado
pelo comitê de estoques antes de efetuarem-se os pedidos junto aos fornecedores. Este
sistema emergencial contribuiu para que o nível de estoques caísse do pico de U$ 215
milhões para U$ 94 milhões em junho de 1922, e o giro do estoque aumentou de duas
para quatro vezes por ano. No entanto, em 1921 um novo sistema fez retornar o controle
sobre as atividades de compras para as divisões. A proposta de Donaldson Brown,
aprovada no CF, estabeleceu que a divisão elaborasse um plano de produção
quadrimestral, atualizado mensalmente, que seria revisado e aprovado pelo vicepresidente de operações. A partir deste plano a tesouraria estabelecia um calendário de
liberação gradual dos recursos para as compras.
74
Concomitante ao sistema de gestão de compras, um novo controle de caixa foi
criado pelo staff de finanças, que extinguiu a antiga gestão de caixa das divisões. Até
1921, as divisões mantinham total autonomia sobre seu caixa. Todas as receitas
entravam em uma conta própria, da qual também efetuava pagamentos de suas
despesas, como salários, contas de fornecedores e acertos com outras divisões. O acerto
com a sede da General Motors era feito apenas quando balancetes das divisões eram
concluídos, geralmente no prazo de um a dois meses. Com a centralização do caixa, a
GM abriu contas de depósitos em uma centena de agências bancárias pelo país, onde
poderia receber todos os pagamentos em nome de suas divisões. A liberação dos
recursos para saldar as despesas nas divisões passou então a ser controlada através de
limites mínimos e máximos em suas contas e a partir de cronogramas de liberação de
valores previstos em seus planos de produção. Além disso, foi possível estabelecer um
sistema de compensação das transações entre divisões, que eliminava um complexo
fluxo de transações. Assim sendo, a GM passou a trabalhar com projeções de seu fluxo
de caixa, de forma a poder aplicar saldos de caixa em fundos de curto prazo que
remuneravam recursos financeiros não utilizados.
Nos dois anos e meio da gestão de Pierre S. du Pont, a organização das finanças
foi sensivelmente alterada. O sistema de formação de estoques e de controle de caixa foi
viabilizado pela adoção de métodos de previsão e acompanhamento de vendas e
produção. Até 1921, apenas uma previsão de vendas e lucros era preparada pela
tesouraria para o CF, que não incluía sequer o detalhamento por divisões. Para viabilizar
o controle, Sloan passou a solicitar que os gerentes das divisões encaminhassem a
programação da produção para o mês seguinte e uma expectativa de vendas para os três
meses subseqüentes. Gradualmente Sloan foi criando novos relatórios a serem enviados
pelas divisões, de modo a aumentar a sofisticação de seu sistema. Em 1922, os gerentes
das divisões já informavam, além de estimativas de produção, faturamento e lucro para o
ano e para o quadrimestre, bem como os números realizados em cada mês.
Quando, em abril de 1922, o manual para aprovações de apropriações e despesas
de capital foi aprovado pelo CE e pelo CF, a GM tornou-se capaz de projetar e controlar
despesas e receitas para o ano de tudo que envolvia capital de giro e investimentos de
expansão. O desenvolvimento de regras para apropriações e despesas de capital havia
começado no comitê especial criado pelo CE, em 1919, com Alfred D. Sloan como
presidente. O manual desenvolvido sob a liderança de Sloan determinou que projetos que
75
envolvessem despesas de capital seriam aprovados e controlados por um comitê de
apropriação, que envolveria CE e CF. O método de avaliação definiu princípios de retorno
sobre o investimento, mediação de interesses entre divisões, relevância relativa a outros
projetos da corporação, além de critérios técnicos de forma e apresentação. Os projetos
aprovados passariam então a ter gastos examinados mensalmente de forma semelhante
àquela do controle dos gastos com capital de giro.
4.1.7. Sloan no comando, rumo ao topo
No dia 10 de maio de 1923, Alfred D. Sloan foi eleito pelo conselho de
administração como presidente da General Motors. Desde o início de seu mandato, Sloan
demonstrou seu reconhecimento em favor da busca por soluções gerenciais por meio de
comitês. Ainda em 1922, então vice-presidente de operações, Sloan havia estabelecido
dois comitês, de compras e de propaganda, e, além disso, persuadiu o conselho a
adicionar ao CE Charles Mott e Fred Fisher, homens experientes de operações. Com a
questão do copper-cooled deixada por du Pont para ser resolvida pelo seu sucessor,
Sloan, em sua primeira reunião como presidente do CE, apontou um comitê de três
engenheiros para avaliar o status do motor a ar, que também estava sendo desenvolvido
em seis cilindros para equipar um Oldsmobile.
O relatório apresentado ao CE dez dias depois apontou no motor a ar problemas
como má pré-ignição e perda de potência em altas temperaturas. Recomendava-se que
os desenvolvimentos para sua fabricação fossem suspensos. Na Chevrolet, 759 modelos
haviam sido produzidos, dos quais 239 foram descartados ainda na fábrica. Os demais
veículos comercializados foram recolhidos dois meses depois. No dia 26 de junho de
1923, o projeto do motor a ar, para frustração de Charles Kettering, foi oficialmente
descontinuado das atividades da General Motors.
Segundo o próprio Sloan (1963), os comitês de compras e de propaganda, criados
em 1922, forneceram contribuições apenas razoáveis para a organização durante suas
curtas existências, no entanto, foram os precursores de sua idéia de gestão por políticas e
deram grandes contribuições sobre a prática de coordenação entre as divisões. Em 1923,
determinou a criação do Comitê Técnico Geral (CTG). Ao CTG foi designada a
incumbência de integrar as atividades de engenharia das divisões e o GM Research Labs,
além de coordenar a formulação de políticas naquilo que dissesse respeito ao conjunto
das divisões. O CTG rapidamente desenvolveu uma dinâmica de reuniões sobre assuntos
76
técnicos importantes – como, por exemplo, estabelecimento de procedimentos de testes
para o campo de provas, inaugurado em 1924, workshops e troca de informações sobre
melhores práticas de engenharia em assuntos como freios, pneus, consumo de
combustível, lubrificantes e compressão de itens do motor – e criou também outras ações,
como programa de treinamento para vendedores sobre atributos técnicos dos veículos.
Os resultados da coordenação promovida na área de engenharia animaram Alfred
Sloan, que, em 1924, determinou a criação de outro comitê “interdivisões”, o Comitê Geral
de Vendas (CGV), o qual teve como primeiro presidente Donaldson Brown, vicepresidente de finanças. Ainda em 1924, Sloan procurou replicar a dinâmica de comitês em
outras instâncias e persuadiu o conselho a ampliar o CE para dez integrantes, sendo sete
com ampla experiência em operações e três com formação em finanças, dentre eles John
Raskob e Pierre du Pont. Em seguida, Sloan decidiu ativar o Comitê de Operações (CO)
criado por du Pont, mas nunca utilizado. O CO era composto dos gerentes gerais das
divisões e tinha a incumbência de avaliar o desempenho da General Motors e verificar a
necessidade de novas políticas, embora não as formulassem, nem as aprovassem.
Desta forma, a General Motors de Sloan em 1925 possuía a seguinte dinâmica: as
divisões tinham autonomia para operar dentro das políticas corporativas; CE aprovava
políticas, sob a supervisão da CF, sobretudo quando envolvesse gastos acima de certo
limite; os grupos de políticas, como o CTG e o CGV, funcionavam com staffs consultivos
para formulação de políticas para a CE, enquanto o staff financeiro fazia o equivalente
para a CF; e, finalmente, o CO funcionava como um fórum para verificação por parte das
divisões da adequação de suas práticas às políticas e vice-versa.
Enquanto as gestões de du Pont e de Sloan davam os passos iniciais para a
criação de uma organização central na GM após a crise de 1920, o mercado de
automóveis nos Estados Unidos não demorou a retomar uma trajetória de crescimento.
Assim, o desempenho da General Motors em termos de vendas e de lucro se recuperou
na mesma velocidade. Em 1922, os patamares de venda da GM e da indústria anteriores
à crise foram novamente alcançados, e em 1923 o recorde de 4 milhões de unidades da
indústria permitiu que a GM vendesse pouco mais de 750 mil carros naquele ano. Com
isso, sua receita aproximou-se de U$ 700 milhões, enquanto o lucro foi de U$ 72 milhões.
No começo de 1924, porém, a indústria deu sinais de desaceleração. O sistema de
informações desenvolvido pela GM para realizar as estimativas de vendas evitava a
formação de estoques de produtos acabados nas divisões, mas não alcançava com
77
eficiência os estoques na rede de distribuição. Ainda assim, em março, Sloan começou a
receber os relatórios dos concessionários, informando, com três meses de atraso e sem
muita precisão, níveis crescentes de estoques nas lojas, o que o levou a negociar com os
gerentes de divisões reduções em seus planos de produção. Dois meses após rever os
planos de produção, Alfred Sloan e Donaldson Brown decidiram percorrer alguns
distribuidores para checar pessoalmente a situação que enfrentavam. A constatação foi
pior do que se imaginava: o nível de estoques na rede havia aumentado mesmo com a
redução na produção. Com isso, Sloan emitiu ordens para que todas as divisões
reduzissem imediatamente seus programas, diminuindo a produção total em 30 mil
unidades por mês.
Ao final do ano, devido aos controles financeiros, o impacto da desaceleração
reduziu a receita da GM em 18%, mas ainda manteve seus lucros na casa dos U$ 50
milhões. Contudo, o susto provocado pelos métodos rudimentares de estimativa de
vendas fez com que o CGV, de Donaldson Brown, empreendesse a tarefa de desenvolver
um sistema corporativo de previsão de demanda. O sistema foi desenvolvido ao longo de
1924 e 1925 e se dividia em duas frentes. Uma delas tratava do dimensionamento da
demanda total da indústria. Para tanto, uma série de análises estatística, a partir da
pirâmide de demanda identificada anteriormente, procuraram encontrar correlações entre
a venda de automóvel e outros setores da atividade econômica. A outra frente buscou
desenvolver um sistema de relatórios ao longo da organização de vendas e da rede de
distribuição, reduzindo para dez dias o prazo de atualização das informações de vendas e
de situação dos estoques. Essa estimativa corporativa da demanda passou a indicar uma
referência para os planos de produção de cada divisão, e um sistema decenal de revisão
do real versus o projetado permitia uma reação mais rápida a alterações para mais ou
para menos.
O componente final do sistema de controles gerenciais, implementados na década
de 1920, alinhou as diversas atividades de controle espalhadas ao longo da operação da
GM em torno do princípio fundamental de retorno sobre o investimento. Donaldoson
Brown, ex-tesoureiro da Du Pont e que lá implantou um sistema semelhante, apresentou,
em 1925, o conceito que chamou de “standard-volume”. O conceito do standard-volume
se expressava em um método para avaliar o desempenho de longo prazo da organização,
cujo objetivo era obter não a mais alta taxa de retorno possível, mas a mais alta taxa de
retorno de forma consistente ao longo do tempo.
78
A partir da abordagem estabelecida pelo standard-volume, as atividades como
planejamento de produção, projetos de expansão e lançamentos de novos modelos das
divisões puderam ser avaliadas em termos de retorno sobre o investimento e poderiam
ser devidamente encaixadas no conjunto das divisões, formando uma visão geral da
mesma análise para a corporação. Decisões de preços de venda de veículos ou de
compra de matéria-prima, diante de uma situação de variação nas condições de oferta e
demanda ou de pressões de competidores, passaram a ser avaliadas em função de seu
impacto no retorno sobre o capital investido. Esta análise levava em conta a evolução de
preços, custos, volumes e lucros dentro da curva de sazonalidade anual e também
considerava as tendências de evolução da indústria e da economia nos anos seguintes.
Com seu sistema de controle gerencial estabelecido, e superada a retração da
indústria de 1924, a General Motors de Sloan concentrou-se, durante os anos seguintes,
no seu desafio contra a líder de mercado Ford. A política de posicionamento de produtos
da GM no topo de cada segmento, buscando maior percepção de qualidade, era oposta à
estratégia de um único modelo básico - posicionado-o com o menor preço e maior escala
- adotada pela Ford. Entre os anos de 1925 e 1927, quando a GM finalmente superou sua
adversária, outras práticas contribuíram para que a GM alcançasse o topo.
Em 1925, a Chevrolet reverteu a queda nas vendas que havia amargado com o
copper-cooled e o reformado “490”, rebatizado como Superior, lançando um novo modelo.
Sob o comando de William Knudsen, gerente geral, e Ormond E. Hunt, chefe de
engenharia, a Chevrolet lançou o Modelo K, aumentado em tamanho e espaço interno,
incorporando uma série de pequenas inovações em acessórios e com a nova pintura
Duco. A pintura Duco foi desenvolvida em parceria entre o GM Research Labs e a Du
Pont e resolveu uma das mais demoradas e custosas etapas de produção para que os
modelos pudessem ser oferecidos em cores diferentes6. Com isso, o novo modelo pôde
cumprir o objetivo de ocupar o topo da faixa mais baixa de preço e conquistar
consumidores de outros modelos. No ano, as vendas da Chevrolet aumentaram em 64%,
contra um crescimento de 18% da indústria. A participação de mercado foi de 8% para
11%, enquanto a da Ford caiu de 54% para 45%, com o volume permanecendo estável.
A Chevrolet foi a principal divisão a contribuir para que a GM alcançasse o topo da
indústria: suas vendas foram de 293 mil unidades em 1924 para 940 mil em 1927, ano em
6
No caso da Ford os modelos eram oferecidos apenas na cor preta, pois esta era a única cor que não exigia o
uso de verniz e possuía secagem mais rápida, permitindo reduzir o tempo de fabricação do veículo.
79
que tornou-se a marca mais vendida nos Estados Unidos. Diversos fatores contribuíram
para que a GM conquistasse tal posição. Segundo Sloan (1963), nos anos 1920 houve
uma transição na indústria automobilística, passando do mercado de massa, que originou
a produção em massa da Ford, para outro de massa em classes7. Para ele, a raiz de tal
transformação pode ser resumida, sem perdas significativas, a quatro elementos que
moldaram a indústria nos anos seguintes – o crédito ao consumo, a carroceria fechada, o
ano/modelo e o mercado de usados. A General Motors participou de forma ativa no
desenvolvimento destes elementos e tornou-se a maior empresa de sua indústria. Suas
práticas se estabeleceriam como referência para os concorrentes nas próximas décadas.
A General Motors não foi a primeira empresa automobilística a oferecer crédito ao
consumo, porém a GMAC, criada em 1919, desenvolveu um papel de liderança nesta
atividade na indústria. As políticas básicas da GMAC foram finalmente formuladas em
1925. Nos anos anteriores, a GM patrocinou estudos de crédito ao consumo, feitos pelo
professor E. Seligman, que se tornaram referência para outros bancos em gestão de risco
de crédito ao consumidor. Como resultado, A. L. Deane, vice-presidente da GMAC,
estabeleceu um sistema de provisão para perdas que limitava boa parte dos riscos do
distribuidor, em caso de não pagamento e impossibilidade de execução da garantia. Além
disso, a GM criou dentro da GMAC a General Exchange Insurance Corporation (GEIC),
que passou a oferecer aos compradores seguro contra danos físicos aos veículos. As
vendas financiadas na indústria, em 1925, foram em torno de 65% do total, e a venda de
seguros, em 1926, acompanhou 40% dos financiamentos vendidos pela GMAC.
A carroceria fechada também se tornou hegemônica nas vendas de automóveis
durante os anos 1920, conforme mostra o gráfico 4-1 abaixo, pois a substituição da
carroceria aberta pela fechada permitiu que o veículo fosse usado em diversas condições
de clima, sobretudo em regiões com inverno mais rigoroso. A GM havia adquirido 60% do
controle da Fisher Body em 1919, quando a carroceria fechada representava apenas 10%
das vendas da indústria, assegurando a prioridade no fornecimento de carrocerias na
tecnologia em que a Fisher era a principal referência da indústria. A fusão completa da
Fisher Body, tornando-se uma divisão da GM, ocorreu em 1926, em um episódio que
ganhou notoriedade devido às circunstâncias que tornaram desvantajoso o contrato de
garantia de compra para a GM e os altos valores negociados na compra do restante das
ações (COASE,R. 2000, 2006; KLIEN, B. 2000, 2007).
7
Tradução livre dos termos “mass market” e “mass-class market” em Sloan (1963, p 150)
80
Gráfico 4-1 Evolução da participação da carroceria fechada nas vendas da indústria
de 1919 a 1927 (em porcentagem)
Adaptado de Sloan (1963, p 152)
Após a trajetória de crescimento acelerado desde 1900, interrompido apenas por
alguns poucos e esparsos anos de recessão econômica, as vendas de veículos
mantiveram-se em um patamar em torno de quatro milhões de unidades por ano entre
1923 e 1928, exceção feita aos anos de 1924 e 1927, quando a recessão e a expectativa
sobre o novo modelo da Ford (1927) seguraram as vendas8. Com a estabilização dos
volumes, os comuns excessos de demanda em anos de crescimento deixaram de ocorrer,
e o número de fabricantes de veículos nos Estados Unidos reduziu de 108 em 1920 para
44 em 1929.
A nova política de produtos da GM, embora não perfeitamente
implementada, evitou parte da competição entre divisões. Em 1926, as cinco divisões da
GM estavam posicionadas ao longo de faixas de preços, acima da Ford, e de maneira
razoavelmente separada, como mostra o gráfico 4-1 a seguir.
O sucesso do Modelo K da Chevrolet evidenciou a cristalização da mudança no
gosto do consumidor americano, o qual passou a valorizar o apelo de atributos de design
e novos acessórios que eram incorporados nos modelos. Segundo Sloan (1963), o
conceito de ano/modelo, que previa a mudança anual em toda a linha de veículos, não foi
estabelecido formalmente até o início dos anos 1930, mas, na prática, a General Motors
realizava mudanças anuais desde 1923 e, mesmo antes disso, ainda em 1908, novos
modelos eram apresentados todos os anos nos salões e feiras espalhados pelo país.
8
Gráfico da evolução das vendas de veículos na indústria norte-americana de 1900 a 2008 em anexo.
81
Figura 4-1 Posicionamento de preço dos veículos de Ford e GM em 1926
2000
Cadillac Standard Line (6 variações)
Cadillac Custom Built
Cadillac 138 WB (6 variações)
1000
0
2000
Buick Standard (6 variações)
Buick Master (3 variações)
Buick 128 WB (6 variações)
1000
0
Peso do veículo em em Kg
2000
Oldsmobile “30” (6 variações)
1000
0
2000
Pontiac 110 WB (2 variações)
Oakland “6” (6 variações)
1000
0
2000
Chevrolet Modelo K (5 variações)
1000
0
2000
Ford Modelo T (14 variações)
1000
0
Preço em U$
Adaptado de compilação da publicação Motor Age de janeiro de 1926, encontrado em Chandler
(1964)
A prática do ano/modelo, juntamente com a pirâmide de marcas, contribuiu para
encontrar a saída de um problema enfrentado pela indústria. Em uma estimativa
apresentada por Chandler (1964), o número de famílias com carros em 1926 girava em
torno de 19 milhões, cerca de 77% do total de famílias. Dos veículos em circulação, cerca
de 12 milhões eram Ford Modelo T. A estimativa de restar apenas 4,4 milhões de famílias
ainda não motorizadas, ou seja, o equivalente ao volume de vendas de um ano para a
indústria, indicava a gravidade do problema de Henry Ford em manter sua estratégia de
produção em massa. A alternativa para manter as escalas de produção na indústria
seguiu na direção das práticas da GM, que estimulava o consumidor a trocar seu veículo,
82
fosse para ter acesso a inovações, fosse para subir na escala de preços e demonstrar
alguma melhoria de status social.
Para acelerar ainda mais o declínio do Ford Modelo T, o grande número de
veículos nas mãos dos americanos fez emergir um robusto mercado de veículos usados.
Com novos modelos sendo oferecidos, consumidores que desejavam trocar de carros
vendiam seus usados para realizar uma nova compra. Com o tempo, as lojas
concessionárias e agências de crédito, dentre elas as da GM, passaram a aceitar o
veículo usado como parte do pagamento de um novo e, em seguida, financiar a venda
daquele usado para um novo consumidor. Assim sendo, carros usados com melhores
atributos e mesmo a alternativa de um modelo igual, porém mais barato por ser usado,
passaram a competir diretamente com os veículos Ford que saíam da fábrica sem
inovações.
Em maio de 1927, após consecutivas quedas nas vendas, Henry Ford decidiu
fechar sua planta de River Rouge e a manteve sem produção por quase um ano,
enquanto transformava a linha para fabricar um novo carro, o Modelo A. Desta forma, o
caminho ficou livre para a Chevrolet assumir a ponta da indústria e, também, abriu espaço
para desafiantes, como o Plymouth de Walter Chrysler.
Segundo Sloan (1963), estas mudanças na indústria e na General Motors não
foram pensadas de forma conjunta e antecipada. As decisões eram avaliadas em cada
situação, como forma de resolver o problema daquele momento. O movimento como um
todo e a dinâmica entre seus elementos só foram razoavelmente esclarecidos olhando
para trás depois que tudo já havia ocorrido. Neste ambiente de intensa alteração na
prática de fabricar e vender automóveis, diversas atividades foram ocasionalmente
incorporadas à GM, de forma que suas evoluções fizeram emergir um sofisticado sistema
de coordenação da atividade de pesquisa e de desenvolvimento de novos produtos.
O sucesso do Modelo K desenvolvido pela Chevrolet em 1925 despertou a idéia
de replicar as inovações para outros segmentos. Olhando para a pirâmide de demanda e
para a linha de produtos das divisões da GM, duas lacunas entre os produtos
despontavam. A mais óbvia delas era entre o topo de linha da Buick (U$ 1995) e o mais
barato da Cadillac (U$ 2995). Mas, em termos de volume, o espaço entre o mais caro
Chevrolet (U$ 775) e o mais barato Oldmobile (U$ 875) representava um potencial
significativo. Sendo assim, o chassi e as carrocerias da Chevrolet foram adaptados para
receber um motor de seis cilindros. Conforme o tema do posicionamento do novo veículo
83
foi debatido no CTG, a Oakland se manifestou interessada em receber o modelo de seis
cilindros. No entanto, temendo a limitação na capacidade de engenharia da Okaland,
Sloan decidiu que o desenvolvimento e o teste fossem concluídos pela experiente
engenharia da Chevrolet e, somente depois, o veículo seria designado para produção à
Oakland. Esta ocasião significou um importante aprendizado na coordenação de
desenvolvimento de engenharia entre divisões. O novo modelo foi chamado de Pontiac e
posicionado a U$ 825. Grande sucesso de vendas, esse veículo posteriormente definiu
uma nova posição para a divisão, que anos depois descontinuou o Oakland e mudou de
nome para Pontiac.
A outra lacuna na linha de produtos da General Motors era entre Cadillac e Buick.
Sloan propôs que a Cadillac adicionasse um novo veículo na faixa de U$ 2000. O gerente
geral da Cadillac, Lawrence P. Fisher, havia visitado algumas concessionárias na
Califórnia e descobriu um designer que, associado ao dono de uma loja, preparava carros
sob medida para estrelas de Hollywood. Fisher convidou o designer Harley J. Earl a ir a
Detroit trabalhar no desenvolvimento de seu novo carro. O resultado foi o La Salle,
lançado em 1927 e sucesso de vendas. O La Salle marcou a história da indústria, pois foi
o primeiro carro desenvolvido com participação de um designer de estilo a ser fabricado
em escala industrial. O êxito da inclusão do design no desenvolvimento de novos
produtos rapidamente despertou o interesse da Buick e, posteriormente, da Chevrolet.
Harley Earl foi contratado pela GM para iniciar o que se tornaria gradualmente o staff de
estilo.
Em 1928, quando a Ford lançou o Modelo A, a General Motors vendeu mais de
1,7milhão de veículos, sendo a Chevrolet responsável por mais de 65% desse volume. O
sucesso das práticas nas áreas de engenharia e de organização de vendas na Chevrolet,
e os desenvolvimentos de estilo na Cadillac fizeram com que Sloan iniciasse uma
tentativa de replicar boas práticas para o restante da organização. O. E. Hunt, chefe de
engenharia, e Richard Grant, responsável pela área de vendas, foram promovidos a vicepresidentes das áreas de engenharia e vendas, respectivamente. O staff de operações
era restrito, nesta época, às atividades de pesquisa avançada no GM Research Labs, às
atividades de testes do campo de provas e à recém-criada sessão de estilo de Harley
Earl.
Com Hunt à frente do CTG, o comitê passou a coordenar grupos de estudos de
projetos de produtos especiais. Estes grupos eram executados por equipes de força-
84
tarefa formadas por membros das divisões, tendo eventuais despesas custeadas pela
corporação. O primeiro grupo a ser formado por Hunt, em 1929, foi incumbido de adaptar
um Chevrolet para ser produzido pela subsidiária Vauxhaull, adquirida na Inglaterra em
1925. O mesmo grupo desenvolveu também um carro para a subsidiária Opel, adquirida
na Alemanha, em 1929. Gradualmente foram formados grupos de estudos de partes dos
veículos, como suspensão, transmissão e motor. Assim, as atividades dos grupos, apesar
de freqüentemente serem executadas nas divisões, foram sendo transferidas para uma
emergente organização de pesquisa e desenvolvimento em quatro áreas vitais:
desenvolvimento de transmissões; desenvolvimento de estruturas; desenvolvimento de
suspensão; e design e novos tipos de carros.
Ao final de 1928, a General Motors tinha motivos para comemorar seu
desempenho na década. De um início em crise, com prejuízo, queda nas vendas e na
participação de mercado, a General Motors passou a ser líder em vendas e em lucros.
Seus modelos faziam sucesso no mercado, com a participação saindo de menos de 20%
para mais de 40%. Todo esse desempenho encheu o orgulho e o bolso dos gerentes.
Em 1923, John Raskob havia criado, além do plano de bônus para os
empregados, a Managers Securities Company (MSC), uma empresa com o objetivo de
aumentar o vínculo de propriedade de alguns gerentes com a General Motors. O sistema
foi estruturado da seguinte maneira: a MSC comprou um lote de ações da General Motors
a um preço pré-estabelecido e pagou emitindo títulos de dívida pré-fixados, com prazo de
oito anos, e comprados pela própria GM. Paralelamente, a MSC emitiu ações que foram
oferecidas a um seleto grupo de 80 gerentes. Ao optar por comprar sua cota, um gerente
pagaria uma entrada em dinheiro e o saldo no prazo de oito anos, podendo usar futuros
bônus e dividendos da GM para isso. Os 80 gerentes eram indicados por seus superiores
e aprovados por um subcomitê do conselho de administração. Durante o prazo do
programa, o gerente passaria por avaliações anuais, e a GM poderia recomprar as ações
dos gerentes caso este pedisse demissão ou tivesse um baixo desempenho. Ao final de
oito anos, os gerentes poderiam resgatar suas cotas compradas no começo do programa,
recebendo-as na forma de ações da GM em seu preço corrente.
Ainda em 1928, o conselho de administração assistiu à saída de seu presidente
Pierre du Pont e de John Raskob. Raskob decidiu participar da campanha presidencial do
partido democrático e foi pressionado por Sloan e outros membros do conselho a optar
entre a GM e a política. Pierre du Pont tentou defender a continuidade de seu ex-
85
tesoureiro, mas diante da irredutibilidade de Sloan e dos demais membros do conselho,
decidiu acompanhar a renúncia de John Raskob. No lugar de Pierre du Pont assumiu
outro membro da família, Lammont Du Pont, e a presidência do CF passou para
Donaldson Brown. Uma das primeiras medidas tomadas pelo conselho de administração
sob o comando de Lammont Du Pont foi antecipar o resgate da MSC para 1929, a fim de
iniciar outro programa semelhante, desta vez através da Management Corporation (MC),
que ampliou o número de gerentes contemplados de 80 para 250. Os gerentes
beneficiários do programa realizaram lucros enormes, uma vez que compraram suas
cotas em uma época de baixa e praticamente não tiveram que desembolsar o restante
das parcelas, já que os próprios dividendos distribuídos foram suficientes para a
amortização.
4.1.8. A grande depressão e a consolidação dos comitês
O ano de 1929 apresentou em boa parte uma aceleração do crescimento da
indústria. As vendas atingiram o volume recorde acima de 5,3 milhões, elevando o
patamar de quatro milhões nos anos anteriores. A General Motors também fechou o ano
com recorde em vendas, cerca de 1,8 milhões de veículos, mas sua participação de
mercado caiu de 39% para 34%. A Ford, com seu Modelo A, ficou próxima dos 30%. Em
maio de 1929, porém, o sistema de revisão decenal da projeção de vendas da GM
antecipou a sutil inversão nas tendências de evolução do mercado. Três semanas antes
da quebra da bolsa de Nova York no final de outubro, Sloan havia alertado acionistas
sobre a perspectiva de um longo período de queda na rentabilidade.
A grande depressão iniciada no final de 1929 produziu conseqüências
devastadoras na indústria automobilística. O volume de vendas caiu 72% entre 1929 e
1932, chegando ao nível de 1,9 milhões de unidades. Dos 44 fabricantes no início dos
anos 1930, somente oito mantiveram-se em atividade até o final da década. A General
Motors também viu sua operação encolher, entretanto, os controles gerenciais
desenvolvidos ao longo dos anos 1920 permitiram que a GM atravessasse a mais grave
crise econômica da história dos Estados Unidos sem apresentar prejuízos em um ano
sequer. Apesar da natureza de altos custos fixos e mantendo a operação apenas a 30%
da capacidade, a GM, com seu standard-volume, conseguiu produzir um lucro de U$ 165
mil em 1932, o pior ano da depressão. A participação de mercado subiu para 38% durante
86
a crise, e a quase totalidade dos baixos lucros gerados foram distribuídas em dividendos,
que também tiveram seu nível reduzido em relação aos anos anteriores.
Para lograr tal resultado, novos investimentos foram praticamente eliminados da
pauta do CE, dado que as perspectivas de retorno eram quase nulas. No ano de 1932,
foram gastos apenas U$ 5 milhões em novos equipamentos nas plantas, enquanto nos
cinco anos entre 1930 e 1934 gastos como estes totalizaram U$ 81 milhões. Durante a
depressão, alguns equipamentos ociosos foram retirados da linha, e o desenvolvimento
de produtos que envolviam novas tecnologias também foi suspenso. Por exemplo: o uso
de vidros laminados que havia sido lançado no Modelo A da Ford era considerado uma
melhoria significativa em termos de segurança em relação ao vidro comum, que era
utilizado até então. Sloan resistiu durante três anos à adoção da nova tecnologia de
vidros, alegando que o consumidor não iria pagar a mais pela inovação e,
conseqüentemente, o valor teria de sair do bolso do acionista.
Ainda antes da quebra da bolsa de valores, em setembro de 1929, a GM deu mais
um passo na construção de sua estrutura corporativa. O CO, que reunia os gerentes
gerais das divisões, passou a ter sessões conjuntas com o CE, mas os representantes
das divisões foram substituídos pelos executivos que haviam sido recém-promovidos aos
cargos de vice-presidentes, responsáveis pelos staffs de finanças e operações. Desta
forma, o CO foi composto da seguinte maneira: John T. Smith, Albert Bradley, Richard
Grant e Ormond Hunt, que eram respectivamente vice-presidentes de assuntos jurídicos,
finanças, vendas, engenharia. Juntou-se a este grupo Charles E. Wilson, um engenheiro
que havia apresentado excelentes resultados na divisão Delco-Remy, galgando posições
e chegando ao topo em 1925, quando foi nomeado vice-presidente de operações.
Em junho de 1931, Alfred Sloan determinou a criação de grupos consultivos.
Segundo o próprio Sloan (1963), este seria o primeiro passo para a nova organização que
tinha em mente. Os grupos consultivos foram a transição entre os grupos de estudos de
projetos especiais, formado por membros das divisões, para o que ficou conhecido
posteriormente como staff de operações ou staff corporativo. Estes grupos passaram a
operar através dos comitês gerais no levantamento de fatos e dados, análise e proposição
de políticas para o CO e a CE.
Apesar da grave situação da economia, a General Motors manteve suas divisões
de automóveis operando, apenas com a troca do nome Oakland por Pontiac. Contudo,
diante do aprofundamento da recessão, em março de 1932 o CO apresentou uma
87
proposta para reformular a política de produtos da GM. Com a aprovação, o sofisticado
arranjo de divisões, que formava a pirâmide de marcas e havia sido grande sucesso na
década de 1920, sofreu mudanças radicais. As atividades de produção da Chevrolet e da
Pontiac foram unificadas e colocadas sob o comando de William Knudsen. As áreas de
vendas das marcas que disputavam os segmentos intermediários, Buick, Oldsmobile e
Pontiac, foram fundidas em uma única organização denominada com a sigla BOP. As
lojas concessionárias das três bandeiras passaram a vender os modelos dessas divisões.
A decisão do CE da General Motors foi uma resposta ao entendimento de que,
com a recessão, o mercado anteriormente já reduzido, concentrava-se ainda mais em
veículos menores e mais baratos – 73% em 1932 contra 52% em 1926. Com isso, o plano
de diferenciar marcas em função de tamanho e sofisticação de acessórios foi trocado por
outro que teve como objetivo unificar chassis e carrocerias em somente três tamanhos, a
serem usados de forma comum entre as divisões, otimizando lotes de compra e o
processo de produção. A diferenciação entre as marcas se daria através da sessão de
estilo, que à época já estava integrada às atividades de desenvolvimento e possuía em
seu espaço, no prédio da GM Resarch Labs, estúdios e equipes dedicados a cada
divisão.
A única divisão de veículos a permanecer intacta foi a Cadillac, que dispunha de
distinção especial de sua marca, embora viesse perdendo mercado para a luxuosa
concorrente Packard. Em Junho de 1932, com as vendas em baixa, o CE considerava a
hipótese de replicar a estratégia de concentrar as vendas em produtos posicionados com
preços mais baixos, neste caso, abandonando os modelos superiores da Cadillac e
mantendo esforços sobre o La Salle. Entretanto, uma proposta alternativa emergiu de
dentro da divisão. Sabendo da intenção do CE em descontinuar o topo da linha da
Cadillac, o ex-mecânico e gerente de serviços da divisão, Nicholas Dreystadt, pediu uma
reunião com Sloan e Brown. Do contato com a rede de distribuição, Dreystadt tinha
aprendido que o Cadillac era um grande parâmetro de sucesso para uma pequena
burguesia de negros emergente nas cidades americanas. A venda de Cadillac, assim
como outros bens e serviços de luxo, era proibida para negros nos Estados Unidos, mas
comumente eles pediam a intermediação de brancos para comprarem um Cadillac, o qual
passou a ser uma das poucas formas de demonstração de status para essas pessoas.
Dreystadt ganhou um prazo de 18 meses para estabelecer este mercado e, em 1934, a
Cadillac já estava de volta aos lucros.
88
Com o anúncio de Lammont Du Pont, em 1933, de que ele e a Du Pont deixariam
de ocupar a presidência em favor de Sloan, novas alterações no quadro de executivos
foram realizadas. Um novo grupo de gerentes assumiu o posto principal nas divisões, em
substituição aos que foram promovidos para compor a estrutura corporativa que se
formava ou se aposentaram. As divisões passaram a responder diretamente a William
Knudsen, promovido da Chevrolet para ocupar o novo cargo de vice-presidente de
operações e que seria o representante das divisões nos comitês da GM. Alfred Sloan
passou a acumular as presidências do conselho de administração e da General Motors, o
que lhe fazia também presidente do CE. Esta movimentação foi também uma sinalização
de um plano de sucessão que colocou Knudsen como sucessor natural de Sloan.
Em 1934, a indústria apresentava indícios de recuperação. Apesar das vendas
ainda serem inferiores ao patamar de antes da crise, o ano fechou com um aumento de
44% no volume em relação ao ano anterior – o dobro se comparado ao pior momento da
crise, dois anos antes. Com isso, a General Motors desfez a unificação de atividades das
divisões, como a BOP e a produção conjunta entre Chevrolet e Pontiac. Entretanto, a
comunização de chassis e carrocerias em três versões de tamanho (A, B e C) foi mantida.
O A body, como era chamado, era usado pelos modelos da Chevrolet; o B body, pela
Pontiac, Oldsmobile e Buick; e o C body, por Cadillac e os modelos maiores de Buick e
Oldsmobile. Desta forma, a diferenciação entre as marcas continuou a depender em
grande parte do design.
Ainda em 1934, uma nova mudança na estrutura marcou a evolução da gestão
corporativa da General Motors para o sistema que posteriormente ganhou notoriedade,
chamado de “gestão por políticas”. Os primeiros grupos de políticas foram criados em
outubro de 1934. Eram eles: Grupo de Política de Engenharia (GPE) e Grupo de Política
de Preços (GPP), ambos evoluções naturais dos comitês de política liderados pelos vicepresidentes de engenharia (CTE) e de vendas (CGV). A diferença entre os grupos de
políticas e seus predecessores era a eliminação da participação formal dos gerentes das
divisões e, conseqüentemente, na formulação de políticas. Os membros das divisões
foram substituídos por executivos de staff, cuja formação iniciara-se em 1931 com a
formação dos grupos consultivos. Participavam ainda outros executivos corporativos,
incluindo o presidente da GM. As divisões ficaram com a responsabilidade administrativa
de implementar as políticas aprovadas.
89
Esses grupos de políticas respondiam para o CE e não possuíam autoridade sobre
as divisões, nem aprovavam políticas. Sua responsabilidade era coordenar a formulação
de políticas para a corporação e submetê-las ao CE, que possuía autonomia para
aprovar, recusar ou solicitar alterações. Entre 1934 e 1937 nove grupos de política foram
criados, divididos em conjuntos de dois tipos: aqueles cujo nome indicava uma área
funcional – Engenharia, Distribuição, Pesquisa, Recursos Humanos e Relações Públicas;
e outros cujo nome se referia a uma operação propriamente dita – Mercados Externos,
Canadá, Motores Gerais e Utilidades Domésticas. O primeiro conjunto era mais
relacionado à atividade automotiva, e os trabalhos eram conduzidos pelo staff relacionado
à determinada funcionalidade. O segundo conjunto funcionava sob a responsabilidade de
um executivo de grupo que coordenava um staff dedicado àquela operação. Os grupos de
políticas, em especial o de GPE, foram a forma que a GM encontrou para coordenar as
atividades das divisões, cujos veículos eram compostos de uma grande quantidade de
componentes, com fornecedores internos e externos, e que possuíam evoluções
tecnológicas independentes. Além disso, as linhas das divisões deveriam se diferenciar
umas das outras em relação ao estilo, sendo que cada modelo de veículo tinha de ser
renovado ano a ano.
Em
sua
autobiografia,
Sloan
(1963)
descreve
um
procedimento
para
desenvolvimento de novos modelos que, segundo ele, foi formalizado a partir do GPE por
volta de 1935 e consolidou diversas práticas de desenvolvimento de produtos,
emergentes desde a década de 1920, em um sistema em que o staff de engenharia por
meio do GPE coordenava as ações das várias áreas envolvidas em pesquisa, estilo,
fabricação e comercialização de veículos. Ainda de acordo Sloan (1963), o protocolo que
ele descreve passou por revisões de tempos em tempos, mas de maneira geral manteve
a base até a década de 1960, quando ele se afastou da GM.
Anualmente os veículos eram remodelados, adotando novos atributos de design,
de acabamento e de acessórios. Outras alterações mais profundas em sua estrutura de
chassi, carroceria e mecânica também ocorriam, mas estas geralmente possuíam um
intervalo maior, de quatro a seis anos. O ciclo de desenvolvimento para troca do
ano/modelo levava cerca de dois anos. O primeiro ano se concentrava na definição do
design e na preparação dos programas de lançamento, quando uma elaborada seqüência
de aprovações consolida uma proposta de design interno e externo para toda a linha da
GM, além de todo orçamento de custos e investimento para produção e comercialização.
90
No segundo ano, as divisões implementavam o sistema de produção e realizavam testes
de desempenho e durabilidade dos novos modelos. O fluxo dos processos para
desenvolvimento de novos modelos é apresentado a diante.
De acordo com Sloan (1963), a seqüência de revisões do desenvolvimento do
design dos produtos na primeira metade do ciclo apresentado minimizava a chance de
ocorrer desistência ou mudanças radicais em uma etapa mais avançada do
desenvolvimento de um veículo, embora eventualmente isto tenha ocorrido. O processo
também poderia ser acelerado em relação a um ou outro modelo, em virtude de algum
lançamento feito por um concorrente.
A descrição do processo deixa claro também como ocorria a separação das
atividades de formulação de políticas nos grupos e comitês e a administração da divisão.
Apesar de não participar diretamente na materialização das idéias para a nova linha,
segundo Sloan (1963), havia um processo de feedback informal que ocorria antes e
durante o desenvolvimento, entre os engenheiros do staff e das divisões. Além disso, os
gerentes das divisões eram eventualmente convidados a participar das reuniões do staff
de engenharia que diziam respeito a seus produtos. Assim, estabelecia-se uma dinâmica
de persuasão mútua e negociação de consenso sobre conceitos técnicos e de estilo a
serem implementados.
Com a redução do investimento em novas tecnologias, em função da grande
depressão, alguns concorrentes passaram a construir uma reputação com o lançamento
de inovações, como o compacto de motor V-8 lançado pela Ford. A resposta da GM foi
concentrar-se no desenvolvimento de novos desenhos para seus veículos. Por exemplo,
em 1932, a sessão de estilo sugeriu que o porta-malas fosse montado já na estrutura da
carroceria, cobrindo o tanque de gasolina, e não pela fixação de um suporte como era
utilizado. O teste foi feito com o Cadillac naquele ano e replicado para a Chevrolet no ano
seguinte. Diante da boa aceitação, outros modelos foram incorporando o novo desenho.
O mesmo ocorreu em 1934, quando a indústria siderúrgica desenvolveu folhas de aço de
80 polegadas de largura. O teto feito em aço anteriormente havia sido rejeitado devido ao
barulho causado pela vibração. Com a nova tecnologia, os “turret tops” começaram a
equipar os veículos da GM em 1834 e logo se tornaram grande sucesso.
91
Figura 4-2 Fluxograma do processo de desenvolvimento de novos modelos entre 1935 e 1962
Staff de Finanças
(Comitê de política
Financeira)
Aprovação
da FPC
Executivos corporativos
(comitê executivo)
Aprovação
do EC
Staff de engenharia
(Comitê de política
de engenharia)
Staff de
estilo
Análise das
inovações das
divisões,
staffs e
laboratórios
Aprovação
do estilo dos
modelos em
argila
Kickoff meeting:
diretrizes gerais
de estilos e
programas
Feedback
informal sobre
modelos
anteriores
junto às
divisões
Preparação
dos modelos
de argila em
tamanho real
Preparação
de modelos
em plástico
Aprovação
do estilo
para toda a
linha
Preparação
de
modelos
em plástico
reforçado
Aprovação
das medidas
de chassis
Divisão de
veículos
testes corporativos
realizado no campo de
provas para
identificação de falhas
Ajuste de detalhes
de acabamento,
instrumentos e
acessórios junto as
divisões de
veículos
Estimativas de custo de
fabricação de peças,
ferramentas e preparação
das fábricas
Início da
produção de
ferramentas para
linha piloto de
protótipos
Estimativas de custo de
peças e investimentos para
produção e comercialização
Desenho de peças
distribuídos aos
departamentos
para estimativas
de custo de
fabricação
Aprovação de
medidas da
carroceria
Fisher
Body
Aprovação dos
programas de
novos modelos
Carrocerias
usadas
para
protótipos
Planejamento e
seqüenciamento das
operações de
manufatura
Protótipos
artesanais
de chassis
Testes de rodagem de
protótipos para
correção de erros
Comitê decide
comprar ou fazer
Engenharia de
produção consulta
engenharia dos
fornecedores
Meses
1
2
3
4
5
6
7
8
9
Fonte: adaptado do processo descrito em Sloan (1963, p. 240-246)
92
10
11
12
13
14
Início da
fabricação
dos
modelos
Preparação
da linha de
montagem
Planejamento e
seqüenciamento das
operações de manufatura
e montagem
15
16
17
18
19
20
Preparação da
linha de
montagem
21
22
Início da
fabricação
dos
modelos
23
24
Início
das
vendas
Mesmo com investimento em inovações de engenharia andando em ritmo lento,
em virtude da crise, a ligeira melhora do mercado a partir de 1933 despertou a busca por
inovações mecânicas nas engenharias das divisões. Em 1934, a Cadillac desenvolveu a
primeira transmissão automática a ser produzida em escala industrial, lançando o câmbio
hidramático.
Simultaneamente,
outras
inovações
foram
gradualmente
sendo
apresentadas pelas divisões, como, por exemplo, transmissão automática para
caminhões, suspensão dianteira independente, suspensão tipo wishbone, câmbio semiautomático e transmissão I.V.
Até o ano de 1937, quando o volume de vendas se aproximava do nível de cinco
milhões de veículos atingidos em 1929, o desenvolvimento de inovações de design e
engenharia havia se tornado o principal meio de competição perseguido pelos fabricantes
de veículos. Com isso, a sessão de estilo da General Motors criou mais uma ferramenta
para ajudar no desenvolvimento de novos conceitos de design. Em 1937, a Buick e o staff
de estilo lançaram a idéia de exibir um carro com conceitos de design experimentais
durante o salão do automóvel e perceber qual era a reação do público. Os conceitos
apresentados em protótipos experimentais não seriam lançados na linha de produtos
daquele ano, mas contribuíam no desenvolvimento de modelos futuros na medida em que
permitiam ao designer ter uma idéia melhor sobre o gosto do consumidor.
O início da recuperação da economia americana ao final da primeira metade dos
anos 1930 fez com que outros negócios não automotivos da General Motors, iniciados
timidamente durante a década de 1920, também prosperassem. Um desses negócios era
a Frigidaire. Durante a década de 1920, quando a Frigdaire foi incorporada à Delco,
diversas melhorias desenvolvidas pela equipe de pesquisa do GM Research Labs, como
em materiais para isolamento térmico e gases de resfriamento, tornaram o produto mais
eficiente, leve e barato. Em 1928, a atividade fabril da Frigidaire já havia sido removida da
planta de Northway para Moraine e, em 1933, tornou-se uma divisão dentro da GM.
A General Motors também havia decidido diversificar sua atividade para a indústria
aeronáutica, temendo que o surgimento de um avião de baixo custo pudesse ameaçar o
negócio automotivo. Em 1929, com um investimento de U$ 23 milhões, três empresas
foram adquiridas, duas apenas por meio de participação acionária e outra por completo. A
GM adquiriu 40% da fabricante de aeronaves Fokker Airkraft Corporation of American. Em
1933, a Fokker fundiu-se com a General Aviation Manufacturing Corporation, formando a
holding North American Aviation, da qual a GM passou a ter 30% . Outra empresa de
93
relativo sucesso na fabricação de aviões foi a Bendix, sobre a qual a GM adquiriu 24%
das ações. Além dessas, a GM também adquiriu integralmente a Allisson Engineering
Company, uma empresa pequena, com cerca de 200 empregados e que custou pouco
mais de U$ 500 mil. O relacionamento da General Motors com essas empresas era
limitado. Em duas delas, representantes da GM apenas ocupavam um assento no
conselho de diretores, enquanto a Allisson permaneceu como um investimento em
engenharia, tentando desenvolver motores para aviões pequenos.
Durante a grande depressão, a principal alteração nos investimentos da GM em
aviação foi a determinação judicial, após a aprovação do Air Mail Act em 1934, que
obrigou a North American a se desfazer de participações em empresas operadoras de
transporte aéreo, como a Eastern Air e a Trans World Airlines (TWA), usadas para
controlar a fabricação e a operação de aeronaves. As ações das empresas de transporte
aéreo foram distribuídas aos acionistas da North American, dentre eles a GM, que
recebeu 13% das ações da TWA e as vendeu em 1935. Apesar dos negócios na indústria
aeronáutica caminharem de forma razoável durante os anos 1930, ao final da década,
com o início da Segunda Guerra Mundial, as três empresas nas quais a GM havia
investido começaram a apresentar resultados que indicavam o período de lucros que
estaria por vir.
Outra atividade não ligada ao automóvel na qual a General Motors se aventurou e
teve uma importante evolução durante os anos 1930 foi a inauguração da indústria de
locomotivas a diesel. Charles Kettering, chefe do GM Research Labs, já havia estudado
motores a diesel no início da década de 1920, mas foi em 1928, após comprar para si um
iate, que o interesse pelos problemas desta tecnologia de motores chamou-lhe a atenção.
Uma equipe de engenheiros de Kettering realizou testes com todos os motores a diesel
oferecidos no mercado e, depois dos estudos realizados, combinou algumas soluções já
conhecidas a um sistema de injeção de combustível e a uma bomba de alta precisão
capaz de injetar o diesel em alta pressão, viabilizando um motor de dois tempos (twocycle) de alta velocidade. Ao longo de 1930, a GM adquiriu duas empresas associadas, a
Winton Engine Company e a Electro-Motive Engineering Company, que desenvolviam e
fabricavam motores a diesel, especialmente para barcos.
Por um tempo, as duas empresas operaram como antes de serem adquiridas, mas
em 1932, Charles Kettering decidiu fabricar um motor a diesel de dois tempos, com oito
cilindros, que produziriam 600 cavalos de potência, pensando que haveria boa utilidade
94
aplicando-o para gerar energia durante a exposição da World’s Fair de Chicago, em 1933.
Antes mesmo de o novo motor ser completado, Ralph Budd, presidente de uma empresa
operadora de estradas de ferro, ficou sabendo por um amigo sobre as intenções de
Kettering e pediu que o motor equipasse um trem articulado para o transporte de
passageiros. Kettering resistiu à idéia, por se tratar ainda da primeira versão, mas a
insistência de Ralph Budd o convenceu e, em 1934, o motor estava pronto para ser
testado. Após alguns ajustes, o motor apresentou um desempenho surpreendente de
velocidade e de custos de operação em relação à alternativa de locomotivas a vapor, a
gasolina ou elétricas. Antes mesmos dos testes finais, Charles Budd já havia
encomendado motores maiores e com o dobro da potência para locomotivas maiores,
sendo entregues a partir de 1935. Rapidamente os motores de Kettering tornaram-se
sucesso entre empresas ferroviárias, que começaram a pedir que a Winton fornecesse
locomotivas completas e não apenas os motores.
Em 1935, Charles Kettering e Harold Hamilton, presidente da Winton que
permaneceu no cargo após a aquisição, decidiram iniciar uma nova planta para fabricação
de locomotivas a diesel. A fábrica ficou pronta em 1938, em La Grange, Illinois, quando a
Winton, cujo nome mudou para Cleveland Diesel Engine Division (CDED), passou a
fornecer locomotivas e carros de movimentação de vagões.
Apesar da recuperação da economia e dos negócios da GM na segunda metade
dos anos 1930, a grande depressão teve um efeito severo sobre um dos mecanismos
criados pela GM para motivar seu corpo de gerentes. No meio do período de recessão,
em 1933, a queda nos preços das ações e a redução dos dividendos fizeram com que
muitos gerentes ficassem temerosos com o risco de não ser possível recuperar o
investimento que vinha sendo feito no programa de compra de ações. Sloan pediu para
que o CF analisasse a possibilidade de realizar alterações no programa a fim de aliviar a
possibilidade de perdas para os gerentes, que já vinham tendo seus bônus
compulsoriamente absorvidos pela GM para o pagamento das parcelas do plano. No ano
seguinte, a estrutura do plano incorporou algumas mudanças, reviram valores a serem
pagos pelos gerentes e, principalmente, constituiu um fundo que criava uma provisão para
ressarcimento dos gerentes em caso de as ações estarem desvalorizadas no momento do
resgate.
Ao final de 1935, com a economia sinalizando uma recuperação, a General
Motors, após realizar um estudo da capacidade de suas fábricas que haviam sido
95
reduzidas durante a depressão, aprovou um tímido programa de expansão, no total de U$
50 milhões. No ano seguinte, o problema de falta de capacidade persistiu: a Chevrolet,
cujas vendas voltaram a ultrapassar a casa de um milhão de veículos em 1935 e 1936,
teve problemas em atender a demanda, e outras fábricas da GM, incluindo as divisões
não-automotivas, passavam por dificuldade semelhante. Isso e mais a tendência de
redução da jornada semanal de trabalho levaram a GM a aprovar mais um programa de
U$ 60 milhões para ampliação e modernização de plantas, que foi implementado em dois
anos.
Em maio de 1937, o conselho de administração aprovou uma mudança na
estrutura de comitês no topo da organização. A mudança arquitetada por Sloan e
Lammont Du Pont reduziu o número de integrantes do Conselho de Administração, para
que este pudesse se reunir mensalmente, e unificou os Comitês de Finanças (CF) e
Executivo (CE), transformando-os no Comitê de Política (CP). Além disso, o CO foi
substituído pelo Conselho de Administração (CA) e passou a ser formado inteiramente
pelos gerentes das divisões. Desta forma, a nova dinâmica da formulação de políticas
ficou da seguinte maneira: os grupos de políticas, formados exclusivamente por
executivos corporativos e de staff, continuavam subordinados ao CE, estudando e
formulando propostas de novas políticas. As propostas formuladas nos grupos eram
encaminhadas antes para o CA, que não tinha poder para aprová-las e apenas
encaminhava para o CE, acompanhadas de recomendações de aprovação, alteração ou
rejeição. Por fim, já apontado como natural sucessor para o comando da GM, William
Knudsen foi promovido a presidente, enquanto Sloan ainda permanecia como presidente
do Conselho de Administração e do CP.
4.1.9. Relações trabalhistas e a greve de ocupação de 1936-1937
(sit-down strike)
Os anos de depressão econômica foram sofridos para o trabalhador americano
das linhas de produção da indústria automobilística. O número de empregados, que era
de 470 mil em 1929, caiu pela metade, e a média do salário semanal foi de U$ 33 para U$
20. Como tentativa de reverter a forte recessão, em 1933, o presidente dos Estados
Unidos, Franklin Roosevelt, eleito no ano anterior, deu início à sua política do New Deal. A
política consistiu na criação de agências e regulamentações que visaram intervir em
setores da economia, como bancos, agricultura e indústria e gastos públicos, na tentativa
de coordenar uma recuperação do crescimento. Um das ações lançadas pelo New Deal
96
foi a aprovação do National Industry Recovery Act. (NIRA), que teve como objetivo
estabelecer critérios para assegurar empregos e salários, dentre eles a redução da
jornada semanal e o fim do trabalho infantil. A operacionalização do NIRA começou com a
criação do National Recovery Administration (NRA), que teria a incumbência de
intermediar empresas e trabalhadores na criação de novos códigos.
A reação da General Motors ao NIRA foi a de aparentar apoio, enquanto agia
discretamente para minar sua legitimidade. Publicamente, assim como várias outras
grandes empresas, a GM aderiu à campanha em favor da criação de códigos de
competição justa na indústria e da geração de empregos, exibindo o adesivo de membro
do NRA em seus produtos e adotando o teto para jornada de trabalho de 48h semanais.
No entanto, o NIRA previa também o estabelecimento de negociações coletivas dos
contratos de trabalho, o que era um assunto considerado de alto risco. Assim sendo, a
GM também passou a financiar, através de seu acionista controlador, Du Pont, a
American Liberty League (ALL), que foi fundada em 1934 para fazer oposição ao NIRA e
ao presidente Roosevelt. A ALL não obteve sucesso em evitar a reeleição do presidente
em 1936, porém, em 1935 o NIRA foi considerado inconstitucional pela suprema corte dos
Estados Unidos, por interferir, por meio da fixação de salários, na soberania dos estados
para regulação do comércio dentro de seus territórios.
A aprovação do NIRA despertou a movimentação dos trabalhadores americanos
no sentido da organização sindical. A principal organização sindical americana para os
trabalhadores da indústria era a American Federation League (AFL), fundada em 1881
para representar o interesse dos sindicatos dos artesãos. A AFL teve dificuldades em
exercer
uma
representação
plena
dos
interesses
dos
operários
da
indústria
automobilística até meados da década de 1930, pois o surgimento das técnicas de
produção em massa, levando ao uso intenso de mão-de-obra não-qualificada, ia de
encontro ao princípio da valorização da qualificação do artesão, grupo hegemônico na
AFL. A despeito das deficiências da AFL, a General Motors não se limitou a assistir à
distância as tentativas de organização dos trabalhadores. A partir de 1933, a GM
contratou agências de detetives, dentre elas a Pinkerton, e infiltrou agentes disfarçados
em suas linhas de produção. De acordo com Cray (1980), a GM se tornou a maior
empregadora de detetives dos Estados Unidos entre 1933 e 1936, gastando algo em
torno de U$ 1 milhão pelo serviço de não menos do que 15 agências.
97
A resposta do presidente Roosevelt à derrubada do NIRA foi a aprovação do
National Labor Relations Act (NLRA), também conhecido como Wagner Act, em julho de
1935. A nova legislação assegurou o direito do trabalhador de filiar-se ao sindicato,
proibindo qualquer reprimenda por parte do empregador, e estabeleceu a negociação
coletiva entre o empregador e um representante de escolha da maioria dos empregados.
O NLRA estabeleceu também a criação do National Labor Relations Board (NLRB),
conselho responsável por fiscalizar e investigar suspeitas de violação da nova legislação.
Assim como o NIRA, o NLRA também seria questionado judicialmente. A decisão final da
Suprema Corte americana ocorreu somente em 1937 e, desta vez, foi em favor da
legislação. Porém, antes mesmo do reconhecimento definitivo, as novas regras
produziram um grande impacto na relação com empregados na General Motors e no
restante da indústria.
Com a porta novamente aberta, sindicatos ligados à AFL retomaram suas
atividades para organizar a representação dos trabalhadores. Em maio de 1935, um
grupo de sindicatos organizou dentro da AFL o Congress of Industrial Organization (CIO),
como forma de tentar centralizar os interesses dos trabalhadores das indústrias. No
processo de criação do CIO, foi formado o United Auto Workers (UAW) para ser o
sindicato que representaria o interesse dos trabalhadores da indústria automobilística. Em
1936, a AFL tentou impedir a formação do grupo dentro de sua organização, no entanto, a
posição contrária da AFL teve efeito inverso e contribuiu para fortalecer o CIO, que
passou a se organizar fora da AFL. Os esforços do CIO se concentraram inicialmente
sobre a indústria siderúrgica, mas o UAW decidiu não esperar a liderança do CIO para se
estabelecer como representante dos trabalhadores e em 1936 mobilizou os operários
para estabelecer a negociação com as montadoras.
O UAW escolheu a General Motors como primeiro alvo9, dentre as três grandes
fabricantes, em sua estratégia para ser reconhecida pela indústria automotiva. Uma greve
foi planejada para iniciar em janeiro de 1937, após o pagamento do bônus de final de ano,
que ajudaria as famílias dos operários durante a greve. Os planos do UAW apontavam
para a planta N° 1 da Fisher em Flint que, por concentrar a pintura das carrocerias nos
novos modelos para 1937, poderia rapidamente parar boa parte da produção da General
Motors. A idéia de realizar uma greve contra a GM na cidade de Flint não era uma tarefa
9
Segundo Rubenstein (2001), a Ford foi descartada pelos métodos violentos de repressão de seus agentes de
segurança. A Chrysler, que seria uma escolha mais lógica, já havia organizado negociações coletivas com a
representação sindical da AIWA
98
fácil. A GM empregava um quarto de toda a população da cidade, possuía grande
influência sobre a prefeitura e a polícia da cidade e seus detetives infiltrados ocupavam
inclusive dois assentos no comitê local do UAW.
Ao final de 1936, o UAW teve dificuldades em conter o ímpeto dos trabalhadores
de iniciar a greve. A reeleição de Roosevelt e as vitórias que outras organizações locais
do UAW vinham conseguindo em plantas de fornecedores e da própria Fisher, em outras
cidades como Detroit e South Bend, Clevland, Atlanta e Kansas City, ameaçavam se
espalhar por outras plantas antes de o UAW estar pronto em Flint. O UAW acelerou a
realização da primeira manifestação de greve em 30 de dezembro de 1936, ocupando as
plantas N° 1 e N° 2 em Flint. A notícia da greve se espalhou e trabalhadores de fábricas
da GM em outras cidades também organizaram paralisações no início de janeiro. A
General Motors entrou na justiça e obteve um mandado de segurança para desocupação
das plantas. Porém, antes que o mandado fosse cumprido, o UAW reverteu a decisão ao
comprovar que o juiz havia violado a lei, pois era detentor de ações da General Motors.
Em 11 de janeiro, um conflito com a polícia de Flint iniciou-se na planta N°2
quando membros do UAW tentaram forçar a entrega de comida para os grevistas. A ação
dos policiais e a reação dos grevistas deixaram 14 feridos e isolou os trabalhadores de
volta ao interior do prédio. Diante dos atos de violência, o prefeito de Flint recorreu à
ajuda do Governador de Michigan, Frank Murphy. Este, por sua vez, respondeu com o
envio e 1200 homens da Guarda Nacional com a orientação de posicionarem-se em
escolas próximas às plantas, apenas para evitar que alguém mais se ferisse.
Temendo o possível esfriamento da greve, o UAW organizou a ocupação de uma
terceira planta da GM, mas, dessa vez, para evitar a violência, o sindicato executou uma
manobra para despistar os agentes infiltrados da GM. Em 1 de fevereiro, o UAW anunciou
os planos de greve em duas pequenas fábricas de componentes em Flint e, enquanto a
polícia se movimentava para antecipar a ocupação, o UAW direcionou os trabalhadores
para a Chevy – 4, que fabricava todos os motores para os veículos da Chevrolet. Com
isso, a greve de ocupação seria capaz de paralisar grande parte da operação em questão
de dias.
A General Motors conseguiu novamente na justiça um mandado para a
desocupação de suas fábricas, o qual foi encaminhado para que o governador executasse
a decisão. Diante da possibilidade de um conflito entre grevistas e a Guarda Nacional
resultar em um banho de sangue, o governador recusou-se a cumprir a decisão da justiça,
99
e a General Motors viu-se, então, forçada a aceitar reivindicações do comando da greve.
O acordo entre a GM e o UAW reconheceu o sindicato como representante de 17 plantas
principais da GM para um mandato de seis meses. Além disso, o UAW poderia livremente
realizar a filiação de trabalhadores nas fábricas, o que a permitiria ser eleito representante
nas negociações futuras.
Apesar das seis semanas de greve no início de um ano que foi o segundo melhor
desempenho em vendas da indústria até então, atrás somente de 1929, a GM conseguiu
fechar 1937 com um crescimento 2% nas vendas. A Chevrolet foi a divisão mais afetada
pela greve, a única a não aumentar o volume de vendas em relação a 1936, fechando
com queda de 7%. Com isso, a participação de mercado da GM recuou em 2%, para
38%, e os lucros que haviam totalizado U$ 238 milhões em 1936, ultrapassando pela
primeira vez na década a marca dos U$ 200 milhões, recuaram para U$ 196 milhões.
Com a vitória, o UAW abriu caminho para se estabelecer como representante dos
trabalhadores também nas demais fabricantes de veículos e peças. No entanto, outros
capítulos na história da negociação entre sindicato e GM teriam de esperar até 1945. Em
1938, ano seguinte à conquista da UAW, uma forte recessão interrompeu a seqüência de
quatro anos de recuperação econômica. A indústria de veículos sofreu uma queda de
48%. Para contornar a redução na demanda, a GM demitiu 30 mil operários e colocou os
230 mil restantes revezando sob o regime de semana de três dias10. Nos dois anos
subseqüentes, a indústria apresentou ligeira recuperação, mas a pressão inflacionária, em
função do acirramento da guerra na Europa, fez o governo lançar um programa de
estabilização de salários, que congelou a possibilidade de negociação salarial até o
término da Segunda Guerra Mundial.
4.1.10.
General Motors na Segunda Guerra Mundial
Após a recessão de 1938, o crescimento da demanda mundial, devido ao aumento
dos gastos com defesa dos países europeus, teve efeito positivo sobre a renda e o
consumo nos Estados Unidos. A indústria de veículos se recuperou durante os anos de
1939 e 1940, crescendo 43% e 25% respectivamente. A General Motors aumentou sua
participação de mercado para 44% em 1940 e bateu seu recorde de vendas, chegando a
1,95 milhão de veículos. Apesar do bom desempenho no negócio automotivo, ao final de
10
A expressão “semana de três dias”, ou “semana de quatro dias”, é usada comumente na indústria
automobilística para indicar um regime especial onde o operário horista tem sua escala de trabalho semanal
reduzida dos usuais cinco dias, a fim de acomodar redução na produção sem que haja demissões.
100
1940 e início de 1941 os contratos para fornecimento de materiais de defesa começaram
a ocupar um espaço na atividade da empresa. Em 1940, os contratos de defesa da GM
totalizaram U$ 75 milhões, equivalente a 4% do faturamento daquele ano. Em janeiro de
1941, a GM já tinha mais de U$ 683 milhões em contratos de produtos de defesa para os
governos dos países aliados. No ano em que a venda de carros da GM bateu novo
recorde, ultrapassando pela primeira vez a marca de 2 milhões de veículos, a receita com
contratos de defesa já significava 16% do faturamento.
Uma das primeiras atividades da General Motors a ser envolvida na indústria de
defesa foi a aviação. Bendix e North American, onde a GM atuava apenas com
representação em seus conselhos de administração, faturaram cerca U$ 40 milhões cada
durante o ano de 1940. Ao longo da Segunda Guerra, seus contratos de fornecimento
chegaram a um pico de U$ 800 e U$ 700 milhões, respectivamente. A terceira empresa
envolvida com aviação era a Allison Engineering, que até então vinha se dedicando
apenas a desenvolvimentos de engenharia. No início dos anos 1930, a Allisson conseguiu
um contrato junto ao governo britânico para desenvolver um novo motor. Após alguns
anos trabalhando em conjunto com o GM Research Labs, a Allison teve, em 1937, a
aprovação de seu motor V-1710. O novo motor para aviões de combate da Allison foi o
primeiro com refrigeração por fluído a obter sucesso nos Estados Unidos, operando em
alta temperatura e desenvolvendo 1000 cavalos de potência. Apesar de haver ordens
firmes para apenas 863 unidades, em 1939 a GM decidiu construir uma planta para a
Allison e, com o sucesso do motor, novos contratos foram fechados. Em 1941 a fábrica já
operava com a produção mensal de 1100 motores.
Os Estados Unidos aderiram aos aliados no confronto bélico da Segunda Guerra
Mundial em dezembro de 1941. A partir de janeiro de 1942 a General Motors envidou
todos os seus esforços na conversão de suas unidades produtivas para fabricar produtos
de defesa. A conversão para a produção militar ocorreu logo nos primeiros meses de
1942. A receita da GM no ano da conversão foi de U$ 2,25 milhões, dos quais apenas
15% foram de produtos civis. Em 1942, a General Motors era a maior empresa do país,
possuía 10% das instalações da indústria metal-mecânica. De fevereiro de 1942 até
setembro de 1945, toda a produção da General Motors foi dedicada aos contratos de
defesa. No início do último ano de conflito, a GM operava cerca de 120 plantas no país,
sendo 18 delas arrendadas junto ao governo. O total de contratos significou um
101
faturamento de U$ 12 bilhões durante o período, cerca de 8% do gasto do norteamericano com equipamentos de defesa.
A forma de organização da General Motors em 1937 começou a enfrentar
dificuldades em virtude da complexidade das novas decisões envolvendo o emergente
mercado de equipamentos de defesa. As decisões sobre novos contratos de defesa eram
analisadas em duas partes antes de ser encaminhadas para aprovação. Primeiro, a
proposta seria debatida por executivos corporativos e membros do staff no CA. Em
seguida, antes de qualquer compromisso ser assumido, o contrato era analisado pelo staff
financeiro e o de assuntos jurídicos. Além disso, como estes contratos em geral envolviam
várias divisões, cada divisão apontava um membro para representá-la quando ela
estivesse envolvida no projeto. Contudo, os contratos nunca eram realmente fechados
caso não houvesse interesse pela divisão, levando, muitas vezes, uma agência
governamental a ser colocada em contato com a divisão para que a negociação fosse
feita antes do projeto ser encaminhado para análise dos comitês.
Em junho de 1940, o presidente da General Motors, William Knudsen, renunciou
ao cargo para integrar o comitê de defesa dos Estados Unidos. A saída do presidente da
GM desencadeou uma reorganização de sua estrutura, que incluiu a nomeação de
Charles E. Wilson, que ocupava a vice-presidência executiva de operações, como novo
presidente. Para auxiliá-lo, foram nomeados como assistentes da presidência O. E. Hunt,
vice-presidente de engenharia, e James Mooney, vice-presidente de mercados externos.
Knudsen, como presidente da GM, exercia a função de chefe de operações e era o
natural sucessor de Alfred Sloan, então presidente do conselho de administração e
também chefe do executivo, pois acumulava a presidência do CP. Na ausência de
Knudsen, além da promoção de Wilson, Sloan transferiu Albert Bradley, vice-presidente
de finanças, para o cargo de vice-presidente encarregado das operações de carros e
caminhões. Desta forma, Sloan pretendia atribuir-lhe experiência em operações e torná-lo
uma alternativa para sua sucessão no conselho de administração.
Ainda em junho de 1940, com o intuito de melhorar a coordenação da GM ao lidar
com o crescente mercado de defesa, Sloan criou o Comitê de Relações com Materiais de
Defesa (CRMD). O novo comitê teria como presidente James Mooney. O CRMD era
formado por todos os membros do CP, menos os três representantes da Du Pont, e a
atividade principal era formular as políticas relacionadas aos contratos de defesa. Na
prática, todas as decisões sobre contratos de defesa passaram a se deliberadas pelo
102
grupo de executivos do CMRD e encaminhadas, a posteriori para o CP, apenas para
cumprir formalidades. Para assegurar aos acionistas a supervisão da atividade do CMRD,
relatórios dos projetos em andamento passaram a ser encaminhados para aprovação,
demonstrando análises de necessidades de capital, volume de vendas, projeção de lucros
e de retorno, número de empregados envolvidos, implicações tributárias e outros riscos.
Além disso, contratos com valor acima de U$ 1 milhão, ou estimativa de gastos capital
acima de U$ 500 mil, não poderiam ser iniciados sem a aprovação do CP.
O CMRD coordenou a obtenção de contratos de materiais de defesa até o final de
1941. Porém, o anúncio da entrada dos Estados Unidos no confronto na Europa e a
perspectiva de conversão total da General Motors para o abastecimento das forças
armadas provocaram nova mudança na estrutura da organização. Em 5 de janeiro de
1942, o DMRC foi substituído pelo Comitê Emergencial de Guerra (CEG). O CEG passou
a centralizar todos os poderes na condução das atividades de formulação e aprovação de
políticas, antes conferidas ao CP e ao CA, devendo apenas apresentar relatórios de suas
decisões ao CP. A formação do CEG permaneceu com os sete membros do DMRC, à
exceção de Frederic Donner, recém nomeado vice-presidente de finanças, no lugar de
James Mooney, que renunciou para trabalhar junto ao governo dos Estados Unidos.
Em questão de semanas a General Motors deveria preparar sua complexa rede de
fábricas de partes e peças e linhas de montagem, para produzir cerca de três mil produtos
de aplicação militar, muitos dos quais a maioria a GM não possuía qualquer experiência
em fabricar e outros nunca antes produzidos em uma linha de montagem. Muitas vezes
os contratos referiam-se a produtos cujos desenhos e especificações não estavam
disponíveis, ou não apresentavam qualquer base para estimativa de custos. Com isso, as
divisões passaram a participar de forma ativa na definição do contrato, pois, como cada
novo contrato envolvia uma nova e, às vezes, complexa relação de fornecedores internos
e externos, era necessário que houvesse coordenação entre as atividades de cada
divisão.
Dos U$ 12 milhões obtidos em contratos de defesa durante a Segunda Guerra,
cerca de U$ 8 milhões referiram-se a produtos completamente novos para a General
Motors. Portanto, a capacidade de coordenação e a agilidade para produzir novos
produtos tornaram-se cruciais. Por exemplo, a Cadillac, para organizar a fabricação do
tanque de guerra M-24, teve de organizar a obtenção de partes e peças junto a 17
fornecedores internos. À medida em que a GM convertia suas plantas, uma nova
103
mudança na organização da estrutura corporativa era implementada em maio de 1942.
Apenas cinco meses depois de sua criação, o CEG foi abolido e, em seu lugar, criado o
Comitê de Administração de Guerra (CAG), que uniu aos sete integrantes do grupo
anterior os vice-presidentes de operações, que integravam o CA. Excepcionalmente
durante a existência do CAG, os gerentes gerais das três principais divisões, Marvin
Coyle da Chevrolet, Edward Fisher da Fisher Body e Harlom Curtice da Buick, foram
promovidos ao status de vice-presidentes de grupo e incorporados ao comitê.
A formação do CAG consolidou a organização corporativa que a General Motors
adotaria até o final da Segunda Guerra. Com isso, a dinâmica estabelecida para a
obtenção de contratos de fornecimento de materiais militares foi amplamente
descentralizada, com as divisões sendo responsáveis pela negociação dos contratos. O
CAG formulava as políticas que estabeleciam parâmetros gerais para a operação e
supervisionava o andamento dos contratos das divisões.
As políticas que estabeleceram o sistema de gestão dos contratos de defesa foram
sendo formuladas desde os primeiros contratos do começo da década de 1940. Uma das
primeiras decisões do CP à época foi de provisionar, para os contratos de defesa, um
fundo de reconversão das plantas ao término do fornecimento. Em agosto de 1940, outra
política determinou regras para o financiamento das construções ou adaptações das
fábricas. A recomendação era de que a GM só financiaria a construção de novas fábricas
casos o governo oferecesse garantias contra perdas do capital investido, caso contrário,
quando as fábricas projetadas não pudessem ser reconvertidas para a fabricação de
automóveis, o governo deveria providenciar os recursos para o investimento antes da GM
aceitar o contrato.
Em 1942, a GM se antecipou ao departamento de ajustes de preços do Conselho
de Guerra e, voluntariamente, impôs um limite máximo de 10% para a margem de lucros
antes de impostos durante o esforço de guerra. Este limite estava ligado à estratégia de
lobby para evitar que o governo americano implantasse formas alternativas de controles
dos lucros de empresas com o fornecimento de materiais de defesa, as quais vinham
sendo discutidas, e que envolviam limitações sobre a taxa de retorno sobre o
investimento. Finalmente adotado pelo Conselho de Guerra, o limite de 10% sobre a
margem de lucro, proposto pela GM, combinado com a já utilizada política de contratos
em preço fixo, assegurou um caminho para que a General Motors preservasse sua taxa
104
de retorno, bastando manter a margem em 10% e aumentar o faturamento, obtendo o
maior número de contratos sobre a mesma base de investimentos.
Assegurar a capacidade de cumprimento dos compromissos assumidos de
entregas de materiais de defesa tornou-se um grande desafio diante da complexidade de
cadeias internas de fornecimento. Além disso, o principal determinante de capacidade da
maioria das fábricas americanas, incluindo as da GM, passou a ser a disponibilidade de
mão-de-obra, dado que muitos operários treinados e experientes foram servir no front de
batalha. Ao longo dos anos em que se seguiu a Segunda Guerra, a GM contratou e
treinou, ao todo, cerca de 750 mil novos operários, sobretudo mulheres. Diante desta
situação, a CEG aprovou, no início de 1942, o Plano de Distribuição de Cargas (PLC). A
política implementada a partir deste plano estabeleceu um sistema que convertia os
valores de um contrato na forma de índices, os quais poderiam ser comparados com o
limite máximo que uma divisão poderia aceitar. O PLC estabelecia o seguinte
procedimento: o prospecto de um contrato era analisado pela CEG, e seu fluxo de
entregas era definido em termos de valor de pico anual, que consistia no valor em dólar
da produção de doze meses, considerando o mês de pico de capacidade mensal
requerido pelo contrato. Assim, os contratos com prazos diferentes poderiam ser
comparados entre si. Depois de calcular o valor de pico anual, os executivos subtraíam os
custos com matéria-prima, e o valor restante seria considerado a carga líquida. O valor
apontado como carga líquida era usado para estimar o número de trabalhadores que cada
contrato iria requerer em termos de mão-de-obra no pico da produção. Com isso, os
gerentes das divisões poderiam analisar se os contratos estavam dentro dos limites que
seriam capazes de cumprir.
Desta forma, os gerentes das divisões possuíam autonomia para aceitar ou rejeitar
contratos de materiais de defesa que respeitassem o limite de sua capacidade, bem como
em outras atividades, como compras e engenharia. Quando um contrato exigisse mais do
que a capacidade disponível, ele somente poderia ser aprovado pela CEG
(posteriormente a CAG). Devido a tal autonomia e diante da dificuldade em encontrar
fornecedores específicos, muitas vezes as divisões desenvolviam os componentes e
transferiam a produção para outro fornecedor.
Com isso, um intenso mercado de
contratação entre as divisões emergiu e atribuiu maior flexibilidade para que a GM
obtivesse novos contratos.
105
O controle da atividade das divisões pelo CAG era feito por meio de dois relatórios,
um mensal e outro quinzenal, sobre o andamento dos contratos. O relatório mensal
reportava o volume produzido até então em cada contrato, produção agendada para os
próximos quatro meses em cada um deles, projeção de picos de produção, picos de
capacidade das instalações e datas de término do fornecimento de cada contrato. O
relatório quinzenal comparava a produção dos quinze ou trinta dias do mês com os
recebimentos que haviam sido programados pelas forças armadas. As divisões deveriam
também encaminhar explicações para qualquer desvio no cumprimento das entregas.
A centralização da formulação e aprovação de políticas que culminou com a
criação do CAG praticamente paralisou os trabalhos que vinham sendo desenvolvidos
pelos grupos de políticas, com exceção dos de finanças, assuntos jurídicos, preços e de
planejamento pós-guerra, os quais participavam da análise dos contratos. Contudo, em
1943 conforme a nova rotina de operações foi se estabilizando, outros grupos emergiram,
dentre eles grupos de políticas de produtos. Os novos grupos de políticas seguiam os
moldes desenvolvidos ao longo da década de 1930, com um executivo corporativo no
comando de uma equipe de staff que coordenava o trabalho de desenvolvimento junto às
divisões. Por exemplo, o Grupo de Desenvolvimento de Transmissões havia suspendido
as atividades no desenvolvimento da transmissão automática para os veículos civis e,
posteriormente, passou a trabalhar no desenvolvimento de um câmbio hidramático para
cargas pesadas, que, quando pronto, equipou os tanques de guerra do exército,
aumentando sua eficiência, durabilidade e facilidade de operação. A General Motors
aplicou sua engenharia em diversos produtos, como motores a diesel, motores para
aviões, sistemas de freio, sistemas de direção, metralhadores e outras armas,
melhorando significativamente a tecnologia dos equipamentos de defesa durante a
Segunda Guerra.
Ao final da guerra, em 1945, a General Motors havia se estabelecido como o maior
fornecedor de equipamentos de defesa do governo americano. Com a vitória na Europa,
em maio, algumas plantas começaram a reconversão para fabricação de veículos.
Imediatamente após a vitória sobre o Japão, em agosto, todos os contratos de
fornecimento às forças armadas foram cancelados. A GM deixaria de receber U$ 1,75
bilhão em materiais de defesa, além de descartar grande parte dos estoques
armazenados em suas fábricas. Após 45 dias do término da guerra, os primeiros carros
saíram das fábricas da GM nos Estados Unidos.
106
Apesar das perdas com cancelamento de contratos e da adoção de controle sobre
margem de lucros, o saldo da participação da General Motors na Segunda Guerra, em
termos financeiros, foi considerado positivo. Como mostra a tabela 4-2,, a receita da GM
chegou ao nível recorde, ultrapassando U$ 4 bilhões, com os lucros mantendo-se em
média em U$ 175 milhões, entre 1940 e 1945, quando os contratos representaram mais
de 80% das vendas.
Tabela 4-2 Receita e Lucro líquido da GM durante a segunda guerra mundial.
Ano
Receita total
(em U$ milhões)
Participação de contratos
Lucro líquido
de defesa (em
(em U$ milhões)
porcentagem)
1939
1.376,8
-183,3
1940
1.794,9
4%
195,6
1941
2.436,8
16%
201,7
1942
2.250,5
84%
163,7
1943
3.796,1
100%
149,8
1944
4.262,2
100%
171,0
1945
3.127,9
82%
188,3
Fonte: dados obtidos em relatórios anuais Moody’s (1940-1946) e em Sloan (1964).
A General Motors investiu cerca de U$ 130 milhões na conversão e expansão de
suas plantas entre 1940 e 1944 e ainda arrendou sob sua operação outros U$ 650
milhões em fábricas do governo norte-americano. Para financiar sua produção e gastos
de capital, a GM obteve um linha de financiamento junto ao governo de U$ 1 bilhão,
embora só tenha efetuado empréstimo de cerca de 10% desse valor, cujo pagamento
ocorreu em menos de um ano. A maior parte da operação da GM, à exceção das plantas
construídas pelo governo, foi financiada com o caixa da própria operação. Ainda assim,
com a política de constituição de fundo para reservar recursos para a reconversão, a
disponibilidade de caixa aumentou de U$ 290 milhões, em 1940, para U$ 597 milhões ao
final de 1944, mesmo a GM tendo distribuído dividendos que totalizaram 77% do lucro
líquido do período.
A partir de 1945, as atenções das divisões da GM voltaram-se para a indústria de
automóveis. Durante os três anos em que o país esteve dedicado à guerra, a atividade de
fabricação e comercialização de veículos novos ficou completamente parada. Entre 1941
e 1944 o número de concessionários da GM no país caiu de 17.360 para 13.791, apesar
do programa lançado por Sloan, no início de 1942, para tentar amenizar perdas nos
negócios dos concessionários com sistemas de alocação de veículos e peças. O esforço
de reconversão, portanto, teria não somente que readaptar as plantas, mas também
107
restabelecer parte de sua organização de vendas e desenvolver toda a linha de novos
veículos.
4.1.11.
A expansão do pós-guerra
A General Motors começou a preparar-se para o fim da guerra pouco depois da
entrada definitiva dos Estados Unidos para o conflito. Por iniciativa de Alfred Sloan, em
1942, foi estabelecido o Grupo de Política para o Planejamento do Pós-Guerra (GPPPG).
Edward Riley, gerente geral da divisão de operações em mercados externos, foi nomeado
com a orientação de analisar e apresentar a Sloan e aos demais integrantes do GPPPG
uma síntese das principais idéias sobre as situações políticas e econômicas que poderiam
emergir após a Segunda Guerra Mundial.
O GPPPG também era composto de outros seis executivos corporativos e dois
chefes de staff. A partir de 1943, com a melhora na rotina de contratação da fabricação de
materiais de defesa, esse grupo passou a desenvolver uma lista de questões de longo
prazo, as quais a GM enfrentaria com o término do confronto. Uma agenda de discussão
foi criada, e gerentes das divisões eram convidados a participar das reuniões para realizar
projeções para os próximos dez a quinze anos sobre capacidade produtiva, evolução da
demanda, mix de produtos e necessidades de capital. Após alguns meses e sob a revisão
do staff financeiro, o GPPPG concluiu um amplo plano de crescimento, visando
acompanhar a retomada da demanda reprimida de automóveis no pós-guerra, mantendo
os níveis participação de mercado de antes da guerra. Para tanto, previa-se a
necessidade de investimentos de capital de U$ 500 milhões na modernização e
ampliação das instalações produtivas.
As recomendações do plano do pós-guerra compreendiam todas as atividades nas
quais a GM estava envolvida. Para a aviação, o plano previa que o mercado do pósguerra iria se consolidar em três grandes setores: aviação militar, aviação comercial de
transporte de cargas e de passageiros e aviação civil particular. A recomendação de
Sloan e do estudo era para que a GM abandonasse o mercado de montagem final de
aviões e se mantivesse apenas na fabricação de partes e motores, que normalmente
representavam 45% do valor da aeronave e cuja engenharia oferecia sinergias com a
atividade automotiva.
Outra atividade não-automotiva abordada pelo plano do CPPPG foi divisão de
locomotivas a diesel. O staff financeiro havia se posicionado contra a continuidade desta
108
operação, argumentando que o mercado de locomotivas havia se estabilizado e que
perspectivas de retorno sobre investimentos nesta indústria seriam baixos. Por outro lado,
gerentes das divisões defenderam que o mercado logo após a guerra apresentaria
crescimento, e que os investimentos manteriam retornos razoáveis por um longo período.
O impasse foi solucionado com a recomendação de que a divisão de locomotivas a diesel
ampliasse a capacidade para oferecer também serviços de manutenção de locomotivas e
motores, que apresentava uma tendência promissora na indústria.
Quanto à divisão Frigidaire, os estudos do GPPPG reconheceram que a GM havia
falhando em não acompanhar a tendência de diversificação para outros eletrodomésticos,
como rádios, lavadora de roupas e de pratos e ferros de passar, como fizeram
concorrentes como GE e Whestinghouse durante os anos 1930. O grupo, então, realizou
pesquisas junto à rede de lojas revendedoras e elencou uma série de utilidades
domésticas com recomendação para serem desenvolvidas, tais como freezers, lavadoras
automáticas, secadora de roupas, lavadora de roupas, fornos e fogões.
O plano elaborado pelo GPPPG também propôs investimentos na modernização
da organização de engenharia. Até a Segunda Guerra, as atividades do staff de
engenharia, o laboratório de engenharia avançada e o staff de estilo funcionavam em
prédios distantes, sendo que em alguns casos estavam mal acomodados. Com isso, o
plano do pós-guerra incluiu o projeto de construção de um centro de engenharia que
reuniria as atividades de pesquisa e de desenvolvimento em uma área comum.
O GPPPG encaminhou o estudo sobre o pós-guerra para a análise do CAG. O
plano permaneceu em discussão durante poucos meses, quando sofreu algumas
alterações no mix de produtos, cortes e adições de capacidade produtiva entre as
divisões. No começo de 1944, o CAG enviou plano com recomendação de aprovação
para o CP. Quase um ano antes do fim da guerra, em setembro de 1944, o CP aprovou o
plano de expansão do pós-guerra, que previa investimentos de U$ 500 milhões, em
ampliação e modernização de plantas, totalizando a capacidade de 2,1 milhões de
veículos por ano, a ser financiado com o caixa gerado durante a guerra.
Enquanto se preparava para a implementação de seu plano, em 1945, a General
Motors voltou a discutir a organização de sua estrutura administrativa. A estrutura
centralizada de formulação de políticas do CAG, criado especialmente para lidar com as
demandas de defesa, necessitava ser desfeita. Por outro lado, a tentativa de estabelecer
um único comitê que reunia a aprovação financeira e de operações, usada desde 1937
109
até o início do esforço de guerra, também havia se apresentado problemático. As
dificuldades do sistema centralizado deviam-se tanto ao excesso de relatórios e de
assuntos a cada reunião, quanto à dificuldade em reunir executivos capazes de avaliar
aspectos financeiros e de operações de forma equivalente.
De maneira geral, na GM, finanças e operações eram duas carreiras distintas
dentro da organização. Executivos de finanças normalmente eram contratados recémgraduados de boas universidades de economia e contabilidade e construíam suas
carreiras em uma longa escada de promoções dentro do staff financeiro. Já os executivos
de operações, a exceção dos mais antigos, que vieram junto com as empresas
adquiridas, eram geralmente engenheiros graduados que passavam por uma formação
técnica na área automotiva por meio do General Motors Institute (GMI) e giravam pelas
várias divisões à medida em que eram promovidos. Executivos que iniciavam em uma
carreira e depois trocavam para a outra eram raros. Um desses poucos casos foi Harlom
Curtice, que havia começado como contador na Spark & Plug, onde seu desempenho o
levou a gerente geral para, em seguida, assumir a gerência geral da Buick.
A mudança na estrutura e funcionamento da organização foi debatida pelo grupo
do conselho de administração formado por Sloan (presidente), Donaldson Brown (vicepresidente) e os representantes da Du Pont, Lammont Du Pont e Walter Carpenter.
Depois de mais de um ano de discussão, em junho de 1945, o conselho aprovou a
reorganização no topo da gestão da General Motors, com a definição de três comitês. O
Comitê de Política Operacional (CPO), composto por executivos corporativos de staff e
operações, seria responsável por aprovar políticas formuladas nos grupos de políticas sob
sua orientação. O Comitê de Política Financeira (CPF), formado por representantes da Du
Pont, executivos do staff financeiro e os presidentes da Genenral Motors e do conselho de
administração. O CPF possuía total poder sobre a aprovação de gastos de capital e todas
as políticas de contabilidade e controladoria. O terceiro comitê era o Comitê de
Administração (CA), que seria formado pelos membros do CPO, mais os gerentes das
principais divisões. O CA teria um caráter consultivo, apenas recomendando sua
avaliação sobre novas políticas ao CPO. Alfred Sloan passou a presidência do CPO, que
significava a função de CEO, para Charles Wilson e, para que continuasse como
presidente
do
conselho,
a
aposentadoria
compulsória
aos
setenta
anos
foi
excepcionalmente suspensa. Albert Bradley assumiu a presidência do CPF, com a
decisão de Donaldson Brown de se aposentar.
110
A implementação do plano de expansão durou de 1945 a 1947, quando foram
investidos na reconversão, ampliação e modernização de plantas U$ 588 milhões, U$ 88
milhões a mais do que originalmente planejado. O plano desenvolvido estabeleceria a
capacidade produtiva em 14 mil carros e 3,5 mil caminhões por dia e incluía o programa
de um novo carro compacto, o Chevrolet Cadet, que iria atender a uma demanda
potencial para veículos baratos, identificada em pesquisas junto ao consumidor, e
assegurar os níveis de participação de mercado de sua maior divisão. No entanto, a
seqüência de eventos em 1946 obrigou a GM a rever as metas de seu plano.
A liberação das atividades e a retomada do consumo no final de 1945 e início de
1946 provocou escassez de matéria-prima e uma onda de inflação na economia
americana. A General Motors, apesar de seus investimentos, não era capaz de ocupar
toda a capacidade e o volume de vendas ficou abaixo do esperado. Adicionalmente, uma
greve dos operários que reivindicavam a recuperação dos salários congelados desde
1941 paralisou as fábricas por 113 dias. Diante das perspectivas de queda na receita e
nos lucros, a GM reduziu suas metas de expansão, postergando parte das obras de
construção do centro de engenharia, e reduziu seu programa de produção, retendo
expansão da capacidade em 10 mil carros e 2,5 caminhões por dia. Outro corte relevante
foi o cancelamento do programa do Cadet. O carro compacto da Chevrolet já era motivo
de controvérsia entre finanças e operações. O CPF alegava que o Cadet seria somente
de U$ 100 a U$ 150 mais barato do que o próximo veículo mais barato da linha, que por
sua vez era maior e mais luxuoso e, portanto, teria baixo retorno sobre o investimento. Já
o CPO argumentava que o produto era importante para proteger a participação de
mercado da Chevrolet. Com a nova necessidade de priorizar investimentos, o CPF
prevaleceu.
Além disso, a GM precisou recorrer a alternativas de financiamento externo para
manter níveis seguros de caixa. Em 1946, U$ 125 milhões em títulos de 30 anos a 2,5%
foram vendidos para um grupo de oito seguradoras. Em seguida, outros U$ 100 milhões
em ações preferenciais foram emitidos. As medidas de contenção de gastos e
investimento surtiram efeito nos números financeiros. Em 1946, a receita havia caído
37% em relação ao ano anterior, e o lucro de U$ 87 milhões foi insuficiente para pagar os
dividendos daquele ano. No ano seguinte, a GM bateu seu recorde histórico de lucro, U$
288 milhões, e com as sobras de caixa, antecipou o resgate de seus títulos para 1949.
111
4.1.12.
Negociações com a UAW e o contrato de 1948
Além dos problemas de oferta de matéria-prima que surgiram na recuperação do
pós-guerra, uma grande movimentação dos operários da GM e da UAW, em favor da
reposição dos salários comprimidos pela inflação durante a guerra, tomou conta de parte
da agenda dos executivos. O presidente norte-americano Harry Truman anunciou o
descongelamento dos salários nos Estados Unidos em agosto de 1945, e o contrato da
GM com a UAW terminaria em novembro.
Em outubro, os ânimos começaram a
esquentar com a proposta encaminhada por Walter Reuther, líder da UAW, exigindo
aumento de 30% nos salários. Charles Wilson respondeu que nesses termos os preços
dos veículos aumentariam em 30% no dia seguinte. A negativa do presidente da GM
levou a UAW a anunciar a greve no final de 1945 na maioria das fábricas da empresa.
Entre 1937 e 1941 as negociações da GM com o sindicato eram conduzidas pelo
então presidente William Knudsen, acompanhado do vice-presidente de assuntos
jurídicos, John T. Smith, e do vice-presidente de finanças, Donaldson Brown. Quando a
greve teve início em 1945, Sloan, ainda como CEO, nomeou um novo grupo negociador
liderado por Charles Wilson, juntamente com outros executivos de operações de Detroit.
O impasse, entretanto, estendeu a greve pelos últimos 40 dias do ano e chegou a janeiro
de 1946 sem perspectivas de acordo.
Com o intuito de mediar a solução de um assunto que ganhava grande
repercussão no país, o presidente Truman nomeou uma comissão de três pessoas, que
tinham a tarefa de indicar uma proposta de reajuste dentro da capacidade de pagamento
da indústria. Em 10 de janeiro de 1946, a comissão do governo apresentou a
recomendação de aumento de 17,5% nos salários, sem repassar custos para os preços
dos produtos. A proposta do governo foi prontamente rechaçada por ambas as partes, e o
impasse continuou.
A greve, que ocorria simultaneamente na Ford e na Chrysler, representava altos
custos para empresas e também para as famílias dos trabalhadores, que ficavam sem
receber salários. Durante o tempo em que as plantas da GM ficaram paralisadas, o caixa
da empresa reduziu de U$ 378 milhões para U$ 219 milhões. A solução para o impasse
começou no final de janeiro, quando Chrysler e, logo em seguida, Ford estabeleceram
acordo com representantes locais da UAW, concedendo um aumento de 18,5% nos
salários. Em 13 de fevereiro, as fábricas da General Motors representadas pelo sindicato
112
United Electrical Workers (UEW) aceitaram os 18,5% de reajuste e restaram apenas as
fábricas da GM representadas pela UAW. Apesar da precedência aberta por outros
contratos, a UAW resistiu por mais um mês e, após 113 dias de greve, assinou um
contrato de dois anos com a General Motors, em troca do aumento de 18,5% e de outros
benefícios, como a equiparação do salário feminino, a preferência de transferência para
os mais velhos, adicional de hora-extra e pagamento de férias.
O acordo fechado com a UAW assegurou a estabilidade na produção pelo resto do
ano de 1946 e durante todo o ano seguinte, porém, no início de 1948, a UAW iniciou as
movimentações para nova negociação. Em março, a UAW apresentou proposta para um
novo contrato, que foi considerado ultrajante por executivos da GM. Dentre os termos de
negociação exigidos pelo sindicato incluíam-se aumento nominal de 25 centavos por hora
nos salários (em torno de 18%), programa de pensão e aposentadoria e garantia de
semana de 44 horas.
A reação da General Motors diante da oferta inicial da UAW foi de evitar o início de
diálogo nos termos apresentados. Com isso, a movimentação das partes permaneceu fria
nos dois meses seguintes. Em 12 de maio, a UAW iniciou greve nas fábricas da Chrysler
e começou também a mobilizar operários nas fábricas da GM para a votação sobre nova
greve. Diante da iminente ameaça de prejuízos como os de 1946, a GM decidiu
encaminhar uma proposta para uma nova fórmula de reajuste salarial. Desde 1941,
Charles Wilson vinha defendendo internamente a formulação de um sistema de reajuste
dos salários de acordo com o impacto da inflação sobre o custo de vida dos
trabalhadores. Os estudos de Wilson haviam sido colocados de lado devido ao
congelamento dos salários, no início da guerra. Além disso, internamente, a proposta
inicial foi severamente criticada, tachada de mecanismo gerador de inflação. Porém, com
Wilson como presidente da GM (chefe de operações) e do CPO (chefe do executivo), sua
proposta foi novamente colocada na pauta.
A proposta tinha por princípio separar o cálculo do reajuste do salário em dois.
Uma parte do reajuste, chamada de ajuda de custo11, seria variável de acordo com a
inflação, e a outra seria um aumento de salário, chamado de ganho de produtividade, com
valor anual pré-fixado no contrato. O sindicato aceitou o princípio apresentado, e uma
negociação foi estabelecida para acertar os detalhes. A fórmula final e os demais itens do
11
Tradução livre do termo em inglês utilizado: cost allowance
113
contrato foram definidos por uma equipe mista de força-tarefa com dois representantes de
cada parte.
A validade do contrato foi estendida para três anos, e o ano-base para o cálculo do
reajuste da inflação seria 1940, último ano sem aumentos significativos dos preços. Com
isso, a defasagem, em relação à inflação, nos salários em vigor foi calculada em 9% e,
para compensar, a formação do salário-base para o cálculo foi adicionado em U$ 0,08 à
média salarial da GM, totalizando em U$ 1,49 (dólar por hora). Portanto, a fórmula final
para o reajuste ficou da seguinte forma para cada um dos três anos:
• A título de ganhos de produtividade, aumento anual de U$ 0,03 (por hora), cerca de
2%;
• A título de ajuda de custo, para cada 1,14% de aumento na inflação anual, reajuste de
U$ 0,01 (por hora).
Na fórmula de reajuste, o ganho de produtividade previa um aumento automático,
que seria concedido independentemente de haver ganho real na eficiência das atividades
produtivas. Outros benefícios concedidos no acordo de 1948 incluíam um plano de
pensão para os empregados e seguro de saúde que cobria também suas famílias. Os
gastos com os dois benefícios criados seriam cobertos por meio de um fundo de
investimento em ações, criado por Charles Wilson. Como contrapartida, a UAW
concederia flexibilidade à GM para automatizar processos da linha de produção.
Alem disso, a partir deste acordo, GM e UAW estabeleceram uma nova dinâmica
para solução de controvérsias enquanto o contrato estivesse em vigor. GM e UAW
criaram um sistema de hierarquias de comitês para a resolução dos problemas que
emergiam do chão-de-fábrica, por meio da definição de quatro instâncias de negociação.
A primeira tratava da negociação direta entre sindicado e encarregados de produção. As
questões, não resolvidas passariam a ser tratadas entre o comitê de fábrica,
representantes eleitos pelos operários e a gerência da planta. A instância seguinte seria
um conselho de apelação, que envolveria representantes da UAW regional e gerentes da
divisão. Somente após estas etapas a solução para o conflito iria para mediação e
arbitragem externa.
O contrato assinado pela GM e a UAW em 1948 significou um marco nas
negociações sindicais dali por diante e seu modelo seria replicado para toda a indústria.
As próximas negociações entre GM e o sindicato adotariam diversas revisões deste
114
modelo, como, por exemplo, aumento nos valores concedidos com ganhos de
produtividade, rebalanceamento dos índices de ajuda de custo, ampliação do prazo para
cinco anos e inclusão de benefícios, como seguro desemprego complementar.
Entretanto, os princípios de contrato de longo prazo e a fórmula de reajuste salarial
seriam adotados como padrão, assegurando à GM um longo período de estabilidade, sem
greves entre 1948 e 1971
4.1.13.
Hegemonia recuperada na gestão Wilson
Os eventos inesperados em 1945/1946 retardaram o retorno das condições
projetadas para a indústria e, conseqüentemente, alguns dos planos elaborados pela GM
em 1944 e 1945 tiveram de ser protelados. No caso dos mercados externos, a
recomendação foi para operar via subsidiária, nos países onde a indústria automotiva
estivesse instalada, e via exportação de veículos prontos ou desmontados nos demais
países. Logo após o final do conflito na Europa, a GM retomou as atividades na inglesa
Vauxhaul e iniciou a formação de uma subsidiária na Austrália, onde havia adquirido a
fábrica de peças da Holden em 1931. Contudo, as operações da GM na alemã Opel não
foram retomadas até 1948. Uma prolongada indecisão, que envolvia diferenças nas
visões do CPO e do CPF, prorrogou as negociações para que a GM assumisse o controle
de suas plantas. Também somente em 1948, a GM se desfez de suas ações da North
American e da Bendix, mantendo a Allison na indústria de aviões, como havia sido
recomendado pelo plano do pós-guerra.
Durante os primeiros anos do pós-guerra, o esforço para restabelecer a indústria
fez com que as fabricantes de veículos oferecessem modelos bastante semelhantes
àqueles que eram oferecidos em 1941, de forma a poderem priorizar a reconversão de
suas linhas. Contudo, conforme a atividade da indústria se normalizou, as empresas
voltaram a pensar os diferenciais competitivos de seus produtos. A General Motors havia
construído uma grande vantagem sobre suas concorrentes com a centralização de
desenvolvimento de técnicas de design durante os anos 1920 e 1930. No entanto, após a
Segunda Guerra, suas duas principais concorrentes, Ford e Chrysler, procuraram reduzir
a distância em relação à líder e adotaram laboratórios e procedimentos para
desenvolvimento de estilo semelhantes aos da General Motors, inclusive contratando
alguns de seus designers. Com isso, as inovações em design ditaram o ritmo da
competição na indústria no final da década e continuariam durante os anos 1950.
115
O laboratório de estilo da GM, liderado por Harley Earl, desenvolveu a primeira
versão do design que ficou famoso como “rabo de peixe”, lançado no modelo do Cadillac
de 1948. O rápido sucesso fez com que o conceito fosse replicado para as demais
divisões e se tornasse um padrão da indústria durante os 15 anos seguintes. O processo
de desenvolvimento de novos modelos da GM permaneceu semelhante ao que havia sido
formalizado em 1935, apesar da revisão sofrida em 1946. O laboratório de estilo, as
divisões e o staff de engenharia concordavam sobre atributos mecânicos e de design para
renovação anual dos modelos, com a mediação e supervisão do grupo de política de
engenharia.
Além do design, outro artifício que retomou sua importância no final da década de
1940 foi o crédito ao consumidor. A ferramenta de crédito vinha sendo amplamente usada
por fabricantes de veículos desde os anos 1920 para impulsionar vendas, a ponto de o
governo dos Estados Unidos apontar abusos durante os anos 1930. A GM havia sido
forçada a alterar seu plano de financiamento de 1935, devido a uma divulgação que
causava dúvidas ao consumidor, e foi novamente contestada pelo governo em 1938 e
1939 em duas ações antitruste que envolviam também Ford e Chrysler. O período de
guerra nos anos 1940 havia esfriado as atividades de crédito e os processos na justiça,
porém, ao final da década os questionamentos voltaram a ganhar força, e a GM, que
vinha negando irregularidades em seu sistema de crédito, negociou uma saída na forma
de uma nova legislação para regulamentar tal atividade na indústria.
Ao final de 1947, conforme a GM se aproximou da conclusão da ampliação da
capacidade, Charles Wilson apresentou um novo programa de expansão produtiva,
estimando um investimento total de U$ 600 milhões, e que seria implementado ao longo
de 1948 e 1949. No entanto, o CPF, responsável pela aprovação financeira, autorizou
apenas parte dos projetos do programa, que totalizava U$ 273 milhões, e decidiu
prorrogar a avaliação do restante do plano elaborado pela organização de operações.
Ambos os planos de ampliação da capacidade após a Segunda Guerra tiveram o
escopo reduzido pelo CPF, um no início e outro ao final de 1947. No entanto, as vendas
de veículos nos Estados Unidos decolaram a partir de 1946 e chegaram ao volume
recorde de cerca de oito milhões de unidades em 1950. A rápida aceleração da demanda
permitiu que as empresas aumentassem significativamente os preços dos veículos. Em
julho de 1948, o CPF comunicou ao CPO que a fórmula de preços definida pelo método
stadard-volume não determinava limites máximos para os preços, e que ficava a cargo de
116
operações aumentarem as margens além do necessário para atingir as metas de retorno.
Com isso, os preços dos veículos da GM aumentaram 8% naquele mês.
Quadro 4-4 Margem líquida de GM, Ford e Chrysler e vendas da indústria entre 1946
e 1950
1946
1947
1948
1949
1950
General Motors
Ford
Chrysler
Vendas totais da indústria
(em mil unidades)
4,5%
7,5%
9,4%
11,5%
11,1%
-0,9%
4,2%
4,9%
7,9%
8,6%
3,1%
4,9%
5,7%
6,3%
5,8%
3.089
4.797
5.285
6.253
8.003
Fonte: Relatórios anuais Moody’s de GM, Ford e Chrysler de 1947 a 1951 e Chandler (1964) p. 4.
Nos dois anos seguintes, a tendência se manteve tanto na GM quanto em suas
concorrentes. O resultado foi o aumento significativo da margem líquida das empresas
entre 1946 e 1947, como pode ser observado na tabela X acima. As margens líquidas
obtidas por GM e Ford em 1949 e 1950, respectivamente, representaram suas melhores
marcas deste indicador desde a Segunda Guerra até o final do século XX. Para a
Chrysler, o ano de 1949 significou sua terceira melhor marca, ultrapassada apenas no
biênio 1984 e 1985.
Apesar de aproveitar-se da escassez da oferta de veículos, a General Motors teve
que, ao mesmo tempo, mobilizar sua organização de vendas para coibir comportamentos
oportunistas em sua rede de concessionários que, diante do aumento na demanda,
também procuraram meios de obter vantagens.
As redes de distribuição das divisões da GM passaram a ter processos formais de
expansão a partir dos anos 1920. O método da General Motors para designar os pontos
de vendas de suas divisões estabeleceu fórmulas para encontrar o potencial de vendas
de cada região e, baseado nisso, as divisões submetiam pedidos de nomeação ou
substituição de concessionárias. As organizações de venda das divisões, sob a
coordenação de Richard Grant, construíram amplas redes de lojas e, durante a década de
1930, a coordenação da rede de distribuição foi complementada com a criação de duas
instâncias de mediação. Uma delas foi o Comitê de Distribuidores, em 1934, cujo objetivo
era servir de fórum consultivo entre concessionários e executivos para auxiliar no
desenvolvimento de políticas de distribuição. Quatro anos depois, foi criado o Conselho
117
de Relação com Distribuidor, que era composto de executivos corporativos, com a tarefa
de mediar preventivamente conflitos que surgissem entre concessionários de divisões.
As políticas que tratavam da relação entre GM e concessionários era amparada
dentro de um contrato de franquia. Todo o aparato desenvolvido pela GM para organizar
sua atividade de vendas fez com que esse contrato evoluísse ao longo dos anos.
Entretanto, em 1949, duas cláusulas do contrato de franquia tiveram que ser retiradas,
alterando as condições de competição entre concessionários. As cláusulas que
determinavam a fixação do preço pelo fabricante e a área geográfica de atuação foram
removidas depois que a GM consultou o Departamento de Justiça norte-americano e
descobriu que ambas feriam a legislação antitruste. Assim sendo, no final da década de
1940, o desequilíbrio entre oferta e demanda provocou o surgimento de duas práticas
desleais de venda, o “price packaging” e o “bootlegging” 12.
O price packing foi o nome dado à prática do concessionário de adicionar margens
extras, atribuindo-as a itens fictícios de custos ou taxas. Por exemplo, Rubenstein (2001)
relata que o revendedor de carros, durante os anos 1950, determinava o preço com a
seguinte composição:
•
Custo de aquisição;
•
Margem bruta de 1/3 do custo do veículo;
•
Despesas de frete e de propaganda e armazenagem, repassadas diretamente ao
consumidor;
•
Adicional de serviço de 10%;
•
Margem adicional sobre acessórios equipando o veículo.
Dos itens acima, apenas custo de aquisição e despesas de frete eram práticas
regulares na determinação do preço; os demais passaram a ser aplicados de forma
oportunista. Os consumidores levaram um tempo para descobrir que o preço passara a
ser diferente entre concessionárias, mas quando isto ocorreu, tornou-se um hábito de
compra percorrer as lojas em busca do melhor negócio.
Além disso, a diferença do preço no frete cobrado para cada região estimulou a
prática de bootlegging, nome dado quando o concessionário de uma região, onde o frete
12
Decidiu-se por manter os termos em ingles, pois ambos significam práticas específicas, restritas à atividade
da comercialização de veículos, cujas expressões equivalentes em português não foram encontradas.
118
era baixo, levava veículos novos para serem vendidos em regiões de frete caro, atraindo
consumidores que comprariam nas lojas daquelas regiões. No começo dos anos 1950, o
preço do frete para Detroit era de U$ 11 enquanto que para Los Angeles ou São
Francisco chegava a U$ 280. De acordo com Rubenstein (2001), no começo dos 1950,
um quinto das vendas de novos veículos na Califórnia era feita por meio de bootlegging.
Ambas as práticas nasceram no período de escassez de oferta do final dos anos
1940 e perduraram nos anos 1950. O price packing só veio a ter fim em 1958, quando
uma nova legislação obrigou fabricantes a indicarem o preço sugerido em gravações no
vidro dos veículos. Já o bootlegging foi eliminado em 1965, quando a GM passou a
reduzir a diferença entre os preços dos fretes cobrados em cada região, incorporando no
preço de venda do atacado o custo dessa equalização.
O aumento dos preços e, conseqüentemente, das margens de lucro dos veículos,
fortaleceu o resultado apresentado pelas divisões da General Motors. Com isso, a gestão
de Charles Wilson, durante a segunda metade da década de 1940 foi marcada por
significativa melhora nos indicadores de desempenho. Por exemplo, o faturamento da GM
saltou de U$ 1,9 milhão para U$ 7,5 milhões entre 1946 e 1950. No mesmo período, o
lucro saiu de U$ 87 milhões para U$ 834 milhões, enquanto a participação de mercado foi
de 36,4% para 45,2%. Dado que estes resultados foram obtidos apesar da redução nos
investimentos em 1947, houve um natural aumento nos índices de retorno sobre o ativo,
saindo de 4,4% em 1946, para 24,2% em 1950.
A despeito do sucesso financeiro, outras questões atraíram a atenção de Charles
Wilson ao final dos anos 1940.
Durante o pós-guerra, muitos dos executivos mais experientes e que ocupavam as
principais posições corporativas se aproximavam da aposentadoria. Uma linha de
sucessão se fazia necessária, contudo, apesar de entregarem bons resultados
financeiros, poucos gerentes de divisões eram suficientemente experientes para serem
promovidos a executivos corporativos. Dentre os gerentes das divisões, Nicholas
Dreystadt, gerente geral da Chevrolet, e Harlom Curticem, gerente geral da Buick, eram
os mais experientes e, em tese, favoritos para uma sucessão. Com a morte de Draystadt
em 1946, Curtice tornou-se a principal opção e, como parte de sua preparação para
sucessão, Charles Wilson o nomeou vice-presidente executivo encarregado do staff.
Ainda assim, diante da escassez de potenciais sucessores, Wilson trouxe Roger Kyes de
119
fora da General Motors para ser assistente especial da presidência. Kyes serviria como
alternativa caso houvesse qualquer contratempo na carreira de Harlom Curtice.
Em junho de 1950, teve início o conflito armado entre as Coréias do Norte e do
Sul. A intervenção americana no mês de julho alertou a indústria para o início de uma
nova preparação para abastecimento de equipamentos de defesa às forças armadas. Os
Estados Unidos declararam estado de emergência em dezembro de 1950 e entraram
definitivamente no confronto, que duraria até 1953. Novamente a GM teria participação
significativa no fornecimento ao governo americano, entretanto, as circunstâncias do novo
conflito eram diferentes da experiência da Segunda Guerra Mundial. O governo anunciou
o retorno do controle sobre preços e salários, porém, não impôs restrições à produção
civil, com exceção de algumas matérias-primas, como borracha e cobre. Além disso, os
contratos de fornecimento do governo teriam novamente a limitação de 10% da margem
de lucro.
Diante da evolução da indústria nos anos anteriores e da perspectiva de
investimento em fábricas de equipamentos bélicos, a General Motors elaborou um
ambicioso plano de investimentos em novas fábricas, aprovado pelo CPF em março de
1951. A GM decidiu incluir no plano a antecipação de sua preparação para atender à
demanda reprimida que se previa ocorrer com o término da guerra. Desta forma, os
esforços de expansão seriam divididos entre as plantas para finalidade civil, que deveriam
ficar com 80% capacidade, e plantas de defesa, que teriam 20%. Além disso, as fábricas
de materiais de defesa seriam financiadas com capital próprio, e deste modo poderiam
ser construídas com a preparação para serem convertidas em fábrica de automóveis
assim que o contrato de defesa terminasse. Ao final do plano, o aumento da capacidade
produtiva seria de 24%, chegando ao volume anual de 4,5 milhões de unidades. O
investimento previsto foi de U$ 750 milhões, sendo U$ 300 milhões para instalações e
máquinas para produtos de defesa e U$ 450 milhões para reconversão e modernização
da produção de veículos. Para cobrir os investimentos, a GM reduziria os dividendos de
U$ 6 para U$ 4 por ação e diminuiria exigências de caixa da empresa.
Ao final de 1952, no decorrer da Guerra da Coréia, Dwight D. Eisenhower foi eleito
presidente dos Estados Unidos, sucedendo Harry S. Truman. Charles Wilson aceitou o
convite para assumir como secretário de defesa americano e renunciou à presidência da
General Motors em dezembro. No lugar de Wilson, assumiu Halom H. Curtice, que desde
1948 era vice-presidente executivo, encarregado das atividades de staff.
120
4.1.14.
Gestão Harlom Curtice
Os produtos para atender aos contratos de defesa durante a guerra da Coréia
eram versões avançadas daqueles fabricados durante a Segunda Guerra. A General
Motors foi novamente a principal fornecedora do governo dos Estados Unidos, com
contratos totalizando U$ 5,7 milhões. Esta, porém, seria a última vez que equipamentos
para as forças armadas teriam destaque nas atividades da GM. A partir de 1955, os
contratos de defesa buscariam fornecimento de artefatos mais sofisticados, como mísseis
balísticos e componentes de armas nucleares, e grande parte do foco sairia da produção
para atividades de pesquisa e desenvolvimento. Com isso, a GM teria sua participação
em contratos reduzida gradualmente, embora duas divisões permanecessem ligadas à
atividade militar. A Allison manteve-se como fornecedora de motores de aviões de
combate e transmissões para veículos pesados, como tanques e caminhões. E a AC
Spark & Plug passou a participar no desenvolvimento e fabricação de sistemas de
navegação, utilizados principalmente em mísseis teleguiados e futuramente no programa
aeroespacial americano.
Harlom Curtice assumiu a presidência da GM e do CPO seis meses antes do fim
da guerra, ainda com contratos em andamento, e enquanto a GM executava suas obras
de expansão e modernização da produção. Também no início de seu mandato, uma ação
antitruste movida pelo Departamento de Justiça norte-americano contra a relação da Du
Pont com a GM intimidou as interferências dos acionistas no CPF e no Conselho de
Administração. Nesse contexto, Curtice promoveu alterações na organização corporativa,
centralizando decisões em suas mãos e, ao mesmo tempo, envolvendo mais as divisões
no processo de formulação de políticas. Curtice decidiu não nomear substituto para sua
antiga posição. Ao invés disso, ele acumulou sua função anterior, fazendo com que toda
atividade de staff respondesse diretamente à pessoa do presidente e CEO, e não mais ao
CPO. Além disso, contrariando o já tradicional princípio de gestão da GM de separar
estratégia e administração, Curtice aprovou, em 1954, a nomeação de dois gerentes de
divisões de automóveis ao CPO e ainda manteve todas as divisões não automotivas,
inclusive caminhões, respondendo diretamente a ele.
O novo CEO da GM, apesar de não ser engenheiro, desenvolveu durante sua
carreira nas divisões uma longa experiência em operações. A forma centralizada, e ao
mesmo tempo mais próxima das unidades de negócios, em que a organização corporativa
passou a funcionar, acelerou a velocidade das decisões e aumentou a influência das
121
divisões nos rumos da organização. Mas, por outro lado, o estilo adotado por Curtice para
conduzir as reuniões do CPO, onde políticas eram aprovadas, reduziu o debate sobre as
propostas apresentadas. De acordo com (Freeland, 2001), Harlom Curtice limitava os
executivos, durante as reuniões do CPO, a emitirem suas opiniões somente quando o
assunto em discussão envolvesse sua respectiva área ou divisão.
Ao final de 1953, os gastos com fábricas e equipamentos, que haviam sido
previstos em U$ 750 milhões para os três anos, chegara à marca de U$ 1,28 bilhão. A
demanda de veículos se recuperou em relação aos dois anos anteriores e chegou a 7,3
milhões de unidade. A participação de mercado da GM aumentou em relação a 1951 e
1952, voltando para a casa dos 45%, e o faturamento ultrapassou a marca de U$ 10
bilhões, embora o lucro líquido não tenha aumentado na mesma intensidade, devido ao
limite de margens de lucros nas vendas ao governo. Ainda assim, totalizaram U$ 1,66
bilhão nos três anos.
A General Motors anunciou no início de 1954 um novo ciclo de investimentos,
prevendo a aplicação de U$ 1 bilhão ao longo de dois anos. O valor do investimento
superaria as perspectivas de geração de caixa e, portanto, a GM antecipou futuras
necessidades de capital recorrendo a financiamento externo. Um mês antes do anúncio,
em dezembro de 1953, o staff financeiro da GM realizou uma bem sucedida emissão de
debêntures, com vencimento em 25 anos, a 3,25% ao ano, totalizando uma captação de
U$ 298,5 milhões depois dos descontos.
Depois de um ano de seu lançamento, o plano de investimentos foi ampliado para
U$ 1,5 bilhão e, até o final de 1955, seria aumentado novamente, chegando a U$ 2
bilhões. Para mobilizar os recursos necessários, o CPF e o Conselho de Administração da
GM aprovaram uma oferta a seus acionistas de 4,38 milhões de lotes de novas ações a
U$ 75. A emissão foi bem sucedida e a GM captou U$ 325 milhões, após descontos, para
completar seu plano. Os investimentos de 1954/1955 visavam não somente ampliar
fábricas de veículos, mas principalmente novas ferramentas e equipamentos para fábricas
de acessórios e componentes, tais como ar-condicionado, power-brakes, motores V-8 e
direção hidráulica, que em meados da década de 1950 passaram a ser essenciais na
competição entre as Três Grandes: GM, Ford e Chrysler13.
13
A referência ao grupo formado por GM, Ford e Chrylser, como as “Três Grandes” é traduzido da expressão
Big Three, comumente utilizada nos Estados Unidos e outros países de lingua inglesa para denominar as três
maiores empresas americanas do setor automotivo
122
A indústria automobilística veio gradualmente aumentando os investimentos em
design e engenharia desde 1948, à medida que a turbulência do pós-guerra começou a
estabilizar e a demanda voltou crescer. A renovação anual dos modelos determinou o
ciclo da disputa pelo mercado entre fabricantes, e o volume de vendas passou a ser
condição necessária para amortizar despesas com staffs de desenvolvimento. Com isso,
os poucos fabricantes independentes que restavam, além das Três Grandes, entraram em
franco processo de declínio e em poucos anos deixariam o mercado de veículos.
Portanto, a década de 1950 assistiu a uma intensa competição por inovações em estilo e
atributos de engenharia entre as empresas, porém, a supremacia da General Motors em
relação a concorrentes evitou que os efeitos da concorrência chegassem aos preços dos
veículos.
A GM possuía, desde 1937, a preocupação explícita de não caracterizar sua
dominação do mercado de forma a levantar questionamentos sobre violação das leis
antitruste. Assim sendo, sua participação de mercado era monitorada de forma a não
ultrapassar 50%, deixando os outros 50% para os concorrentes. Esta condição fez com
que os preços dos veículos, ao longo da década de 1950, aumentassem em média 43%,
o dobro da inflação (RUBENSTEIN, 2001), apesar da intensa disputa entre as Três
Grandes. O exemplo a seguir ilustra a sincronia no aumento de preços na época. Em
1956, a Ford lançou seus modelos com um aumento nos preços de U$ 50 em relação ao
ano anterior. Quando os modelos da Chevrolet de 1956 foram anunciados, incorporando
aumentos entre U$ 50 e U$ 160, a Ford se viu obrigada a aumentar seus preços em mais
U$ 50, equiparando-se à Chevrolet. A alternativa de manter os preços mais baixos e de
ganhar participação de mercado não era viável, uma vez que a GM dispunha de força
desproporcional para reagir. Sendo assim, a Ford preferiu aumentar suas margens e
assegurar uma operação lucrativa.
O mercado de veículos apresentou algumas mudanças, durante a década de
1950, em relação ao hábito de consumo dos americanos. O crescimento da renda fez
com que gradualmente as famílias passassem de um único carro, geralmente com
carroceria tipo sedan para acomodar a família e bagagens, para dois veículos por
residência e, eventualmente, mais de dois carros, quando filhos atingiam idade para
dirigir. Com isso, emergiram ao longo da década variações de estilo, como carros
esportivos, conversíveis com capota retrátil, peruas, além dos importados compactos,
sendo o mais bem sucedido deles o Volkswagen Fusca.
123
Sob o comando de Curtice, as divisões ganharam maior flexibilidade para aprovar
os programas idealizados por suas engenharias. Os desenvolvimentos de design eram
conduzidos em estreito relacionamento das divisões com o laboratório de estilo que
mantinha estúdios e designers separados para cada uma delas. Os staffs de engenharia
continuaram coordenando as atividades de desenvolvimento através do GPE, porém,
agora respondendo diretamente a Curtice.
O presidente tratava diretamente com as
divisões e a influência do gerente geral da divisão, na opinião de Curtice, significou mais
autonomia na aprovação de novos modelos, tornando mais rápidas a ação e a reação em
relação concorrência.
A General Motors consolidou sua estrutura de engenharia e estilo quando
inaugurou, em 1956, o centro de tecnologia, batizado em homenagem a Charles F.
Kettering, ex-vice-presidente executivo de pesquisa, que se aposentara em 1947. O
centro de tecnologia, em Warren, Michigan, iniciado após a Segunda Guerra, seria
comandado pelo substituto de Kettering, o PhD. em ciência nuclear, Lawrence R. Hafstad.
Com investimento total de U$ 150 milhões, a GM construiu um complexo de cinco prédios
que abrigaria as atividades de desenvolvimento de quatro mil funcionários, sendo 1300
alocados em pesquisas específicas, 1200 em estilo e outros 700 em desenvolvimentos de
engenharia e manufatura. Em seu discurso de inauguração, Hafstad deixou claro que as
atividades de pesquisas da GM não iriam aplicar esforços exagerados em pesquisa pura,
e que era essencial colher os frutos de tal atividade em um prazo não muito longo.
Para acelerar o desenvolvimento de produtos nas divisões, Curtice reforçou suas
equipes de engenharia. A Cadillac havia despontado com seus luxuosos carros, estilo
rabo de peixe, no final da década de 1940 e continuou a desenvolver modelos nesta linha
durante a década de 1950, juntamente com as intermediárias Buick e Oldsmobile. O
engenheiro de desenvolvimento da Cadillac, Ed Cole, foi transferido para a Chevrolet, a
fim de renovar seus modelos V-6, que vinham perdendo em atratividade aos V-8 da Ford.
A Pontiac não dispunha de um grande staff de engenharia e seus modelos eram
relativamente os mesmos oferecidos desde o fim da Segunda Guerra. Para renovar a
divisão, Curtice nomeou Semon E. Knudsen, filho do ex-presidente da GM, William
Knudsen, como gerente geral da Pontiac para comandar a renovação daquela divisão.
Knudsen trouxe Elliont Estes para ser chefe de engenharia e buscou na luxuosa Packard,
então em processo de concordata, o engenheiro John Z. Delorean. O resultado do esforço
de desenvolvimento foi o lançamento de carros com design mais esportivo, dentre eles os
124
Chevrolet Belair e o Corvette, um dos primeiros no estilo “muscle-car” que predominaria
na década seguinte, e os potentes e bem acabados sendas médios da Pontiac, o
StarChief e Bonneville.
Com o esforço das divisões no desenvolvimento e variação dos novos modelos, a
General Motors ofereceu em 1957 cerca de 450 opções de acabamento dos carros,
variando as 75 carrocerias (duas portas, quatro portas, perua, conversível) sobre três
tamanhos básicos de chassi (A, B e C) entre suas cinco divisões (CRAY, 1980). A
variação de modelos e versões realçou a importância da criação de novas ferramentas e
da preparação da linha de montagem nos custos de desenvolvimento de novos produtos.
E, para lidar com tal variedade durante a década de 1950, o staff corporativo de
engenharia de manufatura, estabelecido em 1945, promoveu uma série de estudos sobre
as alternativas de automação da linha de produção que levaram ao início da aplicação de
sistemas de computadores para gerenciar a montagem dos produtos.
No entanto, a agilidade de reação à concorrência, incentivada por Harlom Curtice,
por vezes causou aumentos crônicos nos custos de desenvolvimento e fabricação dos
veículos. Durante a década de 1950, não seria raro ocorrer mudanças de última hora nos
planos dos produtos, com o andamento da implementação avançado, para reagir a
inovações anunciadas por Ford ou Chrysler. Isto freqüentemente provocava uma
escalada dos investimentos, uma vez que havia um prêmio a ser pago aos fornecedores
para acelerar encomendas de novas ferramentas e equipamentos. Além disso, os custos
de produção aumentavam significativamente, dado que o atraso na preparação da linha
de montagem obrigava plantas a operarem em turnos extras, a fim de formar os estoques
a tempo do lançamento no início da temporada de vendas.
Durante o mandato de Harlom Curtice, a GM também empreenderia outros
esforços para ampliar suas vendas de veículos, além das atividades tradicionais de suas
divisões. A coordenação entre empresas da indústria, sob a forma de associações, teve
início
quase
que
simultaneamente que
a
própria
atividade
de
fabricação e
comercialização de veículos automotores. A National Association of Automobile
Manufactures (NAAM), a já mencionada ALAM e o National Automobile Chamber of
Commerce (NACC) foram precursores, no início do século XX, em promover a
cooperação entre fabricantes, no sentido de construir legitimidade e difundir o automóvel
perante a sociedade americana.
Estas entidades foram sucedidas pela Automobile
Manufacturers Association (AMA), em 1934, que tornou-se a principal representante do
125
setor na promoção da educação de trânsito, organização de feiras e salões e no apoio a
construção de estradas pavimentadas. Em 1943, a AMA, sob forte patrocínio da GM,
aliou-se a outras associações para formar a American Road Builders Association (ARBA),
com o intuito de organizar o lobby em favor de um amplo programa de construção de
estradas nos Estados Unidos.
Em 1954, o presidente americano Dwight Eisenhower nomeou uma comissão para
diagnosticar a real necessidade do país em termos de estradas. Para presidir a comissão,
foi nomeado o general Lucius D. Clay, importante integrante do governo de ocupação da
Alemanha após a Segunda Guerra, e que desde 1951 passara a ser o primeiro membro
do conselho da GM que não era acionista nem membro do executivo.
O resultado da comissão foi a apresentação do projeto de lei para a criação do
programa de construção de um sistema nacional de rodovias durante os próximos 16
anos, prevendo o investimento de U$ 25 bilhões de dólares, que seriam cobertos com
impostos sobre produtos ligados à utilização do automóvel (combustível, pneus etc.) e
pedágios nas estradas. A aprovação do plano durante o governo Eisenhower deu início à
construção de diversas estradas interestaduais e desencadeou um processo de formação
de áreas suburbanas nos Estados Unidos. Durante a segunda metade do século XX, as
famílias gradualmente passariam a preferir residências fora das regiões centrais das
grandes cidades e, assim, o uso do automóvel teria um papel cada vez maior no dia-a-dia
dos norte-americanos.
O sucesso em seu primeiro ano como presidente, ainda contando com a
participação dos contratos de defesa, foi apenas o início de uma seqüência de três anos
de forte crescimento e altos lucros vivida pela GM. Nos dois anos seguintes, o programa
de expansão de Curtice levaria a GM a aumentar seu volume de vendas em 36%, para
mais de 4,4 milhões de veículos, ficando a participação de mercado em torno dos 50%. O
faturamento em 1955 bateria novo recorde de U$ 12,4 bilhões e, sem os controles do
governo e com os aumentos nos preços, o lucro também bateu recorde, pela primeira vez
ultrapassando os nove dígitos e chegando a pouco mais de U$ 1,2 bilhão. O indicador de
retorno sobre o ativo aumentou de 13,6% em 1953, para 18% em 1955.
Passado os três primeiros anos de seu mandato, Curtice assistiu a uma inversão
nos negócios da GM a partir de 1956. As vendas da indústria, que haviam alcançado o
nível recorde de nove milhões de unidades, em 1955, nos dois anos seguintes giraram em
torno de sete milhões, queda de 25%. O volume de vendas e o faturamento da GM
126
caíram em 13% e 21%, respectivamente, em 1956, e permaneceram estagnados no ano
seguinte. O lucro líquido caiu 32%, para a faixa dos U$ 850 milhões, porém, com os altos
investimentos realizados na primeira metade da década, o retorno sobre o ativo caiu para
a casa do 12,5%. A queda do desempenho despertou pedidos de explicação vindas do
CPF para que Curtice justificasse as medidas adotadas em sua gestão.
O caso da Buick talvez tenha sido o mais crítico dentre as descobertas feitas pelo
CPF e o conselho de administração. No começo de 1956, a queda nos volumes da
indústria e a crescente competição dos importados da Volkswagen no mercado de preços
baixos fizeram com que Chevrolet, Ford e Plymouth, da Chrylser, incrementassem seus
modelos para disputar mercados onde as margens poderiam ser maiores. Com isso,
intermediárias como a Buick, Oldsmobile e Pontiac tiveram seus modelos espremidos na
luta por uma fatia de mercado menor. A Buick, divisão onde Curtice havia cumprido boa
parte de sua carreira, era a terceira marca mais vendida em 1955, com 780 mil unidades.
No começo de 1956, Harlom Curtice decidiu acumular a função de gerente da divisão
Buick, dedicando seus finais de semana em Flint para cuidar de suas tarefas
administrativas. Os dois anos que se seguiram foram de queda vertiginosa para a Buick:
31% em 1956 e 24% em 1957.
Pressionado por Sloan e por acionistas membros dos dois órgãos, Curtice nomeou
uma comissão para avaliar os recursos gerenciais da Buick e apontar um plano para
sucessão dentro da divisão. Apesar do esforço de Curtice para amenizar julgamentos
negativos sobre sua gestão, em 1958 ele chegaria a 65 anos e teria de se aposentar
compulsoriamente. Assim sendo, não lhe restaria tempo suficiente para reverter a
situação.
4.1.15.
Fim do ciclo Sloan-Du Pont e a reorganização
A preocupação manifestada pela Du Pont durante a década de 1930 sobre evitar
questionamentos a respeito da violação das leis antitruste não evitou que GM e Du Pont
enfrentassem o julgamento das autoridades regulatórias americanas. A magnitude das
operações da General Motors se destacava em comparação a qualquer outra empresa
dos Estados Unidos. Em 1955, quando a empresa obteve seu recorde de vendas na
década, o faturamento da GM correspondeu a 3% do PIB americano e foi
aproximadamente o dobro da segunda maior empresa do país, a Exxon Mobil.
Comparada a suas concorrentes, a GM detinha 50% do mercado, faturou 37% a mais e
127
lucrou o dobro do que suas duas principais concorrentes, Ford e Chrysler, juntas. A
desproporcional diferença entre a GM e as demais empresas chamou a atenção do
Departamento de Justiça dos Estados Unidos. Sobretudo na relação entre a General
Motors e a Du Pont, que, além de principal acionista e controladora, também era
fornecedora de produtos químicos, especialmente para as atividades de pintura.
Alguns processos relacionados à preservação da livre concorrência foram
movidos, ou tiveram desfecho, contra divisões da GM ao longo da década de 1950,
embora nunca diretamente relacionados às divisões de automóveis e caminhões. Em
casos como o da Euclid Company, de máquinas rodoviárias, o da GMAC, acusada de
restringir o comércio de crédito ao consumo, e do monopólio sobre a fabricação de ônibus
urbanos, a General Motors obteve êxito em contornar a situação, cumprindo as decisões
da justiça, porém sem grandes perdas e com alterações meramente administrativas em
suas atividades.
A investigação e os processos sobre a relação da Du Pont com a General Motors
tiveram início na segunda metade da década de 1940, e o seu desfecho no final dos anos
1950 foi decisivo para a realização de mudanças na organização e no funcionamento da
estrutura corporativa da General Motors. Tais mudanças ocorreram na transição da
gestão de Harlom Curtice para Frederic Donner, em meio a um contexto de profunda
alteração na composição do conselho de administração, bem como na relação entre
gestão e os acionistas da GM.
Alfred Sloan presidiu o conselho de administração da General Motors durante 22
anos, entre 1934 até 1956, quando, aos 80 anos de idade, renunciou ao cargo, depois do
falecimento de sua esposa Irene. Para o seu lugar, Sloan favoreceu a nomeação de
Albert Bradley, a quem Sloan há alguns anos vinha preparando, e era vice-presidente
executivo de finanças e presidente do CPF. A promoção de Bradley puxou uma seqüência
de promoções na organização de finanças, apontando a linha de sucessores formada por
Frederic Donner, Richard Gerstenberg e George Russel. No lado da organização de
operações, a linha de sucessão para o presidente e CEO, Harlom Curtice, também
começou a ser preparada, em 1956, com a nomeação de John F. Gordon para a vicepresidente de operações de produção de automóveis, promovido da gerência geral da
Cadillac, Ed Cole, chefe de engenharia, nomeado gerente geral da Chevrolet, James
Roche, ex-diretor de recusos humanos da Cadillac assumiu a gerencia geral no lugar de
128
Gordon, e além desses, Semom Knudsen passou a ser uma opção mais distante, à frente
da Pontiac.
A ação do Departamento de Justiça contra a Du Pont teve o julgamento em
primeira instância concedendo a vitória à Du Pont em 1954. Contudo, a decisão final da
Suprema Corte dos Estados Unidos, em 1957, condenou a E. I. Du Pont de Nemours na
acusação de restrição do comércio, por manter interferência na gestão da General
Motors, da qual era fornecedora de tintas automotivas e outros materiais químicos. A
sentença obrigava a Du Pont a se desfazer de suas ações da General Motors dentro de
um prazo de cinco anos e remover seus representantes do conselho de administração e
do CPF da GM.
Na metade de 1957, diante da decisão judicial que previa o afastamento da Du
Pont e da perspectiva das aposentadorias de Albert Bradley e de Harlom Curtice, em
1958, Alfred Sloan foi nomeado para presidir um subcomitê especial dentro do conselho
de administração, com a tarefa de estudar a sucessão e a reorganização da estrutura
corporativa da General Motors. O grupo, denominado internamente de “comitê de Sloan”,
era composto pelo presidente do conselho de administração, Albert Bradley, pelo
representante e presidente do conselho da Du Pont, Walter Carpenter, o membro do
conselho, General Lucius Clay e Harlom Curtice, além do próprio Sloan, e não
oficialmente de Donaldson Brown, ex-vice-presidente do conselho da GM.
Após o prolongado período de estudos e discussões conduzidos pelo comitê de
Sloan no conselho de administração, em agosto de 1958, a sucessão e a reorganização
da estrutura corporativa da General Motors foi aprovada, sem a participação de nenhum
membro representando a Du Pont.
A reorganização restabeleceu o Comitê Executivo (CE) em substituição ao CPO. O
CE contaria com a presença do presidente do conselho de administração, mas seria
presidido pelo presidente da GM. Também comporiam o CE os vice-presidentes
executivos (encarregados do staff) e os vice-presidentes de operações. Já o CPF foi
substituído pelo Comitê de Finanças (CF), o qual seria presidido pelo presidente do
conselho de administração. Comporiam o CF membros do conselho de administração,
executivos de finanças e o presidente da GM. Desta forma, o presidente da GM, chefe de
operações, ficou subordinado ao presidente do conselho, que por ocupar a presidência do
CF, colocou as decisões do CE sob intenso escrutínio CF. Os grupos de políticas
passaram a responder novamente de forma direta ao CE, eliminando a supervisão e a
129
análise prévia do CA. Nesta nova configuração, o CA, composto pelos gerentes das
divisões, seria apenas uma instância consultiva do presidente da GM.
O conselho de administração aprovou, também em 1958, a nomeação de Frederic
Donner, vice-presidente de finanças, para substituir Albert Bradley e Harlom Curtice nas
funções de presidente do conselho e CEO. Donner nomeou John F. Gordon, o novo
presidente da General Motors.
4.1.16.
O legado de Harlom Curtice
O ano de 1958 fechou com a General Motors enfrentando uma forte queda no
volume de vendas, cerca de 22%, acompanhando a diminuição da atividade no restante
da indústria. A GM, no entanto, se recuperaria até o final da década e fecharia 1960
obtendo faturamento recorde de U$ 12,7 milhões, com a venda de 3,7 milhões de
veículos que representavam aproximadamente 52% do mercado. Mesmo com uma ligeira
queda nas margens, o lucro líquido alcançaria U$ 959 milhões. A consolidação da
hegemonia ao longo da década só foi desafiada por um, ainda que pequeno, mercado de
veículos “subcompactos”14, que emergiu na segunda metade da década de 1950. A
Volkswagen começou a importar o Fusca em 1953 e, juntamente com o Rabler da
American Motors, outros compactos importados da Europa conquistaram cerca de 5% de
participação de mercado. Até 1960 os veículos compactos, a maioria importados como os
da própria Vauxhaul e Opel, receberiam concorrentes nacionais das Três Grandes.
Em 1956, o chefe da engenharia da Chevrolet, Ed Cole, havia assumido a
gerência geral da divisão. Dentre os principais planos de Cole estava a criação de um
veículo compacto, com motor traseiro, para competir de frente com os emergentes
Rambler e Fusca. Em 1957, a Chevrolet desenvolveu o primeiro protótipo e apresentou
aos executivos da GM. O novo veículo se chamaria Corvair e sua aprovação seria uma
das últimas conduzidas durante a gestão de Halom Curtice. Em 1958, Curtice e Ed Cole
trabalharam a aprovação no CE, contrariando opiniões de finanças e do ainda vicepresidente de operações de carros e caminhões, John Gordon, que consideravam o
projeto como de baixo retorno devido à estreita margem de lucro. Quando Fred Donner
assumiu o comando, a GM decidiu que após o lançamento da Chevrolet a arquitetura do
14
No início da década de 1950 o segmento dos carros com as menores dimensões já possuía a denominação
de compacto. Portanto, quando o novo padrão de tamanho se consolidou, o termo subcompacto foi adotado.
No decorrer deste texto, o termo compacto será utilizado em referência ao padrão de veículos com a menor
dimensão existente e não na forma habitual da indústria americana nos anos 1950.
130
Corvair seria compartilhada pelas demais divisões, exceto a Cadillac, a fim de aumentar a
escala e melhorar o retorno sobre o investimento.
O Corvair foi aprovado sob uma série de condições impostas por Curtice. O carro
deveria ser lançado no final de 1959, com um motor traseiro feito em alumínio, com
sistema de refrigeração a ar e suspensão com eixos independentes, atributos que o
tornaria mais leve e econômico. Além disso, o modelo mais básico do Corvair deveria
competir em preço com o Fusca que, à época, custava pouco menos de U$ 2000.
A combinação de motor traseiro com o sistema de suspensão independente
resultava em complicações de engenharia que rapidamente foram identificadas pelas
equipes de teste da GM. O Corvair, quando dirigido em curvas de alta velocidade, tendia
a ficar instável e propenso a capotamentos. O comportamento nos testes foi devidamente
documentado e gerou uma grande discussão entre o staff corporativo e o gerente geral da
Chevrolet, Ed Cole. Charlie Chayne, vice-presidente de engenharia, defendia a inclusão
de barras estabilizadoras e o uso de pneus mais largos como forma de melhorar a
estabilidade do veículo, enquanto Cole afirmava que o Corvair dispunha de suficiente
estabilidade e que a adição destes itens inviabilizaria a competitividade de custos do
veículo. Diante do impasse técnico, Fred Donner optou por preservar as margens de
lucro, e o Corvair foi lançado sem os dispositivos em 1959.
A celeuma criada entre as engenharias rapidamente se espalhou para as demais
equipes das divisões. Os gerentes de Buick, Oldsmobile e Pontiac persuadiram a
organização corporativa a retirar o Corvair de seus planos. As três divisões
compartilhariam a arquitetura de um veículo compacto, com motor dianteiro, que vinha
sendo desenvolvido conjuntamente por Buick e Oldsmobile. Assim sendo, em 1960, o
Buick Special, Oldsmobile F-85 e o Pontiac Tempest foram introduzidos para competir no
mercado de compactos, que além dos importados do Rambler e do Corvair contaria
também com os lançamentos dos concorrentes, o Ford Falcon e o Plymouth Valiant.
O Corvair foi lançado com diversas combinações de acabamento e acessórios,
utilizados para aumentar a margem de lucro nas vendas. Dentre as versões levadas ao
mercado, a de maior sucesso foi o Corvair Monza, que explorava um apelo mais
esportivo. No entanto, os problemas de estabilidade do carro nas estradas dos Estados
Unidos começaram a retornar para a GM na forma de processos na justiça. Promovido à
gerência geral da Chevrolet, em substituição a Ed Cole que em 1961 se tornou vicepresidente de operações de carros e caminhões, Semon Knudsen iniciou uma luta para a
131
adoção de barras estabilizadoras no Corvair, a um custo de U$ 15. Diante da perspectiva
de ter seu pedido negado, Knudsen ameaçou deixar a General Motors caso sua proposta
não fosse aprovada. As barras estabilizadoras foram finalmente adotadas nos modelos
vendidos em 1964, no entanto, o dano à imagem do veículo seria irreversível.
Em 1965, uma série de processos na justiça levou à criação de um comitê no
senado dos Estados Unidos para investigar a segurança dos veículos. Os resultados
desta comissão foram desastrosos para a GM e para o Corvair. Entre 1959 e 1965, a
Chevrolet vendeu cerca de 1,5 milhão de unidades e, após a investigação do senado,
apenas 125 mil unidades foram vendidas até a descontinuação do modelo, quatro anos
depois.
4.1.17.
Hegemonia de Finanças
Quando a General Motors se preparava para o lançamento de seu compacto
Corvair, Alfred Sloan, que ainda exercia certa influência como membro do conselho de
administração, alertou sobre a necessidade de a GM construir carros ainda menores do
que o Corvair. Para Sloan, o desenvolvimento de carros pequenos seria válido mesmo
que estes não fossem comercializados, pois proporcionaria um aprendizado para a GM e
a ajudaria a estar preparada para futuras mudanças no mercado (FREELAND, 2001). As
recomendações de Sloan ecoaram nas divisões, que submeteram ao GPE propostas de
programas para veículos compactos. No entanto, a orientação do CF e do CE foram no
sentido contrário, e as propostas geradas nas divisões eram seguidamente reprovadas
devido às baixas perspectivas de retorno sobre o investimento.
Um modelo topo de linha da Buick ou Oldsmobile, vendido por U$ 4500 na
concessionária, tinha o preço de atacado em torno de U$ 3400. Os custos de fabricação
girariam em torno de U$ 1900 a U$ 2000, gerando uma margem de cerca de U$ 1400 a
U$ 1500, que resultaria em um lucro, descontados os impostos, de cerca de U$ 850. Já
um veículo com grande carroceria e mais luxuoso, como o Cadillac DeVille, possuía um
custo de produção de U$ 300 a U$ 400 a mais que o intermediário Chevrolet Caprice,
enquanto que a diferença de preço entre os dois poderia chegar a U$ 3800. Com isso,
enquanto o lucro líquido dos modelos mais caros poderia chegar a U$ 2000, os modelos
intermediários gerariam lucros de U$ 400 dólares, e compactos como Corvair e o Pontiac
Ventura, algo entre U$ 150 e U$ 200. Além disso, modelos esportivos, com tamanhos
132
intermediários, porém com grande apelo para o consumidor, poderiam ser vendidos a U$
4000, gerando lucros de cerca de U$ 900.
Outra maneira que as empresa encontraram para aumentar o lucro obtido em cada
venda era carregar os veículos com acessórios opcionais, cujos valores eram cobrados a
parte. Pacotes oferecidos com frisos cromados, pneus mais largos e outros adereços, a
um custo de U$ 15, permitiria um aumento de U$ 300 no preço do “novo” modelo. Ou
então, com o custo adicional de U$ 25, a troca dos pára-choques, bancos especiais,
tacômetro e manopla de câmbio cromada transformariam um modelo comum em sua
versão esportiva, elevando preço em U$ 400.
Dada a diferença de margens, as tentativas de desenvolver carros maiores, de
forma que pudessem receber mais acessórios, tornou-se uma tendência na General
Motors e na indústria a partir dos anos 1960. Com isso, modelos compactos lançados por
Buick, Pontiac e Oldsmobile no início da década receberiam motores mais potentes e
teriam suas carrocerias ampliadas para receber mais acessórios. A concorrente Ford
também seguiu o mesmo caminho, em um programa de U$ 800 milhões para a
revitalização de sua divisão Mercury, de veículos intermediários e grandes. Além disso, ao
longo da década de 1960, tornaram-se populares os “muscle-cars”, veículos
intermediários, com forte apelo esportivo em seu desing, equipados com motores
potentes e vendidos por um alto preço. Dentre os modelos que marcaram o início do
muscle-car estão o concorrente Ford Mustang, de 1964, e o Chevrolet Camaro, lançado
em 1967. No entanto, versões preliminares deste estilo já vinham sendo desenvolvidas
pela GM, como o Corvette 1957, o Corvair Monza e o experimental Chevy II, em 1962.
Com a atenção das grandes montadoras voltadas para o problema de como
incrementar as margens de seus veículos, a demanda por carros compactos de baixo
preço foi deixada novamente para os concorrentes importados. Tais veículos haviam
perdido espaço no início dos anos 1960, com os lançamentos dos nacionais Corvair, o
Ford Falcon e o Valiant da Chrysler, mas retomaram participação no mercado a partir de
1963. O Volkswagen Fusca aumentou suas vendas de 157 mil unidades em 1960 para
563 mil em 1968, ano em que importados conquistaram 10,5% do mercado.
O esforço de busca por margens, oferecendo mais opções de estilo, e a tentativa
de ampliar a escala, compartilhando o veículo desenvolvido em uma divisão com as
demais, fez com que, a partir do final dos anos 1950 e durante os anos 1960, a General
Motors aumentasse sua linha de produtos significativamente. O número de arquiteturas
133
básicas saltou de três em 1955 para dez no final em 1969. Além disso, a GM aumentou
os tipos de carrocerias de 75 para 175, com um total de 918 opções de acabamento. Com
isso, o número de partes chegou a 15 mil, combinadas em 165 mil listas de materiais,
incluindo os modelos de carros e caminhões.
Para controlar a logística e uma produção de tamanha complexidade, a GM
utilizava sistemas computadorizados em suas fábricas, com os quais era possível
organizar a seqüência de produção. No lado do desenvolvimento de engenharia, a
mudança anual dos modelos passou a ser mais superficial, procurando limitar-se à
combinações de acessórios e detalhes mínimos de design. Além disso, o ciclo de
mudanças significativas na mecânica e na estrutura dos veículos foi ampliado de quatro
para seis anos. Ainda assim, a GM não foi capaz de reduzir o tempo de paralisação das
fábricas para a troca anual dos modelos, como conseguiram Ford e Chrysler, que
transferiram parte dos dias de paralisação para ajustes realizados nos finais de semana.
No começo dos anos de 1970, a Ford paralisava suas operações durante o equivalente a
42 dias de produção de uma planta para trocar toda a linha de produtos, enquanto que na
GM o mesmo processo levava o equivalente a 460 dias.
O aumento da diversidade de produtos e a atuação das divisões em todos os
segmentos, competindo entre si, exigiram maior coordenação entre suas atividades,
sobretudo no desenvolvimento de novos modelos. A responsabilidade de conduzir a GM
diante de tal desafio recaiu sobre o CEO Fred Donner, cuja carreira havia sido toda
desenvolvida em finanças. Para comandar gerentes e executivos que dispunham de
maior experiência em operações, Donner adotou uma prática que se tornou comum na
General Motors mesmo depois de sua saída. Assim que assumiu o comando, apontou
John Gordon como presidente da GM, que segundo John Z. De Lorean (WRIGHT, 1974)
era a escolha menos óbvia. Gordon era vice-presidente de operações de montagem, no
entanto, dentro da GM os dois principais nomes da área de operações cotados para
substituir Harlom Curtice eram os vice-presidentes executivos Cliff Goad e Bud Goodman.
Posteriormente, Donner ainda nomearia Roger Kyes como vice-presidente de operações
não-automotivas e, anos depois, para operações de carros e caminhões. Kyes havia feito
sua carreira fora da GM e, mesmo depois de entrar para a empresa, suas experiências se
restringiam à gerência das divisões Frigidaire e GM Truck & Coach.
No início da gestão de Donner, o desenvolvimento dos modelos manteve-se com o
sistema de revisões em comitê semelhante ao que fora estabelecido por Sloan. Novas
134
propostas emergiam do trabalho conjunto entre divisões e o laboratório de estilo, e os
programas para toda a linha eram aprovados por meio de uma seqüência de revisões
conduzidas pelo staff de engenharia através do GPE, até consolidar uma proposta que
era encaminhada para a avaliação do CE e do CF. Em geral, inovações na mecânica ou
no design eram adotadas, primeiro, por uma divisão e, em caso de sucesso, eram
replicadas para as demais. Este processo, formalizado em 1935, veio gradualmente
transferindo as atividades de desenvolvimento das divisões para o staff de engenharia.
Porém, na gestão de Donner este processo foi deliberadamente acelerado e, ao longo da
década de 1960, as decisões de produto passaram a ser cada vez mais impostas às
divisões e com maior detalhamento das especificações a serem seguidas.
Em 1962, a Pontiac realizou por sua conta experimentos com o seu modelo
intermediário Tempest. A divisão comandada por Elliot Estes, que contava com John
DeLorean como chefe de engenharia, removeu todos os componentes supérfluos do carro
e o reequipou com novos freios, suspensão e componentes de motor. Com a melhora
significativa de desempenho, a Pontiac renomeou o veículo como GTO. A divisão Pontiac
conduziu o desenvolvimento do GTO sem informar o GPE, pois temia que este não
aprovasse as alterações propostas. O risco assumido por Estes foi recompensado, e as
vendas do GTO, em 1963, se revelaram um grande sucesso. A organização corporativa
da GM não teve outra opção senão reconhecer o novo produto. No entanto, a resposta de
Fred Donner viria logo em seguida, com a determinação de que todas as decisões de
produtos feitas pelas divisões fossem submetidas à corporação para aprovação.
O sistema de controles financeiros estabelecidos desde os anos 1920 contribuiu
para que a GM controlasse as decisões de suas divisões. O controler da divisão
elaborava o orçamento do ano sob a orientação do gerente da divisão, porém os valores
previstos e a programação de receitas e despesas eram aprovados e controlados pelo
staff financeiro. Com isso, a divisão só poderia alterar um modelo depois que ele já
estivesse aprovado pelo controle corporativo e, ainda assim, respeitando os limites
estabelecidos no orçamento. Por exemplo, a Pontiac, em 1966, elaborou um projeto para
remodelar um de seus veículos grandes, o Catalina, substituindo partes e componentes
por outros mais leves e mais baratos. O protótipo exibido formal e informalmente, porém
apesar da boa impressão causada ao staff de engenharia, foi aprovado com cortes no
orçamento que tornavam o projeto inicial inviável. Diante da restrição, a Pontiac
conseguiu a aprovação para substituir o Catalina por um modelo intermediário. O
135
resultado foi a criação do Grand Prix, um sucesso de vendas, que inaugurou um
segmento de carros médios especiais. O Grand Prix tinha o preço de U$ 4000, gerando
um lucro de cerca de U$ 1500, enquanto que a média das linhas de veículos
intermediários era de U$ 600.
A autonomia das divisões, como os casos dos Pontiac GTO e Grand Prix, se
tornou cada vez mais limitada ao longo da gestão de Fred Donner e culminou em 1965
com a criação da General Motors Assembly Division (GMAD), que passaria a centralizar
as atividades de produção e montagem das divisões automotivas. No início, foram
reunidas fábricas de Buick, Pontiac, Oldsmobile e Fisher Body. Cadillac e Chevrolet
permaneceriam ainda com suas divisões até a década de 1970. Dois principais motivos
são apontados para justificar a criação da GMAD. Um deles é explícito e estava
relacionado ao plano de comunização de partes e componentes, que tinha por objetivo
aumentar escalas de produção e, conseqüentemente, reduzir custos. Outro motivo seria
fruto de uma suspeita de que a General Motors poderia ser novamente questionada sobre
o domínio que exercia no mercado. Com isso, temia-se que o fato de operar sob uma
estrutura composta de divisões razoavelmente autônomas, facilitasse uma sentença que
determinasse o desmembramento e a venda de algumas divisões, como forma de
restabelecer a concorrência no setor. Com a criação da GMAD, as divisões passariam a
se restringir a suas organizações de marketing, vendas e distribuição.
Frederic Donner foi presidente do conselho de administração e CEO da General
Motors entre 1958 e 1967. Durante sua gestão, a GM manteve sua participação de
mercado próximo ao nível de 50%, enquanto o volume de vendas gradualmente cresceu a
partir do baixo nível do primeiro ano, tendo o dobro de veículos saído de suas plantas no
ano recorde de 1965, quando foram vendidos 5,7 milhões de veículos. O faturamento da
GM saltou da faixa de U$ 10 bilhões nos anos que precederam Donner para a casa dos
U$ 20 bilhões nos três últimos anos de seu mandato. Em 1965, dois anos antes de sua
aposentadoria compulsória, Donner nomeou James Roche presidente da General Motors.
Em 1967, quando Donner finalmente se aposentou, Roche assumiu como novo CEO e
presidente do conselho de administração.
Diferentemente de Fred Donner, Roche não vinha de uma formação de finanças e,
assim sendo, não ocuparia a presidência do CF como seu antecessor. Para compensar a
nomeação de um CEO com formação em operações, foi criada a posição de vicepresidente do conselho, a ser ocupada pelo vice-presidente de finanças George Russell,
136
que passou a ser o segundo em comando na ausência de Roche. O cargo menos
favorecido com a mudança de gestão foi o de presidente da GM. Edward Cole foi
nomeado presidente, porém a partir de 1967 sua influência foi significativamente reduzida,
pois além de o CE passar a ser presidido por Roche, Cole teria autoridade somente sobre
as divisões de veículos, uma vez que nem as áreas não-automotivas nem os mercados
externos seriam subordinados a ele. Além disso, a composição do CE, responsável pela
aprovação de operações, mudou amplamente durante o mandato de Donner, reforçando
a influência de finanças. Em 1967, o CE da General Motors veria os vice-presidentes de
operações serem reduzidos à minoria. Até 1970, na gestão Roche, o CE passaria a ter
cinco membros, todos executivos corporativos relacionados às áreas de staff, sendo a
maioria de finanças.
4.1.18.
Segurança veicular e controle de emissões
Um dos primeiros desafios de James Roche assim que assumiu a presidência da
General Motors, ainda com Donner como CEO, foi enfrentar a desastrosa participação da
GM na comissão de segurança veicular do senado dos Estados Unidos. As preocupações
com o crescimento do número de acidentes e mortes no trânsito acompanhou a difusão
do uso do automóvel pela sociedade americana. Em 1936, a indústria automobilística
criou a Automotive Safety Foundation (ASF) para realizar estudos e promover campanhas
para a redução de acidentes de trânsito. Com os custos pagos pelas montadoras, parte
dos trabalhos da ASF procurou retirar a responsabilidade do automóvel sobre os
acidentes e atribuir a maior parte das causas às más condições de estradas e sinalização.
Dentre as primeiras ações na tentativa de explorar comercialmente atributos de
segurança, a Ford lançou, em 1956, com ampla campanha de divulgação, um pacote de
segurança para equipar seus veículos, que incluía opcionais como sinto de segurança e
barra de direção resistente a colisões, a um custo de U$ 25. O pacote de segurança foi o
conjunto de acessórios mais vendidos pela Ford na época, cerca de 400 mil unidades em
18 meses. A Chrysler também acompanharia a concorrente Ford e em poucos meses
ofereceria o conjunto de opcionais. Entretanto, a General Motors alegaria que as
conclusões sobre a eficiência de equipamentos como sinto de segurança ainda
precisavam ser mais bem estudadas, e não ofereceria o dispositivo pelos próximos nove
anos. A recusa da GM em oferecer acessórios de segurança, concentrando esforços de
divulgação para os lançamentos de motores e carros mais potentes, fez com que a Ford
137
retirasse sua campanha promocional do pacote de segurança seis meses depois e
retornasse para atividades semelhantes às da GM.
A resistência da GM em desenvolver melhor segurança para motoristas e
passageiros de seus veículos teve um fim estrondoso no ano de 1965. Um dos
protagonistas dos eventos que culminaram com a criação da legislação americana sobre
requisitos de segurança veicular foi Ralph Nader, um advogado de Harvard que passou a
investigar estatísticas de acidentes envolvendo o Chevrolet Corvair quando trabalhava
como consultor em processos envolvendo companhias de seguro. Com o tempo, Nader
passou a compartilhar as estatísticas e jurisprudências que encontrava para auxiliar
processos movidos por todo o país. Quando contratado como consultor por uma nova
subcomissão do senado norte-americano, Nader compartilhou seus achados com o
novato Senador Abraham Ribicoff. Em fevereiro de 1965, Ribicoff anunciou que sua
subcomissão colheria depoimentos de autoridades e fabricantes, para investigar as
razões de tantas mortes em acidentes de trânsito.
Em julho de 1965, Fred Donner e James Roche apresentaram-se à subcomissão
do senado para apresentar as atividades realizadas pela GM acerca da segurança de
seus veículos. Ao final do testemunho, o resultado foi desastroso para a GM. Quando
questionado pelo senador Robert Kennedy sobre quanto a GM havia investido em
projetos de segurança veicular no ano anterior, Donner prontamente respondeu o
montante de U$ 1,25 milhão, porém quando o mesmo senador indagou qual fora o lucro
da GM no mesmo período, Donner se engasgou com a resposta e afirmou não ter o
número de cabeça. A resposta repercutiu pessimamente na subcomissão, uma vez que o
lucro era uma informação pública, facilmente acessada. Pressionado pelos senadores,
James Roche interveio no depoimento e forneceu o valor de U$ 1,7 bilhão de lucros
reportados em 1964. A conclusão de Robert Kennedy, apresentada em sua réplica,
arrematou o péssimo desempenho da GM nos depoimentos e deixou uma má imagem da
organização perante os senadores.
Ainda em 1965, paralelamente aos trabalhos da subcomissão do senado, Ralph
Nader organizou um livro que apresentava uma análise das estatísticas de acidentes e
mortes do Corvair. O livro foi publicado no final do ano, sob o título de Unsafe at Any
Speed (Inseguro a Qualquer Velocidade). Semanas antes da publicação, ao tomar
conhecimento dos planos de Nader, o chefe da consultoria jurídica da GM, Aloysius F.
138
Power, contratou detetives para investigar Nader, a fim de encontrar algo que pudesse
desacreditá-lo perante a opinião pública.
A ação da GM foi desmascarada quando Ralph Nader foi convocado para depor
na subcomissão do senado. Antes da seção se iniciar, os detetives que andavam em seu
encalço foram identificados por um segurança do senado americano como suspeitos de
estarem perseguindo o depoente. Alertado pela segurança, o presidente da subcomissão
Ribicoff elaborou uma estratégia de utilizar boatos na imprensa para forçar a
manifestação de pessoas que tivessem sido abordadas pelos detetives da GM. Em
poucos meses o escândalo estourou, e James Roche teve de pedir desculpas
publicamente em nome da GM pelos atos cometidos.
O resultado dos trabalhos da subcomissão culminou com a aprovação no
Congresso americano, em 1967, da Lei Nacional de Segurança de Veículos e no Trânsito.
A nova legislação criou o arcabouço para uma série de regulamentações, definindo
padrões, equipamentos e sistemas obrigatórios de segurança, bem como estabelecendo
as responsabilidades e garantias de qualidade dos veículos.
Também na metade da década de 1960 surgiram as primeiras leis de controle
sobre emissão de gases poluentes sobre os automóveis. Os efeitos nocivos de resíduos
emitidos durante o processo de fabricação começaram a ser estudados pelos próprios
fabricantes ainda na década de 1920. Porém, apenas no início da década de 1950 a
indústria começou a se mobilizar, ainda que timidamente, para amenizar pressões em
relação à poluição do ar. Em 1953, os fabricantes concordaram em ceder mutuamente às
patentes de dispositivos que contribuíssem para o controle de emissões. O estado da
Califórnia foi o primeiro a criar exigências sobre o controle de emissões dos automóveis.
Los Angeles era uma das cidades mais afetadas pela concentração de gases emitidos por
automóveis na década de 1950. Em 1961, o California Air Resources Board (CARB),
exigiu que todos os carros novos vendidos no estado fossem equipados com um
dispositivo de válvula de ventilação do cilindro, que reduzia significativamente a emissão
dos gases mais tóxicos, resultantes da queima inadequada do combustível. O dispositivo
havia sido desenvolvido pelo GM Research Labs em 1958 e sua patente foi liberada para
as demais montadoras em 1962.
O movimento pioneiro da Califórnia levou a aprovação no Congresso americano
da Lei Federal do Ar Limpo, em 1965. A legislação estabelecia que a Secretaria de
Saúde, Educação e Bem-Estar do governo americano tinha autoridade para estabelecer
139
os limites e medidas que os novos veículos deveriam seguir. Os primeiros critérios de
controle foram anunciados em 1968. No entanto, alegando não terem capacidade de
cumprir com as novas regras a tempo, as montadoras persuadiram as autoridades a
postergar o início das novas regras para 1970. A partir deste ano, gradualmente os limites
seriam alterados, de forma a torná-los mais rigorosos, a fim de reduzir o nível de poluição
do ar, sobretudo em grandes cidades.
4.1.19.
A Gestão de James Roche
Os desafios de James Roche, no início de sua gestão como CEO, em relação à
segurança e poluição não foram os únicos questionamentos externos aos quais a General
Motors teve de responder. Desde a saída da Du Pont do grupo de acionistas da GM,
nenhum outro acionista passou a deter quantidade suficiente de ações a ponto de exercer
influências decisivas nas ações da empresa. A maioria das ações estava distribuída nas
carteiras de fundos de investimentos, que quando ficavam insatisfeitos com atitudes da
GM simplesmente vendiam suas ações no mercado. No entanto, um pequeno grupo de
pessoas que aplicavam suas economias em ações começou a se manifestar nos
encontros anuais de acionistas.
Pouco antes do encontro de 1970, doze jovens acionistas criaram um movimento
ao qual deram o nome de Campanha GM. O pequeno grupo começou a solicitar votos
para a criação de um comitê de acionistas para responsabilidade social, além da inclusão
de três representantes da sociedade no conselho de administração da GM. Sabendo do
movimento com antecedência, Roche mobilizou acionistas para vetar as propostas,
alegando que elas restringiriam a capacidade gerencial da organização. No dia do
encontro, a votação foi esmagadora em favor de Roche, porém, considerando que a
maioria dos votos vinha de um pequeno grupo de fundos de investimento, os 3%
conseguidos pela Campanha GM foi uma vitória moral. Durante a reunião, novas
pressões surgiram, como, por exemplo, o questionamento sobre por que não havia
nenhum negro membro do conselho de administração.
Apesar de evitar alimentar tais manifestações entre os poucos acionistas
engajados, Roche adotou a prática de cooptar tais grupos logo no início dos
questionamentos. Assim sendo, após a reunião de 1970, James Roche indicaria o
reverendo Leon H. Sullivan, ministro da maior igreja de negros da Filadélfia, para integrar
ao conselho da GM. No ano seguinte, Roche indicaria a primeira mulher a fazer parte do
140
conselho, bem como criaria a vice-presidência de assuntos de meio ambiente, com um
orçamento de U$ 26 milhões para incentivar pesquisas de redução da poluição. Além
disso, no início da década de 1970, a GM atendeu às pressões de seus acionistas e
passou a divulgar junto com o relatório anual as estatísticas de cumprimento dos
requisitos de segurança e controle de poluição.
Também durante a gestão de James Roche, a GM se viu novamente sob o desafio
de desenvolver um carro compacto com preço baixo. Ao longo da década de 1960, o
crescimento nas vendas do Volkswagen Fusca e a intensa competição entre os veículos
médios da Ford, Chrysler e de divisões da GM fizeram com que a Chevrolet, principal
marca da organização, visse sua participação de mercado reduzir de 31% em 1962 para
24% em 1968. Um dos carros de tamanho intermediário, o Chevy, sofreu uma queda nas
vendas de 600 mil unidades para 200 mil unidades no mesmo período, sem contar com o
Corvair, que praticamente parou de vender após os escândalos de 1965.
Com a confirmação da demanda por carros menores e mais baratos, as divisões
da GM, em especial a Chevrolet de Eliot Estes e a Pontiac de John DeLorean,
submeteram ao GPE suas propostas para o desenvolvimento de novos modelos que
competiriam neste segmento. Contudo, em 1967, o recém empossado presidente da GM,
Edward Cole, possuía planos diferentes para combater a ameaça dos importados. Cole
apresentou planos para um carro compacto que, diferentemente do processo tradicional
de criação de novos modelos, seria totalmente desenvolvido pelo staff de engenharia
corporativo. Os protótipos seriam entregues prontos para a Chevrolet, que desenvolveria
seu sistema de produção e comercializaria o veículo. Guardadas as diferenças devido à
evolução na estrutura e na equipe de engenharia, o projeto de Cole, batizado de XP-887,
tinha uma estratégia de desenvolvimento semelhante ao do fracassado copper-cooled de
Charles Ketering e Pierre du Pont, em 1921.
A GM adotou outra medida incomum em relação ao seu novo desenvolvimento.
Em outubro de 1968, o CEO James Roche anunciou publicamente os planos de
lançamento do novo veículo para 1970, divulgando ainda que o veículo teria peso inferior
a 900 quilos e preço final de U$ 1800. O detalhe do pronunciamento de Roche foi que as
estimativas apresentadas de custo e peso do veículo eram preliminares, projetadas a
partir dos desenhos iniciais do futuro modelo. O compromisso com tais metas, anunciado
pelo CEO da General Motors gerou grande expectativa em relação à reação da General
Motors.
141
Assim como no caso do copper-colled, 47 anos antes, o processo de
desenvolvimento entre engenheiros de staff e da Chevrolet foi conturbado. Dentre as
primeiras polêmicas esteve a definição do ciclo do motor, quando o staff corporativo
impôs seu motor de ciclo longo contra a opinião dos engenheiros da divisão, defensores
de um motor de ciclo curto, que evitaria problemas de superaquecimento. Divergências à
parte, os primeiros protótipos enviados para a divisão apresentaram defeitos básicos. Nos
primeiros 12 quilômetros de teste, a frente do veículo se soltou e, para corrigir o defeito de
projeto, a divisão teve que acoplar um suporte extra, adicionando 10 quilos ao peso do
carro. Além disso, o projeto deixou de fora itens mandatórios, como barras laterais, na
tentativa de atingir metas de custo e de peso.
Conforme o XP-887 foi sendo aprontado para o lançamento, o limite de peso foi
ultrapassado em 100 quilos e as metas de custo, largamente estouradas. Depois de
pronto, o carro contrariou as estimativas feitas no projeto inicial, a ponto de não ser mais
competitivo no segmento de compactos de baixo preço. Porém, de acordo com John
DeLorean, que assumiu a gerência geral da Chevrolet no lugar de Elliot Estes, a maior
dificuldade do compacto não estava nos atributos do veículo, mas sim na tarefa de
motivar a equipe de engenheiros e a organização de marketing e vendas da Chevrolet a
se esforçarem para obter o melhor resultado possível com aquele produto (WRIGHT,
1974). A interferência do staff corporativo havia ido além da etapa de desenvolvimento e
assumiu
também
a
responsabilidade
sobre
decisões
de
marketing,
causando
descontentamento das pessoas na divisão. A definição do nome do novo veículo, por
exemplo, foi grande motivo de controvérsia entre divisão e staff. A Chevrolet propôs o
nome de Gemini, pois pesquisas junto ao consumidor indicavam a associação imediata da
fonética do nome com a referência GM “mini”. No entanto, os executivos corporativos
preferiram não associar o carro à GM e optaram pelo nome Vega. As pesquisas com
consumidores feitas pela divisão também procuraram identificar o melhor posicionamento
para o Vega. Após testarem diversas combinações, desde a mais básica até a mais
completa e luxuosa, a recomendação da Chevrolet foi para que o carro fosse posicionado
em suas versões maiores e mais equipadas, oferecendo ao mercado um veículo
compacto premium. Já as versões de mini-carros baratos para competir com o Fusca
deveriam ser abandonadas. Durante a revisão da política de preços, a corporação
novamente aprovou o preço sugerido pela divisão, porém retirou a maioria dos
incrementos de acabamento e de acessórios da versão básica, colocando-os como
opcionais, pagos separadamente.
142
O Vega enfrentou diversas dificuldades no seu lançamento, além das questões de
custo, peso e posicionamento de preço. Uma greve que paralisou a fábrica onde o modelo
seria produzido alterou a programação de seu lançamento, causando desencontros nas
ações de marketing e de vendas. A fabricação e a distribuição do veículo foram finalmente
regularizadas em 1971, em meio à transição para o sucessor de Roche.
O desenvolvimento de um veículo completo pelo staff corporativo, em 1968, foi
mais uma evidência dos esforços da General Motors para tentar lidar com a complexidade
dos problemas decorrentes de seu tamanho e diversidade. O aumento no número de
modelos e o compartilhamento de plataformas levaram as divisões a tentarem diferenciarse, fazendo uso de atributos de design, acessórios e variações de acabamento. Por
exemplo, no caso da Chevrolet, um consumidor que fosse a uma concessionária para
comprar um veículo poderia escolher entre 179 combinações de carros e motores.
Contudo, 67% da quantidade de versões possíveis correspondiam a apenas 1% das
vendas.
Grande parte dos sistemas de gestão de operações da GM, durante a explosão de
variedade de modelos nas décadas de 1950 e 1960, permaneceu bastante semelhante
aos que foram criados na década de 1920 e razoavelmente atualizados ao final da
Segunda Guerra. Com a diferença que, em 1945, a GM possuía apenas três variações de
chassi e carroceria. A programação de produção era quadrimestral, com revisões
semanais. A coordenação continuava sendo feita pelo staff corporativo, que consolidava
os volumes solicitados pelas divisões, confrontava-os com a projeção do mercado e
realocava os volumes e o mix, formalizando uma programação que, em seguida, era
encaminhada para aprovação nos comitês.
Esta forma impedia que houvesse
coordenação entre o volume a ser fabricado e as ações de marketing realizadas pelas
divisões. Com isso, ocorriam desencontros, como, por exemplo, a divisão realizar uma
campanha na TV promovendo determinado produto, enquanto os estoques nas lojas
estavam vazios. Quando finalmente os veículos chegavam à concessionária, os
compradores haviam se dispersado. Para tentar contornar os problemas de falta de
estoques, os gerentes das divisões superestimavam a programação de vendas que
enviavam ao staff corporativo. A somatória das estimativas das divisões, em geral, eram
sempre superiores à capacidade instalada. Para resolver o problema de alocação, o staff
deliberava de acordo com o histórico de vendas dos produtos. Desta forma, produtos que
haviam vendido bem em períodos anteriores seriam priorizados e tornava-se bastante
143
provável que a divisão não recebesse o volume que realmente esperava ou poderia
vender de outros modelos.
As fabricas também sofriam com os sistemas de controle corporativo. Embora os
pedidos de compra de matérias-primas fossem delegados à gerência de cada planta, os
planos de produção eram periodicamente revisados pelo staff corporativo e, normalmente,
só eram informados a cada planta com uma semana de antecedência. Assim sendo, caso
houvesse falta de estoque, o gerente da planta saía em busca de estoque do mesmo
componente ou matéria-prima sobressalente em outra fábrica da GM. O sistema permitia
que plantas compartilhassem estoques, porém, com a programação sendo informada
semanalmente, eram freqüentes situações como a de uma planta solicitar um
componente no estoque de outra e, na semana seguinte, ter que fornecer o mesmo
componente para a planta que a havia socorrido.
Segundo John Delorean, diversas tentativas de reduzir os custos de operação das
linhas de produção eram sugeridas pelos gerentes das plantas. Ele mesmo, em suas
passagens por Pontiac e Chevrolet, disse ter apresentado 18 propostas para melhoria dos
sistemas, entre 1965 e 1972. Porém, todas as propostas eram encaminhadas para
análise do staff corporativo e para aprovação nas comissões e, devido à morosidade
desses processos, raramente chegavam a ser implementadas (WRIGHT, 1974). Além
disso, diversos sistemas computadorizados foram desenvolvidos para controlar a
seqüência de produção. Contudo, os sistemas não eram compatíveis entre si, e os
benefícios de coordenação em uma área não eram compartilhados com o restante do
sistema de produção e distribuição.
Para tentar resolver os problemas do aumento da complexidade, a GM realizou
diversos esforços, sobretudo na segunda metade da década de 1960. Um deles foi a
harmonização das peças entre os modelos das divisões. Tal mudança teria o objetivo de
diminuir o custo das peças, com o aumento das escalas de compra e produção. No
entanto, um outro efeito foi percebido. Os veículos que competiam em faixas de preços
mais baixas, notadamente os da Chevrolet, foram obrigados a compartilhar peças de
veículos mais luxuosos, que conseqüentemente eram mais caras. Com isso, os custos de
fabricação efetivamente subiram, pois nos veículos de maior volume o custo unitário
aumentou.
Outra medida já mencionada adotada pela GM para lidar com a complexidade do
sistema produtivo foi a criação da GMAD, que teve como um de seus objetivos unificar a
144
gestão das linhas de montagem final dos veículos. Mas a criação da GMAD agravou
processos de desenvolvimento de produtos e de controle de qualidade. Com a GMAD,
aumentou ainda mais a departamentalização no desenvolvimento de produtos, sobretudo
a partir de 1971, quando finalmente as plantas da Chevrolet foram absorvidas pela divisão
de montagem.
Ao longo das décadas de 1950 e 1960, a GM apresentou uma sistemática
desvantagem no custo de desenvolvimento de novos modelos em relação a sua principal
rival. Uma comparação entre Ford e Chevrolet demonstra a magnitude da diferença no
custo de desenvolvimento. Enquanto a Ford desenvolveu, entre 1959 e 1969, quatro
novos modelos (Falcon, Mustang, Pinto e Maverick) com um investimento de U$ 350
milhões, a Chevrolet, no mesmo período, também desenvolveu quatro modelos
equivalentes (Corvair, Nova, Camaro e Vega), mas com um investimento total de U$ 800
milhões. A partir dos anos 1950, grandes inovações de engenharia, como câmbio
automático, direção hidráulica e motores de alta compressão,
tornaram-se raras na
indústria, e o desenvolvimento de novos produtos passou a ser concentrado em
incrementos de design e de acessórios, a fim de justificar a troca anual dos modelos. O
início deliberadamente atrasado do desenvolvimento, praticado pela GM desde a gestão
Curtice, fez com que os orçamentos de desenvolvimento de produtos fossem estourados
ano após ano durante praticamente duas décadas. Em 1966, por exemplo, o orçamento
de engenharia fechou U$ 13 milhões acima do projetado, em 1968 o valor foi de U$ 11
milhões e em 1969, U$ 15 milhões.
No início dos anos 1970, a gestão de James Roche chegava ao fim, consolidando
uma burocracia corporativa que centralizava a coordenação de grande parte das ações
competitivas e também dos esforços de resolução de problemas. Atividades como o
sistema de controle financeiro, a unificação da gestão das atividades de montagem na
GMAD e a centralização do desenvolvimento fora da divisão, iniciada com o Vega, são
alguns casos resultantes dos esforços de sistematização do staff corporativo ao longo dos
anos. Para resolver novos problemas, a GM passou a utilizar-se, cada vez mais, de um
sistema corporativo baseado em comitês de política e equipes de força-tarefa. Porém, a
diversidade e a complexidade das atividades da organização fizeram com que os
processos conduzidos nesse sistema se tornassem proporcionalmente mais extensos e
demorados. Os executivos corporativos integrantes dos CE e do CF eram obrigados a
estudar uma grande quantidade de relatórios todos os dias, apenas para se prepararem
145
para uma agenda repleta de reuniões para aprovação de assuntos como a revisão do
plano de produção para determinado mês, ou um contrato de arrendamento para um
escritório regional de vendas.
Os problemas e as atividades da GM eram freqüentemente traduzidos em índices
pelos staffs financeiros e de operações, portanto era comum que os diagnósticos
resultantes de equipes de força-tarefa nomeadas para analisar um problema fossem
apresentados na forma relatórios que sintetizavam indicadores de desempenho. O
depoimento de John DeLorean, que foi nomeado gerente da Chevrolet em 1969 para
tentar recuperar a divisão, ilustra os métodos da GM na época:
Embora muitas vezes Kyes oferecesse sugestões sobre como recuperar a Chevrolet,
ficou evidente a partir das conversas que tive com ele e outros executivos
corporativos que ninguém sabia o que havia de errado com a Chevrolet. Mas todo
mundo estava preocupado, porque a divisão caminhava para entrar no vermelho.
Internamente, me foram oferecidas quatro análises detalhadas dos problemas da
divisão preparadas pela equipe financeira, e estas também acabaram por serem de
pouca ajuda, porque eles analisaram de forma simplista apenas os efeitos dos
problemas da Chevrolet - a queda do retorno sobre o investimento, a perda de
participação de mercado e assim por diante. Eles não lidavam com as causas.
(tradução livre de Wright, 1974 p. 106)
Em outro trecho de seu depoimento, DeLorean descreve parte da burocracia e dos
métodos usados pelo staff de operações para tentar encontrar soluções para os
problemas:
Um conceito simplista praticado é o que eu chamo de "gestão por força-tarefa". Em
certo sentido, ela substituía "a gestão por comitê", pois parecia que toda vez que um
problema era levado a um dos comitês corporativos, uma "força-tarefa" era formada
para analisá-lo. Tivemos forças-tarefa sobre tudo: a iniciação dos novos modelos, os
aumentos dos custos materiais, gerenciamento das questões trabalhistas. Tornou-se
tão ridículo que uma vez Terrell organizou duas equipes separadas para trabalhar
sobre o mesmo projeto – problemas sobre desenvolvimento de novos modelos. Um
deles foi formado sob a direção da GMAD e o outro no âmbito do staff de manufatura.
As duas equipes exigiram que as divisões respondessem às mesmas perguntas. As
pessoas da Chevrolet ficaram sobrecarregadas apenas para responder às mesmas
perguntas vindas de duas fontes diferentes, e nós tivemos que trabalhar horas extras
para conseguir colocar a produção em ordem novamente.
146
Quando os relatórios ficaram prontos e foram apresentados pelas duas equipes, as
divisões foram chamadas para ver o resultado. O que ouvimos foi apenas uma
repetição das informações que lhes tínhamos fornecido. Em outras palavras, eles nos
perguntaram como é que estavam fazendo em nossos planos para os novos
desenvolvimentos e, em seguida, nos chamaram para uma reunião na sede da
corporação para ouvi-los nos contar o que havíamos dito. Esta não foi a primeira vez
que isto havia ocorrido. E também não foi a última. (tradução livre de Wright, 1974 p.
212-213)
A burocracia nos staffs e comitês corporativos da General Motors não apenas
tornava a busca por solução e a implementação de mudanças lenta, mas também
dificultava que soluções para novos produtos ou problemas gerenciais nas divisões
fossem ratificadas ou replicadas para outras áreas que enfrentassem situações
semelhantes.
Um exemplo das dificuldades decorrentes da morosidade e inércia corporativa é o
caso de John Z. DeLorean à frente da Chevrolet entre 1969 e 1972. Nomeado para
chefiar a maior e mais problemática divisão da GM, DeLorean aplicou diversas práticas
inovadoras na gestão da Chevrolet, resultando na melhoria dos seus índices de
desempenho e culminando com a promoção do gerente geral à vice-presidência
corporativa, responsável por carros e caminhões na América do Norte. No entanto, a
frustração com a burocracia corporativa acabou por provocar uma saída precoce da GM.
Um resumo das principais ações promovidas por DeLorean é apresentado a seguir:
•
Desenvolvimento de produtos coordenados por gerentes de produtos, ao invés da
departamentalização por funcionalidade e coordenação por comitê.
•
Novo sistema de orçamento de projetos de engenharia, com controle por meio de
revisões periódicas, com maior flexibilidade e agilidade, ao contrário do tradicional
sistema com supervisão ao final da execução do orçamento.
•
Utilização de pesquisas junto ao consumidor para pré-testar campanhas de
propaganda e, também, para medir resultados na percepção da população. Atividade
antes inexistente, o que fazia com que peças de campanha fossem feitas para
conseguir a aprovação nos comitês e não para atingir um objetivo de comunicação.
•
Proposta para o desenvolvimento do K-car, uma plataforma comum para todos os
modelos compactos e médios da Chevrolet e que poderia tornar a linha de montagem
flexível para produzir todos os modelos sem grandes alterações.
147
•
Redução da quantidade de níveis hierárquicos na gestão da divisão, enxugando a
estrutura administrativa e acelerando a comunicação entre as áreas.
•
Programa de controle de qualidade, com inspeções nos produtos ainda na fábrica.
Isto permitia que a causa dos defeitos fosse encontrada mais rapidamente, se
comparado com a prática anterior, quando um defeito só era identificado quando o
consumidor acionasse a garantia.
•
Sistema de banco de engenheiros para as atividades de desenvolvimento. Com isso,
os profissionais eram alocados no início de um projeto e retornavam para o banco
quando este encerrava. Anteriormente, o desenvolvimento era departamentalizado em
partes específicas do veículo, e não havia movimentação entre departamentos em
função de aumentos na demanda de trabalho.
•
Criação de um comitê de planejamento que reunia mensalmente um representante de
cada área da divisão para coordenar as atividades, identificar problemas e debater
soluções.
•
Semelhante ao que ocorreu nas atividades de desenvolvimento, a organização de
marketing foi organizada por gerentes de produtos, ao invés da tradicional
departamentalização funcional. Com isso um gerente passou a coordenar atividades
de planejamento de volumes, promoção e vendas relativas a um produto.
•
Pesquisas qualitativas durante o desenvolvimento do produto, submetendo atributos
como design e acabamento à apreciação de uma audiência controlada, monitorando e
identificando previamente possíveis percepções do consumidor.
•
Implantação de um sistema de informação de marketing que permitia monitorar e
antecipar movimentações da demanda a partir da variação nas margens dos
concessionários, os quais eram livres para fixar o preço final do veículo. Até então, a
alteração na demanda só era percebida no início dos movimentos de aumento ou
diminuição das quantidades vendidas. O sistema permitiu integrar as atividades de
planejamento de produção e organização de distribuição e vendas com as ações de
marketing.
•
Programa de “desproliferação” de peças, introduzindo avaliações estatísticas sobre o
volume de vendas de uma determinada peça ou acessório opcional e o custo de
desenvolvimento e manutenção em estoque. Acessórios que não se justificassem em
termos de retorno eram descontinuados.
148
•
Programa de teste e reparo, quando necessário, dos veículos que saíam da linha de
montagem, antes que estes fossem para o mercado.
•
Estabelecimento de um programa de melhoria de lucros, definindo um especialista
interno para ajudar a avaliar a viabilidade e a controlar a implementação das idéias que
os gerentes das áreas tinham para reduzir o custo ou aumentar receitas.
•
Criação de um departamento de análises de sistemas, com a finalidade de
harmonizar os diversos sistemas computadorizados da divisão, integrando marketing,
vendas e produção. Em três anos, a Chevrolet tornou compatível a linguagem dos
sistemas, permitindo relacionar desde a solicitação de produtos feita pelo distribuidor,
até o planejamento de compras de matérias-primas.
•
Parcerias de desenvolvimento de componentes com fornecedores externos à General
Motors.
As ações de John DeLorean na Chevrolet produziram ganhos de eficiência e
recuperaram sua lucratividade. A divisão voltou a bater recorde de vendas, chegando a
3,1 milhões de veículos em 1972. Este volume foi atingido mesmo com a redução da
gama de produtos oferecidos. O número de modelos de carros diminuiu de 35 para 32, as
179 combinações de motor caíram para 75 e, no caso do Camaro, que possuía 2700
combinações de painel, a variedade foi reduzida para 96. A redução da diversidade de
peças e o melhor planejamento de produção aumentaram o giro dos estoques de 16 para
25 por ano, entre 1969 e 1972, e as despesas anuais com fretes extras caíram em U$ 11
milhões. Os custos de desenvolvimento também foram reduzidos: depois de dois anos,
com a reorganização das atividades, DeLorean havia eliminado 2400 cargos de
engenheiros, analistas e gerentes, sem que fossem necessárias demissões. Os
orçamentos de engenharia que tradicionalmente estouravam passaram a gerar sobras,
devido ao ganho de eficiência em desenvolvimento. Os gastos com desenvolvimento
caíram de U$ 273 milhões em 1970 para U$ 125 milhões em 1972. Com todas essas
ações, DeLorean simultaneamente aumentou vendas e reduziu custo, produzindo maior
lucro com menor investimento, portanto, melhorando a taxa de retorno da divisão.
Apesar de a atuação de DeLorean à frente da Chevrolet ter sido reconhecida como
de sucesso, as práticas que ele introduziu em raros casos foram rapidamente
aproveitadas em outras divisões da organização. Alguns dos projetos da Chevrolet sequer
foram autorizados a sair do papel, como foi caso do K-car. Outras práticas foram
149
descontinuadas quando DeLorean deixou a General Motors ou, no caso das ações em
áreas de produção e qualidade, acabaram quando a GMAD absorveu as plantas da
Chevrolet. Em grande parte dos casos, os processos estabelecidos entre 1969 e 1972
foram incorporados na rotina da divisão, porém sem serem devidamente replicados ou
integrados a outras áreas até muitos anos depois. John DeLorean se sentiu frustrado
diante da incapacidade de atuar como queria nas atividades corporativas e, em 1973,
pediu demissão da General Motors, cerca de um ano após ter sido promovido (WRIGHT,
1974).
A passagem de DeLorean pela Chevrolet coincidiu com os últimos anos da gestão
de James Roche, que se aposentou em 1971. Durante a segunda metade dos anos 1960,
a GM manteve seu desempenho em faturamento, margens de lucro e retorno sobre o
ativo em níveis altos, porém com uma ligeira queda, já que o mau desempenho da
Chevrolet em determinado período foi apenas parcialmente compensado pelas altas
margens de suas divisões de veículos intermediários e de luxo. A GM manteve os altos
volumes de vendas e a participação de mercado próxima a 50%. A exceção foi o ano de
1970, quando uma recessão econômica e uma greve de 67 dias paralisaram fábricas e
causaram queda no faturamento. Ainda assim, a GM fechou a década com a operação
com lucros e mantendo a distribuição de dividendos.
Em termos financeiros, a General Motors se recuperou rapidamente em 1971, ano
em que a indústria bateu recorde de vendas e, pela primeira vez, ultrapassou a marca de
12 milhões de veículos. O bom ano recebeu, em dezembro, o novo CEO Richard
Gerstenberg, até então vice-presidente do conselho de administração e presidente do CF.
Gerstenberg assumiu com a perspectiva de um curto mandato, uma vez que a
aposentadoria compulsória aos 65 anos só o permitiria ficar no comando por dois anos.
No entanto, sua ascensão marcou o retorno de um executivo de finanças ao posto mais
alto da organização. A escolha de Gerstenberg efetivamente definiu a orientação
financeira que a organização teria para a posição do CEO dali em diante. O presidente Ed
Cole foi mantido no cargo, no entanto, Thomas Murphy foi movido da organização de
finanças para ocupar a vice-presidência, responsável pelas operações de carros e
caminhões. Tom Murphy teve sua carreira acelerada, saindo da posição de controler para
tesoureiro e, em seguida, para a área de operações, tudo em um período de apenas
quatro anos. Murphy estava sendo preparado para assumir a posição de Gerstenberg a
partir de 1973.
150
4.1.20.
Desafios na primeira metade da década de 1970
Apesar das boas expectativas que a aceleração nas vendas em 1971 causaram, o
início da década de 1970 seria marcado por muitos desafios para a General Motors. Além
do acirramento da concorrência dos importados e das dificuldades em desenvolver um
veículo compacto competitivo, a GM se veria novamente às voltas com greves e
negociações trabalhistas, além de diversos problemas com a qualidade dos produtos.
Após a intensa proliferação de modelos e estilos durante as décadas de 1950 e
1960, a indústria automobilística consolidava seus segmentos em cinco categorias de
automóveis, além das caminhonetes. As classes de veículos de passageiros são
apresentadas na tabela 4.6 abaixo:
Quadro 4-5 Classes de veículos no início da década de 1970, segundo o
comprimento
Comprimento médio
Pacela da produção das
Três Grandes
5,4 metros
40% a 45%
5 metros
20% a 25%
Carros compactos
4,7 metros
10% a 15%
Carros subcompactos
4,3 metros
5% a 10%*
Diversas metragens
10% a 15%
Classes de veículos
Carros grandes
Carros intermediários
Carros especiais
Fonte: adaptado de Rubenstein (2001) p 224.
*Os concorrentes importados se concentravam nesta categoria e detinham entre 15% a
20% do mercado.
As divisões da General Motors competiam em praticamente todas as classes de
tamanhos, compartilhando componentes e plataformas. A semelhança de desempenho e
de atributos dos veículos foi o resultado dos esforços para comunizar as peças, iniciados
na metade da década de 1960. Com isso, tornava-se cada vez mais difícil diferenciar os
produtos perante o consumidor a ponto de convencer-lhe a pagar mais por um Oldsmobile
que possuía exatamente o mesmo motor que o modelo equivalente da Chevrolet.
O crescimento da demanda por veículos compactos foi um desafio que, pela
segunda vez, a GM se propôs a enfrentar – a primeira vez havia sido com o fatídico
Corvair. Desta vez, a aposta era o lançamento do Vega, programado para setembro de
1970. O primeiro carro completamente desenvolvido pelo staff corporativo, porém, não
atenderia os objetivos traçados pelos executivos da GM quando o anunciaram. O Vega
havia ficado 170 quilos mais pesado do que a meta de 900 quilos, e a versão mais básica
151
teve o preço final estabelecido em U$ 2091, ou seja, U$ 311 acima do Fusca e U$ 172
acima do preço do Ford Pinto. A despeito da falta de competitividade do compacto da GM,
o Vega enfrentou outro grave problema na época de seu lançamento: a greve iniciada
pela UAW, em outubro de 1970.
Após mais de 20 anos negociando com Ford e Chrysler e depois apenas
replicando os acordos feitos para a GM, em 1970, a UAW escolheu a GM como alvo para
a negociação do novo contrato. As exigências iniciais do Sindicato incluíam um aumento
de U$ 2,50 e o direito de aposentadoria após 30 anos de serviço. Porém, quando as
conversas se iniciaram, General Motors e UAW perceberam que a greve seria inevitável,
pois a distância entre as partes desta vez era grande. Com três semanas de pacíficas
paralisações nas fábricas, as posições ainda não haviam se aproximado o suficiente. A
GM oferecia 38 centavos de aumento, contra a exigência de 61 centavos. Além disso, a
empresa exigia limite mínimo de 58 anos para o direito à aposentadoria. A negociação só
foi ter um desfecho depois de 67 dias de greve, com ambas as partes fazendo
concessões. O aumento foi acertado em 51 centavos, enquanto a aposentadoria manteve
a idade mínima de 58 anos, sendo que, se o operário decidisse se aposentar antes desta
idade, deveria aceitar uma redução no valor do pagamento. A decisão das partes só
aconteceu depois de um alto custou pago por ambas. O sindicato consumiu todo o fundo
de greve e ainda se endividou para levantar os U$ 120 milhões usados para amparar 350
mil operários e suas famílias. Pelo lado da GM, cerca de 1,5 milhão de veículos deixaram
de ser fabricados, significando uma perda de receita de aproximadamente U$ 5 bilhões.
Dentre os veículos não produzidos estava o principal foco de atenção e grande aposta
dos últimos dois anos, o Vega.
Quando a greve iniciou na planta de Lordstown, havia apenas 24 mil Vegas em
estoque, porém a campanha publicitária de U$ 12 milhões programada para os meses de
outubro e novembro já estava rodando. O fornecimento aos concessionários só voltou a
ocorrer em janeiro de 1971. A estimativa de vendas da GM para o Vega era de 400 mil
unidades no primeiro ano, sendo que 100 mil desse total seria fruto da migração de
consumidores do Fusca. Contudo, o Vega foi um verdadeiro fiasco. Ao final de 1971,
apenas 245 mil unidades foram vendidas, e o novo veículo ficou atrás inclusive do
concorrente da Ford, que vendeu 317 mil unidades. Além disso, como se não bastasse a
frustração no desempenho nas vendas, o Vega ainda sofreria com outro grave problema:
a falta de qualidade.
152
Os primeiros Vegas a saírem da fábrica não dispunham de grande confiabilidade.
Algum tempo depois do lançamento, 132 mil carros sofreram recall15 para troca de
componentes do carburador. Até o ano de 1972, o Vega teria novos recalls, que afetaria
95% dos veículos fabricados em Lordstown, fábrica exclusiva para o Vega. Porém, o
defeito mais danoso à imagem do veículo foi quando os motores em aluminium
começaram a sofrer com o super aquecimento. O efeito do calor excessivo gerado pelo
próprio funcionamento do carro provocava problemas irreversíveis em seu motor,
obrigando a sua troca.
Os problemas de qualidade e recalls nos veículos da GM começaram a se tornar
freqüentes depois da entrada em vigor da legislação de segurança veicular em 1967, que
também determinava a responsabilidade do fabricante sobre defeitos de fabricação.
Dentre os primeiros casos esteve o recall para reparar um defeito sistemático que
causava o vazamento para o compartimento de passageiros de resíduos gasosos da
combustão do motor. Em 1968, o inspetor Edward Gregory levantou a hipótese de que
veículos fabricados na planta de Saint Louis possuíam tal vazamento, depois de encontrar
dentro de um carro os corpos de três pessoas e dois cachorros mortos, intoxicados com
monóxido de carbono. Sete meses e outras 29 mortes depois de encontradas as
primeiras evidências, a GM lançou um recall, em 1969, de 2,5 milhões de veículos
fabricados entre 1965 e 1969. Na mesma época, foi feito outro recall para corrigir um
defeito no carburador de 2,9 milhões de carros e caminhonetes produzidos entre 1968 e
1969 em todas as divisões.
Outro importante recall ocorreu em 1970, quando a GM de uma só vez convocou
6,7 milhões de veículos à sua rede de concessionárias. O problema era decorrente do
coxim utilizado nos veículos, que era propenso à quebra depois de algum tempo de uso.
O coxim é utilizado para apoiar o motor dentro do compartimento do veículo e a sua
quebra provoca o deslocamento do motor. No caso dos carros da GM, o deslocamento
fazia com que o motor travasse a uma velocidade de 40 quilômetros por hora e causasse
diversos acidentes de trânsito. Segundo DeLorean (WRIGHT, 1974), este defeito havia
sido descoberto em testes realizados pela Pontiac ainda em 1966. Na época, a Pontiac
desenvolveu um novo coxim que passou a ser montado em seus carros, porém nenhuma
outra divisão decidiu usar o novo componente. Em 1969, quando os relatórios indicando o
15
Termo em inglês refere-se à convocação de proprietários de um produto para que recebam serviço gratuito
de reparo de defeitos de fabricação. O termo “recall” foi mantido no texto por ser amplamente conhecido por
consumidores e pela indústria no Brasil
153
defeito começaram a chegar em grande quantidade, o presidente da GM, Ed Cole, e o
vice-presidente de carros e caminhões, Tom Murphy, ainda tentaram evitar que o recall
fosse feito, pois o custo da substituição das peças seria de cerca de U$ 40 milhões. No
entanto, diante da grande exposição negativa que o problema ganhou na mídia, a GM
cedeu à pressão e aprovou o recall dos veículos fabricados entre 1965 e 1970.
A atenção dos meios de comunicação com questões de segurança e qualidade
dos veículos passou a ser cada vez maior desde o incidente do Corvair em 1965. O Vega
seria um dos primeiros cujas vendas sofreriam com a má reputação do produto. Após os
diversos recalls e o problema de aquecimento do motor pelos quais o carro passou, uma
nova greve na fábrica de Lordstown em 1972 acrescentaria outra mancha à imagem do
produto.
A origem da greve desta vez não estava relacionada a aumento de salários, mas
sim a condições de trabalho. Quando as plantas da Chevrolet finalmente passaram para a
divisão GMAD, diversas mudanças foram promovidas. No caso de Lordstown, a fim de
torná-la mais competitiva em custo e em produtividade, logo em setembro de 1971, 700
operários foram demitidos, sendo parte deles aqueles que estavam alocados no programa
de inspeção de qualidade criado por DeLorean e prontamente eliminados pela GMAD.
Além disso, alguns processos produtivos foram automatizados e a velocidade da linha de
montagem foi acelerada para atingir a meta de 100 carros montados por hora. Em pouco
tempo, as reclamações dos operários começaram a se acumular, o excesso de horas
extras, faltas e problemas físicos, devido à alta carga de trabalho, foram alguns dos
problemas enfrentados pelos comitês de fábrica. O sindicato local iniciou uma greve
reclamando melhores condições de trabalho e redução da velocidade da linha de
produção. O movimento foi resolvido de forma razoavelmente rápida com um acordo
fechado em 22 dias. Diante da revolta dos empregados a GM reduziu a meta de
fabricação de 100 para 60 carros por hora, e os programas para ampliar a automatização
da linha foram suspensos.
No entanto, os danos para o Vega seriam bem mais graves do que a simples
perda de três semanas de produção. Durante as paralisações, operários grevistas
concederam entrevistas à imprensa atestando que os carros feitos em Lordstown eram de
péssima qualidade, que as máquinas utilizadas na linha operavam em ritmo acelerado,
impossibilitando a montagem adequada e a correção de defeitos. Com tantos problemas
envolvendo um de seus principais lançamentos no início da década de 1970, a GM ainda
154
se esforçou para evitar o fracasso de mais uma tentativa de fabricar um carro compacto
de baixo preço. Para combater a queda nas vendas do Vega, a Chevrolet lançou, a partir
de 1973, um programa de garantia que cobriria reparos feitos até o veículo completar 60
mil quilômetros. A oferta de garantia aumentaria significativamente as despesas da GM
com este serviço adicional. Além disso, novas versões mais equipadas, como o Italian
Vega, recuperariam as vendas no decorrer da década permitindo que o compacto da
Chevrolet ultrapassasse seu competidor equivalente da Ford.
Apesar dos muitos problemas com a qualidade de seus veículos, a GM optou por
apenas manter o sistema de medição de defeitos criado ao longo da década de 1960,
incentivar o corte de custos e continuar oferecendo os serviços de garantias aos
compradores de seus produtos. Em 1960, a GM criou um índice que apontava o número
de defeitos por carros fabricados em uma planta, em uma escala que ia de 0 a 100. Um
carro com zero defeitos teria a pontuação de 100; se tivesse cinco defeitos pontuaria em
95, e assim por diante. Porém quando o índice foi aplicado em todas as fábricas, muitas
tiveram dificuldades em atingir a meta de 60, ou seja, 40 defeitos por veículo. Em 1968, a
GM estabeleceu nova escala para o índice, indo até 145, porém com a lista de defeitos
possíveis mantida em 100. Com isso, um carro com cinco defeitos teria a pontuação de
140, e um carro com 100 defeitos, a pontuação de 45. Os bônus dos gerentes das
fábricas passaram a incluir mais este critério em suas avaliações. Este sistema
permaneceu na GM até o final da década de 1980. O método utilizado pela General
Motors fazia com que gerentes de fábricas que atingissem um índice de 130, equivalente
a 15 defeitos por veículo, recebessem premiações por tal desempenho.
Com todos os problemas enfrentados pela GM no lançamento do Vega, na falta de
qualidade e nas questões com o sindicato nos primeiros anos da década, os principais
indicadores de desempenho da organização se recuperaram ao longo da gestão de
Gerstenberg e apresentaram alguns números recordes em 1973. O faturamento que havia
caído 22%, chegando a U$ 18 bilhões em 1970, atingiu U$ 35 bilhões em 1973. No
mesmo período, o lucro que havia caído para U$ 609 milhões também bateu novo
recorde, chegando a U$ 2,9 bilhões. O volume de vendas, que havia caído 32% em 1970,
com 3,6 milhões de unidades, aumentou 81% em quatro anos, estabelecendo novo
recorde de 6,5 milhões de veículos. Dentre estes principais indicadores, o único que a GM
não foi capaz de recuperar totalmente em relação aos níveis obtidos na década de 1960
foi o de participação de mercado. Os diversos problemas internos e externos no ano de
155
1970 fizeram com que a participação de mercado da GM caísse momentaneamente do
patamar de 50% para 35%. Mesmo com a recuperação no volume das vendas para níveis
recorde em 1973, a participação de mercado fechou em 45%.
Um dos fatores que contribuiu para a recuperação da GM durante a gestão de
Richard Gerstenberg foi uma série de medidas adotadas pelo governo do presidente
norte-americano Richard Nixon em relação à política externa. Em 1970, o próprio
Gerstenberg, ainda vice-presidente do conselho da GM, foi indicado por Nixon para
participar da comissão presidencial sobre comércio e investimento internacional.
Trabalhando entre Detroit e Washington, Gerstenberg ajudou a elaborar o estudo que
propunha, dentre outras medidas, uma sobretaxa aos veículos importados. As
recomendações do estudo foram implementadas em um pacote aprovado pelo presidente
Nixon em 15 de agosto de 1971. Agindo sob a autoridade que lhe foi concedida na lei de
estabilização econômica aprovada um ano antes, o presidente dos Estados Unidos
eliminou um imposto federal de 7% sobre todos os automóveis vendidos nos país desde
1942 e passou a aplicar uma sobretaxa de 10% na importação de veículos. Além disso,
Nixon suspendeu o sistema de conversibilidade estabelecido no acordo de Bretton
Woods, levando o dólar a se desvalorizar perante as demais moedas internacionais. Com
as novas medidas do governo norte-americano em 1971, praticamente de um dia para o
outro, o compacto Chevrolet Vega reduziu a diferença de preço para o imbatível Fusca de
U$ 311 para apenas U$ 23.
4.1.21.
Choque do petróleo e o início da gestão de Thomas
Murphy
A discreta participação da GM na decisão do governo americano de aumentar as
tarifas de importação de veículos contrariou um longo histórico de defesa da liberalização
do comércio internacional, por meio da associação dos fabricantes AMA. O balanço de
pagamentos da GM nos Estados Unidos, com suas subsidiárias no exterior, acumulou um
total de U$ 11,7 bilhões entre 1946 e 1967, sendo que só em 1967 o valor foi de U$ 782
milhões. Tanto a GM quanto suas concorrentes americanas ampliaram suas operações
no exterior, adquirindo empresas e instalando subsidiárias. Das três subsidiárias no final
dos anos 1940 (Opel, Vauxhaul e Holden), a GM ainda abriu operações em países da
América Latina nas décadas de 1950 e 1960 e adquiriu participação em empresas locais
na Ásia, como na japonesa Isuzu, em 1971, e posteriormente na coreana Daewoo, em
156
1979, mas manteria essas subsidiárias com operações autônomas respondendo
diretamente ao CE.
Apesar do aumento das operações internacionais por parte da GM, o ano de 1973
marcaria o primeiro de uma série de seguidos saldos negativos na balança comercial do
setor automotivo, registrando U$ 3,3 bilhões de déficit. As importações eram feitas em
pequenos volumes por empresas como Volvo, Fiat, Renault e Opel e, nos casos da
européia Volkswagen e das japonesas Toyota, Honda e Nissan, os números eram mais
significativos. Dessas quatro montadoras, apenas as japonesas sustentariam um
crescimento importante ao longo da década de 1970. Apesar da vantagem de preço e da
boa aceitação pelo consumidor americano conquistada durante a década de 1860, o líder
entre os importados, o Fusca, entraria em decadência após o volume recorde de 569 mil
unidades em 1970. Com seu modelo pouco alterado de um ano para outro, desde a
introdução no mercado em 1952, o Fusca foi descontinuado no mercado americano em
1977.
Em outubro de 1973, a Organização dos Países Exportadores de Petróleo
(OPEP) declarou um embargo na venda de petróleo aos Estados Unidos, depois que seu
governo anunciou apoio militar ao estado de Israel na guerra do Yon-Kippur, no Oriente
Médio. O embargo causou a escalada dos preços internacionais do barril de petróleo e
afetou mais fortemente o abastecimento nos países importadores. Nos Estados Unidos,
um sistema de racionamento na venda de combustível passou a vigorar já no final de
novembro, com as vendas controladas pela placa do carro. O embargo da OPEP foi
suspenso cerca de seis meses depois, no entanto os preços do petróleo, antes em um
patamar estável de U$ 3 por barril, quadruplicaram, estabilizando-se na faixa de U$ 12
por barril. As conseqüências da crise do petróleo de 1973 provocariam mudanças
profundas na competição da indústria automobilística nos Estados Unidos e no mundo.
A partir de 1973 a preocupação com a eficiência no consumo de combustível
passou a ser altamente relevante na decisão de compra de um automóvel. Com isso, a
GM e suas concorrentes americanas, cuja linha se concentrava em veículos de alto
consumo por serem grandes e equipados com motores de oito e seis cilindros, viram suas
vendas despencarem. Em 1974, as vendas na indústria caíram 21%, mas na GM o
volume total diminuiu ainda mais, 28%, e ao se considerar o segmento de veículos
grandes, o percentual de queda chegou a quase 50%.
157
A resposta dos executivos da GM foi imediata. Ainda sob o comando de
Gerstenberg, a GM aprovou no final de 1973 um amplo plano de redução no tamanho dos
veículos oferecidos ao consumidor. O Plano de Redução16, como ficou conhecido,
estabeleceu os seguintes objetivos:
• Priorizar a produção dos modelos compactos da GM, incluindo o Vega, de forma que
estes correspondessem a 25% dos produtos oferecidos em 1974, e 40% em 1975.
• Aumentar o conteúdo de acessórios embutidos nas versões dos modelos compactos
como forma de aumentar as margens de cada venda, a fim de manter as taxas de
retorno.
• Redimensionar toda a linha de veículos grandes e intermediários, reduzindo a distância
entre eixos, eliminando componentes e substituindo partes, de forma a torná-los mais
leves e econômicos.
Para cumprir com a tarefa de redesenhar todos os produtos da linha de produção,
a GM investiu um total de U$ 3 bilhões, sendo que U$ 600 milhões foram obtidos através
da emissão de títulos de dívida. Foi a primeira emissão desde o plano de expansão após
a Guerra da Coréia, 20 anos antes. Alguns dos efeitos do plano tornaram-se evidentes em
plena recessão econômica, no ano de 1974. A GM promoveu quatro aumentos de preços
durante o ano, acumulando uma alta de 20% sobre os preços do ano anterior. A guerra de
preços com os importados deu lugar a um aumento generalizado na indústria. Além dos
10% de impostos, os importadores se viram obrigados a aumentar os preços, mesmo com
o excesso de produtos em estoque, pois quando tentaram baixá-los foram repreendidos
sob a acusação de prática de dumping. Destoando dos demais importadores, a Toyota
decidiu manter os preços e as quantidades programadas de suas vendas.
A implementação do Plano de Redução ficou sob responsabilidade do novo
presidente do conselho de administração e CEO, Tomas Murphy, que substituiu Richard
Gerstenberg. Tom Murphy nomeou Elliot Estes como presidente da General Motors no
lugar de Edward Cole que, assim como Gerstenberg, aposentou-se no fim de 1973.
Thomas Murphy assumiu em meio a uma época tumultuada. Em certa ocasião, quando
conversava com um grupo de analistas financeiros, declarou publicamente, pela primeira
vez na história da GM, uma meta corporativa de retorno para o acionista de 15% a 20%
(CRAY, 1980).
16
Tradução livre do termo original utilisdo “Downsizing Plan”
158
No ano de 1975, a GM apresentou sua linha de veículos com um aumento padrão
de U$ 500. A programação de produção para veículos grandes era correspondente a 32%
do total para o ano, no entanto, a rejeição destes modelos nas concessionárias obrigou a
GM a oferecer descontos que chegaram a U$ 600. Outro artifício utilizado para
impulsionar as vendas, tentando compensar o aumento nos preços, foi oferecer
financiamentos prolongados. A GMAC e outras financiadoras de veículos passaram a
conceder crédito com prazo de quatro anos, cujos juros ao final do empréstimo
correspondiam a um quarto do valor pago. O aumento na produção de carros compactos
seguiu conforme o projetado, chegando a dois milhões de veículos, cerca de 40% das
vendas. Ainda assim, a alta não foi suficiente para manter a participação de mercado da
GM nos níveis anteriores à crise, ficando em torno de 42%.
A queda na indústria nos anos de 1974 e 1975 reduziu o volume de vendas a um
patamar de 11 milhões de carros e caminhões, contra os 14,3 milhões em 1973. Essa
redução afetou mais fortemente as Três Grandes e abriu espaço para as importadoras
japonesas, como Toyota, Honda e Nissan, que ofereciam veículos compactos e
econômicos. O choque do petróleo marcaria o início da trajetória de crescimento das
fabricantes japonesas na indústria norte-americana. As vendas das três japonesas, que
era de 458 mil unidades em 1974, cresceram 222% em seis anos, chegando a 1,5 milhão
de carros. Em 1980, a participação de mercado estava em 13% ante os 4% registrados
seis anos antes. Apesar da redução nas vendas e da queda da participação de mercado,
a capacidade da GM em mobilizar recursos e acelerar a remodelação de todos os seus
veículos, ao mesmo tempo em que promovia mudanças nas linhas de produção, fez com
que os principais indicadores de desempenho permanecessem em níveis positivos. Ao
contrário da Chrysler, que amargou prejuízos, e da Ford, que viu seu lucro reduzir em dois
terços, a GM recuperou-se mais rapidamente. Em 1974, depois da queda no faturamento
e nos lucros, -12% e -60% respectivamente, em 1975 a GM apresentou crescimento de
13% no faturamento e de 32% no lucro, correspondentes a U$ 35 bilhões e a U$ 1,25
bilhão, respectivamente. Contudo, a força da resposta da GM à crise seria mais
claramente percebida na segunda metade da década de 1970.
4.1.22.
Recuperação da indústria até o 2º choque do petróleo
A resposta do governo americano ao embargo dos países árabes veio em 1975
com a aprovação da Lei de Políticas e Conservação de Energia, que estabeleceu três
159
principais medidas com o objetivo de contornar os problemas relacionados à dependência
do petróleo. A primeira medida foi a priorização da importação de petróleo de nações com
as quais os Estados Unidos possuíam boas relações, como Arábia Saudita, México e
Venezuela. Em segundo lugar, estabeleceu-se a criação de reservas estratégicas de
petróleo, capazes de ajudar a regular flutuações da oferta e da demanda. Por fim, foi
criada uma política de incentivo ao uso eficiente do petróleo. Dentre os principais
componentes desta terceira política estava a criação do Corporate Average Fuel Eficiency
(CAFE), que teria o objetivo de reduzir o consumo de combustível da frota de veículos
norte-americana.
Por meio do CAFE, o governo estabeleceu que a média do consumo de todos os
veículos vendidos em um ano, por cada fabricante ou importador, deveria atender a um
limite mínimo de quilômetros por litro (Km/L)17, o qual seria determinado e controlado pelo
Departamento de Transportes dos Estados Unidos. A pena para o não-cumprimento do
CAFE seria de U$ 2 por cada 0,04 Km/L acima do limite, multiplicado pelo número de
veículos vendidos. Assim sendo, um fabricante X que possuísse dois modelos A e B,
sendo que A tivesse vendido 5000 unidades com consumo médio de 10,7 Km/L, e B
tivesse vendas de 10000 unidades e consumo 8,5 Km/L, teria sua média calculada da
seguinte forma:
((5000 x 10,7) + (10000 x 8,5)) / 15000 = 9,93 Km/L
O limite estabelecido para o CAFE em 1975 foi de 7,7 Km/L, porém só entraria em
vigor para os veículos vendidos em 1978. A partir de 1979, os limites passaram a
diferenciar carros e caminhonetes. Os veículos comerciais leves com tração nas quatro
rodas receberam um CAFE de 6,3 Km/L, enquanto as com tração em duas rodas
passaram para 6,7 Km/L. A justificativa para tal mudança era que, por ser veículo de
carga, a caminhonete teria seu tamanho diminuído para cumprir com o CAFE, mas
produziria o efeito oposto em função do aumento do número de viagens. O CAFE ainda
seria gradualmente alterado até a década de 1990, quando os limites foram estabelecidos
em 11,5 Km/L para carros e em 8,5 Km/L para caminhonetes.
Inicialmente, as fabricantes americanas se opuseram ao CAFE, alegando que,
para atender aos limites, 90% de suas vendas teriam que ser de carros compactos. No
entanto, os executivos das montadoras não cogitavam ultrapassar os limites, uma vez que
17
A legislação faz referência a milhas por galão, que são as unidades de medidas oficialmente utilizadas nos
Estados Unidos. Neste trabalho, a referência às medidas foi convertida para quilômetros por litro.
160
seus cargos poderiam ser questionados por acionistas, caso houvesse descumprimento
de regulamentação federal. GM, Ford e Chrysler cumpriram com as normas do CAFE
promovendo uma série de alterações nos veículos, como redução nas dimensões da
carroceria, uso de partes de plástico e borracha, substituição dos pneus por pneus radiais,
modelos com tração dianteira, melhores e mais eficientes lubrificantes e, posteriormente,
controle de injeção eletrônica de combustível. Tais mudanças reduziram o peso e
melhoraram a eficiência no consumo.. Com isso, o consumo médio de combustível dos
novos veículos subiu de 6,7 Km/L em 1975 para 11,1 Km/L em 1982 (RUBENSTEIN,
2001).
Para atender aos novos limites de consumo de combustível, a GM acelerou o
andamento de seu Plano de Redução. Em 1975, foi lançado o Chevette, um compacto de
quatro cilindros baseado em uma plataforma desenvolvida pela Opel e que era vendida na
Europa e no Brasil. O Chevette passou a ser o menor e mais barato carro da linha da GM,
ao preço de U$ 2900. Tinha por objetivo competir com os importados japoneses e o
decadente Fusca. Ainda em 1975, a General Motors lançou, depois de dois anos de
indecisão do CE, o Cadillac Seville. O novo veículo encerrou o ciclo da divisão de luxo da
GM sob o lema de carros maiores e melhores. O Seville usaria a plataforma intermediária
da GM. Equipado com os acessórios mais luxuosos e com um preço de U$ 12000, seria
posicionado para enfrentar as vendas crescentes dos veículos da alemã Mercedes, que
com dimensões menores que os gigantes Cadillacs conseguiam um preço U$ 7000 maior.
No final de 1976, o Plano de Redução foi implementado em toda a linha de
veículos da GM. Com isso, os veículos grandes tiveram suas dimensões aproximadas dos
antigos intermediários e estes, por sua vez, foram reduzidos para um tamanho próximo ao
dos carros compactos. A mudança promovida pela GM, em função da crise do petróleo,
finalmente poria um fim nos enormes carros que haviam justificado os recordes de
margens e retornos durante as décadas de 1950 e 1960. Apesar disso, a redimensionada
classe de veículos grandes trouxe otimismo para a GM. Com a parcial recuperação do
volume de vendas da indústria, os novos modelos significaram um aumento de 68% nas
vendas da linha de veículos grandes em relação ao fraco ano de 1975 (RUBENSTEIN,
2001), fazendo com que a participação de mercado da GM chegasse ao recorde de 52%.
O ano de 1976 marcaria o maior pagamento de bônus para os executivos da GM até
então. Thomas Murphy recebeu 65% a mais do que no morno ano de 1975, com um
161
bônus total de U$ 950 mil, enquanto o bônus do numero dois da organização, Elliot Estes,
foi de U$ 600 mil.
Ainda
em
1976,
a GM aprovou novos
investimentos em pesquisa e
desenvolvimento na busca por carros com maior eficiência no consumo. Depois de dois
anos protelando a decisão, o CE aprovou o programa para a nova linha de X-cars. A
condução das atividades de desenvolvimento seria semelhante à do Vega no final dos
anos 1960, novamente sob de responsabilidade do staff corporativo. A plataforma X, que
era compartilhada por alguns veículos intermediários, seria reformulada, passando a rodar
com motor e tração dianteiros, o que reduziria o peso em 150 quilos. O X-car seria
lançado simultaneamente em quatro das cinco divisões, diferenciados apenas pelos
elementos de design. Além disso, a GM iniciou pesquisas sobre o uso de eletricidade. A
divisão Delco havia desenvolvido um veículo elétrico para uso do programa espacial da
NASA, e a idéia foi ampliada para novas frentes de pesquisa no GM Research Labs.
Além do esforço para superar os desafios nas operações automotivas, a GM
promoveu mudanças também na sua estratégia em relação a algumas de suas operações
não-automotivas. O designado para conduzir a recuperação da divisão não-automotiva e
de defesa, que incluía a Frigidaire, a Terex de escavadeiras e máquinas pesadas e a
Allison, foi George Boham Smith. Smith era um profissional da carreira de finanças que
seguiu passos semelhantes aos de Albert Bradley, Fred Donner, Richard Gerstenberg e
Thomas Murphy, recentes CEOs da GM, e continuaria seguindo, pois foi o substituto de
Tom Murphy em 1981. Na sua gestão à frente das atividades não-automotivas, George
Smith promoveu uma ampla análise da viabilidade dos negócios e surpreendeu aos
executivos membros do CE quando propôs que a melhor alternativa para duas das
operações, a Frigidaire e a Terex, era a venda das empresas. A aprovação da operação
proposta por Smith foi lenta, mas o promissor executivo persuadiu o CE, e ambas as
unidades tiveram vendas consideradas bem-sucedidas no final da década.
Aproximando-se do final da década de 1970, a indústria automobilística dos
Estados Unidos apresentava um panorama bastante diferente daquele que se construiu
desde o final da Segunda Guerra. A mudança na preferência do consumidor, somada com
as diversas exigências legais sobre especificações dos veículos, havia criado grandes
dificuldades para as concorrentes Ford e Chrysler. Ao não dispor de recursos suficientes
para alterar toda sua linha de produtos, estas empresas sofreram com a severa queda
nas vendas de seus veículos grandes. Ao mesmo tempo, os importados, sobretudo
162
japoneses, competiam de forma implacável em preço e qualidade com suas linhas de
carros compactos. Desde os anos 1960, os importados vinham aumentando
gradualmente sua participação de mercado e atingiriam a faixa entre 18% e 20% na
segunda metade dos anos 1970.
Dentre as americanas, apenas a General Motors
manteve um desempenho satisfatório durante a década.
Com todo o incentivo sobre as vendas de carros compactos, a GM teve um
desempenho apenas razoável em suas tentativas de competir no segmento de carros
pequenos e de baixo preço ao longo dos anos 1970. A primeira incursão neste mercado,
com o Chevrolet Vega, enfrentou graves problemas de qualidade e só foi decolar
realmente depois que alguns acontecimentos permitiram que a GM carregasse o veículo
de acessórios e de margem de lucro. O Vega foi descontinuado em 1978, permanecendo
apenas em sua versão esportiva Monza. No caso do super compacto Chevette, lançado
em 1975 com um preço U$ 124 mais barato do que o concorrente da Toyota, logo no
primeiro ano o programa de produção teve de ser reduzido em 10% devido à baixa
aceitação do consumidor americano. Porém, mesmo com a dificuldade em ser competitiva
no segmento que mais crescia, a General Motors apresentou rápida recuperação depois
do choque do petróleo de 1973. A tática de redimensionar sua linha de veículos grandes,
tornando-os mais eficientes e atrativos, fez com que a participação do mercado voltasse
para o patamar próximo a 50%. A receita líquida, que antes da crise de 1973 era de U$ 35
bilhões, alcançou o valor recorde de U$ 66 bilhões em 1979, enquanto o lucro, além de se
manter positivo mesmo nos piores anos da crise, alcançou valores recordes, chegando a
U$ 2,9 bilhões.
Em 1979, quando consumidores e indústria já se acostumavam com os novos
padrões do mercado de automóveis, uma série de movimentações políticas no Oriente
Médio provocou um novo choque nos preços do petróleo. A Revolução Iraniana, no
começo do ano, retirou do poder o Xá Reza Pahlavi e colocou o Ayatollah Ruhollah
Khomeini. Dentre as primeiras medidas do novo regime estava a decisão de reduzir a
produção de petróleo no Irã. Mesmo com a tentativa da Arábia Saudita e de outras
nações da OPEP de compensar a diminuição da oferta por meio do aumento do nível de
suas produções, os preços do barril de petróleo dispararam no mercado internacional. O
segundo choque do petróleo, como ficou conhecido, ainda foi agravado com a guerra
entre Irã e Iraque iniciada em 1980. Com o confronto, o Irã suspendeu totalmente a
163
produção e fez aumentar ainda mais as incertezas nos mercados. A crise alterou o
patamar dos preços do petróleo, subindo de U$ 15 para U$ 39 o barril.
Com a nova escalada nos preços dos combustíveis, o interesse do consumidor
norte-americano novamente se concentrou em veículos com maior eficiência no consumo
de combustível, o que construiu um cenário promissor, na medida do possível, para a
nova linha do X-Car que chegava às divisões. Os novos Chevrolet Citation, Pontiac
Phoenix, Oldsmobile Omega e Buick Skylark eram derivados da mesma plataforma,
variando as suas dimensões entre o compacto e o intermediário, e haviam sido projetados
com a nova tração dianteira, que o tornava mais leve e com menor consumo de
combustível. A linha de X-cars foi lançada de forma antecipada no primeiro semestre de
1979 e causou grande furor nas vendas, sobretudo no modelo da Chevrolet. Contudo, o
desempenho nos meses seguintes não correspondeu às expectativas dos executivos. Os
veículos sofreram com seguidos recalls devido à baixa qualidade, e consumidores
passaram a protestar quando descobriram que haviam pago mais caro por um Buick ou
Oldsmobile, que eram praticamente idênticos ao modelo da Chevrolet. As marcas na
imagem dos veículos condenaram as pretensões da GM. A organização ainda insistiria
com os X-cars por mais alguns anos, mas em 1985 os modelos das quatro divisões
seriam precocemente descontinuados.
O impacto do segundo choque do petróleo na venda de automóveis foi imediato.
De 1978 para 1980, as vendas da indústria americana caíram 25% em relação ao recorde
de 15,4 milhões de unidades, chegando a meros 11,5 milhões, o mesmo nível de 1974.
Com o fracasso dos X-cars, o efeito nos volumes da GM foi ainda maior, com uma queda
de cerca de 30%. O último ano da gestão de Thomas Murphy marcou o fim de um ciclo de
59 anos de resultados positivos desde a crise de 1920. Em 1980, as Três Grandes
americanas encerraram o ano no vermelho. A Chrysler, com o prejuízo de U$ 1,7 bilhão,
acumulou, com os dois anos anteriores, mais de U$ 3 bilhões em perdas. Este
desempenho obrigou a caçula americana a pedir socorro ao governo, em um polêmico
episódio de concessão de empréstimo federal. A Ford amargou U$ 1,55 bilhão em
prejuízos, e a GM pouco menos da metade disso, U$ 762 milhões. Enquanto isso, as
japonesas Toyota, Honda e Nissan seguiam firme em seu crescimento no mercado.
Juntamente com os demais modelos importados, os carros japoneses já correspondiam a
cerca de um quarto do mercado dos Estados Unidos.
164
O mês de janeiro de 1981 foi marcado pela escolha de George Smith para
substituir o CEO Thomas Murphy, que cumpriria a aposentaria compulsória. George
Smith, executivo formado no percurso tradicional da carreira de finanças, nomeou James
McDonnald como presidente da GM. McDonald havia iniciado sua carreira gerencial
assumindo a planta de fundição da GM em Ohio e escalou os degraus da área de
operações, passando pela gerência das divisões de transmissão Hydramatic, Pontiac e
Chevrolet. As nomeações de Simth e McDonald repetiam a combinação mais comum dos
últimos anos, com um CEO de carreira em finanças e o presidente, chefe de operações,
um engenheiro, formado pelo GMI, com a carreira feita nas divisões de automóveis. No
entanto, apesar da sucessão que respeitava a tradição das últimas gerações de CEO, a
gestão de George Simth não seguiria as receitas habituais de seus antecessores. A
década de 1980, para a General Motors, seria marcada por uma série de tentativas de
mudança na organização, e Smith se colocaria no centro de um esforço que prometia
preparar a GM para o século XXI.
4.1.23.
A organização do século XXI de Roger Smith
Após a nomeação de James McDonnald, Smith aos poucos foi colocando os
executivos que julgou adequados, porém alguns nomes se destacaram pelo perfil
incomum nas práticas da GM. A nomeação mais inusitada talvez tenha sido a de Robert
O’Connell, tradicional executivo de finanças, para ocupar a vice-presidência de marketing.
Além dele, o advogado Elmer Johnson foi contratado, deixando seu escritório para ser
vice-presidente consultivo. Smith também nomeou Robert Frosch, ex-chefe da agência
espacial americana NASA, como vice-presidente encarregado das atividades dos
laboratórios de pesquisa.
A gestão de George Smtih teve o desafio, logo no seu início, de lidar com as
dificuldades decorrentes do segundo choque do petróleo e do fraco desempenho dos
novos lançamentos direcionados para o mercado de carros mais econômicos. Além dos
carros intermediários da plataforma X, lançados pela GM em 1979, a gestão de Smith
herdou também a linha de veículos compactos da nova plataforma J. Os J-cars, como
ficaram conhecidos, foram mais uma tentativa da GM, depois de Corvair (1959), Vega
(1970) e Chevette (1975), de finalmente emplacar um sucesso no segmento de carros
pequenos. Derivados da mesma estrutura básica, o Chevrolet Cavalier, o Pontiac 1200,
Oldsmobile Firenza, Buick Skyhawk e até mesmo o Cadillac Cimarron levaram a entrada
165
simultânea de todas as divisões neste mercado. No entanto, os veículos pequenos de
tração dianteira, feitos para combater os importados, não obtiveram os volumes
esperados nos primeiros dois anos. As vendas desta linha só iram se recuperaram a partir
de 1984, com a substituição dos motores de quatro para seis cilindros. Além dos J-cars,
Roger Smith herdou o lançamento de uma nova linha de veículos intermediários, baseado
na plataforma A, mais próxima dos grandes, equipados com tração dianteira. Os
derivados da plataforma A foram bem recebidos pelo consumidor, embora nos dois
primeiros anos, 1981 e 1982, as vendas tenham sido afetadas pela queda generalizada
na demanda.
As vendas da indústria automobilística permaneceram em queda nos dois
primeiros anos da década. Depois da redução de 19% em 1980, o mercado encolheu
mais 6% em 1981 e 2% em 1982. Ainda assim, Roger Smith implantou severas medidas
para trazer a GM imediatamente de volta ao lucro. Dentre as ações de Smith estava o
fechamento de fábricas obsoletas ou de fraco desempenho, anunciadas ainda na gestão
anterior, substituindo algumas delas por plantas mais modernas ou linhas de montagem
no México. Roger Smith adicionou mais 90 mil demissões às 180 mil efetuadas na
véspera de seu mandato. Além disso, a GM liquidou um prédio em Nova York, vendeu a
fábrica da Hyatt Roller Bearings para os próprios empregados, fundiu a Roechester
Products à Diesel Equipment e a Harisson Radiator à Delco Air-conditioning,
reorganizando e enxugando suas estruturas. Smith ainda reduziu os valores dos
benefícios de seus empregados e cortou definitivamente a contribuição de U$ 16 milhões
à GMI, principal provedora de gerentes e executivos de operações desde os anos 1920,
que passou a ser uma instituição de ensino privada.
Na área de vendas, a GM passou a aplicar programas de financiamento ao
consumidor com juros subsidiados pelo fabricante, oferecendo em 1981 um taxa de
13,8%, considerada baixa para a época. As ações contingenciais de George Smith
reverteram o prejuízo de U$ 750 milhões para modestos lucros de U$ 333 milhões. Em
1982, a GM aumentou os preços dos veículos e ofereceu taxas ainda menores. O
resultado foi o aumento no lucro para U$ 962 milhões, mesmo com a queda de 4% no
faturamento, além da recontratação de 2400 operários demitidos no ano anterior. A
prática de subsídio à taxa e ao juro mostrou-se tão eficaz que a GM e o restante da
indústria passaram usá-la sistematicamente, criando um círculo vicioso de redução dos
juros ao consumo, que chegaram a 2,9%, em 1986.
166
Em 1982, enquanto a GM se preparava para decidir sobre mais um esforço no
combate aos importados, George Smith tomou uma decisão diferente do habitual no que
diz respeito à alocação da produção. Ao avaliar as projeções sobre a nova proposta de
desenvolvimento para a plataforma S, de carros compactos, Smith pediu que fosse feito
uma comparação com a alternativa de se importar uma versão remodelada do veículo
fabricado pela Isuzu, da qual a GM havia adquirido 34% em 1971, que abastecia a
subsidiária Opel na Alemanha. A diferença de custos foi gritante. Enquanto o custo total
unitário de um carro S era estimado em U$ 5731, o modelo comparável da Isuzu chegaria
aos Estados Unidos ao custo de U$ 2857. A decisão de Smith, naturalmente, foi em favor
da importação do veículo japonês. A GM ainda compraria participação em outra japonesa,
a Suzuki, que produziria outro modelo a partir da mesma plataforma da Isuzu. Os carros
chegaram ao mercado americano no ano de 1984. Tal medida significou uma razoável
mudança nas práticas da GM, uma vez que, mesmo já tendo importado no passado
carros compactos de suas subsidiárias, esta foi a primeira vez que a GM reconheceu a
incapacidade de competir neste segmento com um modelo feito nos moldes tradicionais
de sua operação nos Estados Unidos.
À parte as ações emergenciais para retornar à lucratividade, Roger Smith nomeou
diversos grupos de trabalho para estudar e propor mudanças em quase todas as áreas da
organização. Uma dessas mudanças foi chefiada por Bob Dorn. Dorn era engenheiro
chefe da Pontiac quando foi nomeado para conduzir o desenvolvimento de uma nova
plataforma para veículos médios, a GM-10. O orçamento para o investimento era o maior
já aprovado até então, U$ 7 bilhões. O plano para o desenvolvimento foi conduzido de
forma diferente da tradicional departamentalização do staff de engenharia e das divisões.
O GM-10 teve uma equipe dedicada, que conduziu todos os aspectos da criação do
veículo, desde o design até o planejamento da linha de produção. O conceito usado pelo
GM-10 se assemelhava ao gerente de desenvolvimento de produtos criado por John
DeLorean à frente da Chevrolet em 1970, porém desta vez era o principal programa
corporativo.
Talvez o principal grupo de trabalho formado por George Smith em 1982 tenha
sido o responsável pela reorganização das divisões de automóveis da América do Norte.
Estudos preliminares sobre a integração das fábricas de motores já haviam sido
conduzidos por John Debbink, à época gerente geral da subsidiária Delco Moraine.
Porém, somente no segundo semestre de 1982, a GM aprovou a criação do grupo
167
especial de força tarefa sob a coordenação de Debbink. A primeira atividade do grupo foi
visitar uma série de grandes corporações americanas para conhecer suas formas de
organização. A conclusão foi de que a GM necessitava de uma profunda mudança, que
enfatizasse uma estrutura mais participativa com uma filosofia mais empreendedora, a
mudança da mentalidade de auditor para outra de trabalho em equipe e cooperação,
estabelecendo uma comunicação aberta (KELLER, 1989).
Para ajudar na construção de um plano que atendesse os objetivos acima,
Debbink recorreu a consultores externos da McKinsey, que proveram métodos para
organizar a análise de toda a operação de automóveis, entrevistando 65 gerentes e 800
empregados. A proposta formalizada pelo grupo, juntamente com os consultores,
anunciava o objetivo básico de integrar a organização, eliminar redundâncias e criar
oportunidade para sistemas que atravessassem as divisões (KELLER, 1989). O plano de
reorganização estabeleceu que a operação automotiva fosse dividia em apenas duas
divisões, completamente autônomas. Com isso, seriam criadas a Chevrolet-PontiacCanada (CPC) e a Buick-Oldsmobile-Cadillac (BOC), para as quais seriam repartidas
todas as atividades da GMAD e da Fisher Body. Esta última, apesar de estar sob o
comando da divisão de montagem, na prática operava de forma autônoma, quase
exatamente como fazia desde a década de 1920.
A nova organização foi definida com Robert Stempel, então gerente geral da
Chevrolet, como novo gerente da BOC e Lloyd Reuss, gerente geral da Buick, assumiu a
CPC. O vice-presidente de operações de carros da América do Norte passou a ser Alex
Cunningham, para quem as duas divisões respondiam. Charles Katko, gerente geral da
GMAD seria o responsável por assegurar que a transição fosse feita da forma mais
organizada possível. A equipe de planejamento da transição ainda seria auxiliada por
John Debbink e pela equipe de consultores da McKinsey, autores dos estudos que
propuseram a reorganização. A elaboração do plano levou cerca de seis meses durante o
ano de 1983. Alocado fora das dependências da GM, o quartel general de transição teve
como primeiro trabalho elaborar a descrição dos cargos que comporiam todas as
principais estruturas das duas divisões. Em seguida, quatro a cinco nomes eram
identificados para cada posição e cada um dava o seu voto naquele que achava mais
adequado. Ao final das alocações de pessoal, descobriu-se que novos engenheiros teriam
de ser contratados para completar posições antes centralizadas na Fisher e na GMAD e
168
que agora teriam de ser replicadas, uma vez que as divisões deveriam dispor de
capacidade para operar de forma completamente autônoma.
O anúncio oficial da criação das duas divisões foi feito por George Smith em
janeiro de 1984. O início da implementação foi bastante conturbado, gerando grande
insatisfação na organização. Uma grande quantidade de pessoas foi movimentada tanto
em termos de posição e função na organização quanto na localização física do trabalho.
Os sistemas formais e informais de relacionamento e fluxo de informações, sobretudo em
relação às atividades da GMAD e da Fisher, foram praticamente interrompidos de um dia
para o outro, e os novos processos planejados pela equipe de transição não passaram a
operar de forma eficiente na mesma velocidade.
No caso das atividades das divisões de automóveis, a adaptação à nova
organização ocorreu de forma diferente entre CPC e BOC. A primeira era composta
basicamente de uma grande divisão, a Chevrolet, outra divisão consideravelmente menor,
a Pontiac, a estrutura de marketing e distribuição e algumas das fábricas que compunham
a divisão do Canadá.
Com
isso,
Lloyd Reuss
manteve parte
da
estrutura
departamentalizada como era habitual nas divisões. O desafio na BOC era um tanto
maior. Buick, Oldmobile, e Cadillac eram divisões com marcas bastante distintas e
localizadas cada uma em uma cidade, separadas por 70 quilômetros uma da outra. Para
mobilizar os integrantes da nova divisão, Robert Stempel adotou um método bastante
semelhante ao utilizado por John DeLorean, quando assumiu a Chevrolet em 1969.
Dentre os primeiros passos, Stempel criou um grupo, uma espécie de comitê, que reunia
os principais gerentes de cada área para discutir os problemas e elaborar os caminhos a
serem seguidos. A proposta elaborada por Stempel e pela BOC também se assemelhou
àquela utilizada por DeLorean. A BOC decidiu organizar-se em equipes de produtos, ao
invés dos tradicionais departamentos. Desta forma, a divisão adotaria três plataformas, as
quais contariam com equipes de desenvolvimento que coordenariam a formulação dos
programas de novos veículos, do início do design até a preparação para a produção.
A proposta de organização de Robert Stempel foi inicialmente vetada quando este
a apresentou para seus superiores James McDonnald e Alex Cunningham. No entanto,
Stempel, motivado por sua equipe, reformulou sua proposta, concentrando-se em rebater
as principais críticas que recebera. Na segunda oportunidade em que a levou a seus
superiores, ele conseguiu persuadi-los a o deixarem seguir em frente.
169
Dentre os grupos de força-tarefa nomeados por George Smith no início de sua
gestão a situação das divisões de autopeças também foi alvo de mudanças. O conjunto
das divisões e subsidiárias que compunham a rede interna de fabricação de peças
acumulava uma força de trabalho equivalente à de sua principal concorrente americana. A
GM produzia internamente 70% de todos os componentes que utilizava, e alguns de seus
fornecedores internos eram também fornecedores de suas concorrentes em muitas
dessas peças. Grande parte das organizações fabricantes de peças operavam de forma
periférica na cadeia produtiva da GM desde os anos 1920 e recebiam pouca atenção ou
investimentos na melhoria de suas atividades. Havia grande disparidade entre os
fornecedores internos da GM, existindo desde empresas com conteúdo de alta tecnologia,
como Delco Electronics, Spark & Plug e Allison, até empresas fabricantes de simples
componentes, como rolamentos.
Pressionada por Lloyd Reuss, gerente da CPC e que queria ampliar as cotações
para os fornecedores externos, a GM nomeou W. Blair Thompson, vice-presidente do
Grupo de Componentes Automotivos (GCA), que reunia 139 fábricas e 2500 mil
empregados. Thompson contratou três empresas de consultoria para avaliar a
competitividade de cada uma das peças produzidas por este grupo. As fábricas seriam
classificadas em três cores, de acordo com a competitividade de seus produtos. As
fábricas de cor verde eram consideradas eficientes e lucrativas; as fábricas em amarelo
apresentavam um baixo desempenho em custo, porém poderiam ser melhoradas; e as
fábricas em vermelho, cerca de 4%, deveriam ser fechadas ou vendidas. A decisão de
terceirizar o fornecimento das plantas consideradas pelos consultores como nãocompetitivas provocou forte manifestação do sindicato. Muitas dessas plantas reagiram à
notícia com forte mobilização, propondo eliminação de funções e medidas para ganho de
eficiência. Ao final de um ano e diante de tantos protestos dos sindicatos, os planos de
terceirização foram suspensos.
A pressão da UAW pela manutenção de empregos estava relacionada aos
acontecimentos mais recentes, que mudaram o foco das negociações sindicais. Por mais
de 35 anos os contratos entre UAW e montadoras baseou-se no estabelecimento dos
parâmetros de reajuste da ajuda de custo e do ganho de produtividade e, por vezes,
adicionalmente incluíam questões de benefícios como aposentadoria, auxilio saúde ou
seguro desemprego suplementar. Em geral, os contratos das Três Grandes possuíam
vencimentos em datas próximas, de modo que o sindicato escolhia uma das três
170
empresas como alvo e, depois de conseguir o contrato, levava as mesmas exigências
para as demais. A mudança nos paradigmas de negociação começou em 1979, na
renegociação do contrato da Chrysler, que beirou a falência depois do segundo choque
do petróleo. Em 1982, UAW e GM, assim como também fez a Ford, decidiram
reciprocamente antecipar a negociação do contrato que venceria no final do ano. A UAW
estava preocupada com a manutenção dos empregos do número de seus associados,
que chegou ao pico de 1,5 milhão de pessoas em 1979, porém já havia declinado para
1,2 milhão em 1983. A GM, por meio de seu CEO, vinha seguidamente declarando na
imprensa que o custo de mão-de-obra nos Estados Unidos impossibilitava a competição
com outros países, sobretudo com o Japão. As negociações foram conduzidas por James
McDonald do lado da GM pelo novo presidente da UAW, Owen Bieber. O novo contrato
estabeleceu concessão de redução de salários por parte da UAW, enquanto a GM se
comprometeu a garantir o nível de emprego e o programa de participação nos lucros.
George Smith levou adiante outras ações para reduzir os custos de mão–de-obra,
que segundo suas declarações na época eram U$ 8 dólares por hora mais cara do que
Japão. A GM abriu as suas primeiras plantas no México em 1981, na cidade de Saltillo, e
passou a montar carros e motores a partir de peças importadas, reexportando-os aos
Estados Unidos. O México iniciou seu programa de abertura comercial na década de 1970
e a evolução dos acordos internacionais culminaria com a criação do NAFTA em 1994. A
abertura de plantas de montagem no México seria uma tendência na indústria
automobilística americana, principalmente como forma de reduzir custos de salário e fugir
das negociações com a UAW.
Esta, por sua vez, continuaria a ver seu número de
associados reduzir ao longo da década 1980 e das seguintes, enfraquecendo
significativamente seu poder de barganha.
À medida que a General Motors e a indústria se recuperavam da depressão nas
vendas após o segundo choque do petróleo, George Smith direcionava o foco de suas
ações para moldar o futuro competitivo da General Motors. Smith determinou, em um
curto período de tempo, uma grande onda de investimentos da GM nas áreas de
tecnologia, diversificou sua atividade por meio de aquisições, fez parceria com a Toyota e
iniciou uma nova empresa para fazer o carro do futuro, partindo do zero.
Dentre os investimentos que George Smith anunciou como o caminho para a GM
se tornar uma empresa do século XXI, um dos primeiros tratou da automatização e
aplicação de robôs nas fábricas. Smith freqüentemente atacava publicamente o alto custo
171
de mão-de-obra nos Estados Unidos. Para combater tal “desvantagem”, durante a década
de 1980 a GM anunciou a aplicação significativa de recursos para desenvolver e adquirir
robôs de solda, prensas de transferência, sistemas de reconhecimento óptico e Veículos
Automaticamente Guiados (VAG). entre outros equipamentos automatizados que
deveriam substituir a força de trabalho humana. Para concretizar o desenvolvimento
destas tecnologias, Roger realizou uma joint venture com a Fujitsu-Fanuc, líder em
tecnologia de robôs, para criar a GMF Robotics, que em poucos anos se tornaria a
número um em fabricação de robôs, sendo 70% para a GM.
O CEO da GM, em entrevistas, anunciou que até o final de seu mandato
aumentaria o número de robôs nas plantas da GM de 300 para 11 mil. Durante a primeira
metade da década de 1980, uma série de novos investimentos em planta foi anunciada.
Foram construídas 11 fábricas high-techs, outras 19 passaram por uma modernização e
três unidades de prensagem foram automatizadas. Entre estes investimentos, um
exemplo dos mais significativos foi a nova planta de Hamtramck, construída para
substituir a antiga fábrica da Cadillac, em operação desde o início dos anos 1920.
Hamtramck teria um investimento de U$ 600 milhões e contaria com 260 robôs.
Comparativamente, a Ford construía uma nova fábrica ao custo de U$ 350 milhões.
Outros investimentos importantes deste período foram a fábrica do futuro de Saginaw e a
Buick City. A primeira ficou conhecida depois de se afirmar que ela poderia funcionar com
as luzes apagadas, pois os robôs seriam capazes de realizar todas as atividades sem
intervenção humana. Já a Buick City empregaria os conceitos da Toyota City e teria todos
os fornecedores em um raio de 45 quilômetros, eliminando a necessidade de estoques.
Segundo Lee (1988), até 1986 os uso de tecnologia e robótica atingiria 79% das linhas de
montagem da GM, com um investimento total de U$ 42 bilhões.
A General Motors escolheu o caminho da tecnologia de informação para lidar com
a diversidade e a complexidade na renovação de seus mais de 600 modelos, cuja
preparação incluía a coordenação de cerca de 35 a 40 linhas de montagem nos Estados
Unidos. Em março de 1984 a GM lançou o projeto TRILBY, conduzido sob a
responsabilidade do GM Resarch Labs e chefiado por Robert Frosch, e que tinha por
objetivo conciliar e sistematizar tudo o que fosse de mais avançado em termos de
metodologias, técnicas e sistemas de coordenação e controle das atividades de pesquisa
e desenvolvimento. O TRILBY reuniu uma equipe de 100 engenheiros e especialistas que
durante cinco anos ficaram dedicados ao novo projeto. Como resultado, diversos novos
172
sistemas e ferramentas foram aplicados às atividades de desenvolvimento, especialmente
na implementação das equipes de plataformas, como a do GM-10.
Pouco depois da criação do TRILBY, Roger Smith daria mais um passo no sentido
de integrar o uso de tecnologia de informação aos processos da General Motors. Um dos
objetivos declarados de Roger Smith era de que a informática seria a solução para a
diminuição da burocracia organizacional, permitindo o ganho de agilidade e a
coordenação entre as áreas da empresa. Smith freqüentemente condenava na imprensa
o alto uso de papel nos fluxos de informação entre áreas e apontava os sistemas
integrados como a solução do futuro. Em junho de 1984, a GM adquiriu o controle da
Electronic Data System, segunda maior empresa de sistemas de processamento de
dados dos Estados Unidos e comandada por Ross Perot. Perot havia se iniciado na área
de vendas quando começou sua empresa. O sucesso nos negócios e o amplamente
noticiado episódio em que ele organizou uma missão privada para resgatar dois
funcionários presos no Irã fizeram dele uma espécie de herói nacional.
A aquisição foi intermediada por um banco de investimento que, à pedido de
Roger Smith, saiu à procura de empresas de tecnologia que pudessem integrar à GM o
conhecimento esperado por Smith. O valor da transação foi de U$ 2,55 bilhões. Dentro do
contrato de compra, a GM ainda ofereceu ações da GM à Perot e aos principais
funcionários, como forma de incentivar suas permanências. No entanto, para o caso da
EDS, a GM criaria uma ação especial, chamada de Classe E, que receberia os dividendos
a partir do desempenho da própria EDS e não da corporação. Somente após a conclusão
da compra é que GM e a EDS foram tratar da forma como ocorreria a integração da nova
unidade da corporação. A EDS assumiria a responsabilidade por todo hardware e
software de informática espalhados pelas divisões da GM. À época, cada divisão da GM
dispunha de seus próprios sistemas e métodos arcaicos de integração entre eles. Os dez
mil funcionários de informática distribuídos nas diversas áreas da GM passariam a fazer
parte da equipe da EDS. Ross Perot continuou como presidente da EDS e passou a
integrar o conselho de administração da GM. A integração dos funcionários da GM à EDS
seria conduzida por Mort Meyerson, braço direito de Perot, que se mudou imediatamente
com uma equipe de 650 funcionários da EDS para Detroit. A EDS continuaria a oferecer
seus serviços no mercado, porém agora teria como seu maior cliente a General Motors,
cujos contratos seriam fechados diretamente com as divisões.
173
Na onda de diversificação e integração de sistemas, Roger Smith levou a diante
mais duas aquisições nas quais enxergou a oportunidade de combinar as especialidades
da GMAC, em financiamentos ao consumidor, e da EDS, em integração de sistemas de
informação. A GMAC adquiriu por U$ 11 milhões a Norwest Mortgage, uma agência
financeira de hipotecas em Mineapolis. Além disso, em uma transação que custou U$ 190
milhões aos cofres do braço financeiro da GM, comprou o grupo Corestate, também de
hipoteca e composto por sete agências
que operavam na costa leste dos Estados
Unidos. .
Em junho de 1985, uma nova aquisição na área de alta tecnologia, realizada pela
GM, gerou grande repercussão nos Estados Unidos. Porém, diferentemente da EDS,
desta vez a compra teve a concorrência de outras interessadas. A Huges Aircraft era uma
das empresas líderes mundiais em desenvolvimento de tecnologia, em especial aquelas
voltadas para uso militar. Conhecida por ter inventado o laser e também por ser
especializada em integração de sistemas, a Huges Aircraft tinha fornecido todo sistema
da rede de defesa dos Estados Unidos e da OTAN. Embora a Huges competisse com
outras empresas privadas, seu controle era detido por um instituto médico, que era isento
de impostos. Forçado pelo governo americano, o instituto controlador da Huges anunciou
o leilão de sua controlada, despertando o interesse de Boeing, Ford e General Motors.
Roger Smith enviou sua equipe para realizar uma avaliação sobre as
possibilidades de integração e geração de sinergias entre as atividades de Huges e GM.
A resposta da equipe liderada por Howard Kehrl e Donald Atwood, ambos experientes
executivos corporativos, apontou que, baseando-se no custo para adquirir ou desenvolver
as tecnologias disponíveis na Huges, o valor giraria em torno de U$ 500 milhões. Porém,
a equipe indicava também que seria difícil atribuir valores aos potenciais benefícios da
aplicação de tais tecnologias nas atividades da GM. A oferta de Roger Smith para a
compra da Huges foi a vencedora, totalizando U$ 5,2 bilhões, sendo U$ 2,7 bilhões em
dinheiro e o restante em ações de classe H da GM, criadas especificamente para o caso
da Huges, pois incluíam cláusulas de recompra em três anos. A Huges Aircraft passou a
se chamar Huges Electronics Corporation e absorveu os 18 mil empregados da Delco
Electronics e as atividades de sistemas e instrumentos da A/C Spark & Plug.
Com todos esses investimentos e aquisições, George Smith prometia em seus
discursos e entrevistas para a imprensa que a alta tecnologia levaria a General Motors a
ser competitiva no século XXI. No entanto, a concorrência na indústria era acirrada em
174
meio à lenta recuperação do mercado. A General Motors tinha dificuldade em manter sua
participação de mercado, sobretudo no segmento dos compactos de baixo preço. Em
1981, as montadoras japonesas, pressionadas pela diplomacia dos Estados Unidos,
estabeleceram uma restrição voluntária de exportações, com um teto de volume de 1,68
milhão de unidades por ano. Contudo, a estagnação da indústria até praticamente 1985
fez com que nem o preço nem a participação de mercado das empresas japonesas
alterassem significativamente. Por outro lado, após a restrição voluntária, a Honda foi a
primeira montadora japonesa a anunciar a construção de uma planta em Ohio, em 1982.
Diante do regime de restrição voluntária, o plano de George Smith de importar os
veículos produzidos de Isuzu e Suzuki também ficou limitado quanto à perspectiva de
fazer desta uma alternativa de longo prazo. Com isso, Smith encontrou uma nova saída
para viabilizar a produção nos Estados Unidos de um modelo compacto fabricado com os
métodos japoneses. O CEO da GM usou intermediários para iniciar o contato com
executivos da Toyota sobre a possibilidade de investimentos conjuntos entre as duas
montadoras. Depois de uma extenuante negociação com viagens dos principais
executivos das duas empresas para reuniões em ambos os países, George Smith e Eiji
Toyoda, presidente e fundador da Toyota, anunciaram, no começo de 1983, a criação da
joint venture New United Motor Manufacturing Inc. (NUMMI). As duas empresas deteriam
50% sobre o novo investimento. A Toyota aplicou U$ 100 milhões em dinheiro, e GM
entraria com o equivalente, cedendo sua planta de Freemont na Califórnia, desativada em
1982. O acordo estabeleceu a meta de produção de 200 mil carros por ano. As operações
seriam conduzidas pela Toyota, que tinha o direito de indicar o presidente e CEO da nova
empresa. Um grupo de 16 gerentes da GM fez parte da equipe inicial. O contrato também
previa a prioridade para contratação de ex-operários da GM.
A fábrica em Freemont havia funcionado sob o comando da GM de 1963 até 1982.
Nos últimos anos antes de ser fechada, a planta estava entre os piores desempenhos de
toda a organização em termos de qualidade, reclamações de empregados e faltas no
trabalho. Quando o acordo da NUMMI foi fechado, a Toyota se viu pressionada em aceitar
que a UAW representasse os trabalhadores, fato que preocupou os japoneses. Contudo,
a Toyota persuadiu o sindicato e assegurou um acordo com flexibilidade para alterar
cargos e atividades dos operários dentro da linha de produção, em troca da garantia de
estabilidade. Tal liberdade era uma condição necessária para implantar seu sistema de
células de produção. A seleção dos funcionários seguiu um misto de entrevistas com
175
dinâmicas de grupo para observar aqueles que melhor se encaixavam no perfil de
orientação para resolução de problemas da fabricante japonesa. Nenhum antigo gerente
da fábrica de Freemont foi contratado, pois temia-se que estes trouxessem os vícios da
experiência anterior.
Depois de selecionados, a Toyota investiu uma média de 600 horas de
treinamento para cada funcionário, sendo que 250 líderes escolhidos entre os operários
passaram diversas semanas no Japão aprendendo sobre a atividade de equipes de
produção. Líderes de equipes eram operários como os demais, porém deveriam saber
executar as tarefas de todos do seu grupo, composto em média por seis pessoas, e,
principalmente, mediar as atividades de melhoria contínua, ensinando as abordagens
para solução de problemas, decisão em grupo e as demais ferramentas de qualidade.
Quando as operações de montagem começaram na NUMMI, o início de cada
etapa não ocorria até que o processo anterior estivesse funcionando perfeitamente. Desta
forma, apesar do maior tempo necessário para implementação, os carros que
inauguraram a linha de montagem possuíam baixos índices de defeitos. Ainda assim, os
primeiros carros produzidos em Freemont não foram encaminhados às lojas, tampouco
formaram o estoque para um lançamento maciço. Diferentemente da prática das
montadoras americanas, estes carros foram distribuídos para alguns funcionários que
passaram a usá-los regularmente, observando eventuais defeitos que aparecessem
durante o uso do produto, de forma que pudessem ser corrigidos.
A NUMMI montou, em 1985, 65 mil Chevrolets Nova, derivado da plataforma do
Toyota Corolla. A fábrica somente atingiu a capacidade planejada em seu segundo ano,
quando introduziu outro modelo, o Toyota FX. Dos 2200 empregados, 84% eram antigos
operários da planta de Freemont. O desempenho, porém, era o oposto do que ocorrera
antes. A fábrica possuía o mesmo nível de produção: 200 mil carros por ano, com cerca
de metade do número de funcionários. A NUMMI necessitava de 20 horas para montar
um veículo, enquanto a operação anterior levava 34 horas. O absenteísmo foi de 2%, ao
passo que anteriormente havia chegado a picos de 20%, e a média nas outras fábricas da
GM era de 9%. As despesas com garantias dos carros produzidos em Freemont também
eram significativamente inferiores – em média, nos produtos da NUMMI era apenas um
terço dos U$ 350 gastos com os demais veículos da GM. Entretanto, a diferença mais
marcante entre a NUMMI e as demais fábricas da GM talvez tenha ocorrido em 1988,
quando uma redução de 29% nas vendas dos produtos da NUMMI, ao invés de provocar
176
um plano de demissões, levou a Toyota a implantar um programa de treinamento,
retirando operários da linha, em grupos de 100, para treinamento.
O prazo de 10 anos estabelecido pela Comissão Federal de Comércio previa o
encerramento da NUMMI em 1984. No entanto, após o pedido apresentado pelas duas
montadoras, o limite de 10 anos foi suspenso. A NUMMI opera ainda em 2008, com a
capacidade ampliada para mais de 400 mil carros e caminhonetes, já tendo produzido
mais de 6,2 milhões de veículos.
Um outro esforço para o desenvolvimento de um carro compacto que fosse
competitivo foi divulgado em janeiro de 1985, quando foi criada a Saturn Corporation. As
ações que levaram a criação da Saturn decorriam da criação, ainda em maio de 1982, de
uma nova equipe de staff para engenharia avançada de produtos e manufatura, liderada
pelo experiente engenheiro Alex Mair. Este novo grupo teria a incumbência de retomar os
estudos sobre o programa da plataforma S – cujo desenvolvimento havia sido cancelado
em favor da importação dos carros de Suzuki e Isuzu – porém, partindo de um escopo
mais amplo de investigação, em busca de explorar todas as formas possíveis para tornar
o novo produto realmente competitivo. Os estudos envolveram a participação de cerca de
90 pessoas, incluindo gerentes de divisões e membros da UAW. Segundo Keller (1984),
o relatório final recomendava os seguintes pontos:
•
O estabelecimento de um projeto para a construção de um carro que não fosse
apenas um programa de desenvolvimento de veículo, mas de um processo integrado
de negócio.
•
Operar o projeto como uma empresa controlada, com gestão e relações sindicais
separados da GM.
•
Criação de uma rede de concessionárias separadas a ser operada em conjunto com
o projeto.
•
Desenvolvimento de um novo carro para ser lançado em 1990 com um desenho e
estrutura totalmente originais.
O resultado do estudo foi a criação da Saturn Corporation, uma empresa criada a
partir de uma folha em branco por uma equipe de 350 dos melhores engenheiros e
especialistas da GM.Em cinco anos, a Saturn Corporation teria um orçamento de U$ 5
bilhões, com o objetivo de desenvolver não só o carro do futuro, mas um novo jeito de
produzir e vender carros nos Estados Unidos. A nova organização teria total
independência da corporação. A responsabilidade de presidir a equipe que formaria a
177
nova corporação foi dada a William Hoglund, que ocupava a gerência da Pontiac. Dentro
de sua equipe, Hoglund envolveu o então vice-presidente da UAW, Don Elphin, para
desenvolver um novo contrato trabalhista.
A Saturn estabeleceu um acordo que previu um papel bastante diferente para a
UAW e os operários. Dentre os planos para tais relações estavam:
•
Remuneração dos operários divididas em 80% fixa e 20% variável.
•
Garantia de estabilidade de empregos.
•
Comitê consultivo estratégico, que envolvia o presidente da GM e a UAW.
•
Comitê consultivo de manufatura para supervisão da planta, incluindo representantes
da UAW e especialistas em engenharia, design e produção.
•
Comitê da unidade de negócio, responsável pela coordenação das atividades da
planta. Seria formado pelos gerentes da planta, especialistas e representantes da
UAW.
•
Módulo de unidade de trabalho: uma estrutura de divisão em times, compostos de três
a seis unidades lideradas por um consultor.
•
Unidades de trabalho:equipes de seis a quinze trabalhadores liderados por um
consultor da UAW
O anúncio da Saturn Corporation causou grande repercussão na mídia e na
população americana. A ameaça japonesa à hegemonia das Três Grandes era um
assunto freqüente nas páginas dos jornais americanos. Neste contexto, a Saturn surgiu
como a resposta que a maior empresa do país daria a tal desafio, reunindo e criando as
melhores e mais modernas práticas existentes no mundo dos negócios. Uma pesquisa
feita quatro meses após o anúncio da Saturn mostrou que 41% das famílias americanas
reconheciam o nome da nova empresa, apenas com a divulgação espontânea da mídia.
Segundo Lee (1988), os planos de Roger Smith para a Saturn eram de completa
automatização dos processos. O cliente iria a uma loja da Saturn onde o vendedor
conversaria para entender as preferências deste cliente e selecionar a configuração de
todos os opcionais do veículo. O pedido seria registrado em um terminal de computador,
de onde se dispararia imediatamente a solicitação de fornecimento dos cerca de 15 mil
itens. Em duas semanas, o carro seria entregue. A linha de produção seria controlada por
robôs, que teriam a capacidade de reconhecer as diversas configurações possíveis e
executar as tarefas de acordo com a seqüência especificada para cada produto. Com
178
isso, a Saturn seria, segundo a definição de Smith, uma empresa sem papel, com todos
os processos integrados por sistemas eletrônicos.
O entusiasmo com o novo projeto da GM ficou evidente quando 38 governadores
americanos submeteram propostas para sediar as novas instalações da Saturn. Seis
meses depois do anúncio, a Saturn definiu como destino de sua planta uma pequena
cidade do Tenesse. Os U$ 5 bilhões em investimentos para criar a Saturn certamente não
seriam pagos pelo lucro gerado na venda dos 500 mil carros anuais projetados para
serem produzidos nesta planta. Porém, esperava-se que o novo empreendimento gerasse
um novo modelo que pudesse ser replicado e renovasse as demais atividades da GM.
4.1.24.
General Motors e suas mudanças questionadas
Ao final de 1985, Roger Smith recebia o reconhecimento pelas mudanças que
havia implementado à frente da GM. A indústria recuperou o nível de venda de 15 milhões
de unidades, e a queda nos preços dos combustíveis fez com que a linha de carros
grandes ganhasse novamente a preferência de parte dos consumidores. As vendas, o
faturamento e o lucro da GM registravam seus níveis mais altos, e a expectativa gerada
pelos investimentos em tecnologia, com aquisições de grandes empresas, fizeram com
que Smith recebesse em 1984 e 1985 uma série de prêmios, promovidos por diversos
meios de comunicação, como o executivo do ano. No entanto, de fora da organização
pouco se notava o que ocorria internamente. Apesar da reestruturação iniciada em 1982,
o número de empregados da GM cresceu cerca de 18% nos três anos seguintes. A GM
havia investido U$ 45 bilhões desde 1980 e ainda planejava investir mais U$ 34 bilhões
até o final da década (LEE, 1988). Com isso, as perspectivas de lucros na operação
deveriam permanecer em níveis altos, a fim de justificar tamanha aplicação de recursos.
Ainda no embalo da expansão via aquisições, Roger adquiriu a empresa de carros
de corrida Lotus, da Inglaterra, por U$ 20 milhões. A Lotus era uma empresa pequena
para os padrões da indústria automobilística e concentrava seus investimentos em
desenvolvimento de engenharia avançada, apresentando importantes avanços na década
de 1980, como suspensão ativa controlada eletronicamente e uso de materiais especiais
em carrocerias monobloco. O valor da Lotus estava mais relacionado à capacitação de
seu quadro de engenharia, que prestava serviços para diversos fabricantes, inclusive GM
e Toyota, do que propriamente à sua linha de carros esportivos de alto luxo ou à sua
equipe de Fórmula 1.
179
Quando perguntado sobre os investimentos feitos na Lotus, Roger disse: “Da
última vez que olhei dentro da caixinha verde, ela não estava vazia”. Quando tratou sobre
a área de tecnologia ainda afirmou: “É frustrante que às vezes a gente não consiga gastar
dinheiro na velocidade em que gostaria” (LEE, 1988). Porém, o clima de entusiasmo
manifestado externamente não refletia a situação interna da empresa. A reorganização
que criara CPC e BOC havia eliminado os principais sistemas informais de comunicação,
causando freqüente confusão e desencontros na operação. As atividades de
desenvolvimento foram severamente prejudicadas, e praticamente todos os lançamentos
a partir da reorganização sofreram atrasos. O GM-10, projeto que inaugurava o novo
método de engenharia de produto, foi postergado em dois anos, com um ciclo de
desenvolvimento total de sete anos, contra três da Toyota. Os modelos intermediários
derivados do GM-10, que passou a chamar-se plataforma W, veriam o concorrente
Taurus, da Ford, antecipar diversas das inovações que estavam sendo desenvolvidas.
Nos anos de 1984 e 1985, atrasos de seis meses a um ano nos demais lançamentos se
tornaram comuns, assim como os defeitos de fabricação e recalls que continuavam
gerando altos gastos com garantia.
Para conquistar vendas e assegurar a participação de mercado, a GM fazia uso
intenso dos subsídios à taxa de juros. Com isso, as margens eram severamente afetadas,
uma vez que a GM usava parte dela para cobrir os descontos nos juros feitos pela GMAC.
Além disso, com a criação das duas divisões, as estruturas foram aumentadas ao invés
de diminuídas. Somente a CPC contratou oito mil funcionários depois que foi formada.
Isto
deixava a divisão que incluía Chevrolet e Pontiac com um total de 160 mil
funcionários, contra apenas 60 mil da Toyota, que em 1985 produziria os mesmos 3,5
milhões de carros do que a CPC.
As modernas fábricas planejadas e anunciadas como o supra-sumo da tecnologia
em robótica começaram a entrar em operação na metade da década. No entanto, os
robôs não funcionavam como o esperado por diversos motivos. Primeiramente, os
modernos equipamentos foram instalados e sua operação iniciada sem que houvesse
treinamento para a maioria dos operários da linha. Em muitos casos os homens e
mulheres da linha necessitavam de treinamentos mais básicos, como de alfabetização,
antes de aprenderem a lidar com computadores.
A inauguração da produção em algumas dessas plantas foi atrasada em função
dos problemas com a linha de robôs. No caso de Hamtramck, eram 260 robôs
180
responsáveis por atividades como pintura e soldagem de carrocerias. A linha de
Hamtramck fabricava três modelos derivados da mesma plataforma para cada uma das
marcas da BOC. Os robôs eram capazes de reconhecer o seqüenciamento da produção e
produzir cada modelo sem a necessidade de alterações na linha. Contudo, o que se viu
quando a linha começou a funcionar foi que os robôs eram instáveis e cometiam falhas,
sobretudo quando a linha estava mais acelerada. Os erros eram corrigidos por operários
que deveriam ficar à disposição para os reparos. O resultado foi que as fábricas que
haviam custado duas ou três vezes mais do que as dos concorrentes, japoneses ou
americanos, operavam às vezes com a capacidade reduzida pela metade, utilizando uma
quantidade de operários 40% a maior. Ainda por cima, a percepção de qualidade dos
produtos que saíam destas fábricas ficava abaixo da média da indústria, gerando as mais
altas despesas com garantias.
Não bastasse os problemas com as operações automotivas, outra confusão
aflorou na segunda metade da década de 1980, também criada a partir dos planos de
modernização da GM iniciados por Smith. Assim como a reorganização das divisões, a
integração dos 10 mil empregados da GM aos quadros da EDS causou grandes
desencontros e, neste caso, os conflitos subiram os escalões da corporação. Para muitos
empregados, a transferência foi motivo de grande frustração devido aos salários menores
na EDS, onde a maior parte dos ganhos era variável de acordo com o desempenho. Por
outro lado, as divisões de automóveis da GM se irritavam com os contratos de custo +
margem18, onde a EDS não compartilhava do risco de o projeto ter que ser ampliado e
ainda assegurava uma operação sempre lucrativa, sendo que seus empregados recebiam
bônus e dividendos sobre o resultado da EDS e não da GM.
Os conflitos entre EDS e GM se acirraram devido à repercussão causada pelos
severos protestos e críticas que uma pessoa pública como Ross Perot fazia no conselho
de administração da GM e para a imprensa. A crise entre Perot e Smith chegou a níveis
críticos no final de 1986, ganhando notoriedade na imprensa, apesar de Smith sempre ter
tentado abafar o caso.
A alternativa que pareceu ser a melhor para CEO da GM foi comprar a saída de
Ross Perot da GM. A transação fez de Ross Perot, o maior acionista individual da GM na
época, um das pessoas mais ricas dos Estados Unidos. A GM já havia comprado a EDS
18
Referência utilizada para denominar o tipo de contrato de fornecimento de serviços cujo valor era calculado
em função do custo do serviço, mais uma margem de lucro pré-definida.
181
pelo alto valor de U$ 2,55 bilhões e a recompra das ações de classe E de Perot somou
U$ 700 milhões. No entanto, Ross Perot não parou sua onda de protestos quando
assinou o contrato de venda de suas ações. No dia seguinte, Perot anunciou na imprensa
que não era justo, diante do momento pelo qual passava a empresa, que ele recebesse
U$ 700 milhões sem antes consultar os demais acionistas sobre o assunto, e que estaria
disposto a devolver o dinheiro caso a maioria dos acionistas da GM assim o quisessem. O
anúncio de Perot agravou ainda mais a situação da Roger Smith diante dos acionistas,
uma vez que ele já vinha sendo pressionado desde o início de meados de 1986.
Desde quando a Du Pont foi obrigada a se desfazer de suas ações da GM, entre o
final dos anos 1950 e o início dos 1960, a propriedade das ações da GM era pulverizada
na mão de investidores privados e fundos de investimentos. A partir de então, a relação
da gestão da organização com os acionistas ocorreu sob um acompanhamento mais
distante, com raros episódios onde pressões e questionamentos foram mais relevantes do
que o anúncio dos lucros e dos dividendos. Entretanto, em abril de 1986, Roger Smith se
viu acuado com tantas críticas vindas de analistas financeiros durante um encontro com
os gestores das carteiras dos fundos de investimentos. Apesar dos lucros anunciados no
fechamento de 1985, o valor era 11% menor do em 1984, enquanto o faturamento havia
aumentado 14%. A preocupação dos analistas não era só com a queda nas margens,
mas também com a capacidade de a empresa gerar retornos sobre os investimentos.
Depois de mais de U$ 40 bilhões investidos, o ponto de equilíbrio da GM requeria uma
venda de no mínimo 5,6 milhões de carros, ou seja, 43% do mercado, isso apenas para
não ter prejuízo. Os analistas questionavam seriamente a lógica do plano de George
Smith de construir a General Motors do século XXI.
Após a reunião com os analistas, George Smith tomou uma série de medidas para
melhorar a imagem da GM e a sua própria perante os investidores do mercado financeiro.
Smith contratou a Gershon Kekst, uma consultoria especializada em gestão da relação
com acionistas, para lidar com as pressões que enfrentava. A GM adotou medidas para
controlar a divulgação de informações institucionais e, ainda no verão de 1986, poucos
meses depois da reunião, anunciou um plano de redução de custos que contemplava o
fechamento de 11 fábricas, com a redução de 25 mil empregados assalariados e 29 mil
operários, até 1990. Outras ações desse esforço de redução incluíam a venda das
operações de ônibus e de caminhões e o fechamento de unidades em países como
Filipinas, Grécia, África do Sul, Uruguai e Equador. A GM também reduziu os
182
investimentos em suas atividades de desenvolvimento. Os carros da plataforma GM-10
tiveram o número de fábricas reduzidas de sete para quatro, o mesmo acontecendo com
a Saturn, que ao invés de duas linhas de montagem, iniciaria com somente uma. Além
disso, o projeto do carro que substituiria os esportivos Camaro e Firebird foi cancelado.
Com todas estas ações a GM se recuperaria do prejuízo registrado no terceiro
trimestre de 1986 e fecharia o ano com lucros de U$ 2,9 bilhões. Contudo, segundo Lee
(1988), para alcançar tal resultado, a GM alterou procedimentos contábeis: reviu
operações retroativamente e eliminou U$ 640 milhões dos custos, aumentando em U$
130 milhões os rendimentos líquidos. Ainda segundo Lee (1988), a GM realizou uma
operação contábil com a GMAC para adicionar U$ 5,5 bilhões em contas a receber aos
balanços. Mesmo com todas essas ações da GM para melhorar sua imagem junto aos
investidores, a principal concorrente, a Ford, fechou o ano com um lucro maior, pela
primeira vez desde 1924, com U$ 3,3 bilhões, embora tivesse um faturamento 35%
inferior. A situação da GM se agravava com o preço de suas ações em queda, enquanto
Ford e Chrysler anunciavam programas de recompra de ações, que faziam o preço subir.
O anúncio de Ross Perot feito no começo de dezembro de 1986 mobilizou
acionistas, já insatisfeitos com o desempenho da empresa, a apresentarem uma
proposição de resoluções que impedisse George Smith de seguir adiante com a compra
da saída de Perot. O Conselho Nacional de Investidores de Nova York, uma espécie de
sindicato que reunia fundos de investimento responsáveis por 10% dos votos de todas as
ações da bolsa, era presidido por John Goldin. Logo após o anúncio de Perot, Goldin
organizou um encontro com os representantes dos fundos de investimentos, Perot e
George Smith, os quais prontamente confirmaram a presença. Os acionistas tinham até
19 de dezembro para submeter novas proposições de resolução para que pudessem ser
votadas até maio do ano seguinte na convenção de acionistas da GM. No dia da reunião
com os investidores em Nova York, Smith não compareceu e sem avisar ou apresentar
explicações enviou uma equipe de cinco executivos corporativos em seu lugar.
Após o desgaste com o episódio de Nova York, George Smith passou a cumprir
uma intensa agenda de reuniões com representantes de fundos de investimentos,
colhendo procurações para evitar uma derrota na convenção de acionistas de maio, que
poderia significar sua demissão do cargo de CEO da GM. No dia da convenção, George
Smith havia reunido a maioria dos votos sob procuração em seu nome, mesmo assim a
votação das resoluções para alterar o estatuto da GM teve 20% de votos a favor. Apesar
183
da vitória de Smith, a votação contrária à posição da gestão da organização foi a maior na
história da GM até então.
Mesmo diante da vitória na convenção, Smith saiu com a imagem arranhada do
episódio iniciado por Perot. Porém, pouco tempo depois, o CEO da GM anunciou mais um
pacote de medidas para redução de custo, que chegaria a U$ 10 bilhões por ano. O
pacote incluía o fechamento de mais três fábricas, demissão de mais 17 mil empregados
assalariados, reduções nos gastos do escritório central, liquidação de operações
deficitárias de componentes e redução em U$ 200 milhões nos gastos com garantias,
embora nestes três últimos itens a forma como os cortes seria feita não fosse
especificada. Além da redução de U$ 10 bilhões, Smith anunciou um plano de recompra
de ações no total de U$ 5 bilhões e a meta de alcançar um retorno de 15% para o
acionista até 1990.
Paralelamente ao anúncio dos cortes de gastos e compras de ações, Roger Smith
também implementou mudanças nos sistemas de bônus dos empregados administrativos.
O sistema de avaliação vigente na General Motors vinha desde os tempos de Sloan e o
empregado era avaliado por seu superior imediato, que o atribuía uma de três
classificações possíveis, sendo que não havia classificação para um desempenho
insatisfatório. Em 1987, o novo sistema reduziu para 3,5% o montante disponível para
distribuição de bônus, eliminou a ajuda de custo que era repassada da negociação com
os operários para os assalariados e determinou três classificações de desempenho, das
quais a última tornava o empregado não elegível ao bônus. Os gerentes passaram a ter
cotas para cada classificação, tendo obrigatoriamente que ordenar seus subordinados
quanto ao seu grupo de desempenho.
Em 1987, GM e Ford negociaram novo acordo com o sindicato. O contrato fechado
primeiro pela Ford e depois reconhecido pela GM novamente não se concentrou sobre
aumentos salariais. O contrato estabeleceu uma cláusula de estabilidade de emprego de
longo prazo, onde o fabricante se comprometia a não eliminar arbitrariamente os
empregos, limitando a redução de postos de trabalho na razão de um para cada dois
empregados aposentados. Por outro lado, o sindicato reconhecia a redução da força de
trabalho em períodos de retração na demanda, porém o contrato assegurava a
recontratação de empregados demitidos quando as condições de mercado se
restabelecessem. Outro ponto importante do contrato de 1987 foi o arcabouço para a
184
criação de comitês de segurança no trabalho e de eficácia operacional, com o objetivo de
explorar oportunidades para melhor utilização da força de trabalho.
Todas essas medidas de cortes e ajustes nos gastos da GM ocorreram em um ano
em que a indústria apresentou uma ligeira retração de 7% no volume de vendas. Para a
General Motors, o compromisso assumido junto aos acionistas de priorizar as taxas de
retorno e de não utilizar mais subsídios à taxa de juros ao consumidor impôs uma
significativa perda de participação de mercado, de 40% em 1986 para 37% em 1987. Com
isso, as receitas da GM caíram 1%, para U$ 101,7 bilhões, enquanto o lucro aumentou
em 20%, chegando a U$ 3,5 bilhões, 23% menor que o da Ford.
4.1.25.
Rota ajustada e o fim da gestão Smith
Os pacotes de demissão anunciados em 1986 e 1987 foram implementados na
maior parte entre 1987 e 1989. Contudo, ao invés da reorganização dos processos para
compensar a diminuição do número de pessoas em uma atividade, o que ocorreu foi a
terceirização dos serviços, continuando, em muitos casos, a serem prestados pelo mesmo
empregado, que passava a trabalhar em uma prestadora de serviços. A troca de
empregados contratados por empresas terceirizadas era freqüentemente a saída mais
cômoda para o gerente de uma área, que recebia uma meta de corte na folha de
pagamento (KELER, 1989; LEE, 1988).
Apesar do maior contato com as técnicas de gestão da Toyota depois da entrada
em operação da NUMMI em 1984, as tentativas da GM de aplicar as soluções aprendidas
por seus gerentes que atuaram em Freemont ocorreram de forma tímida, fragmentadas e
raramente com o apoio formal de algum programa corporativo. A ação mais relevante
deveria ter sido a Buick City, planejada para operar em um sistema modular, que tentaria
replicar técnicas Just-in-time praticadas na fábrica da Toyota no Japão. No entanto, os
relatos dão conta de que o método foi rapidamente corrompido pela gestão da fábrica,
com práticas como estoques secretos ou desprezo pelas técnicas de resolução de
problemas (LEE, 1988; PASCALE, 1994)
Outro método adotado para promover melhorias nas atividades produtivas foi o
uso de um sistema de competição por melhoria de desempenho entre plantas, sob a
condição de que a perdedora eventualmente fosse fechada. O caso apresentado por
Keller (1989) descreve a experiência de competição entre fábricas feita pela GM com as
plantas de Van Nuys e Norwood. A planta de Van Nuys, por estar mais próxima
185
geograficamente de Freemont e diante da perspectiva de ser fechada, procurou replicar
algumas de suas técnicas aplicadas na NUMMI. Contudo, os métodos utilizados para a
transferência do conhecimento foram significativamente diferentes daqueles realizados
pela Toyota para trazer suas técnicas do Japão. Van Nuys utilizou vídeos gravados em
Freemont e recebeu visitas semanais de gerentes que, por um período, funcionaram
como consultores. O resultado foi a implementação de métodos distorcidos do sistema de
produção japonês. Dentre as principais barreiras estavam a resistência do representante
do sindicato e a desconfiança generalizada dos trabalhadores, que já davam seus
empregos como perdidos. O esforço realizado em Van Nuys, ao contrário de melhorar,
causou a queda nos indicadores de qualidade e produtividade. Mesmo assim, a planta
venceu a batalha contra Norwood, que foi fechada não por critérios de desempenho, mas
por ser mais antiga e com equipamentos mais velhos.
Outras iniciativas de replicar alguns dos métodos utilizados em Freemont foram
conduzidas por gerentes de plantas da GM espalhadas pelos Estados Unidos, em geral
com maior sucesso do que em Van Nuys. Entretanto, a diferença entre indicadores de
desempenho da NUMMI em relação às demais plantas da GM eram gritantes no final dos
anos 1980. Por exemplo, o índice de horas/homem, que indicava a quantidade de horas
dedicadas em média pelos trabalhadores na montagem cada veículo. Em Freemont era
de 23 horas/homem, enquanto que nas demais plantas da GM a média era de 40
horas/homem. Na planta de Ver Linden, uma das mais modernas e automatizadas da
época, cujo gerente, Dale Snyder, era um declarado entusiasta das técnicas japonesas,
alcançava um dos melhores índices da GM: 29 homens/hora.
A grande aposta de George Smith para competir com as empresas japonesas que
instalaram suas fábricas nos Estados Unidos ao longo da década de 1980 era realmente
a Saturn Corporation. O lançamento do veículo Saturn ocorreu em 1991. Em um dos
últimos atos de George Smith como presidente, ele dirigiu o primeiro modelo que saiu da
fábrica. Porém, quando a Saturn finalmente começou, sua operação era bastante
diferente daquela planejada em 1984. Ainda na fase de planejamento da nova empresa,
em 1986, diversas alterações no escopo do projeto foram efetuadas depois que alguns
dos conceitos de alta tecnologia e automação não apresentavam os resultados esperados
em outros projetos da GM. Além disso, as dificuldades financeiras e a pressão dos
acionistas exigiram um uso comprovadamente mais racional do capital. Naturalmente, a
186
Saturn, sendo um dos principais projetos da GM na década, também se viu alvo de
cortes.
O modelo previsto inicialmente para a Saturn era de um carro compacto para
competir no segmento de baixo preço. Em 1986, Roger Smith aprovou a alteração para
um veículo maior e mais luxuoso, do qual fosse possível obter melhores margens. O
volume anteriormente projetado para 500 mil unidades/ano foi reduzido pela metade, com
a eliminação de uma das linhas de produção. Outro critério em relação ao produto
alterado no decorrer do projeto foi o compartilhamento de partes, peças e fornecedores
com os demais modelos da General Motors. Inicialmente a meta era que todos os
componentes do Saturn fossem projetados a partir de uma folha em branco, e que os
fornecedores fossem todos avaliados de forma independente pelos executivos da nova
empresa. A redução no orçamento de desenvolvimento obrigou a mudança nos planos, e
a Saturn passou a olhar para componentes usados em outras divisões, inclusive adquiriu
alguns equipamentos de outras plantas da GM para montar sua linha de produção.
Outra mudança considerável no desenvolvimento da Saturn foi em relação ao
sistema fornecido pela EDS para integrar desde a venda até o pedido de compra junto ao
fornecedor. A idéia de uma organização sem papel, defendida por George Smith também
foi abandonada. Os sistemas da EDS estavam presentes na operação da Saturn talvez
em maior nível de aplicação do que em outras divisões, porém o uso de computadores e
robôs nas atividades de vendas e produção foi severamente reduzido.
A Saturn manteve sim algumas inovações quando suas vendas foram finalmente
inauguradas. A organização de vendas era a única a operar com preço fixo em todo os
Estados Unidos. A eliminação da negociação de descontos ou sobrepreços na ação de
vendas permitiu que a Saturn implantasse um eficiente sistema de atendimento ao cliente,
o qual foi avaliado como o mais agradável do mercado. Além disso, o contrato de trabalho
dos empregados era composto de 80% fixo e 20% variável e, replicando um modelo
comumente usado em montadoras européias, o Sindicato tinha participação efetiva em
comitês consultivos da organização.
As vendas da nova subsidiária foram bem-sucedidas nos primeiros anos de
lançamentos. Os consumidores preferiam meses de espera e ter o carro em seu preço
cheio a adquirir modelos concorrentes repletos de descontos. As avaliações de satisfação
do consumidor e de qualidade percebida colocaram o Saturn no topo da lista dos veículos
vendidos nos Estados Unidos. Porém, mesmo com todo o sucesso de aceitação pelo
187
consumidor norte-americano, a Saturn registrou prejuízos em seus primeiros dois anos de
operação e apenas empatou no terceiro ano, graças à transferência de U$ 3 bilhões
referentes aos investimentos para a conta da GM. Os índices de produtividade também
colocavam a Saturn bem distante de seu objetivo de ter o menor custo da indústria. Sua
média era de 35 horas/homem, quase o dobro dos índices obtidos nas plantas japonesas
nos Estados Unidos à época. A parte variável dos salários não foi atrelada a metas de
desempenho, mas sim de treinamento. Com isso, as 750 horas de treinamento em 11
especialidades diferentes garantiram uma média salarial de U$ 45 mil para os
empregados administrativos, a maior média salarial entre as divisões da GM (REHDER,
1993).
Os anos que antecederam o início da operação da Saturn indicaram a situação de
retração que estaria a indústria no momento do lançamento do carro. Após o recorde de
volume de vendas em 1988, que só seria batido dez anos depois, a indústria apresentou
três anos de quedas seguidas, acumulando uma redução de 20%. Para a GM, 1988
também havia sido um ano de recorde de faturamento e de lucros, contudo, a queda nas
vendas nos anos seguintes, combinada com a natureza altamente fixa dos custos de suas
fábricas high-techs, fez seu lucro despencar. O impacto nas vendas da GM foi maior do
que no restante da indústria, acumulando uma queda de 32%. Assim, os dois últimos
anos do mandato de George Smith levariam a GM ao terceiro e ao quarto prejuízo em 82
anos de história. Uma comparação de alguns índices de desempenho do início e do fim
do mandato de George Smith reforça as evidências do declínio vivido pela GM na década
de 1980, apesar do intenso esforço para reverter suas desvantagens em relação às
concorrentes. Entre 1980 e 1991, anos em que a indústria viveu momentos de recessão,
o nível do volume anual de vendas da General Motors caiu 22%, enquanto a participação
de mercado foi de 47% para 33%. Em 1990, a General Motors voltou a apresentar
prejuízos , desta vez de U$ 2 bilhões e, no ano seguinte, de U$ 4,5 bilhões.
George Smith partiu para sua aposentadoria deixando a GM nas mãos de Robert
Stempel em agosto de 1990. Stempel havia assumido a presidência da GM no lugar de
James McDonald que se aposentou em 1987, quebrando a tradição da organização de ter
um CEO com formação em finanças. Entretanto, o mandato do engenheiro, que havia
começado na Oldsmobile em 1958, acabou seis anos antes de ele atingir a idade de 65
anos e fosse obrigado a se aposentar, como era habitual para os presidentes da GM.
Stempel deixou o cargo em novembro de 1992, dois anos e três meses depois de
188
assumir. A saída de Stempel foi uma decisão do conselho de administração da GM, do
qual ele era presidente. Diante da pior crise de sua história, quando a GM reportou um
prejuízo de U$ 23 bilhões, uma reorganização dividiu as funções de presidente do
conselho e CEO. Como novo presidente do conselho, foi eleito John G. Smale, expresidente e CEO da Procter & Gamble e membro do conselho da GM desde 1982. As
funções de CEO e presidente da GM (COO) ficaram sob a responsabilidade de John F.
Smith Jr.
Jack Smith, como era chamado, fizera sua carreira nos escalões de finanças da
GM por 23 anos, até assumir a gerência das operações da GM no Canadá, em 1984. Dali
em diante, Smith tornou-se um executivo de operações, passando pelo comando de
diversas unidades em outros países até se tornar o responsável por toda a operação da
GM no exterior. John Smith assumiu o comando-executivo da GM com a missão de
recuperar a organização após inéditos três anos seguidos de prejuízos.
4.1.26.
Redução de custos, venda de ativos e concordata
A partir de 1992, a GM adotou medidas severas de redução de custo e melhora
nos seus indicadores de retorno. Imediatamente foram anunciados fechamento de
fábricas e planos de demissão, a GM também replicou uma solução iniciada na Europa,
organizando um pool de compras globais. Alem disso, preparou o desenvestimento de
todas as empresas adquiridas na gestão Roger Smith. Com a recuperação do mercado a
partir de 1993 a GM adotou definitivamente a estratégia de importar o carro pequeno de
suas controladas. Investiu no desenvolvimento e ampliação da linha de caminhonetes e
utilitários esportivos. Carros grandes e de maior margem.
Em 1995 a GM organizou a Delphi. A nova empresa reuniu as unidades produtivas
de peças e posicionou-se como uma “empresa de mercado”, não mais uma subsidiária da
GM. Em 1999 a GM vendeu completamente sua participação de mercado. Para valorizar
as ações da Delphi a GM havia feito um contrato de exclusividade de fornecimento a nova
empresa que acabou em 2002. Dois anos depois, em 2004, a Delphi foi advertida pela
Securities Exchange Comission (SEC) que regula as exigências de goverança da Bolsa
de Valores. O motivo da punição foi de fraude nas práticas contábeis.
Em 1998 a GM implantou a sua primeira fábrica em consórcio modular, onde so
forencedores é que operavam a linha de montagem, sob as regras de um contrato. O
189
modelo foi rapidamente replicado para as plantas nos Estados Unidos e as demais
abertas no México. Este movimento causou a greve mais cara de toda a história.
Com a volta dos baixos preços do petróleo e os japoneses dominando os
mercados de carros médios, a GM expandiu rapidamente para os já dominantes veículos
utilitários, entre estas expansões esteve a aquisição do derivado militar Hummer. Entre
2000 e 2004, a GM aumentou a quantidade de modelos de 51 para 63, sendo que o
número de caminhonetes subiu de 20 para 30. Apesar do aumento no faturamento, a
participação de mercado da GM diminuiu como pode ser observado no gráfico 4-2,
abaixo.
Gráfico 4-2 Receita líquida e participação de mercado da GM
250.000.000.000
80%
70%
200.000.000.000
60%
50%
150.000.000.000
40%
100.000.000.000
30%
20%
50.000.000.000
10%
0
0%
1992
1993
1994
1995
1996
1997
1998
1999
participação de mercado
2000
2001
2002
2003
2004
2005
2006
2007
Receita Líquida
Fonte: Relatórios anuais da GM
A partir de 2004, o aumento do preço do petróleo devido ao aquecimento da
demanda mundial fez com que a GM perdesse de forma mais acelerada a participação de
mercado. Nesta época, a GM lutava também contra os altos déficits dos fundos de
pensão de assistência médica de seus funcionários. Estes benefícios haviam começado
na década de 1940, quando foram criados fundos para estes benefícios, que incusive
investiram nas ações da GM. Nos anos 1990, uma combinação que envolveu o aumento
dos preços dos serviços médicos, a redução da base de contribuintes e queda nas
vendas e lucros levou a GM a prejuízos recordes.
Anunciando novos planos de cortes em custo, investimentos, redução de pessoal
e o fechamento da Oldsmobile. A GM, sob o comando de Rick Wagoner, amargou quatro
anos de prejuízos. Recentemente e sob os efeitos da crise financeria nos Estados Unidos,
a GM foi ao Senado Norte Americano solicitar um emprétimos federais para cumprir os
190
comprimissos financeiros da organização. O socorro do governo norte-americano à
General Motors foi aprovado em dezembro de 2008, juntamente com um acordo
semelhante para Chrysler. A ajuda do governo estabeleceu um limite de empréstimo de
até U$ 13,4 bilhões, tendo como garantia as ações da própria GM.
Em 1 de juho de 2009, a General Motors apresentou o pedido de concordata na
justiça dos Estados Unidos. O resultado deste processo foi a cisão dos ativos, liquidando
a parte ruim e reunindo a parte considerada boa em uma nova empresa, denominada
Nova GM, da qual o tesouro americano recebeu 60% das ações.
4.2.
Análise das respostas aos desafios à longevidade
A General Motors desenvolveu ao longo de seus 100 anos de história uma
trajetória de ascensão e declínio como pode ser observado na curva de crescimento
relativa à atividade econômica dos Estados Unidos, no gráfico 4-3 abaixo. O crescimento
acelerado das quatro primeiras décadas atingiu o patamar mais elevado entre as décadas
de 1950 a 1970. Nos últimos 30 a 40 anos de sua trajetória a GM apresentou um declínio
crônico até o ano de 2009 quando foi pedida sua concordata.
O formato da curva de crescimento da General Motors mais uma vez sugere que
organização desfrutou de uma situação de sucesso inicial e, posteriormente, se deparou
com o fracasso. A análise das respostas da GM aos desafios à longevidade buscará
identificar estabilidade e/ou mudanças nos padrões de resposta e comparar com as
referências de propensão ao sucesso e ao fracasso, fornecidas pela teoria. As
constatações obtidas a partir desta comparação de padrões poderão contribuir para
entender as condições que levaram a organização a produzir tal trajetória.
Nos próximos sub-itens desta seção, os cinco desafios a longevidade são
analisados isoladamente. Na Seção seguinte será apresentada a síntese dos padrões de
respostas da GM aos cinco desafios, bem como o efeito combinado dessas respostas
sobre a evolução da posição da GM em relação a auto-perpetuação e auto-destruição.
191
Gráfico 4-3 Evolução do crescimento da General Motors 1904 a 2008
0,035
0,025
0,015
y = -2E-11x 5 + 6E-09x 4 - 7E-07x 3 + 3E-05x 2 - 3E-05x + 0,000
R² = 0,9
0,005
-0,005
Lucro Líquido/PNB
Receita Líquida/PNB
4.2.1. Desafio do Empreendedorismo
O desafio do empreendedorismo está relacionado à promoção de serviços
empreendedores (PENROSE, 2006) e de motivações produtivas (CHANDLER, 1977) pela
organização, condições necessárias ao crescimento. A curva de crescimento da General
Motors indica uma tendência de contínua expansão durante seis décadas e
posteriormente apresenta uma inflexão, invertendo a curva em uma trajetória de declínio.
Apesar do declínio, as evidências indicam que a GM manteve processos contínuos para
prover a organização dos serviços empreendedores, assim como desenvolver
crescimento produtivo.
Motivações para o crescimento
As evidências indicam que a GM desenvolveu sua expansão diversificando a
aplicação dos motores do crescimento contínuo (FLECK, 2003). Inicialmente, motores de
integração vertical e horizontal por meio da aquisição de concorrentes e fornecedores
fizeram uso da capacidade de William Durant em mobilizar recursos financeiros para
expandir as fronteiras da organização. Dois grandes ciclos de aquisições foram
desenvolvidos, um entre 1908 e 1910, e outro entre 1916 e 1920, contudo este motor
encontrou a limitação com o esgotamento de empresas para serem adquiridas. Durante a
192
década de 1920, as oportunidades de aquisições no setor automobilístico se tornaram
escassas, as últimas foram a Scripps-Booth e a Interstate, que logo foram
descontinuadas, além de subsidiárias na Europa, Vauxhall e Opel, e na australiana,
Holden. As demais aquisições já no final dos anos 1920 acionaram o motor de
diversificação, iniciado em 1916 com a guardian fridge, e posteriormente avançando sobre
áreas mais relacionadas como motores a diesel e aviação.
O crescimento da GM também acompanhou o aumento da demanda por
automóveis. O longo ciclo de expansão da indústria pode ser observado no gráfico 4-4
abaixo. A General Motors não só acompanhou a indústria, como aumentou sua
participação de mercado desde seu início até a década de 1970. A expansão inercial da
GM só não foi mais intensa porque encontrou limites na regulamentação da defesa da
concorrência, uma vez que ultrapassar a marca dos 50% do mercado traria
questionamentos jurídicos, e também porque o mercado consumidor se aproximou de um
ponto de saturação.
Gráfico 4-4 Evolução das vendas de veículos da indústria e da General Motors nos
Estados Unidos, entre 1900 e 2008
18.000.000
Vendas de veículos totais (em unidades)
16.000.000
Vendas General Motors (em unidades)
14.000.000
12.000.000
10.000.000
8.000.000
6.000.000
4.000.000
2.000.000
2008
2005
2002
1999
1996
1993
1990
1987
1984
1981
1978
1975
1972
1969
1966
1963
1960
1957
1954
1951
1948
1945
1942
1939
1936
1933
1930
1927
1924
1921
1918
1915
1912
1909
1906
1903
1900
0
Fontes: Relatório estatístico da Senate Fiscal Agency (2007), American Bureau of Statistics (apud
CHANDLER, 1964), relatórios Moody’s (1917 a 1998), relatórios anuais da GM (1998 a 2009)
193
As atividades desenvolvidas pela General Motors eram grandes geradoras de
recursos sob a forma de lucro. A reaplicação destes recursos para gerar mais crescimento
– inercial e via aquisição, principalmente – é uma evidência de motivação produtiva na
organização. Em alguns momentos, a GM também empregou processos de crescimento
de natureza híbrida, como por exemplo o lançamento de carros compactos nas décadas
de 1960 e 1970, mesmo obtendo uma taxa de retorno menor, porém defendendo o
mercado contra as importações.
Na década de 1980, a GM aplicou uma grande quantidade de recursos em
diversos processos de crescimento. Início de programas de inovações, diversificação via
aquisição e expansão vertical adquirindo fornecedores foram algumas das tentativas da
organização para produzir um crescimento e continuar gerando lucros. Contudo, apesar
de ter por trás uma orientação produtiva, grande parte dos esforços fracassou. Já a partir
da década de 1990, a GM desenvolveu um estágio de declínio de dissolução de partes do
negócio. A GM apresentou esforços de crescimento nulo, como a venda e a terceirização
de suas divisões, e também crescimento defensivo, com o uso de descontos e redução de
juros para manter a participação de mercado.
Ambição
A ambição foi uma das características marcantes da gestão de William Durant,
protagonista do processo de formação da GM. As evidências, inclusive registros
autobiográficos, deixam clara a ideia de Durant à respeito da consolidação da indústria
automobilística e a convicção sobre ocupar um papel importante neste processo. O ciclo
de investimentos em aquisições e a contínua construção de plantas para ampliar a
capacidade e desenvolvimento de novos modelos também indicam a forte presença da
ambição, que neste período emanava, sobretudo, do principal acionista e gestor da
empresa.
Por outro lado, conforme a organização aumentou de tamanho, outras pessoas
passaram a estabelecer um relacionamento de sócio-gestor e, portanto, passaram a
contribuir também como fontes deste serviço, foram os casos de Charles Mott, Henry e
Wilfred Leland, Charles Kettering e Alfred Sloan. A associação de Pierre du Pont e da Du
Pont à GM foi um forte incentivo à predisposição a promover o lucro e o crescimento. Tal
predisposição foi registrada no relatório preparado por John Raskob, tesoureiro da Du
Pont, quando ele recomendou a oportunidade de investimento devido a promissoras
perspectivas de rendimento. A participação efetiva da Du Pont na gestão da GM durou
194
entre 1918 e 1958, neste período a Du Pont influenciou o início de dois importantes
processos que sistematicamente passaram a reforçar a ambição, o programa de bônus e
método de análise e tomada de decisão do standard-volume.
O bônus baseado em resultados, inicialmente implantado em 1918, sofreu
diversas adaptações ao longo do tempo, porém, independente do formato, instituiu, dali
em diante, a premiação em função de resultados para o grupo de gerentes e executivos
mais graduados. Este programa permitiu, por exemplo, que o CEO da General Motors,
Thomas Murphy, recebesse um bônus de U$ 950 mil em 1976, por ter alcançado, dentre
outras metas, uma participação de mercado de 52%, renovando toda a linha de produtos
para se adaptar as novas preferências do mercado após o Choque do Petróleo. Naquele
mesmo ano, outros executivos também alcançaram níveis recorde de bônus. Foi o caso
de Elliot Estes, número dois da GM, que no mesmo período recebeu bônus de U$ 600 mil.
O método de avaliação de retorno sobre o investimento, implantado por executivos
vindos da Du Pont, no início dos anos 1920, foi chamado de standard-volume.
Tal
método consistia na conciliação de diversos sistemas de informação e análise que
incluíam procedimentos para projeção da demanda, estimativa de custos e investimentos
e, principalmente, estabelecia o retorno sobre o investimento como critério de decisão. O
objetivo associado ao método era de maximizar o retorno ao longo do tempo, o que
reforçava a predisposição não somente ao lucro, mas ao reinvestimento no negócio.
Embora as metas e a exata fórmula de cálculo de rentabilidade não tenham sido
oficialmente divulgadas, a literatura sobre a GM indica que desde os anos 1920 a
organização trabalhou com o objetivo de produzir um retorno de algo como 20% sobre o
investimento. Esta meta foi publicamente reconhecida pela primeira vez no final da
década de 1970 pelo então CEO da GM, Thomas Murphy, em reunião com acionistas. O
gráfico abaixo indica o longo período de sucessivos resultados positivos em termos de
lucro líquido em relação ao ativo, sobretudo durante o período entre 1920 e 1980.
Após 1980, o indicador de retorno sobre o ativo apresenta uma forte tendência de
queda, porém a análise histórica indica que tanto os princípios de retorno sobre o ativo
quanto os esforços para produzir o crescimento continuaram presentes na General
Motors, especialmente durante a gestão de Roger Smith, quando um novo ciclo de
aquisições foi conduzido. Tais evidências indicam que o declínio observado neste período
não esteve relacionado a uma queda nos níveis de ambição da organização.
195
Gráfico 4-5 Lucro Líquido sobre ativo total, corrente e média móvel em 10 anos
30%
20%
10%
0%
-10%
-20%
-30%
GM - Lucro Líquido / ativo
2007
2004
2001
1998
1995
1992
1989
1986
1983
1980
1977
1974
1971
1968
1965
1962
1959
1956
1953
1950
1947
1944
1941
1938
1935
1932
1929
1926
1923
1920
1917
1914
1911
1908
1905
-40%
Média Móvel (10 anos)
Versatilidade
Os processos de expansão baseados em aquisições e desenvolvimento de
inovações, assim como a penetração e o desenvolvimento de mercado, ocorrem com
intensidade variada ao longo da história da General Motors, eventualmente esbarrando
nos limites existentes a cada um dos motores de crescimento contínuo. As evidências
indicam que os serviços empreendedores de versatilidade atuaram de forma relevante
durante esses processos, no entanto uma característica a se destacar é a fragmentação
entre os fornecedores deste serviço, que marcou a organização desde o seu início. A
separação entre aqueles que contribuíam com a capacidade de imaginação e a
criatividade para combinar os recursos e aqueles que forneciam a visão sobre as
possibilidades de criação de valor teve um papel decisivo no processo de formação da
General Motors. Portanto, o adequado provimento deste serviço dependeu fortemente da
cooperação entre as partes. A observação do histórico da GM evidencia que este foi um
dilema crescente, que acompanhou a expansão da organização e impôs uma repressão
gradual à versatilidade.
A aquisição da Buick por Willian Durant, que deu início ao que viria ser a GM,
representou também um marco da dinâmica que caracterizou os serviços de versatilidade.
196
Na ocasião, David Buick, um inventor que havia criado um veículo capaz de operar com
eficiência, obteve sucessivos fracassos ao tentar criar valor a partir de sua inovação.
Contudo, após a aquisição, Durant não só atuou na mobilização dos recursos, mas foi
determinante na visão de serviços essenciais para a viabilidade do negócio, tais como
rede de vendas, assistência mecânica e instalações produtivas. Para tornar essa união
entre Buick e Durant eficaz, o primeiro aceitou ceder o total controle do negócio ao
segundo, porém tempos depois as divergências provocaram a saída de David Buick.
Essa dinâmica se repetiu com outros integrantes da GM que inicialmente
trabalharam em cooperação com Durant e depois entraram em algum conflito relacionado
à busca de novos serviços produtivos. Foram os casos de Louis Chevrolet, piloto criador
do primeiro veículo Chevrolet, Henry e Wilfred Leland, fundadores da Cadillac, e Walter
Chrylser, que saiu da GM para criar a Chrysler. Esses integrantes participaram de forma
versátil na criação de negócios para a GM, juntamente com outros que permaneceram por
mais tempo na organização, tais como Charles F. Kettering, Artur Mason, Harry Shiland e
Lee Dunlap.
De maneira geral, a conciliação entre a versatilidade daqueles mais próximos à
operação com a visão de William Durant foi obtida por meio da aplicação da folga de
recursos, especialmente financeiros, de forma a patrocinar ou adquirir frentes de
desenvolvimento
semi-autônomas.
Ao
diversificar
as
apostas
usando
recursos
excedentes, Durant se protegeu contra erros de versatilidade de alguns e alavancou os
acertos de outros. Assim sendo, durante sua gestão, a GM colecionou fracassos
relevantes, como por exemplo, Heany Lamp, Welch Motors, Cartercar, Marquette e
Samson Tractor, mas também desenvolveu ações de grande versatilidade, tais como o
Buick Modelo 10, a partida elétrica, Oldsmobile, Oakland, a carroceria fechada, o
Chevrolet 490, a GMAC e a Frigidaire.
A mudança do controle para a Du Pont despertou um ensaio de novos processos
relacionados à versatilidade. O episódio principal foi a fracassada tentativa de
desenvolvimento do motor a ar, o copper-cooled. Na ocasião, Pierre du Pont procurou
submeter serviços de versatilidade de três divisões, o Laboratório de pesquisa, Chevrolet
e Oakland, a um processo corporativo, sob o comando de Charles Kettering. Contudo, o
desentendimento entre as divisões foi crítico e o projeto foi abortado. Após esse episódio,
as divisões permaneceram com estruturas e processos paralelos de desenvolvimento de
produtos e de expansão dos seus negócios.
197
O aparato corporativo promovido pela Du Pont produziu como consequência
adversa o gradual abafamento sobre versatilidade nas unidades de negócio. Durante este
período, houve uma contínua adoção de diversos procedimentos que sistematizavam
atividades fortemente relacionadas à expansão dos serviços produtivos, como por
exemplo políticas para identificar preços e volumes de produção dos veículos, métodos
para avaliar a ampliação ou construção de plantas, sistemas para calcular a geografia de
mercado e assim expandir a rede de vendas, programações para renovação anual da
linha de produtos e também sistemas para definição e execução de orçamentos.
Tais procedimentos impuseram restrições sobre a atuação das unidades de
negócio, inicialmente com o intuito de dar maior eficiência à criação de valor da GM como
um todo. Por exemplo, a política de pirâmide de marcas dos anos 1920 segmentou uma
faixa do mercado para cada unidade de negócio, na qual cada uma possuía autonomia
para desenvolver seus produtos, levando em conta a orientação de se posicionar no topo
de cada faixa. Como resultado, a GM evitou a competição direta entre suas unidades e ao
mesmo tempo ficou em vantagem na disputa com concorrentes que se concentravam
apenas em determinados segmentos. Ao longo da trajetória da GM, no entanto, o nível de
restrição das políticas se elevou e o espaço para as unidades de negócio explorarem a
versatilidade de seus agentes foi gradualmente reduzido.
O desenvolvimento de novos produtos é uma atividade amplamente relacionada
aos serviços de versatilidade. A análise da evolução deste processo na GM evidencia
efeito negativo dos métodos corporativos. Durante a depressão dos anos 1930, a
estratégia de pirâmide de marcas deu lugar ao compartilhamento de chassis e carrocerias
entre as unidades de negócio, a fim de explorar economias de escala e assegurar a
sobrevivência no mercado reduzido e mais sensível a preço. Com a estrutura do veículo
pré-definida pela GM, as divisões passaram a investir na diferenciação de seus produtos
desenvolvendo novos atributos mecânicos, de acabamento e design dos veículos. A GM
então desenvolveu procedimentos sistematizados para renovar a linha de produtos e
compartilhar as soluções entre as unidades de negócio. Estes foram os casos do portamalas inteiriço, os tetos turret tops, transmissão automática, novas suspensões e o design
rabo de peixe, dentre outros que na maioria das vezes foram lançados por uma divisão e,
nos anos seguintes, compartilhados com as demais. Os processos de disseminação de
inovações e melhores práticas, além de reduzir o espaço para desenvolvimento nas
198
divisões, também acirraram a competição entre as marcas que passaram a oferecer
produtos cada vez mais similares.
Conforme os programas corporativos avançaram sobre as especificações dos
produtos, as divisões que dispunham de maior estrutura, corpo de engenharia e
orçamento para desenvolvimento apenas prolongaram a capacidade de desenvolver
novas ideias. No entanto, até o início dos anos 1970, todas as divisões de veículos,
inclusive a Chevrolet, líder de mercado à época, transferiu a definição de seus produtos, e
também de seus processos produtivos, para o staff de engenharia e para a GMAD. Ao
longo deste processo, relatos como o de John Delorean atestam a rivalidade emergente
entre divisões e organização corporativa, que neutralizou a cooperação entre as partes,
tornando as inovações cada vez mais raras.
Se por um lado a versatilidade foi reprimida nas unidades por sistemas
corporativos, por outro a GM não foi capaz de gerar em nível corporativo processos
integrados para incentivar uma alta capacidade de imaginação e visão de novos serviços
produtivos eficazes. Após o fracasso do copper-cooled, Charles Kettering continuou à
frente da organização de pesquisa da GM e contribuiu, juntamente com outros
pesquisadores e engenheiros, para inovações tecnológicas de extrema importância, como
a pintura duco, a gasolina com chumbo, a refrigeração com gás freon e motores e
locomotivas a diesel. A versatilidade de Kettering e sua equipe resultou em efetiva
expansão e criação de valor para a GM. Entretanto, nenhum desses casos resultou em
processos contínuos e integrados de inovação e sim em novas divisões autônomas. De
maneira semelhante, outra iniciativa, a Allisson Engineering, apesar da alta versatilidade
em produtos de elevado conteúdo tecnológico, tornou-se uma divisão que atuou de forma
isolada sobre suas inovações, como por exemplo, motores e turbinas de aviões, e a
transmissão automática para veículos pesados e equipamentos aeroespaciais.
O isolamento das atividades de pesquisa avançada como as de Kettering e da
Allison é evidente quando se observa a facilidade com que essas divisões foram
desligadas da GM sem alterar o andamento das demais. A própria atuação do Laboratório
de Pesquisa da GM deixou de apresentar inovações relevantes após a aposentadoria de
Kettering, em 1947. A GM voltou a anunciar grandes projetos de desenvolvimento de
tecnologia em 1970, iniciando pesquisas para lançar um carro elétrico. Porém, nem o
projeto do carro elétrico, nem o do carro do futuro, Saturn, no final da década de 1980,
foram realizações eficazes na criação de valor.
199
Em termos corporativos, a principal contribuição para o desenvolvimento de novos
produtos se concentrou mesmo na decodificação e transferências de inovações. A
atividade que, no início, era intermediada de forma limitada por Durant, como nos casos
da Oldsmobile e Oakland, após 1920, evoluiu para procedimentos formais da organização
corporativa. Comitês técnicos, grupos de política de produtos, estúdio de design e staff de
engenharia foram algumas das formas como esta atividade se organizou. A atuação da
GM transformou-se em uma capacitação para replicar soluções entre as próprias divisões
e atualizar produtos em relação aos concorrentes. Tal capacitação determinou as práticas
competitivas da GM, sobretudo no período entre as décadas de 1950 a 1970. Neste
período, foram recorrentes as práticas de espionagem industrial e táticas deliberadas de
atrasar programas para poder adaptá-los em relação a inovações de outras fabricantes.
Após a má experiência com o copper-cooled, nos anos 1920, a GM só voltou a
empreender projetos de desenvolvimento de veículos pelo staff corporativo no final da
década de 1960. Entretanto, esses produtos, apesar da grande expectativa gerada,
apresentaram resultados apenas medianos ou baixos, como os casos do Chevrolet Vega
em 1970, o X-car em 1979, o GM-10 em 1986, o Saturn em 1991 e o EV1 em 1996.
A GM empreendeu diversos processos de expansão durante a década de 1980,
investindo grande quantidade de recursos. Contudo, os esforços produziram uma
expansão praticamente nula, evidenciando a baixa versatilidade da organização
corporativa. Os U$ 42 bilhões em automação de plantas, mais os investimentos em
aquisições como a EDS, Huges Aircraft, Lotus, as joint ventures com Toyota e FujitsuFanuc e projetos como o TRILBI e a Saturn Corporation não atingiram seus objetivos em
termos de criação de valor.
Habilidade na mobilização de recursos financeiros
A habilidade na mobilização de recursos financeiros desenvolvida pela General
Motors representou um diferencial vantajoso e decisivo em diversos momentos de sua
história. O adequado uso da reputação, a atenção com o retorno aos credores e a
capacidade de argumentar sobre a atratividade do negócio foram qualidades notórias de
William Durant que viabilizaram o financiamento da expansão da GM em sua formação.
Ao longo do tempo, as competências para prover recursos financeiros foram
aperfeiçoadas a partir do surgimento de uma ampla organização financeira, que soube
não só obter recursos externos de maneira vantajosa, como mobilizou grande geração e
200
reinvestimento de caixa, importantes para impulsionar o crescimento e a manutenção de
uma posição dominante na indústria.
Durante os anos de formação da indústria automobilística nos Estados Unidos, o
acesso a recursos financeiros foi um dos fatores mais críticos para a sobrevivência das
empresas que emergiram. William Durant transpôs esse obstáculo explorando a
reputação de
empreendedor visionário e de
empresário respeitador
de seus
compromissos com credores, que havia desenvolvido na cidade de Flint e em outras no
estado de Michigan. No percurso de levantar recursos para seus investimentos, Durant,
entre bancos, investidores e novos sócios, caminhou para os maiores mercados
financeiros dos Estados Unidos. Porém, seu ímpeto esbarrou na dificuldade em cumprir
com requisitos mínimos de organização da transparência e informação sobre as finanças
de seu grupo. Tais requisitos entraram forçosamente na GM durante a gestão dos bancos
em 1910, gestão na qual a organização aderiu à bolsa de Nova York.
Durant recorreu à associação a investidores como L. Kaufman, J. P. Morgan e a
Du Pont para se adequar às exigências de fornecimento de capital. A ligação com a Du
Pont contribuiu intensamente para manter alta a capacidade de mobilização de recursos
financeiros da GM. Homens como Pierre S. du Pont, John Raskob e Donaldson Brown,
vindos da Du Pont, além de Alfred Sloan e Albert Bradley, foram responsáveis pela
organização de processos que elevaram a qualidade deste serviço empreendedor.
A transição entre os métodos informais de Durant e a sofisticada organização
financeira começou com a criação do comitê de finanças, que inicialmente apenas
recolhia estimativas orçamentárias grosseiras e se incumbia da emissão de ações e
títulos de dívida. A este processo foram se somando seguidos avanços, como auditoria
externa, métodos de orçamento e projeção de mercado e sistemas de tesouraria. A
adoção de procedimentos como estes permitiu que a GM criasse, nos anos 1920, um
avançado processo de análise financeira, o standard-volume, que maximizou a aplicação
e a geração dos recursos. Com isto, a organização não só melhorou seu crédito no
mercado como criou uma máquina de geração de lucro e caixa sem iguais na indústria.
A reaplicação maciça dos recursos obtidos na operação foi algo frequente na
gestão de Durant. Porém, a partir dos anos 1920, a geração de caixa foi tamanha que,
apesar de período com tendência de crescimento acentuada e prolongada na indústria, a
GM foi capaz de, além de pagar dividendos crescentes, financiar seu processo de
expansão praticamente todo com recursos provenientes de sua própria operação. A
201
disponibilidade de recursos financeiros permitiu que a GM criasse a GMAC, um braço
financeiro que pôde aplicar os excedentes na maior atividade de crédito ao consumo do
setor.
A distinta capacidade de mobilizar recursos financeiros assegurou por diversas
vezes uma posição vantajosa para a GM em relação a seus concorrentes. Por exemplo, a
mudança nos requisitos em favor de veículos menores anos após o Choque do Petróleo,
fez com que a GM batesse recordes de vendas, de lucro e de participação de mercado,
pois ao contrário de suas principais concorrentes, ela dispunha de recursos para renovar
toda sua linha de forma simultânea. Em outra situação, durante os anos 1980, a despeito
da extravagância de investimentos em expansões nulas, a GM ainda contou com recursos
para aplicar na promoção das vendas por meio de subsídios e descontos em
financiamento. Esta prática, aliás, foi recorrente durante boa parte do declínio crônico nas
vendas, durante os anos 1990 e 2000.
A reaplicação de recursos da própria operação predominou na maior parte da
história da GM. A captação por meio de endividamento ou ampliação de capital, que foi
recorrente na fase de formação da empresa, tornou-se rara entre os anos 1920 e 1980.
Neste período, a GM só realizou captações externas em momentos de maior
instabilidade, como a expansão das fábricas durante a Segunda Guerra, o plano de
expansão após a guerra da Coreia e o plano de redução de veículos após o primeiro
Choque do Petróleo. Em todos os casos a GM obteve recursos em condições vantajosas
em relação à indústria.
A partir da década de 1980, quando os indícios de declínio tornaram-se mais
aparentes e a organização realizou seguidos investimentos, tornou-se mais frequente a
contração de endividamento. Porém, vale destacar que a GM manteve seus títulos de
dívida com os ratings em mais alto nível junto às agências classificadoras de risco, até
poucos anos antes de ser obrigada a recorrer a empréstimos federais em 2008.
Julgamento diante do risco e da incerteza
A natureza deste serviço empreendedor o relaciona mais à adequação na coleta e
processamento de informações do que propriamente a traços pessoais dos membros da
organização. Neste sentido, o esforço diferenciado de Durant para avaliar riscos e
incertezas, apesar de terem viabilizado a constituição da GM, mostraram-se de alcance
limitado, principalmente em momentos de instabilidade econômica. Com as atividades
iniciadas sob influência da Du Pont, no entanto, a qualidade deste serviço foi
202
significativamente aprimorada por meio da aplicação sistemática de recursos na
interpretação dos riscos e incertezas do ambiente.
Os serviços de julgamento da GM na gestão de Durant foram o resultado da
combinação de seu tino empresarial com a colaboração de uma ampla rede de
relacionamentos da qual ele obtinha informações. Atuando desta forma, Durant
desenvolveu importantes noções sobre diversos riscos ao seu negócio, como por exemplo
a instabilidade no fluxo de matérias-primas, a volatilidade de inovações tecnológicas, a
potencial desvantagem de baixa economia de escala e a alta demanda por recursos
financeiros para sustentar a pesada estrutura de custos fixos. A reação da GM para
mitigar estes riscos contribuiu para respostas como diversificação de investimentos em
novas tecnologias e patentes, aquisição e associação a fornecedores, ampliação da
produção via aquisição e expansão orgânica, e busca para ampliar fornecedores de
capital.
Apesar da ampla coleta de informações e a diferenciada qualidade no julgamento,
Durant foi também conhecido pela aversão em lidar com a organização das informações e
pela abordagem superficial e informal a diversas questões. Tal característica impôs
limitações à qualidade do julgamento da GM, e a expôs a riscos quase fatais. À frente das
operações, Durant enfrentou quatro situações de desaceleração nas vendas da indústria.
Em duas delas, em 1907 e em 1918, a GM saiu ilesa, porém tanto em 1910 quanto em
1920, Durant não foi devidamente precavido contra ameaças à continuidade da GM. Em
ambos os casos, a saída de Durant do comando da organização foi posta como condição
para salvar a empresa.
A influência da Du Pont sobre os julgamento de riscos e incertezas começou com
a realização de estudos em caráter consultivo, como os realizados por E. Bergland e John
Pratt e Alfred Sloan, que inicialmente alertaram para vulnerabilidades da organização.
Após a saída de Durant, estudos pontuais deram lugar a equipes de staff consultivo de
finanças e de operações, que além de identificar riscos também passaram a propor
soluções para evitá-los. O trabalho dos staffs para a análise deste serviço empreendedor
representou a aplicação de recursos na busca pela identificação e neutralização de riscos
e incertezas, melhorando-o significativamente.
Adicionalmente, a instituição de princípios de retorno sobre o investimento e de
métodos de planejamento e controle nas decisões da GM determinou um sistema formal
para avaliar os riscos envolvidos ao longo da cadeia de decisões da empresa. Processos
203
como monitoramento de estoques, projeções de demanda, sistemas orçamentários,
programas de desenvolvimento de produtos, projeções de fluxo de caixa, dentre vários
outros, permitiram que a GM transpusesse, sem apresentar prejuízos, situações
altamente hostis, como por exemplo a grande depressão, as negociações sindicais dos
anos 1930 e 1940, a Segunda Guerra, a Guerra da Coreia e o Choque do Petróleo.
Mesmo quando a GM, na década de 1980, realizou uma desastrada sequência de altos
investimentos com crescimento nulo, a operação contou com serviços eficientes de
julgamento que amenizaram o efeito desses insucessos, possivelmente evitando um
declínio ainda mais acelerado.
4.2.2. Desafio da Navegação no Ambiente Dinâmico
Segundo Felck (2006), respostas positivas ao desafio da navegação no ambiente
dinâmico referem-se ao contínuo monitoramento do ambiente e ao uso adequado de
respostas estratégicas (OLIVER, 1991), assegurando legitimidade e oportunidades para
captura de valor. As evidências encontradas na análise da trajetória da General Motors
indicam a existência de traços consistentes de aplicação de recursos para o
monitoramento do ambiente e uso ativo das respostas estratégicas. A resposta da GM a
este desafio apresentou a característica de explorar sua distintiva vantagem de
mobilização de recursos financeiros, aplicando-os para negociar, cooptar e controlar
processos externos, e assim moldar o ambiente. A GM obteve êxito ao moldar o ambiente
externo, especialmente nos processos de institucionalização da indústria automobilística.
Contudo, apesar de ter assegurado legitimidade e relevante captura de valor por pelo
menos oito décadas, a insistência nesta resposta não impediu a deterioração das
margens quando houve mudanças na rivalidade do ambiente competitivo.
Contínuo monitoramento do ambiente
Assim como buscava informações para exercer o julgamento de riscos e
incertezas, a GM, por meio de Durant e sua rede de relacionamentos, exercia o
monitoramento do ambiente. O comandante da GM peregrinava pelo país e nutria
relacionamentos com as diversas pontas de seu negócio. Políticos, advogados,
empresários, concorrentes, banqueiros, fornecedores, concessionários, pesquisadores e
pilotos de corrida são alguns típicos perfis de pessoas com quem Durant dialogava
frequentemente. Não obstante, a GM também contava com diversos gerentes e
204
associados que também contavam com suas próprias fontes de informação e
eventualmente as compartilhavam com Durant.
Atuando desta forma, a GM manteve-se em contato com as expectativas e
exigências de seus múltiplos stakeholders e sobre as tendências da indústria. Apesar do
caráter informal e intuitivo das ações de Durant em relação a este aspecto do desafio de
navegação no ambiente dinâmico, é possível afirmar que a GM antecipou as dinâmicas
de mudança do ambiente externo, ou no mínimo esteve atualizada em relação elas. Tal
condição permitiu que a organização atuasse adequadamente, por vezes até com
pioneirismo, em questões como a disputa por patentes e inovações tecnológicas,
restrições de insumos produtivos, consolidação dos padrões da indústria, necessidades
da demanda, e desenvolvimento de mão-de-obra para as plantas, cumprimento de
exigências legais e ampliação de fontes de capital.
As gestões pós Durant, de Pierre S. du Pont e de Alfred Sloan, acrescentaram à
GM a regularidade e a sistematização na análise do ambiente por meio de processos
como estudos de força-tarefa, sistemas de coleta de informações, pesquisas de mercado,
contratação de consultorias, criação de equipes de staff especializados e de programas
dotados de etapas formais de supervisão e checagem das ações e do ambiente. O
estabelecimento destes processos permitiu à GM desenvolver regularidade no
monitoramento do ambiente e adequada precisão nas informações obtidas. Exemplos da
qualidade destes processos foram: as pesquisas sobre percepção de marca e
comportamento do consumo na década de 1920, os estudos sobre o ambiente do pósguerra,
os
sistemas
de
projeção
da
demanda
e
monitoramento
de
preços,
desenvolvimento e exposição de protótipos para avaliar a reação do público, espionagem
industrial e sindical, e hierarquias de comitês para mediação com sindicatos e a rede de
distribuidores.
Durante sua história, alguns eventos indicaram falhas nas respostas da GM em
lidar com certas mudanças no ambiente, como por exemplo o surgimento do mercado de
carros compactos, as preocupações com segurança e emissões de poluentes, novas
exigências de qualidade e as filosofias e métodos de produção enxuta. Contudo, em
nenhum dos casos estudados é possível indicar que as falhas da GM estiveram
relacionadas ao fraco monitoramento do ambiente. A tendência de carros compactos foi
detectada na GM logo após a Segunda Guerra, significativamente antes da entrada do
Volkswagen Fusca no final da década de 1950. Nos casos de preocupações com níveis
205
de segurança, emissões e qualidade dos veículos, em todos os casos há evidências de
que a mudança no ambiente foi percebida pela organização. O mesmo ocorreu com o
surgimento das técnicas japonesas de produção, dado que a GM desenvolveu ligações
com Isuzu, Suzuki e Toyota e teve oportunidades efetivas de acessar seus métodos.
Manutenção da legitimidade e captura de valor
O surgimento do automóvel nos Estados Unidos gerou grande expectativa na
população americana. Logo o crescimento das vendas foi tão acelerado e as
oportunidades de captura de valor tantas que houve uma enorme proliferação de
fabricantes. As características do ambiente para essa indústria representaram desafios
críticos para a GM e seus concorrentes. A complexidade do novo produto, a evolução da
tecnologia, a ausência de regulamentações específicas, o estágio incipiente de algumas
indústrias e estruturas correlatas são alguns dos aspectos que marcaram está época.
As evidências revelam respostas ativas da GM e de Durant em relação ao
ambiente externo, como por exemplo a resistência oportunista contra a ALAM, o
investimento em equipes de corrida, as campanhas para atrair trabalhadores para Flint, a
mudança do registro para Nova Jersey, as lojas com exposição de produtos e a
assistência pós-venda. Todavia, as ações mais importantes deste período estiveram
relacionadas a quatro temas: a alta demanda por investimentos de capital, a instabilidade
do fluxo de insumos produtivos, o intenso surgimento de inovações tecnológicas e a
corrida por economias de escopo e escala. Nessas quatro frentes, a GM procurou
desenvolver respostas ativas que a conferiram vantagens que a distinguiram de seus
concorrentes, colocando-a em condições de criar valor.
Ao desenvolver fornecedores de capital, a GM usou amplamente a reputação de
William Durant como tática de influenciar investidores, persuadiu bancos oferecendo
remuneração favorável nos empréstimos, cooptou acionistas importantes, dentre eles a
família Du Pont, e aceitou fazer concessões de controle nas crises de 1910 e 1920. Em
todos os casos, de forma recorrente e muitas vezes explícita, houve a expectativa do
oferecimento de retornos excepcionais aos fornecedores destes recursos.
Para lidar com o fluxo de insumos produtivos e a volatilidade de inovações, a GM
utilizou táticas de cooptação por meio da aplicação de recursos excedentes na aquisição
de empresas e de patentes. Ao adquirir diversos fornecedores e empresas que
trouxessem novas tecnologias, pesquisadores e engenheiros, a GM pode prevenir
diversas situações que naquele período contribuíram para o fracasso de concorrentes, os
206
quais optaram por estratégias diferentes. Portanto, apesar de muitas dessas aquisições
terem fracassado e representado perdas, a resposta pode ser considerada positiva.
Em relação às ameaças à baixa economia de escala, as respostas da GM foram
de cooptar fabricantes a atuar dentro de sua corporação em um processo de crescimento
horizontal via aquisição. Por outro lado, a GM também procurou controlar este processo
investindo amplamente na expansão da rede de distribuição e da capacidade produtiva,
além de insistir no oferecimento de veículos mais baratos, como o caso do Chevrolet 490.
Ao final da gestão de Durant, a Ford havia alcançado significativa vantagem de escala,
pois priorizou o investimento na produção em massa de seu Modelo T. No entanto, a
desvantagem da GM não representou um erro fatal. Nos anos seguintes, a GM, além de
equiparar as técnicas de produção mimetizando a própria Ford, foi capaz de usar
ativamente respostas estratégicas que moldaram o ambiente a seu favor.
A partir dos anos 1920, a evolução das forças competitivas (PORTER, 1979)
ampliaram a oportunidade para captura de valor. As altas economias de escala, tendo a
Ford como principal expoente, tornaram-se uma barreira a novos entrantes e contribuíram
para o shakeout na indústria. Sem fortes substitutos e com significativas barreiras de
entrada (PORTER, 1979), restou à GM disputar a rentabilidade da indústria com a Ford,
uma vez que ambas controlavam boa parte de suas cadeias produtivas até o consumidor
final. Durante este período, a GM empregou diversos processos para moldar os hábitos
de compra e uso de veículos nos Estados Unidos, dentre eles o financiamento ao
consumidor, o incentivo a troca anual dos modelos, a diferenciação de estilo e a qualidade
entre as marcas, o uso de carrocerias fechadas e a criação do mercado de carros usados.
A General Motors ainda contou com a desatenção da Ford em relação a essas mudanças
no ambiente e neutralizou as desvantagens de escala da concorrente.
O espaço criado pela GM para captura de valor foi tamanho que, durante a
depressão dos anos 1930, a pior crise econômica da história dos Estados Unidos, a
organização foi capaz de manter-se rentável, mesmo com a indústria reduzida a ¼ de seu
volume de vendas. Além disso, com a margem de lucro gerada na operação, Alfred Sloan
e a família Du Pont puderam instituir generosas metas de retornos sobre o investimento
para o acionista e ainda obter todo o financiamento necessário para a expansão da
General Motors. A partir dos anos 1930, as ameaças à GM vindas dos concorrentes foram
seguidamente neutralizadas por meio do ativo uso de respostas estratégicas de imitar
eventuais inovações de produtos, mesmo que isso apresentasse um custo adicional, e
207
também de controlar as práticas do mercado, usando as vantagens de tamanho que
adquiriu para determinar preços e configurações de produtos.
Outras respostas ativas da GM para manter a captura de valor após a conquista
de uma posição hegemônica na indústria envolveram também outros stakeholdes da
organização. Por exemplo, as reivindicações sindicais nas décadas de 1930 e 1940
levaram a um intenso processo de negociação marcado por resistência e barganha no
início, porém culminando com a instituição de processos de pacificação, que passaram a
mediar a distribuição de recursos, minimizando a resistência. Durante a Segunda Guerra,
a GM influenciou fortemente o governo dos Estados Unidos, persuadindo-o à elaboração
de propostas de contratação de forma a favorecer as vantagens de escala que possuía.
Já na década de 1950, a GM coordenou a ação com outras indústrias para influenciar a
criação de um plano nacional de construção de estradas.
A segunda metade da década de 1960 marcou uma inflexão na legitimidade da
indústria automobilística nos Estados Unidos e em especial sobre a GM. Até então as
pressões da sociedade americana limitavam-se ao julgamento sobre a conformidade em
relação às leis existentes, como por exemplo a defesa da concorrência, que impôs o
ajustamento dos contratos da GMAC com distribuidores, o desinvestimento nas empresas
de aviação, a venda da operação de ônibus e o desligamento da Du Pont como acionista.
Entretanto, as pressões mais significativas foram decorrências de emergentes
preocupações da sociedade sobre a responsabilidade da empresa em questões como
segurança dos veículos, poluição do ar nas cidades, economia de combustível e
qualidade dos produtos. Tais movimentos questionaram mais fortemente a legitimidade da
GM, pois tiveram ampla mobilização dos cidadãos e dos governos, exigindo adequação a
padrões antes inexistentes.
Após
a
atuação
desastrada
no
caso
do
Corvair,
em
1965,
quando
equivocadamente desafiou os questionamentos do senado americano e de Ralph Nader,
a GM não repetiu a mesma resistência quando viu sua legitimidade questionada. As
evidências indicam que nesses casos que envolveram a responsabilização do fabricante
sobre os efeitos do automóvel na sociedade, a GM optou por adotar respostas de
negociação mais passivas, baseadas mais na acomodação e pacificação do que
propriamente na barganha. Este tipo de atuação da GM predominou durante as
mobilizações para a criação de políticas e regulamentações, como a lei nacional de
segurança de veículos, a lei federal do ar limpo e a CAFE.
208
O êxito na entrada de Toyota, Honda e Nissan no mercado americano aumentou
gradualmente a rivalidade na indústria a partir do final da década de 1960. A resposta
imediata da GM seguiu o padrão utilizado até então contra Ford e Chrysler de procurar
controlar a disputa usando sua força para ocupar os espaços. O lançamento do Vega, em
1970, foi a segunda tentativa de entrar no mercado de carros compactos, porém, assim
como no caso do Corvair, a GM foi incapaz de produzir o veículo a que se propôs.
A presença dos concorrentes japoneses foi impulsionada com o Choque do
Petróleo de 1973, pois estes, além do atrativo ligado ao menor consumo de combustível,
puderam ter a qualidade de seus veículos mais conhecida. Embora nos primeiros anos
pós-choque a GM tenha se favorecido devido aos problemas de caixa de Ford e Chrysler,
a pressão da concorrência dos produtos japoneses continuou aumentando nos anos
seguintes. Após a segunda crise do petróleo, a partir de 1979, a ameaça ganhou novo
impulso e a GM passaria a década seguinte em uma ativa cruzada competitiva, colocando
em prática uma ampla gama de respostas estratégicas, por vezes divergentes.
Uma das primeiras ações para recuperar as vendas foi negociar com o
consumidor. A GM passou a oferecer parte da sua margem na forma de descontos ou
redução dos juros em troca da preferência por seus produtos. No discurso à imprensa, o
CEO George Smith desfiou ataques à competição desleal da mão-de-obra asiática e
acusou sindicatos americanos de promover desvantagens competitivas. Quando esteve
diante do governo americano, procurou influenciá-lo a criar barreiras à importação, como
também a estabelecer acordo comercial com o México para obter acesso à mão-de-obra
mais barata. Posteriormente, se por um lado a GM negociou acordos sindicais mais
favoráveis, ela também cooptou as montadoras japonesas Suzuki e Isuzu, nas quais
adquiriu participação, a importar veículos que completavam a linha de compactos. Em
relação a produção nos Estados Unidos, a GM ao mesmo tempo que evitou os métodos
de produção japoneses apostando na tecnologia da informação em projetos como o
Trilbly e a Saturn, também cooptou a Toyota para associarem-se na criação da NUMMI.
A resposta mais significativa em termos de aplicação de recursos foi a corrida para
expandir a fronteira tecnológica. A série de aquisições de empresas de tecnologia,
robótica e processamento de dados, somada aos investimentos em novas plantas
automatizadas, representou a tentativa de desafiar as pressões e ao mesmo tempo
controlar o avanço tecnológico. O baixo resultado das respostas estratégicas conduzidas
ao longo da década de 1980 forçou a GM a entrar em conformidade com as exigências de
209
seus acionistas, reduzindo os investimentos e negociando o nível da demanda com o uso
de incentivos de preço e financiamentos.
Durante as décadas de 1990 e 2000, a GM limitou-se a respostas de aceitação às
pressões institucionais, procurando imitar produtos e entrar em conformidade com novos
padrões de qualidade; passou a evitar confrontos competitivos ao desfazer-se aos poucos
de partes de sua operação e concentrar-se em segmentos de altas margens e, por fim,
negociar incentivos à demanda, cedendo suas margens para manter a operação rodando.
4.2.3. Desafio da Gestão da Diversidade
O desenvolvimento da integridade organizacional foi um desafio persistente ao
longo da trajetória General Motors, com o qual os gestores tiveram dificuldades em
apresentar soluções plenas. Ao conduzir a formação inicial da GM em uma holding
fragmentada e heterogênea, Durant ofereceu uma resposta que promoveu pouco
compartilhamento de recursos e foi limitada no oferecimento de processos de
coordenação. A evolução da estrutura para a empresa multidivisional foi acompanhada da
sistematização de procedimentos para identificar e promover o compartilhamento e
intercâmbio de recursos entre as divisões, na busca de economias de escala, escopo e
velocidade (Chandler, 1977).
Contudo, a ampliação do vínculo entre as partes da organização não foi
devidamente seguida do desenvolvimento de capacitações de coordenação eficazes. Em
vez disso, a GM procurou resolver as divergências com origem na heterogeneidade entre
as divisões por meio de processos corporativos de arbitragem, que gradualmente
acirraram a rivalidade entre divisões e organização corporativa. Os efeitos da resposta
negativa a este desafio levaram à redução da propensão à cooperação e incentivaram a
criação de um aparato corporativo excessivamente pesado para acomodar as diferenças
entre as partes.
Compartilhamento e intercâmbio de recursos
Durante o período de formação da General Motors diversas empresas foram
reunidas dentro da mesma holding. Os principais recursos compartilhados foram os
serviços empreendedores de Durant, em especial a habilidade em mobilizar recursos
financeiros. Outras relações de intercâmbio de recursos existiram na forma de
transferência de tecnologias e patentes, como por exemplo o uso da estrutura do Buick
210
para o novo Oldsmobile, além, claro, da transferência de componentes das empresas
fornecedoras, mesmo sob uma relação típica de mercado.
Nos períodos em que esteve à frente da GM, Durant foi o principal responsável por
identificar recursos homogêneos e oportunidades para estabelecer relações de
compartilhamento. Porém, a informalidade e a superficialidade com que as questões eram
abordadas pelo comandante da GM representaram uma barreira para a qualidade desses
processos. Por outro lado, embora o nível do relacionamento entre as empresas tenha
significado um vínculo relativamente superficial, tratava-se do compartilhamento de
recursos
extremamente
valiosos
naquele
contexto
da
indústria.
O
acesso
a
financiamentos para expansão, inovações tecnológicas e contínuo fluxo de insumos
mostrou-se suficiente para justificar que as partes permanecessem ligadas à organização
naquele momento.
Em 1910, ocorreram os primeiros esforços sistematizados para identificar
oportunidades de compartilhamento de recursos. A gestão do consórcio de bancos
credores promoveu a harmonização dos procedimentos contábeis e usou de cálculos
estatísticos para avaliar as diversas empresas que compunham a GM. O resultado foi a
fusão e absorção de diversas empresas para formar, por exemplo, a GM Trucks e a
Peninsular, bem como a venda de outras avaliadas como sendo de baixa viabilidade. Esta
gestão também desenvolveu novos processos compartilhados pelas unidades de negócio,
como o primeiro laboratório de testes, a GM Exports e revista Insider.
Na segunda gestão de Durant, novas empresas foram incorporadas à GM para o
fornecimento de produtos e serviços às demais fabricantes. A GMAC, a Fisher Body e a
New United ampliaram a transferência de recursos importantes para as divisões de
veículos, tais como serviço de crédito ao consumidor, componentes, carrocerias e
inovações tecnológicas. A partir de 1918, todas as empresas do grupo foram convertidas
em divisões. A GM formalizou a estrutura corporativa em divisões, em substituição à
holding. Porém, nos anos imediatamente seguintes, a operação das divisões permaneceu
sem alterações relevantes.
No início da década de 1920, a adoção de novos processos de sistematização de
procedimentos e de busca por soluções contribuíram imediatamente para novas ações
que significaram a ampliação de recursos compartilhados. Uma delas foi a unificação do
caixa das divisões, que veio acompanhada de métodos e regras sofisticadas de controle.
A outra foi a identificação da ameaça, comum às divisões de veículos que representava a
211
produção em massa da Ford. Esta noção resultou no desenvolvimento de uma estratégia
comum de segmentação entre as divisões de veículos para dominar os espaços do
mercado.
A atuação de grupos e comitês consultivos, como o de vendas e o de produtos,
passou sistematicamente a identificar novas oportunidades de combinar e compartilhar
recursos entre as unidades, a disseminação de melhores práticas de engenharia, a
cessão de tecnologia de motor entre divisões ou a formação e equipes multidivisionais de
engenheiros para desenvolver novos componentes foram algumas formas pelas quais o
intercâmbio de recursos entre divisões ampliou-se.
Na década de 1930, o ambiente hostil da Grande Depressão acelerou o
compartilhamento de recursos entre as divisões. A quantidade de chassis e carrocerias foi
reduzida a três opções de tamanho, de modo que as divisões compartilhassem um tipo de
chassis com pelo menos mais uma divisão. A operação de marketing e vendas das três
divisões menores, Buick, Oldsmobile e Pontiac, foram unificadas em uma única
organização, a BOP, enquanto Chevrolet e Cadillac permaneceram separadas. Ao final da
depressão, a BOP foi desfeita, mas o compartilhamento de chassis continuou.
A partir de 1934, a padronização do fluxo de desenvolvimento de novos modelos
aplicado em todas as divisões e supervisionado pelo staff corporativo de engenharia
estabeleceram processos formais de identificação e transferência de recursos entre as
divisões. A programação do desenvolvimento de novos modelos da forma como foi
estabelecida promoveu acelerado intercâmbio e compartilhamento de recursos por um
longo período. As equipes de staff e os comitês corporativos também padronizaram e
compartilharam procedimentos relativos a outras áreas além do desenvolvimento de
produtos. Modelos de contratos para a rede de distribuição e sistemas de avaliação de
desempenho, de promoção e de bonificação foram disseminados a partir desta época.
Na década de 1950, o uso da informática para a organização dos processos
produtivos permitiu ampliar o compartilhamento de recursos, uma vez que praticamente
todas as opções de peças, acessórios, recursos de acabamento e design puderam ser
disponibilizados aos modelos das várias divisões. Com isso, o staff de engenharia
promoveu ampla comunização das plataformas de veículos por meio das marcas de cada
unidade de negócio. Avançando as relações de compartilhamento, entre 1965 e 1971, a
GM formou a divisão GMAD e estabeleceu a unificação dos recursos produtivos de todas
as divisões de veículos e da Fisher Body, fornecedora de carrocerias.
212
A organização da GMAD parece ter sido o ápice do vínculo de compartilhamento
de recursos na General Motors. A partir do final dos anos 1960 e início dos 1970, a GM
iniciou uma reação a crescentes ameaças a sua competitividade, cujos efeitos
desencadearam um longo ciclo de cisão, venda e terceirização das atividades.
Em 1968, foi vendida a Euclid, de máquinas e equipamentos pesados, e em 1979
a divisão de eletrodomésticos Frigidaire. Na década de 1980, a GMAD foi desfeita e duas
divisões autônomas de veículos foram criadas, a BOC e a CPC. Operações deficitárias de
autopeças foram vendidas, fechadas ou absorvidas por outras divisões. A área de
processamento de dados da GM foi transferida para a EDS, que passou a funcionar como
um fornecedor externo. Outros investimentos para produzir novas tecnologias e depois
serem transferidas para as operações de veículos foram conduzidos de forma isolada,
como a joint-venture para desenvolvimento de robôs, a aquisição da Huges Aircraft, a
NUMMI e a criação da Saturn Corporation e da Lotus.
Nos anos 1990, a GM unificou suas áreas de compras no intuito de produzir
economias de escala. Desfez-se de diversas operações iniciadas na década anterior,
como a EDS e a Huges Aircraft e, além disso, unificou suas operações de autopeças com
a criação da Delphi e, posteriormente, vendeu sua participação. No final da década de
1990 e nos anos 2000, a GM passou a converter suas plantas para um sistema de
consórcio modular, terceirizando boa parte das operações de montagem e passando
parte dos custos fixos e do risco para fornecedores. Finalmente, o declínio continuado
levou à venda de diversas operações autônomas, como Electromotive, GM Defense,
GMAC, Allisson, e participações em Isuzu e Suzuki.
Capacitações de coordenação
A holding criada por Durant reuniu sob o nome da General Motors um conjunto de
empresas autônomas, praticamente em regime de gestão de portfólio (PORTER, 1987).
Foi comum nesta fase, após adquirir uma empresa, Durant mantê-la operando da mesma
maneira que fazia antes de esta entrar para a GM, como foi o caso da Cadillac. As
evidências referentes ao período inicial indicam uma ocorrência praticamente nula de
processos de coordenação. Ocasionalmente, Durant era levado a intermediar ações
conjuntas ou transferência de tecnologias entre unidades, porém, o fazia com
envolvimento superficial e informal. Em outros raros casos, processos de cooperação
entre empresas emergiram a partir do convívio social entre membros da organização.
213
Os limitados processos de coordenação da GM de Durant e o alto grau de
autonomia de unidades de negócio ocasionalmente acirraram a rivalidade sobre da
utilização dos recursos, como as divergências sobre a produção em período de guerra
que causaram a saída de Henry Leland da Cadillac. No entanto, de uma maneira geral os
momentos críticos de impasse na relação entre unidades de negócio e a GM tiveram
como resposta processos de acomodação das posições. Em casos onde houve disputa
por recursos escassos entre as divisões, como nas crises de 1910 e 1920, a resposta da
GM foi de negociar novos recursos. Nesses dois casos especificamente coube a uma
direção externa arbitrar sobre a distribuição. É evidente que as condições da indústria em
forte expansão e sem concorrentes dominantes, aliadas à capacidade de Durant para
mobilizar recursos financeiros em condições vantajosas, permitiram à GM prolongar a
situação na qual manteve recursos compartilhados apenas superficialmente e, ao mesmo
tempo, dispensou a cooperação entre as unidades de negócio.
No início dos anos 1920, dois processos ampliaram recursos compartilhados entre
as divisões: a unificação do caixa e a estratégia de pirâmide de marcas contra a Ford. Em
ambos os casos, a coordenação entre as partes não seguiu o caminho da cooperação,
mas novamente o de acomodação por meio da arbitragem, desta vez na forma de
políticas corporativas que delimitaram a atuação de cada divisão. A principal instância
responsável pela arbitragem foi o comitê executivo nomeado por Pierre S. du Pont, que
além dele incluíam Alfred Sloan, John Raskob e J.A. Haskell, com Sloan sendo o único
com experiência na indústria automobilística. Cabe ressaltar que, para estas deliberações
do CE terem produzido um resultado esperado, a sistematização de procedimentos e a
adoção de métodos sofisticados de análise foram decisivos.
Pierre S. du Pont também tentou avançar no intercâmbio de recursos entre
divisões da GM, com o desenvolvimento de um novo veículo com motor refrigerado a ar, o
Cooper-cooled. Novamente, a coordenação do processo foi estabelecida através de uma
decisão arbitrária do comitê executivo. O novo veículo envolveria o Laboratório de
Pesquisas da GM, Chevrolet e Oakland, sendo que o Laboratório conduziria o
desenvolvimento e, posteriormente, transferiria para que as duas divisões o produzissem.
A Chevrolet se viu forçada a aceitar as ideias do CE, porém evitou contribuir para o
desenvolvimento que, após sucessivos fracassos, foi descontinuado.
Por determinado período dos anos 1920, a GM foi capaz de promover relativa
cooperação na coordenação entre as divisões. Contribuiu para isso uma série de
mudanças efetuadas por Alfred Sloan, depois que ele assumiu a presidência da GM.
214
Sloan indicou para compor o CE da GM Charles Mott e Fred Fisher, executivos que, como
ele, haviam amplo relacionamento com todas as divisões, pois, em boa parte de suas
carreiras, tinham sido fornecedores com relevante nível de cooperação com as principais
divisões. Além disso, Sloan ativou o Comitê Operacional (CO) formado por gerentes das
divisões, que passou a supervisionar a atividade do staff. O staff de operações, formado
pelos comitês técnicos geral e de vedas, passou a conduzir grupos de estudo e equipes
força-tarefa, formados por membros das divisões, que avançaram em inovações em áreas
como transmissão, estruturas, suspensão e design.
A partir de 1930, o compartilhamento de recursos aumentou devido à unificação
das carrocerias e chassis para enfrentar a depressão econômica. No entanto, ao invés de
ampliar os processos de coordenação, a GM retrocedeu. Após a curta experiência da
BOP, as divisões permaneceram autônomas e os membros das divisões que participavam
nos grupos e comitês de staff foram substituídos, assim como os gerentes que faziam
parte do CO. Este comitê, que permitia às divisões influenciar a formulação de políticas
corporativas, foi extinto por um período e, depois da Segunda Guerra, retornou sob o
nome de Comitê de Administração, porém sem a atribuição de sugerir ou vetar políticas.
A criação de um programa padronizado de desenvolvimento de novos modelos
acelerou o intercâmbio de soluções entre as divisões e também a atualização dos
produtos em relação a inovações de concorrentes. A arbitragem através de políticas
permaneceu o principal mecanismo para acomodar as divergências entre as divisões.
Com o tempo, sistematizou-se também uma hierarquia de grupos de staff e comitês. O
CE e o CF continuaram as instâncias mais altas e, entre eles e as divisões, nove grupos
de políticas e diversos comitês foram criados.
À exceção do período da Segunda Guerra, quando a organização se
descentralizou amplamente para fornecimento de equipamentos bélicos, a forma como a
GM se organizou produziu um amplo potencial de divergências entre as divisões. O caso
descrito por John Delorean em sua biografia retrata o efeito negativo do sistema de
comitês de arbitragem em relação à coordenação: a programação de vendas das divisões
era superestimada por seus gerentes, de forma que a somatória das divisões era
frequentemente superior à capacidade. A acomodação dos volumes era, então, arbitrada
no comitê de vendas, formado por membros do staff corporativo, com base nas
estatísticas do histórico de vendas dos modelos. Portanto, se a divisão percebesse uma
oportunidade de reposicionar determinado produto com baixo desempenho nas vendas e
desenvolvesse alguma espécie de promoção, se a demanda aumentasse, fatalmente o
215
produto não estaria disponível nas lojas, pois a ordem de aumento na produção teria sido
vetada em função do histórico.
Ao ocupar a presidência da GM na década de 1950, Harlom Curtice, promoveu
mudanças na organização corporativa, a fim de lidar com os processos de coordenação
das atividades. Ao estabelecer relação direta com equipes de staff e também com as
divisões, Curtice substituiu parte da hierarquia de comitês e passou ele mesmo a orientar
a formulação e a arbitrar as políticas da GM. Após a aposentadoria de Curtice, seus
métodos foram devidamente reprovados pela organização corporativa, que reformulou as
atribuições dos comitês no formato similar ao anterior, porém tornando ainda menos
influente a participação do CA, que passou a ter um caráter meramente consultivo.
Com os veículos cada vez mais semelhantes entre as divisões, a rivalidade entre
elas também aumentou. Para encontrar saídas para seus problemas competitivos
algumas divisões procuraram se diferenciar. A Pontiac, na década de 1950, adotou o
estilo mais esportivo em seus veículos; a Chevrolet também seguiu essa linha. Porém o
processo de desenvolvimento de novos modelos, conduzido pelo staff corporativo, passou
a ser cada vez mais detalhado sobre as especificações dos produtos, deixando pouco
espaço para a atuação das divisões. Tal nível de interferência das deliberações
corporativas aumentou o potencial de divergência entre divisões e staff. Nesta situação,
duas distorções principais dos processos de coordenação foram identificadas: uma foi a
ocultação de projetos nas divisões, como no caso do GTO, desenvolvido às escondidas
pela Pontiac, em 1966; a outra distorção foi a orientação das ações para a aprovação, ou
seja, as divisões passaram a planejar suas ações, como campanhas publicitárias, com o
objetivo de serem aprovadas nos comitês e não de terem a mensagem e a forma mais
apropriadas.
O esgotamento do processo de acomodação arbitrária entre as diferenças das
divisões fez com que a organização corporativa absorvesse parte das atividades das
divisões. Com os programas de comunização de peças e a GMAD estabelecidos ao longo
da década de 1960, a partir dos anos 1970 a GM gradualmente passou o
desenvolvimento de veículos das divisões para o staff corporativo de engenharia. Assim,
as divisões deixaram de conceber e de montar seus produtos, limitando-se a realizar a
promoção, a comercialização e a entrega dos veículos, ou no máximo, a criar derivações
dos veículos a partir de combinações de acabamento, como o Chevrolet Nova, derivação
esportiva do Vega.
216
No início da década de 1980, após registrar queda no desempenho financeiro e
seguidas crises na qualidade dos produtos, o recém empossado presidente George Smith
promoveu uma ampla reorganização. A GM desfez a GMAD e organizou-se em duas
grandes divisões, a CPC e a BOC. No nível das divisões foi realizada também uma
restruturação
envolvendo
a
substituição
da
estrutura
em
departamentos
por
funcionalidade por outra organizada em torno de gerentes de produtos. Na área de
engenharia, duas equipes distintas para cada divisão foram formadas. Toda a concepção
e aprovação dessas medidas ocorreram no nível corporativo. Por exemplo: a seleção e a
formação das equipes e dos gerentes para cada área foi conduzida por uma equipe de
força-tarefa que entrevistou e analisou os membros da organização.
As dificuldades enfrentadas pela GM no início da década de 1980, prejuízo e
problemas crônicos com qualidade, levaram o CE a deliberar uma série de planos de
mudanças radicais, a fim de dar novos rumos para a organização. Fusão das divisões de
veículos e da GMAD em duas, CPC e BOC, substituição de departamentos por gerentes
de produtos, aliança para fabricação de robôs, construção de plantas automatizadas,
aquisições de EDS, Huges Aircraft e Lotus, criação da Saturn e da NUMMI foram as
principais ações. As decisões arbitrárias do CE foram acompanhadas de processos de
coordenação, baseados apenas no cumprimento da programação formulada pelos
comitês e equipes de força-tarefa. Nenhuma das ideias alcançou os objetivos traçados.
Na maioria delas houve um baixo nível de cooperação; integrantes e partes da
organização que foram colocados para trabalharem juntos desenvolveram rivalidade,
redes informais foram desfeitas de uma hora pra outra, houve atrasos em alguns
programas e gastos extraordinários para corrigir problemas em outros.
Pressionada pelos maus desempenhos, a GM anunciou seguidos planos de
redução de custos no final dos anos 1980 e início dos 1990. Alguns dos planos
estabeleceram programas de demissão, que em diversos casos, definiu metas de
redução, por departamento. Este processo seguiu a prática de deliberação de políticas, no
entanto a baixa coordenação entre comitês de políticas e departamentos nas divisões
refletiu na implementação da decisão, a necessidade de contar com os serviços de
pessoas que tinham de ser demitidas fez com que parte dos profissionais fossem
recontratados sob contratos de terceirização.
No final da década de 1990, a terceirização foi anunciada como alternativa para a
competitividade em custos. As plantas passaram a ser operadas por terceiros, regidos por
contratos minuciosos de fornecimento. Esta alternativa reforçou a utilização de processos
217
de acomodação e arbitragem de políticas, neste caso, na forma de contratos associados a
um forte aparato analítico provido pelo staff corporativo.
4.2.4. Desafio do Aprovisionamento de Recursos Humanos
A análise histórica da General Motors fornece evidências de que a organização
manteve processos voltados para antecipar a necessidade de recursos gerenciais.
Embora
de
uma
natureza
aparentemente
intuitiva,
os
esforços
para
reunir
antecipadamente pessoas talentosas para gerir as atividades de uma indústria em
formação foram constantes na fase inicial da GM. Acompanhando a adoção de
procedimentos sistematizados a organização desenvolveu processos formais de seleção,
formação, retenção e desenvolvimento de recursos gerenciais, que foram satisfatórios ao
preparar os quadros de gerentes para as necessidades de expansão e de sucessão.
Como resultado, a GM em raras ocasiões necessitou recorrer ao recrutamento externo ou
improvisações emergenciais para atender às demandas por estes recursos.
Fornecimento constante e antecipado de Recursos Gerenciais
Nos primeiros anos da indústria não havia uma formação específica de onde
potenciais recursos gerenciais pudessem ser recrutados. Diversos homens, que
contribuíram de forma relevante para o seu crescimento, chegaram à GM pelas ações de
Durant. Por meio das aquisições, Durant recrutou Charles Kettering, Alfred Sloan, Weston
Mott, Henry e Wilfred Leland, Lee Dunlap, os irmãos Fisher e Albert Champion. Além
disso, Durant também contratou pessoas por meio de sua ampla rede de contatos, tais
como, Charles Nash, ABC Hardy, Sam Mclaughlin, Louis Chevrolet e Harry Shiland. Nesta
época, Durant manteve uma ampla rede de gerentes ligados às empresas da GM,
permitindo promovê-los a novas funções conforme a necessidade. Atuando desta forma,
Durant mobilizou pessoas com conhecimento específico sobre a indústria e criou uma
espécie de estoque de recursos humanos, antecipando as necessidades ocasionadas
pela expansão. Eventualmente, excessos foram cometidos por Durant para reter pessoas
com conhecimentos e habilidades raras, como foi o caso de Walter Chrysler. Porém, em
geral, os principais gerentes da GM eram também acionistas, pois suas empresas haviam
sido adquiridas com trocas de ações, fortalecendo a relação de vínculo ao negócio.
A transição entre as gestões de Durant e Pierre S. du Pont não se tratou de uma
sucessão antecipada. Durant estava longe da aposentadoria e, apesar de ocupar-se em
antecipar o recrutamento de gerentes, não previu a necessidade de um substituto
218
imediato caso algo ocorresse consigo. Já na gestão de du Pont, uma série de processos
foi iniciada para prover os recursos gerenciais da GM.
Na década de 1920, o recrutamento e a formação de recursos humanos foram
influenciados pela adoção de ações planejadas que visavam antecipar as necessidades
da organização. A GM buscou na Du Pont executivos como John Raskob, Donaldson
Brown e John Pratt, cujas habilidades foram julgadas como necessárias para solucionar
os problemas da GM, assim como alguns executivos vindos da Ford com experiência
sobre as técnicas de produção em massa, como William Knudsen. Além disso, a GM
adotou processos de recrutamento de recém graduados com alto desempenho em boas
escolas de economia e negócios, e inaugurou o General Motors Institute (GMI), em 1922,
que passou a oferecer a formação de engenharia com a realização de estágios nas
próprias unidades da GM para futuros ocupantes das posições nas divisões.
O incentivo ao comprometimento dos gerentes com o negócio manteve o principio
de participação nos lucros da época de Durant, porém após os anos 1920, foram
estabelecidos programas de participação nos lucros e bônus para os gerentes. Para tanto,
a GM também estabeleceu hierarquias de cargos e responsabilidades, com sistemas de
avaliação e promoção dos empregados. Para supervisionar a formulação e aplicação de
políticas a respeito de assuntos como planos de bônus, participação nos lucros, opções
de compra de ações, foi formado um comitê externo, indicado pelo conselho de
administração.
Duas carreiras principais emergiram na organização, uma de finanças e outra de
operações. Em ambas desenvolveram-se trajetórias padrão para os executivos. Em
finanças, recém graduados eram recrutados nas escolas de negócio e avançavam os
degraus da organização de finanças conforme eram bem avaliados na realização de suas
atividades. Vários executivos que ocuparam as posições mais altas da organização
cumpriram este percurso, dentre eles Albert Bradley, Fred Donner, Thomas Murphy,
Richard Gerstenberg, George Smith, John Smith e Richard Wagoner. Pelo lado de
operações, os percursos dos executivos que chegaram ao topo foram mais variados, uma
vez que não necessariamente os gerentes haviam passado pelo GMI, porém, assim como
na organização de finanças, havia hierarquias dentro das divisões e também entre
divisões. Por exemplo, Semon Knudsen, Elliot Estes e John Delorean, entre 1956 e 1959,
foram respectivamente gerente geral, engenheiro chefe e gerente de engenharia da
Pontiac. O bom desempenho dos três produziu uma sequência de promoções,
219
substituindo um ao outro, passando pela gerência geral da Pontiac, gerência geral da
Chevrolet e, em seguida, para a organização corporativa.
Após a turbulenta transição entre Durant e du Pont as demais sucessões no topo
da hierarquia corporativa foram conduzidas de forma mais planejada. Já na curta gestão
de du Pont, Alfred Sloan, que havia apresentado desempenho destacável, foi preparado
para assumir a presidência da GM e, em seguida a presidência do conselho de
administração. Após Sloan, a sucessão nas posições de presidente, CEO e presidente do
conselho em raras vezes teve de recorrer ao improviso ou a executivos de fora da
organização. O processo de escolha normalmente era iniciado anos antes da
aposentadoria do ocupante do cargo, quando o potencial sucessor era escolhido dentre
um grupo de vice-presidentes corporativos e, caso fosse julgado necessário, o candidato
era designado a alguma posição que completaria sua preparação. Foram os casos de
Albert Bradley, Thomas Murphy, George Smith, John Smith e Richard Wagoner, que
saíram da organização de finanças para assumir uma posição de operações antes de
serem nomeados CEO.
Com relação ao desenvolvimento de habilidades e competências dos gerentes,
além da natural evolução dos gerentes, que na medida em que avançavam as hierarquias
aprendiam a lidar com problemas gerenciais mais difíceis, a análise histórica não forneceu
evidências de que a GM tenha feito uso de treinamentos para desenvolver novas
qualificações nos gerentes, de modo a antecipar necessidades de habilidades
específicas. Os escassos registros de treinamentos planejados e executados pela
organização limitam-se à década de 1980, quando relatórios de consultorias apontaram
como ponto fraco da GM o baixo uso de treinamentos. Na mesma década, Lee (1988)
afirmou que ao buscar evidências da realização de treinamentos, não os encontrou em
nível corporativo e descobriu que estes ficavam mais a cargo das divisões. Outras
evidências encontradas a esse respeito foram a conferência corporativa trienal, com
registros a partir da década de 1960, onde eram feitas apresentações preparadas por
executivos da própria organização para uma massa de gerentes, além de um curso
contratado junto a Phillip Crosby na década de 1980, para treinar gerentes e líderes
sindicais, durante uma semana, sobre técnicas e conceitos de qualidade.
220
4.2.5. Desafio da Gestão da Complexidade
As respostas a este desafio estão relacionadas aos processos desenvolvidos pela
organização para lidar com problemas complexos. Neste sentido, a análise da atuação da
General Motors ao longo da história indica que houve significativa alteração no padrão de
suas ações.
Na fase de formação da organização, as respostas empregadas sob o comando
de William Durant, marcadas pelo excesso de informalidade e improvisação, colocaram a
existência da GM em risco por pelo menos duas vezes em seus primeiros 12 anos. Após
1920, o esforço aplicado sob a influência da Du Pont determinou o início do
desenvolvimento de procedimentos sistematizados de coleta de informação, análise e
tomadas de decisão, implementação e controle, que ampliaram a capacidade da GM em
lidar com problemas complexos, afetando também capacitações relacionadas a respostas
a outros desafios.
A fórmula encontrada pela GM para promover esta mudança envolveu inicialmente
a aplicação de recursos na formação de equipes de força-tarefa, normalmente isentas de
atividades de operações, para estudar o problema e propor soluções transferíveis às
divisões. A evolução deste processo levou à formação de uma organização corporativa
com equipes de staff especializadas e permanentes, sob a orientação de uma hierarquia
de comitês corporativos. A atuação de staffs e comitês institucionalizou na GM um tipo de
gestão marcada pela formulação sistematizada de políticas corporativas.
Por outro lado, a forma como a GM empregou procedimentos sistematizados para
solucionar problemas produziu também um efeito negativo sobre a capacidade de
aprendizado da organização. O incentivo da GM ao desenvolvimento das ferramentas de
busca (CYERT & MARCH, 1963) concentrou-se nos processos desenvolvidos em nível
corporativo, ou seja, separando-os da atuação no nível das divisões que permaneceram
autônomas para conduzirem seus próprios processos. Portanto, à medida que a
organização cresceu, os processos corporativos tornaram-se ineficazes em incluir a busca
por soluções para problemas nas áreas mais distantes da organização, enquanto a busca
por soluções nas divisões enfrentou crescentes dificuldades ao esbarrar no cumprimento
dos limites impostos pelas políticas corporativas.
Busca sistemática por soluções de problemas
221
No início da General Motors, além da atuação dos gerentes em cada divisão, as
ações na busca por soluções de problemas mais complexos ficavam a cargo de William
Durant. Alguns relatos da época, como os de Lee Dunlap, E. Bergland, Alfred Sloan, e
Walter Chrysler, descrevem a atuação de Durant como sendo de envolvimento superficial
com os problemas, desprovida de registros formais e com decisões fortemente baseadas
em seus instintos. Isto proporcionava soluções pobres em detalhes, por vezes
ocasionando conflitos com outros aspectos da organização, além de não conterem
parâmetros para controlar a implementação ou avaliar o resultado das soluções.
Apesar da forte expansão da GM durante a gestão de Durant, diversas vezes o
envolvimento superficial de Durant nos processos de crescimento, sobretudo nas
aquisições, conduziu a investimentos que resultaram em perdas, como nos casos da
Heany Lamp, Welch, Cartercar, Marquette, Rainier e Samson Sieve Grip. A ausência de
sistemas de controle financeiros básicos expôs a GM a riscos excessivos, sendo que em
duas crises econômicas, 1910 e 1920, a GM teve sua solvência questionada. Em 1910,
quando cobrada pelos credores, a GM foi incapaz de sequer saber o tamanho da dívida e
as datas de vencimento dos compromissos de suas empresas. Em 1920, novamente,
Durant impulsivamente aplicou recursos na compra de ações da GM sem qualquer
registro sistemático dos compromissos a serem saldados, até que, quando cobrado,
percebeu que havia ultrapassado sua capacidade de pagamento.
Outra evidência da baixa capacidade em lidar com a complexidade da GM neste
período inicial foi a exaustão do tempo disponível de William Durant. Logo nos primeiros
anos da GM o dia-a-dia de Durant já era repleto de compromissos, de modo que pouco
tempo era dedicado com exclusividade a cada um deles. Durant fazia amplo uso dos
meios de comunicação para estender o alcance de sua atuação nos diversos pontos onde
seus negócios estavam. No entanto, em determinado momento, o acesso a Durant ficou
tão restrito que os demais executivos passaram a viajar para onde ele estivesse apenas
para colher decisões. Houve casos como o de John Raskob e Walter Chrysler que tiveram
de cruzar o país para encontrar Durant, ficaram o dia todo na sala de espera e depois
foram obrigados a voltar sem conseguir uma reunião.
A limitada capacidade da GM de Durant em lidar com a complexidade fez com que
muitos dos problemas só despertassem esforços para uma busca por solução na medida
em que se tornassem urgências ou ameaças vitais à General Motors. Um dos exemplos
foi o aumento dos estoques em 1920. Na ocasião, seguidos alertas sobre os crescentes
222
níveis de estoque não levaram a ações efetivas no sentido de reduzir o risco a que a
empresa estava se expondo. Já no episódio que ocasionou a saída de Durant da GM,
quando o rombo nas contas do presidente da GM foi descoberto, os rumores do mercado
financeiro já ameaçavam a credibilidade de toda a organização.
A primeira ação significativa no intuito de adotar procedimentos sistematizados na
identificação de problemas foi ainda em 1911, quando a gestão do grupo de credores
assumiu o controle da GM e promoveu a unificação dos procedimentos contábeis entre as
empresas. Em 1918, a associação de Durant com a Du Pont também resultou na
aplicação de recursos orientados a estabelecer novos processos para sistematizar a
busca por soluções, tais como o estabelecimento do comitê de finanças, a contratação de
consultores como E. Bergland, a vinda de John Pratt da Du Pont, além da dedicação
voluntária de Alfred Sloan no desenvolvimento de um estudo que propôs melhorias na
GM. No entanto, as medidas desta época não evoluíram para processos amplamente
estabelecidos na organização. Uma atuação sistemática para melhorar as respostas à
gestão da complexidade só começou mesmo a partir de 1920, quando Pierre S. du Pont
assumiu a presidência da GM.
Ao assumir a presidência da GM, Pierre S. du Pont trouxe Donaldson Brown, da
Du Pont, para conduzir a criação do staff de finanças, uma equipe dedicada a identificar e
a propor soluções para os problemas financeiros que assolavam a GM e as divisões até
então. A organização dos trabalhos foi sob a forma de equipes de força-tarefa, sob a
denominação de comitês, como o de vendas, o de políticas de estoque e o de
investimentos de capital. O resultado, depois de cinco anos de atuação do staff, foi a
criação de diversos processos interligados que sistematizaram a projeção da demanda, o
planejamento das vendas e da produção, a definição dos preços, e o controle sobre a
elaboração e execução dos orçamentos, com sistemas de coleta de dados e revisões
periódicas da realização dos planos. O conjunto de processos implementados por meio
das políticas elaboradas pelo staff financeiro culminaram no standard-volume que, em
1925, sistematizou um método de coleta de dados, análise e tomada de decisão,
buscando converter o impacto das decisões sobre as atividades das divisões em
indicadores financeiros.
Além da aplicação de recursos na formação do staff de finanças, a GM investiu em
algo semelhante para os problemas de operações. Porém, inicialmente o CE de Pierre S.
du Pont contratou o serviço de empresas de consultoria e constituiu equipes que
223
realizaram estudos para identificar o posicionamento adequado dos carros das divisões
da GM, face à ameaça do Ford Modelo T. O resultado foi a formulação de uma política de
produtos que segmentava a atuação das divisões de acordo com o preço e o nível dos
atributos dos veículos.
Na segunda metade da década de 1920, a GM, sob o comando de Alfred Sloan,
iniciou a formação de um staff de operações. Em um primeiro momento, os grupos de
políticas foram compostos por membros das divisões. Sloan também estabeleceu um
comitê de operações, formado pelos gerentes das divisões, que teria o papel de orientar
os trabalhos de busca por solução. A atuação dos comitês e grupos de políticas ligados à
área de operações promoveram a organização de esforços para a busca por soluções,
primeiramente, com o mero intercâmbio de melhores práticas em seminários e
workshops, depois, ampliando para a formação de equipes de força-tarefa para
desenvolvimento de soluções específicas, como novas transmissões, sistema de freios e
motores.
Ao longo da década de 1930, sobretudo após os anos de depressão econômica, a
GM estabeleceu de forma mais ampla e sistematizada os processos de busca por
soluções para os problemas. Os grupos de políticas de operações, até então compostos
por membros das divisões, passaram a ser formados por equipes de staff. Entre 1934 e
1937, nove grupos de políticas foram criados, um para cada tema relacionado à atividade
das divisões automotivas e um para cada divisão não automotiva. Uma hierarquia de
comitês também estabeleceu uma forma sistemática de formulação e aprovação de
políticas corporativas. Essa configuração da organização corporativa permitiu que a GM
lidasse com problemas complexos que envolviam diferentes implicações para cada
divisão. O principal exemplo de solução providenciada por este sistema de gestão por
políticas foi a elaboração de um processo sistematizado para lidar com o problema da
renovação anual de toda a linha de produtos das divisões de veículos.
A forma desenvolvida pela GM para lidar com a complexidade de certas situações
foi replicada ao lidar com outros problemas conforme eles emergiam. Por exemplo, a GM
estabeleceu um sistema de hierarquia de comitês para solução de conflitos trabalhistas.
Algo semelhante foi criado para lidar com o relacionamento com a rede de
concessionárias. Em 1945, a GM criou um grupo de staff de engenharia de manufatura
para lidar com o aumento da complexidade dos problemas nas linhas de montagem. O
224
trabalho da equipe de staff levou ao início do uso de computadores para controlar as
atividades de produção.
Apesar de a gestão por políticas ter conferido a GM um aumento da capacidade
em lidar com problemas mais complexos, o sistema desenvolvido pela organização deu
sinais de suas limitações já no final dos anos 1930. À época, o comitê executivo teve de
ser reformulado, pois a participação de membros externos à GM restringia a agenda de
reuniões, que precisaram se tornar mais frequentes. Somou-se também o fato de a cada
vez maior especificidade dos assuntos tornar improdutiva a participação de pessoas de
fora da organização.
Na década de 1950, a gestão de Harlom Curtice apresentou evidências que
sugerem a dificuldade do sistema de gestão por políticas em avançar no entendimento
dos problemas das divisões. Curtice reduziu o papel do comitê executivo, colocando as
equipes de staff subordinadas a si e estabelecendo uma comunicação direta com os
gerentes das divisões. Estas ações refletem a preocupação de Curtice, um executivo com
carreira nas divisões e que antes de ser presidente havia chefiado as equipes de staff, em
acelerar o processo de formulação e aprovação de políticas, o qual foi se tornando lento
com o aumento da complexidade dos problemas.
John Delorean, que teve atuação destacada na GM entre 1956 a 1973, também
apontou evidências do esgotamento da capacidade do sistema de gestão por políticas em
lidar com a complexidade. Por exemplo, os diagnósticos elaborados pelas equipes de
staff, quando uma divisão apresentava um problema, não eram capazes de ir além da
mera descrição dos problemas e de seus efeitos, traduzindo tudo em indicadores. Por
outro lado, as divisões, quando eram convidadas a fazer apresentações nos comitês
corporativos, por vezes tinham a sensação de que a linguagem que estavam falando não
estava sendo compreendida, devido a especificidade dos assuntos. Delorean afirma que
enquanto foi gerente geral da Chevrolet, encaminhou 18 propostas de soluções para
problemas que ele acreditava poderem ser transferidos às demais divisões, no entanto,
quase todas se perderam na morosidade dos comitês e nunca foram adiante.
O mesmo John Delorean, que depois foi nomeado executivo corporativo, descreve
a atividade dos comitês como sendo excessivamente burocrática. Segundo seus relatos,
a quantidade de relatórios e documentos cuja leitura era exigida daqueles executivos,
apenas para que estivessem em condições de acompanhar as discussões, era maior do
que a capacidade deles absorverem a informação.
225
Não há indícios de que a GM tenha alterado ou criado novos processos de busca
por soluções, além da gestão por políticas. Embora existam poucas descrições
detalhadas sobre o funcionamento dos comitês de políticas da organização corporativa a
partir dos anos 1970, o histórico nos anos subsequentes não revela um aumento da
capacidade de lidar com problemas mais complexos.
Na década de 1980, a GM reforçou a busca por soluções usando equipes de
força-tarefa formadas por membros não envolvidos com a operação. A consultoria
McKinsey foi contratada para desenvolver um trabalho junto com uma equipe interna
nomeada para restruturar as divisões. A EDS foi adquirida para absorver as áreas de
processamento de dados da GM e ter a incumbência de solucionar os problemas
relacionados ao tema. Uma equipe dedicada foi nomeada para atuar exclusivamente no
desenvolvimento de uma nova empresa com um produto novo, a Saturn. Além disso,
outras aquisições e alianças foram estabelecidas para desenvolver externamente
soluções para os problemas internos.
As últimas evidências sobre as dificuldades na busca sistemática por solução de
problemas referem-se aos anos 1990 e início dos anos 2000, quando a GM passou a
gradualmente se desfazer de partes da sua operação, terceirizando a responsabilidade
para a solução dos problemas aos fornecedores. Além da venda de divisões não ligadas
estritamente a automóveis, como EDS, Huges Aircraft e GMAC, a GM constituiu e se
desfez da Delphi, que contemplou as divisões de autopeças, e por fim passou a terceirizar
partes inteiras das operações de montagem a partir de 1998.
4.3.
Síntese das Respostas aos desafios
A análise das respostas da GM para cada um dos cinco desafios ao crescimento
de Fleck (2009), apresentados nas seções anteriores, revela que em um deles, o da
Gestão da Complexidade, houve uma mudança significativa no padrão das respostas
entre o período sob o comando de William Durant e as gestões subsequentes à de Pierre
S. du Pont. Segundo Fleck (2009), a gestão da complexidade afeta a qualidade das
respostas aos demais desafios, de modo que o desenvolvimento de capacitações de
busca sistemática para solução de problemas é uma condição necessária para que a
organização possa promover o crescimento e a renovação, enquanto mantém a
integridade. O caso da General Motors confirmou a existência de forte relação entre os
226
processos de busca por soluções de problemas que emergiram a partir de 1920 com a
sistematização de procedimentos para responder aos demais desafios.
A mudança na gestão da complexidade da GM sugere a existência de dois
períodos distintos na trajetória da organização. O primeiro é relacionado à intensa
atuação de William Durant, que, no papel de empreendedor, concentra não só os serviços
empreendedores (PENROSE,1959), mas parte significativa das ações para responder aos
demais desafios. No segundo período, a influência da Du Pont, sobretudo nas gestões de
Pierre S. du Pont e Alfred Sloan, institucionaliza o sistema de gestão por políticas, que
criou estruturas e processos corporativos envolvendo comitês e equipes de staff. O
quadro 4-6 a seguir apresenta um resumo das respostas em duas fases, a primeira
chamada de “Líder Empreendedor” e a segunda de “Gestão por Políticas”.
Na figura abaixo, as setas indicativas que partem da caixa que resume a gestão da
complexidade, na fase de Gestão por Políticas, indicam as principais influências da
mudança nas respostas para lidar com a complexidade, sobre as respostas dos demais
desafios. Por exemplo, o procedimento estabelecido por equipes de staff e comitês,
denominado standard-volume, em 1925, definia um meta ambiciosa de retorno sobre
investimento de 20%, substituindo e sistematizando a alta ambição nos investimentos
espontaneamente promovida por William Durant. O mesmo pode ser dito sobre sistema
de bônus de executivos em relação aos gestores acionistas da fase do Líder
Empreendedor. Em outros casos, processos foram criados para solucionar problemas
antes não observados, como o compartilhamento de recursos ou os planos de sucessão
do CEO.
227
Quadro 4-6 Síntese das respostas da GM aos desafios em duas fases distintas
Desafio
Fase
Líder Empreendedor
(Entre 1908 a 1920)
Gestão por Políticas
(Entre 1920 a 2008)
Ambição: Alta
• Forte ambição promovida por Durant
• Gestores acionistas
Versatilidade: Visão alta e imaginação dispersa
• Visão sobre a criação de valor de Durant
• Imaginação emergente nas divisões
Mobilização de recursos financeiros: Alta
• Reaplicação do caixa da operação
• Habilidade de Durant para captar recursos
Julgamento: Limitado
• Esforço pessoal porém disperso de Durant para coletar e avaliar
informações
Motivações para o crescimento: Positivas /Híbridas
• Expansões positivas vertical, horizontal, inercial e diversificação.
• Reaplicação dos recursos para gerar crescimento
Ambição: Alta
• Meta ambiciosa de 20% de retorno de longo prazo
• Programas de Bônus para executivos
Versatilidade: Visão alta e imaginação dispersa/reprimida
• Programas e equipes dedicados a vislumbrar a criação de valor
• Imaginação emergente nas divisões, gradualmente reprimida por políticas
corporativas
Mobilização de recursos financeiros: Alta
• Gestão eficiente para geração e re-investimento de caixa
• Alta reputação e credibilidade no mercado financeiro
Julgamento: Alto
• Equipes e comitês e métodos dedicados à coleta de informação, análise e
julgamento de riscos e incertezas
Motivações para o crescimento: Positivas /Híbridas
• Expansões positivas vertical, horizontal, inercial e diversificação.
• Reaplicação dos recursos para gerar crescimento
Monitoramento do ambiente: Ativo/centralizado
• Intenso desenvolvimento e exploração da rede de relacionamentos de
Durant para obter informações
Uso das respostas estratégicas: Ativo/ Defensivo
• Uso ativo de respostas estratégicas, lideradas por Durant
• Aplicação de recursos excedentes para defender-se contra pressões do
ambiente
Monitoramento do ambiente: Ativo
• Equipes de staff dedicadas e especializadas no freqüente monitoramento
do ambiente
Uso das respostas estratégicas: Ativo/ Defensivo
• Uso ativo de respostas estratégicas, definidas por comitês de política
• Aplicação de recursos excedentes para defender-se contra pressões do
ambiente
Compartilhamento e intercâmbio de recursos: Limitado
• Compartilhamento limitado , porém recursos valiosos
•Capacitações de coordenação: Baixa cooperação/Decisões arbitradas
• Unidades de negócios autônomas e concorrentes
• Acomodação de conflitos , Decisões arbitrárias de Durant
Compartilhamento e intercâmbio de recursos: Alto
• Equipes de staff e processos dedicados a identificação e implementação
de relações de compartilhamento e intercâmbio
Capacitações de coordenação: Baixa cooperação/Decisões arbitradas
• Unidades de negócios autônomas e concorrentes
• Hierarquia de comitês para acomodar e/ou arbitrar conflitos
Aprovisionamento
de RH
Fornecimento de Recursos Gerenciais: Antecipado/ não programado
• Recrutamento preventivo de Durant
• Retenção baseada em incentivos financeiros
• Sucessão não programados
• Desenvolvimento de habilidades gerenciais no exercício da função
Fornecimento de Recursos Gerenciais: Antecipado, programado
• Formação sistemática de gerentes nas carreiras de finanças e operações
• Programas de promoção e remuneração
• Desenvolvimento e sucessão baseado na evolução na escada hierárquica
• Desenvolvimento de habilidades gerenciais no exercício da função
Gestão da
complexidade
Busca de soluções de problemas: Superficial
• Ausência de procedimentos sistemáticos de informações, análise, decisão
e implementação
• Busca superficial e soluções improvisadas por Durant
Empreendedorismo
Navegação no
ambiente dinâmico
Gestão da
diversidade
228
Busca de soluções de problemas: Sistemática/segregada
• Equipes de staff, isentas das funções de operações, dedicadas a desenvolver
processos de busca de soluções para os problemas
• Soluções por meio da formulação e aprovação de políticas corporativas
As respostas ao desafio da gestão da complexidade da GM levaram a organização
a mover-se de um padrão de busca por solução de problemas – que era superficial,
improvisado e centralizado em William Durant, na fase de Líder Empreendedor – para
outro, no qual a busca passou a ocorrer em processos formais de coleta de informações,
análise, formulação de soluções e implementação, tendo como agentes principais equipes
de staff e comitês corporativos. A mudança ocorreu após a GM ter passado por um
processo crônico de incapacidade em lidar com a complexidade nos últimos anos da fase
do Líder Empreendedor, culminando, em 1920, com uma forte crise na coordenação dos
gastos e investimentos nas divisões. Este processo evidencia que a GM, em relação à
gestão da complexidade, desenvolveu capacitações que a permitiram movimentar-se na
direção do polo da auto-perpetuação (FLECK, 2009), afastando-se da auto-destruição.
Com relação aos demais desafios, apesar de as mudanças terem produzido
efeitos sobre a qualidade das respostas, não há evidências de que tenha havido
alterações significativas em termos de infusão de novos valores, movimentando o padrão
das respostas na direção de um ou outro polo. Ao longo das duas fases identificadas, o
padrão das respostas ao empreendedorismo, à navegação no ambiente dinâmico, à
gestão da diversidade e ao aprovisionamento de recursos humanos oscilou ao longo do
contínuo, dentro de uma mesma faixa ao longo da história da General Motors.
A figura 4-3 abaixo ilustra a trajetória das respostas da GM a cada desafio ao
longo do contínuo entre os polos da auto-perpetuação e da auto-destruição. As evidências
encontradas indicam que as respostas da GM ao desafio do empreendedorismo,
considerando as fases de Líder empreendedor e de Gestão por Políticas, oscilaram em
uma região do contínuo mais próxima do polo da auto-perpetuação, mantendo alta
ambição e capacidade de mobilizar recursos financeiros, melhorando a capacidade de
julgamento e visão da primeira para a segunda fase, porém reprimindo serviços de
imaginação de oportunidades produtivas (PENROSE, 2006) nas unidades de negócio por
meio de políticas corporativas.
No caso dos desafios da navegação no ambiente dinâmico e do aprovisionamento
de recursos humanos, a melhora na gestão da complexidade contribuiu significativamente
para a sistematização de procedimentos. Porém, os processos iniciados a partir de tal
influência promoveram a formalização e a continuidade do caráter em relação ao desafio
de uma fase para outra. Por exemplo, na navegação do ambiente, Durant optou por
aplicar recursos em excesso para neutralizar fontes de pressão externa, como a oscilação
229
no fluxo de insumos e inovações tecnológicas. Na fase seguinte, o padrão se manteve,
porém voltado para novas fontes de pressão, como o caso das questões trabalhistas. Da
mesma forma, na fase do Líder Empreendedor, Durant já adotava a prática de antecipar
as necessidades de recursos gerenciais, contratando pessoas e comprando empresas
para absorver gerentes talentosos. Na fase de Gestão por Políticas, este caráter se
manteve, porém formalizado em programas mais eficientes de formação de gerentes.
Figura 4-3 Trajetória das respostas aos desafios do crescimento, no continuum
entre auto-destruição e auto-perpetuação.
Pólos das respostas aos Desafios
Auto-destruição
Empreendedorismo
Navegação no
ambiente dinâmico
Gestão da
diversidade
Aprovisionamento
de RH
Gestão da
Complexidade
Auto-perpetuação
Baixo
Baixos níveis de ambição,
versatilidade, imaginação,
visão capacidade de
levantar recursos
financeiros, e realização
de expansões defensivas
ou nulas
Alta ambição, visão e
mobilização de recursos,
imaginação dispersa e
julgamento fraco
Alta ambição, visão,
mobilização de recursos,
julgamento e imaginação
dispersa e reprimida
Monitoramento
ativo e
navegação ativa
e defensiva
Passivo
Monitoramento ruim, mal
uso de estratégias de
navegação
Fragmentação
Fracasso no
estabelecimento de
relacionamentos de
integração e de
capacitações de
coordenação
Monitoramento
ativo e navegação
ativa e defensiva
Relações de
Integração
limitadas e baixa
coordenação
Ad-hoc
Baixa capacitação para
solução de problemas
utilizando rápida análise
sem aprendizado
Recrutamento
antecipado,
porém não
programado
Fase do líder
empreendedor
Aprovisionamento
antecipado e
programado
Capacitações
para solução
de problemas
incipiente
Busca de soluções
sistemática, porém
segregada
Fase de gestão
por políticas
Ativo
Monitoramento regular,
uso correto de estratégias
de navegação
Integração
Estabelecimento bem
sucedido de
relacionamentos de
integração e capacitações
de coordenação
Relações de
integração altas e
baixa coordenação
Tarde
Ações no momento que
existe necessidade ou
depois dela
Alto
Altos níveis de ambição,
versatilidade, imaginação,
visão, capacidade de
levantar recursos
financeiros, e realização
de expansões produtivas
ou híbridas
Planejado
Ações planejadas com
antecedência
Sistemático
Capacitação para solução
de problemas,
promovendo busca
correta por soluções e
aprendizado
Oscilação das ações em torno de
padrões (sem resultar em movimento na
direção de um dos pólos)
230
Ao longo da trajetória da General Motors os indícios são de que em três dos cinco
desafios o padrão das respostas oscilou em uma faixa mais próxima da auto-perpetuação
do que da auto-destruição, mesmo que em algum aspecto dos desafios a resposta não
tenha sido adequada. Tal observação se alinha à teoria de Fleck (2009), na medida em
que ela define o polo da auto-perpetuação como um estado ideal. Durante a fase do Líder
Empreendedor, em dois dos desafios, o da gestão da diversidade e o da gestão da
complexidade, a General Motors apresentou padrões mais próximos da auto-destruição
do que da auto-perpetuação. Conforme exposto anteriormente, a mudança nas respostas
à gestão da complexidade significaram uma reorientação dos padrões deste desafio na
direção da auto-perpetuação, mas as respostas da GM à gestão da diversidade não foram
capazes de estabelecer capacitações de coordenação e mantiveram, portanto, uma
propensão à auto-destruição estável ao longo história.
Apesar de durante a fase de Gestão por Políticas a General Motors ter
desenvolvido diversos relacionamentos de compartilhamento e intercâmbio de recursos
entre suas unidades de negócio, estes processos não foram acompanhados por
capacitações que promovessem a cooperação e a inovação entre as partes da
organização. Diferentemente do que a teoria de Fleck (2009) estabelece como condição
necessária, a GM procurou constantemente acomodar diferenças e conflitos entre as
partes, por exemplo, arbitrando a aplicação de recursos em excesso, como em casos
onde duas divisões produziram e comercializaram praticamente o mesmo veículo. Além
disso, a forma como a GM desenvolveu processos para responder a este desafio separou
as atividades de planejamento das de operações, nutrindo a rivalidade entre divisões e
organização corporativa e prejudicando a comunicação entre seus diversos níveis.
A forma como se configuraram as respostas da General Motors na fase de Líder
Empreendedor se mostraram auto-destrutivas, pois além do baixo vinculo e coordenação
entre as unidades de negócio, não havia capacitações para lidar com a crescente
complexidade de uma organização e uma indústria em forte expansão. A ausência de
duas condições necessárias ao crescimento contribuiu amplamente para duas crises
graves enfrentadas pela GM nesta fase.
O desenvolvimento de respostas positivas à gestão da complexidade permitiu que
a General Motors produzisse amplo crescimento nas primeiras décadas da fase de
Gestão por Políticas. Diversos fatores contribuíram para que a ausência de capacitações
de coordenação não fosse decisiva e pudesse ser substituída por processos de
231
acomodação e arbitragem de políticas. Um dos fatores identificados foi o forte e
prolongado crescimento da demanda desde os anos 1920 até a década de 1970. Outro
ponto importante foi a relevância de vantagens competitivas associadas à capacidade de
mobilizar recursos financeiros, às economias de escala e à integração da cadeia
produtiva. Além disso, a General Motors contou com a desatenção de sua maior rival
americana, a Ford, que nos anos 1920 ignorou a necessidade de diversificação da linha
de produtos. Com isso, a General Motors foi capaz de elevar sua participação no mercado
para o limite institucionalmente aceito e pode acompanhar a evolução da demanda com
ampla vantagem de escopo e escala sobre seus concorrentes.
Durante a década de 1970, algumas mudanças no ambiente tornaram-se mais
evidentes. A proximidade da saturação do mercado, a competição japonesa no segmento
de compactos e os novos padrões exigidos dos fabricantes, tais como segurança,
economia, emissão de poluentes e qualidade, fizeram com que as pressões do ambiente
institucional e competitivo se tornassem maiores. O declínio da General Motors, no
entanto, só foi reconhecido de forma mais explícita em 1980, quando o primeiro prejuízo
em 60 anos foi anunciado. Apesar da nova crise do petróleo, que fez as vendas caírem de
forma generalizada, o declínio da GM esteve fortemente relacionado ao baixo nível das
respostas ao desafio da gestão da diversidade.
A série de ações para reverter o declínio, levadas adiante nos anos 1980,
apresenta evidências sobre o papel central que o caráter organizacional, em termos da
fraca gestão da diversidade, teve sobre o fracasso da organização. Ao longo da década, o
nível das respostas aos demais desafios manteve-se em níveis razoáveis, ou seja, mais
próximo da auto-perpetuação, dentro de uma faixa na qual já oscilavam. Por exemplo: o
volume de investimentos e o empenho dos executivos indicam o alto nível de ambição e
de capacidade de mobilizar recursos financeiros. A visão e o julgamento, embora a
maioria dos investimentos tenha fracassado, demonstraram estar na direção correta. A
automação, a transferência eletrônica de dados, as técnicas de produção enxuta dentre
outros processos referem-se a visões da GM que vieram a se mostrar viáveis em outros
negócios similares.
Outros desafios também mantiveram um padrão dentro da faixa mais próxima à
auto-perpetuação, durante a tentativa de mudança na década de 1980. Na navegação do
ambiente, a GM influenciou o governo para promover restrições aos importados e
negociar acordo comercial. Além disso, grande expectativa popular foi depositada sobre a
232
GM como representante da competitividade e do orgulho americano. Os contratos
trabalhistas foram revisados para baixo, reduzindo benefícios, consentindo com
demissões
e
com
transferência
de
plantas
para
o
México.
No
desafio
de
aprovisionamento de RH, a GM promoveu revisão do sistema de avaliação, comprou
empresas com gerentes talentosos, como EDS, Huges e Lotus, e reorganizou as divisões,
avaliando previamente o perfil dos gerentes, além de oferecer treinamentos. Quanto à
gestão da complexidade, a GM contratou a consultoria Mckinsey, montou equipes de
força-tarefa para os projetos, adotou organização matricial por produtos, realizou
benchmarking e adquiriu e desenvolveu um sistema avançado para desenvolvimento de
produtos.
Porém, com relação à gestão da diversidade, as capacitações de coordenação
continuaram minando a capacidade de realização da GM. Os projetos aprovados pelo
comitê de administração não foram implementados com sucesso pelas divisões. Os
problemas encontrados na operação não eram facilmente comunicados às equipes de
staff, tampouco aos comitês. Pessoas mudadas de local e de função ao longo da
restruturação viram suas redes de relacionamento desaparecer, e os processos
atrasaram de forma generalizada. E, por fim, mesmo algumas soluções que apresentaram
sucesso, como foi o caso da NUMMI, não houve coordenação para transferi-las a outras
áreas da organização.
Analisando através do arcabouço de declínio nas organizações de Weitzel (1989),
os esforços da General Motors na década de 1980 se assemelharam ao terceiro estágio
de declínio, no qual a organização realiza ações, porém inadequadas. O estágio seguinte,
quando a organização atinge o estado de crise, é análogo à situação enfrentada pela GM
nos anos 1990. Fortes prejuízos, demissão de um presidente, lançamentos fracassados e
a vinda de um presidente externo para o conselho de administração precederam o que
seria o último estágio de declínio, quando a organização é forçada a se dissolver. Neste
caso, a dissolução da GM foi gradual: inicialmente com a venda de operações menos
relacionadas, como EDS e Huges Aircraft, em seguida, de divisões de autopeças por
meio da Delphi; depois, foi a vez da terceirização da produção e, por fim, a venda ou
dissolução de divisões ligadas ao negócio central como a GMAC e Oldsmobile, que
precederam o pedido de concordata.
233
5. Considerações Finais
O trabalho se propôs a analisar o caso da GM a fim de entender como uma
organização bem sucedida se deparou com o declínio e finalmente o fracasso. Para
responder ao questionamento proposto a análise buscou identirficar e comparar os
padrões das respostas da GM em relação aos desafios à longevidade de Fleck (2009). As
evidências coletadas para este estudo de caso permitiram reconstruir o histórico da
organização, confrontando especialmente relatos de biografias, artigos, reportagens e
relatórios corporativos e, desta forma, foi possível identificar elementos relevantes para
uma análise longitudinal, comparando as evidências aos parâmetros fornecidos pelo
referencial teórico.
A GM se desenvolveu na indústria automobilística dos Estados Unidos,
participando desde seus primeiros anos. Protagonizou a disseminação do automóvel na
sociedade, tornando esta uma das principais atividades industriais de seu tempo. O
levantamento de dados permitiu reconstituir a história em ordem cronológica com razoável
precisão sobre a sequência dos acontecimentos, desde anos antes da fundação da
General Motors, em 1908, até o pedido de concordata, em 2009. A partir deste
levantamento foi possível analisar os padrões das respostas da GM e identificar alguns
elementos que contribuíram para que a organização desenvolvesse destacável
crescimento e geração de lucros e, posteriormente, viesse a fracassar.
O estudo concluiu que o declínio e posterior fracasso da General Motors esteve
relacionado principalmente ao não desenvolvimento de capacitações de coordenação
para lidar com a gestão da diversidade da organização. Este padrão de resposta anulou
processos de cooperação entre partes da organização, nutriu a rivalidade e impôs
barreiras à comunicação. No lugar desta coordenação a GM adotou processos de
arbitragem e acomodação das diferenças, recorrendo à aplicação de recursos em
excesso para neutralizar pressões para a fragmentação.
A pesquisa concluiu ainda que, em uma primeira fase da trajetória da GM,
marcada pela atuação de seu líder empreendedor, William Durant, a organização
respondeu negativamente, além da gestão da diversidade, também ao desafio da gestão
da complexidade. A mudança de controle para a influência da Du Pont impulsionou a
institucionalização de processos que alteraram o padrão da gestão da complexidade,
234
adotando a busca sistemática de soluções por meio de equipes de staff especializadas e
a gestão por políticas formuladas em comitês corporativos.
A propensão à auto-destruição desenvolvida a partir das fracas capacitações para
a gestão da diversidade, apesar de estável ao longo de toda trajetória da GM, não
impediu que a organização desenvolvesse negócios a ponto de ter o sucesso de sua
atividade aclamado de maneira generalizada. O resultado da análise aqui apresentada
também concluiu que, por trás do aparente sucesso durante décadas, alguns fatores
contribuíram de forma decisiva para que uma configuração auto-destrutiva como era a da
GM fosse viável. Dentre eles, o forte e duradouro ciclo de crescimento da indústria
automobilística nos Estados Unidos, a relevância de economias de escala e escopo sobre
o ambiente competitivo e a desatenção da principal concorrente Ford formaram um
ambiente piedoso que permitiu que a GM dominasse e defendesse sua participação de
mercado e crescesse de forma a acompanhar a evolução da demanda.
5.1 Considerações sobre o sucesso e o fracasso da General
Motors
A General Motors esteve entre as organizações corporativas mais importantes de
seu tempo, inclusive sendo apontada, em determinadas épocas de sua história, como
detentora de práticas consideradas referência não só para a indústria automobilística,
como também para a gestão de empresas de um modo geral. Por ser uma organização
que encontrou o fracasso, apesar do amplo acesso a recursos para investir e promover a
continuidade das suas atividades, constituiu-se um fenômeno que tem provocado ampla
discussão nos meios acadêmicos, no ambiente de negócios e na mídia em geral.
Portanto, a identificação de elementos que contribuíram para que tal trajetória se
configurasse torna-se altamente relevante.
A análise das respostas aos desafios à longevidade apontou a ausência de
capacitações de coordenação da General Motors como o principal fator de uma gestão da
diversidade orientada à fragmentação e revelou a contribuição decisiva das respostas ao
desafio da gestão da diversidade para o declínio e o fracasso. No caso da General
Motors, a relação entre a gestão da diversidade e o fracasso torna-se mais relevante à
medida que tal característica esteve presente desde o processo de formação da
organização. Tal estabilidade indica que a gestão fragmentadora da diversidade foi um
traço institucionalizado da organização, que apesar de contribuir para o desenvolvimento
235
de uma propensão a auto-destruição, não impediu que a GM desenvolvesse o
crescimento e a criação de valor por várias décadas.
Com relação aos elementos que levaram a General Motors, durante pelo menos
sete décadas, a ser amplamente aceita como organização de sucesso, a análise por meio
da teoria de Fleck (2009) não oferece relações de suficiência entre as respostas aos
desafios e o sucesso, mas de condições necessárias. Ainda assim, os resultados
encontrados na análise revelaram aspectos importantes a esse respeito. Primeiramente,
fatores do ambiente tornaram a atividade na indústria automobilística altamente rentável,
como o prolongado crescimento da demanda. Por outro lado, durante muitas décadas a
GM explorou eficazmente as vantagens de tamanho sobre seus concorrentes, com
economias de escopo e escala em atividades intensas na imobilização de capital, tais
como a construção de fábricas de componentes e veículos, engenharia para renovação
dos modelos, rede de distribuição, e crédito ao consumo.
Cabe destacar, que no início dos anos 1920 a GM era um conglomerado de
diversos fabricantes, sendo boa parte pouco rentáveis, enquanto a Ford dominava o
mercado com seu modelo T. Portanto, o sucesso da GM também contou com a miopia de
sua principal concorrente que resistiu em perceber as exigências da demanda e em
poucos anos deteriorou sua posição de liderança em favor da General Motors. Além
disso, as respostas relativamente positivas em relação aos demais desafios permitiram
que a GM pudesse dispor de grande folga organizacional para aplicar na neutralização
das pressões de fragmentação.
Os elementos encontrados neste estudo em relação aos desafios à longevidade
são relevantes também por apresentar aspectos diferentes do que até então vinha sendo
apresentado na literatura acadêmica e de negócios. As explicações obtidas a partir deste
trabalho se diferenciam, primeiramente, ao apresentar elementos sob uma perspectiva
cronológica que identifica a origem e a evolução dos processos que formam organização.
Em segundo lugar, o uso do arcabouço proposto por Fleck (2009) fornece uma leitura
abrangente e organizada sobre os aspectos que contribuem para a propensão ao sucesso
ou ao fracasso. O resultado das análises revelou formas diferentes para interpretar
algumas das justificativas para o fracasso da GM mais comunmente apresentadas.
Abaixo estão alguns exemplos de afirmações tradicionalmente usadas para explicar o
fracasso da GM, seguidos da perspectiva adicionada por este estudo.
236
•
O fracasso da GM esteve relacionado ao peso dos passivos trabalhistas
como fundos de pensão e de assistência médica – Ao longo da análise, o
excesso de reajustes e benefícios concedidos aos trabalhadores, a partir dos anos
1940, é considerado como uma folga aplicada para dissuadir um conflito, dentro de
uma prática de arbitragem e acomodação de exigências divergentes. Este foi um
padrão de resposta recorrente ao longo da trajetória da GM em relação a desafio
de navegação no ambiente dinâmico. Em nome da manutenção de uma atividade
altamente rentável, a GM passou a conceder recursos em excesso a seus
stakeholders, neste caso, trabalhadores, para que não criassem problemas para a
operação, porém subestimando as implicações destas decisões sobre a eficácia
da organização.
•
O fracasso da GM deveu-se à competição desigual relacionada à mão-deobra mais barata de empresas asiáticas – As diferenças de custo operacional da
GM em relação às concorrentes asiáticas não estavam relacionadas somente ao
custo da mão-de-obra. Mesmo quando a GM teve acesso aos custos laborais
equivalentes, o sistema fragmentado e departamentalizado da General Motors
tornou inviável a adoção de técnicas de coordenação e de busca de solução de
problemas, que passaram a ser decisivos na diferença entre fabricantes. Desta
forma, a diferença salarial se acumulou a outras diferenças de eficácia e eficiência,
para apenas mascarar e retardar a constatação das limitações gerenciais da GM.
•
A GM fracassou por causa da arrogância e menosprezo da General Motors
em relação a exigências como qualidade e demanda por carros compactos e
mais econômicos – A incumbência sobre a versatilidade da GM, desde os anos
1930 e mais intensamente a partir do final dos anos 1950, foi gradualmente
transferida das unidades de negócio para grupos de staff. Tal fragmentação entre
estratégia e implementeação foi a resposta encontrada pela organização para a
necessidade de coordenar a ampla diversidade entre unidades de negócio.
Contudo, teve como conseqüência a repressão das capacitações de inovação da
GM para acompanhar as exigências do mercado. Os novos desenvolvimentos da
GM passaram a seguir tendências já estabelecidas no mercado, usando as
vantagens de tamanho para compensar o atraso em relação aos concorrentes.
•
A GM fracassou, pois foi tomada pela hegemonia de uma elite com uma
mentalidade demasiadamente financeira sobre a gestão – Esta característica é
237
decorrente da separação entre as atividades de estratégia e operação. O perfil
exigido dos membros da organização corporativa, responsáveis pela formulação
de políticas, tornou-se fortemente tecnocrata, uma vez que as decisões passaram
a ser cada vez mais baseadas em conjutos de índices e projeções. A GM até
procurou conciliar perfis de marketing, engenharia e operações nos processos de
definição das políticas corporativas, como no emblemático caso de John Delorean,
no entanto a natureza dos processos decisórios favorecia profissionais que
tivessem maior facilidade em analisar a sobrecarga de relatórios repletos de
números e indicadores. Assim sendo, profissionais de Finanças possuíam uma
maior propensão a se destacar nas esferas mais altas da organização e
consequentemente
serem
favoritos
para
ocupar
as
funções
de
maior
responsabilidade.
5.2 Implicações do caso da GM para outras organizações
Por se tratar de um estudo de caso, os elementos identificados acerca do sucesso
e do fracasso da General Motors dificilmente podem ser diretamente generalizados para a
questão sobre como empresas que atingiram um reconhecido sucesso, eventualmente
enfrentaram o fracasso. Por outro lado, a comparação entre empresas semelhantes a
General Motors, a fim de permitir maior poder de generalização, traria significativas
complicações para o estudo, como encontrar uma amostra representativa de casos
contemporâneos, minimamente homogêneos, e lidar com o volume e a complexidade de
dados para produzir o nível de análise adequado a este modelo teórico.
As contribuições deste estudo para questões genéricas sobre a gestão das
organizações são mais relevantes quando associadas à validação das proposições
sugeridas pelo arcabouço teórico utilizado. Assim sendo, a relação de condição
necessária entre repostas positivas ao desafio da gestão da diversidade e a propensão a
auto-perpetuação, validada para o caso da General Motors, pode ser interessante para
gestores de outras organizações avaliarem como estão respondendo a este desafio.
Além disso, abordando os resultados do estudo para os demais desafios à
longevidade, ao se deparar com a constatação de que a GM alcançou altos níveis de
crescimento e de criação de valor, mesmo nutrindo um traço auto-destrutivo, pessoas
envolvidas com a gestão de organizações virtualmente reconhecidas como de sucesso
238
podem despertar-se para questionar se algo semelhante não está se passando nas
empresas com as quais têm relação.
5.3 Contribuições ao arcabouço teórico
O estudo de caso sobre a General Motors validou a aplicação do modelo teórico
apresentado por Fleck (2009) para a compreensão de como esta importante organização
do setor automobilístico desenvolveu sua trajetória. O trabalho também pode comprovar a
adequada utilização do modelo teórico dos desafios à longevidade associado a uma
estratégia de pesquisa baseada em uma visão de processo (LANGLEY, 1999). A
abordagem histórica com a reconstituição cronológica dos eventos permitiu a identificação
de padrões e a comparação em relação à teoria.
Os resultados encontrados a partir da análise do caso da GM, sob a ótica do
modelo de Fleck, reforçam a capacidade deste referencial teórico em fornecer um
entendimento diferenciado sobre os fatores que contribuem para o sucesso ou o fracasso
de uma organização. As análises baseadas em referenciais teóricos tradicionais tenderam
a concentram-se nos aspectos mais nítidos de desencaixe entre a organização e o
ambiente, e apontam fatores como passivos trabalhistas, arrogância, competição desleal
de concorrentes asiáticos, menosprezo às exigências do mercado e hegemonia da elite
financeira como explicações para o fracasso da General Motors. Já o arcabouço teórico
utilizado neste trabalho mostrou-se capaz de revelar padrões da dinâmica dos processos
organizacionais que induziram a GM em direção ao crescimento ou ao declínio, e que
foram decisivos no desenvolvimento de vulnerabilidades que determinaram fracasso da
organização.
5.4 Sugestões para estudos futuros
A partir do estudo de caso da General Motors, sob o referencial teórico dos
arquétipos do sucesso e do fracasso de Fleck (2009), estabelece-se uma base para
outros estudos que, ao serem confrontados com este, podem responder perguntas
interessantes. Por exemplo, estudos semelhantes tendo como unidade de análise outras
organizações do setor automotivo, como Toyota, Ford, Chrysler, Honda, Hyunday,
Volkswagen ou Renault poderão fornecer explicações relevantes para a compreensão de
questões relativa à origem de diferenciais competitivos entre empresas, mimetismo e
isomorfismo na indústria e processos de coevolução.
239
Por outro lado, outros estudos não necessariamente envolvendo o setor
automobilístico poderiam encontrar neste trabalho uma oportunidade para, a partir da
confrontação das análises, contribuir para a ampliação do entendimento sobre as
organizações. Por exemplo, a comparação do caso da General Motors com outras
empresas que apresentem padrões de fragmentação em relação ao desafio da gestão da
diversidade pode produzir novas constatações teóricas acerca deste desafio, ou mesmo
da relação dele com os demais. De forma análoga, a comparação entre o estudo de caso
na GM com estudos similares em empresas cujos padrões de resposta estejam em
posições opostas em relação à gestão da diversidade pode enriquecer o conhecimento a
respeito deste desafio e sua relação com a auto-perpetuação e a auto-destruição.
Por fim, cabe ressaltar que apesar de o estudo a partir das estratégias de pesquisa
utilizadas ter se verificado possível, as dificuldades em definir e implementar estratégias
para coleta e análise dos dados foram duros obstáculos a serem transpostos. A
quantidade de informações a ser coletada, referentes a um longo período de tempo, cria
problemas como heterogeneidade das fontes em termos de enfoque, viés e rigor,
concentrações variadas de informações em períodos da história, impossibilidade de
confrontar fontes primárias e secundárias, risco de ser influenciado pelo viés da narrativa
e lacunas de informação. Estudos futuros que ofereçam avanços em termos de soluções
para lidar com estes e outros problemas relacionados aos métodos de pesquisa
oferecerão relevante contribuição para a o desenvolvimento do conhecimento.
240
6 Referências
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vol. 20, p. 59-69, 1983.
ANTIQUE AUTOMOBILE CLUB OF AMERICA. Disponível em
www.local.aaca.org/junior/milespots Acesso em 25/01/2008.
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Methodology and New Evidence. The Journal of Political Economy, vol. 97, n. 1, p. 3892, February 1989.
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Framework. Academy of Management Review, vol. 11, n. 4, p. 791-800, 1986.
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7 Apêndice A
7.1 Mapas visuais da trajetória da General Motors
Desafio do Empreendedorismo
As respostas aos desafios do empreendedorismo compreendem quatro dimensões
da análise: ambição, versatilidade, mobilização de recursos financeiros e julgamento. A
evolução dos padrões de ação identificados ao longo da história da GM, apresentados na
Esta análise é feita separadamente entre as dimensões, pois é uma forma de tornar mais
claros os elementos que compõem os serviços empresarias da organização (PENROSE,
2006).
Figura 7-1 Processos encontrados nas ações em resposta ao desafio do
empreendedorismo
Ambição
(1) Gestor principal é também o maior acionista
(2) Consórcio de credores assume o controle da operação
(3) Gerentes eram acionistas das unidades de negócio e da General Motors
(4) Plano de participação nos lucros
(5) Retorno sobre o investimento é a principal meta corporativa
(6) Esforço da Segunda Guerra, margem de lucro fixada em 10%
(7) A meta principal é ampliar a participação nos mercados
250
(8) Plano de compra de ações por executivos-chave da organização
Versatilidade
(9) Willam Durant adquire empresas que identifica como oportunidade
(10) Engenheiros e gerentes incumbidos de implementar idéias de Durant
(11) Desenvolvimento de novos produtos e inovações tecnológicas nas unidades de negócio
(12) Staff de engenheiros, designers e pesquisadores desenvolvendo novas tecnologias e produtos
(13) Subsidiária no exterior com modelos e estrutura local
(14) Aquisição de empresa para lançar inovações tecnológicas desenvolvidas internamente
(15) Importação de modelos de outros fabricantes do exterior para ocupar o mercado de compacto
(16) Aquisição de empresas para incorporar tecnologias ao negócio automotivo
(17) Joint venture com a Toyota para fabricação de compactos nos Estados Unidos
(18) Início de uma nova empresa com equipe autônoma (Saturn)
Mobilização
de recursos
financeiros
(19) Durant usa prestígio, persuasão e recursos próprios para financiar as operações
(20) Reaplicação dos recursos obtidos com a operação
(21) Aquisições de empresas com parte do pagamento em ações da GM
(22) Empréstimo a consórcio de bancos, com cessão do controle da empresa
(23) Redução compulsória dos salários dos gerentes em 50%
(24) Emissão de ações na Bolsa de Nova York
(25) Associação à DuPont e minoritariamente ao JP Morgan
(26) Empréstimos de longo prazo para completar parte do capital usado em planos de expansão
Julgamento
(27) Tino empresarial de William Durant aprova ou reprova os empreendimentos da GM
(28) Um comitê de representantes do consórcio de credores avalia a viabilidade dos projetos
(29) Comitê de finanças avalia necessidades de caixa para determinar necessidade de captação
(30) Comitê de emergencia centraliza a availiação da viabilidade dos projetos
(31) Staff financeiro por meio do CF, avalia as perspectivas de retorno sobre investimento
(32) Staff operacional, geralmente por meio de comites e avalia viabilidade dos projetos
(33) Formação de uma equipe independente, para analisar e deliberar a viabilidade da Saturn
Desafio da Navegação no Ambiente Dinâmico
Os padrões de ação da General Motors em resposta ao desafio da navegação no
ambiente dinâmico são apresentados na figura abaixo. Foram identificados nos fatos
históricos analisados seis dimensões do ambiente externo com as quais a organização
manteve esforços para captura de valor e manutenção da legitimidade. As seis dimensões
são as seguintes:
• Sociedade e economia - trata das ações da GM para monitorar, moldar ou se adaptar
às alterações na atividade econômica e nos hábitos e valores da sociedade.
• Acionista – refere-se a ações da GM para manutenção da reputação e da legitimidade
da gestão perante os detentores de suas ações.
• Relações trabalhistas – ações para assegurar o fluxo de mão-de-obra nas atividades
produtivas.
• Tecnologia – diz respeito a atividades de monitoramento do surgimento de tecnologias,
bem como de ações para moldar ou participar dos ciclos tecnológicos.
251
• Indústria automotiva e concorrentes – ações praticadas pela organização para
monitorar e moldar a evolução da cadeia produtiva e dos concorrentes
• Governo e legislação – monitoramento de leis e de regras governamentais e ações
visando construir oportunidades a partir de medidas do governo e, ao mesmo tempo,
evitar pressões contra a legitimidade.
Figura 7-2 Processos encontrados nas ações em resposta ao desafio da Navegação
no Ambiente
Dinâmico
Sociedade e
Economia
(34) Observação e análise aleatória e esporádica de Durant e outros membros da organização
(35) Informções não sistematizadas passadas por concessionários à organização de vendas
(36) Análise de estatísticas nacionais eo de pesquisas realizadas com vendedores
(37) Coleta de dados sistemática informações sobre demandas e estoques junto à rede de lojas
(38) Exibição de protótipos e observação da reação do público em salões e exposições
(39) Pesquisas de mercado durante o processo de desenvolvimento de novos modelos
Acionistas
(40) Acionista majoritário é também o principal gestor da organização
(41) Grandes acionistas participando no conselho de administração
42) Pagamento de dividendos atraentes e constantes
(43) Controle da empresa entregue a um consórcio de credores
(44) Acionistas representados diretamente no CF
(45) Acionistas representados diretamente em um CE
(46) Acionistas elegem representantes indicados por gestores da empresa em convenção anual
(47) Inclusão de representação direta de um grande acionista fruto da aquisição (Ross Perot)
Relações
trabalhistas
(48) Ações voluntárias da GM em relação a recrutamento, treinamento, divisão do trabalho e
bem-estar dos operários, evitando qualquer tipo de negociação
(49) Contratação de espionagem nas fábricas e prevenção contra organização sindical
(50) Concessões ao sindicato apenas mediante a greve extenuante barganha
252
(51) Adoção de sistema de negociação de remuneração e benefícios
(52) Fuga de sindicatos abrindo novas plantas fora da região de influência
(53) Flexibilização dos contratos negociados com o sindicato
Tecnologia
(54) Observação e busca espontânea de tecnologias emergentes por parte de executivos
(55) Aquisição de empresas detentoras de tecnologias desejadas
(56) Staff de especialistas aplicados no desenvolvimento avançado de tecnologia
(57) Cessão mútua de patentes ligadas ao controle de emissão de poluentes
Indústria
automotiva e
concorrentes
(58) Consolidação por meio de aquisição de concorrentes e fornecedores
(59) Produção verticalmente integrada com prática de cotações de fornecimento comparando
fornecedores internos e externos, com autonomia entre as divisões
(60) Monitoramento de marcas, modelos e preços, posicionando-se no topo de cada segmento
(61) Monitoramento e testes dos veículos dos concorrentes no campo de provas
(62) Joint venture com a Toyota para fabricação de compactos nos Estados Unidos
Governo e
legislação
(63) Monitoramento e cumprimento das exigências legais
(64) Desafio à validade de patente sobre fabricação de veículos automotores
(65) Resistência ao esforço de fornecimento de material militar durante a Primeira Guerra
(66) Monitoramento, evitação e desafio à acusações de trusting entre a Du Pont e GM
(67) Resistência a contestações judiciais sobre práticas de crédito através da GMAC
(68) Cooperação para o fornecimento de materiais militares
(69) Associação para lobby em favor de política pública federal de construção de estradas
(70) Evitação de questionamentos sobre controle de emissão de poluentes
(71) Evitação e dissuasão de aplicação de dispositivos de segurança veicular
Desafio da Gestão da Diversidade
As ações que indicam as respostas da Genaral Motors ao desfio da gestão da
diversidade são divididas em duas dimensões: o compartilhamento de recursos e os
mecanismos de coordenação.
Figura 7-3 Padrões encontrados nas ações em resposta ao desafio da Gestão da
diversidade
253
Relações de
compartilhamento
de recursos
(91) Integração vertical sobre a cadeia de fornecedores
(92) Fusão de unidades com atividades relacionadas
(93) Desinvestimento ou venda de unidades de negócios
(94) Intercâmbio de partes e arquiteturas de veículos entre unidades
(95) Unificação da gestão de caixa das divisões com um controle corporativo
(96) Unificação de carrocerias por tamanho
(97) Novos modelos feitos sobre a base de modelos anteriores
(98) Paralisação anual da linha de montagem para troca de modelos
(99) Comunicação de partes, ferramentas e arquiteturas para aplicação em todas as divisões
(100) Contratos com dispositivos de seleção e proteção dos concessionários
(101) Aumento pré-fixado, benefícios e equiparação à indústria
(102) Fusão das operações de montagem em uma única divisão
(103) Reorganização de seis divisões em CPC e BOC
Coordenação de
recursos
(104) Coordenação centralizada em Durant, tratando diretamente com os chefes de divisões
(105) Comitê representante de credores toma decisões na gestão da empresa
(106) Staff ligado ao comitê executivo aplicado em estudos ad-hoc
(107) Comitê executivo para decisões de operações e de finanças para gestão de tesouraria
(108) Comitê executivo centralizador durante período de grande incerteza
(109) Staff financeiro, com controllers nas divisões exercendo duplo report
(110) Comitê de finanças aprova orçamento corporativo e das divisões
(111) Comitês interdivisão para formulação de políticas consensos
(112) Consenso entre divisões e staff obtido por meio de persuasão e venda de conceitos
(113) CE formado por executivos corporativos e membros do board
(114) CO formado por executivos corporativos para recomendar políticas ao CE
(115) Staff permanente para formulação de estudos e consensos nas áreas operacionais
(116) Conselho de distribuidores para formulação de políticas junto à rede de distribuição
(117) Grupos temáticos de staff subordinados ao CE e dedicados a formulação
(118) Centralização do poder no CEO, com controle sobre CF e CE
(119) Desenvolvimento em equipes de produto
254
Desafio do Aprovisionamento de Recursos Humanos
As respostas ao desafio de aprovisionamento de Recursos Humanos foram
analisadas em três dimensões.
• Seleção e Formação – diz respeito às ações da GM para recrutar, treinar e formar
recursos gerenciais. Está inclusa nesta dimensão ações de identificação de talentos,
promoção e desenvolvimento de carreiras para formação de gerentes.
• Retenção – são ações orientadas para fomentar o compromisso de longo prazo de
gerentes com a organização.
• Sucessão – trata das ações para preparação e escolha dos sucessores nos postos
mais altos de liderança da organização.
Figura 7-4 Processos encontrados nas ações em resposta ao desafio do
Aprovisionamento de Recursos Humanos
Seleção e
Formação
(120) Recrutamento não-sistemático de profissionais
(121) Promoções e rotação entre áreas e divisões mediante avaliação de desempenho pelo superior
(122) Profissionais absorvidos na aquisição de empresas
(123) Recrutamento de contadores e administradores recém formados em boas universidades
(124) Escola corporativa provendo treinamento técnico
(125) Recrutamento de executivos na Du Pont
(126) Promoções dentro da organização de finanças mediante avaliação do superior
(127) Busca de profissionais específicos já estabelecidos no mercado de trabalho
Retenção
(128) Gerentes detentores de ações da General Motors e/ou de empresas absorvidas
255
(129) Plano de bônus
(130) Aumentos de salários em programa de avaliação de desempenho
(131) Programa de compra de ações para altos executivos através da Managers Securities Co.
(132) Extensão dos aumentos negociados pelo sindicato para os demais empregados assalariados
(133) Programa de stock option para altos executivos
(134) Lealdade ao chefe como critério para a promoção dos executivos
Sucessão
(135) Predomínio de Durant nas escolhas de sucessão de executivos
(136) Consóricio de credores determina sucessão de gerentes
(137) Escolha de sucessores de forma ad-hoc, com o crivo do board para os casos de executivos
corporativos
(138) Pool de executivos seniors atuando na formulação e aprovação de estratégias corporativas
(139) Executivo indica o próprio sucessor
(140) Sucessão do CEO planejada com antecedência
(141) Estabelecimento de idade para aposentadoria compulsória
(142) Predominância do executivo de finanças para as funções de CEO e Chairman
.
Desafio da Gestão da Complexidade
Os padrões de ação encontrados nas respostas da GM ao desafio da gestão da
complexidade são apresentados em duas dimensões. A primeira dimensão é a orientação
para solução de problemas, relacionada às ações, métodos e procedimentos que a
organização regularmente utiliza para resolver seus problemas. A segunda dimensão de
análise é a sistematização de procedimentos. Neste caso, procurou-se identificar padrões
na adoção de procedimentos sistemáticos para lidar com situações de alta complexidade.
Figura 7-5 Processos encontrados nas ações em resposta ao desafio da Gestão da
Complexidade
Orientação para
solução de
(143) Durant se envolve diretamente na busca de soluções para problemas
256
problemas
Sistematização
de procedimentos
(144) Autonomia para as divisões resolverem seus problemas de forma independente
(145) Aquisição de empresa para absorver capacitações e tecnologias
(146) Comitê de credores analisa e delibera soluções
(147) Staff corporativo de pesquisa avançada
(148) Força-tarefa para estudo e busca de solução
(149) Staff consultivo monitorando a operação e propondo soluções por meio de novas políticas
(150) Intervenção corporativa nas unidades de negócio
(151) Sistema de produção por oficinas de trabalho aplicadas na linha de montagem
(152) Sistematização das demonstrações financeiras das unidades de negócio e do consolidado
(153) Sistema de controle financeiro a partir do método standard volume
(154) Harmonização de práticas e parâmetros por meio de comitês temáticos interdivisionais
(155) Avaliação de potencial geográfico para determinar a alocação de concessionárias
(156) Sistema de gestão por políticas com hierarquia para formulação e aprovação
(157) Sistema de conselho de distribuidores para mediar políticas de vendas
(158) Sistema de contratação interna com margem fixa durante a Segunda Guerra
(159) Sistema de comitês de fábrica e e negociação com o sindicato
(160) Informatização do processo produtivo
(161) Integração dos sistemas de produção, suprimentos, vendas e distribuição
(162) Automação do processo produtivo aplicando intenso uso de robôs integrados
(163) Adoção fragmentada de técnicas japonesas de melhoria contínua
257
8 ANEXOS
Tabela 8-1 Receita Líquida, Lucro e Ativo Total da General Motors entre 1917 e 2008
Ano
1917
1918
1919
1920
1921
1922
1923
1924
1925
1926
1927
1928
1929
1930
1931
1932
1933
1934
1935
1936
1937
1938
1939
1940
1941
1942
1943
1944
1945
1946
1947
1948
1949
1950
1951
1952
1953
1954
1955
1956
1957
Receita Líquida
96.295.741
269.796.829
509.676.694
567.320.603
304.487.243
463.706.733
698.038.947
568.007.459
734.592.592
1.058.153.338
1.269.519.673
1.459.762.906
1.504.404.472
983.375.137
808.840.723
432.311.868
569.010.542
862.672.670
1.155.641.511
1.439.289.940
1.606.789.841
1.066.973.000
1.376.828.337
1.794.936.642
2.436.800.977
2.250.548.859
3.796.115.800
4.262.249.472
3.127.934.888
1.962.502.289
3.815.159.163
4.701.770.340
5.700.835.141
7.531.086.846
7.465.554.851
7.549.154.419
10.027.985.482
9.823.526.291
12.443.277.420
10.796.442.575
10.989.813.178
Lucro Líquido
14.294.000
14.826.000
60.005.000
37.750.000
(38.681.000)
54.474.000
72.009.000
51.632.000
116.016.000
186.231.000
235.105.000
276.468.000
248.282.000
151.099.000
96.877.000
165.000
83.214.000
94.769.000
167.227.000
238.482.000
196.437.000
102.190.000
183.290.000
195.622.000
201.653.000
163.652.000
149.780.000
170.996.000
188.268.000
87.526.000
287.991.000
440.448.000
656.434.000
834.044.000
506.199.000
558.721.000
598.119.000
805.974.000
1.189.477.000
847.396.000
843.592.000
258
Ativo Total
133.789.724
299.489.336
446.652.520
604.806.868
515.122.979
522.335.034
593.123.718
592.570.918
703.786.664
920.894.106
1.098.477.575
1.242.894.869
1.324.889.764
1.315.813.059
1.300.267.222
1.115.228.641
1.183.674.006
1.268.532.026
1.414.266.298
1.518.188.800
1.566.673.796
1.598.012.229
1.323.382.388
1.535.916.531
1.747.250.191
1.979.771.117
2.264.718.441
2.182.609.504
1.813.885.559
1.982.692.134
2.472.969.238
2.957.769.607
2.824.074.217
3.444.195.961
3.671.582.575
4.001.294.708
4.405.475.042
5.130.093.595
6.344.772.161
6.569.400.736
6.825.788.811
1958
1959
1960
1961
1962
1963
1964
1965
1966
1967
1968
1969
1970
1971
1972
1973
1974
1975
1976
1977
1978
1979
1980
1981
1982
1983
1984
1985
1986
1987
1988
1989
1990
1991
1992
1993
1994
1995
1996
1997
1998
1999
2000
2001
2002
2003
2004
9.521.956.629
11.233.057.200
12.735.999.681
11.395.916.826
14.640.240.799
16.494.818.184
16.997.044.486
20.733.982.295
20.208.505.041
20.026.252.468
22.755.403.000
24.295.141.000
18.752.354.000
28.263.918.000
30.435.231.000
35.798.289.000
31.549.546.000
35.724.911.000
47.181.000.000
54.961.300.000
63.221.100.000
66.311.200.000
57.728.500.000
62.689.500.000
60.025.600.000
74.581.602.000
83.889.900.000
96.371.700.000
102.813.700.000
101.781.900.000
110.228.500.000
112.533.200.000
110.797.300.000
123.109.000.000
132.243.000.000
138.219.500.000
154.951.200.000
160.254.000.000
164.013.000.000
178.174.000.000
161.315.000.000
189.058.000.000
184.632.000.000
177.260.000.000
186.736.000.000
195.645.200.000
193.517.000.000
633.628.000
873.100.000
959.042.000
892.821.000
1.459.077.000
1.591.823.000
1.734.782.000
2.125.606.000
1.793.392.000
1.627.276.000
1.731.915.000
1.710.695.000
609.087.000
1.935.709.000
2.162.807.000
2.398.103.000
950.069.000
1.253.092.000
2.902.800.000
3.337.500.000
3.508.000.000
2.892.700.000
(762.500.000)
333.400.000
962.700.000
3.730.194.000
4.516.500.000
3.999.000.000
2.944.700.000
3.550.900.000
4.856.300.000
4.224.300.000
(1.985.700.000)
(4.453.000.000)
(23.498.000.000)
2.465.800.000
4.900.600.000
6.881.000.000
493.000.000
6.698.000.000
2.956.000.000
6.002.000.000
4.452.000.000
601.000.000
1.736.000.000
3.822.000.000
2.805.000.000
259
6.890.854.380
7.246.408.027
7.837.665.995
8.272.596.180
9.169.053.616
9.641.165.359
10.292.828.528
11.478.546.590
12.213.487.799
13.273.082.524
14.010.175.142
14.820.094.529
14.174.359.767
18.241.900.040
18.273.382.035
20.296.861.419
19.873.550.014
21.664.884.594
24.442.400.000
26.658.300.000
30.598.300.000
32.215.800.000
34.581.000.000
38.991.200.000
41.397.800.000
45.694.500.000
52.144.900.000
63.832.800.000
72.593.000.000
162.343.200.000
164.063.100.000
173.297.100.000
180.236.500.000
184.325.500.000
190.196.000.000
188.200.900.000
198.599.000.000
213.663.000.000
222.142.000.000
228.888.000.000
257.389.000.000
274.730.000.000
303.100.000.000
323.969.000.000
369.053.000.000
448.507.000.000
479.921.000.000
2005
192.604.000.000 (10.600.000.000) 476.078.000.000
2006
204.467.000.000
(1.978.000.000) 186.304.000.000
2007
179.984.000.000 (38.732.000.000) 148.883.000.000
2008
148.979.000.000 (30.860.000.000) 91.047.000.000
Fonte: Relatório Moody’s de 1917 à 1998; Relatório anual da General Motors
Tabela 8-2 Produto nacional bruto do Estados Unidos entre 1917 e 2009
Ano
1917
1918
1919
1920
1921
1922
1923
1924
1925
1926
1927
1928
1929
1930
1931
1932
1933
1934
1935
1936
1937
1938
1939
1940
1941
1942
1943
1944
1945
1946
1947
1948
1949
1950
1951
1952
1953
1954
1955
Produto Nacional
Bruto
60.400.000.000
76.400.000.000
84.000.000.000
91.500.000.000
69.500.000.000
74.100.000.000
85.100.000.000
84.700.000.000
93.100.000.000
97.000.000.000
94.900.000.000
97.000.000.000
104.400.000.000
91.900.000.000
77.000.000.000
59.100.000.000
56.700.000.000
66.300.000.000
73.600.000.000
84.000.000.000
92.200.000.000
86.500.000.000
92.500.000.000
101.700.000.000
127.200.000.000
162.300.000.000
198.900.000.000
220.100.000.000
223.400.000.000
222.900.000.000
245.300.000.000
270.600.000.000
268.600.000.000
295.200.000.000
341.200.000.000
360.300.000.000
381.300.000.000
382.500.000.000
417.200.000.000
260
1956
1957
1958
1959
1960
1961
1962
1963
1964
1965
1966
1967
1968
1969
1970
1971
1972
1973
1974
1975
1976
1977
1978
1979
1980
1981
1982
1983
1984
1985
1986
1987
1988
1989
1990
1991
1992
1993
1994
1995
1996
1997
1998
1999
2000
2001
2002
440.300.000.000
464.100.000.000
469.800.000.000
509.300.000.000
529.500.000.000
548.200.000.000
589.700.000.000
622.200.000.000
668.500.000.000
724.400.000.000
792.900.000.000
838.000.000.000
916.100.000.000
990.700.000.000
1.044.900.000.000
1.134.700.000.000
1.246.800.000.000
1.395.300.000.000
1.515.500.000.000
1.651.300.000.000
1.842.100.000.000
2.051.200.000.000
2.316.300.000.000
2.595.300.000.000
2.823.700.000.000
3.161.400.000.000
3.291.500.000.000
3.573.800.000.000
3.969.500.000.000
4.246.800.000.000
4.480.600.000.000
4.757.400.000.000
5.127.400.000.000
5.510.600.000.000
5.837.900.000.000
6.026.300.000.000
6.367.400.000.000
6.689.300.000.000
7.098.400.000.000
7.433.400.000.000
7.851.900.000.000
8.337.300.000.000
8.768.300.000.000
9.302.200.000.000
9.855.900.000.000
10.171.600.000.000
10.500.200.000.000
261
2003
11.017.600.000.000
2004
11.762.100.000.000
2005
12.502.400.000.000
2006
13.252.700.000.000
2007
13.910.000.000.000
2008
14.397.800.000.000
Fonte: Balke & Gordon (1989) até 1928; Buerau of Economic Analisys de 1929 em diante
Tabela 8-3 Vendas de veículos nos Estados Unidos entre 1900 e 2008
Ano
Vendas
Automóveis Caminhões e
General
Totais de
utilitários
Motors
veículos
1900
4192
4192
0
1901
7000
7000
0
1902
9000
9000
0
1903*
11235
11235
16
1904*
22830
22130
700
37
1905*
25000
24250
750
750
1906*
34000
33200
800
2295
1907*
44000
43000
1000
4641
1908
65000
63500
1500
9875
1909
127287
123990
3297
30084
1910
187000
181000
6000
44564
1911
210000
199319
10681
35459
1912
378000
356000
22000
41358
1913
485000
461500
23500
56118
1914
572139
548139
24000
58987
1915
969930
895930
74000
97937
1916
1617708
1525578
92130
176834
1917
1873949
1745792
128157
195945
1918
1170686
943436
227250
213334
1919
1876356
1651625
224731
344334
1920
2227349
1905560
321789
362448
1921
1616119
1468067
148052
208306
1922
2544176
2274185
269991
419682
1923
4034012
3624717
409295
754810
1924
3602540
3185881
416659
533833
1925
4265830
3735171
530659
790880
1926
4301234
3692617
608617
1179214
1927
3401326
2936533
464793
1472494
1928
4358759
3775417
583342
1790736
1929
5337087
4455178
881909
1799427
262
1930
1931
1932
1933
1934
1935
1936
1937
1938
1939
1940
1941
1942
1943
1944
1945
1946
1947
1948
1949
1950
1951
1952
1953
1954
1955
1956
1957
1958
1959
1960
1961
1962
1963
1964
1965
1966
1967
1968
1969
1970
3362820
2380426
1331860
1896817
2737070
3971241
4461462
4820219
2508407
3588889
4472286
4840502
1041524
699828
738134
725215
3089565
4797621
5285544
6253651
8003056
6765263
5538959
7323014
6601071
9169276
6920590
7220520
2787456
1948164
1103557
1567599
2160865
3273874
3679242
3929203
2019566
2888512
3717385
3779682
222862
139
610
69532
2148699
3558178
3909270
5119466
6665863
5338435
4320794
6116948
5558897
7920186
5816109
6113344
575364
432262
228303
329218
576205
697367
782220
891016
488841
700377
754901
1060820
818662
699689
737524
655683
940866
1239443
1376274
1134185
1337193
1426828
1218165
1206066
1042174
1249090
1104481
1107176
10148400
8402600
1745800
263
1105773
997594
506928
779029
1086321
1504698
1803275
1846621
1052873
1487375
1950142
2149804
217804
91109
224227
229929
1123451
1845885
2051742
2672894
3653358
2829490
2234397
3276586
3295956
4476672
3507741
3237178
2526245
2960017
3681377
3150312
4222823
4661690
4597990
5696480
5195384
4789644
5410320
5295652
3591064
1971
1972
1973
1974
1975
1976
1977
1978
1979
1980
1981
1982
1983
1984
1985
1986
1987
1988
1989
1990
1991
1992
1993
1994
1995
1996
1997
1998
1999
2000
2001
2002
2003
2004
2005
2006
2007
2008
12259700
13433200
14355200
11377700
10888700
13294500
14859000
15420800
14148500
11469200
10789900
10542200
12295900
14483300
15720100
16317800
15156500
15773600
14826100
14127800
12519600
13092300
14165900
15377500
15077800
15404400
15445600
15863600
17290200
17700300
17368400
17138000
16971500
17296900
17444600
17048300
16460300
13501000
10227800
10873300
11350100
8773700
8537800
9994000
11046000
11164000
10558800
8981800
8534300
7979400
9178600
10390200
10978400
11405700
10170900
10545600
9776800
9300200
8175000
8214400
8517700
8990400
8636200
8526800
8272500
8142100
8696500
8852100
8422100
8102400
7614500
7504500
7667200
7780500
7588100
6757000
2031900
2559900
3005100
2604000
2350900
3300500
3813000
4256800
3589700
2487400
2255600
2562800
3117300
4093100
4741700
4912100
4985600
5228000
5049300
4827600
4344600
4877900
5648200
6387100
6441600
6877600
7173100
7721500
8593700
8848200
8946300
9035600
9357000
9792400
9777400
9267800
8872200
6744000
5767138
5740440
6512236
4677534
4657671
6933000
7472000
7731000
7234000
5470000
5286000
4607000
5921000
6502389
7261000
6559100
5694538
5914340
5533000
5013000
4249000
4381000
4729000
4729670
4870080
5143380
4805310
4630140
5051220
4953000
4905000
4859000
4757000
4707000
4518000
4125000
3867000
Fonte: Chandler (1964); Estatísticas do senado norte-americano; Relatório Moody’s; Relatório
anual da General Motors
* As vendas da GM nestes anos referem-se apenas a Buick
264