Diagnóstico
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Diagnóstico
Volume 1 Diagnóstico GOVERNO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE SECRETARIA DE PLANEJAMENTO E FINANÇAS-SEPLAN INSTITUTO INTERAMERICANO DE COOPERAÇÃO PARA A AGRICULTURA-IICA CONSELHO DE DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL DO SERIDÓ (Decreto nº 14.543, de 3.9.99) PLANO DE DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL DA REGIÃO DO SERIDÓ DO RIO GRANDE DO NORTE VOLUME 1: DIAGNÓSTICO Caicó-RN, 30 de setembro de 2000 1 Na diversidade das regiões estão as raízes de nossa riqueza cultural. (...) A luta contra o subdesenvolvimento é um processo de construção de estruturas, portanto, implica na existência de uma vontade política orientada por um projeto. (...) Em face das incertezas que enfrentamos atualmente, uma estratégia, para ser eficaz, deve visar um horizonte a longo prazo e privilegiar o esforço de reconstrução. Os objetivos iniciais devem ser abrangentes e podem parecer um tanto contraditórios do ponto de vista da lógica econômica convencional. Mas o que importa é que sejam coerentes do ponto de vista político. (Celso Furtado. O Longo Amanhecer – Reflexões sobre a Formação do Brasil, 1999.) Diante das dificuldades por que vem passando a economia do Seridó, perguntam-me se hoje está mais fácil sensibilizar sua população, para garantir seu envolvimento em um Projeto de Desenvolvimento. Respondo que sim. A presença da Igreja no Seridó sempre foi muito importante, pelo que tem feito na região, desde sua instalação nesta parte do Nordeste. A partir, pois, da experiência da Igreja, no Rio Grande do Norte, posso dizer que o passado garante e facilita o presente, ajudando a promover o futuro. (Entrevista com D. Jaime Vieira Rocha, Bispo da Diocese de Caicó e Presidente do Conselho de Desenvolvimento Sustentável do Seridó, em 28 de março de 2000.) 2 EQUIPE RESPONSÁVEL GOVERNO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE-GRUPO GESTOR Leonel Cavalcanti Leite (Coordenador) (Seplan) Fernando Augusto Noronha (Seplan) Luiz Gonzaga Tavares (Seplan) Rubens de Souza Passos (Seplan) CONSELHO DE DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL DO SERIDÓCDS/COMISSÃO DE ACOMPANHAMENTO DO PLANO-CAP Raimundo da Costa Sobrinho Sálvio José de Oliveira Verônica Maria de Barros SUPERVISÃO Carlos Luís de Miranda (IICA – Brasília) COORDENAÇÃO GERAL Rodolfo Teruel (IICA) Membros Natos D. Jaime Vieira Rocha – Diocese de Caicó (Presidente) Abelírio Vasconcelos da Rocha (Fiern) José Salim (Seplan) Antônio Ferreira de Assunção (AMSO) Rui Pereira dos Santos (AMS) Luiz Cláudio Souza (Sebrae-RN) João Dinarte Patriota (Fecomercio) Leônidas Ferreira de Paula (Faern) Manoel Cândido da Costa (Fetarn) Membros Honorários José Cortez Pereira de Araújo COORDENAÇÃO DO PCT-IICA-RN Fidel Braceras (IICA) APOIO DO PAPP-RIO GRANDE DO NORTE Evandro de Oliveira Borges (Coordenador do PAPP-RN) Sebastião Francisco de Menezes (PCT-IICA-RN) Janúncio Bezerra de Melo (Centro Regional de Ensino Superior do Seridó–Ceres, Campus de Caicó) 2-DIMENSÃO AMBIENTAL José Otamar de Carvalho (Coordenador) Mardone Cavalcante França (IICA) Ana Rosa Cavalcanti da Silva (técnica do Idema) Dilma Lucas da Silva (técnica do Idema) Hélio Batista de Faria (técnico do Idema) Hiramises Paiva de Pádua (técnica do Idema) Adailton J. E. de Carvalho (Projeto Ibama/Pnud/Bra/97/047) Maria Auxiliadora Gariglio (Projeto Ibama/Pnud/Bra/97/047) Newton D. Estrada Barcellos (Projeto Ibama/Pnud/Bra/97/047) EQUIPES TÉCNICAS 1-ABORDAGEM ESPACIAL José Otamar de Carvalho (Coordenador) (IICA) Tânia Bacelar de Araújo (IICA) Newton Duque Estrada Barcellos (Projeto Ibama/Pnud/Bra/97/047) Monsenhor Ausônio Tércio de Araújo (Diocese de Caicó) Ubaldo Medeiros (Músico e Maestro) Membros Convidados Tarcísio Araújo (Rotary Club) Ronaldo Carlos Dantas de Souza (Lions Club) João Avelino de Lima (Colônia de Pescadores) Ridalvo Batista de Araújo (Ibama) Max Rosan dos Santos–Escola do Sertão Alvamar da Costa Queiroz (GEDS) Francisco de Morais Lima (DNOCS) Miriam Araújo (Cooperativa de Produção Artesanal do Seridó LTDA –Coase) 3-DIMENSÃO TECNOLÓGICA José Otamar de Carvalho (Coordenador) Mardone C. França Maria de Fátima Formiga (Cooperativa de Produtos Artesanais Industriais do Seridó–COOPAIS) Maria Mariz da Silva (Sindicato dos Trabalhadores na Educação–Sinte) José de Araújo Vale (Cooperativa Agropecuária de Caicó–Coacal) Pastor Daniel Rodrigues Martins (Igreja Presbiteriana do Brasil) Membros Colaboradores Sandra Lúcia Barbosa Cavalcanti (Fiern) Acácio Zânzio de Brito (Sebrae) José Rangel de Araújo (Associação Comercial, Industrial e de Serviços de Caicó-ACISC) José Mariano Neto (Cooperativa de Eletrificação Rural do Seridó Ltda-Cersel) Ione Rodrigues Diniz (Ufrn/Ceres, Campus de Caicó) Júlio Roberto Araújo de Amorim (Emparn) Damião Santos de Medeiros (Seapac) Francisco das Chagas Teixeira de Araújo (Pastoral da Criança) Francisco Galvão Freire Neto (DDAS) Jailma Oliveira Nóbrega Febrônio de Azevedo (Pastoral da Criança) EQUIPE DE MOBILIZAÇÃO Waldecy de Urquiza e Silva (Coordenador) João Matos Filho Bertrand Brito de Araújo Dione Maria de Freitas Francisco Jacó Neto José Procópio de Lucena (Assessor do Pres. do CDS/CAP) Léa da S. Oliveira Lopes Mário Francisco de Oliveira Patrícia Morais Fernandes 4-DIMENSÃO ECONÔMICA Tânia Bacelar de Araújo, Coordenadora Eleonora Beaugrand (IICA) Antônio Ronaldo de Alencar Fernandes (IICA) 5-DIMENSÃO SOCIAL Leonardo Guimarães Neto (Coordenador) (IICA) Dinah S. Tinoco (IICA) Muirakytan Kennedy de Macêdo (Responsável pelo tema Cultura) 6-DIMENSÃO POLÍTICO-INSTITUCIONAL Waldecy de Urquiza e Silva (Coordenador) (IICA) João Matos Filho (IICA) 7-CONSOLIDAÇÃO DOS TEXTOS José Otamar de Carvalho (Coordenador) Waldecy de Urquiza e Silva EQUIPE DE APOIO ADMINISTRATIVO (IICA, Natal) Geusamy da Silva Oliveira Maria Goreth B. F. Diógenes 3 SUMÁRIO GERAL VOLUME 1 DIAGNÓSTICO 1. 2. APRESENTAÇÃO 010 INTRODUÇÃO 014 1.1 ASPECTOS CONCEITUAIS 015 1.2 METODOLOGIA 016 1.2.1 Compilação e Análise de Dados e Documentos 017 1.2.2 Consulta à Sociedade 017 1.2.3 Realização de Entrevistas 018 DESENVOLVIMENTO COM SUSTENTABILIDADE 019 2.1 ÊNFASES ATUAIS DO PLANEJAMENTO REGIONAL 019 2.2 DESENVOLVIMENTO PLANEJADO NO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE 022 RETOMADA DO DESENVOLVIMENTO DA REGIÃO DO SERIDÓ 025 2.3 3. DIAGNÓSTICO DO SERIDÓ 027 3.1 ABORDAGEM ESPACIAL 028 3.1.1 O Território do Seridó no Contexto do Nordeste Brasileiro 028 3.1.2 Estruturação e Ocupação do Espaço do Seridó 033 3.1.3 A Diferenciação Interna 036 3.1.4 Regionalização Adotada 037 3.1.5 Elementos para o Ordenamento Territorial do Seridó 044 3.2 045 DIMENSÃO AMBIENTAL 4 3.2.1 Ecossistemas do Nordeste e do Seridó 046 3.2.2 Recursos Hídricos 050 3.2.2.1 3.2.2.2 3.2.2.3 3.2.2.4 3.2.2.5 Oferta e Demanda de Recursos Hídricos no Nordeste Bacias Hidrográficas do Rio Grande do Norte Oferta e Demanda de Recursos Hídricos no Rio Grande do Norte e no Seridó Projeto de Transposição de Águas do São Francisco Perda de Capacidade de Águas Armazenadas 057 060 064 3.2.3 Recursos de Solo 065 3.2.4 Recursos Florestais 070 3.2.4.1 3.2.4.2 3.2.4.3 3.2.4.4 Mapeamento da Vegetação Nativa Lenhosa Inventário Florestal da Vegetação Nativa Consumo e Demanda de Energéticos Florestais Conservação dos Recursos Florestais 3.2.5 Recursos Minerais 3.2.5.1 3.2.5.2 3.2.5.3 3.2.6.1 3.2.6.2 070 071 074 076 077 A Economia Mineira do Nordeste e do Rio Grande do Norte Origens, Evolução e Perspectivas da Indústria Extrativa Mineral do Seridó Impactos Ambientais da Mineração 3.2.6 Alterações no Meio Ambiente Alterações Específicas A Desertificação como Síntese 077 079 083 084 084 086 3.2.7 Fragilidades Ambientais 088 3.2.8 Lixo e Saneamento Ambiental 093 3.2.9 Instituições da Área Ambiental 096 3.2.9.1 3.2.9.2 3.3 050 054 Com Atuação Direta Com Atuação Indireta 097 100 3.2.10 Principais Problemas 3.2.11 Potencialidades Relevantes 100 101 DIMENSÃO TECNOLÓGICA 103 3.3.1 Importância da Ciência e Tecnologia 104 5 3.3.1.1 3.3.1.2 3.3.1.3 Possibilidades de Produção de Ciência e Tecnologia Padrões Tecnológicos Alternativas Tecnológicas para Aumentar a Produtividade e Elevar a Qualidade de Vida 3.3.2 Base de Ciência e Tecnologia 3.3.2.1 3.3.2.2 3.3.2.3 3.4 Instituições que Atuam na Esfera Estadual Instituições que Atuam na Região do Seridó Sistema Estadual de Ciência e Tecnologia: Envolvimento do Seridó 104 105 107 110 110 112 113 3.3.3 Incentivo a Inovações e Tecnologias 114 3.3.4 Produção Acadêmica 116 3.3.5 Demandas Tecnológicas 119 3.3.6 Principais Problemas 123 3.3.7 Potencialidades Relevantes 124 DIMENSÃO ECONÔMICA 125 3.4.1 Características Principais do Ambiente Econômico Regional 125 3.4.1.1 3.4.1.2 3.4.1.3 Produção Predominante e Especificidades Sub-Regionais Padrão Tecnológico Dominante, a Baixa Produtividade e as Mudanças Recentes Estrutura Agrária e Mudanças no Uso da Terra 3.4.2 Tendências Recentes da Dinâmica Econômica 3.4.2.1 3.4.2.2 3.4.2.3 Atividades Dinâmicas ou que Dão Sustentação à Economia Local Atividades em Crise As Principais Trajetórias do Pós-Crise 3.4.3 A Base de Infra-Estrutura Econômica 3.4.3.1 3.4.3.2 3.4.3.3 A Infra-Estrutura de Transportes A Infra-Estrutura de Comunicações e Telecomunicações A Infra-Estrutura de Energia 3.4.4 Tendências do Comércio Exterior 6 125 128 129 134 134 146 154 156 156 157 159 160 3.4.4.1 3.4.4.2 Tendências Gerais Principais Produtos Exportados e a importância dos Minérios 3.4.5 Tendências da Renda Regional 3.4.5.1 3.4.5.2 A Dimensão da Economia Regional: o PIB e a Renda A Renda Regional e a Importância de Diversas Transferências 3.4.6 Tendências da Receita Pública 3.4.6.1 3.4.6.2 Receita dos Municípios do Seridó Composição das Transferências 3.4.7 Problemas e Potencialidades 3.4.7.1 3.4.7.2 3.5 Principais Problemas Potencialidades 161 162 165 165 167 170 170 171 172 173 175 DIMENSÃO SOCIOCULTURAL 175 3.5.1 Cultura e Identidade no Seridó 176 3.5.1.1 3.5.1.2 3.5.1.3 3.5.1.4 Instância Religiosa Instância Política Instância Socioeconômica Instância Educacional 3.5.2 População, Qualidade de Vida e Pobreza 3.5.2.1 3.5.2.2 3.5.2.3 3.5.2.4 Distribuição da População no Seridó Dinâmica Demográfica Qualidade de Vida e Pobreza As Grandes Tendências da População e de sua Qualidade de Vida 3.5.3 Emprego e Relações de Trabalho no Seridó 3.5.3.1 3.5.3.2 3.5.3.3 176 178 179 182 184 185 186 193 200 202 Aspectos da Dinâmica do Emprego no Rio Grande do Norte Características da Força de Trabalho 203 203 Grau de Utilização da Força de Trabalho: Desemprego, Subemprego e Impacto da Seca sobre o Mercado de Trabalho 213 7 3.5.3.4 3.5.3.5 O Trabalho Infantil Emprego X Desemprego, Segundo a Percepção da População 3.5.4 Condições Educacionais da População e a Situação da Oferta dos Serviços de Educação 3.5.4.1 3.5.4.2 3.5.4.3 3.5.4.4 3.5.4.5 Condições Educacionais da População, em 1996 Evolução das Condições de Educação no Seridó - 1970-91 A Educação na Perspectiva da População do Seridó A Oferta de Serviços de Educação Problemas e Potencialidades e Aspectos de um Cenário 3.5.5 Condições de Saúde da População do Seridó 3.5.5.1 3.5.5.2 3.5.5.3 3.5.5.4 3.5.5.5 Os Indicadores de Longevidade: Situação mais Recente A Evolução dos Indicadores de Longevidade A Saúde na Perspectiva da População A Oferta dos Serviços de Saúde no Seridó Problemas, Potencialidades e Aspectos do Futuro Desejado 3.5.6 Condições de Habitação e de Saneamento Básico no Seridó 3.5.6.1 3.5.6.2 3.5.6.3 3.5.6.4 3.5.6.5 3.6 Condições Atuais dos Domicílios Evolução das Condições dos Domicílios Condições de Saneamento Básico e da Habitação na Perspectiva da População do Seridó Disponibilidade dos Serviços Problemas e Potencialidades 215 216 218 219 223 229 233 236 239 239 241 244 247 252 254 255 259 261 266 268 DIMENSÃO POLÍTICO-INSTITUCIONAL 270 3.6.1 Tipologia dos Municípios do Seridó 272 3.6.2 A Presença do Estado 273 3.6.2.1 3.6.2.2 3.6.2.3 Trajetória no Período Anterior à Criação da Sudene Mudanças na Intervenção Estatal: Planejamento para o Desenvolvimento Regional (1960-70) 277 A Mudança no Padrão de Intervenção Governamental: de 1970 em Diante 279 8 275 3.6.3 Panorama Institucional Atual 3.6.3.1 3.6.3.2 3.6.3.3 3.6.3.4 3.6.3.5 3.6.3.6 3.6.3.7 Organizações Governamentais Organizações Não-Governamentais Organizações Empresariais Organizações Sindicais Organizações Civis Instituições Judiciárias Outras Categorias 3.6.4 O Sistema Municipal de Governo 3.6.4.1 3.6.4.2 3.6.4.3 3.6.4.4 3.6.4.5 3.6.4.6 3.7 Características Gerais Perfil da Administração Municipal Situação do Poder Legislativo Municipal Estrutura Organizacional das Prefeituras Forma de Prestação de Serviços A Atuação do Sistema 282 282 285 287 289 290 291 292 295 295 296 300 302 303 304 3.6.5 Principais Problemas Detectados 304 3.6.6 Potencialidades Relevantes 310 ANÁLISE DO AMBIENTE EXTERNO 311 3.7.1 Ameaças 313 3.7.2 Oportunidades 314 9 APRESENTAÇÃO O Plano de Desenvolvimento Sustentável do Seridó, que abrange um elenco estruturado de informações, dados, indicadores e propostas, destinados a nortear as ações que conduzirão o processo de desenvolvimento sustentado e permanente dessa região. Estruturado em dois Volumes, este é o Volume 1, do qual consta, além desta Apresentação, mais três capítulos, cujos títulos e conteúdos são a seguir descritos. A bibliografia utilizada na preparação dos dois volumes está listada ao final do Volume 2. Capítulo 1 – Introdução Descreve a metodologia adotada para o desenvolvimento dos trabalhos de elaboração do Plano (preponderantemente marcada pela participação da sociedade), mostra como o processo de participação foi concebido e posto em prática (em termos de mobilização e de instrumentos utilizados) e fixa os aspectos conceituais mais relevantes do Desenvolvimento Sustentável. Capítulo 2 – Desenvolvimento com Sustentabilidade Nesse Capítulo são feitas considerações sobre as questões relacionadas ao processo de desenvolvimento, mostrando-se que, apesar de um certo esvaziamento das atividades de planejamento (sobretudo na esfera federal), ainda é possível conceber e pôr em prática experiências de desenvolvimento regional e sub-regional, como a forma mais adequada de contribuir para a redução dos crônicos desníveis socioeconômicos existentes no Brasil. Nesta linha de idéias, são abordadas experiências recentes, assentadas em novos paradigmas, principalmente as pautadas pela ótica do desenvolvimento sustentável, prática que vem sendo incorporada ao conhecimento atual por intermédio das atividades de estudo e planejamento realizadas com a cooperação técnica do Instituto Interamericano de Cooperação para a Agricultura–IICA, destacando-se, dentre outras, as que culminaram com o Projeto Áridas e o Plano de Desenvolvimento Sustentável do Estado do Rio Grande do Norte. Capítulo 3 – Diagnóstico do Seridó Esse capítulo mostra a realidade atual da Região do Seridó, em todos os seus aspectos, desdobrando-se nos sete itens a seguir descritos. i. Abordagem Espacial. Contempla uma detalhada descrição do espaço físico da Região do Seridó, mostrando sua inserção no Nordeste e no estado do Rio Grande do Norte, assim como o processo histórico de sua estruturação, suas limitações e condicionantes. ii. Dimensão Ambiental. Aborda questões relacionadas ao meio ambiente e aos recursos naturais renováveis. Constatações e considerações sobre recursos hídricos, solos, cobertura vegetal, recursos minerais, etc., bem como sobre a fragilidade do meio ambiente da região. As pontuações efetuadas naquelas áreas e domínios possibilitam a construção de uma imagem completa e abrangente dos ecossistemas do Seridó, em suas múltiplas variações. iii. Dimensão Tecnológica. Disserta sobre os padrões tecnológicos e a necessidade de desenvolver, neste particular, processos de mudanças pautados pela adoção de inovações tecnológicas, estabelecidas em função das possibilidades da oferta e dos requerimentos que caracterizam as 10 demandas por Ciência & Tecnologia, no estado e no Seridó, por parte dos diferentes sistemas sociais. São, também, descritas alternativas tecnológicas para o aumento de produtividade das atividades econômicas e para a elevação da qualidade de vida dos habitantes da região. Apresenta-se, ainda, um levantamento completo do aparato institucional que atua na área de C&T (tanto no estado, como um todo, quanto na região, especificamente), destacando-se os incentivos oferecidos ao desenvolvimento científico-tecnológico. iv. Dimensão Econômica. Analisa a economia da região, mostrando sua estrutura e as alterações experimentadas ao longo das três últimas décadas (enfocando-se, mais detidamente, o estágio atual). Indica os principais problemas e ameaças – endógenas e exógenas – que comprometem seu desempenho, assim como as potencialidades identificadas como capazes de propiciar maior sustentabilidade ao desenvolvimento da economia regional. v. Dimensão Sociocultural. Começa pela abordagem dos aspectos identitários do Seridó, abordados em perspectiva histórica. Trata, em seguida, dos temas relacionados às peculiaridades sóciodemográficas da região, pondo em relevo a extensão e os níveis de qualidade dos serviços oferecidos à população, em termos de saúde, educação, saneamento básico e habitação. Expõe, assim, aspectos da dinâmica do processo migratório e da situação dos habitantes da região, com respeito às magnas questões do emprego e da renda. vi. Dimensão Político-Institucional. O item é iniciado com algumas considerações conceituais sobre Estado e governo, abordando, a seguir, a presença do Estado na Região do Seridó, no contexto histórico, a partir do qual sobressaem as motivações e os propósitos das intervenções das diversas esferas do poder público, no processo de mudanças por que tem passado a região. Apresenta, ainda, um panorama geral do quadro institucional existente e atuante na Região do Seridó, por sua vez descrito e analisado no que se refere à sua estrutura atual e ao seu desempenho. Destaque especial foi concedido ao Sistema Municipal de Governo, pela importância de que se reveste para a implementação do Plano de Desenvolvimento Sustentável do Seridó. Mostra, por fim, os principais problemas que interferem no desempenho do quadro institucional e as potencialidades mais relevantes, capazes de influir na consolidação e aprimoramento das instituições da região. vii. Análise do Ambiente Externo. Esse item complementa o Diagnóstico, indicando os fatores exógenos que podem representar ameaças ao processo de desenvolvimento sustentável da Região do Seridó. Destaca, ao mesmo tempo, as oportunidades do ambiente externo capazes de influir favoravelmente sobre esse processo. Capítulo 4 – Estratégia Contempla os cenários visualizados para a Região do Seridó, qualificados como um cenário tendencial e um cenário desejado. Do mesmo capítulo constam os objetivos gerais do Plano, assim explicitados: i) promoção das condições de vida da população; ii) ampliação relevante dos níveis de qualificação de mão-de-obra; iii) consolidação do processo de reestruturação econômica e dinamização das atividades produtivas; iv) promoção do desenvolvimento ambientalmente sustentável; e v) fortalecimento da cidadania e melhoria do desempenho das instituições que atuam na região. As opções estratégicas do Plano são abordadas na última parte desse capítulo. 11 Capítulo 5 – Programas e Projetos Trata especificamente da descrição dos Programas e Projetos, concebidos como capazes de garantir a retomada do processo de desenvolvimento, com sustentabilidade, na Região do Seridó. São 24 Programas, dos quais seis se desdobram em 27 Projetos de desenvolvimento. Capítulo 6 – Sistema de Gestão do Plano O Sistema de Gestão corresponde à última etapa do processo de elaboração do Plano do Seridó. Nele estão descritos os princípios básicos que fundamentaram sua concepção, as instâncias e órgãos integrantes, assim como a forma de articulação necessária à execução do Plano. Culmina com a indicação de providências relacionadas ao processo de implementação dos Programas e Projetos. Coerente com a filosofia participativa, que norteou o desenvolvimento dos trabalhos, o resultado do Diagnóstico foi submetido à apreciação e análise por parte da Comissão de Acompanhamento do Plano–CAP. Foi, posteriormente, objeto de debates nas Reuniões Sub-Regionais de Currais Novos, das Serras Centrais e de Caicó, previstas no Processo de Mobilização/Participação. Os subsídios decorrentes desses dois momentos de análise e reflexão foram incorporados a esta versão. A produção dos textos aqui apresentados beneficiou-se, ademais, da colaboração de várias instituições do governo do Rio Grande do Norte, em particular da que foi oferecida pelas Secretarias de Indústria, Comércio, Ciência e Tecnologia–Sintec (nas pessoas do Dr. Paulo Waldomiro, Coordenador de Recursos Minerais, Ciência e Tecnologia, e do Dr. José Lacet Filho, Coordenador do Poloemp); de Recursos Hídricos (na pessoa do Dr. Paulo Lopes Varella Neto, Secretário da Pasta, e da Dra. Maria de Fátima de Freitas Rego); e do Planejamento (na pessoa do Dr. Leonel Leite, Coordenador de Planejamento da Secretaria), assim como a que foi obtida por intermédio do Diretor Geral do Idema, Dr. Geraldo Magela Cabral de Souza. Colaboração especial foi oferecida pelo Projeto Ibama/Pnud/Bra/97/047, viabilizada pelo Eng. Florestal Newton Duque Estrada Barcellos. A Fundação Esquel, por intermédio do Dr. João Arthur Soccal Seyffdeth, e o Grupo de Estudos de Desertificação do Seridó, na pessoa do técnico Josimar Araujo de Medeiros, ofereceram informações importantes sobre a questão da desertificação na área objeto de estudo. O Diagnóstico também captou particularidades do Seridó, como resultado das informações colhidas, em entrevistas, com lideranças e profissionais da região, a exemplo das que são a seguir referidas: D. Jaime Vieira Rocha, Bispo da Diocese de Caicó; José Cortez Pereira, ex-Governador do Rio Grande do Norte; Abelírio Vasconcelos da Rocha, Presidente da Fiern; Álvaro Dias, Presidente da Assembléia Legislativa do Rio Grande do Norte; Emídio Germano da Silva, empresário de Caicó; Edgard Ramalho Dantas, geólogo e professor da UFRN; Janúncio Bezerra de Melo, físico e professor da Ufrn (Ceres de Caicó); Newton Duque Estrada Barcellos, eng. florestal, do Projeto Ibama/Pnud/Bra/97/047; Adailton José Epaminondas de Carvalho, Projeto Ibama/Pnud/Bra/97/047; Alfredo Antônio Galvão, Presidente do Câmara de Diretores Lojistas–CDL, de Currais Novos; Chico Elpídio, líder da Comunidade de Palma, no Município de Caicó; José de Araújo Vale, Presidente da Cooperativa Agropecuária de Caicó; Cristino Jerônimo da Silva, Presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Caicó; José Mariano Neto, Presidente da Cooperativa de Energia e Desenvolvimento Rural do Seridó–Cersel, em Currais Novos; Marcelo Porto, Presidente do Sindicato dos Mineradores do Rio Grande do Norte; José Suterland Guimarães Menezes, Presidente da TerraSul– Assessoria de Comércio Exterior; Francisco César M. de Queiroz, Gerente da Agência do Banco do Nordeste, em Caicó; José Rangel de Araújo, Gerente do SEBRAE, em Caicó; Leônidas Ferreira de 12 Paula, Presidente da Federação da Agricultura do Estado do Rio Grande do Norte–FAERN e Presidente do Serviço Nacional de Aprendizagem Rural–Senar; Maria Auxiliadora Sales Muniz, técnica do Setor de Negócios do Sebrae–Natal; Mônica G. Lima Menezes, técnica do Sebrae–Natal (responsável pelo Projeto do Artesanato); e Ricardo Luiz Paiva Medeiros, Gerente do Bradesco, Agência de Caicó. Além das informações oferecidas durante as entrevistas, a Fiern, o Sebrae-RN, o Banco do Nordeste e a Fetarn propiciaram conjuntos importantes de informações sobre aspectos gerais e particulares da realidade econômica regional, constantes de seus acervos documentais. Um outro importante destaque deve ser feito. O processo de mobilização/participação contou com alguns fatores e circunstâncias que em muito contribuíram para o seu sucesso. Em primeiro lugar, o alto grau de interesse que o Plano despertou junto às lideranças e às comunidades da Região, uma vez que delas havia partido a iniciativa de propor sua elaboração. Em segundo, a decidida atuação da Diocese de Caicó, cujo titular empenhou seu prestígio e seus esforços no sentido de mobilizar e envolver os segmentos mais representativos da sociedade civil do Seridó. Em terceiro lugar, há que destacar a colaboração de dirigentes e técnicos do Programa de Apoio ao Pequeno Produtor Rural– PAPP, cuja filosofia incorpora a participação como característica básica de seu processo de seleção, formulação e execução de projetos. A internalização das práticas de há muito adotadas pelo PAPP constituiu fator extremamente facilitador do processo de participação. Por fim, mas não por menos importante, deve ser posta em relevo a contribuição do PAPP, incorporando a decisiva participação do governo do Rio Grande do Norte e do Banco Mundial, no financiamento dos trabalhos de elaboração deste Plano. Todos colaboraram positivamente. Deve-se, porém, colocar ainda em merecido relevo, o apoio oferecido por D. Jaime Vieira Rocha, Bispo da Diocese de Caicó e Presidente do Conselho de Desenvolvimento do Seridó e da Comissão de Acompanhamento do Plano, particularmente no que se refere ao envolvimento das lideranças de todas as instâncias de representação dos diferentes interesses do Seridó. Sua presença em várias reuniões, na cidade de Caicó ou em Natal, foi sempre estimulante, pelo apoio prestado ou pela esperança demonstrada nas possibilidades deste Diagnóstico e das propostas contidas no Volume 2 do Plano de Desenvolvimento do Seridó. 13 1. INTRODUÇÃO No presente capítulo descrevem-se os antecedentes que determinaram a elaboração do Plano de Desenvolvimento Sustentável do Seridó, bem como os princípios e procedimentos adotados para sua concretização. Os antecedentes do Plano de Desenvolvimento Sustentável do Seridó envolveram os seguintes instrumentos e decisões: i. Protocolo de Intenções firmado entre o Governo do Estado do Rio Grande do Norte com a Associação dos Municípios da Microrregião do Seridó Ocidental–AMSO e a Associação dos Municípios da Região do Seridó–AMS, tendo como intervenientes a Federação das Indústrias do Estado do Rio Grande do Norte–Fiern, o Serviço de Apoio às Micro e Pequenas Empresas do Rio Grande do Norte–Sebrae-RN, a Federação do Comércio do Estado do Rio Grande do Norte (Fecomercio), a Federação da Agricultura do Estado do Rio Grande do Norte (Faern), a Federação dos Trabalhadores da Agricultura do Estado do Rio Grande do Norte–Fetarn e a Diocese de Caicó; ii. Projeto de Cooperação Técnica–PCT firmado entre o Governo do Estado do Rio Grande do Norte e o Instituto Interamericano de Cooperação para a Agricultura (IICA); iii. Resultados das Reuniões Técnicas realizadas em Natal-RN, no período de 21 a 23.09.99, com a participação: • de consultores mobilizados pelo IICA; • de técnicos da Secretaria de Planejamento e Finanças do Rio Grande do Norte–Seplan e do Projeto de Apoio ao Pequeno Produtor Rural-PAPP; • de professores da Ufrn; • de representantes da Diocese de Caicó; • de representantes da Fetarn; • de representantes de organizações não-governamentais, com atuação no Seridó; • dos Presidentes da Associação de Municípios da Região do Seridó-AMS e da Associação dos Municípios da Microrregião do Seridó Ocidental-AMSO; e iv. resultados do Seminário de Nivelamento e Lançamento do Processo de Elaboração do Plano do Seridó, com a participação: • • • • • • • • • do Presidente do Conselho de Desenvolvimento Sustentável do Seridó; de Prefeitos de Municípios integrantes da Região do Seridó; de representantes de Sindicatos de Trabalhadores Rurais de municípios da região; de técnicos de órgãos públicos, com atuação na região; de componentes do Grupo Gestor; de representantes de organizações não-governamentais; de representante da Fiern; do Presidente da AMSO e do Presidente da AMS; e de consultores mobilizados pelo IICA. A mobilização do IICA para a elaboração do Plano do Seridó refletiu as demandas formuladas 14 ao poder público estadual pelas lideranças da Região do Seridó. O atendimento a tais demandas havia sido anteriormente tentado pelo governo do estado (com o apoio da Fiern). Aludido intento foi parcialmente concretizado, com a elaboração de um Diagnóstico sobre os problemas e as potencialidades daquela região. As instituições (públicas e não-governamentais) envolvidas no processo de elaboração do Plano do Seridó, no entanto, consideraram necessário ampliar o Diagnóstico, aditando-lhe os elementos referentes a estratégias, programas e projetos e modelo de gestão, destinados a promover o desenvolvimento da Região do Seridó. Firmaram-se, ainda, na compreensão de que para ser eficaz, o Plano do Seridó deveria ser concebido, elaborado e executado com a participação das instituições que representassem os principais interesses das forças sociais que configuram a Região do Seridó, em suas múltiplas dimensões. Assim, o Plano de Desenvolvimento Sustentável do Seridó foi elaborado segundo a perspectiva de que os anseios da população daquela região estariam sendo amplamente catalisados pelo Governo do estado do Rio Grande do Norte e por lideranças e instituições do Seridó, com destaque para a Diocese de Caicó, os Sindicatos dos Trabalhadores Rurais e as duas Associações de Municípios atuantes naquela região. 1.1 ASPECTOS CONCEITUAIS O desenvolvimento sustentável é entendido como uma construção assentada em uma base ética, que demanda uma solidariedade social e a necessidade de subordinação da dinâmica econômica aos interesses da sociedade e às condições do meio ambiente. Cria, neste sentido, duas solidariedades: uma, sincrônica, para com a geração à qual pertencemos, e outra, diacrônica, para com as gerações futuras. (Sachs, 1990.) Esta se traduz, em primeiro lugar, na solidariedade intergerações, de tal modo que o bem estar das gerações atuais não pode comprometer as oportunidades e necessidades futuras. Ao mesmo tempo, pressupõe uma solidariedade intrageração, segundo a qual o bem-estar de uma minoria não pode ser construído em detrimento da maioria (oportunidades desiguais na geração atual). (Miranda et alii, 1999.) Deve ser visto, portanto, como um processo amplo e abrangente de mudança social e elevação das escolhas e das oportunidades da sociedade, de modo a compatibilizar no tempo o crescimento econômico, a eqüidade social e a conservação do meio ambiente. Encerra, de imediato, a necessidade de uma abordagem multidisciplinar e integradora das diversas dimensões da realidade, como a ambiental, a científico e tecnológica, a econômica, a sociocultural, e a político-institucional. A concretização desta abordagem demanda, por outro lado, o fortalecimento da cidadania e a democratização das instituições e da sociedade. Na medida em que se consolida no pensamento técnico contemporâneo a concepção do desenvolvimento sustentável, propagam-se novas tendências teóricas e práticas do planejamento, que tendem a alterar a visão tradicional do planejamento tecnocrático e autoritário, que, no Brasil, dominou durante cerca de duas décadas. Em sintonia, portanto, com as vertentes contemporâneas de planejamento, as atividades de elaboração do Plano partiram da concepção de que o planejamento é um processo essencialmente político de tomada de decisões, com base no instrumento e capacidade técnica de organizar e processar informações sobre a realidade e seu contexto. 15 Assim, buscou-se pôr em prática uma estratégia que possibilitasse 1 aos atores sociais manterem estreito intercâmbio com os técnicos, na troca de percepções e visões que preparassem e fundamentassem as decisões políticas. Compreende-se que para tornar as aspirações e interesses da sociedade do Seridó efetivas e representativas, consoante a lógica do processo de desenvolvimento sustentável, o planejamento deva ser conduzido de forma participativa e democrática, ampliando a mobilização dos atores e segmentos sociais a serem envolvidos na formulação dos programas e projetos, bem como na elaboração do Sistema de Gestão do Plano. A expressão planejamento participativo tem sido, nos últimos anos, largamente utilizada por técnicos, políticos e governantes, como característica de um modelo novo de gestão governamental, marcado pelo envolvimento da sociedade na formulação e execução das ações de governo. Embora seja este o discurso, nem sempre a prática resulta efetiva. A experiência tem mostrado que, muitas vezes, o que se entende por participação restringe-se, pura e simplesmente, a uma tentativa dos poderes públicos em dividir responsabilidades, homologar seus atos ou legitimar suas ações, com respaldo da manifestação de segmentos da sociedade, mobilizados exclusivamente para tais fins. No caso específico da formulação do Plano de Desenvolvimento Sustentável da Região do Seridó do Rio Grande do Norte, levou-se em consideração o reconhecimento da necessidade de se desenvolver um processo de construção amplo, democrático e participativo, de forma a que o Plano pudesse vir, de fato, a incorporar as aspirações autênticas e legítimas da sociedade do Seridó. Participação, aqui, deve ser entendida não apenas como tomar parte, mas também – e principalmente – como ser parte. Dessa forma, foi delineada e posta em prática uma estratégia destinada a envolver os mais diversos segmentos da sociedade civil (assim como representantes das administrações municipais da região), fazendo-as ao mesmo tempo sujeito e objeto do processo de desenvolvimento. Com este balizamento, as atividades desenvolvidas ao longo do processo de elaboração do Plano foram conduzidas com um duplo direcionamento: além de se destinarem à coleta de informações e subsídios deveriam também possibilitar o desenvolvimento de ações voltadas para induzir todas as entidades envolvidas na adoção de práticas voltadas para a consolidação e aprimoramento de sua participação nos sistemas de planejamento e gestão de programas e projetos de interesse da região. 1.2 METODOLOGIA Em obediência à filosofia adotada na condução dos trabalhos, o Plano foi elaborado segundo metodologia participativa, articulando-se rigoroso tratamento técnico e envolvimento da sociedade e dos atores sociais da região na execução de suas diferentes etapas. Pautado pelo conceito de desenvolvimento sustentável, o trabalho incorpora a idéia de que o planejamento corresponde a um processo, que é, ao mesmo tempo, técnico e político, de formulação de ações para a construção do futuro. Nesta linha de conduta, a metodologia adotada, atendo-se aos aspectos conceituais a seguir descritos, envolveu: i) compilação e análise de documentos técnicos, dados secundários e material bibliográfico; ii) consulta à sociedade; e iii) realização de entrevistas. 1 Em todas as etapas de elaboração do Plano (Diagnóstico, Estratégia, Programas e Projetos e Sistema de Gestão). 16 1.2.1 Compilação e Análise de Dados e Documentos Um amplo acervo de informações a respeito da Região do Seridó foi consultado, daí resultando subsídios de extrema importância para a elaboração do Plano. Foram analisados todos os estudos, planos e relatórios anteriormente produzidos, dentre os quais o Plano de Desenvolvimento Sustentável do Estado do Rio Grande do Norte (produzido sob a coordenação da Secretaria do Planejamento e das Finanças) e o Relatório Diagnóstico para o Plano de Desenvolvimento do Seridó (elaborado pelo Consórcio Tecnosolo & CEP, sob encomenda da Fiern, do governo do Estado do Rio Grande do Norte e das Prefeituras da região). Documentos técnicos e estatísticas básicas produzidos pelo Instituto de Desenvolvimento Econômico e Meio Ambiente do Rio Grande do Norte– Idema também forneceram dados secundários importantes sobre os mais variados aspectos socioeconômicos do Seridó. Estudos, dissertações e teses sobre o Rio Grande do Norte e o Seridó também foram examinados e discutidos, aportando elementos fundamentais para a compreensão da realidade hoje vivida pela região objeto de estudo e a construção de seu futuro. No caso específico da Dimensão Institucional foram também utilizados dados e informações obtidos diretamente junto às instituições atuantes na região, por intermédio de instrumentos específicos de coleta. As instituições das esferas dos governos federal e estadual foram identificadas e listadas, fazendo-se uma breve descrição de cada uma delas, em sua respectiva área temática. Já no caso das entidades municipais, procurou-se fazer um diagnóstico mais aprofundado, a partir da aplicação de um formulário específico de coleta de dados, complementado por entrevistas. Em cada um dos municípios que compõem a Região do Seridó foram recolhidos dados e informações que possibilitaram formar um juízo acerca do desempenho de sua administração (sob o ponto de vista organizacional e gerencial) e do funcionamento de seu Sistema de Governo. 1.2.2 Consulta à Sociedade A participação da Sociedade no processo de elaboração do Plano foi concretizada por meio de Reuniões Municipais, realizadas em todos os municípios do Seridó. A mobilização para essas reuniões foi feita pela Comissão de Acompanhamento do Plano, que, para tanto, contou com a participação das Prefeituras, dos Sindicatos dos Trabalhadores Rurais e de várias organizações civis. De acordo com cronograma previamente elaborado, as convocações foram feitas por meio de correspondências expedidas à Prefeitura de cada município do Seridó e às instituições representativas da comunidade (igrejas, sindicatos, órgãos de classe, instituições governamentais com atuação no município, associações comunitárias, organizações não-governamentais, etc.), além de divulgação de cunho mais amplo, com a utilização dos meios disponíveis de comunicação de massa. A convocação feita para essas reuniões envolveu, de maneira geral, um universo constituído por Associações de Municípios; Prefeituras Municipais; Câmara de Vereadores; Conselhos de Políticas Sociais; Organizações Comunitárias; Sindicatos; Igrejas; Clubes de Serviços; Organizações Empresariais; Organizações Governamentais; Organizações Não-Governamentais; Associações outras. As Reuniões Municipais tiveram, como objetivos básicos: i) informar os participantes sobre a elaboração do Plano de Desenvolvimento Sustentável do Seridó; ii) sensibilizar os participantes para a necessidade de pensar a questão do desenvolvimento municipal sustentável; e iii) iniciar um processo de planejamento local que permitisse a formulação do Plano com a participação efetiva de seus 17 principais interessados, ou seja, a população do Seridó. Os participantes foram orientados quanto às técnicas e processos a utilizar para o cumprimento dos objetivos acima indicados, de forma a se poder captar a opinião da comunidade quanto à: i) identificação dos problemas considerados como os mais importantes enfrentados pelo município; ii) indicação das soluções vistas como as mais adequadas para o equacionamento dos problemas; iii) indicação das potencialidades do município, capazes de contribuir para a implantação das soluções indicadas; e iv) construção do cenário futuro desejado. Em seu conjunto, as reuniões municipais contaram com a presença de cerca de 1.200 participantes, e delas resultaram valiosos subsídios não apenas para a fase do Diagnóstico como, também, para as fases subseqüentes dos trabalhos de elaboração do Plano. Posteriormente, e na seqüência das atividades previstas no processo de mobilização, foram realizadas três Reuniões Sub-Regionais (uma em cada Zona Homogênea da região do Seridó), com os objetivos de i) analisar e consolidar as informações advindas das Reuniões Municipais; ii) delinear o cenário futuro desejado, ao nível de cada respectiva Zona Homogênea; e iii) apreciar as propostas formuladas pelos consultores, no tocante a Programas e Projetos. Com uma média de 150 participantes, essas Reuniões Sub-Regionais aportaram inestimáveis subsídios para a elaboração do Plano de Desenvolvimento do Seridó. 1.2.3 Realização de Entrevistas Outra fonte importante de obtenção de subsídios para a elaboração do Plano foram as entrevistas com personalidades e lideranças políticas que conhecem a problemática da Região do Seridó e do Estado do Rio Grande Norte. Representando uma forma complementar de consulta, foram realizadas junto a personalidades de destaque nos meios político, científico e empresarial, representantes de sindicatos de trabalhadores, organizações não-governamentais, produtores rurais e outros entes da sociedade civil, tanto da Região do Seridó quanto do Estado do Rio Grande do Norte, como um todo. As personalidades a serem entrevistadas foram escolhidas de comum acordo entre a Comissão de Acompanhamento do Plano–CAP e os consultores do IICA. As entrevistas foram gravadas e transcritas, resultando de seu conteúdo preciosas informações que possibilitaram uma visão abrangente da problemática da Região do Seridó e de sua história política e econômica. 18 2. DESENVOLVIMENTO COM SUSTENTABILIDADE No presente capítulo abordam-se as tendências atuais do planejamento, sobretudo no que se relaciona à formulação de propostas destinadas à promoção do desenvolvimento regional, como forma de minimizar os desníveis socioeconômicos, destacando-se neste particular as experiências realizadas com a participação do Instituto Interamericano de Cooperação para a Agricultura (IICA). Três tópicos ligados a esse contexto são descritos a seguir: ênfases atuais do planejamento regional; Desenvolvimento Planejado no Estado do Rio Grande do Norte; e Retomada do Desenvolvimento da Região do Seridó. 2.1 ÊNFASES ATUAIS DO PLANEJAMENTO REGIONAL Reconhece-se haver uma notável diferença entre os novos e os antigos paradigmas do desenvolvimento, percebida nas distintas experiências de planejamento regional recente, conduzidas no Nordeste com a participação do IICA. Essas mesmas experiências indicam que continua havendo espaço para a prática do desenvolvimento segundo a perspectiva regional. É possível que não haja mais tanto espaço para o desenvolvimento, tal como o que foi imaginado e até certo ponto praticado para as Grandes Regiões do País, a partir da segunda metade dos anos 50 – na linha das experiências da Superintendência do Plano de Valorização Econômica da Amazônia–Spvea 2 e da Sudene – e com maior expressão durante os anos 60 e 70, com a extensão daquelas experiências às Regiões Sul (onde atuou a Superintendência do Desenvolvimento da Região Sul–Sudesul) e Centro-Oeste (palco de ação da Superintendência do Desenvolvimento da Região Centro-Oeste–Sudeco). Os anos 80 registraram o progressivo esvaziamento dos trabalhos de planejamento em escala regional, como resultado da crise financeira do Estado brasileiro e do processo de reforma por que passou esse mesmo Estado, mormente na esfera federal. Embora aquelas circunstâncias tenham continuado nos anos 90, foi possível iniciar e dar corpo em seu decorrer a novas e importantes experiências de desenvolvimento regional e sub-regional, a partir de meados da mesma década. Nos anos de 1993/94, o Nordeste foi objeto de um amplo e diversificado conjunto de estudos sobre os mais diferentes problemas e facetas do desenvolvimento regional, tanto em termos setoriais, como espaciais. Esses estudos foram conduzidos ao abrigo do Projeto Áridas, iniciativa concebida e consolidada pela então Secretaria de Planejamento, Orçamento e Coordenação da Presidência da República–Seplan-PR e por vários governos de estados nordestinos. Trabalhava-se no Projeto Áridas com a tese de que era não apenas necessário como urgente refletir e reinventar a política de desenvolvimento do Nordeste, passando esta “pela introdução do conceito de desenvolvimento sustentável, pelo planejamento de longo prazo – uma geração, pelo menos –, pela redefinição do papel do governo, pela descentralização do planejamento e da execução das políticas, e pela criação do espaço necessário para mobilização do potencial criativo da sociedade.” Assim, o Projeto Áridas foi concebido com o objetivo geral de “elaborar proposta de estratégia, políticas, programas prioritários, metodologia de planejamento e modelo de gestão, visando ao desenvolvimento sustentável da Região Nordeste e considerando como área de eleição a zona rural e o espaço semi-árido.” (Magalhães, 1994.) O Projeto Áridas teve como objetivos específicos: 2 Transformada em Superintendência do Desenvolvimento da Amazônia–Sudam, em 1966. 19 • formular estratégia geral para o desenvolvimento sustentável do espaço semi-árido e, por extensão, do meio rural do Nordeste, partindo da visão holística e integrada das variáveis econômicas, ambientais, sociais e políticas; • delinear as bases gerais − incluindo objetivos, diretrizes gerais e específicas, linhas de ação, critérios, instrumentos e metodologias − para a elaboração e implementação de políticas e programas sustentáveis; • delinear modelo de gestão descentralizada e participativa, para emprego na implementação das políticas e programas de desenvolvimento sustentável. Os estudos realizados de acordo com a estratégia do Projeto Áridas propiciaram a produção, dentre outros, de resultados como os seguintes: i. quarenta relatórios sobre temas relevantes (recursos naturais e meio ambiente, recursos hídricos, organização do espaço regional e agricultura, economia, ciência e tecnologia, políticas de desenvolvimento e modelo de gestão, recursos humanos e integração com a sociedade) e estudos especiais de interesse dos estados envolvidos na implementação do Projeto; ii. sete relatórios de grupos de trabalho (relativos aos temas mencionados no item anterior); iii. seis relatórios consolidados dos estados, reunindo as constatações e propostas dos grupos de trabalho, atinentes ao contexto estadual; iv. um relatório executivo, documentando os aspectos relevantes da execução do Projeto e a síntese das principais constatações, recomendações e produtos; e v. um relatório final do Projeto Áridas, com análise das condições de sustentabilidade atual e futura da Região, sua vulnerabilidade às secas e eficácia das políticas de governo. Na linha dos produtos gerados a partir dos relatórios mencionados, foram preparados trabalhos importantes, com a cooperação técnica do IICA e a participação de estados do Nordeste, dentre os quais se destaca a retomada do planejamento em escala estadual e sub-regional, no Nordeste. A este respeito, foram elaborados como base para a já mencionada retomada dos trabalhos de planejamento regional, nas escalas estadual e sub-regional, os seguintes planos e estratégias estaduais: i. Plano Estratégico de Desenvolvimento Sustentado do Estado do Piauí; ii. Ceará: Plano de Desenvolvimento Sustentável: 1995 - 1998; iii. Plano de Desenvolvimento Sustentável do Rio Grande do Norte; iv. Paraíba: Plano de Desenvolvimento Sustentável: 1996 - 2010; v. Pernambuco 2010: Estratégia de Desenvolvimento Sustentável; vi. Bahia: Plano Plurianual: 1996 - 1999. 20 Na linha dos delineamentos estabelecidos nos planos e estratégias estaduais, foram elaborados, também com a cooperação do IICA, os seguintes planos e programas sub-regionais: i. Piranhas; Programa de Valorização Agroindustrial do Vale do Piranhas, na Paraíba: Agropolo do ii. Programa de Desenvolvimento da Zona da Mata Paraibana; iii. Programa de Desenvolvimento das Zonas do Agreste e Brejo da Paraíba; iv. Plano de Desenvolvimento Sustentável do Sertão de Pernambuco; v. Plano de Desenvolvimento Sustentável da Zona da Mata Pernambucana; e vi. Programa de Desenvolvimento Sustentável do Semi-Árido Baiano: Projeto Sertão Forte. O IICA viabilizou, ainda, a extensão da experiência do Projeto Áridas a outras regiões, colaborando com a Secretaria Especial de Políticas Regionais-Sepre, 3 na elaboração dos seguintes planos para a Região Centro-Oeste: i. Plano de Desenvolvimento Sustentável para a Região Centro-Oeste–Planoeste; e ii. Plano de Desenvolvimento para a Região Integrada de Desenvolvimento do Distrito Federal e Entorno–Planride. Além dos estudos, planos, programas e estratégias, o IICA está promovendo a realização de cursos de desenvolvimento sustentável, com ênfase nas escalas municipal e sub-regional. Reconhece-se que boa parte dos resultados das experiências mais recentes parecem depender do planejamento e da execução de projetos destinados ao aproveitamento de vantagens comparativas e de vantagens competitivas, mobilizáveis no interior de espaços de menores superfícies territoriais (ou sub-regiões de tamanhos variados). A produção desses espaços tem sido realizada como resultado do desenvolvimento integrado de setores ou “clusters”, como passaram a ser denominados, no quadro dos novos paradigmas do desenvolvimento, os setores, subsetores e ramos econômicos. O conceito moderno de cluster está sendo trabalhado como correspondendo a “aglomerados de atividades econômicas afins” ou a “núcleos integrados de competitividade”. Do ponto de vista econômico, o cluster é considerando como “um agrupamento de empresas líderes, que comercializam produtos e/ou serviços competitivos em mercados estratégicos, e que são abastecidas por uma rede de fornecedores de insumos e serviços. Empresas e fornecedores, por sua vez, são apoiados por instituições que oferecem recursos humanos capacitados, recursos financeiros, tecnologia e infraestrutura física.” 4 3 A Sepre foi extinta em 1999, tendo seu espaço institucional sido coberto pelo Ministério da Integração Nacional, criado pela Medida Provisória nº 1.911-8, de 29.07.99. 4 Na conceituação de cluster aqui reproduzida, os “produtos e serviços competitivos são aqueles que têm maiores possibilidades de concorrer e permanecer em mercados estratégicos, gerando maior ingresso de divisas para um dado país”. (Bndes, 1997.) 21 No Nordeste, vem ganhando espaço a tendência a se atribuir a concretização de novas possibilidades de desenvolvimento à transformação de vantagens comparativas em vantagens competitivas. Os resultados das experiências pautadas por essa percepção parecem mostrar-se eficazes à inserção de economias sub-regionais dinâmicas no quadro de economias regionais mais desenvolvidas, ainda que ao custo de não considerar na devida conta as exigências sociais. Dar atenção particular a tais tendências significa deixar à margem ou tratar sem a necessária prioridade os problemas sociais. Considerando a matriz dos determinantes que responderam pela deflagração do processo de elaboração do Plano do Seridó, admite-se que os atores envolvidos em sua feitura estarão, por isso, atentos aos desdobramentos daquele segundo tipo de tendência – ausência de ênfase ou concessão de escassa prioridade ao social –, trabalhando para que a busca de soluções para os problemas locais, além de compatíveis com suas possibilidades, se coadunem com as diferentes dimensões do desenvolvimento sustentável: econômica, sociocultural, ambiental, científico e tecnológica e político-institucional. Além, pois, do cuidado com as inovações técnicas e conceituais trazidas pelo desenvolvimento, em época de globalização, e da busca por uma maior participação dos beneficiários, quer-se ainda preparar os diferentes atores sociais interessados na melhoria das condições de vida dos que vivem no Seridó para os desafios e tarefas inerentes ao processo de implementação do Plano em apreço, para que esse instrumento possa ser não apenas eficiente, mas eficaz, em relação às demandas das diferentes comunidades daquela região. 2.2 DESENVOLVIMENTO PLANEJADO NO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE As transformações que o Estado do Rio Grande do Norte vem experimentando, nas últimas quatro décadas, confirmam um padrão de desenvolvimento cujas características principais são a intensa urbanização, as elevadas taxas de crescimento econômico, a concentração de renda e os altos índices de exclusão social. A distribuição espacial, que nos anos 50 caracterizava uma sociedade tipicamente rural, com quase 70% da população habitando em áreas rurais, hoje evidencia traços marcantes de uma sociedade urbanizada, com 70% dos habitantes vivendo nas cidades. A economia do Rio Grande do Norte também mudou o seu perfil, com o crescimento das atividades industrial e de serviços, com destaque para as indústrias têxtil e de transformação, a construção civil, o comércio, as atividades petrolíferas e o vertiginoso crescimento do turismo. Como conseqüência, nos anos 70, 80 e 90, as taxas de crescimento econômico no estado situaram-se entre as maiores, no contexto da região nordestina. Ao lado desse dinamismo econômico, sem precedentes na história do Rio Grande do Norte, evidenciam-se os maiores índices de exclusão social nas cidades e no campo. Mais de 80% da população tem uma renda de até dois salários mínimos mensais. O índice de indigência, calculado pelo Instituto de Desenvolvimento Econômico e Meio Ambiente (Idema), órgão da administração indireta estadual, situa-se na faixa dos 46%, portanto, entre as maiores do Nordeste, chegando a mais de 50%, exatamente nos pólos agroindustriais do estado. Trata-se, assim, de um padrão de desenvolvimento econômico insustentável, pelos problemas de natureza econômica, social e cultural que produz, entre outras conseqüências, uma profunda exclusão social. Ao reconhecer as dificuldades daí advindas para a sociedade do Rio Grande do Norte, o governo do estado preparou, no período 1996/97, durante a primeira administração Garibaldi Alves Filho, o 22 Plano de Desenvolvimento Sustentável do Rio Grande do Norte. Nas palavras do Governador, “o processo de transformação da sociedade norte-rio-grandense iniciado neste governo, é pautado na prudência e uso racional dos recursos naturais renováveis e, principalmente, dos não-renováveis. Ele nos dá subsídios para promover o crescimento econômico, a melhoria da qualidade de vida e a redução das desigualdades sociais, tão visíveis no Rio Grande do Norte.” (Idec, 1997: 8.) O Plano de Desenvolvimento Sustentável do Rio Grande do Norte tem como objetivos gerais promover: • redução significativa da indigência, da pobreza e das desigualdades sociais no Estado; • uma elevação generalizada da qualidade de vida da população, melhorando os indicadores sociais do estado; • maior geração de renda e emprego para a população, distribuindo melhor os benefícios sociais resultantes da dinâmica econômica; • a dinamização da economia e o fortalecimento da base econômica, constituindo no estado novos focos de dinamismo da economia nacional; • a conservação dos recursos naturais e do meio ambiente, com a recuperação de áreas degradadas, o uso racional desses recursos, de forma a garantir, a longo prazo, a sustentabilidade do desenvolvimento no estado; • fortalecimento da cidadania e da organização e consciência da sociedade na sua participação social. (Idec, 1997: 46.) A partir desses objetivos, foram definidas diretrizes que orientam a atuação do Estado, como mentor e executor do Plano, assim expressas: • serão concedidas prioridades aos investimentos e gastos públicos e privados que aproveitem as potencialidades e vocações do Rio Grande do Norte como um todo e de suas diferentes regiões; • as iniciativas e mecanismos de intervenção manejáveis pelo Estado serão concentradas em atividades, setores e segmentos de maior efeito no combate à pobreza e às desigualdades sociais; • as ações estruturantes de reorganização da vida econômica e social no estado serão combinadas com medidas e iniciativas compensatórias, orientadas de forma imediata pela moderação das dificuldades sociais da população pobre, articulando as iniciativas estratégicas com as medidas de curto prazo; e • as iniciativas e medidas transformadoras da realidade estadual serão enfatizadas, daí se esperando grande impacto na reorganização do estilo de desenvolvimento, em particular no que se refere à criação de externalidades que viabilizem o aumento das vantagens competitivas do Rio Grande do Norte. (Idec, 1997: 47.) 23 O desenvolvimento do Rio Grande do Norte está pautado, em terceiro lugar, segundo a ótica do Plano referido, pela escolha de opções estratégicas sintetizadas na conservação dos recursos naturais e na reestruturação e democratização do Estado. O primeiro conjunto de opções abrange escolhas relacionadas ao desenvolvimento humano, ao desenvolvimento científico e tecnológico e à dinamização e reestruturação da base econômica, cada uma delas detalhada segundo as possibilidades atuais e os requerimentos do futuro desejado pela sociedade norte-rio-grandense. O segundo conjunto de opções está relacionado aos aspectos político-institucionais, caracterizados pela reestruturação e democratização do Estado, na linha das duas seguintes opções: i) consolidação do esforço de reestruturação da administração estadual; e ii) fortalecimento do movimento empresarial e das modernas formas de articulação entre Estado e Sociedade Civil. De acordo com essa estratégia, foi definido um amplo elenco de programas voltados para a solução das carências setoriais e espaciais do Rio Grande do Norte, estruturados conforme as seguintes categorias programáticas: i. política ambiental – conservação e uso dos recursos naturais; ii. desenvolvimento humano; iii. dinamização e reestruturação da base econômica; iv. desenvolvimento da base tecnológica; v. reestruturação e democratização do Estado. Para a implementação do Plano de Desenvolvimento Sustentável do Rio Grande do Norte foram identificados e estruturados três conjuntos de instrumentos: os financeiros e fiscais, os institucionais e os organizacionais. Considerando a particular importância dos instrumentos organizacionais, para uma bem sucedida implementação do Plano, eles foram tratados no quadro de um necessário e possível Modelo de Gestão, orientado por objetivos gerais, diretrizes específicas e estrutura institucional. Esse último elemento contempla a integração das instituições públicas, as relações Estado–Sociedade e a instituição de um Sistema de Planejamento Governamental. O governo do Estado do Rio Grande do Norte e todos os que participam do esforço consubstanciado nas orientações estabelecidas no Protocolo de Intenções firmado entre o governo estadual e demais instituições signatárias daquele Acordo, assim como nos direcionamentos estabelecidos no Projeto de Cooperação Técnica assinado pelo mesmo governo com o IICA, trabalharam para que o Plano de Desenvolvimento Sustentável do Seridó do Rio Grande do Norte fosse produzido com base nas evidências disponíveis sobre as possibilidades de promoção do desenvolvimento sustentável da Região do Seridó do Rio Grande do Norte. O Plano do Seridó teve sua elaboração comandada pela perspectiva de que o seu resultado há de ser consentâneo com a natureza e os rumos das mudanças requeridas pelos novos paradigmas do desenvolvimento sustentável, sem perder de vista as referências históricas propiciadas pelas experiências de desenvolvimento regional até hoje postas em prática no Nordeste brasileiro. A elaboração do Plano do Seridó teve abrangência e escopo similares aos das experiências do Projeto Sertão Forte, no semi-árido da Bahia; do Agropolo do Piranhas, na Paraíba; do Programa de 24 Desenvolvimento da Mata Paraibana; do Programa de Desenvolvimento do Agreste e Brejo da Paraíba; do Plano de Desenvolvimento do Sertão de Pernambuco e do Plano de Desenvolvimento da Mata Pernambucana, antes mencionados. Apresenta, entretanto, diferenças notáveis em relação àquelas experiências, tendo em vista a mobilização e a participação das comunidades da área objeto do Plano em seu processo de elaboração. Uma das características básicas do processo adotado (predominante em todas as suas etapas) foi, de fato, a participação efetiva dos diferentes atores da sociedade norte-riograndense como um todo e da área objeto de estudo, em particular. Assim, ao longo de todo o desenvolvimento dos trabalhos, houve inúmeras e produtivas discussões com as comunidades locais sobre particularidades relacionadas às novas possibilidades do desenvolvimento regional sustentável. As trocas de experiência vivenciadas beneficiaram-se produtivamente da herança legada pelos trabalhos da Igreja no Rio Grande do Norte e do Programa de Combate à Pobreza Rural-PCPR. Esse Programa deu seqüência às atividades conduzidas no mesmo sentido pelo Programa de Apoio ao Pequeno Produtor-PAPP. As experiências do PCPR e do PAPP foram positivamente animadas pelo Banco Mundial, que tem financiado os empreendimentos realizados por essas duas iniciativas. 2.3 RETOMADA DO DESENVOLVIMENTO DA REGIÃO DO SERIDÓ Tal como caracterizado no item 2.2 anterior, o padrão de desenvolvimento econômico hoje observado no Rio Grande do Norte ainda apresenta traços de forte insustentabilidade, dados os problemas de natureza econômica, social e cultural que produz, destacando-se uma profunda exclusão social. Esse quadro torna-se ainda mais grave nas regiões do estado com menor grau de desenvolvimento relativo, destacando-se, dentre elas, o Seridó. Essa região já foi caracterizada, em passado nem tão remoto – por volta dos anos 50 e 60 –, como a principal área de produção algodoeira do Rio Grande do Norte, além de centro de extraordinária importância em matéria de produção mineral e principal bacia leiteira do estado. Dadas as carências nela observadas, é imperioso cuidar de reverter a situação desfavorável ali encontrada, que tende a se agravar, no curto prazo, pelo impacto que oferece às populações rurais e urbanas, que vivem sem ocupação e não dispõem de renda, e pela degradação ambiental, fruto das práticas inadequadas de exploração dos recursos naturais, salientando-se, dentre elas, os elevados índices de desmatamento que sinalizam, em algumas áreas, para situações de completa desutilização do suporte físico. Para sanar as dificuldades encontradas, a descentralização foi definida como foco da estratégia da administração estadual, perfilando-se na prática um novo modelo de gestão participativa, como parte das mudanças do processo decisório para o nível municipal/comunitário. Esse processo teve início a partir dos Conselhos Municipais, concebidos e implementados com o apoio do PCPR, financiado com recursos do Estado do Rio Grande do Norte e do Banco Mundial. A prática vem mostrando que o processo em apreço ainda carece de maiores ações para ser consolidado e se tornar mais efetivo. Neste sentido, o PCPR poderá desempenhar papel relevante, em particular, por meio do aprimoramento do Fundo Municipal de Apoio Comunitário–Fumac. Inclui-se, neste sentido, sua experiência piloto – o Fumac-P –, com vistas à regionalização do planejamento sustentável no estado, por intermédio da qual as demandas mais imediatas serão incluídas em categorias de prioridade, por parte dos representantes dos governos estadual e municipais, além da sociedade civil. 25 Para regiões como o Seridó, o governo estadual ainda necessita intensificar suas ações de erradicação da pobreza, particularmente as levadas à prática com os instrumentos do PCPR, em articulação com outras estratégias e programas. Por isso, o governo do Rio Grande do Norte decidiu conceder prioridade e articular suas ações naquela região, mediante a elaboração de um Plano de Desenvolvimento Sustentável para a Região do Seridó. A preparação desse Plano representa um grande desafio, pois dele depende a definição de novos rumos para o seu desenvolvimento, centrado, em boa medida, em suas possibilidades endógenas, assim como na real e mutuamente comprometida integração sociedade civil e governo, repensando a natureza e o papel dos governos nessa integração. 26 3. DIAGNÓSTICO A formulação do Plano do Seridó foi realizada na perspectiva de que o seu resultado deve ser compatível com a natureza e os rumos das mudanças que vêm sendo exigidas pelos novos paradigmas do desenvolvimento sustentável, não se perdendo de vista as referências históricas propiciadas pelas experiências de desenvolvimento regional até hoje conduzidas no Nordeste brasileiro. Este é também o contexto que preside a elaboração deste capítulo, que se beneficiou extraordinariamente das contribuições aportadas por todas as instâncias que representam e constituem a sociedade do Seridó do Rio Grande do Norte. O capítulo contempla os aspectos fundamentais da realidade da Região do Seridó, resultante da identificação e análise dos fatores internos mais relevantes, que corporificam a situação atual e os determinantes do futuro da região, a partir de uma abordagem pautada pelos princípios da sustentabilidade, que implica visão agregada e integrada da região como um todo e, ao mesmo tempo, o tratamento desagregado e equilibrado entre as diversas dimensões do desenvolvimento sustentável: ambiental, tecnológica, econômica, sociocultural e político-institucional. Esse exame é completado, já em seu início, pela abordagem do espaço seridoense, em seus desdobramentos de espaço natural e de espaço produzido. Intenta-se, portanto, neste capítulo, a produção de uma interpretação histórico-estrutural do desenvolvimento socioeconômico da região, no âmbito do Estado, da Região Nordeste e das economias nacional e internacional. As descrições e análises sobre o espaço seridoense e cada uma das dimensões do desenvolvimento sustentável, referidas às especificidades da região em estudo, desdobram-se na identificação dos seus principais problemas (incluindo tanto as condições indesejáveis como os pontos de estrangulamento) e de suas potencialidades (qualificadas por fatores ou processos favoráveis ao desenvolvimento com sustentabilidade). No percurso aqui seguido são, em conseqüência, ressaltadas as convergências e divergências dos atores sociais, que possam vir a estimular ou a inibir o desenvolvimento de setores e atividades da região, agregados naquelas dimensões. Do processo construído durante esse percurso foram extraídos elementos capazes de definir o perfil atual da realidade e antecipar as perspectivas futuras da Região do Seridó. O Diagnóstico é, além disso, produto de um contínuo processo de articulação, técnica e política, conduzida segundo a percepção e os anseios da sociedade e dos atores sociais da região. Os resultados e proposições que dele constam configuram, assim, uma apreciação sintética dos principais aspectos da realidade seridoense, captados, criticados, sintetizados e mediados pelo processo de mobilização e participação/consulta à sociedade. O capítulo envolve, assim, o estudo dos aspectos a seguir referidos, concernentes à realidade do Seridó do Rio Grande do Norte: i. ii. iii. iv. v. vi. vii. abordagem espacial; dimensão ambiental; dimensão tecnológica; dimensão econômica; dimensão sociocultural; dimensão político-institucional; e ambiente externo. 27 3.1 ABORDAGEM ESPACIAL Localizada em pleno interior do Nordeste Semi-Árido, em área de solos de baixíssima fertilidade, a não ser nos escassos terrenos de baixadas aluviais, a Região Natural do Seridó 5 está submetida a um dos mais característicos regimes de escassez e desigual distribuição de chuvas observados no Nordeste. Ali, as chuvas falham com freqüência, dando lugar à ocorrência de secas, totais (quando afetam toda a região) ou parciais, de duração anual (quando ocorrem em anos intercalados) ou plurianual (quando se estendem por períodos superiores a um ano). Parciais ou totais, as secas provocam fortes impactos sobre a economia (em particular sobre as atividades agropecuárias), a população (reduzindo e, no limite, eliminando renda e emprego) e o meio ambiente (diminuindo ou eliminando a cobertura vegetal de amplas áreas, contribuindo para o aumento da erosão do solo, por natureza raso e pedregoso, em quase todas as partes da região). Embora a agropecuária venha perdendo importância no conjunto de atividades que respondem pela geração do Produto Interno Bruto-PIB regional, os efeitos da crise de produção determinada pelas secas continuam sendo proporcionalmente elevados, mais sobre as atividades agrícolas, do que sobre as não-agrícolas. Os prejuízos econômicos do comércio em geral e da indústria são de natureza indireta, resultado da retração econômica provocada pela queda da produção agrícola e pastoril nos anos de seca. Esses prejuízos passaram a ser potenciados dos anos 90 para cá, com a redução do volume de recursos despendidos com a população afetada pelas irregularidades climáticas, por intermédio dos Programas de Emergência de Seca. O maior volume desses recursos provinha do governo federal, pesando muito pouco (em termos absolutos e relativos) a contribuição dos governos estaduais e mais ainda a dos governos municipais. Esse é um retrato recorrente do Nordeste semi-árido, como um todo, ao qual o Seridó Norte-riograndense não está, em absoluto, infenso. As descrições aqui aportadas refletem a vulnerabilidade ambiental, a variabilidade do clima e a insustentabilidade da economia dos espaços nordestinos, historicamente submetidos às vicissitudes das secas. Em particular, são apresentados a seguir elementos básicos sobre os seguintes pontos da problemática espacial do Seridó do Rio Grande do Norte: i. ii. iii. iv. v. O Território do Seridó no Contexto do Nordeste Brasileiro; Estruturação e Ocupação do Espaço do Seridó; A Diferenciação Interna; Regionalização Adotada; e Elementos para o Ordenamento Territorial do Seridó. 3.1.1 O Território do Seridó no Contexto do Nordeste Brasileiro O Nordeste brasileiro, integrado pelos Estados do Maranhão, Piauí, Ceará, Rio Grande do Norte, Paraíba, Pernambuco, Alagoas, Sergipe e Bahia, abrange uma área de 1.548.672km². Incluindose o território da Área Mineira do (antigo) Polígono das Secas tem-se uma superfície de 1.662.947km², que corresponde ao espaço conhecido como Nordeste da Sudene. Esse território foi recentemente ampliado em mais 74.246,40 km², com a inclusão de terras do noroeste do Espírito Santo 5 Tanto do Rio Grande do Norte, como da Paraíba e do Ceará. Os estudos mais importantes sobre as regiões naturais do Nordeste, como um todo, e a região natural do Seridó, em particular, foram produzidos por Guimarães Duque (1953 e 1964) e Vasconcelos Sobrinho (1970). 28 (24.432,70 km²) e de novas áreas de Minas Gerais − agora situadas no Vale do Jequitinhonha (49.813,70 km²). 6 Hoje, portanto, o Nordeste da Sudene cobre uma superfície de 1.737.193,40 km². Com a edição da Lei nº 9.690/98, foi alterada a superfície da Região Semi-Árida do Fundo Constitucional de Financiamento do Nordeste–FNE Anteriormente, com 900.485km², 7 essa área correspondia a 54,1% do espaço de atuação da Sudene. Agora, totalizando 974.731,40 km², equivale a 56,11% da nova área de atuação da Sudene. O Rio Grande do Norte tem uma superfície de 53.306,80 km², dos quais 48.343,60 km² estão inseridos na Região Semi-Árida do FNE. 8 O semi-árido norte-rio-grandense corresponde a 90,69% do território estadual. Trata-se, portanto, de uma das unidades federadas do Nordeste com maior percentual de seu território incluído em áreas semi-áridas, no âmbito do estado. Como espaço natural, o Seridó constitui uma importante região natural do semi-árido nordestino, figurando com particular importância ao lado das regiões que integram os espaços afetados pelas secas no Nordeste, integrados pelas regiões naturais de Sertão, Caatinga, Curimataú, Cariris Velhos, Carrasco e Serras. O Seridó do Rio Grande do Norte tem particularidades muito especiais, referidas muito mais à história e à cultura, que a população desse território conseguiu engendrar. Sem trabalhar as especificidades naturais da região fica, porém, muito difícil compreender as características econômicas e socioculturais do Seridó norte-rio-grandense. Guimarães Duque, um dos mais argutos pesquisadores dos ambientes semi-áridos do Nordeste, produziu uma das mais precisas caracterizações do Seridó. Tratando das questões técnico-materiais do semi-árido nordestino ou do Polígono das Secas, como eram então denominadas, oficialmente, as áreas afetadas pelas secas, Duque definia assim os principais traços da paisagem do Seridó: “A região se caracteriza pela vegetação baixa, de cactos espinhentos e agressivos, agarrados ao solo, de arbustos espaçados, com capins de permeio e manchas desnudas, em terra procedente do Arqueano, muito erodida e áspera; os seixos rolados existem por toda a parte e as massas de granito redondo sobressaem, aqui e ali, demonstrando como a erosão lenta, através dos séculos, deixa vestígios ciclópicos.” Conforme suas observações, as chuvas no Seridó Rio-grandense ocorrem de janeiro a maio, com variações de 127 mm a 916 mm, por ano, como aconteceu no período de 1930 a 1955, apresentando valor médio de 497 mm, anuais, em Cruzeta. “O mapa das isoietas de 22 anos, apresenta esse Seridó envolvido pelas chuvas de 400 a 600 mm.” Como não há orvalho, a “insolação média é de 2.988 horas de luz solar, por ano,” e a temperatura média das máximas é de 33ºC e a das mínimas de 22ºC; o índice de aridez, é elevado, correspondendo a 3,3.” (Duque, 1964: 61.) 6 Esses acréscimos resultaram da consolidação e aprovação de Projeto de Lei apresentado, em 1992, pela Senadora Júnia Marise, de Minas Gerais, ao qual foram acrescentadas emendas de Deputados Federais do Estado do Espírito Santo. A matéria foi transformada na Lei nº 9.690, de 15.07.98, quando foi sancionada pelo Presidente da República. Sua publicação no Diário Oficial da União ocorreu no dia 16.07.98. 7 O semi-árido nordestino oficial abrange parte do Norte de Minas Gerais, incluída na antiga figura do Polígono das Secas. Essa categoria territorial foi extinta com a edição da lei que instituiu o Fundo Constitucional de Financiamento do NordesteFNE (Lei nº 7.827/89). Em seu lugar, tem-se hoje a Região Semi-Árida do FNE, integrada, atualmente, em Minas Gerais, apenas por uma parte da antiga Área Mineira do Polígono das Secas. Os 74.246,40 km² acrescentados ao território do Nordeste, em conseqüência das disposições da Lei nº 9.690, de 15.07.98, integram a área de atuação do FNE, expandindo, mais uma vez, os limites do semi-árido nordestino oficial. 8 Veja-se, a respeito: LINS & BURGOS, 1989, onde se encontram os antecedentes e a configuração da Região Semi-Árida do FNE. 29 Segundo as pesquisas realizadas por Guimarães Duque, a Região Natural do Seridó do Nordeste cobre uma superfície de 33.669, 250 km², distribuídos entre os Estados do Ceará, Paraíba e Rio Grande do Norte, de conformidade com os dados da tabela 3.1.1.1, adiante. O Seridó Norte-rio-grandense compreende uma área correspondente a 23.55% do total dessa região natural, equivalente a 7.928,70km². Nessa área estavam incluídos, até os anos 50, os seguintes municípios (12 no total): Acari, Caicó, Currais Novos, Jardim de Piranhas, Jardim do Seridó, Parelhas, São João do Sabugi, Serra Negra, Cruzeta, Carnaúba dos Dantas, Ouro Branco e São Vicente. 9 TABELA 3.1.1.1 SUPERFÍCIE DA REGIÃO NATURAL DO SERIDÓ NO NORDESTE, POR ESTADO ESTADOS Rio Grande do Norte Paraíba Ceará TOTAL MUNICÍPIOS ÁREA (km²) % SOBRE O TOTAL Currais Novos, Acari, Parelhas, Jardim do Seridó, Jardim de 7.928,700 23,55 Piranhas, Caicó, São João do Sabugi, Serra Negra, Cruzeta, Ouro Branco, São Vicente e Carnaúba dos Dantas (12) Santa Luzia, São Mamede, Patos e Brejo da Cruz (04) 5.177,500 15,38 Frade (atual Jaguaretama), Quixeramobim, Quixadá, Canindé, Irauçuba, Solonópolis, Boa Viagem, Capistrano, Itapiuna, General 20.563,000 61,07 Sampaio e Apuiarés (11) 27 33.669,250 100,00 FONTE DOS DADOS BÁSICOS: DUQUE, J. G. (1964)- O Nordeste e as lavouras xerófilas. 1. Ed. Fortaleza, BNB, 1964, p. 61-66 A superfície da Região do Seridó, como muitas outras regiões, teve seu território ampliado por critérios políticos, administrativos e culturais, variando seus contornos, ao longo de sua história. José Augusto Bezerra de Medeiros assinala, em seu livro Seridó, publicado em 1952, que as terras da região em estudo cobriam, naquela época, uma superfície de 9.332 km², dela fazendo parte os municípios de Acari, Currais Novos, Florânia, Jardim do Seridó, Jucurutu, Parelhas e Serra Negra do Norte. (Medeiros, 1952: 9-10.) Entretanto, o Seridó norte-rio-grandense, política e administrativamente delimitado pelo Ibge, tem uma configuração distinta da que foi sendo construída de acordo com as especificidades históricas e culturais da região. Para o Ibge, o Seridó é integrado por duas Microrregiões Geográficas – a do Seridó Ocidental e a do Seridó Oriental –, abrangendo uma superfície de 6.970,60 km². Integram as duas microrregiões 17 municípios, conforme se especifica a seguir: i. Microrregião Geográfica do Seridó Ocidental (07 municípios): Caicó, Ipueira, Jardim do Piranhas, São Fernando, São João do Sabugi, Serra Negra do Norte e Timbaúba dos Batistas; e ii. Microrregião Geográfica do Seridó Oriental (10 municípios): Acari, Carnaúba dos Dantas, Cruzeta, Currais Novos, Equador, Jardim do Seridó, Ouro Branco, Parelhas, Santana do Seridó e São José do Seridó. Pode-se e se deve, entretanto, salientar os fatos que contribuem para determinar os limites espaciais do Seridó, segundo as características históricas e culturais que fazem desse espaço uma região com feição marcadamente norte-rio-grandense. Pela via dos determinantes da cultura, seu território sobrepassa os limites do espaço natural, para assumir uma configuração econômica e sociocultural, que 9 Formalmente, os Municípios de Cruzeta, Carnaúba dos Dantas, Ouro Branco e São Vicente só passaram a integrar o Seridó norte-rio-grandense depois de 1953, quando foram criados por desmembramento de outros municípios seridoenses. 30 lhe é específica. O peso dessa região é extremamente forte, pois o cidadão que nasce no Seridó do Rio Grande do Norte, antes de ser potiguar, é seridoense. O Seridó paraibano ainda partilha características peculiares do Seridó norte-rio-grandense, pois seu processo de evolução histórica, inclusive religiosa, está muito próximo do Seridó norte-riograndense. O mesmo não acontece com o Seridó cearense, cujas semelhanças com aqueles dois espaços fica restrita aos aspectos físicos, notabilizadas por seus inselbergs, paradigmatizados pela “Pedra da Galinha-Choca”, constitutiva de um dos principais ícones da paisagem do Município de Quixadá, no Ceará. Na realidade, essas distinções se devem à história e à cultura estabelecida na Região Natural do Seridó do Ceará, apesar de ali a pecuária, o algodão e a mineração terem também se constituído em atividades importantes, mas com percursos distintos, seja pelos desdobramentos econômicos, seja pelos socioculturais. Para os efeitos deste Plano, os limites do Seridó norte-rio-grandense encontram-se hoje delineados. Em 1989, a região contava com 20 municípios, assim especificados: Acari, Caicó, Currais Novos, Jardim de Piranhas, Jardim do Seridó, Parelhas, São João do Sabugi, Serra Negra, Cruzeta, Carnaúba dos Dantas, Ouro Branco, São Vicente, Florânia, Ipueira, Jucurutu, Lagoa Nova, Santana do Seridó, São Fernando, São José do Seridó e Timbaúba dos Batistas (mais oito municípios). Desmembramentos posteriores e acréscimos de outros municípios fizeram com que fossem agregados à região outras oito unidades municipais, assim denominadas: Bodó, Campo Grande, Cerro Corá, Equador, Santana do Matos, São Vicente, Tenente Laurentino Cruz e Triunfo Potiguar. Esses municípios integram quase que integralmente a Microrregião Homogênea Serrana Norte-RioGrandense, do Ibge. Com a inclusão daqueles oitos municípios a Região do Seridó norte-rio-grandense, conta, presentemente, com 28 municípios, no quadro da regionalização descrita adiante. Suas particularidades, além das assinaladas por Guimarães Duque, foram salientadas, também do ponto de vista físico, por estudos recentes, como o realizado pelas Consultoras Tecnosolo & CEP, para a Federação das Indústrias do Rio Grande do Norte-Fiern, sobressaindo as seguintes: • Seridó do Rio Grande do Norte tem aspectos físico-climáticos bastante específicos. Do ponto de vista hidrográfico, por dispor de uma rede fluvial constituída por rios não-perenes. Excetuados os anos de seca, eles apresentam dois ciclos perfeitamente caracterizados: um, com escoamento, durante o período chuvoso, e outro, sem escoamento ou seco, na época de estiagem, tão logo cessam as chuvas; • a geologia da região é constituída, predominantemente, pelo cristalino, circunstância que aliada ao poder erosivo das chuvas torrenciais dá origem a solos rasos que impedem o acúmulo de água no seu perfil e a conseqüente descarga de base. O clima da região é classificado como muito quente e semi-árido, com a estação chuvosa se atrasando para o outono. Propicia, por isso, um acentuado déficit hídrico anual; • seus solos pertencem, dominantemente, à categoria dos Bruno Não-Cálcicos, caracterizados pela escassa profundidade e elevada suscetibilidade à erosão. Apresentam aptidão agrícola limitada, por conta da ação conjunta de fatores como relevo, vegetação e regime hídrico. Apresentam acentuada deficiência de água, alta pedregosidade na superfície, pouca profundidade efetiva e alta suscetibilidade à erosão. Por isso, é difícil encontrar faixas amplas e contínuas de terras 31 cultiváveis. Daí a necessidade de tecnologias especiais para o seu aproveitamento, como as de “cultivo mínimo, plantio em nível, cobertura permanente do solo, especialmente durante a estação das chuvas.” O tipo de agricultura e as práticas culturais primitivas, não adaptadas ao manejo adequado de solo, vem diminuindo progressivamente a capacidade produtiva dos solos, por conta de sua degradação, sendo possível, atualmente, encontrar grandes extensões de terras que devem deixar de ser exploradas, daí decorrendo a urgência de restaurar a vegetação de cobertura. (Consórcio Tecnosolo & CEP, 1999: v. 3, 327-328.) A ocupação dessa região foi efetuada sob o embalo de verdadeiras epopéias. Os fazendeiros que fizeram o Seridó, vindos da Corte e de outras partes do País, ocuparam a duras lutas boa parte do ecúmeno pastoril do Nordeste. Ao seu lado, apoiando ou dissentindo, estiveram os nativos – mestiços e índios, forros ou não –, encarregados da faina de organizar a produção, trazendo e levando gados (como os do Piauí), mantimentos e outros produtos necessários à criação de vida, riqueza e fixação dos brancos de fora. Esse numeroso conjunto de mão-de-obra barata foi pacífico e violento – trabalhando, estruturando seita ou invadindo propriedades. A ocupação do interior adusto, que atraía mais por sua vastidão do que pela abundância de recursos, não foi uma mera expedição aventurosa, na qual se sobressaíam os senhores. Dela também fez parte aquela abundante porção de nativos e mestiços, no seio da qual também chegaram a se salientar os que haveriam de ensejar a formação de outros senhores – da terra, dos homens e do poder. Integraram esse conjunto distinto, pouco referido, do exército dos supostos vencidos, os fanáticos e os cangaceiros. Em seu extremo, constituíram os dois tipos esquemáticos da realidade social, cheia de nuanças e complexidade. Tal como foi tratado por Djacir Menezes, em O Outro Nordeste, 10 aquele extremo foi caracterizado pelos “dois pólos da reação do homem sertanejo contra todas as condições sociais, que agravam injustiças seculares. A reação do que procura conjurar os males, que o esmagam, recorrendo aos processos mágico-animistas de antepassados – o fanático. A reação do que se ergue, instintivamente, contra algo que não sabe o que é nem como definir, iniciando a crônica sinistra do crime e do latrocínio – o cangaceiro. A reação violenta no plano místico; e a reação forte, no plano histórico. O fanático procura vencer os obstáculos que o constrangem como o primitivo vencia as hostilidades naturais. ‘Vê’ o mundo social – melhor seria ‘sente’ – através de forças instintivas e cegas, colorindo-o na subjetividade animista, com a sua técnica, a sua magia. (...) O cangaceiro é a reação violenta. Em geral, do tipo hígido, cuja história começa numa injustiça cometida pela politicagem local.” E mais: “na sua percentagem mais ativa, as hordas do cangaço contam os tarados, os degenerados anti-sociais atraídos pelo crime. Todo o grosso da matula social se recruta pelo crivo social.” Incrível é verificar que, “Depois de tantas páginas comovidas de Euclides, ainda não se organizou o processo de atividade normal, que os incorpore à produtividade laboriosa." (Menezes, 1970: 19.) Essas injustiças também foram vistas por autores reconhecidos, em matéria de Seridó, com a visão típica dos vencedores, como José Augusto, que afirma: “O povoamento da região começou no fim do século XVII, quando da guerra dos bárbaros, luta que durou muitos anos e durante a qual, após crueldades inomináveis, o homem civilizado exterminou os selvagens que habitavam as margens do rio Açu e seus afluentes, um dos quais, como se sabe, é o rio Seridó.” (Medeiros. 1952: 10.) A continuidade do processo de povoamento foi viabilizada com a exterminação dos índios. Depois vieram os homens chamados homens brancos, com todo o aparato de sua estrutura de 10 Em complemento ao “Nordeste” (da cana-de-açúcar), escrito por Gilberto Freyre, publicado em 1937. (Freyre, 1985.) 32 colonização. Teve como ápice da conquista a emancipação administrativa do Seridó, que se deu em 31 de julho de 1788, por intermédio do alvará de criação do Município de Vila Nova do Príncipe, atual Caicó. Com o desenvolvimento demográfico, político, social e econômico, surgiram outros municípios, a partir de povoações mais densas, como o de Acari, Jardim do Seridó e Serra Negra – ainda no período monárquico –, Currais Novos, Flores (hoje Florânia), Parelhas e Jucurutu – após a proclamação da República. (Medeiros, 1952: 12.) A população do Seridó cresceu extraordinariamente, desde a consolidação do Município de Vila do Príncipe. De um total de 3.630 habitantes, em 1782, passou para 6.276 (em 1824), 15.921 (em 1855), 31.281 (em 1872), 40.514 (em 1890), 41.800 (em 1900), 85.840 (em 1920), 127.027 (em 1940) e 140.459 (em 1950). (Medeiros, 1952: 13.) Respeitados os aumentos resultantes da ampliação do número de municípios, a população do Seridó elevou-se para os 289.767 habitantes, ali residentes em 1996. Não fora a relativamente limitada capacidade de suporte dos recursos naturais – potenciada pelas crises que passaram a afetar as atividades do complexo pecuária-algodão-lavouras alimentares e da mineração –, o Seridó poderia ser habitado por um maior contingente populacional. As migrações provocadas por fatores de expulsão (como as secas periódicas) ou por fatores de atração (a exemplo das possibilidades de emprego e serviços diversos, como os de educação e saúde) contribuíram para relativizar os números absolutos da população seridoense, ao longo do período de sua ocupação. Esse processo, em muitos sentidos, benéfico, responde ainda hoje pela redução considerável da população regional, tanto da que reside em áreas rurais como urbanas. As cidades e vilas da região talvez abrigassem, em 1996, em sítios urbanos, um número maior de pessoas do que os 68,13% da população total (197.419 habitantes), não fossem as migrações, de origem rural e urbana, com destino urbano. 3.1.2 Estruturação e Ocupação do Espaço do Seridó Com a pecuária, o Seridó representou o sustentáculo do povoamento das Capitanias de Pernambuco, Itamaracá e da Paraíba. A pecuária de início e o algodão, bem mais tarde, a par com o cultivo de lavouras alimentares, nas terras mais férteis, de permeio com a cultura algodoeira, constituíram a matriz básica das atividades econômicas do Seridó. A atividade pastoril e, mais do que ela, o algodão foi importante para assegurar e ampliar o assentamento das famílias que se instalaram no Seridó. Mas a produção algodoeira, englobando tanto a produção agrícola como a agroindustrial – impulsionada pelo “locomóvel”, a primeira máquina descaroçadora de algodão, usada na região – foi mais importante para a expansão da economia e para a estruturação e sustentação das cidades da região. A integração das atividades da pecuária, do algodão e das lavouras alimentares vigorou por mais de um século no Seridó. Lastreadas em explorações dependentes, diretamente, das chuvas, algumas delas foram também desenvolvidas, no curso da evolução econômica regional, em regime de irrigação. Foi o que aconteceu, de início, com as obras de açudagem e os experimentos de irrigação e drenagem, conduzidos pela antiga Inspetoria Federal de Obras Contra as Secas–IFOCS e, na seqüência, pelo DNOCS, dos anos 20 aos anos 50 do século XX. Expandidos os experimentos pelo setor público (federal e estadual), os benefícios da irrigação conseguiram chamar a atenção do setor empresarial para as possibilidades agricultura irrigada, sempre que as condições de solo e água permitem. A mineração constituiu outra importante fonte de expansão econômica no Seridó, tendo sido ali introduzida por volta dos anos 30/40, do século XX. Suas possibilidades centraram-se em minerais 33 como a tantalita – com jazidas importantes nos Municípios de Jardim do Seridó, Parelhas, Acari e Currais Novos –, o berilo, a scheelita (com reservas de minérios e indústrias localizadas em Currais Novos, Caicó, Serra Negra, Jardim do Seridó e Parelhas) e a cassiterita. (Medeiros, 1952: 86.) Com seu aproveitamento, o Seridó cresceu, gerou riquezas e empregos; importou e criou tecnologias; construiu fama e estima; fez história e cultura; 11 e ampliou sua participação nas esferas políticas de decisão do Rio Grande do Norte. 12 Estes foram os elementos básicos da estruturação do espaço econômico do Seridó. Veio, em seguida, sua desarticulação, com a crise da economia algodoeira e da mineração. Essa desarticulação não teve caráter final, terminativo, de falência geral da economia e das instituições, como as que aparecem em cidades que não sobrevivem ao final de certos ciclos econômicos. É verdade que no Seridó, mais do que no Estado do Rio Grande do Norte, o padrão de desenvolvimento atualmente observado ainda apresenta traços de forte insustentabilidade, dados os problemas de natureza econômica, social e cultural que produz, destacando-se elementos básicos de exclusão social, que tem forçado sua população a migrar para a capital do Estado e para outras regiões do País. Observa-se, presentemente, que as atividades mais tradicionais, que produziram certo fausto na região, apresentam dinâmica bem mais lenta. O espaço econômico do Seridó continua integrado por aquelas atividades e por outras – em processo de estruturação – como as da pecuária leiteira, ainda alicerçada em forte apoio oficial. Trata-se esta, entretanto, de atividade dinâmica, pois graças a ela, a região conseguiu transformar-se na segunda bacia leiteira do Rio Grande do Norte. Além da pecuária leiteira, está sendo reestruturada a caprino-ovinocultura, estrutura-se a cajucultura, fortalece-se a agroindústria (com derivados de produtos de origem animal) – em bases artesanais e modernas –, expande-se a indústria em geral e se mantém o ritmo do comércio e dos serviços, nos dias atuais. As novas atividades ainda carecem de uma dinâmica mais específica. A indústria do Seridó, por exemplo, está caracterizada por atividades de baixo consumo de energia. Excetuam-se, a respeito, as atividades de cerâmica, ainda responsáveis, em boa medida, pelo avanço observado sobre os recursos naturais de origem vegetal. De todo modo, a indústria, é pautada por processos tecnológicos dotados de reduzida complexidade e, em conseqüência, geradores de baixo valor agregado. As indústrias existentes abrangem desde pequenas unidades manufatureiras (como padarias e confecções) até empresas de grande porte, como as até hoje ligadas à indústria extrativa mineral, de que constitui exemplo a Wah Chang/Teledine. 13 Os ramos industriais abrangem indústrias processadoras de alimentos, tanto de matérias-primas produzidas na região – como a mandioca, o leite, o caju, o couro e o algodão–, quanto oriundas de fora do Seridó, como o café, trigo, borracha sintética e tintas, dentre as principais. (Consórcio Tecnosolo & CEP, 1999: v. 2, 197.) 11 Exemplo dessa produção, na área literária, foi dado pelo escritor currais-novense José Bezerra Gomes, que escreveu, nos anos 30 e 40, os seguintes romances: “Os Brutos” (de 1938), “Por que não se Casa, Doutor” (de 1944) e “A Porta e o Vento” (publicado em 1974).Esses romances foram republicados, em 1998, pela UFRN, em Obras Reunidas. O primeiro deles – “Os Brutos” – constitui um dos marcos do ciclo literário da economia algodoeiro-pecuária nos Sertões do Rio Grande do Norte. A cultura do Seridó está sendo reforçada agora com dois novos romances, ainda inéditos, da lavra de Janúncio Bezerra de Melo, professor da UFRN e escritor de Caicó: “Vida Bruta” e “Sementes de Sangue”. Neles, trata de coronéis e de cangaço; do desenvolvimento pretérito da pecuária; e das dificuldades por que passa a economia do Seridó. 12 A importância da expansão pastoril no Seridó foi tratada recentemente em romance de um outro nordestino. Trata-se do livro de Ésio de Souza, “No Rastro do Boi: conquistas, lendas e mitos”. (Souza, 2000.) 13 Empresa de grupo canadense. Baseado em entrevista realizada com o geólogo e professor da UFRN, Edgard Dantas, realizada em Natal-RN, no dia 17.12.99, com a participação de Otamar de Carvalho, Mardone C. França e Ronaldo de Alencar Fernandes. 34 A Região do Seridó concentrava 9,4% do número de empresas existentes no Rio Grande do Norte, em 1998, segundo o Cadastro Industrial produzido pela Federação das Indústrias do Estado do Rio Grande do Norte–Fiern e o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística–Ibge. Sua distribuição pelas Zonas Homogêneas–ZH do Seridó, em relação ao total do Estado, era a seguinte: ZH de Caicó (4,9%), ZH de Currais Novos (4,1%) e ZH das Serras Centrais (0,4%). O percentual de empresas ali existente reflete o peso econômico de cada uma daquelas zonas. O comércio caminha a braços com a indústria. Está relacionado à distribuição de alimentos, de remédios, de autopeças, de veículos, de materiais de construção e de atividades ligadas ao dia-a-dia urbano. O comércio de insumos agrícolas também apresenta peso específico considerável. (Consórcio Tecnosolo & CEP, 1999: 199, v. 2.) Essas atividades são fortemente afetadas pelas festas das padroeiras 14 das principais cidades da região. (Medeiros, Org., 1997.) Além do turismo ligado às festas religiosas, também é explorado o ecoturismo, baseado no potencial – ainda pouco explorado – oferecido pelos açudes (de maior porte) existentes na região. Embora os padrões tecnológicos ainda sejam mais para o tradicional, a informática já marca visível presença nos negócios da região. Há empresas ligadas ao setor agropecuário que utilizam máquinas (computadores pessoais) e softwares destinados à melhora da gestão e ao aumento do rendimento de suas atividades. Essa presença é mais acentuada na indústria, no comércio e nos serviços. Profissionais autônomos também fazem uso de novos recursos da informática, como é possível observar em relação aos que se acham ligados aos centros universitários existentes na região ou aos negócios, em cidades como Caicó e Currais Novos. A reestruturação econômica, em curso, pauta e, ao mesmo tempo, depende da evolução de seu quadro demográfico. Com uma população estimada para o ano 2000 de, aproximadamente, 294 mil pessoas, o Seridó abrigará, neste ano, cerca de 11% da população do Rio Grande do Norte. Esse contingente populacional estará desigualmente distribuído nas três Zonas Homogêneas-ZH da região. Em 2000, a população da ZH de Currais Novos será de 94 mil, a de Caicó de 115 mil e a da Serras Centrais de 85 mil. A população do Seridó deverá continuar residindo, predominantemente no meio urbano. Essa predominância, encontrada na região como um todo, é maior nas ZH de Caicó (77,4%) e de Currais Novos (75,7%). Na ZH das Serras Centrais, a população urbana corresponde a 47,8% da população total, observando-se, até 1996, a predominância da população rural.. A dinâmica demográfica do Seridó apresenta traços semelhantes à observada em relação ao Rio Grande do Norte, ao Nordeste e ao País, em seu conjunto, registrando desaceleração, atribuída, em boa medida, à redução do número de filhos em cada família. Na década de 70, verificou-se uma expansão da população de 0,86%, ao ano, expansão que se mostrou um pouco maior no período entre os censos de 1980 e 1991 (1,11%). De 1991 a 1996, houve um declínio significativo, com uma taxa anual de crescimento demográfico de apenas 0,33%. Destaque-se que o Seridó, em todas esses períodos, apresentou crescimento bem menor do que o Estado em seu conjunto. As carências observadas no Seridó podem vir a se agravar, no curto prazo, dado o impacto que exercem sobre suas populações, rurais e urbanas, que vivem sem ocupação, sujeitas, além disso, à degradação ambiental, como fruto das práticas inadequadas de exploração dos recursos naturais. 14 Com destaque para a de Santana, em Caicó, onde ocorre a festa religiosa mais importante da região. 35 Salientam-se, neste sentido, os elevados índices de desmatamento, os quais sinalizam, em algumas áreas, para situações de completa desutilização do suporte físico, chegando a demonstrar, em outras, fortes evidências de processos (quase) irreversíveis de desertificação. 3.1.3 A Diferenciação Interna Os Sertões do Nordeste, de acordo com a regionalização produzida por Mário Lacerda de Melo, são integrados por Áreas Agropastoris com Combinações Agrícolas Sertanejas (Sertão Sul) e por Áreas do Sistema Gado-Algodão (Sertão Norte). (Melo, 1978.) O Sertão Sul, que interessa mais aos Estados da Bahia e de Pernambuco, é extenso e diversificado, em relação aos recursos e condições naturais, tanto no que se refere às combinações de atividades econômicas como no que toca aos domicílios das populações que o habitam. Ali, onde dominam “os sistemas Agropastoris com Combinações Sertanejas, essas diversificações são muito numerosas, o que é óbvio em uma porção territorial de 354.957 km², povoada e explorada pelo homem desde a segunda metade do século XVI. Apesar de distante do litoral, o chamado Sertão Sul apresenta peculiaridades que diversificam suas várias porções, tanto levando em conta as características ecológicas como os sistemas de utilização dos recursos pelo homem.” (Andrade, 1984: 39.) O Sertão Norte compreende pequena parte das terras de Pernambuco e boa parte dos territórios da Paraíba, Rio Grande do Norte e Ceará, onde predominaram por muito tempo as atividades do complexo pecuária-algodão-lavouras alimentares. (Silva & Andrade Lima, 1982: 79.) Aludido espaço cobre uma superfície de 210.104 km², os quais, somados à área do Sertão Sul, espalham-se por uma longa faixa territorial de 565.061 km² de Nordeste. O Sertão Sul e o Sertão Norte formam um verdadeiro “paredão” entre os territórios do Litoral e Agreste e os espaços mais interiores do Nordeste, integrados por partes da Bahia, Piauí e Maranhão. Esse “paredão” vai do sudeste da Bahia até o “saliente nordestino”, ou seja, a parte mais setentrional da Região, situada na porção mais extrema do litoral do Rio Grande do Norte. No Seridó norte-rio-grandense as diferenças mais notáveis resultam da natureza do processo de ocupação, antes referido. Os espaços caracterizados por maior desenvolvimento relativo estão inseridos nas ZH de Caicó e de Currais Novos, pois foram neles onde se instalaram e se expandiram, mais precisamente, as atividades do complexo algodoeiro-pecuário e da indústria extrativa mineral. A maior densidade econômica das Zonas de Caicó e Currais Novos não se estende a todos os seus municípios. Dentre eles, há os que, por falta ou menor dotação de recursos minerais, apresentam desempenho econômico menos favorável e Índices Desenvolvimento Humano–IDH que expõem níveis mais elevados de pobreza. 15 É o que ocorre em Municípios como Equador, na ZH de Currais Novos, e de São Fernando, na ZH de Caicó. Na ZH das Serras Centrais, que se caracteriza como a de menor desenvolvimento relativo, os municípios com menores IDH são os de Campo Grande, Santana do Matos, Jucurutu e Lagoa Nova. Onde o desempenho econômico mostrou-se maior, no passado, é onde também se observa uma maior degradação ambiental, como ocorre em Equador, onde a mineração desempenhou papel importante. Equador é hoje um dos municípios mais afetados pela desertificação, dentre os que integram o Núcleo de Desertificação do Seridó. 15 A análise do IDH do Seridó, como região, segundo as Zonas Homogêneas e a nível municipal, será tratada no item referente à Dimensão Sociocultural. 36 3.1.4 Regionalização Adotada Historicamente, a Região do Seridó do Rio Grande do Norte é o resultado de várias configurações adotadas para esse espaço. Cada uma das regionalizações conhecidas foi efetuada para atender a propósitos político e administrativos. Mas é quase sempre assim que os espaços são configurados, a menos quando se trata de um espaço natural. De todo modo, a degradação ambiental pode contribuir para alterar o fácies ecológico de um dado espaço natural. Os limites físicos do Seridó norte-rio-grandense como região natural variam pouco, como se viu. O mesmo não ocorre com o espaço produzido – que é aquele sobre o qual a ação do homem se dá, com mais intensidade. A superfície do Seridó como espaço produzido tem, portanto, variado ao longo do tempo. Trabalha-se aqui com a regionalização praticada pelo governo do Estado do Rio Grande do Norte, por intermédio do Instituto de Desenvolvimento e Meio Ambiente do Rio Grande do Norte– Idema. As diferenças em relação à configuração apresentada pelo Ibge para o Seridó são, portanto, de natureza política, administrativa e econômica. A regionalização adotada atende, assim, aos propósitos do planejamento das ações do governo estadual. Assim, o espaço objeto do Plano de Desenvolvimento Sustentável do Seridó do Rio Grande do Norte foi estabelecido a partir da divisão do Estado em Zonas Homogêneas. Essas Zonas foram delimitadas a partir de estudo realizado pelo governo do Estado, em 1975, com a assessoria do Instituto Latino-americano de Pesquisa Econômica e Social– ILPES, das Nações Unidas, contratado para elaborar estudo orientado para a estruturação da base de planejamento do Estado. Os resultados desse esforço foram a produção do “Diagnóstico Estrutural do Estado do Rio Grande do Norte”, integrado por uma série de volumes, tratando, cada um, de aspectos específicos da realidade estadual. O primeiro estudo tratava do zoneamento do Estado, no qual foram agrupados os seus municípios em oito Zonas Homogêneas. A metodologia então adotada foi desenvolvida pelos consultores do ILPES, baseando-se no princípio da variabilidade. De acordo com a metodologia então concebida, foi definido o grau de homogeneidade e/ou de heterogeneidade do conjunto de indicadores utilizados para cada município, tomado como unidade básica de análise. Os indicadores empregados cobriam as seguintes dimensões: demográfica, social, econômica e física (território e recursos naturais). A partir dos indicadores selecionados, foi construído um índice de polaridade, identificando uma cidade pólo e os municípios inseridos em sua área de influência. A agregação desses municípios, em torno da cidade pólo, definiu as 8 Zonas e as 15 Subzonas Homogêneas que configuram a atual regionalização, adotada pelo Estado, em matéria de produção de informações estatísticas e de ações para o planejamento. Com uma superfície de 53.306,8 km² (0,62% do território nacional), o Rio Grande do Norte contava, em 1996, com uma população de 2.558.660 habitantes, dos quais 1.847.853 viviam no meio urbano (72,22%) e 710.807 no meio rural (27,78%). A densidade demográfica total era de 48,00 hab/km². De acordo com a regionalização utilizada, o Rio Grande do Norte está dividido em oito Zonas Homogêneas–ZH, integradas por 15 Subzonas Homogêneas e por 166 municípios. As Subzonas estão distribuídas em Zonas Homogêneas, na forma especificada a seguir. a. Zona do Litoral Oriental a.1 Subzona de Natal (2 municípios) a.2 Subzona do Vale do Ceará-Mirim (5 municípios) 37 a.3 Subzona da Mata (18 municípios) b. Zona do Litoral Norte b.1 Subzona de João Câmara (14 municípios) b.2 Subzona de Touros (5 municípios) c. Zona do Agreste c.1 Subzona do Agreste Central (15 municípios) c.2 Subzona Fronteiriça da Paraíba (12 municípios) c.3 Subzona do Potengi (6 municípios) d. Zona de Currais Novos (6 municípios) e. Zona de Caicó (12 municípios) f. Zona das Serras Centrais f.1 Subzona de Santana do Matos (7 municípios) f.2. Subzona de Jucurutu (3 municípios) g. Zona Do Alto Apodi g.1 Subzona de Pau dos Ferros (19 municípios) g.2 Subzona das Serras Úmidas (17 municípios) h. Zona Mossoroense h.1 Subzona de Mossoró (10 municípios) h.2 Subzona do Açu (10 municípios) h.3 Subzona Salineira (5 municípios). (Idema, 1998.) Dentre as oito Zonas Homogêneas referidas, três configuram o espaço aqui considerado como Região do Seridó. Nele foram incluídas por continuarem caracterizando suas distintas realidades: histórica, cultural, natural e econômica. O Seridó assim delimitado está integrado pelas Zonas Homogêneas de Caicó, de Currais Novos e das Serras Centrais. Sua superfície é de 12.965,3 km², correspondendo a 1,33% de todo o espaço da nova Região Semi-Árida do FNE (974.731,40 km²) e a 26,82% da mesma Região Semi-Árida do FNE no Rio Grande do Norte – 48.343,60 km². (Vide Mapa 1.) 38 Juntas, as três Zonas Homogêneas do Seridó abrangem os 28 municípios já referidos, que se acham listados na tabela 3.1.4.1, adiante referida. Esses municípios abarcam ¼ do território potiguar, mas apenas 11,3% da população norte-rio-grandense. As Zonas Homogêneas mais densamente habitadas são as de Caicó e de Currais Novos. A maior densidade demográfica é apresentada por Currais Novos – 26,7 hab/km² –, seguida de Caicó, com 25,8 hab/km²). Nas Serras Centrais estão as mais baixas densidades do Seridó e do Estado (16,4 hab/km²). No conjunto, a região tem baixa densidade para o padrão estadual (22,3 contra 46,6 hab/km²), mas vale lembrar que se trata de espaço de uma zona semi-árida, onde, em geral, a ocupação humana não se adensa muito. A base econômica das três Zonas referidas também apresenta diferenciações relevantes. No conjunto, alguns indicadores básicos das três ZH do Seridó pesam pouco (cerca de 8%, se medidos pelo PIB regional, estimado no item 3.4 deste capítulo – Dimensão Econômica –, e apenas 4,65% da economia do Estado, quando medidos por sua participação no total do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços–ICMS arrecadado pelo Tesouro Estadual). Desse ponto de vista, fica longe da liderança econômica exercida no Rio Grande do Norte por duas outras Zonas Homogêneas: i) a ZH Litoral Oriental, no interior da qual se encontra a Subzona de Natal (que gera, sozinha, mais de metade – 53,74% – da receita do ICMS estadual arrecadado e concentra quase metade – 44,16% – da população do Estado) e a Mossoroense (com 19,46% da população estadual e 31,63% do ICMS arrecadado). (Vide tabela 3.1.4.2, adiante.) Seguem-se algumas indicações sobre o quadro natural e humano das três Zonas Homogêneas referidas (tabela 3.1.4.1), que mostram suas diferenças e, portanto, a diversidade de situações ali encontradas. (Tecnosolo & CEP, 1999.) A Zona Homogênea de Caicó compreende a parte ocidental da antiga Região do Seridó, e é composta por 12 municípios, que representam 8,2% da superfície territorial e 4,4% da população total do Estado (segundo os dados da Contagem Populacional de 1996, do Ibge). Abriga 33,02% da população de todo o Seridó. As sedes municipais desse subespaço têm altitude que variam de 134 metros (Jardim de Piranhas) a 336 m (Santana do Seridó), típicas do Sertão, onde a altura média varia em torno de 100 a 300 m. O município mais antigo desse subespaço e da região no seu conjunto é o de Caicó (criado em 1788), seguido de Jardim do Seridó (desmembrado de Acari, em 1858) e Serra Negra do Norte (desmembrado de Caicó, em 1874). O mais recentemente criado é o de Ipueira (desmembrado de São João do Sabugi, em 1963). A ZH de Caicó apresenta clima semi-árido, com média anual de chuvas de 700 mm, solos rasos ou moderadamente profundos, de textura argilosa e com fertilidade natural média a alta, segundo Levantamento Exploratório realizado pelo governo do Estado. Em menor proporção, aparecem solos Litólicos, rasos ou muito rasos (limitados para uso agrícola), mas a ZH dispõe também de várzeas (contínuas, em cerca de 39 mil hectares), onde dominam solos aluviais profundos, férteis e com potencial para o desenvolvimento agrícola. Conta com a presença, em suas terras, da bacia hidrográfica do Piranhas-Açu. Abriga ainda o maior efetivo pecuário do Seridó e vem se destacando como importante bacia leiteira, inclusive quando vista no contexto geral do Estado. Essa Zona tem Caicó como principal centro urbano do Seridó, mas vem perdendo população, com vários municípios apresentando taxas negativas de crescimento. A crise das atividades agropecuárias estimula o êxodo rural e a urbanização tem se acelerado. Hoje, 3 em cada 4 de seus habitantes já vive em áreas urbanas. Em muitas delas, encontra-se em expansão o comércio e cresce o número de pequenos estabelecimentos industriais e prestadores de serviços. 39 A Zona Homogênea de Currais Novos abrange a maior parte da porção oriental da antiga Região do Seridó, e é integrada por apenas 6 municípios, que representam 6,5% da superfície territorial e 3,6% da população total do Estado (segundo a Contagem de 1996). Nessa Zona vivem 31,94% da população total do Seridó. As sedes municipais desse subespaço têm altitude que variam de 159 m (São Tomé) a 572 m (Equador). O município mais antigo é o de Acari (desmembrado de Caicó, em 1833), seguido de Currais Novos (desmembrado de Acari, em 1890). O mais recentemente criado é o de Equador (desmembrado de Parelhas, em 1962). Com clima que pode ser considerado árido, apresenta pluviosidade média anual de 430 mm e déficit hídrico durante todo o ano. Em 90% de sua área predominam solos Litólicos Eutróficos, rasos e muito rasos – o que dificulta o uso agrícola. As várzeas são bem menores do que em Caicó (apenas 5,1 mil hectares). A formação geológica, constituída pelo complexo cristalino, dificulta a formação de aqüíferos subterrâneos. Mas abriga alguns rios, como o Seridó e o Acauã, e tem alguma disponibilidade de águas superficiais. Sua urbanização é elevada (77% da população), liderando os índices seridoenses nesse aspecto. Tem na cidade de Currais Novos seu centro urbano mais importante. Uma de suas especificidades se deve à importância que a mineração tem em sua vida econômica, em função da presença de importantes jazidas de minerais. A Zona Homogênea das Serras Centrais situa-se ao redor das serras de Santana e João do Vale, e a norte das outras duas Zonas Homogêneas mencionadas. Com seus 10 municípios, responde por 9,6% da superfície territorial e 3,3% da população total do Estado (segundo a Contagem de 1996). As sedes municipais desse subespaço têm altitude que variam de 63 m (em Jucurutu) a 686 m (em Lagoa Nova), tipificando o que, a este respeito, ocorre no interior de todo o semi-árido nordestino, com outras serras úmidas (brejos de altitude ou áreas de exceção). O município mais antigo é o de Santana do Matos (desmembrado de Açu, em 1836), seguido de Campo Grande (também desmembrado de Açu, em 1870). A Zona Homogênea das Serras Centrais tem os municípios mais novos do Seridó, com três deles criados na atual década: Bodó e Triunfo Potiguar, em 1992, e Tenente Laurentino Cruz, em 1993. Seu clima é semi-árido, a leste e subúmido seco, a oeste, marcando o quadro natural da Zona. Esse clima exerce influências positivas sobre sua vegetação (onde domina a caatinga hipo e hiperxerófila). O relevo também merece destaque, valendo salientar a presença das Serras de Santana e de João do Vale, com potencial para a fruticultura. A ZH das Serras Centrais tem no Piranhas-Açu o único curso d’água perenizado e uma rede de açudagem, enquanto suas condições naturais não favorecem a oferta hídrica subterrânea. 40 MAPA 1 41 TABELA 3.1.4.1 ÁREA E POPULAÇÃO DOS MUNICÍPIOS E ZONAS HOMOGÊNEAS QUE INTEGRAM A REGIÃO DO SERIDÓ ZONAS HOMOGÊNAS E MUNICÍPIOS DO SERIDÓ ZH DE CURRAIS NOVOS (06 municípios) Acari Carnaúba dos Dantas Currais Novos Equador Parelhas São Tomé ZH DE CAICÓ (12 municípios) Caicó Cruzeta Ipueira Jardim de Piranhas Jardim do Seridó Ouro Branco Santana do Seridó São Fernando São João do Sabugi São José do Seridó Serra Negra do Norte Timbaúba dos Batistas ZH DAS SERRAS CENTRAIS (10 municípios) Subzona de Santana do Matos (07) Bodó Cerro Corá Florânia Lagoa Nova Santana do Matos São Vicente Tenente Laurentino Cruz Subzona de Jucurutu (03) Campo Grande Jucurutu Triunfo Potiguar REGIÃO DO SERIDÓ (28 municípios) ÁREA (km²) 3.462,5 612,9 246,2 887,1 313,1 525,7 877,5 4.384,6 1.220,4 289,7 172,1 374,2 380,5 221,2 170,5 405,5 287,2 194,9 525,2 143,2 5.118,2 3.018,5 248,4 402,6 509,5 137,3 1.445,5 209,7 65,5 2.099,7 856,2 966,4 277,1 12.065,3 POPULAÇÃO (hab) RURAL URBANA 71.587 8.358 4.635 34.749 3.903 14.654 5.288 85.623 45.829 5.575 1.321 7.501 8.894 2.676 1.224 1.522 3.981 2.304 3.060 1.736 40.209 24.841 1.160 4.245 4.432 5.156 5.776 2.615 1.457 13.368 4.454 9.459 1.455 197.419 20.960 2.590 1.523 5.857 1.715 3.533 5.764 27.432 6.190 2.379 466 3.009 2.992 1.904 1.098 1.980 1.468 1.158 4.363 426 43.956 29.200 1.361 6.067 4.487 5.735 7.319 2.354 1.877 14.756 4.918 7.585 2.253 92648 TOTAL 92.547 10.948 6.156 40.586 5.618 18.187, 11.052 113.055 52.019 7.954 1.787 10.510 11.886 4.580 2.322 3.502 5.449 3.462 7.423 2.161 84.165 54.041 2.521 10.312 8.919 10.891 13.095 4.969 3.334 50.124 9.372 17.044 3.708 289.767 % SOBRE A POPULAÇÃO TOTAL 31,94 3,78 2,12 14,01 1,94 6,28 3,81 39,01 17,95 2,74 0,62 3,63 4,10 1,58 0,80 1,21 1,88 1,19 2,56 0,75 29,05 18,65 0,87 3,51 3,08 3,76 4,52 1,71 1,15 17,30 3,23 5,88 1,28 100,00 DENSIDADE DEMOGRÁFICA (hab/km²) 26,73 17,86 25,00 45,75 17,94 34,60 12,59 25,79 42,67 27,46 10,38 28,09 31,24 20,71 13,62 8,64 18,97 13,76 14,13 56,99 16,44 17,90 10,15 25,61 17,51 79,32 9,06 23,70 50,90 23,87 10,95 17,64 13,38 22,35 FONTE DOS DADOS BÁSICOS: Estado do Rio Grande do Norte. Secretaria de Planejamento e Finanças. Instituto de Desenvolvimento Econômico e Meio Ambiente do Rio Grande do Norte-Idema. Anuário estatístico; Rio Grande do Norte, 1998. Natal-RN, 1998, p. 21-23. 42 TABELA 3.1.4.2 RIO GRANDE DO NORTE. SUBZONAS HOMOGÊNEAS, MUNICÍPIOS, ÁREA, POPULAÇÃO, DENSIDADE DEMOGRÁFICA E ARRECADAÇÃO DO ICMS, POR ZONAS HOMOGÊNEAS ZONAS HOMOGÊNEAS I. Litoral Oriental II. Litoral Norte III. Agreste IV. Currais Novos V. Caicó VI. Serras Centrais VII. Alto Apodi VIII. Mossoroense TOTAL DO ESTADO TOTAL DO SERIDÓ SERIDÓ/ESTADO (%) SUBZONAS 3 2 3 0 0 2 2 3 15 2 13,33 VARIÁVEIS E INDICADORES TERRITORIAIS E SOCIOECONÔMICOS MUNICÍPIOS ÁREA (km²) POPULAÇÃO (hab) DENSIDADE ICMS ARRECADADO, DEMOGRÁFICA (hab/km²) EM 1997 (%) 25 4.798,6 1.129.951 235,48 53,72 19 8.509,1 158.750 18,66 1,11 33 6.637,9 267.080 40,24 1,51 6 3.462,5 92.547 26,73 1,79 12 4.384,6 113.055 25,78 2,51 10 5.118,2 84.165 16,44 0,35 36 5.359,8 215.112 40,13 1,15 25 15.006,1 498.000 33,19 31,61 166 53.306,8 2.558.660 48,00 100,00 28 12.965,3 289.767 22,37 4,65 16,87 24,32 11,32 46,60 4,65 FONTE DOS DADOS BÁSICOS: Estado do Rio Grande do Norte. Secretaria de Planejamento e Finanças. Instituto de Desenvolvimento Econômico e Meio Ambiente do Rio Grande do Norte-Idema. Anuário estatístico; Rio Grande do Norte, 1998. Natal-RN, 1998. 43 Em termos demográficos, essa Zona tem o menor contingente humano (29,05% do total da Região do Seridó) e apresenta baixo e declinante crescimento, com vários municípios apresentando taxas negativas. É ainda a única dominantemente rural, com grau de urbanização baixo, para os padrões seridoenses atuais: 48% de seus habitantes, em 1996, viviam nas áreas urbanas, contra mais de 75% nos casos das outras duas Zonas. As Serras Centrais são líderes na pecuária suína e tem boa presença na bovinocultura. A produção de mandioca, milho, feijão e de castanha de caju (cuja produção também é liderada pelas Serras Centrais no Seridó) marcam a vida econômica dessa Zona, onde a indústria é muito incipiente. 3.1.5 Elementos para o Ordenamento Territorial do Seridó Destacam-se agora elementos atinentes à distribuição da população e das atividades econômicas no espaço seridoense. As descrições realizadas sobre o assunto, no presente Diagnóstico, indicam que o movimento da população do Seridó segue, em boa medida, a distribuição das atividades econômicas da região, a considerar a direção dos fluxos migratórios, de origem rural e destino urbano, no interior da região ou para fora dela. Sugerem que esse relacionamento se dá por conta da fragilidade da base econômica sub-regional, potenciada pela vulnerabilidade das atividades econômicas à variabilidade climática. De relevante, cabe destacar a capacidade que as secas continuam tendo de fazer com que as atividades econômicas nas áreas de caatinga persistam subordinadas a processos de descontinuidade, que impedem a manutenção de um fluxo mais permanente de produção de bens e serviços, nos espaços da Região do Seridó. Um dos aspectos centrais da problemática a resolver ali refere-se às dificuldades enfrentadas pelos diferentes agentes produtivos (públicos e privados) para promover a reorganização econômica daquelas áreas, limitando assim o processo de destruição dos excedentes gerados nos anos climaticamente normais. A ênfase na questão climática não diminui a importância conferida à natureza da estrutura das relações de produção e distribuição dos bens e serviços gerados na esfera dos diferentes setores econômicos. Pelo contrário, reforça o seu caráter inadequado, particularmente em relação aos contingentes de pessoas historicamente desprovidas de meios de produção. Uma efetiva política de (re)ordenamento territorial para o Seridó deve considerar, dentre outros, elementos como os seguintes: a heterogeneidade da região, a dinâmica urbana recente e a importância das secas. As particularidades no tocante à heterogeneidade da região expressam-se em termos de recursos naturais, recursos humanos e conhecimentos tecnológicos. Daí, haver-se privilegiado uma regionalização que considera uma gama variada de espaços, nos quais a diferença de problemas pode ser contrabalançada pelas vantagens comparativas e competitivas existentes. A dinâmica urbana recente apresenta-se particularmente importante, para compreender-se o futuro da região. No Seridó de hoje, o que é dinâmico está referido a atividades urbanas, tanto em espaços urbanos como em espaços rurais. Nas áreas urbanas, o dinamismo está ligado à indústria, ao comércio e aos serviços, enquanto nas áreas rurais, são dinâmicas as atividades ligadas ao agronegócio. Assim, o que é dinâmico são atividades urbanas em áreas urbanas e atividades urbanas em áreas rurais. Constata-se que esse dinamismo do espaço urbano não diminui a importância do espaço rural, nem dos negócios nesse último tipo de espaço, efetiva ou potencialmente. 44 A importância das secas não pode e nem deve ser descurada. A escassez e a distribuição irregular das chuvas persistem constituindo uma das marcas do semi-árido do Nordeste. Notabilizam-se ainda mais na Região Natural do Seridó, pois ali a irregularidade do clima (com chuvas mal distribuídas e temperaturas relativamente mais altas) tem seus efeitos potenciados pela ação de fatores físicos, como o solo raso e pedregoso. Esses aspectos contribuem para que os impactos das secas sobre o Seridó sejam mais intensos do que os observados em algumas outras áreas do semi-árido nordestino. Como a região em estudo apresenta uma alta percentagem de população vivendo em áreas urbanas, a escassez de água para abastecimento humano constitui atualmente uma das mais graves conseqüências das secas no Seridó do Rio Grande do Norte. 3.2 DIMENSÃO AMBIENTAL As características ambientais da Região do Seridó foram estudadas segundo perspectiva que envolve tanto a identificação de problemas, como as possibilidades de aproveitamento dos recursos naturais mapeadas. Neste sentido, descrevem-se a seguir as particularidades referentes aos seguintes aspectos: i. Ecossistemas do Nordeste e do Seridó; ii. Recursos Hídricos (abrangendo as Bacias Hidrográficas do Rio Grande do Norte; Oferta e Demanda de Recursos Hídricos no Nordeste; Oferta e Demanda de Recursos Hídricos no Rio Grande do Norte e no Seridó; Projeto de Transposição de Águas do São Francisco; e Restrições Ambientais); iii. Recursos de Solo; iv. Recursos Florestais (envolvendo o Mapeamento da Vegetação Nativa Lenhosa; o Inventário Florestal da Vegetação Nativa; o Consumo e Demanda de Energéticos Florestais; e a Conservação dos Recursos Florestais); v. Recursos Minerais (compreendendo a Economia Mineira do Nordeste e do Rio Grande do Norte; as Origens, Evolução e Perspectivas da Economia Mineira do Seridó; e os Impactos Ambientais da Mineração); vi. Alterações no Meio Ambiente (envolvendo Alterações Específicas e a Desertificação como Síntese); vii. Fragilidades Ambientais; viii. Lixo e Saneamento Ambiental; ix. Instituições que Atuam na Área Ambiental; x. Principais Problemas; e xi. Potencialidades Relevantes. 45 3.2.1 Ecossistemas do Nordeste e do Seridó O ecossistema é entendido como um termo genérico, que diz respeito aos diversos níveis de organização da Biosfera. A adoção deste conceito pelo Ministério do Meio Ambiente exigiu o abandono de percepções que, embora usuais, foram consideradas incorretas. Assim, o agrupamento dos ecossistemas individualizados, antes referido, foi efetuado, deliberadamente, sem levar em consideração “a corrente metodológica que propõe a regionalização por biomas, conceito inadequado para os propósitos deste trabalho.” Com efeito, “o bioma ‘Floresta Ombrófila’ está representado pela Floresta Amazônica e pela Mata Atlântica; o bioma ‘Cerrado’ engloba grande parte do Pantanal; as ‘Florestas Estacionais’ usual e incorretamente não são citadas como bioma; as disjunções de ‘Cerrado’ na ‘Floresta Ombrófila Equatorial’ teriam o mesmo tratamento que o Brasil Central e estariam alheias ao contexto amazônico ao qual na realidade pertencem.” (BRASIL. MMA, 1996: 17.) Tomando-se por base critérios de relevância físico-biótica e espacial, do ponto de vista da gestão ambiental, o Brasil está caracterizado por nove ecossistemas principais, assim especificados: • Ecossistemas Amazônicos; • Ecossistemas da Região dos Cerrados; • Ecossistemas do Pantanal; • Ecossistemas da Região das Caatingas e Florestas Deciduais do Nordeste; • Ecossistemas do Meio Norte; • Ecossistemas da Região das Florestas Estacionais Semideciduais; • Ecossistemas da Região dos Pinheirais; • Ecossistemas do Extremo Sul; e • Ecossistemas das Áreas Costeiras e da Região da Mata Atlântica. (Brasil. MMA, 1996: 9.) Desses ecossistemas, quatro interessam ao Nordeste: os Ecossistemas da Região dos Cerrados, visíveis em algumas áreas do Nordeste, como o sudeste do Maranhão e o sudoeste do Piauí; os Ecossistemas da Região das Caatingas e Florestas Deciduais do Nordeste; os Ecossistemas do Meio Norte; e os Ecossistemas da Região das Florestas Estacionais Semideciduais. A Região Natural do Seridó está localizada em pleno interior do Nordeste Semi-Árido, em área de solos de relativa fertilidade. 16 Insere-se, assim, no quadro dos Ecossistemas da Região das Caatingas e Florestas Deciduais do Nordeste. 16 Situação que vale para o Seridó do Rio Grande do Norte, assim como para as áreas desse tipo de região natural encontradas na Paraíba e no Ceará. 46 Fotografia J. Marcelino 47 Considerando “a necessidade de síntese frente à complexidade ambiental brasileira,” aqueles “nove subespaços foram definidos, basicamente, segundo condições ecológicas refletidas pela vegetação original predominante e a posição geográfica que ocupam, exceto o Pantanal, que detém características geomorfológicas próprias.” A definição dos nove subespaços (ou ecossistemas) foi efetuada independentemente “da divisão político-administrativa e segundo critérios de regionalização já consagrados, além de algumas adaptações que se fizeram necessárias. Assim, os cerrados dos Estados do Tocantins e do Maranhão fazem parte, neste trabalho, do conjunto dos cerrados do Brasil Central, não tendo sido incluídos na faixa amazônica pelo mero fato de pertencerem à Amazônia Legal. Quanto ao Meio Norte, representado nitidamente por ecossistemas de transição, reveste-se de características próprias sob o ponto de vista socioeconômico e cultural, o mesmo acontecendo com as Florestas Deciduais, que ora ocorrem na Caatinga, ora no Cerrado. Neste caso, os aspectos culturais – ou de estilo de vida – orientaram a delimitação cartográfica incluindo as referidas áreas em uma ou outra unidade de mapeamento.” (Brasil. MMA, 1996: 17.) Os Ecossistemas da Região das Caatingas e Florestas Deciduais do Nordeste abrangem, assim, as especificidades do Domínio Morfoclimático das Caatingas, sejam elas arbustivas ou arbóreas. Uma das particularidades notáveis da caatinga – esse tipo singular de vegetação xerófila tropical, somente encontrada nessa parte do Nordeste – é a capacidade das plantas ali existentes de perderem as folhas na estação seca (ou sem chuvas). Trata-se de mecanismo fisiológico de defesa contra a alta transpiração. A caatinga foi estudada, pioneiramente, no Nordeste, por Philipp von Luetzelburg, botânico que integrou os quadros da antiga Inspetoria Federal de Obras Contra as Secas-IFOCS. (Luetzelburg, 1922.) O estudo desse tipo de vegetação também recebeu contribuição relevante do geógrafo e botânico brasileiro Walter Egler (1992). Coube a Guimarães Duque promover a articulação entre teoria e prática, com vistas à determinação das possibilidades da caatinga e dos espaços onde ela viceja. (Duque, 1953; e Duque, 1964.) Para Guimarães Duque, “a caatinga é um conjunto de árvores e arbustos espontâneos, densos, baixos, retorcidos, leitosos, de aspecto seco, de folhas pequenas e caducas, no verão seco, para proteger a planta contra a desidratação pelo calor e pelo vento. As raízes são muito desenvolvidas, grossas e penetrantes.” O solo onde ocorre esse tipo de associação vegetal no Nordeste “é silicoso ou sílico-argiloso, muito seco, raso, quase sem humos, pedregoso, pobre em azoto, porém contendo regular teor de cálcio e potássio, como atesta a vegetação do algodoeiro e do caroá. (...) Na caatinga a associação florística com o solo e a atmosfera é quase uma simbiose, tal é o regime de economia rígida da água para entreter as funções em equilíbrio; a união densa, fechada, de caatingueiras, acácias, umbuzeiros, maniçobas, macambiras, cactáceas, pereiro, etc., protege o solo no inverno com a sua folhagem verde, e no verão cobre-o com uma camada de folhas fenadas que são em parte comidas pelo gado e o restante aduba o chão; as espécies, para sobreviverem em relativa harmonia fisiológica, absorvem umidade do ar, com o abaixamento da temperatura à noite, quando a terra seca lhe nega água e força-as ao repouso. Este é o clímax de estabilização vegetativa." (Duque, 1953: 34.) Dentre as plantas características da caatinga destacam-se as seguintes: umbuzeiro, barriguda, icó, baraúna, faveleiro, pau ferro, licuri, camaratuba, carnaubeira e várias espécies de cactáceas (palmas, mandacaru e xique-xique) e bromeliáceas (macambira e caroá). (Duque, 1964: 73-74.) A Caatinga é uma região natural que integra o Nordeste Semi-Árido, juntamente com o Sertão, o Seridó, o Agreste, o Curimataú, o Carrasco e as Serras. No interior das áreas de Caatinga há espaços que podem ser aproveitados com cultivos de sequeiro tradicional ou tecnificado, bem como áreas irrigáveis, em esquemas de pequena irrigação. É um espaço que requer preciso e adequado manejo dos recursos de solo e água, para evitar a degradação e, no limite, a desertificação. Requer esforços de pesquisa pura e aplicada. O conhecimento atualmente disponível sobre a caatinga ainda é exploratório. Alguns avanços já 48 foram conseguidos pela Embrapa, por intermédio do Centro de Pesquisa Agropecuária do Trópico SemiÁrido-Cpatsa. Mas ainda há muito o que ser pesquisado, no tocante às inter-relações do complexo soloágua-planta. Na individualização dos Ecossistemas da Região das Caatingas e Florestas Deciduais do Nordeste, o MMA mapeou as diversas caatingas e suas transições, juntamente com as formações florestais secas a elas relacionadas. As temperaturas no contexto desses ecossistemas são elevadas, “a umidade relativa do ar é baixa e as precipitações pluviométricas são – via de regra – inferiores à evapotranspiração potencial, caracterizando, desta forma, um acentuado déficit hídrico. O tipo de clima é essencialmente tropical quente, semi-árido, com 6 a 11 meses secos, passando a mediterrâneo subúmido com 4 a 5 meses secos na faixa oriental desta unidade.” (Brasil. MMA, 1996: 19.) Essas evidências reforçam, de outra parte, a percepção de que os Ecossistemas da Região das Caatingas e Florestas Deciduais do Nordeste se acham presentes na maior parte do território do Nordeste Semi-Árido, eqüivalendo-se, quase que totalmente, os elementos delimitadores de ambas as categorias – os ecossistemas das caatingas e o semi-árido nordestino. As áreas onde ocorrem os Ecossistemas da Região das Caatingas e Florestas Deciduais do Nordeste têm sido exploradas como fontes variadas de matérias-primas para a população do semiárido, suprindo necessidades alimentares, de vestimenta, de medicamento, de energia e de habitação. (Mendes, 1997: 26-35.) Têm atendido, além disso, as demandas da indústria tradicional, de fibras e oleaginosas, sob o comando do velho capital mercantil, que dominou a economia do Nordeste como um todo e do semi-árido em particular, por mais de uma centúria. Explorada em moldes extrativistas, as áreas de caatinga chegam hoje à quase exaustão, contribuindo para a degradação ambiental, visualizada por intermédio dos processos erosivos que reduzem o solo, carregando-o, pela ação das chuvas, em numerosos subespaços, para riachos, rios e açudes da Região. Os ecossistemas do Seridó integram os encontrados no Nordeste Semi-Árido, com a desvantagem de serem mais frágeis, dadas as limitações de sua base de recursos naturais. O ambiente da Região do Seridó do Rio Grande do Norte está estruturado no mesmo quadro dos Ecossistemas da Região das Caatingas e Florestas Deciduais do Nordeste. Embora extremamente degradados, os recursos florestais ali existentes ainda guardam exemplares da flora de caatinga. A pressão (ou o avanço) sobre tais recursos é crescente, em particular devido ao uso continuado das matas de caatinga como fonte de energia. A situação tende a se tornar mais crítica porque a produtividade madeireira da caatinga é muito baixa (52,10 estéreos por hectare 17). Problemático a este respeito foi a aprovação, pela Sudene, do projeto da Siderúrgica União, instalado na cidade de Currais Novos, destinada a processar o minério de ferro extraído na Serra da Formiga. (Pnud/FAO/Ibama, 1993-a.) Outras políticas públicas contribuíram para exacerbar o uso inadequado dos recursos florestais do semi-árido em geral e do Seridó, em particular. A sustentação dessas políticas tem sempre uma razão econômica. A elevação extraordinária dos preços internacionais do petróleo, em 1973, fez com que o governo brasileiro estimulasse o uso do carvão vegetal, por parte de indústrias nacionais. Depois, as indústrias voltaram a consumir combustíveis derivados do petróleo. Mas nesses quase 20 anos foi grande a devastação da caatinga em municípios como Mossoró, no Rio Grande do Norte, e Sobral e Barbalha, no Ceará. Além da razão econômica, essas decisões também têm sido pautadas pelos argumentos de geração de emprego, por parte de empresários urbanos e rurais ligadas ao corte de 17 O estéreo é a medida de volume para lenha. Um estéreo corresponde a uma pilha de lenha com dimensões aproximadas de 1 x 1 x 1 m, equivalente a 0,355 m³ sólidos. 49 madeira e à produção de carvão. (Mendes, 1997: 32.) A exploração econômica dos recursos florestais é responsável por 29% da renda gerada pelos pequenos produtores rurais do Rio Grande do Norte. (Pnud/FAO/Ibama, 1993-a.) Essas mesmas razões continuam sendo usadas como argumentos em favor da continuidade daquelas atividades. É, pois, extremamente acentuado o desequilíbrio observado na esfera dos Ecossistemas da Região das Caatingas e Florestas Deciduais do Nordeste, em particular no Seridó. As evidências obtidas a partir dos estudos do Projeto Pnud/FAO/Ibama, pontuadas por pesquisadores como o professor Benedito Mendes, são eloqüentes. “Atualmente, as indústrias sertanejas mais prejudiciais à preservação da biodiversidade do Semi-Árido são as cerâmicas, caieiras, indústrias de óleos vegetais e de sabão, e as padarias. As indústrias de cerâmica vermelha localizam-se nos vales dos rios intermitentes, o que contribui para a eliminação da mata ciliar destes cursos de água. Por outro lado, utilizam como matéria-prima os solos aluviais das margens dos rios, que são justamente os solos mais ricos do Nordeste” e do Seridó. (Mendes, 1997: 33.) Diante das fragilidades econômicas e sociais, provocadas pelas secas, verifica-se que vão sendo produzidas outras, particularmente as decorrentes da utilização de processos inadequados de gestão ambiental. Nessa linha, amplia-se o quadro das dificuldades enfrentadas pelas populações pobres, forçadas, historicamente, a encontrar no fácies ecológico do semi-árido seus próprios meios de sobrevivência. 3.2.2 Recursos Hídricos O Seridó é uma das regiões naturais do semi-árido mais premidas pela estreiteza da base de recursos naturais, especialmente dos renováveis. Dentre esses, os recursos hídricos são os que se caracterizam por uma mais ampla escassez relativa. Mas os recursos de solo e vegetação também apresentam características de elevada escassez. Neste item são tratados os seguintes aspectos dos recursos hídricos, no que em particular interessa ao Seridó: i) oferta e demanda de recursos hídricos no Nordeste; ii) bacias hidrográficas do Rio Grande do Norte; iii) oferta e demanda de recursos hídricos no Rio Grande do Norte e no Seridó; iv) restrições ambientais; e v) Projeto de Transposição de Águas do São Francisco. O exame desses aspectos, no tocante ao Seridó, é realizado em estreita associação com o que ocorre, em relação ao mesmo tema, no Nordeste e no Estado do Rio Grande do Norte. 3.2.2.1 Oferta e Demanda de Recursos Hídricos no Nordeste Ao lado do Ceará, da Paraíba e de Pernambuco, o Rio Grande do Norte é caracterizado como um dos estados de maior carência hídrica no Nordeste. No interior de suas terras semi-áridas (44.343,40 km²), correspondentes a 90,69% do território estadual e a 4,55% do semi-árido nordestino, o Seridó (com superfície de 12.965,3 km²) está entre as áreas semi-áridas mais carentes de recursos hídricos. Junto à fragilidade dos solos, a escassez de água é, com certeza, o fator mais crítico ao desenvolvimento dessa região. Da água de chuva precipitada sobre uma determinada zona ou bacia, parte se evapora ou é evapotranspirada; uma outra, sob a forma de escoamento superficial é carreada para os rios; e uma terceira parte se infiltra nos aqüíferos, para constituir a recarga subterrânea. Esta última é escoada de maneira muito lenta no seio do subsolo, de onde segue para o mar, se o aqüífero for costeiro, ou para os rios, se o aqüífero for interiorano. Neste caso, forma o escoamento de base, que é acrescentado ao escoamento superficial. A soma dessas duas parcelas forma o escoamento total dos rios ou escoamento 50 fluvial. Esse modelo global de circulação da água constitui a essência do ciclo hidrológico. (Gondim Filho, 1994: 5; e Vieira, 1994: 27.) Quatro conceitos são essenciais para definir a oferta de água: potencialidades, disponibilidades, capacidade de armazenamento de recursos hídricos e nível de garantia de suprimento de água. Esses conceitos foram utilizados durante os trabalhos de elaboração do Plano de Aproveitamento Integrado dos Recursos Hídricos do Nordeste do Brasil–Plirhine, no final dos anos 70 e princípios dos anos 80 (Sudene, 1980), tendo sido revisitados durante a preparação do Projeto Áridas, em 1993/94 (Projeto Áridas, 1995). Continuaram sendo usados pelos estudos posteriores ao Plirhine. A potencialidade dos recursos hídricos de uma dada bacia hidrográfica corresponde ao escoamento natural médio, ou seja, à soma dos escoamentos de superfície e de base. A disponibilidade de recursos hídricos representa uma parcela da potencialidade, ativada por meio de açudes, poços, etc. A capacidade de açudagem eqüivale à capacidade nominal de armazenamento de um açude ou reservatório. O nível de garantia da água armazenada em um açude é definido a partir de sua disponibilidade efetiva, que é aquela com a qual se pode efetivamente contar para diferentes tipos de consumo. “O nível de garantia mais utilizado no planejamento dos recursos hídricos é o de 90%. 18 Para este nível de garantia, para açudes bem dimensionados e nas condições normais da região semi-árida, o nível de rendimento de um reservatório é de 20 a 30%.” O volume disponível anual dos reservatórios situados em rios intermitentes, para aquela garantia de 90%, foi considerado como correspondendo a um nível de rendimento médio de 25%, nos estudos do Plirhine e do Projeto Áridas. Esse foi o valor médio considerado como volume disponível anual referido à capacidade total de acumulação de água dos reservatórios existentes nas Unidades de Planejamento (ou Bacias Hidrográficas) dos rios intermitentes do Nordeste. (Vieira, 1994: 29.) A tabela 3.2.2.1 apresenta informações sobre a potencialidade e a disponibilidade de recursos hídricos, assim como sobre a capacidade de açudagem (ou de armazenamento) de todos os açudes construídos no Nordeste, para as 24 Unidades de Planejamento (caracterizadas como bacias ou conjunto de bacias hidrográficas) estudadas pela Sudene, no âmbito do Plirhine. (Sudene, 1980.) Aquelas unidades de planejamento foram novamente estudadas, em 1993/94, pelo Projeto Áridas-Nordeste, tomando por base o ano de 1991. 18 O nível de garantia pode ser elevado para até 95% ou para até 99%, como foi feito nos estudos do Projeto de Transposição de Águas do São Francisco, que está sendo conduzido pelo Ministério da Integração Nacional. Ressalte-se, porém, que a oferta de água regularizada diminui à proporção em que aumenta o nível de garantia de sua utilização. A utilização de um maior nível de garantia é considerado necessário (ou economicamente mais adequado) quando se trabalha com a utilização prioritária dos recursos hídricos para atividades como a da irrigação. (MI/SIH, 2000-a: 265, tomo I.) 51 TABELA 3.2.2.1 POTENCIALIDADE, DISPONIBILIDADE E CAPACIDADE DOS AÇUDES E BARRAGENS DO NORDESTE, POR UNIDADE DE PLANEJAMENTO, EM 1991 UNIDADES DE PLANEJAMENTO (UP) 1-Tocantins Maranhense 2-Gurupi 3-Mearim-Grajaú-Pindaré 4-Itapecuru 5-Munim-Barreirinhas 6-Parnaíba 7-Acaraú-Coreaú 8-Curu 9-Fortaleza 10-Jaguaribe 11-Apodi-Mossoró 12-Piranhas-Açu 13-Leste Potiguar 14-Oriental da Paraíba 15-Oriental de Pernambuco 16-Bacias Alagoanas 17-São Francisco 18-Vaza-Barris 19-Itapicuru-Real 20-Paraguaçu-Salvador 21-Contas-Jequié 22-Pardo-Cachoeira 23-Jequitinhonha 24-Extremo Sul da Bahia NORDESTE (da Sudene) UPs Localizadas no Rio Grande do Norte, Total ou Parcialmente Relação UPs do Rio Grande do Norte/UPs do Nordeste (%) Relação UP Piranhas-Açu/Estado do Rio Grande do Norte (%) ÁREA DAS UPs (km²) 32.900 * 50.600 97.000 54.000 27.700 330.000 30.500 11.500 14.700 72.000 15.900 44.100 24.440 23.760 25.300 17.100 * 48.700 22.330 46.100 81.560 62.240 42.000 * 23.200 * 27.300 1.663.230 68.540 4,12 64,34 POTENCIALIDADE DAS UPs (hm³/ano) 1 5.950,000 17.800,000 17.570,000 9.300,000 8.810,000 40.120,000 5.270,000 2.360,000 2.270,000 4.150,000 820,000 2.720,000 1.680,000 2.190,000 4.330,000 3.080,000 41.100,000 1.200,000 2.080,000 8.420,000 5.560,000 7.160,000 6.110,000 6.980,000 207.030,000 5.220,000 2,52 52,11 DISPONIBILIDADE 2 DAS UPs (hm³/ano) 575,000 2.594,000 4.021,500 1.753,000 1.930,000 9.064,040 700,090 565,727 666,199 2.078,360 217,399 1.555,525 219,864 363,899 325,931 247,517 64.837,880 110,808 211,942 1.756,000 735,500 817,000 548,500 1.415,000 97.301,681 1.992,788 2,05 78,06 CAPACIDADE DE AÇUDAGEM 3 DAS UPs (hm³) 0,790 0,260 10,260 2,440 1,570 6.779,068 1.825,682 1.196,531 850,245 7.054,173 657,597 6.102,101 458,256 1.047,595 603,725 31,669 55.209,933 302,430 653,766 1.691,652 617,395 28,490 1,590 0,080 85.127,298 7.217,954 11,79 84,54 FONTE: VIEIRA, Vicente P. P. B. - Recursos hídricos e o desenvolvimento sustentável do semi-árido nordestino; relatório consolidado. [Brasília], nov., 1994, p. 16 (tabela 1.3.2). (Estudo realizado no âmbito do Grupo de Recursos Hídricos do Projeto Áridas.) (*) 1 2 3 Área de Unidades de Planejamento situadas na área de atuação da Sudene. A potencialidade dos recursos hídricos de uma bacia hidrográfica corresponde ao escoamento natural médio, ou seja, à soma dos escoamentos de superfície e de base. A disponibilidade de recursos hídricos representa uma parcela da potencialidade, ativada por meio de barragens, poços etc. A capacidade de açudagem corresponde à capacidade nominal de armazenamento de um reservatório. 52 A oferta d’água disponível é, assim, derivada da forma com que são mobilizadas as potencialidades e as disponibilidades de recursos hídricos, no quadro dos níveis de garantia e de rendimento afetos à capacidade de acumulação dos açudes. Corresponde, pois, a parte da água produzida (ou armazenada) em açudes, poços e outros meios (como as cisternas, em bem menores proporções). Equivale, assim, ao volume regularizado da água efetivamente tornada disponível para consumo pelos diferentes usuários. Em síntese, a oferta de água é expressa pela capacidade de açudagem de açudes e barragens construídos (soma das capacidades de acumulação regularizada daqueles reservatórios) e pela vazão dos poços instalados. Como essa segunda parcela é reduzida em relação à primeira, considerar-se-á como oferta de água apenas a capacidade de açudagem, regularizada, dos açudes e barragens existentes. A carência de recursos hídricos no Nordeste é demonstrada quando se compara a disponibilidade de água de suas Unidades de Planejamento – ou Bacias Hidrográficas (coluna 4 da tabela 3.2.2.1) – com a capacidade de açudagem de todos os açudes nelas construídos (coluna 5 da tabela referida). Em 1991, 19 havia uma disponibilidade de 97,3 bilhões de metros cúbicos, para uma capacidade de açudagem de 85,1 bilhões de metros cúbicos. 20 A diferença, em termos médios, é de mais 12,1 bilhões de metros cúbicos. Esse número representa o excedente total, médio, de recursos hídricos, naquele momento. Dito volume pode ser ampliado, desde que se utilizem outros recursos hídricos locais, mediante a mobilização de parte da potencialidade dos recursos hídricos existentes, ou se amplie a disponibilidade com o recurso à transposição de águas de bacias hidrográficas de fora do Nordeste, como as Bacias do Tocantins e do São Francisco. Verificados esses aspectos gerais da oferta de recursos hídricos, convém examinar agora os da demanda. A demanda total por recursos hídricos no Nordeste, considerada como uma demanda potencial, máxima, teórica, para todos os usos, correspondia, em 1991, a 21,8 bilhões de metros cúbicos por ano, como se vê na tabela 3.2.2.2. (Gondim Filho, 1994:10-78.) Esse agregado abrange as demandas populacionais urbana e rural, animal, de irrigação, agroindustrial, de distritos agroindustriais e ecológica. 21 De 1979/80 para 1991, a demanda cresceu 144,9%, ao passar de 8,9 bilhões de metros cúbicos, em 1979/80, para 21,8 bilhões, em 1991. (Carvalho, 1994: 154-155.) No Nordeste da Sudene, a distribuição dos açudes e barragens é extremamente concentrada, em função mesmo das condições que propiciam sua construção – local para a instalação dos maciços das barragens e disponibilidade hídrica para ser acumulada. A infra-estrutura hídrica do Nordeste, que realmente conta, é assim integrada por pouco mais de 300 açudes e barragens de porte. A grande maioria deles foi construída pelo DNOCS (Araújo, Coord., 1990: 292), vindo na seqüência os construídos pela Companhia de Desenvolvimento do Vale do São Francisco–Codevasf e pelos estados da Região. Dentre aqueles mais de 300 açudes e barragens, há 10 (algo em torno de 3% daquele total) com capacidade de armazenamento superior a 500 milhões de metros cúbicos, que podem acumular cerca de 73% (62 bilhões 19 As informações disponíveis sobre a oferta e a demanda de recursos hídricos, aqui utilizadas, sofreram pouca modificação em relação ao Nordeste e ao Rio Grande do Norte. Para o Seridó, as mudanças passaram a se referir à melhora realizável na distribuição de água, com a construção em curso das adutoras de Serra de Santana e Piranhas-Caicó. 20 Incluindo as Barragens do sistema Chesf: Boa Esperança-PI, Itaparica-PE, Sobradinho-BA, Xingó-AL e Moxotó-BA. 21 A demanda ecológica, de acordo com os estudos do Projeto Áridas foi considerada com correspondendo a 10% do escoamento superficial disponível. 53 de metros cúbicos de água) da capacidade total de armazenagem do Nordeste, calculada em 85,1 bilhões de metros cúbicos de água. (Vide tabela 3.2.2.3.) 22 A mencionada comparação reflete, ademais, a dinâmica da urbanização observada no interior do semi-árido do Nordeste ou do Rio Grande do Norte. Reforça também as evidências sobre os conflitos entre oferta e demanda de água em várias sub-regiões do Nordeste. É quase certo que esse desequilíbrio decorre mais das escassas disponibilidades de recursos hídricos e da distribuição espacial dos açudes, do que da capacidade de armazenamento. A concentração de um grande volume de água armazenável em um reduzido número de açudes constitui um dos principais indicadores da adequação ou inadequação da distribuição de água em várias sub-regiões do semi-árido nordestino. As evidências antes apontadas podem ser particularmente encontradas nos estados caracterizados pela presença de bacias carentes, como ocorre com os do Ceará, Rio Grande do Norte, Paraíba e Pernambuco. Daí persistirem os problemas de atendimento da demanda por água, especialmente da chamada demanda rural difusa (água para consumo doméstico e dos animais, ao nível das fazendas) e da demanda urbana municipal (água para consumo doméstico e para os serviços urbanos das capitais e cidades do interior). 3.2.2.2 Bacias Hidrográficas do Rio Grande do Norte O Estado do Rio Grande do Norte apresenta um quadro hidrográfico, cuja principal característica é a presença de rios temporários, dentre os quais se destacam os Rios Apodi-Mossoró, Piranhas, Boqueirão, Punaú, Maxaranguape, Ceará-Mirim, Doce, Potengi, Pirangi, Trairi, Jacu, Catu, Curimataú, Guajú e Seridó. Eles representam os veículos principais de alimentação e escoamento dos recursos hídricos de superfície do estado. Estão distribuídos ao longo de 14 bacias e duas áreas de escoamento difuso, localizadas no litoral norte e no litoral leste do estado. Essas 16 unidades hidrográficas estão especificadas na tabela 3.2.2.4. 22 Dentre os dez açudes e barragens com essa capacidade, destacam-se os seguintes: Sobradinho (que pode acumular cerca de 35 bilhões de metros cúbicos), Itaparica (com cerca de 15 bilhões de metros cúbicos), Xingó (com cerca de 5 bilhões), Armando Ribeiro Gonçalves (com 2,2 bilhões) e Orós (com 2,1 bilhões). 54 TABELA 3.2.2.2 DEMANDAS HÍDRICAS DOS ESTADOS DO NORDESTE, EM 1991 POPULAÇÃO (hab) ESTADO 1-Maranhão 2-Piauí 3-Ceará 4-Rio Grande do Norte 5-Paraíba 6-Pernambuco 7-Alagoas 8-Sergipe 9-Bahia 10-Minas Gerais 1 NORDESTE (DA Sudene) Relação R. G. do Norte/Nordeste (%) URBANA RURAL 1.972.008 1.367.184 4.162.007 1.669.267 2.052.066 5.049.968 1.482.033 1.002.877 7.016.770 736.830 26.511.010 6,30 2.957.021 1.214.953 2.204.640 746.300 1.149.048 2.076.201 1.032.067 488.999 4.851.221 603.018 17.323.468 4,31 URBANA 183,384 159,272 517,944 189,651 196,964 593,768 175,222 97,599 798,814 71,043 2.983,661 6,36 RURAL 75,554 31,038 56,331 19,070 29,352 53,050 26,366 12,489 123,951 15,411 442,612 4,31 DEMANDA HÍDRICA (hm³/ano) DE ANIMAL IRRIGAÇÃO AGROINDUSTRIAL 107,778 101,641 109,075 32,528 46,318 79,948 20,718 23,170 366,486 42,648 930,310 3,50 403,148 273,849 1.003,169 267,420 288,824 1.425,883 249,459 153,959 1.643,813 485,730 6.195,254 4,32 13,142 5,620 91,909 45,632 55,649 547,714 410,030 36,281 59,608 7,295 1.272,880 3,58 DISTRITOS INDUSTRIAIS 45,799 39,817 130,006 47,639 49,242 148,441 43,805 24,400 200,120 17,761 747,030 6,38 TOTAL 828,805 611,237 1.906,434 601,940 666,349 2.848,804 925,600 347,898 3.192,792 639,888 2 12.571,747 4,79 FONTES: i) VIEIRA, Vicente P. P. B., 1994: Recursos hídricos e o desenvolvimento sustentável do semi-árido nordestino. Brasília, Áridas, p. 25. (Estudo realizado no âmbito do Grupo de Recursos Hídricos do Projeto Áridas.) ii) GONDIM FILHO, Joaquim Guedes Corrêa: Sustentabilidade do desenvolvimento do semi-árido sob o ponto de vista dos recursos hídricos. Brasília, Áridas, p. 10 (tabela 2.2) e p. 78 (tabela 3.37). (Estudo realizado no âmbito do Grupo de Recursos Hídricos do Projeto Áridas.) 1 Corresponde à Área Mineira do Polígono das Secas. A esse total deve ser acrescentado o valor da demanda ecológica, equivalente, em 1991, a 9.292,938hm³/ano, para as 24 UPs. A demanda total efetiva passa a ser assim de 21.864,685hm³/ano, para o Nordeste da Sudene. Nas fontes consultados não consta o volume da demanda ecológica por Estado. 2 55 TABELA 3.2.2.3 CAPACIDADE DOS AÇUDES E BARRAGENS DO NORDESTE, POR ESTADO ESTADO 1-Maranhão 2-Piauí 3-Ceará 4-Rio Grande do Norte 5-Paraíba 6-Pernambuco 7-Alagoas 8-Sergipe 9-Bahia 10-Norte de Minas Gerais NORDESTE (da Sudene) Relação Rio Grande do Norte/Nordeste (%) Relação Capacidade de Açudagem do Estado do Rio Grande do Norte/Capacidade de Açudagem da UP Piranhas-Açu (%) 2 CAPACIDADE DE TODOS OS AÇUDES E BARRAGENS DO NORDESTE (hm³) 15,320 5.511,298 11.557,988 3.495,833 3.183,256 13.271,041 3.859,206 55,711 43.298,519 879,126 85.127,298 4,11 CAPACIDADES DOS AÇUDES E BARRAGENS DO NORDESTE, EXCLUINDO OS DO SISTEMA CHESF (hm³) 1 57,29 57,29 15,320 426,298 11,557,988 3.495,833 3.183,256 2.489,041 59,206 55,711 7.956,519 879,126 30.118,298 11,61 FONTE: VIEIRA, Vicente P. P. B., 1994: Recursos hídricos e o desenvolvimento sustentável do semi-árido nordestino. Op. cit., p. 16 (tabela 1.3.3). 1 Não inclui as Barragens de Boa Esperança-PI, Itaparica-PE, Sobradinho-BA, Xingó-AL e Moxotó-BA. 2 A Bacia do Piranhas-Açu conta com 64 açudes públicos (35 dos quais contam com capacidade de acumulação teórica superior a um milhão de metros cúbicos de água, correspondente, no total, a 2.918,580 hm³), 1.010 açudes particulares, com capacidade de acumulação teórica estimada em 178,358 hm³ e 33 açudes comunitários, com um volume acumulável de 5,465 hm³. No total, essa bacia apresenta uma capacidade de acumulação de 3.102,402 hm³ de água nos açudes referidos. (Serhid, 1995: 7.) 56 TABELA 3.2.2.4 RESUMO DAS PRINCIPAIS INFORMAÇÕES DAS BACIAS HIDROGRÁFICAS DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE BACIAS HIDROGRÁFICAS 01. Apodi-Mossoró 02. Piranhas-Açu 03. Boqueirão 04. Punaú 05. Maxaranguape 06. Ceará-Mirim 07. Doce 08. Potengi 09. Pirangi 10. Trairi 11. Jacu 12. Catu 13. Curimataú 14. Guajú 15. Faixa Litorânea Norte 16. Faixa Litorânea Leste TOTAL DO ESTADO ÁREA (km²) 13.923,8 12.462,2 221,1 450,2 934,0 2.705,1 338,5 4.183,3 449,9 2.829,6 1.768,4 192,9 790,0 136,3 6.193,1 588,2 53.166,6 % DA ÁREA DO ESTADO 26,19 32,84 0,42 0,85 1,76 5,09 0,64 7,87 0,85 5,32 3,33 0,37 1,49 0,26 11,65 1,10 100,00 PRECIPITAÇÃO PLUVIOMÉTRICA MÉDIA ANUAL (mm) 700 a 1.000 650 850 1.000 650 a 1.200 500 a 1.300 900 a 1.400 500 a 1.400 1.150 a 1.450 780 a 1.300 700 a 1.200 1.300 700 a 1.150 1.300 450 a 700 1.260 a 1.500 ... NÚMERO DE MUNICÍPIOS INSERIDOS NA BACIA 49 38 1 3 7 14 6 19 6 24 18 4 9 2 17 9 POPULAÇÃO RESIDENTE NA ÁREA DA BACIA (hab) 540.452 407.826 10.815 7.200 31.164 78.829 134.711 231.371 158.684 140.212 91.441 20.839 73.239 3.700 87.753 395.885 2.424.121 ESCOAMENTO SUPERFICIAL ANUAL MÉDIO (106 m³) 150,52 174,24 2,96 5,97 11,84 26,72 5,79 42,30 8,17 35,28 18,01 3,37 11,67 2,32 65,64 14,34 578,74 FONTE: Estado do Rio Grande do Norte. Secretaria de Recursos Hídricos e Projetos Especiais. Coordenadoria de Gestão de Recursos Hídricos–Serhid (1995)- Caracterização das bacias hidrográficas do Rio Grande do Norte. Natal-RN, Serhid, 1995, p. 39. Xerox. 3.2.2.3 Oferta e Demanda de Recursos Hídricos no Rio Grande do Norte e no Seridó O quadro descrito no item 3.2.2.1 anterior é mais agudo quando referido ao Estado do Rio Grande do Norte. No Seridó, embora as informações quantitativas disponíveis não tenham a mesma amplitude, as condições são sem qualquer margem a dúvidas muito mais graves. A carência de recursos hídricos no Rio Grande do Norte, também expressa pela diferença entre a disponibilidade de água e a capacidade de açudagem – ou de armazenamento de água – de todos os açudes construídos no Estado, é considerável. Em 1991, havia uma disponibilidade de 1.992,788 hm³ para uma capacidade de açudagem de 7.217,954 hm³. 23 A diferença daí resultante é de menos 5.225,166 hm³. Essa carência pode ser atendida, parcialmente, com recursos hídricos locais – mediante a mobilização de sua potencialidade – e com recursos hídricos de outras bacias, dotadas de excedentes mobilizáveis, via transposição. A UP do Piranhas-Açu – abrangendo partes dos territórios da Paraíba e do Rio Grande do Norte – apresenta um balanço também negativo, pois sua disponibilidade é de 1.556,525 hm³, para uma capacidade de açudagem de 6.102,101 hm³, do que resulta uma carência total de 4.545,576 hm³, que só 23 Incluindo as Unidades de Planejamento do Leste Potiguar, Apodi-Mossoró e do Piranhas-Açu (compartilhada com a Paraíba), conforme dados da tabela 3.2.2.1. 57 pode ser atendida, parcialmente, por meio da mobilização de recursos hídricos locais (criados pela mobilização de sua potencialidade) e, complementarmente, de recursos hídricos de outras bacias, também via transposição. A oferta de recursos hídricos do Estado do Rio Grande do Norte e do Seridó é representada pela mesma capacidade de açudagem dos açudes e barragens ali construídos. Da oferta total de recursos hídricos do Nordeste, apenas 4,11% se encontravam, em 1991, em bacias hidrográficas (total ou parcialmente) localizadas no Rio Grande do Norte. A capacidade de açudagem do Estado era de 3,495 bilhões de metros cúbicos de água, também em 1991 (tabela 3.2.2.3 anterior). 24 Estudos mais recentes, realizados pela Secretaria de Recursos Hídricos–Serhid, do Rio Grande do Norte, mostram que aquele volume foi elevado para 3,592 bilhões de metros cúbicos, por volta de 1995. (Serhid, 1999: 8.) A capacidade de açudagem do Seridó, especificamente, não foi calculada pelo Projeto Áridas. Os estudos efetuados pela Serhid indicam que essa capacidade era de 439.962.000 de metros cúbicos, em 1995, quando da elaboração do Plano Estadual de Recursos Hídricos. (Serhid, 1999: 8.) Como consta da tabela 3.2.2.5, adiante, é de 26 o número de açudes 25 responsáveis por, pelo menos, 80% da capacidade de açudagem do Seridó. Destaque-se, ademais, que cinco açudes (19,2% do total daqueles 26), com capacidade individual de armazenagem superior a 40 milhões de metros cúbicos, listados na tabela referida, respondem por 73% da capacidade de açudagem dos açudes do Seridó, com mais de hum milhão de metros cúbicos de água. O Seridó norte-rio-grandense, segundo informações do Desenvolvimento Econômico e Meio Ambiente do Rio Grande do Norte–Idema, contava, em 1991, com 715 açudes particulares, com capacidade individual de armazenagem superior a cem mil metros cúbicos. No total, essa capacidade de armazenagem era superior a 500 milhões de metros cúbicos de água, incluindo 29 açudes comunitários, com capacidade individual de armazenagem também superior a cem mil metros cúbicos. A capacidade de armazenagem total dos açudes dessa última categoria era de 4.565.000 m³. Assim, a capacidade de açudagem total eleva-se para 544.546.000 m³ de água. A demanda total por recursos hídricos no Rio Grande do Norte, também considerada como demanda potencial, máxima, teórica, para todos os usos, em 1991, era de 601.940.000 milhões de metros cúbicos por ano. (Vide tabela 3.2.2.2 anterior.) Esse volume correspondia a 4,79% da demanda total do Nordeste. No que em particular se refere ao Seridó, a demanda está sendo atendida de forma extremamente precária, tanto em relação à demanda rural difusa (consumo doméstico e dos animais, ao nível das fazendas) como à demanda urbana municipal (consumo doméstico e serviços urbanos das principais cidades da região). Os açudes privados e comunitários se encontravam, em sua grande maioria, em agosto de 1999, ou totalmente vazios ou com escassa margem de água armazenada. Até mesmo os maiores açudes públicos apresentavam, naquela data, volume de água disponível inferior a 30% da capacidade máxima de armazenamento, como mostram os percentuais a seguir especificados, referentes à relação entre as águas armazenadas e a capacidade nominal total de armazenamento dos maiores açudes do Seridó: 24 Esse volume está incluído na capacidade de açudagem da Bacia Hidrográfica do Piranhas-Açu, que era de 6,1 bilhões de metros cúbicos – compreendendo os volumes armazenáveis no Rio Grande do Norte e na Paraíba. 25 De um total de 33, existentes na parte norte-rio-grandense da Bacia do Piranhas-Açu. (Cf. Consórcio Tecnosolo & CEP, 1999: 15, v. 1.) 58 • • • • • • • • • Açude Marechal Dutra: Açude Itans: Açude Dourado: Açude Cruzeta: Açude Sabugi: Açude Passagem das Traíras: Açude Boqueirão de Parelhas: Açude Zangarelhas: Açude Caldeirão: 29,2%; 15,5%; 12,0%. 11,3%; 9,6%; 7,2%; 3,7%; 2,5%; 1,4%. Os estudos realizados pelo Ministério da Integração Nacional, em apoio ao Projeto de Transposição de Águas do São Francisco, conduzidos pelo Fundação de Ciências, Aplicações e Tecnologias Espaciais-Funcate, vinculada ao Instituto de Pesquisas Espaciais-INPE, em especial os realizados pela Empresa VBA Consultores, sobre os aspectos de Inserção Regional, produziram importantes informações específicas, a este respeito, de interesse para o Seridó do Rio Grande do Norte. 26 Com esses estudos foi realizado um extraordinário avanço no tocante aos conhecimentos sobre oferta e demanda de água nos Estados do Ceará, Rio Grande do Norte, Paraíba e Pernambuco. Para os municípios que integram a Bacia do Piranhas-Açu foi possível verificar a existência de um desequilíbrio entre oferta e demanda de água expresso por um déficit de 157 litros de água por segundo, em 1998, para um nível de garantia de 99%. 27 Embora expressivo, esse déficit ainda é menor do que o constatado para o total de municípios das Bacias Receptoras do Estado do Rio Grande do Norte, calculado em 447 l/s. (MI/SIH, 2000-b: 244 – quadro 2.40, tomo II.) No caso do Seridó norte-rio-grandense, os estudos mostraram que em 25 dos 28 municípios do Seridó, integrantes da Bacia do Piranhas-Açu, a oferta hídrica foi superior à demanda, em 1998. Naquele ano, havia uma oferta de 951 litros por segundo para uma demanda de 425 l/s. A situação até poderia não ser considerada grave, pois havia um superávit de 536 l/s. Mas o superávit foi observado em apenas 12 daqueles 25 municípios. Nos outros 13 municípios, o déficit variou de um mínimo de 3 l/s a um máximo de 25 l/s. Além da observação de que cerca de metade dos municípios considerados apresentavam superávit e a outra metade déficit, deve-se ter em conta que os valores médios, nessas circunstâncias, não constituem uma boa aproximação da realidade local. De fato, os maiores déficits do Seridó foram encontrados, em 1998, nos municípios de Jardim do Seridó (25 l/s), Jardim de Piranhas (16 l/s), Carnaúba dos Dantas (15 l/s) e Florânia (12 l/s). Esse quadro agravou-se com a seca de 1998 e seu prolongamento em 1999, colocando Caicó – parcialmente abastecida em dezembro de 1999 por carros-pipa − na lista de municípios com déficit hídrico potencial. A situação de déficit hídrico deve ser maior ainda naqueles 26 Cf. informações obtidas com o Dr. Rômulo Macedo Vieira, Secretário de Infra-Estrutura Hídrica do Ministério da Integração Nacional, em entrevista realizada pelo consultor Otamar de Carvalho, no dia 18.04.2000, em Brasília-DF. Como resultado desta entrevista, foi possível acessar informações relacionadas a alguns relatórios do Projeto de Transposição de Águas do Rio São Francisco para o Nordeste Setentrional, em particular os que tratam da demanda de água no Seridó do Rio Grande do Norte. (MI/SIH, INPE/Funcate & VBA Consultores, 2000.) 27 Os estudos do Projeto de Transposição de Águas do Rio São Francisco para o Nordeste Setentrional consideram um nível de garantia de 99% de disponibilidade hídrica. Está destacado nos estudos que, para esse nível de garantia, os açudes com capacidade de armazenamento inferior a 10 milhões de metros cúbicos – que constituem a grande maioria dos reservatórios existentes – não dispõe de capacidade de regularização. Esses reservatórios deixam por isso de ser confiáveis, como suporte único, em matéria de suprimento hídrico, a demandas humanas. (MI/SIH, 2000-b: 243, tomo II.) 59 municípios abastecidos por açudes com capacidade nominal de armazenamento inferior a 10 milhões de metros cúbicos. (MI/SIH, 2000-b: 243-244 – quadro 2.40, tomo II.) O balanço entre oferta e demanda, tornado disponível com as informações produzidas pelo Ministério da Integração Nacional, a partir dos estudos realizados para o Projeto de Transposição de Águas do São Francisco, reforça a necessidade de aumentar a oferta de água e melhorar sua distribuição, gestão e conservação no Seridó. TABELA 3.2.2.5 CAPACIDADE DE ARMAZENAGEM DE ÁGUA DE SUPERFÍCIE DA REGIÃO DO SERIDO, POR AÇUDES COM CAPACIDADE ARMAZENÁVEL SUPERIOR A HUM MILHÃO DE METROS CÚBICOS AÇUDE Gargalheiras/M. Dutra Itans Mundo Novo Monte Alegre Cruzeta Barra do Catunda Currais Novos Do Pico ou Totoró Dourado Gangorra Malhada de Dentro Mulungu Olho D’Água Brandões Mamão Zangarelhas Boqueirão de Parelhas Caldeirão de Parelhas Alecrim Caraúbas Rio da Pedra Trapiá III Sabugi Vida Nova Torrão Passagem das Traíras Dinamarca TOTAL DO SERIDÓ Nº DE ORDEM MUNICÍPIO RIO (R.) OU RIACHO (Rc.) BARRADO CAPACIDADE DE ARMAZENAGEM (103 m³) 01 02 03 04 05 06 07 08 09 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19 20 21 22 23 24 25 26 Acari Caicó Caicó Acauã R. Barra Nova Rc. Mundo Novo Carnaúba dos Dantas Rc. Olho D’Água Cruzeta Currais Novos Currais Novos Currais Novos Currais Novos Currais Novos Currais Novos Currais Novos Currais Novos Equador Jardim do Seridó Parelhas Parelhas Santana do Matos Santana do Matos Santana do Matos Santana do Matos São João do Sabugi Timbaúba dos Batistas São Vicente S.J. do Seridó/Jardim do Seridó Serra Negra do Norte Rc. São José Rc. Catunda Totoró Rc. Namorado Rc. Currais Novos Rc. do Cipó Rc. da Ligação Rc. Pau Ferro Rc. Salgadinho Rc. dos Pintos R. da Cobra R. Seridó/R. das Vazantes Rc. dos Quintos Rc. Olho D’Água Rc. Caraúbas R. da Pedra Rc. Carnaúbas R. Sabugi Rc. da Volta R. Luzia Rio Seridó Espinharas 41.900 81.750 3.600 1.442 35.000 2.240 3.815 3.941 10.322 2.682 1.380 1.596 1.022 1.183 7.916 85.013 10.196 6.250 1.194 12.432 1.315 65.335 1.760 3.720 48.858 6.000 441.862 ANO DE CONCLUSÃO 1959 1935 1915 1986 1929 1984 1954 1933 1982 1984 1980 1980 1984 1984 1957 1988 1985 1958 1980 1984 1988 1965 1984 1994 1994 1998 ÓRGÃO RESPONSÁVEL DNOCS DNOCS Min. da Agricultura-MA Estado do RN DNOCS Estado do RN DNOCS Estado do RN DNOCS Estado do RN Estado do RN Estado do RN Estado do RN Estado do RN DNOCS Estado do RN Estado do RN DNOCS Pref. Municipal Estado do RN Estado do RN DNOCS Estado do RN Estado do RN Estado do RN Pref. S. Negra/FNS FONTE: Estado do Rio Grande do Norte. Secretaria de Recursos Hídricos e Projetos Especiais (1999)- Informações técnicas solicitadas pelo Idema, em 14.09.99. Natal-RN, s. e., 1999. Xerox. 3.2.2.4 A Alternativa do Projeto de Transposição de Águas do São Francisco 28 A escassez de recursos hídricos no Rio Grande do Norte como um todo e no Seridó em particular pode ser solucionada mediante a importação de água de bacias hidrográficas com balanço positivo entre 28 As informações aqui apresentadas estão baseadas em Carvalho, 1994-c. 60 oferta e demanda. Presentemente, a solução mais pronta e eficaz é a representada pela implementação do Projeto de Transposição de Águas do São Francisco, na linha dos estudos e projetos realizados em 1994/95. Esse Projeto foi formulado pelo antigo Ministério da Integração Regional–MIR, tomando por base idéias há tempo disponíveis sobre o assunto. Do ponto de vista mais técnico, o MIR apoiou-se em estudos realizados pelo extinto Departamento Nacional de Obras de Saneamento–DNOS, assim como em estudos conduzidos, direta ou indiretamente, por aquele Ministério. Em sua concepção mais geral, o Projeto tinha como objetivo a execução de obras e o desenvolvimento de atividades orientadas para dar solução ao problema da insuficiência de água no semi-árido nordestino, atendendo as demandas da população, do campo e das cidades; expandir as áreas irrigadas, como forma de aumentar a produção de alimentos e matérias-primas; e neutralizar os efeitos das secas. Antes das iniciativas do MIR, o antigo Departamento Nacional de Águas e Energia Elétrica– Dnaee, do Ministério das Minas e Energia-MME, preparou e publicou estudo sobre as alternativas de transposição das águas dos rios Tocantins e São Francisco para o Nordeste Semi-Árido, eentrado nos estudos do DNOS. A área estudada, em conjunto, pelo Dnaee compreende região que transcende os limites do semi-árido, pois também abrange o Estado do Maranhão. No estudo do Dnaee, foram examinadas seis alternativas de transposição para o semi-árido, envolvendo rios como o Tocantins, Sono, Balsas, Parnaíba, Itaueiras, Piauí, Canindé, Gurguéia, Salgado, Jaguaribe, Piranhas-Açu, Garças e Brígida. (MME. Dnaee, 1983: 5.) Estudos posteriores do DNOS, foram enfeixados no Plano de Ação para Irrigação do Nordeste Semi-Árido, Complementada com Águas do Rio São Francisco, caracterizado como estudo de viabilidade, a nível técnico, econômico, financeiro e social. Esses trabalhos foram elaborados, em 1985, por um consórcio de empresas representadas pela Hidroservice-PRC. O United States Bureau of Reclamation-USBR, órgão vinculado ao Departamento do Interior dos Estados Unidos da América, também participou daqueles estudos. O Bureau of Reclamation chegou a preparar uma análise dos aspectos de engenharia do empreendimento, enfatizando sua concepção geral, e fez uma avaliação das alternativas dos traçados do sistema adutor principal e da classificação das terras para irrigação na área do Projeto. O Projeto do MIR correspondia a uma proposta reduzida, frente à originalmente detalhada pelo DNOS. O sistema adutor principal do Projeto compreendia quatro trechos básicos, seguindo traçado assemelhado ao do Projeto original, imaginado em 1847, no qual se baseara o DNOS: • Cabrobó-Jati (reversão São Francisco/Salgado); • Salgado-Piranhas-Apodi (adução por gravidade); • Apodi-Chapada do Apodi (adução por gravidade); • Jati-Orós-Banabuiú-Choró-Pacoti (chamado ramal Cariri, deverá chegar até Fortaleza, aproveitando o Canal do Trabalhador). Posteriormente, o MIR, por meio de sua Secretaria de Irrigação−SIR, reavaliou os critérios e parâmetros que fundamentaram a concepção do anteprojeto das obras. A partir dos estudos realizados seriam construídas, inicialmente, obras para a captação, no curto prazo, de 70 m³/s, no braço da Ilha de 61 Assunção, localizada no Município de Cabrobó, em Pernambuco, dos quais 15 m³/s seriam utilizados na própria bacia do São Francisco, para atender o Estado de Pernambuco. Os outros 55 m³/s teriam a seguinte distribuição: 25 m³/s para o Ceará (bacia do Jaguaribe), 15 m³/s para a Paraíba (bacia do Piranhas) e 15 m³/s para o Rio Grande do Norte (5 m³/s para o Piranhas-Açu e 10 m³/s para o Apodi). 29 O Projeto Básico e demais estudos (como os ambientais) que o Ministério da Integração Nacional está presentemente elaborando são consistentes com a concepção global do Projeto do MIR. Com o aprofundamento dos estudos de alternativas técnico-econômicas de obras e do maior detalhamento dos serviços de campo, de topografia e geotecnia, foram realizadas algumas alterações no traçado do Projeto. (O Povo, 1999-a.) Esses estudos estão sendo preparados pela Fundação de Ciências, Aplicações e Tecnologias Espaciais-Funcate, vinculada ao Instituto de Pesquisas Espaciais-INPE, e por algumas empresas privadas, como a VBA Consultores (encarregada dos estudos de Inserção Regional), Joacopoyre e Tahal (Estudos de Impacto Ambiental) e consórcio Engecops-Plaza (Estudos de Engenharia − alternativas, viabilidade técnica e econômica − e Projeto Básico, para o trecho CabrobóJati). 30 As vazões a serem transpostas, de acordo com os estudos conduzidos pelo Ministério da Integração, correspondem aos volumes especificados na tabela 3.2.2.6, a seguir. TABELA 3.2.2.6 DISTRIBUIÇÃO DAS VAZÕES POR ESTADO (m³/s), NOS EIXOS NORTE E LESTE ESTADO EIXO NORTE EIXO LESTE TOTAL Paraíba 10 10 20 Ceará 40 40 Rio Grande do Norte 39 39 Total Transferido 89 10 99 Pernambuco (*) 10 18 28 TOTAL 99 28 127 FONTE: Ministério da Integração Nacional-MI. Secretaria de Infra-Estrutura Hídrica-SIH (2000)- Projeto São Francisco. Brasília, jan., 2000. Xerox. (*) Distribuição de 8 m³/s para o Agreste e de 10 m³/s para a Bacia do Moxotó. Para o Ministério da Integração Nacional, a “alternativa selecionada apresenta vantagens importantes sobre as demais alternativas estudadas, na medida que o eixo principal da transferência alonga-se no divisor de águas Ceará–Paraíba alimentando todas as bacias por gravidade, sem necessidade de novos bombeamentos. Há, ainda, outras vantagens, como a de se assegurar melhor qualidade da água na entrada de cada Estado e de se possibilitar uma gestão mais flexível da água, com a possibilidade de se criar uma bolsa d'água, cujo destino dependerá da capacidade de cada Estado de pagar pelo recurso ao concessionário do Projeto.” (MI/SIH, 2000:11.) Admite-se que a implementação do Projeto de Transposição de Águas do São Francisco pode até não solucionar todos os problemas do Nordeste Semi-Árido, mas resolverá, com certeza, os problemas de abastecimento de água de inúmeras cidades e capitais do Nordeste. Seu impacto a este 29 Face á considerável redução da vazão total do Projeto, o trecho Rio Apodi–Chapada do Apodi foi eliminado do Sistema de Transposição, na alternativa de construção em curso. 30 Essas informações foram fornecidas pelo eng. João Cézar Pierobom, integrante da equipe de coordenação dos estudos do Projeto de Transposição, no âmbito da Secretaria de Infra-Estrutura Hídrica, do Ministério da Integração Nacional. 62 respeito será semelhante ao desempenhado pela construção do Canal do Trabalhador, no Ceará, com cujas águas a população da cidade de Fortaleza conseguiu sobreviver nos anos de seca de 1990 a 1993 e no curso das secas de 1998 e 1999. Naturalmente, a construção desse magno empreendimento requer a adoção de medidas que viabilizem a generalização de seus benefícios às comunidades desprovidas de mecanismos de acesso ao poder. Dentre as mais importantes, podem ser destacadas as referidas a seguir, que se acham, em parte, pelo menos, consideradas no quadro das iniciativas conduzidas pelo Ministério da Integração Nacional, sobre a matéria: • utilização social dos investimentos públicos aplicados no Projeto; • desapropriação das terras beneficiadas pelos investimentos públicos em obras de infraestrutura hídrica e de irrigação, para evitar a especulação imobiliária, que pode ser praticada pelos agentes econômicos que disponham de informações privilegiadas sobre as áreas beneficiadas pelo Projeto; • conhecimento e discussão da forma e conteúdo da organização social da produção viabilizada pelos distintos usos da água tornada disponível pelo Projeto; • compatibilização dos princípios que devem comandar o desenvolvimento da irrigação, estabelecidos na Lei de Irrigação 31 e na Lei de Recursos Hídricos; 32 • contribuição do Projeto para o atendimento da demanda de água no Nordeste, de acordo com os diferentes usos; • execução do Projeto apenas depois de concluídos os estudos e relatórios de impacto ambiental, de forma a garantir a possibilidade de reformular ou não executar componentes do Projeto, que tragam impactos negativos ao meio ambiente; • formulação de estratégias de desenvolvimento científico e tecnológico, requeridas pela prática da irrigação e drenagem ; • realização de programas de desenvolvimento institucional para as organizações públicas federais, estaduais e municipais, em relação às demandas do Projeto, tendo em vista um adequado gerenciamento dos recursos hídricos da Região, particularmente em suas áreas semi-áridas; • garantia de capacitação dos agentes envolvidos na prática da agricultura irrigada (produtores, técnicos e empresários); • acesso à educação básica e ao desenvolvimento sustentável, por parte dos trabalhadores beneficiados pelo Projeto; e • ampla discussão do Projeto com a sociedade. 31 Que, inclusive, está sendo revista, dispondo de substitutivo de Projeto de Lei, em tramitação no Senado Federal. Lei nº 9.433, de 8 de janeiro de 1997, que “Institui a Política Nacional de Recursos Hídricos e cria o Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos. 32 63 O Projeto de Transposição passou a ser considerado prioritário, em 1999, pelo Ministério da Integração Nacional. Com o Projeto, aquele Ministério pretende fazer avançar a integração econômica do Nordeste, beneficiando amplos segmentos da população dos Estados do Ceará, Rio Grande do Norte, Paraíba e Pernambuco, sem causar prejuízos aos outros Estados que integram a Bacia do São Francisco. A execução desse projeto constitui uma das principais metas daquela Pasta. (O Povo, 1999b.) A decisão de implementar esse Projeto continua objeto de intensa discussão, como mostram as matérias publicadas nos jornais do eixo Rio de Janeiro–São Paulo. Destaque-se, a propósito, a ampla matéria divulgada pelo Jornal do Brasil, na edição de 19 de janeiro de 2000. Além de uma alentada descrição das características do Projeto, a matéria traz um longo rol de opiniões de cidadãos brasileiros e estrangeiros, aprovando, criticando ou manifestando discordância quanto à oportunidade de implementação dessa importante iniciativa. 3.2.2.5 Perda de Capacidade de Águas Armazenadas A degradação ambiental é mostrada por meio da grande e contínua redução da cobertura florística, da qual decorrem processos de erosão do solo. Esses processos são observados nas áreas de cristalino, predominantes na Região do Seridó, onde o solo e o subsolo vêm perdendo sua capacidade de retenção de água. Por isso, o escoamento superficial das chuvas tem contribuído fortemente para ampliar os efeitos dos processos erosivos. Vale destacar, a respeito, os problemas do assoreamento dos riachos, rios e açudes, causados, dentre outras causas, pelo desmatamento. Os estudos realizados pelo governo do Rio Grande do Norte, no contexto do Plano Estadual de Recursos Hídricos, mostram que os principais açudes do Seridó estão submetidos a forte processo de assoreamento, como resultado da erosão dos solos das bacias hidrográficas dos reservatórios. A partir dessas informações é possível chegar ao volume de sedimentos retidos no interior de cada açude. Combinando os dados de sedimentos retidos com o volume total de água dos açudes, obtém-se o que se denomina, aqui, de Perda de Capacidade de Armazenamento de Água–PCAA, dada pela relação entre “volume de sedimentos retidos” e “volume total de água dos açudes”. Para tanto, foram considerados, em relação ao primeiro caso, as características climáticas, geológicas, geomorfológicas, de relevo e de cobertura vegetal, da bacia hidrográfica de cada açude, e, para o segundo, o volume de água também armazenável em cada açude. A Perda de Capacidade de Armazenamento de Água–PCAA foi calculada para os nove principais açudes do Seridó, tal como se especifica na tabela 3.2.2.7, da qual constam informações projetadas para os anos 2000, 2010 e 2020. Os açudes mais prejudicados pelo assoreamento são o Cruzeta e o Dourado. O Açude Cruzeta terá até o final de 2000 cerca de 63% de seu volume total de água armazenável tomado por sedimentos. No ano 2020, sua capacidade de perda de armazenamento de água será da ordem de 81%. O Açude Dourado está em processo mais acentuado de assoreamento. Embora tenha cerca de 44% de seu volume total de água ocupado por sedimentos, até o final do ano 2000, terá até 2020 algo em torno de 92% de seu volume total de água tomado por sedimentos. Trata-se de processo de assoreamento extremamente rápido, considerando que o Açude Dourado teve sua construção concluída em 1982, enquanto o Açude Cruzeta, menos comprometido, foi concluído em 1929. Se nada for feito, pela população e pelos poderes públicos, essas tendências poderão chegar a ser confirmadas. 64 3.2.3 Recursos de Solo Depois dos recursos hídricos, os solos do semi-árido nordestino constituem o segundo conjunto de recursos mais escassos, quer se destinem à agricultura de sequeiro, quer à irrigada. Nos espaços afetados pelas secas, os solos são em geral ondulados, rasos, muitas vezes pedregosos, erodidos e de fertilidade mediana. Excetuam-se as áreas de baixadas ao longo das margens dos rios e riachos, sempre secos no verão (estação sem chuvas), e as de chapadas, nem sempre de topografia suave. Comparados aos de outras áreas semi-áridas do mundo, os solos do Nordeste semi-árido apresentam características que lhes conferem uma notória especificidade. (Carvalho, 1988: 88.) Neste sentido, eles se caracterizam por apresentar um estoque global “muito mais rico em massa e em importância agropastoril do que a média das regiões semi-áridas conhecidas.” (Ab’Saber, [1975]: 12.) O Seridó norte-rio-grandense está inscrito na grande unidade de paisagem Depressão Sertaneja, integrante dos Ecossistemas da Região das Caatingas e Florestas Deciduais do Nordeste. Na Depressão Sertaneja estão incluídas outras áreas do semi-árido, localizadas nos Estados de Pernambuco, Rio Grande do Norte, Paraíba e Bahia, conforme delimitação do Zoneamento Agroecológico do Nordeste, produzido pelo Cpatsa. (Silva et alii, 1993.) Os solos dominantes nessa área estão classificados, a nível exploratório, como Bruno Não-Cálcicos. Esse tipo de solo é caracterizado por apresentar pouca profundidade e alta susceptibilidade à erosão. Trata-se de um tipo particular de erosão – a laminar –, bastante comum no Seridó. Ao contrário da erosão em sulcos, a erosão laminar apresenta-se pouco perceptível, sendo por isso mais problemática. O problema da erosão laminar é que ela remove principalmente o horizonte superficial do solo – o horizonte “A”, que apresenta, em muitas áreas, profundidade inferior a 15 centímetros. O horizonte “A” é o mais rico em matéria orgânica. A erosão laminar determina, por isso, uma intensa perda dos nutrientes associados ao solo em que ocorrem. (Consórcio Tecnosolo & CEP, 1999: 19, v. 1.) Além dos solos Bruno Não-Cálcicos, também se observa a presença de solos Litólicos nas terras do Seridó. Os solos Bruno Não-Cálcicos apresentam fertilidade média e alta. Predominam na Zona Homogênea de Caicó. Enquanto isso, os solos Litólicos, fisicamente inadequados à agricultura, ocorrem com maior expressão na Zona Homogênea de Currais Novos. Também há ocorrência de solos aluviais, de regossolos eutróficos, de latossolos vermelho amarelos distróficos (com nutrição irregular), de solos podzólicos vermelho amarelos eutróficos e planossolos. Boa parte desses solos – especialmente os mais rasos, pedregosos e de relevo acidentado – constituiu outrora o domínio quase absoluto do algodoeiro mocó e da pecuária bovina de corte. Também foram utilizados, secundariamente, pela criação de caprinos. Mas sua utilização alternativa com outras atividades agrícolas é cada vez mais reduzida. Com a contração da produção algodoeira, observada nos 80 do século XX, os solos pouco férteis, pedregosos e ondulados do Seridó foram tendo seu uso restrito ao desenvolvimento extensivo da caatinga, cujas espécies se destinavam à extração de madeira, para a produção de lenha e carvão, utilizados com diversas finalidades, conforme salientado. Certo é que as atividades agrícolas e pecuárias realizadas no Seridó são hoje conduzidas em solos com as características mencionadas, porque são escassas as manchas de terras férteis, quase sempre encontradas nas faixas aluviais de alguns rios e riachos. Os solos de melhor fertilidade, textura e relevo, têm sido usados no cultivo de lavouras alimentares, de frutas e de forrageiras. Atualmente, o uso com forrageiras tem sido crescente, em virtude da prioridade que está sendo concedida à alimentação do gado destinado à produção leiteira. 65 TABELA 3.2.2.7 PERDA DE CAPACIDADE DE ARMAZENAMENTO DE ÁGUA DOS NOVE PRINCIPAIS AÇUDES DO SERIDÓ DO RIO GRANDE DO NORTE VOLUME DE SEDIMENTOS RETIDOS-VSR (106 m³) AÇUDE VTAA (10 ANUAL ATÉ 2000 ATÉ 2010 ATÉ 2020 m³ (2x3) – 18 Boqueirão 85,01 0,50 6,00 11,00 16,00 Caldeirão de Parelhas 10,20 0,10 3,30 4,30 5,30 Cruzeta 35,00 0,31 22,01 25,11 28,21 Dourado 10,32 0,25 4,50 7,00 9,50 Gargalheiras 41,90 0,47 19,27 23,97 28,67 Passagem de Traíras 48,88 0,38 17,55 20,26 22,95 Itans 81,75 0,27 17,55 20,25 22,95 Sabugi 65,33 0,21 7,35 9,45 11,55 Rio da Pedra 12,43 0,06 1,28 2,08 2,88 FONTE DOS DADOS BÁSICOS: Consórcio Tecnosolo & CEP, 1999: 18, v. 1. 1 1 2 6 Volume Total de Armazenamento de Água. Perda de Capacidade de Armazenamento de Água. 66 PCAA 2 = VSR/VTAA.100 ATÉ 2000 ATÉ 2010 ATÉ 2020 7,06 32,35 62,89 43,60 45,99 35,90 21,47 11,25 10,30 12,94 42,16 71,74 67,85 57,21 41,45 24,77 14,47 16,73 18,82 51,96 80,60 92,05 68,42 46,95 28,07 17,62 23,17 Convém salientar, ademais, que a disponibilidade de terras agricultáveis em grandes áreas contínuas, no Seridó, “é reduzida, pois a pequena produtividade dos solos, a pedregosidade na superfície ou a ocorrência de pequenas áreas de aluviões ao longo dos rios, restringem a ocupação agrícola a poucas manchas de terras na paisagem, o que pode ser comprovado no campo, pela atual forma de ocupação das terras, onde agricultores utilizam apenas as manchas de solos ligeiramente mais profundos, nas meias encostas ou as situadas nas proximidades dos cursos d’água.” (Consórcio Tecnosolo & CEP, 1999: 22, v. 1) A aptidão agrícola das terras do Seridó é bem variada, sendo diminuta sua utilização com lavouras de maior produtividade. O quadro 3.2.3.1 oferece uma visão clara sobre as possibilidades de aproveitamento agropecuário das terras do Seridó, assim especificadas: • duas classes de todas as terras da região (abrangendo 3,56% das terras do Seridó – i) a de terras planas, com moderadas a fortes limitações de fertilidade e deficiência hídrica, e ii) as de terras com relevo ondulado, mas com susceptibilidade à erosão e deficiência hídrica) – têm aptidão para o cultivo com a fruticultura irrigada e a olericultura; • uma classe de aptidão – a de terras com relevo suave a ondulado, com moderadas limitações de drenagem, fertilidade, deficiência hídrica e susceptibilidade à erosão – pode ser cultivada com produtos olerícolas, culturas anuais e pastagens, em áreas correspondentes a 2,93% de todas as terras do Seridó; • duas classes de aptidão, abrangendo 78,72% de todas as áreas do Seridó – i) a classe de terras com relevo suave ondulado a ondulado, com impedimentos à mecanização, susceptibilidade a erosão e deficiência hídrica e ii) a classe de relevo suave ondulado e montanhoso, com muito fortes limitações, no tocante aos mesmos aspectos da anterior – têm suas terras utilizáveis com culturas especiais, 33 pastagens e preservação ambiental; e • uma classe de aptidão, cobrindo 14,79% das terras do Seridó, referida às terras que se prestam apenas à preservação ambiental. Cotejando a disponibilidade de solos agricultáveis com as limitações de recursos hídricos – ainda mais notáveis –, verifica-se que não são amplas as possibilidades de desenvolvimento da agricultura no Seridó, sobretudo em relação às atividades realizadas em regime de sequeiro. Entretanto, há peculiaridades que devem ser destacadas, como ocorre com os platôs da Serra de Santana, cujos latossolos cobrem uma área da ordem de 25.000 hectares. Essa área não apresenta limitações de uso agrícola, além de ser beneficiada por suas condições intrínsecas de microclima serrano. Ali já se pratica uma fruticultura diversificada, de pequeno porte, dispersa por toda a Serra. 33 Como o abacaxi, a abóbora, o mamão, a melancia e a uva, por serem dotadas de sistema radicular superficial. 67 EXIGÊNCIAS DE CULTIVO NOS SOLOS DO SERIDÓ O solo do Seridó do Rio Grande do Norte e da Paraíba está muito erodido, pedregoso, parcialmente coberto, de seixos rolados, com manchas silicosas aqui e ali, subsolo aflorando com rochas de granito e de gneiss, pegmatito apontando nos altos, topografia acidentada ou ondulante; o run-off é levado com violento escoamento das águas nas horas de chuvas. Computandose a água acrescida anualmente no reservatório Cruzeta, de 1941 a 1947, achou-se o deflúvio médio, anual, de 88.839 m³ d’água, por km². Isto mostra que o solo raso e desnudo não acumula água para as lavouras e que o calor e o vento contribuem para secar mais o meio. Salvo algumas glebas, que foram poupadas pela enxurrada, a terra de cultura está limitada às margens dos rios e dos riachos cujos leitos, aliás, estão plantados com vazantes de batata-doce, de jerimum, de forragens, de feijão, etc., durante o verão, com estrume de gado nas covas. O algodão mocó ocupa a maior parte da superfície cultivada com o aproveitamento dos baixios dos riachos, as terras menos erodidas e aquelas cobertas de seixos rolados, onde o matuto, por meio de covas fundas, procura utilizar alguma umidade subterrânea. O seridoense potiguar é o homem que melhor aproveita o pequeno açude, no Nordeste. Seja plantando os solos úmidos, de montante, com culturas alimentares e forrageiras, seja criando peixes ou engordando o boi na corda, tira o máximo dessas iniciativas. É notável a quantidade de creme, de manteiga, de queijo e de carne de sol transportadas diariamente para Natal e para outras cidades. Conjugam-se, ali, a exploração dos açudes com a criação de gado e lavoura de algodão. O solo demais erodido e as condições de secura aconselham fazer a rotação cultural, controlar as enxurradas, plantar em curvas de nível, cobrir a terra nua com árvores, aproveitar melhor os açudes e construir outros, melhorar os pastos com as semeaduras de capins, de leguminosas, de arbustos de ramas forrageira, aperfeiçoar a cultura do mocó com melhores sementes e emprego dos inseticidas. Poder-se-ão incrementar os plantios de faveleiros, de algaroba, como forma de reflorestamento, para proteger o solo, fonte de sementes oleaginoas e forragens. (Duque, 1964: 61-62 e 64.) 68 QUADRO 3.2.3.1 SÍNTESE DA APTIDÃO AGRÍCOLA DAS TERRAS DO SERIDÓ CLASSES DE APTIDÃO DAS TERRAS Fi = Planas, com moderadas a fortes limitações PRINCIPAIS LIMITAÇÕES Fertilidade Deficiência hídrica OFi = Relevo ondulado, com fortes limitações Susceptibilidade à erosão Deficiência hídrica OiP = Relevo suave e ondulado, com moderadas Drenagem limitações Fertilidade Deficiência hídrica Susceptibilidade à erosão EiP = Relevo suave ondulado a ondulado, com Impedimentos à mecanização fortes limitações Susceptibilidade à erosão Deficiência hídrica PP = Relevo suave ondulado e plano, com muito Impedimentos à mecanização fortes limitações Susceptibilidade à erosão Deficiência hídrica GRAU DAS LIMITAÇÕES Forte Forte Forte Forte Moderada Forte Forte INDICAÇÕES DE USO Fruticultura irrigada Olericultura e fruticultura irrigada Olericultura Culturas anuais Pastagens ÁREA (% DO TOTAL) (hectare) 45.626 3,52 520 0,04 37.978 2,93 496.833 38,33 523.535 40,39 191.708 14,79 1.296.200 100,00 Moderada a forte Forte Moderada a forte Forte Muito forte Forte Forte RP = Relevo forte ondulado e montanhoso, com Impedimentos à mecanização muito fortes limitações Susceptibilidade à erosão Deficiência hídrica TOTAL Muito forte Muito forte Forte Culturas especiais e Pastagens Pastagens e preservação ambiental Preservação ambiental FONTE: Consórcio Tecnosolo & CEP (1999)- Plano de desenvolvimento do Seridó; relatório diagnóstico e prognóstico. Natal-RN, Federação das Indústria do Estado do Rio Grande do Norte–Fiern, Governo do Estado do Rio Grande do Norte & Prefeituras Municipais da Região do Seridó, 1999. 69 Trata-se da área do Seridó onde é possível ampliar a fruticultura, a partir, principalmente, da cajucultura. Os dois citados conjuntos de limitações físicas expõem ainda mais a fragilidade do meio ambiente da região, máxime quando se lhes ajunta o caráter extensivo e, em muitos sentidos, degradador dos processos de exploração das atividades agropecuárias, que têm sido postos em prática com muito pouca cautela, no tocante às exigências da gestão ambiental. 3.2.4 Recursos Florestais O Estado do Rio Grande do Norte apresenta uma realidade florestal caracterizada por elevada dependência em matéria de lenha e carvão vegetal, utilizados como energéticos, tanto pelo setor domiciliar quanto pelos setores industrial e comercial. A Região do Seridó tem esta realidade agravada pelas condições edafoclimáticas locais (baixa intensidade de chuvas, concentradas em poucos meses do ano, e solos rasos) e pelo baixo nível tecnológico de suas indústrias. Nesta perspectiva, descrevem-se a seguir as características principais do Mapeamento da Vegetação Nativa Lenhosa e do Inventário Florestal da Vegetação Nativa da região, estabelecendo-se depois os elementos básicos referentes ao Consumo e Demanda de Energéticos Florestais e à Conservação dos Recursos Florestais do Seridó. 3.2.4.1 Mapeamento da Vegetação Nativa Lenhosa O último levantamento da cobertura florestal da Região do Seridó foi efetuado em 1988, a partir de fotografias aéreas de 1985 (na escala 1:40.000). Seus resultados integram o Plano de Manejo Florestal da Região do Seridó, elaborado pelo Projeto Pnud/FAO/BRA/87/007. Não se conta com mapeamentos mais recentes. Aquele levantamento identificou três estratos bem característicos da vegetação nativa lenhosa da Região do Seridó, assim especificados: • isolada; Tipo 2 – Vegetação Natural Rala, onde as árvores ou arbustos apresentam-se de forma • Tipo 3 – Vegetação Natural Semidensa, onde os indivíduos apresentam-se mais próximos entre si, podendo, às vezes, estar agrupados; e • Tipo 4 – Vegetação Natural Densa, cujos indivíduos, homogeneamente distribuídos, apresentam suas copas fechadas ou quase fechadas. As áreas correspondentes aos tipos de vegetação, identificados nos municípios do Seridó, à época daquele levantamento, estão apresentadas na tabela 3.2.4.1. As áreas de agricultura, pastagem ou pousio (tipo 1) ocuparam 13,39% da área total mapeada, variando de municípios com 8% (Jucurutu e Timbaúba dos Batistas), até mais de 35% (Santana do Seridó e São José do Seridó), onde a agricultura é mais relevante. A avaliação da expansão da fronteira agropecuária da região indica ter havido um avanço de 5%, num período de 18 anos. 70 A vegetação natural ocupou 83,40% da área mapeada, sendo 14,94% pela vegetação rala, 52,30% pela semidensa e 16,15% pela densa. Daí, concluir-se que a vegetação característica do Seridó é a do tipo 3, que ocupou uma maior porcentagem de área na região. Em função de fatores relacionados à economia do Seridó (paralisação das atividades da Siderúrgica União e abandono da cultura do algodão, dentre os principais) e ao uso tradicional da terra (sistema de pousio), acredita-se que o ritmo de expansão da fronteira agrícola e de transformação do uso do solo tenha se mantido constante. Além disso, também se observa que várias indústrias locais têm utilizado, como combustível, a lenha de algaroba (Prosopis juliflora), minimizando, por isso, a utilização da mata nativa com fins energéticos. Admite-se, entretanto, continuar sendo necessário, para a prática de planejamento mais consistente, refazer os levantamentos sobre consumo e fluxo de produtos florestais e mapear novamente a cobertura florestal lenhosa, dentre as providências mais imediatas. TABELA 3.2.4.1 ÁREA MAPEADA NO SERIDÓ/RN, POR ESTRATO DE VEGETAÇÃO (1988) TIPO 1 ÁREA TOTAL MAPEADA (ha) ÁREA EXPLORÁVEL 803.436 133.373 ESTRATO DA VEGETAÇÃO NATIVA LENHOSA (ha) TIPO 2 TIPO 3 TIPO 4 TOTAL ÁREA DE ÁREA DE ÁREA DE ÁREA DE ÁREA PRESERÁREA PRESERÁREA PRESERÁREA PRESEREXPLOR VAÇÃO EXPLOVAÇÃO EXPLOVAÇÃO EXPLOVAÇÃO ÁVEL PERMARÁVEL PERMARÁVEL PERMARÁVEL PERMANENTE NENTE NENTE NENTE 107.609 12.455 336.147 84.095 75.806 53.951 652.935 150.501 FONTE: PROJETO Pnud/FAO/Ibama/BRA/87/007 (1992)- Plano de manejo florestal para a Região do Seridó do Rio Grande do Norte. Natal-RN, Ibama, 1992. Volume 1. (Levantamentos Básicos.) 3.2.4.2 Inventário Florestal da Vegetação Nativa Tendo como base o mapeamento da vegetação nativa lenhosa da região, o Projeto Pnud/FAO/Ibama/BRA/87/007 realizou, em 1989, um inventário florestal, para quantificar o volume da biomassa existente, além de caracterizar os tipos florestais quanto à abundância e dominância das espécies. a. Estoque Unitário por Tipo Florestal A tabela 3.2.4.2 apresenta os valores do estoque florestal e as respectivas médias, expressas por sete variáveis, para cada tipo florestal (ou estrato de vegetação nativa lenhosa). TABELA 3.2.4.2 ESTOQUE MÉDIO UNITÁRIO POR TIPO FLORESTAL TIPOS DE ESTRATOS DA VEGETA-ÇÃO NATIVA LENHOSA (ha) NÚMERO DE ÁRVORE POR HECTARE (n/ha) ÁREA BASAL NA BASE - ABB (m²/ha) ÁREA BASAL À ALTURA DO PEITO - ABP (m²/ha) ABB x ALTURA MÉDIA - H (m³/ha) ABP.H (m³/ha) P. VERDE (t/ha) P.SECO (t/ha) VOLUME REAL (m³/ha) VOLUME EMPILHADO (st/ha) (*) TIPO 2 620 3,50 2,21 6,35 4,86 8,93 5,91 8,06 26,90 TIPO 3 1.003 5,48 3,39 8,23 6,56 13,11 9,17 12,01 39,80 TIPO 4 1.781 9,17 5,99 25,45 21,41 29,33 20,58 26,93 89,60 FONTE: PROJETO Pnud/FAO/Ibama/BRA/87/007 (1992)- Plano de manejo florestal para a Região do Seridó do Rio Grande do Norte. Natal-RN, Ibama, 1992, Volume 1. (Levantamentos Básicos.) (*) st/ha = Estéreo por hectare. (O estéreo, medida de volume para lenha, estéreo corresponde a uma pilha de lenha com dimensões aproximadas de 1 x 1 x 1 m, equivalente a 0,355 m³ sólidos.) 71 b. Estoque Global Explorável Baseado no rendimento do estoque unitário dos diferentes tipos florestais, determinou-se o estoque de biomassa explorável para a Região do Seridó, como consta da tabela 3.2.4.3. TIPO 2 3 4 TOTAL TABELA 3.2.4.3 ESTOQUE GLOBAL EXPLORÁVEL TOTAL DA ÁREA VOLUME VOLUME ESTOQUE EXPLORÁVEL EXPLORÁVEL REAL EMPILHADO st x106 % ha % m³/ha st/ha m³ x 106 107.609 20,71 8,06 26,90 0,87 2,89 12,53 336.147 64,70 12,01 39,80 4,04 13,38 58,02 75.806 14,54 26,93 89,60 2,04 6,79 29,45 519.562 100,00 6,95 23,06 100,00 FONTE: PROJETO Pnud/FAO/Ibama/BRA/87/007 (1992)- Plano de manejo florestal para a Região do Seridó do Rio Grande do Norte. Natal-RN, Ibama, 1992. Volume 1. (Levantamentos Básicos.) (*) st/ha = Estéreo por hectare. O resultado do estoque florestal nas áreas de preservação permanente pode ser verificado na tabela 3.2.4.4. TIPO 2 3 4 TOTAL TABELA 3.2.4.4 ESTOQUE DAS ÁREAS DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE ÁREAS DE VOLUME VOLUME PRESERVAÇÃO REAL EMPILHADO ESTOQUE PERMANENTE st x 106 ha % m³/ha st/ha m³ x 106 12.455 8,28 8,06 26,90 0,10 0,33 84.095 55,88 12,01 39,80 1,01 3,35 53.951 35,84 26,93 89,60 1,45 4,83 150.501 100,00 2,56 8,51 % 3,88 39,36 56,76 100,00 FONTE: PROJETO Pnud/FAO/Ibama/BRA/87/007 (1992)- Plano de manejo florestal para a Região do Seridó do Rio Grande do Norte. Natal-RN, Ibama, 1992. Volume 1. (Levantamentos Básicos.) O estoque total de biomassa florestal nos 670.063 ha de mata nativa do Seridó soma 31,57 milhões de estéreos, dos quais 23,06 milhões de estéreos, ou seja 73,08%, representam o estoque explorável, enquanto que as áreas de preservação permanente totalizam 8,51 milhões de estéreos, o que corresponde a 26,96% do volume total de biomassa. A relação entre o estoque explorável, para cada tipo de estrato de vegetação nativa lenhosa, e o total do tipo de estrato florestal apresenta os seguintes resultados: • Tipo 2: 89,75%; • Tipo 3: 79,98%; e • Tipo 4: 58,43%. A baixa proporção explorável observada no tipo 4 é explicada pelo fato de boa parte da vegetação localizar-se nas encostas dos morros, as quais, segundo o Código Florestal, são consideradas áreas de preservação permanente. 72 c. Caracterização dos Tipos Florestais Os três tipos florestais são caracterizados pela estratificação da vegetação nativa (tipo 2 – vegetação rala; tipo 3 – vegetação semidensa; e tipo 4 – vegetação densa), mas não apresentam diferenças qualitativas importantes entre si, por constituírem, em conjunto, uma formação vegetal. As diferenças existentes são, principalmente, de caráter quantitativo, mostrando-se bem visíveis entre os tipos 2 e 4, sendo o tipo 3 uma transição entre aqueles. As causas dessas diferenças são baseadas ora em fatores ecológicos, como a qualidade do sítio, ora em fatores antrópicos, como a exploração florestal e/ou a atividade agropecuária. Os três tipos são caracterizados a seguir. • Tipo 2 – Vegetação Natural Rala. Esse estrato apresenta duas espécies predominantes – o pereiro (Aspidosperma pirifolium) e a jurema preta (Mimosa hostilis) –, tanto em número de árvores (71%) como em área basal (82%). A catingueira (Caesalpinia pyramidalis) e a jurema branca (Pithecolobium dumosum), o marmeleiro (Croton hemiargyreus) e o mofumbo (Cobretum leprosum) apresentam-se como espécies acompanhantes. Normalmente, essas áreas sofreram uma ação antrópica intensa, levando a um alto grau de degradação. Em termos de volume de biomassa florestal, esse é o estrato menos importante. Apresenta um estoque de 0,97 milhões de m³ ou 3,22 milhões de estéreos. Ocupa 120.064 ha, sendo 107.609 ha cobertos com vegetação passível de exploração e 12.455 ha de área de preservação permanente. • Tipo 3 – Vegetação Natural Semidensa. Nesse estrato não existe uma dominância clara das espécies. No entanto, as mais encontradas são o pereiro (Aspidosperma pirifolium), o marmeleiro (Croton hemiargyreus), a jurema preta (Mimosa hostilis), a jurema branca (Pithecolobium dumosum), o mofumbo (Cobretum leprosum) e a catingueira (Caesalpinia pyramidalis). Em volume de biomassa, destacam-se três espécies: o pereiro, a jurema preta e a catingueira, que, juntas, representam 76% do volume total de biomassa. No que se refere ao volume de biomassa, é o estrato mais importante, apresentando um estoque de 5,05 milhões de m³, ou seja, 16,73 milhões de estéreos. Ocupa uma área de 420.242 ha, sendo 336.147 ha passíveis de exploração e 84.095 ha correspondentes às áreas de preservação permanente. • Tipo 4 – Vegetação Natural Densa. Basicamente, duas espécies dominam a população desse estrato: o marmeleiro (Croton hemiargyreus) e a catingueira (Caesalpinia pyramidalis). Novamente, quando se considera o volume de biomassa, notam-se três espécies importantes: a catingueira, a jurema preta e o marmeleiro (73%). Neste tipo florestal há uma maior diversidade florística. Esse é o menor estrato em área explorável e o segundo em volume de biomassa, apresentando um estoque de 3,49 milhões de m³, ou seja, 11,62 milhões de estéreos. Ocupa uma área de 129.757 ha, sendo 75.806 ha de área explorável e 53.951 ha de área de preservação permanente. As características mais visíveis no campo, que permitem diferenciar os tipos florestais entre si, são a densidade das árvores e arbustos, a altura e a composição florística, especificadas a seguir. i. Densidade. É a característica mais marcante, quanto à diferenciação entre tipos florestais, sendo definida como densa, semidensa e rala; a média desta variável é de 620 árvores/ha no tipo 2, 1.000 árvores/ha no tipo 3 e 1.800 árvores/ha no tipo 4. Os limites de diferenciação entre os tipos florestais, segundo a densidade seriam então os seguintes: 73 • Tipo 2 – até 800 árvores/ha, 8 árvores em 10 x 10 m; • Tipo 3 – 800 a 1.300 árvores/ha, 8 a 13 árvores em 10 x 10 m; e • Tipo 4 – mais de 1.300 árvores/ha, mais de 13 árvores em 10 x 10 m. ii. Altura. Não é grande o contraste de altura entre os tipos florestais; porém, em função desta característica, é possível distinguir principalmente o tipo 4 dos outros dois. Nos tipos 2 e 3 a altura média das árvores maiores é de aproximadamente 4 m, enquanto que no tipo 4 é de 5,5 m. iii. Composição Florística. Também não é de alto contraste a diferença quanto às espécies, uma vez que esta é gradativa. As características específicas de cada tipo florestal baseiam-se na freqüência e na dominância das espécies, conforme apresentado no quatro 3.2.4.1, a seguir. QUADRO 3.2.4.1 COMPOSIÇÃO QUALITATIVA E QUANTITATIVA DOS TIPOS FLORESTAIS CARACTERÍSTICAS DOMINÂNCIA EM BIOMASSA (PESO SECO) FREQÜÊNCIA TIPO 2 TIPO 3 Jurema preta e Pereiro (dominante) Pereiro e Jurema preta (dominante claramente) Catingueira e Jurema preta (subdominante) -Catingueira (pouco freqüente) -Catingueira (muito freqüente) -Angico e Imburana (não ocorrem) -Angico e Imburana (às vezes -Marmeleiro e Jurema branca (às presentes) vezes presentes) -Marmeleiro e Jurema branca (situação -Mofumbo (situação intermediária) intermediária) -Mofumbo (muito comum) TIPO 4 Catingueira e Jurema preta (dominante) Marmeleiro (subdominante) -Catingueira (presença quase certa) -Angico e Imburana (às vezes presentes) -Marmeleiro e Jurema branca (muito comuns) -Mofumbo (pouco freqüente) Assim a observação combinada dos diferentes caracteres específicos permitirá reconhecer o tipo florestal em uma determinada área. 3.2.4.3 Consumo e Demanda de Energéticos Florestais A ordenação racional dos recursos florestais de uma determinada região tem, principalmente, como base o conhecimento da oferta e da demanda desses recursos. Pelas próprias características da Região do Seridó e dos recursos citados, a demanda naquela região refere-se, em essência, aos energéticos florestais – lenha e carvão vegetal. Para conhecer o volume desses energéticos, consumidos pelos setores domiciliar, industrial e comercial do Seridó, o Projeto Pnud/FAO/Ibama/BRA/87/007 realizou, em 1987, uma amostragem do consumo para aqueles setores. O consumo dos energéticos referidos atingiu volume equivalente a 501.500 estéreos/ano, o que representava cerca de 12.000 ha desmatados anualmente. No setor domiciliar, o consumo atingiu cerca de 350.300 estéreos/ano, sendo que 146.400 estéreos/ano (42%) correspondiam ao consumo domiciliar urbano e 203.900 estéreos/ano (58%) ao consumo domiciliar rural. 74 Quanto ao setor industrial, o consumo era de 151.200 estéreos/ano, mas na época da amostragem o setor encontrava-se com capacidade ociosa bastante alta (34%), devido, principalmente, ao fato de 1987 haver sido um ano de atividade econômica deprimida no País. O consumo potencial, ou seja, o consumo de lenha nas indústrias, funcionando a plena capacidade, foi calculado em aproximadamente 227.600 estéreos/ano (50% a mais do que o registrado em 1987). a. Cenário Atual Diante da importância que os energéticos florestais representam para a economia do Seridó, é necessário realizar um novo levantamento florestal, para que se possa conhecer a evolução do consumo, daquela data em diante, haja vista o fato de nos anos posteriores ao levantamento a economia local haver sofrido modificações, e essas, com certeza, modificaram o perfil do consumo de biomassa na região. Esse fato pode ser comprovado pela circunstância de o setor de cerâmica dispor, em 1987, de 8 indústrias em atividade, e de contar atualmente com 71 cerâmicas em funcionamento na região, ou seja, houve um incremento de 887%, expressão bastante significativa para as condições locais. Outros ramos industriais, também consumidores de energéticos florestais, com certeza, tiveram suas atividades dinamizadas, em função da conjuntura atual, como as indústrias de sabão, óleos vegetais, torrefação de café, doces e padarias. b. Situação do Pólo de Cerâmica do Seridó Das 71 cerâmicas em atividade naquela região, 46 (65%) estão distribuídas em apenas 5 municípios: Jardim do Seridó (6 cerâmicas), Carnaúba dos Dantas (16), Parelhas (21), Santana do Seridó (2) e Equador (1). As 25 cerâmicas restantes estão distribuídas pelos demais municípios da região. Uma das características do setor ceramista da região é sua baixa eficiência técnica e gerencial. Dentre as razões para tal situação, podem ser citadas as seguintes: i. existência de fornos de concepção “bem rudimentar” e construção própria; ii. utilização de sistemas de combustão deficiente; iii. falta de instrumentação de controle dos fornos; iv. capacidade laboratorial nula; v. secagem deficiente do material “marombado”; vi. reduzido nível de mecanização; vii. utilização de mão-de-obra não qualificada; viii. baixo nível de investimento; e ix. produto final pouco uniforme. 75 c. Cenário do Consumo de Lenha no Setor Cerâmico Tomando-se o consumo médio de 560 estéreos/ano, declarado ao Ibama pelas 71 cerâmicas da região, ter-se-ia um consumo total de 39.760 estéreos/ano. Dividido pelo rendimento médio da vegetação (42 estéreos/hectare), resultaria uma área total desmatada de 947 hectares/ano. Os estudos realizados pelo Projeto Pnud/FAO/Ibama/BRA/87/007 e o Laboratório de Produtos Florestais, do Ibama, resumidos na tabela 3.2.4.5, apontam para uma realidade bastante diferente. TABELA 3.2.4.5 CONSUMO DE ENERGÉTICOS FLORESTAIS NO SETOR CERÂMICO DO SERIDÓ DO RIO GRANDE DO NORTE NÚMERO DE CERÂMICAS NA REGIÃO NÚMERO DE FORNADAS POR INDÚSTRIA/ ANO TOTAL ANUAL DE FORNADAS NA REGIÃO PRODUÇÃO MÉDIA POR FORNADA (Milheiros) 71 48 3.488 11 QUANTIDADE. DE PEÇAS PRODUZIDAS NA REGIÃO (Milheiros) CONSUMO ESPECÍFICO DE LENHA (st/Milheiro) CONSUMO TOTAL DE LENHA NA REGIÃO (st/ano) RENDIMENTO MÉDIO DA VEGETAÇÃO NATIVA (st/ha) ÁREA DESMATADA ANUALMENTE NA REGIÃO (ha) 4,31 161.573 42,00 3.847 37.488 FONTE: PROJETO Pnud/FAO/Ibama/BRA/87/007 (1992)- Plano de manejo florestal para a Região do Seridó do Rio Grande do Norte. Natal-RN, Ibama, 1992. Volume 1. (Levantamentos Básicos.) Assim, em tese, pode-se admitir que a área desmatada para o atendimento da demanda anual do setor de cerâmica da Região do Seridó é de aproximadamente 3.800 ha, bastante diferente, portanto, daquela que seria resultante do consumo declarado ao Ibama (947 ha/ano). A tabela 3.2.4.6 mostra os valores de incremento médio anual (IMA) de áreas ocupadas com algaroba no Seridó, calculados pelo Projeto Pnud/FAO/Ibama/BRA/87/007. TABELA 3.2.4.6 VALORES DE INCREMENTO MÉDIO ANUAL OBTIDOS SEGUNDO A POSIÇÃO TOPOGRÁFICA POSIÇÃO INCREMENTO MÉDIO ANUAL-IMA VÁRZEA BAIXIO TABULEIRO MAIS MÉDIA ENCOSTA Volume Real (m³/ha ano) 11,30 1,90 0,74 4,60 Volume Empilhado (st/ha ano) 39,00 6,70 2,60 16,10 Peso Verde (t/ha ano) 14,10 2,40 0,93 5,80 Peso Seco (t/ha ano) 9,40 1,60 0,62 3,90 FONTE: PROJETO Pnud/FAO/Ibama/BRA/87/007 (1992)- Plano de manejo florestal para a Região do Seridó do Rio Grande do Norte. Natal-RN, Ibama, 1992. Volume1. (Levantamentos Básicos.) Como é possível observar, o crescimento da algaroba é fortemente influenciado pela posição topográfica do terreno em que as plantas se encontram. De fato, as áreas de várzeas e baixios apresentam valores de incrementos superiores aos observados nos tabuleiros e encostas. 3.2.4.4 Conservação dos Recursos Florestais Atualmente, a Região do Seridó conta com três unidades de conservação ambiental: as duas Reservas Particulares do Patrimônio Natural (RPPN) e uma Estação Ecológica (ESEC). As RPPN podem ser preservadas e reconhecidas pelo poder público como reservas particulares do patrimônio natural. 76 Nessas condições, a área passa a receber atenção especial dos órgãos de meio ambiente, instituições de pesquisa e entidades ambientalistas. A ESEC está a cargo do governo federal. As RPPN estão localizadas nos Municípios de Acari (RPPN Sernativo) e Jucurutu (RPPN Stoessel de Brito). Possuem área de 156 ha e 756 ha, respectivamente, e têm como objetivo ordenar o uso e proteger o ecossistema da caatinga. As atividades de educação ambiental são realizadas nas RPPN. A Estação Ecológica do Seridó, localizada no Município de Serra Negra do Norte, possui uma área de 1.166,38 ha, e tem como objetivo principal proteger bancos genéticos de flora e fauna da caatinga, desenvolvendo, para tal, atividades de pesquisa científica e de educação ambiental. Por outro lado, na Região do Seridó há 150.500 ha de caatinga considerados de preservação permanente, os quais apresentam grande potencial para a criação de unidades de conservação, seja de uso direto ou indireto. O quadro 3.2.4.2 contém uma lista dessas áreas potenciais, bem como os instrumentos legais existentes, que amparam a criação de unidades de conservação. QUADRO 3.2.4.2 ÁREAS DO SERIDÓ QUE APRESENTAM POTENCIAL PARA A CRIAÇÃO DE UNIDADES DE CONSERVAÇÃO, COM RESPECTIVO AMPARO LEGAL ÁREAS COM POTENCIAL PARA CRIAÇÃO DE UNIDADES DE CONSERVAÇÃO Serras, Montanhas e Montes Áreas de Pouso de Aves de Arribaçã Reservatórios Naturais e Artificiais Reservas Florestais nos Projetos de Assentamento Sistemas Fluviais LEGISLAÇÃO Lei Federal Nº 4.771, de 15/09/1965; Lei Federal Nº 6.938, de 16/05/1988; Lei Federal Nº 6.766, de 19/12/1979; Resolução CONAMA Nº 004/1985. Lei Federal Nº 4.771, de 15/09/1965; Lei Federal Nº 6.938, de 16/05/1988;Lei Federal Nº 5.197, de 03/01/1967; Resolução CONAMA Nº 004/1985. Lei Federal Nº 4.771, de 15/09/1965; Lei Federal Nº 6.938, de 16/05/1988; Lei Federal Nº 6.766, de 19/12/1979; Lei Federal Nº 7.661, de 31/08/1981; Resolução CONAMA Nº 004/1985; Resolução CONAMA Nº 020/1981. Lei Federal Nº 4.771, de 15/09/1965. Lei Federal Nº 4.771, de 15/09/1965;Lei Federal Nº 6.938, de 16/05/1988; Lei Federal Nº 6.766, de 19/12/1979; Lei Federal Nº 7.661, de 31/08/1981; Resolução CONAMA Nº 004/1985. 3.2.5 Recursos Minerais No semi-árido estão presentes as mais importantes áreas de ocorrência mineral do Nordeste. O Rio Grande do Norte é um dos Estados mais bem dotados desses recursos na Região. A contribuição da indústria extrativa mineral para a geração do Produto Interno Bruto–PIB, a custo de fatores, do Nordeste e daquele Estado, tem-se ampliado, embora não seja das mais expressivas. A partir desse posicionamento geral, trata-se, a seguir, ainda que de forma esquemática, de outros importantes elementos da mineração, assim especificados: • A Economia Mineira do Nordeste e do Rio Grande do Norte; • Origens, Evolução e Perspectivas da Economia Mineira do Seridó; e • Impactos Ambientais da Mineração. 3.2.5.1 A Economia Mineira do Nordeste e do Rio Grande do Norte O valor da Produção Mineral do Nordeste, conforme estudos do Projeto Áridas, evoluiu positivamente, no período 1980-90, embora a um ritmo bem menor do que o constatado para o País como um todo. De uma produção de US$ 2,360 milhões, para o Nordeste, em 1981, o valor elevou-se para US$ 77 2,660 milhões, em 1990, representando uma taxa de crescimento anual de 1,34%. Enquanto isso, a taxa anual de crescimento da produção mineral brasileira, no mesmo período, foi de 8,68%. O desempenho da mineração no Rio Grande do Norte superou o da economia mineira no Brasil, pois a taxa de crescimento anual da produção mineira potiguar, naquele período, foi de 12,40%. (Tabela 3.2.5.1.) TABELA 3.2.5.1 VALOR DA PRODUÇÃO MINERAL-VPM BRASILEIRA E DO NORDESTE, POR ESTADO, NOS ANOS DE 1981 E 1990 ESPECIFICAÇÃO Maranhão Piauí Ceará Rio Grande do Norte Paraíba Pernambuco Alagoas Sergipe Bahia VPM NORDESTE (*) VPM BRASIL (*) NORDESTE/BRASIL (%) VPM – 1981 ABSOLUTO (US$ 1,000) 4.516 4.058 115.779 255.291 10.614 20.479 52.910 635.066 1.261.508 2.360.221 6.157.345 38,33 % SOBRE O TOTAL 0,2 0,1 5,0 10,8 0,4 0,8 2,2 27,0 53,4 100,0 VPM – 1990 % SOBRE O TOTAL ABSOLUTO (US$ 1,000) 43.091 23.924 180.491 730.874 43.933 45.958 117.539 454.390 1.022.506 2.659.706 13.018.929 20,43 1,6 0,9 6,7 27,5 1,7 1,7 4,4 17,0 38,4 100,0 FONTE DOS DADOS BÁSICOS: DNPM. Anuário Mineral Brasileiro, 1982 e 1991. APUD: PINTO, Carlos Almiro Moreira et alii (1994)- Recursos minerais do semi-árido: diagnóstico e perspectivas. Brasília, Projeto Áridas-Nordeste, 1994. Xerox. (Trabalho preparado no contexto do Projeto Áridas-Nordeste.) (*) Inclui energético (petróleo e gás natural), diamantes e gemas. O crescimento da mineração no Rio Grande do Norte foi de magnitude considerável. Em 1981, o Estado se encontrava em terceiro lugar, no ranking da produção mineral dos Estados do Nordeste (produzindo 10,8% da produção mineira), logo após Sergipe, que ocupava o segundo lugar (27,0%), e a Bahia, em primeiro (53,4%). Em 1990, o Rio Grande do Norte ocupou o segundo lugar (com 27,5%), mantendo-se a Bahia em primeiro (com 38,4%). No cômputo geral, a perda de posição relativa da Bahia resultou dos ganhos auferidos pelo Rio Grande do Norte. Esses ganhos deveram-se à entrada desse Estado, no rol dos produtores de petróleo do Nordeste. A contribuição da produção mineira do Rio Grande do Norte para a geração do PIB regional e estadual qualifica melhor a posição das atividades da indústria extrativa mineral nesse Estado. O exame de alguns anos do período 1970-95 indica que a contribuição dessa indústria era de apenas 1,94%, em 1970. Cresceu até 1985, quando ficou no patamar de 5,11%, mas decresceu para 1,83%, em 1990. Essa quebra foi resultado da queda de preços no mercado internacional da scheelita, wolframita, Tantalita e Berílio, em relação aos produtos mais tradicionais da pauta de exportação regional. Em 1995, a contribuição da indústria extrativa mineral voltou a elevar-se, alcançando posição recorde, em virtude da expansão da produção petrolífera. (Tabela 3.2.5.2.) A participação da indústria extrativa mineral do Rio Grande do Norte no PIB do Estado também foi crescente nos anos de 1970 (2,54%) a 1985 (13,02%). Mas diminuiu consideravelmente daí em diante, apesar da ampliação da produção petrolífera no litoral potiguar. Baixou para 9,5% em 1990 e para 6,00% em 1995. Essa perda de posição tem a ver com a crise que afetou a indústria extrativa mineral na Região 78 do Seridó, por conta da redução extraordinária enfrentada pela economia mineral, em particular a baseada na scheelita, como consta da tabela 3.2.5.2. De todo modo, a participação da indústria extrativa mineral do Rio Grande do Norte nesse mesmo conjunto de atividades para o Nordeste foi crescente naqueles mesmos anos do período 1975-95, como mostra a tabela 3.2.5.3. A indústria extrativa mineral–IEM do Rio Grande do Norte que participava com 6,67% no conjunto da IEM do Nordeste, em 1970, elevou sua participação para 36,16%, em 1995. Tratase de uma evolução positiva, pois a IEM do Nordeste, além de ter crescido, também diversificou-se. TABELA 3.2.5.2 PARTICIPAÇÃO DA INDÚSTRIA EXTRATIVA MINERAL-IEM NA GERAÇÃO DO PRODUTO INTERNO BRUTO DO NORDESTE E DO RIO GRANDE DO NORTE, A CUSTO DE FATORES, EM ANOS DO PERÍODO 1970-95 ANO IEM DO NORDESTE/PIB NORDESTE (%) IEM DO R. G. NORTE/PIB R. G. NORTE(%) 1970 1,94 2,54 1975 2,26 5,71 1980 2,45 6,08 1985 5,11 13,02 1990 1,83 9,50 1995 10,92 6,00 FONTE DOS DADOS BÁSICOS: Brasil. Sudene. (1999)- Agregados econômicos regionais – Nordeste do Brasil – 19651998. Recife, Sudene, 1999, p. 18-22 e 94-97. TABELA 3.2.5.3 PARTICIPAÇÃO DO RIO GRANDE DO NORTE NA INDÚSTRIA EXTRATIVA MINERAL-IEM DO NORDESTE, EM ANOS DO PERÍODO 1970-95 ANO 1970 1975 1980 1985 1990 1995 IEM DO NORDESTE (%) 100,00 100,00 100,00 100,00 100,00 100,00 IEM DO RIO GRANDE DO NORTE (% SOBRE O NORDESTE) 6,67 12,63 13,56 16,22 31,22 36,16 FONTE DOS DADOS BÁSICOS: Brasil. Sudene. (1999)- Agregados econômicos regionais – Nordeste do Brasil – 19651998. Recife, Sudene, 1999, p. 18-22 e 94-97. 3.2.5.2 Origens, Evolução e Perspectivas da Indústria Extrativa Mineral do Seridó A sociedade e a economia do Seridó devem boa parte do seu progresso à indústria extrativa mineral, mormente a ligada à mineração do tungstênio. A Região do Seridó também foi impulsionada por outros jazimentos, de menor importância econômica, como os minerais de nióbio e tântalo, estanho, bismuto, lítio, ouro e berílio (também sob a forma de gema preciosa) e água-marinha. Dada a presença desses minerais, a região em estudo pode ser denominada de Província Mineral Scheelitífera e Pegmatítica do Seridó. A Região do Seridó do Rio Grande do Norte só veio a conhecer a mineração como uma atividade regular no início da década de 30, quando compradores alemães começaram a adquirir na região os chamados minerais estratégicos, extraídos de pegmatitos, representados principalmente pelo berílio, columbita, tantalita, cristal de rocha e mica. Antes, o extrativismo mineral esteve constituído quase que exclusivamente por materiais de construção, representados por argilas ceramificáveis, calcários para o fabrico do cal, areias e rochas para agregados ou emprego direto. (Dantas, 1993.) 79 Por conta das demandas identificadas no curso da II Guerra Mundial, os recursos minerais já explorados aumentaram de produção, a eles se acrescendo a descoberta da scheelita, mineral de tungstênio, que passou a ser o produto mais importante para a economia mineira do Seridó. Nesse período, a mineração apresentava-se como uma atividade com baixo nível de industrialização, caracterizada pela garimpagem de minerais de pegmatitos e de tungstênio. Sua importância pode ser aquilatada pelo número de empregos então gerados, calculados como abrangendo um contingente de mais de 10.000 trabalhadores. (Dantas, 1999.) No pós-guerra, começou a se observar uma certa diminuição do nível daquelas atividades. Mas esse problema teve curta duração, pois o conflito sino-coreano deflagrado na Manchúria, região de maior produção mundial de tungstênio, ainda hoje, compromete o consumo e a formação de estoques, que se agravaram em virtude das dificuldades interpostas pela Guerra Fria. Nas brechas do mercado ampliado, por conta das decisões estratégicas de não exportar a produção local, adotadas naquela parte do mundo, o Seridó conseguiu ter sua produção expandida, com mercado assegurado. (Dantas, 1999.) Centralizada em Currais Novos, a atividade mineira do Seridó ganhou gradativamente níveis modernos de industrialização e de agregação tecnológica. Embora no início da década de 60, a atividade demonstrasse certa decadência, o quadro tornou-se mais uma vez favorável, em virtude das políticas de desenvolvimento regional adotadas pela Sudene, que estabeleceu prioridade para que a exploração de minerações locais, em várias sub-regiões do Nordeste, pudesse ser conduzida como importante atividade econômica. O I Plano Diretor de Desenvolvimento Econômico e Social do Nordeste, com vigência no período 1961-63, elaborado pela Sudene, a partir das diretrizes estabelecidas pelo Grupo de Trabalho para o Desenvolvimento do Nordeste–GTDN, reconhecia a fragilidade do setor privado, na área da mineração. Destacava, por isso, caber aos “órgãos governamentais, através de estudos bem orientados e coordenados, verificar as verdadeiras possibilidades do Nordeste, como região produtora de minérios, e promover seu aproveitamento racional, criando, ao mesmo tempo, ambiente para o desenvolvimento de uma sólida indústria mineira”. Esse era, por sinal, o objetivo do plano de aproveitamento de recursos minerais, formulado por aquela Autarquia, em 1959/60, e aprovado pelo Congresso Nacional, como parte do I Plano Diretor. (Mecor, Sudene, 1966: 219.) É nesse período que se iniciam os estudos básicos e tecnológicos visando a diversificação e melhor aproveitamento dos recursos minerais da região. O I Plano Diretor da Sudene reconhecia que a produção mineira do Nordeste era muito variada, mas havia numerosas ocorrências minerais, ainda não exploradas, que deviam ser melhor conhecidas. No que de particular interessa ao Seridó, o I Plano Diretor da Sudene dava ênfase a estudos sobre metais preciosos como o Ouro, minerais não-ferrosos (como o Cobre), Ferro e metais ferrosos (como o tungstênio), metais menores (como o tântalo, columbita, berílio e lítio). materiais industriais e refratários (como a mica), materiais cerâmicos (como o caulim), materiais de construção (como o gesso) e pedras preciosas e semipreciosas (como o berílio, a água-marinha e o corindon). (Mecor, Sudene, 1966: 223-229.) A década de 70 começou com uma alta significante nos preços da scheelita, no mercado externo, ativando as atividades desse subsetor da mineração seridoense. Ademais, contou-se com a 80 ampliação do mercado interno nacional, como resultado do processo de industrialização substitutiva de importações, em curso na Região Centro-Sul do País. A economia mineira baseada na scheelita consolidou-se, nesse que foi o seu melhor período de desenvolvimento. A mineração da scheelita e dos minerais de pegmatitos gerou um amplo e diversificado conhecimento da Geologia e dos recursos minerais da região, refletindo-se tais conhecimentos no surgimento de outros produtos, notadamente de minerais industriais, comandados pelo caulim e o feldspato, as gemas e as rochas ornamentais. A intensa exploração então realizada contribuiu para que as minas se tornassem profundas, elevando-se os custos de extração e de beneficiamento. A elevação dos custos, associada à queda de preços no mercado externo contribuiu gradativamente para que a economia mineira seridoense declinasse consideravelmente seu nível de atividade, levando muitas empresas à paralisação. Um outro gravame deve ser registrado. Trata-se do fato de alguns minerais estratégicos terem passado a uma condição de abundância e enfrentado a concorrência de produtos substitutos ou derivados da reciclagem de produtos finais. Essas circunstâncias comprometeram a produção das minas, a tal ponto que a produção de tungstênio, nos dias de hoje, chega a representar 1/3 do seu consumo real. A economia mineira do Seridó foi afetada ainda pela ausência de uma política mineral, a exemplo da que fora concebida e levada à prática no começo dos anos 60, sob a coordenação da Sudene. Na ausência dessa política, os empresários dedicados à mineração no Seridó não conseguiram delinear novas alternativas para suas atividades, as quais, de mais a mais, foram também seriamente comprometidas pela crise econômica que se instalou no País, em parte dos anos 80 e 90. Essa economia apresenta hoje uma configuração com as mesmas características qualitativas prevalecentes no período que antecedeu a II Guerra Mundial. Neste sentido, ela se encontra restrita à produção de materiais de construção de demanda no máximo estadual e a uma produção incipiente dos seus conhecidos minerais estratégicos. Apesar das limitações indicadas, a mineração no Seridó ainda tem futuro, a começar pelo tungstênio. Uma das possibilidades a este respeito refere-se ao aproveitamento dos rejeitos da mineração, hoje considerados um sério problema ambiental. Em lugar de constituir problema, aqueles rejeitos – que estão fora do subsolo – representam, hoje, “a maior mina de tungstênio do Brasil”. Seu aproveitamento requer a elaboração de um projeto de caracterização tecnológica, adequadamente estudado. Todo o processo de concentração ali utilizado era gravimétrico. O rendimento da extração do Tungstato variava de 80 a 85% desse minério. Assim, de 15 a 20% do produto final a ser beneficiado se encontra hoje na superfície do solo, em torno das minas. 34 Os rejeitos são parte integrante das minas, assim como os equipamentos nelas utilizados. Desse modo, os rejeitos pertencem aos donos de minas, desde que essas se encontrem abertas. Mas pertencerão à Nação, nos casos de corresponderem a minas fechadas, que tenham perdido suas concessões. As possibilidades referidas já foram estudadas. Existe uma memória dos estudos realizados por uma empresa de consultoria, para o Projeto do Complexo Químico-Metalúrgico, por solicitação da 34 Cf. entrevista com o prof. Edgard Dantas, em 20.11.99. 81 Secretaria do Planejamento do Rio Grande do Norte. Foram preparados perfis de projeto, disponíveis e utilizáveis, contribuindo para o aprofundamento de novos estudos técnicos e institucionais sobre o assunto. 35 Pode-se dizer que as possibilidades dos demais recursos minerais são favoráveis, até porque há, hoje, uma percepção distinta da que ainda prevalece em algumas áreas dos setores público e privado, de que a indústria extrativa mineral do Rio Grande do Norte como um todo continuaria dependente das atividades extrativas minerais da scheelita e da tantalita. Estudos recentes (Nesi, 1999) indicam que há uma tendência orientada para a exploração dos recursos energéticos, a partir do petróleo e gás natural. Para o caso particular do Seridó, as possibilidades estão relacionadas à exploração de: • Parelhas;36 matérias-primas para cerâmicas vermelhas, concentradas no chamado pólo de • matérias-primas para cimento, cal e agricultura; • matérias-primas para vidros (feldspato, quartzo e quartzito, dentre outros); • matérias-primas para cargas minerais (caulim, feldspato e mica, além de outros); 37 • matérias-primas para a indústria química (espodumênio e rutilo/ilmenita); • matérias-primas para a construção civil (areia quartzosa, argila, granitos e granitóides, mármore e quartzito/metaconglomerado) (Nesi, 1999: 121-124); • gemas (como a água-marinha, esmeralda, ametista e turmalina, dentre as mais importantes); 35 O “Perfil do Tungstênio”, por exemplo, deve estar disponível na área de documentação da Seplan. Em caso contrário, é possível obter uma cópia do estudo com o prof. Edgard Dantas. 36 A exploração das matérias-primas para cerâmica vermelha está naturalmente, submetida a fortes restrições ambientais, como já foi salientado. Trata-se de uma questão que envolve decisões políticas específicas, pois a extração dessa matériaprima constitui uma fonte de renda e de emprego, para a qual ainda não foram encontrados substitutos. As razões para a extrair a argila, por parte dos proprietários rurais, têm sido explicadas como resultando da falta absoluta de alternativas econômicas. O agricultor José Marcelino dos Santos, 57 anos, de São José do Seridó, justifica a prática da venda de argila extraída dos aluviões de sua fazenda, como uma questão de sobrevivência. Ele fez a seguinte afirmativa ao Jornal do Comércio do Recife: “Quase não existe mais terra boa para plantar. E quando tem, o que falta é a chuva. O jeito é ganhar algum dinheiro com o pessoal das cerâmicas.”. Ele informou à jornalista Clara Carvalho, do mencionado jornal, que vendera, em 1997, cerca de dois hectares de solo de aluvião de sua propriedade, para serem usados como barro. Com o dinheiro da venda, comprou uma casa na cidade e umas cabeças de gado. Diz não estar arrependido com o negócio, pois precisava do dinheiro. Compreende, entretanto, que sua terra ficou imprestável para o plantio. (Carvalho, 1999.) Raciocínio semelhante deve ser esposado pelos industriais de cerâmica. Ligados ao ramo, há tempo, os que se dedicam a essa atividade já realizaram investimentos, cuja desmobilização significará falências e, na melhor das hipóteses, prejuízos. As alterações desse quadro deverá, assim, requerer forte ação do poder público e da sociedade, num processo de negociação de complicada solução, certamente. 37 As cargas minerais ou fillers são minerais não-metálicos acondicionados a outras matérias-primas principais. Sob a forma de pó eles são quimicamente inertes. O acondicionamento às outras matérias-primas é feito com o objetivo de reduzir a relação valor/peso do produto final e/ou para transferir algumas de suas propriedades físicas à mistura. Dentre essas propriedades, destacam-se as seguintes: cor (brancura, brilho e opacidade), densidade, resistência mecânica, dureza ou maciez, textura e distribuição superficial, resistência ao fogo, condutividade térmica e elétrica, capacidade de adsorção de óleo e tintas e impermeabilidade, dentre outras. (Nesi, 1999, 126.) 82 • pegmatitos diversos (com destaque para a caulinita, tantalita-columbita, berílio, cassiterita, granada, espodumênio, bismuto nativo, sericita, mângano-tantalita e fluorita, dentre os principais). (Moraes, 1999: 30-37.) Para que esses minerais tenham sua exploração retomada, ainda será necessário realizar estudos e produzir perfis de projeto, indicativos de sua viabilidade econômica. Alguns deles se encontram em minas, cujas atividades foram paralisadas. Outros, porém, como a tantalita, os feldspatos e vários corpos encaixados nos quartzitos da Formação Equador, nas proximidades da cidade de Equador, estão sendo minerados. (Moraes, 1999: 34.) Do ponto de vista da geração de impostos, há um aspecto crucial para a economia do Rio Grande do Norte, sobre o qual há que chamar atenção. Trata-se do controle dos produtos das atividades mineiras, particularmente em relação à comercialização dos minerais de baixa densidade e reduzido volume. Por essas características, os responsáveis por tais minerais podem fugir ao controle do fisco, com facilidade; acondicionados em embalagens que não suscitam qualquer suspeita, quando do seu transporte com destino ao mercado, tanto interno como externo. 3.2.5.3 Impactos Ambientais da Mineração A economia mineira do Seridó está pautada por processos de extração e beneficiamento que datam de mais de meio século. Tem sido assim conduzida sem os cuidados exigidos pela legislação ambiental, que é bem mais recente. De todo modo, algumas empresas chegaram a se organizar e adotar normas exigidas pela legislação ambiental pertinente. Os vários cursos, seminários e publicações divulgadas pelos órgãos de meio ambiente têm contribuído um pouco para minimizar os efeitos de algumas das explorações minerais realizadas naquela região. Com a crise econômica, é possível que os impactos ambientais tenham aumentado, pois nessas situações, o interesse particular vem em primeiro lugar. Os estudos existentes sobre essa matéria indicam que as empresas economicamente mais fortes e mais organizadas são as que conseguem atender melhor a legislação ambiental, ocorrendo o contrário com as pequenas e micro atividades de lavra mineral, assim como com os garimpeiros em geral. “É nesse nível ou escala de produção onde se dão a maioria dos conflitos na área de produção dos recursos minerais. Até mesmo porque a outorga da Concessão da Lavra, hoje está condicionada ao licenciamento ambiental.” (Ribeiro, 1995: 92.) Essa especificidade não indica que as empresas de mineração, de porte e bem organizadas, não provoquem impactos ambientais. Tanto umas como outras têm se constituído em fontes de degradação ambiental, em várias áreas do Seridó. A utilização de recursos naturais não-renováveis em bases sustentáveis e em condições de eficiência e eficácia econômica constitui um desafio, cuja solução depende tanto da sociedade, direta e indiretamente, beneficiada (com empregos) ou prejudicada (pela perda de recursos), como dos empresários ligados às atividades de mineração. Por isso, a aplicação de tecnologias e controles de exploração, constitui modernamente uma das questões centrais da mineração, mais importante talvez do que a observação formal dos seus aspectos técnicos. Para uma melhor compreensão da magnitude dos problemas decorrentes da exploração mineral conduzida de forma ecologicamente incorreta, listam-se a seguir algumas das formas de impactos provocados por essas atividades: • mineração; construção de caminhos, picadas, estradas e abertura de clareiras, para acesso às áreas de 83 • escavação de túneis e de buracos de dimensões variadas, expondo pessoas e animais a riscos diversos; • geração de ruídos e degradação do solo, por conta de explosões e vazamentos de combustíveis, verificados durante as atividades de mineração e de levantamentos geofísicos; • possibilidades de interferência nos recursos hídricos subterrâneos, como resultado da realização de estudos hidrogeológicos; e • possibilidades de prejuízo à flora, às águas subterrâneas, ao solo e à segurança de comunidades, por conta da perfuração de poços e de galerias para pesquisa e preparação das lavras. (Banco do Nordeste, 1999.) Há ainda outros importantes impactos ambientais da mineração no Seridó, como os referidos aos rejeitos das minas e à utilização dos solos aluviais, antes explorados com o cultivo de lavouras alimentares ou com forragens para arraçoamento dos rebanhos de gado leiteiro, na produção de cerâmica. A pecuária leiteira apresenta-se hoje como uma das principais atividades econômicas do Seridó, a partir da qual são engendradas várias outras, de grande importância econômica para as comunidades locais. Sua continuação depende, em boa medida, da disponibilidade desses solos, cuja área total, nas várias e dispersas manchas existentes na região, é da ordem de não mais do que 60.000 hectares de aluvião. A produção de cerâmica, também importante, pela renda e empregos que gera, é feita com argila também oriunda de outras áreas. Mas há evidentes impactos ambientais decorrentes da exploração desse tipo de indústria, com a utilização de argila extraída de áreas aluviais. Além da perda de solos férteis e bem localizados, utilizados para a agricultura e pecuária, a indústria ceramista ainda contribui para a desertificação, pela queima de recursos florestais escassos e a conseqüente erosão dos solos, carreados para os riachos, rios e açudes da região, que estão sendo fortemente assoreados. 3.2.6 Alterações no Meio Ambiente As alterações aqui tratadas resultam do uso e interação dos recursos naturais (água, solo, minerais e vegetação), segundo processos específicos ou conjuntos, tão ou mais comuns quanto mais nítidos forem os fatores determinantes da semi-aridez na região em estudo. Conforme referências apresentadas no item 3.1.1 anterior, mais de 90% do território do Rio Grande do Norte estão situados em áreas semi-áridas. Ali, os fatores climáticos, aliados às condições geológicas, pedológicas, hidrológicas e de cobertura florestal geram restrições ao processo de desenvolvimento, que estão sendo agravadas por condicionantes de ordem socioeconômica, cultural e político-institucional. A Região do Seridó, situada na porção meridional do Estado, faz parte desse contexto, sendo constituída por ecossistemas naturais bastante frágeis, ameaçados no tempo pelas intervenções humanas locais. 3.2.6.1 Alterações Específicas Dentre os fatores naturais considerados adversos na região, destacam-se os referidos ao clima semi-árido, caracterizado por temperatura média anual situada entre 26 e 28ºC (com declínio acentuado à noite), insolação de 3.240 horas/ano, umidade relativa do ar na faixa de 64%, precipitação pluviométrica média anual entre 645 e 760 mm e alta evapotranspiração. Essas condições climáticas, aliadas à predominância do substrato geológico do tipo cristalino (escassez de água subterrânea, impondo a necessidade de captação e armazenamento de águas de superfície, por meio da açudagem e 84 da perenização de rios), exercem influência decisiva sobre a disponibilidade dos recursos hídricos, condicionando a existência de rios dominantemente intermitentes. Outro aspecto importante daí derivado se refere à salinização das águas, processo que ocorre nos terrenos cristalinos por conta da intensa ação do sol e dos altos índices de evaporação, associados aos ventos. A água das chuvas solubiliza os sais minerais das rochas, os quais, por sua vez, são carreados para os reservatórios. Devido a esses fatores, a concentração salina das águas dos mananciais existentes no Seridó sofre substancial elevação, comprometendo sua qualidade físico-química, inviabilizando seu uso, tanto para o consumo humano como animal e agrícola. No auge do período das secas, chega-se a observar em pequenos corpos d'água (açudes) o fenômeno da eflorescência, isto é, a cristalização de sais na superfície do solo, sob a forma de crostas brancas. A limitação dos recursos hídricos no Seridó (nos períodos de estiagem, os rios secam) tem prejudicado o aproveitamento da água para consumo humano, repercutindo sobre o desenvolvimento agropecuário do Estado, pois a disponibilidade de áreas irrigáveis é maior do que a disponibilidade hídrica existente. A degradação dos recursos hídricos locais se dá pela destruição da cobertura florestal, como resultado dos desmatamentos e queimadas (principalmente das matas ciliares), pela acumulação e uso não controlado da água e pelo lançamento de agentes poluidores nos mananciais. Com relação, especificamente, à poluição dos cursos d'água (pelo lançamento de esgotos domésticos e efluentes industriais não tratados, lixo e agrotóxicos), há uma agravante a destacar, expressa pela inexistência de sistemas de saneamento básico nas cidades, associados à condição de intermitência dos mananciais. Outro fator importante que se reflete na quantidade e qualidade dos recursos hídricos é a erosão dos solos (resultante da destruição da cobertura vegetal e do desenvolvimento de atividades agrícolas e minerais, sem medidas de conservação), que provoca o assoreamento dos corpos d'água, trazendo como conseqüência inundações e redução da capacidade de acumulação dos reservatórios. No que se refere aos aspectos pedológicos, cabe salientar a presença no Seridó dos solos Litólicos Eutróficos, que são rasos e de constituição areno-argilosa. Observam-se, ainda, muitas áreas onde afloram as rochas cristalinas (restringindo seu uso para a agricultura) e os solos Bruno NãoCálcicos, de média e alta fertilidade. A vegetação nativa da região, especificamente a de Caatinga, tem-se reduzido em extensão e quantidade, devido ao processo de degradação ambiental, provocado pelo desmatamento – agropecuária extensiva, retirada de lenha para consumo doméstico e industrial, além de queimadas e atividades de mineração. A prática tradicional de corte da vegetação da Caatinga tem contribuído, além disso, para a redução da biodiversidade, que tem como causas principais a destruição do habitat e a caça predatória, que supre o comércio ilegal de animais silvestres. No tocante ao desenvolvimento de atividades agropecuárias, há ainda outros fatores geradores de impactos ambientais, que merecem destaque: i) as queimadas (que destroem a cobertura vegetal do solo e os microorganismos); ii) o uso indiscriminado de agrotóxicos e fertilizantes, que contribui para a poluição do solo e das águas, com prejuízos para o ser humano; e iii) a falta de práticas de manejo e conservação do solo, no curso das atividades econômicas desenvolvidas; iv) a degradação do solo, pela retirada de material para a indústria ceramista; v) e a criação extensiva. No que tange aos recursos minerais, a Região do Seridó possui a mais expressiva concentração dessas riquezas no Estado, com destaque para a scheelita, feldspato, berilo, tantalita, columbita, mica, ouro, gemas, quartzo e rochas ornamentais. Até a década de 70, o Rio Grande do Norte era o maior produtor nacional de scheelita. Atualmente, as minas e garimpos de scheelita estão paralisados, não por esgotamento de reservas, mas devido à perda de competitividade em relação ao equivalente chinês. 85 Além dos impactos já mencionados (item 3.2.5.3 anterior), provocados pela atividade mineradora na região, destacam-se ainda aqueles gerados pela mineração de ouro (poluição pelo uso de mercúrio durante a garimpagem). 3.2.6.2 A Desertificação como Síntese As condições ambientais da região (clima, solo, água e vegetação), associadas à forte pressão exercida sobre os recursos naturais, pela ação antrópica (pressão populacional, formas inadequadas de uso e ocupação do solo, entre outros), têm contribuído de forma significativa para os processos de desertificação existentes no Seridó. Estudos a este respeito foram iniciados no Nordeste e no Rio Grande do Norte, desde 1977, sob a coordenação da Sudene, objetivando identificar as áreas mais atingidas pelo fenômeno e a selecionar aquelas consideradas mais críticas, como áreas piloto, para efeito de mapeamento. A Região do Seridó foi diagnosticada no Rio Grande do Norte como a mais atingida pelo processo de desertificação, com destaque para os municípios de Equador, Parelhas, Carnaúba dos Dantas, Caicó, São José do Seridó e Currais Novos. Esses municípios integram o Núcleo de Desertificação do Seridó, um dos quatro Núcleos que estão sendo estudados no Nordeste pelo Ministério do Meio Ambiente e várias instituições de pesquisa – nacionais e internacionais. O Núcleo de Desertificação do Seridó abrange uma área de 2.341 km² (18,06% da superfície da região), onde vivem 244.000 habitantes (84,21% da população seridoense). A área em processo de desertificação, apresenta-se, assim, com uma altíssima densidade demográfica (104,23 hab/km²), que é cerca de cinco vezes superior à densidade observada em todo o Seridó (22,35 hab/km²) e em todo o Nordeste Semi-Árido (cerca de 20,00 hab/km²), considerado uma das áreas semiáridas mais densamente povoadas do mundo. Esses números indicam que a capacidade de suporte das áreas em processo de desertificação no Seridó, por conta da migração para as cidades (da Região do Seridó ou de outras áreas do Rio Grande do Norte), tende a decrescer. Na ausência de novos processos tecnológicos, econômica e ambientalmente sustentáveis, também é possível admitir estar havendo uma tendência à redução da sustentabilidade da economia nessas áreas. A tabela 3.2.6.1 apresenta a configuração das áreas desertificadas e de alto risco, correspondentes aos quatro Núcleos de Desertificação identificados no Nordeste. TABELA 3.2.6.1 ÁREAS DESERTIFICADAS E DE ALTO RISCO ÁREAS SUPERFÍCIE POPULAÇÃO CAUSA DA DESERTIFICAÇÃO E/OU DA DEGRADAÇÃO (km²) (Habitantes) 1. Gilbués–Piauí 6.131 10.000 A região foi devastada por mineradoras 2. Irauçuba–Ceará 4.000 34.250 A ocupação desordenada arruinou o solo 3. Seridó–R.G. do Norte 2.341 244.000 A caatinga foi destruída para a extração de argila e lenha 4. Cabrobó–Pernambuco 5.960 24.000 O solo frágil não suportou a pecuária e a agricultura TOTAL 18.431 312.250 FONTE DOS DADOS BÁSICOS: Ministério do Meio Ambiente. APUD: GUSMÃO, Marcos (1999)- “O Sertão Virou Pó”. Revista VEJA, São Paulo, Edição 1.613, Ano 32, nº 35, 1º.09.99. As principais conseqüências ou efeitos das alterações ambientais observadas no Seridó referemse, assim, à destruição do solo (através de processos erosivos), à eliminação da cobertura vegetal nativa, ao assoreamento dos reservatórios de água, ao empobrecimento dos lençóis freáticos, à perda da diversidade biológica, à redução de opções de desenvolvimento, ao empobrecimento e à migração do homem do campo. Trata-se de restrições que devem pautar os novos direcionamentos a serem impressos ao processo de desenvolvimento, em bases sustentáveis, na Região do Seridó. 86 A DESERTIFICAÇÃO COMO SÍNTESE DAS ALTERAÇÕES AMBIENTAIS NO NORDESTE E NO SERIDÓ: A VISÃO DE GESTORES NACIONAIS O semi-árido nordestino, que sempre resistiu aos longos períodos de estiagem, está entregando os pontos diante do avanço da desertificação. O fenômeno é muito mais cruel (do) que as terríveis secas. O solo perde definitivamente a cobertura fértil e se vão para sempre os parcos nutrientes que sustentam a vegetação pobre e agreste. Sobram apenas a areia, umas poucas plantas espinhosas sem valor econômico e os enormes buracos provocados pela erosão. É um cenário bastante parecido com o de grandes desertos, como o famoso Vale da Morte, na Califórnia. Se fossem reunidas numa só, as áreas já transformadas em pequenos desertos no sertão nordestino formariam uma mancha quase do tamanho do Estado de Sergipe. São mais de 18 000 quilômetros quadrados completamente esturricados, uma terra arenosa e empobrecida que água nenhuma conseguiria tornar cultivável. O fenômeno torna-se ainda mais preocupante porque os técnicos identificaram uma área dez vezes maior que esta indo pelo mesmo caminho. “Isso tudo vai virar um imenso deserto”, diz Heitor Matallo Júnior, diretor do Plano Nacional de Combate à Desertificação. do Ministério do Meio Ambiente. É um território equivalente a quatro vezes o tamanho do Estado do Rio de Janeiro. A desertificação é ainda um processo voraz. Na semana passada, geólogos do Ministério da Integração Nacional divulgaram estudos surpreendentes sobre a velocidade de degradação do solo do semi-árido. Perdem-se a cada ano 10 toneladas de terra fértil por hectare. É como se tirassem dois caminhões basculantes por ano de terra de um campo de futebol, explica Henrique Marinho Chaves, engenheiro agrônomo do Ministério da Integração Nacional. O impacto já é tão devastador que, se deixado por conta da natureza, precisaria de 1.000 anos para ser revertido. A situação em certas partes do Nordeste brasileiro é tão dramática que cenário semelhante só é encontrado na região do Sahel, onde o Saara avança para o interior da África. De acordo com dados das Nações Unidas, 60.000 quilômetros quadrados de terras férteis são perdidos todos os anos no mundo pela mesma razão: ocupação desordenada e predatória de regiões extremamente frágeis do ponto de vista ambiental. A criação extensiva de bois e de bodes, da forma como é praticada atualmente, tem arrasado o sertão. Os animais comem a vegetação que sobrevive à estiagem prolongada e ainda pisoteiam mudas e plantas rasteiras. O desmatamento indiscriminado da caatinga também contribuiu para o desequilíbrio ambiental. A lenha é retirada sem nenhuma fiscalização, vai nos fogões das famílias e nos fornos de cerâmicas do Seridó, no Rio Grande do Norte, e de fábricas de gesso no sertão do Araripe, em Pernambuco. Nessas duas áreas e na região de Gilbués, no Piauí, a mineração dizimou o solo cultivável. Para completar, a algaroba, uma árvore peruana que foi introduzida em programas de reflorestamento na década de 40, ocupou as áreas que ainda conservam algum superfície de solo fértil e matou as plantas nativas. Apesar de o cenário desértico causado pelo homem no Nordeste ser muito semelhante ao que se vê nas formações desérticas naturais, a região desertificada do semi-árido brasileiro mantém certas particularidades. O problema não é exatamente a falta de água. Enquanto num deserto chove menos de 100 milímetros por ano, na caatinga a média de chuva é de 500 milímetros anuais. O tipo de solo da região também altera a configuração dessas áreas ressequidas. Onde há solo mais cristalino, a formação desértica é de um imenso areal saariano. É esse o caso da região de Rodelas, na Bahia, próximo à divisa com Pernambuco. Mas em locais de solo mais compacto ou com boa quantidade de argila a desertificação é caracterizada por um ambiente com arbustos secos e grandes crateras erodida lugares nos quais não adianta plantar, porque nada prospera A recuperação desse tipo de solo é possível, mas a alto custo. O Ministério do Meio Ambiente estima serem necessários 2 bilhões de dólares para reabilitar a região num período de vinte anos. “A conta é alta, mas esse é o preço para não perdermos o semi-árido,” diz o engenheiro florestal Paulo César Lima, da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária, Embrapa. O problema maior para a superação não é o dinheiro, mas o tempo exigido. Os Estados Unidos estão investindo na reabilitação de áreas desertificadas, no Meio Oeste do país, desde a década de 30. No Brasil, a discussão sobre o assunto tomou impulso na década passada. Em novembro (de 1999), a III Convenção Internacional de Combate à Desertificação, das Nações Unidas, (...) foi realizada no Recife para discutir quais (...) as soluções mais viáveis. Tentativas de interromper a passagem do semi-árido para a condição de deserto pipocam aqui e ali. Em Irauçuba, Ceará, a Embrapa está plantando milhares de árvores de vinte espécies. No Rio Grande do Norte, existem quatro centros de cultivo de mudas de plantas nativas da caatinga. Em Pernambuco, os agricultores estão recebendo treinamento sobre o uso e manejo do solo. É pouco para rever processo. Mas essas poucas espécies têm mostrado que mudar a paisagem não é impossível. .FONTE: GUSMÃO, Marcos (1999)- “O Sertão Virou Pó”. Revista VEJA, São Paulo, Edição 1.613, Ano 32, nº 35, 1º.09.99. 87 3.2.7 Fragilidades Ambientais No Seridó as fragilidades ambientais são, realmente, marcantes. A temperatura do solo na região chega a atingir 60º C, com uma incidência de insolação superior a 3.000 horas anuais. As altas taxas de evapotranspiração impõem um elevado déficit hídrico, que constitui fator determinante da degradação do solo e do conseqüente empobrecimento da flora e da fauna nativa. Do total das chuvas que caem no Seridó, apenas 0,2% se infiltram no solo, 3,8% se acumulam nos açudes, 5% retornam para o mar, através dos rios, e 91% são evaporados. 38 As atividades humanas que se desenvolveram, e continuam até hoje na Região do Seridó, estão ligadas à pecuária extensiva, à agricultura de sequeiro, com culturas e técnicas inadequadas, à indústria extrativista da cerâmica e à mineração, entre as mais significativas. A indústria da cerâmica tem papel destacado, sustentando-se em dois vetores com efetivos e potenciais poderes de degradação do meio ambiente: a retirada da argila dos vales e o uso da mata nativa para a produção de lenha, consumida nos fornos de queima da cerâmica. O intenso processo de migração para as cidades também contribui para agravar o quadro de alterações ambientais. A vida nas cidades é bem diferente da vida no meio rural. O padrão de consumo e o padrão tecnológico das concentrações urbanas elevam os níveis de demanda de água, de energia, de alimentos, de minerais, enfim, dos recursos renováveis e não-renováveis. Eleva, também, a produção de descartes e poluentes ambientais como o lixo, esgotos, gases poluentes, etc., que se constituem em ameaças adicionais ao ambiente seridoense. Ademais, a pobreza, como manifestação mais visível do secular subdesenvolvimento da região, paradoxalmente, tem contribuído para a degradação ambiental, pois como recurso extremo para sua sobrevivência, as populações pobres, muitas vezes, não têm alternativas que não seja a de cortar a última árvore que reste ou a de caçar o último espécime silvestre que lhe possa servir de alimento. O ponto de equilíbrio entre o que a população de uma região demanda e aquilo que o meio ambiente é capaz de suprir gera uma das questões mais polêmicas no contexto do desenvolvimento sustentável, embora constitua, ao mesmo tempo, um dos princípios basilares dessa forma de desenvolvimento. Trata-se da capacidade de suporte, assim conceituada pela Organização para a Educação, Ciência e Cultura das Nações Unidas–Unesco: A capacidade “de suporte expressa o nível de população que pode ser suportado por um país (ou região) em um dado nível de bem-estar. Mais precisamente, pode ser definida como o número de pessoas compartilhando um dado território, que podem, para o futuro visível, sustentar um dado padrão físico de vida, utilizando energia de outros recursos (incluindo terra, ar, água e minerais) bem como o espírito de iniciativa, competências e organizações. (...) É um conceito dinâmico, que pode ser estendido ou restringido de várias maneiras: por mudanças nos valores culturais, descobertas tecnológicas, melhorias no manejo agrícola ou sistemas de distribuição de terras, mudanças em sistemas educacionais, modificações de arranjos fiscais e legais, descobertas de novas fontes de minerais ou a emergência de uma nova vontade política. Nunca existe uma só solução para a equação população/recursos naturais, porque não é a população sozinha que determina a pressão sobre os recursos (e os efeitos ecológicos potencialmente associados), mas também o consumo individual, que, por sua vez, é determinado por sistemas de valores e percepções de estilo de vida." (Hogan, 1991: 64). 38 Cf. dados fornecidos pelo Dr. Cortez Pereira, ao jornal Tribuna do Norte, de 22.12.99. 88 O processo de desenvolvimento enfrenta limites físicos que devem ser previstos e acomodados. Tanto a capacidade do ambiente de absorver a poluição, como a capacidade de fornecer recursos esgotáveis, são finitas (Tietenberg, 1994). Quando os limites são desrespeitados, tanto no sentido da exploração que exaure, como do lixo que polui, os efeitos logo aparecem e, na maioria das vezes, são os mais pobres que pagam o preço mais alto. É assim, quando as indústrias de cerâmica e as atividades agropecuárias promovem o desflorestamento que degrada o solo, que mata os rios e que dizima a biodiversidade da região, pois quem primeiro sofre os efeitos da degradação ambiental é a população do campo, que é impelida a migrar para viver nas cidades, em condições, muitas vezes, mais miseráveis do aquelas em que viviam antes. Certamente, se os limites fossem respeitados, segundo os parâmetros da capacidade de suporte da região, o Seridó não estaria diante do dilema que enfrenta atualmente: encontrar, a qualquer custo, alternativas para promover o seu desenvolvimento em bases sustentáveis. Em decorrência da realidade ambiental de muitas regiões da Terra, as Nações Unidas já definiram uma nova categoria de refugiados, que são os refugiados ambientais, obrigados a abandonarem o lugar onde moram, em razão de não disporem mais de condições mínimas de sobrevivência em seu lugar de origem, por causa dos agravos ao meio ambiente. Os agricultores do Seridó, que migraram e continuam migrando, podem ser muito bem considerados como uma espécie de refugiados ambientais. Os mapas 2 e 3, a seguir, mostram, respectivamente, a amplitude e a intensidade dos dois processos de desertificação: o esvaziamento da zona rural seridoense e o processo de desertificação de vastas áreas dessa região. Nos gráficos 1, 2 e 3 apresentam-se indicadores ambientais, que tomam por base a utilização das terras para a exploração agropastoril. O primeiro indicador relaciona a “área alterada com a área total” e mede, em dois pontos no tempo, a expansão do uso das terras em atividade econômica. Como se observa no gráfico 1, houve para a Região do Seridó, como um todo, uma diminuição do valor desse indicador, no período 1985-95, da ordem de 9%, pois passou de 55,86%, em 1985, para 48,65%, em 1995. Nas três Zonas Homogêneas que compõem o território da Região do Seridó, observou-se uma retração na magnitude do indicador, não obstante, essa diminuição haver sido menor nas Serras Centrais, pois seu valor passou de 59,64% em 1985 para 55,63% em 1995. Esse resultado se mostra coerente, pois as Serras Centrais constituem uma realidade ambiental, social e econômica bastante diferenciada das outras duas Zonas (Caicó e Currais Novos). O fato de se haver observado uma considerável diminuição relativa da área alterada nas zonas de Caicó e Currais Novos pode estar sinalizando para o alto grau de saturação das terras e seu conseqüente abandono para fins produtivos. Enquanto isso, nas Serras, dada a peculiaridade de ali predominarem as pequenas propriedades de sitiantes, a relação entre “área alterada e área total” manteve-se elevada, mas sem grandes oscilações nos dez anos considerados. 89 MAPA 2 90 MAPA 3 NÚCLEOS DE DESERTIFICAÇÃO NO NORDESTE 91 GRÁFICOS 1, 2 e 3 92 Quando, porém, se compara o indicador que relaciona as “áreas de mata com a área total”, que, de certa forma, mede a evolução do processo de desmatamento na região, naqueles dez anos, verifica-se que a situação permanece imutável, pois os seus valores foram, respectivamente, de 16,78% e de 15,17%, para 1985 e 1995. O Seridó, com relação a esse aspecto, teve comportamento similar ao do Estado, que apresentou valores de 13,50% e 13,15%, não apresentando, pois, variação. A ZH de Caicó, em termos de desmatamento, no decorrer do período analisado, seguiu o padrão regional, pois apresentou valores bem próximos, para os seus indicadores. As Zonas de Currais Novos e das Serras Centrais apresentaram variações, para mais ou para menos, que não devem ser consideradas significativas. A conclusão a que se chega, a partir desses indicadores, é que, surpreendentemente, não ocorreram alterações significativas na utilização das matas da região. Este fato merece melhor aprofundamento e reflexão, por contradizer o senso comum acerca do Seridó. Outro indicador utilizado para avaliar os efeitos da ação do homem na região foi a relação entre “área de matas e pessoas ocupadas” em atividades rurais. Quanto maior for a relação entre essas duas variáveis, menores serão as ocorrências de desmatamentos. Conforme pode ser visto no gráfico 3, essa relação, na Região do Seridó, era de 18,76 hectares por pessoa ocupada, em 1985, tendo crescido para 19,72, em 1995, o que significa um crescimento de menos de 1%. Para o Estado, o indicador foi bem menor, embora tenha quase dobrado nos dez anos analisados, passando de 7,83 hectares por pessoa ocupada em atividades rurais, em 1985, para 13,17 hectares por pessoa ocupada, em 1995. Significa, por esses dados, que o risco de desmatamento da Região do Seridó é quase duas vezes menor do que o do Estado, não convindo esquecer que no Seridó ele está estabilizado, enquanto no Estado ele apresentou um incremento relativo de 68%, em dez anos. A situação aparentemente mais favorável para o Seridó, expressa pelo indicador “área de matas e pessoas ocupadas”, deve ser vista com muita cautela, pois ela pode decorrer de uma redução no número de pessoas ocupadas, na zona rural do Seridó, como sugerem as evidências sobre o aumento das migrações de origem rural. Pode resultar também da diminuição das áreas cultivadas com algodão, que passaram, com o correr dos anos do período pós-1985, à categoria de “mata rala”. Atente-se, ademais, para o fato de o mapa 3, anteriormente apresentado, reforçar as evidências sobre o aumento das áreas desmatadas, via processos de desertificação. 3.2.8 Lixo e Saneamento Ambiental 39 Dentre as questões ambientais mais emergentes da atualidade, o problema do lixo, conhecido como resíduos sólidos, se destaca. Há vários tipos de lixo, dependendo da fonte de onde é gerado. Há o lixo doméstico, produzido pelas residências, o lixo hospitalar e o lixo industrial, produzido como rejeito do processo industrial. A solução para o destino do lixo requer procedimentos e manejos diferentes, de acordo com a natureza da fonte que o produz. Daí a origem das dificuldades de se aplicar soluções eficazes. O lixo doméstico é o que se produz em maior quantidade, naturalmente porque cada pessoa contribui com sua parcela de lixo. Assim, quanto maior a população de uma cidade e melhor o seu nível de renda, mais ela produz lixo, maior é o problema e mais cara é a solução. Com o crescimento da urbanização, o problema do lixo se torna mais visível e incômodo, tanto pelos problemas de saúde que provoca como pelos problemas de natureza ambiental. O lixo urbano é um dos principais problemas ambientais do Seridó. Deriva-se do rápido e 39 As informações aqui apresentadas, no que se refere aos aspectos instrumentais, foram obtidas em consulta ao site da Caixa Econômica Federal, na Internet. 93 crescente processo de urbanização observado nas cidades da região. A ocorrência desse problema representa uma contradição, que compromete a imagem de limpeza que caracteriza várias das cidades do Seridó. Mas se, ali, as cidades têm suas construções limpas e bem cuidadas, o mesmo não acontece com os riachos e rios que margeiam as áreas urbanas. Na falta de aterros sanitários, a população tem se valido dos espaços antes vazios dos cursos d’água. Os rios no Seridó também perdem vazão por causa desse procedimento. As prefeituras parecem não dispor de estrutura e de recursos (materiais, humanos e financeiros) para administrar esse problema, que a urbanização crescente impõe às cidades. Na prática, o problema é de coleta e destino final do lixo. Essa questão, posta em destaque nos 28 municípios da Região do Seridó, durante as reuniões municipais realizadas com todas as lideranças locais, está estreitamente relacionada à preservação dos recursos naturais da região, que se encontram seriamente afetados pela poluição ambiental por resíduos sólidos. Sabe-se, ademais, que a ausência de um sistema adequado de coleta, transporte, tratamento e destino final do lixo tem influência direta na contaminação das águas, do ar e do solo, além de facilitar a proliferação de insetos e roedores, prejudiciais à saúde da população. As prefeituras do Seridó, em particular as dos pequenos municípios, não têm condições financeiras para instalar sistemas eficientes e eficazes de coleta e tratamento do lixo. A tabela 3.2.8.1 oferece uma idéia mais precisa sobre o assunto. No Seridó, apenas um pouco mais da metade do lixo domiciliar é coletado; o restante tem variados destinos: é queimado, enterrado ou jogado em terrenos baldios, rios, etc. A situação do Seridó não é tão diferente daquela que prevalece no Estado, em relação a essa questão, pois o Rio Grande do Norte, como um todo, só coletava, em 1991, 57,23% de seu lixo doméstico. Entre as três Zonas Homogêneas do Seridó, a que apresenta melhor performance é a Zona de Currais Novos, que coleta 68,25% do lixo doméstico produzido. Em seguida, vem a Zona de Caicó, com 61,30%, e, por último, bem distante, a Zona das Serras Centrais, provavelmente, por se tratar de uma área onde ainda há uma razoável presença de habitantes na zona rural. A partir de parâmetros médios nacionais, foi possível estimar a produção per capita de lixo para a Região do Seridó, como se mostra na tabela 3.2.8.2. A região produz cerca de 10% do lixo domiciliar urbano do Estado, correspondendo, em termos de cifras absolutas, a 118.500 kg de lixo por dia, sendo coletados, pelo sistema regular de coleta de lixo, apenas 55,13%. Para dar uma idéia mais precisa desse volume, tenha-se em conta que seriam necessárias 30 viagens diárias de caminhões caçambas, com capacidade de 4.000 kg, cada, para fazer o transporte de todo o lixo produzido diariamente na região. Por sua relevância, aludida matéria carece de estudos específicos, a serem realizados no âmbito de toda a Região do Seridó. As informações a este respeito oferecerão, com certeza, uma visão mais clara desse problema na região, em particular das questões relacionadas às maiores concentrações populacionais, como ocorre em Caicó e Currais Novos. Esses estudos poderão propiciar alternativas para a “reestruturação do sistema de limpeza urbana” das cidades do Seridó, no que se refere aos seus componentes principais. Podem também contemplar alternativas para a constituição de um Consórcio Intermunicipal de Tratamento de Resíduos Sólidos, para os grupos de municípios cuja proximidade e estoque de lixo produzido apresentem escala compatível com a constituição de uma usina de tratamento. 94 TABELA 3.2.8.1 DESTINO DO LIXO DOMICILIAR NA REGIÃO DO SERIDÓ DO RIO GRANDE DO NORTE, EM 1991 DESTINO DO LIXO NA REGIÃO DO SERIDÓ ZONAS HOMOGÊNEASZH ZH Caicó ZH Currais Novos ZH Serras Centrais Região do Seridó R. G. do Norte TOTAL (%) COLETADO QUEIMADO ENTERRADO JOGADO EM TERRENO BALDIO 100,00 100,00 100,00 100,00 100,00 61.30 68,24 31,82 55,15 57,23 4.57 4,68 3,25 4,23 7,54 0,10 0,29 1,03 0,43 2,59 9,18 5,80 15,84 9,93 13,09 RIO, LAGO OU MAR 1,31 0,10 0,04 0,56 0,80 OUTROS 23,54 20,89 48,22 29,70 18,75 FONTE DOS DADOS BÁSICOS: Ibge. Censo demográfico, 1991. (Resultados do universo relativo às características da população e dos domicílios do Rio Grande do Norte.) 95 Com esses estudos, será possível elaborar projetos modulares para os diferentes núcleos urbanos do Seridó, de forma isolada ou por etapas, até o nível de consórcio. A execução de projetos com tais características pode ser viabilizada com o apoio do governo federal, que conta com dois grandes programas na área de saneamento – o Programa de Ação Social em Saneamento–PASS e o PróSaneamento. Esses dois programas podem vir a constituir fontes de financiamento para a implementação de sistemas de saneamento e coleta de lixo, segundo as características encontradas na Região do Seridó. Sabe-se que o PASS está destinado a cidades com população entre 15 mil e 50 mil habitantes, contando com o aporte de recursos do Banco Interamericano de Desenvolvimento–BID, para financiamento de projetos voltados para as seguintes áreas: i) instalação, ampliação e/ou melhoria dos serviços de abastecimento de água; ii) instalação, ampliação e/ou melhoria dos serviços de esgotamento sanitário; iii) instalação, ampliação e/ou melhoria do sistema de coleta e tratamento de resíduos sólidos; e iv) saneamento ambiental, quando contempla ações de projetos e/ou programas em execução. O Pró-Saneamento, por seu turno, está baseado em dois componentes: o institucional e o financeiro. O componente institucional destina-se a melhorar o desempenho e a gerência das companhias prestadoras de serviços de saneamento. E o componente financeiro apoia a realização de investimentos de apoio ao desenvolvimento e financiamento de serviços de saneamento, contando com a participação da comunidade na elaboração, execução e manutenção dos serviços. O Pró-Saneamento atende às seguintes modalidades de serviços: i) abastecimento de água; ii) esgotamento sanitário; iii) desenvolvimento institucional; iv) drenagem urbana; v) Saneamento Integrado–Prosanear; vi) tratamento de resíduos sólidos (disposição final); e vii) estudos e projetos. TABELA 3.2.8.2 ESTIMATIVA DA PRODUÇÃO DE LIXO DOMICILIAR URBANO NA REGIÃO DO SERIDÓ E NO RIO GRANDE DO NORTE, EM 1996 LIXO COLETADO POPULAÇÃO PRODUÇÃO ZONAS PRODUÇÀO (%) URBANA HAB/DIA PARTICIPAÇÃO HOMOGÊNEASDOMICILIAR (kg)1 (%) ZH (kg/dia) ZH Caicó 85.623 0,6 51.400 43,40 61,30 ZH Currais Novos 71.587 0,6 43.000 36,30 68,24 ZH Serras Centrais 40.209 0,6 24.100 20,30 31,82 Região do Seridó 197.419 0,6 118.500 100,00 55,15 2 R. G. do Norte 1.843.486 0,6 - 0,8 1.240.000 100,00 57,23 FONTE DOS DADOS BÁSICOS: Ibge. Censo demográfico, 1991. (Resultados do universo relativo às características da população e dos domicílios do Rio Grande do Norte.) e Contagem Populacional, 1996. 1 Parâmetros médios fornecidos pelo CEMPRE - Compromisso Empresarial para Reciclagem. 2 Aplicou-se o fator 0,8 para 35% (Área de Natal) e 0,6 para os 65% correspondentes aos municípios do interior. 3.2.9 Instituições da Área Ambiental Há um razoável número de instituições ligadas à questão ambiental, na Região do Seridó. Algumas atuam exclusivamente nessa área, enquanto outras oferecem apoios diversos à causa do equilíbrio entre desenvolvimento e meio ambiente. As instituições aqui referidas são governamentais (federais, estaduais e municipais), privadas e não-governamentais. De forma específica, serão referidas todas aquelas que exercem atividades na Região do Seridó. 96 3.2.9.1 Com Atuação Direta As instituições que atuam na área do meio ambiente na Região do Seridó estão referidas a seguir: i. Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis-Ibama; ii. Projeto Ibama/Pnud/Bra/97/047; iii. Grupo de Estudos de Desertificação do Seridó–GEDS; e iv. Instituto de Desenvolvimento Econômico e Meio Ambiente do Rio Grande do Norte– Idema. O Ibama executa tarefas clássicas, como as de registro, controle e fiscalização de atividades de usuários de recursos naturais – comercialização de produtos florestais e de produtos da caça e da pesca. Realiza ainda ações na área de Educação Ambiental, formal e não-formal. A execução do Programa de Educação Florestal e do Programa de Reorientação Curricular constituem exemplos de atividades de educação formal. A realização dessas atividades está entregue aos Escritórios de Caicó e de Jardim do Seridó. O Ibama realiza, também, atividades de pesquisa e conservação de recursos naturais da Região do Seridó, que são levadas à prática por intermédio da Estação Ecológica do Seridó (ESEC), localizada no Município de Serra Negra do Norte, e de duas Reservas Particulares do Patrimônio Natural–RPPN. O Projeto Ibama/Pnud/Bra/97/047 vem atuando no Rio Grande do Norte, em continuação às ações iniciadas por outros projetos de cooperação com as Nações Unidas, voltados para o setor florestal do Nordeste. Tem como objetivo contribuir para o desenvolvimento sustentável da Região, promovendo a adoção de práticas racionais de exploração, transformação e uso final dos produtos oriundos da vegetação nativa local. No Seridó, o Projeto realiza estudos referentes à situação da cobertura florestal, técnicas de exploração mais adequadas, participação do setor florestal na socioeconomia da região. Confere a respeito particular importância à preservação da vegetação nativa para o equilíbrio ecológico local. O Grupo de Estudos sobre Desertificação no Seridó–GEDS, criado em 1997, tem por objetivos estudar, propor e colocar em prática medidas para o controle do processo de desertificação que afeta a Região do Seridó. Sua formação resultou de um processo de reflexão em torno das questões da seca e das alternativas para a convivência com os efeitos provocados por tal fenômeno. Na agenda de discussões do grupo envolvido com essa problemática também estavam incluídas questões relacionadas ao estudo da viabilidade econômica do combate direto aos processos desencadeadores da desertificação. O GEDS, que ainda é um grupo informal, está constituído por organizações nãogovernamentais (ONGs), organizações governamentais (OGs), organizações sindicais e instituições privadas, assim especificadas: i. Organizações Não-Governamentais • Serviço de Apoio aos Projetos Alternativos Comunitários– Seapac; 97 • Associação de Apoio às Comunidades do Campo–AACC; • Escritório Técnico de Apoio aos Municípios– IV ETAM; e • Fundação Grupo Esquel-Brasil. ii. Organizações Governamentais • Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis– Ibama; • Universidade Federal do Rio Grande do Norte-Ufrn: Centro Regional de Ensino Superior do Seridó–Ceres, Campus de Currais Novos; • Ufrn: Centro Regional de Ensino Superior do Seridó–Ceres, Campus de Caicó; • Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística–Ibge; • Fundação Nacional de Saúde–FNS, por intermédio do Distrito Sanitário de Caicó–DSC; • Departamento Nacional de Obras Contra as Secas–DNOCS; • Secretaria de Educação, Cultura e Desportos do Rio Grande do Norte; • Empresa de Pesquisa Agropecuária do Rio Grande do Norte–Emparn; • Instituto de Assistência Técnica e Extensão Rural do Rio Grande do Norte-Emater (Escritório Regional de Caicó); e • Instituto de Desenvolvimento Econômico e Meio Ambiente do Rio Grande do Norte– iii. Organizações Sindicais • Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Caicó–RN; e • Federação dos Trabalhadores na Agricultura do Estado do Rio Grande do Norte– Fetarn. iv. Instituições Privadas • Colégio Objetivo de Currais Novos–RN. Idema. Como grupo informal, o GEDS trabalha em parceria com instituições interessadas e envolvidas na solução dos problemas de desertificação na Região do Seridó. Os eventos organizados pelo GEDS – como o I e o II Seminários de Desertificação do Seridó, realizados em 1997 e 1998 – foram executados em parceria com instituições não-governamentais, como a Fundação Esquel-Brasil, com o apoio de entidades governamentais. 98 O GEDS está sediado no Município de Caicó, onde são estruturadas suas ações, com a participação das entidades colaboradoras antes mencionadas. O Grupo tem apenas um profissional dedicado, em tempo integral, às suas atividades, que é pago pela Fundação Grupo Esquel-Brasil. O Idema é o Órgão Estadual de Meio Ambiente–Oema do Rio Grande do Norte. Suas origens remontam ao antigo Departamento Estadual de Estatística–DEE, vinculado à então Secretaria de Planejamento e Coordenação Geral do Rio Grande do Norte. Pela Lei Estadual nº 4.414, de 04 de novembro de 1974, foi transformado em Fundação, passando a integrar o Sistema Estadual de Planejamento, como órgão de assessoramento à administração pública estadual, nas funções de planejamento, orçamentação e modernização institucional. Sua configuração atual é de autarquia vinculada à Secretaria de Planejamento e Finanças-Seplan do Estado, 40 tal como estabelecido nas Leis Complementares de nº 139, de 25.0196 (sob a sigla de Idec) e 163, de 05.02.99 (sob a sigla de Idema). Ainda sob a denominação de Idec, cumpriu a tarefa de produzir e difundir informações necessárias ao planejamento da ação governamental, no curso das décadas de 80 e 90 do Século XX. A partir da reforma administrativa realizada em 1999, o Idec passou a ser designado pela sigla de Idema, reforçando sua missão de refletir sobre a realidade socioeconômica e ambiental do Rio Grande do Norte, de forma a subsidiar as políticas públicas estaduais e municipais. Cabe ainda ao Idema, na qualidade de órgão estadual de meio ambiente, executar funções específicas de proteção e educação ambiental, gerenciamento costeiro, licenciamento, controle e monitoramento, objetivando a sustentabilidade dos recursos naturais. O Idema tem como finalidades principais: • produzir e difundir informações técnicas e estatísticas pertinentes ao conhecimento da realidade estadual; • realizar estudos e pesquisas necessários à atividade do planejamento público estadual ou, mediante remuneração, a preço de mercado, de interesse de terceiros; • formular, coordenar, executar e supervisionar a política estadual de preservação, conservação, aproveitamento, uso racional e recuperação dos recursos naturais; e • fiscalizar o cumprimento das normas de proteção, controle, utilização e recuperação dos recursos ambientais, aplicando as penalidades disciplinares e/ou compensatórias às infrações apuradas, além de outras atividades correlatas. Atua por meio de duas Coordenadorias: a de Estudos Socioeconômicos-CESE e a de Meio Ambiente-CMA. Esta última exerce suas atividades com o apoio de três Subcoordenadorias: a de Planejamento e Educação Ambiental–SPEA, de Licenciamento e Controle Ambiental–SLCA e a de Gerenciamento Costeiro–Sugerco, além do Parque Estadual Dunas do Natal. 40 As informações sobre o Idema estão baseadas no texto veiculado pela Seplan do Rio Grande do Norte, em seu site na Internet. 99 3.2.9.2 Com Atuação Indireta O conjunto de instituições que apoia a área ambiental no Seridó está integrado pelas seguintes entidades: • Serviço de Apoio às Micro e Pequenas Empresas do Rio Grande do Norte–Sebrae/RNEscritório de Caicó; • Emparn (parceira do Ibama, em componentes de pesquisa e experimentos florestais); • Banco do Nordeste (atua como órgão de financiamento do desenvolvimento); • Instituto de Assistência Técnica e Extensão Rural do Rio Grande do Norte–Emater (presta assistência técnica aos projetos apoiados com recursos do Programa Nacional de Apoio à Agricultura Familiar–Pronaf); • ambiente); • Ministério da Integração Regional (vem apoiando iniciativas de conservação do meio Fetarn (realiza atividades de educação ambiental, em apoio aos trabalhadores rurais); • Federação das Indústrias do Estado do Rio Grande do Norte–Fiern (presta apoio a diversas iniciativas, de interesse ambiental, junto ao setor empresarial); • Federação da Agricultura do Estado do Rio Grande do Norte–Faern (estimula atividades de proteção ambiental, junto aos empresários agropecuários e do agribusiness); • Universidade Federal do Rio Grande do Norte–Ufrn (realiza estudos e apoia o desenvolvimento de atividades de interesse ambiental, por intermédio do Centro Regional de Ensino Superior do Seridó–Ceres, Campus de Currais Novos e Campus de Caicó); e • Movimento dos Trabalhadores Sem-Terra–MST (apoia os trabalhadores rurais, na defesa e proteção ao meio ambiente.) 3.2.10 Principais Problemas Trabalha-se aqui com o conceito de problema entendido como uma restrição ao processo de desenvolvimento, em bases sustentáveis, tanto em termos socioculturais, como econômicos, ambientais, científico e tecnológicos e político-institucionais. Neste sentido, foram apresentadas evidências de que o Rio Grande do Norte é um dos Estados do Nordeste mais afetados pela agressão ao meio ambiente. Dessa particularidade se derivam, por sua vez, as restrições impostas ao processo de desenvolvimento, historicamente posto em prática na Região do Seridó. Ainda assim, a área objeto de atuação do Plano conta com uma base de recursos naturais, que, embora, submetida a um equilíbrio extremamente frágil, pode ser bem aproveitada, desde que utilizada de acordo com adequados princípios de gestão ambiental. Os recursos efetivos vêm sendo utilizados sem os necessários cuidados para com as normas e padrões de sustentabilidade, conservação ambiental e racionalidade econômica. Nesta perspectiva, podem ser destacados como problemas principais, os mencionados a seguir: 100 • Desmatamento das áreas de vegetação nativa. Considerável volume das matas nativas do Seridó vem, há tempos, sendo utilizado para fins energéticos, com nenhuma ou escassas precauções, no tocante ao seu manejo sustentado. O desmatamento daí decorrente também é intensificado pela demanda por novas áreas para a formação de pastos. Sua utilização, de forma extensiva, em esquemas de manejo pouco adequado das matas de caatinga nativa, tem contribuído para o aumento das áreas erodidas no Seridó. Em conseqüência, diminuem as possibilidades de ampliação de forragem volumosa, aumentam os custos de alimentação das explorações pastoris e são exacerbados os impactos ambientais; • Construção de estruturas de armazenamento de água na ausência de política de recursos hídricos. Os açudes e barragens de maior porte vêm deixando de preencher sua capacidade de armazenamento, mesmo nos anos de chuvas regulares, por conta da construção de novos reservatórios em áreas de montante. Não se tem observado, na devida medida, se os cursos d’água que alimentam os açudes já existentes dispõem de vazão suficiente para alimentar os novos reservatórios; • Comprometimento e redução da vazão de rios e riachos. Os cursos d’água da Região do Seridó vêm apresentando redução de suas vazões, devido ao processo de assoreamento provocado pela retirada da mata, pela erosão e pelo acúmulo de lixo em seus leitos. Esses processos também comprometem a capacidade de armazenamento dos açudes, de diferentes tamanhos; • Escassa dotação de recursos de solo. É mais notável na Zona Homogênea-ZH de Currais Novos, onde prevalecem solos Litólicos (de menor fertilidade), seguida pela ZH de Caicó, onde os solos Bruno Não-Cálcicos (de melhor fertilidade) podem ter maior utilização em atividades agropecuárias. A menor escassez relativa de solos agricultáveis é observada na ZH das Serras Centrais; • Instrumentos inadequados em relação ao disciplinamento do uso dos recursos naturais. Os instrumentos disponíveis, especialmente os legais, são pouco utilizados ou apresentam reduzida eficácia, no que se refere à utilização disciplinada dos recursos minerais, de solo, água e vegetação; • Expansão das áreas em processo de desertificação. A desertificação funciona como síntese dos inadequados processos de produção e gestão dos recursos naturais. Crítico é verificar que o problema ainda é considerado uma restrição menor à retomada do processo de desenvolvimento em bases sustentáveis, inclusive por algumas instâncias do setor público; e • Aumento da produção de lixo em áreas urbanas. Trata-se de problema observado nas sedes dos 28 municípios da Região do Seridó. Sua origem remonta à aceleração do processo de urbanização. Apresenta dimensões críticas nas principais cidades da região, daí advindo efeitos deletérios para a saúde das pessoas e o meio ambiente. 3.2.11 Potencialidades Relevantes A potencialidade é uma vantagem, comparativa ou competitiva. Ela se expressa pela disponibilidade de recursos naturais, que sejam exploráveis mediante a mobilização de forças produtivas existentes ou a introdução de inovações, apoiadas (ou não) por novas invenções. Os cuidados com o meio ambiente exercerão efeito multiplicador de grande poder sobre a dinamização da economia da Região do Seridó. O melhor uso dos recursos naturais constitui garantia 101 de disponibilidade de novas atividades, dinâmicas e sustentáveis. Daqui se derivam os conteúdos de proteção dos recursos naturais disponíveis - com ênfase nos recursos hídricos, de solo e florestais - e do patrimônio ecológico encontrado no Seridó. Admite-se a conveniência de mobilizar as potencialidades existentes, buscando uma crescente integração − espacial, ambiental, econômica e sociocultural −, que possa contribuir para desconcentrar a base econômica da Região do Seridó. Com esta perspectiva, destacam-se, a seguir, as principais potencialidades do Seridó, na área ambiental: • Biodiversidade. A biodiversidade abrange todas as espécies vivas (animais e vegetais, e microorganismos, inclusive os genes contidos em cada indivíduo). Engloba também as relações entre todas essas espécies. O Seridó apresenta características peculiares a este respeito, contando com espécies vegetais típicas da caatinga e de áreas relativamente mais úmidas, como as encontradas nas ZH das Serras Centrais. A região conta com uma diversidade de flora e fauna que precisa e pode ser aproveitada, apesar dos agravos ambientais. As potencialidades estão, assim, representadas pelo material genético existente e do que dele pode derivar-se, em termos de novas técnicas e produtos; • Rede de açudes. O Seridó apresenta uma acentuada carência de recursos hídricos. Mas é uma das regiões mais açudadas do Rio Grande do Norte. Admite-se que a gestão adequada das águas acumuladas nos mais de 800 açudes existentes e as acumuláveis em novos barramentos na região contribuirá para diminuir as carências observadas, viabilizando melhores condições de abastecimento de água para suas populações e para outras finalidades; • Otimização das áreas irrigáveis do Seridó. As áreas irrigáveis do Seridó não são amplas. Mas podem ser expandidas e melhor aproveitadas, no quadro de uma adequada conservação dos recursos naturais, a partir da realização de estudos específicos sobre as possibilidades, riscos, técnicas de manejo e alocação de recursos financeiros. A organização e fortalecimento da pequena irrigação pode constituir uma boa diretriz a este respeito; • Gerenciamento dos recursos hídricos. A quantificação e qualificação das reservas acumuladas e a acumular, assim como a identificação dos riscos e técnicas de manejo mais adequados desses recursos, pode oferecer contribuição decisiva para ativar, em bases ampliadas e sustentáveis, a capacidade de armazenamento dos reservatórios existentes e a serem construídos na região. A garantia de oferta d’água regularizada dependerá, fundamentalmente, da gestão adequada dos recursos hídricos existentes. A situação do Seridó é tão crítica em matéria de efetiva disponibilidade de água que a aprendizagem em matéria de gestão de recursos hídricos termina por se transformar em potencialidade; • Solos. A agricultura do Seridó pode ser realizada com sustentação ambiental e econômica em áreas superiores a 6% das classes de todas as terras da região, onde o relevo é plano ou suave e ondulado, e as limitações de drenagem, fertilidade, deficiência hídrica e susceptibilidade à erosão podem ser adequadamente manejáveis. Essas condições estão presentes nas áreas aluviais e na Serra de Santana. Ademais, a exploração dos 81,6% de terras utilizáveis com pastagens podem constituir potencialidade adicional e complementar; • Manejo florestal da caatinga. Trata-se de alternativa viável e legal para a obtenção de vários produtos florestais, exploráveis de forma sustentável, com tecnologias inovadoras disponíveis. As áreas e propriedades que ainda possuem vegetação de caatinga, em dimensão suficiente, apresentam 102 condições locacionais adequadas a esse tipo de exploração, caracterizando-se, por isso, como potencial a ser explorado; (Ibama, 1999.) • Modificação do balanço energético. A substituição de madeira por energéticos derivados do petróleo constitui reforço ao desenvolvimento em base sustentável de várias áreas do Seridó. Essa alternativa deverá reduzir drasticamente o consumo residencial e industrial de lenha e carvão vegetal; • Recursos minerais. A exploração mineral no Seridó pode ser retomada, com a diversificação dos minerais explorados e a utilização de novos processos tecnológicos e de gestão ambiental; • Aproveitamento do lixo urbano. Além de melhorar as condições de saneamento ambiental, a utilização de mecanismos de coleta e tratamento adequado do lixo contribuirá para a criação de novas atividades industriais e de serviços, com capacidade para ampliar a geração de emprego e criar novas fontes de renda na região; • Participação social e preservação ambiental. O uso dos recursos naturais do Seridó pode ser maximizado, preservando o ambiente, sustentando as atividades produtivas e ampliando as oportunidades de emprego e renda, concebendo-se e viabilizando a concretização de esquemas de participação da sociedade nas decisões de investimento em prol do desenvolvimento da região. 3.3 DIMENSÃO TECNOLÓGICA A revisão das pesquisas, discussões com a comunidade e entrevistas realizadas para o estudo desta Dimensão sugerem, com razoável grau de certeza, que a sustentabilidade do Semi-Árido em geral e do Seridó, em particular, depende fundamentalmente de novos aportes em matéria de ciência e tecnologia. Daí ter-se considerado oportuno “ler e reler, para poder pensar e escrever” algo mais concreto sobre o futuro do Seridó, tomando-se, ainda que de forma simplificada, assentamentos científicos e tecnológicos que pudessem pautar perspectivas alvissareiras, de efetivo saber científico, suficientes para consolidar a construção e, em certos casos, a reconstrução, aqui pensadas. O quadro de mudanças – nem sempre favoráveis – por que tem passado o Seridó, com a crise que afetou a economia algodoeiro-pecuária e a indústria extrativa mineral, ali assentadas, sugere que a retomada do seu desenvolvimento irá depender, em grande medida, da identificação e utilização de novas inovações tecnológicas, na acepção mais precisa da construção teórica aportada pelo economista Joseph Schumpeter, a respeito do desenvolvimento e do progresso técnico. (Schumpeter, 1982.) Realiza-se, por isso, um particular esforço para estabelecer as bases da produção de ciência e tecnologia e dos padrões tecnológicos, hoje prevalecentes, na região objeto de estudo. Discute-se, na seqüência, a base de ciência e tecnologia existente no Rio Grande do Norte e no Seridó, seguida pelas referências às inovações e tecnologias adaptadas recentemente, de maior importância econômica para a região. Descreve-se, depois, a produção acadêmica gerada pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte, com os rebatimentos mais relevantes, identificáveis em relação ao Seridó. Apresenta-se, no tópico seguinte, apesar da escassez de informações, uma descrição bastante preliminar a respeito das demandas por informações tecnológicas, identificadas em relação à área objeto de estudo. Por fim, trata-se, de forma esquemática, dos problemas e das potencialidades existentes na área de ciência e 103 tecnologia, do confronto dos quais espera-se poder identificar soluções compreensíveis, pautadas pela lógica e sentido da sustentabilidade do desenvolvimento. 3.3.1 Importância da Ciência e Tecnologia Este assunto é tratado a partir da discussão dos seguintes aspectos: possibilidades de produção de ciência e tecnologia; padrões tecnológicos; e alternativas tecnológicas para aumentar a produtividade e elevar a qualidade de vida. 3.3.1.1 Possibilidades de Produção de Ciência e Tecnologia O Brasil caracterizou-se, ao longo de seu processo de desenvolvimento, como país importador de tecnologia. Nos primórdios, a importação e, a partir desta, a produção ocasional de tecnologia não foram realizadas sob forma de material pesquisável. De início, importaram-se bens e serviços que cristalizavam uma ciência e uma técnica que não se possuía, e era paga como insumo, estando seu preço embutido no pagamento das mercadorias importadas. Foram feitos melhoramentos nos produtos importados, mas se avançou pouco, do ponto de vista científico. Depois, adquiriu-se alguma tecnologia, melhorando produtos e importando novas tecnologias, na fase do chamado “crescimento para fora” e do “crescimento para dentro”, que caracterizou seu processo de desenvolvimento, dos anos 50 em diante. Mas naquela época, ainda não se fazia uma idéia clara das diferenças entre a ciência e a técnica voltadas para a produção. A visão que se tinha na ocasião era compatível com a problemática do capitalismo industrial, muito anterior a do capitalismo financeiro. Tratava-se a ciência e a tecnologia no quadro de uma formação econômica na qual não se fazia a clara distinção entre capitalista e empresário, como se passou a fazer, posteriormente, com Schumpeter. Daí, haver Ignacio Rangel chamado atenção para o fato de não ser difícil “compreender que a emergência da ciência e da técnica como forças produtivas autônomas teria que esperar pelo surgimento do capitalismo financeiro.” (Rangel, 1982: 94.) Esses passos, entretanto, não foram rápidos, nem concretos o suficiente para que o Brasil ganhasse forças para fundar sua independência tecnológica. E mais importante, para que pudesse produzir tecnologia de ponta. As impossibilidades a este respeito deveram-se, em grande medida, ao caráter incipiente do capitalismo financeiro no Brasil dos anos 60/70. Antes de nos tornarmos produtores de tecnologia, devíamos nos caracterizar como sistemáticos importadores de tecnologia. Essa especificidade foi destacada ainda nos anos 70, quando o Brasil começava a desempenhar papel relevante como importador de tecnologia. O Brasil de então foi “importador de tecnologia, mas no sentido antigo dessa expressão”, ou seja, importava mais insumos do que tecnologia em estado puro, capaz de diminuir nossa dependência da importação de mais insumos. (Rangel, 1982: 96.) Aqui está o centro de referência sobre as possibilidades de produção científica e tecnológica, que precisam ser consideradas, em relação ao Nordeste, ao Rio Grande do Norte e ao Seridó. Se o Brasil fizer as opções adequadas e necessárias a essa construção, será, com certeza, mais fácil para o Nordeste, ainda uma região periférica no Brasil, abrir seus caminhos, naquela mesma direção. Por via de conseqüência, estarão sendo viabilizadas as opções exigidas pelo Rio Grande do Norte e pelo Seridó. 41 41 A política de ciência e tecnologia ainda vigorante no Nordeste contempla hoje a orientação definida a este respeito pelo Grupo de Trabalho para o Desenvolvimento do Nordeste–GTDN. Para a Região em seu conjunto, a política tecnológica esteve vinculada às expectativas em relação ao “motor” do desenvolvimento, que dependia da industrialização. O próprio 104 3.3.1.2 Padrões Tecnológicos O progresso técnico envolve três etapas importantes, quais sejam, a invenção, a inovação e a difusão, sendo as duas últimas determinantes das mudanças tecnológicas, por responderem pela aplicação do conhecimento à produção. A atuação do Estado, no contexto das economias atrasadas, tem sido necessária para garantir o acervo de produção científica e tecnológica, hoje disponível. Nesse processo, a empresa capitalista, tem atuado com a força dos subsídios concedidos pelo Estado. Nos países desenvolvidos, essa empresa tem-se dedicado ao desenvolvimento final dos produtos e à pesquisa aplicada. Os centros estatais de pesquisa se concentram em pesquisas aplicadas de interesse social e militar, e as universidades se especializam na pesquisa fundamental e aplicada de maior alcance a longo prazo. Há centros independentes de pesquisa e inventores individuais, mas eles estão sendo substituídos por formas superiores de investigação. São essas instâncias que mudam os padrões tecnológicos, refletindo a lógica e a dinâmica econômica e financeira das sociedades globalizadas. Nas economias em desenvolvimento, o papel do Estado continua sendo relevante, dada a importância nelas desempenhada pelas universidades e a reduzida contribuição ainda apresentada pelo setor privado. (Santos, 1987: 12-13.) Na seqüência, é fundamental destacar o conceito de inovação, entendida como uma função de produção, ou seja, uma recombinação de fatores produtivos. Na prática, sua configuração implica a realização de mudanças tecnológicas, segundo padrões tecnológicos novos, cuja adoção depende, por sua vez, da efetivação de mudanças estruturais nos diferentes sistemas sociais (econômicos, culturais, ambientais, políticos e institucionais). A inovação caracteriza-se como um processo fundamental da vida econômica capitalista. É ela que dá lugar ao processo de desenvolvimento, progresso ou evolução econômica, como diz Schumpeter. À medida que o impulso dado pelas inovações se faz a partir de raízes sólidas, encravadas “na própria atividade capitalista, o desenvolvimento, oriundo das inovações, também é um fenômeno interno, endógeno ao sistema capitalista, embora se apresente como necessariamente extrínseco ao fluxo circular.” Deve-se, porém, notar, que as invenções são economicamente irrelevantes, enquanto não forem utilizadas. Na mesma linha, é fundamental ter em conta que o conceito mais preciso de inovação é aquele que admite que nem toda inovação é capaz de romper o equilíbrio e gerar desenvolvimento. (Possas, 1987: 174-182.) O uso mais (ou menos) intenso da ciência e da técnica determina o padrão tecnológico vigente em uma determinada economia e sociedade. O padrão tecnológico, tradicional (no sentido de atraso ou escasso uso de tecnologia nas atividades produtivas) ou moderno (no sentido de competitivo) permite que setores, ramos e indústrias locais concorram com seus congêneres externos – ao Estado, à Região e ao País. O padrão tecnológico é, pois, o conjunto de tecnologias utilizadas na produção de um determinado produto. Equivale, em linguagem mais clara, a um sistema de produção, como os que integram um “pacote tecnológico”. conceito de indústria eqüivalia, de certo modo, ao conceito de desenvolvimento, na linha da boa tradição teórica da Comissão Econômica para a América Latina–Cepal. Mais importante ainda era que a política de desenvolvimento tecnológico do GTDN – e depois da Sudene – privilegiava as diferenciações espaciais, neste sentido destacando o semiárido. Nesse espaço, o avanço técnico seria viabilizado, em boa medida, pelas possibilidades derivadas da expansão da agricultura irrigada, sem esquecer, porém, as tecnologias requeridas para modernizar as atividades da economia algodoeiropecuária. (Sicsú & Dias, 1994.) 105 Assim, o padrão tecnológico é resultado e síntese da produção e generalização do conhecimento, em condições históricas determinadas. Nesta perspectiva, compreende um dado conjunto de tecnologias, lastreadas por invenções e inovações, geradas internamente ou adquiridas no exterior. Resulta, assim, da aplicação do progresso técnico, constituindo-se em forças produtivas. Como indústria que é, a ciência e a tecnologia caracterizam-se como a síntese em que tem se convertido o trabalho técnico-científico. (Rangel, 1982: 95.) A existência de um dado padrão tecnológico envolve os resultados e os desdobramentos das atividades do conhecimento, abrangendo a pesquisa fundamental e a pesquisa aplicada, assim como todo o desenvolvimento final dos produtos e processos. Compreende no rol das atividades aí desenvolvidas os esforços do setor público e do setor privado, seja como agentes produtivos, seja como agentes responsáveis pelo seu financiamento. O Rio Grande do Norte dispõe de uma experiência tecnológica considerável, ampliada, em particular, com os empreendimentos realizados pelo Estado, desde a época da introdução da economia algodoeira e da mineração. Essa experiência expandiu-se em período recente com a exploração das reservas de petróleo e gás de sua plataforma continental. Tem também capacidade em segmentos específicos, como os ligados à produção de queijo e derivados. 42 (Guimarães, 1999: 3.) Não obstante a fragilidade e a escassa articulação com alguns setores produtivos, há segmentos que têm se constituído em ponto de apoio ao desenvolvimento de novas atividades, como as relacionadas aos complexos gással, de fruticultura irrigada e de turismo. O Seridó também conta com uma experiência tecnológica específica, que avançou com a exploração mineral e a economia algodoeira. A região já se fazia notar na produção artesanal de derivados do leite (queijo, doce), desde o século XIX, pelo menos. Sua boa dotação de recursos humanos, assinalada no início dos anos 70, do século XX, pelo Banco Mundial, em relatórios sobre os programas de desenvolvimento rural integrado, pioneiramente concebidos pelo governo do Estado, 43 vis-à-vis as demais regiões do Estado, constitui um indicador das disponibilidades tecnológicas com que o Estado contava àquela época. A produção de algodão mocó e a produção de minérios no Seridó foi e continua sendo realizada segundo padrões tecnológicos, que tipificaram esses dois conjuntos de atividades, no contexto do Nordeste, do Rio Grande do Norte e do mesmo Seridó. Os padrões tecnológicos dessa região eram distintos dos encontrados no Seridó da Paraíba, no Seridó do Ceará e no semi-árido nordestino, em geral. A produção leiteira hoje obtida no Seridó segue, nesse mesmo sentido, um padrão tecnológico, que caracteriza a pecuária leiteira ali explorada, de forma distinta da encontrada em outras regiões do Rio Grande do Norte ou do Nordeste. As evidências identificadas, no quadro das dimensões estudadas neste Diagnóstico, indicam que o Seridó produz tecnologia em condições capazes de assegurar a ruptura do equilíbrio da crise econômica hoje vivida pela região. Mostram também que essa crise é grave, pois a economia regional 42 O Jornal Gazeta Mercantil, em Relatório sobre o Rio Grande do Norte, faz o seguinte destaque sobre o Pólo Queijeiro do Seridó: “O projeto que prevê a criação do Pólo de Modernização Empresarial das Indústrias de Queijos do Seridó, em Currais Novos, orçado em R$ 22,2 milhões, começará a ser implantado em dezembro (de 1999), com a construção do Centro Tecnológico do Queijo (CTq). O prédio integra o complexo que também contará com um Núcleo Central de Processamento de Serviços. A sede da holding, formada por 50 pequenas indústrias de queijos, ocupará uma área de 60 hectares. Quando estiver concluído o Condomínio Empresarial, próxima etapa do projeto, o centro vai ter uma capacidade para produzir 35 mil quilos de queijo de leite de vaca por dia. 43 Cf. entrevista concedida pelo Dr. José Cortez Pereira, ex-governador do Rio Grande do Norte, a Waldecy de Urquiza e Silva, Otamar de Carvalho, João Mattos Filho e Ronaldo de Alencar Fernandes, em Natal, no dia 17.12.99. 106 está perdendo capacidade de investimento. Por isso, a retomada de seu desenvolvimento continua a depender, cada vez mais, de inovações, como as referidas à introdução de novos produtos, de novos métodos de produção, de novos métodos de transporte, da abertura de novos mercados, da exploração de novas fontes de matérias-primas, do uso da informática e da biotecnologia, bem como da adoção de novas formas de organização industrial. 44 Pensando, concretamente, no Seridó, os efeitos da introdução do algodão arbóreo e da exploração da scheelita produziram resultados tecnológicos e econômicos da mais alta significação para aquela região. Da mesma forma, o colapso da exploração das jazidas de scheelita, em virtude dos altos custos de produção do mineral (tungstênio), comparativamente ao produto internacional, particularmente o de origem chinesa, e a crise da agropecuária no Seridó, foi provocada por fatores de ordem climática, complementada por outros fatores naturais, como a praga do bicudo. Essas duas ordens de conjuntura econômica engendraram efeitos econômicos negativos, de grande magnitude, sobre aquela economia, que ainda hoje persistem. Neste sentido, as decisões de investimento em relação ao desenvolvimento do Seridó exigem o conhecimento das diversas possibilidades setoriais e de sua capacidade ociosa, para que se possa saber que setor deve ser privilegiado, em relação a outros, no futuro processo de desenvolvimento. É, pois, nessa perspectiva que se situam a ciência e a tecnologia, enquanto conjunto de possibilidades capaz de contribuir para a retomada do desenvolvimento dessa região. As novas atividades serão, com certeza, pautadas por novos padrões tecnológicos. Com a tecnologia neles embutida espera-se poder eliminar a degradação ambiental e a pobreza, provocada pela pressão da própria população sobre os recursos naturais, em várias áreas do Seridó. Isto porque a pobreza tem chegado a caracterizar-se, em algumas daquelas áreas, como forte determinante da degradação ambiental. 3.3.1.3 Alternativas Tecnológicas para Aumentar a Produtividade e Elevar a Qualidade de Vida A economia do Seridó apresenta níveis de produtividade inferiores aos observados em relação ao Estado como um todo e à Zona Homogênea Mossoroense, em particular. Essa diferença é constatada na indústria, na agropecuária e nos serviços, baseando-se tal percepção em informações mais qualitativas do que quantitativas. As informações dos Censos Econômicos do Ibge, para os anos de 1980 e 1985, permitem que se produza um perfil a respeito da produtividade do trabalho na indústria, relacionando-se o valor da transformação industrial–VTI (expresso em dólares) e o pessoal ocupado na atividade produtiva deste setor. Tome-se como parâmetros o Nordeste e o Rio Grande do Norte. O VTI por pessoa ocupada, para o Nordeste como um todo, diminuiu entre os anos de 1980 e 1985, pois passou de U$ 4,282.00, em 1980, para U$ 2,367.00, em 1985, o que significa uma diminuição de 45%. Para o Rio Grande do Norte, a situação foi melhor, pois a retração verificada foi de apenas 17%. O VTI por pessoa ocupada, que era de U$ 6,896.00, em 1980, diminuiu para U$ 5,711.00, em 1985. Dada a maior presença da indústria em torno de Natal, é lícito assumir que a produtividade industrial do Seridó é bem mais baixa do que a do Estado. Os dados relativos obtidos para o Seridó indicam que a produtividade do trabalho em sua indústria correspondia, em 1980, a 62% da observada 44 O que é o mesmo, em relação a este último caso, que tratar da introdução de novos processos de gestão, compatíveis com as disponibilidades de recursos e a organização social local. 107 para o Estado como um todo. Em 1985, aludida relação caiu para 41%, mostrando perda para o Seridó, vis-à-vis o Estado. Embora não se conte com informações quantitativas para os anos 90, pode-se oferecer indicações qualitativas a este respeito, tomando-se por base tendências deriváveis de informações globais e de algumas relações entre indicadores macroeconômicos, discutidas neste Diagnóstico. Estabelecem-se, a partir daqui, inferências para o Seridó, que corroboram perda de posição da região em comparação ao Estado. O peso da economia do Seridó na arrecadação do ICMS norte-rio-grandense é de apenas 4,5%. Dada a comprovada correlação entre participação no PIB e esforço de arrecadação, é aceitável admitir que a contribuição do Seridó para o PIB do Estado, além de modesta, vem, ao longo das últimas décadas, perdendo posição. A crise enfrentada pela indústria extrativa mineral, reforça as evidências de perda de dinamismo das atividades da mineração. As atividades agropecuárias também vêm perdendo posição, desde os anos 80, com a crise da economia algodoeira, desestruturada com a entrada da praga do bicudo e a ocorrência de vários anos de seca, como os de 1979-83, 1987, 1990 a 1994, 1998 e 1999. O que de dinâmico existe hoje no Seridó, em relação ao setor rural, está relacionado à pecuária leiteira e à cajucultura. Mas os níveis de produtividade ainda são baixos, como indicam os resultados observados em relação à produção de leite, adiante destacados. De positivo, em relação a outras atividades do setor urbano, destacam-se os resultados com a pequena produção urbana organizada, que se mantêm crescentes, e o comércio e os serviços em geral. De todo modo, é possível reconhecer que os agentes produtivos que vivem no semi-árido dispõem de inovações tecnológicas para todas as atividades que pretendam desenvolver naquela região. Sempre que foi possível aplicar as tecnologias disponíveis – graças a uma conjuntura favorável de recursos financeiros e decisões conseqüentes sobre políticas públicas –, os resultados obtidos foram positivos. Tem sido assim em relação a experiências conduzidas por empresários conhecedores das possibilidades da Região, como o engenheiro Manoel Dantas Vilar Filho, conhecido como Manoelito Dantas, proprietário da Fazenda Carnaúba, situada no Município de Taperoá, na Paraíba, e outros empreendedores, radicados no semi-árido nordestino. Naquela fazenda, produz-se carne e leite, oriundos de rebanhos bovinos e caprinos. Ali, os recursos locais são utilizados segundo técnicas modernas, que respeitam e refletem as particularidades do meio ambiente. 45 Há várias outras experiências. Uma delas se refere à produção de mangas, no Município de Livramento do Brumado, na Bahia. A produtividade das mangueiras e a lucratividade do negócio decorre das possibilidades dos solos explorados, em regime de irrigação, com economia de água; da utilização de variedades de alto valor comercial, exploradas com a devida orientação técnica; do moderno sistema de gestão adotado, em relação ao empreendimento; e, sobretudo, da união dos produtores ligados ao negócio. Os produtores envolvidos com aquele empreendimento formaram uma associação encarregada do tratamento pós-colheita, representado pela embalagem, transporte e gestões necessárias à exportação do produto, em containers refrigerados, pelo Porto de Salvador, na Bahia. Esse grupo é também encarregado 45 Baseado em notas colhidas por Otamar de Carvalho, durante palestra proferida pelo Eng. Manoel Dantas Vilar Filho, em 26.08.1992, no Auditório da Companhia de Desenvolvimento do Vale do São Francisco–CODEVASF, em Brasília-DF. E em outras informações colhidas em visita à Fazenda Carnaúba, realizada no dia 12.05.2000, pelos consultores Otamar de Carvalho, Waldecy Urquiza, João Matos Filho e Ronaldo de Alencar Fernandes. 108 do controle de qualidade do produto, expresso, inclusive, pela impressão de selo ou marca de origem, identificando o produto. (Baiardi, 1994: 18.) A classificação do Seridó, em 1996, como a segunda mais importante bacia leiteira do Rio Grande do Norte, responsável por 22,3% da produção leiteira do Estado (Nobre, 1998: 161), constitui outro exemplo das possibilidades oferecidas pelas tecnologias disponíveis. O aumento nos níveis de produtividade alcançados pela pecuária leiteira em expansão, é o resultado dos investimentos feitos na melhoria da qualidade do rebanho, considerando-se, neste sentido, elementos como mudança nos padrões tecnológicos utilizados, com destaque para as práticas de alimentação e manejo. Em abril de 1995, o Programa do Leite, apoiado pelo governo do Estado do Rio Grande do Norte, atuava com 45.000 vacas, produzindo 60.000 litros de leite dia, número que representava uma produção para cada vaca de 1,33 litros de leite-dia. Em setembro de 1999, o número de vacas elevou-se para 120.000 e a produção de leite para 400.000 litros-dia. Embora o aumento da produção de leite, por vaca-dia, em números absolutos, não tenha sido muito significativo, ao passar a média, por vaca, para 3,33 litros de leite-dia, o incremento relativo foi extraordinário, correspondendo a 251%, em relação à produção média de leite, por vaca, por dia. (SEAS, 1999: 7.) O apoio oficial, assegurando mercado institucional para aquela expansão da produção leiteira, constitui o fator garantidor, por excelência, da utilização adequada das tecnologias disponíveis, em relação à pecuária leiteira. Significa dizer, a ação do Estado continua sendo fundamental para o sucesso de experiências produtivas, cuja expansão é também pautada por seu caráter social, como ocorre com a produção de leite, cujo crescimento foi, também, apoiado em função da necessidade de atender a demanda por leite de vastas camadas da população de mais baixa renda. Além das tecnologias acessáveis pelas empresas, nas áreas da irrigação e da agroindústria, há um estoque razoável de tecnologias simples, disponíveis em relação aos produtores individualmente, a exemplo de forrageiras adaptadas à seca, forrageiras irrigadas, além de outras, específicas para a caprino-ovinocultura, piscicultura, ranicultura, bovinocultura de leite, confinamento de bovinos e ovinos, avicultura, apicultura, produção de biofertilizantes, etc. A maior disponibilidade de tecnologias, em relação à produção animal, é explicada pelo fato de que esse é o conjunto de atividades com mais alta capacidade de exploração auto-sustentada no semi-árido. As vantagens das atividades derivadas da produção animal exigem qualificação. A produção de queijo do Seridó, atividade com larga tradição, além das fronteiras regionais, deve ser objeto de mais específica reflexão. O crescimento dessa produção deve ser pautado pela qualidade e competitividade. A fama de produtos como os queijos e carnes do Seridó está sendo, em parte, comprometida, em virtude da perda de sua qualidade, O crescimento mais rápido da oferta, sem a observância de padrões tecnológicos compatíveis com as exigências do mercado, põe em risco valores como marca e tradição. Essa tendência pode ser revista, mediante a implementação de projetos de racionalização e modernização do processo industrial, preservando-se a imagem e a participação dos produtos regionais nos mercados nacional e internacional. (Consórcio Tecnosolo & CEP, 1999: v. 1, 55.) Também há tecnologias disponíveis para elevar a produtividade do setor terciário e para melhorar a qualidade de vida da população do Seridó. Tal disponibilidade é relativamente menos abundante do que as referidas aos setores produtivos, por exigirem outros mecanismos de validação. Essas tecnologias podem referir-se a procedimentos mais difíceis de concretizar, a exemplo dos relacionados a técnicas destinadas à melhoria da qualidade de atendimento de certos serviços, às condições de habitação ou à diversificação da dieta alimentar da população regional. 109 A prestação de serviços pode ser amplamente melhorada, desde que sua oferta seja organizada segundo determinantes culturais específicos, desvinculando-se o seu atendimento das raízes de obrigações de cunho religioso ou de atribuição de responsabilidade irrestrita ao Estado, no cumprimento de todas as demandas. A baixa qualidade dos serviços prestados pelo setor público não pode ser atribuída ao desinteresse, supostamente absoluto, por parte dos servidores públicos. É natural que haja desinteresse, diante de salários desestimulantes, da falta de treinamento e de certa dose de corporativismo, que faz com que a “ética da segurança prevaleça sobre a ética da responsabilidade.” (Baiardi, 1994: 25.) 3.3.2 Base de Ciência e Tecnologia O Estado do Rio Grande do Norte não se caracteriza como detentor de privilegiado aporte na área de Ciência e Tecnologia (C & T), mas tem revelado, nos últimos anos, avanços significativos na institucionalização de C&T, principalmente, por parte do setor público. Como foi referido no item 3.2.9 anterior (Instituições da Área Ambiental), há um razoável número de entidades ligadas à base de ciência e tecnologia no Rio Grande do Norte, nele estando incluídas as que produzem tecnologia ou apoiam atividades nesse campo do conhecimento, como as relacionadas às seguintes categorias: instituições governamentais (federais, estaduais e municipais); organizações não-governamentais; instituições empresariais; e organizações sindicais. Esse rol de entidades foi aqui estruturado em dois conjuntos: i) o de instituições que trabalham na esfera estadual, incorporando entidades federais e estaduais; e ii) o de instituições (federais ou estaduais) que atuam, diretamente, na Região do Seridó. Depois de referi-las, segue-se uma breve descrição sobre o envolvimento do Seridó com as atividades do Sistema Estadual de Ciência e Tecnologia. 3.3.2.1 Instituições que Atuam na Esfera Estadual Nesta esfera têm se concretizado as mais efetivas ações de desenvolvimento científico e tecnológico. Essa opção está inserida no Plano de Desenvolvimento Sustentável do Estado do Rio Grande do Norte como um dos cinco eixos estratégicos de desenvolvimento do Estado. O Rio Grande do Norte apresenta, portanto, condições favoráveis para o desenvolvimento da área de C&T, considerando o elenco de instituições de que dispõe, que vêm desempenhando profícuo trabalho nessa área. a. Instituições Públicas Como instituições âncoras do desenvolvimento de C&T, no Estado, destacam-se as seguintes entidades estaduais e federais: • Universidade Federal do Rio Grande do Norte–Ufrn; • Universidade Estadual do Rio Grande do Norte–Uern; • Escola Superior de Agronomia de Mossoró–Esam; • Universidade Potiguar–UnP; • Centro de Formação de Executivos–Facex; 110 • Escola Técnica Federal do Rio Grande do Norte–ETFRN (atualmente denominada de Centro Federal de Ensino Técnico–Cefet); • Secretaria de Indústria, Comércio, Ciência e Tecnologia–Sintec; • Secretaria Estadual de Educação e Desportos–SEED; • Empresa de Pesquisa Agropecuária do Rio Grande do Norte–Emparn; • Instituto de Assistência Técnica e Extensão Rural do Rio Grande do Norte–Emater (na área de difusão tecnológica); • Petrobras; • Instituto de Pesquisas Espaciais–INPE; • Regional; e Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística–Ibge, por intermédio de sua Delegacia • Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis–Ibama, por meio de sua Representação Estadual. b. Instituições Privadas Nesse domínio, destacam-se as seguintes instituições: • Universidade Potiguar–UnP; • Faculdade Natalense para o Desenvolvimento–Farn; • Faculdade de Natal–FAL; • Serviço Brasileiro de Apoio às Micros e Pequenas Empresas–Sebrae; • Serviço Nacional de Aprendizado Industrial–Senai; • Serviço Nacional do Comércio–Senac; • Federação das Indústrias do Rio Grande do Norte–Fiern; e • Instituto Euvaldo Lodi–IEL. Cada uma das instituições dos dois conjuntos referidos tem desenvolvido importante papel para o desenvolvimento de C&T, destacando-se as especificadas a seguir: 111 i. Universidade Federal do Rio Grande do Norte–Ufrn. Possui em sua estrutura de administração central uma Pró-Reitoria de Pesquisa e Extensão e na área acadêmica um Centro de Tecnologia, onde se concentram as chamadas engenharias, atualmente com cursos de graduação e pósgraduação, a nível de mestrado e doutorado. Conta, além disso, com uma agência de gestão e intermediação de projetos de pesquisas – a Fundação Norte-rio-grandense de Pesquisa e Cultura– Funpec. Adotando uma política de descentralização das atividades universitárias, a Ufrn interiorizou sua ação para algumas regiões do Estado, por intermédio do Centro Rural Universitário de Ação Comunitária–Crutac, que é hoje responsável pela administração dos Campi Universitários, destacandose o Centro Regional de Ensino Superior do Seridó−Ceres, Campus de Caicó e Campus de Currais Novos. Esses dois Campi atendem a 320 alunos dos diferentes municípios da região. Na área do ensino médio, a Ufrn conta com o Colégio Agrícola de Jundiaí e o Colégio Agrícola de Ceará-Mirim. ii. Escola Superior de Agricultura de Mossoró–Esam. Atua nas áreas de ensino, pesquisa e tecnologias adaptadas às condições particulares do semi-árido nordestino. iii. Secretaria de Indústria, Comércio, Ciência e Tecnologia–Sintec. Dispõe de uma Coordenação de Ciência e Tecnologia e é, na estrutura de C&T do Estado, o Órgão Central do Sistema de Ciência e Tecnologia. Esta Secretaria tem papel primordial na política de Ciência e Tecnologia do Rio Grande do Norte, pois tem a si vinculado o Fundo Estadual de Desenvolvimento Científico e Tecnológico–Fundet, criado em 1995. O Secretário, titular da pasta da Sintec, é, por Lei, o Presidente do Conselho de Ciência e Tecnologia–Conecit. iv. Centro Federal de Ensino Técnico–Cefet (anteriormente denominado Escola Técnica Federal do Rio Grande do Norte). Desenvolve ações específicas, por meio do recém criado Centro de Tecnologia Empresarial, via convênios que celebra com a iniciativa privada. v. Serviço Brasileiro de Apoio às Micros e Pequenas Empresas–Sebrae. Com atuação em escala nacional, o Sebrae tem dado relevante contribuição ao Estado do Rio Grande do Norte, por intermédio de vários programas de treinamento e difusão de tecnologia. Atualmente, é o gestor do Proder/Especial, que presta assessoria aos municípios contemplados pelo Projeto Comunidade Ativa, vinculado ao Programa Comunidade Solidária, na implementação de iniciativas econômicas para geração de renda. Tem atuação na maioria dos municípios do Estado, inclusive na Região do Seridó. vi. Fundação Norte-rio-grandense de Pesquisa e Cultura–Funpec. Atua na área do desenvolvimento de estudos e pesquisas ligados aos diferentes ramos do conhecimento. vii. Empresa de Pesquisa Agropecuária do Rio Grande do Norte–Emparn. Realiza, no âmbito do Estado, pesquisas e estudos nas áreas de agropecuária e meteorologia. viii. Federação das Indústrias do Rio Grande do Norte–Fiern. Vem atuando como importante parceira do Estado, na alavancagem de projetos estruturantes e na criação de centros tecnológicos, nas áreas de informática e de tecnologia do gás. 3.3.2.2 Instituições que Atuam na Região do Seridó Aquelas mesmas instituições atuam no Seridó, diretamente ou por intermédio de núcleos especializados, a exemplo dos seguintes: 112 • Centro Regional de Ensino Superior do Seridó–Ceres, Campus de Currais Novos, vinculado à Ufrn; • Centro Regional de Ensino Superior do Seridó – Ceres, Campus de Caicó, vinculado à • Estação Experimental de Cruzeta, vinculada à Emparn; • Campo Experimental de Mundo Novo, sede da Unidade Regional da Emparn do Seridó; Ufrn; • Departamento Nacional de Obras Contra as Secas–DNOCS, por intermédio da Estação de Piscicultura de Caicó; • Ibama, por intermédio da Estação Ecológica de Serra Negra do Norte; • Núcleos do Sebrae, em Caicó e Currais Novos; • Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Estado, por intermédio do Centro Regional de Agricultura de Caicó; • Emater, por intermédio do Escritório Regional de Caicó, apoiado pelos Escritórios Locais, existentes na região; • Cooperativa Agropecuária de Caicó Ltda.–Coacal; e • Cooperativa Agropecuária de Currais Novos Ltda. A participação do setor privado nas atividades de C&T na Região Seridó, como se vê, é pouco expressiva. 3.3.2.3 Sistema Estadual de Ciência e Tecnologia: Envolvimento do Seridó O Sistema Estadual de Ciência e Tecnologia do Rio Grande do Norte tem como objetivos principais: • integrar e divulgar em rede as informações em Ciência e Tecnologia produzidas nas instituições do Rio Grande do Norte; • prestar informações em rede sobre entidades, bases de dados, especialistas/pesquisadores, normas técnicas, legislação, patentes, documentos, publicações seriadas, projetos/pesquisas em andamento, eventos, recursos de informática; • contribuir para as atividades de planejamento de ciência e tecnologia no âmbito estadual; • gerar ponteiros ou indicadores referenciais sobre informação científica e tecnológica. e 113 O Seridó não está efetivamente envolvido nas atividades de C&T realizadas no Estado do Rio Grande do Norte. As particularidades a este respeito estão sendo estudadas, para serem incluídas no III Plano Estadual de Ciência e Tecnologia–Citec – 2000-2002. As diretrizes setoriais e espaciais desse envolvimento deverão ser estabelecidas em programa específico do Plano de Desenvolvimento Sustentável da Região do Seridó. Um programa a este respeito será crucial para o desenvolvimento do Seridó. O planejamento da produção de informações científicas e tecnológicas, de interesse para o Seridó, pode ser mais efetivo, mas carece, atualmente, de orientações mais específicas, em particular as oferecidas pelos usuários desses serviços. Ou seja, há que, pelo menos, qualificar a demanda para esse tipo de informações, assunto do qual se tratará no item 3.3.5, adiante. 3.3.3 Incentivo a Inovações e Tecnologias O estudo da Ciência e Tecnologia no Rio Grande do Norte tem um marco importante no Plano de Desenvolvimento Sustentável do Estado–PDS, publicado em 1997. Esse Plano confere o seguinte destaque a este tema: “A opção estratégica Desenvolvimento da Base Científica e Tecnológica orienta-se para a geração de conhecimentos e tecnologias na forma de subsídios técnicos e informacionais necessários à economia e à sociedade norte-rio-grandense. Desta forma, deve contribuir para o desenvolvimento sustentável, viabilizando o aumento da produtividade, competitividade e, principalmente, a compatibilização do crescimento econômico com a preservação ambiental. De forma mais específica, os objetivos são os seguintes: • geração de tecnologias adequadas aos ecossistemas do Estado, permitindo uma compatibilização da base econômica com o meio ambiente; • promoção do aumento da produtividade e da competitividade da economia norte-riograndense; e • melhoria da qualidade dos produtos e serviços gerados pelos setores econômicos.” (Idec/Seplan, 1997: 129.) O progresso técnico de um país, estado ou região acontece quando a capacidade criativa e inovadora da sociedade é direcionada para a produção de conhecimentos e de tecnologias adaptadas para o aproveitamento de suas potencialidades. Esse corolário torna-se verdadeiro quando se trata de sociedades que apresentam grandes defasagens nas áreas de C&T, como é o caso do Rio Grande do Norte. Pensa-se a respeito, como ensina a história, já conhecida, do Japão e dos países do Leste Asiático, na possibilidade de realizar avanços mais rápidos nas etapas do processo de desenvolvimento científico e tecnológico, promovendo-se a adaptação inovadora de conhecimentos e tecnologias já dominadas. Agregam-se, simultaneamente, o pressuposto e as demonstrações práticas sobre o fato inexorável de que é fundamental investir maciçamente em capital humano, para desenvolver novas tecnologias e encurtar a defasagem em C&T. No Rio Grande do Norte, pode-se perceber, pela análise de documentos e portfólios de projetos das diversas instituições da área de C&T, que a opção prevalecente é de uma política de Ciência e Tecnologia pautada pelos princípios mencionados. Fica evidente, pela orientação do Conselho Estadual 114 de Ciência e Tecnologia–Conecit, em relação ao apoio que deve ser concedido, pelo Fundo Estadual de Desenvolvimento Científico e Tecnológico–Fundet, a Programas e Projetos que induzam e incentivem o desenvolvimento de iniciativas voltadas para a solução dos problemas mais prementes e desafiadores da sociedade potiguar, cabendo destacar aqui o aproveitamento das potencialidades do Seridó. Neste sentido, menciona-se o Programa de Tecnologias Apropriadas do Rio Grande do Norte– PTA/RN, que tem como objetivos: i. desenvolver tecnologias apropriadas, utilizáveis por pequenos produtores, micro e pequenas empresas, consoante a realidade social, econômica, cultural e ambiental, que lhes caracteriza, de modo a contribuir para a melhoria da qualidade de vida das populações situadas nas periferias urbanas e no meio rural; ii. garantir que os processos de captação, seleção, aperfeiçoamento, geração, transferência e difusão de tecnologias sejam criados e geridos com as comunidades, objetivando, em última instância, sua autodeterminação tecnológica. Esse Programa contempla as seguintes iniciativas: • Tropicais; Projeto de Apoio ao Desenvolvimento da Produção e Beneficiamento de Frutas • Projeto Comunitário de Viveiros de Lagosta no Mar e Pesca Alternativa; • Projeto de Extração e Caracterização da Folha do Abacaxi; • Projeto Manejo Orgânico do Abacaxi Pérola; • Projeto de Vitalização da Apicultura da Região Oeste do Rio Grande do Norte; e • Projeto de Informação em Tecnologias Apropriadas. O governo do Estado trabalha com dois outros Programas importantes, cujas ações mais específicas para a Região do Seridó correspondem às apoiadas pelos dois seguintes Programas: i. Desenvolvimento Tecnológico do Rio Grande do Norte–Protec, cujo objetivo consiste em promover, incentivar e apoiar a instalação de empresas de inovação tecnológica no Estado; e ii. Reestruturação do Setor de Laboratórios da Emparn, que tem como objetivos: adequar, ampliar, modernizar e integrar a infra-estrutura laboratorial da Emparn, de modo a ampliar/subsidiar as áreas de melhoramento vegetal, fitossanidade, solo, água, sementes, bromatologia e nutrição e sanidade animal; e realizar análises físico-químicas e biológicas, destinadas a atender as demandas dos produtores e dar suporte ao desenvolvimento do agronegócio no Estado do Rio Grande do Norte. Os Projetos apoiados pelo Protec serão implementados em Natal e na Região do Seridó. O Programa da Emparn contempla o Seridó com o Projeto “Estudo Comparativo dos Dados das Estações Climatológicas dos Municípios de Cruzeta, Florânia e Caicó.” 115 Para os negócios não-agrícolas, o Seridó pode contar com o apoio do Pólo de Modernização Empresarial para Eficiência Coletiva de Micros e Pequenas Empresas–Poloemp, que tem por objetivos: • orientar e articular as ações relativas à capacitação tecnológica das pequenas empresas, tendo em vista o aumento da competitividade dos bens e serviços produzidos no Estado do Rio Grande do Norte como um todo e no Seridó, em particular; e • estimular os micros e pequenos empresários industriais e comerciais, para que atuem de forma conjunta, organizando pólos, na busca da competitividade. Além dos projetos já mencionados, encontra-se em estudo no âmbito da Coordenaria de Ciência e Tecnologia da Sintec um projeto no domínio da nutrição animal, orientado para a “adaptação de tecnologias na área da pecuária leiteira, com o objetivo de melhorar o desempenho de sua produção e a expansão das atividades agroindustriais, no âmbito da região semi-árida do Rio Grande do Norte" (Lima Filho, 1999). Com esse projeto, pretende-se implantar “O Sistema Agroecológico de Produção de Pasto em Estufa”, nos municípios da Zona Homogênea de Currais Novos, onde também está prevista a instalação do Centro Tecnológico do Queijo, no Município de Currais Novos. Na área mineral, merece destaque o Programa de Reativação do Setor Mineral da Região do Seridó, com dois projetos específicos: • Avaliação e Caracterização dos Calcários da Região do Seridó e suas Aplicações Industriais, a ser executado pelo Serviço Geológico do Brasil–CPRM e Ufrn; • Avaliação dos Fatores Condicionantes da Reativação da Mineração de Scheelita no Rio Grande do Norte; a ser executado pelo Professor Eliezer Braz Pereira; e • Gemas e Minerais Industriais, abrangendo os Municípios de Parelhas, Currais Novos, Equador e Carnaúba dos Dantas, no Seridó. 3.3.4 Produção Acadêmica Como referido anteriormente, o Rio Grande do Norte conta com os seguintes centros universitários: a Universidade Federal do Rio Grande do Norte–Ufrn, a Escola Superior de Agronomia de Mossoró–Esam, a Universidade Estadual do Rio Grande do Norte–Uern, a Universidade Potiguar– UnP, a Faculdade Natalense para o Desenvolvimento–Farn, a Faculdade de Natal–FAL e o Centro de Formação de Executivos–Facex. A produção acadêmica desses centros é considerável. Os dados de sua produção, acessados no momento, se referem apenas à Ufrn, via Internet. 46 Os primeiros cursos de mestrado da Ufrn foram iniciados em 1978, com os cursos de Administração, Ciências Sociais, Educação, Patologia Oral e Odontologia Social. Depois foram criados mais 14 cursos de mestrado, como mostra o quadro 3.3.4.1. Os cursos de doutorado tiveram início em 1986 (área de Física) e 1994 (área de Educação). 46 Até dezembro de 1999, aquelas outras escolas e centros universitários ainda não haviam tornado disponível sua produção acadêmica, via Internet. 116 Os 18 cursos de mestrado geraram 645 dissertações no período de 1978 a 1998. As 645 dissertações produzidas estão assim distribuídas, entre as quatro grandes áreas do conhecimento, especificadas no quadro 3.3.4.1: i. ii. iii. iv. Administração e Ciências Sociais: Línguas e Educação: Biologia e Ciências da Saúde: Engenharia e Física: 118 (18,29%); 176 (27,29%); 129 (20,00%); 222 (34,42%). O conjunto da área de engenharia, de importância fundamental para a introdução e difusão do progresso técnico, está bem representado, com 34,42%. Segue-lhe o conjunto da área de Línguas e Educação, com 27,29% do total de dissertações, vindo em terceiro lugar a área de Biologia e Ciências da Saúde, com 20,0%, e em quarto lugar a área de Administração e Ciências Sociais, com 18,29%. Ainda é muito estreita a base técnica centrada na disponibilidade de doutores, pois a Ufrn formou apenas 13 doutores até 1998, sendo 12 na área de Educação e um na de Física. Os profissionais que fizeram pós-graduação na Ufrn não estão, necessariamente, vinculados à produção de conhecimentos científicos e tecnológicos, nem se encontram, em sua totalidade, trabalhando no Rio Grande do Norte. A saída (ou o retorno) para outros Estados, de uma parte deles, pode estar sendo compensada por profissionais que hoje atuam no Estado, vindos de outras regiões, como os que trabalham nas áreas de exploração de petróleo, gás natural, minerais diversos (metálicos, não-metálicos, materiais refratários e cerâmicos), irrigação, fruticultura irrigada, turismo e ensino. QUADRO 3.3.4.1 PRODUÇÃO ACADÊMICA DOS CURSOS DE MESTRADO E DOUTORADO DA UFRN ÁREAS MESTRADO DOUTORADO INÍCIO Nº DE DISSERTAÇÕES INÍCIO Nº DE TESES ADMINISTRAÇÃO E C. SOCIAIS 118 1. Administração 1978 116 2. Ciências Sociais (*) 1978 2 LÍNGUAS E EDUCAÇÃO 176 12 3. Estudos da Linguagem 1993 24 4. Educação 1978 152 1994 12 BIOLOGIA E CÊNCIAS DA SAÚDE 129 5. Bioecologia Aquática 1995 8 6. Medicina 1994 2 7. Patologia Oral 1978 47 8. Clínicas Odontológicas 1994 6 9. Odontologia Social 1978 41 10. Psicobiologia 1986 25 ENGENHARIA E FÍSICA 222 1 11..Engenharia Elétrica 1983 46 12. Engenharia Mecânica 1983 69 13. Engenharia Química 1988 43 14. Física 1986 34 1994 1 15. Geodinâmica 1996 1 16. Química . 1990 27 17. Sistemas de Computação 1995 2 18. Bioquímica (**) N. d. N. d. N. d. N. d. TOTAL 645 13 FONTE DOS DADOS BÁSICOS: Ufrn. Biblioteca Central Zila Mamede http://www.bczm.ufrn.br/pesquisa_colecoes_universidade.html. (*) Admite-se a produção de outras dissertações na área de Ciências Sociais, que não estão registradas no site da Biblioteca Central Zila Mamede–BCZM da Ufrn. Além disso, há teses típicas da área de Ciências Sociais incluídas na área de Administração. (**) O site da Ufrn/BCZM lista a área de Bioquímica, mas não indica o número de dissertações produzidas. N. d. Não disponível. 117 Destaque-se que a Região do Seridó tem sido beneficiada com a produção acadêmica gerada no âmbito da Ufrn. Dentre as dissertações de mestrado, ali preparadas, há algumas que tratam especificamente de problemas do Seridó, tanto na perspectiva sociocultural e econômica, como ambiental e produtiva, de que constituem exemplo as mencionadas a seguir: i. ALVES, Jefferson Fernandes (1997)- O CULT (iv) O DAS PEDRAS PESADAS - Um estudo do modelo extrativo-industrial da scheelita em Currais Novos. Natal, RN, 1998. (Dissertação apresentada ao Centro de Ciências Sociais Aplicadas da Federal do Rio Grande do Norte.) Xerox. ii. ARAÚJO, Sandra do Amaral de (1998)- Variação temporal da freqüência de captura e sazonalidade reprodutiva de Prochilodus cearensi Steidachner, 1911 (Characiformes, prochilodontidae) no açude Itans, Caicó/RN. Natal, RN, 1998. (Dissertação apresentada ao Centro de Biociências da Universidade Federal do Rio Grande do Norte.) Xerox. iii. MACÊDO, Muirakytan Kennedy de (1998)- A penúltima versão do Seridó; espaço e história no regionalismo seridoense. Natal-RN, Ufrn, 1998. Xerox. (Dissertação apresentada ao Programa do Mestrado de Ciências Sociais da Universidade Federal do Rio Grande do Norte.); iv. MORAIS, Ione Rodrigues Diniz (1998)- Desvendando a cidade; Caicó em sua dinâmica espacial. Natal-RN, Ufrn, 1998. Xerox. (Dissertação apresentada ao Programa do Mestrado de Ciências Sociais da Universidade Federal do Rio Grande do Norte.) (Essa dissertação foi publicada em livro, em 1999); v. QUEIROZ, Alvamar Costa de (1997)- A inserção da dimensão ambiental no ensino fundamental. Natal-RN, 1997. (Dissertação apresentada ao Centro de Ciências Sociais Aplicadas da Ufrn); e vi. SOUSA, Terezinha Dantas de (1992)- A educação escolar no município de Currais Novos/RN ou a (co)existência da escola e da máquina de beneficiar algodão a vapor – 1900 - 1930. Natal, RN, 1992. (Dissertação apresentada ao Centro de Ciências Sociais Aplicadas, Universidade Federal do Rio Grande do Norte.) Xerox. A Universidade, como instituição, está presente no Seridó, expressando-se essa presença por intermédio do Centro Regional de Ensino Superior do Seridó–Ceres, via Campus de Currais Novos e Campus de Caicó. A Região do Seridó contava, em 1999, com 81 docentes, dos quais 31 eram graduados, 19 tinham especialização, 29 eram mestres e 2 eram doutores, como consta da tabela 3.3.4.1. Na esfera do Centro Regional de Ensino Superior do Seridó estão sendo especializados três profissionais em cursos de mestrado e seis em cursos de doutorado. TABELA 3.3.4.1 CARACTERIZAÇÃO DOCENTE DO CENTRO DE ENSINO SUPERIOR DO SERIDÓ, CAMPUS DE CAICÓ E DE CURRAIS NOVOS. SITUAÇÃO EM 1999 DEPARTAMENTO Caicó Currais Novos Ceres FONTE: Ceres. DOCENTES GRADUADO 55 26 81 24 7 31 QUALIFICAÇÃO DOCENTE ESPECIALISTA MESTRE 15 4 19 15 14 29 118 DOUTOR DOCENTE EM QUALIFICAÇÃO ESPECIALISTA MESTRE DOUTOR 1 1 2 5 3 8 2 1 3 3 3 6 Comparando-se com os dados de 1998, o Ceres apresentou em 1999 uma melhora significativa na qualificação docente. Houve uma redução de 22,6% no número de graduados; um aumento de 18,8% no número de especialistas; e de 38,1% no número de mestres. Os docentes em qualificação, estarão em breve encerrando os respectivos cursos. Significa que o Seridó contará até o final do ano de 2000 com 23 Graduados, 27 Especialistas, 32 Mestres e 08 doutores. Outros professores estarão iniciando sua pós-graduação – doutorado e mestrado – no mesmo período. De todo modo, ainda é reduzida a disponibilidade de recursos humanos vinculados à geração e difusão de novas tecnologias, na esfera universitária, que resulta, em grande medida, da escassez de recursos financeiros para aplicação em pesquisa. Aludida escassez decorre, por outra parte, da falta de políticas mais explícitas de desenvolvimento científico e tecnológico, aplicáveis não apenas ao Seridó, como ao Rio Grande do Norte e ao Nordeste. 3.3.5 Demandas Tecnológicas Este tópico constitui complemento das informações até aqui descritas sobre a produção e oferta de tecnologias, no que em particular, pode interessar ao desenvolvimento do Seridó. Trata-se de abordagem preliminar e simplificada. A formulação de demandas tecnológicas (ou prospecção tecnológica) ainda constitui campo muito novo de pesquisa. Seu desenvolvimento vai, aos poucos, se firmando na gestão de ciência e tecnologia, em decorrência da maturação dos investimentos em pesquisa e da escassez de recursos para o financiamento de novos investimentos, em C&T, tanto públicos como privados. A identificação de demandas tecnológicas é problemática, diante das dificuldades que as instituições de C&T devem solucionar, em matéria de pesquisa e desenvolvimento (P&D). Na execução de suas atividades, essas instituições devem responder, de saída, a questões como as seguintes: o que é importante pesquisar e como distribuir os recursos disponíveis (financeiros e humanos), para atender as demandas identificadas. (Goedert, Paez & Castro, 1994: 167-169.) A revisão que se fez sobre a identificação de demandas tecnológicas informa que não há informações quantitativas sobre a demanda por serviços de ciência e tecnologia, tanto em relação ao Rio Grande do Norte como à Região do Seridó. Essa carência não constitui privilégio desse Estado, embora a formulação, em detalhe, da demanda por aqueles serviços venha constituindo objeto de discussão em encontros, simpósios e congressos de C&T. Mesmo assim, os resultados concretos daí advindos ainda são restritos. Sabe-se que as entidades dedicadas à pesquisa e à tecnologia estão atentas a esse problema, como mostram as iniciativas postas em prática por instituições como a Embrapa. Idêntica observação também vale para as organizações envolvidas com a difusão de tecnologia, tomando-se por base o caso mais estudado, que é o da aplicação de novas tecnologias em atividades agropecuárias. Em relação a este setor, o problema é mais complexo. No tocante à difusão de tecnologias, não se conta, atualmente, com uma instituição que atue, especificamente, sobre o tema, nas esferas nacional e regional. E a que existe no âmbito estadual, representada pela Emater, deveria dispor de uma mais efetiva capacidade instalada, compatível com as demandas hoje postas por sua clientela preferencial. As carências em matéria de difusão de novas tecnologias chegam a integrar o rol das recomendações de várias instituições de pesquisa, em particular daquelas cujos maiores interessados dispõem de conhecimento técnico e científico restrito sobre a matéria, como ocorre com as ligadas ao setor agropecuário. A situação é um pouco diversa, quando se trata de agricultores e pecuaristas, tecnicamente mais avançados, que até podem não dispor de uma percepção precisa sobre as demandas 119 específicas na área de C&T. Mas sabem localizar os problemas que limitam a rentabilidade de seus negócios. Na prática, a ligação dos agricultores mais modernos com os centros de pesquisa de organizações como a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária−Embrapa é realizada, em boa medida, por intermédio de meios modernos de comunicação, como o telefone e, por fim, a Internet. As dificuldades maiores – para a prospecção tecnológica – tendem a ficar mais restritas aos pequenos produtores, em particular os que produzem diminutos excedentes para o mercado, como ocorre com os que trabalham nas áreas mais carentes de recursos (físicos, materiais, técnicos e financeiros), do semi-árido em geral e do Seridó em particular. Esses produtores ainda dependem muito dos técnicos responsáveis pela difusão de tecnologias, integrantes dos quadros da Emater, para terem suas demandas especificadas. Passando do setor rural ao setor urbano, verifica-se que as dificuldades antes mencionadas também são enfrentadas pelos micro e pequenos empresários urbanos, embora a natureza particular de seus problemas seja diversa. Primeiro, aqueles empresários podem contar com uma disponibilidade de recursos financeiros relativamente maior do que a mobilizável pelos micro e pequenos agricultores. Segundo, os problemas que os micro e pequenos empresários urbanos enfrentam ficam relacionados à capacidade de pagamento dos serviços de informação técnica. Como o Estado não financia a assistência técnica requerida pelos setores econômicos, ditos urbanos, dada a suposição de sua maior força econômica e financeira, aquela categoria de empresário só tem acesso a inovações técnicas se puderem pagar pelos serviços exigidos para a utilização das novas tecnologias. Há exceções, para confirmar a regra, como as expressas pela assistência técnica aportada pelo Serviço Brasileiro de Apoio às Micros e Pequenas Empresas–Sebrae. Assume-se, pois, que no Seridó – e, de resto, no Nordeste e Estados que o integram –, o acesso aos serviços prestados pelas instituições de difusão tecnológica é realizado pelo emprego de uma de duas opções: o interessado recebe o serviço de assistência e informação gratuitamente (quando se trata de um micro ou pequeno agricultor) ou paga por aquele serviço (quando se trata de um empresário, quer tenha negócio em área rural ou urbana). O quadro das instituições que atendem a demanda por serviços de C&T, na Região do Seridó, é constituído por organizações como as especificadas a seguir, em relação às atividades com as quais operam: i. atividades rurais: Emater, organizações não-governamentais (como o Serviço de Apoio aos Projetos Alternativos Comunitários–Seapac, vinculado à Diocese de Caicó, e a Associação de Apoio as Comunidades do Campo–AACC) e empresas privadas (de planejamento e de assistência técnica); e ii. atividades urbanas: Sebrae, organizações não-governamentais (como as duas mencionadas na alínea anterior) e empresas privadas (de planejamento, consultoria, assessoria e marketing). A identificação das demandas tecnológicas depende, fundamentalmente, da integração de ações entre as instituições de produção e difusão de inovações e destas com os clientes, que podem ser pequenos agricultores, empresários rurais e empresários urbanos. Para uma região com as características do Seridó, será tanto mais eficaz, quanto mais próximos atuarem os diferentes atores desse processo, em relação aos seus objetivos comuns. 120 Historicamente, as demandas tecnológicas mais efetivas do Rio Grande do Norte e do Seridó têm sido as colocadas pelos grandes produtores (rurais ou urbanos), em particular aqueles ligados às atividades algodoeiro-pecuárias e à indústria extrativa mineral. O atendimento dessas demandas, em particular as de interesse do complexo algodoeiro-pecuária, foi viabilizado pela ação de instituições públicas e privadas. No primeiro caso, destacaram-se o antigo Instituto de Pesquisas e Experimentação Agropecuárias do Nordeste–IpeaNE, a Sudene e a Embrapa, além de órgãos do governo do Rio Grande do Norte. No segundo caso, convém salientar a contribuição de empresas como a Machine Cotton (com os trabalhos realizados na Fazenda São Miguel, no Município de Angicos), a Anderson Clayton e o Instituto Nordestino para o Fomento de Algodão e Oleaginosas−Infaol. A produção de informações tecnológicas de interesse da indústria extrativa mineral deveu-se também ao suporte oferecido por instituições públicas e privadas. Dentre aquelas destacaram-se a Sudene, a antiga Companhia de Pesquisas de Recursos Minerais–CPRM (hoje transformada em Serviço Geológico do Brasil) e a órgãos do governo do Rio Grande do Norte. O setor privado emprestou contribuição importante, por ter arrostado riscos consideráveis, na introdução e utilização de novas tecnologias, cuja eficácia local estava para ser comprovada. “As necessidades de tecnologia de usuários específicos, ou da sociedade como um todo, são definidas pelos objetivos da sociedade. Estes, por sua vez, são influenciados por características dos sistemas sociais, como valores, padrões de consumo, que determinam problemas, necessidades e prioridades em relação à tecnologia. Todas essas variáveis têm comportamento dinâmico e provocam modificações nas demandas dos usuários da tecnologia. Por isso, é fundamental que as variáveis que interferem neste processo, sejam monitoradas.” Esses objetivos devem ser, por seu turno, colocados no quadro geral dos espaços (natural ou produzido) e situados nos contextos gerais e específicos das diferentes dimensões do desenvolvimento sustentável (ambiental, tecnológica, econômica, sociocultural e político-institucional). O próximo passo consistirá na avaliação das conseqüências futuras de decisões atuais e na avaliação do potencial futuro das tecnologias sobre o processo de inovação social. (Goedert, Paez & Castro, 1994: 173-174.) Considerando de forma específica as contribuições do Sistema Nacional de Pesquisa Agropecuária, desenvolvido pela Embrapa, em relação ao qual há uma experiência ampla e sistematizada, 47 verifica-se que a identificação das demandas tecnológicas de uma região como o Seridó deve passar por etapas como as seguintes: i. análise do mercado de produtos, com a identificação das tecnologias mais importantes neles contidas; ii. exame das necessidades, exigências e aspirações dos consumidores daqueles produtos; iii. análise do mercado de tecnologia, de acordo com os seus diferentes segmentos; e iv. identificação da clientela e caracterização de suas demandas, na perspectiva dos centros de P&D (levantamento, classificação, compatibilização, agregação e estabelecimento de prioridades). No quadro das informações disponíveis, pode-se assumir que as demandas tecnológicas que se colocam atualmente referem-se a exigências observáveis nas esferas de atividades dinâmicas e de 47 Veja-se, em particular, sobre o assunto: (Goedert, Paez & Castro, 1994: 177-185.) 121 atividades (tradicionais ou não) ligadas à indústria e à agroindústria. No que se refere às atividades dinâmicas, destacam-se demandas nos seguintes subsetores: • pecuária leiteira; • lavouras (de sequeiro ou irrigadas) exploradas em regime de pequena produção rural organizada; e • lavouras empresariais, como a da cajucultura (na Zona Homogênea das Serras Centrais). No tocante às demandas afetas a atividades ligadas à indústria e à agroindústria, há requerimentos de tecnologias para: • a indústria extrativa mineral, considerando a retomada de explorações mineiras antigas, a exemplo das referentes ao aproveitamento dos rejeitos do tungstênio; • uso de produtos energéticos alternativos, considerando as particularidades da indústria de cerâmica; • • tecnologias. a agroindústria de queijos e carnes; e a instalação de Parques Tecnológicos e outras formas de produção e difusão de A explicitação das demandas referidas aos dois conjuntos de atividades mencionados não significa carência de tecnologias. Na realidade, boa parcela das inovações requeridas já se acham dominadas. O que falta, em determinados casos, é torná-las disponíveis, em função das características dos mercados de produtos e de tecnologia, da disponibilidade de crédito para o desenvolvimento de novas atividades, da organização das instituições de difusão tecnológica e da criação de apoio aos micro e pequenos produtores e empresários, rurais ou urbanos. Por fim, também falta apoio do governo estadual aos trabalhos de ciência e tecnologia, no rol dos quais se inclui a formação de profissionais bem capacitados, devidamente remunerados, para identificarem as demandas tecnológicas adequadas e produzirem as inovações a elas correspondentes. “A maioria dos Estados brasileiros não tem investido em ciência e tecnologia. Pagam mal a seus cientistas e investem pouco na infra-estrutura laboratorial. Com exceção de São Paulo, há nos Estados a tradição de esperar pelos investimentos públicos federais, que, por sua vez, também são reduzidos, principalmente quando comparados, em percentagem do PIB, com os efetuados em países desenvolvidos.” (Sousa, 1993:85.) Esta situação apresenta-se mais grave atualmente. O governo federal vem reduzindo seus já diminutos aportes de recursos às atividades de pesquisa, geração e difusão de tecnologias. Assim, a contribuição do setor privado, por mais amplas e efetivas que possam a ser os esquemas de parceria, tenderá a ser insuficiente para equilibrar o balanço entre demanda e oferta de informações tecnológicas. 122 3.3.6 Principais Problemas Os problemas são aqui considerados como uma restrição ao desenvolvimento sustentável, em uma ou mais de suas vertentes (científica e tecnológica, ambiental, sociocultural, econômica e políticoinstitucional). Neste sentido, os problemas do Seridó, na área de ciência e tecnologia, foram examinados a partir das dificuldades que, no mesmo sentido, se mostraram relevantes em relação ao Estado do Rio Grande do Norte. Em função dessas, é que são identificados os principais problemas do Seridó, admitindo-se poder criar, a partir deles, os elementos necessários à compreensão das iniciativas programáticas que serão detalhadas no capítulo 5, posteriormente. A Região do Seridó conta com uma base tecnológica restrita, insuficiente para promover as atividades potencialmente dinamizáveis. Além de insuficiente, é defasada em relação às demandas das atividades produtivas. Registra-se, neste sentido, uma grande defasagem entre as tecnologias utilizadas nos setores da economia, manifestada quando da avaliação do processo produtivo atual e o padrão tecnológico exigido por essas atividades. Essa defasagem decorre da orientação que tem presidido o desenvolvimento das atividades de geração e difusão de tecnologia, comprometendo o padrão de desenvolvimento e sua sustentabilidade. Os problemas existentes nessa dimensão estratégica podem ser assim sintetizados: • Baixos níveis de produtividade das atividades produtivas. Os níveis de produtividade alcançados pelas atividades rurais e urbanas do Seridó apresentam desvios negativos em relação aos alcançados por outros centros produtores do semi-árido nordestino; • Restrita capacidade de produção de informações científicas e tecnológicas. As estruturas existentes, tanto as vinculadas ao governo (federal e estadual) como ao setor privado, não estão compatíveis com as demandas suscitadas pela recuperação, reorganização e fortalecimento das atividades e serviços produtivos da Região do Seridó; • Escassa disponibilidade de informações técnico-científicas sobre a eficiência do uso da água. O balanço entre oferta e demanda de recursos hídricos no Seridó indica carência acentuada, em relação à demanda por água, para diferentes usos. A gestão desses recursos é realizada, além disso, sem a consideração necessária para com os fatores que respondem pela eficiência do uso da água, em relação às suas diferentes finalidades; • Carência de estruturas de difusão tecnológica. Os produtores rurais são assistidos por Escritórios Locais da Emater em apenas 2/3 dos municípios do Seridó. Complementarmente, são apoiados por organizações não-governamentais. Ambos os tipos de serviço não têm atendido as demandas dos produtores, seja pela natureza de sua estruturação e funcionamento, seja pela falta de articulação com as instituições de pesquisa, crédito e oferta de insumos. As carências são ainda mais acentuadas em relação aos produtores do setor urbano; • Demandas tecnológicas não identificadas. Não há informações específicas sobre o assunto. A percepção que se tem a respeito é fruto de um grande esforço de qualificação do problema, definido a partir de experiências vinculadas ao setor agropecuário e aos pequenos negócios do setor urbano; 123 • Escassa articulação entre as iniciativas de C&T e de gestão ambiental. As atividades de produção e difusão de tecnologias são limitadas, em extensão e profundidade. As que vêm sendo realizadas não consideram ou respeitam, apenas minimamente, as especificidades do Seridó, no tocante à compatibilização entre as atividades de C&T e gestão ambiental; • Inexistência de programas específicos de C&T para a Região do Seridó. O planejamento das atividades de C&T ainda constitui uma prática exploratória no Rio Grande do Norte. Os Planos de C&T disponíveis são econômicos em termos de concepção e detalhamento de ações programáticas, e mais restritos, ainda, em relação às demandas e possibilidades do Seridó; • Estrutura e quadros de pessoal insuficientes. Embora conte com a presença da Ufrn, o Seridó dispõe de um reduzido contingente de profissionais dedicados aos trabalhos de C&T. A complementação derivada de iniciativas contidas no bojo de programas geridos a partir de Natal, não é capaz de atender as demandas da região; • Limitada dotação de recursos humanos para a implementação de programas considerados dinâmicos na região. É desfavorável o balanço entre oferta e demanda de recursos humanos, para o desenvolvimento da pecuária bovina leiteira e atividades correlatas, como a criação de caprinos e ovinos, além da piscicultura; e • Escassa utilização de esquemas de parceria. A fragilidade do setor público (federal, estadual e municipal) não tem sido compensada pela estruturação de mais esquemas de parceria entre esse setor com a iniciativa privada e organizações não-governamentais, na área de C&T. A contribuição de instituições como o Sebrae cobre apenas parte das demandas do setor urbano. 3.3.7 Potencialidades Relevantes Potencialidade é uma vantagem, comparativa ou competitiva. Expressa-se pela disponibilidade de recursos naturais, aproveitáveis mediante a mobilização de forças produtivas existentes ou novas, alcançáveis com a introdução de inovações, apoiadas ou não por novas invenções. As potencialidades mais importantes do Seridó, no tocante a esta Dimensão, estão referidas aos seguintes aspectos: • Base de recursos humanos. Embora insuficiente a uma maior cobertura das demandas, o Seridó conta com uma base de recursos humanos com formação variada, inclusive de nível superior, nas principais cidades da região, capacitada para absorver inovações e utilizar as técnicas disponíveis, se apoiada devidamente; • Disponibilidade de núcleos de recursos humanos, capacitados a nível de mestrado e doutorado. Os profissionais que integram os Centros Regionais de Ensino Superior−Ceres, Campus de Caicó e Campus de Currais Novos, da Ufrn, junto com os existentes nas unidades de pesquisa da Emparn, constituem núcleos de recursos humanos, passíveis de mobilização, para a alavancagem de programas de ciência e tecnologia, produzindo novas tecnologias (inovações) e difundindo as existentes; • Existência de cultura pautada por inovações. A cultura do Seridó expressa familiaridade com diferentes aspectos do conhecimento. Destacam-se a este respeito, os vinculados à indústria de beneficiamento de fibras e oleaginosas (como herança das atividades do complexo 124 algodoeiro-pastoril) e à indústria extrativa mineral, passíveis de replicagem, em bases ampliadas, em novos setores e ramos da economia; • Campo para a interação dos esforços de C&T e meio ambiente. O processo de desertificação observado em áreas do Seridó e a explicitação de uma consciência ecológica na região constituem sólidos elementos para a interação positiva dos atores sociais comprometidos com os requerimentos do desenvolvimento sustentável da região; e • Demanda social pela expansão da capacidade tecnológica. Importantes comunidades do Seridó põem crédito nas possibilidades tecnológicas oferecidas por segmentos produtivos específicos, a exemplo dos relacionados à produção leiteira, indústria extrativa mineral, produção e gestão de recursos hídricos, e manejo e conservação de recursos florestais e de solo. Entende-se que o aproveitamento dessas possibilidades pode ser maximizado, pela mobilização em maior escala da capacidade demonstrada pelas pequenas e médias empresas disponíveis na região. 3.4 DIMENSÃO ECONÔMICA Esta Dimensão é descrita tomando por base a identificação das principais características do ambiente econômico do Seridó, destacando as atividades que desempenharam um papel central, a partir das quais foi organizada a economia seridoense – os complexos algodoeiro-pecuária, a agricultura de alimentos e o complexo minerador (comandado pela extração da Scheelita), estando ambos os complexos em crise, desde os anos 80. Destaca também outras atividades importantes para a economia regional, como a pecuária de leite, a piscicultura e a ovino-caprinocultura, com suas especificidades sub-regionais (Zonas Homogêneas), com destaque para as Serras Centrais, pouco urbanizada, e em cujos platôs se encontra a cajucultura e outras fruteiras (pinha, jaca, graviola), além da produção de milho, feijão e especialmente da mandioca. O quadro é complementado pela análise de outras características importantes da organização econômica local, produzindo-se, sempre que necessário, comparações com o Rio Grande do Norte, em seu conjunto. Salientam-se, a respeito, as atividades que atualmente dão sustentação à economia seridoense – na sua maioria urbanas. A dinâmica das atividades industriais, comerciais e de prestação de serviços são, assim detalhadas, para que se examine a crise que marca os dois complexos que estruturaram, durante muitos anos, a vida econômica local. Trata-se, da mesma forma, das principais causas da crise, assim como das perspectivas atuais para o desenvolvimento da região. 3.4.1 Características Principais do Ambiente Econômico Regional A este respeito, examinam-se a seguir os seguintes tópicos: i) Produção Predominante e Especificidades Sub-Regionais; ii) Padrão Tecnológico Dominante, a Baixa Produtividade e As Mudanças Recentes; e iii) Estrutura Agrária e Mudanças no Uso da Terra. 3.4.1.1 Produção Predominante e Especificidades Sub-Regionais A vida econômica (social e política) seridoense foi estruturada a partir de duas matrizes básicas: o complexo pecuária/algodão/produtos alimentares (em especial, o milho, o feijão e a mandioca) e a atividade de extração mineral. O primeiro e mais antigo complexo lastreou a organização econômica da maior parte da região. Nele, às atividades agropecuárias se associavam atividades industriais voltadas para o beneficiamento do algodão (para extração da pluma, óleo e torta), realizado por diversas usinas localizadas principalmente em Parelhas, Caicó, Jardim do Seridó e 125 Currais Novos e Acari. Hoje não existe nenhuma em funcionamento. A mineração, que se desenvolve no Seridó sobretudo nas décadas de trinta e quarenta do atual século, e que atingiu seu apogeu nos anos 70, marca principalmente a vida da porção oriental da região seridoense. Até meados da década de 80, portanto, ainda predominava no Seridó um sistema de produção baseado nesses dois grandes complexos. No primeiro, as relações sociais de produção eram fundamentadas na parceria (meação e terça), predominante na grande e média propriedade. Na pequena unidade produtiva, o trabalho era desenvolvido pela mão-de-obra familiar. No beneficiamento da produção do complexo algodoeiro-pecuário e na produção do complexo minerador é que se encontravam os trabalhadores assalariados . Com o declínio e quase extinção do algodão arbóreo no Seridó, processo que toma força nos anos 80 e 90, os espaços ocupados por essa cultura foram abandonados e suas capoeiras passaram a ser utilizadas pelos rebanhos, tendo a agricultura sido reduzida às áreas de vazantes e alguns pequenos plantios de milho e feijão nos tabuleiros e baixios, porém muito dependentes das chuvas. No mesmo período a crise também se instala na economia mineira do Seridó. As condições em que esteve organizada a produção, geradoras de baixos índices de produtividade, a praga do bicudo – que atingiu o algodão nordestino nos anos 80 –, a concorrência com outros produtores (chineses, principalmente, no caso da mineração mas produtores do Sudeste brasileiro, no caso do algodão), as políticas econômicas que dominaram o ambiente brasileiro nos anos 90, favoráveis aos importadores, constituem fatores relevantes que estão por traz da crise desses dois pilares da base produtiva da região seridoense. Hoje, dentre as atividades agropecuárias que tiveram forte tradição na região se destaca apenas a pecuária leiteira. A forte migração para as cidades representou uma das estratégias de parte importante da população envolvida nesses dois complexos, e isso contribuiu de maneira decisiva para o abandono das atividades agrícolas, especialmente nas Zonas Homogêneas de Caicó e Currais Novos. Foge parcialmente desse quadro, a Zona Homogênea das Serras Centrais. As diferenciações do quadro natural e do processo de ocupação, associado ao fato de que abriga menor contingente populacional, fizeram a diferença. Seus platôs estão ocupados pelas culturas do caju, milho, feijão, mandioca e outras fruteiras como pinha, jaca e graviola. A cajucultura é a atividade mais importante. Além disso, a ocupação dos platôs é predominantemente de minifúndios, comparativamente as outras duas zonas, onde as propriedades são bem maiores. As Serras têm, até hoje, baixa urbanização e as condições de altitude favorecem um melhor regime de quedas pluviométricas. Esta zona tem também na pecuária de leite um dos mais destacados componentes de sua economia. Por ser uma região com boa infra-estrutura de açudes, o Seridó a partir dos trabalhos de peixamento desses açudes, promovido pelo DNOCS, passou a ter na piscicultura outra importante atividade produtiva, sobretudo na Zona Homogênea de Caicó, onde há maior concentração de mananciais. A piscicultura é desenvolvida em açudes públicos, sendo a pesca realizada por pescadores das colônias inscritas no DNOCS ou mediante pesca contratada ou em parceria nos açudes particulares. Apesar de bem dotado de açudes, a irrigação não tem presença marcante no Seridó. As limitações físicas de água e solo, características que predominam na região é determinante de sua pouca importância para fins de agricultura irrigada. A irregularidade pluviométrica torna o fator água, o mais 126 limitante para assegurar o desenvolvimento de uma agricultura sustentável. Os grandes açudes, quando sangram, permitem a perenização de rios e propiciam a prática da irrigação, sobretudo pontual. Entretanto, quando ocorre a seca – como a atual, que vem castigando o Estado, desde 1997 – as condições para a irrigação no Seridó são mínimas, e ficam reduzidas às áreas que margeiam o rio Piranhas-Açu, no seu trecho seridoense. Os principais projetos de irrigação no Seridó são os perímetros irrigados do Itans, Sabugi e Cruzeta, administrados pelo DNOCS, totalizando uma área de 550 ha, assim distribuída: Itans – 70 ha; Sabugi – 360 ha; Cruzeta – 120 ha. Esses projetos estão paralisados por falta de água para irrigação. Quando em atividade, produziam tomate, algodão herbáceo, milho, feijão, arroz e forrageiros para bovinos, explorados para leite e corte. Da iniciativa do governo do Estado e incluídos no Programa de Apoio ao Pequeno ProdutorPAPP, foram estabelecidas diversas áreas de assentamento no Projeto Seridó, onde algumas glebas foram contempladas com irrigação de pequeno porte, conforme especificado a seguir: i) Boa Sorte – 378 ha; e Viração – 606 ha. As áreas assinaladas não constituem perímetros irrigados, pois na maioria são terras para as atividades de sequeiro, com um mínimo de terra para o cultivo irrigado. Assim, no Boa Sorte há 5 ha irrigados e no Viração 14 ha, totalizando uma área de 19 ha de terras irrigadas. A grande maioria das áreas irrigadas da Região correspondem a pequenos projetos pontuais, dispersos às margens dos rios ou no entorno dos açudes, destacando-se os trechos perenizados dos rios Acauã, Seridó, São José, Sabugi, Barra Nova e margem direita do Piranhas-Açu. Predominam as culturas tradicionais de milho, feijão, batata, melancia e forrageiras. O cadastro dos Usuários de Água para Irrigação, realizado em dezembro de 1966, pela Secretaria de Recursos Hídricos do Estado, excluídos os projetos públicos de irrigação, mostra a existência de 2.227 ha de áreas irrigadas na Região do Seridó. Considerando a atual quadra seca, basicamente nos municípios beneficiados pelo rio Piranhas-Açu (Serra Negra, Jardim de Piranhas e Jucurutu), prevalecem alguns cultivos irrigados sobretudo de capim, batata-doce, feijão, sorgo e melancia. Segundo informação dos Escritórios Regionais da Emater, em Caicó e Currais Novos, atualmente, as áreas irrigadas assistidas por essa instituição totalizam cerca de 1.100 ha, nas quais são cultivados capim elefante, fruteiras diversas e culturas alimentares. Ainda com respeito às atividades agropecuárias, vale destacar a presença da ovinocaprinocultura, que até período recente constituía uma exploração caseira, voltada, sobretudo, para o abastecimento interno das fazendas. Com a crise do algodão e o conseqüente esvaziamento do campo, a exploração racional de caprinos e ovinos passou a representar uma nova opção produtiva, em função principalmente da excelente adaptação desses animais às condições naturais do semi-árido, ao mesmo tempo que se ampliam as potencialidades de mercado e se realizam avanços tecnológicos, a partir da pesquisa e de estímulos governamentais para essa atividade. Nas áreas urbanas, em especial nas duas cidades principais da região – Caicó e Currais Novos – e mesmo nas áreas rurais, as chamadas atividades urbanas ou não-agrícolas têm se desenvolvido e ampliado, merecendo destaque a atividade comercial, a indústria, o artesanato e a produção de serviços. 127 3.4.1.2 Padrão Tecnológico Dominante, a Baixa Produtividade e as Mudanças Recentes Uma das marcas da vida econômica regional são os baixos padrões de produtividade que prevalecem em grande parte das atividades realizadas. Isso influencia fortemente os baixos níveis de renda, que também predominam no Seridó, onde a renda média da população é inferior à do Estado, em seu conjunto (que já é baixa para os padrões nacionais), e onde mais de 70% dos residentes tinham renda considerada insuficiente, no início da atual década, segundo o Ibge. Alguns avanços vêm sendo observados na região, mas a melhoria dos padrões tecnológicos continua sendo um desafio importante da região, como se viu no Item 3.3 anterior (Dimensão Tecnológica). Em uma região onde domina uma agropecuária inserida em ambiente de elevado risco climático, onde a parceria constituiu a relação de trabalho dominante, onde a população ativa tem baixo nível educacional e reduzida qualificação tecnológica, os produtores tendem a ser conservadores e resistentes às mudanças. Essa situação ganha amplitude quando se trata de parceiros ou pequenos proprietários, que apresentam condições, em matéria de poupança e financiamento, extremamente reduzidas. Além das limitações naturais, representadas pelas secas e pela inadequação pedológica de muitas das áreas da região, as dificuldades creditícias, e o pouco uso das técnicas recomendadas pelos órgãos de pesquisa e assistência técnica devem ser considerados. Afora a semente selecionada que tinha aceitação crescente, as demais tecnologias recomendadas como: maior adensamento de plantas nas linhas de plantio, quantidade de sementes por cova, manejo das pragas, poda e plantio orientado segundo a conservação do solo, sempre tiveram baixo nível de aceitação. Nesse contexto, a cultura algodoeira apresentava baixa produtividade por unidade de área, em seu ciclo de 4 a 5 anos. Um exemplo está consignado no trabalho do Centro Nacional do Algodão, intitulado “Decadência do Algodoeiro Mocó e Medidas para o seu Soerguimento no Nordeste Brasileiro”. Uma análise da produção, área cultivada e produtividade média desse algodão no Nordeste revelou que nos extremos do período de 1973-93 a área foi reduzida em 83,9%, a produção em 92,7% e a produtividade em 55,6%, representando uma produção entre 80 a 180 kg por hectare. A bovinocultura de leite que pela tradição laticinista do Seridó vinha gradativamente melhorando o padrão genético do rebanho. Com o desaparecimento da atividade algodoeira reforçou essa tendência, que ganhou nova dinâmica com o Programa do Leite, implementado pelo governo estadual, desde 1995. Tomando 1975 como ano base e 1995 como extremo, verifica-se que enquanto o número de vacas ordenhadas cresceu em 3%, foi de 69,1% o incremento da produção leiteira seridoense. Entretanto, ainda é muito baixa a média de leite por vaca (3,3 litros/vaca), considerando o elevado custo de produção. Somente o componente alimentação (volumoso e ração concentrada) representam 44,6% do custo total da atividade leiteira do Seridó. (Nobre, Org., 1998.) A insuficiência de alimentos volumosos no período seco é o mais grave problema do rebanho, secundado por aspectos sanitários e de manejo animal. A ovino-caprinocultura é uma atividade subsidiária à criação de bovinos nas fazendas seridoenses. De modo geral, como nas demais áreas do Nordeste, o rebanho é explorado de forma 128 extensiva, sendo a maior parte dos animais SRD (sem raça definida). Falta-lhes um mínimo de cuidados e práticas elementares de alimentação, manejo e sanidade. A alimentação é obtida pelo que a natureza oferece. Não há calendários de vacinação, controle de reprodução, melhoramento genético e adoção de práticas zootécnicas. Todavia, cumpre mencionar o esforço que vem sendo desenvolvido pelas Associações de Criadores, em várias regiões do Estado, inclusive no Seridó. Verifica-se, ainda, a existência de produtores cujos criatórios estão se constituindo em verdadeiras unidades de demonstração, no que tange a melhoramento genético, alimentação, sanidade, manejo e instalações. As explorações estão voltadas para a venda de reprodutores, produção de carne, leite e queijo de cabra. O Sebrae e a Emater estão promovendo assistência técnica e gerencial a diversos núcleos de caprino e ovinos. A cajucultura, como já referido, está restrita aos platôs serranos da Serra de Santana, ocupando, no total da Zona Homogênea, 6.726 ha, onde os minifúndios correspondem a 74% do total dos estabelecimentos, ocupando 14% da área. (Incra, 1992.) Ali predomina um sistema de plantio aleatório, disperso em pequenas áreas, sem espaçamento definido. A seleção das castanhas para plantio foi feita a base da escolha dos pés tidos como mais produtivos e de caju mais doce. Sem um espaçamento regular, os cajueiros formaram bosques, com árvores espaçosas, entremeadas por espaços livres para o consórcio com lavouras de mandioca, milho e feijão, além de outras fruteiras. A maioria do cajueiral da Serra deve estar com mais de 30 anos (Emparn, 1999), apresentando grande heterogeneidade e baixa produtividade. A tecnologia empregada resume-se ao coroamento das plantas e à poda dos galhos mais baixos para facilitar a apanha das castanhas. O sistema de produção guarda forte conotação extrativista, em virtude de sua condição de árvore rústica, tolerante à seca, pouco exigente e de longa vida útil. Os trabalhos de pesquisa iniciados no Ceará pela Empresa de Pesquisa Agropecuária do Ceará–Epace e Embrapa, resultando na obtenção da variedade anã, precoce, e em tecnologias de substituição de copas, estão sendo difundidas na Serra, já com algumas áreas iniciando o emprego dessas novas técnicas de produção. A melhoria dos padrões tecnológicos da cajucultura é um dos desafios importantes da região. Quanto à piscicultura, predomina a exploração extensiva dos mananciais, tanto públicos como privados. A pesca tem caráter artesanal, extrativista, com baixo volume de inversões em equipamentos e infra-estrutura. A tecnologia é rudimentar e de modo geral o pescador não é qualificado. Os equipamentos e apetrechos são utilizados de acordo com a modalidade da pesca e da espécie a ser capturada. São empregadas canoas, redes, covos, chumbadas e anzol, via de regra, fornecidas pelo comerciante atacadista. A produtividade média, possível de obter em açudes do Nordeste, é estimada em 250 kg de pescado/hectare/ano de espelho d’água, quando bem manejados, para a pesca extensiva. Nas atividades urbanas, o padrão tecnológico dominante no Seridó tende a acompanhar o que ocorre em áreas urbanas semelhantes da região Nordeste e do Rio Grande do Norte, especialmente em Caicó e Currais Novos. Algumas especificidades são referidas adiante. 3.4.1.3 Estrutura Agrária e Mudanças no Uso da Terra As características predominantes na Região não fogem muito das condições gerais do Estado e do Nordeste. No Seridó, predomina a mesma combinação de grandes e pequenas propriedades. Por ser uma área de grande número de açudes, a grande propriedade concentra a terra e a água. E nunca é demais lembrar que “água” é um dos fatores centrais de estrangulamento ao desenvolvimento agropecuário do Nordeste semi-árido em seu conjunto e, dentro dele, também do Seridó. 129 No entanto, a estrutura fundiária seridoense não se inscreve entre as mais desigualmente distribuídas do Nordeste e do Rio Grande do Norte, tanto que no levantamento realizado em seminários feitos nos diversos municípios da região, como parte do processo de elaboração do Plano de Desenvolvimento Sustentável do Seridó, a reforma agrária não apareceu entre as demandas principais. A demanda por água foi muito mais intensa. Segundo o Censo Agropecuário de 1985, a Região do Seridó tinha 89% dos seus estabelecimentos nos estratos de área de até 100 ha, participando com 24,4 % da área total. Os acima de 1.000 ha representavam somente 0,7% do total de estabelecimentos, mas ocupavam 24,8 % da área. Em 1995/96 os menores estabelecimentos haviam aumentado em número (de 12.716 passaram a ser 13.807), mas haviam reduzido seu peso tanto no total de estabelecimentos (de 89% para 87%) quanto na área (de 24,4% para 22% da área total). Por sua vez, os grandes estabelecimentos (com mais de 1.000 ha) também eram mais numerosos (passaram de 106 para 126) e haviam mantido praticamente igual sua participação tanto no total quanto na área ocupada. As mudanças em dez anos, portanto, não haviam sido relevantes. TABELA 3.4.1.1 SERIDÓ. ESTRUTURA FUNDIÁRIA, SEGUNDO OS CENSOS AGROPECUÁRIOS DE 1985 E DE 19995/1996 ESTRATO DE ÁREA (ha) Abaixo de 100 ha 101 a 500 ha 501 a 1.000 ha Acima de 1.000 ha TOTAL Nº DE ESTABELECIMENTOS 12.716 1.311 189 106 14.322 1985 % 88,9 9,1 1,3 0,7 100,0 ÁREA (ha) 196.921 278.159 129.250 199.714 804.044 % Nº DE ESTABELECIMENTOS 24,4 34,5 16,3 24,8 100,0 13.807 1647 257 126 15.837 1995/96 % ÁREA (ha) 87,3 10,3 1,6 0,8 100,0 222.038 354.036 175.723 242.625 994.422 % 22,3 35,6 17,7 24,4 100,0 FONTE DOS DADOS BÁSICOS: Ibge, Censos Agropecuários de 1985 e de 1995/1996. A situação por Zona Homogênea do Seridó pode ser particularizada, conforme os dados apresentados a seguir. Na Zona Homogênea de Caicó, em 1985, 83,8% dos estabelecimentos tinham área de até 100 ha, ocupando 24,2 % da área total. Em 1995/96, aquele percentual caíra para 80% do número e para 21% da área. Já os estabelecimentos com mais de 500 ha compreendiam apenas 2,6% do total, mas detinham 37,8% da área total, revelando importante concentração fundiária. Em 1995/96, eles abrangiam 3,2% dos estabelecimentos e ocupavam 37,2% da área. O quadro não sofreu alteração relevante, portanto. A Zona Homogênea de Currais Novos, naquele mesmo ano, tinha 88,7% do total dos estabelecimentos, com até 100 ha, apropriando 24,8% da área total. Também declinaram um pouco sua participação. Por sua vez, os estabelecimentos acima de 500 ha abrangiam 2,4% do número total de estabelecimentos e abrangiam 46,1% das terras dessa ZH, caracterizando concentração de terra mais forte do que em Caicó. Em 1995/96, compreendiam 2% do número de estabelecimentos, mas detinham menos terra: 41% da área total, revelando ligeira atenuação do quadro anterior. A Zona Homogênea das Serras Centrais tem 15% de suas terras ocupadas por estabelecimentos com menos de 50 ha. Os de área até 100 ha constituíam 92,6% do total, detendo 22,6 % da área total. Esses percentuais não mudaram muito, em 10 anos. Entretanto, os situados acima de 500 ha, somente 1,8% do total, ocupavam 47% da área total, indicando grande concentração de terra. Esses percentuais praticamente se mantiveram no Censo de 1995/96. As análises realizadas para o Censo 1995/96 não apontam alterações expressivas na estrutura fundiária do Seridó, particularizado por suas Zonas Homogêneas. Mantém-se a concentração fundiária existente. Quando se calcula o Índice de Gini, observa-se uma modesta redução dessa concentração, 130 vez que ele passa de 0,76 para 0,74, entre 1985 e 1995/96, no conjunto do Seridó. Foge a esse comportamento a ZH das Serras Centrais, onde esse índice passou de 0,79 para 0,80, no mesmo período. (Consórcio Tecnosolo & CEP, 1999.) TABELA 3.4.1.2 ZONA DE CAICÓ. ESTRUTURA FUNDIÁRIA, SEGUNDO OS CENSOS DE 1985 E DE 1995/1996 1985 Nº DE ESTABELEESTRATO DE ÁREA Nº DE ESTABE% ÁREA(ha) % CIMENTOS (ha) LECIMENTOS Abaixo de 100 ha 4.366 83,8 94.843 24,2 3.338 101 a 500 ha 708 13,6 148.607 38,0 681 501 a 1.000 ha 84 1,6 55.738 14,2 89 Acima de 1.000 ha 53 1,0 92.070 23,6 41 TOTAL 5.211 100,0 391.258 100,0 4.149 FONTE DOS DADOS BÁSICOS: Ibge, Censos Agropecuários de 1985 e de 1995/1996. 1995/96 % ÁREA(ha) 80,4 16,4 2,1 1,1 100,0 77.244 151.332 59.455 75.284 363.315 % 21,2 41,6 16,3 20,9 100,0 TABELA 3.4.1.3 ZONA DE CURRAIS NOVOS. FUNDIÁRIA, SEGUNDO OS CENSOS DE 1985 E DE 1995/1996 1985 1995/96 Nº DE ESTABELENº DE ESTABELEESTRATO DE ÁREA % ÁREA(ha) % % ÁREA(ha) CIMENTOS CIMENTOS (ha) Abaixo de 100 ha 4.136 88,7 70.896 24,8 2.818 84,5 60.671 101 a 500 ha 414 8,9 83.288 29,1 418 12,5 89.484 501 a 1.000 ha 75 1,6 51.240 17,9 66 1,9 45.202 Acima de 1.000 ha 39 0,8 80.759 28,2 31 1,1 58.293 TOTAL 4.664 100,0 286.183 100,0 3.333 100,0 253.650 FONTE DOS DADOS BÁSICOS: Ibge, Censos Agropecuários de 1985 e de 1995/1996. % 23,9 35,2 17,8 23,1 100,0 TABELA 3.4.1.4 ZONA DAS SERRAS CENTRAIS. ESTRUTURA FUNDIÁRIA, SEGUNDO OS CENSOS DE 1985 E DE 1995/1996 ESTRATO DE ÁREA (ha) Nº DE ESTABELECIMENTOS 1985 % ÁREA(ha) % Nº DE ESTABELECIMENTOS Abaixo de 100 ha 8.609 92,6 101.728 22,6 101 a 500 ha 519 5,6 137.512 30,5 501 a 1.000 ha 104 1,1 72.630 16,1 Acima de 1.000 ha 67 0,7 138.169 30,8 TOTAL 9.299 100,0 450.039 100,0 FONTE DOS DADOS BÁSICOS: Ibge, Censos Agropecuários de 1985 e de 1995/1996. 1995/96 % ÁREA(ha) 7.651 91,6 548 6,5 102 1,2 54 0,7 8.355 100,0 84.123 113.220 71.066 109.048 377.457 % 22,3 30,0 18,8 28,9 100,0 Vale destacar, ao lado da grande predominância dos estabelecimentos com menos de 100 ha de área (cerca de 13,8 mil), que representam cerca de ¼ do total, em todas as Zonas Homogêneas do Seridó), uma tendência preocupante que se observa nesse segmento (a da fragmentação) e uma característica que dificulta o acesso dos que neles produzem: a falta de regularização de suas propriedades. A não regularização fundiária prejudica os produtores na medida em que dificulta ou bloqueia seu acesso a políticas públicas e ao sistema de crédito. E não têm sido realizadas políticas fundiárias significativas no Estado. Ao contrário, o antigo órgão estadual de terras foi desativado, em meio à Reforma do Estado implementada na segunda metade da atual década, e suas atribuições transferidas a uma mera coordenadoria da Emater (COF), sem meios e sem nível institucional para exercer ação relevante. 131 Vale também salientar que, de acordo com informações fornecidas pela Fetarn, há no Seridó 14 Assentamentos Rurais, com 958 famílias ocupando 25.958 ha de área, ou apenas 2,6 % da área total dos estabelecimentos do Seridó (estimada em 995 mil ha, no Censo Agropecuário de 1995/1996). Uma participação, portanto, muito modesta. Há mais 5 assentamentos, que estão sendo instalados, com 366 pessoas, abrangendo área de 5.949 ha (no município de Cerro Corá). E uma demanda crescente por desapropriações, em curso junto ao Incra. Os assentamentos já existentes, localizam-se em pleno semi-árido, estando voltados para a agricultura de sequeiro e o pequeno criatório. Em função das irregularidades das chuvas e conseqüente risco climático, aliado à falta de infra-estrutura hídrica, de oportunidades econômicas e de serviços sociais (educação, saúde e saneamento), são difíceis as possibilidades de progresso econômico dessas comunidades, com base nesse modelo de agricultura e na precariedade de investimentos que podem realizar. Nesse contexto adverso, os assentados buscam a sobrevivência, complementando a renda no extrativismo, trabalhando como diaristas em outras propriedades, enquanto alguns terminam migrando para as cidades mais próximas, transferem os seus lotes para terceiros ou abandonam o assentamento. Em contraposição, as áreas com matas e as terras de lavouras em descanso crescem seu peso na área total do Seridó, passando de 33%, em 1985, para 49%, em 1995/96, como mostra o Gráfico abaixo. Quando se analisam esses dados por Zona Homogênea, tal como apresentados nas tabelas a seguir, verificam-se diferenças importantes. A redução do uso das terras com lavouras foi muito mais visível nas ZH de Currais Novos e Caicó do que na das Serras Centrais, e o menor uso das terras com pastagens representou processo muito mais intenso nas Serras Centrais, teve queda menor em Caicó e não ocorreu em Currais Novos (onde se mantiveram os 103 mil ha com esse uso). Por sua vez, os dados sobre o uso da terra mostram as mudanças que vêm ocorrendo na região, nas décadas recentes. A crise da base agropecuária, cujo elemento central é a brusca queda da produção algodoeira, fica evidenciada na redução muito significativa (de 15%, em 1985, para apenas 8%, em 1995/96) das áreas utilizadas com lavouras, tanto permanentes como temporárias (passando de 164 mil ha para 78 mil ha). No Estado como um todo, esse processo também ocorreu, mas em menor intensidade (as lavouras reduzem seu peso nas terras ocupadas de 23% para 16%, no mesmo período). Por sua vez, as áreas ocupadas com pastagens (naturais e artificiais) confirmam que a enorme redução da produção do algodão também afetou negativamente a atividade pecuária (pois afetou seus custos, que o algodão ajudava a reduzir, ao fornecer, dentro da própria fazenda pecuária, o volumoso – restolho do algodoal – e a torta para a alimentação do rebanho. As pastagens que ocupavam 43% das terras do Seridó, em 1985, passaram a ocupar apenas 37%, em 1995/96. No Estado como um todo, a redução também foi observada, mas passou de 35% para 33%, apenas. TABELA 3.4.1.5 RIO GRANDE DO NORTE, SERIDÓ E ZONAS HOMOGÊNEAS. UTILIZAÇÃO DAS TERRAS (EM 1000 ha) ÁREA TOTAL DISCRIMINA-ÇÃO LAVOURAS PERMANEN-TES E TEMPORÁRIAS UTILIZAÇÃO DA TERRA PASTAGENS MATAS LAVOURAS EM NATURAIS E NATURAIS E DESCANSO ARTIFICIAIS PLANTADAS 1985 1995 1985 1995 1985 1995 1985 R. G. do Norte 4.382 3.733 1.029 589 1.534 1.246 1.107 Região Seridó 1.129 995 164 78 488 370 299 ZH Currais Novos 287 254 51 18 103 103 85 ZH Caicó 393 363 44 22 181 148 118 ZH Serras Centrais 450 377 69 38 204 119 96 FONTE DOS DADOS BÁSICOS: Ibge, Censos Agropecuários de 1985 e de 1995/1996. 132 1995 1.127 344 72 133 139 1985 433 79 20 19 40 TERRAS INAPROVEITÁVEIS 1995 1985 609 279 144 99 48 28 38 31 58 41 1995 162 58 12 22 24 UTILIZAÇÃO DAS TERRAS NO ESTADO E NA REGIÃO DO SERIDÓ NOS ANOS DE 1985 E 1995 Lavouras Permanentes e Temporárias Pastagens Naturais e Artificiais 50 43 1985 V alores Perccentuais 40 35 Matas Naturais e Plantadas 30 26 25 23 Lavouras emDescanso 20 15 Terras Inaproveitáveis 10 10 9 7 6 0 Estado Região do Seridö 40 Discriminação 33 37 35 1995 Valores Perccentuais 30 30 20 16 16 14 8 10 6 4 0 Estado Região do Seridö Discriminação 133 TABELA 3.4.1.6 RIO GRANDE DO NORTE, SERIDÓ E ZONAS HOMOGÊNEAS – UTILIZAÇÃO DAS TERRAS (EM %) UTILIZAÇÃO DA TERRA LAVOURAS PASTAGENS MATAS NATURAIS LAVOURAS EM TERRAS DISCRIMINAÇÃO ÁREA TOTAL EPERMANENTES NATURAIS E E PLANTADAS DESCANSO INAPROVEITEMPORÁRIAS ARTIFICIAIS TÁVEIS 1985 1995 1985 1995 1985 1995 1985 1995 1985 1995 1985 1995 Estado 100,0 100,0 23,0 16,0 35,0 33,0 25,0 30,0 10,0 16,0 6,0 4,0 Seridó 100,0 100,0 15,0 8,0 43,0 37,0 26,0 35,0 7,0 14,0 9,0 6,0 ZH Currais Novos 100,0 100,0 18,0 7,0 36,0 41,0 30,0 28,0 7,0 19,0 10,0 5,0 ZH Caicó 100,0 100,0 11,0 6,0 46,0 41,0 30,0 37,0 5,0 10,0 8,0 6,0 ZH Serras Centrais 100,0 100,0 15,0 10,0 45,0 32,0 21,0 37,0 9,0 15,0 9,0 6,0 FONTE DOS DADOS BÁSICOS: Ibge, Censos Agropecuários de 1985 e de 1995/1996. 3.4.2 Tendências Recentes da Dinâmica Econômica Estão tratadas a partir da descrição dos seguintes tópicos: i) Atividades Dinâmicas ou que Dão Sustentação à Economia Local; ii) Atividades em Crise; e iii) As Principais Trajetórias do Pós-Crise 3.4.2.1 Atividades Dinâmicas ou que Dão Sustentação à Economia Local De uma região de base produtiva essencialmente primária, onde o binômio algodão-pecuária bovina e a atividade de extração mineral comandavam a vida econômica, social e política, o Seridó passou, nas décadas finais do século XX, a ser uma região dominantemente urbana (exceto na Zona Homogênea das Serras Centrais), com essas atividades, e em especial as pequenas iniciativas, assumindo papel crescente, de convivência com a crise de seus complexos econômicos tradicionais. Os dados da população ocupada por tipo de atividade, analisados na dimensão sociocultural, confirmam isso (ver item 3.5). Como a população, a economia urbana seridoense encontra-se fortemente concentrada nos municípios de Caicó e de Currais Novos, focos importantes de comando econômico regional. Assim, em anos recentes, enquanto as atividades que produziram riqueza (e um certo luxo) na região, apresentam problemas graves de competitividade e algumas praticamente desapareceram (como o algodão), outras atividades ganharam peso relativo ou passaram a integrar a base produtiva local – caracterizando-a como em nítido processo de reestruturação. Dentre as que marcam, atualmente, a vida econômica, social e política regional, merece destaque uma, que é realizada nos espaços rurais, e que tem a ver com a antiga vocação regional: a pecuária leiteira, como se destacou anteriormente. Esse segmento teve seu crescimento recente puxado por importante iniciativa governamental (o Programa do Leite, que há alguns anos vem sustentando um mercado institucional capaz de fomentar a ampliação da produção local, e que, agora, estimula sua diversificação). 134 A existência de duas cooperativas (a Coacal e a Cersel) participando do mercado de laticínios e de mais de uma centena de queijarias, vem consolidando as explorações. A partir de 1995, com a implementação do Programa do Leite, aquele subsetor tomou novo impulso, com a criação desse mercado institucional. Este mercado compra das usinas credenciadas da região 30 mil litros diários de leite, ou ¼ dos 120 mil litros adquiridos pelo governo estadual, para distribuição em diversos programas sociais do próprio governo do Estado e da Prefeitura de Natal. Sem dúvida, no setor agropecuário, é a bovinocultura de leite a atividade econômica de maior expressão no Seridó. Hoje, a região dispõe de um rebanho em gradativo processo de melhoramento genético, com expressiva produção de leite, situando-se como a segunda bacia leiteira do Estado. No âmbito interno do Seridó, a Zona de Caicó desponta na liderança da produção leiteira, tendo, no período 1975-95, mantido um total produzido que representou o dobro da contribuição das demais Zonas (Currais Novos e Serras Centrais). A possibilidade de diversificação para a produção de laticínios, desenvolvendo atividades nãoagrícolas nas zonas rurais e expandindo indústrias e serviços nas áreas urbanas da região, apresenta-se como um dos potenciais do Seridó. O futuro do Programa do Leite é uma incerteza crítica relevante, dada sua dependência desse mercado institucional. Vale destacar que a tradição leiteira da região e sua conhecida pauta de produtos artesanais, como queijo-de-manteiga, queijo-de-coalho, nata e manteiga-de-garrafa – além da carne-de-sol –, fazem deste um segmento promissor. A produção seridoense marca presença no Estado e se afirma em outras regiões do País, especialmente onde residem emigrantes nordestinos. Não só a produção mas a “marca Seridó”, e dentro dela a “marca Caicó”, são pontos fortes da economia regional, num mundo onde cada dia mais as “marcas” se valorizam. Já existe uma consciência na região sobre a importância desse “patrimônio”, registrando-se esforços iniciais para valorizá-lo devidamente. A caprino-ovinocultura é outra atividade que vem despertando interesse na região e que tem plena condição de integrar-se à bovinocultura regional para fortalecer a base pecuária seridoense. A pecuária é sem dúvida, um dos esteios de qualquer proposta de desenvolvimento da economia da região semi árida do Nordeste. As condições de adaptabilidade do efetivo caprino, as potencialidades de mercado e os incentivos governamentais como o Programa de Leite – que estabeleceu uma cota para o leite-de-cabra –, criou um forte estímulo para o seu criatório. Gradualmente, essa que era tida na região como “atividade de pobres” (pois o gado bovino é que era muito valorizado econômica e culturalmente) supera essa visão e se afirma como atividade a ser prestigiada e promovida, nos grandes e pequenos estabelecimentos. Por outro lado, o avanço e a difusão de tecnologias e a existência do Centro de Caprinos da Embrapa, no Nordeste (em Sobral, Ceará), aliado aos trabalhos da Empresa de Pesquisa Agropecuária do Estado da Paraíba–Emepa, constituem referências para a Região, conferindo suporte tecnológico para o desenvolvimento dessa exploração. O Protocolo da Ovino-caprinocultura, firmado pelo governo do Estado e o Banco do Nordeste, com abrangência em todo o território estadual, aliado a dois empreendimentos ligados à atividade – o Centro Tecnológico do Queijo, a ser implantado em Currais Novos, pela Secretaria de Indústria, Comércio, Ciência e Tecnologia-Sintec e o Centro Profissionalizante em Produção Animal da Emparn – são instrumentos que ampliam as chances para propiciar condições ao desenvolvimento sustentável da cadeia produtiva baseada tanto na ovino-caprinocultura como na bovinocultura, particularmente as atividades voltadas para a produção de leite e derivados. 135 A cajucultura, ao lado de outras atividades da fruticultura ( especialmente a produção de pinha, graviola e jaca), no que toca à base agrícola, tem ajudado a manter a economia da região. A fruticultura, e em especial a cajucultura, embora fortemente concentrada nos platôs da Serra de Santana, na Zona Homogênea das Serras Centrais, apresenta boas perspectivas de expansão horizontal e vertical. À disponibilidade de áreas que podem ser ocupadas racionalmente com o cajueiro anão e à possibilidade de substituição de copas dos cajueiros comuns pouco produtivos, somam-se à participação dos produtores no beneficiamento e comercialização da castanha. Fatos relevantes para o futuro são expressos pela existência de cerca de 10 associações de produtores (que devem ser ativadas), da Cooperativa de Cerro Corá–Coopersertana e do Programa de Substituição de Copas em Cajueiros Improdutivos e Adensamento (Protocolo entre o governo do Estado, Banco do Brasil, Secretarias de Estado e Associações de Classe, de grande importância para a continuidade desse programa). A existência de unidades de beneficiamento do pedúnculo do caju, dentre as quais se destaca a Cersel, constitui uma nova oportunidade para os cajucultores da região. As atividades ligadas à piscicultura e à pesca artesanal também têm se desenvolvido na região, embora estejam sendo muito prejudicadas, em função do baixo nível de água dos mananciais, assoreamento e poluição em muitas deles. O regime pluviométrico, que tem se caracterizado pela predominância de anos de poucas chuvas, em períodos mais recentes, é caracterizado como forte fator limitante. Contudo, é inegável a potencialidade do Seridó para explorar de forma mais racional a piscicultura extensiva, podendo pôr em prática, gradativamente, explorações intensivas, mediante a colocação de tanques-redes nos açudes públicos e particulares. Segundo estudo realizado pela Emparn, em 1997, somente os açudes públicos do Seridó, a pleno volume, dispõem de espelhos d’água que alcançam cerca de 8.000 ha, propiciando a distribuição de 22.000 tanques-redes com produção anual, estimada em 20.000 toneladas de pescado. Atualmente, estima-se estarem cadastrados cerca de 900 pescadores em cooperativas que atuam nos açudes públicos, fora os que atuam nos açudes particulares. A comercialização da produção é outro problema considerado relevante, que pode ser melhor resolvido via ação cooperativa. Mas falta um forte trabalho educativo em relação às práticas associativas e o gerenciamento adequado das cooperativas, para que as estruturas já existentes e outras que venham a se criar possam dar melhor resultado. Expande-se, também, na região, a indústria de transformação – em geral de porte pequeno – e o artesanato (bordados, produção de redes de dormir, entre outros) e se desenvolve o comércio e os serviços. As novas atividades, a seguir melhor diagnosticadas, estão se estruturando, mas sua dinâmica ainda não tem força suficiente para competir com a de outros pólos do Estado (como Natal, Mossoró e o Vale do Açu), levando alguns estratos sociais (especialmente os de maior renda) a enfatizar um discurso de que o Seridó perde espaço econômico e político na vida norte-rio-grandense. Além do mais, os pequenos negócios, especialmente os informalmente organizados, como se verá adiante, é que têm apresentado forte dinamismo. Dentre os ramos da indústria de transformação, destacam-se o de cerâmica (sobretudo a produção de telhas e tijolos), a de confecções (especialmente a produção de bonés) e as indústrias processadoras de alimentos, tanto de matérias-primas produzidas na região – como a mandioca, milho, arroz, o leite, o caju, o couro e peles, entre outras –, quanto de produtos oriundos de fora do Seridó, como o café (torrefação) e trigo (panificação). 136 De acordo com o Cadastro Industrial do Rio Grande do Norte de 1998, no Seridó estão 9,4 % do total de empresas dessa atividade do Estado, com especial destaque para o município de Caicó, que detém 2,3% do total estadual; em seguida, vem Currais Novos, com 50 empresas (1,9% do total), dentre o total das registradas no Cadastro Industrial da Fiern. TABELA 3.4.2.1 RIO GRANDE DO NORTE. DISTRIBUIÇÃO DAS INDÚSTRIAS NA REGIÃO DO SERIDÓ, POR ZONA HOMOGÊNEA EMPRESAS ESTADO, SERIDÓ E ZONAS HOMOGÊNEAS E PRINCIPAIS MUNICÍPIOS DA REGIÃO NÚMERO ESTADO % 2.663 100,00 Seridó 251 ZH de Currais Novos 109 Currais Novos 50 Parelhas 28 ZH de Caicó 130 Caicó 61 Jardim de Piranhas 34 Jardim do Seridó 19 ZH das Serras Centrais 12 FONTES DOS DADOS BÁSICOS: i) Fiern (1998)- Cadastro industrial do Rio Grande do Norte. Natal-RN, 1998; e ii) Consórcio Tecnosolo & CEP, 1999. 9,4 4,1 1,9 1,1 4,9 2,3 1,3 0,7 0,4 Fiern, Usando como referência os dados da arrecadação do ICMS, por atividade, dos municípios do Seridó em 1995 e 1998 percebe-se uma concentração nas atividades industriais de pequeno porte, com destaque para: cerâmicas, panificadoras, confecções, produção de redes, artesanatos, industrias de massas. Para muitos municípios a única atividade que registra arrecadação é o comércio varejista, como é o caso de Florânia, Ipueira, São Fernando, São João do Sabugi e Timbaúba dos Batistas. Outros municípios ostentam dados relativos apenas à arrecadação dos Serviços Públicos, como é o caso de Santana do Seridó (onde dos R$ 61.870,00 arrecadados, R$ 51.153,62 vêm dos serviços públicos). Dentre as atividades urbanas, algumas merecem destaque, sendo examinadas com mais detalhe, a seguir. a. Indústrias de Bonés e de Tecelagem Observa-se na Zona Homogênea de Caicó a emergência de um novo setor, o das “bonelarias”. Apenas no município de Caicó foram encontradas 40 unidades industriais cadastradas. Na região, estima-se existirem cerca de 50 bonelarias que ocupam em torno de 2000 pessoas (direta e indiretamente) e geram uma produção média mensal estimada de 500 mil unidades. Dessas unidades produtivas, apenas duas constituem empresas de médio porte a “ED Criações” e a “Só Boné”, produzindo três mil bonés ao dia. O mercado local absorve apenas 10% da produção que é , assim, destinada majoritariamente a outras áreas do Rio Grande do Norte, a outros Estados do País e até a países do Mercosul. A demanda pelo produto oscila muito ao longo do ano. Mas observa-se um incremento da atividade nos períodos pré-eleitorais com substancial demanda por bonés de propaganda de candidatos, um dos principais “brindes” do marketing eleitoreiro contemporâneo. Embora existam outras industrias de bonés localizadas na cidade de Natal, já é notório que o preço dos bonés fabricados no Seridó é bem inferior ao dos fabricados na capital. Parte da explicação para essa 137 vantagem competitiva é atribuída à adoção de um regime tributário especial ( pauta) e à utilização de mão-de-obra infantil nas unidades de produção, na sua grande maioria de caráter informal. De acordo com registro feito pelo Ministério Público do Trabalho, esses estabelecimentos produtivos têm sido freqüentemente autuados, em toda a Região do Seridó. Apesar desse ponto, as fábricas de bonés marcam presença crescente no tecido econômico regional. Tanto que para suprir suas necessidades a região já implantou indústrias de insumos para bonelaria, como 3 unidades de dublagem e 3 fábricas de reciclagem de plástico (a aba do boné é feita com plástico reciclado, o que cria empregos na coleta seletiva de lixo). Além dos bonés, a região produz chapéus (tanto de couro como de tecido) em cerca de 10 unidades, situadas sobretudo em Caicó. Merece também referência na região a existência do segmento de Tecelagem, presente sobretudo no município de Jardim de Piranhas, com cerca de 200 unidades informais que consomem, mensalmente, cerca de 200 toneladas de fio. b. Indústrias de Produtos Alimentares Uma outra atividade de destaque diz respeito ao ramo alimentício que apresentou forte crescimento, principalmente em razão da elevação do número de panificadoras. Uma indústria que merece ser citada é a Indústria de Massas do Nordeste Ltda. que produz massas e biscoitos para o RN e a Paraíba. O aumento das panificadoras é observado para vários municípios seridoenses. De acordo com as manifestações ocorridas por ocasião das reuniões foram sugeridos alguns encaminhamentos para a melhoria dos serviços relativos à comercialização de alguns produtos: • • • • • melhoria na qualidade dos produtos; criação do selo de qualidade para os produtos do sertão; maior divulgação para os produtos agrícolas; incentivar a produção e armazenamento de alimentos; e incentivar o Comércio nas feiras livres de cada comunidade. c. Indústrias de Calçados O setor de calçados reduziu o número de estabelecimentos e modificou suas características, especializando-se na produção de chuteiras, com duas fábricas em Caicó, uma delas com produção diária de 300 pares – Indústria Murielli –, que exporta para outros Estados do Nordeste e da Região Norte. Observa-se também uma diminuição da produção de sandálias de couro (Morais, 1998. Apud: Caicó em Revista) e o surgimento de 15 fábricas de sandálias “surf” (instaladas sobretudo em Caicó, Jardim do Seridó e Cerro Corá). O surgimento de cooperativas de calçados em estados vizinhos, como Paraíba e Ceará, foi responsável em parte pela retração da atividade. Esse processo tende a se agravar com a criação dos pólos industriais de calçados que têm atraído antigos produtores do setor para as novas áreas. O Sebrae tem desenvolvido iniciativas no sentido de impedir o esvaziamento do setor criando um pool de indústrias da região para que juntas possam se beneficiar de alguns programas de capacitação e melhoria do setor, visando atingir mercados consumidores fora do país e evitar a exportação do valor agregado que sai no couro exportado da região e volta no calçado fabricado por outros países para ser consumido em seguida no Seridó. 138 d. Artesanato e Turismo Um dos principais cartões de visitas do Seridó é, sem dúvida, montado a partir da fama dos bordados de Caicó, que são na grande maioria fabricados em Timbaúba dos Batistas. Tradicionalmente conhecidos pela riqueza de detalhes, os bordados passaram a ser vendidos principalmente pelas lojas de artesanato de Natal mas também exportados para outros estados do Brasil e para o exterior. Com a intensificação do comércio internacional outros países puderam também divulgar os seus bordados (Ilha da Madeira, Indonésia ...), muitas vezes com preços inferiores aos praticados pelos comerciantes locais, o que acabou provocando uma queda nas vendas e consequentemente na produção. O projeto de revitalização do Artesanato patrocinado pelo Banco do Nordeste e Sebrae vem tentando tornar os produtos mais competitivos, permitindo que eles sejam divulgados nas missões e Feiras Internacionais multissetoriais. Um trabalho de conscientização e treinamento de pessoal ocupado no setor vem sendo realizado. Foi também desenvolvido um estudo para reformular a estrutura dos bordados tentando diferencia-los dos bordados do Ceará e transformá-los em mercadorias mais baratas (por conterem menos figuras bordadas). O artesanato está incluído nas principais atividades de vários municípios da região seridoense, como Jardim de Piranhas, Timbaúba dos Batistas, Serra Negra, Caicó, São João do Sabugi, Ipueira, Santana do Seridó, Carnaúba dos Dantas, Jucurutu e Parelhas. Outros produtos artesanais, além dos bordados, permanecem importantes como: licor, produtos da cerâmica, doces, queijos, carne-de-sol, redes de dormir, produtos de palha, entre outros, todos facilmente comercializados. 48 Todavia, há dificuldades de recursos para a produção e a comercialização dos produtos. Para enfrentar esses problemas foi criada a Cooperativa de Produção Artesanal de Caicó–Coase, em 1978, congregando todos os municípios da região. A cooperativa dispõe de uma loja para a comercialização dos produtos. Existe ainda uma outra cooperativa constituída pelas indústrias de beneficiamento de leite e seus derivados, a Cooperativa Agropecuária de Caicó–Coacal, com 3 549 associados, em 1998, que fabrica leite in natura, tipo C, iogurte e manteiga. O Turismo vem se expandindo na região. O turismo de eventos (festas religiosas, eventos culturais e esportivos) e o ecoturismo têm potencial para crescer. Sete municípios seridoenses já integram o “Programa Nacional de Municipalização do Turismo” (PNMT). O potencial existente já vem estimulando o desenvolvimento da Hotelaria – outra atividade em crescimento e com franco potencial de expansão no futuro próximo. O atendimento ao cliente é um ponto fraco (face à carência de recursos humanos com qualificação adequada). e. Indústria Cerâmica A indústria cerâmica no Rio Grande do Norte é de grande importância para a economia do Estado, se constituindo como a principal, e muitas vezes única, atividade para alguns municípios. Cabe, no entanto, ressaltar que pesquisando as diversas fontes existentes encontra-se uma forte discrepância 48 Pesquisa realizada, em dezembro de 1999 e janeiro de 2000, junto a 5 lojinhas do tipo “Cantinho Sertanejo”, na cidade de Natal, demonstrou que, embora esses estabelecimentos respeitem a venda de produtos, com registro comercial, selo e especificações da composição, é muito grande a oferta de fornecedores do circuito informal de produtos da região, que são, em grande parte, vendidos nas feiras livres, a camelôs e a particulares. Muitos desses produtos não são necessariamente fabricados no Seridó, nem somente por pessoas originárias da região. A marca “Seridó”, por se vender bem, já justifica a aceitação por parte dos consumidores em geral, que não verificam necessariamente a proveniência dos produtos vendidos. Quanto às feiras livres, a venda de produtos “made in Seridó” se dá sem nenhuma exigência de qualidade e/ou discriminação dos produtos. Portanto, permitem a venda de qualquer produto sob o selo de Produtos de Caicó ou Seridó. 139 relativa aos dados, tanto para o número de cerâmicas, quanto para o número de empregados e total da produção. É importante observar que existe uma diferenciação entre cerâmicas e olarias nos cadastros e dados em geral, como duas atividades distintas. De acordo com o Dicionário Aurélio (1980) e a Enciclopédia e Dicionário Ilustrado Koogan/Houaiss (1994), o termo olaria é sinônimo de cerâmica. Dessa forma se forem somadas as atividades registradas sob os dois termos a produção é, sem dúvida, superior aos números indicados. Na verdade, o termo olaria diz respeito ao local onde se trabalha de forma mais artesanal, com técnicas rudimentares. Já a cerâmica caracteriza-se como um empreendimento industrial, mecanizado, com técnicas mais elaboradas. Isso reforça a existência de um considerável número de empresas informais, que trabalham na região. Segundo o Dr. Edgard Dantas, 49 “para cada cerâmica legalizada existem duas não registradas, camuflando, finalmente, a produção total”. Acrescente-se a isso o fato de que são vários os elementos que compõem a indústria de cerâmicas, pois nem sempre a atividade de garimpo e extração está registrada nas atividades das cerâmicas. Dentre aqueles elementos, são utilizados os seguintes bens minerais na indústria cerâmica: Areia, Argila, Caulim, Diatomita, Feldspato, Mica, Quartzo e Talco. De acordo com o Estudo sobre Minerais Industriais do Rio Grande do Norte do (Nesi & Carvalho, 1999), a industria da cerâmica vermelha do Rio Grande do Norte é constituída de 3 pólos, responsáveis por 60% da produção total: Pólo de Açu-Ipanguassu, Pólo de São Gonçalo do Amarante e Pólo de Parelhas. As principais empresas registradas no documento respondem pela extração e transformação da argila (Cerâmica Vermelha) e correspondem a 62, das quais 19 (ou 30% do total) se encontram na Região do Seridó principalmente no município de Parelhas, Carnaúba dos Dantas, Cruzeta, Equador, Acari, Caicó e Currais Novos. Mas esses dados, de acordo com o Sr. Otacílio Oziel de Carvalho – geólogo, professor do Cefet e assessor do Senai-RN –, 50 não refletem a realidade. Ele calcula que há cerca de 150 cerâmicas operando em todo o Estado do Rio Grande do Norte, destacando ter havido aumento em relação aos dados oficiais, publicados no cadastro industrial. 51 Ele estima que a indústria cerâmica gera entre 5.000 a 6.000 empregos diretos no Estado, produzindo em torno de 400.000 unidades de cada produto (telhas, tijolos, lajotas) por mês. Parte da produção fica no Rio Grande do Norte, mas uma grande quantidade é escoada para diferentes Estados do Nordeste, como a Bahia, Pernambuco, Sergipe, Alagoas e Paraíba. A indústria de cerâmica no Seridó apresenta, dentre outras, características como as seguintes: • Parelhas emprega mais de 1.000 trabalhadores, valendo ressaltar que esse é um dos segmentos que também faz uso do trabalho infantil. (IICA, 1999.) Estima-se que esses dados são inferiores aos do número de pessoas empregadas, de fato, nas cerâmicas do município; • Carnaúba dos Dantas conta com 15 olarias, que são responsáveis pela geração de 1.000 empregos diretos e indiretos; • as olarias de Cruzeta geram 400 empregos; 49 Edgard Dantas, geólogo, pesquisador do Rio Grande do Norte e Prof. da Ufrn. Otacílio Oziel de Carvalho é ainda especialista em Gerência de qualidade total, Mestre em Geologia Econômica. Atualmente, está desenvolvendo pesquisa sobre as cerâmicas no Estado do Rio Grande do Norte 51 Segundo o Projeto Pnud/FAO/Ibama/BRA/87/007, o setor de cerâmica conta atualmente com 71 cerâmicas em funcionamento na Região do Seridó. Veja-se, a respeito, as informações apresentadas no item 3.2.4 anterior. 50 140 • as unidades existentes em Santana do Seridó estão sendo beneficiadas pela parceria realizada entre a Associação de Oleiros, governo do Estado, Prefeitura e Embaixada Americana, gerando 50 empregos diretos e produzindo 25.000 telhas diárias (Consórcio Tecnosolo & CEP, 1999: 397-398, v. 3.); e • o município de Equador tem como maior potencialidade as jazidas de caulim, feldspato utilizados na industria de cerâmicas finas. A exploração dessa atividade exige muito do solo, pois tem como combustível principal as arvores da mata, queimadas como lenha em seus fornos. Mas dela se origina uma grande diversidade de produto: tijolos, telhas, louças de barro, artesanato de peças de cerâmica, entre outros. Alguns municípios apresentam potencial das atividades ceramistas, como é o caso de Parelhas, grande produtor oleiro, com importantes jazidas de matéria-prima. Por enquanto, a produção se restringe praticamente a telhas romanas. Os esforços que vêm sendo feitos suscitam a possibilidade de melhorar a qualidade dos produtos e de desenvolver outros produtos, capazes de superar a concorrência, o alto custo da produção, o mercado restrito, degradação ambiental e excessiva exploração da mão-de-obra. Finalmente, cabe destacar que a produção de argila no Rio Grande do Norte é de 50 a 60 mil metros cúbicos por mês, concentrada basicamente em cerca de 15 produtores. A brita é produzida por 18 empresas com uma produção de 40.000 m3 por mês. Cada empresa emprega em média 30 pessoas, num total de 500 pessoas. O Feldspato é produzido por 4 a 5 empresas, um total de 5.000 toneladas por mês, empregando em torno de 15 a 20 pessoa por empresa. (IICA, 1999.) 52 f. O Pólo de Caicó e seu Perfil Industrial Esse destaque torna-se importante, pelo peso que esse município tem, tanto em termos populacionais como econômicos. A existência de trabalhos específicos sobre Caicó permitiu que se fizesse análises mais detalhadas sobre as diferenças de dinâmica entre as três Zonas seridoenses. Partindo dos dados relativos aos estabelecimentos industriais, número e natureza das atividades, é possível acompanhar a evolução de alguns segmentos, ao longo do período observado. Percebe-se que algumas atividades se encontram em retração como é o caso dos calçados (que representavam 13 estabelecimentos em 1980 e foram reduzidos para 7 no ano de 1998) e das tecelagens de redes. Outro foi o movimento das Panificadoras, cujo número elevou-se de 11 para 21, incluindo-se aí as fábricas de massa. A tabela 3.4.2.2 mostra que a estrutura industrial do município, em 1980, apresentava-se concentrada em dois setores principais: a tecelagem de rede e a produção de calçados e chapelaria de couro. Os dois setores, juntos, representavam metade dos estabelecimentos existentes. Os demais setores representativos foram o de panificação e o de carpintaria e esquadrias de madeira. Observouse pouca diversificação de indústrias, que pertencem, na sua maioria, aos setores tradicionais que utilizam máquinas e tecnologia rudimentar. Já em 1998, a composição das indústrias de Caicó comporta uma maior diversificação de atividades, embora o número de estabelecimentos tenha passado de 100 para 141, ou seja, um aumento de apenas 41% em dezoito anos. 52 Informações obtidas com Otacílio Oziel de Carvalho. 141 g. O Comércio No que se refere ao comércio, os estabelecimentos comerciais tiveram crescimento significativo, aumentando de 410 estabelecimentos para 786, em março de 1998 (acréscimo de 92%), conforme dados do Departamento de Tributação, da Secretaria Municipal de Finanças de Caicó. Observa-se que aqueles estabelecimentos são de pequeno porte, com predominância para o setor de alimentação e bebidas, seguido de armarinhos e butiques. A Secretaria de Finanças do município estima a presença de 420 estabelecimentos de comércio informal em Caicó. Esse dado é reforçado por estudos feito pelo Sebrae de Caicó, que identificou um grande contingente de pequenas empresas de caráter informal. 53 O comércio, organizado em padrões que não são os das grandes cidades brasileiras – onde as estruturas comerciais se concentraram (comandadas por grandes grupos econômicos e grandes superfícies como os shopping centers ) –, tem mantido dinamismo. O domínio de empresários locais e a presença marcante dos médios e pequenos estabelecimentos é característica importante desse segmento econômico na região. A importância das feiras semanais nos diversos municípios , mesmo nos maiores, é reveladora desse padrão, criado e sustentado na força da cultura local, mais forte até agora que a influência dos padrões importados de outros lugares. O comércio seridoense distribui especialmente alimentos, remédios, veículos e autopeças, materiais de construção, entre outros. O comércio de insumos agrícolas, principalmente rações, também apresenta-se dinâmico. (Consórcio Tecnosolo & CEP, 1999: 199, v. 2.). O movimento comercial é fortemente influenciado pelo turismo, outra atividade forte e com potencial de ampliação no Seridó, especialmente o religioso. Destacam-se a este respeito as festas das padroeiras das principais cidades da região, em particular a de Santana (Caicó e Currais Novos), a festa religiosa mais importante da região. O Seridó tem iniciado a desenvolver – ainda de forma incipiente – o ecoturismo, para o qual tem potencial oferecido pelos açudes de grande porte existentes na região. Quanto à estrutura das atividades comerciais do Município de Currais Novos, observa-se que os pequenos empreendimentos, também se destacam, como em Caicó, justificando a baixa arrecadação por parte da Secretaria de Tributação. A tabela 3.4.2.4 não relaciona a totalidade dos estabelecimentos comerciais (trata-se de uma amostra escolhida para analisar o potencial econômico do município, numa pesquisa realizada pelo Sebrae-RN, em 1996), mas revela grande diversidade da estrutura comercial local. 53 Entrevista feita com o Gerente do Sebrae, em Caicó, em dezembro de 1999 – “O município possui um número considerável de pequenas empresas de fundo de quintal que não constam dos registros da Secretaria mas que se revelam nas consultas à agência, no sentido de obterem informações de como abrir uma empresa e sobre programas de investimentos para pequena e médias empresas. Por se tratar de um pequeno município onde todos se conhecem a maioria já desenvolve algum tipo de atividade.” 142 TABELA 3.4.2.2 CAICÓ. TIPO E NÚMERO DE ESTABELECIMENTOS INDUSTRIAIS, EM 1980 E 1998 ESTABELECIMENTOS INDUSTRIAIS TIPO, EM 1980 NÚMERO Tecelagem(de rede) Cordão de rede Chapelaria(de couro) Calçado Panificadora Doçaria Gelo, picolé e sorvete Torrefação e moagem de café Beneficiamento de arroz Beneficiamento de algodão Óleo de caroço de algodão Carpintaria e Esquadria de madeira Movelaria e malas de madeira Mosaicos e pré-moldados Esquadrias de ferro Molas para veículo Funerária Caixa de papelão ESTABELECIMENTOS INDUSTRIAIS TIPO, EM 1998 NÚMERO “Bonelaria” 29 Dubladora 2 Chapelaria (veludo e napa) 9 Tecidos (rede, toalha e pano de prato) 8 Confecção de roupas em malha 7 Artefato de tecido (enxoval) 5 Calçados 7 Indústria de massa e panificação 21 Fábrica de bolacha, bolo, doce 12 Queijaria 4 Beneficiamento de milho, arroz e café (torrefação) 4 Tratamento de água 1 Gelo 1 Beneficiamento de leite 1 Fabricação de ração animal 1 Movelaria e carpintaria 5 Serraria 11 Pré-moldados, gesso e laje 6 Artefatos de ferro e alumínio 3 Marmoraria 2 Beneficiamento de couro 1 Fabricação de plástico 1 TOTAL 100 TOTAL 141 FONTE DOS DADOS BÁSICOS: MORAIS, MORAIS, Ione Rodrigues Diniz (1998)- Desvendando a cidade; Caicó em sua dinâmica espacial. Natal-RN, Ufrn, 1998. Xerox. (Dissertação apresentada ao Programa do Mestrado de Ciências Sociais da Universidade Federal do Rio Grande do Norte.) Caicó em sua dinâmica espacial. Natal-RN, Ufrn, 1998, p. 162 (tabela 7) e 165 (tabela 8). Xerox. (Dissertação apresentada ao Programa do Mestrado de Ciências Sociais da Universidade Federal do Rio Grande do Norte.) Nota: a ordem de apresentação dos estabelecimentos foi modificada. 27 3 11 13 11 1 2 3 1 1 1 9 4 3 4 1 1 4 TABELA 3.4.2.3 CAICÓ. TIPO E NÚMERO DE ESTABELECIMENTOS COMERCIAIS EXISTENTES EM CAICÓ, EM 1998 TIPO DE ESTABELECIMENTO NÚMERO TIPO DE ESTABELECIMENTO NÚMERO Mercearia 139 Farmácia 21 Açougue 36 Livraria e Papelaria 6 Mercadinho 33 Floricultura 3 Armazém 21 Compact disc 4 Frigorífico, galeteria, fruta e verdura 13 Vidraçaria 4 Supermercado 12 Venda de gás 3 Confeitaria(bombons) 10 Produto veterinário 5 Distribuição de bebidas 7 Ração para alimentação animal 6 Frio e Laticínio 3 Barraco 79 Importadora e bebida 4 Autopeça e acessório p/bicicleta 24 Produto artesanal regional 3 Placa p/automóvel 2 Confecção em geral 24 Peça, pneu, tinta, etc. 8 Malharia 3 Posto combustível 8 Butique 34 Revenda de automóveis novos e usados 3 Sapataria 14 Concessionárias 12 Tecido 5 Máquina de costura – peça 1 Armarinho, presente e bijuteria 57 Balança, máquina e equipamentos para /lanchonete 1 Artigo para recém-nascido 3 Antena parabólica 1 Artigo para bordado 7 Móvel e eletrodomésticos 20 Artigo evangélico 2 Colchão 3 Artigo para caça e pesca 1 Funerária 3 Material para decoração 5 Instrumentos musicais 1 Material para confecção de boné 2 Variedade (alumínio, plástico, inox) 14 Material esportivo 3 Material de construção 10 Ótica 8 Revista e jornal 2 Artigo para festa 5 Outros tipos 80 Cosmético e Produto Natural 7 TOTAL 461 324 FONTE DOS DADOS BÁSICOS: MORAIS, Ione Rodrigues Diniz (1998)- Desvendando a cidade. Op. cit., p. 178 (tabela 10). Nota: a ordem de apresentação dos estabelecimentos foi modificada. 143 TABELA 3.4.2.4 CURRAIS NOVOS. PRINCIPAIS ATIVIDADES COMERCIAIS RAMOS DE ATIVIDADE N º de EMPRESAS Farmácia Produtos alimentícios Artigos para presente Calçados Variedades Confecções Material infantil Móveis e eletrodomésticos :Livrarias Perfumaria Tecidos Ótica e relojoaria Armarinho Pneus Venda de ferro Linha automotiva Produtos agropecuários e agricultura Comercial Cosméticos Artesanato Importados Eletroeletrônica Jóia Bicicletas TOTAL FONTE: Sebrae-RN (1998)- Diagnóstico e plano estratégico de desenvolvimento de Currais Novos. Natal, Sebrae-RN, 1998. h. 03 02 01 01 02 10 01 03 02 01 01 02 01 01 01 01 03 02 01 01 01 03 01 01 60 Os Serviços Os serviços pessoais predominam amplamente na região, concentrando-se na área de alimentação – como bares, lanchonetes e restaurantes, cantinas e churrascarias. Registra-se também a presença de trailers e sorveterias, além de salões de beleza, academias, locadoras de vídeo e de automóveis. Quanto aos serviços de apoio à produção econômica ou de reparação, é significativo o número de oficinas e estabelecimentos de manutenção de veículos, que superam 50% dos estabelecimentos existentes. Podem ser ainda destacadas outras áreas, como as de empresas construtoras e escritórios de contabilidade, símbolos de um processo de urbanização já avançado. 144 TABELA 3.4.2.5 CAICÓ. TIPO E NÚMERO DE ESTABELECIMENTOS PRESTADORES DE SERVIÇOS PESSOAIS, EM 1998 ESTABELECIMENTOS TIPO Bar Lanchonete Restaurante e Pizzaria Sorveteria Trailer Cantina e Churrascaria Hotel e Pousada Salão de Beleza Barbearia Academia Clube recreativo Motel Casa lotérica TOTAL NÚMERO 68 48 28 27 27 9 5 19 14 10 12 3 4 274 ESTABELECIMENTOS TIPO Curso de Informática Curso de Inglês Escola de Natação Auto-escola Agência de Segurança Agência de Viagem Chaveiro Foto Dedetização Vídeo game Locadora de Automóveis Locadora de Cd e Vídeos Funerária 28 NÚMERO 4 1 1 2 1 1 1 4 1 4 2 4 2 28 FONTE DOS DADOS BÁSICOS: MORAIS, Ione Rodrigues Diniz (1998)- Desvendando a cidade. Op. cit., p. 190 (tabela 13). Nota: a ordem de apresentação dos estabelecimentos foi modificada. A tabela 3.4.2.6 indica a presença de setores de serviços de peso na economia do município, com particular destaque para os Estabelecimentos Bancários (em número de 4), Agência de Publicidade, Escritórios de Contabilidade, Construtoras, Auditoria e Consultoria. TABELA 3.4.2.6 CAICÓ. TIPO E NÚMERO DE ESTABELECIMENTOS PRESTADORES DE SERVIÇOS PRODUTIVOS, EM 1998 ESTABELECIMENTOS TIPO Oficinas e ourives Posto de lavagem de carro Borracharia Capotaria Máquinas, eletrodomésticos e. assistência técnica Construtora Imobiliária Projeto para construção Transportadora Cooperativa de artesanato Cooperativa de desenvolvimento rural Cooperativa médico-odontológica TOTAL NÚMERO 83 8 15 1 3 17 1 1 1 1 2 2 135 ESTABELECIMENTOS TIPO Agências bancárias (*) Agências de publicidade Auditoria e consultoria empresarial Corretora de seguros Escritórios de contabilidade Centro de convenções Gráfica Serigrafia Computador- assistência técnica Empacotadeira NÚMERO 4 3 3 1 14 1 7 1 3 1 38 FONTE DOS DADOS BÁSICOS: MORAIS, Ione Rodrigues Diniz (1998)- Desvendando a cidade. Op. cit., p. 193 (tabela 4). Nota: a ordem de apresentação dos estabelecimentos foi modificada. (*) BB, Banco do Nordeste, CEF e Bradesco. Ainda de acordo com a mesma pesquisa observamos dados percentuais referentes à prestação de Serviços e a distribuição por setores de atividade. Cabe ressaltar a importância do peso das Agências Bancárias, dos Escritórios de Contabilidade, Lojas de Fotografia e Setores Privados de Saúde que juntos correspondem a quase 50% do total das atividades de Prestação de Serviços Específicos de Currais Novos. 145 TABELA 3.4.2.7 CURRAIS NOVOS. RAMOS DE ATIVIDADES PRESTADORAS DE SERVIÇOS RAMO DE ATIVIDADE % SOBRE O TOTAL Hospedagem Restaurante e lanchonete Eventos, propaganda, promoções sociais Advocacia Locadora de fitas de vídeo Consultórios, clínicas e laboratórios Fotografia Cartório Escritório de contabilidade Educação Banco Comunicação Prestação de serviços Água e esgotos TOTAL FONTE: Sebrae-RN (1998)- Diagnóstico e plano estratégico de desenvolvimento de Currais Novos. Natal, Sebrae-RN, 1998. i. 3,33 3,33 6,67 3,33 3,33 10,00 10,00 6,67 10,00 3,33 16,68 13,33 6,67 3,33 100,00 O Consumo Regional como Foco de Dinamismo A renda regional é formada pelo fluxo das remunerações dos fatores produtivos alocados nas atividades da região, mas recebe, também, importante complemento de diversos tipos de transferências, como se verá no item 3.2.5, adiante). Isso ajuda a ampliar a demanda global regional e permite explicar parte do dinamismo que se observa em várias atividades produtoras de bens e serviços de consumo. A vida econômica regional tem na demanda local um elemento importante de sustentação. Sua variação (positiva ou negativa) tem impactos importantes na economia seridoense, agora que a crise se estabeleceu nas antigas bases da economia regional. O setor público tem papel importante na vida regional, sobretudo como ofertante de serviços, especialmente os sociais, que ampliaram sua oferta nas décadas recentes, como se verá na análise da dimensão sociocultural da realidade seridoense. Os gastos que realiza (em especial os de custeio) ajudam a manter a demanda local ativa. 3.4.2.2 Atividades em Crise Como já foi destacado, as atividades que foram as âncoras principais da dinâmica econômica seridoense, no passado, encontram-se em crise, no presente. a. A Crise da Cotonicultura O algodão foi até o final da década de 70 a principal fonte de emprego e renda no Estado e da Região do Seridó. As atividades agropecuárias participavam com 45% do PIB estadual e o algodão isoladamente, contribuía com um percentual médio de 32% , no período de 1962-1971. (Melo, 1973.) A área plantada chegou a alcançar cerca de 500 mil hectares, no Estado do Rio Grande do Norte, utilizando um contingente de mão-de-obra que ultrapassava 100 mil pessoas. O algodoeiro de fibra longa representava mais de 60% do cultivo dessa malvácea, concentrando-se nas regiões mais áridas do espaço norte-rio-grandense – o Seridó e o Sertão Central. 146 As dificuldades para o algodão nordestino, para alguns analistas, começa a se delinear no início da década de 30, quando o Estado de São Paulo inicia a produção do algodão herbáceo em grande escala e já em 1936, a produção paulista supera a do resto do País. As bases da crescente importância do algodão herbáceo e da competição inter-regional no mercado brasileiro, em formação, estariam ali lançadas. Mas o dinamismo da indústria têxtil no Sudeste e Sul criavam uma demanda importante e o algodão do Nordeste não recebe impactos relevantes, pois mantém forte presença num mercado brasileiro e nordestino em expansão. Em período mais recente e até os dias atuais, alguns fatores podem ser identificados como responsáveis pela redução da cultura algodoeira no Nordeste, no Estado do Rio Grande do Norte, e no Seridó, tais como: o aparecimento das fibras sintéticas no final dos anos 50, a modernização do parque têxtil dando preferência ao algodão de fibra curta – quando o Seridó era forte em fibra longa –, o baixo rendimento agrícola das variedades arbóreas – predominantes no Seridó –, as repetidas secas ocorridas nas décadas de 60, 70 e 90, as dificuldades de financiamento, etc. Contribuindo para agravar mais ainda a situação, a economia nacional passava por forte processo inflacionário sobretudo nos anos 80, coincidindo com o surgimento da praga do bicudo que generalizou-se em 1985/86 inviabilizando a cultura do algodoeiro arbóreo. A inclusão da correção monetária, no período de inflação alta, nos financiamentos rurais foi mais um elemento a dificultar as condições para investir e custear a produção agrícola, principalmente nas áreas mais secas, vez que os preços dificilmente acompanhavam o custo do financiamento. Por sua vez, a abertura da economia no começo da década de 90 e a política de estabilização inerente ao Plano Real vão facilitar as importações de países que ofereciam longo prazo de pagamento e juros baixos – que variavam de 4% a 8% a.a.–, não disponíveis para o algodão brasileiro. A rápida redução da tarifa de importação – de 55% para 3% –, a política de valorização cambial dos anos iniciais do Real – que amplia a vantagem da importação –, o não cumprimento da política de preços mínimos e os baixos preços pagos aos produtores criaram um quadro extremamente prejudicial a cotonicultura. Atualmente, a área cultivada com algodão arbóreo no Rio Grande do Norte está reduzida a 9.642 ha, dos quais 8.852 ha na Região do Seridó, seu habitat natural. Este dado, por si só, retrata a grave crise da cotonicultura seridoense. (Idec, 1997). No Estado como um todo, a área total cultivada com algodão é atualmente inferior a 10% do total ocupado por essa cultura nas décadas de 60 e 70. No Seridó, em 1996, o valor da produção do algodão arbóreo foi de apenas R$ 522 mil (57% gerados na Zona Homogênea de Caicó) e respondendo por quase 90% na produção do Estado do Rio Grande do Norte. Por sua vez, a produção do herbáceo gerou valor insignificante, estimado em R$ 46 mil, com peso irrelevante no total estadual (R$ 4.926 mil). Assim, a produção anual dos dois tipos de algodão geram apenas R$ 568 mil, no Seridó, segundo dados do Ibge. No mesmo ano, a região apresentou um valor de produção maior em outras culturas: R$ 592 mil na produção de batata-doce, R$1.130 mil na cajucultura, R$ 1.214 mil na produção do milho, R$ 2.834 na de mandioca e R$ 2.907 na de feijão, conforme dados do Ibge. (Idema, 1998.) As iniciativas de retomada dessa atividade ainda são muito tímidas, no Nordeste e no Rio Grande do Norte. O Ceará é quem mais tem avançado, em anos recentes, mas o ambiente macroeconômico nacional tem sido bastante adverso, por favorecer exageradamente as importações. Com a desvalorização do Real e a mudança do regime cambial, em 1999, recomeçaram os debates sobre as possibilidades competitivas do semi-árido para retomar essa atividade. Mas ainda estão incipientes, também no Seridó. 147 b. A Crise e o Potencial da Mineração Historicamente, o Rio Grande do Norte tem ocupado posição de destaque na produção e comercialização de Minérios. Mas quando se fala em minérios no Estado, se pensa na Scheelita e no Município de Currais Novos. Não por se tratar do único município produtor do minério, nem o único minério a ser produzido, mas principalmente por ele estar atrelado a uma fase de expansão econômica do Estado, e por ser de fundamental importância para a base produtiva da Região do Seridó, com reflexos na economia norte-rio-grandense. Currais Novos cresceu e se desenvolveu, principalmente, na esteira da atividade de mineração, cuja expansão desencadeou o desenvolvimento de outros segmentos produtivos. Assim, falar da mineração em Currais Novos não é apenas analisar o seu papel no desenvolvimento econômico como atividade extrativo industrial, mas é também ressaltar a sua participação na construção do perfil urbano da cidade e dos municípios vizinhos, através dos símbolos de uma época de prosperidade, que constituem ainda hoje o cartão de visitas do município e da região. Como diz Jefferson Alves, são monumentos do tempo de abundância, metáforas arquitetônicas forjadas de identidade social: o Hotel Tungstênio, a Rádio Brejuí, o Cine-teatro Desembargador Salustino, a antiga sede da agência do Banco do Brasil, o Posto de Puericultura, a Igreja, a Vila Operária. (Alves, 1997.) A década de 70 foi de grande euforia para o setor da mineração. Ela é portanto marco de um período de prosperidade para o Estado ao mesmo tempo que constitui um divisor de águas na base econômica da região pelo período de retração da atividade que acontece na década seguinte. As transformações no mercado mundial de matérias primas, a queda dos preços de alguns produtos, a chegada de produtos de países concorrentes, o surgimento de produtos alternativos e sucedâneos provocam impactos negativos na região. Tradicionais fornecedores de matéria prima local ao comércio exterior entram em crise e parte importante da população envolvida nessa atividade adota formas precárias de sobrevivência, na falta de fontes alternativas de sustentação econômica. O impacto inicial é desestruturante. Foi apenas nos últimos anos que as atenções se voltaram para a região e algumas iniciativas foram tomadas, no sentido de avaliar o verdadeiro potencial desses setores. Alguns empresários não deixaram de acreditar na revitalização do setor. Marcelo Porto, Diretor Presidente da METASA diz: ( ) Eu acredito na mineração como atividade rentável. Não é por acaso que esses anos todos eu não abandonei a atividade da mineração, como fez a maioria. Continuo batalhando, comprando e reabrindo minas por esse Estado afora. O que falta, como sempre, para o Nordeste é vontade política, é decisão de uma política econômica que modifique a legislação das alíquotas para os produtos importados. Eu produzo a Scheelita ao mesmo preço que os Chineses colocam o produto no porto de Santos. Só que com alíquota zero sobre as importações não dá para concorrer. Mas eu não desisto. Onde tem uma reunião sobre o tema eu vou... Por iniciativa da Fiern 54 foram realizados, em 1999, dois estudos sobre o setor de Mineração no Rio Grande do Norte – “Minerais Industriais do Estado do Rio Grande do Norte” e “Gemas do Rio Grande do Norte”. Esses trabalhos revelam que, apesar do declínio da atividade, a década de 90 já pode 54 O Presidente da Fiern – Abelírio Rocha – informa que a Federação promoveu a realização de estudos sobre as potencialidades do setor mineral do Rio Grande do Norte, por acreditar que essas atividades constituem alternativa positiva para o desenvolvimento do Estado. Por isso também, a Federação destinou um local para as atividades do Sindicato dos Proprietários de Minas do Estado. 148 ser considerada como o início de uma nova era para os minerais e rochas no Brasil. Acrescenta ainda o documento, que face “à tendência da demanda futura destes insumos minerais o Rio Grande do Norte tem um excelente potencial de depósitos de minerais e rochas industriais inexplorados ou pouco explorados podendo portanto ser desenvolvido”. Ainda de acordo com o documento, dentre os principais bens minerais produzidos destacam-se o sal, a scheelita, a diatomita, calcários, mármores feldspato, caulim, berilo e gemas. Quanto ao potencial gemológico do Estado, o estudo concluiu que o Rio Grande do Norte está entre os mais importantes do País, tanto pela quantidade de jazimentos, como pela qualidade e variedade de suas pedras preciosas e semipreciosas. O Rio Grande do Norte é constituído de terrenos antigos denominados de Complexo GnáissicoMigmatito ou Complexos Caicó, São Vicente e Presidente Juscelino, nos quais ocorrem diversos tipos de granitóides intrusivos, além de faixas de rochas metassedimentares dobradas, perfazendo cerca de 60% da superfície do estado. Das oito províncias gemológicas conhecidas no mundo, a do Brasil é a que possui maior área, além de ser a mais diversificada, com um grande numero de minerais-gema, dentre os quais os mais importantes são o diamante, o rubi, a safira, a água marinha e a esmeralda. As potencialidades desses setores, entretanto, são pouco conhecidas como promovedoras de desenvolvimento. É portanto de fundamental importância analisar aspectos endógenos e exógenos que interferem no processo, uma vez que a diversidade e aplicabilidade desses minérios são extremamente importantes para vários segmentos industriais. A postura no Seridó não pode ser diferente. b.1 Ascensão e Queda de um Setor A produção das regiões mineradoras portadores de tungstênio, especialmente a scheelita, no Brasil, aumentou no final dos anos 30, na esteira da Segunda Guerra Mundial, e prosseguiu para atender ao mercado interno brasileiro, no suprimento de matérias-primas demandadas pelo processo de industrialização. Por conta disso, a produção mineral brasileira também permitiu ao Pais uma maior inserção no comércio internacional, por meio da exportação do minério. Até os primeiros anos da década de 50, o capital brasileiro tinha a seu favor uma legislação que proibia a presença do capital estrangeiro na esfera da extração mineral, permitindo apenas a sua atuação a nível da comercialização e beneficiamento de produtos, a partir de concentrados de scheelita. Assim, empresas como a Wah Chang e a Hoshschid (Brasilet), que tinham representações na Região do Seridó, adquiriam o produto extraído em grandes quantidades da mina de Brejuí (Alves, 1997: 305) e comercializavam, em seguida, para outros países. Até a metade da década de 50, as empresas do Seridó se dedicavam, portanto, à extração mineral. A Mineração Tomaz Salustino S/A – principal empresa do Estado na extração da scheelita – foi basicamente fornecedora de matéria-prima, mas sua incapacidade de verticalização produtiva esteve relacionada à natureza do capital fechado e familiar que o grupo representava. Ainda assim, a Mineração correspondia a um imenso complexo, que ultrapassava o Rio Grande do Norte e explorava minas até na Paraíba. As descobertas das jazidas situadas no Nordeste, notadamente no Rio Grande do Norte e Paraíba, se encontram definidas desde os anos 40, como portadores de uma determinada faixa geológica, conhecida como a Região do Seridó (potiguar e paraibano), responsável pela quase totalidade da produção brasileira. O Município de Currais Novos se destaca na produção da Scheelita, por intermédio das minas Brejuí e Barra Verde (1943) e de uma terceira, que surgiu nos anos 60, a Boca de Lage. É a partir da scheelita que se obtém o wolfrâmio ou tungstênio, utilizado em equipamentos eletrônicos, lâmpadas e iluminação. O quadro seguinte reflete a importância da produção de tungstênio 149 e os períodos de maior crescimento da produção no Estado, quando a atividade teve seu papel de destaque. De acordo com a tabela 3.4.2.8, a produção de tungstênio no Rio Grande do Norte apresentou desde então sete intervalos de picos de produção. TABELA 3.4.2.8 RIO GRANDE DO NORTE – PRODUÇÃO DE TUNGSTÊNIO EM ANOS SELECIONADOS ANO PRODUÇÃO (t) 1945 1953 1958 1971 1975 1977 1981 1982 1993 1.115 1.000 1.131 1.356 1.356 1.212 1.574 1.524 254 FONTE DOS DADOS BÁSICOS: NESI, Júlio de Resende (1993)- “Prognóstico da situação do tungstênio no Rio Grande do Norte.” Anais do XII Simpósio de Geologia do Nordeste. João Pessoa-PB, 1º a 04 de maio de 1986, p. 360-373 e Anuário Mineral Brasileiro, MME/DNPM – 1981-93. É a partir de 1982 que a produção “despenca”, em queda livre: de 1.524 toneladas de tungstênio produzidas no referido ano, o estado chega a 254 toneladas, em 1993, significando um decréscimo de 84%, tornando inviáveis as minas brasileiras. Já em 1990, Barra Verde e Boca de Lage paralisaram suas atividades e a mina de Brejuí reduziu drasticamente sua produção. A decadência do setor fica confirmada pelos dados atuais da produção nacional de wolfrâmio, que corresponderam, em 1996, a 98 t (obtidas a partir de 171 toneladas de concentrado de scheelita, vindas essencialmente da Mina de Brejuí). Se comparado ao período áureo, os anos 70, quando a produção alcançava 1.600 toneladas/ano, constata-se que o setor ainda resiste. Outros aspectos devem ser ressaltados, quanto ao desempenho decrescente dos minerais metálicos. Além da queda dos preços no mercado internacional da scheelita, wolframita, tantalita e berilo, observa-se ainda uma redução da demanda interna por parte do setor metalúrgico nacional. Na década de 70, o governo do Estado apoiou a criação de cooperativas de pequenos mineradores em São Tomé, Cerro Corá, Lajes e Equador e a instalação de centros de lapidação e artesanato mineral nas cidades de Currais Novos, Parelhas e Tenente Ananias, para a capacitação de pessoal no beneficiamento de pedras preciosas. Destacam-se, ainda, as ocorrências de gemas, que se distribuem em 28 municípios do Estado, dentre os quais os mais importantes são Lajes Pintadas, Tenente Ananias (principalmente ÁguaMarinha), Parelhas e Equador (principalmente Turmalinas) e, ainda, Acari, Campo Redondo e São Tomé. Como se vê, a presença seridoense é importante. 150 b.2 Principais Entraves à Expansão e Sinais de Recuperação A pequena e decrescente representatividade do setor mineral na economia estadual constitui um primeiro entrave. Ademais, esse não é um problema apenas do Seridó. De acordo com dados do Anuário Mineral Brasileiro, a importância da atividade extrativa mineral na geração de empregos, no Estado, vem gradativamente diminuindo, desde os anos 70 e ao longo do período seguinte. Atualmente, a maior parte dos jazimentos encontra-se inativa e parte da mão-de-obra qualificada migrou para outros estados ou para outros segmentos da economia. TABELA 3.4.2.9 RIO GRANDE DO NORTE - OCUPAÇÃO DE MÃO-DE-OBRA NA INDÚSTRIA EXTRATIVA MINERAL ANO 1980 1985 1990 1995 1996 NÚMERO DE EMPREGADOS 2.703 2.089 1.248 519 566 EVOLUÇÃO ( % ) --(23) (41) (59) 9 FONTE DOS DADOS BÁSICOS: MME. DNPM. Anuário Mineral Brasileiro, 1981. 1986, 1991, 1996 e 1997. Nota: Os números entre parênteses ( ) apresentam variação negativa. Quando se analisam, hoje, as perspectivas comerciais para alguns produtos, se elege o mercado internacional como possível canal de escoamento e fonte de rentabilidade para a produção existente. A realidade é que a competitividade constitui exigência indispensável, e já não basta apenas produzir. Em se tratando de algumas matérias-primas tradicionais, a questão é ainda mais complexa. Veja-se o caso do Tungstênio. As reservas mundiais de tungstênio se encontram em 6 países: a China (com 41,5%), o Canadá (15%), a Rússia (10,8%), os Estados Unidos (6,3%), a Austrália (4%) e a Bolívia (3,2%), que juntos representam cerca de 80,8% do total de tungstênio produzido. O Brasil participa com apenas 2% das reservas totais. Desde o final dos anos 70, a China intensificou a produção e a oferta do minério no mercado internacional, com redução de preços graças à redução dos custos de extração. Assumiu a supremacia do mercado scheelitífero internacional. Acrescente-se a isso, a substituição por outros minérios na constituição de artefatos industriais e tecnológicos nas importações de concentrados de scheelita, como ferro, ligas e pó e a política de abertura da economia brasileira – que suprimiu as restrições às importações ao mesmo tempo que extinguiu os incentivos à produção . Assim, atribui-se à queda dos preços no mercado internacional o principal fator de desmantelamento da industria de minérios do Seridó, em particular a industria da scheelita, mas os minerais industriais enfrentam ainda outros fatores que dificultam a comercialização. Além de serem muito competitivos entre eles, muitos podem ser substituídos um pelo outro, em varias aplicações industriais. De acordo com o relatório do Ministério das Minas e Energias – Minerais Industriais do Estado do Rio Grande do Norte –, a pesquisa dos minerais industriais é realizada por “uma provocação do mercado”, gerando empreendimentos médios e pequenos. Em geral pouco competitivos e de pouca penetração no mercado. 151 Um outro entrave ao processo de expansão das minas diz respeito basicamente à natureza dos empreendimentos e à forma como foram estruturadas essas atividades. A histórica “falta de visão empresarial de maior alcance”, e que visasse mercados maiores e mais competitivos, significou em dado momento a perda progressiva de consumidores. Alguns pesquisadores atribuem a falta de dinamismo de parte do segmento a traços da cultura empresarial local: “dirigir a mina enquanto uma atividade econômica produtiva se norteando pela racionalidade propriamente capitalista – a maximização do lucro, mas sua conduta socioempresarial baseada na racionalidade ‘da terra veio, à terra retornará’, em que, por motivações erguidas em torno das ações propriamente econômica, política e religiosa, converte-se num ‘empreendedor’ territorializado, cujo empenho enquanto benfeitor da terra natal, restringe as possibilidades de ampliação do capital constituído com as ‘pedras pesadas’”. (Alves, 1977.) Vários dos problemas mencionados pelos participantes das reuniões e entrevistas realizadas, durante o processo de mobilização das comunidades dos 28 municípios do Seridó, se assemelham aos depoimentos de alguns empresários da área, como Marcelo Porto. Eles atribuem a estagnação do setor de minérios à ausência de políticas públicas, à falta de pesquisa sobre as potencialidades minerais da região e à falta de laboratórios que permitam uma maior divulgação e aproveitamento dos minérios. Neste sentido, um primeiro passo parece ter sido dado com o Projeto Minerais Industriais do Estado do Rio Grande do Norte, que aponta os pólos de desenvolvimento e os principais minerais e rochas industriais existentes. Os principais objetivos desse projeto são: revitalizar o setor de minérios do Estado; estimular o desenvolvimento da industria de minerais e rochas industriais do Estado; qualificar os minerais e rochas industriais selecionados; iniciar ações imediatas para fomentar o aproveitamento de minerais e rochas; e contribuir para o descobrimento de novas jazidas de minerais e rochas industriais. TABELA 3.4.2.10 RIO GRANDE DO NORTE. RESERVAS DE MINERAIS E ROCHAS INDUSTRIAIS, 1996 RESERVAS (t) SUBSTÂNCIA MINERAL MEDIDA INDICADA INFERIDA Argila 6.063.016 ----Calcário sedimentar 2.425.085.276 2.355.965.558 1.416.947.690 Calcário metamórfico 46.717.652 17.351.475 19.840.631 Caulim 990.233 727.000 --Diatomita 1.912.617 4.900 15.000 Feldspato 107.261 147.838 94.440 Fluorita 363 508 871 Gipsita 7.618.377 2.405.660 --FONTES DOS DADOS BÁSICOS: MME/DNPM e DNPM/RN (1997)- Anuário Mineral Brasileiro. Por sua vez, a produção de gemas do Estado é ainda muito baixa. Sua participação na economia é insignificante, não ocupando, portanto, posição de destaque nas possibilidades de desenvolvimento citadas pela comunidade nas reuniões municipais. Além da falta de investimentos e incentivos governamentais, o setor é explorado de forma precária e sua vitalidade não pode ser medida apenas pela existência das reservas. 152 TABELA 3.4.2.11 RIO GRANDE DO NORTE. PRODUÇÃO DE MINERAIS E ROCHAS INDUSTRIAIS, 1996 SUBSTÂNCIA MINERAL QUANTIDADE PRODUZIDA (t ) VALOR DA PRODUÇÃO ( US$ 1000000 ) Areia * 426.999 1.952 Argila 381.700 3.098 Brita * 321.630 4.434 Calcário calcítico 449.193 2.213 Calcário dolomítico 1.130 47 Caulim 1.053 27.835 Diatomita 20.939 3.004 Feldspato 1.593 55 Sal marinho 3.450.000 51.543 FONTE DOS DADOS BÁSICOS: MME/DNPM, 1997. Anuário Mineral Brasileiro. * m³. Mas há sinais de recuperação. O crescente interesse de grupos empresariais de fora, por exemplo, mostra que a mineração é uma potencialidade que a região não pode desprezar . No elenco das estratégias para o desenvolvimento econômico do Estado, a mineração volta a ocupar papel relevante, como se constata da leitura do Plano de Desenvolvimento Sustentável do Rio Grande do Norte, elaborado em 1997. Identificada ao longo dos anos com a economia da Região do Seridó, a atividade extrativa mineral já apresenta sinais de uma tímida recuperação. A Armil Mineração do Nordeste, recém inaugurada, recebeu um financiamento de R$ 2,8 milhões do Banco do Nordeste, prometendo gerar, a curto prazo, 500 empregos diretos e indiretos. A empresa prevê o beneficiamento de 50 mil toneladas de minérios não-metálicos, por mês, extraindo 5 mil toneladas de pó de Feldspato, Quartzo, Argila refrataria, Caulim e Barita, para atender as indústrias de louças, cerâmicas, vidros e tintas do País (Jornal de Hoje, 20.01.2000.) O governo do Estado fez construir uma ponte na cidade de Parelhas, para permitir a ampliação do tráfego de caminhões transportadores de minérios. Um outro elemento importante é a exportação de parte da produção, via Porto de Natal, justificando um maior interesse por parte do governo, no sentido de intensificar a saída de produtos pelo sistema de escoamento portuário do estado. (Tribuna do Norte, 18.01.2000.) b.3 A Mineração na Perspectiva dos Habitantes da Região Há o reconhecimento por parte da população do Seridó sobre a importância da mineração para a economia da região, particularmente no que se refere à geração de emprego e renda. O empresário Marcelo Porto reforça essa constatação, quando fala da estrutura de apoio das vilas, mantida para receber qualquer empreendimento: ( ) Está tudo pronto. Até as casas para os técnicos e operários estão lá, prontas para serem habitadas. Ia resolver o desemprego de muita gente. Durante os seminários municipais realizados, foram apontados alguns pontos comuns, para diferentes municípios da Zona Homogênea de Currais Novos, particularmente quanto aos fatores endógenos de estrangulamento da atividade mineral. Eles foram agrupados de acordo com as manifestações e inquietações de parte da população, para a qual a atividade é importante e são apresentados a seguir: 153 • Falta de capacitação de mão-de-obra especializada. Aspectos quanto à falta de tecnologia e de pessoal capacitado na mineração foram inúmeras vezes mencionados como fatores negativos na expansão da atividade Assim, se ressaltam elementos de natureza endógena, com muita freqüência, para justificar as dificuldades enfrentadas por diversos setores, que atribuem o processo de estagnação econômico à falta de capacitação da mão-de-obra, na maioria das vezes, e até mesmo à falta de capacidade empresarial. • Exploração do minério, de forma desordenada, informal, predadora e por preço abaixo do mercado. A “insuficiente” exploração dos recursos minerais e a forma como aquela é realizada são citadas por um grande número de entrevistados da Zona Homogênea de Currais Novos como um importante problema para as atividades sob exame. • Exploração dos recursos minerais por agentes externos, sem retorno para o município. Constitui preocupação resultante da presença de grupos de fora na região, especialmente de empresas estrangeiras como a HIR – grupo alemão, que, embora há pouco tempo em Parelhas, tem aumentado suas exportações para a Europa. Um outro grupo – o Artesanal Gemas –, ainda que com exportação incipiente, desenvolve pesquisa de prospeção para ampliar suas exportações. Segundo empresário local do setor, outros grupos têm manifestado interesse na comercialização de alguns produtos da região, como é o caso da Amsterdã Sauer – fabricante de jóias de alto luxo. O representante daquela empresa já visitou a região e mantêm contatos com empresários locais, no sentido de estabelecer parceria para o fornecimento de algumas pedras. As dificuldades para competir, por parte dos empreendedores locais, começam dentro do próprio município, com a vinda de estruturas extremamente organizadas, que, embora dinamizem parte da cadeia produtiva, também fragilizam o tradicional processo de comercialização da região. Em janeiro de 2000, foi inaugurada em Parelhas a Armil Mineradora do Nordeste Ltda., que desencadeou manifestações contrárias por parte dos produtores locais. Uma outra firma vem desenvolvendo atividades no setor. Trata-se da empresa alemã Paul Wild, que possui direito de lavra em uma mina de Parelhas, que compra turmalinas, ametistas e água-marinha, freqüentemente, no Seridó. A presença desse agente revela, por outro lado, o potencial regional para essa atividade. • Falta de articulação e cooperação entre os proprietários das minas. Na ausência de um projeto de desenvolvimento para a região, o processo de concorrência entre os diferentes grupos tem sido visto por parte da população como um entrave à expansão da atividade, embora empresas de fora sejam bem-vindas por proprietários de minas desativadas, que, sem recursos, apostam em jointventures como alternativa. • A falta de indústrias na região. Os participantes das reuniões municipais, promovidas como parte do processo de mobilização das lideranças locais, manifestaram preocupação quanto à ausência de indústrias de transformação de minérios, fato que teria contribuído para dificultar a expansão da atividade, ao longo dos últimos anos. Para alguns, o cenário desejado é de que mais empresas venham para a região, não importando, segundo os depoimentos, que elas sejam constituídas por grupos nacionais ou/e estrangeiros. 3.4.2.3 As Principais Trajetórias do Pós-Crise As transformações no mundo agrário e o processo de urbanização foram responsáveis pelo surgimento de novas atividades, modificações e extinção de outras. Algumas estruturas se mantiveram 154 ao longo dos tempos. O perfil que se redesenha hoje na região acena para alternativas imediatistas de sobrevivência, na grande maioria, enquanto outros seridoenses insistem em manter estruturas tradicionais de produção e comercialização que resistem a toda e qualquer tentativa de modernização. 55 Quanto aos tradicionais produtores de algodão, de scheelita e empresários da região, muitos se direcionaram para outros ramos de atividades. As pessoas da classe média e os pequenos produtores ou antigos trabalhadores dos complexos em crise buscam alternativas de sobrevivência nas cidades da região (quando não emigram para outras regiões). Segundo o deputado Álvaro Dias, os poucos grandes empresários de Caicó, que ainda tinham condições de investir, orientaram seus investimentos para Natal. Um deles, o Sr. Emídio Germano da Silva, proprietário de 5 fazendas de algodão e 4 fábricas de óleo, fala melancolicamente: (...) Quando o algodão acabou, eu resolvi investir em imóveis. Eu já investia, mas sai comprando o que aparecia, em Caicó principalmente. Mas também em Natal. Comprei para preservar parte do meu patrimônio. Vendi as fábricas de óleo e sabão, mas conservei as fazendas, onde vou todos os dias. Agora estão dizendo que o algodão vai voltar. Difícil vai ser convencer o povo ... Os diretores de uma mineradora que já foi importante, com a derrocada das atividades da empresa, adquiriram, nos anos 80, vários imóveis em Natal, além de duas concessionárias de automóveis FIAT (uma em Natal, outra em Currais Novos). Mas faliram nos anos 90. O empresário Marcelo Porto, antigo diretor da Mineração Tomaz Salustino, que ainda permanece na atividade de minérios, assim se manifestou sobre os diferentes ramos de investimento do grupo: (...) Na família Salustino, muita gente tinha outros negócios. Quando a Mineração parou suas atividades, cada um seguiu seu caminho. Os médicos construíram uma clínica, os outros botaram lojas. E os engenheiros mais capacitados foram trabalhar em outras minas, lá para o Norte. A busca das cidades da região foi a trajetória mais comum para os que não eram os principais empresários ou seus descendentes. Basta um passeio pelas ruas de algumas das maiores cidades do Seridó, para se perceber a natureza das atividades econômicas, ancoradas principalmente nos pequenos negócios. Foram eles que abrigaram os novos demandantes de inserção na vida econômica regional e os que saíram das atividades em crise. São as atividades urbanas que retratam a realidade econômica atual, constituindo sua principal base de sustentação, seja por meio dos pequenos empreendimentos, das atividades de fundo de quintal ou da tradicional estrutura de comercialização. Assim, os habitantes da região sobreviveram aos longos períodos de instabilidade e crise, e mantiveram, em parte, um modus vivendi, insuficiente de certo, mas que se nutre da produção local. A lealdade desse povo às suas raízes, tão cantada em prosa e verso na literatura seridoense, talvez explique, em parte, esse apreço pelo que é da terra, permitindo que a uniformização de um outro padrão de consumo não tenha ainda se instalado nos “cardápios da economia dos desejos” da população do Seridó. Dessa forma, não é de estranhar a reivindicação feita por vários participantes das 55 Há dois anos foi inaugurado na cidade de Caicó um açougue, nos moldes dos modernos estabelecimentos de venda de produtos perecíveis, existentes nas grandes cidades. Esse açougue fechou suas portas antes mesmo de completar um ano de funcionamento. Seus maiores concorrentes foram o açougue municipal e as feiras livres, que ali funcionam, apesar das péssimas condições de armazenamento dos produtos. Em matéria recentemente veiculada pelos jornais locais (Tribuna do Norte, 21.01.2000) foram denunciadas as condições de funcionamento do matadouro municipal, assim como a utilização da mão-de-obra infantil, que executa todo tipo de trabalho. Na fala de um habitante de Caicó: “carne embrulhada em plástico, fica com gosto de plástico, não presta”. 155 reuniões municipais, solicitando a iniciativa do poder público, no sentido de apoiar o desenvolvimento do comércio local, especialmente por intermédio de feiras livres. A insuficiência de informação sobre as atividades não registradas na região dificulta o aprofundamento dessa análise, uma vez que grande parte delas se dá na esfera do chamado setor informal. O peso do informal pode ser evidenciado no fato de que o Seridó representa cerca de 8% do PIB e apenas 4,5 % da receita do ICMS estadual. Formais ou informais, o fato é que, nos anos 90, as atividades ligadas à economia urbana do Seridó já se caracterizavam como mais dinâmicas do que as tradicionais. A decadência da base econômica agrária, além de acelerar o processo de urbanização nos principais pólos da região, abriu espaço para uma economia essencialmente urbana, fundamentalmente apoiada no setor terciário, e com particular destaque para o setor de serviços. É importante ressaltar que, na origem, esse setor não se expandiu em função do desenvolvimento das atividades produtivas da agricultura e indústria, pois essas atividades eram ainda pouco dinâmicas para constituir outros processos produtivos mais estruturados. Ele se revela nos setores de distribuição, comércio, serviços sociais e pessoais, relativos aos transportes coletivos, educação, saúde, lazer, alimentação. E cresceu, de fato, nos últimos anos, como uma alternativa econômica, diante de um cenário de poucas possibilidades. 3.4.3 A Base de Infra-Estrutura Econômica Como de resto no Rio Grande do Norte, a infra-estrutura econômica não é um gargalo central ao desenvolvimento do Seridó. O Nordeste brasileiro realizou importante esforço de ampliação de sua base de estradas, energia e comunicações, nas últimas décadas e isso beneficiou também o Seridó, como revelam os dados a seguir apresentados, para os diversos segmentos que interessam ao desenvolvimento regional. 3.4.3.1 A Infra-Estrutura de Transportes A acessibilidade ao Seridó é bastante boa. A ligação da região com Natal, Mossoró, as demais regiões do Estado, com outros Estados do Nordeste e com o resto do País se faz com facilidade, e é de boa qualidade. Uma malha rodoviária (estradas pavimentadas) de padrão semelhante ao do Nordeste em seu conjunto dá acessibilidade à região. Não existe, no entanto, infra-estrutura para o transporte ferroviário, como em outras regiões do Estado. A estrutura de transportes no interior da Região do Seridó, no entanto, é considerada insuficiente e precária, pela maioria dos entrevistados. A acessibilidade intra-regional é um problema mais grave que o inter-regional. Essa carência é diferenciada dentro do Seridó. De acordo com a manifestação dos participantes das reuniões municipais, a Zona Homogênea das Serras Centrais apresenta o maior número de reivindicações quanto às melhorias de estradas (vicinais em sua maioria), assim como a construção de pontes e asfalto. Observa-se que alguns dos entraves que impedem a ampliação da comercialização dizem respeito às dificuldades encontradas para o escoamento da produção, em conseqüência da insuficiência das estradas ou de sua inadequada conservação. A crise da base produtiva da região, nos últimos anos, certamente contribuiu para o agravamento de alguns aspectos relevantes do quadro infra-estrutural de transportes. 156 Como em todo o País, o predomínio do transporte rodoviário é evidente em sua oferta regional. O quadro nas diversas zonas, a este respeito, vai especificado a seguir: • a Zona Homogênea de Caicó é servida pelas Rodovias Federais BR-110 e BR-427 (atravessa Caicó, Jardim do Seridó, Serra Negra do Norte e Timbaúba dos Batistas) e pelas seguintes Rodovias Estaduais: RN-081, RN-082, RN-083, RN-085, RN-088, RN-089 e RN-118 (Ipueira) e RN288 (que serve Cruzetas e Jardim de Piranhas); • a Zona de Currais Novos é servida pelas rodovias federais BR-104, BR-226 e BR-427 (servindo aos Municípios de Acari e Currais Novos). As Rodovias Estaduais são as seguintes: RN-023, RN-041, RN-042, RN-086, RN-129, RN-203 e RN-288; e • a Zona Homogênea das Serras Centrais é servida por três Rodovias Federais, assim especificadas: BR-104, a BR-110 e BR-226. Por sua vez, a Zona é cortada pelas seguintes Rodovias Estaduais: RN-041, RN-042, RN-087 (única estrada para Tenente Laurentino), RN-088, RN-023 (única estrada para Bodó), RN-118 (única estrada para Jucurutu) e RN-223 (única estrada para Triunfo Potiguar). O transporte de passageiros é realizado pelo setor privado. As principais linhas são servidas pelas empresas abaixo discriminadas: • Linhas Interestaduais: Planalto, Jardinense e São Geraldo; e • Linhas Intermunicipais: Jardinense. O Transporte aéreo também pode ser feito no Seridó, pois a região conta com três campos de pouso (Caicó, Currais Novos e Jardim do Seridó) para aeronaves do tipo leve, da classe Bandeirante (BEM-110). As condições de uso, no entanto, deixam a desejar, pela pouca utilização e importância dos mesmos. Dentre os campos disponíveis destacam-se os seguintes: • Caicó, o Campo de Pouso "Rui Mariz", próximo à BR-088, dista 32 km do centro da cidade. O aeroporto é de propriedade do Ministério da Aeronáutica e da Prefeitura Municipal; e • Currais Novos, o "Campo do Pouso Jurema", que fica a 4 km da cidade. Nesse contexto, carências localizadas é que orientaram a identificação de prioridades para o presente Plano de Desenvolvimento. 3.4.3.2 A Infra-Estrutura de Comunicações e Telecomunicações Os dados disponíveis 56 permitem destacar aspectos relevantes quanto à infra-estrutura das telecomunicações no Estado e nas Zonas Homogêneas. As transformações ocorridas nas telecomunicações de uma forma geral modificaram o cenário atual. O processo de privatização da 56 As informações sobre as telecomunicações baseiam-se no Anuário Estatístico do Rio Grande do Norte, publicado pelo IDEC, em 1998; no “Relatório de Localidades da TELERN”; no "Diagnóstico Socioeconômico e Cadastro Empresarial de Caicó”; e nos “Diagnósticos e Planos Estratégicos de Desenvolvimento dos Municípios de Currais Novos e Florânia”. 157 Telern, o crescimento da telefonia móvel e a chegada de outras operadoras no sistema, 57 nos últimos meses de 1999, tendem a redesenhar o mapa da telefonia no estado e na Região do Seridó. A insuficiência de terminais instalados na região – entre aparelhos convencionais, celulares e outros, particularmente os públicos 58 (que representam apenas 5% do total do Estado, quando seu peso na população é mais do que o dobro) – não se modifica com a proliferação de telefones celulares, que preenche, apenas, em parte, a demanda insatisfeita da população. Ainda que haja facilidades de aquisição e habilitação das linhas de telefonia celular, a manutenção dos serviços – com os preços elevados das tarifas do sistema – não está ao alcance do poder aquisitivo da maioria da população. De acordo com os dados da tabela 3.4.3.1, o Estado do Rio Grande do Norte contava, em 1997, com 200.252 terminais instalados e 204.941 terminais em serviço. Dentre aqueles, 11.891 estavam instalados na Região do Seridó, distribuídos da seguinte forma: 4.278 na ZH de Currais Novos, 7.021 na ZH de Caicó e 592 na ZH das Serras Centrais. É importante observar que essas informações revelam uma cobertura desigual do sistema de telecomunicações. A ZH de Caicó apresentava uma média de 15,8 habitantes por linha telefônica instalada. Essa proporção sobe na ZH de Currais Novos para 21,3 habitante/linha e chega a 140,2 habitante/linha telefônica na ZH das Serras Centrais. A média do Estado era de 12 linhas/habitante, superior à média da Região Seridó. Alguns municípios apresentavam carências maiores do que atualmente. Observa-se que existe uma grande concentração de terminais nas cidades maiores – a cidade de Caicó, por exemplo, concentrava 92% do total de terminais instalados (fixo e celular), na Zona Homogênea do mesmo nome, enquanto 7 dos outros municípios tinham apenas postos de serviço. Currais Novos concentrava 82%, enquanto 2 municípios da Zona Homogênea tinham apenas um posto de serviço cada. As maiores deficiências encontram-se na Zona Homogênea das Serras Centrais, com 37,5% do total de terminais instalados em Jucurutu e 3 dos municípios daquela zona, com somente postos de serviços. (Consórcio Tecnosolo & CEP, 1999.) Florânia conta com 4 postos de serviço, sendo um na cidade e 3 nas comunidades: Cajueiro, Caiçara e Ipueira. Em termos de comunicações, merece destaque a presença da Televisão. No Seridó, são captados, regularmente, 4 canais: TV Cabugi (Rede Globo), TV Potengi (Rede Bandeirantes), TV Tropical e TV Ponta Negra (SBT). Igualmente importante é a presença de Emissoras de Radio, assim como a circulação de Jornais na região, onde há 4 emissoras: 3 AM (“A Voz do Seridó”, a “Rádio Rural” e a “Rádio Caicó”) e uma emissora que opera em FM (a “Rural FM”). No que se refere a Jornais, não há periódicos específicos para a Região do Seridó. Os jornais que ali circulam são os mesmos do Rio Grande do Norte, como a “Tribuna do Norte”, o “Diário de Natal” e o “Diário Oficial”. 57 O sindicato dos empregados em Telecomunicações do Rio Grande do Norte informa que, com a chegada da VESPER, agora em janeiro, e a ampliação dos Serviços da BCP (que estrategicamente não comunica os seus números), o panorama da telefonia no Estado tende a ser permanentemente modificado. 58 A instalação de terminais públicos nas pequenas cidades do interior do País foi, durante muito tempo, fruto de negociações políticas, quando se trocava um posto da Telern ou um telefone público, em pequenos municípios, por votos. A privatização da empresa, com a margem de influência do Estado, nas estratégias de implantação de novos terminais, não está contribuindo para reduzir as carências de algumas regiões, que podem, até mesmo, aumentar. 158 TABELA 3.4.3.1 RIO GRANDE DO NORTE E SERIDÓ - TERMINAIS INSTALADOS E TERMINAIS EM SERVIÇO DA TELERN, SEGUNDO AS ZONAS E SUBZONAS HOMOGÊNEAS E MUNICÍPIOS – 1997 ESTADO, SERIDÓ, ZONAS E SUBZONAS HOMOGÊNEAS E MUNICÍPIOS DA REGIÃO TERMINAIS INSTALADOS ESTADO Seridó IV – Zona de Currais Novos Acari Carnaúba dos Dantas Currais Novos Currais Novos – Celular Parelhas São Tomé V – Zona de Caicó Caicó Caicó – Celular Cruzeta Jardim de Piranhas Jardim do Seridó Serra Negra do Norte VI – Zona das Serras Centrais - Subzona de Santana do Matos Florânia Santana do Matos - Subzona de Jucurutu Campo Grande Jucurutu 200.252 11.891 4.278 200 176 3.052 466 256 128 7.021 5.600 901 64 136 256 64 592 192 64 128 400 192 208 TERMINAIS EM SERVIÇO 204.941 10.349 3.887 193 167 2.689 466 253 119 6.411 5.007 901 63 129 250 61 515 182 59 123 333 139 194 FONTE DOS DADOS BÁSICOS: Telecomunicações do Rio Grande do Norte–TElern. Em termos de correios, a região apresenta insuficiências. Há uma agência da Empresa Brasileira de Correios, em Currais Novos, e outra em Caicó, além de 3 postos de vendas de selos e uma agência em Florânia. 3.4.3.3 A Infra-Estrutura de Energia A oferta da energia elétrica, no Nordeste das últimas décadas, foi significativamente ampliada. Os benefícios daí decorrentes alcançaram o Rio Grande do Norte e, em seu interior, a região seridoense. As áreas urbanas estão bem servidas e as cidades do Seridó seguem o padrão estadual, com uma boa cobertura. Tanto que em termos do total de consumidores, o Seridó representa 11% do total estadual. No que se refere aos consumidores residenciais, os domicílios da região têm uma participação, no total estadual atendido por energia, semelhante ao seu peso no total populacional (ambos os pesos situam-se próximo dos 11%). Os menores percentuais de domicílios com acesso a energia são encontrados na região das Serras Centrais, por conta do maior peso da população rural naquele espaço. Isso porque as áreas rurais são em menos atendidas. 159 De fato, a eletrificação rural ainda constitui uma demanda prioritária em vários municípios seridoenses, tanto que apareceu citado entre os problemas prioritários nas reuniões municipais, para os municípios de São João do Sabugi, Ipueira, Serra Negra, Ouro Branco, Cerro Corá, e Tenente Laurentino. No entanto, são carências localizadas, pois no Seridó, em seu conjunto, estavam, em 1997, 18% dos consumidores rurais do Estado, apresentando a região participação mais elevada do que a que tem no número de consumidores residenciais. No que se refere ao número de consumidores industriais, a participação da região é de 17%, o que pode ser considerada uma situação pelo menos regular. (Idema, 1998.) Em alguns municípios, o acesso à energia parece dificultado por outro motivo: o custo da tarifa da energia elétrica, considerado alto em locais como Jardim de Piranhas e São Fernando. O problema não é de oferta, mas de renda da população. Cabe ainda destacar que quando o indicador utilizado deixa de ser o número de consumidores, e passa a ser o consumo (medido em MWh), a participação do Seridó no total do Estado declina para cerca de metade de seu peso, em número de consumidores, ficando com cerca de 5,6% do total estadual, o que revela relativamente menor capacidade de consumo, tanto das famílias como da economia regional, face à de outras regiões do Estado, que fazem uso mais intensivo de energia. Isso se confirma no dado do consumo médio, inferior no Seridó ao da média estadual (0,86 e 1,14, respectivamente). Apenas Caicó tem um consumo médio superior à media estadual, e mais uma vez, o menor índice é apresentado pela ZH das Serras Centrais, segundo dados do Anuário Estatístico do Rio Grande do Norte, citados no diagnóstico produzido pelo Consórcio Tecnosolo & CEP. Para o futuro, a matriz energética do Nordeste e do Brasil tende a se modificar, com perda de importância do fornecimento da energia hidroelétrica, que predominou no passado recente. Já se verifica o crescimento da oferta de outras fontes, com destaque para o gás natural e a termelétrica. A energia solar e a energia eólica também tendem a crescer. No Seridó, não há avanços nessa direção. O Rio Grande do Norte é rico em gás natural, mas os gasodutos previstos não passam pela região. Mas levarão esse tipo de energia para outros Estados, como o Ceará e Pernambuco. Esse é um ponto relevante, que deve ser discutido no âmbito do Plano de Desenvolvimento do Seridó. Por sua vez, outras áreas do semi-árido nordestino já vêm avançando na oferta de energia solar, especialmente para localidades ou estabelecimentos isolados, onde os custos para levar a energia elétrica de origem hidráulica têm se mostrado muito altos. No Seridó esse processo é muito incipiente. 3.4.4 Tendências do Comércio Exterior A participação do Rio Grande do Norte no comércio exterior do Brasil é mínima (cerca de 0,16%, em 1997), bem menor do que em 1993, quando esteve situada em torno de 0,49%. (Decex, 1998.) Se se considerar que as exportações brasileiras não chegam a 1% do total das transações do mercado internacional, a participação dos produtos do Estado é ainda mais insignificante. No Seridó, também, as trocas comerciais com países estrangeiros são muito pequenas. Mesmo assim, o otimismo das previsões do governo federal, de atingir o marco de 100 bilhões de dólares, em produtos exportados, até o ano 2002, repercutiu da mesma forma nas previsões do Estado, para 1999, com a meta anunciada de atingir 100 milhões de dólares em mercadorias vendidas para outros países. Isso baseado na existência de um grande potencial que pode contribuir para o desenvolvimento econômico do Estado, para uma série de fatores examinados em seguida. 160 3.4.4.1 Tendências Gerais O comércio exterior do Rio Grande do Norte acompanhou nesses últimos anos a tendência da economia brasileira, marcada pelo acréscimo e superação das importações em detrimento das exportações. De acordo com a tabela 3.4.4.1, pode-se observar que as exportações apresentaram crescimento, entre 1992 e 1994, mas já a partir de 1995 houve uma inversão, e o Estado passou a importar mais do que a exportar, ostentando em 1997 um déficit recorde em sua balança comercial. Segundo dados da Sudene, as exportações se recuperaram nos últimos anos, e em 1998 o Rio Grande do Norte já apresentava pequeno superávit comercial (1/5 do valor registrado em 1992). TABELA 3.4.4.1 RIO GRANDE DO NORTE. COMËRCIO EXTERIOR - 1992/1997 ( US$ 1000 ) ANO EXPORTAÇÕES EVOLUÇÃO (EM %) IMPORTAÇÕES EVOLUÇÃO (EM %) 1992 72.950 --- 11.116. --- BALANÇA COMERCIAL 68.834 1993 1994 1995 1996 1997 1998 81.288 86.729 79.228 94.875 93.504 101.695 11,43 6,69 8,75 19,75 (1,4) 8,7 16.736 59.158 81.620 101.978 125.408 88.528 50,55 253,64 37,91 24,23 22,9 (29,4) 64.552 27.571 (2.392) (7.103) (31.904) 13.167 FONTE DOS DADOS BÁSICOS: i) Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior. Secretaria de Comércio Exterior–Secex. Departamento de Comércio Exterior–Decex; e ii) Sudene, Boletim Conjuntural, ago., 1999. Nota: Os números entre parênteses representam variação negativa. Esse déficit se deu basicamente em conseqüência das importações das empresas têxteis, 59 que reativaram o parque industrial do estado, comprando a maior parte dos novos equipamentos fora do Brasil. Assim, de acordo com dados da Subsecretaria de Comércio Exterior e Captação de Investimentos do Rio Grande do Norte, vinculada à Sintec, foram adquiridos no exterior, entre equipamentos, máquinas e matérias-primas, 131 milhões de dólares/ano, correspondendo a 2/3 do valor total das importações do Estado. Acrescente-se a isso a importação de algodão, que aumenta ainda mais nos anos seguintes, com a valorização cambial e os altos preços praticados no mercado interno. Neste sentido, observa-se que, enquanto as exportações cresceram 30,05%, as importações cresceram muito mais, ou seja, 812,06%. Esse fenômeno foi observado no País inteiro, com a abertura da economia, a política de câmbio fixo e a chegada de bens importados, que invadiram o comércio interno brasileiro. 60 Quanto a esse aspecto, é importante ressaltar o grande número de consultas realizadas no "Ponto Focal" do Sebrae-RN, para conhecer o mercado dos importados e abrir pequenos estabelecimentos comerciais. Os maiores importadores da região, localizados em Recife e Fortaleza, 59 O Programa de Apoio ao Desenvolvimento Industrial–Proadi foi constituído para apoiar e incrementar o desenvolvimento industrial, assegurando a concessão de financiamento a empresas industriais. Seu objetivo principal é o de atrair empresas industriais que possam aportar seu capital, concedendo-lhes benefícios fiscais no recolhimento de ICMS. 60 O setor de Negócios Internacionais do Sebrae-RN registrou um número considerável de consultas sobre as empresas importadoras de produtos “made in China”, que provocaram a abertura de centenas de estabelecimentos comerciais, do tipo “Tudo por R$ 1,99”, em todo o Estado do Rio Grande do Norte. Até o ano de 1998, de cada dez novos empreendimentos registrados pelo Sebrae 3 eram de pequenos comerciantes, que se instalavam levados pela febre do consumismo de produtos da economia de “miudezas”. (Sebrae-RN, 1999.) 161 desenvolveram esquemas de distribuição e abastecimento permanente a pequenas lojas, que acabaram proliferando em todo o Estado. De acordo com os dados da base de dados “Análise e Informações sobre Comércio Exterior– ALICE, no que se refere aos exportadores do Rio Grande do Norte, observa-se que as maiores empresas presentes nos registros têm sido as mesmas dos últimos 10 anos, o que traduz um mercado fechado, concentrado em grupos tradicionalmente detentores desse segmento no mercado. As iniciativas das instituições promovedoras do Comércio Exterior não têm despertado interesse na maioria dos produtores do Rio Grande do Norte, exceto para os das tradicionais áreas mais rentáveis, tipo fruticultura e pescados, que se beneficiaram dos programas de financiamento, tipo APEX, nos últimos 2 anos. As “rodas de negócios”, 61 realizadas pelo Sebrae, com o objetivo de sensibilizar produtores em potencial, têm apresentado resultados medíocres, quanto à participação e aumento de produtos na pauta de exportação do Estado. Em relação à Região do Seridó, que durante anos desempenhou papel importante com a exportação de vários produtos, verifica-se que ela está hoje reduzida a uma participação insignificante, com alguns produtos como minérios, chifres e galhadas, e produtos da Indústria de Massas. Cabe ressaltar a presença do produto “chifres e galhadas”, que compõe a pauta de exportação do Estado, mas é explorada por uma empresa localizada em Macaíba – a Medeiros Irmãos Indústria e Comércio Ltda. –, embora a matéria-prima adquirida seja comercializada em sua quase totalidade na Região do Seridó. 3.4.4.2 Principais Produtos Exportados e a Importância dos Minérios O principal produto da pauta de exportação do Rio Grande do Norte é o melão, que disputa com a castanha-de-caju o primeiro lugar na pauta estadual, constituindo o carro-chefe da fruticultura, que, juntamente com mangas, uvas, bananas e melancias, caracteriza-se como o setor mais rentável da economia exportadora do Estado. O valor e o volume relativos às exportações desses produtos vem aumentando substancialmente, nos últimos anos, consolidando o subsetor da fruticultura. Justifica-se, assim, a política de incentivos destinada à região do Vale do Açu e Mossoró, que, durante os últimos tempos, absorveu a maior parte dos recursos do governo do Estado. Em seguida à castanha-de-caju e ao melão, em 1999 (dados de janeiro a setembro), por ordem decrescente do valor exportado, vem o açúcar de cana (14%), a confeitaria (10%), o sal (8%), os tecidos de algodão (5%), o pescado (5%), 62 a confecção de malha (4,5%), 63 os couros e peles (3,8%) e a manga (3%). Merecem ainda referência o sal marinho, outros produtos de confeitaria e banana fresca. O Estado tem, assim, uma das pautas mais diversificadas do Nordeste. Mas somente no 18% lugar apareciam os minérios, em 1997, conforme dados da Secretaria de Comércio Exterior–Secex, do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, lugar que não se alterou nos dois anos posteriores. Como esse é o principal produto de exportação do Seridó, a região não tem presença que mereça destaque na pauta de exportações estadual. 61 As Rodas de Negócios são reuniões entre produtores, comerciantes e consumidores, feitas com o objetivo de facilitar a compra e venda de produtos, geralmente entre uma empresa âncora e empresas de médio e pequeno porte. O Estado realiza duas “rodas de negócios” formais – uma em setembro e outra em outubro. Além das Rodas de Negócios, foi realizado em Natal uma reunião do Encontro do Comercio Exterior–Encomex, com s participação de mais de 450 inscritos, entre empresários, agentes públicos e estudantes 62 A atividade pesqueira ainda se faz presente com a lagosta (1,6 %) e camarão (1,1%), o que eleva para 6,6% seu peso entre os principais produtos exportados pelo Estado. 63 O segmento têxtil/confecções soma a esses 4,9%, dos tecidos de algodão, 4,4% das camisas de malha e 1,8% das T-shirts, totalizando 11,1% de participação nas vendas totais, só entre os principais produtos. 162 A exportação de minérios do Estado corresponde principalmente à Scheelita, Tantalita e Sal Marinho, seguindo-se de a Berilo e Columbita. De acordo com a tabela 3.4.4.2, as exportações de bens minerais atingiram seu pico máximo, em 1980, representando 43% do total exportado (US$ 54,8 milhões do total do Estado, ou seja, US$ 23,7 milhões oriundos de bens minerais). A partir de 1996, as exportações registraram valores anuais decrescentes, caindo, no período analisado, cerca de 95,2%. Em 1996, as exportações de bens minerais representaram apenas 2,4 % do total das exportações do Estado (US$94,8 milhões, contra US$ 2,2 milhões), como é possível verificar na tabela 3.4.4.3. A scheelita e a tantalita, considerados importantes produtos da pauta de exportações, até 1980 (em torno de 38,3% do total de exportações do Estado), encontram-se hoje com dados contabilizados na rubrica “outros produtos não especificados” Alguns deles desapareceram dos registros e já não são mais comercializados. Não são numerosas as empresas da Região do Seridó que exportam seus produtos para outros países. De acordo com dados do ALICE, 64 grandes empresas estão registradas na balança comercial, no item das exportações. A maioria com produtos da industria de minérios, principalmente o Tungstênio. A tabela 3.4.4.3 contém dados sobre a relação quantidade/valor negociado por elas. Acredita-se, portanto, que o aumento das exportações de minérios, especialmente as gemas da Região de Parelhas, incrementarão os valores referentes ao comércio exterior, para as quais não há ainda registro na base ALICE, uma vez que a comercialização desses produtos só se acentuou nos últimos dois anos, com a revitalização das minas de Parelhas e a chegada de grupos estrangeiros operando no município. 65 Algumas operações não são registradas nas exportações, por alguns fatores: i) em se tratando da matéria-prima bruta, saem muitas vezes do Estado, para sofrerem processo de beneficiamento em outros estados brasileiros; e ii) saem por outros portos da região, como Cabedelo, na Paraíba, e Suape, em Pernambuco. TABELA 3.4.4.2 RIO GRANDE DO NORTE -EXPORTAÇÃO DE BENS MINERAIS – SETOR PRIMÁRIO ( US$ 1000 FOB ) BEM MINERAL Berilo Columbita Sal marinho Scheelita Tantalita Total do bem mineral Total do Estado 1980 133 133 2.362 8.024 13.054 23.707 54.894 % 0,5 0,5 9,9 33,9 55,2 100,0 43,1 1985 155 --1.740 2.033 1.867 5.795 42.659 % 2,6 --30,0 35,0 32,4 100,0 13,6 1990 % --------456 58,0 ----332 42,0 788 100,0 88.800 0,8 1995 % --------1.352 100,0 --------1.352 100,0 79.228 1,7 1996 ----2.258 ----2.258 94.876 % ----100,0 ----100,0 2,4 FONTE: NESI, Júlio de Rezende & CARVALHO, Valdecílio Galvão Duarte de (1999)- Minerais industriais do Estado do Rio Grande do Norte. Recife, Serviço Geológico do Brasil–CPRM 1999, p. 19. 64 O ALICE (Análise de Informações sobre Comércio Exterior) é uma base de dados do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio, operada pelo Departamento de Comércio Exterior–Decex, da Secretaria de Comércio Exterior–Secex daquele Ministério. Essa base é trabalhada no Rio Grande do Norte pela Subsecretaria de Comércio Exterior e Captação de Investimentos, vinculada à Secretaria de Indústria, Comércio, Ciência e Tecnologia do Rio Grande do Norte–Sintec. 65 Dentre esses grupos estão a HIR Minérios, de origem alemã, que exportou, no segundo semestre de 1999, US$ 190.000 dólares para a Alemanha, conforme informações da TerraSul–Assessoria de Comércio Exterior, na pessoa de José Suterland Guimarães Menezes, Presidente da TerraSul.. 163 TABELA 3.4.4.3 SERIDÓ. PRINCIPAIS EMPRESAS EXPORTADORAS DE MINÉRIOS, EM 1997 MINÉRIOS Zangarelhas Mineração e Comércio Currais Novos Minérios IMARF Granito e Mineração Total na Pauta de Exportações do Rio Grande do Norte QUANTIDADE (kg) 16.000 66 16.300 133.802.332 VALOR (US$ 1,000) 427.497 26.725 15.649 2.756.979 FONTE: ALICE (Análise de Informações sobre Comércio Exterior), 1997. Os dados acima revelam que as empresas exportadoras de minérios da Região do Seridó representam muito pouco, em termos de valor e volume da produção, na pauta de exportações do Estado, que foi de 16,6% do total do volume exportado, em 1997. As novas empresas que hoje atuam na região não estão registradas nas exportações de 1997, pois começaram a exportar a partir daquele ano. Confirmando-se as tendências de expansão da atividade extrativa, relacionada às gemas, espera-se que a base produtiva regional encontre aí uma saída, a partir de demandas comerciais expressivas e da eventual instalação de indústrias de transformação no Município de Parelhas. Hoje, a totalidade das exportações ainda é de produtos minerais em estado bruto, “exportando” o valor agregado do processo de beneficiamento Quanto à importação de minérios, ela é verificada para produtos como farinha siliciosa, num total de 102.380 kg, correspondendo a 0,05% do total das importações, e mármore cortado, num total de 62.800 kg, equivalente a 0,02%, segundo a base de dados ALICE (outubro, 1997). a. Problemas Detectados Atribui-se à queda dos preços no mercado internacional o principal fator de desmantelamento da indústria de minérios do Seridó, em particular a industria da scheelita. Mas os minerais industriais enfrentam outros fatores, que dificultam a comercialização de alguns produtos. Além de serem muito competitivos entre eles, muitos podem ser substituídos um pelo outro, em várias aplicações industriais. Um outro elemento importante da decadência do setor diz respeito à intensa exploração, tornando as minas mais profundas, e elevando seus custos de extração e de beneficiamento. 66 De acordo com o relatório do Ministério das Minas e Energias – Minerais Industriais do Estado do Rio Grande do Norte –, 67 a pesquisa dos minerais industriais é realizada por “uma provocação do mercado”, daí gerando empreendimentos médios e pequenos, em geral pouco competitivos e de pouca penetração no mercado. Na maioria das vezes, a sua comercialização se dá em função de demandas por parte de empresas estrangeiras que já atuam no setor. Os estudos de prospeção para os minérios do Estado têm se revelado insuficientes, pela dificuldade que o setor ostenta na comercialização e escoamento dos produtos, "protegendo" os tradicionais fornecedores dos produtos minerais. 66 Segundo o Professor Edgar Ramalho Dantas (geólogo e pesquisador dos minérios do Rio Grande do Norte), o desconhecimento técnico do processo de exploração não somente acarretou danos às minas, mas contribuiu para fragilizar o grau de competitividade do produto, nos mercados externos. (Cf. entrevista realizada em 10.01.2000.) 67 Cf. NESI, Júlio de Rezende & CARVALHO, Valdecílio Galvão Duarte de (1999)- Minerais industriais do Estado do Rio Grande do Norte. Recife, Serviço Geológico do Brasil–CPRM 1999. 164 b. Principais Países Importadores No período analisado, as exportações do Estado se destinaram a 57 países, mas principalmente para a América do Norte e Europa (com 3/4 do total das exportações), África (18%) Ásia (1,17%) e Oceania (0,51%). Dentre os principais países, estão os Estados Unidos com 1/4 das importações, seguidos da Nigéria, Reino Unido, Países Baixos, Argentina, Espanha, Portugal e Finlândia que, juntos, foram responsáveis por mais de 2/3 do total exportado. Quanto à anatomia das exportações do Estado, observa-se que as oportunidades de mercado se concentram basicamente em alguns países, como os Estados Unidos (principal comprador de frutas e pescado) e a Nigéria (grande importador de sal e açúcar). Os acordos firmados com o Mercosul, para ampliar as relações comerciais com estados do Nordeste, pouco tem contribuído para aumentar as exportações do Rio Grande do Norte, para os países do Cone Sul. Apenas algumas empresas do subsetor de fruticultura, como a Directivos – exportadora de bananas – (que envia 30% das suas exportações para a Argentina), têm de fato penetrado no mercado da América Latina. Paralelamente, as importações provenientes da Argentina ocuparam o segundo lugar na pauta de importações do Estado. 3.4.5 Tendências da Renda Regional O processo de formação e o comportamento recente da renda apropriada pelos seridoenses constituem pontos relevantes do diagnóstico da Dimensão Econômica. A dinâmica do mercado da própria região e dos lugares mais próximos é muito importante, pois sua base exportadora é modesta, como se viu antes. Busca-se, assim, dimensionar o nível da renda global e verificar as tendências mais importantes de processo de geração e apropriação da renda na região. O consumo das famílias e das empresas locais são elementos importantes na vida econômica seridoense, especialmente nos tempos atuais. 3.4.5.1 A Dimensão da Economia Regional: o PIB e a Renda Segundo o Ibge, o PIB, a preços de mercado, do Rio Grande do Norte era estimado em R$ 6,6 Bi, em 1997 (último ano para o qual se dispõe de informação), representando 5,8 % do total da produção do Nordeste e 0,7% do total brasileiro. Em meados da década anterior (1985), a participação da economia norte-rio-grandense na economia nordestina era pouco menor (5,5%), mas seu peso no total nacional era semelhante. Para a Sudene, que estima o PIB dos estados do Nordeste, a produção do Rio Grande do Norte e do Nordeste, em seu conjunto, no mesmo ano, era maior (R$ 8,4 bilhões para o Estado e R$130,4 bilhões para o Nordeste, segundo a estimativa a custo de fatores, e de R$ 9,0 bilhões e R$139,0 bilhões, respectivamente, para a estimativa a preços de mercado). Isso fazia o peso norte-rio-grandense subir para 6,5% no total nordestino. Tomando como referência os dados do Ibge, cuja estimativa apresenta um valor menor do que o da Sudene, o PIB per capita do Rio Grande do Norte, naquele mesmo ano, era de R$ 2.522,00 (estimando-se uma população de 2,593 mil pessoas). Ora, estimativas realizadas com base nos dados universais do recenseamento de 1991, pelo mesmo Ibge, demonstraram que a renda familiar per capita, média, da Região do Seridó (R$ 510,00, a preços da época) correspondia a 71% da mesma renda per capita média, calculada para o Estado do Rio Grande do Norte, em seu conjunto (que era de R$ 720,00) . 165 Como esse percentual não tende a apresentar mudanças bruscas a prazo curto, é possível adotálo para estimar, em primeira aproximação, o PIB per capita do Seridó. Assim procedendo, percebe-se que esse indicador elevou-se para R$ 1.790,00, em 1997 (ou seja, 71% do valor estadual). Como a população do Seridó, naquele ano era de cerca de 290 mil pessoas, pode-se estimar, grosso modo, na ausência de um cálculo concreto e preciso, que se gera naquela região um PIB de cerca de R$ 520 milhões, valor que corresponderia a uma primeira aproximação do montante da Renda Interna Regional. Isso nos permitiria afirmar que a economia da Região do Seridó responde por algo em torno de 8% do total da economia estadual e a menos de 0,5% da economia do Nordeste, em seu conjunto. Como a Sudene dispõe de uma série mais longa, pode-se destacar um aspecto muito importante: a economia do Rio Grande do Norte vem aumentando sua importância na Região, passando de uma participação de 5,1%, na década de 70 para 5,9 % nos anos 80, e para 6,5 % nos anos 90 (199098). Para ter ganho posição, a economia norte-rio-grandense cresceu, nas últimas década, a um ritmo mais intenso que a média nordestina. Esse dinamismo, como ressaltam diversos estudos sobre o Estado, não foi semelhante, nas suas diversas regiões. Se concentrou na Zona Homogênea do Litoral Oriental – onde Natal tem apresentado forte tendência expansiva, sobretudo para os padrões atuais da economia brasileira e nordestina –, na região do Vale do Açu – onde a fruticultura irrigada marcou presença nos anos recentes – e na ZH Mossoroense, especialmente com a presença da atividade petrolífera, realizada pela Petrobrás, mas onde se extrai também o sal marinho e o gás natural. TABELA 3.4.5.1 NORDESTE, RIO GRANDE DO NORTE E SERIDÓ. PIB A PREÇOS CORRENTES, EM 1997 (R$ bilhões) ESPECIFICAÇÃO NORDESTE Rio Grande do Norte Rio Grande do Norte/Nordeste (%) BRASIL Rio Grande do Norte/Brasil (%) Seridó Seridó/Rio Grande do Norte (%) FONTE DA INFORMAÇÃO PRODUZIDA PIB a Preços de Mercado (Sudene) PIB a Preços de Mercado (Ibge) 139,0 113,0 9,0 6,6 6,5 5,8 864,1 864,1 1,0 0,7 0,7 8,0 FONTES DOS DADOS BÁSICOS: i) Sudene. Boletim Conjuntural, ago., 1999; e ii) Ibge. Contas Regionais do Brasil: 1985-97. Mimeogr. * Estimativa, conforme explicado no texto acima. Por sua vez, as atividades econômicas do Agreste e do Sertão norte-rio-grandense não têm sido igualmente dinâmicas. Como o Seridó situa-se na porção sertaneja do Estado, apresenta-se com mais dificuldade para expandir sua base produtiva, nas duas últimas décadas. Isso explica a percepção que se dissemina entre a população seridoense de que a região precisa de um tratamento especial, principalmente no que se refere às políticas públicas. É que, enquanto a moderna base de fruticultura recebia investimentos relevantes e se expandia no Vale do Açu, a principal atividade agrícola do Seridó – o algodão – entrava em crise profunda, da qual não se 166 recuperou ainda. Ao mesmo tempo, enquanto a Petrobrás se instalou na região noroeste do Estado, transformando o Rio Grande do Norte no segundo produtor de petróleo do Brasil, e num importante fornecedor de gás natural, no Seridó, a atividade mineradora entrou em crise. A concorrência da China no mercado mundial de Scheelita, onde oferecia produtos a preços muito mais baixos, levou a crise à Zona Homogênea de Currais Novos. Enquanto a base produtiva regional teve que enfrentar essas dificuldades, a renda apropriada pela população foi sendo ampliada através de transferências, como se verá a seguir. 3.4.5.2 A Renda Regional e a Importância de Diversas Transferências Os dados disponíveis sobre a renda média das famílias do Seridó mostram que a sociedade regional apresenta uma situação muito mais desfavorável de acesso à renda do que a média do País. Nos diversos anos da pesquisa censitária realizada pelo Ibge, mesmo nos municípios de melhor renda da região (Caicó e Currais Novos), as famílias dispunham de apenas 62% e 53%, respectivamente, da renda familiar média do brasileiro. Na grande maioria dos municípios, a renda familiar média local flutua entre 20% e 45% do valor médio do País. Há casos com valores médios ainda mais baixos, como o de Santana do Matos. A tabela 3.4.5.2 contém informações a este respeito, para os anos de 1970, 1980 e 1991. Cabe, de saída, ressaltar que o dado inicial apresentado em 1970 sugere uma melhoria da situação, mas o ano base, nesse caso, não pode ser tomado como referência, pois a pesquisa surpreendeu a região em ano de seca, situação em que a crise da produção afeta fortemente a renda monetária das famílias em todo o semi-árido do Nordeste, e, portanto, também, no Seridó. As mudanças na base produtiva regional, e em especial a crise de suas atividades mais representativas (algodão, pecuária e mineração) têm se constituído em fator central para dificultar uma maior expansão dos níveis regionais de renda. Por sua vez, na totalidade dos municípios seridoenses, inclusive Caicó, mais de metade das famílias vive com renda considerada insuficiente, nos estudos especializados. A situação é muito mais grave do que na média do País, onde, no início da década de 90, cerca de 45% das famílias brasileiras se encontravam nessa situação de insuficiência, o que já é um percentual muito elevado. No Seridó, os dados mostram que, a exceção de Caicó, todos os municípios têm mais de 60% das famílias com renda considerada insuficiente. O quadro antes descrito, que demonstra a dificuldade das atividades econômicas regionais de gerarem e distribuírem renda, é atenuado pela presença de rendimentos acessados pela população, por intermédio de transferências que lhes chegam de outras partes de País, e até do exterior. Dentre essas transferências, se destacam as que são feitas entre esferas de governo, por meio do FPM (da União para as Prefeituras), da distribuição de quotas dos 25% do ICMS arrecadado e dos 50% do IPVA recolhido pelo governo estadual. No item 3.5 (Dimensão Social) se fará uma análise mais detalhada sobre essas transferências, mas aqui cabe destacar que parte importante desses recursos, ao chegarem aos municípios, são transformados em renda familiar, via pagamento aos funcionários municipais, via compra de bens e serviços de ofertantes locais, etc. Acrescente-se a esses fluxos outras transferências como as do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério–Fundef (que se transforma em salários de professores) e como as de vários programas sociais dos governos federal e estadual. 167 TABELA 3.4.5.2 SERIDÓ DO RIO GRANDE DO NORTE. RENDA FAMILIAR, NOS ANOS DE 1970, 1980 E 1991 RENDA FAMILIAR MEDIA PER CAPITA PORCENTAGEM DE PESSOAS COM (Salário Mínimo de Setembro de 1991) RENDA INSUFICIENTE (P0 ) MUNICÍPIO 1970 1980 1991 1970 1980 1991 Acari 0,18 0,48 0,51 94,19 71,05 71,21 Caicó 0,30 0,74 0,81 86,55 59,06 53,28 Carnaúba dos Dantas 0,18 0,56 0,47 96,65 59,96 70,06 Cerro Corá 0,15 0,34 0,27 97,24 85,81 88,12 Cruzeta 0,18 0,42 0,56 93,85 72,23 66,82 Currais Novos 0,28 0,72 0,70 88,92 59,62 65,73 Equador 0,15 0,49 0,36 98,42 68,30 82,77 Florânia 0,16 0,33 0,31 95,97 84,29 85,19 Ipueira 0,16 0,41 0,52 95,59 80,32 73,95 Jardim de Piranhas 0,12 0,46 0,59 99,37 81,09 62,95 Jardim do Seridó 0,23 0,65 0,55 91,07 55,74 67,89 Jucurutu 0,12 0,42 0,40 97,75 77,39 79,82 Lagoa Nova 0,11 0,27 0,26 97,98 86,91 87,20 Ouro Branco 0,16 0,36 0,43 96,77 79,87 76,69 Parelhas 0,21 0,65 0,46 93,19 57,28 72,49 Santana do Matos 0,13 0,24 0,22 98,07 89,60 91,63 Santana do Seridó 0,14 0,40 0,34 97,45 71,37 80,35 São Fernando 0,16 0,49 0,41 96,21 71,30 77,82 São João do Sabugi 0,19 0,44 0,54 95,57 78,06 67,89 São José do Seridó 0,12 0,40 0,55 98,57 77,85 71,11 São Tomé 0,18 0,38 0,30 96,27 78,93 86,06 São Vicente 0,12 0,32 0,38 99,08 82,71 75,75 Timbaúba dos Batistas 0,22 0,54 0,59 95,29 60,90 62,52 Brasil 0,63 1,43 1,31 67,90 39,47 45,46 FONTE DOS DADOS BÁSICOS: Pnud. Ipea (1996)- Relatório sobre o desenvolvimento humano no Brasil Rio de Janeiro: Ipea; Brasília: Pnud, 1996. Programas e projetos assistenciais ou promotores de emprego e renda em unidades de pequeno porte, implementados por entes não-governamentais e financiados com recursos públicos ou privados (muitos até internacionais) também contribuem para ampliar o nível de rendimentos das famílias seridoenses. Cabe, especialmente, destacar o papel que vem sendo desempenhado desde o final dos anos 80, pelas transferências via sistema de aposentadoria, ampliado pela Constituição Federal de 1988, e que beneficiam bastante regiões com o perfil do Seridó. Segundo os dados da tabela 3.4.5.3, havia na região 27.149 pessoas de 10 anos e mais, recebendo benefícios da aposentadoria ou de pensões. 68 Como na mesma ocasião, a população total dessa faixa etária na Região do Seridó abrangia 228.050 pessoas, pode-se estimar que 12% eram beneficiários do Sistema Previdenciário. 68 O que representava 12,7 % do total de beneficiários do Estado do Rio Grande do Norte. 168 TABELA 3.4.5.3 RIO GRANDE DO NORTE. APOSENTADOS E PENSIONISTAS DE 10 ANOS E MAIS DE IDADE, EM 1991 LOCALIDADE NÚMERO % Estado 214.076 100,0 Seridó 27.149 12,7 Serras Centrais 6.394 3,0 Caicó 11.086 5,2 Currais Novos 9.669 4,5 FONTE DOS DADOS BÁSICOS: Ibge, Censo Demográfico de 1991. Em anos recentes, o contingente de seridoenses com 10 anos e mais cresceu para cerca de 235 mil pessoas. Supondo, numa hipótese conservadora, que o percentual dos beneficiários não se elevou (continuando a ser de 12%), pode-se estimar que cerca de 28,2 mil habitantes do Seridó recebem rendimentos da previdência social. Pesquisa recente, encomendada pelo Ipea, levantou dados diretos da renda média dos aposentados e pensionistas em diversos municípios do Seridó, chegando a estimar que essas pessoas recebem R$ 142,00 mensais, 69 durante os meses do ano, além do 13º salário. Com base nesse rendimento médio, estima-se que circule na economia local, mensalmente, cerca de R$ 4 milhões, provenientes de tal rendimento, transferido pelo Sistema da Previdência. Multiplicando-se esses valores mensais por 13 meses (incluindo a gratificação natalina conhecida como 13º salário), pode-se estimar que é transferido e circula na região um valor anual, médio, de R$ 52 milhões. Isso representa cerca de 10% da renda regional, estimada em R$ 520 milhões, como foi discutido no item 3.4.5.1 anterior. Trata-se de um volume não desprezível, tanto em virtude da dimensão da economia da maioria dos municípios seridoenses, como diante dos níveis médios de renda da maioria da população. Evidências a este respeito foram obtidas nas entrevistas, nas quais sempre foram feitas referências à ampliação do movimento de vendas na região, no período de pagamento dos aposentados e pensionistas. Nos anos de seca, como os de 1998 e 1999, também se observa uma outra forma de transferência, via programa público de assistência às famílias atendidas pelo Programa de Emergência de Seca. Na seca de 1999, segundo informações do Grupo Executivo que gerencia o referido Programa no Estado, foram atendidas 17.360 pessoas no Seridó, número que representava 19% do total da população rural da região, e 16% do número de alistados no Estado como um todo. 70 Lembre-se, a propósito, que o Seridó abriga cerca de 11% da população residente no Rio Grande do Norte. O atendimento à população é feito por meio da distribuição de cestas básicas de alimentos, que funcionam como uma importante fonte de renda não-monetária, e do pagamento de rendimento monetário, que na seca de 1999 correspondia a R$ 65,00 por pessoa (o que representa 47,8% do valor do salário mínimo vigente no País). A região capta, assim, mensalmente, R$ 2,25 milhões, dessa fonte, o que, em números anuais, chega aos R$ 27 milhões (ou seja, 5,2% do valor da renda anual aqui estimado para a região, ou valor que representa 52% do montante, já referido, transferido anualmente aos pensionistas e aposentados pelo Sistema Previdenciário). Finalmente, cabe referir as transferências privadas interfamílias, prática usual na sociedade do Seridó, onde a emigração é fato comum e o sentimento de solidariedade é bastante presente. Seridoenses residentes em outras regiões e países costumam enviar renda (monetária e não monetária) 69 70 Valor pouco acima do salário mínimo vigente até o final de abril de 2000, que era de R$ 136,00 por mês. Veja-se a tabela 3.5.3.9, no Item 3.5 adiante. 169 para seus familiares. Um primeiro levantamento, nos Correios de Caicó e de Currais Novos, confirma esse tipo de fluxo, vez que registra envio de R$ 170,6 mil no ano de 1999, sob a forma de vale postal (o que dá cerca de 103 salários mínimos por mês). Dada a importância dos volumes de renda transferidos é que se explica, em grande parte, porque a crise econômica que afetou, nos últimos anos, tão duramente diversas atividades de peso no Seridó, não gerou uma crise social ainda mais grave. A pobreza da população é um dado perceptível, mas parte do dinamismo registrado no comércio local, nos serviços e na vida cultural é financiado por meio desses diversos tipos de transferência. 3.4.6 Tendências da Receita Pública Serão abordadas no contexto de sua geração, viabilizada pelas receitas dos municípios do Seridó e pela composição das diferentes formas de transferências recebidas pela região. Mas antes dessa análise cabe destacar um problema experimentado pelas atividades econômicas da região, especialmente as de menor porte: a implementação pela Secretaria Estadual da Tributação de regime de antecipação tributária para diversos produtos. Isso, na prática, reduz um fator escasso no Seridó: capital de giro das empresas de menor porte. Mesmo a adoção do SIMPLES, específico e benéfico para pequenas empresas, vem tendo sua regulamentação postergada no Estado (embora exista legislação aprovada desde 1999). 3.4.6.1 Receita dos Municípios do Seridó Cabe, de início, destacar que o valor da receita pública das diversas municipalidades integrantes do Seridó é muito pequeno, tendo alcançado pouco menos de R$ 54 milhões, em 1997, valor semelhante, portanto, ao das transferências realizadas pela Previdência Social (estimada em R$ 52 milhões, no item 3.4.5.2 anterior). TABELA 3.4.6.1 RECEITAS DOS MUNICÍPIOS DO RIO GRANDE DO NORTE E DO SERIDÓ, EM 1995 (Em R$ 1.000,00) RECEITA TOTAL RECEITAS CORRENTES ESTADO E ZONAS HOMOGÊNEAS VALOR % VALOR % Caicó 27.100 4,7 24.946 4,5 Currais Novos 9.451 1,6 8.657 1,6 Serras Centrais 17.381 3,0 15.977 2,9 Seridó 53.932 9,4 49.580 9,0 ESTADO 570.167 100,0 551.396 100,0 FONTE DOS DADOS BÁSICOS: Idema. Anuário Estatístico de 1998. RECEITAS DE CAPITAL VALOR % 2.154 11,5 794 4,2 1.404 7,5 4.352 23,2 18.771 100,0 Mesmo assim, a Região do Seridó tem um peso maior na geração da receita arrecadada pelo conjunto dos municípios do Estado (9,4%) do que sua participação no PIB estadual (cerca de 8%). Isso em parte tem a ver com a importância das transferências (correntes e de capital), captadas pelos municípios da região. 170 TABELA 3.4.6.2 TRANSFERÊNCIAS RECEBIDAS PELAS PREFEITURAS DOS MUNICÍPIOS DO RIO GRANDE DO NORTE E DO SERIDÓ, EM 1997 (R$ 1.000,00) TRANSFERÊNCIAS CORRENTES VALOR % VALOR % Caicó 24.165 5,2 22.194 4,8 Currais Novos 8.764 1,9 8.055 1,8 Serras Centrais 15.801 3,4 14.540 3,2 Seridó 48.730 10,5 44.819 9,8 ESTADO 464.263 100,0 456.697 100,0 FONTE DOS DADOS BÁSICOS: Idema. Anuário Estatístico de 1998. ESTADO E ZONAS HOMOGÊNEAS TOTAL TRANSFERÊNCIAS DE CAPITAL VALOR % 1.971 26,0 679 9,0 1.261 16,7 3.911 51,7 7.566 100,0 A tabela 3.4.6.2, anterior, revela que os municípios seridoenses captaram sob a forma de transferências R$ 48,7 milhões, em 1997, valor que representa 90,3% da Receita Total por eles apropriada. Isso confirma a importância das transferências para o financiamento da atividade pública realizada pelas municipalidades, como ocorre na imensa maioria dos municípios do Nordeste, onde essa dependência também se faz notória. E segue igualmente, como se vê na tabela 3.4.6.3, o padrão observado para municípios do porte (até 20 mil habitantes) da quase totalidade dos que integram o Seridó, 71 em estudo sobre as finanças municipais realizado, recentemente, pelo Centro Josué de Castro, no qual foram analisados os municípios de todas as regiões do Estado. TABELA 3.4.6.3 RIO GRANDE DO NORTE. GRAU DE DEPENDÊNCIA DOS MUNICÍPIOS (%), NOS ANOS DE 1991 a 1996 CATEGORIAS MUNICIPAIS 1991 1992 1993 1994 1995 Até 20.000 Habitantes 81,78 91,68 92,21 89,35 92,38 De 20.000 até 50.000 Habitantes 80,57 81,53 83,69 90,45 91,82 De 50.000 até 100.000 Habitantes 72,76 84,06 81,65 90,43 87,66 Mais de 100.000 Habitantes 62,20 62,35 65,81 81,65 84,88 Capital 54,69 48,93 60,35 FONTE DOS DADOS BÁSICOS: Centro Josué de Castro, Finanças Municipais. Recife, Pernambuco, 1999. 3.4.6.2 1996 90,49 88,12 83,42 80,19 68,85 Composição das Transferências Finalmente, cabe destacar que as transferências realizadas pelo Fundo de Participação dos Municípios–FPM são muito mais importantes, como fonte de recursos para a região, do que as captadas por intermédio das cotas correspondentes à distribuição dos 25% do ICMS que o governo estadual arrecada e é obrigado a distribuir com os municípios. Em 1997, foram 6,6 vezes maior, como se vê na tabela 3.4.6.4. Nela se observa que esse fato se repete para todas as Zonas Homogêneas que integram o espaço seridoense, mas que é especialmente verdadeiro na ZH das Serras Centrais, onde a participação do ICMS na receita dos municípios é muito reduzida (33,5 vezes menor do que a do FPM, em 1997, enquanto nas outras duas ela é pouco mais de 4 vezes maior). 71 Só Caicó e Currais Novos têm população superior. 171 Essas duas formas de transferência, juntas, geraram R$ 41,9 milhões, como se vê tabela referida, ou seja, 86% dos R$ 48,7 milhões de transferências totais captadas pelos municípios naquele ano. 3.4.7 Problemas e Potencialidades As evidências apresentadas mostram que a economia do Seridó se encontra em meio a um processo de reestruturação, após a crise profunda que afetou dois de seus principais pilares, nos anos 80 e 90. O impacto da crise afetou fortemente a renda regional, especialmente a que era apropriada pelos grades produtores – que correspondia, obviamente, à maior parte, face ao restrito grau de apropriação dos pequenos produtores, parceiros e assalariados, como revela o índice de concentração da Renda, aqui apresentado. As camadas mais pobres foram apoiadas por transferências de diversos tipos, e têm sobrevivido dos pequenos negócios, muitos deles integrantes da chamada “economia informal”, tanto em pequenas indústrias como no comércio e na prestação de serviços. A migração para as áreas urbanas melhorou para muitos o acesso a serviços públicos – muito mais precário nas áreas rurais. A pobreza é uma marca da vida social seridoense, mas a miséria é menos evidente do que em outras áreas, até mais ricas e dinâmicas, do próprio Estado e do País. Mas a alta relevância do trabalho infantil em diversas dessas pequenas unidades produtivas é um dos fatos reveladores da fragilidade desse processo de reestruturação produtiva em curso. As elites empresariais locais buscaram a diversificação de suas atividades – o que refletiu na diversificação do próprio tecido econômico local, nos anos recentes. Mas são atividades que não têm, ainda, a dimensão, o potencial de acumulação e o vigor das que as antecederam. E procuraram salvar o patrimônio que acumularam, transferindo-o, em parte, para outras áreas, em especial para Natal. A presença de empresários de fora ainda é incipiente na economia regional. Surpreendida pela crise, em meio à crise mais ampla da economia brasileira e ao aprofundamento da crise financeira do setor público do País – antes um importante patrocinador do desenvolvimento econômico –, a região não tem contado com políticas públicas que tenham tido peso significativo em apoio à sua busca de novos caminhos. O Programa do Leite, de iniciativa estadual, é que mereceu mais referências na ampliação da pecuária leiteira regional – segmento tradicional e que ganha relevância nos anos recentes, fazendo da região a segunda bacia leiteira do Estado. O Programa de Adutoras (Recursos Hídricos) tem ampliado o acesso à água na região e o Programa de Combate à Pobreza Rural–PCPR tem levado apoio a pequenas iniciativas de produtores rurais, estimulando algumas cadeias produtivas locais. Mas o Seridó, como de resto o semi-árido, onde não existem grandes vales, com água em maior disponibilidade (como o do São Francisco e o do Açu), não está entre as áreas dinâmicas que receberam prioridade por parte dos Programas de Investimentos Federais (como o Brasil em Ação e o Avança Brasil). O Banco do Nordeste é o órgão de fomento do Governo Federal que tem marcado alguma presença no Seridó. Junto com uma ainda modesta ação do Sebrae, tem apoiado essas pequenas iniciativas dos produtores urbanos locais. Na realidade, a economia urbana de base local é que tem dado sustentação à vida econômica seridoense, com a demanda local ampliada pelas transferências, como se mostrou antes. Com base neste sucinto diagnóstico, pode-se partir para apresentar, de forma sintética, os principais Problemas e as mais relevantes Potencialidades com que a região conta para avançar na 172 reestruturação de sua base econômica e construir um processo de desenvolvimento sustentável, num futuro próximo. TABELA 3.4.6.4 SERIDÓ. TRANSFERÊNCIAS DA COTA DO ICMS E DO FPM, EM 1997 ICMS FPM ZONAS E SUBZONAS HOMOGÊNEAS E MUNICÍPIOS (R$ 1,00) (%) (R$ 1,00) (%) IV – Zona de Currais Novos 2.052.666 1,7876 9.320.723 6,0 Acari 94.389 0,0822 1.242.761 0,8 Carnaúba dos Dantas 125.392 0,1092 932.073 0,6 Currais Novos 1.318.915 1,1486 3.106.910 2,0 Equador 90.714 0,0790 932.073 0,6 Parelhas 269.846 0,2350 1.864.145 1,2 São Tomé 153.410 0,1336 1.242.761 0,8 V – Zona de Caicó 2.882.069 2,5099 13.981.089 9,0 Caicó 1.914.873 1,6676 3.106.910 2,0 Cruzeta 182.232 0,1587 932.073 0,6 Ipueira 3.100 0,0027 932.073 0,6 Jardim de Piranhas 176.835 0,1540 1.242.761 0,8 Jardim do Seridó 263.530 0,2295 1.242.761 0,8 Ouro Branco 29.855 0,0260 932.073 0,6 Santana do Seridó 23.310 0,0203 932.073 0,6 São Fernando 8.268 0,0072 932.073 0,6 São João do Sabugi 23.769 0,0207 932.073 0,6 São José do Seridó 203.246 0,1770 932.073 0,6 Serra Negra do Norte 47.080 0,0410 932.073 0,6 Timbaúba dos Batistas 5.971 0,0052 932.073 0,6 VI – Zona das Serras Centrais 398.568 0,3471 13.359.707 8,6 Subzona de Santana do Matos 255.378 0,2224 9.010.034 Bodó 230 0,0002 932.073 0,6 Cerro Corá 40.764 0,0355 1.242.761 0,8 Florânia 46.735 0,0407 1.553.455 1,0 Lagoa Nova 81.758 0,0712 1.242.761 0,8 Santana do Matos 66.371 0,0578 2.174.838 1,4 São Vicente 18.487 0,0161 932.073 0,6 Tenente Laurentino Cruz 1.033 0,0009 932.073 0,6 Subzona de Jucurutu 143.190 0,1247 4.349.673 Campo Grande 38.697 0,0337 1.553.455 1,0 Jucurutu 103.345 0,0900 1.864.145 1,2 Triunfo Potiguar 1.148 0,0010 932.073 0,6 SERIDÓ 5.333.303 9,6363 36.661.519 23,6 FONTE DOS DADOS BÁSICOS: Instituto de Desenvolvimento Econômico e Meio Ambiente do Rio Grande do NorteIdema (1998)- Anuário estatístico; Rio Grande do Norte, 1998. Natal-RN, 1998. 3.4.7.1 Principais Problemas Listam-se, a seguir, os principais problemas aqui constatados. • Presença insuficiente de atividades e empreendimentos econômicos de maior peso, com capacidade para impulsionar o crescimento da produção regional e disseminar seus efeitos em 173 termos de geração de renda ou criação de oportunidades de inserção da população ativa na vida econômica regional. Algumas dessas atividades perderam condições de competitividade (em especial a produção de algodão e a de mineração do Tungstênio), por causas internas ou por impactos de processos e políticas externas à região. As atividades emergentes ainda não se fazem suficientemente fortes para comandar um novo ciclo de dinamismo econômico na região; • Dificuldades de acesso ao crédito por parte dos produtores de menor porte, em função do alto custo atual do dinheiro, das exigências em termos de garantias reais, no âmbito do atual ambiente macroeconômico do País; • Estrutura fundiária marcada pelo binômio latifúndio-minifúndio, com importante carência de processo que promova uma melhor distribuição e regularização fundiária; • Reduzida oferta de serviços de assistência técnica, em especial aos pequenos produtores e aos produtores familiares das atividades agropecuárias. Os serviços oferecidos por órgãos governamentais têm se reduzido e os prestados por entidades não governamentais têm oferta ainda muito insuficiente; • Produtividade média relativamente baixa no tecido econômico regional, com acesso reduzido a novas tecnologias em diversas atividades e baixa qualificação da mão-de-obra, além de resistências culturais a mudanças; • Gargalos localizados de infra-estrutura assim como insuficiente oferta e elevado custo da energia em alguns locais. Problema referido em alguns municípios, como Jardim de Piranhas, São Fernando (alto custo da tarifa da energia elétrica); São João do Sabugi, Ipueira, Serra Negra, Ouro Branco, Cerro Corá, Tenente Laurentino (reduzida oferta de eletrificação rural). A oferta insuficiente de Telefonia Rural foi indicada como presente em Currais Novos; • Acesso da região ao gás natural. Presentemente, o Seridó está fora das rotas de acesso ao gás natural, recurso energético abundante no Estado – que o fornece a outros Estados do Nordeste –, mas não há previsão para levá-lo ao Seridó; • Falta de incentivo e de estruturas de fomento adequadas para promover a cultura empreendedora da população e apoiar as numerosas iniciativas de pequeno porte, que hoje constituem o essencial do tecido econômico seridoense; • Cultura associativa ainda pouco disseminada entre os produtores locais, em momento no qual a cooperação tem sido largamente usada como elemento chave das estratégias de competitividade, ao longo das cadeias produtivas; • Estruturas de comercialização desfavoráveis aos produtores, com a presença de muitos intermediários; • Alta freqüência com que vem ocorrendo secas, ampliando a carência da oferta de água e prejudicando a colheita de lavouras tradicionais da região (como o feijão e a mandioca), com impactos importantes na vida econômica das populações que vivem na zona rural; 174 • Futuro do Programa do Leite, que criou uma demanda institucional importante para o desenvolvimento da bacia leiteira local nos anos recentes, mas que precisa ter uma perspectiva de futuro melhor definida, para que os produtores se planejem face ao cenário mais provável a ser construído; e • atividades. 3.4.7.2 Presença relevante do trabalho infantil (cerca de 4.000 crianças) em diversas Potencialidades O futuro do Seridó pode ser construído a partir de potencialidades como as sintetizadas a seguir. • Presença na região da segunda bacia leiteira do Estado, com tendência à diversificar a geração de produtos, ao longo da cadeia produtiva, desenvolvendo a indústria de laticínios numa região que já tem uma “marca” importante na visão dos consumidores do Estado e do País; • Dinamismo e diversidade da base econômica urbana local, desenvolvida a partir de forte capacidade de iniciativa da população seridoense, demonstrada pela presença de inúmeras pequenas empresas de diversos segmentos da indústria e dos serviços; • Potencial para expansão de diversas atividades e sua cadeia produtiva, em especial a ovino-caprinocultura, a piscicultura, a fruticultura, o turismo e o artesanato; • Conceito positivo entre os consumidores da “marca SERIDÓ”, que começa a ser trabalhado pela iniciativa privada seridoense, numa época em que esse tipo de patrimônio é crescentemente valorizado; • Tradição comercial da região, que fornece um lastro importante ao desenvolvimento das atividades de distribuição de mercadorias e serviços; • Presença de importante riqueza mineral, com possibilidade de exploração racional, se devidamente apoiada; • Relativamente boa base educacional da população da região, que tem tradição na oferta dos serviços ligados à educação e cuja base vem sendo ampliada nos anos recentes; • Melhoria da capacidade tecnológica em alguns segmentos da economia local; e • Existência de uma base inicial de cooperativas, que precisa ser fortalecida e ampliada, mas que no caso das mais exitosas já funcionam como fato positivo na região. 3.5 DIMENSÃO SOCIOCULTURAL Trata-se aqui de aspectos demográficos, de emprego e relações de trabalho, de questões de cultura, educação, saúde, saneamento básico (abastecimento de água e esgotos) e habitação na Região do Seridó, com os desdobramentos permitidos pela base de informação disponível. Muitas das explicações da dinâmica demográfica e do emprego, bem como de aspectos relativos às condições de vida da população, foram discutidos no item 3.4 (Dimensão Econômica). Algumas delas serão aqui 175 consideradas e repetidas, sempre que necessário, por questões de ênfase ou de melhor compreensão das questões abordadas. 3.5.1 Cultura e Identidade no Seridó Quando se fala em Seridó, vêm à tona algumas imagens que delineiam a noção de um lugar particular. Neste sentido, existe a percepção de que há uma recorrência ao Seridó – ou dos enunciados que o formam – em vários discursos que circulam no imaginário estadual e regional. É bastante sugestivo que o Seridó exerça essa marcação no campo discursivo, a ponto de ser uma região tão nitidamente pronunciada nesse recorte estadual, vis-à-vis outras regiões. 72 Tal evidência termina por imprimir uma visibilidade regional específica, associada a determinados padrões identitários. Obviamente, tem-se clareza de que essa identidade regional existe por meio de um efeito do poder, produzido por uma construção histórica que se entranhou e se emaranhou na memória social, ao longo de séculos de ocupação humana na ribeira do Seridó. Também é certo que, ao discorrer sobre elementos identitários, tem-se clareza de que tais elementos não serão encontrados em “estado puro”, consubstanciados em um tipo ou estereótipo humano, flagrantemente reconhecido como “o seridoense”. É possível, a partir de determinadas recorrências discursivas, culturalmente configuradas no Seridó, detectar alguns traços distintivos de sua feição regionalista. Pode-se analiticamente isolar características de maior realce. Assim, os componentes dessa rede de significações estão ancorados, basicamente, em quatro instâncias: a religiosa, a política, a socioeconômica e a educacional.73 Esses quatro mananciais são responsáveis pela formação da identidade regional seridoense, tal como ela é encenada e atualizada no imaginário da maioria da sociedade que vive no Seridó. 3.5.1.1 Instância Religiosa Decerto que, além da religião católica, outros credos e confissões religiosas hoje encontram abrigo e espaço no território seridoense. Os evangélicos foram os primeiros que se constituíram como contraponto religioso aos católicos no Seridó; posteriormente, ou concomitante a eles, vieram outras fés: manifestações espirituais afro-brasileiras, Testemunhas de Jeová, Espíritas Kardecistas e, ultimamente, os Mórmons. Um leque considerável de subjetividades e práticas espirituais a campearem em prados majoritariamente católicos. Entretanto, há uma persistência do referencial cristão, que se encontra imantado no imaginário seridoense com uma aderência identitária muito forte. Isto porque, inegavelmente, a religião católica tem um caráter de fundação e instituição de um estilo de pensar, de viver e de delimitar espaços nos sertões seridoenses. Assim, a primeira constatação aponta para o fato de que essa instância contribui decisivamente para a constituição do território seridoense, ou aquele que mais se aproxima da atual delimitação para fins de planejamento. E aqui é necessário que se adiante e se admita que esse território tem especificidade tanto geográfica quanto cultural. Primeiramente, é necessário discutir a territorialização cartográfica, de forma a precisar quais são as possíveis determinações que, neste sentido, a religião católica investiu no Seridó. 72 Decerto que outras regiões aparecem no discurso, mas sem a clareza com que se configura o Seridó. É evidente que elas não se hierarquizam, nem tampouco podem ser entendidas como estanques e fechadas em esferas incomunicáveis. 73 176 Espaço povoado pela expansão da pecuária pelos sertões, por volta da segunda metade do século XVII, o Seridó foi, a princípio, somente uma ribeira, que ao se espraiar pelos chãos sertanejos demarcava, a partir de suas margens, os espaços das fazendas. Com o aumento da complexidade da vida sertaneja, diminutos núcleos urbanos foram tímida e vagarosamente surgindo. População e economia voltadas para as atividades pastoris foram se avolumando e gerando maiores demandas pelo poder espiritual e secular. A princípio subordinado aos serviços religiosos da distante Freguesia de Piancó (vila paraibana), até 1748, o Seridó foi secionado dessa jurisdição e delimitado como freguesia da Gloriosa Senhora Sant’Ana, para atender as necessidades espirituais da população. É interessante notar que o recorte espacial que tomava a freguesia seria o mesmo da Vila do Príncipe (correspondente à atual Caicó). 74 Foi a primeira regionalização do espaço seridoense que se desenhava. Partindo da divisão administrativa da Igreja Católica na Colônia, o Seridó ganhou existência no plano cartográfico como território fiscal – o dízimo do gado era cobrado nesse espaço; como território espiritual – dominado por Sant’Ana; e como território político – a povoação do Queiquó (antiga denominação de Caicó), posteriormente Vila do Príncipe, como sede do poder civil da freguesia. 75 Se a religião católica está presente na fundação territorial do Seridó, ela se impregna também no imaginário, fundando poderosas chaves explicativas para a realidade regional, que até hoje estão presentes na subjetividade sertaneja. Neste sentido, basta que se atente para dois fatos significativos que corroboraram esse raciocínio. O primeiro deles data de meados da primeira metade do século XIX: é o aparecimento do Seridó como um objeto de conhecimento de suas elites. É o primeiro elemento discursivo que forma articuladamente o regionalismo seridoense, mas que também é moeda corrente nas falas que se referem ao semi-árido. Trata-se do entendimento do espaço como provação e promissão: o espaço percebido como estratégia do plano divino para testar a fé humana, ao mesmo tempo em que Deus lembra a promessa de bem-aventurança. Tal interpretação é decalcada da crônica de Manoel Antônio Dantas Corrêa, escrita em 1847. A partir desse manuscrito pode-se demonstrar em que medida essa noção de espaço agônico 76 foi estabelecida pela intertextualidade presente no documento, ou seja, de um diálogo semântico com o segundo livro da Bíblia, o Êxodo. (Macedo, 1998.) Texto flagrantemente citado, tanto episodicamente quanto estilisticamente, para explicar o deserto árido do Seridó. 74 Assim, o Visitador lavrou a primeira regionalização: “- a Ribeira das Espinharas, começando das suas nascenças, ou nascenças do seu Rio com todas as suas vertentes e desaguadôros nelle até a Barra que faz no Rio das Piranhas, e por este abaixo até os limites da Freguezia do Assú, ficando a Ribeira do Seridó, suas vertentes e todas as mais que d’esta parte correm para o Rio de Piranhas (que será diviza entre a antiga e a nova Freguezia) para Freguezia de Santa Anna; e o que fica para a outra banda do Rio Piranhas pela parte do Patú, e que não fôr Ribeira das Espinharas e suas vertentes ficam continuando a pertencer a antiga Freguezia de Nossa Senhora do Bom Sucesso. Nesta divizão assim interponho minha Autoridade Ordinaria, e quero que em todo tempo se tenha, e mantenha, como neste hei expresso, e mando aos Freguezes de uma e outra Freguesia, assim divididos, e aos Parochos, sob pena de Excommunhão assim o tenham entendido e cumpram e façam cumprir e guardar, como neste se contem. Os Parochianos da nova Freguezia pagarão à seus Reverendos Parochos, os mesmos estipendios e emolumentos que antes pagavão e era uso e costume pagarem ao de Nossa Senhora do Bom Successo, sem que, em razão da divisão, haja auteração ou diminuição nos sobreditos emolumentos e direito: e poderão erigir sua Matriz, como o sobredito Titulo de Nossa Senhora Santa Anna, no lugar, que julgarem mais apto para serem curados, e para se lhes administrarem os Sacramentos” . Documento transcrito na íntegra por Monteiro (1945: 40). 75 Os limites do Seridó colonial herdavam parcela do território paraibano. Procurando objetivar os limites da Vila Nova do Príncipe, o Padre Francisco de Brito Guerra – deputado geral que representava os interesses seridoenses –, pleiteando dirimir as dúvidas, propôs ao Senado a demarcação do território da vila. Seu projeto foi ratificado pelo Decreto de 25 de outubro de 1831. Tal delimitação, no entanto, não foi ponto pacífico senão em 1834, quando o Senado imperial ratificou a pertença seridoense à província do Rio Grande. 76 Ou seja, um lugar onde se está sempre lutando contra a morte: nas figuras da fome e da peste. 177 O segundo deles guarda contornos míticos e está associado à própria explicação do nascimento da povoação de Caicó. Segundo essa narrativa, um vaqueiro acossado por um touro bravio – possuído por Tupã – rogou à Sant’Ana que o protegesse do ataque do animal. Atendido em sua solicitação, o vaqueiro fez construir uma capela dedicada à santa de sua devoção. 77 No entorno dessa capela, começou a povoação de Caicó. O interessante é que a estrutura desse mito de origem está presente em outras cidades que tiveram seu espaço produzido pela pecuária. Note-se, de passagem, que Sant’Ana era considerada a protetora dos pastores. Veja-se o caso de Santana do Matos. A exemplo de outras cidades sertanejas, cujos territórios municipais foram delineados pelos limites da freguesia primeva, Santana do Matos tem seu mito de origem na intervenção da avó de Cristo, nos vexames sofridos pelos primeiros vaqueiros. Os historiadores que se ocuparam das histórias municipais não deixam de registrar esses fatos. Câmara Cascudo não fugiu à regra de ouro. Explica essa “história que se enovela em lenda”: Manoel José de Matos – daí o sobrenome da cidade – desesperado pelas tribulações por que passava, prometeu cultuar Sant’Ana, com capela e imagem votivas; agraciado, cumpre a promessa, lançando em terra o que seria a semente urbana. Da construção da capela à instituição da freguesia, foi um movimento natural; em 1821, a povoação santanense assim tinha sido reconhecida. (Cascudo, 1955-a: 15.) Esta é, pois, mais uma evidência do regionalismo seridoense. De fato, está-se aqui diante de um dos símbolos mais fortes e consensuais da identidade da Região Seridó. Para reforçar ainda mais essa percepção, basta que se perceba o quanto se ritualiza Sant’Ana no mês de julho, em festas de padroeiras, em que cidades como Caicó e Currais Novos dobram sua população flutuante. 78 3.5.1.2 Instância Política Ao lado da descapitalização econômica, a carência de representatividade propositiva na política talvez seja uma das mais comumente citadas perdas no Seridó. Se, até hoje, quando políticos de outras regiões, em campanha pelo Seridó, lembram um passado áureo de lideranças seridoenses ou expressões locais, tentam legitimarem-se a partir da filiação a uma linhagem ou afinidade política secular, o que está acontecendo é a reencenação de outro elemento constitutivo do perfil identitário seridoense: o Seridó como celeiro de líderes, figuras conhecidas regional e nacionalmente, cujas idéias cultivavam consensos e propostas de desenvolvimento. Claro está que são as elites econômicas a encenarem tais discursos movidos por vontade de poder nada camuflada. A tradição política – a que os atores sociais acima reivindicam – começou, de forma mais positiva e perene, a entrar no mercado simbólico da política estadual na última eleição do Império. Nessa campanha, o Seridó ganhou visibilidade política própria. Foi a região – ou zona como era mais comum na época – que deu as cartas no 2o Distrito (como era conhecido o colégio eleitoral do Sertão 77 “No lugar onde é hoje a cidade de Caicó o que havia era só mofumbo... Mas, certa vez, durante a seca, apareceu por aí um fazendeiro de Jardim de Piranhas, procurando um touro que havia, há dias, desaparecido do curral. E nesta mata de mofumbos deu com ele, mas o animal parecendo um demônio marchou, furioso, para derrubar o cavaleiro e o seu cavalo. O vaqueiro correu apavorado, fugindo à perseguição do touro lembrando-se, porém, na aflição, de prometer uma Capela a Sant’Ana, no lugar onde o touro o abandonasse. E olhando para trás viu que o animal, seguira outro caminho, desaparecendo. O fazendeiro voltou ao sítio de Jardim de Piranhas e, expondo o ocorrido aos seus trabalhadores, estes se prontificaram de construir a Capela, exatamente onde está, hoje, a Catedral de Caicó. Construída a Capela, foi fácil, mais tarde, aparecerem as habitações que deram início à atual cidade.” (Monteiro,1945: 12-13.) 78 Este aspecto será tratado em mais detalhe posteriormente. 178 Potiguar). Emerge aí, como líder, José Bernardo de Medeiros, caicoense, fundador de uma genealogia de influentes políticos seridoenses, que culminará com o domínio da oligarquia seridoense no poder estadual, em fins da República Velha. Impossível falar desse perfil identitário seridoense sem que se toque nas imagens políticas evidenciadas por esse regionalismo. Assim, o tempo político que é citado no imaginário seridoense é o que se funda principalmente até o fim da República Velha, com figuras do porte de Amaro Cavalcanti, José Augusto de Medeiros e Juvenal Lamartine, que definham quando é chegada a Revolução de 30, posto que são indivíduos visceralmente integrados à política oligárquica do período. 79 Se há alguma significação nesses elementos, a importância se explica pelo espaço seridoense ter sido pensado pela elite algodoeiro-pecuária, à época do processo de mudança do eixo político potiguar do litoral para o sertão. Um dos elementos que assoma do discurso dessa elite é um Seridó apreendido unilateralmente, como espaço voltado quase que exclusivamente para a produção cotonicultora. Políticas públicas, programas educacionais, instalação de estações de pesquisa experimental, todas essas atitudes administrativas ficaram como fortes marcas de suas passagens pelo poder estadual. 3.5.1.3 Instância Socioeconômica A visibilidade dada ao Seridó a partir da República Velha tinha como principal marca discursiva a valorização do espaço pela cotonicultura. Os saberes que eram investidos na nomeação dessa região estavam voltados para o melhoramento da cultura algodoeira, para o seu beneficiamento, etc. Eram falas técnicas, ancoradas nas séries estatísticas, nas condutas científicas agenciadas, por exemplo, pelas novidades da botânica e da nascente agronomia brasileira. A paisagem hoje do Seridó não mais é pontilhada pelas plumas de algodão que branqueavam a perder de vista os campos sertanejos. Sua economia não mais produz o ouro branco e principalmente a sua mais nobre variedade, o mocó. Todavia, a persistência do algodão no regionalismo seridoense é tal que, nos dias atuais, embora sendo a cotonicultura apenas um residual traço estatístico no Seridó, esse produto continua a gerar valores simbólicos. O algodão é muito freqüentemente lembrado nos períodos em que são discutidas propostas de soerguimento econômico da região. Nesses momentos, as falas que pensam a crise reencenam um Seridó orgulhoso de si, exportador de um produto cuja excelência foi reconhecida no Brasil e no exterior. Neste sentido, mesmo ausente, o algodão ocupa um lugar decisivo na formação da rede de significações da paisagem regionalista. 80 Pode-se atribuir a persistência simbólica do Seridó – que ainda é também algodoeiro no imaginário dos que vivem nesse espaço – à própria crise vivenciada pela região, a partir da década de 70 do século XX, quando declina irreversivelmente a produção cotonicultora. Nesse momento é que a busca dos tempos perdidos ganha voz e sentido nas virtudes regionais encontradas na memória social. O algodão é um desses emblemas. 79 É evidente que a Revolução de 30 não extingue a força dessas lideranças. Elas se recomporão no Estado Novo, ao se alinharem a Dinarte Mariz, outro político seridoense celebradíssimo, que ganha visibilidade apoiando a Revolução. 80 Sobre o sentido tomado por um elemento da paisagem na constituição de sua imagem, concordamos com Schama (1996: 70), quando diz: “(...) cabe também reconhecer que, quando uma determinada idéia de paisagem, um mito, uma visão, se forma num lugar concreto, ela mistura categorias, torna as metáforas mais reais que seus referentes, torna-se de fato parte do cenário.” 179 Interessante é que, atividade econômica inicial do Seridó, o criatório não é celebrado nesta crise. Tal lapso é o resultado de não se associarem as lides pastoris às imagens de superação regional. Esse fato conduz a observação de que a pecuária não foi pródiga em elaborar símbolos no imaginário regional, de forma tão laica quanto a cotonicultura. A pecuária está associada à origem do Seridó, ao ambiente do misticismo católico coetâneo, à fundação das primeiras cidades seridoenses, em suma, ao passado imemorial da fundação do Seridó. Só ultimamente a pecuária começou a modernizar-se, mas com uma velocidade muito lenta de incorporação das novidades tecnológicas contemporâneas. É a própria natureza da pecuária que não conseguiu se urbanizar. 81 Em larga medida, a atividade pastoril, ao permanecer no rural, construiu uma carapaça não muito afeita às inovações. Tal imaginário em ambiente pastoril arcaico – das sociedades tradicionais – está preso, em sua estrutura mental mais profunda, a uma noção de tempo que se revela por meio de certas características cíclicas da natureza. O tempo recorrente, da instância das coisas que ocorrem sem o controle do homem, um tempo que não pode ser modificado, posto que quem o opera é o próprio Deus. Neste, há o sentido sempiterno do clima que não se dobra a qualquer intervenção humana. Daí o descrédito nas novidades que afetam o mundo da produção. Se as gerações anteriores sobreviveram aos ciclos da natureza, não haveria razão para contrariá-las. A ordem natural não poderia, neste sentido, ser quebrada pela tangível mão humana, eis o que reza tal percepção. É importante lembrar que se ainda hoje a cotonicultura é pensada como um elemento de superação regional, é porque essa atividade não ficou somente na esfera do rural. Ela adentrou a cidade, engendrando processos de urbanização jamais experimentados no Seridó. Ora, tais aparelhamentos de produção ancorados em maquinários – como é o caso das usinas de beneficiamento do algodão – e relações de trabalho assalariadas geraram uma série de mudanças tanto no tecido urbano quanto no sentimento de urbanidade, ou seja, na idéia de fazer parte (de pertencer) ao sítio urbano – na expressão moderna do termo (a cidade como locus da produção). Qual não foi, nesse último sentido, o apelo, a partir da década de 60, pelo ar livre das cidades: hospitais, escolas, trabalho, etc.?! Veja-se, como exemplo – para que seja analisado um dado cultural –, a obra de um ficcionista seridoense. Comumente, José Bezerra Gomes, autor currais-novense, é visto sob o prisma reducionista de um escritor regionalista, incluído na literatura potiguar no que ficou conhecido como “ciclo do algodão”. Na leitura de um dos seus romances, “Os Brutos”, pode ser detectado, além dos elementos regionalistas que despontam da narrativa – e são o seu pano de fundo –, que José Bezerra Gomes está antenado ao ambiente moderno e seus móveis, sejam eles o não-referenciamento e destino nãoexemplar dos personagens, o deslumbre perante a modernização e os símbolos gestados pela introdução das novas máquinas. Dado o cenário econômico que transformava a paisagem da produção, a cotonicultura – ainda majoritariamente sediada no campo (só posteriormente é que o beneficiamento do algodão se faria nas cidades do interior, com o surgimento e a consolidação das usinas) – faz com que, paulatinamente, na 81 Aqui é necessário que se faça uma distinção das noções de “rural” e “urbano”, da forma como se instrumentaliza no presente texto. Fique desde logo esclarecido que essas noções correspondem a termos utilizados a partir da percepção que o imaginário regional faz deles. Portanto, não têm a pretensão de serem ferramentas conceituais rigorosamente científicas. Se aqui são contempladas dessa forma, deve-se à necessidade de clareza mais imediata. No sentido aqui utilizado, “rural” denota um ambiente ainda plasmado por relações de produção tecnicamente pouco desenvolvidas, pouco alfabetizado e com padrões societários tradicionais. “Urbano” é o ambiente modernizado, com padrões educacionais e sanitários eficientes, onde a empregabilidade se dá em serviços, fábricas ou indústrias, e onde os equipamentos de usos comunitários são acessados e administrados publicamente. 180 cidade estejam presentes os elementos da ordem e da desordem, binômios ambíguos, caros à urbanidade. A cena urbana denota também as modificações acarretadas pelo desenvolvimento econômico da região, a partir da cultura do algodão. Nos romances daquele autor, os signos urbanos são trazidos do mundo exterior. Estes elementos, pelo fato de serem exógenos e desafinarem, com sua estranheza e “ruído”, o concerto uníssono do “mesmo”, são tidos como valores de prestígio: o primeiro automóvel, seu motorista (Jesus), os doutores (médico, advogado e juiz). Por sua vez, o campo abriga o mundo do trabalho, rotineiro e óbvio: o lugar ordenado pela família, pela produção, pelo ritmo monocórdio de uma natureza estéril ou abundante. Este é o espaço afetivo para onde todos – segundo o que se percebe do autor – deveriam voltar, em busca de identidade. Mas, paradoxalmente, será também o campo onde a natureza pune com o exílio. Interessante essa percepção de José Bezerra Gomes, para se demonstrar que o rural foi tido – e ainda é – no Seridó, como um locus de conservadorismo. Se inovações foram possíveis a partir do algodão, é porque ele modificou perenemente a face urbana das cidades sertanejas, com os móveis de qualquer processo de modernização: máquinas, energia e urbanização. O mesmo processo ocorreu com a mineração em Currais Novos – evidentemente que a modernização chega à cidade indiretamente pelo processo de urbanização. No caso específico de Caicó, anota Ione Rodrigues Diniz Morais (1998: 94): “A expansão da atividade algodoeira e a modernização das unidades de beneficiamento na década de 60 repercutiam em termos de organização espacial de Caicó, por meio da localização de usinas na cidade. As usinas funcionaram como pólos dinamizadores tanto em termos de economia – oferta de empregos e circulação de capital – como no que se refere à expansão urbana – surgimento de bairros novos e crescimento de alguns já existentes.” Parece que quanto mais afastado desse ambiente urbano de produção, mais persiste a resistência à modernização, seja das relações sociais de produção, seja das relações técnicas de produção. Um exemplo culinário expressivo que se pode extrair desse universo, para corroborar tal juízo, pode ser dado pela produção alimentícia artesanal do Seridó: queijos, carnes-de-sol, manteiga, etc. A sua fragilidade ficou demonstrada tragicamente quando o mercado exigiu um maior gradiente produtivo. Ora, ambientada somente no mundo rural, portanto arcaico, essa produção não atendeu eficientemente a demanda e grande parte degenerou-se, ou simplesmente, extinguiu-se. Para dar conta da demanda, é notória a adulteração feita nos queijos, a partir de amidos encontrados no macarrão, farinha de trigo, etc. Atualmente, essas mercadorias têm a marca, mas não a qualidade de outras épocas. Ou então, existe somente a marca e o produto é manufaturado fora da região do Seridó – muitas mercadorias vendidas em outros mercados são negociadas como produtos seridoenses, sem de fato o serem. O desafio seridoense seria o de modernizar sua produção alimentícia para exportação interna, sem, no entanto, desfigurar o padrão de qualidade, higiene e sabor. Talvez somente com a urbanização dessa produção, essa mudança possa tornar-se possível. 181 3.5.1.4 Instância Educacional Tais objeções às mudanças operadas pelo homem sertanejo foram percebidas desde os primeiros momentos da cotonicultura. A despeito de tudo, a saída ao marasmo sertanejo era – em fins do Império – propugnada por meio da educação formal. Manoel Dantas, seridoense acadêmico de Direito na Faculdade do Recife, em 1889, numa série de reportagens sobre a vida sertaneja, já detectava que o modus vivendi sertanejo era antípoda à lei do progresso. Sua cultura e costumes estacionários paralisaram o desenvolvimento sertanejo rumo ao progresso material e espiritual. Não se tratava, no entanto, de um caso perdido. As condições de sua superação estariam já esboçadas dentro dele mesmo, mas as potencialidades estariam, todavia, encarceradas pela cultura conservantista dos sertões. Somente à luz da instrução pública, da educação formal, romperia a crisálida que punha travas à sua emancipação. Há, pelo que foi discutido acima, uma identificação entre a significação das lideranças políticas e sua formação intelectual. Interessante perceber-se que um dos elementos constituintes da identidade regional é também o valor dado à educação formal. 82 Ao analisar-se mais detidamente tal constatação, dá-se conta de alguns fatos que são definidores dessa percepção. O primeiro deles, que mais remotamente ganha significado, é a Escola de Latim, que foi criada em Caicó (na época, Príncipe), na primeira metade do século XIX. O ingresso no ensino secundário, no qual percebe-se a presença de alunos de extração social mais elevada, dava-se, em grande parte, nas Escolas de Latim; só, posteriormente, quando esgotadas as possibilidades de ensino de qualidade no interior, procurava-se Natal. No Rio Grande do Norte, as mais antigas foram fundadas em Natal (1731), Açu (1827) e Caicó (Príncipe). No caso do Seridó, o exemplo mais expressivo fica por conta da Cadeira de Gramática Latina, que o Deputado Pe. Brito Guerra fez aprovar na corte, em 1832. A Escola de Latim já funcionava no sobrado do padre antes dessa data e, segundo o próprio deputado, em sua argumentação parlamentar, contava com mais de trinta alunos. Nos bancos da Escola de Latim do Seridó sentaram-se, entre outros, o Padre João Maria e Amaro Cavalcanti. 83 Outro elemento significativo é a geração de políticos-intelectuais, referida acima. Todos eles formados em Direito pela prestigiosa Faculdade de Direito do Recife. Foram esses indivíduos os primeiros no Seridó a fazer profissão de fé na qualidade do ensino formal. 84 O caso de José Augusto parece ser paradigmático: quando governador (1924-1928), foi um grande incentivador da educação primária; e como político, atuante na esfera federal, integrou as comissões da reforma educacional brasileira no período anterior à Revolução de 30. (Araújo, 1999.) 82 Somente à guisa de ilustração, vale lembrar que há, na iconografia mais poderosa da região, uma coincidência no mínimo sugestiva com relação à valoração da educação: a imagem clássica de Sant’Ana é aquela em que ela aparece sentada alfabetizando a Virgem. Sobre esse detalhe na cultura cristã Ocidental veja-se Manguel (1997: 90). 83 Certamente o ensino do latim esmerilhou a educação dos seridoenses que estudaram tal idioma, dando polidez formal e adornos eruditos às construções gramaticais de uso coloquial, cultivados na literatura clássica. Assevera Câmara Cascudo que “Os velhos fazendeiros, iletrados e poderosos, sabiam empregar uma frase de Vergílio ou de Horácio, um provérbio, uma sentença bíblica, recitando orações no idioma Clássico que tomava acentos imprevistos de ineditismo naqueles lábios habituados a comandar”. (Cascudo, 1955-b: 265.) 84 Veja-se o caso de Manoel Dantas, no Jornal O Povo, primeiro jornal editado no Seridó (fins do Império), numa série de artigos sobre a superação da vida sertaneja, via educação pública. 182 A educação formal como idéia positiva na formação do seridoense estendeu-se até a década de 70. Até aquela década, cidades-pólos como Caicó, principalmente essa, e Currais Novos, serão reconhecidas como centros educacionais de respeitável qualidade, para onde convergiram estudantes das mais variadas procedências regionais. Perceba-se o quanto se articulam nesse sentido, a instância religiosa com a educacional. Em 1925, foi criado um colégio confessional de ensino privado, que começou a funcionar com a denominação de Educandário Santa Terezinha, sob a direção da Congregação das Filhas do Amor Divino. Inicialmente voltado ao público feminino, ultimamente leciona também à clientela masculina. Em 1942, dois anos após a criação da Diocese de Caicó, fundou-se o GDS (hoje CDS) – Ginásio Diocesano Seridoense. Esse colégio será uma referência regional de excelência educacional. 85 Por fim, há francas inserções da Igreja Católica, no âmbito do ensino de 3o Grau, com a Faculdade de Filosofia e Teologia Cardeal Dom Eugênio Araújo Sales, que funciona com turmas de universitários desde 1999. Evidentemente, iniciativas para uma maior universalização do ensino só ocorreriam a partir da década de 60 com o Colégio Estadual José Augusto, de ensino público e gratuito. Ainda relacionado ao imbricamento das esferas religiosas e educacionais, são de uma importância indubitável as ações pedagógicas que a Igreja Católica desenvolveu a partir da criação, em 1963, da Emissora de Educação Rural de Caicó, cuja motivação inicial está expressa em sua denominação. Sua missão consistia em, por meio do rádio, estender a prática da evangelização católica ao meio rural, além de ministrar programas educacionais à distância. Portanto, ações pedagógicas de vanguarda no interior do estado. São dignos de notas os trabalhos pioneiros do Movimento de Educação de Base–MEB, que tinha também, ancoradas no rádio, suas tarefas educacionais com relação à politização e a projetos de educação de adultos nas comunidades rurais. A presença dessa emissora de rádio foi também muito significativa para a circulação de notícias, padrões estéticos e comportamentais dos grandes centros urbanos, 86 assim como para a preservação de determinadas práticas culturais populares como, por exemplo, os violeiros. 87 Parece que nenhuma outra característica do perfil identitário seridoense contribuiu mais que o valor dado à educação formal, entendida como força motriz da mobilidade social. A educação nesse nível foi considerada talvez a principal esperança dos pobres para alçarem seus filhos a um patamar social superior ao seu. Estes são, em linhas gerais, os tons mais fortes da identidade seridoense, tal como se conseguiu analisá-la nos discursos regionalistas que tentam construí-la. Tem-se, pois, claro que essas marcas, a despeito de toda a celeridade dos meios de informação de massa, do mundo midiático, continuam a moldar a identidade seridoense. Mesmo assim, convém fazer algumas ressalvas quanto às práticas culturais seridoenses. 88 85 “Potiguares, paraibanos, cearenses, pernambucanos e alagoanos eram mandados , pelo menos até meados de 60, para o educandário (...)” . (Caicó em Revista, 1976: 23). 86 Sobre esse aspecto, o cantor e compositor Chico César, em entrevista à imprensa, chegou a dizer que a Emissora de Educação Rural de Caicó tinha sido sua “internet”, à época em que vivia em Catolé do Rocha, na Paraíba. 87 O programa mais antigo da referida emissora é “Violeiros do Seridó”, em funcionamento, sem interrupção, desde 1963. 88 Genericamente, cultura, da forma como aqui se entende, pode ser tanto os traços que identificam uma sociedade do âmbito de suas particularidades subjetivas, quanto também é a expressão dos desejos simbólicos dessa sociedade, em termos 183 Já é lugar comum apontar-se na cultura seridoense um locus de arcaísmos. No entanto, essa noção de cultura que se esmera em encontrar o naif, o primitivo, o ingênuo, já não corresponde à realidade seridoense. Identificar no folclore e artesanato as variantes mais verídicas do Seridó denota flagrantemente uma certa percepção cultural muito elitista (na acepção pejorativa do termo), no sentido de instituir-se para o povo o que deveria ser eleição dele próprio. Dessa forma, tidas como verdades insofismáveis, as práticas culturais “genuinamente” seridoenses são relegadas somente ao universo rural. A questão é mais complexa, visto que tendencialmente as práticas culturais da região estão sendo produzidas num ambiente cada vez mais urbano. No entanto, se essa visão reducionista persiste, deve-se primeiro a uma concepção de cultura que a crê imóvel – portanto conservadora, literalmente; segundo, credita-se à noção que entende que a cultura do povo deve assim permanecer drenada por benesses quase filantrópicas dos poderes municipais, estaduais e federais. Os aspectos aqui apresentados, de forma sumária, não podem deixar de ser considerados quando se pretende, numa perspectiva de mobilização da sociedade, articular esforços no sentido de produzir condições para que o Seridó alcance melhores níveis de desenvolvimento econômico e social. Neste sentido, os limites e as potencialidade que a identidade cultural de região – produzida pela instância religiosa, política, socioeconômica e educacional, consolidada no decorrer da história do Seridó – constituem marcos fundamentais, quando se pensa em ações e estratégias nas diferentes dimensões da realidade: a ambiental, a tecnológica, a econômica, a sociocultural e a político-institucional. Em qualquer delas, a forma como a sociedade se comporta e o modo como os atores sociais estabelecem suas relações fundamentais, na produção ou na convivência diária, constituem ponto de referência, tanto na concepção como na implementação ou avaliação de um Plano de Desenvolvimento Sustentável para a Região. Muitos dos valores assinalados, como os vinculados à identidade própria de região, à forma de pensar e avaliar a educação, a tradição de participação política das lideranças regionais no contexto estadual e nacional, a valoração do urbano e moderno, ou outros não considerados na análise, como o maior ou menor grau de solidariedade ou de cooperação que define a convivência entre as classes sociais e os seus principais atores, tendem a exercer no estabelecimento da estratégia de desenvolvimento sustentável peso da maior importância. Além disso, o conhecimento dessa identidade e das manifestações culturais da região devem constituir objetivo de programas e projetos, voltados tanto para sua valorização e, em decorrência, para o fortalecimento da identidade regional, como para sua utilização como fonte geradora de emprego e renda para a população do Seridó. 3.5.2 População, Qualidade de Vida e Pobreza Estima-se a população total do Seridó, no ano 2000, em aproximadamente 294 mil pessoas, o que representa cerca de 11% da população do Estado do Rio Grande do Norte. Esta população estaria distribuída desigualmente pelas três Zonas Homogêneas–ZH, com a população da Zona Homogênea de Currais Novos calculada, no referido ano, em 94 mil habitantes; a de Caicó (115 mil) e a da Zona Homogênea das Serras Centrais (85 mil). Na última Contagem de População, realizada pelo Ibge, em da materialização de suas representações: festas, artes cênicas, plásticas, danças, culinária, etc. Essas últimas é que se identificam como práticas culturais. (Coelho, 1999.) 184 1996, a Região do Seridó havia registrado cerca de 289,8 mil, a ZH de Currais Novos (com 92,5 mil), a de Caicó (113,1 mil) e a ZH das Serras Centrais (aproximadamente 84,2 mil). A população do Seridó, a exemplo da população do Estado, reside, predominantemente, no meio urbano, registrando, em 1996, cerca de 68,1% do total vivendo em cidades e vilas. A predominância da população urbana, encontrada na região como um todo, é apresentada por duas das três Zonas Homogêneas, uma vez que tanto a Zona Homogênea de Currais Novos (77,4%), quanto a de Caicó (75,7%) registraram alta taxa de urbanização. Quanto à das Serras Centrais, com 47,8% da população residente no meio urbano, havia ainda, até 1996, predominância da população rural.. No que se refere à dinâmica demográfica, a população da região, a exemplo do que ocorre no Estado, no Nordeste e no País, em seu conjunto, vem registrando um processo de desaceleração, atribuído em grande parte à redução do número de filhos em cada família. No caso específico do Seridó, o que se verificou entre 1970 e 1980 foi uma expansão da população de 0,86%, ao ano, ocorrendo na década seguinte (1980-91) expansão um pouco maior, de 1,11%, para registrar entre 1991 e 1996 um declínio significativo, com uma taxa anual de crescimento demográfico de apenas 0,33%. O Seridó, em todas esses períodos, apresentou crescimento bem menor do que o Estado em seu conjunto. Mas Zonas Homogêneas da região apresentaram taxas anuais e comportamento diferenciado, neste particular. Relativamente ao Índice de Desenvolvimento Humano–IDH, as estimativas feitas para o Seridó mostram que no último ano para o qual se tem informações, o IDH correspondeu a 78% daquele registrado para o Estado com um todo. Além disso, embora tenha partido, no ano de 1970, do mesmo nível de desenvolvimento humano do Rio Grande do Norte, a região vem perdendo posição relativa, com seu IDH crescendo menos que o do Estado, nos anos de 1980 e 1991.Outros indicadores médios para o Seridó sugerem perda de posição relativa da região no confronto com o Estado, o que mostra as dificuldades da região para acompanhar o desenvolvimento social, médio, do Rio Grande do Norte. As partes que seguem apresentam detalhamentos sobre aspectos considerados relevantes a respeito de características demográficas da população. São feitas, logo a seguir, considerações sobre a distribuição da população do Seridó, segundo as Zonas Homogêneas e seus municípios, conforme as informações da Contagem da População, de 1996, realizada pelo Ibge. Na seqüência, examina-se a dinâmica demográfica, considerando os anos de 1970, 1980, 1991 e 1996. Finalmente, são considerados pontos relevantes relacionados ao desenvolvimento humano, às condições de vida, à pobreza e às desigualdades na distribuição de renda. 3.5.2.1 Distribuição da População no Seridó A tabela 3.5.2.1 apresenta a distribuição da população do Seridó, segundo suas Zonas Homogêneas e municípios que as compõem. Um primeiro aspecto a ser destacado é que o Seridó registrava, em 1996, um grau de urbanização (68,1%) próximo ao do Estado em seu conjunto (72%). No entanto, a participação da população urbana na região não se apresenta semelhante, quando se consideram as Zonas Homogêneas que a integram. Assim, a Zona Homogênea de Currais Novos registra uma taxa de urbanização de 77,4% e a de Caicó de 75,7% – ambas maiores do que a taxa de urbanização do Estado, em seu conjunto –, enquanto a Zona Homogênea das Serras Centrais apresenta um percentual da população urbana sobre o total de apenas 47,8%. Esta última, apesar de apresentar uma participação na população total de apenas 29%, no total da região, registra cerca de 47,6% (ou seja quase a metade) da população rural do Seridó. A maior parte dos municípios desta Zona apresenta mais 185 da metade de sua população residindo no meio rural. Este é um ponto que deve ser considerado nas ações a serem desenvolvidas na região. No que se refere ao grau de urbanização, convém destacar, para o Seridó, sobretudo nas Zonas Homogêneas de Currais Novos e Caicó, a presença de municípios com participação da população urbana maior ou igual a 75%, alguns deles de pequeno porte. É o que ocorre em Acari (76,3%), Carnaúba dos Dantas (75,3%), Parelhas (80,6%), Caicó (88,1%) e Timbaúba dos Batistas (80,3%). É importante, também, considerar, na distribuição da população na região, o peso relativo de alguns municípios, tanto do ponto de vista econômico como demográfico, que certamente polarizam a vida na região. Neste particular, os dados da tabela 3.5.2.1 destacam, entre outros aspectos, a importância do Município de Currais Novos, que representa 43,9% da população da ZH de Currais Novos, que comanda sua vida econômica e social, e o Município de Caicó, na Zona Homogênea que leva seu nome: sua participação no total da população é de 46%. Relativamente à Zona Homogênea das Serras Centrais, não há uma polarização similar às demais, registrando-se um peso maior dos municípios de Jucurutu, Santana do Matos e Campo Grande, com o primeiro, que apresenta maior população, registrando participação de 20,2%, no total da população de sua Zona Homogênea. Esta é uma outra diferença que deve ser ressaltada, relativamente à Zona Homogênea das Serras Centrais. Salvo os dois municípios-pólo, já referidos, o de Currais Novos, com 40,5 mil habitantes, dos quais 34,7 mil no meio urbano, e o de Caicó, com 53 mil habitantes (com 45,8 mil residentes na cidade), a região se caracteriza pela presença de municípios de pequeno porte, em todas as suas Zonas Homogêneas. Isto se torna mais patente quando se considera a população urbana de cada um deles. Neste particular, dos 25 municípios considerados na tabela 3.5.2.1, cerca de 22 apresentam uma população urbana inferior a 10 mil habitantes. 89 3.5.2.2 Dinâmica Demográfica Já foram assinalados alguns aspectos referentes ao dinamismo da população do Seridó. Cabe, agora o destaque de alguns pontos importantes para uma melhor compreensão da região, imprescindível para a elaboração e implementação de ações voltadas para o seu desenvolvimento sustentável. Relativamente à população do Estado, a Região do Seridó vem perdendo importância relativa com o correr dos anos. De uma participação em torno de 15%, em 1970, a região passa, no total do Estado, para 11,3% em 1996 e, provavelmente, para 11% em 2000. (Tabela 3.5.2.2.) Este declínio de participação é encontrado em todas as Zonas Homogêneas do Seridó: a de Currais Novos, Caicó e Serras Centrais. Esta última região é a que registra, no conjunto, o declínio mais intenso de sua participação. A tendência de declínio da participação e de menor dinâmica da população do Seridó, relativamente ao Estado, fica mais evidente quando se estabelece o confronto entre as taxas de crescimento anual de cada uma das populações consideradas nos anos de 1970, 1980, 1991 e 1996. O 89 Além dos municípios considerados na tabela 3.5.2.1, vale assinalar a existência do município de Bodó, desmembrado de Santana do Matos, o de Tenente Laurentino, desmembrado de Florânia e o de Triunfo Potiguar, desmembrado de Campo Grande. Eles não existiam por ocasião da Contagem da População, em 1996. 186 gráfico 3.5.1, apresentado adiante, destaca, por meio das taxas anuais de crescimento, não só os valores maiores estimados para o Rio Grande do Norte, como os valores diferenciados das Zonas Homogêneas que compreendem a Região do Seridó. TABELA 3.5.2.1 RIO GRANDE DO NORTE, SERIDÓ E SUAS ZONAS HOMOGÊNEAS: POPULAÇÃO EM 1996 ESTADO, SUB-REGIÃO, ZONAS E MUNICÍPIOS Estado POPULAÇÃO EM 1996 TOTAL URBANA SERIDÓ = 100 RURAL Total Urbana (%) Rural Urbana 1.843.486 289.767 197.419 92.348 100,0 100,0 100,0 68,1 31,9 92.547 71.587 20.960 31,9 36,3 22,7 77,4 22,6 10.948 8.358 2.590 3,8 4,2 2,8 76,3 23,7 6.156 4.635 1.521 2,1 2,3 1,6 75,3 24,7 40.586 34.749 5.837 14,0 17,6 6,3 85,6 14,4 Equador 5.618 3.903 1.715 1,9 2,0 1,9 69,5 30,5 Parelhas 18.187 14.654 3.533 6,3 7,4 3,8 80,6 19,4 52,2 Região do Seridó Currais Novos Acari Carnaúba dos Dantas Currais Novos São Tomé Caicó Caicó 715.174 72,0 Rural 2.558.660 28,0 11.052 5.288 5.764 3,8 2,7 6,2 47,8 113.055 85.623 27.432 39,0 43,4 29,7 75,7 24,3 52.019 45.829 6.190 18,0 23,2 6,7 88,1 11,9 Cruzeta 7.954 5.575 2.379 2,7 2,8 2,6 70,1 29,9 Ipueira 1.787 1.321 466 0,6 0,7 0,5 73,9 26,1 Jardim de Piranhas 10.510 7.501 3.009 3,6 3,8 3,3 71,4 28,6 Jardim do Seridó 11.886 8.894 2.992 4,1 4,5 3,2 74,8 25,2 Ouro Branco 4.580 2.676 1.904 1,6 1,4 2,1 58,4 41,6 Santana do Seridó 2.322 1.224 1.098 0,8 0,6 1,2 52,7 47,3 São Fernando 3.502 1.522 1.980 1,2 0,8 2,1 43,5 56,5 São João do Sabugi 5.449 3.981 1.468 1,9 2,0 1,6 73,1 26,9 São José do Seridó 3.462 2.304 1.158 1,2 1,2 1,3 66,6 33,4 Serra Negra do Norte 7.423 3.060 4.363 2,6 1,6 4,7 41,2 58,8 Timbaúba dos Batista 2.161 1.736 425 0,7 0,9 0,5 80,3 19,7 Serras Centrais 84.165 40.209 43.956 29,0 20,4 47,6 47,8 52,2 Campo Grande (ex-Augusto Severo) 13.080 5.909 7.171 4,5 3,0 7,8 45,2 54,8 Cerro Corá 10.312 4.245 6.067 3,6 2,2 6,6 41,2 58,8 Florânia 12.253 5.889 6.364 4,2 3,0 6,9 48,1 51,9 Jucurutu 17.044 9.459 7.585 5,9 4,8 8,2 55,5 44,5 Lagoa Nova 10.891 5.156 5.735 3,8 2,6 6,2 47,3 52,7 Santana do Matos 15.616 6.936 8.680 5,4 3,5 9,4 44,4 55,6 4.969 2.615 2.354 1,7 1,3 2,5 52,6 47,4 São Vicente FONTE DOS DADOS BÁSICOS: Ibge, Contagem da População. 187 TABELA 3.5.2.2 RIO GRANDE DO NORTE, SERIDÓ E ZONAS HOMOGÊNEAS: EVOLUÇÃO DA POPULAÇÃO ESTADO, REGIAO E ZONA HOMOGÊNEA ESTADO Seridó Z.H. de Currais Novos Z.H. de Caicó Z. H. das Serras Centrais ESTADO Seridó Z.H. de Currais Novos Z.H. de Caicó Z. H. das Serras Centrais 1970 1980 1991 1996 (NÚMERO DE PESSOAS) 2000 (*) 1.550.244 1.898.172 2.415.567 2.558.660 2.679.464 231.807 71.783 88.901 71.123 252.538 82.215 94.290 76.033 285.057 91.350 110.682 83.025 (%) 289.767 92.547 113.055 84.165 293.603 93.513 115.012 85.078 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 15,0 4,6 5,7 4,6 13,3 4,3 5,0 4,0 11,8 3,8 4,6 3,4 11,3 3,6 4,4 3,3 11,0 3,5 4,3 3,2 FONTE DOS DADOS BÁSICOS: Ibge. Censos demográficos de 1970 a 1991 e Contagem da população, 1996. * Estimativa baseada na taxa de crescimento anual, do período 1991-1996. Fica patente, pelas informações do gráfico 3.5.2.1, a diferença entre a intensidade do crescimento da população do Estado e o das Zonas Homogêneas do Seridó. Embora tanto o Estado quanto a região e sua zonas sigam a mesma trajetória – desaceleração do seu crescimento populacional –, as taxas são significativamente diferenciadas, notadamente quando se leva em conta o crescimento da população da Zona Homogênea das Serras Centrais. Digno de destaque é o diferencial de crescimento nos anos 90 (1991-96), entre o Estado e a Região do Seridó. O primeiro consegue, ainda, no contexto de uma desaceleração do seu crescimento populacional, manter-se no patamar de pouco mais de 1% ao ano, enquanto o Seridó e suas Zonas Homogêneas ficam no nível inferior a 0,5%, ao ano, de crescimento demográfico. Isto se deve, em grande parte, como se verá adiante, à evolução da população rural e ao intenso processo de esvaziamento do meio rural da região. Um nível de detalhamento maior da evolução da população do Estado e do Seridó pode ser realizado a partir das informações sobre a evolução demográfica nos anos considerados, com base no exame da situação dos municípios que compõem as Zonas Homogêneas do Seridó, levando em conta tanto a população urbana quanto a rural. A tabela 3.5.2.2 mostra os dados considerados mais relevantes para esse aprofundamento da dinâmica da população. 188 Gráfico 3.5.2.1 R.G.do Norte, Seridó e suas Zonas Homogêneas: Taxas Anuais de Crescimento da População Total - 1970-96 2.50 2.00 (%) 1.50 1970-80 1.00 1980-91 1991-96 Serras Centrais Caicó Currais Novos Seridó - Estado 0.50 TABELA 3.5.2.3 RIO GRANDE DO NORTE, SERIDÓ E ZONAS HOMOGÊNEAS: TAXAS ANUAIS DE CRESCIMENTO DA POPULAÇÃO TOTAL, URBANA E RURAL - 1970-96 ESTADO, REGIÃO E ZONA`HOMOGÊNEA Estado Região do Seridó Currais Novos Acari Carnaúba dos Dantas Currais Novos Equador Parelhas São Tomé Caicó Caicó Cruzeta Ipueira Jardim de Piranhas Jardim do Seridó Ouro Branco Santana do Seridó São Fernando São João do Sabugi São José do Seridó Serra Negra do Norte Timbaúba dos Batista Serras Centrais Campo Grande Cerro Corá Florânia Jucurutu Lagoa Nova Santana do Matos São Vicente POPULAÇÃO TOTAL POPULAÇÃO URBANA 1970-80 1980-91 1991-96 1970-96 1970-80 1980-91 1991-96 1970-96 2,05 0,86 1,37 0,11 1,78 2,94 0,85 1,50 (1,43) 0,59 0,92 0,51 0,19 0,71 1,51 (0,94) 0,17 (1,80) 0,70 0,45 0,23 (0,55) 0,67 0,83 0,41 1,16 0,82 3,08 (0,86) 1,62 2,22 1,11 0,96 (0,02) 0,37 1,28 0,83 1,78 0,09 1,47 2,16 1,32 1,09 1,46 1,23 0,01 0,11 0,85 1,73 0,46 (0,36) 2,35 0,80 0,21 1,63 0,72 0,92 2,58 (0,03) 0,11 1,16 0,33 0,26 (0,06) 1,88 0,18 0,45 0,69 (0,73) 0,43 0,54 0,17 0,99 1,09 0,08 0,15 (1,55) (0,01) (0,12) 1,73 (0,22) 2,23 0,27 1,01 (0,41) (0,28) 3,03 0,19 (1,90) (0,04) 1,95 0,86 0,98 0,02 1,20 1,70 0,76 1,46 (0,65) 0,93 1,37 0,79 0,73 1,10 1,12 (0,33) (0,19) (0,34) 0,97 0,70 (0,11) 1,20 0,65 0,60 0,76 0,70 1,28 2,31 (0,71) 0,66 4,22 3,36 3,70 2,13 3,36 4,96 4,22 3,36 (0,60) 2,70 2,28 2,15 2,74 5,00 4,38 1,90 3,33 2,49 2,84 3,83 3,92 2,04 4,07 5,85 2,47 6,08 5,64 3,56 1,84 3,84 3,74 3,26 3,02 1,65 3,64 2,54 6,25 3,71 4,85 3,36 3,03 3,12 5,92 3,85 2,67 3,08 6,62 5,51 3,73 4,67 3,07 5,49 3,70 3,28 4,01 2,62 5,65 4,26 3,01 2,50 2,01 1,67 1,24 1,37 3,21 0,54 2,97 1,87 1,20 1,79 1,39 1,27 4,58 4,57 0,79 2,14 3,27 2,60 1,24 5,45 0,05 4,71 2,20 2,33 1,10 1,60 5,10 2,67 (0,37) 1,88 3,59 2,99 2,94 1,78 3,45 3,08 4,83 3,22 2,02 2,80 2,42 2,39 4,43 4,43 2,96 2,44 4,70 3,78 2,90 4,50 2,81 4,00 3,55 4,07 2,85 3,74 5,54 3,69 1,90 2,89 POPULAÇÃO RURAL 1970-80 (0,37) (1,14) (1,20) (2,21) 0,44 (1,07) (0,53) (0,89) (1,71) (1,80) (2,53) (1,14) (1,04) (1,87) (1,80) (2,33) (0,50) (2,78) (1,40) (0,98) (0,88) (2,64) (0,57) (0,71) (0,34) (0,74) (0,69) 2,84 (1,79) 0,53 1980-91 (0,44) (1,71) (3,02) 3,10) (4,41) (3,34) (3,91) (2,42) (2,32) (1,77) (1,46) (1,39) (3,44) (1,23) (1,66) (2,47) (2,62) (1,13) (1,43) (2,91) (2,10) (2,48) (0,89) (1,49) 0,44 (0,52) (2,11) 1,55 (1,64) (1,61) FONTE DOS DADOS BÁSICOS: Ibge. Censos demográficos de 1970 a 1991 e Contagem da população, 1996. 189 1991-96 (0,85) (2,22) (2,72) (4,00) (1,63) (1,85) (4,15) (3,48) (2,32) (3,23) (4,66) (2,14) (6,29) (5,34) (1,88) (2,29) (5,64) (1,77) (3,33) (3,86) (0,40) (5,23) (1,31) (0,00) (1,39) (1,84) 0,75 (1,76) (3,03) (1,95) 1970-96 (0,49) (1,59) (2,27) (2,93) (2,04) (2,19) (2,67) (2,04) (2,09) (2,06) (2,49) (1,44) (3,09) (2,28) (1,75) (2,38) (2,41) (1,89) (1,79) (2,36) (1,31) (3,08) (0,85) (0,91) (0,21) (0,86) (1,02) 1,39 (1,97) (0,86) Entre os pontos relevantes da evolução da população, sugeridos pelos dados da tabela 3.5.2.3, podem se destacados os seguintes: • que chama atenção na evolução demográfica recente do Estado e do Seridó é o sistemático declínio da sua população rural e sua redução em termos absolutos, em todas as décadas consideradas; • esse processo vem-se acelerando, com o correr do tempo, quando se considera, no geral, o Estado, a Região do Seridó, suas Zonas Homogêneas e os municípios que as compõem; • no caso do Seridó, relativamente ao Estado, este esvaziamento do campo é bem mais intenso, pois, enquanto este último passa de uma taxa de – 0,37% (1970-80), para – 0,44% (1980-91 e para – 0,85% (1991-96), o Seridó registra, respectivamente, taxas de – 1,14%, – 1,71% e – 2,22%; • na comparação da intensidade desses processos, entre as Zonas Homogêneas do Seridó, o que se constata é que ele é mais acelerado na ZH de Currais Novos e Caicó, do que na Zona Homogênea das Serras Centrais; • deve-se chamar, ainda, atenção, nesse processo, para o fato de que nos anos 90 (199196), quando se acelera a saída de população do campo, muitos municípios do Seridó registram taxas negativas da evolução da população rural superiores a – 3% ao ano: três municípios da ZH de Currais Novos (Acari, Equador e Parelhas), sete da ZH de Caicó (Caicó, Ipueira, Jardim de Piranhas, Santana do Seridó, São João do Sabugi, São José do Seridó e Timbaúba dos Batistas) e um da Zona Homogênea das Serras Centrais (Santana do Matos); • quanto ao comportamento da população urbana, as taxas de crescimento da população urbana do Seridó, embora inferiores à do Estado, são próximas às apresentadas pelo Rio Grande do Norte; e • nesse processo de desaceleração do crescimento da população, que afeta, também a evolução da população urbana, há diferenças que merecem ser consideradas entre as Zonas Homogêneas do Seridó; a ZH de Currais Novos registra uma desaceleração no crescimento urbano, muito maior do que as demais; isto, seguramente, se deve ao comportamento da população urbana da sede do Município de Currais Novos, que passa de uma taxa de crescimento de 4,96%, entre 1970 e 1980, para 2,54% na década seguinte (1980-91), para, nos anos 1991-96, registrar uma expansão de apenas 0,54%. Esse fato apresenta estreita relação com o que se assinalou anteriormente, quando do exame da dinâmica da economia regional e das dificuldades pelas quais vêm passando suas atividade produtiva. Sem dúvida, uma característica muito importante da evolução da população do Seridó, como já se fez referência, é o acelerado declínio de sua população rural, seguramente associado à instabilidade da economia agrícola, às secas periódicas e ao processo de desertificação, em algumas de suas áreas, como têm ressaltado mais recentemente alguns estudos e planos. Este comportamento fica bem evidente com o exame das informações do gráfico 3.5.2.2, relacionadas às taxas anuais de crescimento da população da região. Neste particular, chama-se atenção para o progressivo aumento da taxa negativa de evolução da população rural, de um nível na década de 70 correspondente a – 1,14% alcança – 2,22% ao ano, na década de 90 (1991-96). Essa taxa praticamente duplica, em termos absolutos, entre as duas décadas referidas. 190 GRÁFICO 3.5.2.2 S e r i d ó : T a x a s d e C r e sc i m e n to d a P o p u l a ç ã o - 1 9 7 0 -9 6 4 .0 0 3 .0 0 2 .0 0 1 .0 0 (%) T o ta l Urbano - Rural ( 1 .0 0 ) ( 2 .0 0 ) ( 3 .0 0 ) 1970-80 1980-91 191 1991-96 TABELA 3.5.2.4 MUNICÍPIOS DO SERIDÓ: POPULAÇÃO FORA DO MUNICÍPIO DE NASCIMENTO – 1996 SERIDÓ, ZONA HOMOGÊNEA E MUNICÍPIO Região do Seridó Currais Novos Acari Carnaúba dos Dantas Currais Novos Equador Parelhas São Tomé Caicó Caicó Cruzeta Ipueira Jardim de Piranhas Jardim do Seridó Ouro Branco Santana do Seridó São Fernando São João do Sabugi São José do Seridó Serra Negra do Norte Timbaúba dos Batista Serras Centrais Campo Grande Cerro Corá Florânia Jucurutu Lagoa Nova Santana do Matos São Vicente REGIÃO NORTE 284 120 5 2 64 7 9 33 127 79 6 5 4 10 16 1 1 3 2 37 4 14 8 3 5 3 R. G. NORTE 8.137 2.964 401 101 1.869 78 442 73 3.254 1.176 519 67 276 451 87 25 202 121 99 88 143 1.919 78 206 558 197 521 345 14 OUTROS. ESTADOS DO NORDESTE 3.224 1.178 78 94 484 237 278 7 1.781 624 57 152 442 121 90 22 24 31 11 176 31 265 1 23 63 96 49 22 11 SÃO PAULO 929 336 67 13 146 48 55 7 409 210 46 24 7 36 11 3 8 29 12 16 7 184 2 15 47 62 30 19 9 OUTROS REGIÃO ESTADOS SUL DO SUDESTE 448 55 189 11 18 8 95 7 5 52 4 11 149 40 55 25 48 2 1 3 19 10 6 2 3 3 3 2 6 110 1 6 44 30 15 6 8 1 4 3 1 TOTAL DE MIGRANTES 13.077 4.798 569 218 2.665 375 840 131 5.760 2.169 678 249 732 647 212 54 235 185 125 285 189 2.519 82 254 726 396 618 398 45 FONTE DOS DADOS BÁSICOS: Ibge. Contagem da população, 1996. O reduzido crescimento da população do Seridó, a uma taxa anual sempre menor do que a do Estado, sobretudo entre 1991 e 1996, que alcançou apenas 0,33% ao ano, enquanto o Estado, em seu conjunto, registrou uma taxa de 1,16%, sugere a presença de um processo migratório com saldos negativos, que não somente alcança o meio rural mas a totalidade da região. A tabela 3.5.2.4 apresenta as informações coletadas em 1996, sobre a população dos municípios do Seridó, que residiam em municípios diferentes daqueles em que nasceram, e, por meio desses dados, mostra o destino escolhido pela população que migra. Tais fenômenos demográficos têm, seguramente, estreita relação com o que se registrou anteriormente, quando foram assinalados aspectos relevantes da crise da agricultura tradicional do Seridó, notadamente a do algodão. 192 Segundo aqueles dados, em 1996, se encontrariam fora dos municípios em que nasceram cerca de 13 mil pessoas, das quais cerca de 8,1 mil estariam residindo em municípios do Rio Grande do Norte, inclusive no interior do Seridó. No entanto, o destaque deve ser dado para o fato de que 3,2 mil estariam morando em outros estados nordestinos, sendo que cerca de 1,4 mil estariam no Sudeste; desse total, aproximadamente 929 pessoas nascidas no Seridó estariam residindo no Estado de São Paulo. Do total dos migrantes, cerca de 5,7 mil saíram de municípios da Zona Homogênea de Caicó; especificamente do município de Caicó teriam saído, segundo a estimativa do Ibge, cerca de 2.2 mil pessoas. Este contingente só é superado pelo do município de Currais Novos, de onde teriam saído, no correr dos anos, cerca de 2,7 mil pessoas. 3.5.2.3 Qualidade de Vida e Pobreza O balanço sumário da qualidade de vida da população do Seridó, de suas Zonas Homogêneas e dos seus municípios, será realizado a partir de alguns indicadores produzidos pelo Relatório de Desenvolvimento, produzido pelo Pnud, 1998, e de estimativas elaboradas a partir dessas informações. Muitos desses aspectos serão complementados quando do exame de questões relacionadas à saúde, educação e outros temas associados à dimensão social do desenvolvimento da região. O que se pretende a seguir, no que se refere à qualidade de vida da população do Seridó, neste momento, é buscar elementos para respostas a duas questões: i) como se situa a qualidade de vida no Seridó, relativamente ao Estado, em seu conjunto, nas últimas décadas? ii) nesta evolução recente, quanto dos determinantes do índice de desenvolvimento humano (IDH) tem contribuído para reduzir a intensidade da melhoria que se constata no indicador geral do IDH? Para a primeira resposta fez-se um esforço no sentido de estimar o IDH para o Seridó e suas Zonas Homogêneas, a partir dos dados disponíveis para os municípios, estabelecendo-se com base nesta estimativa um confronto com a evolução do IDH para o Estado. Para a resposta à segunda pergunta, fez-se o confronto entre as dimensões do IDH relativa à longevidade, instrução e renda. Relativamente à primeira indagação, a tabela 3.5.2.5 e o gráfico 3.5.2.3 sugerem alguns aspectos relevantes. Em primeiro lugar, cabe destacar o fato de a Região do Seridó apresentar, praticamente, no início do período aqui considerado, o mesmo patamar de desenvolvimento humano registrado para o Estado em seu conjunto, mostrando, em 1991, um nível inferior ao que é apresentado para a média do Rio Grande do Norte. Note-se que, já em 1980, o valor do IDH do Seridó era bem menor do que o do Estado. Naquele ano, o valor do IDH do Seridó correspondia a 80,6% do apresentado pelo Rio Grande do Norte; em 1991 representava cerca de 77,6%, ocorrendo, portanto, um aumento da perda relativa da região TABELA 3.5.2.5 RIO GRANDE DO NORTE, SERIDÓ E ZONAS HOMOGÊNEAS: ESTIMATIVA DO IDH: 1971, 1980 E 1991 ESTADO, SERIDÓ E ZONAS HOMOGÊNEAS 1970 1980 1991 Estado Seridó ZH de Currais Novos ZH de Caicó ZH das Serras Centrais 0,266 0,268 0,272 0,315 0,204 0,501 0,404 0,435 0,462 0,299 FONTE DOS DADOS BÁSICOS: Pnud-Ipea-Ibge-FJP (1997)- Relatório de desenvolvimento humano do Brasil, 1997. Nota: Foram feitas estimativas para a região e as Zonas Homogêneas, a partir dos dados municipais. 193 0,620 0,481 0,508 0,543 0,368 Quando se desce ao exame das Zonas Homogêneas, no interior da Região do Seridó, constatamse diferenças relevantes no seu comportamento, no que se refere à evolução do seu índices de desenvolvimento humano. A Zona Homogênea das Serras Centrais registra níveis muito baixos do índice. Ela parte de um nível muito reduzido em 1971 e permanece, relativamente às demais Zonas, em patamar bem inferior às ZH de Currais Novos e de Caicó, e, em conseqüência, que a média da região, nos anos seguintes: 1980 e 1991. A Zona Homogênea de Currais Novos registra um comportamento similar ao do Seridó, em seu conjunto. Já a de Caicó, iniciando o período com um nível mais elevado do que o Seridó, registra no final do período um nível inferior ao do Estado, no entanto superior ao da média da região. Tudo indica que, enquanto os indicadores dos municípios da Zona Homogênea de Caicó contribuem para elevar o nível de desenvolvimento humano do Seridó, os municípios das Serras Centrais contribuem, provavelmente, para a redução do seu patamar, com o passar dos anos. É importante examinar esse aspecto a partir dos dados apresentados pelos diferentes municípios integrantes do Seridó. Na tabela 3.5.2.6 são apresentados os dados originais do Relatório de Desenvolvimento Humano, para cada município e para o Estado, em seu conjunto, e as estimativas feitas para a região e Zonas Homogêneas. O exame dos dados calculados pelo Pnud, Ipea, Ibge e Fundação João Pinheiro–FJP, para os municípios do Seridó, revelam que sua grande maioria registra níveis que os qualifica como de baixo grau de desenvolvimento humano. De fato, quando se considera que neste nível encontram-se aqueles municípios cujos IDH estão abaixo do 0,50, o que se percebe é que dos 25 listados na tabela 3.5.2.6 cerca de 14 deles não alcançam o referido patamar, e cerca de 6 apenas ultrapassam a marca de 0,50, registrando entre 0,50 e 0,52, para 1991, último ano para o qual se dispõe de estimativa municipal para o IDH. O peso relativo desses municípios, com baixo nível no índice de desenvolvimento humano, contribui para que a Região do Seridó, em seu conjunto, esteja, ainda, em 1991, classificada como de baixo nível de desenvolvimento humano. Note-se que, na Zona Homogênea das Serras Centrais, todos os municípios apresentam IDH abaixo da média considerada como patamar para sua classificação como municípios com baixo nível de desenvolvimento humano. O que não acontece com as demais Zonas Homogêneas. A de Currais Novos apresenta uma maior diversificação dos municípios, neste particular, o que permite que supere, por pouco, o patamar de baixo nível de desenvolvimento humano, na média que foi calculada a partir dos dados dos municípios. Relativamente à Zona Homogênea de Caicó, o peso do município-pólo e a presença de vários municípios, com marca superior a 0,50, do seu IDH, possibilitam, no conjunto da região, que essa Zona Homogênea apresente o valor maior no referido índice, entre as demais Zonas Homogêneas. Convém ressaltar que o Município de Caicó apresenta um IDH inferior, mas muito próximo ao da média do Estado do Rio Grande do Norte. Resta agora examinar, no IDH, as suas diferentes dimensões, e explicitar, no período, qual delas contribuiu mais para a determinação dos valores apresentados na índice composto (IDH), anteriormente comentado. Isso poderá sugerir caminhos para algumas ações voltadas para o desenvolvimento humano do Seridó e de seus municípios e Zonas Homogêneas. 194 O IDH possui três dimensões básicas que, igualmente ponderadas, definem o seu valor. Tais dimensões referem-se aos aspectos de longevidade (estimado a partir da expectativa de vida), da educação (taxa de analfabetismo e número média de anos de estudos) e de renda (renda familiar per capita). O que se pretende é ter, nos três intervalos de tempo considerados, uma noção mínima da evolução dessas dimensões e de sua influência sobre o indicador mais geral – o IDH. TABELA 3.5.2.6 RIO GRANDE DO NORTE, SERIDÓ, SUAS ZONAS HOMOGÊNEAS E MUNICÍPIOS: ESTIMATIVAS DE IDH 1971, 1980 E 1991 ESTADO, SERIDÓ E ZH 1970 Estado Seridó Acari Carnaúba dos Dantas Currais Novos Equador Parelhas São Tomé Currais Novos Caicó Cruzeta Ipueira Jardim de Piranhas Jardim do Seridó Ouro Banco Santana do Seridó São Fernando São João do Sabugi São José do Seridó Serra Negra do Norte Timbaúba dos Batistas Caicó Campo Grande Cerro Corá Florânia Jucurutu Lagoa Nova Santana do Matos São Vicente Serras Centrais 1980 0,266 0,268 0,297 0,251 0,284 0,251 0,334 0,183 0,272 0,351 0,292 0,242 0,234 0,345 0,290 0,265 0,291 0,328 0,314 0,265 0,320 0,315 0,207 0,176 0,225 0,191 0,184 0,217 0,212 0,204 1991 0,501 0,404 0,422 0,467 0,459 0,416 0,503 0,281 0,435 0,515 0,411 0,421 0,374 0,492 0,395 0,420 0,424 0,448 0,430 0,387 0,456 0,462 0,281 0,282 0,329 0,314 0,275 0,294 0,317 0,299 FONTE DOS DADOS BÁSICOS: Pnud-Ipea-Ibge-FJP (1997)- Relatório de desenvolvimento humano do Brasil, 1997. 195 0,620 0,481 0,505 0,506 0,557 0,413 0,511 0,380 0,508 0,604 0,510 0,517 0,476 0,520 0,462 0,462 0,440 0,518 0,518 0,452 0,527 0,543 0,354 0,367 0,384 0,362 0,365 0,361 0,411 0,368 Gráfico 3.5.2.3 R.G. do Norte: Estimativa do IDH para Seridó e sua Zonas Homogêneas - 1970-91 0.700 0.600 0.500 0.400 1970 0.300 1980 0.200 1991 ZH das Serras Centrais ZH de Caicó ZH de Currais Novos Seridó 0.000 Estado 0.100 As informações mais gerais a respeito das três dimensões do IDH estão apresentados no gráfico 3.5.1.4. A partir dele algumas observações relevantes podem ser consideradas a respeito da evolução da região. (Tabela 3.5.2.7.) Gráfico 3.5.2.4 Seridó: Evolução do IDH, segundo suas Dimensões - 1970-91 0.700 0.600 (índice) 0.500 0.400 IDH -longev. 0.300 IDH - educ. 0.200 IDH - renda 0.100 1970 1980 1991 FONTE DOS DADOS BÁSICOS: Pnud, Ipea, Ibge, FJP. Em primeiro lugar, cabe a constatação de que grande parte da evolução do IDH, no sentido de melhoria dos níveis apresentados pelo Seridó, deve-se à sua dimensão relacionada à longevidade. De 196 fato, o índice que reflete estes aspectos não só apresenta valores maiores em todos os anos, como constitui o que mais cresceu, de modo sistemático, no período, comparativamente aos demais. Convém observar que o índice que reflete a evolução dos aspectos relativos à educação, embora registre uma expansão, com o correr do tempo, a intensidade do seu crescimento é menor, sobretudo quando se consideram os dois últimos anos da série na qual sua expansão é menor. Neste particular, cabe observar que no início do ano o referido índice (IDH–educação) era similar ao índice que reflete os aspectos da longevidade (IDH–longevidade). No que se refere ao IDH–renda, cuja variável básica é a renda familiar per capita, alguns comentários iniciais devem ser feitos. Seu ponto de partida, o ano de 1970, quando o índice alcançava valor extremamente baixo, em comparação com os demais, está muito influenciado pela seca que ocorreu naquele ano. Em 1970, o Produto Interno Bruto–PIB total registrado para o Rio Grande do Norte correspondeu a 64,2% do apresentado em 1971, quando terminada a seca os níveis de atividade voltaram ao patamar anterior. Quanto ao PIB agrícola, o Estado apresentou em 1970 um nível que correspondia a apenas 52,4% do de 1971, isto é, à metade. Como a dinâmica do região, sobretudo há décadas atrás, é, em grande parte, explicada pelas atividades agropecuárias, não resta dúvida de que nas comparações que estão sendo feitas partiu-se de uma base muito reduzida. Considerando este fato, o que o gráfico assinala é que o IDH–renda apresenta, em todos os anos, nível bem mais reduzido do que os demais, e, além disso, entre 1980 e 1991, praticamente estagnou. TABELA 3.5.2.7 RIO GRANDE DO NORTE, SERIDÓ E ZONAS HOMOGÊNEAS: ESTIMATIVAS DO IDH SEGUNDO SUA DIMENSÕES - 1970-1991 ESTADO, REGIÃO E ZONA HOMOGÊNEA IDH - LONGEVIDADE 1970 1980 1991 IDH - EDUCAÇÃO 1970 1980 1991 1970 IDH – RENDA 1980 1991 ESTADO 0,326 0,434 0,593 0,334 0,422 0,519 0,162 0,477 0,507 Seridó ZH – Currais Novos ZH – Caicó ZH – Serras Centrais 0,362 0,355 0,432 0,283 0,458 0,456 0,523 0,379 0,611 0,635 0,643 0,543 0,330 0,329 0,380 0,267 0,403 0,428 0,455 0,310 0,479 0,509 0,529 0,379 0,111 0,131 0,134 0,063 0,351 0,421 0,408 0,206 0,354 0,380 0,459 0,185 FONTE DOS DADOS BÁSICOS: Pnud-Ipea-Ibge-FJP (1997)- Relatório de desenvolvimento humano do Brasil, 1997. Com exceção do grande salto que dá entre 1970 e 1980 – explicado em grande parte pela seca de 1970, que reduziu significativamente o seu valor naquele ano –, o IDH–renda é particularmente responsável pelo menor dinamismo ocorrido na evolução do valor do IDH em geral, no Seridó e nas suas Zonas Homogêneas. A hipótese que se pode extrair a partir desses dados é que o avanço ocorrido no IDH se deveu, provavelmente, mais aos fatores que possibilitaram uma redução da mortalidade infantil e um aumento da expectativa de vida (entre os quais não se pode esquecer o aumento da cobertura da vacinação, a expansão da oferta de água tratada e uma ampliação da assistência médica), bem como aos fatores associados ao aumento da escolaridade, do que a uma melhoria substancial da renda, decorrente, por exemplo, do aumento da base produtiva do Seridó. A base produtiva da região, dependente em grande parte do setor primário, não só é extremamente vulnerável às condições climáticas adversas, como assiste à perda de importância econômica de culturas agrícolas comerciais, que tiveram peso da maior relevância na sua vida econômica, tempos atrás. 197 O gráfico 3.5.2.5 apresenta a evolução do IDH–renda, nos anos 1970-91, para o Seridó e suas três Zonas Homogêneas. O que os dados revelam, de modo enfático, são aspectos já comentados anteriormente: o aumento significativo de 1970 (ano de uma intensa seca) para 1980 e uma redução ou pequeno crescimento, entre 1980 e 1991. De fato, quando se considera a região em seu conjunto, o que se percebe é que os níveis entre 1980 e 1991 permanecem, praticamente, os mesmos, no que se refere ao ÍDH–renda. Com relação à Zona Homogênea de Currais Novos, verifica-se um declínio entre os dois últimos anos, o mesmo acontecendo na Zona Homogênea das Serras Centrais. O crescimento do nível de renda, de acordo com o IDH–renda, ocorre apenas na Zona Homogênea de Caicó, o que é explicado em parte pelo crescimento do referido índice no município-pólo (Caicó), entre 1980 e 1991. Essa perspectiva da evolução da renda pode ser melhor entendida com a utilização, não de um índice, mas dos valores reais do rendimento familiar per capita, dos residentes no Seridó, comparativamente aos do Estado, em média. Na tabela 3.5.2.8 são apresentados os valores do rendimento familiar por residente no domicílio, medido em salários mínimos de setembro de 1991, que correspondia, na moeda vigente, a CR$ 36.161,60. Gráfico 3.5.2.5 1970 1980 ZH Serras Centrais ZH Caicó 1991 ZH Currais Novos 0.500 0.450 0.400 0.350 0.300 0.250 0.200 0.150 0.100 0.050 - Seridó (índice) Seridó e suas Zonas Homogêneas: IDH - Renda no Período - 1970-91 Um primeiro aspecto a ser considerado é a trajetória distinta do Seridó, comparativamente à média do Estado. Enquanto o Estado mostra uma trajetória ascendente em todos os intervalos de tempo (mesmo que entre 1980 e 1991 registre um aumento muito pequeno), o Seridó apresenta um aumento significativo (como o Estado) entre 1970 e 1980, e registra uma estagnação, entre 1980 e 1991. Esta estagnação é explicada, em grande parte, pelo declínio apresentado na renda familiar por habitante da Zona Homogênea de Currais Novos e das Serras Centrais, que apenas foi compensado pelo aumento registrado na renda familiar per capita da Zona Homogênea de Caicó. Convém notar, quando se examina a participação da renda familiar por habitante do Seridó e de suas Zonas Homogêneas, no total da renda familiar per capita do Estado, que, salvo a renda por habitante da ZH de Caicó, todas as demais perdem importância relativa. O declínio maior da participação ocorre nas Serras Centrais, que participavam com 50% da renda familiar por habitante do Estado, em 1970, mas reduziram sua participação para 40,3%, em 1991. O Seridó, em seu conjunto, 198 apresenta um aumento da participação, entre 1970 e 1980, para, em seguida, em 1991, registrar um declínio, apresentando nesse ano uma participação menor do que a apresentada em 1970. A região, portanto, não acompanha a evolução do Estado, em seu conjunto, neste particular. Com base nos indicadores apresentados no Atlas de Desenvolvimento Humano no Brasil, 90 elaborado pelo Pnud, Ipea, Ibge e FJP, é possível ter um conhecimento aproximado com relação à incidência da pobreza no Seridó e nas suas Zonas Homogêneas. Para isso, utilizou-se o indicador que mede o percentual de pessoas com renda insuficiente, considerando como tal a população que possui renda abaixo de um determinado nível, que, no caso, foi considerado como correspondendo à metade do salário mínimo por membro da família. Em síntese, o que este indicador mostra, na forma como foi estimado, é o percentual de pessoas cuja renda familiar per capita é menor ou igual à metade do valor do salário mínimo vigente em setembro de 1991. TABELA 3.5.2.8 RIO GRANDE DO NORTE, SERIDÓ E ZONAS HOMOGÊNEAS – ESTIMATIVA DO RENDIMENTO FAMILIAR PER CAPIT:A: 1970, 1980 E 1991 ESTADO, SERIDÓ E ZONA HOMOGÊNEA 1970 1980 1991 (EM SALÁRIOS MÍNIMOS DE SET/91) ESTADO 0,26 0,68 0,72 Seridó ZH - Currais Novos ZH - Caicó ZH - Serras Centrais 0,19 0,22 0,22 0,13 0,51 0,60 0,59 0,32 (EM %) 0,51 0,55 0,65 0,29 100,0 100,0 100,0 73,1 84,6 84,6 50,0 75,0 88,2 86,8 47,1 70,8 76,4 90,3 40,3 ESTADO Seridó ZH - Currais Novos ZH - Caicó ZH - Serras Centrais FONTE DOS DADOS BÁSICOS: Pnud-Ipea-Ibge-FJP (1997)- Relatório de desenvolvimento humano do Brasil, 1997. Os valores estimados mostram uma alta incidência da população de renda insuficiente no Seridó, que se expressa, no melhor dos anos considerados, por um valor correspondente a 71,7% da população total. Ou seja: em 1980, o melhor dos anos, cerca de 71,7% do total da população da região pode ser considerada como pobre, uma vez que, nesta proporção, recebia igual ou menos que meio salário mínimo per capita. Note-se, de acordo com a tabela 3.5.2.9, que, em 1970, tal proporção havia alcançado cerca de 93,9%, em plena seca ocorrida no referido ano, tendo passado para 72,5% no último ano da série: 1991. Como era de se esperar, a partir da trajetória da renda por habitante, anteriormente comentada (tabela 3.5.2.7), não ocorreu nenhuma melhoria neste indicador de insuficiência de renda, entre 1980 e 1991. Ao contrário, registrou-se um pequeno aumento da população que pode ser considerada pobre, uma vez que o nível do índice que mede a população com renda insuficiente passou de 71,9% para 72,5% (tabela 3.5.2.9). 90 Ou Relatório de Desenvolvimento Humano. 199 TABELA 3.5.2.9 RIO GRANDE DO NORTE, SERIDÓ E ZONAS HOMOGÊNEAS: ESTIMATIVA DA POPULAÇÃO COM INSUFICIÊNCIA DE RENDA - 1970-1991 (%) ESTADO, SERIDÓ E ZONA HOMOGÊNEA 1970 1980 1991 ESTADO 89,98 65,97 66,87 Seridó ZH – Currais Novos ZH – Caicó ZH – Serras Centrais 93,94 92,96 91,81 97,59 71,69 65,23 66,82 84,72 72,54 72,23 62,53 86,24 FONTE DOS DADOS BÁSICOS: Pnud-Ipea-Ibge-FJP (1997)- Relatório de desenvolvimento humano do Brasil, 1997. Essa trajetória de melhoria substancial, entre 1970 e 1980, e de estagnação ou mesmo aumento da insuficiência de renda, entre 1980 e 1991, ocorreu em relação às Zonas Homogêneas e para o conjunto do Estado do Rio Grande do Norte. Em síntese, por várias razões associadas, tanto ao reduzido crescimento da economia entre 1980 e 1991, ou ainda à instabilidade da agropecuária, da qual depende parte importante da população da região – mesmo que não trabalhe diretamente no meio rural – o que se constata é a ausência de melhoria da situação de pobreza ou de insuficiência de renda que, no Seridó, e de modo mais geral, no Estado, alcança parcela relevante da população. 3.5.2.4 As Grandes Tendências da População e de sua Qualidade de Vida Do exposto, é importante extrair algumas tendências da população que têm grande significado para a implantação de ações voltadas para o desenvolvimento sustentável da Região do Seridó e de suas Zonas Homogêneas. Um primeiro ponto a considerar é o caráter predominantemente urbano da população do Seridó, não obstante algumas diferenças entre suas Zonas Homogêneas a este respeito, com as Serras Centrais registrando, ainda em 1996, uma participação maior da população rural no total da população da Zona Homogênea. Este ponto sugere que parte relevante das ações seguramente deverão estar voltados para o meio urbano da região. Além disso, cabe na distribuição espacial da população, destacar o grande peso que têm os dois municípios de porte médio, o de Currais Novos e o Caicó, que concentram não só parte relevante da população urbana, mas parcela importante da vida econômica e social da região. É, sem dúvida, da maior relevância considerar algumas tendências constatadas na dinâmica da população, por suas implicações na definição de estratégias e programas sociais e econômicos: • vem ocorrendo um processo de desaceleração do crescimento da população do Seridó, que se tornou mais expressivo nos anos 1991-96; embora acompanhe o que se vem verificando no Estado e na região Nordeste, essa desaceleração do crescimento demográfico é bem maior no Seridó, cuja taxa anual é 3,5 vezes menor do que a do Estado, nos anos 90; • há, além disso, um processo muito intenso de redução da população rural, não só em termos relativos, mas em valores absolutos; esse processo de emigração da população do campo para a 200 cidade tornou-se bem mais acelerado nos anos 90 e vem ocorrendo a taxas negativas, que correspondem, em termos absolutos, a duas vezes e meia a taxa registrada para o Rio Grande do Norte; e • esses dois aspectos sugerem não só a ocorrência e aceleração da emigração do meio rural para o meio urbano, mas a presença de um processo migratório do Seridó para outras partes do Estado, da região e do País; o que significa dizer que, da perspectiva econômica, a região não vem oferecendo condições para que as pessoas obtenham oportunidades de trabalho e de emprego na região, notadamente no meio rural. No que se refere ao nível de desenvolvimento humano, embora o IDH estimado revele a ocorrência de uma melhoria a partir dos anos 70, o Seridó, mesmo no último ano para o qual estão disponíveis informações, a respeito, está classificado entre as áreas de baixo desenvolvimento humano. Além disso, em média, a região não vem acompanhando o progresso, neste particular, ocorrido no Estado. De fato, partindo, nos anos 70, do mesmo nível de desenvolvimento humano registrado para o Rio Grande do Norte, o Seridó apresenta tanto em 1980 como em 1991 níveis menores do que a média estadual. Ademais, no interior da região, os níveis de desenvolvimento humano da Zona Homogênea das Serras Centrais são, significativamente inferiores aos das Zonas Homogêneas de Currais Novos e de Caicó, registrando uma grande diferenciação entre os municípios do Seridó. O exame das três dimensões do índice do desenvolvimento humano (longevidade, educação, renda) mostra que i) grande parte da melhoria ocorrida deveu-se à evolução do IDH–longevidade, que tem na expectativa de vida sua expressão maior; ii) em segundo lugar, aparece a influência do IDH– educação, calculado a partir da taxa de analfabetismo e do número médio de anos na escola. No que se refere ao IDH–renda, o que se verifica é que, registrando uma melhoria substancial, entre 1970 e 1980 (1970 foi um ano de grande seca, com impacto negativo sobre o nível de renda da população), o referido índice mostra uma estagnação entre este último ano e o início dos anos 90. Este comportamento, entre outros aspectos, sugere que a ação governamental – por meio dos serviços e dos programas que permitiram a maior expectativa de vida da população ou seu acesso à instrução – contribuíram bem mais do que o crescimento da renda para a melhoria do índice de desenvolvimento humano do Seridó, notadamente no período 1980-91. Ou seja, tanto pelo nível apresentado pelo índice representativo da renda (IDH–renda), comparativamente aos demais, como pela sua evolução, tudo indica que a fragilidade da base econômica do Seridó e sua grande vulnerabilidade não contribuíram para que o avanço do IDH, em geral, ocorresse, no período, com uma maior intensidade. Isto significa que, como se verá mais adiante, além do desenvolvimento de programas voltados para a melhoria das condições de saúde e de educação, é da maior importância a realização de um conjunto de ações articuladas, voltadas para o fortalecimento e a reestruturação da base produtiva da região, se se pretender um progressivo e sustentável aumento dos indicadores de desenvolvimento humano do Seridó. Não obstante o fato de os indicadores mostrarem uma melhoria da situação da pobreza na região, quando este é medido pela participação da população, com renda insuficiente no total da população regional, algumas qualificações devem ser feitas a respeito. Em primeira lugar, os níveis de participação da população, com renda insuficiente no Seridó. são muito altos, ultrapassando, nos melhores anos, a marca de 70%. Em segundo lugar, a melhoria ocorrida foi entre 1970 e 1980, tendo sido o primeiro dos anos marcado pela presença de uma seca muito intensa, que reduziu o nível de renda na região e no Estado de modo geral, como mostram as estimativas de Produto elaboradas pela 201 Sudene. Em terceiro lugar, não se constatou nenhuma melhora neste indicador, entre 1980 e 1991, que seguramente está associada ao reduzido crescimento da base produtiva da região. O reduzido crescimento da população do Seridó, associado a diferentes razões, entre elas a de menor número de filhos por família, nesse período mais recente, possibilita, da perspectiva dos programas sociais, que investimentos menores do que seriam necessários há algumas décadas, sejam realizados a partir de agora, em áreas como a de instalação de escolas, hospitais e postos de saúde. Além disso, permite que, neste particular, as ações governamentais se voltem mais para a qualidade dos serviços e melhoria do seu funcionamento, que anteriormente, quando os déficits e as necessidades de ampliação do sistema, dificultavam esse tipo de linhas de ação nos programas e projetos sociais. É evidente que somente um exame detido de cada segmento e dos programas sociais poderá definir a natureza da estratégia a ser desenvolvida. 3.5.3 Emprego e Relações de Trabalho no Seridó O mercado de trabalho no Brasil tem apresentado transformações marcantes. A globalização da economia, a abertura de mercado e as amplas inovações tecnológicas introduzidas por novos arranjos organizacionais e produtivos, como também as mudanças nos padrões de consumo da população, têm modificado a estrutura do emprego por setor de atividade, suscitando a criação de novas categorias profissionais e a extinção ou a modificação de algumas carreiras. Essas transformações estruturais se efetuam também no âmbito das relações contratuais. O trabalho assalariado, em tempo integral com carteira assinada, que previa segurança de emprego e direitos trabalhistas garantidos, tem sido gradativamente substituído pelo trabalho temporário, em tempo parcial, subtraído desses direitos. Essas modalidades de trabalho são preconizadas pelas novas formas de administração e gerência, no sentido de garantir a rentabilidade e produtividade requeridas pelos atuais padrões de competitividade. As práticas de desregulamentação, deslocalização e flexibilização do mercado de trabalho promoveram a precarização do trabalho, a dispensa maciça de trabalhadores e a instabilidade do emprego. O Brasil apresenta particularidades quanto às características organizacionais e gerenciais de uma sociedade com baixo nível educacional e insuficientes investimentos em ciência e tecnologia. Aqui coabitam formas arcaicas e avançadas de produção que caracterizam um espaço híbrido. Enquanto alguns segmentos da economia incorporam a automação, a robótica e avançados sistemas de informática e comunicação, em outros persistem o trabalho manual, as indústrias de fundo de quintal e até aberrações, como o trabalho escravo e infantil. Observam-se, lamentavelmente, aumentos de criminalidade e corrupção numa sociedade que desconhece ainda as noções mais elementares de cidadania. Cresce também a participação da economia informal, que se torna mais presente, em razão da crise econômica, do desemprego, do subemprego e do empobrecimento da classe média. A economia do Rio Grande do Norte, como reflexo da brasileira, apresenta também diversidade de modelos produtivos e organizacionais, quanto aos setores e ocupações. A política do atual governo, no sentido de criar mais emprego, tem dado destaque para a instalação de projetos em setores dinâmicos da economia, como o Pólo Gás Sal, o Centro Industrial Avançado–CIA e a vinda de empresas com o apoio do programa de isenção fiscal – Programa de Apoio ao Desenvolvimento Industrial–Proadi. Algumas regiões fortemente atingidas pelas secas, a exemplo do Seridó, têm recebido a ação governamental por intermédio de alguns programas específicos, como o Programa do Leite, o Programa de Convivência com a Seca (a construção de adutoras e barragens, a distribuição de cestas básicas e as frentes de trabalho) e o Programa de Erradicação de Casas de Taipa. 202 A apreensão do emprego no Estado e no Seridó se defronta com a limitação dos dados estatísticos disponíveis, principalmente em escala regional. Portanto, para que seja possível apreender em alguma medida, a dinâmica do emprego no Seridó é necessário, inicialmente, tecer considerações sumárias sobre a realidade laboral no Estado, cujos reflexos se fazem sentir no âmbito dessa região. Outra fonte de dados a que se recorrerá com freqüência nesta análise é o Censo de 1991 do Ibge, que dispõe de informações detalhadas sobre os municípios e o Estado. 3.5.3.1 Aspectos da Dinâmica do Emprego no Rio Grande do Norte O exame da estrutura de ocupações, a partir da população economicamente ativa–PEA do Rio Grande do Norte, em 1997, mostra que a mão-de-obra estadual está centrada no setor terciário da economia, que absorve mais da metade da PEA. Isso se dá principalmente por intermédio da prestação de serviços e do comércio. O setor de prestação de serviços é tradicionalmente forte absorvedor de mão-de-obra, e tem recebido grande influência do turismo e das atividades de entretenimento, além de atividades predominantemente informais. Desponta também, no âmbito desse setor, o segmento serviços sociais. A agricultura e a indústria têm apresentado participação limitada, embora a primeira ainda apresente preponderância sobre a segunda. A população economicamente ativa sem ocupação é superior a quarenta mil pessoas e representa mais de 4% da PEA estadual. A variação do emprego formal (com carteira assinada) por setor de atividade, com base nas informações do Ministério do Trabalho (Caged), permite verificar os setores econômicos mais dinâmicos, em termos de criação de novas vagas. A indústria de construção civil lidera com mais de 17% do total. Em seguida, vem a indústria têxtil, com dados próximos a 12%. O segmento industrial alimentação e bebidas é também significativo. Já o setor serviços embora apresente dados positivos, tem seus diversos segmentos bastante próximos, com ligeira predominância dos serviços médicoodontológicos. (Tabela 3.5.3.1.) Os setores que sofreram maiores reduções no número de vagas foram a agricultura, os serviços de utilidade pública e a indústria extrativa mineral. Essa indústria tem sofrido uma perda crescente de mão-de-obra, a partir dos anos 80. Perda essa que se fez ainda mais drástica nos anos 90. O elevado índice de redução dos empregados na agropecuária permite fazer inferências de que a situação do setor agrícola, enquanto empregador, ainda é mais grave nas áreas mais atingidas pelas secas, como é o caso do Seridó. 3.5.3.2 Características da Força de Trabalho Não há estatísticas sobre emprego e desemprego no Brasil em âmbito municipal, salvo para os municípios que integram as regiões metropolitanas. Contudo, os dados censitários permitem apreender características e transformações da população economicamente ativa–PEA, ao longo das três últimas décadas. Inicialmente, será abordada a drástica redução que se operou nas ocupações ligadas às atividades agropecuárias, ao extrativismo vegetal e à pesca, nos anos 1970, 1980 e 1991. Em seguida, serão examinados os dados de emprego por setor de atividade econômica, nos anos de 1980 e 1991, de forma a apreender sua estrutura e evolução, por setores e subsetores econômicos. Optou-se por não incluir 1970, porque as subcategorias estabelecidas nesse ano não são compatíveis com as adotadas posteriormente. A análise prosseguirá com as informações obtidas no Censo de 1991, o qual permitiu uma percepção mais acurada das pessoas ocupadas, visto que as classificou i) por condição de ocupação e relações de trabalho, ii) por local de trabalho e iii) por forma de vinculação ao 203 estabelecimento agrícola, no caso específico dos trabalhadores rurais. Portanto, achou-se elucidativo abordar o emprego segundo essas perspectivas. a. População Ocupada por Setor de Atividade A distribuição da força de trabalho por setor de atividade no Seridó apresenta algumas especificidades. Primeiro, ocorreu uma diminuição generalizada dos segmentos ligados às atividades agropecuárias, de extração vegetal e pesca (tabela 3.5.3.2). Esse fato foi constatado no Estado do Rio Grande do Norte e em todas as três Zonas Homogêneas, em termos absolutos e relativos, ao longo de todo o período, entre os censos de 1970, 1980 e 1991, embora em intensidade diferente, como demonstram as taxas de crescimento negativas apresentadas pelo setor. Porém, o maior decréscimo ocorreu nos anos de 1980 e de 1991. As Zonas Homogêneas de Currais Novos e de Caicó apresentaram queda mais acentuada do que a Zona Homogênea das Serras Centrais. Isso ocorreu provavelmente em razão da crise econômica dos anos 80, que afetou, sobremaneira, as atividades vinculadas à agropecuária, sobretudo a crise da cotonicultura que atingiu fortemente o Seridó, nos anos de 1980 e 1990, em razão das secas, da praga do bicudo e da concorrência da produção algodoeira do sudeste do País. Simultaneamente, houve o crescimento da população urbana e conseqüentemente das atividades secundárias e terciárias. TABELA 3.5.3.1 RIO GRANDE DO NORTE: POPULAÇÃO ECONOMICAMENTE ATIVA –1997 SETORES ECONÔMICOS Agricultura Indústria Indústria de transformação Indústria da construção Outras atividades Industriais Comércio e Serviços Comércio de mercadorias Prestação de Serviços Serviços Auxiliares Transporte e Comércio Sociais Administração Pública Outros atividades TOTAL OCUPADOS TOTAL PEA TOTAL DE DESOCUPADOS DESOCUPADOS/PEA (%) PEA 264.016 173.538 97.890 57.852 17.796 583.885 152.281 211.590 17.305 36.088 90.478 63.778 12.364 1.021.439 1.065.432 43.993 % 25,8 17,0 9,6 5,7 1,7 57,2 14,9 20,7 1,7 3,6 8,9 6,2 1,2 4,1 FONTE DOS DADOS BÁSICOS: Ibge, Pnad. 204 TABELA 3.5.3.2 RIO GRANDE DO NORTE E SERIDÓ: PESSOAS OCUPADAS NA ATIVIDADE AGROPECUÁRIA ESTADO, SERIDÓ E ZONA HOMOGÊNEA ESTADO Seridó ZH Currais Novos ZH de Caicó ZH das Serras Centrais VALORES ABSOLUTOS 1970 1980 1991 % SOBRE O TOTAL 1970 1980 1991 240.955 239.160 215.189 59 40 27 42.730 10.716 15.209 16.805 39.746 9.851 13.440 16.455 34.055 8.120 11.267 14.668 67 56 63 85 49 36 44 72 37 20 26 60 FONTE DOS DADOS BÁSICOS: Ibge, Censos Demográficos, 1970, 1980 e 1991. O cálculo das taxas de crescimento na década de 70 (1970-80) e na seguinte (1980-91) mostra não só que o declínio – indicado também pela participação percentual assinalada na tabela 3.5.3.2 – do emprego agropecuário é mais intenso no Seridó, do que no total do Estado. Indica também que tal processo, no interior da região, é mais intenso na ZH de Caicó e na de Currais Novos do que na ZH das Serras Centrais. Enquanto as taxas do Rio Grande do Norte eram, para tal setor, nas duas décadas, respectivamente, de – 0,1% e – 1,1, no Seridó era de – 0,7% (1970-80) e – 1,6% (1980-91). Nas Serras Centrais era de – 0,2% e – 1,2%, enquanto na ZH de Caicó era de – 1,3% e – 1,8% e na de Currais Novos – 0,8% e 1,9%. Note-se que em todos os caso há um nítido processo de redução do emprego, com o correr dos anos. As modificações no meio rural, com a decadência da economia algodoeira e mineira, bem como as dificuldades crescentes da pecuária bovina em razão das repetidas estiagens, foram fatores de expulsão da mão-de-obra, que migrou do campo para as cidades, conforme atestam as acentuadas taxas de urbanização e de crescimento do setor serviços. Instalando-se nas cidades próximas, essa população se insere em atividades vinculadas principalmente à prestação de serviços, pequenos comércios, atividades que são, por suas características típicas, de economia informal. A prestação de serviços e os serviços sociais têm sido fortalecidos em todos os municípios do Seridó, em razão da descentralização que canalizou para seus territórios atividades mais especializadas, principalmente de educação e saúde. Isso efetuou-se de forma acelerada entre os anos 80 e 90, acentuando-se mais nos anos 90. Verificou-se ainda um incremento das atividades industriais, seja da indústria de transformação, seja de outras atividades industriais. A tabela 3.5.3.3 apresenta as pessoas ocupadas por setor de atividade, para os anos de 1980 e 1991 (que permitem uma maior comparabilidade). Constata-se que o comportamento do Seridó se diferencia do observado para o Estado do Rio Grande do Norte, visto que esta região apresenta peso mais acentuado da população vinculada ao setor primário da economia nos anos 80 e 91 em relação aos dados do Estado. Apesar desse fato, a população ocupada nas atividades primárias da região decresceu nesse período, como se fez referência, o que se expressou em termos absolutos e relativos. Em números absolutos, a população ocupada do setor agrícola decresceu em uma década o equivalente a mais de cinco mil pessoas. Em termos relativos, houve uma perda de cerca de 13 pontos percentuais. Não há uniformidade, neste particular, no âmbito das Zonas Homogêneas. A maior representatividade, quanto às atividades agropecuárias é da Zona Homogênea das Serras Centrais, que absorvia mais de 70% da PEA, em 1980, tendo reduzido sua participação para 60%, em 1991, permanecendo ainda como a zona com maior absorção de população vinculada às atividades 205 agropecuárias. As demais zonas apresentam menos de 30% da população ocupada ligadas ao setor agropecuário. Quanto às atividades industriais, o Seridó apresentou uma média pouco superior a 20%, o que a coloca relativamente próxima da situação do Estado, cuja média se mostra ligeiramente inferior a esse patamar. A Zona Homogênea que se destacou mais em relação à indústria, em 1980, foi a de Currais Novos, que detinha, então, 30% da PEA ocupada no setor industrial. Essa participação decresceu na década seguinte, apresentando crescimento negativo, em razão provavelmente da crise da indústria extrativa mineral. Nas demais Zonas Homogêneas, as taxas de crescimento das pessoas ocupadas na indústria têm sido em geral modestas. Embora alguns novos setores tenham despontado na economia da região, como a confecção de bonés, malharia e calçados, outros foram extintos, a exemplo das usinas de beneficiamento de algodão, ou se encontram em decadência, como a fabricação de redes. A população ocupada da Zona Homogênea das Serras Centrais ainda está fortemente ancorada na atividade agropecuária, apresentando pequeno contingente vinculado às atividades industriais. Todavia, essa Zona tem apresentado fortalecimento da população ligada ao setor terciário. O setor serviços apresenta-se como tendo uma menor participação no Seridó do que na média do Rio Grande do Norte, que já superava os 50 pontos percentuais em 1991. Todavia, foi esse setor que apresentou as maiores taxas de crescimento, principalmente no âmbito das Zonas Homogêneas de Caicó e das Serras Centrais. Em 1991, os serviços já representavam mais de 40% da PEA regional, contudo, as posições das Zonas Homogêneas se diferenciam. A Região de Caicó, por exemplo, se destacou quanto às atividades terciárias, aproximando-se do patamar observado no Estado. As atividades terciárias são lideradas pela prestação de serviços e pelas atividades sociais. As primeiras são significativas no âmbito da Região do Seridó e de todas as Zonas Homogêneas, exceto a Zona das Serras Centrais, para o ano de 1980. As segundas têm apresentado elevado significado e crescimento em todas as Zonas Homogêneas indistintamente, a exemplo do que foi observado no Estado do Rio Grande do Norte em seu conjunto. Vale ressaltar que a Zona Homogênea de Currais Novos tem apresentado o mais baixo índice de crescimento da população ocupada em todos os setores econômicos, com crescimento negativo nos dois primeiros (agropecuária e indústria) e crescimento inferior às demais zonas no setor serviços, o que leva a supor que a crise do emprego nessa Zona Homogênea pode ser mais grave do que a observada no âmbito da região. De fato, a crise da mineração, desencadeada em meados dos anos 1980, teve forte repercussão, tanto no que se refere ao extrativismo mineral quanto ao beneficiamento de minérios. Ademais, os serviços ainda são pouco diversificados nessa Zona, concentrando-se em estabelecimentos de pequeno porte, com baixa absorção de mão-de-obra. Em resumo, no Seridó, mais do que no Estado, o grande decréscimo ocorrido no emprego rural é compensado pelo emprego no segmento urbano, não obstante o fato de as atividades industriais, salvo na ZH de Caicó, não se mostrarem muito dinâmicas, sobretudo quando se compara com o Estado. Os serviços apresentam maior dinamismo, muito embora isto ocorra desigualmente: as Zonas Centrais revelam um crescimento do emprego no terciário, que corresponde a quase metade do verificado no Seridó e a menos da metade do que se verificou no Estado. O crescimento do emprego total na região, em seu conjunto, correspondeu, entre 1980 e 1991, a um pouco mais da metade do que se constatou para o Rio Grande do Norte. O emprego das atividades urbanas nas Serras Centrais foi apenas capaz de compensar a perda de emprego no meio rural: o crescimento total da ocupação foi de apenas 0,1% ao ano. Do declínio do emprego agropecuário e industrial na Zona Homogênea de Currais Novos e do crescimento do emprego nos serviços, resultou uma expansão de apenas 0,6% do emprego nesta Zona 206 Homogênea. A ZH de Caicó é, de longe, a mais dinâmica, no tocante ao crescimento do emprego total: 3,6% ao ano. Ali, os estabelecimentos industriais, comerciais e de serviços apresentam-se mais diversificados e em maior número. TABELA 3.5.3.3 RIO GRANDE DO NORTE E SERIDÓ: EVOLUÇÃO SETORIAL DO EMPREGO – 1980-91 SETORES E ANOS Agropecuária Indústria Serviços Total Agropecuária Indústria Serviços Total Agropecuária Indústria Serviços Total ANO ESTADO 1980 1991 1980 1991 1980 1991 1980 1991 239,2 214,2 111,4 151,1 224,5 418,9 575,1 784,2 1980 1991 1980 1991 1980 1991 1980 1991 42,0 27,0 19,0 19,0 39,0 53,0 100,0 100,0 1980-91 1980-91 1980-91 1980-91 (1,0) 2,8 5,8 2,9 SERIDÓ ZH - CN ZH - CA Valores Absolutos (1000 pessoas) 39,8 9,9 13,4 34,1 8,1 11,3 16,2 8,3 5,6 20 7,8 9,7 24,9 8,8 10,6 42,8 12,9 22,5 80,9 27 29,6 96,9 28,8 43,5 Percentuais 49,0 37,0 45,0 35,0 28,0 26,0 20,0 31,0 19,0 21,0 27,0 22,0 31,0 33,0 36,0 44,0 45,0 52,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 Taxas Anuais de Crescimento (1,4) (1,8) (1,5) 1,9 (0,6) 5,1 5,0 3,5 7,1 1,7 0,6 3,6 ZH - SC 16,5 14,7 2,3 2,5 5,5 7,4 24,3 24,6 68,0 60,0 9,0 10,0 23,0 30,0 100,0 100,0 (1,0) 0,8 2,7 0,1 FONTE DOS DADOS BÁSICOS Ibge. Censos Demográficos. Nota: Os valores entre parênteses são negativos. Foram excluídos os que procuravam trabalho em 1980. b. Pessoal Ocupado por Condição de Ocupação A posição da população ocupada, quanto ao tipo de ocupação principal, pode ser observada na tabela 3.5.3.4, mediante as seguintes categorias: i) empregado do setor privado, ii) do setor público, iii) trabalhadores por conta própria, iv) empregador e v) ocupação não remunerada. 91 91 O Censo Demográfico do Rio Grande do Norte – Mão-de-Obra, 1991 – classifica as pessoas de 10 anos ou mais de idade quanto à posição na ocupação em quatro principais categorias: Empregado – aquele que presta serviço a um empregador remunerado em dinheiro ou mercadoria. Incluem-se trabalhadores agrícolas volantes, parceiros ou meeiros empregados, trabalhadores domésticos empregados, além de empregados do setor privado e empregados do setor público. ContaPrópria, o que exerce uma atividade de forma individual ou com a ajuda de pessoa não-remunerada moradora no domicílio. Integram essa categoria os parceiros e meeiros conta-própria bem como os trabalhadores domésticos conta-própria. Empregador, o que explora uma atividade econômica, com o auxílio de um ou mais empregados. Esse item contempla os parceiros ou meeiros empregadores. Não foi considerado empregador a pessoa que só dispunha de empregado doméstico. 207 Constatou-se que mais da metade das pessoas ocupadas no Seridó é constituída de pessoas empregadas (assalariadas). Se for estabelecida uma comparação com o Rio Grande do Norte, a participação dos empregados na região é inferior, visto que aproximadamente 65% das pessoas ocupadas no Estado são empregados. No que se refere aos trabalhadores vinculados ao setor público e ao setor privado, é preciso ter muita cautela no exame desses dados, pois o setor público tem se utilizado amplamente da terceirização, por intermédio de associações, cooperativas, ONGs, entre outras e da adoção de ampla flexibilização nas formas de contratação, tais como contratos temporários, serviços prestados, gratificações, pró-labores, entre outras práticas até mesmo informais. O setor saúde tem sido fortemente atingido por essas novas formas de contratação de pessoal. Por isso, funcionários formalmente vinculados ao setor privado podem estar prestando serviço em órgãos públicos, embora de forma mascarada. 92 Feitas essas ressalvas, o exame da tabela 3.5.3.4 mostra que o principal empregador é o setor privado, tanto no que se refere ao Estado quanto ao Seridó e suas Zonas Homogêneas, com médias próximas a 40% da população ocupada total. O setor público representa na região e nas Zonas Homogêneas menos de 20% do total, patamar levemente inferior ao Estado. Já os trabalhadores por conta própria alcançam mais de 30% do total na região do Seridó e nas Zonas Homogêneas, dado superior ao observado para o Estado. A Zona Homogênea das Serras Centrais se destaca com aproximadamente 44% de trabalhadores por conta própria. Os empregadores são em número reduzido, atingindo entre 1 a 3% do total. Os trabalhadores não remunerados são superiores à média estadual, situando-se no Seridó em torno de 6%. Mais uma vez, a Zona Homogênea das Serras Centrais apresenta uma situação diferenciada com 9% de pessoas ocupadas não remuneradas. Essas informações podem ser desmembradas por município, apresentando maiores detalhes. É possível observar então que os empregados do setor privado dividem-se em trabalhador agrícola volante, parceiro ou meeiro e outros, 93 sendo as duas primeiras categorias numericamente pouco significativas, predominando a categoria outros, ou seja, relações não identificadas, provavelmente relações de trabalho vinculadas às atividades urbanas. Isso é válido igualmente para o Estado e as três Zonas Homogêneas, as quais apresentam situação similar. Quanto ao setor público 94 predomina o servidor público conforme seria de se esperar com patamares entre 15% a 20% nas Zonas Homogêneas. Situação próxima a observada no Estado do Rio Grande do Norte. Porém, alguns municípios Não-Remunerado é aquele que exerce uma atividade econômica sem remuneração durante pelo menos 15 horas por semana, a título de ajuda. 92 Cf. BRASIL. Ministério da Saúde-MS (1999)- Política de recursos humanos para a saúde: questões na área da gestão e regulação do trabalho; relatório final. Natal-RN, DRH/SUS-MS, OPAS/OMS-Conasems, ago.,1999. 93 O Censo Demográfico de 1991 – Mão-de-Obra – classifica, quanto à Relação de Emprego, dois principais tipos de Empregados: Empregado do Setor Privado e Empregado do Setor Público. Inclui na categoria Empregado do Setor Privado a pessoa prestadora de serviços a empresa, firma, instituição, etc., de caráter privado, em sociedade limitada, anônima, de cotas de capital aberto, etc. O Empregado do Setor Privado foi então subdividido nas subcategorias: Trabalhador Agrícola Volante – aquele que não dispõe de trabalho fixo, mas presta serviço a um ou mais estabelecimentos agropecuários ou de extração vegetal, pago por tarefa, dia ou hora. Parceiro ou Meeiro – aquele que explora ou exerce atividade econômica e recebe pelo trabalho efetuado parte da produção ou paga com parte da produção pelo uso da terra. Essa subcategoria foi subdividida em duas outras: Empregado, no caso de não ter autonomia em relação a quem lhe cedia a parceria, sendo ou não auxiliado por pessoas não remuneradas moradoras do domicílio. Conta Própria – quando tinha autonomia em relação a quem lhe cedia a parceria sendo ou não era auxiliado por pessoas não-remuneradas moradoras do domicílio. A categoria Outro não foi explicada pelo Censo; supõe-se que essa categoria refere-se aos trabalhadores não incluídos nas categorias explicitadas, ou seja, os trabalhadores urbanos. 94 O Censo Demográfico de 1991 – Mão-de-Obra – classifica quanto à Relação de Emprego na categoria Empregado do Setor Público: a pessoa que presta serviço a órgão da administração direta, autarquia, fundação e empresa pública ou de economia mista, na qual o governo é o principal ou único acionista. 208 apresentam elevado número de funcionários públicos superando largamente a média regional tais como Ipueira e São Fernando, o primeiro com 36% e o último com 29% de funcionários públicos. Os trabalhadores por conta própria são de um modo geral mais numerosos no Seridó que no Rio Grande do Norte. Essa categoria foi subdividida em parceiro ou meeiro e outras. Também nesse caso predomina a categoria “outras”, ao invés das tradicionais relações de parceiro e meeiro. O número de empregadores é reduzido e a média de pessoas ocupadas não remuneradas é de 6%, levemente superior ao observado no Estado (4%).Todavia, em alguns municípios as pessoas não remuneradas atingem percentuais iguais ou superiores a 13%, como em Equador, na Zona Homogênea de Currais Novos, e em Cerro Corá e Florânia, na Zona Homogênea de Caicó, representando 16% e 13% respectivamente das pessoas ocupadas. TABELA 3.5.3.4 RIO GRANDE DO NORTE E SERIDÓ. RELAÇÕES DE EMPREGO, 1991 ESTADO SERIDÓ ZH – CN ZH - CA ZH - SC RELAÇÕES DE EMPREGO Valores Absolutos (1.000) Total 784,1 98,7 30,8 43,3 24,6 Empregado – Total 510,6 55,4 18,2 25,9 11,3 Setor Privado 346,4 37,9 13,1 17,5 7,3 Setor Público 164,2 17,5 5,1 8,4 4,0 Conta Própria 228,0 34,9 10,2 13,8 10,9 Empregador 18,0 2,6 0,8 1,5 0,3 Não Remunerado 27,5 5,8 1,6 2,1 2,1 Percentuais Total 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 Empregado – Total 65,1 56,1 59,1 59,8 45,9 Setor Privado 44,2 38,4 42,5 40,4 29,7 Setor Público 20,9 17,7 16,6 19,4 16,3 Conta Própria 29,1 35,4 33,1 31,9 44,3 Empregador 2,3 2,6 2,6 3,5 1,2 Não Remunerado 3,5 5,9 5,2 4,8 8,5 FONTE DOS DADOS BÁSICOS: Ibge. Censo Demográfico de 1991. Nota: em razão das aproximações feitas, os totais podem não coincidir com o da tabela anterior (tabela 3.5.3.3). c. Pessoal Ocupado por Local de Trabalho O local onde as pessoas exercem suas atividades laborais é um elemento importante de análise da ocupação (tabela 3.5.3.5). O efetivo das pessoas que desenvolvem trabalho nas propriedades agropecuárias é maior no Seridó (33%) do que no Estado do Rio Grande do Norte. Todavia, as pessoas que trabalham em empresas ou firmas são em maior número no Estado do Rio Grande do Norte (52%) do que no Seridó, cujo participação é inferior à média estadual em nove pontos percentuais. Os que trabalham em casa do cliente ou patrão somam apenas 10% no Estado e na região. Já os que trabalham no domicílio representam 8% na região, sendo em número ainda menor no Estado do Rio Grande do Norte. Em geral, o trabalho em domicílio se efetua sem um local exclusivo para seu desempenho. Todavia, observam-se grandes diferenças no âmbito das Zonas Homogêneas e no interior delas. A propriedade agropecuária enquanto local de trabalho está muito presente na Zona Homogênea das Serras Centrais, aproximando-se dos 60% (mais exatamente 58%). Nas demais Zonas Homogêneas, apenas em torno de 25% do total exercem atividades nesse local. O que se verifica para as Serras Centrais eleva, sem dúvida, a média da região. O mesmo ocorre em relação aos que trabalham 209 em empresas ou firmas. Esses atingem acima de 45%, tanto na Zona Homogênea de Currais Novos quanto na de Caicó, mas na Zona Homogênea das Serras Centrais decaem para patamares em torno de 27%, o que também influencia fortemente a média regional. No interior das Zonas Homogêneas destacam-se alguns municípios. É o caso dos municípios de Jardim de Piranhas e Timbaúba dos Batistas que apresentam elevada participação de trabalhadores que desempenham suas atividades no domicílio. O primeiro devido às tecelagens que se situam nas residências e se utilizam de mão-de-obra familiar. O segundo em razão do artesanato (bordados) realizado também pelas famílias. d. Pessoal Ocupado por Categoria Os dados do censo agropecuário, sobre a população rural ocupada, segundo categorias de responsável pelo estabelecimento, membro de família sem remuneração e outras, permitem estabelecer comparações entre duas datas: 1985 e 1995/96. É elevada a incidência de responsáveis e membros não remunerados da família, em ambos os períodos (tabela 3.5.2.6), superiores em todas as regiões a 70%, apresentando valores ainda mais elevados na Zona Homogênea das Serras Centrais. Os empregados permanentes e os empregados temporários cresceram ligeiramente em 1995/1996, comparado com o ano de 1985, mesmo assim apresenta percentuais baixos, em torno de 10% do total do Seridó, com situação ligeiramente diferenciada, no âmbito das Zonas Homogêneas. Os parceiros empregados estão em número incipiente e tendem a se reduzir ainda mais. TABELA 3.5.3.5 RIO GRANDE DO NORTE E SERIDÓ: POPULAÇÃO OCUPADA SEGUNDO LOCAL DE TRABALHO, 1991 LOCAL DE TRABALHO ESTADO SERIDÓ ZH - CN ZH - CA ZH - SC Total 100 100 100 100 100 Propriedade agropecuária 26 33 26 24 58 Empresa ou firma 53 43 48 46 27 Em casa do cliente ou patrão 10 10 12 11 7 No domicílio – total 5 8 6 12 4 Com local exclusivo 3 3 3 3 2 Sem local exclusivo 2 5 3 9 2 Via pública 4 4 5 5 2 Com equipamento pesado 1 1 2 2 1 Com Equipamento leve ou sem equipamento 3 3 3 3 1 Outro 2 2 3 2 2 FONTE DOS DADOS BÁSICOS: Ibge. Censo Demográfico de 1991. Nota: foram realizadas algumas aproximações nas parcelas. A elevada incidência de responsáveis e membros não remunerados da família em todas as Zonas Homogêneas demonstra que no meio rural a unidade de produção está concentrada na família. Sendo assim, os baixos rendimentos percebidos escondem uma exploração ainda mais acirrada da força de trabalho rural. Embora tenha havido declínio, em termos absolutos, de praticamente todas as categorias apresentadas, a redução do número de parceiros empregados é bem mais intensa, praticamente desaparecendo em algumas Zonas Homogêneas. Além dessas informações, os dados dos censos demográficos revelam que o pessoal ocupado residente nos estabelecimentos é elevado, superando 70% do total na região e nas Zonas Homogêneas, 210 mostrando-se superior à média estadual. O que chama a atenção é o número significativo de estabelecimentos sem pessoal contratado, em torno de 20%. TABELA 3.5.3.6 I.RIO GRANDE DO NORTE E SERIDÓ: CATEGORIAS DE OCUPAÇÃO NA AGROPECUÁRIA – 1985 E 1995-96 CATEGORIAS DAS PESSOAS OCUPADAS SERIDÓ ZH - CN ZH - CA ZH - SC Valores Absolutos Total 1985 432.317 78.698 19.439 25.932 33.327 Idem 1995-96 332.516 56.231 12.279 15.816 28.136 Responsáveis e membros da família sem remuneração 1985 324.032 56.006 14.138 16.764 25.107 Idem 1995-96 240.190 43.582 9.324 11.001 23.257 Empregados permanentes 1985 23.365 5.669 1.278 2.905 1.486 Idem 1995-96 26.168 5.432 1.570 2.561 1.301 Empregados temporários 1985 52.910 8.031 1.179 3.565 3.287 Idem 1995-96 52.579 5.286 907 1.315 3.064 Parceiros empregados 1985 19.794 3.475 1.486 1.033 956 Idem 1995-96 4.366 543 103 230 210 Outras categorias 1985 12.216 5.514 1.358 1.665 2.491 Idem 1995-96 9.213 1.388 375 709 304 Percentuais Total 1985 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 Idem 1995-96 00,0 100,0 100,0 100,0 100,0 Responsáveis e membros da família sem remuneração 1985 75,0 71,2 72,7 64,6 75,3 Idem 1995-96 72,2 77,5 75,9 69,6 82,7 Empregados permanentes 1985 5,4 7,2 6,6 11,2 4,5 Idem 1995-96 7,9 9,7 12,8 16,2 4,6 Empregados temporários 1985 12,2 10,2 6,1 13,7 9,9 Idem 1995-96 15,8 9,4 7,4 8,3 10,9 Parceiros empregados 1985 4,6 4,4 7,6 4,0 2,9 Idem 1995-96 1,3 1,0 0,8 1,5 0,7 Outras categorias 1985 2,8 7,0 7,0 6,4 7,5 Idem 1995-96 2,8 2,5 3,1 4,5 1,1 FONTE DOS DADOS BÁSICOS: Ibge, Censos Agropecuários 1985 e 1995/96. e. ANO ESTADO Renda dos Chefes de Domicílios O nível de renda da população do Seridó está excessivamente concentrado nas faixas mais baixas. O exame dos rendimentos dos chefes de domicílios particulares pode ilustrar bem a repartição da renda no âmbito da Região do Seridó e das suas Zonas Homogêneas (tabela 3.5.3.7). A Região do Seridó apresentou 60,6% dos chefes de família percebendo até um salário mínimo, situação próxima à observada para o Estado do Rio Grande do Norte, que concentra mais de 57% do total nessa faixa de rendimento. Há algumas diferenças, no âmbito das Zonas Homogêneas, que devem ser especificadas. A Zona Homogênea de Caicó encontra-se mais bem posicionada em relação às demais, embora ainda disponha de cerca de 48% ganhando até um salário mínimo. Essa Zona apresentou o maior percentual dos que ganham acima de dois salários mínimos, cerca de 25% do total, porcentagem quase equivalente à verificada para o Estado do Rio Grande do Norte. A Zona Homogênea das Serras Centrais por sua 211 vez é a que apresentou os piores rendimentos. Quase 38% do total dos chefes ganham até meio salário mínimo, enquanto apenas 7% do total recebem mais de dois salários mínimos. A composição da renda da população urbana apresentou apenas uma pequena diferença para mais, em relação à renda total. Uma desagregação dos dados no nível de municípios permite que se tenha uma idéia mais detalhada desses aspectos. Os dois municípios mais populosos – Caicó e Currais Novos – apresentaram melhor posição, em relação à renda dos chefes de família do que os demais municípios. É provável que esse fato possa ser atribuído à maior diversificação de atividades produtivas presentes nesses centros, que dispõem de serviços de referência de âmbito regional. TABELA 3.5.3.7 RIO GRANDE DO NORTE E SERIDÓ: NÍVEL DE RENDIMENTO DOS CHEFES DE FAMÍLIA – 1991 ESTADO NIVEL DE RENDIMENTO CATEGORIA DE POPULAÇÃO Até 1/2 salário mínimo Idem Mais de 1/2 a 1 salário mínimo Idem De 1 a 2 salários mínimos Idem Mais de 2 salários mínimos Idem Total Idem Total Urbana Total Urbana Total Urbana Total Urbana Total Urbana 135.590 76.009 165.208 105.482 105.682 83.434 114.691 104.321 521.171 369.246 Até 1/2 salário mínimo Idem Mais de 1/2 a 1 salário mínimo Idem De 1 a 2 salários mínimos Idem Mais de 2 salários mínimos Idem Total Idem Total Urbana Total Urbana Total Urbana Total Urbana Total Urbana 26,0 20,6 31,7 28,6 20,3 22,6 22,0 28,3 100,0 100,0 SERIDÓ ZH - CN ZH - CA Valores Absolutos 8.248 845 767 3.920 604 596 24.597 8.000 9.315 14.999 5.600 6.141 12.069 3.943 5.691 9.003 3.298 4.336 9.302 3.073 4.950 7.950 2.871 4.172 54.216 15.861 20.723 35.872 12.373 15.245 Percentuais 15,2 5,3 3,7 10,9 4,9 3,9 45,4 50,4 45,0 41,8 45,3 40,3 22,3 24,9 27,5 25,1 26,7 28,4 17,2 19,4 23,9 22,2 23,2 27,4 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 ZH – SC 6.636 2.720 7.282 3.258 2.435 1.369 1.279 907 17.632 8.254 37,6 33,0 41,3 39,5 13,8 16,6 7,3 11,0 100,0 100,0 FONTE DOS DADOS BÁSICOS: Ibge. Censo Demográfico de 1991. Malha Municipal do Brasil. No interior das Zonas Homogêneas, alguns municípios apresentaram situação desfavorável em relação à média de sua Zona, foi o caso de São Tomé, na Zona Homogênea de Currais Novos, e Santana do Seridó, na Zona Homogênea de Caicó. As Serras Centrais, embora apresentem nível de renda baixíssimo, mostram uma distribuição mais homogênea no âmbito da Zona. É possível afirmar que os baixos salários praticados na região se devem à fragilidade já observada na economia, ancorada em atividades informais e ocupações mal remuneradas, que admitem baixo nível de formação. Todavia, há uma conscientização da sociedade sobre a importância da educação como vetor de desenvolvimento e mudança. No que se refere ao baixo nível de remuneração, 212 não se pode deixar de assinalar o menor poder de barganha dos trabalhadores, no contexto de um mercado de trabalho com uma grande disponibilidade de pessoas procurando emprego. Em resumo, as condições do mercado de trabalho do Seridó, dada a grande disponibilidade de pessoas que procuram trabalho, a vulnerabilidade das atividades produtivas às secas, o declínio de atividades tradicionalmente empregadoras, a redução gradativa da capacidade de absorção de mão-deobra no campo e o reduzido poder de barganha das associações e sindicatos dos trabalhadores, ao lado da baixa produtividade de muitas das atividades rurais e urbanas, constituem elementos que explicam, em parte, os baixos níveis de rendimento das pessoas empregadas e dos trabalhadores chefes de família, em particular. 3.5.3.3 Grau de Utilização da Força de Trabalho: Desemprego, Subemprego e Impacto da Seca sobre o Mercado de Trabalho O Seridó tem perdido posição em relação a outras regiões do Rio Grande do Norte. A crise da cotonicultura, a decadência do setor de minérios, as dificuldades da pecuária, aliado às adversidades climáticas e à degradação ambiental, fragilizam a região, que apresenta baixíssimo nível de renda, de grande parte de sua população e um êxodo rural muito intenso. Embora não haja dados estatísticos que permitam mensurar o desemprego, esse é um problema crônico, ressaltado pela população em todos os municípios da região, por ocasião das reuniões preparatórias do Plano de Desenvolvimento Sustentável do Seridó. Todavia, alguns programas governamentais, além de iniciativas individuais, têm permitido promover a criação de empregos no Seridó. Destacam-se principalmente pela abrangência dos seus objetivos: o Programa de Convivência com a Seca, o Programa de Substituição de Casas de Taipa e o Programa do Leite, dentre outros. Esses programas contemplam medidas assistencialistas como a distribuição de cestas básicas e a distribuição de leite para minorar os efeitos devastadores da crise econômica e, conseqüentemente, da fome. Um outro elemento de impacto na subsistência dessa população é a Previdência Social, que, por meio de aposentadorias, pensões e outras formas de auxílio (doença, maternidade) permite assegurar a manutenção de parte importante das famílias carentes. Há ainda a solidariedade vigente nas pequenas comunidades, entre os familiares e amigos. Nos municípios mais carentes, é elevada a participação de aposentados e pensionistas na composição da demanda das economias locais. Muitas famílias dependem desses rendimentos para sua subsistência. Em 1991, a Região do Seridó tinha um elevado número de aposentados e pensionistas (tabela 3.5.3.8). Eram mais de 27 mil pessoas, o que comparado com a população residente nesse ano dá uma média de quase 10% do total da população. Levando-se em consideração a densidade média por domicílio nesse mesmo ano, de 4,6 pessoas por família, é possível ressaltar que em, aproximadamente, uma família em duas há alguém recebendo da previdência. Todavia, o impacto da previdência é superior ao que os dados deixam supor, porque essas informações não incluíram o auxílio-doença e o salário-maternidade. 213 TABELA 3.5.3.8 RIO GRANDE DO NORTE E SERIDÓ: APOSENTADOS E PENSIONISTAS DE MAIS DE 10 ANOS, 1991 ESTADO SERIDÓ ZH - CN ZH - CA ZH - SC APOSENTADOS E PENSIONISTAS Valores Absolutos Total 214.076 28.351 9.669 11.094 7.588 Somente aposentados 177.331 24.535 8.169 9.448 6.918 Somente pensionistas 34.148 3.607 1.452 1.512 643 Aposentados e pensionistas 2.597 209 48 134 27 Percentuais Total 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 Somente aposentados 82,8 86,5 84,5 85,2 91,2 Somente pensionistas 16,0 12,7 15,0 13,6 8,5 Aposentados e pensionistas 1,2 0,7 0,5 1,2 0,4 FONTE DOS DADOS BÁSICOS: Ibge. Censo Demográfico, 1991. O Programa do Leite integra a Política de Assistência às Famílias Carentes. O público beneficiário do programa é constituído por crianças de 6 meses a 3 anos, gestantes, nutrizes desnutridas e deficientes. (Sinlade, s.d.) Teve início em abril de 1995, abrangendo apenas dez municípios. No final do mesmo ano, contemplava 31 municípios. O Programa cobre, atualmente 103 municípios do Estado, 62% do total. Dezenove dos 28 municípios do Seridó são assistidos pelo Programa. O Programa de Convivência com a Seca foi concebido para atender às populações rurais atingidas pelas estiagens em cerca de 156 municípios, de um total de 166, ou seja 93% do território estadual. Esse programa teve inicio em abril de 1998, e contempla um conjunto de ações que pretende minorar a situação dos municípios atingidos pelas secas. São cinco suas principais linhas: i) recuperação e/ou formação de infra-estrutura; ii) programa de alfabetização de jovens e adultos; iii) programa especial de financiamento de combate à estiagem – crédito rural; iv) ação emergencial de distribuição de cestas básicas, no começo da seca; e v) distribuição de sementes. As cestas básicas são constituídas por 20 quilos de alimentos. No total, foram distribuídas 170.000 cestas, principalmente nos meses de abril e maio de 1998. A partir de junho daquele ano ocorreu o primeiro pagamento a um total de 84.567 trabalhadores rurais, recebendo R $80,00 por mês. O Seridó estava dividido em duas principais zonas administrativas: a de Caicó, que recebeu 10.787 cestas básicas, e a de Currais Novos (com 15.697 cestas). (Brasil. Sudene. RN, 1999.) Esse programa, também conhecido como Programa de Emergência, tem contribuído para minorar os problemas advindos da seca, visto que proporciona, entre outros benefícios, um salário mensal ao trabalhador rural. Embora obtendo um valor inferior ao salário mínimo, a população assistida pelo Programa é variável, mas atinge números significativos em alguns municípios, superando 30% da população. A média da população assistida no Seridó é de 19%, levemente superior à atendida em todo o Estado, que é de 17%. A Zona Homogênea das Serras Centrais é a mais beneficiada, mas é a que concentra maior parcela da população carente e localizada na área rural. A relação entre a população atendida no Seridó vis-à-vis a atendida no Estado é de 16%. (Tabela 3.5.3.9.) Essas ações, se foram capazes de minorar, em alguma medida, a fome, deixa a população extremamente dependente das benesses do Estado e de medidas de assistência, perpetuando a dependência e o comodismo, o que agrava a situação da extremada pobreza vigente. 214 TABELA 3.5.3.9 RIO GRANDE DO NORTE. POPULAÇÃO ATENDIDA PELO PROGRAMA DE EMERGÊNCIA DE COMBATE AOS EFEITOS DA SECA ZONA HOMOGÊNEA, EMERGÊN- POPULAPOPULAÇÃO POPULAÇÃO TOTAL MUNICÍPIOS, SERIDÓ E CIA DE 1998 ÇÃO CADASTRADA ATENDIDA GERAL/POPULAESTADO RURAL EM SETEMBRO DE 1999 EM 10.11.99 ÇÃO RURAL (%) ZH DE CURRAIS NOVOS 7.901 20.960 3.105 3.259 16 Acari 810 2.590 384 384 15 Carnaúba dos Dantas 420 1.521 150 150 10 Currais Novos 1.630 5.837 1.387 1.387 24 Equador 540 1.715 195 195 11 Parelhas 1.200 3.533 555 558 16 São Tomé 3.301 5.764 434 585 10 ZH DE CAICÓ 8.693 27.432 4.909 4.905 18 Caicó 2.000 6.190 1.048 1.048 17 Cruzeta 680 2.379 397 397 17 Ipueira 240 466 188 188 40 Jardim de Piranhas 1.002 3.009 400 400 13 Jardim do Seridó 840 2.992 320 319 11 Ouro Branco 550 1.904 388 387 20 Santana do Seridó 370 1.098 208 207 19 São Fernando 661 1.980 281 281 14 São João do Sabugi 450 1.468 434 434 30 São José do Seridó 360 1.158 305 305 26 Serra Negra do norte 1.300 4.363 798 798 18 Timbaúba dos Batistas 240 425 142 141 33 ZH DE SERRAS CENTRAIS 12.012 44.136 9.116 9.196 21 Bodó ... 1.361 637 640 47 Campo Grande 1.820 5.138 979 979 19 Cerro Corá 1.650 6.067 1.117 1.117 18 Florânia 1.820 4.633 1.064 1.064 23 Jucurutu 1.870 7.585 928 931 12 Lagoa Nova 1.620 5.735 1.212 1.274 22 Santana do Matos 2.532 7.278 1.665 1.676 23 São Vicente 700 2.354 461 461 20 Ten. Laurentino Cruz ... 1.732 612 612 35 Triunfo Potiguar ... 2.253 441 442 20 SERIDÓ 28.606 92.528 17.130 17.360 19 TOTAL DO ESTADO 164.282 650.326 107.913 109.401 17 FONTE DOS DADOS BÁSICOS: Estado do Rio Grande do Norte. Grupo Executivo. Gerência de Operações. Programa emergencial de combate aos efeitos da seca; mapa de cadastramento. Natal-RN, nov., 1999. 3.5.3.4 O Trabalho Infantil As reuniões preparatórias do Plano de Desenvolvimento Sustentável do Seridó apontaram o trabalho infantil como um problema grave a ser combatido nos municípios da região. As informações do Atlas de Desenvolvimento Humano de 1991, embora estejam de certo modo defasadas, por se tratarem de levantamentos censitários realizados em 1991, permitem uma aproximação com a dimensão do problema. De acordo com as mencionadas informações, bastante detalhadas na análise que foi feita da situação educacional da população, cerca de 4.000 crianças, de 10 a 14 anos, exerciam algum tipo de trabalho no Seridó. A Zona Homogênea de Caicó destacou-se, pela maior concentração de crianças trabalhando (cerca de 1,8 mil). As informações disponíveis mostram uma redução do número de crianças exercendo atividade de trabalho, principalmente em 1991. Todavia, nesse ano as estatísticas 215 para o Estado do Rio Grande do Norte ainda apontam a elevada cifra de mais de 21 mil crianças, de 10 a 14 anos, no mercado de trabalho. O peso maior é de municípios como Caicó e Currais Novos, no total de contingente de crianças que trabalham. Não obstante este fato, aparecem, também, municípios como Florânia, Jardim de Piranhas e Acari. 95 Um número não desprezível de municípios registra participação de mais de 10% da população, de 10 a 14 anos que trabalha, no total da população nessa faixa etária. Alguns chegam a ultrapassar a marca dos 15%, não obstante o fato de que há uma tendência nos anos considerados (1970, 1980, e 1991), de redução dessa participação. Chamam atenção, no que se refere à grande participação, municípios como Jardim de Piranhas, que registra 33% da participação da população, de 10 a 14 anos que trabalha, no total da população com essa idade, além de Cruzeta, com 29,7%, Florânia (15,6%), Acari (15,6%), Timbaúba dos Batistas(19,6%) e São João do Sabugi (15,4%). É importante considerar que o Estado registra uma cifra, nessa participação, de 7,5%. Há uma tentativa de combate ao problema, a partir de uma maior fiscalização. O Núcleo de Combate ao Trabalho Infantil e Proteção ao Trabalhador Adolescente–NUCA, vinculado ao Ministério do Trabalho e Emprego, identificou nos municípios do Seridó a prática do trabalho infantil, em 18 dos 28 municípios da Região, conforme tabela 3.5.3.9, que especifica as atividades econômicas que absorvem a mão-de-obra infanto-juvenil nos municípios do Seridó, por Zona Homogênea. Observa-se que as crianças estão inseridas nas principais atividades desempenhadas nos municípios, independente do grau de periculosidade envolvido nas mesmas. O problema é de difícil solução, em razão da dificuldade de fiscalizar todos os estabelecimentos que adotam essa prática, como também devido à pobreza generalizada na região. 3.5.3.5 Emprego X Desemprego, Segundo a Percepção da População Como já foi observado, o desemprego constitui o principal problema indicado pela população nas reuniões preparatórias do Plano de Desenvolvimento Sustentável do Seridó. Naquela ocasião, foram apontados a precariedade do mercado de trabalho, a má distribuição de renda (baixos salários), o subemprego, a falta de segurança no trabalho, bem como a exploração de mão-de-obra infantil. O problema do desemprego se expressa principalmente na fragilidade da economia local e nas dificuldades de lidar com as adversidades de clima e solo, bem como na ausência ou insuficiência de políticas públicas que permitam ao seridoense romper as amarras do subdesenvolvimento. A economia do Seridó tem passado por modificações relevantes, mostrando um decréscimo das ocupações ligadas às atividades agropecuárias e um crescimento dos segmentos vinculados à economia urbana. Todavia, a indústria é de pequeno porte e tem capacidade limitada de absorção de pessoal. O comércio local é constituído de pequenos estabelecimentos ligados à atividades de subsistência (mercearias, mercadinhos, entre outros), utilizando principalmente mão-de-obra familiar. Os serviços são, sobretudo os do setor privado, de reduzida dimensão, constituído-se de atividades de reparação e manutenção, além de serviços pessoais. Os serviços sociais, públicos e privados, por sua vez, têm crescido e tendem a se elevar nesse contexto de reduzido dinamismo das atividades econômicas. 95 Para uma análise mais detida desses dados, ver o subitem 3.5.4, adiante, onde se trata das condições de educação. 216 TABELA 3.5.3.10 SERIDÓ: TRABALHO INFANTO-JUVENIL, SEGUNDO ATIVIDADES ZH E MUNICÍPIOS ATIVIDADE ECONÔMICA ZH DE CURRAIS NOVOS Acari Cerâmica e Pesca Carnaúba dos Dantas Cerâmica Currais Novos Cerâmica e Mineração Parelhas Cerâmica ZH DE CAICÓ Caicó Bonelaria, tecelagem, Fabricação de Chuteiras Cruzeta Cerâmica Jardim de Piranhas Fabricação de redes, Mantas e Pano de Prato Jardim do Seridó Pesca Ouro branco Pedreiras São João do Sabugi Pesca São José do Seridó Bonelaria Serra Negra do Norte Bonelaria ZH DAS SERRAS CENTRAIS Cerro Corá Casas de Farinha Jucurutu Pesca Lagoa Nova Casas de Farinha e Colheita de Caju Santana do Matos Casas de Farinha São Vicente Casas de Farinha Tenente Laurentino Cruz Casas de Farinha e Colheita de Caju FONTE DOS DADOS BÁSICOS: Ministério do Trabalho e Emprego-MTb. Delegacia Regional e Emprego no Rio Grande do Norte. Serviço de Inspeção do Trabalho. Núcleo de Combate ao Trabalho Infantil e Proteção ao Trabalhador Adolescente–NUCA. Para uma mais acurada percepção da questão do desemprego, é pertinente resgatar como a população tem se expressado em relação à identificação dos problemas e das possíveis soluções, em relação ao emprego e à sua falta, bem como às suas aspirações, quanto ao futuro desejado. Há uma clara percepção que o emprego, visto como ocupação ou colocação no mercado de trabalho, não necessariamente formal, está estreitamente ligado ao dinamismo da economia local e à capacidade de articulação da sociedade, com vistas ao associativismo para viabilizar a formação de cooperativas e outras formas organizacionais autogestionárias, que permitam às coletividades lutar por novos espaços de produção. Um conjunto de ações e medidas de políticas públicas foram propostas pelas lideranças locais, no sentido de possibilitar uma melhor convivência com a seca e prestar apoio às atividades econômicas. Dentre as medidas propostas nas discussões, destacam-se o incentivo à produção e à produtividade da agricultura e da piscicultura e, principalmente, à percepção da importância de melhor aproveitamento das potencialidades locais, mediante pesquisa científica para a escolha de produtos apropriados, melhoramento de rebanhos e seleção de raças mais adequadas para a criação no semi-árido. O estabelecimento de uma política agrícola – crédito rural e a prestação de assistência técnica ao homem do campo, bem como a transferência de tecnologias e o estabelecimento de uma política de convivência com a seca, por meio da construção de barragens, perenização de rios, entre outras medidas, foram percebidas, pelas lideranças de vários municípios, como formas de conter o êxodo rural. 217 O incentivo à atividade industrial e à agroindústria, vinculada a utilização de frutas, bem como à criação de unidades de produção artesanal, são vistas como capazes de propiciar a criação de novos postos de trabalho, assim como a dinamização do comércio e dos serviços. Preconizam, também, os representantes de amplos segmentos da população, o desenvolvimento de programas que busquem a preservação do patrimônio histórico e o incentivo ao turismo. Acredita-se que a exploração do potencial de sítios paisagísticos é capaz de reverter, de forma favorável, na criação de novas colocações. O recurso à economia familiar tem sido percebido como forma adicional de geração de renda. Há uma mudança de perspectiva quanto às atividades econômicas rurais, visto que já se sugere a criação de indústrias, tanto no meio urbano quanto no rural, 96 bem como a interiorização de indústrias, numa clara mudança de apreensão do que se entende por rural, perspectiva que emerge do “novo rural“, ou seja, do espaço econômico híbrido, onde as atividades urbanas e rurais se imbricam e se interpenetram numa dinâmica que supera claras divisões de atividades anteriormente prevalecentes. (Silva, s.d.) Vale ressaltar a percepção, por parte da população local, da ausência e insuficiência de capacitação e qualificação dos recursos humanos, da deficiência de mão-de-obra especializada e da falta de cursos profissionalizantes. As aspirações da sociedade seridoense convergem para uma sociedade mais justa e igualitária, capaz de propiciar emprego e renda para todos e serviços sociais de qualidade. Neste sentido, percebese a importância da educação, da qualificação e do treinamento como elementos chaves para a superação do atual quadro de estagnação econômica. Uma sociedade ancorada no associativismo, com organizações sociais fortes e capacitadas para gerenciar recursos e participar ativamente da administração, visando o desenvolvimento sustentável em todas as suas dimensões. 3.5.4 Condições Educacionais da População e a Situação da Oferta dos Serviços de Educação O desenvolvimento sustentável não pode ocorrer em qualquer região, sem que avanços substanciais no desenvolvimento humano e, em particular, na melhoria das condições de educação da população, sejam obtidos. Neste particular, trata-se não somente de desenvolver esforços importantes na formação e treinamento da parcela da população que constitui a força de trabalho, visando o melhor desenvolvimento da suas atividades produtivas, mas de um esforço no sentido de universalização do conhecimento, que possa transformar cada membro da sociedade em cidadão consciente dos seus direitos e deveres. A universalização dos serviços básicos de educação deve constituir-se em coluna mestra no apoio à promoção ao desenvolvimento que se pretende humano e sustentável, sobretudo em regiões nas quais as condições climáticas e os limites impostos pelo meio ambiente apresentam-se mais severos que em outras partes do País. O exame sumário das condições educacionais da população do Seridó mostra que não obstante os avanços realizados nas últimas décadas, expressos pela melhoria de parte significativa dos indicadores mais tradicionais, a situação atual da população merece que ações mais intensas e de maior 96 Conforme sugerido na Reunião Municipal de Ipueira-RN, em 23.11.99. 218 impacto venham a ser desenvolvidas, sobretudo quando se considera o contexto no qual o conhecimento, a produção de conhecimento e sua difusão, passam a se constituir peça chave da promoção do desenvolvimento sustentável. De fato, os níveis de analfabetismo, o número de crianças fora da escola, o número médio de anos de estudo da população nos municípios do Seridó mostram, com todas clareza, a dimensão do esforço a ser realizado no sentido de universalização da educação nos municípios da região, e relativizam os avanços que foram, até o presente, obtidos. O que se apresenta em seguida é, num primeiro momento, um balanço sumário das condições educacionais da população da região, a partir dos dados secundários ou com base na perspectiva da lideranças municipais, e, em seguida, uma descrição da dimensão e das condições da oferta dos serviços de educação, com destaque para os seus problemas e potencialidades. 3.5.4.1 Condições Educacionais da População, em 1996 De acordo com os dados mais recentes. a respeito do grau de instrução da população do Estado do Rio Grande do Norte, em 1996, da população de 7 a 14 anos, cerca de 27,8% estavam constituídos por analfabetos. Nessa mesma condição e no referido ano, encontravam-se, no Estado, cerca de 28,4% da população de 15 anos e mais, segundo informações da Pnad. Os dados dos censos de 1996 mostram que 28,5% do total das pessoas de 4 e mais anos ou não tinham instrução ou possuíam apenas 1 ano de estudo. No que se refere ao Seridó, sabe-se que, em 1996, cerca de 30,2% da população de 4 anos e mais estava constituída de analfabetos ou de pessoas com menos de um ano de escola. Isso representava um total de 78,9 mil pessoas na região. Como pode ser observado na tabela 3.5.4.1, ocorre uma diferença entre as Zonas Homogêneas do Seridó, no que se refere ao percentual da população de 4 anos e mais, analfabeta ou com apenas 1 ano de instrução formal, com as Serras Centrais apresentando percentuais bem maiores do que as demais. De fato, enquanto a Zona Homogênea de Currais Novos registra uma participação de 27,3% da população de 4 anos e mais, nesta condição, e a da Zona de Caicó cerca de 25,6%, a Zona Homogênea das Serras Centrais alcança cerca de 39,6% (ou seja quase 40%). Os casos extremos, de municípios com piores condições, neste particular, são encontrados nos municípios das Serras Centrais, com destaque para Campo Grande (43,9%), Lagoa Nova (40,6%) e Santana do Matos (40,2%). É nítido o contraste entre o município de Campo Grande, com o alto percentual anteriormente apresentado e o município de Carnaúba dos Dantas (com 21,9%). Tais informações, como pode ser claramente percebido pelo exame da tabela 3.5.4.1, mostram, no confronto entre os municípios, as diferenças marcantes entre eles, o que, desde logo, exige um tratamento diferenciado, tanto no nível das Zonas Homogêneas quanto dos municípios, em particular, nas ações voltadas para a melhoria dos níveis de educação da população do Seridó. 219 TABELA 3.5.4.1 RIO GRANDE DO NORTE E SERIDO. POPULAÇÃO DE 4 ANOS E MAIS, SEM INSTRUÇÃO OU COM MENOS DE UM ANO DE ESTUDO, EM 1996 ESTADO, SERIDÓ, ZONAS HOMOGÊNEAS E MUNICÍPIOS GRAU DE INSTRUÇÃO (*) ESTADO 28,50 Seridó 30,19 Currais Novos 27,30 Acari 25,68 Carnaúba dos Dantas 21,89 Currais Novos 26,03 Equador 31,47 Parelhas 22,34 São Tomé 42,96 Caicó 25,59 Caicó 22,38 Cruzeta 25,15 Ipueira 24,69 Jardim de Piranhas 38,14 Jardim do Seridó 22,42 Ouro Branco 24,68 Santana do Seridó 21,94 São Fernando 32,14 São João do Sabugi 27,06 São José do Seridó 24,58 Serra Negra do Norte 34,72 Timbaúba dos Batistas 24,77 Serras Centrais 39,62 Campo Grande 43,87 Cerro Corá 39,81 Florânia 36,91 Jucurutu 39,68 Lagoa Nova 40,57 Santana do Matos 40,17 São Vicente 31,07 FONTES DOS DADOS BÁSICOS: Ibge. Contagem da População, 1996. (*) População de 4 anos e mais, sem instrução ou com menos de um ano de estudo. 220 A tabela 3.5.4.2, anterior, mostra aspectos relevantes da cobertura que o sistema educacional tem, relativamente à população jovem, e ressalta, também, a média de anos de estudos da população de 4 anos e mais nos municípios do Seridó e na média do Estado. Tendo em vista a dificuldades de acesso aos dados demográficos, segundo determinadas faixas de idade, não foi possível apresentar a situação média da região, nem das Zonas Homogêneas que a compõem. TABELA 3.5.4.2 RIO GRANDE DO NORTE E SERIDÓ: PARTICIPAÇÃO DAS PESSOAS SEGUNDO FAIXA ETÁRIA NAS ESCOLAS E MÉDIA DOS ANOS DE ESCOLA – 1996 ESTADO, SERIDÓ, ZONAS HOMOGÊNEAS E MUNICÍPIOS ESTADO Currais Novos Acari Carnaúba dos Dantas Currais Novos Equador Parelhas São Tomé Caicó Caicó Cruzeta Ipueira Jardim de Piranhas Jardim do Seridó Ouro Branco Santana do Seridó São Fernando São João do Sabugi São José do Seridó Serra Negra do Norte Timbaúba dos Batistas Serras Centrais Campo Grande Cerro Corá Florânia Jucurutu Lagoa Nova Santana do Matos São Vicente PESSOAS QUE FREQUENTAM ESCOLAS EM RELAÇÃO ÀS PESSOAS RESIDENTES 4 A 6 ANOS 7 A 9 ANOS 10 A 14 ANOS 15 A 19 ANOS MÉDIA DE ANOS DE ESCOLA 64.35 89.25 87.66 57.46 5.41 75.65 83.09 75.88 64.69 74.45 50.50 93.39 93.04 92.46 92.03 94.95 85.05 86.23 89.24 90.76 87.23 90.21 77.94 48.24 56.15 62.57 49.92 53.82 44.31 5.01 5.04 5.42 4.05 4.77 4.24 80.30 68.17 52.04 48.37 79.90 65.49 67.46 54.85 54.52 83.17 36.18 78.57 93.10 93.86 95.42 79.92 94.87 90.51 94.02 87.11 90.70 93.47 82.03 92.31 90.01 85.25 89.69 73.77 87.68 88.81 89.14 81.46 89.16 90.87 81.53 89.52 60.30 52.88 62.94 36.09 57.13 62.09 50.40 48.80 61.78 61.14 47.86 49.07 5.72 4.63 4.68 4.38 4.81 4.53 4.14 4.34 4.72 4.99 4.04 4.74 46.80 61.85 54.56 55.91 59.49 58.35 53.72 77.17 87.17 83.00 82.43 87.41 83.42 83.79 81.82 84.50 81.32 83.51 80.32 79.20 84.46 50.80 50.09 50.07 49.37 39.42 45.10 50.37 3.81 4.06 4.44 3.91 3.90 3.90 4.82 FONTE DOS DADOS BÁSICOS: Ibge. Contagem da População, 1996. 221 TABELA 3.5.4.3 RIO GRANDE DO NORTE E SERIDÓ: TAXA DE ANALFABETISMO DA POPULAÇÃO DE 15 ANOS E MAIS - 1970-91 ESTADO, SERIDÓ, ZONAS HOMOGÊNEAS E MUNICÍPIOS 1970 1980 1991 ESTADO 54,4 44,4 34,9 Seridó Currais Novos Acari Carnaúba dos Dantas Currais Novos Equador Parelhas São Tomé Caicó Caicó Cruzeta Ipueira Jardim de Piranhas Jardim do Seridó Ouro Branco Santana do Seridó São Fernando São João do Sabugi São José do Seridó Serra Negra do Norte Timbaúba dos Batistas Serras Centrais Campo Grande Cerro Corá Florânia Jucurutu Lagoa Nova Santana do Matos São Vicente 54,7 54,9 48,9 45,8 51,3 58,3 41,5 78,8 48,0 43,3 53,3 55,1 60,6 39,1 43,2 51,5 37,1 45,6 69,2 69,2 45,7 62,5 57,0 72,3 57,3 62,5 68,5 60,6 70,0 45,3 41,9 40,5 25,4 38,0 39,2 38,0 69,8 39,4 36,1 37,1 34,8 50,0 34,9 41,4 41,4 37,8 35,3 53,0 53,0 34,9 57,0 60,8 67,4 45,7 57,5 62,1 55,5 52,4 37,9 34,3 33,1 29,0 31,9 44,7 29,6 48,6 32,8 27,4 37,3 26,9 42,8 30,4 32,3 32,3 43,3 31,1 48,5 48,5 31,9 49,5 51,4 47,4 46,1 50,5 46,9 54,7 41,6 FONTE DOS DADOS BÁSICOS: Pnud-Ipea-Ibge-FJP (1997)- Relatório de desenvolvimento humano do Brasil, 1997. É importante chamar a atenção para o fato de que os dados registram uma cobertura quase total do sistema, no que se refere à população de 7 a 9 anos, em geral apresentando cifras em torno de 90%. No entanto, no que se refere às faixas anteriores (de 4 a 6 anos e às faixas de idade posteriores, notadamente a de 15 a 19 anos), os percentuais são menores, em geral, revelando a menor ênfase no atendimento dessas faixas de idade. Tais informações revelam, de um lado, a dificuldade do sistema escolar de abranger toda a população que, em tese, deveria, numa situação satisfatória, estar participando de aulas nos diferentes cursos oferecidos, e, de outro, a necessidade, sobretudo da população da faixa etária de 15 a 19 anos, de ajudar suas famílias, por meio da participação no mercado de trabalho, completando o orçamento familiar, com a obtenção de rendimento regular ou eventual. Em qualquer situação, que necessita ser investigada, é importante conhecer as causas da ausência dos jovens nas escolas, e desenvolver 222 esforços para aumentar o número de anos da população no sistema escolar que é, como se pode constatar na tabela referida, ainda reduzido. Algumas dessas constatações, como se verá mais adiante, vão ao encontro de diagnósticos feitos nas reuniões realizadas nos municípios, notadamente as que se referem à necessidade de ampliar o sistema de cobertura escolar, para as faixas de mais idade da população ou para o meio rural, onde a cobertura é insatisfatória em alguns municípios. Mais uma vez, é relevante destacar a situação dos municípios das Serras Centrais, que registram, comparativamente aos das demais Zonas Homogêneas, o menor nível de cobertura escolar. 3.5.4.2 Evolução das Condições de Educação no Seridó - 1970-91 A análise detida para os anos de 1970, 1980 e 1991, considerando-se os municípios e as Zonas Homogêneas do Seridó, num perspectiva de longo prazo, revela que embora algum avanço tenha sido realizado, os níveis de analfabetismo da população entre 15 anos e mais são, ainda, muito altos, para o último ano. Como se pode depreender dos dados da tabela 3.5.4.3, tais níveis abrangiam, em 1991, cerca de 37,9% da população, o que, em termos absolutos, significava que, neste ano, cerca de 68,9 mil pessoas não sabiam ler nem escrever. Deve-se destacar, embora a taxa de analfabetismo no Seridó tenha passado de 54,7%, em 1970, para 45,3%, em 1980, e 37,9% em 1991, que o total de pessoas na condição de analfabetos, de acordo com os levantamentos censitários do Ibge, teria passado de 77,2 mil (1970) para 68,3 mil (1980) e, finalmente, para 68,9 mil (1991). Isto significa que, nos dois últimos anos considerados, embora tivesse havido uma importante redução nas taxas de analfabetismo (de 45,3% para 37,9%), o número de pessoas, de 15 anos e mais, classificados como analfabetos teria permanecido, praticamente, o mesmo. As taxas são, sem dúvida, muito altas, para todos os municípios e Zonas Homogêneas, mesmo quando se considera um município como o de Caicó (27,4%), entre todos, o que mais avançou na redução das taxas referidas. Para que se tenha uma percepção da dimensão das taxas de analfabetismo do Seridó e do Rio Grande do Norte, apresentadas na tabela 3.5.4.3, é importante considerar que sua evolução, no País em seu conjunto, ocorreu com a passagem, no período, de uma taxa de 33% (1970) para 25,3% (1980) e, por fim, para 19,4% (1991). O que significa que a taxa de analfabetismo do País correspondeu, em 1991, à metade da taxa registrada para o Seridó, no referido ano e um pouco mais da metade, relativamente à do Rio Grande do Norte. No interior da região, deve-se chamar a atenção, mais uma vez, para o conjunto de municípios que compõem a Zona Homogênea das Serras Centrais, que, em média, registra uma taxa de analfabetismo, em 1991, de quase 50% (mais exatamente, 49,5%). Neste caso, a grande participação da população rural, no total da população, e a fragilidade da oferta de serviços no campo explica em grande parte essa situação. Comparativamente com o total do Estado, tendo partido de, praticamente, o mesmo patamar em 1970, o Seridó registra, no último ano da série considerada, uma taxa de analfabetismo um pouco maior que a média registrada para o Rio Grande do Norte. A Zona Homogênea de Currais Novos praticamente acompanha a evolução do Estado, enquanto que a de Caicó apresenta, em todos os anos, níveis de analfabetismo menores do que o Rio Grande do Norte. Para que se tenha uma idéia da dimensão do esforço que os atores sociais da região, considerados entre estes os governos federal, estadual e municipais, além da sociedade civil, a tabela 223 apresenta o total de pessoas que não sabiam ler nem escrever nos anos considerados, no Seridó, em suas Zonas Homogêneas e municípios. É importante levar em conta que, com exceção da Zona Homogênea de Currais Novos e não obstante o fato de que houve para todas as zonas e municípios uma redução das taxas de analfabetismo, há uma tendência de permanecer o mesmo número absoluto de população analfabeta com o correr dos anos. Assim, na Zona Homogênea de Caicó, por exemplo, passa-se de 25,4 mil pessoas, de mais de 15 anos, que não sabiam ler nem escrever, em 1970, para 33,9 mil, em 1991. Nas Serras Centrais, de 27,6 mil (1970) para 25 mil (1991). Tudo indica que o avanço que se obtém na maior oferta de serviços de educação que, em tese, implicaria a redução da população analfabeta, é anulado, em grande parte, pelo crescimento da população, que alcança a idade para demandar tais serviços. Neste particular, o caso do Município de Caicó é sintomático. Sua taxa de analfabetismo da população de 15 anos e mais passa de 43,3%, em 1970, para 27,4%, em 1991. No entanto, dado o ritmo de expansão da sua população, o fato concreto é que o contingente de pessoas de 15 anos e mais classificadas como analfabetas é de 9,9 mil, em 1970, e de 9,2 mil, em 1991. Nesses 21 anos considerados, a oferta dos serviços de educação não foi capaz de reduzir, substancialmente, o contingente absoluto de pessoas que não sabem ler nem escrever. A maior parte dos municípios segue esta trajetória. Vale lembrar, com relação a essas informações, que se trata de um contingente de pessoas que já entrou ou está entrando na força de trabalho, em busca de uma oportunidade de emprego – ou no Seridó ou, através da emigração, em outras partes do Estado ou do País – e que seguramente terá muito mais dificuldades para encontrar trabalho do que um contingente mais qualificado e que saiba, no mínimo, ler e escrever. Numa fase em que, no mercado de trabalho, há uma crescente exigência de mão-de-obra mais capacitada e apta a dominar os novos processos produtivos que estão sendo introduzidos em todos os segmentos econômicos, notadamente os urbanos (industriais e de serviços), o analfabetismo ou o baixo nível de instrução constitui obstáculo não desprezível para o futuro das pessoas com estas características. Uma outra perspectiva da grande fragilidade dos serviços de educação no Seridó e no próprio Estado do Rio Grande do Norte é dado pelo número de anos de estudos da população adulta. Embora esta questão tenha sido abordada anteriormente, com dados para 1996, a faixa etária considerada era outra, o que não permite comparação com os dados que seguem. As informações trabalhadas pelo Pnud, Ipea, Ibge e FJP, no Atlas de Desenvolvimento Humano do Brasil, permitem que se tenha uma idéia do número médio de estudos da população adulta, de 25 anos e mais. O que se observa é que o número médio de estudos da população adulta (25 anos e mais), no Seridó, é muito pequeno, como a do Estado, mesmo no contexto do País em seu conjunto, que, na América Latina, registra uma das menores médias entre os países que a compõem. Há, sem dúvida, um avanço nas duas décadas consideradas, que, no Seridó, em média, significou triplicar entre 1970 e 1991 o número média de anos de estudos dessa população, quando se passou de 1,1 ano (1970) para 3 (1991). No entanto, está ultima média, que pode ter melhorado entre 1991 e este final de século, é ainda muito pouco significativa, quando se sabe que, mesmo no caso brasileiro, o nível era de 2,5 anos, em 1970 e de 4,9, em 1991. No Rio Grande do Norte, de acordo com os dados da tabela 3.5.4.5 é de 1,3 (1970), 2,3 (1980) e 3,8 (1991). Tais cifras constituem, não resta dúvida, a tradução de uma situação ainda crítica para o Seridó, o Rio Grande do Norte e mesmo o País, em seu conjunto, e, certamente, um desafio que terá que ser enfrentado, neste início de século, pelo 224 sistema de ensino nacional, estadual e regional, sobretudo quando se leva em conta a crescente exigência, no mercado de trabalho, quanto ao conhecimento e capacidade de absorver novos processos produtivos. Os municípios das Serras Centrais mostram, em média, não só o menor número de anos de estudos de sua população adulta, como uma menor intensidade do crescimento da referida média, com o decorrer dos anos. O que se pode assinalar, a partir dos dados disponíveis, a respeito das condições educacionais da população em idade escolar? Qual o grau de cobertura do sistema, relativamente à população que constitui o público-alvo da educação básica ou do ensino fundamental? TABELA 3.5.4.4 SERIDÓ: NÚMERO DE PESSOAS ANALFABETAS, DE 15 ANOS E MAIS - 1970-91 ESTADO, SERIDÓ, ZONAS HOMOGÊNEAS E MUNICÍPIOS 1970 Seridó Currais Novos Acari Carnaúba dos Dantas Currais Novos Equador Parelhas São Tomé Caicó Caicó Cruzeta Ipueira Jardim de Piranhas Jardim do Seridó Ouro Branco Santana do Seridó São Fernando São João do Sabugi São José do Seridó Serra Negra do Norte Timbaúba dos Batistas Serras Centrais Campo Grande Cerro Corá Florânia Jucurutu Lagoa Nova Santana do Matos São Vicente 1980 77.268 24.269 3.042 1.226 8.003 1.458 3.337 7.203 25.421 9.965 1.977 479 2.617 2.159 1.228 647 828 1.183 1.075 2.856 407 27.577 4.098 4.265 3.546 4.353 2.231 7.297 1.786 1991 68.345 20.612 2.632 809 7.932 1.117 3.421 4.701 22.984 9.143 1.521 346 2.517 2.333 1.161 557 731 982 966 2.400 326 24.750 4.099 3.408 3.009 4.407 2.770 5.482 1.575 68.945 19.981 2.344 1.054 8.288 1.477 3.258 3.560 23.945 9.217 1.875 295 2.765 2.483 962 494 989 1.103 989 2.365 407 25.019 3.806 2.936 3.483 4.636 2.903 5.903 1.352 FONTE DOS DADOS BÁSICOS: Pnud-Ipea-Ibge-FJP (1997)- Relatório de desenvolvimento humano do Brasil, 1997. 225 TABELA 3.5.4.5 R. G. DO NORTE E SERIDÓ: MÉDIA DOS ANOS DE ESTUDOS DA POPULAÇÃO DE 25 ANOS E MAIS - 1970-91 ESTADO, SERIDÓ, ZONAS HOMOGÊNEAS E MUNICÍPIOS 1970 1980 1991 ESTADO 1,3 2,3 3,8 Seridó Currais Novos Acari Carnaúba dos Dantas Currais Novos Equador Parelhas São Tomé Caicó Caicó Cruzeta Ipueira Jardim de Piranhas Jardim do Seridó Ouro Branco Santana do Seridó São Fernando São João do Sabugi São José do Seridó Serra Negra do Norte Timbaúba dos Batistas Serras Centrais Campo Grande Cerro Corá Florânia Jucurutu Lagoa Nova Santana do Matos São Vicente 1,1 1,1 1,2 1,1 1,3 0,9 1,5 0,5 1,4 1,8 1,2 1,2 0,8 1,6 1,3 1,0 0,6 1,2 1,2 0,8 1,4 0,8 0,8 0,6 1,0 0,7 0,6 0,8 0,6 1,8 2,0 2,0 2,2 2,3 1,5 2,2 1,2 2,2 2,8 1,8 1,6 1,6 2,3 1,5 1,4 1,6 2,0 1,4 1,5 2,1 1,1 1,2 0,8 1,5 1,1 1,1 0,9 1,2 3,0 3,3 3,2 3,5 3,5 2,5 3,5 2,4 3,5 4,3 3,2 2,9 2,5 3,2 2,9 2,8 2,4 3,4 3,1 2,2 3,0 2,0 2,2 1,7 2,2 2,0 2,1 1,6 2,4 FONTE DOS DADOS BÁSICOS: Pnud-Ipea-Ibge-FJP (1997)- Relatório de desenvolvimento humano do Brasil, 1997. As informações do Atlas de Desenvolvimento Humano do Brasil, já referidas, permitem que se avance no conhecimento, nos anos 1970-91, a respeito do contingente de população de 7 a 14 anos, que não estava freqüentando a escola. A tabela 3.5.4.6 mostra, para o Estado do Rio Grande do Norte, o Seridó, suas Zonas Homogêneas e municípios, as informações mais relevantes da respeito. Mais uma vez, as faixas etárias diferentes dificultam a comparação dos dados para 1970-91, com os de 1996, já comentados, neste particular. Embora seja razoável esperar que de 1991 até o presente tenha havido melhoria na participação da população de 7 a 14 anos, no sistema escolar, as informações revelam um contingente muito significativo da população jovem que está fora das escolas. Não resta dúvida que a ausência de quase ¼ da população nesta faixa etária (mais exatamente 23%, na região) representa a falta de cobertura do 226 sistema de ensino e, em última instância, a continuidade, por alguns anos, das altas taxas de analfabetismo da população local. É bem verdade que houve, de 1970 a 1991, avanços significativos, uma vez que se passou de uma participação de 45,4%, em 1970, para 40,5%, em 1980, e 23%, em 1991, no Seridó. Mas não se pode negar, também, que os níveis continuam muito altos e representam, em termos absolutos, um número significativos de crianças fora da sala de aula. Em 1991, segundo os cálculos realizados, cerca de 12,7 mil crianças não estavam freqüentando as aulas, no Seridó. Em municípios maiores, como Caicó e Currais Novos (e Santana do Matos), este contigente superava a marca de mil crianças em cada uma deles. Além disso, na Zona Homogênea das Serras Centrais, a ausência de crianças de 7 a 14 anos da escola, ainda em 1991, chegava a representar um pouco menos de 1/3 da população dessa faixa etária. O Seridó, em média, acompanha a trajetória do Estado, neste particular, pois os percentuais registrados são muito semelhantes, em cada ano. Além disso, ambos apresentam uma evolução caracterizada por um esforço maior de abrangência da cobertura do ensino, a partir dos anos 80. A situação e a evolução da Zona Homogênea das Serras Centrais é muito diferente das duas outras Zonas Homogêneas. Ela parte de um patamar muito alto e registra, tanto em termos relativos quanto absolutos, um avanço muito menor da cobertura do sistema de ensino, no que se refere à população de 7 a 14 anos. Sem ter ainda, pelo menos até 1991, alcançado a totalidade das crianças que constituem, em geral, o público especial dos serviços que são oferecidos, o sistema de ensino no Seridó ainda tem um longo espaço a percorrer, como se constatou anteriormente, no sentido de oferecer à população adulta condições para que ela tenha um acesso mínimo ao conhecimento e à informação que lhe permita não só uma mais fácil inserção no mercado de trabalho, como o exercício pleno da cidadania. Gráfico 3.5.4.1 RG N, S e rid ó e ZH: P o p u la çã o d e 7-14 An o s q u e n ã o F re q ü e n ta Esco la - 1970-91 120 100 (1970=100) 80 1970 1980 60 1991 40 20 Es tado Seridó ZH Curr ais Nov os ZH Caic ó ZH Serras Centr ais FONTE DOS DADOS BÁSICOS: Pnud-Ipea-Ibge-FJP (1997)- Relatório de desenvolvimento humano do Brasil, 1997. 227 O gráfico 3.5.4.1, anterior, mostra alguns traços relevantes da evolução da participação da população de 7 a 14 anos, que não freqüenta escola. Neste particular, ele destaca que, considerando o contingente da população fora da escola, em 1970, igual a 100, o Seridó registra uma tendência declinante sistemática dessa população, enquanto que o Estado do Rio Grande do Norte apresenta um aumento entre 1970 e 1980, para registrar uma redução dessa parcela da população somente entre 1980 e 1991. Diferentemente, o Seridó e as Zonas Homogêneas de Currais Novos e de Caicó registram um declínio do contingente de crianças fora da sala de aulas já entre os dois primeiros anos considerados, e isto prossegue no ano final da série. TABELA 3.5.4.6 RIO GRANDE DO NORTE E SERIDÓ: POPULAÇÃO DE 7 A 14 ANOS QUE NÃO FREQÜENTA A ESCOLA - 1970-91 ESTADO, SERIDÓ, ZH E MUNICÍPIOS ESTADO Seridó Currais Novos Acari Carnaúba dos Dantas Currais Novos Equador Parelhas São Tomé Caicó Caicó Cruzeta Ipueira Jardim de Piranhas Jardim do Seridó Ouro Branco Santana do Seridó São Fernando São João do Sabugi São José do Seridó Serra Negra do Norte Timbaúba dos Batistas Serras Centrais Campo Grande Cerro Corá Florânia Jucurutu Lagoa Nova Santana do Matos São Vicente 1970 43,9 45,4 44,0 49,5 30,0 46,1 54,1 26,6 53,8 40,6 31,3 54,4 57,6 43,6 34,5 49,3 53,9 52,0 44,8 43,2 57,8 38,3 52,8 59,0 52,3 49,1 47,6 50,0 53,6 64,0 (%) 1980 41,1 40,5 34,0 32,6 24,5 24,6 41,9 35,5 62,7 35,0 31,5 17,0 33,9 41,3 38,8 42,4 38,3 42,9 33,1 42,9 47,0 23,0 53,9 62,4 62,1 37,3 59,4 38,0 57,6 51,8 1991 23,3 23,0 18,1 16,8 16,9 14,6 23,3 18,9 30,5 19,8 15,1 15,5 12,7 28,4 18,6 25,8 29,5 23,1 22,2 25,6 34,8 12,8 31,9 33,1 25,1 23,5 27,2 34,3 44,3 30,9 POPULAÇÃO (Habitantes) 1970 1980 1991 148.805 164.816 110.744 23.474 21.301 12.718 7.026 5.712 3.249 1.236 756 372 313 282 189 2.618 1.735 1.177 526 454 263 749 1.018 641 1.583 1.468 606 7.996 6.785 4.061 2.613 2.516 1.394 784 244 236 175 99 43 757 755 527 684 770 372 561 384 224 293 230 149 401 284 151 391 319 237 267 278 166 946 836 519 124 70 43 8.452 8.803 5.408 1.510 1.696 903 1.158 1.166 544 1.082 892 562 1.344 1.702 826 687 643 769 2.184 2.174 1.502 488 529 303 FONTE DOS DADOS BÁSICOS: Pnud-Ipea-Ibge-FJP (1997)- Relatório de desenvolvimento humano do Brasil, 1997. Em resumo, os dados apresentados até agora mostram, pelo menos até 1991, deficiências significativas nos serviços de educação básica no Seridó, não só da perspectiva da população adulta 228 cujo percentual de analfabetos é significativo, como da perspectiva de atendimento da parcela da população jovem sem acesso ao sistema escolar. 3.5.4.3 A Educação na Perspectiva da População do Seridó Do esforço de mobilização da população, realizado visando a implantação do Plano de Desenvolvimento Sustentável do Seridó, resultou a coleta de informações valiosas a respeito das condições de instrução da região e das aspirações que a sociedade organizada tem em relação à educação. Neste particular, pode-se começar com os problemas mais relevantes constatados e dar prosseguimento no que se refere às potencialidades. • Analfabetismo. Um ponto central nos levantamentos realizados é o da constatação, pela população, da presença do analfabetismo na população local e a aspiração de erradicação do analfabetismo, entre os participantes nas reuniões ocorridas, em praticamente todos os municípios da região. Em alguns desses municípios, o cenário desejado era o de analfabetismo zero, além de escolas de melhor qualidade. A erradicação do analfabetismo é, seguramente, um esforço que deve ser realizado, com prioridade, no sistema de ensino, visando a cobertura completa da população jovem e adulta, neste particular, e que decorre do reconhecimento de que a alfabetização da população constitui não só um elemento fundamental para a participação mais efetiva das pessoas nas discussões e nos destinos da comunidade, como da constatação de que mudanças significativas estão ocorrendo nos processos de trabalho e nas exigências de ingresso no mercado de trabalho, que vão no sentido de reduzir o acesso da força de trabalho analfabeta e de reduzido grau de instrução ao emprego produtivo, tanto na região como fora dela. A concretização dessa aspiração de erradicação do analfabetismo provavelmente exigirá tanto a ampliação de programas governamentais voltados para a oferta de instrução à população analfabeta, quanto a mobilização das comunidades neste esforço, não só sob a forma de pressão mas por meio da oferta de serviços de educação que o Estado e os governos municipais não tenham condições de oferecer. Convém ressaltar o destaque dado nos seminários à presença marcante do analfabetismo entre a população rural da região, o que de certa forma é confirmado pelas informações estatísticas, uma vez que as taxas maiores de analfabetismo ocorrem nos municípios nos quais a taxa de urbanização (% população urbana sobre população total) é menor. • Insuficiência de cobertura do sistema. Há o reconhecimento, por parte da população, da insuficiência do sistema de educação nos municípios do Seridó. Tal insuficiência, de acordo com as manifestações ocorridas nos seminários realizados, visando a montagem do Plano de Desenvolvimento do Seridó, está associado não só ao fato de que o sistema tradicional não abrange a totalidade da população, que se constituiria em seu público-meta, o que é confirmado pelas informações estatísticas disponíveis que assinalaram que a insuficiência de cobertura alcança sobretudo algumas faixas etária extremas, como está associada ao fato de que há uma demanda significativa, em praticamente todas as comunidades, de cursos profissionalizantes ou de cursos técnicos específicos, que, em parte, decorre da crescente dificuldade de inserção da população no mercado de trabalho e de suas exigências quanto à formação dos recursos humanos. 229 No que se refere aos cursos profissionalizantes, a demanda é muito extensa e complexa, o que exige um aprofundamento futuro da identificação das formas de atendimento das aspirações. Cabe, apenas para ilustrar, sem a pretensão de cobrir toda a demanda, a menção à: i. capacitação da mão-de-obra voltada para as atividades industriais (cerâmica, movelaria, queijaria, etc.); ii. ausência de escolas agrícolas ou centros de treinamento voltados para as práticas agrícolas, ou a inexistência de equipamentos nas referidas escolas, ou, ainda, a ausência de ensino técnico em áreas como preparação de solos e novas tecnologias agrícolas, principalmente as técnicas que permitam à adaptação da atividade na ocorrência de secas; iii. carência de educação ambiental (formal e informal), sobretudo no que se refere ao processo de desertificação e à questão dos agrotóxicos: iv. falta de cursos médios especializados, condizentes com a realidade regional, qualificação e capacitação, tanto voltada para a população jovem como para a população adulta; v. necessidade de qualificação dos artesãos locais tendo em vista o desenvolvimento de atividade de turismo; vi. necessidade crescente de acesso da população à informática e à utilização de computadores, por meio de cursos voltados para esta área ou do equipamento das escolas, neste particular. Com relação a estes pontos, há um conjunto de solicitações no sentido de constituição de núcleos de ensino profissionalizantes e de cursos de extensão, vinculada à atuação das universidades existentes no Estado. Este aspecto é complementado com a demanda por uma atuação mais intensa de entidades que estão presentes na região como o Senai, Senac, Senar, Sebrae e SESI. Relativamente à necessidade de complementação dos sistemas de ensino tradicional, a identificação dos problemas, de acordo com as necessidades da comunidade, passam pelos seguintes aspectos, que, seguramente, não cobrem todo elenco de questões discutidas em seminários: i. carência de ensino de 3o grau, tendo em vista a continuidade da educação dos egressos do 2º grau e evitar a sua evasão (demanda dos municípios de maior porte), ou falta de opções para os referidos cursos (demanda de municípios menores); ii. necessidade de escolas específicas para excepcionais; iii. falta, em alguns municípios, de escolas públicas de 2º grau; iv. falta de escolas rurais ou de sistemas de transporte que permitam o acesso de populações rurais às escolas; carência de escolas do 1º grau nas zonas rurais. É importante lembrar, mais uma vez, que as informações estatísticas mais recentes (1996), anteriormente apresentadas, mostram que é desigual a cobertura do sistema educacional, no que se refere à população escolar de diferentes faixas etárias, o que confirma reivindicações feitas por representantes das populações locais nos seminários realizados. 230 Manifestações apresentadas pelos representantes de alguns municípios sugerem a presença de cobertura desigual do sistema educacional. A demanda de escolas rurais e a demanda de escola de 2º grau em municípios menores, constituem sinais de que embora em média o sistema cubra parte significativa das necessidades, em determinados municípios e espaços estão presentes déficits localizados. • Problemas associados à qualidade da educação oferecida. Não obstante os avanços ocorridos na oferta de serviços de educação no Seridó, perceptíveis a partir do aumento dos anos de estudo da população e da redução das taxas de analfabetismo nas últimas décadas, foram freqüentemente mencionadas questões associadas à qualidade da educação oferecida e que tomaram vários aspectos: i. a presença marcante da evasão e repetência; ii. a ausência de acompanhamento psicológico ou de assistentes sociais aos alunos; iii. didático; insuficiência de laboratórios, de mobiliário e instalações apropriadas e de material iv. falta de equipamentos em escolas rurais; v. ausência ou carência de bibliotecas e de equipamentos de computação e informática; vi. existência de professores sem qualificação adequada; falta de interesse de professores no desenvolvimento de suas atividades; vii. ausência de instalações para práticas esportivas e para o desenvolvimento de manifestações culturais (teatro, danças, folclore, etc.); viii. problemas associados à conservação dos prédios e instalações das escolas; ix. necessidade de adaptação do currículo escolar à realidade local e sua atualização. Este último aspecto é muito ressaltado, tanto ao serem feitas referências à necessidade de vinculação do ensino com a realidade, as condições de vida e de trabalho locais, quanto à necessidade de eliminação de sua defasagem (atualização), relativamente às questões presentes, nas quais a população escolar está inserida. Associada a esta desvinculação está a proposta de capacitação e atualização dos professores. Some-se às deficiências assinaladas, a questão já anteriormente referida da carência notada, em quase todas as reuniões, de cursos técnicos específicos e profissionalizantes, voltados para a população jovem e adulta. Este tema, em geral, esteve associado ao reconhecimento do grande problema local constituído pelo desemprego e, estreitamente vinculado a este, do êxodo rural. É importante assinalar que a questão da qualidade da educação oferecida, como ficou patente nas discussões realizadas durante as Reuniões Municipais e Sub-Regionais e em reuniões técnicas, depende de uma grande complexidade de fatores, não podendo ser atribuída ao nível de interesse e de qualificação dos professores, que nas avaliações tradicionais são apontados como os principais responsáveis por tais deficiências. Há, de fato, uma profunda conjugação de fatores que passam pelas 231 condições materiais, pelos valores da sociedade e pelas condições de remuneração e de trabalho dos que integram o sistema de ensino, como professores ou funcionários. Disso resulta que os avanços na qualidade da educação envolvem, ao lado de ações específicas no sistema educacional, profundas mudanças no próprio comportamento da sociedade e da sua relação com a educação. Nos cenários futuros desejados pela população local, que constituíam, nos seminários, a parte final das discussões, a questão da educação de qualidade, de erradicação do analfabetismo e da oferta de cursos profissionalizantes, em diferentes aspectos – como foi assinalado – compreendiam os pontos centrais das aspirações das comunidades. • Trabalho infantil. Em algumas ocasiões da consulta à sociedade, foram feitas referências à existência do trabalho infantil em municípios do Seridó, o que tem implicações significativas sobre a questão educacional, notadamente na ausência das crianças nas escolas, em sua capacidade de aprendizado e nas taxas de evasão e repetência. Neste particular, é importante examinar a dimensão do problema, a sua concentração espacial e o grau de vinculação ou dependência, relativamente a algumas atividades produtivas. Embora se trate de informações de certo modo defasadas, por se referirem a levantamentos censitários realizados em 1991, as estatísticas levantadas pelo Atlas de Desenvolvimento Humano, apresentadas, permitem uma aproximação com a dimensão do problema. Segundo os referidos dados, em 1991, aproximadamente 4 mil crianças de 10 a 14 anos trabalhavam no Seridó, sendo que a maior concentração (cerca de 1,8 mil) ocorria na Zona Homogênea de Caicó. Embora tenha havido, com o decorrer dos anos, uma redução no contingente de jovens que trabalham, os totais apresentados para a região e o Estado do Rio Grande do Norte (21,8 mil) são significativos. Note-se pela tabela 3.5.4.7, o peso dos maiores municípios, como Caicó e Currais Novos, no total do contingente de crianças que trabalham. Não obstante este fato, aparecem, também, municípios como Florânia, Jardim de Piranhas e Acari. Um número não desprezível de municípios registra a participação de mais de 10% da população de 10 a 14 anos que trabalha, no total da população total nesta faixa etária. Alguns chegam a ultrapassar a marca de 15%, não obstante o fato de que há uma tendência, nos anos considerados (1970, 1980 e 1991), de redução dessa participação. Chamam atenção, no que se refere à grande participação, municípios como o de Jardim de Piranhas, que registra 33% da participação da população de 10 a 14 anos que trabalha, no total da população com essa idade, além de Cruzeta, com 29,7%, Florânia (15,6%), Acari (15,6%), Timbaúba dos Batista (19,6%) e São João do Sabugi (15,4%). É importante considerar que o Estado em seu conjunto registra uma cifra, nessa participação, de 7,5%. • Outros problemas. É reconhecida a importância e o significado que tem a merenda escolar na melhoria não só nas condições de alimentação da populações carentes, em particular daquela mais jovem, como na melhoria do seu rendimento escolar. Foram assinalados em alguns municípios atrasos no repasse da merenda escolar, além da ausência de cobertura, entre os alunos do 2ºgrau, embora se trate de uma referência não muito freqüente. Além disso, as condições dos professores, notadamente os níveis de salários, foram referidos em várias oportunidades, considerando-se sobretudo o estímulo que a melhoria das suas condições de vida e de trabalho poderiam implicar na melhoria dos serviços de educação que são oferecidos. 232 Há, ainda, uma questão que, embora já referida, merece ser enfatizada. Trata-se da demanda por infra-estrutura para lazer e para a prática de esportes ou para apoio ao desenvolvimento de manifestações culturais, que aparece ora vinculada às questões tratadas, quando da discussão da educação ou independentemente dela. Neste caso, é freqüentemente sugerida a construção de ginásios poliesportivos, de organizações de eventos, com destaque, por vezes, não só considerando a população jovem como o lazer e a atenção para a população de terceira idade. Não obstante o fato de que, sobretudo no contexto atual de profundas mudanças na sociedade, na economia e no mercado de trabalho, a educação e a qualificação passaram a ter um papel da maior relevância. No que em particular se refere à inserção no mercado de trabalho, a solução para o desemprego reside, fundamentalmente, na expansão da economia e nas oportunidades de trabalho que surgem no interior de uma economia dotada de maior dinamismo. 3.5.4.4 A Oferta de Serviços de Educação As informações relacionadas à oferta dos serviços de educação, sobretudo do pré-escolar, do 1º e do 2º graus, foram obtidas com base no Anuário Estatístico do Rio Grande do Norte, publicado pelo Idema. Elas permitem que sejam conhecidos aspectos relevantes a respeito da oferta de serviços de educação no Estado, em geral, e do Seridó e suas Zonas Homogêneas, em particular. Começando por esses três níveis de ensino, o que está assinalado nas tabelas 3.5.4.8 e 3.5.4.9 revela as características mais importantes dos estabelecimentos, do corpo docente e da matrícula (inicial e final) desse sistema. No Seridó, de acordo com os dados das referidas tabelas, estão concentrados cerca de 16,5% dos estabelecimentos de ensino (federais, estaduais, municipais e privados) e cerca de 12,8% dos docentes. Além disso, 11,6% das matrículas iniciais foram registradas nessa região. Não esquecer que a população do Seridó representa cerca de 11,3% da população do Estado. Nos níveis de ensino antes assinalados, existiam no Seridó, em 1997, cerca de 1147 estabelecimentos de ensino, dos quais 787 estavam no meio rural. No total dos estabelecimentos trabalhavam cerca de 4,4 mil professores, sendo que 1,2 vinculados aos estabelecimento de ensino localizados no meio rural. Algumas constatações relevantes podem ser extraídas das informações que resumem aspectos dos serviços educacionais prestados no Seridó. Entre eles cabe fazer referência aos seguintes: • relativamente à localização dos estabelecimento e do corpo docente, constata-se uma distribuição rural/urbana dos serviços voltados para o pré-escolar e para o ensino de 1º grau, que demostra um esforço no sentido de cobrir a demanda localizada tanto no meio urbano quanto no meio rural; • assim, do total dos estabelecimentos voltados para o pré-escolar, cerca de 48,2% estão no meio rural; ademais, cerca de 22,9% do corpo docente e 37,5% das matrículas iniciais estão vinculados aos estabelecimentos rurais; • no que se refere ao 1º grau, estão registrados no meio rural aproximadamente 79,4% dos estabelecimentos, 31,3% dos integrantes ao corpo docente, 26,2% das matrículas iniciais; neste 233 particular, é importante considerar que cerca de 31,9% da população do Seridó residem no meio rural; esta distribuição, como era de se esperar, não ocorre com relação ao ensino do 2º grau; • de fato, dada a dimensão e complexidade dos estabelecimentos do ensino do 2º grau, o racional era sua localização em determinado espaço, onde a concentração da população justificasse a existência de tal estabelecimento; no entanto vale o registro de que nenhum estabelecimento do 2º grau se localiza no meio rural do Seridó, não obstante, de acordo com as estatísticas, cerca de 5 deles tenham esta localização no Estado, em seu conjunto; • vale o destaque ainda nesta questão para o fato de que, de acordo com as informações da base de dados consultada, em todos os municípios, com exceção de Bodó e Triunfo Potiguar (que não registram nenhum estabelecimento de 2ºgrau), existe pelo menos um estabelecimento com este nível de ensino. TABELA 3.5.4.7 RIO GRANDE DO NORTE E SERIDÓ: POPULAÇÃO DE 10 A 14 ANOS QUE TRABALHA - 1970, 1980 E 1991 ESTADO, SERIDÓ, ZONAS 1970 1980 1991 HOMOGÊNEAS E MUNICÍPIOS ESTADO Seridó Currais Novos Acari Carnaúba dos Dantas Currais Novos Equador Parelhas São Tomé Caicó Caicó Cruzeta Ipueira Jardim de Piranhas Jardim do Seridó Ouro Branco Santana do Seridó São Fernando São João do Sabugi São José do Seridó Serra Negra do Norte Timbaúba dos Batistas Serras Centrais Campo Grande Cerro Corá Florânia Jucurutu Lagoa Nova Santana do Matos São Vicente 24.910 5.187 1.334 149 54 378 61 287 404 1.743 341 42 53 263 219 237 147 116 135 163 27 2.110 328 323 308 300 160 594 97 30.720 4.862 1.889 280 210 772 95 195 338 1.367 446 100 5 95 223 23 48 115 55 81 164 11 1.605 259 172 250 266 285 289 85 FONTE DOS DADOS BÁSICOS: Pnud-Ipea-Ibge-FJP (1997)- Relatório de desenvolvimento humano do Brasil, 1997. 234 21.833 3.935 1.172 211 74 525 110 200 52 1.815 541 282 9 388 165 71 33 22 96 51 118 42 948 154 139 253 158 110 65 69 TABELA 3.5.4.8 RIO GRANDE DO NORTE E SERIDÓ: ESTABELECIMENTO E CORPO DOCENTE DO PRÉ-ESCOLAR, DO 1º E DO 2º GRAU, SEGUNDO ZONAS HOMOGÊNEAS - 1997 ZONAS HOMOGÊNEAS SERIDÓ E ESTADO Currais Novos Pré-escolar 1º grau 2º grau Caicó Pré-escolar 1º grau 2º grau Serras Centrais Pré-escolar 1º grau 2º grau Seridó Pré-escolar 1º grau 2º grau ESTADO Pré-escolar 1º grau 2º grau TOTAL DOS ESTABELECIMENTOS. TOTAL RURAL 294 177 85 34 195 142 14 1 392 235 81 16 295 219 16 461 375 135 95 317 280 9 1.147 787 301 145 807 641 39 1 6.941 4.196 2.095 1.024 4.548 3.167 298 5 TOTAL CORPO DOCENTE TOTAL RURAL 1.445 182 1.028 235 1.720 257 1.195 268 1.262 167 981 114 4.427 606 3.204 617 34.565 4.326 25.438 4.801 313 36 263 14 298 20 278 545 83 462 1.156 139 1.003 14 7.846 1.148 6.634 64 FONTE DOS DADOS BÁSICOS: Idema. Anuário Estatístico do Rio Grande do Norte, 1998. É com relação a esses estabelecimentos de 2º grau que parte relevante das recomendações relacionadas com a melhoria do acesso a este tipo de ensino foram feitas nos seminários realizados. Tanto no que se refere às dificuldades de transporte, sobretudo para as pessoas que residem no meio rural, como à distribuição da rede de ensino do 2º grau foram feitas freqüentes referências. Relativamente ao ensino superior, cabe fazer referência não só à presença como ao papel estratégico que as instituições de ensino superior exercem na região. De acordo com os dados do Anuário Estatístico do Rio Grande do Norte, em 1997, marcava presença no Seridó, o Centro Regional de Ensino Superior (Ceres) de Caicó e o Centro Regional de Ensino Superior (Ceres) de Currais Novos, ambos integrantes da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (Ufrn). 235 TABELA 3.5.4.9 RIO GRANDE DO NORTE E SERIDÓ: MATRÍCULA INICIAL E FINAL NO PRÉ-ESCOLAR, NO 1º E NO 2º GRAU, SEGUNDO ZONAS HOMOGÊNEAS – 1997 ZONAS HOMOGÊNEAS SERIDÓ E ESTADO Currais Novos Pré-escolar 1º grau 2º grau Caicó Pré-escolar 1º grau 2º grau Serras Centrais Pré-escolar 1º grau 2º grau Seridó Pré-escolar 1º grau 2º grau ESTADO Pré-escolar 1º grau 2º grau MATRÍCULA INICIAL TOTAL RURAL 30.523 4.887 5.235 757 21.702 4.074 3.586 56 35.688 4.517 5.457 374 25.736 4.143 4.495 ... 27.857 11.527 4.238 1.588 21.745 9.939 1.874 ... 94.068 20.931 14.930 2.719 69.183 18.156 9.955 56 MATRÍCULA FINAL TOTAL Rural 25.526 4.125 5.382 658 18.137 3.467 2.007 30.227 3.511 6.228 335 20.947 3.176 3.052 ... 21.688 8.630 3.868 1.330 17.081 7.300 739 ... 77.441 16.266 15.478 2.323 56.165 13.943 5.798 0 807.846 166.862 641.810 124.108 104.688 613.503 89.655 24.849 141.566 447 112.007 478.670 51.133 23.064 100.806 238 FONTE DOS DADOS BÁSICOS: Idema. Anuário Estatístico do Rio Grande do Norte, 1998. 3.5.4.5 Problemas e Potencialidades e Aspectos de um Cenário As informações apresentadas anteriormente, tanto aquelas vinculadas aos levantamentos de dados secundários, quanto as relacionadas à consulta à população, mostraram a existência de problemas significativos nas condições de educação da população do Seridó. Puseram também em destaque que as potencialidades para este segmento devem constituir elemento de fundamental importância para o desenvolvimento de ações futuras nesta área. Os problemas. No que se refere aos problemas mais relevantes, deve-se considerar que não obstante os avanços ocorridos tanto no que se refere à redução do analfabetismo, como à melhoria da qualidade do ensino, quanto à sua maior cobertura, relativamente à população em idade escolar, que marcam ainda presença no Seridó os especificados a seguir. • Analfabetismo ou o reduzido grau de instrução da população em geral. Neste particular, de acordo com as informações apresentadas, cerca de 30,2% da população de 4 e mais anos de idade estavam constituídos de pessoas analfabetas ou com menos de um ano de instrução, em 1996, cifra um pouco maior do que a média do Estado (28,5%). Nos municípios da Zona Homogênea de Caicó, esta cifra alcançava 25,6%, na de Currais Novos cerca de 27,3% e na Zona Homogênea das Serras Centrais aproximadamente 39,6%. 236 Isto implica, certamente, dificuldades crescentes da população, para ampliar o seu nível de entendimento e compreensão de uma realidade crescentemente complexa e um obstáculo significativo no acesso ao mercado de trabalho, em constantes mudanças e cada vez mais exigente quanto ao conhecimento e domínio dos processos de trabalho mais modernos e complexos. • A existência de déficits de cobertura do sistema de ensino em relação à população em idade escolar é ainda relevante, não obstante os avanços ocorridos e a quase total cobertura existente em alguns níveis de ensino; como se assinalou, há, na maior parte dos municípios do Seridó e no Estado, um percentual bem maior da população na idade de 7 a 9 anos e de 10 a 14 anos, do que nas idades de 4 a 6 anos e, sobretudo de 15 a 19 anos. Isso mostra a existência de obstáculos e dificuldades para se constituir um sistema de ensino suficientemente abrangente para oferecer formação e capacitação a toda a população jovem da faixa de prioridade de todo sistema educacional eficiente e eficaz (4 a 19 anos). • Muitos aspectos que podem ser associados a fatores que reduzem a qualidade do ensino oferecido no Seridó foram mencionados durante a consulta à sociedade. Tais aspectos tomaram as mais diferentes dimensões e podem ser assim resumidos: i) quanto à disponibilidade de meios materiais nas unidades de ensino: falta de instalações adequadas, de material didático, insuficiência de laboratórios, de mobiliário, falta de equipamentos em escolas rurais, ausência ou carência de bibliotecas e de equipamentos de computação e informática, ausência de instalações para práticas esportivas e para o desenvolvimento de manifestações culturais e problemas associados à conservação dos prédios e instalações das escolas; ii) problemas associados ao corpo docente e à disponibilidade de funcionários: existência de professores sem qualificação adequada; falta de interesse de professores no desenvolvimento de suas atividades, ausência de acompanhamento psicológico ou de assistência social aos alunos; iii) questões associadas ao currículo escolar: necessidade de adaptação do currículo escolar à realidade local e sua atualização em relações às exigências mais recentes da comunidade. • Carência de especialização e cursos profissionalizantes. Algumas deficiências do sistema de ensino aparecem, quanto se estabelece o confronto entre os cursos e disciplinas oferecidas e uma demanda cada vez mais intensa e complexa de cursos profissionalizantes, técnicos e especializados; neste particular, coube o destaque, na consulta que foi feita à sociedade, para os seguintes temas: capacitação da mão-de-obra voltada para as atividades industriais (cerâmica, movelaria, queijaria, etc.); necessidade de qualificação dos artesãos locais, tendo em vista o desenvolvimento de atividades de turismo; necessidade crescente de acesso da população à informática e à utilização de computadores, através de cursos voltados para esta área ou ao equipamento das escolas, neste particular; ausência de escolas agrícolas ou centros de treinamento voltados para as práticas agrícolas, ou, ainda, ausência de ensino técnico em áreas como preparação de solos e novas tecnologias agrícolas, principalmente as técnicas que permitam a adaptação da atividade na ocorrência de secas; carência de educação ambiental (formal e informal), sobretudo no que se refere ao processo de desertificação e à questão dos agrotóxicos; constituição de núcleos de ensino profissionalizantes e de cursos de extensão vinculada à atuação das universidades existentes; atuação mais intensa de entidades que estão presentes na região como o Senai, Senac, Senar, Sebrae e SESI. • Outros problemas relevantes. Muitos outros aspectos foram diagnosticados a partir dos levantamentos de dados secundários realizados ou com base nos seminários de consulta à sociedade organizada no Seridó: a presença de contingente relevante de crianças no mercado de trabalho e o impacto que este fato tem sobre a quantidade da população em idade escolar fora da escola, em relação à evasão escolar e o nível de aproveitamento a crianças na escola; os dados do Atlas de 237 Desenvolvimento Humano registram para o Seridó, em 1991, a presença de aproximadamente 3,9 mil crianças, de 10 a 14 anos no mercado de trabalho; a isto é importante acrescentar a dificuldade de deslocamento dos alunos, sobretudo no meio rural e em localidade distantes dos estabelecimentos de ensino, que têm induzido a evasão escolar e deficiência no aproveitamento escolar dos alunos nestas condições. Potencialidades. Entre as potencialidades do Seridó, relacionadas ao sistema de ensino e às condições educacionais da população, podem ser destacadas as que se seguem: • A crescente cobertura do sistema de ensino, relativamente à população em idade escolar, sobretudo quando é considerado o longo prazo (de 1970 a 1996); embora se reconheça a existência de déficits, como os já assinalados, não se pode negar a ocorrência de avanço neste particular, que expressam a possibilidade de resposta à demanda crescente da população. • crescente interesse da população para melhoria das condições de educação da região, que se expressa nas pressões voltadas para a ampliação e melhoria das condições de oferta de ensino pré-escolar, do 1º, do 2º grau e do ensino superior, e pela criação de cursos técnicos, de especialização ou profissionalizantes, sem dúvida associados às exigências do mercado de trabalho e à preocupação da população com o problema do desemprego. • A presença marcante, sobretudo nos municípios de Currais Novos e Caicó, da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, através dos dois centros regionais de ensino superior, cuja atuação tem significado impactos significativos na ampliação e melhoria da qualidade do ensino na região. • A menor pressão demográfica, associada ao declínio da taxa de natalidade da população e ao seu menor crescimento, significa, também, menor pressão por novas obras e instalações físicas ou programas de mais alto custo. Essa circunstância enseja uma certa folga nas ações de governo, que bem poderia ser utilizada na melhoria da qualidade do ensino e na diversificação da oferta dos serviços de educação. • A presença de importantes fundos e programas governamentais, voltados para treinamento e qualificação da força de trabalho, poderá viabilizar parte relevante da demanda crescente que se observa na população do Seridó, relacionada à capacitação, mediante cursos técnicos e profissionalizantes. Papel da educação e futuro desejado. Apesar do registro freqüente das dificuldades e problemas vividos pela educação no Seridó, há o reconhecimento de que ela desempenha e deverá desempenhar papel relevante no desenvolvimento social e econômico das comunidades. As indicações de cenários ou de futuro desejado, apresentadas para a sociedade pelos participantes dos seminários realizados, destacam não só uma sociedade na qual esteja erradicado o analfabetismo, como uma sociedade que possua uma oferta de serviços de educação de boa qualidade, além de uma educação estreitamente articulada com a realidade local, que permita o envolvimento das pessoas nos processos decisórios, e, ademais, que se volte – segundo demanda bastante enfatizada – para a preparação técnica e profissional dos jovens e dos adultos em seu ingresso no mercado de trabalho. Isto é particularmente relevante quando há o reconhecimento, no Seridó, da presença de altas taxas de desemprego e quanto se tem consciência, também, das crescentes exigências para inserção no mercado de trabalho, diante das mudanças que vêm ocorrendo e deverão se intensificar nos processos de trabalho. 238 Da consulta feita à população, fica patente o interesse marcante da sociedade no Seridó na melhoria da oferta de serviços de educação na região, que, em sua perspectiva, deve ser traduzida tanto no encaminhamento de soluções para questões que já deviam ter sido solucionadas – caso do analfabetismo e da cobertura do sistema de ensino a toda população em idade escolar – como de aspectos relacionados com a qualidade da educação oferecida, considerando-se suas várias dimensões, como de sua maior abrangência, no que se refere a um grande elenco de cursos profissionalizantes ou de treinamento e capacitação, mais diretamente vinculados ao acesso ao mercado de trabalho, em constantes mudanças. Os termos utilizados nos encontros realizados com as lideranças de “analfabetismo zero”, “educação para todos” e “educação de qualidade” definem pontos relevantes do futuro desejado, relacionado com o sistema de educação para o Seridó. 3.5.5 Condições de Saúde da População do Seridó Esta parte do trabalho refere-se a um diagnóstico sumário sobre as condições de saúde da população do Seridó. Foram abordados, inicialmente, aspectos gerais vinculados às condições de saúde, com base nos indicadores tradicionais de longevidade: esperança de vida ao nascer e mortalidade infantil. As considerações a este respeito tiveram por base os indicadores do desenvolvimento humano elaborados pelo Pnud, Ipea, Ibge e Fundação João Pinheiro–FJP, no seu Atlas de Desenvolvimento Humano, com dados para alguns anos das décadas de 70, 80 e 90. Em seguida, foram examinadas as informações dos seminários e reuniões ocorridas nos municípios da região, com parte relevante da liderança da sociedade organizada, que não só assinalou, de sua perspectiva, os problemas relacionados com a saúde da população do Seridó, mas as potencialidades e soluções que deveriam ser consideradas no Plano de Desenvolvimento do Seridó. Além disso, foram examinados aspectos considerados relevantes dos serviços de saúde existentes na região, a partir dos dados secundários disponíveis. Repete-se, nos problemas de saúde, o que foi encontrado nos demais aspectos da dimensão social do desenvolvimento do Seridó. Ocorreram avanços, alguns significativos, no entanto, os indicadores locais mostram que permanecem defasagens consideráveis, relativamente aos indicadores sociais do País e das regiões mais industrializadas. Além disso, tais defasagens tornam-se mais relevantes quando se sabe que o País, no contexto internacional, apresenta os níveis mais baixos no tocante aos indicadores de saúde, de educação e de saneamento básico, mesmo quando a comparação do Brasil é feita com países de nível de renda similar. Neste particular, pois, importa não só a continuidade dos avanços ocorridos, mas sua intensificação, no sentido de universalizar no curto e médio prazo, junto à população, o conjunto de serviços de saúde, educação, saneamento e seguridade social. 3.5.5.1 Os Indicadores de Longevidade: Situação mais Recente Entre os indicadores tradicionais de longevidade – que traduzem de forma sintética as condições de vida da população –, os mais usados são o de esperança de vida ao nascer e o da taxa de mortalidade infantil. O índice da esperança de vida ao nascer é dado pelo número médio de anos que as pessoas viveriam a partir do nascimento, num contexto social e econômico determinado. A taxa de mortalidade infantil significa a probabilidade de uma criança morrer antes de completar o primeiro ano de vida, expresso por mil crianças nascidas vivas, de acordo com o Atlas de Desenvolvimento Humano, já referido. 239 Antes do exame dos indicadores, algumas considerações preliminares devem ser feitas. Os indicadores foram estimados para a quase totalidade dos municípios, a partir das informações censitárias, considerando-se os dados de 1970, 1980 e 1991. Para o Estado do Rio Grande do Norte, em seu conjunto, os dados avançam até o ano de 1995 e 1996. Os dados municipais foram obtidos por vias indiretas. Devem, portanto, ser considerados como uma aproximação. Os dados referentes à esperança de vida, para a totalidade do Estado, apresentam algumas diferenças, quando se considera, de um lado, o que consta das informações do CD-Rom que acompanha a publicação dos indicadores, ou quando se consideram as informações que constam do texto Desenvolvimento Humano e Condições de Vida: Indicadores Brasileiros. Não há dados referentes às Zonas Homogêneas e ao Seridó, em seu conjunto. Para obter uma estimativa aproximada, para tais agregados, foram utilizados os dados relativos a cada município (esperança de vida e taxa de mortalidade infantil), ponderada pela população (população total para a esperança de vida e população de menos de uma anos para a taxa de mortalidade infantil). No caso da mortalidade infantil, dada a dificuldade para obtenção de informações para a população de menos de um ano por município, não foram feitas as estimativas médias para as Zona Homogêneas e para o Seridó, para o ano de 1980. Os valores encontrados mostram que em 1991 a esperança de vida do Seridó era de 61,62 anos, comparativamente com a do Estado do Rio Grande do Norte (60,58 anos). 97 Tais valores são mais baixos do que os registrados para o Brasil e para os Estados da Federação de maior nível de renda e mais industrializados. Para se ter uma idéia, o País em seu conjunto apresentava, em 1991, uma esperança de vida de 65,37 anos e o Estado do Rio Grande do Sul (um dos que registram melhores indicadores sociais), cerca de 66,10 anos, também, em 1991. Relativamente ao Seridó, para 1991, vale o destaque para o fato de ocorrerem diferenças significativas, quando comparados os dados para as distintas Zonas Homogêneas. A Zona Homogênea de Currais Novos apresenta 63,06 anos de esperança de vida, valor próximo ao da Zona Homogênea de Caicó (63,58), mas distante dos valores apresentados pela Zona Homogênea das Serras Centrais: cerca de 57,42 anos. Entre os valores registrados para os municípios, alguns casos extremos mostram a variação existente na região. Assim, entre os que apresentam os níveis mais altos de esperança de vida ao nascer, mostrando melhores condições de vida, cabe referir-se Caicó (64,28 anos) e Cruzeta (64,12 anos). No outro extremo, situam-se, por exemplo, Jucurutu (51,85) e Campo Grande (56,31) (tabela 3.5.4.1). No que se refere às taxas de mortalidade infantil, é importante assinalar o valor muito alto apresentado pelo Rio Grande do Norte, em 1991, de 90,51‰, quando se faz a comparação com o Brasil, que registrou, naquele mesmo ano, uma taxa de 49,49‰. A taxa do Rio Grande do Norte é, pois, quase o dobro daquela do Brasil. A taxa apresentada pelo Estado é inclusive maior do que a que foi calculada para o Seridó, em seu conjunto (86,43), e para as Zonas Homogêneas de Currais Novos (73,92) e a de Caicó (69,83). No entanto, a média estadual é bem inferior à taxa de mortalidade infantil da Zona Homogênea das Serras Centrais (116,64). (Tabela 3.5.5.1.) 97 No texto que acompanha o CD-Rom os dados de esperança de vida para o Estado são 38,91 anos em 1970, 59,41 anos em 1980 e 63,42 anos em 1991, 64,82 em 1995 e 65,18 anos em 1996. Os dados apresentados pelo CD, que registram estimativas até 1991, mostram os seguintes valores 44,36 (1970), 51,03 (1980) e 60,58 (1991). 240 Considerando-se apenas os valores para 1991, percebe-se a heterogeneidade de situações constatadas para a Região do Seridó. Isto ocorre, como se assinalou, com os valores antes referidos para as Zonas Homogêneas, com destaque para as piores condições de saúde dos municípios das Serras Centrais, refletidas na mortalidade infantil ainda muito alta, e ocorre também quando se considera a perspectiva dos municípios isoladamente. De fato, numa situação consideravelmente melhor, no que se refere à mortalidade infantil, encontram-se municípios como o de Parelhas (56,96), Caicó (64,84) e Cruzeta (56,96), comparativamente com outros municípios que, registram taxas de mortalidade infantil duas ou três vezes maiores do que as dos municípios anteriormente referidos: Campo Grande (123,29), São Vicente (113,51) e Jucurutu (161,51), em pior posição em todo o Seridó. Note-se que estes três últimos municípios situam-se na Zona Homogênea das Serras Centrais, que, seguramente, com suas altas cifras de mortalidade infantil, influíram na média muito alta de mortalidade desta Zona Homogênea. 3.5.5.2 A Evolução dos Indicadores de Longevidade A tabela 3.5.4.1, apresentada no item anterior, oferece informações sobre a evolução dos indicadores tradicionais de longevidade no Estado e no Seridó, fornecendo uma indicação da evolução das condições de saúde e nutrição, que, geralmente, estão por trás dos valores registrados. O Seridó, em seu conjunto, assiste a uma melhoria dos seus indicadores, tanto o de esperança de vida ao nascer, que sugere um aumento da vida média das pessoas, como em relação à taxa de mortalidade infantil, que mostra a redução da mortalidade da população da faixa etária de menos de um ano, indicador extremamente sensível às condições de nutrição, saneamento básico e saúde da população. De fato, houve entre 1970 e 1991 um aumento de 14,89 anos (aproximadamente 15 anos, portanto) na esperança de vida média da população regional, que passou de 46,73 anos para 61,62 anos. Esse incremento está próximo do que ocorreu no Estado do Rio Grande do Norte (16,22 anos, uma vez que se elevou de 44,36 para 60,58 anos) e maior do que ocorreu no Brasil em seu conjunto (11,52 anos: de 53,85 para 65,37). Em relação às Zonas Homogêneas do Seridó, os ganhos de anos na esperança de vida entre 1970 e 1991 são diferentes. Os maiores ganhos foram obtidos pela Zona Homogênea de Currais Novos, que, partindo de uma base menor do que a Zona Homogênea de Caicó, alcançou o mesmo número de anos na última data considerada: 16,76 anos. Em seguida, deve-se mencionar a Zona Homogênea das Serras Centrais, cujo aumento de anos na esperança de vida ficou em torno de 15,46 anos. Partindo de um nível de expectativa de vida muito mais modesto do que os demais, 41,96 anos, alcançou, em 1991, a marca de 57,42 anos. O caso da Zona Homogênea de Caicó é intermediário a essas duas situações. Ela parte de um patamar alto, inclusive em relação ao Estado (50,90 anos em relação a 44,36 do Estado) e alcança, em 1991, 63,58 anos, ou seja 12,68 anos. Em síntese, os ganhos em anos não foram desprezíveis, no entanto, o patamar a que se chegou no Seridó, no início dos anos 90, e em cada uma das suas Zonas Homogêneas é, ainda, muito reduzido. O que era de esperar, uma vez que a região partiu de uma base muito reduzida em anos, em 1970. Relativamente à mortalidade infantil, também não foi desprezível a redução alcançada no número de crianças que morriam antes de alcançar um ano de idade. No Seridó, em 1970, a estimativa da taxa de mortalidade infantil era de 216,12 crianças entre 1.000 nascidas vivas. Esta marca reduziu-se 241 para 86,43, em 1991, o que significa que nesse último ano a região alcançou o equivalente a 40% do que era há pouco mais de vinte anos. Essa diminuição na incidência da mortalidade infantil foi equivalente à que se verificou no Estado e no Brasil. No caso do Rio Grande do Norte, a taxa passou de 235,63 para 90,51, entre 1970 e 1991. No caso do País, de 123,19 para 49,49. Trata-se de uma redução para 40% ou 38%, equivalente ou próxima ao que se obteve no Seridó. TABELA 3.5.5.1 RIO GRANDE DO NORTE E SERIDÓ: ESPERANÇA DE VIDA E MORTALIDADE INFANTIL, SEGUNDO ZONAS HOMOGÊNEAS E MUNICÍPIOS - 1970, 1980 E 1991 ESTADO, SERIDÓ, ZH E MUNICÍPIOS ESPERANÇA DE VIDA (Anos) 1970 1980 1991 MORTALIDADE INFANTIL (Mortes por 1.000 nascidos Vivos) 1970 1980 1991 ESTADO 44.36 51.03 60.58 235.63 Seridó Currais Novos Acari Carnaúba dos Dantas Currais Novos Equador Parelhas São Tomé Caicó Caicó Cruzeta Ipueira Jardim de Piranhas Jardim do Seridó Ouro Branco Santana do Seridó São Fernando São João do Sabugi São José do Seridó Serra Negra do Norte Timbaúba dos Batistas Serras Centrais Campo Grande Cerro Corá Florânia Jucurutu Lagoa Nova Santana do Matos São Vicente 46.73 46.30 50.31 41.01 44.29 47.76 52.25 42.61 50.90 51.54 50.87 44.20 47.12 52.65 47.81 47.82 46.36 54.19 52.89 53.67 51.02 41.96 41.02 40.26 41.82 40.04 42.01 43.42 47.25 52.46 52.37 54.98 53.17 49.61 53.53 60.36 47.28 56.35 57.05 54.56 56.02 51.62 56.95 56.91 59.10 54.26 59.39 58.07 56.02 56.02 47.71 44.56 48.47 47.69 45.99 48.04 50.42 48.84 61.62 63.06 63.73 63.70 63.39 59.59 65.50 58.90 63.58 64.28 64.12 63.68 59.94 63.51 63.70 63.82 61.86 63.68 63.70 63.68 63.68 57.42 56.31 57.68 57.71 51.85 58.05 62.18 57.54 216.12 219.58 176.02 272.82 236.39 200.59 158.18 254.70 171.50 164.52 170.65 237.29 206.98 154.60 200.05 200.05 214.73 141.22 152.53 145.70 169.34 260.92 272.64 281.49 263.54 284.09 261.42 245.78 205.71 169.26 134.58 150.04 182.64 146.88 92.34 205.38 117.57 138.13 125.95 163.82 118.37 118.67 101.73 140.64 99.56 109.60 125.95 125.95 233.50 193.62 201.28 218.47 197.80 174.84 190.03 90.51 86.43 73.92 68.53 68.75 70.78 97.82 56.96 103.04 69.83 64.84 65.94 68.85 95.21 70.00 68.75 67.93 81.35 68.85 68.75 68.85 68.85 116.64 123.29 112.43 112.13 161.51 109.54 79.13 113.51 FONTE DOS DADOS BÁSICOS: Pnud-Ipea-Ibge-FJP (1997)- Relatório de desenvolvimento humano do Brasil, 1997. Comportamento similar ocorreu nas taxas de mortalidade infantil, nas Zonas Homogêneas da região. De acordo com os dados da tabela 3.5.5.1, apresentada no item anterior, na Zona Homogênea (ZH) de Currais Novos, a redução da mortalidade infantil ocorre com a taxa passando de 219,58 (1970) 242 para 73,92 (1991). Esta última cifra equivale a 1/3 daquela registrada em 1970. No caso da ZH de Caicó, passou-se de 171,50 para 69,83. A intensidade foi menor (a taxa de 1991 corresponde a 41% da taxa de 1970), mas a Zona Homogênea de Caicó partiu, no primeiro ano, de um nível de mortalidade infantil bem menor. No caso das Serras Centrais, não só era muito elevada a taxa de mortalidade infantil, calculada para 1970 (260,92), como a redução foi bem menos intensa do que nas demais zonas: a de 1991 (116,64) equivale a 45% do que era em 1970. A distância – como pode ser observada na tabela 3.5.5.1 – entre os municípios das Serras Centrais e os das demais Zonas Homogêneas, no que se refere às taxas de mortalidade infantil, tornaram-se relativamente mais amplas. Voltando-se para os casos mais específicos de alguns municípios do Seridó, é importante chamar atenção para os municípios que, ainda em 1991, registravam níveis de mortalidade infantil a taxas superiores a 100 crianças por 1.000 nascidas vivas: na Zona Homogênea de Caicó, nenhum dos 12 municípios para os quais se tem tal informação; na ZH de Currais Novos 1 dos 6 municípios (São Tomé com a taxa de 103,04); na ZH das Serras Centrais 6 dos 7 municípios que a constituem: Campo Grande (123,29), Cerro Corá (112,43), Florânia (112,43), Jucurutu (161,51), Lagoa Nova (109,54) e São Vicente (113,51). Vale o destaque para o fato de que o município de Jucurutu registrou em 1991 uma taxa de mortalidade infantil um pouco menor do que a média dos municípios da Zona Homogênea de Caicó, no início dos anos 70. No que se refere à mortalidade infantil, a situação dos municípios é muito heterogênea, tanto em relação à base da qual se partiu, em 1970, como no que se refere à intensidade com a qual foram realizados esforços para reduzir os altos níveis de mortalidade da população de menos de um ano de idade. Mais uma vez os municípios das Serras Centrais se destacam pelos baixos níveis das condições de vida de sua população. Embora não se possa atribuir somente às condições de saneamento básico os níveis altos atuais de mortalidade, inclusive infantil, é evidente que tais condições têm influência marcante, neste particular. Na parte do plano dedicada às condições de habitação e de saneamento da população, esta questão será abordada com maior nível de detalhe. No entanto, algumas referências devem ser feitas aqui a respeito das condições de abastecimento de água e da presença de instalações sanitárias. Os levantamentos realizados pelo censo demográfico para 1991, último dado que se tem a respeito, no nível dos municípios, revelam que, nos domicílios urbanos de parte relevante das localidades, é muito reduzido o percentual com abastecimento e instalações consideradas adequadas. Na verdade, em 1991, dos 25 municípios para os quais se tinha uma avaliação das condições de abastecimento de água, referidos aos domicílios urbanos, cerca de 11 registravam que menos da metade das habitações não possuíam abastecimento de água adequado. Municípios como Campo Grande (21,8%), Cerro Corá (26,8%), Lagoa Nova (8,7%) não alcançavam a cifra de 30% de domicílios urbanos com condições adequadas. Cifras similares eram encontradas em relação às instalações sanitárias. Cerca de 9 dos 21 municípios que apresentavam informações a respeito das instalações sanitárias, registravam percentuais correspondentes a menos da metade dos domicílios com condições consideradas adequadas. É bem verdade que relativamente às décadas anteriores houve avanços, tanto no que se refere ao abastecimento de água quanto à existência de instalações sanitárias adequadas. No entanto, os níveis são, para grande parte dos municípios, muito baixos. 243 3.5.5.3 A Saúde na Perspectiva da População A análise que segue foi construída a partir dos seminários realizados em todos os municípios do Seridó, com as suas lideranças mais representativas, quer da perspectiva política, quer religiosa, econômica e administrativa. Tais seminários contaram com a participação de prefeitos, líderes religiosos (católicos e evangélicos), professores, dirigentes de organizações não-governamentais e de órgãos públicos com atuação nos respectivos municípios. Nos seminários foram discutidos os grandes problemas dos municípios, examinadas suas potencialidades e possibilidades de soluções e pensados cenários ou futuros desejados para cada município. Na parte que segue, retiraram-se das discussões os temas específicos relacionados às condições de saúde da população e aos serviços prestados. Entre os problemas mais referidos nos seminários municipais, consideram-se situados entre os mais relevantes os especificados a seguir. • Déficit no atendimento da população: instalações físicas. Há um claro reconhecimento, por parte dos representantes dos vários segmentos sociais, que participaram dos encontros referidos, da existência de uma reduzida cobertura dos serviços de saúde, relativamente às necessidades básicos da população da região. Isto toma diferentes formas, cabendo referir-se, em particular, a reduzida capacidade dos hospitais, aos quais a população tem acesso, bem como a ausência ou reduzida capacidade de atendimento dos postos de saúde existentes na região. É importante destacar que, a exemplo do que ocorre com os serviços de educação, o déficit maior é encontrado junto à população rural. Sobretudo quando se faz referência a este último tipo de instalação, há uma qualificação a respeito, no sentido de se ressaltar a reduzida cobertura da demanda de saúde da população no meio rural. Por vezes, as referências dizem respeito não apenas à inexistência de hospitais ou postos de saúde, mas, mesmo quando eles existem, a menção é feita à sua reduzida capacidade – dada a disponibilidade de pessoal total, pessoal especializado ou instalações – de atender na quantidade e na especificidade desejada as necessidades básicas da população na área da saúde. • Déficit no atendimento: equipamento e pessoal especializado. A reduzida cobertura se traduz, também, na carência não só de instalações físicas mas de equipamentos nos hospitais e postos de saúde, o que estaria a exigir um processo cuidadoso de diversificação dos serviços prestados, sem que isto implicasse, para o conjunto da região uma duplicação de esforços ou superposição de serviços. Além da falta de equipamento nos hospitais e postos existentes, há repetidas referências à necessidade de pessoal especializado e suficientemente informado, de modo a garantir o atendimento bastante mais diversificado do que o presentemente oferecido, a partir dos hospitais e postos, caracterizados, segundo a manifestação das lideranças locais, pelo atendimento bastante limitado. Neste particular, ao lado, por exemplo, da precariedade do atendimento médico, há uma manifestação muito presente, nas reuniões, relacionada à precariedade do atendimento odontológico. Isto chama a atenção para o tema da qualidade dos serviços, ao qual deve acrescentar-se a questão da formação e do permanente aperfeiçoamento dos médicos e outros profissionais das áreas de saúde. 244 • Déficit no atendimento: médicos residentes. A reivindicação da presença de médicos residentes na comunidade traduz, certamente, a insegurança da população diante da ocorrência de doenças entre os membros da família. Além disso, tal referência torna clara a exigência de uma presença permanente nos municípios de serviços de atendimento à saúde, aos quais a população possa ter acesso, tanto nas emergência como em outras situações, sem ter que se deslocar para centros urbanos de maior porte, inclusive incorrendo em maiores custos para obter o atendimento médico necessário. Associada a esta solicitação, surgem com freqüência referências à presença considerada da maior relevância do médico de família, ao qual a população possa se dirigir e que possa, numa primeira triagem, orientar os pacientes e seus familiares para o atendimento que considere necessário em cada caso. Isto não só poderia eliminar deslocamentos desnecessários de pessoas que procuram os serviços de saúde, com a redução dos custos que incidem sobre a população que na ausência deste tipo de consulta se desloca desnecessariamente para centros de saúde especializados, como a redução de custos, também, da própria rede de atendimento, uma vez que muitos dos casos poderiam ser resolvidos através de uma consulta aos referidos médicos. • Necessidade de políticas preventivas, de vigilância sanitária e de campanhas de saúde. Tais reivindicações da população de vários municípios do Seridó, referem-se, em síntese, à ausência de políticas mais gerais e permanentes de saúde, por parte dos municípios, no sentido não só de desenvolvimento de ações preventivas que consigam a cobertura de toda a população, reduzindo a incidência de determinadas doenças, por meio da vacinação ou mudança de hábito ou comportamento, mas no sentido de uma ação permanente, neste particular, que reduza a possibilidade de risco à incidência de determinadas enfermidades. Foram feitas referência, por exemplo, ao combate ao barbeiro, à vigilância junto ao mercado de alimentos e matadouros, a uma ação mais eficaz dos poderes públicos e da sociedade quanto ao destino e tratamento do lixo, quanto ao problema da qualidade da água consumida, ao esclarecimento permanente da população em geral e da população de determinadas faixas etárias quanto à gravidez precoce, ao uso de drogas e ao alcoolismo e relativamente a hábitos de higiene e a incidência de doenças da pele ou à incidência de câncer. • Ausência ou deficiência de transportes e ambulância. Se, de um lado, a cobertura dos serviços, em termos espaciais, é precária, a população de alguns municípios do Seridó, sobretudo os de pequeno porte, faz referências freqüentes à ausência ou deficiência do sistema de transportes, o que torna mais difícil, ainda, o acesso aos serviços. Neste particular, a inexistência de ambulância ou, quando ela existe, as precárias condições de manutenção ou a irregularidade dos serviços, distanciam a população local do atendimento de saúde, sobretudo a rural e de nível de renda mais baixa. • Necessidade de apoio aos agentes de saúde e regularização de sua situação funcional. A presença dos agentes de saúde é tida, em alguns municípios como uma grande potencialidade para a melhoria das condições de vida da população. No entanto, devem ser referidas as observações feitas, em algumas ocasiões, a respeito da necessidade de existência de uma estrutura de apoio aos referidos agentes no sentido de que possam desempenhar com maior eficácia sua função de atendimento, de vigilância e de orientação da população, notadamente a de baixa renda e dos bairros mais pobres. Além disso, é importante considerar a necessidade de regulamentação ou legalização da sua situação, de modo que os trabalhos possam ser melhor desenvolvidos. 245 Por trás dessas considerações, está a concepção de que, não obstante o papel estratégico que tais agentes vêm desenvolvendo em várias experiências municipais, de grande sucesso na melhoria dos indicadores sociais, torna-se necessário não só um treinamento permanente dos agentes mas, sobretudo, uma supervisão do seu trabalho, visando orientá-los na busca de soluções para determinadas situações que fogem da norma da sua atuação diária. Sem essa estrutura de apoio, constituída por profissionais mais especializados e experientes, a importância do trabalho dos agentes se reduz significativamente. • Farmácia básica. A ausência ou precariedade do apoio na disponibilidade de remédios ou de farmácias básicas nos municípios, junto à população carente e de menor nível de renda, constitui outra reivindicação da população muito presente nos seminários que ocorreram nos municípios do Seridó, visando a montagem do Plano de Desenvolvimento Sustentável da Região. Tal solicitação está associada ao fato de que não são encontrados, nas localidades, os medicamentos indicados pelos médicos, ou, ainda, parte significativa da população atendida, dado o seu baixo nível de renda, não ter possibilidade de acesso aos remédios indicados. Torna-se relevante, portanto, que os governos dos municípios e o Governo Estadual, ou ambos, conjuntamente, adotem formas de atendimento que preencham esta lacuna. • Atuação deficiente das instituições relacionadas com a saúde. Muitas referências foram feitas às instituições que tratam da questão da saúde, notadamente os órgãos públicos (governos municipais e governo estadual) e os Conselhos de Saúde. Neste particular, no que se refere aos primeiros, há o reconhecimento, em repetidas vezes, da ausência de políticas claras de saúde, notadamente no que se refere à medicina preventiva nas suas várias dimensões. Além disso, ainda em relação aos órgãos públicos, é importante o destaque para a falta de articulação ou entrosamento, não só em relação aos programas no âmbito de cada um deles, mas a uma ação integrada que envolvam as secretarias de saúde municipais das diferentes prefeituras e destas com a Secretaria de Saúde do Estado. Há, ainda, a registrar, a cobrança de funcionamento do consórcio de saúde formalmente implantado entre alguns municípios da região, que pode ser um caminho relevante na instalação da infra-estrutura e dos serviços de saúde e sua distribuição racional por todo o território do Seridó, mas que até o presente não teve efetivo encaminhamento. Uma segunda cobrança feita nas reuniões nos municípios diz respeito à necessidade de atuação mais agressiva e vigilante dos Conselhos de Saúde, no sentido de avaliar a execução de programas em sua área específica e de fiscalização dos recursos aplicados. Este aspecto institucional, que envolve não só a presença, a articulação e integração mais efetiva de programas adequados de saúde na região, mas, igualmente, uma articulação e integração, também, entre as diferentes entidades públicas e privadas – definindo entre elas uma divisão de trabalho que estabeleça uma racional abrangência territorial dos serviços prestados – é um ponto relevante a ser considerado numa estratégia de desenvolvimento sustentável, sobretudo levando-se em conta a experiência de sucesso dos consórcios municipais em vários estados brasileiros. É evidente que um processo de melhoria das condições de saúde da população não se limita aos programas específicos de saúde, sejam os voltados para a medicina preventiva ou curativa. A saúde da população exige uma renda mínima capaz de adquirir os bens e serviços básicos, uma infra-estrutura de abastecimento de água tratada e de instalações sanitárias adequadas no interior dos domicílios e fora deles, além de informações e um nível educacional que permitam à população conhecer os meios e as condições através das quais possa, nos limites estabelecidos pelo ambiente e pela estrutura econômica e social em que se situa, viver de modo saudável. 246 Do que foi considerado neste e nas outras partes do Diagnóstico sobre a população do Seridó, ficaram claros os limites que vários aspectos estabeleceram para a melhoria dos indicadores de saúde da população. Tais limites vão desde o nível de renda da população e de grande parte dele com renda insuficiente, de acordo com os padrões estabelecidos, aos níveis de instrução caracterizados pelo reduzido número de anos de estudo, em média, da população adulta e, ainda neste particular, da presença marcante do analfabetismo. Além disso, é importante considerar os níveis de desemprego e subemprego existentes na região, sobretudo a partir da ausência de atividades econômicas que, durante anos, constituíram a base produtiva do Seridó, notadamente o algodão e a mineração. Finalmente, os limites impostos pelos déficits e carências dos serviços de saúde, que foram assinalados pela população do Seridó, mostram os elementos adicionais que são responsáveis pelos níveis atuais dos indicadores sociais, relativos às condições de saúde. A distribuição espacial dessas unidades, segundo Zonas Homogêneas e municípios, pode ser observada na tabela 3.5.5.2, elaborada com base nas informações constantes do Anuário Estatístico do Rio Grande do Norte. Observa-se ali que 9 das unidades existentes no Seridó estão na ZH de Currais Novos, 13 na de Caicó (das quais cerca de 4 no município de Caicó) e o restante, 8 unidades, nas Serras Centrais. Como pode ser observado pela tabela 3.5.5.3, predominam no Seridó e nas suas Zonas Homogêneas, as unidades privadas, com exceção das Serras Centrais. Como as unidades hospitalares são de tamanho diferente, é importante considerar alguns aspectos que permitam conhecer a dimensão da oferta de serviços. Neste particular, a consideração dos leitos de hospitais disponíveis no Seridó pode ajudar na compreensão dos serviços disponíveis para a população. Isto na suposição de que a existência de leitos significa a presença, também, de todo o aparato de instalações, equipamentos e pessoal especializado no atendimento. Um primeiro aspecto a ser considerado a partir da tabela 3.5.5.3 é que no Seridó estão instalados, nas suas unidades hospitalares, cerca de 933 leitos destinados às mais diferentes especialidades clínicas. Isto representa aproximadamente 12,6% do todos os leitos deste tipo no Estado. A maior concentração de tais leitos, tanto no Seridó como no Rio Grande do Norte, é em clínica e obstetrícia. Marcam, também, presença no Seridó os leitos vinculados à pediatria. 3.5.5.4 A Oferta dos Serviços de Saúde no Seridó Dos 191 hospitais da rede hospitalar do SUS, existentes no Estado do Rio Grande do Norte, cerca de 30 estavam no Seridó, em 1997. Destes, 13 eram públicos e 17 privados, não existindo nenhum universitário. A rede regional, portanto, representava, aproximadamente, 15,7% das unidades existentes no Estado. 247 TABELA 3.5.5.2 RIO GRANDE DO NORTE E SERIDÓ: REDE HOSPITALAR DO SUS – 1997 HOSPITAIS ESTADO, SERIDÓ, ZH E MUNICÍPIOS TOTAL PÚBLICO PRIVADO UNIVERSITÁRIO ESTADO Seridó Currais Novos Acari Carnaúba dos Dantas Currais Novos Equador Parelhas São Tomé Caicó Caicó Cruzeta Ipueira Jardim de Piranhas Jardim do Seridó Ouro Branco Santana do Seridó São Fernando São João do Sabugi São José do Seridó Serra Negra do Norte Timbaúba dos Batistas Serras Centrais Campo Grande Cerro Corá Florânia Jucurutu Lagoa Nova Santana do Matos São Vicente 191 117 70 30 9 2 1 1 2 2 1 13 4 1 13 4 1 17 5 1 1 1 1 1 1 1 1 2 1 5 1 4 1 1 8 3 1 1 1 1 1 1 1 1 8 2 1 1 1 1 1 1 1 4 1 1 4 1 1 1 2 1 1 1 1 FONTE DOS DADOS BÁSICOS: Idema. Anuário Estatístico do Rio Grande do Norte, 1998. No que se refere às Zonas Homogêneas, a grande concentração dos leitos ocorre na ZH de Caicó, com pouco mais da metade (51%) dos leitos de hospitais da região, sendo que parte relevante está situada no município de Caicó (337 leito dos 476 existentes na ZH). Em seguida, deve-se registrar a Zona Homogênea de Currais Novos, com 32% do total dos leitos do Seridó, e as Serras Centrais, com apenas 16,4% dos leitos. É suficiente considerar que em 1996, a participação dessas Zonas Homogêneas, no total da população, era de 31,9%, para Currais Novos (com 32% dos leitos), de 39% para Caicó (com 51% dos leitos) e de 29% para as Serras Centrais (com 15,4% dos leitos), para se ter uma idéia da distribuição desigual dos leitos hospitalares no interior do Seridó, notadamente em relação a esta última Zona Homogênea, que, em praticamente, todos os indicadores sociais se destaca pela pior situação da sua população, relativamente às demais Zonas Homogêneas e à própria média estadual. De fato, dividindo-se o número de leitos (de 1997) pela população do Seridó e de suas Zonas Homogêneas (em 1996), considerando-se a relação de leitos para 1.000 pessoas, obtêm-se, como média 248 para o Seridó, aproximadamente 3,3 leitos por 1.000 habitantes. No caso da Zona Homogênea de Currais Novos, a relação era, também, de 3,3 e para a ZH de Caicó, em melhor situação, a relação era de 4,2 leitos por 1.000 habitantes. A pior situação, neste particular, é a das Serras Centrais: de 1,9 leito por 1.000 habitantes. É de se esperar que diferenças similares sejam observadas entre as Zonas Homogêneas do Seridó, no que se refere a outros recursos médicos, sejam materiais, sejam recursos humanos. Para que se tenha uma idéia da situação do Seridó, neste caso, relativamente ao Estado, é importante assinalar, a partir dos mesmos dados, que a relação leitos por 1.000 habitantes era de 2,9, menor do que a média da região, no entanto, bem maior do que a média encontrada na Zona Homogênea das Serras Centrais. Outra informação valiosa para se conhecer o sistema de saúde no Estado e no Seridó, em particular, é a constituída pela distribuição dos postos e centros de saúde e das policlínicas e postos de assistência médica. Neste particular, de acordo com a tabela 3.5.5.4, estavam instalados, em 1995, no Seridó, cerca de 17 postos e centros de saúde, além de policlínicas e postos de assistência médica, de um total de 801 existentes no Estado, ou seja, 21,8%. Os postos de saúde representavam, do total dessas unidades, cerca de 78,3%, ou seja, a maior parte delas. As informações mostram, a exemplo do que ocorre com as unidades hospitalares do SUS e com os leitos disponíveis nos hospitais, uma desigual distribuição territorial dos postos, centros e policlínicas. Em municípios das Serras Centrais, Zona Homogênea que registra 43 unidades – sendo 38 postos de saúde, 5 centros de saúde e nenhuma policlínica ou posto de assistência médica – há municípios que não possuem nenhuma dessas instituições, de acordo com o Anuário Estatístico de 1995. Trata-se dos municípios de Bodó, Campo Grande, Tenente Laurentino Cruz e Triunfo Potiguar. É verdade que para o exame mais detido da distribuição das instalações e equipamentos de saúde da região, da perspectiva de uma utilização racional que permitisse o máximo de cobertura da população neste particular, é necessário considerar todas as unidades em conjunto. No entanto as informações revelam indício de ausência de cobertura dos serviços de saúde, o que é de certo modo confirmado pelas avaliações feitas pelas lideranças consultadas durante os seminários ocorridos, sobretudo nos municípios de pequeno porte e criados mais recentemente e naqueles que registram grande parte da sua população residente no meio rural. Convém salientar alguns aspectos da cobertura de vacinas em relação à população infantil no Seridó. Os dados mais recentes, neste particular, referem-se ao ano de 1997, e se relacionam com a vacinação de Sabin, Tríplice, Anti-sarampo e BCG. Os dados coletados para o Anuário Estatístico apresentam, além do levantamento da população de menos de um ano vacinada, a população que se constituía o público alvo do programa de cobertura das campanhas de vacinação. As informações estão apresentadas na tabela 3.5.5.5. A relação entre o público–alvo, definido pelos responsáveis pelas campanhas de vacinação, e o contingente efetivamente vacinado, mostra que houve completa cobertura no Estado, no que se refere à BCG. Relativamente à Sabin, a cobertura teria sido de 75,5%, a da Tríplice de cerca de 77,7% e a da Anti-sarampo, de aproximadamente 95%. 249 TABELA 3.5.5.3 RIO GRANDE DO NORTE E SERIDÓ: LEITOS HOSPITALARES, SEGUNDO ESPECIALIDADES CLÍNICAS. 1997 ESTADO, SERIDÓ, ZH E MUNICÍPIOS ESTADO Seridó Currais Novos Acari Carnaúba dos Dantas Currais Novos Equador Parelhas São Tomé Caicó Caicó Cruzeta Ipueira Jardim de Piranhas Jardim do Seridó Ouro Branco Santana do Seridó São Fernando São João do Sabugi São José do Seridó Serra Negra do Norte Timbaúba dos Batistas Serras Centrais Campo Grande Cerro Corá Florânia Jucurutu Lagoa Nova Santana do Matos São Vicente TOTAL LEITOS – ESPECIALIDADES CLÍNICAS CLÍNI- OBSTE- PEDIAPSIQUIA- TISIOLOCA TRÍCIA TRIA TRIA GIA CIRURGIA OUTROS 7.393 1.268 1.934 1.530 1.249 1.300 35 933 304 68 10 126 34 37 29 476 337 22 146 49 4 307 84 18 4 38 10 7 7 160 108 9 217 79 5 3 30 10 16 15 99 64 4 182 84 33 3 30 8 5 5 76 47 4 73 8 8 8 17 28 12 12 3 8 2 5 10 5 4 4 8 3 3 5 2 4 3 2 3 29 2 2 2 16 6 4 6 3 63 10 5 11 20 3 4 4 2 39 7 4 5 6 2 4 3 2 22 2 2 4 7 14 3 14 3 7 11 12 15 10 153 21 13 22 49 42 6 28 6 9 2 68 46 4 7 73 72 1 FONTE DOS DADOS BÁSICOS: Idema. Anuário Estatístico do Rio Grande do Norte, 1998. 250 77 TABELA 3.5.5.4 RIO GRANDE DO NORTE E SERIDÓ: POSTOS, CENTROS DE SAÚDE, POLICLÍNICAS E POSTOS DE ASSISTÊNCIA MÉDICA – 1995 ESTADO, SERIDÓ, ZH E MUNICÍPIOS TOTAL POSTOS, CENTROS DE SAÚDE E POLICLINICAS POSTOS CENTROS POLICLÍNICA OU POSTO DE ASSISTÊNCIA MÉDICA ESTADO 801 562 217 22 Seridó Currais Novos Acari Carnaúba dos Dantas Currais Novos Equador Parelhas São Tomé Caicó Caicó Cruzeta Ipueira Jardim de Piranhas Jardim do Seridó Ouro Branco Santana do Seridó São Fernando São João do Sabugi São José do Seridó Serra Negra do Norte Timbaúba dos Batistas Serras Centrais Bodó Campo Grande Cerro Corá Florânia Jucurutu Lagoa Nova Santana do Matos São Vicente Tenente Laurentino Cruz Triunfo Potiguar 175 56 13 8 13 2 14 6 76 24 8 3 10 6 2 2 4 2 4 9 2 43 137 44 12 6 7 2 12 5 55 16 7 2 6 5 1 2 3 1 3 8 1 38 31 9 1 1 4 7 3 3 17 7 2 8 6 3 16 6 8 5 2 1 17 7 1 1 1 1 1 1 2 4 1 3 1 1 1 1 1 5 1 1 2 1 FONTE DOS DADOS BÁSICOS: Idema. Anuário Estatístico do Rio Grande do Norte, 1998. No que se refere ao Seridó, a cobertura regional se aproxima da constatada para o Rio Grande do Norte, em seu conjunto. A vacinação alcançou o público–alvo, no tocante à BCG e à Anti-sarampo. No entanto, no que se refere à Sabin, seu alcance foi de 81%; e com relação à tríplice, de 88,7%, superando, em ambos os casos, os valores médios, já assinalados, encontrados para o Estado, em 1997. Descendo ao caso das Zonas Homogêneas, o que se constata é uma bem maior cobertura na ZH de Currais Novos e de Caicó, relativamente ao conjunto dos municípios das Serras Centrais. Na ZH de Currais Novos ocorreu a plena cobertura em todas as demais vacinas, e cerca de 92,5%, no que se 251 refere à Sabin. Na de Caicó, registrou-se a cobertura no que se refere à BCG e à Anti-sarampo, e a abrangência de 90,5% da população–alvo no que se refere à Sabin, e cerca de 98,8% para a Tríplice. Mais uma vez, a situação da Zona Homogênea das Serras Centrais difere das demais Zonas Homogêneas, da média do Seridó e da média do Rio Grande do Norte. Em nenhuma das vacinas assinaladas, ocorreu a plena cobertura, relativamente à população–alvo. No que se refere à Sabin, somente 58%, à Tríplice (63,1%), à Anti-sarampo (67,1%) e à BCG (84,8%). Pode-se dizer, num espaço pequeno constituído pelas Zonas Homogêneas ou os municípios que a compõem, que é possível a vacinação fora dos limites das zonas ou fora dos limites municipais. No entanto os déficits de cobertura são muito grandes, o que sugere deficiências muito importantes na estrutura responsável pela medicina preventiva no Seridó, em particular nas Serras Centrais. Vale lembrar que é nessa parte da região que estão os municípios com maior proporção da população rural, nos quais os indicadores de longevidade são os mais precários e os níveis educacionais os piores. 3.5.5.5 Problemas, Potencialidades e Aspectos do Futuro Desejado Resumindo o que foi assinalado anteriormente, tanto no que se refere à análise dos indicadores secundários como das informações obtidas diretamente das discussões com as lideranças e representantes de segmentos da sociedade organizada de todos os municípios da região, os problemas mais relevantes podem ser especificados na forma a seguir. • Não obstante os avanços ocorridos na evolução dos indicadores mais convencionais, sobre as condições de saúde, notadamente aqueles vinculados à longevidade da população (esperança de vida ao nascer e taxa de mortalidade infantil), os indicadores mostram a presença, ainda, de condições de vida e de saúde muito precárias, seja na média da região, geralmente muito próxima da situação do Estado, e, sobretudo, na concentração representada pelos municípios das Serras Centrais. • Tais condições estão, evidentemente, associadas a uma multiplicidade de fatores: à insuficiência de renda de parte relevante do Seridó, à presença marcante do desemprego e subemprego e às condições de infra-estrutura de saneamento básico, às condições educacionais da população e, sobretudo, às deficiências do sistema de saúde, na produção dos serviços de medicina preventiva e curativa. Mais do que isto, pesam a falta de cobertura e a ineficiência na gestão dos recursos destinados ao SUS. • Com relação aos serviços, os dados mostram relativamente a alguns municípios em todas as Zonas Homogêneas e, principalmente, na quase totalidade dos municípios das Serras Centrais, as deficiências de cobertura no que se refere à medicina preventiva, em particular na vacinação de menores de um ano de idade, em aspectos que são estratégicos para a diminuição das altas taxas de mortalidade infantil em todo o mundo. • Essas deficiências se traduzem, também, em aspectos mais estritamente ligados à medicina curativa: i. déficit no atendimento relacionado à precariedade das instalações físicas, relativamente à demanda e necessidades da população; ii. déficit relacionado aos equipamentos do sistema de saúde e ao pessoal especializado; 252 iii. deficiência no atendimento à demanda e às necessidade da população, em relação à presença de médicos residentes ou de médicos da família no sistema de saúde; iv. deficiências marcantes no sistema de transporte dos doentes ou de ambulâncias, notadamente nos municípios menores e em relação ao meio rural; v. ausência de farmácias básicas e de disponibilidade local de remédios considerados essenciais para a população da região. • Ausência de política preventiva de saúde, por parte das entidades estaduais e sobretudo locais; • Reduzido apoio técnico e institucional aos agentes de saúde que desempenham papel da maior relevância no sistema de saúde local; e • Atuação desarticulada das entidades públicas que atuam na área da saúde e atuação passiva dos Conselhos de Saúde dos municípios na cobrança e fiscalização dos programas de saúde municipais. As potencialidades mais relevantes vão especificadas a seguir. • A melhoria das condições de saúde da população, notadamente os avanços que, comparativamente aos anos 70, ocorreram nos indicadores de longevidade, embora seus valores sugiram condições muito precárias, ainda, de saúde, comparativamente aos padrões nacionais e, sobretudo, internacionais. Isso sugere a presença de meios que, não obstante os problemas econômicos da região, têm permitido progresso, neste particular. • A crescente organização da sociedade e as possibilidades que isto pode representar para o exercício maior sobre as ações governamentais, referentes ou não à saúde. • As possibilidades concretas que podem surgir a partir dos consórcios de saúde, que já começam a ser discutidos no Seridó, seguindo exemplo de experiências de sucesso em outras partes do País, a partir das quais podem ser introduzidos processos racionais e eficazes de utilização dos recursos disponíveis, com uma divisão de trabalho e de funções dos municípios consorciados, na gestão da questão da saúde na região. Não estão disponíveis, até o presente, informações mais detalhadas e articuladas que permitam formular os traços mais marcantes de um cenário ou futuro desejado para a população, no que se refere particularmente à saúde. As afirmações mais freqüentes a respeito destacam a aspiração da população quanto à existência de um serviço universal de saúde, tanto no que se refere aos aspectos preventivos quanto curativos, e, sobretudo de meios que permitam a redução das altas taxas de mortalidade infantil. Há uma demanda freqüente, também, relativamente à qualidade dos serviços de saúde, ao lado da demanda mais relacionada à sua maior abrangência, em termos quantitativos. A questão da articulação dos governos municipais com o governo estadual, no que se refere à saúde, bem como a dos governos municipais, e, no seu interior, entre os programas complementares (saúde e educação, por exemplo) são parte integrante de um cenário desejado, expresso nas discussões com as lideranças municipais. 253 TABELA 3.5.4.5 II.RIO GRANDE DO NORTE E SERIDÓ: MENORES DE 1 ANO IMUNIZADOS – 1997 ESTADO, SERIDÓ, ZH E MUNICÍPIOS ESTADO Seridó Currais Novos Acari Carnaúba dos Dantas Currais Novos Equador Parelhas São Tomé Caicó Caicó Cruzeta Ipueira Jardim de Piranhas Jardim do Seridó Ouro Branco Santana do Seridó São Fernando São João do Sabugi São José do Seridó Serra Negra do Norte Timbaúba dos Batistas Serras Centrais Bodó Campo Grande Cerro Corá Florânia Jucurutu Lagoa Nova Santana do Matos São Vicente Tenente Laurentino Cruz Triunfo Potiguar POPULAÇÃOALVO MENORES DE 1 ANO IMUNIZADOS VACINA VACINA VACINA ANTISABIN TRÍPLICE SARAMPO. VACINA BCG 55.560 41.942 43.185 52.802 56.921 5.517 1.791 201 128 775 121 340 226 1.993 884 150 25 210 212 61 38 68 95 72 139 39 1.733 56 170 242 145 362 271 238 101 67 81 4.467 1.657 193 108 672 135 323 226 1.804 724 165 31 183 191 69 41 91 76 84 112 37 1.006 20 79 95 116 195 103 241 81 55 21 4.898 1.835 226 100 776 162 356 215 1.970 914 135 29 204 195 66 43 81 74 84 91 54 1.093 19 96 118 146 223 79 242 77 73 20 7.200 3.987 229 106 2.859 215 349 229 2.050 1.010 141 22 240 177 60 40 84 71 68 98 39 1.163 20 84 153 145 230 175 199 77 76 4 6.116 2.323 230 88 1.049 137 557 262 2.324 1.520 166 12 130 216 49 24 43 34 26 86 18 1.469 47 215 87 221 317 198 249 100 35 FONTE DOS DADOS BÁSICOS: Idema. Anuário Estatístico do Rio Grande do Norte, 1998. 3.5.6 Condições de Habitação e de Saneamento Básico no Seridó As considerações que se seguem dizem respeito às condições de vida da população do Seridó, sobre a disponibilidade de saneamento básico e outros aspectos vinculados à habitação. As condições de saneamento básico e de habitação da população, não obstante a maior dificuldade da análise, dada a pouca disponibilidade de informações confiáveis e atualizadas para os municípios, são similares às condições médias do Estado, o que significa que são insatisfatórias em 254 seus diferentes aspectos. Além disso, a exemplo do que ocorre em relação aos demais indicadores, é importante, desde logo, destacar as diferenças de situações vigentes no interior do Seridó, notadamente quando se levam em conta as Zonas Homogêneas e os municípios individualmente. A análise que se faz a seguir está centrada nas questões cruciais para as condições de vida da população, que são as do abastecimento de água e disponibilidade de instalações sanitárias, nos domicílios situados nos municípios da região. Nesta análise, são consideradas as informações secundárias, retiradas de fontes oficiais, e as informações provenientes das discussões realizadas no processo de elaboração do Plano de Desenvolvimento Sustentável do Seridó, junto às lideranças locais, em seminários ocorridos em todos os municípios da região. No final do trabalho, resumem-se os problemas cruciais relativos ao saneamento básico e outras condições de habitação no Seridó, assim como as potencialidades da região, no sentido de superar os problemas aproveitando as condições favoráveis disponíveis a este respeito. 3.5.6.1 Condições Atuais dos Domicílios Como se fez referência anteriormente, as informações disponíveis, comparativamente à maioria dos segmentos que constituem a Dimensão Social na região, são precárias. Isto faz com que se façam inferências a partir de uma base de indicadores que não permitem um avanço mais compreensivo na questão, notadamente no que se refere à parte da análise fundamentada nos dados secundários. a. Abastecimento de Água Começando pelo abastecimento de água no Seridó, as informações mais recentes referem-se ao início dos anos 90, a respeito das condições dos domicílios, e às relativas aos serviços de abastecimento de água a data mais recente. No que se refere às condições de domicílios, as informações para 1991 oferecem uma idéia das habitações em alguns municípios e nas Zonas Homogêneas do Seridó, relativamente à disponibilidade de água. O que se observa é, mais uma vez, as diferenças marcantes entre os municípios da região, com os municípios das Serras Centrais apresentando os piores indicadores, neste particular. Começando pelo abastecimento de água, o que se percebe é que a situação dos domicílios do Seridó é similar à situação média do Estado. De fato, cerca de 64% da população residia em domicílios que possuíam abastecimento considerado adequado, percentual próximo aos 65,1% do total da Estado. É importante destacar que esta média para o Seridó é muito influenciada pela situação das duas Zonas Homogêneas nas quais se localizam os dois maiores municípios do Seridó: Currais Novos e Caicó. É importante destacar que se está tratando de domicílios urbanos. 98 São, portanto, marcantes as diferenças entre os municípios das diferentes Zonas Homogêneas do Seridó. Enquanto aproximadamente 71,7% da população dos municípios da Zona Homogênea de Currais Novos vivem em domicílios com abastecimento adequado, na ZH de Caicó este percentual é de 98 O Atlas de Desenvolvimento Humano, já referido, define abastecimento adequado de água como: “Percentual da população urbana que vive em domicílios com condição adequada de abastecimento de água. Considera-se adequado o abastecimento através da rede geral, com canalização interna ou através de poço ou nascente com canalização interna.” 255 71,9%. Neste particular, apenas 32,7% da população das Serras Centrais vive em domicílios urbanos que apresentam condições adequadas de abastecimento de água (tabela 3.5.6.1). Se tais percentuais, válidos para a população que vive nos domicílios urbanos, são considerados representativos do número de domicílios, os dados para 1991 mostram que existiriam, à época, cerca de 15 mil domicílios urbanos sem condições adequadas de abastecimento de água, nos termos definidos pelo Atlas de Desenvolvimento Humano do Brasil. Além disso, tal procedimento mostra que a parte significativa de tais domicílios urbanos se localiza nos municípios das Serras Centrais. Tal estimativa mostraria a presença de 4,3 mil domicílios urbanos na Zona de Currais Novos, 5,1 mil na de Caicó e 5,6 mil nas Serras Centrais. Mais uma vez, cabe a referência ao fato de que se está trabalhando com populações e domicílios urbanos, o que sugere que o déficit de abastecimento adequado nos domicílios municipais deve ser bem maior quando se leva em conta, além dos domicílios urbanos, aqueles localizados no meio rural. É de se esperar que tenha ocorrido melhoria, desde 1991 até o presente, nas condições de abastecimento de água dos domicílios urbanos. No entanto, a recente crise de oferta de água no Seridó pode ter anulado, em grande parte, tal avanço, eliminando as vantagens que as instalações de abastecimento de água domiciliar possam ter trazido para a melhoria da saúde da população. b. Instalações Sanitárias No que se refere às instalações de esgotos nos domicílios, em 1991, os dados são mais precários, e sugerem piores condições para a população do Seridó. A ausência de dados censitários em alguns municípios obrigou a uma estimativa da média das Zonas Homogêneas e da região, com uma base menor de dados do que a que fora feito para o abastecimento de água. Assim, no Seridó, em 1991, apenas 58,2% da população urbana morava em domicílios que possuíam instalações sanitárias consideradas adequadas. Esse percentual era, à época, um pouco maior do que o do Estado em seu conjunto (47,6%). 99 A comparação, neste particular, entre as Zonas Homogêneas mostra, em primeiro lugar, uma situação mais favorável para a de Caicó, que alcançou, neste caso, cerca de 71,7% da população vivendo em domicílios, cujo levantamento censitário considerou que possuíam condições adequadas de esgotamento sanitário. Esta situação difere da condição das demais zonas: a Zona Homogênea de Currais Novos registra que 57,8%, apenas, da população urbana morava em domicílios com instalações sanitárias adequadas e a das Serras Centrais com 30,8%, portanto, menos de 1/3 do total. Adotando-se o mesmo percentual da população servida por adequadas instalações sanitárias, para o número de domicílios urbanos existentes, percebe-se que o total de domicílios sem tal tipo de instalação alcançaria, em 1991, cerca de 16,7 mil domicílios, sendo que 6 mil se localizariam na Zona Homogênea de Currais Novos, 4,9 mil na de Caicó e cerca de 5,7 mil na Zona Homogênea das Serras Centrais. Nesta estimativa, como na anterior, relacionada ao abastecimento de água, não se está considerando o fato de que há, naquele ano, no meio rural, cerca de 21 mil domicílios (5 mil na Zona Homogênea de Currais Novos, 6,7 mil na de Caicó, 9,4 mil nas Serras Centrais), para os quais, é de 99 “Instalações adequadas de esgoto. Percentual da população que vive em domicílios com instalações adequadas de esgotos, ou seja, com instalações sanitárias não compartilhadas com outros domicílios e com escoamento através de fossa séptica ou rede geral de esgoto”. (Atlas de Desenvolvimento Humano do Brasil .) 256 esperar, as instalações sanitárias são mais precárias do que as encontradas nos domicílios das cidades e vilas. Isto, seguramente, elevaria, em muito, o déficit das habitações, no que se refere às condições adequadas de esgotamento sanitário. O que se assinalou anteriormente mostra a necessidade de desenvolvimento de ações tanto na melhoria do sistema de abastecimento de água quanto das instalações sanitárias, as quais, além de representar uma comodidade maior para as famílias residentes, constituem questões fundamentais para a melhoria da saúde e, em decorrência, dos indicadores de longevidade, entre os quais o de mortalidade infantil. TABELA 3.5.6.1 RIO GRANDE DO NORTE E SERIDÓ: SITUAÇÃO DOS DOMICÍLIOS URBANOS QUANTO AO ABASTECIMENTO E ESGOTOS – 1991 % DE INSTALAÇÕES ADEQUADAS ESTADO, SERIDÓ, ZH % DE DOMICÍLIOS COM DE E MUNICÍPIOS ABASTECIMENTO ADEQUADO DE ESGOTOS ÁGUA. ESTADO 65.1 47.6 Seridó Currais Novos Acari Carnaúba dos Dantas Currais Novos Equador Parelhas São Tomé Caicó Caicó Cruzeta Ipueira Jardim de Piranhas Jardim do Seridó Ouro Branco Santana do Seridó São Fernando São João do Sabugi São José do Seridó Serra Negra do Norte Timbaúba dos Batistas Serras Centrais Campo Grande Cerro Corá Florânia Jucurutu Lagoa Nova Santana do Matos São Vicente 64.0 71.7 71.4 59.0 79.1 38.7 75.8 47.6 71.9 77.0 73.9 69.5 36.0 79.6 67.6 97.0 65.6 52.1 79.3 76.2 38.5 32.7 21.8 26.8 44.4 37.4 8.7 43.5 36.2 58.2 57.8 15.0 FONTE DOS DADOS BÁSICOS: Pnud-Ipea-Ibge-FJP (1997)- Relatório de desenvolvimento humano do Brasil, 1997. 257 79.5 46.4 31.8 58.3 71.7 72.7 90.4 79.2 75.2 4.1 56.0 77.7 85.9 38.5 30.8 31.7 69.6 57.6 36.1 16.6 1.1 1.2 c. Densidade Populacional do Domicílio e Durabilidade do Material de Construção Outras características importantes podem ser consideradas, no exame das condições de habitação, a respeito dos domicílios existentes no Seridó. O Atlas de Desenvolvimento Humano do Brasil, já referido, produziu dois indicadores que merecem ser considerados. O da densidade do domicílio é um deles, medido pelo número de pessoas, segundo dormitórios disponíveis; outro indicador diz respeito à durabilidade do material de construção. O que interessa no primeiro é uma indicação de um provável número de pessoas vivendo no domicílio, maior do que poderia ser considerada recomendável. Outra diz respeito à natureza da construção da habitação, quando se pretende constatar um provável grau de improvisação ou de reduzida durabilidade da habitação construída. 100 A tabela 3.5.6.2 mostra os traços mais relevantes destes dois indicadores, assinalando, mais uma vez as diferenças internas existentes no Seridó, quando são comparadas as situações das populações dos municípios das Zonas Homogêneas. Quanto à densidade dos domicílios, o que os dados sugerem é que, em 1991, 30% das habitações apresentavam uma densidade por dormitório disponível superior a duas pessoas. Esse percentual, para o Seridó em seu conjunto e para a Zona Homogênea de Currais Novos e de Caicó, é menor do que o registrado para a média do Estado do Rio Grande do Norte. No entanto, a ocorrência de população vivendo em domicílios com densidade maior do que duas pessoas por dormitório existente é bem maior nos municípios das Serras Centrais, uma vez que, no ano referido, conforme tabela 3.5.5.2, alcança 39,2%. Em alguns municípios desta Zona Homogênea, como Campo Grande e Jucurutu, tal percentual alcançou nível igual ou superior a 45%. Para que se tenha uma idéia aproximada do número de domicílios nos quais há indício de alta densidade nos dormitórios disponíveis, aplicando-se o percentual acima referido sobre o número total de domicílios no Seridó e nas suas Zonas Homogêneas, pode-se estimar que haveria, em 1991, no Seridó, cerca de 19,2 mil habitações, nas quais a densidade dos dormitórios era superior a 2 pessoas. Deste total, cerca de 5,2 mil estavam na ZH de Currais Novos, 7,1 mil na de Caicó e 6,9 mil na Zona Homogênea das Serras Centrais. No que se refere à durabilidade do material de construção dos domicílios, a estimativa que se tem para 1991 é a de que cerca de 92% dos domicílios do Seridó estavam constituídos de material durável, nos termos da definição anteriormente apresentada. Este percentual era maior do que o apresentado pelo Estado do Rio Grande do Norte, em seu conjunto: 88,2%. Esse número é menor do que o apresentado pela Zona Homogênea de Currais Novos (93,7%) e de Caicó (95,7%). Cabe, mais uma vez, o destaque para os municípios das Serras Centrais. O percentual da população que reside em domicílios constituídos por material durável é de 84,8%. Merece destaque o município de Campo Grande que registra, neste particular, apenas 71,6%, ou seja, quase 1/3 dos domicílios existentes em 1991 foram construídos por material não durável. 100 Densidade: “Percentual da população que vive em domicílios com densidade superior a duas pessoas por dormitório. No cálculo da densidade do domicílio considera-se o número de dormitórios como sendo igual ao número total de cômodos menos dois (destinados, provavelmente, à cozinha e ao banheiro). Portanto, a densidade do domicílio é dada por Di = Ni/(Ci-2), onde Ni é o numero de pessoas do domicílio e Ci é o número de cômodos do domicílio.” Durabilidade: “Percentual da população que vive em domicílios duráveis, em que a cobertura e as paredes são construídas de materiais duráveis.” (Atlas de Desenvolvimento Humano do Brasil.) Há dificuldade de comparação entre os censos. 258 Adotando-se o mesmo procedimento anterior – admitindo o percentual das condições de habitação da população como válidos para as condições dos domicílios –, observa-se que, na data referida, haveria no Seridó cerca de 5 mil habitações construídas com material não durável, das quais mais da metade (2,7 mil) estariam localizadas nos municípios das Serras Centrais. A outra metade se distribuiria pelas ZH de Currais Novos (1,3 mil) e de Caicó (1,1 mil). d. Um Resumo Do que foi assinalado anteriormente, deve-se registrar a presença de um déficit ainda significativo na disponibilidade de água tratada e de boa qualidade nos domicílios do Seridó e, mais ainda, de um déficit no que se refere às instalações sanitárias das habitações, mesmo quando se consideram os domicílios urbanos, nos quais a qualidade desses serviços é maior. Assim, como se assinalou, em 1991, cerca de 64% dos domicílios urbanos tinham abastecimento de água considerado adequado e cerca de 58,2% possuíam instalações sanitárias adequadas. Isto significa que, no Seridó, no referido ano, havia cerca de 15 mil domicílios urbanos sem abastecimento de água adequado e aproximadamente 16,7 mil sem instalações sanitárias adequadas, nos termos da definição adotada pelo Pnud. Relativamente à densidade dos domicílios e à durabilidade do material de construção, a estimativa que se pode fazer para 1991 mostra que haveria cerca de 19,2 mil domicílios, para os quais são fortes os indícios de uma densidade por dormitório maior do que a que se poderia considerar adequada. Além disso, cerca de 5 mil habitações, dentre as existentes, teriam sido construídas com material não durável. 3.5.6.2 Evolução das Condições dos Domicílios A exemplo do que ocorre com a maioria dos indicadores sociais, aqueles relacionados com saneamento básico e com as condições de habitação, registram melhoria com o correr do ano, sobretudo quando se tem como referência o ano de 1970. Tal processo pode ser verificado relativamente às condições de abastecimento de água, de instalação sanitária e da densidade populacional dos domicílios, ou, ainda, no que se refere ao material (durável ou não) utilizado na construção das habitações. Se, de fato, ocorre melhoria nos indicadores, as condições são ainda precárias, pela presença de déficits no que se refere, por exemplo, ao abastecimento de água, à disponibilidade de instalações sanitárias e aos demais aspectos das habitações no Seridó. Na tabela 3.5.6.3 estão apresentados dados mais relevantes sobre os municípios e condições de abastecimento de água e de instalações sanitárias da população, para os anos de 1970, 1980 e 1991. Utilizaram-se os mesmos critérios antes apresentados para considerar a parcela da população que possuía abastecimento de água ou instalações sanitárias considerados adequados. Como se fez referência anteriormente, não estão disponíveis para todos os anos e para todos os municípios as informações a este respeito. Além disso, para alguns municípios, como São Vicente ou Lagoa Nova, por exemplo, as informações não são confiáveis, em razão de diferenças marcantes, quando se passa de um para outro ano, como ocorre com as instalações sanitárias, entre 1980 e 1991. No entanto, as informações disponíveis mostram, em geral, a ocorrência de melhoria dos indicadores, com o decorrer do tempo. 259 TABELA 3.5.6.2 RIO GRANDE DO NORTE E SERIDÓ: PARTICIPAÇÃO DA POPULAÇÃO SEGUNDO A DENSIDADE E O MATERIAL DE CONSTRUÇÃO DOS DOMICÍLIOS - 1991 ESTADO, SERIDÓ, ZH E MUNICÍPIOS DENSIDADE SUPERIOR A 2 PESSOAS POR DORMITÓRIO MATERIAIS DE CONSTRUÇÃO DURÁVEIS ESTADO 34.0 88.2 Seridó Currais Novos Acari Carnaúba dos Dantas Currais Novos Equador Parelhas São Tomé Caicó Caicó Cruzeta Ipueira Jardim de Piranhas Jardim do Seridó Ouro Branco Santana do Seridó São Fernando São João do Sabugi São José do Seridó Serra Negra do Norte Timbaúba dos Batistas Serras Centrais Campo Grande Cerro Corá Florânia Jucurutu Lagoa Nova Santana do Matos São Vicente 30.6 25.7 22.2 23.8 26.7 36.2 23.6 24.8 28.5 26.9 24.3 32.2 41.7 21.8 25.0 21.7 29.2 28.9 27.8 42.6 29.2 39.3 50.1 35.3 30.4 45.0 40.7 37.2 28.4 92.0 93.7 92.8 99.8 95.0 95.6 97.0 81.7 95.7 98.1 93.1 93.5 89.7 94.0 100.0 99.8 98.0 93.0 99.3 88.1 96.8 84.8 71.6 85.9 92.1 86.4 90.4 80.2 96.6 FONTE DOS DADOS BÁSICOS: Pnud-Ipea-Ibge-FJP (1997)- Relatório de desenvolvimento humano do Brasil, 1997. Este aspecto fica bem evidente quando se consideram, para ilustrar, os municípios de Currais Novos e Caicó, de maior porte no Seridó. Neste caso, são evidentes os avanços ocorridos tanto na abrangência de domicílios com abastecimento adequado ou com instalações sanitárias adequadas. Como se pode perceber pelos dados disponíveis, que não cobrem todos os municípios – daí a dificuldade para se estimar a média para a região e para as Zonas Homogêneas –, a melhoria das condições das habitações, neste particular, ocorrem, de modo similar, tanto no tocante ao abastecimento de água como na disponibilidade das instalações sanitárias. 260 Tudo indica, a partir da aceitação das informações disponíveis, que grande parte dos avanços no abastecimento de água e na disponibilidade de instalações sanitárias adequadas ocorreram entre 1980 e 1991. É de se esperar que tais avanços tenham continuado no decorrer dos anos 90. No que se refere aos outros aspectos das condições da habitação – densidade populacional e natureza do material de construção – repetem-se os avanços com o decorrer dos anos. Com uma maior cobertura de informações que os aspectos anteriormente considerados, os dados sobre a densidade de população por dormitório e sobre a durabilidade ou não do material de construção, revelam progressos ocorridos nas condições dos domicílios. No entanto, como já se fez referência, alguns indicadores (densidade superior a 2 pessoas por dormitórios) mostram a presença de um grande número de pessoas vivendo em condições inadequadas, ainda no último ano para o qual se dispõe de informação. Os dados mostram também que a melhoria generalizada ocorrida, neste particular, manteve diferenças marcantes de situações, com os municípios situados na Zona Homogênea das Serras Centrais registrando os piores indicadores. Isto sugere que para tais indicadores, como para os demais examinados, em vários segmentos da Dimensão Social, o tratamento que deve ser dado nas políticas e programas sociais deve ser diferenciado, no sentido de privilegiar os municípios que registram maior carência e déficits e, em conseqüência, que têm maiores dificuldades para avançar na melhoria das condições de vida. 3.5.6.3 Condições de Saneamento Básico e da Habitação na Perspectiva da População do Seridó Nas discussões e nos levantamentos feitos junto à população do Seridó, em todos os municípios visitados, foram ressaltados pontos da maior relevância que, em grande parte, complementam e reforçam o que os especialistas e as informações secundárias assinalam. Assim, resumindo o que foi discutido e referido a partir das discussões com as lideranças locais, podem ser considerados pontos relevantes os que são apresentados a seguir. Antes, porém, de assinalar tais pontos, é importante ressaltar, no que se refere ao saneamento básico e às condições de habitação da população residente no Seridó, que, entre as 20 aspirações sociais assinaladas com maior freqüência pelas lideranças sociais da quase totalidade dos municípios consultados, 4 dizem respeito diretamente aos segmentos que estão sendo aqui examinados. A primeira delas diz respeito aos recursos hídricos – em quarto lugar entre todas as aspirações das comunidades consultadas –, e que tem a ver com abastecimento de água, açudes, barragens e poços. Nas demandas relacionadas a essa aspiração aparecem, entre outras, idéias relacionadas à construção de mais açudes, barragens, cisternas, além da ampliação e recuperação das já existentes; implementação das obras de transposição do Rio São Francisco; perfuração de poços profundos; mapeamento dos mananciais; aquisição de dessalinizadores; construção de adutoras; abastecimento nas zonas rurais; combate às secas; ampliação dos sistemas de água encanada; e, finalmente, gerenciamento das águas dos açudes. 261 A segunda aspiração – classificada em sétimo lugar – relaciona-se ao meio ambiente, com destaque para a questão da reciclagem do lixo. Além dessa, merece referência a aspiração associada à existência de saneamento básico e rede de esgotos nas zonas rural e urbana, classificada em 12o lugar. Neste caso, a questão dos esgotos e o desvio no sentido de eliminar a poluição dos açudes, rios e riachos, além da necessidade de um sistema de saneamento mais eficiente e abrangente, inclusive na zona rural, ao lado da oferta de sanitários públicos, constituem pontos freqüentemente referidos nas discussões. TABELA 3.5.6.3 RIO GRANDE DO NORTE E MUNICÍPIOS DO SERIDÓ: PERCENTAGEM DA POPULAÇÃO URBANA EM DOMICÍLIOS COM ABASTECIMENTO DE ÁGUA E INSTALAÇÕES SANITÁRIAS CONSIDERADAS ADEQUADAS - 1970, 1980 E 1991 ESTADO E MUNICÍPIOS DO SERIDÓ ESTADO Currais Novos Acari Carnaúba dos Dantas Currais Novos Equador Parelhas São Tomé Caicó Caicó Cruzeta Ipueira Jardim de Piranhas Jardim do Seridó Ouro Branco Santana do Seridó São Fernando São João do Sabugi São José do Seridó Serra Negra do Norte Timbaúba dos Batistas Serras Centrais Campo Grande Cerro Corá Florânia Jucurutu Lagoa Nova Santana do Matos São Vicente ABASTECIMENTO DE ÁGUA ADEQUADO 1970 1980 1991 INSTITUIÇÕES SANITÁRIAS ADEQUADAS 1970 1980 1991 24,3 44,1 65,1 21,1 37,8 46,6 19,6 72,4 2,5 47,8 17,9 63,4 13,6 1,5 3,4 7,9 4,8 0,9 19,8 15,0 1,6 71,4 59,0 79,1 38,7 75,8 47,6 79,5 46,4 31,8 58,3 37,7 4,9 60,6 30,8 30,5 4,8 53,9 8,0 72,7 90,4 20,1 33,0 19,3 2,6 79,2 75,2 4,1 2,6 33,1 7,5 38,3 26,4 31,7 6,7 77,0 73,9 69,5 36,0 79,6 67,6 97,0 65,6 52,1 79,3 76,2 38,5 21,8 26,8 44,4 37,4 8,7 43,5 36,2 1,2 17,9 35,2 2,9 7,2 2,3 13,2 30,8 39,2 47,0 3,0 38,8 2,3 79,3 FONTE DOS DADOS BÁSICOS: Pnud-Ipea-Ibge-FJP (1997)- Relatório de desenvolvimento humano do Brasil, 1997. 262 56,0 77,7 85,9 38,5 31,7 69,6 57,6 36,1 16,6 1,1 1,2 TABELA 3.5.6.4 RIO GRANDE DO NORTE E SERIDÓ: DENSIDADE E NATUREZA DO MATERIAL DE CONSTRUÇÃO DAS HABITAÇÕES 1970, 1980 E 1991 DENSIDADE SUPERIOR A 2 MATERIAL DE CONSTRUÇÃO DURÁVEL ESTADO, SERIDÓ, ZH PESSOAS POR DORMITÓRIO E MUNICÍPIOS 1970 1980 1991 1970 1980 1991 ESTADO 58,6 Seridó Currais Novos Acari Carnaúba dos Dantas Currais Novos Equador Parelhas São Tomé Caicó Caicó Cruzeta Ipueira Jardim de Piranhas Jardim do Seridó Ouro Branco Santana do Seridó São Fernando São João do Sabugi São José do Seridó Serra Negra do Norte Timbaúba dos Batistas Serras Centrais Campo Grande Cerro Corá Florânia Jucurutu Lagoa Nova Santana do Matos São Vicente 47,6 57,0 49,3 54,1 55,9 46,9 54,3 41,0 41,3 41,0 51,5 35,0 46,9 54,9 51,7 63,8 60,0 49,8 55,6 40,0 59,1 57,1 59,8 63,8 39,6 42,1 40,2 37,0 52,3 43,3 41,5 44,4 48,8 44,0 52,6 45,3 36,1 65,9 56,0 51,7 66,4 74,9 49,3 51,8 63,2 51,9 46,4 61,7 56,3 47,9 45,2 34,0 30,6 25,7 22,2 23,8 26,7 36,2 23,6 24,8 28,5 26,9 24,3 32,2 41,7 21,8 25,0 21,7 29,2 28,9 27,8 42,6 29,2 39,3 50,1 35,3 30,4 45,0 40,7 37,2 28,4 68,6 79,6 88,3 98,0 85,4 73,1 86,7 62,5 82,9 94,2 87,2 82,0 91,7 60,8 88,8 84,0 84,6 77,7 74,7 87,7 93,2 94,7 71,6 83,9 60,4 88,1 93,7 85,0 95,9 85,0 81,2 91,9 93,5 90,4 79,9 88,0 75,9 80,8 61,9 94,4 66,5 68,7 63,5 59,6 79,0 68,3 71,9 75,3 66,3 83,8 65,8 88,6 88,2 92,0 93,7 92,8 99,8 95,0 95,6 97,0 81,7 95,7 98,1 93,1 93,5 89,7 94,0 100,0 99,8 98,0 93,0 99,3 88,1 96,8 84,8 71,6 85,9 92,1 86,4 90,4 80,2 96,6 FONTE DOS DADOS BÁSICOS: Pnud-Ipea-Ibge-FJP (1997)- Relatório de desenvolvimento humano do Brasil, 1997. Por fim, entre as aspirações da população, coloca-se em 20o lugar, no contexto das aspirações assinaladas pelas lideranças em praticamente todos os municípios do Seridó, o problema da habitação, com destaque para a erradicação de casas de taipa. Isto tem a ver, entre outros aspectos, com a disponibilidade de habitação de boa qualidade e com a ampliação dos programas habitacionais existentes, tanto para o campo como para a cidade. a. Insuficiente Oferta de Água Esta constatação esteve presente nas discussões municipais, tanto no que se refere à Dimensão Social quanto à Ambiental. Ela se traduz, sobretudo, em proposições das mais diferentes formas de ampliação da disponibilidade de água (construção de novos açudes, ampliação da captação dos açudes e barragens existentes, construção de poços profundos, cisternas, barragens submersas, recuperação dos 263 mananciais, aceleração das obras das adutoras), junto com as referidas aos problemas associados ao gerenciamento dos recursos hídricos, improvisação cara e de má qualidade dos carros-pipa. Não é sem razão que a questão do abastecimento de água, no tocante à disponibilidade de água, aparece em 4o lugar entre as aspirações mais destacadas das lideranças da região. É bem verdade que o Seridó, como todo o semi-árido, viveu períodos críticos, no que se refere às condições climáticas, nos últimos anos. No entanto, as referências apontam para problemas que dizem respeito ao descaso e à ausência de investimentos sistemáticos no abastecimento, que permitam uma ampla cobertura e garantia de água tratada, em particular junto aos centros urbanos e aglomerados rurais. A questão da oferta de água e do seu uso foi tratada com mais propriedade no diagnóstico da Dimensão Ambiental (Item 3.2 anterior). b. Insuficiente Cobertura, Má Qualidade do Abastecimento de Água e o Desperdício Da perspectiva da população, o abastecimento de água não somente não cobre as necessidades básicas da população, ocorrendo déficit no meio urbano e, sobretudo, nos pequenos aglomerados rurais da população, como se trata de um atendimento que necessita ser melhorado em relação à água que é oferecida à população. Isto ocorre não só em razão da precariedade do tratamento dado à água oferecida, como à contaminação e poluição dos mananciais. Segundo as manifestações das lideranças presentes nas discussões, observa-se também em grande número dos municípios, em relação a açudes, rios, riachos e reservatórios. Neste particular, em algumas manifestações dos presentes às reuniões nos municípios, foi assinalado que a questão da qualidade da água oferecida à população, para os mais diferentes usos, é comprometida pela precariedade do sistema de esgotamento sanitário, que, sem o tratamento devido, polui os reservatórios e os cursos de água, usados no sistema local de abastecimento. Quanto ao desperdício da água, há várias referências, em geral associadas à necessidade de campanhas educacionais para que a população tenha consciência da crescente escassez da água, do seu custo e da necessidade de evitar seu uso para fins de reduzida importância e prioridade. c. Falta de Saneamento Básico A visão passada pelas lideranças a respeito do esgotamento sanitário localizado no Seridó ressalta deficiências em várias partes do sistema. De um lado, na relação direta do sistema com os domicílios, o alcance é reduzido e abrange uma parcela pequena das habitações, mesmo quando se consideram apenas os domicílios urbanos. Além disso, há uma quase ausência, no meio rural, de domicílios com instalações sanitárias adequadas. De outro lado, mesmo na presença de esgotos em alguns municípios, foi destacada a existência do escoamento direto dos dejetos para os cursos de água e os reservatórios, dada a ausência de tratamento e de lagoas de retenção de dejetos, daí resultando o comprometimento dos mananciais. Daí também decorre a necessidade de criação de condições para que as residências tenham instalações sanitárias adequadas (fossas sépticas ou ligações com a rede geral), e para que o sistema de esgotamento sanitário seja complementado com a construção de obras relacionadas ao tratamento e ao destino adequado dos dejetos. d. Deficiência no Tratamento e no Destino do Lixo 264 A questão do tratamento adequado do lixo aparece, junto com a necessidade de preservação ambiental, entre as 7 aspirações de maior freqüência nos municípios do Seridó. A necessidade de considerar este aspecto toma as mais diferentes dimensões, notadamente as que se referem ao tratamento do lixo de cada município e seu destino. No primeiro caso, digna de destaque é a proposta de instalação de usinas de tratamento de lixo e de sua reciclagem (ampliação ou montagem de usinas), dado o fato de que isto representaria, também, o desenvolvimento de uma atividade produtiva e a geração de alguns empregos, além, evidentemente, de um tratamento mais adequado do lixo coletado, diferente da forma como a maioria dos municípios o fazem, presentemente. Este assunto foi tratado em mais detalhe no Item 3.2 (Dimensão Ambiental). No segundo caso, a discussão envolve a necessidade de localização adequada de aterros sanitários, longe dos mananciais, dos centros urbanos e das rodovias que cortam os municípios. A isto devem ser somados os cuidados e as recomendações feitas na construção e utilização dos aterros sanitários. Referência especial foi feita ao lixo hospitalar e ao cuidado específico, neste particular, tanto na coleta quanto no destino que lhe deve ser dado. Com menor freqüência, no entanto, mencionada nas reuniões em alguns municípios, foi a necessidade de utilização de veículos adequados na coleta de lixo, contrariamente ao que parece ser a prática adotada por várias prefeituras, no serviço de limpeza pública. e. Déficit Habitacional e Deficiências nas Condições dos Domicílios A disponibilidade de habitações adequadas, associada, sobretudo, à erradicação das casas de taipa dos municípios do Seridó, situa-se entre as 20 primeiras aspirações mais citadas pelas lideranças da região. O reconhecimento dessa necessidade está vinculado i) à densidade das habitações – o que remete para a dimensão das casas –, para o que foram feitas algumas estimativas, anteriormente referidas; ii) à disponibilidade de água tratada ou de instalações sanitárias; iii) à natureza do material com o qual foram construídas as residências; e, finalmente, iv) às dificuldades encontradas pelas famílias para terem acesso a uma habitação adequada. As necessidades vão desde uma maior cobertura dos serviços de água e esgotamento sanitário à construção de novas unidades habitacionais, à substituição de casas de material não-durável ou precário por casas de material durável, à ampliação de cômodos em habitações de maior densidade e à instalação de infra-estrutura de água e esgotos nos domicílios que não têm tais serviços básicos. Esta parece ser não só uma intenção subjacente a algumas ações governamentais e o seu reconhecimento da dimensão dos problemas habitacionais do Estado. De fato, o governo estadual desde 1998, estabeleceu um programa habitacional que possui um componente emergencial e outro de maior duração. No que se refere ao primeiro componente, o que se pretende é a erradicação das casas de taipas. Neste particular, o Plano Habitacional de Emergência – Erradicação de Casas de Taipa, estima a existência, no Estado, de 10,5 mil habitações precárias, que deveriam constituir objeto de intervenção no ano de 1998, desdobrável em etapas voltadas para a eliminação do déficit habitacional do Estado. 265 Neste caso, considera-se além da instalação de 38,1 mil unidades habitacionais para substituição de habitações rústicas na zona rural, a construção de 30,9 mil unidades para resolver o problema de convivência familiar urbana (para as famílias de até 2 salários mínimos); a construção de 17,4 mil unidades habitacionais, para resolver o problema de convivência de famílias rurais (de baixo nível de renda); a construção 6,4 mil casas, para atender a demanda da população de baixa renda, que paga alugueis excessivos; a construção de 7,3 mil dormitórios nas habitações com mais de 3 pessoas por dormitórios; e a execução de 61 mil serviços de infra-estrutura em vivendas duráveis de famílias de baixa renda, que deveriam constituir-se de instalações domiciliares de água, esgotos, energia elétrica e coleta de lixo. O esforço a ser desenvolvido implica, portanto, avaliar o que foi executado no Seridó, atualizar as estimativas das carências em sua várias dimensões e articular a sociedade e os poderes públicos, visando a implementação imediata das ações. f. Deficiência em Relação à Vigilância Sanitária e a Existência Sanitários e Banheiros Públicos As questões, neste particular, dizem respeito a demandas ressaltadas pelas comunidades nos encontros, sobre a necessidade de uma permanente vigilância sanitária, voltada para os serviços de coleta e destino do lixo – em especial o lixo hospitalar – e para o destino e tratamento dos dejetos, por meio de sistema de esgotos, pois muitos deles têm como destino os cursos de água e os reservatórios. Tal vigilância deveria abranger também os matadouros que, em alguns municípios, constituem-se em fatores responsáveis pela poluição dos mananciais. Muito freqüente também foram as demandas por sanitários e banheiros públicos, como já se fez referência. 3.5.6.4 Disponibilidade dos Serviços Além das informações sobre a disponibilidade de serviços já registrada nos itens anteriores, é importante destacar os dados referentes à oferta de água fornecida pelo governo estadual nos municípios do Seridó. Na tabela 3.5.6.5, são apresentados os dados coletados e trabalhados pelo Idema, para o Anuário Estatístico do Rio Grande do Norte. O que se ressalta na referida tabela é o número de economias ativas de abastecimento de água, segundo sua classificação em residenciais – que têm o maior peso – comerciais, industriais e outras. No total do Seridó, em 1997, havia 49,8 mil economias, que representavam 12,1% do total do Estado, das quais 46,8 mil eram residenciais. Essas últimas representavam, também, no total do Rio Grande do Norte, 12,1%. Embora as economias ativas residenciais não sejam idênticas a domicílios com abastecimento de água, a comparação entre os domicílios existentes e as economias ativas registradas para os municípios pode fornecer uma idéia do atendimento dado ao municípios, em data mais recente do que os dados anteriormente analisados. Em 1996, de acordo com a Contagem da População do Ibge, havia 61,3 mil domicílios permanentes no Seridó. Destes, 46,8 mil localizavam-se no meio urbano. A comparação com as economias ativas, para o ano de 1997, mostra que as 46,8 mil economias ativas residenciais, registradas 266 pela Caern, correspondiam aos domicílios permanentes urbanos do Seridó e a apenas 76,3% do total dos domicílios permanentes. TABELA 3.5.6.5 RIO GRANDE DO NORTE E SERIDÓ: ABASTECIMENTO DE ÁGUA - NÚMERO DE ECONOMIAS ATIVAS DA CAERN – 1997 ESTADO, SERIDÓ, ZH E MUNICÍPIOS ESTADO Seridó Currais Novos Acari Carnaúba dos Dantas Currais Novos Equador Parelhas São Tomé Caicó Caicó Cruzeta Ipueira Jardim de Piranhas Jardim do Seridó Ouro Branco Santana do Seridó São Fernando São João do Sabugi São José do Seridó Timbaúba dos Batistas Serras Centrais Campo Grande Cerro Corá Florânia Jucurutu Lagoa Nova Santana do Matos São Vicente ECONOMIAS ATIVAS RESIDENCIAL COMERCIAL INDUSTRIAL TOTAL OUTRAS 412.387 386.558 16.016 2.454 7.359 49.754 17.958 2.475 1.210 8.889 808 3.170 1.406 22.897 12.610 1.592 388 1.768 2.662 817 346 450 1.174 647 443 8.899 1.012 974 1.510 2.282 1.090 1.257 774 46.839 16.796 2.349 1.162 8.184 738 2.999 1.364 21.491 11.799 1.504 372 1.634 2.514 778 310 432 1.129 602 417 8.552 980 928 1.438 2.205 1.055 1.202 744 1.370 599 40 13 427 14 85 20 662 457 50 324 109 35 4 53 4 11 2 197 100 3 2 70 12 5 1.221 454 51 31 225 52 75 20 547 254 35 14 33 72 25 30 16 26 21 21 220 15 34 44 41 25 38 23 31 64 9 6 2 16 23 4 109 14 10 25 29 10 16 5 3 1 1 18 3 2 3 7 1 2 FONTE DOS DADOS BÁSICOS: Idema. Anuário Estatístico do Rio Grande do Norte, 1998. O que os dados sugerem, no tocante aos domicílios urbanos, é que há uma cobertura muito abrangente – considerando que o conceito de economia ativa adotado pela empresa de abastecimento de água se aproxima do de domicílio –, não havendo, como era de se esperar, em se tratando de sistema de abastecimento de água (que abrange em geral o meio urbano), uma tal cobertura, quando a referência é feita ao total de domicílios, incluindo neste os domicílios rurais. Neste particular, estão fora da abrangência referida 23,7% dos domicílios ou 14,5 mil. Comparando-se os dados de 1991, dos domicílios urbanos do Seridó que, segundo o Atlas de Desenvolvimento Humano, possuíam abastecimento de água adequado (cerca de 64%), com as 267 comparações feitas anteriormente, é provável que tenha havido um avanço substancial na cobertura das habitações urbanas, quanto ao abastecimento de água na região. No entanto, não se deve descartar o fato de que a redução da disponibilidade de água na região, tendo em vista o reduzido percentual de acumulação existente e a questão da qualidade do abastecimento referida, durante a consulta às lideranças, qualifica significativamente este fato, no sentido de reduzir a dimensão dos efeitos positivos que pode representar esta maior cobertura do sistema de abastecimento de água. 3.5.6.5 Problemas e Potencialidades Dentre os problemas mais relevantes relacionados às condições de saneamento básico e de habitação, destacam-se os apresentados a seguir. • Déficit na cobertura do sistema de saneamento básico. A reduzida cobertura dos domicílios refere-se ao abastecimento de água e ao esgotamento sanitário, sobretudo em relação a este último aspecto. Embora tenha havido avanços, no que se refere à disponibilidade de habitações urbanas com abastecimento de água, alguns domicílios urbanos não possuem acesso adequado a esses serviços. E como era de esperar, parte significativa dos domicílios rurais. Os dados do Censo Demográfico de 1991 mostram que 64% dos domicílios urbanos possuíam abastecimento de água considerado adequado. Relativamente às instalações sanitárias adequadas, o percentual de cobertura, no meio urbano, é menor do que o relacionado ao abastecimento de água, pois tal cobertura abrange 58,2% das habitações urbanas, de acordo com os dados de 1991. Os depoimentos das lideranças ressaltam a quase ausência de instalações adequadas nas habitações rurais, que poderiam possuí-las mediante o uso de fossas e outras instalações, com um mínimo de requisitos técnicos. Essa cobertura de saneamento básico, sobretudo no que se refere às instalações sanitárias adequadas, é bastante desigual no interior do Seridó, com os municípios das Serras Centrais registrando percentuais bem mais reduzidos do que a média da região. De fato, em tais municípios, somente 30,8% dos domicílios, em 1991, registravam instalações sanitárias adequadas, em contraposição a 57,8% da Zona Homogênea de Currais Novos e a 71,7% da de Caicó. No interior da região, independentemente do fato de pertencer ou não a determinada Zona Homogênea, as diferenças entre os municípios, individualmente, são grandes. Isto é importante na orientação das ações, tendo em vista a necessidade de atribuir prioridade aos municípios e comunidades com indicadores mais críticos, do ponto de vista da disponibilidade de saneamento básico. • Deficiências na qualidade do sistema de abastecimento de água e esgotamento sanitário. Ficou evidente nas consultas feitas à população a presença de deficiências que comprometem a qualidade dos serviços referentes a saneamento básico no Seridó, tanto no que se refere ao abastecimento de água quanto ao esgotamento sanitário. Quanto ao abastecimento de água, é bastante ressaltada a qualidade da água oferecida, tendo em vista a precariedade do tratamento e a poluição dos mananciais, seja por meio de esgotos sanitários, que têm como destino os cursos de água e os reservatórios, seja em razão do destino que é dado ao lixo, que, por vezes, termina por comprometer a qualidade da água oferecida à população. Assim, soma-se ao déficit na cobertura dos domicílios, a reduzida qualidade da água oferecida. 268 Relativamente às instalações sanitárias, de menor cobertura junto aos domicílios, é importante considerar, conforme várias manifestações nas discussões com as lideranças municipais, o destino que é dado aos dejetos, que comprometem os recursos hídricos disponíveis e, ademais, a ausência de lagoas de retenção dos dejetos e o seu tratamento adequado. Assim, o esforço para avançar neste sentido exige a ampliação da cobertura da população no tocante aos serviços e a complementação do sistema de esgotamento sanitário em alguns municípios, sobretudo no tratamento e retenção dos dejetos. • Déficit habitacional e deficiências nas condições dos domicílios. A oferta de habitações adequadas, associada, sobretudo, à erradicação das casas de taipa dos municípios do Seridó, situa-se entre as grandes aspirações das lideranças da região. O reconhecimento dessas necessidades está vinculado à densidade das habitações, comprovada por algumas estimativas disponíveis; à disponibilidade de água tratada ou de instalações sanitárias; à natureza do material com o qual foram construídas as residências; e, finalmente, às dificuldades encontradas pelas famílias para terem acesso a uma habitação adequada. Tanto os dados secundários disponíveis como as manifestações das lideranças comunitárias mostram a gravidade da situação, as diferenças marcantes existentes entre as Zonas Homogêneas do Seridó e, no interior delas, entre os municípios. Para que se tenha uma idéia, os dados de 1991 mostram que havia no Seridó 19,2 mil domicílios, cuja densidade por dormitório era superior a 2 pessoas, e, além disso, 5 mil domicílios construídos por material não durável. Como era de esperar, dada a heterogeneidade de situações observadas na região, tais habitações em situação precária, estão distribuídas, desigualmente, entre Zonas Homogêneas, entre municípios e entre famílias, com classes de renda diferentes. • Precariedade no tratamento e no destino do lixo. A demanda relacionada à necessidade de melhor tratamento para o lixo aparece, junto com a necessidade de preservação ambiental, entre as aspirações de maior freqüência, manifestadas pelas lideranças comunitárias nos municípios do Seridó. A necessidade de considerar este aspecto toma as mais diferentes formas. Tanto diz respeito à coleta – o que implica cobertura das diferentes localidades dos municípios e procedimentos para sua realização, notadamente os veículos utilizados – como ao destino e à necessidade de tratamento adequado. No que se refere ao destino que é dado ao lixo, sua localização – distante dos mananciais, das cidades e das rodovias – e a necessidade de construção de aterros sanitários adequados constituem os pontos centrais da discussão. Relativamente ao tratamento, as demandas no sentido de implantação, pelos governos municipais, de usinas de utilização e processamento do lixo, está presente nas reivindicações apresentadas. Uma deficiência bastante assinalada, neste particular, diz respeito à coleta, destino e tratamento do lixo hospitalar, na prática das prefeituras de vários municípios. • Precariedade na vigilância sanitária e na disponibilidade de sanitários e banheiros públicos. Há um claro reconhecimento, por parte das lideranças, da necessidade de uma permanente vigilância sanitária, que diga respeito tanto ao tratamento da água oferecida à população quanto aos dejetos e aos esgotos e seu destino e tratamento, bem como em relação ao lixo (sobretudo a coleta, destino e tratamento do lixo hospitalar) e seu destino. É considerada como objeto desta vigilância, a situação de algumas atividades, como a de matadouros, e seus impactos sobre o meio ambiente, em particular os recursos hídricos. A necessidade de construção de sanitários públicos nos aglomerados urbanos surge como ponto importante nas reivindicações das lideranças comunitárias. Sobre as potencialidades, convém destacar as especificadas a seguir. 269 • Os avanços ocorridos na oferta de alguns serviços. Não obstante o fato de que há déficits significativos nas condições dos domicílios, quando são examinados os diferentes aspectos (abastecimento de água, instalações sanitárias, densidade populacional dos domicílios, material de construção adotado), a maior parte dos indicadores existentes revelou progressos, notadamente na cobertura do serviço de abastecimento e, um pouco menos, na de instalações sanitárias. Mesmo no que se refere à densidade populacional das moradias e à durabilidade do material usado na construção das habitações, alguns avanços são perceptíveis, quando se tem como referência a década de 70. Isto significa que a população e a sociedade, de modo geral, e as autoridades públicas, de modo particular, mostraram capacidade de encaminhar soluções para esta questão, embora não o fizessem na intensidade e na abrangência desejadas, daí os significativos déficits ainda presentes. • A consciência da importância e da necessidade de melhoria substancial das condições sanitárias e habitacionais da população. Nas discussões com as lideranças dos vários municípios da região, ficou evidenciado o alto grau de consciência da população do Seridó sobre o significado da disponibilidade de água tratada, da oferta de serviços de esgotamento sanitário adequado e da melhoria da situação habitacional para a população e para a melhoria das condições de saúde e de redução da mortalidade. Além disso, há também uma consciência muito clara sobre as medidas que necessitam ser adotadas para que a sociedade possa garantir avanços substanciais na melhoria dos serviços de saneamento básico e nas condições de moradia. Este aspecto representa, sem dúvida, um potencial no encaminhamento definitivo desses e de outros problemas da região. • A existência de um programa abrangente de redução do déficit de moradia. Embora com resultados concretos ainda muito tímidos, como se pode concluir das informações disponíveis, o programa estadual de redução do déficit de habitação, em sua concepção geral possui uma abrangência na qual estão contempladas as várias dimensões da questão habitacional: a necessidade de substituição das moradias construídas com material precário e de reduzida durabilidade, a densidade dos domicílios, as dificuldades de famílias constituídas de acesso à habitação, as condições de abastecimento de água e de instalações sanitárias sobretudo dos domicílios de famílias de baixa renda. O importante é, a partir dessa concepção, avaliar o programa existente, suas fontes de financiamento e as formas de articulação entre as diferentes esferas de governo e os beneficiários, e definir o rumo e a intensidade de sua efetiva implantação. 3.6 DIMENSÃO POLÍTICO-INSTITUCIONAL Para o estudo das questões institucionais aqui tratadas considerou-se oportuno apresentar conceitos básicos, comumente aceitos, sobre o Estado. Desde logo, cabe distinguir conceitualmente Sociedade, Estado e Governo. A superposição de conceitos, no caso desses três entes distintos, tem sido responsável, com freqüência, pelo mal desempenho das instituições governamentais. Deixa-se claro, portanto, que Estado é Nação politicamente organizada e que Governo é instrumento – da Sociedade e do Estado. Freqüentemente, confunde-se Governo com Estado. Como o Estado é abstração jurídica, e não se o vê, o que se vê é o Governo, nas suas manifestações tangíveis (tais como: o direito positivo, a bandeira, as autoridades constituídas, os edifícios públicos, os guardas de trânsito, os oficiais de justiça, as guias de recolhimento dos tributos, etc.), segue-se que muitas vezes se toma o Governo pelo Estado. Estado, na perspectiva aqui considerada, se articula, por conseguinte, com duas esferas, a da Sociedade Política e a da Sociedade Civil, às quais correspondem, respectivamente, o governo e as 270 organizações e iniciativas não-governamentais, entre estas os sindicatos, as Igrejas, as sociedades e associações civis, etc. Tais considerações são importantes para que se tenha em mente que o tratamento das questões institucionais, mormente no que relaciona à melhora de seu desempenho, está mais diretamente relacionado ao Governo do que ao Estado. É muito comum, no entanto, quando se procura buscar maior racionalidade e eficiência nas ações de governo, dizer-se que é absolutamente necessário redesenhar o perfil do Estado, tornando-o mínimo, quando, na realidade, mínimo (ou de adequado tamanho) deve ser o governo. Teoricamente, o Estado não pode ser nem mínimo nem máximo, pelo simples fato de que a Sociedade, da qual o Estado é a expressão jurídica, não pode ser nem minimizada nem maximizada. Além disso, há que se ter consciência de que o Governo é que se subordina à Sociedade e não esta àquele. Por outro lado, é de ressaltar que a capacidade para enfrentar os desafios emergentes não pode ser cometida exclusivamente ao Estado, até porque o governo, em algumas áreas, tem-se mostrado incapaz de encontrar e viabilizar as soluções mais adequadas. A obtenção de resultados mais consentâneos com a realidade irá depender da forma como o Estado vier a incorporar à sua filosofia de ação a participação das organizações da Sociedade Civil nos processos de gestão, em todas as suas fases. Isso determina a necessidade de criação e de utilização efetiva de mecanismos de controle social (como tais considerados os colegiados que acompanham o desempenho da gestão pública) e de seu envolvimento no próprio processo de gestão, como coadjuvantes da administração pública. Torna-se indispensável, portanto, interessar e envolver o setor privado – bem como os diversos segmentos da Sociedade Civil – na participação efetiva do planejamento e na própria execução de determinados projetos, passíveis de serem desenvolvidos em parceria. Dentro dessa orientação cabe definir, com a maior clareza, o verdadeiro papel do Estado no tocante ao desenvolvimento dos setores produtivos e atribuir às organizações do setor privado as tarefas que elas devem e podem desempenhar com mais eficiência. Caberá, assim, ao Estado, cada vez mais, o papel de principal facilitador da aprendizagem coletiva e de catalisador de suas iniciativas. É imprescindível, pois, a tarefa de conceber, executar e manter, em constante aperfeiçoamento, um processo de desenvolvimento institucional que possibilite ao Estado cumprir, de forma eficiente e eficaz, as ações a seu cargo, de acordo com sua nova feição. Isto vale dizer que, para garantia de plena e efetiva execução de planos, programas e projetos inovadores (como é o caso do Plano de Desenvolvimento Sustentável do Seridó), há necessidade de se melhorar a estrutura e o desempenho do aparato institucional atuante na região. Espera-se que as informações obtidas no diagnóstico institucional venham possibilitar a indicação de medidas tendentes a melhorar o desempenho das entidades governamentais, atuantes na Região do Seridó, envolvendo: • uma clara definição das funções do Estado em ação, como instância ampliada da qual participam as duas esferas do Governo e da Sociedade Civil num processo articulado de formulação e implementação de políticas públicas; • a adequação das estruturas organizacionais, já existentes, às exigências decorrentes do elenco de funções que deverão constar do Sistema de Gestão exigido pelo Plano; e 271 • a definição de normas e a adoção de procedimentos que agilizem o desempenho organizacional. 3.6.1 Tipologia dos Municípios do Seridó Trata-se, neste subitem, tomando por base concepções e evidências produzidas pelo Projeto Áridas-Nordeste, do delineamento de uma tipologia dos municípios do Seridó, a partir de suas características particulares, pautando-as pelos seguintes indicadores básicos: i) grau de urbanização; ii) grau de indigência; e iii) grau de dependência, a seguir conceituados: Grau de Urbanização. Corresponde à relação entre a população total, urbana e rural, refletindo, de certa forma, a distribuição das atividades econômicas do município e a própria localização da demanda por infra-estrutura física e de serviços; Grau de Indigência. Trata-se da relação entre famílias em situação de indigência e o total das famílias de um município, expressa pelo nível de pobreza. Oferece uma idéia da magnitude dos problemas com que se defronta a administração municipal, possibilitando o estabelecimento de prioridades de atuação junto aos municípios, de acordo com os níveis de miséria encontrados em cada municipalidade; e Grau de Dependência. Eqüivale à relação entre a quota-parte do Fundo de Participação dos Municípios e a receita total do município. Reflete a dependência dos municípios no que se relaciona à composição de suas receitas, segundo as fontes de onde provêem os recursos que as constituem. Um maior grau de dependência significa que o município tem sua principal fonte de receita nas transferências efetuadas pela União, fato que mostra a debilidade de sua base econômica, incapaz de possibilitar a geração de tributos em valores expressivos. (Gusmão, 1994.) Dos estudos realizados para o Projeto Áridas-Nordeste, destacou-se o Estado do Rio Grande do Norte e, nele, a Região do Seridó, classificando-se os municípios segundo a tipologia antes referida. Esclareça-se, ainda, que os resultados apontados no trabalho citado apoiaram-se em base de dados relativa ao ano de 1994, razão pela qual não contemplam municípios criados, por desmembramento, após aquele ano. Assim, os municípios da Região do Seridó, em 1994, apresentavam as características especificadas na tabela 3.6.1.1, em termos de enquadramento na tipologia adotada. Como é possível observar, todos os municípios da região, com uma exceção (Currais Novos), apresentam um elevado Grau de Dependência, que seria maior ainda caso fossem consideradas as transferências não-constitucionais. O Grau de Indigência é em geral elevado em todos os municípios. No entanto, é importante observar que aqueles integrantes da Zona Homogênea das Serras Centrais (onde há recursos naturais mais abundantes) ostentam índices mais elevados, enquanto que vários municípios das Zonas Homogêneas de Caicó e Currais Novos, onde a pobreza dos recursos naturais é mais visível, ostentam menores Graus de Indigência. Este fato, aparentemente sem importância, tem enorme significado do ponto de vista social e político-institucional, sugerindo uma maior democratização e aproveitamento dos recursos hídricos acumulados pela via das políticas governamentais nas áreas antigas de concentração do complexo algodoeiro-pecuário e uma menor presença do Estado na área serrana. 272 TABELA 3.6.1.1 CLASSIFICAÇÃO DOS MUNICÍPIOS DO SERIDÓ, SEGUNDO OS GRAUS DE URBANIZAÇÃO, DEPENDÊNCIA E INDIGÊNCIA POPULAGRAU DE GRAU DE GRAU DE DENSIDAMUNICÍPIO ÁREA ÇÃO DEPENDÊNCIA URBANIZA- INDIGÊNCIA DE (km2) (hab.) (%) (%) ÇÃO (%) (hab./km²) Cruzeta 7.874 301,7 26,10 66,34 51,8 83,47 S. J. do Sabugi 5.483 289,6 18,93 68,28 54,4 83,71 Acari 10.981 596,5 18,41 71,08 48,8 78,73 Caicó 50.658 1.222,7 41,43 84,49 42,2 61,71 Carnaúba dos Dantas 5.602 272,7 20,54 70,58 43,3 79,07 Jardim do Seridó 11.825 377,3 31,34 72,20 44,3 68,80 Parelhas 17.566 410,7 42,77 75,98 43,0 66,77 Timbaúba dos. Batistas 1.934 144,4 13,39 71,25 43,3 80,31 Currais Novos 40.212 873,2 46,05 84,11 43,8 48,82 Cerro Corá 10.499 407,6 25,76 38,25 57,8 82,77 Florânia 12.417 593,8 20,91 43,84 56,1 80,16 Jardim de Piranhas 9.962 375,4 26,54 60,26 54,6 82,47 Jucurutu 14.677 934,8 15,70 50,18 53,5 84,03 Lagoa Nova 10.856 132,9 81,69 41,63 59,9 84,25 Ouro Branco 4.543 220,6 20,59 52,94 53,9 86,56 Santana do Matos 17.164 1.684,4 10,19 41,17 56,0 84,14 São Fernando 3.502 410,1 8,54 38,24 51,8 83,59 São José do Seridó 3.178 196,3 16,19 55,60 52,0 88,10 Serra Negra 7.504 544,6 13,78 40,67 53,1 63,18 São Tomé 11.461 873,6 13,12 43,46 54,4 56,05 Equador 5.490 424,3 12,94 61,38 47,7 88,09 Santana do Seridó 2.510 171,6 14,63 41,51 47,5 77,75 FONTES DOS DADOS BÁSICOS: i) Estado do Rio Grande do Norte. Secretaria de Planejamento e Finanças. Instituto de Desenvolvimento Econômico e Meio Ambiente do Rio Grande do Norte-Idema. Anuário estatístico; Rio Grande do Norte, 1998. Natal-RN, 1998, p. 21-23; e ii) GUSMÃO, Paulo P.. de (1994)- Sistemas municipais de governo. Brasília, SeplanPR/IICA, 1994. Xerox. (Estudo realizado no âmbito do Grupo de Políticas de Desenvolvimento e Modelo de Gestão do Projeto Áridas-Nordeste.) 3.6.2 A Presença do Estado A presença do Estado na Região do Seridó pode ser adequadamente interpretada a partir dos estudos que analisaram a trajetória geral das políticas governamentais sobre os problemas do Nordeste brasileiro e da evolução das formas específicas de intervenção pública naquela Região, desde a segunda metade do século XIX, quando se consolidou o chamado complexo algodoeiro-pecuário, por cujo intermédio os novos atores sociais seridoenses entraram em cena e assumiram posição hegemônica na política do Rio Grande do Norte, por quase meio século. 101 101 Alguns exemplos dessas contribuições podem ser encontrados nos trabalhos de Cohn (1978) e Oliveira (1987), que analisam as condições econômicas e políticas que propiciaram a emergência da Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste–Sudene e o desenvolvimento dessa experiência inédita de planejamento regional; em Carvalho (1988), que examinou as “fontes de atraso” do Nordeste brasileiro e o sentido das políticas “anti-seca” e de irrigação para o desenvolvimento regional; em Bursztyn (1984), que identificou a maneira peculiar de articulação entre os poderes central e local como forma de atendimento dos interesses desses poderes e de manutenção das oligarquias locais; e, finalmente, mas não exclusivamente, em Carvalho (1987), que interpretou o discurso e as práticas das instituições de planejamento regional, o caráter recorrente das políticas, programas e projetos de desenvolvimento regional e a manutenção dos problemas nordestinos com a força e a gravidade que lhes são peculiares. 273 A primeira geração daqueles estudos descreve a trajetória da ação governamental como um conjunto de soluções ou fases técnicas, que tiveram início na grande seca de 1877-1879 e emergiram da interpretação dada aos problemas regionais como sendo uma decorrência direta da falta de água, da irregularidade das chuvas e da respectiva formulação das políticas de combate aos efeitos das secas, porém, acima de tudo, da própria consolidação do complexo algodoeiro-pecuário. O segundo conjunto de estudos toma como referência os estágios de acumulação de capital alcançados pela sociedade nordestina ao longo do processo de formação econômica da Região e divide a presença do Estado em quatro períodos: i) o da segunda metade do século XIX até 1950, quando predominou a solução hidráulica; ii) o de 1950 a 1959, quando ocorreu a mudança no padrão de intervenção governamental, que culminou com a criação da Sudene; iii) o de 1959 a 1964, quando ocorreram as tentativas de modernização com reformas, fundamentadas nas idéias de que a solução para os problemas da Região Nordeste envolvia mudanças estruturais de natureza econômica, política e social; e, finalmente, iii) o de 1964 a 1978, caracterizado pelo enfoque da modernização conservadora, no curso do qual teve lugar o progressivo esvaziamento da Sudene, e pelo surgimento das políticas regionais como capítulos dos chamados Planos Nacionais de Desenvolvimento (PNDs). (Carvalho, 1988: 193-250.) Por sua vez, as análises fundamentadas na trajetória das instituições e dos instrumentos de planejamento regional permitem caracterizar a ação governamental em cinco importantes momentos históricos, assim especificados: i) de 1877-79 a 1963, compreendendo a fase hidráulica e a emergência do planejamento para o desenvolvimento regional; ii) de 1964 a 1970, caracterizado pelo rebaixamento do status da Sudene, que teve cortada a sua ligação direta com a Presidência da República, ficando subordinada ao então Ministério da Coordenação Regional–Mecor, perdendo autonomia, prestígio e recursos financeiros; iii) de 1970 a 1974, quando ocorreu uma profunda mudança no padrão de intervenção estatal, que passou a ser conduzido por um Estado nacional forte, centralizador e autoritário, com as políticas regionais passando a ser meros capítulos dos Planos Nacionais de Desenvolvimento; iv) de 1974 a 1979, caracterizado pela vigência do II PND e dos Programas Especiais de Desenvolvimento Regional; e, finalmente, v) de 1979 a 1985, caracterizado pela acentuada intervenção do Estado, no final do período autoritário. (Carvalho, 1987: 43-297.) Finalmente, os estudos sobre a formação e a evolução histórica da estrutura política brasileira adotam uma visão polarizada, na qual é enfatizada, de um lado, a importância do nível local da estrutura de poder, e, de outro, a abordagem que atribui ao nível central um extraordinário poder, progressivamente centralizador. (Bursztyn, 1984: 27-29.) Na entanto, outras contribuições teóricas sobre esse mesmo tema evidenciaram a existência de uma grande interdependência entre os poderes central e local e os processos articulados de centralização e descentralização que daí decorrem, o que possibilitou dividir a ação do Estado no Nordeste em três grandes períodos: i) o anterior a 1959, quando as ações se assentaram fortemente no poder central, porém executadas de forma desconcentrada por diferentes organismos pertencentes àquela esfera de poder; ii) o período situado entre 1960 e 1970, quando a ação do Estado foi descentralizada, passando a ser coordenada pela Sudene; e, finalmente, iii) o período posterior a 1970, caracterizado mais uma vez pela centralização das decisões no governo federal e pela participação de uma multiplicidade de organismos federais e estaduais, atuando de forma descoordenada e superposta. (Bursztyn, 1984: 27-29.) Para os propósitos deste trabalho, a presença do Estado no Seridó será analisada tomando como referência os três últimos momentos históricos assinalados no parágrafo anterior, explicitando-se, ao 274 final, as mudanças mais recentes, em direção à descentralização das políticas públicas, cujo marco inicial foi o período da redemocratização que culminou com a Constituição Federal de 1988. 3.6.2.1 Trajetória no Período Anterior à Criação da Sudene (1877-1879 a 1959) A maioria dos estudos sobre as formas de ação do Estado no Nordeste consideraram a seca de 1877-79 como marco a partir do qual os problemas do Nordeste ganharam visibilidade e começaram a fazer parte da agenda, das ações e das instituições governamentais para a Região. As secas, no entanto, não datam do final do século XIX, reconhecendo-se sua ocorrência no semi-árido nordestino, há pelo menos vinte mil anos, se vistas pelo prisma de sua conceituação climático-meteorológica. (Carvalho, 1988: 194-195.) Por que, então, somente no final do século XIX as secas e os problemas delas decorrentes ganharam visibilidade, justificando a presença do Estado na Região? Que fatores, situados fora das fronteiras governamentais, tiveram capacidade para determinar a forma e o conteúdo da ação governamental? Como é amplamente registrado na historiografia do Rio Grande do Norte, o cultivo do algodão já era feito em terras do atual Estado, desde os primórdios da colonização, mas foi o desenvolvimento da indústria têxtil inglesa, a quebra do fornecimento de algodão americano para a Inglaterra, em decorrência da Guerra de Secessão de 1860-1864, a consolidação da cultura do café e o deslocamento do centro hegemônico da economia brasileira do Norte para o Centro-Sul, que provocaram o vertiginoso crescimento da demanda por algodão, a consolidação da atividade algodoeiro-pecuária e o surgimento de novos atores sociais, que não somente passaram a disputar cargos na administração federal, como a constituir um projeto hegemônico que deslocou o centro de poder da região canavieira, no Litoral Oriental, para o Oeste e o Seridó, exatamente as áreas onde se concentrou a produção de algodão. Seis sertanejos, sendo cinco seridoenses – José Augusto Bezerra de Medeiros, Juvenal Lamartine, Dinarte de Medeiros Mariz, Walfredo Gurgel, José Cortez Pereira de Araújo – e um oestano, Dix-Sept Rosado, foram sucessivamente eleitos Governadores do Rio Grande do Norte e manejaram instrumentos de política econômica que podem ser considerados complexos, principalmente para a época anterior à Sudene, quando ainda não havia sistemas de planejamento e finanças estruturados, além de terem contribuído para a consolidação de uma forte presença do Estado na região algodoeira e, principalmente, no Seridó, mediante a realização de estudos, investimentos, concessão de financiamentos, isenções fiscais e atividades educacionais e cooperativas, pautadas, inclusive, por uma estreita articulação com a Igreja Católica. O Rio Grande do Norte, a Paraíba e o Ceará foram os Estados de onde primeiro se irradiou a forma institucionalizada de combate aos efeitos das secas, concretizada por um conjunto de organizações formais, criadas com a finalidade de tratar dos problemas ocasionados pelas secas, e em nome destas, de realizar os investimentos e desenvolver as atividades requeridas para viabilizar a formação da infra-estrutura hídrica necessária, por meio da construção de açudes e da perfuração de poços, complementada com a construção de estradas destinadas ao escoamento da produção oriunda do complexo algodoeiro-pecuário. Foi a partir do início do século XX que se criaram as Comissões de Açudes e Irrigação, de Perfuração de Poços e de Estudos e Obras Contra as Secas, sendo a primeira localizada no Ceará e as duas últimas no Rio Grande do Norte. Como forma de assegurar regularidade institucional e financeira 275 à ação do Estado, foram essas Comissões transformadas na Inspetoria de Obras Contra as Secas–IOCS, em 1909, depois denominada de Inspetoria Federal de Obras Contra as Secas–IFOCS, em 1919, e, finalmente, de Departamento Nacional de Obras Contra as Secas–DNOCS, em 1945, com sede no Rio de Janeiro e unidades descentralizadas denominadas Distritos, um dos quais, sediado no Rio Grande do Norte, foi criado em 1951. O saldo de realizações do DNOCS e das organizações que o antecederam na mesma função, a IOCS e a IFOCS, inclui a realização de estudos sobre a ecologia regional, a implantação de infraestrutura hídrica e estradas, estas últimas ligando o Seridó ao Litoral, onde se localizavam os portos de Natal, Macau e Areia Branca, por intermédio dos quais eram escoados os produtos de exportação, entre eles algodão, sal, cera de carnaúba e açúcar. Atualmente, o Estado possui um total de 2.259 açudes (públicos, particulares e comunitários), com mais de 100 mil metros cúbicos de água armazenável, totalizando 4,07 bilhões de metros cúbicos de capacidade total acumulada, dos quais 78% se encontram na Bacia do Piranhas-Açu, onde se insere a Região do Seridó. (Serhid, 1999: 3.) A primeira rodovia do Estado, construída em 1915, partiu de Macaíba, distante 18 quilômetros de Natal, exatamente em direção ao Seridó, onde se concentravam o efetivo bovino e o cultivo do algodão. No entanto, o impulso na construção de estradas somente veio a ocorrer em 1927, com a criação do “Fundo Especial para Estradas de Rodagem” e a atuação conjunta do governo estadual/IFOCS, mediante a qual foram construídos vários trechos de estradas secundárias, conectadas ao eixo da “estrada de penetração do Seridó” e às linhas férreas que ligavam as cidades do Oeste com Mossoró, o centro comercial da segunda região produtora de algodão, contígua à Região do Seridó. (Lima & Takeya, 1999: 118-119.) A outra face da presença do Estado no Seridó, no período objeto da análise, configurou-se na política fiscal, por meio da qual o Estado agia do lado das receitas, cobrando imposto de exportação e, do lado das despesas, isentando os investidores que se dispusessem a instalar unidades de beneficiamento de algodão no Rio Grande do Norte; e na política de terras, com a qual o Estado – já naquela época – criava um imposto territorial e regulamentava a ocupação de terras devolutas, condicionando-a à comprovação de residência e exploração habituais. O Estado também se fez presente na Região por meio da criação do Serviço Estadual do Algodão, em 1924, e da Estação Experimental do Seridó, Fazendas de Sementes e Campos de Cooperação para multiplicação de sementes selecionadas, a partir de 1926. Por estes mecanismos, o Estado garantia a qualidade da semente, defendo-a da infestação de pragas provenientes de outras regiões. Em 1927, foi criado o Serviço de Classificação do Algodão, com uma Seção permanente em Jardim do Seridó. Aquele Serviço chegou a cadastrar 400 usinas beneficiadoras de algodão, cujo produto era inspecionado, classificado e marcado com as iniciais do Rio Grande do Norte, para somente depois ser exportado. Não era difícil também, por este meio, chegar ao fornecedor do produto para a usina, o que praticamente fechava o ciclo de controle do Estado sobre a atividade algodoeira, menos, evidentemente, a apropriação do excedente pelas grandes empresas multinacionais dos ramos têxteis e de óleos vegetais. Em 1928, foi construído o Açude Cruzeta, sendo ali desenvolvidos experimentos com irrigação aplicada ao cultivo do algodão. (Lima & Takeya, 1996: 118-129.) Foi também em torno do algodão que as políticas de financiamento e assistência técnica se concretizaram na Região do Seridó. Destacam-se, como marcos da política de financiamento, a criação do Banco do Estado do Rio Grande do Norte (inicialmente Banco de Natal), no início do século XX, e 276 sua posterior expansão para os centros polarizadores da produção de algodão, isto é, Caicó, Currais Novos e Mossoró. Foi também o algodão que promoveu a interiorização do Banco do Brasil, com a instalação de agências nos dois centros polarizadores da Região do Seridó – Currais Novos e Caicó –, contribuindo, ademais, para a criação e interiorização do Banco do Nordeste, já na década de 1950. O marco da política de assistência técnica e extensão rural foi a criação da Associação Nordestina de Crédito e Assistência Rural–ANCAR, com sede em Recife, Pernambuco, em fevereiro de 1954, por intermédio de convênio firmado entre a Agência Interamericana de Desenvolvimento– AID, o Banco do Brasil–BB e o então Banco do Nordeste do Brasil–BNB. Em 1955, iniciaram-se as atividades da ANCAR-RN, apoiada por Escritório Regional e cinco Escritórios Locais, atuando como uma extensão da ANCAR (Regional), reproduzindo a metodologia e estrutura da Associação de Crédito e Assistência Rural de Minas Gerais–ACAR-MG, por onde entrou a extensão rural no Brasil, no final dos anos 40. Em 1958, foi criado o Programa Cooperativo de Extensão Rural do Rio Grande do Norte, mediante convênio firmado entre o governo do Estado, a ANCAR (Regional), o BNB e o Serviço de Assistência Rural (SAR), organização não-governamental ligada à Igreja Católica, em Natal. O aporte de recursos de outras fontes, além do governo do Estado, entre elas os Ministérios da Agricultura e da Educação e Cultura, o Banco do Brasil, o Escritório Técnico da Agricultura, a AID, além das Prefeituras Municipais, garantiu a presença desse serviço em diversas regiões, inclusive no Seridó. A segunda metade dos anos 50 caracterizou-se como uma fase de grande ebulição social no Nordeste, com maior visibilidade na Zona Litoral-Mata de Pernambuco, com a criação das Ligas Camponesas e a vitória de governadores de oposição. No Rio Grande do Norte, a Igreja Católica já vinha desenvolvendo um trabalho sociorreligioso, que apesar de conhecido pela denominação “Movimento de Natal”, de onde se originou, expandiu-se para todo o Estado, por intermédio das chamadas “Escolas Radiofônicas”. A orientação social das “Escolas Radiofônicas”, diferentemente daquela seguida pelas Ligas Camponesas, fundamentava-se na reconciliação dos interesses entre patrões e empregados, na assistência social e na organização popular, por meio de mecanismos institucionais reconhecidos pelo Estado, como os sindicatos e as cooperativas. Esses dois atores sociais, ou seja, a Igreja Católica e o Movimento Sindical, voltam a ter, no presente, importância estratégica na definição e na gestão das políticas públicas contemporâneas. Foi nesse contexto histórico, portanto, que os proprietários ligados ao complexo algodoeiropecuário exerceram sua hegemonia, contribuindo, de forma decisiva, para a manutenção da “solução hidráulica”, como estratégia fundamental de tratamento dos problemas na Região do Seridó, pelo menos até o final dos anos 50, quando foi criada a Sudene e desenhada a nova forma de ação do Estado no Nordeste brasileiro e no Rio Grande do Norte, em particular, cujas conseqüências foram fundamentais para consolidar a presença do Estado no Seridó norte-rio-grandense. 3.6.2.2 Mudanças na Intervenção Estatal: Planejamento para o Desenvolvimento Regional (1960 -70) O início dos anos 60 foram marcados por profundas mudanças no cenário político estadual e, consequentemente, na presença do Estado no Seridó. A principal mudança referiu-se ao fim do “ciclo dos governadores”, articulados entre os atores sociais mais importantes do complexo algodoeiropastoril. 277 Aluísio Alves, que fora o primeiro superintendente da Legião Brasileira de Assistência–LBA, no Rio Grande do Norte, combinou o assistencialismo da LBA com a política do governo americano de doação de alimentos. Além disso, estabeleceu propostas de modernização dos serviços públicos e utilizou um marketing eleitoral inovador na política local. Candidato a governador, Aluísio Alves obteve o apoio de dois ex-correligionários de Dinarte Mariz (seu antigo aliado e naquele momento já ferrenho opositor) – os empresários Odilon Ribeiro Coutinho, da agroindústria canavieira, e Aristófanes Fernandes, da agroindústria algodoeira, “homens de dinheiro” dispostos a financiar a campanha. Tomou como candidato a Vice-Governador o Monsenhor Walfredo Gurgel, político caicoense, há anos auto-recolhido à direção do Ginásio Diocesano de Caicó, por desavenças políticas no seio da oligarquia seridoense. Com essa engenharia política, conseguiu dividir os mais lídimos representantes da política estadual, elegendo-se Governador do Rio Grande do Norte, em campanha onde não faltaram ramos e folhas e às vezes plantas inteiras carregadas por populares que compareciam aos comícios. O verde das plantas, naquele momento, simbolizava a Cruzada da Esperança, como era denominada a coligação partidária que apoiou a candidatura de Aluísio Alves. 102 No governo Aluísio Alves, a presença do Estado no Seridó baseou-se em programas direcionados para o desenvolvimento do Rio Grande do Norte como um todo, e não, prioritariamente, para uma região, como ocorrera durante os governos dominados por políticos seridoenses. Inspirado na estrutura da Sudene, Aluísio Alves criou a Comissão Estadual de Desenvolvimento, pelo Decreto nº 3.804, de 01/02/1961, instituindo, posteriormente, o Conselho Estadual de Desenvolvimento–CED, pela Lei nº 2.796, de 11/05/1962. Preparou técnicos nas áreas de desenvolvimento, elaboração e análise de projetos, para o que contou com o apoio da Sudene e da Comissão Econômica para a América Latina–CEPAL. Os marcos principais da presença do Estado no Seridó foram constituídos, portanto, pela realização de investimentos direcionados a todo o território estadual, como os que se corporificaram na criação da Companhia de Serviços Elétricos do Rio Grande do Norte–Cosern, da Companhia de Águas e Solos–Casol, da Companhia Telefônica do Rio Grande do Norte–Telern, da Fundação de Habitação Popular–Fundhap, do Serviço Cooperativo de Educação do Rio Grande do Norte–Secern, com o qual foi implantado o método “Paulo Freire” de Alfabetização, e do Departamento Estadual de Estradas de Rodagem–DER, todos instituídos na gestão Aluísio Alves, entre 1961 e 1962. A ênfase na construção de uma burocracia pública complexa, como a que acaba de ser vista, não significou o abandono da “solução hidráulica”. No entanto, ela sofreu um claro arrefecimento, com a construção de apenas nove açudes pelo DNOCS, naquele período, sendo dois públicos e sete em cooperação. 102 A Cruzada da Esperança foi a denominação dada à “frente partidária criada por Aluísio Alves para agasalhar dissidentes da UDN, do PSD, aliados do PTN, PTB e PDC..A Cruzada da Esperança representou um conjunto de força eleitoral imbatível, enquanto viveu. O golpe militar de 1964 alterou a vida política nacional e teve entre as repercussões, no Rio Grande do Norte, a cassação de Aluísio e o fim da Cruzada”. (Silvestre, 1999.).A expressão Cruzada da Esperança havia sido encontrada, anteriormente, em “um artigo publicado pelo acadêmico de medicina e presidente do Comitê Estudantil pró-Aluísio Alves, Quinho Alves Filho, na Tribuna do Norte. Sob o título Cruzada da Esperança, Quinho convocava os jovens universitários à luta, tendo como lema esse slogan, que seria dado ao comitê estudantil. Mas o “marqueteiro” pegou a idéia e transformou-a no nome da coligação dos partidos que apoiavam a candidatura de Aluísio Alves ao Governo do Estado”. (Machado, 1999: 86-87..) 278 Os planos de emergência e as políticas setoriais continuaram a ser executados, mas agora sob a perspectiva inédita de um esforço regional de coordenação, do qual participaram os governadores nordestinos, todos com assento no Conselho Deliberativo da Sudene. A participação do Rio Grande do Norte, entretanto, foi pequena, no que concerne aos investimentos realizados com o apoio daquela Superintendência, pelo menos até a segunda metade dos anos 70. A política de industrialização, que seria decisiva como fator catalisador das mudanças na agricultura, teve, no Rio Grande do Norte, uma de suas menores performances. Estudos realizados naquele período indicam que a política de industrialização foi instituída de forma desigual. Os Estados mais privilegiados com essa política foram a Bahia, Pernambuco e Ceará. Do total de 1.205 projetos aprovados, para todo o Nordeste, no período 1960-77, o Rio Grande do Norte participou com apenas 86 projetos, não se tendo notícia de nenhuma participação mais significativa da Região do Seridó nesse contexto. Devem ser destacados, no entanto, os trabalhos de pesquisa e experimentação agronômicas, concentrados na melhoria genética do algodoeiro arbóreo, nas pesquisas de competição de variedades e na introdução dos programas de fenação e silagem, todos desenvolvidos no Seridó com o apoio da Sudene. Merece registro, igualmente, a importante contribuição da Sudene para a reorganização dos serviços públicos no Rio Grande do Norte, incluindo a institucionalização do planejamento governamental e a criação de órgãos de fundamental importância para o desenvolvimento do Estado e do Seridó, em particular, como a Cosern, a Casol e a Telern, já referidas. 3.6.2.3 A Mudança no Padrão de Intervenção Governamental: de 1970 em Diante O terceiro período foi marcado por profundas mudanças no padrão de intervenção governamental, com a tomada do poder pelos militares, em 1964, e a absoluta centralização do poder decisório no nível central de governo. A estratégia de desenvolvimento regional defendida pelo GTDN foi substituída pelo desdobramento de diretrizes e políticas concebidas a nível nacional, enquanto a Sudene foi progressivamente esvaziada e marginalizada, transformando-se numa mera agência repassadora de recursos e executora de decisões incluídas nos chamados Planos Nacionais de Desenvolvimento (PND). A seca de 1970, a primeira, de grandes proporções, após a criação da Sudene, trouxe à tona os mesmos problemas evidenciados nas secas anteriores, porém de forma agravada, face ao progressivo afastamento daquela Superintendência dos problemas estruturais do Nordeste e à conseqüente ineficácia das políticas adotadas durante todo aquele período. Repetiram-se as cenas de lavradores famintos, os saques a trens e a invasão das cidades, como último recurso dos camponeses e trabalhadores rurais para se manterem vivos. E novamente se instalaram as frentes de emergência, o repetido paliativo das épocas críticas. Apesar dessa realidade, o novo modelo de crescimento econômico – baseado na abertura ao capital internacional e na busca da consolidação do desenvolvimento industrial – reservou um novo papel para regiões como o Nordeste e a Amazônia. A estratégia de “integração nacional”, então adotada, não mais via essas regiões como “áreas problemas”, mas como “parceiras” no alcance dos 279 “grandes objetivos nacionais” e na implantação dos chamados “projetos de impacto”, que constituíram a “marca” dos governos daquela época. Foi nesse contexto que se verificou o fim dos Planos Diretores da Sudene, que se constituíram nos instrumentos de planejamento devidamente aprovados pelo Congresso Nacional, seguido pela adoção de um novo estilo de planejamento e intervenção governamental, caracterizado pela predominância de programas, projetos e medidas de ordem setorial, concentrados em espaços econômicos restritos e com maior capacidade de resposta imediata, com a adoção dos PND. O I PND incluiu dois grandes “projetos de impacto”: o Programa de Integração Nacional–PIN e o Programa de Redistribuição de Terras e de Estímulo à Agroindústria do Norte e Nordeste–Proterra. O PIN foi lançado pelo Presidente Médici, após uma visita à área afetada pela seca de 1970. Os principais integrantes desse plano se constituíam na construção das rodovias Transamazônica e Cuiabá-Santarém, no aproveitamento das áreas marginais dessas estradas, para instalação de projetos de colonização, e na implementação do Programa de Irrigação do Nordeste, orientado para o aproveitamento dos vales úmidos da Região. O Proterra previa duas linhas principais de atuação: o apoio ao pequeno produtor, minifundista ou desprovido de terras, mediante o assentamento em áreas adquiridas por compra ou desapropriação e a execução de programas de modernização agropecuária e agroindustrial, apoiados por financiamentos a longo prazo e juros subsidiados. O II PND (1975-79) definiu como pontos principais da sua estratégia para o Nordeste a implantação de grandes complexos industriais articulados, como o Pólo Petroquímico e o Pólo de Fertilizantes do Nordeste; o Complexo Mineral-Petroquímico Regional (no circuito Salvador-AracajuMaceió) e o fortalecimento dos pólos industriais tradicionais, a exemplo do Têxtil e de Confecções e do Couro-Calçadista; a continuidade da execução do Programa de Agroindústria do Nordeste, do Programa de Irrigação do Nordeste e a execução dos chamados “Programas Especiais de Desenvolvimento Regional”, entre os quais se destacaram, pela importância para a região semi-árida do Nordeste brasileiro, o Programa de Desenvolvimento de Áreas Integradas do Nordeste–Polonordeste e o Programa Especial de Apoio ao Desenvolvimento da Região Semi-Árida do Nordeste (Projeto Sertanejo). Os programas, os projetos e as medidas acima caracterizados foram sempre complementados, de forma direta ou indireta, por instrumentos básicos de política econômica, entre os quais os incentivos fiscais, o crédito subsidiado, a assistência técnica e extensão rural e a pesquisa agropecuária caracterizaram-se como formas mais concretas de intervenção do Estado na região semi-árida do Nordeste brasileiro. A presença do Estado, na Região, tornou-se facilmente visível pelo extraordinário crescimento da infra-estrutura energética, rodoviária e de telecomunicações; pela modernização, crescimento e mudanças na composição do parque industrial e pela implementação de grandes empreendimentos agropecuários. 103 Apesar das elevadas taxas de crescimento econômico, a grande seca de 1979-83 veio, mais uma vez, revelar a persistência dos velhos problemas da vulnerabilidade às secas, da estrutura agrária 103 Alguns dados relativos ao período 1960-80 são bastante ilustrativos das mudanças ocorridas no Nordeste neste período: o produto interno bruto do Nordeste cresceu 7,1%; o produto industrial mais do que quadruplicou; a infra-estrutura energética cresceu 1.156%; e, a rede pavimentada federal cresceu 1.136%. (Carvalho, 1987: 237-240.) 280 injusta, dos baixos salários, do analfabetismo, da carência alimentar, das reduzidas oportunidades de ocupação e renda, dos restritos efeitos internos do crescimento industrial e da “modernização conservadora” possibilitada por alguns dos grandes projetos agroindustriais financiados com incentivos fiscais e com crédito rural subsidiado. Por tudo isto, a primeira metade dos anos 80 foi marcada por uma intensa rediscussão dos problemas do Nordeste, da qual participaram diferentes atores sociais, com distintas visões do processo de desenvolvimento, entre eles os novos Governadores, eleitos pela primeira vez, pela via direta, em 1982, após o golpe militar de 1964. Do mesmo esforço, participaram a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil–CNBB, a Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura–Contag e as Federações dos Trabalhadores na Agricultura–Fetags da Região Nordeste, e seus respectivos Sindicatos, além do Banco Mundial, de longe a principal agência internacional de financiamento de programas de desenvolvimento rural na Região. A problemática da seca foi objeto de um grande número de Congressos, Seminários e outros tipos de manifestações coletivas, entre os quais podem ser destacados, pela sua repercussão no âmbito nacional, os Encontros Interestaduais realizados pela CNBB, Contag e Fetags em Fortaleza, Natal e Teresina, respectivamente em julho de 1981, maio de 1982 e agosto de 1983; o Ato Público realizado em Afogados da Ingazeira, em Pernambuco, reunindo mais de cinco mil trabalhadores rurais; e o engajamento dos meios de comunicação, notadamente as redes de televisão e suas campanhas filantrópicas. A resposta do Governo veio sob a forma de uma ampla avaliação das políticas e programas de desenvolvimento regional e da elaboração de uma nova política de desenvolvimento para o Nordeste, contemplando um elenco de diretrizes de natureza global e setorial, que ficou conhecida sob a denominação de Projeto Nordeste. No entanto, a exemplo do que já havia acontecido em outros momentos da intervenção do Estado no Nordeste brasileiro, passado o período crítico da grande seca de 1979-83, com ele também arrefeceram as manifestações coletivas que deram origem à elaboração da estratégia de desenvolvimento incorporada pelo Projeto Nordeste. Valendo-se das numerosas críticas que antecederam à própria elaboração do Projeto Nordeste, entre elas as que associavam a ineficiência da ação governamental à existência de um grande número de programas similares, competindo pelas mesmas fontes de recursos, o governo federal resolveu unificar os diversos programas especiais (Polonordeste, Projeto Sertanejo, Procanor e Prohidro), englobando-os em um único instrumento de política regional, o Programa de Apoio ao Pequeno Produtor Rural (PAPP). Ao unificar os programas especiais, o governo federal não só atendeu às recomendações do Banco Mundial, que havia estimulado e acompanhado todo o processo de elaboração do PAPP, como garantiu financiamentos individuais para cada um dos Estados do Nordeste; reduziu os potenciais problemas de déficit fiscal e os conflitos político-institucionais que uma intervenção multissetorial da magnitude do Projeto Nordeste poderia acarretar; e, por último, mas não menos importante, aproximouse do Movimento Sindical, incluindo seus representantes nas Comissões Paritárias Estaduais e na Comissão Regional de Desenvolvimento Rural–CRDR, a quem competia, nos âmbitos estadual e regional, respectivamente, a análise das propostas anuais de aplicação dos recursos do PAPP, em cada um dos Estados do Nordeste. O PAPP foi objeto de reformulação, por recomendação do Banco Mundial, em decorrência do que foi transformado num único fundo de financiamento de pequenos 281 projetos identificados, elaborados e executados pelas próprias comunidades rurais, por intermédio de suas organizações representativas. A proliferação de organizações comunitárias que se seguiu a esse processo foi vertiginosa, posto que estimulada por diferentes atores sociais, com diferentes mensagens e interesses, entre os quais se incluíram lideranças políticas dos mais diferentes matizes ideológicos, organizações não-governamentais, empresas e escritórios de projetos mais ou menos comprometidos com o processo de desenvolvimento, que poderia ser ensejado por esses pequenos investimentos no âmbito local. Além das políticas públicas acima referidas, se faz presente, na região do Seridó, uma série de instrumentos de política social consagrados nos modelos clássicos de “Welfare State”, entre os quais se incluem a educação, a saúde, a previdência social e a nutrição. Verifica-se também, na região, a presença de outros setores importantes de políticas sociais incorporadas à agenda governamental por força de convênios com os Governos Federal e Estadual e por iniciativas das próprias administrações municipais, entre eles o saneamento, a habitação, o transporte público escolar e as linhas específicas de financiamentos destinadas à geração de ocupação e renda no âmbito local. 3.6.3 Panorama Institucional Atual As instituições que atuam nos municípios do Seridó, foram classificadas, para os fins do presente estudo, em sete grandes grupos: i) governamentais; ii) não-governamentais; iii) empresariais; iv) sindicais; v) organizações civis; vi) instituições judiciárias; e vii) outras categorias. Em seu conjunto, as instituições que atuam na região formam um quadro de mais de quinhentas entidades, cuja base de dados está apresentada nas tabelas 3.6.3.1, 3.6.3.2, 3.6.3.3 e 3.6.3.4, apresentadas ao final deste item 3.6.3, das quais constam as matrizes institucionais sintéticas das três Zonas Homogêneas, juntamente com uma matriz consolidada para as mesmas três ZH. Para cada uma dessas quatro tabelas constam os correspondentes gráficos, plotados depois das respectivas tabelas. As mais expressivas das instituições encontradas no Seridó são aqui analisadas, segundo a natureza de suas atividades e os grupos em que se situam. 3.6.3.1 Organizações Governamentais Nesse rol estão considerados os órgãos e entidades oficiais, ou seja, os que se encontram situados no âmbito dos governos federal e estadual. Em linhas gerais, a atuação das organizações desse aparato institucional, na Região do Seridó, já foi abordada no item referente à Presença do Governo; faz-se, agora, uma descrição mais detalhada de algumas daquelas instituições que mais diretamente atuam nos diversos municípios seridoenses. No caso das instituições situadas no âmbito da administração municipal (embora integrantes deste grupo), optou-se por tratá-las em item específico, no qual se procurou fazer uma avaliação do Sistema Municipal de Governo na região. Isso foi feito com o intuito de, desde logo, se passar a dispor de uma base para o delineamento posterior de estratégias e linhas de ação voltadas para o aprimoramento desse Sistema, de modo a capacitá-lo a oferecer maior sustentabilidade ao modelo de gestão a ser proposto no âmbito do Plano de Desenvolvimento Sustentável do Seridó. 282 a. Integrantes do Governo Federal Diversas entidades vinculadas ao governo federal atuam no Estado do Rio Grande do Norte, como um todo; algumas delas têm unidades operacionais localizadas na Região do Seridó, destacandose como as mais importantes as seguintes: i. Universidade Federal do Rio Grande do Norte–Ufrn. A Ufrn mantém o Centro Regional de Ensino Superior do Seridó–Ceres, Campus de Currais Novos e Campus de Caicó. Em seu conjunto, essas duas unidades têm 80 professores (sendo 30 com nível de graduação, 18 com títulos de especialistas, 30 com nível de mestrado e 2 com nível de doutorado) e oferecem 320 vagas, assim distribuídas: Centro Regional de Ensino Superior do Seridó–Ceres, Campus de Caicó – 245 vagas nos seguintes cursos: Ciências Contábeis – Bacharelado: 45 vagas História – Licenciatura e Bacharelado: 40 vagas Pedagogia – Educação Básica: 40 vagas Geografia – Licenciatura Plena: 40 Direito – Bacharelado: 40 vagas Matemática – Licenciatura Plena: 40 vagas. Centro Regional de Ensino Superior do Seridó–Ceres, Campus de Currais Novos – 75 vagas nos seguintes cursos: Administração – Bacharelado: 40 vagas Português – Licenciatura Plena: 35 vagas. ii. Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis–Ibama O Ibama mantém dois escritórios, um em Caicó e outro em Jardim do Seridó, por meio dos quais exerce, principalmente, ações de fiscalização e controle da exploração de recursos naturais. Administra, ainda, a Estação Ecológica de Serra Negra do Norte. iii. Departamento Nacional de Obras Contra as Secas–DNOCS O DNOCS, que já representou, até passado recente, um importante papel na Região do Seridó, construindo açudes, instalando e administrando projetos de irrigação, limita hoje sua atuação na área a operar a Estação de Piscicultura de Caicó, onde produz alevinos para atender à demanda da região. iv. Fundação Nacional de Saúde–FNS Atua na região por meio do Distrito Sanitário de Caicó. v. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística–Ibge O Ibge atua no Seridó por intermédio de sua Delegacia Regional, que coleta dados e informações destinados a compor seus estudos e publicações demográficas e socioeconômicas. 283 vi. Bancos Oficiais Atuam na região três instituições bancárias, ligadas ao governo federal: Banco do Brasil, Banco do Nordeste e Caixa Econômica Federal. Por intermédio de suas 14 agências, oferecem financiamento a todos os setores da economia, de acordo com as políticas fixadas pela direção daquelas entidades. A atuação dessas instituições foi duramente criticada nas reuniões municipais, notadamente no que diz respeito às linhas de crédito destinadas aos pequenos produtores rurais, cuja utilização foi considerada praticamente inviável, em virtude das exigências burocráticas, principalmente as relacionadas ao oferecimento de garantias e à comprovação de capacidade de pagamento. É de se destacar a existência, no Banco do Nordeste, de um programa denominado "Fundo de Aval", no âmbito do qual são viabilizados financiamentos para a implantação e operacionalização de pequenos negócios não-agrícolas. O Programa funciona em parceria com as Prefeituras, as quais, em conjunto com o banco, constituem um fundo para garantia dos empréstimos concedidos, na proporção de 1 para 10, ou seja, o banco assume 90% dos riscos e a Prefeitura os 10% restantes. Outra contribuição importante prestada pelo Banco do Nordeste ao processo de desenvolvimento institucional na região é a criação do “Farol do Desenvolvimento”, fórum de debates instalado em todos os municípios do Seridó, no qual são discutidas as questões relacionadas ao desenvolvimento local sustentável. b. Integrantes do Governo Estadual De uma maneira geral, operam nos municípios do Seridó, direta ou indiretamente, todas as instituições da esfera estadual. A seguir são citadas aquelas cuja atuação, na região, é mais destacada, quer por desenvolverem ações de interesse mais específico, quer por terem ali escritórios ou agências regionais. i. Empresa de Pesquisa Agropecuária do Rio Grande do Norte–Emparn Desenvolve, em todo o Estado, ações de pesquisa e estudos nas áreas de agropecuária e meteorologia. Mantém uma unidade regional instalada no Campo Experimental de Mundo Novo, no município de Caicó, às margens da rodovia Caicó/Jucurutu, onde desenvolve atividades e projetos como os seguintes: • Laboratório de Análise de Solo, Água, Plantas e Rações. Funciona como unidade de apoio a pesquisas sobre estrutura e fertilidade de solos, qualidade da água e características de plantas e composição de rações, além de prestar serviços aos produtores da região e do Estado. • Central de Incubação de Aves Caipira. Tem uma produção mensal de 28 mil pintos de um dia. Trata-se de projeto destinado à diversificação da agricultura familiar, com apoio do Ministério da Agricultura (Projeto Ave Caipira). • Centro Profissionalizante em Produção Animal. Objetiva criar na região uma estrutura voltada para as atividades de capacitação profissional de criadores, trabalhadores, administradores e pessoal das usinas de beneficiamento de leite, atendendo a todo o semi-árido do Rio Grande do Norte. O projeto conta, atualmente, com recursos no valor de R$ 244.200,00, tendo sido aprovado pela 284 Secretaria de Desenvolvimento Rural do Ministério da Agricultura e Abastecimento. Está atualmente em construção. Além disso, opera uma unidade de pesquisa em Cruzeta, onde dispõe de uma Estação Meteorológica completa, com instrumentos para medição de pluviosidade, ventos, umidade, insolação, etc. e desenvolve pesquisas com forrageiras, manejo sustentável da caatinga e avaliação do desempenho do gado pardo suíço, com produção e venda de reprodutores. Embora operando com sérias dificuldades – decorrentes, principalmente, da carência de meios financeiros –, a Emparn vem desenvolvendo estudos, pesquisas e experimentos da maior importância para a melhoria dos níveis de produtividade da agropecuária da região. ii. Instituto de Assistência Técnica e Extensão Rural do Rio Grande do Norte–Emater Instituição voltada para a difusão tecnológica e apoio técnico (principalmente aos pequenos produtores rurais), a Emater está presente na região por intermédio de 2 Escritórios Regionais (em Caicó e Currais Novos) e de uma rede de 21 Escritórios Municipais com atuação em 24 municípios, dispondo da seguinte equipe técnica: 7 engenheiros agrônomos, 2 médicos veterinários e 37 técnicos agrícolas. Além das atividades de assistência técnica, a Emater esteve muito envolvida na operacionalização do programa de emergência de seca, desde 1997. A instituição vem passando por grandes dificuldades, tanto financeiras (com recursos muito aquém de suas reais necessidades) quanto operacionais, uma vez que seus profissionais mais experientes foram aposentados ou estão em processo de aposentadoria, não havendo renovação nos seus quadros técnicos. Contudo, é inegável a folha de serviços prestados à região, sobretudo no período áureo do sistema de produção do complexo bovinocultura/algodão arbóreo/cultura de subsistência, em relação ao qual se destacam os trabalhos de infra-estrutura hídrica, produção e armazenamento de forragens (capineira, feno e silagem), difusão de sementes selecionadas e controle integrado de pragas no algodão, técnicas para racionalizar o manejo das vazantes, além das ações no campo da saúde, educação e nutrição. 3.6.3.2 Organizações Não-Governamentais Nos últimos anos, em decorrência, principalmente, do fraco desempenho do setor público, tem ocorrido um fenômeno inovador que, aos poucos, vai assumindo maior importância e fazendo com que a própria sociedade se mobilize para criar oportunidades autônomas de investimento, principalmente na área social. Trata-se do surgimento das chamadas Organizações Não-Governamentais–ONGs. Atuando de forma independente do setor público (embora, em alguns casos, contratadas por órgãos governamentais), essas organizações têm mobilizado recursos técnicos, materiais e financeiros destinados a implementar projetos de desenvolvimento social, principalmente junto a pequenas comunidades. A rigor, a atuação dessas instituições tende a ser mais eficiente do que a do Estado, cujos projetos (particularmente os desenvolvidos na área social) têm sua execução comprometida por entraves das mais diversas naturezas, que vão desde a escassez e intempestividade dos recursos até a rigidez de seus processos burocráticos. As ONGs, ao contrário, podem operar com mais flexibilidade e facilidade administrativas e, principalmente, assumir uma postura participativa de mobilização da sociedade e seu envolvimento nos processos decisórios. Por essas razões, já se começa a perceber que várias instituições multilaterais ou órgãos de países desenvolvidos, voltados para o fomento ao desenvolvimento, tendem a preferir direcionar o 285 apoio financeiro a projetos não-governamentais, principalmente quando voltados para pequenos produtores rurais e para desenvolvimento comunitário. Esse fenômeno também já se manifesta na Região do Seridó, onde várias Organizações–Não Governamentais atuam, tanto nas zonas urbanas quanto nas rurais, principalmente na área social, assistindo pequenas comunidades. Dentre as ONGs que atuam mais diretamente na Região destacam-se as abaixo descritas. a. Grupo de Estudos de Desertificação do Seridó–GEDS Atuando desde 1997, o GEDS tem como objetivos conceber, propor e pôr em prática medidas destinadas a controlar o processo de desertificação que ameaça a Região do Seridó. É ainda um grupo informal (não tendo, portanto personalidade jurídica definida), que congrega representantes de organizações governamentais, não-governamentais, sindicatos, etc. b. Serviço de Apoio aos Projetos Alternativos Comunitários–Seapac Entidade vinculada à Igreja Católica do Rio Grande do Norte, seu braço executivo na Região do Seridó encontra-se no âmbito da Diocese de Caicó. Desenvolve um diversificado elenco de ações, dentre as quais destacam-se aquelas voltadas para: • fortalecimento das organizações comunitárias, não apenas na internalização da prática associativa como, também, no apoio técnico em termos de assessoria para elaboração, implantação e gerenciamento de pequenos projetos voltados para a produção familiar; • a promoção de cursos de formação e capacitação em diversas áreas; • a prestação de assistência técnica aos pequenos produtores rurais reunidos em associações; • participação em conselhos de políticas públicas municipais; • apoio e fortalecimento do movimento sindical; e • apoio à execução de projetos governamentais destinados a pequenos produtores, com destaque para o PAPP e o Pronaf. Além das atividades voltadas para os objetivos acima, o Seapac também atua no sentido de mobilizar recursos de fontes diversas (principalmente de entidades ligadas à Igreja Católica, como a Misereor e a Cáritas), com os quais viabiliza projetos destinados à geração de trabalho e renda e melhoria da qualidade de vida de pequenas comunidades. c. Associação de Apoio às Comunidades do Campo–AACC Criada com o apoio da Fundação Konrad Adenauer, a AACC tem um perfil assemelhado ao do Seapac e também atua junto a pequenas comunidades rurais. Muito embora suas ações, atualmente, estejam mais localizadas na Zona Oeste do Rio Grande do Norte, já marcou presença na Região do Seridó, onde eventualmente ainda desenvolve algum tipo de atividade. 286 3.6.3.3 Organizações Empresariais Este grupo abriga instituições da esfera da iniciativa privada, que desempenham funções importantes no processo de desenvolvimento da região; descrevem-se, a seguir, as de atuação mais destacada. a. Cooperativas Há nos diversos municípios do Seridó 25 cooperativas que, congregando principalmente produtores rurais, atuam nas áreas de eletrificação rural e apoio à produção agropecuária. Além da concessão de financiamentos para investimentos e custeio e do fornecimento de insumos, essas cooperativas procedem ao beneficiamento e/ou industrialização da produção de seus associados, com destaque para o ramo de lacticínios e fruticultura. Algumas delas dispõem de unidades de processamento de rações e contam com patrulhas mecanizadas para a prestação de serviços aos cooperados. Sensíveis às alterações ocorridas na base econômica da Região do Seridó, as cooperativas atravessam uma fase delicada, vivendo um processo de transição em que buscam adequar-se à nova conjuntura de uma economia globalizada, de forma a adquirirem maior eficiência e melhorarem a qualidade de seus produtos, para que se capacitem melhor à competição que caracteriza tal conjuntura. Merecem registro, também, as cooperativas de serviços e as de trabalho, notadamente as que atuam no setor de bordados e confecções, que representam um eficiente canal de comercialização desses produtos, atividade econômica de significativa importância na formação da renda familiar. Como tem sido uma constante no cooperativismo nordestino, também no Seridó as instituições cooperativas enfrentam uma série de dificuldades, que envolvem a falta de conscientização dos associados, a precariedade ou inadequação dos processos gerenciais e a falta de apoio das instituições oficiais de crédito. b. Serviço Brasileiro de Apoio às Micros e Pequenas Empresas–Sebrae Instituição que atua em âmbito nacional (através de suas filiadas estaduais) o Sebrae tem como objetivo central o apoio à atividade empresarial de pequeno porte, voltado para o fomento e difusão de programas e projetos que visam a promoção e o fortalecimento das micro e pequenas empresas. Vem desenvolvendo trabalho eficiente nos municípios que compõem a Região do Seridó (onde tem dois escritórios – Currais Novos e Caicó), ali operando em parceria com várias instituições governamentais e não-governamentais na execução de inúmeros projetos. c. Federação das Indústrias do Rio Grande do Norte–Fiern Fundada em 27 de fevereiro de 1.953, e reconhecida por Carta Sindical, em 14 de dezembro de 1.953, a Federação das Indústrias do Estado do Rio Grande do Norte–Fiern é uma entidade sindical de grau superior, com base territorial em todo o Estado, congregando os seguintes Sindicatos: Sindicato das Indústrias de Fiação e Tecelagem em Geral do RN; Sindicato das Indústrias do Vestuário no Estado do RN; Sindicato das Indústrias de Torrefação e Moagem do Café do Rio Grande do Norte; Sindicato das Indústrias de Cerveja, Refrigerantes, Águas Minerais e Bebidas em Geral do Rio Grande do Norte; Sindicato das Indústrias de Cerâmica para Construção do Estado do Rio Grande do Norte; Sindicato das Indústrias da Extração de Metais Básicos e de Minerais Não-Metálicos do Rio Grande do Norte; 287 Sindicato das Indústrias Gráficas do Estado do Rio Grande do Norte; Sindicato das Indústrias Metalúrgicas, Mecânicas e de Material Elétrico do Rio Grande do Norte; Sindicato das Indústrias de Doces e Conservas Alimentícias do Rio Grande do Norte; Sindicato das Indústrias da Construção Civil do Estado do Rio Grande do Norte; Sindicato das Indústrias da Extração do Sal no Estado do Rio Grande do Norte; Sindicato das Indústrias de Álcool dos Estados do Rio Grande do Norte, Ceará e Piauí; Sindicato das Indústrias da Construção Civil de Mossoró; Sindicato das Indústrias de Material e Laminados Plásticos do Rio Grande do Norte; Sindicato das Indústrias de Beneficiamento de Fibras Vegetais e Descaroçamento de Algodão do Rio Grande do Norte; Sindicato das Indústrias da Panificação e Confeitaria de Natal; Sindicato das Indústrias de Calçados do Rio Grande do Norte; Sindicato das Indústrias de Curtimento de Couros e de Peles do Estado do Rio Grande do Norte; Sindicato das Indústrias de Laticínios e Produtos Derivados do Rio Grande do Norte; Sindicato das Indústrias de Mármore, Granito e Pedras Ornamentais do Rio Grande do Norte. A estrutura da Fiern é composta de Diretoria Executiva, Departamento de Comunicação Social, Departamento Sindical, Departamento Econômico e Centro de Apoio à Média e Pequena Indústria, além das Diretorias Regionais do Serviço Social da Indústria, do Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial e do Instituto Euvaldo Lodi. Para facilitar o acesso do empresário a informações técnicas, o Sistema Fiern oferece uma série de produtos desenvolvidos não apenas no Rio Grande do Norte, mas também no Brasil e no mundo, entre os quais podem ser destacados: Cadastro Industrial, Fitas de Vídeo para Treinamento, Pesquisa de Fornecedores, Pesquisas sobre Processos de Fabricação, além de Projetos de Desenvolvimento Econômico, a exemplo do Pólo Gás/Sal. d. Federação da Agricultura do Estado do Rio Grande do Norte–Fearn A Federação da Agricultura do Rio Grande do Norte, criada em 1968, é uma Entidade Sindical de Grau Superior, sem fins lucrativos, com sede e foro na cidade de Natal e base territorial no Estado do Rio Grande do Norte. É constituída pela categoria econômica ligada às atividades da agropecuária, do extrativismo rural, da pesca e outras que lhe guardem similitude, inspirando-se na solidariedade social, na livre iniciativa, no direito de propriedade, na economia de mercado e nos interesses do País. Tem como objetivo o estudo, a coordenação, a defesa e a busca de soluções de questões inerentes aos interesses econômicos da categoria que a constitui, cabendo-lhe em especial: i) promover congressos, seminários, grupos e estudos, painéis e conferências, para instrução e debate dos assuntos de importância da classe; ii) coordenar a ação sindical patronal, pautando-a dentro dos princípios constitucionais, para maior acerto e consecução das finalidades corporativas; iii) contribuir de modo significativo para a divulgação dos conhecimentos técnico-científicos que visem a elevação dos índices de produtividade rural e o aperfeiçoamento dos métodos de trabalho e de comercialização; e iv) representar, perante as autoridades administrativas e judiciárias de quaisquer níveis ou instâncias, os interesses gerais da categoria. e. Câmaras de Dirigentes Lojistas–CDL As Câmaras de Dirigentes Lojistas são entidades de classe, sem fins lucrativos, que têm por objetivos: orientar e representar os interesses dos associados junto às demais organizações da sociedade civil e do governo; aproximar os associados e promover o intercâmbio de idéias e conhecimentos relevantes para as práticas comerciais e o exercício da cidadania; promover a política profissional e defender os interesses dos associados; esclarecer a opinião pública sobre as finalidades 288 socioeconômicas das atividades comerciais; cooperar com os poderes públicos e promover serviços de natureza assistencial e realizar serviços de utilidade pública, tais como SPC, SPI, etc. O Estado do Rio Grande do Norte possui uma Federação de Dirigentes Lojistas, localizada em Natal, e 19 Câmaras de Dirigentes Lojistas a ela filiadas, situadas no interior do Estado; na Região do Seridó há duas dessas instituições: uma em Caicó (com 250 associados) e outra em Currais Novos (com 161 filiados). f. Organização das Cooperativas do Estado do Rio Grande do Norte–Ocern A Ocern é o órgão de representação das cooperativas potiguares, integrando todos os ramos das atividades cooperativistas, tendo sido criada em dezembro de 1963. É uma entidade civil sem fins lucrativos, que assessora as cooperativas singulares tanto nas providências relativas à constituição e legalização quanto na realização de estudos, promoção e divulgação, além de estimular o fortalecimento e a integração daquelas entidades. Em todo o Estado, a Ocern congrega 95 cooperativas singulares e três de segundo grau, totalizando 46.693 associados. 3.6.3.4 Organizações Sindicais Enquadram-se neste grupo os sindicatos de trabalhadores rurais e a Federação dos Trabalhadores na Agricultura do Estado do Rio Grande do Norte. a. Sindicatos de Trabalhadores Rurais Na Região do Seridó há 26 sindicatos de trabalhadores rurais. Embora, no geral, sua atuação ainda contemple, de forma acentuada, o exercício de ações assistencialistas e burocráticas (prestação de serviços de assistência médico-odontológica, formulação e acompanhamento de pleitos à previdência social – principalmente de aposentadorias –, distribuição de cestas básicas no âmbito dos Programas de Emergência de Seca, etc.), essas instituições vêm, aos poucos, se firmando como eficientes agentes de defesa de seus associados, à medida que conquistam espaços junto às administrações municipais, buscando opinar e influir na formulação e implementação de políticas públicas, principalmente nas áreas de educação, saúde e agricultura. Tem sido também extremamente importante sua contribuição para o processo de consolidação e aperfeiçoamento das atividades de organização comunitária. Outro aspecto que merece ser destacado é a abrangência de sua articulação com outras instituições (governamentais e não-governamentais) e a facilidade que encontram na prática desse inter-relacionamento. Apoiados por sua entidade central (a Federação dos Trabalhadores na Agricultura do Estado do Rio Grande do Norte–Fetarn), os sindicatos desenvolvem inúmeros trabalhos em parceria com prefeituras, bancos oficiais, associações rurais e urbanas, Emater e tantas outras instituições, no apoio à execução de variados programas e projetos. É de ressaltar, ainda, a atuação extremamente importante que os sindicatos rurais vêm desenvolvendo no sentido de apoiar a execução do Pronaf e do Programa de Emergência de Seca. b. Federação dos Trabalhadores na Agricultura do Estado do Rio Grande do Norte– Fetarn A Fetarn foi criada em 15 de junho de 1962 e oficialmente reconhecida no dia 14 de agosto de 1963, por meio de Carta Sindical expedida pelo Ministério do Trabalho. É a maior entidade sindical do Estado, congregando 126 sindicatos, distribuídos em 10 Pólos Sindicais, congregando 252 mil 289 trabalhadores rurais das seguintes categorias: assalariados, permanentes ou temporários; agricultores familiares, proprietários ou não; trabalhadores sem-terra; aposentados e pessoas ocupadas em atividades extrativistas. Na Região do Seridó estão localizados 26 sindicatos e 2 delegacias sindicais, correspondendo a aproximadamente 20% do total dos sindicatos e dos trabalhadores associados existentes no Estado. O projeto político da Fetarn segue a orientação defendida pela Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura–Contag, em especial no que concerne ao Projeto Alternativo de Desenvolvimento Rural Sustentável–PADRS, cujo objetivo fundamental é estabelecer um novo modelo de desenvolvimento para o País com base na reforma agrária, no fortalecimento da agricultura familiar, na interiorização do desenvolvimento e na implementação de políticas públicas que concedam prioridade à inclusão social e ao resgate da cidadania. 3.6.3.5 Organizações Civis Nos municípios que compõem a Região do Seridó há mais de 450 associações civis, a maioria congregando famílias de pequenos produtores rurais, para as quais viabilizam recursos financeiros de programas e projetos implementados por órgãos governamentais. Dentre aquelas associações foram destacadas, para análise, as Associações Comunitárias e os Conselhos do Fumac. a. Associações Comunitárias As Associações Comunitárias vêm assumindo, gradativamente, um importante papel no quadro institucional da região. Muito embora, de maneira geral, tenham tido sua origem marcada em decorrência de critérios fixados para a concessão de financiamentos oriundos de programas governamentais (notadamente os realizados com recursos do Banco Mundial, como o PAPP, por exemplo) o exercício de suas atividades vem aprimorando o seu desempenho e ampliando o seu raio de atuação, de forma que, aos poucos, passam a constituir um importante segmento, capaz de integrar, de forma eficiente e eficaz, o próprio Sistema Municipal de Governo, representando um importante canal, através do qual as comunidades (principalmente do meio rural) podem exercer seu poder de pressão política e seus direitos de cidadania. Seu desempenho atual, no entanto, ainda é muito limitado a reivindicações de pleitos localizados no âmbito da própria comunidade, representados por pequenos projetos que, infelizmente, ainda se mostram vulneráveis, dispersos e isolados, pelo pouco planejamento das ações a nível municipal. Tais projetos, além disso, são marcados por processos deficientes de elaboração e análise, pela carência de pessoal qualificado para planejar e implementar o desenvolvimento municipal participativo e pelo despreparo técnico nos recursos humanos locais, com pouca (ou quase nenhuma) capacidade nos aspectos gerenciais, tanto na fase de implementação quanto no que diz respeito ao seu funcionamento. A propósito, cabe ressaltar que um dos principais problemas na implementação dos projetos comunitários é a falta de serviços adequados de Assistência Técnica, para garantir a sua sustentabilidade. Isto porque nas instituições envolvidas não há suficiente capacidade operacional e financeira para atender as múltiplas demandas das comunidades, embora existam profissionais articulados á instituições que demonstram uma certa experiência e formação técnico-administrativa, mas cuja gestão, de certa forma, é comprometida. 290 Deve ser destacada, no entanto, a existência de um conjunto de associações comunitárias, cujas experiências inovadoras de formulação e implementação de investimentos comunitários associativos estão contribuindo de forma efetiva para a geração de ocupação e renda e para a construção da cidadania. Incluem-se neste caso, investimentos em olarias, beneficiamento de leite, queijarias, com assistência técnica e gerencial aportada por organizações não governamentais ligadas à Igreja Católica e Cooperativas de Serviços Técnicos com atuação na Região. b. Conselhos Municipais do Fumac O Fundo Municipal de Apoio Comunitário–Fumac é uma das formas sob a qual são viabilizados projetos destinados a melhorar a qualidade de vida das pequenas comunidades rurais, no âmbito do Projeto de Combate à Pobreza Rural–PCPR, financiado pelo Banco Mundial. De acordo com a sistemática adotada pelo PCPR (que, no Rio Grande do Norte, ainda conserva a denominação de Projeto de Apoio ao Pequeno Produtor–PAPP), para serem acolhidos no Programa os projetos devem ser aprovados por um Conselho Municipal, que se responsabiliza, igualmente, pela supervisão de sua implantação e gerenciamento. Para atender a tal exigência, a unidade responsável pela condução do PAPP apoia as comunidades rurais quanto às atividades de criação e funcionamento dos respectivos Conselhos. Na Região do Seridó há 18 desses Conselhos que, embora criados com a finalidade específica de integrarem o sistema de funcionamento do PAPP, têm se mostrado um importante instrumento de organização comunitária, em alguns casos desempenhando funções que vão além dos objetivos contemplados em sua concepção original. 3.6.3.6 Instituições Judiciárias Ainda compondo o panorama institucional da região, há que considerar a existência das instituições pertencentes ao Poder Judiciário e ao Ministério Público. Essas instituições realizam ações ou prestam algum tipo de serviço de interesse público. a. Poder judiciário Braço jurídico do poder estatal, tem a finalidade de solucionar as lides ou pendências em suas mais variadas esferas. É dividido em Comarcas e classificado de acordo com o número de habitantes da sede do município ou do distrito. Na Região do Seridó há um total de 13 Comarcas, sendo duas de 3ª Entrância (Caicó e Currais Novos), ambas com duas Varas e maior volume de processos, cinco de 2ª Entrância (Acari, Jardim do Seridó, Jucurutu, Parelhas e Santana do Matos), com apenas uma Vara e um volume menor de processos. As demais, enquadradas na categoria de 1ª Entrância, são as Comarcas de Cruzeta, Florânia, Jardim de Piranhas, São João do Sabugi, São Tomé e Serra Negra do Norte, com apenas uma Vara por Comarca. Em todas as Comarcas, há um Juiz titular para cada Vara. b. Ministério Público De acordo com a Lei Federal n.º 8.625/93 e a Lei Estadual complementar n.º 141/96, o Ministério Público, por meio de seus Promotores Públicos, atua na Região do Seridó em todas as Comarcas e Varas existentes. O Ministério Público, pela definição constitucional, não faz parte do poder judiciário, cabendolhe a preservação da justiça e a fiscalização da correta aplicação da lei. Em sua lei orgânica, o Ministério Público se incumbe da defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses individuais e 291 sociais. Dispõe de independência funcional, e tem competência para tratar dos mais variados interesses, incluídos o direito ambiental e suas variáveis, a defesa do patrimônio histórico, e quaisquer outros em que se faça necessária a intervenção do poder público. 3.6.3.7 Outras Categorias O quadro institucional da Região do Seridó é integrado, ainda, por várias outras entidades, que, embora não se enquadrem na classificação adotada no presente relatório, de certa forma desenvolvem ações ou prestam algum tipo de serviço de interesse público. São Lojas Maçônicas, associações desportivas e culturais, Clubes de Serviços, etc. Destacam-se, pela sua importância para a futura implementação do Plano de Desenvolvimento Sustentável do Seridó, as especificadas a seguir. a. Associações de Municípios Os municípios da Região do Seridó agruparam-se em duas associações: a AMSO (Associação dos Municípios do Seridó Ocidental) e a AMS (Associação dos Municípios do Seridó). A primeira tem sede em Currais Novos e a segunda em Caicó. Com o objetivo principal de apoiar as administrações municipais em termos de aprimoramento de seu desempenho gerencial, essas Associações realizam programas de treinamento e capacitação de servidores e viabilizam a internalização de técnicas e métodos mais modernos de administração e gerência. Funcionam, igualmente, como um importante fórum de debates para as questões relacionadas ao processo de desenvolvimento dos municípios a elas vinculados, além de se constituírem em sólido instrumento de reivindicação política junto às demais esferas de governo e às próprias lideranças políticas representativas dos interesses da região. É a seguinte a distribuição dos municípios pelas duas Associações: • Vinculadas à AMSO: Acari; Carnaúba dos Dantas; Currais Novos; Equador; Parelhas; Jardim do Seridó; Ouro Branco; Santana do Seridó; Bodó; Cerro Corá; Florânia; Lagoa Nova; Santana do Matos; São Vicente; e Tenente Laurentino Cruz; e • Vinculadas à AMS: Caicó; Cruzeta; Ipueira; Jardim de Piranhas; São Fernando; São João do Sabugi; São José do Seridó; Serra Negra do Norte; e Timbaúba dos Batistas b. Diocese de Caicó Os órgãos e entidades ligados à Diocese de Caicó representam papel de suma importância no quadro institucional da Região do Seridó. Além do Seapac (descrito na alínea a do subitem 3.6.3.2 anterior) as Paróquias vinculadas à Diocese se caracterizam por uma eficiente atuação nos diversos municípios do Seridó. Tendo como função básica o apoio espiritual e social aos fiéis, segundo a doutrina cristã, essas instituições não limitam suas ações ao plano exclusivamente espiritual, mas desenvolvem um sem número de atividades voltadas para a melhoria das condições de vida das populações dos municípios em que se situam. Com o decidido apoio da Diocese, põem em prática, com indiscutível sucesso, programas voltados para objetivos, dentre outros, como os seguintes: combate ao trabalho do menor; apoio ao menor carente; combate à desnutrição infantil; defesa dos direitos humanos; combate às drogas e à prostituição infantil; capacitação de mão-de-obra. O trabalho desenvolvido pelas suas diversas pastorais em muito tem contribuído para a melhoria da qualidade de vida da população carente da região. 292 b. Batalhão de Engenharia de Construção O Exército Brasileiro mantém, em Caicó, uma unidade da Arma de Engenharia, que presta inestimáveis serviços, em termos de construção e conservação de estradas, construção de barragens e adutoras. O Batalhão também tem colaborado na administração dos Programas de Emergência de Seca. TABELA 3.6.3.1 MATRIZ INSTITUCIONAL – ZONA HOMOGÊNEA DE CURRAIS NOVOS TIPO DE ORGANIZAÇÃO NÚMERO DE ORGANIZAÇÕES ABSOLUTO Governamental 28 Não-Governamental 1 Entidade Sindical 8 Associação Civil 128 TOTAL 165 FONTE: Pesquisa Direta, novembro 1999. Coordenadoria Técnica do PAPP, Fetarn. % 17,0 1,0 5,0 77,0 100,0 GRÁFICO 3.6.3.1 MATRIZ INSTITUCIONAL-ZONA HOMOGÊNEA DE CURRAIS NOVOS 17% 1% 5% G o v e r n a m e n ta i s N ã o G o v e r n a m e n ta i s E n ti d a d e s S i n d i c a i s A s s o c ia ç õ e s C ivis 77% FONTE: Pesquisa Direta(Novembro-99), Coordenadoria Técnica do PAPP, Fetarn. TABELA 3.6.3.2 MATRIZ INSTITUCIONAL – ZONA HOMOGÊNEA DAS SERRAS CENTRAIS TIPO DE ORGANIZAÇÃO NÚMERO DE ORGANIZAÇÕES ABSOLUTO Governamental 32 Não-Governamental 1 Entidade Sindical 14 Associação Civil 159 TOTAL 206 FONTE: Pesquisa Direta, novembro 1999. Coordenadoria Técnica do PAPP, Fetarn. 293 % 15,0 1,0 7,0 77,0 100,0 GRÁFICO 3.6.3.2 MATRIZ INSTITUCIONAL – ZONA HOMOGÊNEA DAS SERRAS CENTRAIS 15% 1% 7% Governamentais Não Governamentais Entidades Sindicais Associações Civis 77% TABELA 3.6.3.3 MATRIZ INSTITUCIONAL – ZONA HOMOGÊNEA DE CAICÓ NÚMERO DE ORGANIZAÇÕES ABSOLUTO Governamental 43 Não-Governamental 1 Entidade Sindical 20 Associação Civil 192 TOTAL 256 FONTE: Pesquisa Direta, novembro 1999. Coordenadoria Técnica do PAPP, Fetarn. TIPO DE ORGANIZAÇÃO % 16,0 1,0 8,0 75,0 100,0 GRÁFICO 3.6.3.3 MATRIZ INSTITUCIONAL – ZONA HOMOGÊNEA DE CAICÓ 16% 1% 8% 75% FONTE: Pesquisa Direta, novembro 1999. Coordenadoria Técnica do PAPP, Fetarn. 294 G overnamentais Não Governamentais Entidades Sindicais Associações Civis TABELA 3.6.3.4 MATRIZ INSTITUCIONAL CONSOLIDADA DA REGIÃO DO SERIDÓ TIPO DE ORGANIZAÇÃO NÚMERO DE ORGANIZAÇÕES ABSOLUTO % Governamental 103 Não-Governamental 3 Entidade Sindical 42 Associação Civil 479 TOTAL 627 FONTE DO DADOS BÁSICOS: Pesquisa Direta, novembro 1999. Coordenadoria Técnica do PAPP, Fetarn. 16,0 1,0 7,0 76,0 100,0 GRÁFICO 3.6.3.4 MATRIZ INSTITUCIONAL CONSOLIDADA DA REGIÃO DO SERIDÓ 16% 1% 7% Governamentais Não Governamentais Entidades Sindicais Associações Civis 76% FONTE DO DADOS BÁSICOS: Pesquisa Direta, novembro 1999. Coordenadoria Técnica do PAPP, Fetarn. 3.6.4 O Sistema Municipal de Governo Preliminarmente, convém esclarecer que o Sistema Municipal de Governo deve ser considerado sob um conceito mais abrangente do que aquele derivado do binômio representado por Prefeitura/Câmara de Vereadores. Embora seja este o modelo tradicional, a evolução do exercício da cidadania já aponta, hoje, no sentido de se fazerem presentes, junto à administração pública, algumas formas de participação da sociedade, principalmente ao nível dos municípios. Esse processo de participação comunitária na gestão municipal, embora ainda incipiente, deverá resultar na ampliação do Sistema, à medida que se consolidem e se institucionalizem os canais através dos quais tal participação é exercida. Assim, o Sistema Municipal de Governo é visto, aqui, como sendo o conjunto de instituições políticas e sociais que interagem nos processos de gestão das ações públicas municipais, em todas as suas fases. 3.6.4.1 Características Gerais A administração municipal ainda é marcada, com maior ou menor intensidade, por uma das características históricas da administração pública brasileira, entre as quais se sobressaem, de um lado, a concentração do poder no âmbito da Prefeitura (e, nesta, nas figuras do Prefeito e de seus auxiliares 295 mais imediatos) e, de outro, a ausência de mecanismos descentralizados de planejamento, participação e ação governamental compartilhada. Como instrumento do poder legislativo local, a maioria das Câmaras Municipais se caracteriza por uma atuação extremamente deficiente, com pouca presença nas decisões sobre as questões de interesse público, quer operando a reboque do Executivo, quer exercendo uma oposição plena e radical, a depender das relações políticas entre os Vereadores e o Prefeito. Como regra geral observase, também, um relativo despreparo dos Vereadores para o exercício de suas funções, principalmente nas comunidades de pequeno porte. Excetuando-se a Prefeitura e a Câmara de Vereadores, são poucos e de rara ocorrência nos municípios outros instrumentos de poder, que atuem efetivamente nas decisões da administração municipal, principalmente nas áreas relacionadas à economia do município. Isto porque ainda é muito reduzido o grau de consciência política e de organização da população. Em boa parte dos municípios, no entanto, já se nota um início de participação comunitária nos processos de gestão (quase sempre estimulada por ações governamentais), embora sua atuação esteja limitada a emitir opinião sobre prioridades a serem consideradas ao nível de cada distrito ou comunidade, passando ao largo das grandes questões municipais. Como característica comum aos municípios da região (principalmente aqueles de menor porte), há que destacar a dificuldade encontrada pelas administrações na constituição de suas equipes de trabalho. Como não há muitas pessoas disponíveis para o exercício das diversas funções gerenciais, e como, em decorrência da extrema debilidade econômica da quase totalidade dos municípios, os salários não estimulam possíveis interessados, são poucas as Prefeituras que dispõem de um quadro de pessoal qualitativamente satisfatório. Apesar de, como foi anteriormente referido, o Sistema Municipal de Governo, na Região do Seridó, refletir a situação geral encontrada na grande maioria dos municípios nordestinos, incorporando os vícios do velho sistema, já é possível vislumbrar alguma tendência no sentido de se ampliar e de se acelerar um processo de mudança nas práticas e métodos da administração municipal, como, por exemplo, a adoção de um maior controle sobre os orçamentos e sobre os gastos públicos, seriedade e transparência nas compras e a definição prévia de prioridades para a ação governamental. 3.6.4.2 Perfil da Administração Municipal Os dados e informações recolhidos permitem se visualizar um panorama geral do Sistema Municipal de Governo da Região do Seridó, utilizando-se os seguintes indicadores: i) perfil dos Prefeitos; ii) quadro de pessoal; iii) grau de utilização dos mecanismos de participação social; iv) grau de utilização dos recursos de informática; v) grau de utilização dos processos inovadores de prestação de serviços públicos; vi) grau de utilização dos instrumentos de políticas de desenvolvimento; vii) formas de prestação de serviços públicos; e viii) caracterização dos programas de projetos em andamento. A análise das informações contidas nos quadros e gráficos correspondentes, a seguir apresentados, caracterizam, no geral, um perfil conservador, onde predominam o caráter hierárquico e centralizador da gestão pública. Foram identificadas, no entanto, algumas experiências inovadoras de descentralização, de participação social e da introdução de microempreendimentos, cujo conhecimento e divulgação são estratégicos para a mudança dos padrões tradicionais de administração pública predominantes na Região. 296 a. Idade dos Prefeitos A idade média dos prefeitos da Região do Seridó é relativamente elevada, com 53,6% situando-se nas faixas etárias entre 50 e 70 anos (tabela 3.6.4.1). Este fato fornece um primeiro indicativo do estilo predominante nas administrações municipais, caracterizado, neste caso, por um traço cultural onde a hierarquia guarda uma estreita relação com a faixa etária, portanto compatível com as características da Região, onde o chefe, seja ele de família ou de estabelecimento industrial, comercial e de serviços, aparece como o personagem fundamental na tomada de decisões. TABELA 3.6.4.1 PREFEITOS SEGUNDO A FAIXA ETÁRIA – 1999 IDADE (ANOS) 40-50 50-60 60-70 TOTAL FONTE: Pesquisa direta, dezembro de 1999. NÚMERO % 13 08 07 28 46,4 28,6 25,0 100,0 GRÁFICO 3.6.4.1 P R E F E IT O S S E G U N D O E T Á R IA F A IX A 2 5 % 4 6 % 5 0 -6 0 6 0 -7 0 2 9 % b. 4 0 -5 0 Composição das Administrações Municipais, Segundo o Gênero A composição das administrações municipais, segundo o gênero, constitui outro traço cultural importante na região. A maioria dos Prefeitos (92,9%) é do sexo masculino, o que revela não só a pequena participação da mulher na política regional, mas, sobretudo, a permanência de um tipo de divisão do trabalho historicamente arraigado no Nordeste brasileiro e no Seridó, em particular, no qual os homens se ocupam predominantemente da gestão das empresas privadas e das organizações públicas. O índice correspondente à participação das mulheres, observado na tabela 3.6.4.2, é de apenas 7,1%, quando se considera o universo dos Prefeitos da Região do Seridó, onde há apenas 2 mulheres e 26 homens ocupando as administrações municipais. 297 Não é desprezível, no entanto, o índice encontrado nas duas situações, o qual para os padrões culturais do Seridó do Rio Grande do Norte, já é uma mudança significativa. TABELA 3.6.4.2 COMPOSIÇÃO DOS PREFEITOS SEGUNDO O GÊNERO ESPECIFICAÇÃO NÚMERO % Masculino 26 Feminino 02 TOTAL 28 FONTE: Pesquisa direta, dezembro, 1999. 92,9 7,1 100 GRÁFICO 3.6.4.2 C O M P O S IÇ Ã O D O S P R E F E IT O S SEGUNDO O GÊNERO 7% M a s c u lin o F e m in in o 93% c. Filiação Partidária As três mais importantes forças políticas da região continuam situadas à direita, na linha ideológica partidária, tal qual aconteceu desde os primórdios da organização política no Estado, onde a UDN e o PSD, e, posteriormente (no período militar), a ARENA e o MDB, dominavam a política estadual. Com a reorganização partidária ocorrida na redemocratização, mudaram-se as siglas, porém a essência ideológica continua a mesma, com 85,7% dos Prefeitos filiados ao PPB, PFL e PMDB, com, respectivamente, 28,6%; 14,3%; e, 42,8% (tabela 3.6.4.3). TABELA 3.6.4.3 FILIAÇÃO PARTIDÁRIA DOS PREFEITOS NÚMERO DE PREFEITOS PARTIDO PPB PFL PMDB OUTROS TOTAL FONTE: Pesquisa direta, dezembro, 1999. % 08 04 12 04 28 298 28,6 14,3 42,8 14,3 100 GRÁFICO 3.6.4.3 F IL IA Ç Ã O P A R T ID Á R IA P R E F E IT O S 1 4 % D O S P P B 2 9 % P F L P M 1 4 % 4 3 % d. D B O U T R O S Distribuição dos Prefeitos segundo a Profissão Ao contrário dos indicadores anteriormente apresentados, houve uma mudança significativa no perfil profissional dos Prefeitos na região. Como é amplamente conhecido, no ciclo algodoeiropecuário, que se prolongou até os anos 70 do século XX, os Prefeitos, assim como os Vereadores, eram agropecuaristas, em geral grandes proprietários rurais, que se dedicavam à bovinocultura e à cotonicultura, como atividades econômicas principais exploradas em regime de parceria. A decadência do complexo algodoeiro-pecuário trouxe como conseqüência a redução da participação das lideranças políticas estaduais na distribuição dos cargos no âmbito estadual e uma clara mudança no perfil profissional conforme referido acima. Com efeito, apenas 32,1% dos Prefeitos têm a agropecuária como atividade principal, distribuindo-se os restantes 67,9% entre agrônomos, médicos e outras profissões (tabela 3.6.4.4). Ainda que vários dos Prefeitos sejam também agropecuaristas (como foi possível observar durante a realização da pesquisa de campo), o perfil atual é de caráter predominantemente urbano, o que pode determinar implicações quanto à visão de mundo desses administradores, notadamente quanto às ênfases diferenciadas, de natureza urbano-industrial e não exclusivamente agropecuária. TABELA 3.6.4.4 PREFEITOS SEGUNDO A PROFISSÃO ESPECIFICAÇÃO Agrônomo Médico Agropecuarista Outros TOTAL FONTE: Pesquisa direta, dezembro, 1999. NÚMERO % 04 06 09 09 28 299 14,3 21,5 32,1 32,1 100 GRÁFICO 3.6.4.4 P R E F E IT O S S E G U N D O A P R O F IS S Ã O 14% 32% A g rô n o m o M é d ic o 21% A g ro p e c u a ris t a 33% 3.6.4.3 O u tro s Situação do Poder Legislativo Municipal Trata-se a seguir de aspectos relacionados à estrutura, composição e desempenho das Câmaras de Vereadores do Seridó. a. Estrutura das Câmaras de Vereadores O número de Vereadores nas Câmaras Municipais variou entre 9 e 13, com uma média de 9,6 Vereadores por Câmara Municipal, na região. Chama a atenção, neste caso, o baixo desempenho das Câmaras Municipais, no ano de 1999, com apenas 1,3 projetos por Vereador (tabela 3.6.4.5). TABELA 3.6.4.5 ESTRUTURA E DINÂMICA DA CÂMARA DE VEREADORES NÚMERO MÉDIO DE VEREADORES POR MUNICÍPIO NÚMERO MÉDIO DE PROJETOS EM 1999 NÚMERO MÉDIO DE PROJETOS POR VEREADOR 9,6 12,8 1,3 FONTE: Pesquisa direta, dezembro, 1999. b. Composição das Câmaras Municipais, Segundo o Gênero A composição das Câmaras Municipais, segundo o gênero, segue o padrão encontrado para os prefeitos, pertencendo a maioria dos vereadores (81%) ao sexo masculino. A participação das mulheres é, pois, de apenas 19%. (Tabela 3.6.4.6.) Assim mesmo, a presença das mulheres nas Câmaras de Vereadores é superior à encontrada nas Prefeituras, pois em todo o Seridó havia apenas duas prefeitas para 26 prefeitos, em 1999. 300 TABELA 3.6.4.6 COMPOSIÇÃO DOS VEREADORES SEGUNDO O GÊNERO ESPECIFICAÇÃO NÚMERO Masculino Feminino TOTAL % 222 52 274 81,0 19,0 100,0 FONTE: Pesquisa direta, dezembro, 1999. c. Filiação Partidária As três mais importantes forças políticas do Seridó, ligadas às Câmaras de Vereadores, continuam situadas à direita, na linha ideológica partidária, tal qual acontece com os prefeitos. Nas Câmaras Municipais, 77,4% dos vereadores são filiados ao PPB, PFL e PMDB, com respectivamente, 17,5%; 24,5%; e 35,4%. (Tabela 3.6.4.7). TABELA 3.6.4.7 FILIAÇÃO PARTIDÁRIA DOS VEREADORES PARTIDO NÚMERO DE VEREADORES PPB PFL PMDB PL PSDB OUTROS TOTAL 48 67 97 20 17 25 274 % 17,5 24,5 35,4 7,3 6,2 9,1 100,0 FONTE: Pesquisa direta, dezembro, 1999. d. Distribuição dos Vereadores Segundo a Profissão À semelhança dos prefeitos, a profissão principal dos vereadores é de caráter predominantemente urbano. Essa circunstância pode contribuir para pautar a visão de mundo desses administradores, em particular no que se refere às ênfases diferenciadas conferíveis aos negócios de natureza urbano-industrial. De todo modo, isto não significa que suas decisões sejam tomadas em detrimento do apoio aos negócios de origem mais especificamente agropecuária. É significativo o número de vereadores que declararam ter a política como atividade profissional, embora o número registrado (18 no total) corresponda a um reduzido percentual (6,5% do total de 274 vereadores existentes em 1999). Esse fato pode ser interpretado como indicativo da ausência de renovação desses quadros, além da pouca atração que esse tipo de atividade exerce sobre os cidadãos do Seridó. 301 TABELA 3.6.4.8 VEREADORES SEGUNDO A PROFISSÃO ESPECIFICAÇÃO Funcionário Público Agropecuarista Comerciante Político Profissional Outros TOTAL NÚMERO % 83 72 35 18 66 274 30,3 26,3 12,8 6,5 24,1 100,0 FONTE: Pesquisa direta, dezembro, 1999. e. Principais Problemas Segundo os Entrevistados A manifestação dos 28 entrevistados em relação aos principais problemas enfrentados pelas Câmaras Municipais apresenta-se como um claro indicativo da necessidade de aperfeiçoamento das habilidades dos vereadores no desempenho de suas funções. Como pode ser observado na tabela 3.6.4.9, os tipos de problemas mais citados foram, respectivamente, a falta de capacitação, a ausência da população dos processos legislativos e a falta de recursos, como dificuldades fundamentais para o efetivo comprimento das responsabilidades cometidas ao poder legislativo. TABELA 3.6.4.9 PRINCIPAIS PROBLEMAS SEGUNDO OS ENTREVISTADOS TIPO DE PROBLEMA Falta de Capacitação Falta de Recursos Falta de Infra-Estrutura Ausência da População Descrédito TOTAL Nº DE CITAÇÕES % 27 23 16 25 07 98 27,6 23,4 16,3 25,5 7,2 100,0 FONTE: Pesquisa direta, dezembro, 1999. 3.6.4.4 Estrutura Organizacional das Prefeituras A análise da estrutura organizacional das Prefeituras pesquisadas revelou que a maioria dos municípios possui um número suficiente de secretarias para cobrir as responsabilidades fundamentais de um sistema municipal de administração pública. No entanto, é preocupante o baixo número de municípios que possuem Secretarias de Planejamento, apenas 21,4%, revelando o incipiente nível organizacional que ainda predomina na maioria dos municípios. Como foi identificado por ocasião da pesquisa de campo, onde muitas das decisões relativas às funções de planejamento e finanças são confiadas a contadores e empresas de prestação de serviços em geral, sem conhecimento da realidade socioeconômica e cultural dos municípios (tabela 3.6.4.10). 302 TABELA 3.6.4.10 ESTRUTURA ORGANIZACIONAL DAS PREFEITURAS UNIDADES ORGANIZACIONAIS Gabinete Prefeito Secretaria de Planejamento Secretaria de Finanças Secretaria de Administração Secretaria de Educação Secretaria de Agricultura Secretaria do Bem Estar Social Secretaria Obras Públicas Secretaria de Turismo MUNICÍPIOS COM UNIDADES ORGANIZACIONAIS N.º DE MUNICÍPIOS QUE N.º DE MUNICÍPIOS COM UNIDADES INFORMARAM ORGANIZACIONAIS ABSOLUTO % 28 27 96,4 28 06 21,4 28 25 89,3 28 24 85,7 28 27 96,4 28 16 57,1 28 26 92,9 28 23 82,1 28 03 10,7 FONTE: Pesquisa direta, dezembro, 1999. 3.6.4.5 Forma de Prestação de Serviços A administração direta ainda é a forma predominante de prestação de serviço nas Prefeituras pesquisadas. As duas situações extremas quanto ao tipo de serviço prestado e a forma de prestação de serviços correspondem à agricultura, onde apenas 50% dos municípios utilizam administração direta, e aos serviços burocráticos, realizados por administração direta em 100% dos municípios (tabela 3.6.4.11). Apesar dos dados terem dupla contagem, pois um mesmo município pode usar diferentes formas de prestação para um mesmo tipo de serviço, verifica-se que as modalidades terceirizada e em parceria (que poderiam ser considerados como experiências inovadoras de descentralização no âmbito municipal), ocorrem nas áreas de limpeza pública, educação e agricultura. Dado o potencial dessas experiências inovadoras para o aumento da eficiência da administração pública, elas serão reavaliadas na perspectiva de implantação em outros municípios da região. TABELA 3.6.4.11 FORMA DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS TIPO DE SERVIÇO N.º DE MUNICÍPIOS QUE INFORMARAM Limpeza pública Saúde Educação Agricultura Serviços burocráticos 7 6 5 2 4 FORMA DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS/Nº DE MUNICÍPIOS QUE USAM DIRETA TERCEIPARCERIA OUTRA RIZADA. N.º % N.º % Nº % Nº % 5 71,4 2 28,6 5 83,3 2 33,3 1 16,6 4 80,0 1 20,0 1 50,0 1 50,0 2 100,0 1 50,0 4 100,0 1 20,0 FONTE: Pesquisa direta, dezembro,1999. 303 3.6.4.6 A Atuação do Sistema A atuação das administrações municipais tem se caracterizado por enfatizarem ações direcionadas aos setores ditos sociais, como saúde e educação. Praticamente, em todos os municípios da Região do Seridó a prioridade dos programas e projetos desenvolvidos no âmbito da administração pública está voltada para o atendimento das necessidades da população, no tocante àqueles serviços, vindo a seguir o saneamento básico e, em alguns casos, a habitação popular. Embora não se possa criticar essa postura por parte dos administradores (pois, afinal de contas, aquelas são as áreas críticas em todos os municípios), não deixa de causar certa estranheza o fato de as ações públicas praticamente se limitarem à prestação daqueles serviços. Enquanto isso, também em todos os municípios, constatou-se uma certa dificuldade, por parte das Prefeituras, quanto ao planejamento e execução de ações relacionadas ao desenvolvimento da economia municipal. Malgrado a existência, na estrutura organizacional de várias delas, de unidades operacionais voltadas para o apoio às atividades econômicas (como Secretarias de Agricultura e Indústria e Comércio, por exemplo) as administrações municipais não contam com políticas definidas com relação às atividades produtivas, capazes de contribuir para o fortalecimento de suas bases econômicas. Além disso, à inexistência de políticas soma-se a fragilidade das próprias unidades operacionais existentes, marcadas pela insuficiência quantitativa e qualitativa das equipes técnicas que as compõem. Esses fatos, aliados à evidência de que, de uma maneira geral, os instrumentos de execução das políticas econômicas (crédito, assistência técnica, incentivos fiscais, etc.) não estão ao alcance das administrações municipais – uma vez que são manejados pelas outras esferas do poder público – determinam a omissão constatada. Nas entrevistas realizadas para os trabalhos de diagnóstico, as constatações acima foram objeto de preocupação por parte dos próprios dirigentes municipais, que reconhecem a impossibilidade de demarrar e de consolidar um processo de desenvolvimento municipal sustentável, sem o delineamento de estratégias e sem a execução de ações concretas voltadas para a diversificação e para o fortalecimento da economia dos municípios. Isso é tanto mais crucial, quando se considera o fato de que todos os municípios do Seridó apresentam elevados Graus de Indigência, quadro que só poderá ser alterado com a adoção de políticas capazes de viabilizar, no âmbito municipal, a diversificação e a dinamização de atividades econômicas geradoras de emprego e de renda. Não se pode esquecer, portanto, que a melhoria do Sistema guarda uma relação com a base econômica do município. Sem alterações positivas nessa base serão infrutíferos todos os esforços que vierem a ser desenvolvidos no sentido de aprimorar os processos decisórios e organizacionais e a capacidade técnica, financeira e gerencial dos municípios, assim como suas possibilidades de planejar e de gerir as ações públicas. 3.6.5 Principais Problemas Detectados Os levantamentos e estudos efetuados no âmbito do presente diagnóstico apontam no sentido de se concluir que se constatam, na Região do Seridó (em maior ou menor intensidade), as dificuldades básicas a seguir expostas, que funcionam como determinantes de um desempenho pouco satisfatório do aparato institucional que ali atua. Destacam-se, como pontos que interferem de forma negativa no processo de desenvolvimento, os seguintes: i) desarticulação entre intervenções das diversas instâncias de governo e gestão que atuam nos municípios; ii) sistema de gestão das Prefeituras com características tradicionais e extremas deficiências técnicas; iii) Câmaras municipais com baixo e restrito desempenho; 304 iv) instrumentos de participação popular frágeis e limitados; v) deficiência das equipes técnicas; vi) debilidade de atuação na área econômica; e vii) debilidade da situação financeira. • Desarticulação entre as Diversas Instâncias de Governo e Gestão. Nos municípios são diversas as instâncias de intervenção, desde os governos federal e estadual, passando pela Prefeitura e Câmara de Vereadores até os Conselhos Municipais (de Saúde, Educação, Criança e Adolescentes, Merenda Escolar, entre outros), as Associações Comunitárias e outros órgãos ou entidades como Organizações Não-Governamentais (ONGs), Clubes de Serviços (Lions, Rotary), Associações de Prefeitos, etc. O ponto de estrangulamento da intervenção dessas instâncias é a desarticulação de suas ações, especialmente em dois níveis distintos: entre as esferas superiores de governo (Federal e Estadual) e as instâncias municipais; e entre as diversas instâncias municipais nos limites dos próprios municípios. O resultado dessa desarticulação é o desperdício de esforços, em meio à extrema deficiência de recursos para promover o desenvolvimento nos municípios. As decisões de investimentos das esferas federais e estaduais não passam por objetivos e estratégias previamente definidas para os municípios, em conformidade com as vocações e necessidades para promover o desenvolvimento sustentável. Os investimentos são pontuais, ou seja, voltados para atender a necessidades específicas (como melhoria de uma estrada, eletrificação de um distrito, construção de açudes, etc.) ou para projetos menores e isolados, muitas vezes obtidos com a intervenção de políticos locais, em atendimento à solicitação de pequenas comunidades. Além disso, as decisões não levam em conta as grandes limitações para promover o desenvolvimento sustentável em municípios pequenos e pobres como os da Região do Seridó, quando considerados isoladamente. Ou seja, não há uma visão de desenvolvimento regional, compreendendo um conjunto de municípios que configurem uma região com as mesmas potencialidades e características desenvolvimentistas. Os objetivos e estratégias de desenvolvimento não são formulados a partir de um processo integrado, compreendendo os três níveis de governo (federal, estadual e municipal), expressando sintonia das decisões regionais com as municipais numa visão articulada, onde as ações que competem a cada nível sejam complementares das exercidas pelos demais. Embora se perceba algum avanço nas áreas de saúde e educação, ainda se mantém a falta de objetividade e de integração. Mesmo nestes casos a falta de visão regional se faz sentir, impedindo a otimização de alguns investimentos que poderia ser obtida, por exemplo, na construção de hospitais e escolas técnicas capazes de atender a um conjunto de municípios. Mas é nos aspectos do desenvolvimento socioeconômico, nas áreas industrial e agrícola, onde as deficiências provenientes da desarticulação entre as esferas de governo se apresentam com maior gravidade. Em conseqüência, as instâncias municipais (Conselhos, Associações, etc.) atuam, quase sempre, de forma isolada e em função de objetivos pontuais e específicos (construir uma casa de farinha, promover a criação de alguns animais, instalar um posto de saúde num distrito, etc.). Essas ações isoladas constituem campo fértil para os políticos clientelistas, que formam seu eleitorado em troca de pequenas realizações. Como contrapartida, essa prática nutre o comportamento subserviente da população, baseado na política dos favores prestados por esse tipo de político. 305 A desarticulação provém, ainda, de outras deficiências e características, próprias das instâncias municipais de gestão, que não têm suas funções claramente definidas. As associações comunitárias são criadas, de maneira geral, em função de interesse específico, quase sempre para obtenção de recursos para pequenos investimentos. Dessa forma, perdem de vista seu papel principal, que seria o de articular-se com outras instâncias, para o exercício da gestão participativa e da cidadania, com objetivos mais amplos de elevar a qualidade de vida da população local. Os Conselhos Municipais de Desenvolvimento também têm sido formados para satisfazer às exigências específicas de algum tipo de financiamento (exemplo, para fazer parte do Fumac, para obter recursos do Banco do Brasil, etc.). Dessa forma, ainda deixam muito a desejar, em termos de integração de ações a nível municipal, embora possam, em alguns casos, significar um grande avanço ou início de mudanças nessa direção. Os colegiados específicos, de existência obrigatória em termos constitucionais (como os de Saúde, Educação, etc.) mantêm a forma de intervenção setorializada, sem articulação de suas ações, numa visão integrada e complementar. Isso é agravado, em alguns casos, pela proliferação de Conselhos, decorrente de exigências de programas e projetos (principalmente daqueles manejados por instituições do governo federal), o que faz com que algumas pessoas participem de vários desses colegiados, sem condições de atuar de forma satisfatória em nenhum deles. • Sistema de Gestão com Características Tradicionais e Extrema Deficiência Técnica. O processo de redemocratização, o início da municipalização (especialmente nas áreas de Saúde e Educação), o crescimento das organizações populares, entre outros, são fatores que vêm provocando mudanças, na forma de administrar das Prefeituras. Entretanto, esse processo tem sido lento, pois o ritmo das mudanças depende ainda, em grande parte, da atuação de lideranças políticas e não de exigências das próprias comunidades. Assim, as transformações têm se dado mais por forças de cima para baixo do que por exigências da população, de baixo para cima. Mesmo em municípios onde as lideranças políticas estabelecem novos valores e princípios administrativos (transparência, participação, prioridades para os interesses sociais, etc.) ainda é lento o processo de mudança cultural, entre a população e a grande maioria dos funcionários da administração municipal. Ao lado das deficiências culturais se mantêm as deformações políticas. O poder decisório, de uma maneira geral, ainda está concentrado na Prefeitura e, nesta, na figura do Prefeito e em alguns de seus auxiliares mais diretos. A participação popular é extremamente precária, não passando, nos melhores casos, de ações consultivas e restritas a alguns setores onde funcionam os Conselhos, como os de Saúde e Educação. Nos aspectos técnicos e administrativos, o sistema de gestão das Prefeituras continua a apresentar grandes deficiências e limitações. Destacam-se as deficiências do sistema de planejamento, reduzido a meros exercícios burocráticos, voltados para cumprir as exigências legais (leis de diretrizes orçamentarias, orçamentos anual e plurianual), ou, então, a elaboração de planos específicos, decorrente de exigências de organismos federais e estaduais. Ressalve-se, aqui, a elaboração de Planos Diretores, em quase todos os municípios do Seridó, em função de apoio oferecido às administrações municipais pelo Sebrae e pela Diocese de Caicó. Em trabalho conjunto com as Prefeituras e alguns segmentos da sociedade civil, têm sido preparados Planos Estratégicos de Desenvolvimento que, a partir de um diagnóstico do município, propõem a 306 adoção de estratégias e metas a serem cumpridas, a curto, médio e longo prazos, com vistas ao desenvolvimento municipal. Ocorre, porém, que os planos elaborados não são postos em prática, reduzindo-se, assim, à condição de simples documento, embora tenham sido concebidos para funcionarem como instrumento do processo de desenvolvimento. Além disso, os Planos Diretores apresentam algumas deficiências no seu processo de elaboração. Não se enquadram no conceito de desenvolvimento sustentável; não integram todos os aspectos do desenvolvimento, especialmente as questões econômicas do setor primário; não partem de uma perspectiva estratégica inserida no contexto em que atuam os municípios; não estão integrados ao processo de desenvolvimento do Estado e da microrregião em que se insere o município considerado e, por fim, não contaram com a participação efetiva da população. Dessa forma, a maior parte dos municípios não dispõe de planos condizentes com suas necessidades de desenvolvimento sustentável, nem de sistemática de planejamento, acompanhamento, avaliação, controle e replanejamento das ações exercidas pelas instâncias que interferem em sua evolução, em particular a Prefeitura, que deveria ser o carro-chefe desse processo. Além disso, a estrutura organizacional das Prefeituras é, em geral, muito deficiente. Em alguns casos, algumas funções básicas não existem, como, por exemplo, as voltadas para o desenvolvimento econômico das áreas agrícola, industrial e comercial. O quadro de pessoal mostra-se extremamente carente de técnicos e administradores capacitados ao mesmo tempo em que, em alguns casos, o excesso de pessoal sobrecarrega a folha de pagamento, reduzindo a capacidade de investimentos. Os processos de gestão são também, quase sempre, primários. A centralização é a tônica das decisões e o trabalho em equipe é pouco praticado, caracterizando um estilo burocrático, segmentado e desintegrado de administrar. Não há política de pessoal, plano de carreira e de qualificação dos integrantes da administração municipal. • Câmaras Municipais com Baixo e Restrito Desempenho. A Constituição Federal, em seu artigo 29, estabelece que o município deverá reger-se por uma lei orgânica, promulgada pela Câmara Municipal, que, entre outros preceitos, deverá contemplar a organização das funções legislativas e fiscalizadoras do poder legislativo municipal. Cada município é autônomo, no que diz respeito à elaboração de sua lei orgânica, respeitados, evidentemente, os princípios estabelecidos pelas Constituições Federal e Estadual. As leis orgânicas vigentes nos municípios seridoenses não divergem muito entre si, uma vez que foram elaboradas a partir de um modelo padrão, no qual foram feitos os ajustes julgados pertinentes em cada caso. Assim, no que se relaciona às atribuições e competências das Câmaras de Vereadores, aquelas leis, de uma maneira geral, estabelecem que cabe à Câmara Municipal legislar sobre assuntos de interesse local e fiscalizar, mediante controle externo, a administração direta ou indireta e as empresas de que participe o município, como detentor da maioria das ações com direito a voto. Além disso, em defesa do bem comum, a Câmara tem o direito de se pronunciar sobre qualquer assunto de interesse público. Essas atribuições de caráter geral determinam a competência da Câmara Municipal para tratar, entre outros, dos seguintes assuntos: i. Sistema Tributário: arrecadação, distribuição das rendas, anistias fiscais e de débitos; 307 ii. Matéria Orçamentária: plano plurianual, diretrizes orçamentarias, orçamento anual, operações de crédito, dívida pública; iii. Planejamento Municipal: plano diretor e legislação decorrente; iv. Organização do Território Municipal: criação de distritos e delimitação de perímetros urbanos e rurais; e v. Estruturação Organizacional: comissionados e funções gratificadas. criação ou extinção de Secretarias, cargos Como se pode observar a partir desse elenco de atribuições, são de considerável amplitude as funções a serem desempenhadas pela Câmara Municipal. Mas a questão fundamental não reside na abrangência das funções do poder legislativo, pois, como foi referido, ela decorre de disposições constitucionais e da própria lei orgânica municipal. O problema a ser considerado diz respeito ao exercício daquelas funções. E é exatamente neste ponto que se constatou o exercício de uma prática pouco recomendável: os vereadores funcionam mais como intermediários de pleitos pessoais de seus eleitores, junto ao poder executivo, do que como legisladores e fiscalizadores dos atos da administração municipal. Nos casos em que os administradores repudiam tais práticas, por vezes os vereadores bloqueiam de todas as formas a atuação do executivo, dificultando o desempenho de suas funções. Claro que há as tradicionais exceções, que, também tradicionalmente, apenas confirmam a regra geral; e esta significa um Legislativo quase sempre a reboque do Executivo (ou radicalmente contra ele), uma Câmara Municipal fragilizada em decorrência de sua própria maneira de atuar. • Instrumentos de Participação Popular Frágeis e Limitados. A participação popular nos processo de gestão na maior parte dos municípios da Região do Seridó, pode ser considerada como pouco expressiva e quase que restrita à atuação daqueles órgãos tidos como obrigatórios por determinações legais, como os Conselhos Municipais de Saúde, de Educação e da Criança e do Adolescente. Já se fez referência a essas fragilidades e limitações dos mecanismos de participação popular, em tópicos anteriores deste documento. Destacou-se que em sua grande maioria, as associações comunitárias existentes e os Conselhos Comunitários ou Municipais de Desenvolvimento foram ou estão sendo criados em função da obtenção de empréstimos e financiamento de projetos tais como: PAPP, Fumac, Fundec, Progera, etc. Cabe aqui ressaltar que embora essas organizações possam significar um certo avanço no sistema de gestão nos municípios, elas se tornam extremamente limitadas, adquirindo uma feição marcadamente reivindicatória, relegando a segundo plano o exercício das atividades do co-gestão municipal e de fiscalização das ações dos órgãos públicos (Estado, Prefeitura, Câmara, empresas do governo, etc.) Na sua origem e formação, estão presentes a cultura do paternalismo e do clientelismo. Não há um trabalho de base junto à população e aos participantes dos organismos (associações e conselhos), para a conscientização dos direitos da cidadania, para a compreensão clara do papel e das funções a serem exercidos por esses instrumentos, em parceria com as demais instâncias de governo local. É neste ponto – deficiência dos instrumentos de participação popular – que reside, talvez, a maior fragilidade do sistema de governo municipal. A superação dessa deficiência é condição sine qua 308 non para o desenvolvimento sustentável no interior do Estado. Sem isso, quaisquer avanços, mesmo os mais bem intencionados, serão efêmeros. • Deficiência das Equipes Técnicas. Uma das grandes dificuldades enfrentadas pelas administrações municipais diz respeito à formação de equipes técnicas para conduzirem as diversas unidades operacionais através das quais são prestados os serviços à população. Sempre a braços com problemas financeiros, em virtude das limitações de seus orçamentos, as Prefeituras não têm condições de oferecer salários compatíveis com o perfil dos profissionais de que carecem e, em conseqüência, são obrigados a trabalhar com equipes técnicas mínimas e qualitativamente deficientes. Em alguns casos, a celebração de convênios com órgãos ou instituições de outras esferas de governo permitem que, em certas áreas, se consiga mobilizar pessoal de bom nível técnico, mas a regra geral é a carência de pessoal, sob o ponto de vista qualitativo. Vale salientar que as deficiências de pessoal qualificado nos municípios não se restringe aos quadros da Prefeitura. Mesmo os órgãos do governo estadual e federal não dispõem de pessoal em número (e as vezes em qualificação) suficiente para atender as necessidades locais. Os projetos de investimentos carecem de técnicos e gerenciadores capazes de dar apoio às comunidades e aos órgãos por eles responsáveis (cooperativas, conselhos, etc.) • Debilidade da Situação Financeira. De um modo geral, todos os municípios padecem com as restrições dos recursos financeiros de que dispõem. O grosso da arrecadação dos municípios provém da transferência compulsória da receita tributária do governo federal, o Fundo de Participação dos Municípios–FPM. Segundo dados oficiais, a parcela do FPM transferida para os municípios passou, em 1988, de 17,0% para 22,5%; cada município recebe um aporte do FPM diretamente proporcional à sua população, mas isso ainda representa muito pouco face às suas reais necessidades, principalmente quando se considera que as receitas próprias da grande maioria dos municípios do Seridó é quase inexpressiva. Além disso, há a considerar o fato de que os aportes do FPM são parcialmente retidos pelo governo federal, para amortizar antigas dívidas das Prefeituras para com o INSS e o FGTS. A outra fonte de receita dos municípios é a participação no ICMS (Imposto Sobre Circulação de Mercadorias e Serviços), arrecadado pelo Estado. Muitos municípios não cobram IPTU, por considerarem que o valor a ser arrecadado não compensa os desgastes políticos que sofreriam com a reação da população e os custos administrativos que seriam exigidos. Outros impostos a cargo das administrações municipais, tais como Imposto Sobre Serviços (ISS) e venda de propriedades (ITBI), só chegam a ser significativos para os casos excepcionais, isto é, para os municípios de maior porte, como Currais Novos e Caicó. Para compensar as deficiências das receitas oriundas das transferências e de recursos próprios, os municípios recorrem às parcerias e colaboração junto a organismos de governo das esferas federal e estadual, às organizações não-governamentais e agências internacionais. • Redução Gradativa da Presença do Estado. Anteriormente foi referida a presença do Estado na Região do Seridó, como um dos fatores de significativa importância para o seu processo de desenvolvimento. Instituições do poder central e do próprio Estado do Rio Grande do Norte ali já atuaram de forma intensa e decidida, realizando investimentos em infra-estrutura e fomentando as atividades produtivas, além de desenvolverem ações voltadas para a área social. Paradoxalmente, no entanto, a atuação dessas instituições foi sendo reduzida paulatinamente, à medida que a economia da região entrava em declínio, o que significou a perda de um importante ponto de apoio, no momento em 309 que o Seridó dele mais necessitava. A política de descentralização de alguns serviços, principalmente na área social, também tem contribuído para o quase desamparo que ocorre na região, no que diz respeito à presença do Estado. É claro que o processo de municipalização de serviços como educação e saúde, por exemplo, é medida de extrema importância não só para a sua melhoria como, também, para a redução de seus custos e para o próprio fortalecimento do Sistema Municipal de Governo. Não se pode esquecer, no entanto, que é indispensável assegurar recursos financeiros e técnicos que viabilizem a concretização de tais objetivos. 3.6.6 Potencialidades Relevantes Sob o ponto de vista político-institucional, os municípios do Seridó contam com um apreciável elenco de potencialidades, que, se bem trabalhadas, podem vir a representar um importante papel no processo de desenvolvimento da região. As mais significativas dessas potencialidades são descritas a seguir. • Envolvimento da Sociedade. Merece destaque especial o grau de interesse demonstrado pelos habitantes, quanto à participação e ao envolvimento na discussão dos problemas que interferem no seu viver. Isso ficou suficientemente demonstrado por ocasião da realização das reuniões municipais destinadas à coleta de dados e informações para a elaboração do Plano. No conjunto dos 28 municípios da região, cerca de 1.200 pessoas comparecerem àquelas reuniões e delas participaram de maneira efetiva e entusiástica, identificando os principais problemas, exercitando a indicação de soluções, descobrindo as potencialidades e manifestando seus anseios com relação ao futuro. E tudo isso feito de forma inteligente e consistente, deixando transparecer um elevado sentimento de solidariedade entre os moradores de todos os municípios e entre a geração presente e as futuras. Por conseguinte, a maior potencialidade da Região do Seridó é o seu próprio Povo. • Nível de Organização Comunitária. Decorrência direta do grau de interesse da população, nota-se em todos os municípios, com maior ou menor intensidade, um razoável nível de organização comunitária. Embora esse processo de organização tenha sido marcado, em suas origens, por exigência de programas ou projetos governamentais, o exercício das funções daí decorrentes tem propiciado, ao longo do tempo, que as instituições situadas neste universo, paulatinamente passem a atuar com maior abrangência. No conjunto dos municípios do Seridó há cerca de 450 associações comunitárias, que, certamente, representarão um importante instrumento na implementação do Plano de Desenvolvimento Sustentável do Seridó. Nesse contexto, também assumem papel extremamente significativo os Sindicatos dos Trabalhadores Rurais (em número de 26) e os 18 Conselhos Municipais do Fumac. • Alterações Positivas no Sistema Municipal de Governo. Embora de forma mais lenta do que a desejável, o Sistema Municipal de Governo na Região do Seridó vem experimentando um sensível processo de mudanças, tanto em sua estrutura quanto em seus métodos de atuação, com um envolvimento maior e mais direto da sociedade nos processos de gestão, em todas as suas fases. A mobilização das forças sociais no sentido de participarem mais diretamente junto às esferas do poder público (fazendo reivindicações ou acompanhando o seu desempenho) começa a se manifestar de forma mais objetiva, não só através de mecanismos de controle social (como tais considerados os colegiados que acompanham o desempenho da gestão pública), mas, também, de outros, destinados a se envolver no próprio processo de gestão, como coadjuvantes da administração pública. 310 Hoje, a participação da sociedade na gestão da coisa pública já começa a avultar de importância, determinando um novo desenho para o sistema de governo (com a incorporação de conselhos ou comitês formados, a partir de organizações comunitárias e classistas, de clubes de serviços, instituições religiosas. etc.) e contribuindo para a adoção de novos métodos e processos de gestão, notadamente no que se relaciona à transparência da administração pública. É bem verdade que esse processo de mudança ainda não é forte o bastante para viabilizar o exercício pleno da cidadania. E, por via de conseqüência, consolidar a prática democrática em toda a sua plenitude, aperfeiçoando o desempenho da administração pública, principalmente porque os instrumentos criados ainda carecem de orientação adequada sobre suas competências e sobre o universo de sua atuação. A consolidação e o aperfeiçoamento dessa prática, no entanto, serão decorrência natural de seu próprio exercício. • Organização da Produção. As 25 cooperativas existentes na região também significam um potencial de significativa importância para o processo de desenvolvimento, desde que sejam concebidas e postas em prática estratégias e linhas de ação capazes de contribuir para a superação dos problemas hoje enfrentados por essas instituições. • Aparato Institucional de Apoio Técnico. Outra potencialidade a ser considerada é a existência de um razoável aparato de apoio técnico existente e atuante na região, representado, entre outras instituições, pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (através de seus dois Centros Superiores de Ensino Superior), pelas duas Associações de Municípios, por entidades classistas (como Clube de Diretores Lojistas, Associações Comerciais, etc.), pelas organizações sindicais e pela Diocese de Caicó. Articuladas e assistidas, essas instituições podem vir a desempenhar um papel de relevante importância em programas de desenvolvimento institucional, no âmbito do Plano de Desenvolvimento Sustentável do Seridó. 3.7 ANÁLISE DO AMBIENTE EXTERNO A análise da realidade interna da região seridoense precisa, agora, ser complementada com uma breve análise do que ocorre no ambiente externo à região (ambiente mundial, nacional e do Estado do Rio Grande do Norte), para que se possa especular sobre prováveis impactos positivos e negativos que as principais tendências externas possam aportar à vida regional. Busca-se, assim, identificar as possíveis ameaças e oportunidades que possam advir para o Seridó. O ambiente mundial, brasileiro e norte-rio-grandense, nas décadas recentes, vem se apresentando como portador de importantes transformações. Nele amadurecem processos e tendências que poderão influenciar bastante o futuro da região seridoense. Isso porque uma das tendências mais evidentes do ambiente externo é a crescente interação entre os diversos espaços do tecido socioeconômico mundial. As facilidades crescentes de acessibilidade, patrocinadas pelos avanços nos meios de comunicação tornam o mundo cada vez mais próximo. Por sua vez, o crescente aumento do tamanho dos agentes econômicos, como resultado de intensa centralização de capitais, e a nítida estratégia de atuação descentralizada desses conglomerados, fazem com que esses fatores estejam presentes, influenciando a vida de cada vez mais numerosos lugares. Daí a importância desse olhar sobre o ambiente externo. De maneira muito sucinta, podem ser destacados alguns movimentos e tendências com capacidade de produzir impactos sobre a vida seridoense, tanto de forma negativa, aportando ameaças a enfrentar, como de forma positiva, criando oportunidades a aproveitar. Dentre os mais relevantes se destacam os 311 seguintes: o avanço da globalização; a mudança de paradigma tecnológico; a reestruturação produtiva e financeira; as mudanças no padrão de organização do comércio internacional e a política de abertura conduzida pelo governo do Brasil; as mudanças no mercado de trabalho; a opção brasileira pela “integração competitiva”; e a crise e reforma do Estado. É evidente o avanço da globalização e a tendência a esta associada à difusão de padrões econômicos (produtivos, tecnológicos, gerenciais, de consumo), mas também de padrões culturais (valores, práticas e manifestações culturais). Tende-se, assim à homogeneização e se ameaçam os valores e padrões locais. Por sua vez, a globalização, dado o seu caráter seletivo, tende a valorizar espaços e atividades mais dinâmicas e competitivas, assim como a gerar um crescente processo de exclusão econômica, social e mesmo cultural. Como o Brasil vem, desde a colonização, aprofundando sua inserção no movimento de internacionalização da economia mundial, os impactos que dele recebe são nítidos e importantes. Pelo seu potencial, o Brasil é um dos espaços que atraem o interesse dos agentes mundiais. Só que essa capacidade de atração se revela, também, de forma seletiva, e o Nordeste não se apresenta como foco central desse interesse, a não ser em subespaços muito bem definidos, dentre os quais não se insere o espaço Seridoense. Há uma clara mudança do paradigma tecnológico, consubstanciada numa verdadeira Revolução Científico-Tecnológica em curso. A hegemonia crescente do paradigma microeletrônico (portador e disseminador do atributo da flexibilidade), o avanço da produção de novos materiais, as novas conquistas da biotecnologia são, entre outros, indicativos de que se adentra uma nova era tecnológica. A disseminação desses avanços vem provocando mudanças aceleradas e fortes impactos nos mais diversos setores da atividade humana. Ao mesmo tempo, concedem papel cada vez mais relevante à educação e sobretudo à produção de conhecimento. Trata-se de um grande desafio para o Seridó interagir com essa tendência, devido aos relativamente baixos padrões de escolaridade de sua população e de produtividade de sua base econômica atual. A reestruturação produtiva e financeira, que constitui uma tendência mundial, também avança no Brasil. Em nosso caso, de forma tardia mas rápida, tem provocado ruptura e desmonte de atividades, empresas e organizações produtivas. A crise do complexo algodoeiro e da atividade mineradora seridoense, por exemplo, tem determinantes internos, mas têm influência desses novos patamares mundiais. E as possibilidades de sua recuperação não pode deixar de considerar esse processo reestruturador que ocorre mundialmente. A não ser atividades de base local, que se destinam a mercados muito locais, as atividades a serem patrocinadas na região precisam ser promovidas considerando os novos padrões definidos por esse intenso movimento de reestruturação, que ocorre no mundo e no Brasil. As mudanças no padrão de organização do comércio internacional e a política de abertura conduzida pelo governo do Brasil definem, por sua vez, um novo contexto de acordo com o qual há que pensar a inserção de segmentos da vida econômica do Seridó, que podem acessar mercados mais amplos (a produção de caprinos e a fruticultura, entre outros) ou que têm que concorrer no seu mercado com agentes de outros lugares (os chineses, no caso da mineração, por exemplo). As mudanças no mercado de trabalho estão associadas ao processo de reestruturação produtiva, à mudança do paradigma tecnológico, aos novos padrões de competição e às próprias políticas brasileiras nesse campo. A busca da flexibilização, a crescente precarização das relações de trabalho, a significativa redução do emprego formal, a crescente exigência por maiores níveis de qualificação, a drástica redução da demanda por empregos em alguns segmentos são alguns dos processos em curso que já impactam fortemente no Brasil e no Seridó. Com uma oferta abundante de mão-de-obra, relativamente pouco qualificada, o Seridó está, aqui, também, diante de importante desafio a enfrentar. Por outro lado, a 312 capacidade de iniciativa de sua população constitui potencialidade a ser aproveitada num mundo onde se valoriza cada vez mais algumas atividades onde o “fazer diferente” é o que atrai produtores e compradores. A opção brasileira pela “integração competitiva”, que termina por valorizar espaços e atividades já mais competitivas, para estimular sua maior inserção na economia mundial e que contribui para se conferir menos prioridade a regiões mais problemáticas como o Seridó, também constitui um movimento importante nos domínios das opções e ameaças que se está examinando. A crise e Reforma do Estado, por fim, representa um processo mundial, cujas particularidades vêm sendo importantes para o ambiente brasileiro. As ocorrências nessa área passaram a ser melhor conhecidas e a pesarem nas decisões de investimento em décadas mais recentes. Apresenta-se, a seguir, um esforço de síntese sobre prováveis impactos sobre o Seridó, tanto positivos como negativos, advindos das relações entre essa sub-região do Rio Grande do Norte e seu ambiente externo. Num primeiro momento são apresentados os aspectos que podem ser classificados como ameaças ao desenvolvimento sustentável do Seridó. Descortinam-se possíveis obstáculos e empecilhos corporificados em aspectos capazes de produzirem repercussões negativas significativas sobre o desenvolvimento da economia, de contribuírem para a deterioração das condições de vida ou, ainda, impactos que possam ampliar a degradação do ambiente natural. Num segundo momento, são apresentadas as oportunidades que o ambiente externo pode trazer. São identificados aspectos positivos para o desenvolvimento sustentável do Seridó, em suas diferentes dimensões, permitindo-lhe evoluir na direção de uma sociedade com grau maior de sustentabilidade nas relações sociais, nas condições de vida e nas relações das pessoas e empresas com o meio ambiente. 3.7.1 Ameaças Entre as ameaças do ambiente externo, cabe referência aos seguintes pontos, considerados da maior relevância: • a prevalência no contexto econômico nacional e regional das políticas de integração competitiva, que, dadas as suas premissas, estão associadas à seletividade espacial e ao reforço às subregiões que têm mostrado, mais recentemente, grande dinamismo a partir das forças de mercado. No Rio Grande do Norte, é provável que sejam privilegiados espaços econômicos como a Grande Natal, a Região do Entorno de Mossoró e os Perímetros de Irrigação voltados para a produção de frutas tropicais – como o Vale do Açu –, continuando o Seridó a constituir um dos espaços de reduzida prioridade. Os planos plurianuais de investimento tanto do governo Federal como do estadual não conferem prioridade ao Seridó, o que confirma essa ameaça a ser enfrentada com iniciativas da sociedade regional ; • a aceleração do processo de desenvolvimento tecnológico é também muito seletiva. Tende a fortalecer economicamente determinadas áreas e sub-regiões produtoras, que passam a concorrer com as demais, excluindo dos mercados sobretudo aquelas nas quais é muito baixa a produtividade de sua base produtiva. Tais áreas não dispõem, portanto, de atividades capazes de remunerar as tecnologias mais modernas. Isso coincide, no Brasil, com inadequadas condições de financiamento, por parte das fontes que financiam o desenvolvimento tecnológico, dado o ambiente macroeconômico onde prevalecem taxas de juros muito elevadas; 313 • a crescente tendência de intensa competição no mercado interno e, em decorrência, as exigências crescentes quanto ao custo e a qualidade dos produtos. Essa circunstância atua no sentido de excluir a produção local das sub-regiões mais atrasadas, econômica e tecnologicamente, por adotarem processos de produção inadequados, do ponto de vista das novas exigências do mercado; • a continuidade da crise do setor público e de sua incapacidade para atender às demandas das regiões, sub-regiões e localidades de menor desenvolvimento e dinamismo, que, além disso, registram precárias condições de vida. Os cortes crescentes dos investimentos públicos que desempenharam e podem desempenhar papel relevante no crescimento de muitas das áreas menos industrializadas do País, assim como o menor significado que passaram a ter as transferências negociadas aos governos estaduais e municipais – em razão do menor dinamismo das receitas públicas – decorrente da política de descentralização, passaram a ter papel relevante nas políticas sociais. Agregue-se a isto a recente descentralização das políticas públicas que registram uma tendência a favorecer os municípios mais estruturados, em detrimento daqueles com mais reduzido grau de estruturação, na perspectiva da administração e planejamento de suas ações; • as exigências crescentes, no mercado de trabalho, de uma demanda de mão-de-obra com maior grau de instrução e qualificação, além de um domínio mínimo de tecnologias modernas, contrastando com as condições vigentes da força de trabalho da maior parte dos municípios do Seridó, onde prevalecem taxas significativas de analfabetismo, um número médio de anos de escolaridade da população muito reduzido e uma oferta limitada de escolas e instituições que permitam o acesso da população a cursos de formação profissional de acordo com as exigências do mercado; e • condições desfavoráveis da oferta de crédito, diante de sua inadequação à realidade da grande maioria das empresas seridoenses e suas necessidades. 3.7.2 Oportunidades No contexto das oportunidades que o ambiente externo oferece, e que devem ser levadas em consideração na elaboração de uma estratégia de desenvolvimento sustentável para o Seridó, cabe fazer referências às seguintes: • a possibilidade de concretização, no médio prazo, da transposição de águas do São Francisco, que poderá implicar a regularização da oferta de água para o consumo humano e animal; para o desenvolvimento de atividades urbano-industriais; e para atividades produtivas menos vulneráveis e de maior nível de produtividade; • a prioridade que tem sido dada, nas administrações recentes, aos programas voltados para o aumento da oferta de água, em particular o abastecimento de água dos centros urbanos; • a tendência mundial de valorização das “marcas”, tradições e especificidades locais, que a Região do Seridó pode explorar, dada sua história e características culturais marcantes, que a individualizam no contexto do estado e da região nordestina. Neste particular, cabe o registro da força da cultura local e de sua capacidade de abrir espaços para o desenvolvimento de atividades artísticas, artesanais e manifestações culturais, que podem ser valorizadas visando a consolidação de uma identidade cultural e, simultaneamente, a constituição de apoio significativo aos programas de geração de emprego e renda; 314 • redefinição das estratégias de grandes empresas no sentido de descentralização, terceirização e interiorização de algumas atividades, que poderá beneficiar empresas da região, oferecendo oportunidades locais de emprego, sobretudo se a descentralização e interiorização ocorrerem em contexto de relações formais e institucionais de trabalho. O Seridó, embora ainda de forma incipiente, já se beneficia dessas estratégias, como comprovam as tendências recentes da produção de chuteiras e da castanha-de-caju; • a ampliação da demanda de produtos locais como laticínios, tanto da perspectiva do mercado como por intermédio de programas governamentais, podendo, em contexto de melhoria do rendimento e da produtividade da agropecuária local, repercutir favoravelmente na criação de emprego e renda na região; • manutenção dos elos de solidariedade da população sertaneja emigrante, relativamente à residente na região, do que decorre, no presente, a minimização das condições críticas de parcela das famílias mais carentes, notadamente na ocorrência de secas e estiagem. No futuro, essa prática cultural poderia ser também orientada para fortalecer pequenos negócios locais; • aumento nacional dos gastos com o ensino fundamental, em particular, criando oportunidades adicionais para reduzir as carências locais, sobretudo melhorando os índices de analfabetismo e de baixa escolaridade da população seridoense, que tem sabido valorizar a educação, mesmo em situações mais adversas; • existência de tecnologias usadas com sucesso em outros locais e capazes de superar as limitações locais, no que se refere à disponibilidade de recursos naturais e, em particular, à melhora da convivência com as condições climáticas adversas do semi-árido; • emergência de novas formas de relação entre o público e o privado, favorecendo o surgimento e a consolidação de associações, parcerias e outros arranjos institucionais, capazes de melhorar os sistemas e processos locais de gestão; • ampliação do debate internacional e nacional em torno da desertificação, colocando o Seridó na pauta de discussões em fóruns apropriados; • existência de lideranças que ocupam postos-chave no quadro político-institucional nacional e que têm o Seridó como sua região de nascimento. 315
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