COPYRIGHT BY ESCOLA DE ENFERMAGEM ANNA NERY
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COPYRIGHT© BY ESCOLA DE ENFERMAGEM ANNA NERY da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Proibida a reprodução, total ou parcial, por qualquer meio e sistema, sem a devida autorização da Comissão Editorial. Proibida a utilização para fins comerciais da matéria publicada. Todos conceitos, idéias e pressupostos contidos nas matérias publicadas por este periódico são de inteira responsabilidade de seus autores. UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO Reitor/President/Rector Prof. Dr. Aloísio Teixeira CENTR O DE CIÊNCIAS DDAA SAÚDE CENTRO Decano/Dean/Decano Prof. Dr. Almir Fraga Valladares ESCOLA DE ENFERMA GEM ANN ENFERMAGEM ANNAA NER NERYY Diretora/Director/Directora Profa. Dra. Maria Antonieta Rubio Tyrrell Escola de Enfermagem Anna Nery Universidade Federal do Rio de Janeiro Rua Afonso Cavalcanti, 275 - Cidade Nova Rio de Janeiro - RJ - Brasil CEP: 20211-110 Telefax: +55 (21) 2293-8999 Telefone: +55 (21) 2293-0528 - ramal 209 Home page: www.eean.ufrj.br/revista_enf/revista_enf.htm E-mail: [email protected] / [email protected] INDEXADORES BDENF - Base de Datos de Enfermería - BIREME; CINAHL - Cumulative Index to Nursing & Allied Health Literature ; CUIDEN - Fundación Index; LA TINDEX-Sistema Regional de Información en Línea para Revistas LATINDEXCientíficas de America Latina, el Caribe, España y Portugal; LILACS - Literatura Latinoamericana y del Caribe en Ciencias de la Salud, Biblioteca Vir tual enm Salud - BIREME; MINER MINERVVA - Base de dados da UFRJ; SECS - Seriados em Ciências da Saúde - BIREME; Vice-diretora/Vce-director/Vice-directora Profa. Dra. Regina Celia Gollner Zeitoune Coordenadora Geral de Pós-Graduação e Pesquisa/ Postgraduation and Research General Co-ordinator/ Coordinadora General de Postgrado e Investigación Profa. Dra. Neide Aparecida Titonelli Alvim Coordenador de Ensino de Graduação e Corpo Discente/ Graduation Teaching and Student Body Co-ordinator/ Coordinador de Enseñanza de Graduación y Cuerpo Discente Prof. Dr. Paulo Vaccari Caccavo Coordenadora de Extensão/ Extension Co-ordinator/ Coordinadora de Extensión Profa. Dra. Maria Catarina Salvador da Motta Escola Anna Nery Revista de Enfermagem/ Universidade Federal do Rio de Janeiro, v.1,n. de lançamento, (1997). Rio de Janeiro: EEAN/UFRJ (1997 - ) Trimestral ISSN 1414-8145 EEAN UFRJ 1937 - 2007 1.Enfermagem - Periódicos. I. Universidade Federal do Rio de Janeiro CDD 61073 Data de impressão/ Printing date/ Fecha de impresión: Março 2007/ March 2007/ Marzo 2007 Tiragem/ Number of issues/ Tiraje: 500 ANOS ESCOLA ANNA NERY REVISTA DE ENFERMAGEM ISSN: 1414-8145 Anna Nery School Journal of Nursing Escuela Anna Nery Revista de Enfermería volume 11 . número 1 . março 2007 POLÍTICA EDITORIAL Como órgão oficial de difusão científica da Escola de Enfermagem Anna Nery da Universidade Federal do Rio de Janeiro, a Escola Anna Nery Revista de Enfermagem tem por finalidade a publicação de trabalhos originais de autores brasileiros e de outros países, relativos à Enfermagem, Saúde e outras áreas afins. Assim, o processo editorial da Revista procura apresentar à comunidade científica, textos que apresentem uma contribuição significativa para a área. Com periodicidade trimestral, a Revista publica resultados de investigações, estudos teóricos, revisões críticas da literatura e atualidades relevantes para a profissão, em consonância com as tendências contemporâneas de interdisciplinaridade entre áreas de conhecimento. Os requisitos necessários ao encaminhamento de manuscritos para publicação neste periódico estão fundamentados nos “Requisitos uniformes para manuscritos apresentados a periódicos biomédicos”, denominado estilo “Vancouver”, do Comitê Internacional de Editores de Revistas Médicas e em outros documentos normalizadores de publicações. EDITORIAL POLICY POLITICA EDITORIAL As the official institution of scientific diffusion of the Anna Nery School of Nursing of the Federal University of Rio de Janeiro, the Anna Nery School Journal of Nursing has the purpose of publishing original works from Brazilian authors and from other countries related to Nursing, health, and related areas. Thus, the publishing process of the Journal looks forward to presenting to the scientific community texts that show a significant contribution to the area. Every quarter the Journal publishes investigation results, theoretical studies, critical literature reviews and relevant updated information for the profession. The necessary requirements for submitting manuscripts for publication in this periodical are based on the “Unifor m requirements for manuscripts presented to biomedical periodicals”, named “Vancouver” style, described by the International Committee of Publishers of Medical Magazines and other documents that normalize publications. Como órgano oficial de difusión científica de la Escuela de Enfermería Anna Nery, de la Universidad Federal de Rio de Janeiro, la Escuela Anna Nery Revista de Enfermería tiene por finalidad la publicación de trabajos originales de autores brasileños y de otros países referentes a la Enfermería, a la Salud y a otras áreas afines. Así, el proceso editorial de Revista procura presentar a la comunidad científica textos que tengan una contribuición significativa para el área. Con periodicidad trimestral, la revista publica resultados de investigaciones, estudios teóricos, revisiones críticas de la literatura y actualidades relevantes para la profesión. Los requisitos necesarios para el envío de manuscritos para publicación en este periódico están basados en los “Requisitos Uniformes para Manuscritos presentados a periódicos biomedicos”, denominado de estilo “Vancouver”, del Comité Internacional de Revistas Médicas, y en otros documentos normalizadores de publicaciones. CONSELHO DELIBERA TIV O DELIBERATIV TIVO COMISSÃO EDITORIAL DELIBERATIVE BODY / CONSEJO DELIBERATIVO Profa. Dra. Maria Antonieta Rubio Tyrrell / EEAN - UFRJ Prof.a Dr.a Neide Aparecida Titonelli Alvim / EEAN - UFRJ Prof. Dr. Paulo Vaccari Caccavo / EEAN - UFRJ Prof.a Dr.a Maria Catarina Salvador da Motta / EEAN - UFRJ Prof.a Dr.a Isaura Setenta Porto / EEAN - UFRJ EDITORIAL COMMITTEE / COMISIÓN EDITORIAL CONSELHO EDITORIAL Profª. Drª. Ana Beatriz Queiroz / EEAN - UFRJ Profª. Drª. Marluci Conceição Stipp / EEAN - UFRJ Prof. Dr. Antonio José de Almeida Filho / EEAN - UFRJ EDITORIAL BODY / CONSEJO EDITORIAL N A CION AL / NNAATION CIONAL TIONAL AL Prof.ª Dr.ª Ana Fátima Carvalho Fernandes / DE - UFC Prof. Dr. André de Faria Pereira Neto / FIOCRUZ - Ministério da Saúde Prof.ª Dr.ª Antônia Regina Ferreira Furegato / EERP - USP Profª. Drª. Cristina Douat Loyola / EEAN - UFRJ Prof.ª Dr.ª Conceição Vieira da Silva /DE - UNIFESP Prof.ª Emérita Dr.ª Elvira de Felice Souza / EEAN -UFRJ Profª. Drª. Ieda de Alencar Barreira / EEAN - UFRJ Profª. Drª. Isabel Amélia Costa Mendes / EERP - USP Prof.ª Dr.ª Isabel Cristina dos Santos Oliveira / EEAN - UFRJ Profa. Dra. Ivone Evangelista Cabral / EEAN - UFRJ Prof.ª Emérita Dr.ª Josete Luzia Leite / EEAP - UNIRIO Prof.ª Dr.ª Ligia Paim / Curso de Enfermagem Universidade do Vale do Itajaí Prof.ª Dr.ª Lorita Marlena Freitag Pagliuca / DE - UFC Profª. Drª. Maria Antonieta Rubio Tyrrell / EEAN - UFRJ Profª. Drª. Maria Itayra Coelho de Souza Padilha / DE - UFSC Profª. Drª. Maria Cecília Puntel de Almeida / EERP - USP Profa. Dra. Namie Okino Sawada / EERP - USP Profª. Drª. Nébia Maria Almeida de Figueiredo / EEAP - UNIRIO Profª. Drª. Nilce Piva Adami / DE - UNIFESP Profa. Dra. Raimunda Magalhães da Silva / UNIFOR Profa. Dra. Regina Célia Gollner Zeitoune / EEAN - UFRJ Profa. Dra. Rosângela da Silva Santos / EEAN - UFRJ Profa. Dra. Semiramis Melani Melo Rocha / EERP - USP Profª. Drª. Suely de Souza Baptista / EEAN - UFRJ Profª. Emérita Drª. Vilma de Carvalho / EEAN - UFRJ I NTERN AL / INTERN AL NTERNAA CION CIONAL INTERNAA T ION IONAL Beatriz Arana Gómez /Universidad Autónoma del Estado de México Carolyn Waltz Ph.D / University of Maryland (USA) Elvira Rodriguez Antinori Ph.D / Universidad Nacional de Trujillo (Peru) Jacques Henri Maurice Gauthier Ph.D / Université de Paris VIII Kelly Myrian Jimenez de Aliaga Ph.D / Universidad Autónoma de Tamaulipas (México) Luz Angélica Muñoz Gonzalez Ph.D /Universidad Andrés Bello (Chile) Manuel Lillo Crespo Ph. D / Universidad de Alicante (ES) Maria da Glória Miotto Wright Ph.D / Organization of the American States Marta Hetsell / University of New YorK (USA) Michel Perreault Ph.D / Université du Montreal (Canadá) Robbie Davis Floyd Ph.D / University of Texas (USA) Rosa Maria Nájera Ph.D / Universidad Autonoma Metropolitana - Xochimilco Sara Torres RN Ph.D / University of Medicine and Dentristy of New Jersey (USA) Sebastián Bustamante Edquén Ph.D / Universidad Nacional de Trujillo (Peru) Violeta Ribeiro Ph.D / University of New Foundland (USA) Editor Chefe / Chief Editor / Editor Jefe Profa. Dra. Isaura Setenta Porto / EEAN - UFRJ Editor Assistente / Assistent Editor / Editor Asistente Profª Drª Maria Helena do Nascimento Souza / EEAN - UFRJ Editores Associados / Associated Editors / Editores Asociados CONSELHO DE C ONSUL ONSULTT ORES AD HOC AD HOC ADVISERS BODY / CONSEJEROS AD HOC Profª. Drª. Aidê Ferreira Ferraz / UFMG Profª. Drª. Ana Inês Sousa / EEAN - UFRJ Profª. Drª. Ana Maria Domingos / EEAN - UFRJ Prof.ª Dr.ª Angela Maria Mendes Abreu / EEAN - UFRJ Profa. Dra. Beatriz Guitton Renaud Baptista de Oliveira / EEAAC - UFF Profa. Dra. Benedita Maria Rêgo Deusdará Rodrigues /FE - UERJ Profª. Drª. Carla Luzia França Araújo / EEAN - UFRJ Prof.ª Dr.ª Claudete Ferreira de Souza Monteiro / DE - UFPI Profa. Dra. Claudia Mara de Mello Tavares / EEAAC - UFF Profa. Dra. Claudia Santos/ EEAN - UFRJ Profa. Dra. Denize Cristina de Oliveira / FE - UERJ Profa. Dra. Deyse Conceição Santoro Batista / EEAN - UFRJ Profa. Dra. Elisabete Pimenta Araújo Paz / EEAN - UFRJ Profª. Drª. Elizabeth Teixeira / DE - UEPA Profa. Dra. Emiko Yoskikawa Eguy / EE - USP Profa. Dra. Enedina Soares/ EEAP - UNIRIO Profa. Dra. Enilda Rosenda do Nascimento/ EE - UFBA Profa. Dra. Enirtes Caeteno Prates Melo / EEAP - UNIRIO Profa. Dra. Fátima Helena do Espírito Santo / EEAAC - UFF Prof. Dr. Francisco Carlos Félix Lana / EE - UFMG Profa. Dra. Florence Romijn Tocantins / EEAP - UNIRIO Profa. Dra. Gertrudes Teixeira Lopes / FE - UERJ Profa. Dra. Glória da Conceição Mesquita Leitão / DE - UFC Profa. Dra. Ida Hauns de Freitas Xavier / EE - UFFGS Profa. Dra. Iraci dos Santos / FE - UERJ Prof.ª Dr.ª Inez Sampaio Nery / DE - UFPI Dra. Jaqueline da Silva / EEAN - UFRJ Profa. Dra. Jane Márcia Progianti / FE - UERJ Prof. Dr. João Ferrreira da Silva Filho / IPUB - UFRJ Profa. Dra. Kaneji Shiratori / EEAP - UNIRIO Profa. Dra. Lolita Dopico / FE - UERJ Profa. Dra. Lúcia Helena Silva Corrêia Lourenço / EEAN - UFRJ Profa. Dra. Márcia de Assunção Ferreira / EEAN - UFRJ Profa. Dra. Márcia Teresa Luz Lisboa / EEAN - UFRJ Prof. Dr. Marcos Antonio Gomes Brandão / EEAN - UFRJ Profª. Drª. Margarethe Maria Santiago Rêgo / EEAN - UFRJ Profa. Dra. Maria Aparecida de Luca Nascimento / EEAP - UNIRIO Profa. Dra. Maria Aparecida Vasconcelos Moura / EEAN - UFRJ Profª. Drª. Maria Catarina Salvador da Motta / EEAN - UFRJ Profa. Dra. Maria da Luz Barbosa Gomes / EEAN - UFRJ Prof.ª Dr.ª Maria da Soledade Simeão dos Santos / EEAN - UFRJ Prof.ª Dr.ª Maria do Livramento Fortes Figueiredo / DE - UFPI Profª. Drª. Maria Eliete Batista Moura / UFPI Profa. Dra. Maria Grasiela Teixeira Barroso / DE - UFC Profa. Dra. Maria Henriqueta Luce Kruce / EE - UFRGS Profa. Dra. Maria José Coelho / EEAN - UFRJ Profa. Dra. Maria Luiza Gonzales Riesgo / EE - USP Prof.ª Dr.ª Maria Magda Ferreira Gomes Balieiro / EE - USP Profa. Dra. Maria Tereza Coimbra de Carvalho / Centro Universitário Vila Velha (ES) Profa. Dra. Maria Tereza Leopardi / DE - UNESC Profa. Dra. Maria Therezinha Nóbrega da Silva / FE - UERJ Profa. Dra. Marialda Christoffel / EEAN - UFRJ Profª. Drª. Marilurde Donato / EEAN - UFRJ Profª. Drª. Marlea Chagas Moreira / EEAN - UFRJ Profa. Dra. Marlene Alves de Oliveira Carvalho / Faculdade de Educação - UFRJ Profª. Drª. Marli Villela Mamede / EERP - USP Prof.ª Dr.ª Miriam Struchiner / NUTES - UFRJ Prof.ª Dr.ª Mirian Paiva / EE - UFBA Profa. Dra. Neide Aparecida Titonelli Alvim / EEAN - UFRJ Prof. Dr. Osnir Claudiano da Silva Junior / EEAP - UNIRIO Prof. Dr. Paulo Vaccari Caccavo / EEAN - UFRJ Profa. Dra. Rita Batista Santos / EEAN - UFRJ Profa. Dra. Rosane Harter Griep / FIOCRUZ - Ministério da Saúde Profa. Dra. Rosane Mara Pontes de Oliveira / EEAN - UFRJ Profa. Dra. Ruth Mylius Rocha / FE - UERJ Profa. Dra. Sheila Nascimento Pereira Farias / EEAN - UFRJ Profa. Dra. Sílvia Teresa Carvalho de Araújo / EEAN - UFRJ Profa. Dra. Sonia Mara Farias Simões/ EEAAC - UFF Prof.ª Dr.ª Stela Maris de Mello Padoin / DE - UFSM Profa. Dra. Sueli Rezende Cunha / FIOCRUZ - Ministério da Saúde Profa. Dra. Tânia Cristina Franco Santos / EEAN - UFRJ Enf.ª Drª. Teresa Caldas Camargo / Instituto Nacional do Câncer - Ministério de Ciência e Tecnologia Prof.ª Dr.ª Telma Maria Evangelista Araújo / DE - UFPI Profa. Dra. Thelma Leite de Araújo / DE - UFC Prof.ª Dr.ª Violante Augusta Batista Braga / DE - UFC Prof. Dr. Wellington Mendonça de Amorim / EEAP - UNIRIO Prof. Dr. William César Alves Machado/Faculdade de Enfermagem Juiz de Fora - Universidade Presidente Antonio Carlos Profa. Dra. Zenith Rosa Silvino / EEAAC - UFF Profa. Dra. Zuila Maria de Figueiredo Carvalho / DE - UFC PRODUÇÃO Central de Eventos Científicos e Culturais EEAN//UFRJ Coordenação Acadêmica Profª Drª Maria Helena do Nascimento Souza Jornalista Responsável Raphaela Ximenes Machado (Registro MT: JP23872 RJ) Bibliotecárias Lúcia Marina Boiteux de F. Rodrigues Lúcia Maria Pinho Apoio Administrativo Fabiana dos Santos Ramada Gina Caruso Mac Donald Brouck Projeto Gráfico /Capa/Editoração Eletrônica Raphaela Ximenes Machado Revisão de Português, Inglês e Espanhol Mariana Villanova Vieira Raphaela Ximenes Machado SUMÁRIO ESCOLA ANNA NERY SUMMARY6 6 SUMARIO REVISTA DE ENFERMAGEM ANNA NERY SCHOOL JOURNAL OF NURSING ESCUELA ANNA NERY REVISTA DE ENFERMERÍA volume 11 09 . número 1 . março 2007 EDITORIAL 52 70 Anos da Escola de Enf er ma Enfer erma maggem Anna Ner Neryy na Uni sidade: a Glória de ser e os Desaf ios a Conquistar Univver ersidade: Desafios Operative Groups of Learning in the Health Services: Basis and Methodologies Systematization Los Grupos Operativos de Aprendizaje en los Servicios de Salud: Sistematización de Fundamentos y Metodologias Sônia Maria Soares Aidê Ferreira Ferraz 70 Years of the Anna Nery Nursing School in the University: the Glory of Being and the Challenges to Conquer 70 Anõs de la Escuela de Enfermería Anna Nery en la Universidad: la Gloria de Ser y los Desafíos a Conquistar Maria Antonieta Rubio Tyrrell Regina Célia Gollner Zeitoune FAC-SÍMILE 58 Perf xuais de Uni sitários da Ár ea de Saúde erfilil e Práticas Se Sexuais Univv er ersitários Área 66 Estresse no Cotidiano Acadêmico: o Olhar dos Alunos de Enf er ma eder al do Piauí ederal Enfer magg em da Uni Univv er sidade FFeder FACSIMILE/FACSÍMILE 15 Apresentação Apresentação// Presentation/Presentación Lúcia Helena Silva Corrêa Lourenço Antonio José de Almeida Filho Fernando Porto Documento original original// Original document/Documento original O De par tamento de Enf er ma Depar Enfer magg em n uma Uni tólica dos Estados Unidos Univv er sidade Ca Católica 23 30 73 Qualidade de Vida de Clientes Pós-Inf ar to Agudo do Miocár dio Pós-Infar Miocárdio 80 Non-V erbal Comm unica tion: Aspects Obser v ed Non-Verbal Communica unication: During Nur sing Consulta tions with Blind PPaa tients Consultations Comunicação não-verbal: Aspectos Observados Durante a Consulta de Enfermagem com o Paciente Cego Comunicación non-verbal: Aspectos Observados Durante la Consulta de Enfermería con el Paciente Ciego Cristiana Brasil de A. Rebouças Lorita Marlena F. Pagliuca Paulo César de Almeida 44 Clientes com Doença Renal Crônica: Avaliação de Enf er ma Enfer magg em sobr e a Competência par paraa o A utocuidado Clients with Chronic Renal Disease: Nursing Evaluation about the Competence for the Selfcare Clientes con Enfermedad Renal Crónica: Evaluación de Enfermería sobre la Competencia para el Auto-cuidado Gilvanice de Sousa Pacheco Iraci dos Santos Rachel Bregman Entr er ma ter na Entree a Enf Enfer magg em e a Ma Mater terna nagg em: um Estudo sobr sobree ação Enf er meir ecém-Nascido Interação Enfer meiraa e RRecém-Nascido a Inter Between Nursing and Mother Nursing: a Study on the Nurse and the New-Born Interaction Entre La Enfermería y la Maternería: un Estudio Sobre la Interacción Enfermera y Recién Nacido Flávia Cristina Cordeiro Biesbroeck Mariana Gomes Cardim Maria Aparecida de Luca Nascimento Client’s Quality of Life After Myocardial Infarction Calidad de Vida de los Pacientes Pós-Infarto Agudo del Miocárdio Joselany Afio Caetano Enedina Soares 38 Os Pr of issionais de Enf er ma Prof ofissionais Enfer magg em Diante do Nascimento da Criança com Malf or mação Congênita Malfor Nursing Professionals Before of the Birth of a Child with Congenital Malformation Los Profesionales de Enfermería Adelante del Nacimiento de un Niño con Malformación Congénita Iêda Maria Ávila Vargas Dias Rosangela da Silva Santos P erf erfilil dos Idosos Inter nados no Hospital geral em Belém (Pará) Profile of the Elderly Admited in a General Hospital at Belém (Pará) Perfil de los Ancianos Internados en un Hospital General en Belém (Pará) Maria Izabel Penha de Oliveira Santos Profile and Sexual Practical of College Students from Health Area Perfil y Practicas Sexuales de Universitarios del Area de Salud José Stênio Pinto Falcão Júnior Samia Thábida de Oliveira Rabelo Emeline Moura Lopes Lydia Vieira Freitas Ana Karina Bezerra Pinheiro Lorena Barbosa Ximenes Stress in the Academic Daily: A Nursing Student View from the Federal University of Piauí - Brazil Estrés en el Cotidiano Académico: El Mirar de los Estudiantes de Enfermería de la Universidad Federal del Piauí – Brasil Claudete Ferreira de Souza Monteiro Jairo Francisco de Medeiros Freitas Artur Assunção Pereira Ribeiro The Nursing Department in a Catholic University of the United States of America El Departamento de Enfermería en una Universidad Católica de los Estados Unidos PESQUISA RESEARCH/INVESTIGACIÓN Gr upos Oper endiza Operaa titivv os de A pr prendiza endizagg em nos Ser viços de Saúde: Sistematização de Fundamentos e Metodologias 86 P er ce pções Ma ter nas Sobr to erce cepções Mater Sobree o Neona Neonato em Uso de Fototerapia Maternal Perceptions About the Newborn in Use of Phototherapy Percepciones Maternales Sobre el Recién Nacido en Uso de Fototerapia Francisca Leonilda Sampaio Rodrigues Isolda Pereira da Silveira Antonia do Carmo Soares Campos 92 A FFamília amília da Criança De pendente de Tecnolo gia: Dependente ecnologia: Aspectos Fundamentais para a Prática de Enf er ma Enfer magg em no Ambiente Hospitalar The Family of the Technology-Dependent Child: Fundamental aspects for hospital nursing practices La familia del Niño Dependiente de Tecnología: Aspectos fundamentales para la práctica de enfermería en el ambiente hospitalario Noélia Silva Ladislau Leite Sueli Rezende Cunha 7 98 105 A Vi vência de Mulher es no PPar ar to Domiciliar e Hospitalar Mulheres Women Experience with Home and Hospital Childbirth La Vivencia de Mujeres en el Parto Domiciliar y Hospitalario Cilene Delgado Crizóstomo Inez Sampaio Nery Maria Helena Barros Luz REFLEXÃO REFLECTION/REFLEXIÓN 138 Seventy Years of the Anna Nery School of Nursing’s University Life: a Brief Reflection Setenta Años de Vida Universitaria de la Escuela de Enfermería Anna Nery: una Breve Reflexión Maria Antonieta Rubio Tyrrel Tânia Cristina Franco Santos A Percepção de Mulheres sobre Atenção Pré-Natal em uma Unidade Básica de Saúde Women’s Perception About Pre-Conception Attention in a Basic Health Unit La Percepción de Mujeres Sobre Atención Pre-Natal en una Unidad Básica de Salud Maria Celeste Landerdahl Lúcia Beatriz Ressel Fernanda Badineli Martins Fernanda Bheregaray Cabral Mariam de Oliveira Gonçalves 112 As Práticas Populares de Cura Utilizadas por Rezadores no PPoo v oado Br ejinho Brejinho ejinho,, Município de Luiz Cor r eia – PI The Popular Healing Practical Used by Prayers in the Brejinho Village, in Luiz Correia City - Piauí - Brazil Las Practicas Populares de Cura Usadas por los Rezadores en el Pueblo Brejinho, Ciudad de Luiz Correia - Piauí – Brasil Lis Cardoso Marinho Medeiros Gláucia Antonia Viana de Azevedo Fábio Mota Machado Simone Ramos de Sousa 118 A Enf er ma ea de Conhecimento no CNPq: Enfer erma magg em Como Ár Área Resgate Histórico da Representação de Área RELATO DE EXPERIÊNCIA EXPERIENCE REPORT/RELATO DE EXPERIENCIA 143 127 150 155 The subject search at and of the nursing work: The Foucaul’s event and the worker’s subjections La procura del sujeto en/del trabajo de enfermería: El acontecimiento “Foucaultiano” y las sujeciones del trabajador Mara Ambrosina Vargas Flávia Regina Souza Ramos Joel Rolim Mancia Denise Pires 133 Práticas Educa titivv as em Gr upo com uma Tecnolo gia Educati Grupo ecnologia Sócio-Educativa: Vivências na Ilha de Caratateua, Belém Educational practices in group with a partner-educational technology: Existences in the Caratateua Island, Belém - Brazil Prácticas educativas en el grupo con una tecnología socio-educativa: Viviencias en la Isla de Caratateua, Belém – Brasil Elizabeth Teixeira 160 INSTRUÇÕES PARA PUBLICAÇÃO DE MANUSCRITOS PUBLISHING INSTRUCTIONS FOR MANUSCRIPT PUBLICATION INTRUCCIONES PARA LA PUBLICACIÓN DE MANUSCRITOS 169 FICHA DE ASSINATURA SUBSCRIPTION FORM FICHA DE SUSCRIPCIÓN Estudo Eletr lação por Ca teter : Eletrof ofisiológico Ablação Cateter of isiológico e Ab er ma ecisa Sa ber Enfer magg em Pr Precisa Saber o que a Enf Electrophysiologic study and catheter ablation: what the nursing should know Estudio electrofisiológico y ablación por catéter: qué la enfermería precisa saber Lutgarde Magda Suzanne Vanheusden Deyse Conceição Santoro T he Li ving Lif or Tr aining Living Lifee Pr Proo g r am – a Str Straa te tegg y ffor of Comm unity Health Ag ents as Social Educa tor Community Agents Educator torss to Give Community Attention in Mental Health O Programa Viva a Vida – uma estratégia de capacitação de agentes comunitários de saúde como educadores sociais capazes de prestar atenção comunitária em saúde mental El Programa Viva la Vida – una estrategia para entrenamiento de agentes comunitarios de salud como educadores sociales capaces de prestar atención comunitaria en salud mental Cristina Loyola Sebastião Rocha A Pr ocur er ma Procur ocuraa do Sujeito no/do Tr abalho de Enf Enfer erma maggem: O Acontecimento “F oucaultiano” e as Sujeições do Trabalhador “Foucaultiano” REVISÃO REVISION/REVISIÓN Potencial Ter eraa pêutico da FFenitoína enitoína na trização de RRadioder adioder mites Cicatrização Cica Therapeutical potential of the phenytoin in the cicatrisation of radiotherapy lesions Potencial terapéutico de la fenitoína en la cicatrización de radiodermitis Flavia Firmino Nursing as an Area of Knowledge in the CNPq: Historical Rescue of the Representation of the Area Enfermería como Área de Conocimiento en el CNPq: Rescate Histórico de la Representación del Área Alacoque Lorenzini Erdmann Isabel Amélia Costa Mendes Joséte Luzia Leite ENSAIO ESSAY/ENSAYO Setenta Anos de V ida Uni Univv er sitária da Escola de Enf er ma ef le xão Enfer magg em Anna Ner y: Uma Br Bree v e RRef efle lexão 8 70 Anos da Escola de Enfermagem Anna Nery: a Glória se ser e os Desafios a Conquistar Tyrrell MAR et al 9 EDITORIAL 70 ANOS DA ESCOLA DE ENFERMAGEM ANNA NERY NA UNIVERSIDADE: A GLÓRIA DE SER E OS DESAFIOS A CONQUISTAR Maria Antonieta Rubio Tyrrell Regina Célia Gollner Zeitoune A Escola de Enfermagem Anna Nery (EEAN/UFRJ), durante 70 anos de inserção no sistema universitário e 84 anos de existência a serviço da vida, criou-se e fortaleceu-se dotada de uma estrutura de extraordinária vitalidade, o que tem lhe permitido persistir durante oito décadas dedicando-se, principalmente, à formação e qualificação de Enfermeiros em níveis de graduação e licenciatura, pós-graduação (lato e stricto sensu), construção de conhecimento e extensão universitária, e, com isto, contribuir com a preservação da qualidade da gestão dos serviços e da assistência à população brasileira. A EEAN, graças ao seu papel de guardiã da profissão e de sua história, do conhecimento, mediadora entre gerações antigas e gerações novas e de crítica do estado e da sociedade, tem a função precípua de formar profissionais capacitados e comprometidos que sejam também cidadãos com capacidade para tomar decisões e posições de defesa dos direitos humanos na sociedade e que contribuam para o desenvolvimento da profissão e da qualidade da vida e de saúde da população brasileira. Além de demarcar a implantação do modelo de enfermagem nightingaleano no Brasil com um novo modelo de Enfermeira no país, decorrente da influência da missão de enfermeiras americanas liderada pela insigne Miss Ethel Parsons (1922), chefe daquela missão, a EEAN é, também, marco de referência na criação dos Cursos Lato Sensu (década de 1940), Cursos Stricto Sensu - Mestrado (década de 1970), empreendimentos que representam verdadeiros legados históricos que asseguram a memória, a institucionalização do Padrão Anna Nery (PAN) e o desenvolvimento do ensino e da prática da Enfermagem no Brasil. A EEAN/UFRJ, contando com os legados da missão Parsons, constitui-se berço da Associação Brasileira de Enfermagem - ABEn, à época denominada Associação de Enfermeiras Diplomadas Brasileiras (1926), e da Revista Brasileira de Enfermagem (REBEn), à época intitulada Annaes de Enfermagem (1ª edição em 1932). Estes acontecimentos continuam assegurando aos seus herdeiros, e principalmente aos desta Escola, a convicção de que os feitos político-sociais significam para uma profissão seus “indicadores de progresso” e, em nosso entendimento, suas “fortalezas” para a “unidade e identidade profissional”. A EEAN/UFRJ, numa avaliação de desempenho acadêmico nos últimos cinco anos, por meio de uma avaliação qualitativa, se apresenta, fundamentalmente, no cenário nacional e internacional, como segue: - Vinculada à ABEn Nacional desde 2005, marcada pelo apoio ao seu Projeto PolíticoPedagógico-Científico; - Filiada à Asociación Latinoamericana de Escuelas y Facultades de Enfermería da União das Universidades da América Latina (ALADEF/UDUAL), 1997, apoiando seus Projetos Educacionais e de Investigação; - Com conceito atribuído ao Curso de Graduação pelo MEC/INEP de 4 (MB), mas esforçando-se para empreender uma reestruturação curricular tomando como base as atuais “Diretrizes Curriculares dos Cursos de Graduação e as necessidades societárias”; - Com conceito da CAPES ao programa de Pós-Graduação de 4 (sendo que em todo o país o conceito máximo obtido pela Enfermagem é de 5), com processo iniciado para uma reforma curricular tomando como base as exigências da CAPES. Este programa tem seu destaque para os indicadores de formação e qualificação de Recursos Humanos de Enfermagem, na perspectiva de solidariedade e intercâmbio técnicocientífico e cultural na perspectiva nacional e internacional; - Avaliação pela CAPES da Escola Anna Nery Revista de Enfermagem como Qualis Internacional “C”. Esta Revista encontra-se empreendendo esforços para conquistar a inserção na coleção SciELO; - Premiação significativa na “Jornada Cientifica da UFRJ” (2005): de 25 melhores trabalhos, 05 foram da EEAN; e nos concursos públicos no Estado do Rio de Janeiro; Anna Nery Enferm 2007 mar; 11 (1): 9 - 14. Esc Anna Nery R EnfermEsc 2007 mar; 11 R(1): 9 - 14. 10 70 Anos da Escola de Enfermagem Anna Nery: a Glória se ser e os Desafios a Conquistar Tyrrell MAR et al - Qualificação do seu corpo docente: de seus 75 professores, 55 professores são doutores; 16 professores encontramse inscritos no curso de doutorado, 100% dos professores são Especialistas e Mestres. No marco histórico e de celebração dos 70 anos de inserção na Universidade e 84 de vida no país, adotamos Barreira (1999), quando ela diz que: [É] uma melhor compreensão da trajetória de nossa profissão, necessária à formação de uma consciência crítica além do conhecimento da história da enfermagem brasileira (aqui expressa num Editorial), que faz parte da cultura profissional de cada qual, depende também do interesse e da consciência que nós mulheres e homens de algum modo envolvidos tivermos das relações passado/presente, o que faz com que valorizemos nossos papéis históricos, como observadores atentos dos sinais de nossa época, como pessoas que nós empenhamos em formar uma opinião esclarecida, como atores que participam do movimento da história e como estudiosos que pretendem contribuir para a compreensão do que nos ocorreu e do que nos ocorre, posto que (parafraseando Hobsbawm), somos parte dessa história e ela é parte de nós. Tomando como base estas considerações, com justiça e merecimento, é que nesta oportunidade dirigimos as nossas homenagens às sempre Diretoras da EEAN: Clara Louise Kieninger (1922 - 1925) Bertha L. Pullen (1928 - 1931 / 1934 - 1938) Lais Netto dos Reys (1938 - 1950) Maria Dolores Lins de Andrade (1967 - 1971) Cecília Pecego Coelho (1975 - 1980) Vilma de Carvalho (1986 - 1989) Maria Cecília Cordeiro Pedro (1994 - 1997) Loraine G. Denhardt (1925 - 1928) Rachel Haddock Lobo (1931 - 1933) Waleska Paixão (1950 - 1967) Elvira De Felice Souza (1971 - 1975) Cilei Chaves Rhodus (1980 - 1985) Raimunda da Silva Becker (1990 - 1993) Ivone Evangelista Cabral (1998 - 2002) Maria Antonieta Rubio Tyrrell (2002 - 2006 / 2006 - 2010) Prof.ª Dr.ª Maria Antonieta Rubio Tyrrell, Diretora da EEAN / UFRJ. Prof.ª Dr.ª Regina Célia Gollner Zeitoune, Vice-Diretora da EEAN / UFRJ. Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 9 - 14. 70 Anos da Escola de Enfermagem Anna Nery: a Glória se ser e os Desafios a Conquistar Tyrrell MAR et al 11 EDITORIAL 70 YEARS OF THE ANNA NERY NURSING SCHOOL IN THE UNIVERSITY: THE GLORY OF BEING AND THE CHALLENGES TO CONQUER Maria Antonieta Rubio Tyrrell Regina Célia Gollner Zeitoune The Anna Nery School of Nursing (EEAN/UFRJ) during 70 years of inser tion in the university system and 84 years of existence in service of the life, was created and for tified endowed with a structure of extraordinary vitality, which has allowed it to persist during eight decades dedicating itself, mainly, to the formation and qualification of Nurses in graduation levels and bachelor’s degree, postgraduation ( lato and stricto sensu ), knowledge construction, university extension and, in this way, to contribute with the quality preservation of the management of the services and the assistance to the Brazilian population. The EEAN, because of this role been guard of the profession and of its history, of the knowledge, mediating between old generations and new generations and been critic of the state and the society, has the main function to form able and engaged professionals who could be also citizens with capacity to take decisions and position of defense of the human rights in the society and could contribute for the development of the profession and the quality of the life and health of the Brazilian population. Besides demarcating the implantation of the nightingale’s model of nursing in Brazil with a new model of Nurse in the country, decurrent of the influence of the mission of American nurses led by the insigne Miss Ethel Parsons (1922), chief of that mission, the EEAN is also, landmark of reference in the creation of the Lato Sensu Courses (decade of 40), Stricto Sensu Courses - Mestrado (decade of 70), enter prises that represent tr ue historical legacies that assure the memor y, the institutionalization of Anna Nery Standard (PAN) and the development of the learning and of the practice of the nursing in Brazil. The EEAN/UFRJ, counting on the legacies of the Parsons mission, consist itself as the cradle of the Brazilian Association of Nursing - ABEn, in the time called Association of Brazilian Diplomee Nurses (1926) and of the Brazilian Magazine of Nursing (REBEn) in that time entitled Annaes of Nursing (1st edition in 1932). These events continue assuring to its heirs and mainly, to the ones of this School, the conviction of that the politics and social actions mean for a profession as its “indicatives of progress” and, in our agreement its “strength” for the “professional unit and identity”. The EEAN/UFRJ, in an evaluation of academic performance in the last five years by a qualitative evaluation, presents itself basically, in the national and international scene as it follows: - Linked to the National ABEn since 2005 marked by the suppor t to its Political, Pedagogical and Scientific Project; - Affiliated to the Asociación Latinoamericana de Escuelas y Facultades de Enfermería of the United Universities of Latin America (ALADEF/UDUAL), 1997, suppor ting its Projects of Education and Investigation; - With concept attributed to the Course of Graduation by MEC/INEP of 4 (MB), but strengthening itself to embark a curricular reorganization taking as basis the current “Curricular Lines of direction of the Courses of Graduation and the Society Necessities”; - With the CAPES concept to the Post graduation Program of 4, (being that in the whole country the maximum concept gotten by the Nursing is of five), with the process initiated for a curricular reform, taking as basis the requirements of the CAPES. This program has its prominence for the formation indicatives and qualification of Human Resources of Nursing, in the perspective of solidarity and technician-scientific and cultural interchange in the national and international perspective; Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 9 - 14. 12 70 Anos da Escola de Enfermagem Anna Nery: a Glória se ser e os Desafios a Conquistar Tyrrell MAR et al - Evaluation by CAPES of the Anna Nery School Journal of Nursing as Qualis International “C”. This Journal finds itself making efforts to conquer the inser tion in SciELO collection; - Significant awarding in the “Scientific Journey of UFRJ” (2005): of the 25 best works, 05 was from EEAN; and in the public concourses in Rio de Janeiro State; - Qualification of its teaching staff: of its 75 professors, 55 professors are doctors; 16 professors are enrolled in the doctorate course, 100% of the professors are Specialists and Masters. In the historical landmark and celebrating the 70 years of University insertion and 84 of life in the country, we adopt Barreira (1999, p. ), when she says: It is a better understanding of the trajectory of our profession, necessary to the formation of a critical conscience beyond knowledge of the Brazilian nursing history (here expressed in an Editorial), that take par t of the professional culture of each one, depends also on the interest and on the conscience that we women and men of some way involved will have of relations past/ present, what makes with that we value ours historical roles, as intent observers of the signals of ours time, as people that we pledge in forming a clarified opinion, as actors that participate of the movement of the history and as studious that intend to contribute for the understanding of what occurred with us and of what occur with us, placing that (paraphrasing Hobsbawm), we are par t of this history and it is par t of us. Taking as basis these considerations, with justice and merit, in this oppor tunity we conduct our tribute to the always Head Directors of EEAN: Clara Louise Kieninger (1922 - 1925) Bertha L. Pullen (1928 - 1931 / 1934 - 1938) Lais Netto dos Reys (1938 - 1950) Maria Dolores Lins de Andrade (1967 - 1971) Cecília Pecego Coelho (1975 - 1980) Vilma de Carvalho (1986 - 1989) Maria Cecília Cordeiro Pedro (1994 - 1997) Loraine G. Denhardt (1925 - 1928) Rachel Haddock Lobo (1931 - 1933) Waleska Paixão (1950 - 1967) Elvira De Felice Souza (1971 - 1975) Cilei Chaves Rhodus (1980 – 1985) Raimunda da Silva Becker (1990 - 1993) Ivone Evangelista Cabral (1998 - 2002) Maria Antonieta Rubio Tyrrell (2002 - 2006 / 2006 - 2010) PhD Professor Maria Antonieta Rubio Tyrrell, Head Director of the EEAN / UFRJ. PhD Professor Regina Célia Gollner Zeitoune, Vicedirector of the EEAN / UFRJ. Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 9 - 14. 70 Anos da Escola de Enfermagem Anna Nery: a Glória se ser e os Desafios a Conquistar Tyrrell MAR et al 13 EDITORIAL 70 ANÕS DE LA ESCUELA DE ENFERMERÍA ANNA NERY EN LA UNIVERSIDAD: LA GLORIA DE SER Y LOS DESAFÍOS A CONQUISTAR Maria Antonieta Rubio Tyrrell Regina Célia Gollner Zeitoune La Escuela de Enfermería Anna Nery (EEAN/UFRJ) durante 70 años de inserción en el sistema universitario y 84 años de existencia a servicio de la vida, fue creada y for tificada dotada de una estructura de extraordinaria vitalidad, que ha permitido que persista durante ocho décadas dedicándose principalmente, a formación y calificación de Enfermeros en niveles de graduación y licenciatura, postgrado ( lato y stricto sensu ), construcción del conocimiento, extensión universitaria y, de esta manera, contribuir con la preservación de la calidad de la gerencia de los ser vicios y de la ayuda a la población brasileña. La EEAN, gracias a su papel de protectora de la profesión y de su historia, del conocimiento, mediando entre las generaciones antiguas y generaciones nuevas y de crítica del estado y de la sociedad, tiene la función principal de formar profesionales capaces y comprometidos que sean también ciudadanos con capacidad de tomar decisiones y posición de defensa de los derechos humanos en la sociedad y que contribuyan para el desarrollo de la profesión y de la calidad de la vida y de la salud de la población brasileña. Además de demarcar la implantación del modelo de enfermería nightingaleano en el Brasil con un nuevo modelo de la Enfermera en el país, decurrente de la influencia de la misión de enfermeras americanas conducidas por la insigne Miss Ethel Parsons (1922), jefe de esa misión, la EEAN es también, marco de referencia en la creación de los Cursos Lato Sensu (década de 40), Cursos Stricto Sensu - Maestría (década de 70), emprendimientos que representan verdaderos legados históricos que aseguran la memoria, la institucionalización del Patrón Anna Nery (PAN) y el desarrollo de la enseñanza y de la práctica de la enfermería en el Brasil. La EEAN/UFRJ, contando en los legados de la misión Parsons, se constiuye cuna de la Asociación Brasileña de Enfermería - ABEn, a la época llamada Asociación de Enfermeras Diplomadas Brasileñas (1926) y de la Revista Brasileña de Enfermería (REBEn) a la época intitulada Annaes de Enfermería (1 ra edición en 1932). Estos acontecimientos continúan asegurando a sus herederos y principalmente, a los de esta Escuela, la convicción de que los hechos políticos y sociales significan para una profesión, sus “indicativos de progreso” y, en nuestro entendimiento su “for taleza” para la “unidad y identidad profesional”. La EEAN/UFRJ, en una evaluación del desempeño académico en los últimos cinco años por medio de una evaluación cualitativa, presentase básicamente, en el escenario nacional e internacional como sigue: - Vinculada a ABEn desde 2005 marcada por el apoyo a su Proyecto Político-PedagógicoCientífico; - Filiada, a la Asociación Latinoamericana de Escuelas y Facultades de Enfermería de la Unión de las Universidades de la Latinoamérica (ALADEF/UDUAL), 1997, apoyando sus Proyectos Educacionales y de Investigación; - Con el concepto atribuido al Curso de Graduación por el MEC/INEP de 4 (MB), pero esforzándose para emprender una reestructuración curricular que toma como base las actuales “Directrices Curriculares de los Cursos de Graduación y de las Necesidades de la Sociedad”; - Con concepto de la CAPES al programa de Postgrado de 4, (siendo que en el país entero el concepto máximo conseguido por la Enfermería es de cinco), con el proceso iniciado para una reforma curricular, tomando como base los requisitos de la CAPES. Este programa tiene su Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 9 - 14. 14 70 Anos da Escola de Enfermagem Anna Nery: a Glória se ser e os Desafios a Conquistar Tyrrell MAR et al destaque para los indicadores de formación y calificación de Recursos Humanos de Enfermería, en la perspectiva de solidaridad e intercambio técnico-científico y cultural en la perspectiva nacional e internacional; - Evaluación por la CAPES de la Escuela Anna Nery Revista de Enfermería como Qualis Internacional “C”. Esta Revista encuéntrase emprendiendo esfuerzos para conquistar la inserción en la colección SciELO; - Premiación significativa en la “Jornada Científica de la UFRJ” (2005): de 25 mejores trabajos, 05 fueron de la EEAN; y en los concursos públicos en el Estado del Rio de Janeiro; - Calificación de su cuerpo docente: de sus 75 profesores, 55 profesores son doctores; 16 profesores están cursando el doctorado, 100% de los profesores son Especialistas y Maestros. En el marco histórico e de celebración de los 70 años de inserción en la Universidad y 84 de vida en el país, adoptamos Barreira (1999, p. ), cuando ella dice: (Es) una mejor comprensión de la trayectoria de nuestra profesión necesaria a la formación de una conciencia critica además del conocimiento de la historia de la enfermería brasileña (acá expresa en un Editorial), que hace parte de la cultura profesional de cada cual, depende también del interés y de la conciencia que nosotros mujeres y hombres de algún modo envueltos tuviéramos de las relaciones pasado/presente, el que hace con que valoramos nuestros papeles históricos, como observadores atentos de las señales de nuestra época, como personas que nosotros empeñámonos en formar una opinión aclarada, como actores que participan del movimiento de la historia y como estudiosos que pretenden contribuir para la comprensión do que nos ocurrió y do que no ocurre, siendo que (parafraseando Hobsbawm), somos parte de esta historia y ella es parte de nosotros. Tomando como base estas consideraciones, con justicia y merecimiento, es que en esta oportunidad conducimos nuestras homenajes a las siempre Directoras de la EEAN: Clara Louise Kieninger (1922 - 1925) Bertha L. Pullen (1928 - 1931 / 1934 - 1938) Lais Netto dos Reys (1938 - 1950) Maria Dolores Lins de Andrade (1967 - 1971) Cecília Pecego Coelho (1975 - 1980) Vilma de Carvalho (1986 - 1989) Maria Cecília Cordeiro Pedro (1994 - 1997) Loraine G. Denhardt (1925 - 1928) Rachel Haddock Lobo (1931 - 1933) Waleska Paixão (1950 - 1967) Elvira De Felice Souza (1971 - 1975) Cilei Chaves Rhodus (1980 – 1985) Raimunda da Silva Becker (1990 - 1993) Ivone Evangelista Cabral (1998 - 2002) Maria Antonieta Rubio Tyrrell (2002 - 2006 / 2006 - 2010) Doctora Profesora Maria Antonieta Rubio Tyrrell, Directora de la EEAN / UFRJ. Doctora Profesora Regina Célia Gollner Zeitoune, Vice-directora de la EEAN / UFRJ. Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 9 - 14. Fac-símile - Documento original 15 FAC-SÍMILE FACSIMILE FACSÍMILE Apresentação O artigo de Marina Vergueiro Forjaz, publicado em junho de 1951, na Revista Annaes de Enfermagem, surpreende o leitor. A multiplicidade de informações descritas de forma concisa e objetiva sobre a Universidade de Notre Dame, fundada em 1842, em Indiana, nos Estados Unidos da América, permite apreender o “olhar” de uma estudante estrangeira. A autora, diplomada no Brasil pela Escola de Enfermeiras do Hospital São Paulo, descreve as descobertas e as experiências vivenciadas naquela Universidade, enfocando de forma peculiar o colégio feminino – St. Mary’s College, que congrega os Departamentos de Filosofia, Letras, Artes, Economia Doméstica e Enfermagem. Forjaz dedica especial atenção ao ensino de enfermagem na Universidade de Notre Dame, através do Departamento de Enfermagem. A escola, doze anos após a inauguração, já incorporava as transformações no ensino que a enfermagem moderna recomendava. Para melhor compreensão do desenvolvimento do ensino de enfermagem nos Estados Unidos, a autora faz breve resgate histórico sobre a estrutura curricular e os ajustes necessários na duração do curso. Por último, destaca que a Universidade de Notre Dame oferecia aos estudantes sólida educação profissional, oferecendo atividades culturais, religiosas, sociais e espor tivas de forma igualitária, independentemente do Departamento ou da Escola o qual estavam inseridos. Identificou como finalidade maior desta Universidade formar profissionais educados e cultos. O texto nos leva a refletir sobre a formação que temos e aquela que queremos. Lúcia Helena Silva Corrêa Lourenço Antonio José de Almeida Filho Fernando Porto Diretoria Colegiada do Nuphebras Esc Anna R Enferm 2007 mar; 11 (1): 15 - 22. Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar;Nery 11 (1): 15 - 22. 16 Fac-símile Fac-símile - Documento - apresentação original Presentation The article from Marina Vergueiro Forjaz, published in june of 1951, in the Annaes de Enfermagem Magazine, surprises the reader. The multiplicity of describe information in a concise and objective way, about the University of Notre Dame, founded in 1842, on Indiana in the United States of America, allow us to understand the “view” of a foreign student. The author, graduated in Brazil by the School of Nurses of the São Paulo Hospital, describes the discovers and experiences lived in that University, focusing, in a peculiar way, the women college – St. Mary’s College, that reunite the Philosophy, English, Arts, Domestic Economic and Nursing Departments. Forjaz pay attention, specially, to the learning of nursing in the University of Notre Dame, trough the Nursing Department. The school, twelve years after its inauguration, already had incorporated the transformations in the learning that the modern nursing recommended. To a better comprehension of the learning development in nursing in the United States of America, the author does a brief historical rescue about the curricular structure and the necessary adjustments in the course duration. For the last, detaches that the University of Notre Dame offered to the students solid professional education, besides cultural, religious, social and sportive activities, in the same way for every student, independent of the Department or of the School in which they were. She identified as major finality of this University, to graduate well educated and cult professionals. The text leads us to reflect about the formation that we have and the one we want. Lúcia Helena Silva Corrêa Lourenço Antonio José de Almeida Filho Fernando Porto Board College of Nuphebras Presentación El artículo de Marina Vergueiro Forjaz, publicado en junio de 1951, en la Revista Annaes de Enfermagem, sorprende el lector. La multiplicidad de informaciones descritas de forma corta y objetiva, sobre la Universidad de Notre Dame, fundada en 1842, en Indiana en los Estados Unidos de América, permite aprehender el “mirar” de una estudiante extranjera. La autora, graduada en Brazil por la Escuela de Enfermeras del Hospital São Paulo, describe las descubiertas y las experiencias vividas en aquella Universidad, enfocando de forma peculiar el colegio femenino – St. Mary’s Collage, que reúne los Departamentos de Filosofía, Letras, Artes, Economía Doméstica y Enfermería. La escuela, doce años después de la inauguración, ya incorporaba las transformaciones en la enseñanza que la enfermería moderna recomendaba. Para mejor comprensión del desarrollo de la enseñanza de enfermería en los Estados Unidos de América, la autora hace un breve rescate histórico sobre la estructura curricular y los ajustes necesarios en la duración del curso. Por último destaca que la Universidad de Notre Dame ofrecía a los estudiantes sólida educación profesional, ofreciendo actividades culturales, religiosas, sociales y deportistas de la misma forma, independientemente del Departamento o de la Escuela en la cual estaban inseridos. Identificó como finalidad mayor de esta Universidad, formar profesionales educados y cultos. El texto llévanos a reflejar sobre la formación que tenemos y aquella que queríamos. Lúcia Helena Silva Corrêa Lourenço Antonio José de Almeida Filho Fernando Porto Directoria Colegiada del Nuphebras Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 15 - 22. Fac-símile - Documento original Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 15 - 22. 17 18 Fac-símile - Documento original Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 15 - 22. Fac-símile - Documento original Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 15 - 22. 19 20 Fac-símile - Documento original Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 15 - 22. Fac-símile - Documento original Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 15 - 22. 21 22 Fac-símile - Documento original Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 15 - 22. Fac-símile - Documento original Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 15 - 22. 23 23 Perfil de Idosos Internados Santos MIPM et al PESQUISA RESEARCH - INVESTIGACIÓN PERFIL DOS IDOSOS INTERNADOS NO HOSPITAL GERAL EM BELÉM (PARÁ)a Profile of the Elderly Admited in a General Hospital at Belém (Pará - Brazil) Perfil de los Ancianos Internados en el Hospital General en Belém (Pará – Brasil) Maria Izabel Penha de Oliveira Santos Resumo O estudo objetivou identificar o perfil dos idosos internados em um hospital geral da rede pública de saúde em Belém (Pará). Estudo transversal, retrospectivo, analítico. Foram analisadas variáveis sociodemográficas, causas da internação, tempo de permanência, complicações e dependência para cuidados de enfermagem, em 160 prontuários, em 2001. A análise estatística foi processada pelo programa eletrônico Epi-info 6.04. Os resultados apontam: A idade variou entre 65 e 74 anos (43,1%), e os idosos eram do sexo masculino (53,1%). A maior freqüência das internações foi por doenças respiratórias (53,7%); os sintomas evidentes foram dispnéia, hipertemia e hipertensão; e o tempo médio de permanência foi de 16 dias. O tempo de internação prolongado aparece como um fator de risco no desenvolvimento de incapacidades, pela imobilidade no leito, complicações como úlceras de decúbito e demais iatrogenias. Houve dependência para os cuidados de enfermagem e necessidade de intervenção interdisciplinar. Pala vr as-c ha alavr vras-c as-cha havve: Idosos. Enfermagem. Fatores de Risco. Abstract Resumen The study has as objective to identify the profile of the elderly internee in a general hospital of health public service, in Belém (Pará). It was a quantitative, retrospective and descriptive study. It was analyzed social-demographics variables, causes of hospitalization, time of stay, complications and dependence of nursing care in 160 record, 2001. The statistics analysis was made by an electronic program Epi-info 6.04. The results point: The age group was between 64-74 years old (43,1%), and (53,1%) was elderly of the male sex, the respiratory diseases were more prevalence (53,7 %), symptoms evidents were dyspnea, hyperthermia and hypertension, the time stay was 16 days. The hospitalization time look as a factor risk for disability, because the limitation of the bed, wound and other iatrogenics, it was a dependency of nursing care, and necessity of interdisciplinary interview. El estudio tiene como objetivo identificar el perfil de ancianos hospitalizados en hospital general de salud pública, en Belém, Estado Pará. Estudio cuantitativo, retrospectivo y analitico. Analizadas variables sócio-demográficas, causas de internación, tiempo de permanencia, complicaciónes y dependencias de la enfermería en muestra de 160 historias en 2001. Analisys estadística fué a través del programa electrónico Epi-info 6.04. Los resultados apuntaran: La edad varió de 64 a 74 años (43,) y 85 (53,1%) y los ancianos eran del sexo masculino, la major frecuencia de la internaciónes fueron enfermedades respiratorias (53,7%), los síntomas evidentes disnea, hipertermia na hipertensión, tiempo promedio de 16 dias. Los ancianos se internaron en media dos veces al año , tiempo de internación largo aparece como factor de riesgo en el desarrollo de incapacidad, por la inmobilidad en las camas, complicaciónes como úlceras de presion y demás iatrogenias, con dependencia para los cuidados de enfermería y necesidades de intervención interdisciplinar. Keywords: Elderly. Nursing. Risk factors Palabras clave: Ancianos. Enfermería. Factores de Riesgo. Esc Anna Enferm Esc Anna Nery R Enferm 2007 Nery mar; R11 (1): 232007 - 9. mar; 11 (1): 23 - 9. 24 Perfil de Idosos Internados Santos MIPM et al INTRODUÇÃO MÉTODO O rápido crescimento populacional no Brasil gerou um impacto importante em todos os segmentos da sociedade. Houve mudanças no perfil de morbimortalidade, levando o Brasil a uma chamada “transição”, tanto demográfica como epidemiológica, o que aponta para desafios quanto a uma nova forma de “olhar”, bem como de “cuidar” da população idosa1,2,3, 5. Devido ao crescente processo de envelhecimento, estimase que, a partir de 2025, o Brasil se torne o sexto país em população na faixa etária de 60 e mais anos de vida. Acreditase que esse fenômeno seja justificado pelas melhorias das condições médico-sanitárias ocorridas ao longo dos anos e que tiveram, como conseqüência, a queda nas taxas de fecundidade e mortalidade1-5. Com efeito, na cidade de Belém, Estado do Pará, a população de idosos vem experimentando um crescimento a partir de 1994, e, em 2001, as pessoas com 60 anos e mais já representavam 6,9% da população5. Pesquisas vêm mostrando que, qualquer que sejam os indicadores observados na avaliação da qualidade de saúde da população idosa, eles apontam para maior utilização de serviços e custos maiores, quando comparados com os da população mais jovem1,3,4,5. Desse modo, a hospitalização de pessoas idosas passou a ser um motivo de preocupação para os profissionais de saúde, principalmente para os enfermeiros, devido aos possíveis riscos, complicações, tempo de internação e custos que podem surgir dessa modalidade de assistência. Estudo realizado em hospital geral público, na região Sudeste, apontou para uma alta taxa de internação de pessoas com mais de 60 anos. A maioria dos idosos foi submetida a procedimentos de baixo risco, as doenças cardiovasculares foram as mais prevalentes, e as especialidades cirúrgicas corresponderam a 60,3% do total das internações. Indicava, porém, que os idosos precisariam ser mais bem avaliados pela equipe de saúde2. Tomando por base essa última afirmação, o objetivo deste estudo foi o de identificar o perfil dos idosos internados em um hospital geral público, na cidade de Belém, Estado do Pará, no intuito de conhecer as causas de internação, as possíveis complicações que surgiram em decorrência da hospitalização, o número de dias de internação e os cuidados de enfermagem dispensados a esses idosos, a partir de sua dependência, assim como os riscos a que estiveram expostos nesse período. A justificativa para realizar este estudo, na época, foi a de que ainda eram escassas, em nossa Região, pesquisas que informassem sobre essa realidade. Um outro ponto que também considerei foi o de que, até momento da realização deste estudo, não dispúnhamos de um centro de referência de atenção à pessoa idosa, de onde informações acerca da saúde dessa população pudessem ser obtidas. Assim, acredito que esta pesquisa venha ao encontro da necessidade de produzir investigações que possam ajudar os enfermeiros e outros profissionais da área da saúde que atuam com pessoas idosas, informando-os sobre as doenças que mais acometem os idosos e que possam levá-los à hospitalização, bem como sobre suas necessidades assistenciais, durante o período de internação. O estudo caracterizou-se como do tipo transversal, retrospectivo, analítico, documental, realizado em prontuários de idosos que estiveram internados no ano de 2001. Foi realizado em um hospital universitário, localizado no bairro do Guamá, na cidade de Belém, Estado do Pará, e que está ligado ao Sistema Único de Saúde (SUS)6,,20. O hospital oferece para internação as especialidades de clínica médica, pneumologia, doenças infecciosas e parasitárias, pediatria, cirurgia, neurologia e doença de Alzheimer. Em nível ambulatorial, fisioterapia respiratória e assistência ambulatorial aos egressos da hospitalização por doenças crônicas. É também um hospital de referência no diagnóstico da Síndrome da Imunodeficiência Adquirida (AIDS) e de doenças respiratórias agudas e crônicas. A pesquisa foi desenvolvida após aprovação pelo departamento de ensino e pesquisa do hospital, conforme declaração em anexo. Neste ano de 2001 for am hospitalizadas aproximadamente 5.000 pessoas, de todas as faixas etárias, pelo menos 1.000, dentre elas, na faixa etária de 60 anos ou mais. Foram considerados, para atender aos critérios de inclusão na pesquisa, os prontuários de pacientes que tivessem idade igual ou superior a 60 anos, de ambos os sexos, hospitalizados por um período superior a 48 horas, entre janeiro e dezembro de 2001. Os que não obedeceram a esses critérios foram excluídos. Os cálculos foram realizados através da fórmula de distribuição normal, com base no número de internações de idosos, que resultou em um valor aproximado a 300 (N=300). Ou seja, a amostra constou de 300 prontuários de pacientes internados no período (janeiro a dezembro de 2001), e, destes 300 prontuários, somente 160 atendiam aos critérios de inclusão da pesquisa, tendo sido excluídos os demais. Foi solicitada, inicialmente, ao Depar tamento de Arquivo Médico e Estatístico (DAME) da instituição, uma listagem com o número de matrícula dos pacientes, a clínica em que haviam sido admitidos para tratamento e as datas da admissão e alta no hospital. Para a obtenção dos dados, foi constr uído um instrumento subdividido em três partes. Na primeira, foi dada ênfase às variáveis sociodemográficas, como sexo, idade, procedência, estado civil e profissão. Na segunda constavam as informações sobre a hospitalização, como diagnóstico médico, tempo de internação, número de internações no ano, procedimentos e os tipos de cuidados registrados pela equipe de enfermagem. E uma terceira parte foi reservada para observações necessárias, que não tivessem sido contempladas nas partes anteriores, como a classificação da doença pelo CID-10, tipo de alta e custo da internação, conforme os registros na Autorização de Internação Hospitalar – Sistema Único de Saúde (AIH-SUS)7. Os dados foram processados no programa eletrônico Epiinfo 6.04, e as tabelas e gráficos, construídos no Microsoft Excel 2000, com a descrição apenas das freqüências simples, expressas em percentuais. Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 23 - 9. 25 Perfil de Idosos Internados Santos MIPM et al RESULTADOS E DISCUSSÃO A Tabela 1 evidenciou que, entre os idosos da amostra, e que foram internados no período da pesquisa, 53,1% eram do sexo masculino. A faixa etária de maior freqüência ficou entre 65 e 74 anos de idade (43,1%). Quanto à questão do gênero, os indicadores demográficos populacionais, no Brasil, apontam que os idosos do sexo masculino apresentam maiores riscos de adoecer e morrer em relação aos do sexo feminino, com as mulheres apresentando uma expectativa de vida de 10 anos a mais que os homens 3,8. Estudo sobre a freqüência de internação de homens, em relação a mulheres, informa que ela é progressivamente maior nos homens dos 20 aos 69 anos de idade. E se torna menor, a partir dos 80 anos, pois o predomínio, a partir dessa idade, passa a ser das internações de mulheres 5. Sobre a questão etária, ficou caracterizado que, neste estudo, os idosos ainda eram jovens, segundo a classificação proposta pela Organização das Nações Unidas (ONU), que divide os idosos em três categorias: os pré-idosos (entre 55 e 64 anos); os idosos jovens (entre 65 e 79 anos) e os idosos de idade avançada (com mais de 75 ou 80 anos). Estes últimos, com mais de 80 anos, são e vão continuar sendo do sexo feminino (IBGE) 1,4. Tabela 1: Distribuição da freqüencia por sexo, faixa etária e estado civil dos idosos internados em hospital geral. Belém/Pará – 2001. IDENTIFICAÇÃO SEXO Masculino Feminino N = 160 % 85 75 53,1 47,8 IDADE (em anos) < 65 65 a 74 75 a 84 > = 85 47 69 31 13 29,3 43,1 19,3 8,1 EST ADO CIVIL ESTADO Casado Viúvo Solteiro 68 39 34 42,5 24,4 21,3 Em relação à clínica onde os idosos foram admitidos para tratamento, neste estudo, a maior freqüência das internações dos idosos foi na clínica de doenças respiratórias – pneumologia (53,7%), muito embora 28,1% dos pacientes tenham sido submetidos a algum tipo de tratamento cirúrgico, como evidenciado na Tabela 2. A especificidade do hospital em doenças do aparelho respiratório e o fato de ser ele um hospital de referência para essas patologias na região Norte foram decisivos para essa freqüência de internações na referida clínica, assim como a Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 23 - 9. Tabela 2: Distribuição da freqüencia por clínica e segundo o sexo dos idosos internados em hospital geral. Belém/Pará – 200. SEXO CLÍNICA Pneumologia Cirúrgica Médica DIP T O TAL Masculino T O TAL Feminino Freq. Freq. % Freq. % 44 24 9 8 85 51,7 28,2 10,5 9,4 53,1 42 21 9 3 75 56,0 28,0 12,0 4,0 46,8 % 86 53,7 45 28,1 18 11,2 11 6,8 160 46,2 prevalência das doenças respiratórias para essa faixa etária. Um outro fator, que contribuiu também para a demanda na clínica de pneumologia, está relacionado às condições climáticas da região – extremamente quente e úmida – o que influencia a agudização das doenças crônicas respiratórias 9. Com efeito, as doenças pulmonares obstrutivas crônicas (DPOC) aparecem como a segunda causa de morte em idosos, após as doenças cardiovasculares, e, de certa forma, essa duas patologias podem se manifestar associadas nos idosos 9-10. A Tabela 3 faz referência à distribuição das freqüências dos procedimentos realizados nos idosos durante o período de sua internação. Nesse aspecto, para os que apresentavam quadro clínico compatível com doenças respiratórias crônicas, foi possível observar que, nos procedimentos em que houve a participação da enfermagem, destacaram-se a oxigenoterapia e nebulização, indicados para esses casos. Eles foram prestados a 78,1% e 62,5% dos pacientes, respectivamente. Tabela 3: Distribuição da freqüencia dos procedimentos a que foram submetidos os idosos durante a internação em Hospital Geral – Belém/Pará – 2001. PROCEDIMENTOS Higiene Oral e Corporal Oxigênio Nebulização Curativos Sondagens Biópsias Endoscopia Gasometria Broncoscopia Toracocentese Freqüência % (N = 160) 145 125 100 72 13 9 7 6 5 2 90,6 78,1 62,5 45,0 8,1 5,6 4,4 3,7 3,1 1,2 Convém ilustrar aqui o papel da enfermagem, na avaliação clínica do paciente portador de doença crônica e na tomada de decisões, implementando adequadamente a assistência, no sentido de promover o bem-estar dos pacientes, através de procedimentos que ajudem na manutenção do fluxo aéreo adequado. 26 Perfil de Idosos Internados Santos MIPM et al Com relação aos sinais e sintomas apresentados pelos idosos e sua freqüência, durante esse período de internação, eles se encontram destacados na Tabela 4. Tabela 4: Distribuição da freqüencia dos sinais e sintomas em idosos internados em Hospital Geral – Belém/Pará – 2001. SINAIS E SINTOMAS Dispnéia Hipertemia Tosse Progressiva Hipertensão Edema MMII Escarro de Sangue Icterícia Freqüência % (N = 160) 106 97 91 78 45 15 12 66,2 60,6 56,8 48,7 28,1 9,3 7,5 A dispnéia foi um sintoma freqüente em 66,2% dos idosos, já que um número considerável desses pacientes foi internado na clínica de pneumologia. Esse sintoma, em geral, está presente e aparece em função da descompensação nos pacientes obstrutivos crônicos e também nos quadros clínicos de Insuficiência Cardíaca Esquerda, podendo ser noturno, no idoso, o que sugere um sono intranqüilo, com pesadelos. Está associado a outras condições clínicas, como em pós-operatório, no tromboembolismo pulmonar, ou também pode surgir de forma súbita, o que é caracterizado, em idosos, como uma manifestação solitária de angina ou infarto do miocárdio, e ainda por ser manifestação de edema agudo de pulmão 10-11. Dessa forma, sintomas agudos ou crônicos, como a dispnéia, em pacientes idosos, precisam ser alvo de avaliação constante pela equipe de enfermagem, devido às complicações que podem estar associadas. Um outro sintoma presente nos idosos da amostra, durante a internação, foi a hipertermia em 60,6% dos pacientes. Esse sintoma, em idosos, geralmente está associado a processos infecciosos ou inflamatórios, sendo então motivo de preocupação, pois, no curso desses processos, pode estar mascarado um quadro clínico de delirium que, muitas vezes, passa despercebido ou pode ser confundido com alterações do processo do envelhecimento11-17. A hipertensão arterial (HA) também foi um dado nosológico importante, que esteve presente em 48,7% da amostra. Estudos informam que a HA é um fator de risco para a saúde do idoso, podendo vir a desenvolver eventos cardiovasculares, como: acidente vascular cerebral, infarto do miocárdio, insuficiência cardíaca, insuficiência renal, aneurisma de aorta, insuficiência vascular periférica, independente de sexo ou raça, em termos de risco relativo, risco absoluto, gradiente de risco e risco atribuível10-6. Com efeito, segundo estudo realizado na população do Rio de Janeiro, as doenças que mais acometem os idosos são as de características crônicas, que podem perdurar por 15, 20 ou mais anos, e que deverão consumir mais recursos da área da saúde. Porém, nem sempre esses custos são revertidos adequadamente às suas necessidades, e essa inadequação não ocorre somente no serviço público 12. O curso das doenças crônicas que acometem os idosos é um dos fatores que favorecem um tempo de internação mais longo para esse grupo. Ou seja, as pessoas acima de 60 anos levam um tempo maior para produzir as respostas do seu sistema imunológico, bem como maior tempo para as respostas terapêuticas, em relação aos mais jovens. Isto se deve ao processo normal de envelhecimento, que tende a ficar mais comprometido quando essas doenças estão presentes. Nesta pesquisa, foi encontrado um tempo médio de 16 dias de internação, e 25% dos idosos tiveram um tempo de internação entre 11 e 20 dias. Sobre esse aspecto, foi possível pensar nos riscos e complicações advindas de um período longo de internação, provocados pela imobilidade no leito, como é caso da formação de úlceras de decúbito, piora das condições respiratórias, exposição maior às infecções hospitalares e ansiedade pelo afastamento familiar, que podem agravar ainda mais o quadro clínico dos idosos (Tabela 5). Pelos registros obtidos nos prontuários individuais, empiricamente foi possível inferir que o retardo nos procedimentos complementares de diagnóstico foi também um outro fator que contribuiu para um tempo prolongado de internação, além de gerar elevação dos custos com as diárias hospitalares. Tabela 5: Distribuição da freqüencia dos idosos internados quanto ao tempo de permanência em Hospital – Belém/Pará – 2001. TEMPO DE PERMANÊNCIA (em dias) Freqüência % 1 a 10 11 a 20 21 a 30 31 a 40 > 40 92 40 11 12 5 57,5 25,0 6,9 7,5 3,1 T O TAL 160 100,0 MÉDIA GERAL 16,0 — Um outro fator considerado nas pesquisas sobre hospitalização de idosos é a iatrogenia, que pode ser causada pela própria equipe multiprofissional, decorrente das diferentes formas de assistência prestadas aos pacientes. Esse conceito, em geriatria, pode ter um significado amplo, quando relacionado às condutas tomadas por vários membros da equipe 13-14. Sobre esse aspecto, alguns autores citam como complicações as iatrogenias de qualquer natureza, sendo importantes na pessoa idosa, dentre elas, a própria dificuldade de adaptação ao meio, maior vulnerabilidade do idoso às agressões, incluindo inter venções propedêuticas e terapêuticas, e incidência maior de doenças crônicas, tornando-se necessário uso maior de drogas. Também são incluídas a plurimorbidade, procedimentos invasivos – Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 23 - 9. 27 Perfil de Idosos Internados Santos MIPM et al diagnósticos e terapêuticos, uso incorreto de medicações e déficits sensoriais e mnemônicos13,14,16-17. Quanto aos procedimentos realizados durante a internação dos idosos, ficou mais evidente nos registros dos prontuários analisados a assistência realizada pela equipe médica e de enfer magem, em relação aos demais profissionais da área de saúde. Sobre esse aspecto, é proposta do Plano Nacional de Atenção à Pessoa Idosa (PNAPI), que as pessoas idosas sejam assistidas por uma equipe multiprofissional, pois elas estão, cada vez mais, preenchendo os leitos hospitalares e estão carentes dessa forma de assistência19. É proposta também, dessa política, que os serviços de saúde elaborem protocolos de assistência voltados para as pessoas idosas, levando em conta as características dessa faixa etária. Nos prontuários analisados neste estudo, não foi observado nenhum item específico voltado ao paciente geriátrico. Muito embora a análise de tais protocolos não tenha sido um dos objetivos do estudo, identifiquei essa lacuna. O quadro clínico apresentado pelos idosos, em decorrência das doenças agudas ou crônicas durante a internação, compromete, muitas vezes, suas condições físicas e cognitivas para o autocuidado. A enfermagem, nesse momento, assume papel importante quanto à ajuda na manutenção da autonomia e independência dos idosos. As alterações para o autocuidado que foram apresentadas pelos componentes deste estudo, durante a internação, encontram-se distribuídas na Tabela 6. Tabela 6: Distribuição da freqüencia das alterações para o autocuidado apresentado pelos idosos internados em Hospital Geral – Belém/Pará – 2001 Nesse contexto, pesquisas referem que, entre os mais importantes indicadores de saúde na velhice, estão as capacidades funcional e cognitiva. E que a capacidade funcional está relacionada com as condições do indivíduo para se adaptar aos problemas cotidianos. Ou seja, trata-se daquelas capacidades que lhe são requeridas pelo ambiente em que vive21-22. As capacidades funcional e cognitiva, em idosos, estão diretamente relacionadas à autonomia e independência. Trata-se da capacidade de autogoverno, de liberdade e de administrar sua própria vida. Porém, quando alteradas, seja por doença ou por outra condição, isto os limita e, às vezes, até os exclui do meio social. Uma outra dimensão que se pode acrescentar à perda da capacidade funcional é a fragilidade, entendida como uma vulnerabilidade que o indivíduo apresenta aos desafios do próprio ambiente. Nestes, estão incluídas as condições materiais, econômicas e sociais da pessoa, que possam levá-la à dependência. As repercussões da hospitalização são seguidas, em geral, por uma diminuição da capacidade funcional e por mudanças na qualidade de vida, muitas vezes irreversíveis 14,21-22. Em relação ao tipo de alta médica evidenciada, a “melhorada” esteve presente na maioria dos idosos da amostra. O custo médio das internações, no período, foi de R$ 406,13, porém não foi possível, naquele momento, estabelecer comparações com os custos para outras faixas etárias, pois as demais faixas etárias não foram objeto deste estudo, além de existirem limitações quanto a registros que tornassem possível realizar um análise mais detalhada sobre esses custos. No entanto, estudos demonstram que a faixa etária de 60 anos e mais é a que consome os maiores recursos do SUS 1,3,8,5, 16,18,21. CONCLUSÕES AL TERAÇÕES PPARA ARA ALTERAÇÕES AUTOCUIDADO Freqüência % (N = 147) Alimentação Deambulação Higiene Vestir-se 124 117 104 4 84,3 79,5 70,7 2,7 Pelas descrições da equipe de enfermagem, as necessidades mais freqüentes dos idosos foram quanto à alimentação (84,3%), deambulação (79,5%) e realização de higiene pessoal (70,2%), exigindo cuidados específicos de enfermagem, mesmo que temporariamente. Nesse patamar, destaco a participação da enfermagem na atenção para com as pessoas que envelhecem, principalmente as fragilizadas e que necessitam desses cuidados durante a hospitalização, ajudando na manutenção da independência e qualidade de vida, em especial dos portadores de doenças crônicas. Estudos vêm sendo realizados, no sentido de enfatizar os cuidados de enfermagem ao paciente idoso, com fundamentos no campo da gerontologia e na habilidade de aplicação de técnicas de tratamentos geriátricos específicos. Como exemplo, cito casos de imobilidade, incontinência urinária, instabilidade postural e riscos de quedas 20. Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 23 - 9. O presente estudo foi realizado com o propósito de identificar o perfil dos idosos internados em 2001 em um hospital de referência na cidade de Belém. Dos 160 prontuários de idosos que foram internados nesse período, 53,1% eram do sexo masculino, e, entre os idosos da amostra, 43,1% estavam na faixa etária de 65 a 74 anos de idade. Os resultados do estudo demonstraram que os sintomas apresentados pelos idosos, durante a internação, eram compatíveis com o quadro clínico de doenças respiratórias crônicas, como a dispnéia (66,2%), hipertermia (60,6%), tosse progressiva (56,8%) e hipertensão arterial (48,7%). Outro fato considerado importante no estudo foi o tempo longo de internação dos idosos, em média 16 dias, que não difere dos perfis nacionais. Esse período prolongado de internação concorre para o estabelecimento de incapacidades, maior exposição a risco de infecção hospitalar, entre outras complicações que podem refletir na recuperação das pessoas idosas. Os idosos deste estudo apresentaram incapacidades para realização de atividades básicas da vida diária, como alimentação (84,3%), deambulação (79,5%) e higiene (70,7%). Isto implicou em uma avaliação adequada pela equipe de enfermagem, que teve participação importante, realizando intervenções e os cuidados necessários para suprir tais 28 Perfil de Idosos Internados Santos MIPM et al incapacidades, muito embora elas possam ter sido geradas pela agudização das próprias doenças. Quanto a esse aspecto, é preciso entender que a identificação e reabilitação precoce de problemas, nessa população, se tornam imprescindíveis para a prevenção de novas incapacidades. Um dos fatores limitantes para o estudo foi quanto aos registros deficientes e incompletos dos profissionais nos prontuários individuais dos pacientes, prejudicando a coleta de dados, impedindo que a análise de uma amostra maior pudesse ter sido realizada. A grafia pouco legível foi outro aspecto que, muitas vezes, tornou incompreensível o entendimento das informações. Devido ao crescimento populacional na faixa etária de 60 anos e mais, maior contingente de pessoas nessa faixa irá, forçosamente, procurar assistência hospitalar. Sobre esse aspecto, sugiro a adequação pelos serviços, nos prontuários de itens e/ou protocolos que identifiquem características físicas e cognitivas do paciente geriátrico. Acredito que essa discussão não finda aqui e que os resultados deste estudo possam incentivar novas pesquisas pelos enfermeiros na área geronto-geriátrica e demais profissionais de saúde. Principalmente sobre pessoas que envelhecem na Região Nor te, carentes ainda de uma sistematização para sua assistência. Referências 11. Costa MFL, Guerra HL, Firmo JOA, Uchôa E.Projeto Bambuí: um estudo epidemiológico de características sócio-demográficas, suporte social e indicadores de condição de vida de saúde em idosos em comparação com adultos jovens. Inf Epidemiol SUS: 2001 out/dez; 10(4): 147-61. 12. Ribeiro EE, Guimarães RM, Toledo AV. Sinais e sintomas do aparelho respiratório. In: Guimarães RM, Cunha UGV. Sinais e sintomas em geriatria. São Paulo(SP): Atheneu; 2004. 13. Veras R P. Terceira idade: gestão contemporânea em saúde. Rio de Janeiro(RJ): Relume-Dumará; 2002. 14. Kane RL, Ouslander JG, Abrass IB.O essencial em clínica geriátrica Tradução de Martha Müller Romiti Araf. 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Textos sobre envelhecimento 2001 ago/dez; 3(6): 47-77. 3. Camarano AA. Envelhecimento da população brasileira: uma contribuição demográfica. In: Freitas EV et al,organizadores. Tratado de Geriatria e Gerontologia. Rio de Janeiro(RJ):Guanabara Koogan; 2002. 4. Mendes MRSSB, Gusmão JL, Faro AGM , Leite RCBO. A situação do idoso no Brasil: uma breve consideração. Acta Paul Enferm 2005 18(4): 422-26 5. Chaimowicz F. Os idosos brasileiros no século XXI: demografia, saúde e sociedade. Belo Horizonte (MG):Posgraduate;1999. 6. Rea LM, Parker Metodologia da pesquisa:do planejamento à execução. Tradução de Nivaldo Montiguelli Junior. São Paulo (SP): Pioneira; 2000. 7. Organização Mundial da Saúde-OMS. CID-10: Classificação estatística internacional de doenças e problemas relacionados à saúde. Tradução do Centro Colaborador da OMS para a classificação de doenças em português. 3ª ed. São Paulo (SP): USP;1996 8. Chaimowicz. F. Epidemiologia e o envelhecimento no Brasil. In: Freitas EV et al, organizadores. Tratado de Geriatria e Gerontologia. Rio de Janeiro(RJ): Guanabara Koogan; 2006. 9. Costa MFL, Guerra HL, Barreto SM, Guimarães RM.Diagnóstico da situação de saúde da população idosa brasileira: um estudo da situação da mortalidade e das internações hospitalares públicas. Inf Epidemiol SUS out/dez: 2000; 9(1), 23-41. 10. Lourenço RA, Veras RP, Silva NAS. Hipertensão arterial e outros fatores de risco de doença cardiovascular: prevalência em uma população de idosos.In: Veras RP.Terceira idade: gestão contemporânea em saúde. Rio de Janeiro(RJ): Relume Dumará; 2002 19.Lei 8.842, de 4 de janeiro de 1994.Dispõe sobre a política nacional de atenção ao idoso, cria o Conselho Nacional do Idoso e da outras providências.[on-line] Brasília,1994.[citado 5 nov 2002].Disponível em: http//www.planalto.gov.br/ccivil-3/leis/ 20.Santos I, Clos AC. Pesquisa quantitativa e metodologia. In: Santos I et al. Pesquisa em enfermagem: novas metodologias aplicadas. Rio de Janeiro (RJ): Guanabara Koogan:1998 21.Caldas CP. Conversando sobre o autocuidado: a qualidade de vida como meta. In: Pacheco JL, Sá JLM, Py L, Goldman SN, organizadores. Tempo rio que arrebata. São Paulo (SP):Setembro; 2005 Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 23 - 9. 29 Perfil de Idosos Internados Santos MIPM et al 22.Veras RP. O custo hospitalar crescente no setor público: conseqüência do envelhecimento populacional. In:___. Terceira idade gestão contemporânea e saúde. Rio de Janeiro (RJ): Relume Dumará; 2002 Nota Este artigo é fragmento da monografia do Curso de Especialização Envelhecimento e Saúde do Idoso, realizado na Faculdade de Ciências Médicas de Belo Horizonte-MG a Sobre a Autora Maria Izabel Penha de Oliveira Santos Enfermeira, Ms. em Educação, Gerontóloga pela SBGG. Coordenadora do Projeto de Extensão Universidade Aberta à Terceira Idade. Membro do Grupo de Pesquisa-Saúde do Adulto e Idoso da Universidade do Estado do Pará (UEPA). Professora do curso de EnfermagemUniversidade do Estado do Pará. e-mail:[email protected] Recebido em 20/10/2006 Reapresentado em 27/02/2007 Aprovado em 10/03/2007 Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 23 - 9. 30 Qualidade de Vida Após Infarto Agudo do Miocárdio Caetano JA et al QUALIDADE DE VIDA DE CLIENTES PÓS-INFARTO AGUDO DO MIOCÁRDIO Client’s Quality of Life After Myocardial Infarction Calidad de Vida de los Clientes Pós-Infarto Agudo del Miocardio Joselany Afio Caetano Enedina Soares Resumo Objetivou-se neste estudo avaliar a qualidade de vida de clientes que sofreram infarto agudo do miocárdio. A amostra constou de 30 clientes selecionados pela busca em prontuários de uma unidade cardiológica, que nos permitiu a identificação e localização desses clientes, internados no ano de 2004. Para coleta de dados utilizamos a Escala de Qualidade de Vida de Flanagan e o tratamento estatístico com desvio-padrão. Os resultados mostraram maior índice de respostas nos níveis “indiferentes” a “pouco satisfeitos” em suas qualidades de vida. A relação interpessoal apresentou o mais alto índice de satisfação, contrariando o bem-estar físico e material, com o mais baixo índice de satisfação. Concluiu-se que a avaliação da qualidade de vida de clientes que sofreram infarto agudo do miocárdio se mostra comprometida, o que vem corroborar outros estudos anteriormente realizados. Pala vr as-c ha alavr vras-c as-cha havve: Infarto do Miocárdio. Qualidade de Vida. Enfermagem. Abstract Resumen This study evaluates the quality of life of clients who suffered myocardial infarction. The sample consisted of 30 clients selected by search in medical records of a cardiac unit, which let us to identify and locate these clients, admitted in the year 2004. For the data collection was used the Quality of Life Scale of Flanagan and the statistic with standard deviation treatment. The results showed a bigger index of answers in the “indifferent” to “little satisfaction” levels in their quality of life. The interpersonal relation showed the higher index of satisfaction, against the physical and material wellness, with the lowest index of satisfaction. It was concluded that the client’s quality of life evaluation that suffered myocardial infarction is compromised, witch comes to confirm other previous studies that was carried trough. El objetivo del estudio fue evaluar la calidad de vida de los clientes que han sufrido infarto agudo del miocardio. La muestra ha consistido de 30 pacientes escogidos por la búsqueda en historias clínicas de una unidad cardiológica, que nos permitió la identificación y localización de estos clientes, internados en el año 2004. Para la colecta de los datos utilizamos la Escala de Calidad de Vida de Flanagan y el tratamiento estadístico con desvío medio. Los resultados muestran mayor índice de respuestas en los niveles “indiferentes” a “poco satisfechos” en sus calidades de vida. La relación interpersonal presentó el más alto índice de satisfacción, contrariando el bienestar físico y material, con el más bajo índice de satisfacción. Ha concluído que la evaluación de la calidad de vida de clientes que sufrieron infarto agudo del miocardio muéstrase comprometida, lo que viene a confirmar otros estudios anteriormente realizados. Keywords: Myocardial Infarction. Quality of Life. Nursing. Palabras clave: Infarto Agudo del Miocardio. Calidad de Vida. Enfermería. Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 30 - 7. 31 Qualidade de Vida Após Infarto Agudo do Miocárdio Caetano JA et al INTRODUÇÃO O conceito de qualidade de vida é relativamente recente e decorre, em parte, de novos paradigmas que têm influenciado as políticas e as práticas de saúde nas últimas décadas. Consoante a essa mudança de paradigma, a qualidade de vida passou a ser um dos resultados esperados tanto das práticas assistenciais quanto das políticas públicas para o setor da promoção de saúde e da prevenção de doenças1. O termo qualidade de vida é amplo e inclui uma variedade maior de condições que podem afetar a percepção do indivíduo, seus sentimentos e comportamentos relacionados com o seu funcionamento diário, incluindo a sua condição de saúde e as intervenções médicas. A satisfação com a vida e sensação de bem-estar pode, muitas vezes, ser um sentimento momentâneo. Porém, acreditase que o investimento na conquista de uma vida com qualidade pode ser construído e consolidado em um processo que inclui a reflexão sobre o que é definitório para sua qualidade de vida e o estabelecimento de metas a serem atingidas, tendo como inspiração o desejo de ser feliz. Qualidade de vida (QV), em seu sentido geral, aplica-se ao indivíduo aparentemente saudável do ponto de vista físico e diz respeito ao seu grau de satisfação com a vida nos múltiplos aspectos que a integram: moradia, transporte, alimentação, lazer, satisfação/ realização profissional, vida sexual e amorosa, bom relacionamento com outras pessoas, liberdade, autonomia e segurança financeira. A qualidade de vida pode estar vinculada ao estilo de vida, incluindo padrão de alimentação, prática de atividades físicas, não-aderência a hábitos, como o cigarro, e a forma como encara o trabalho, a família e as chamadas “tensão de vida moderna”2. Avaliar a QV de pessoas com doenças crônicas tem sido uma maneira de determinar o impacto do cuidado de saúde quando a cura não é possível. São considerados importantes aspectos de avaliação dos resultados dos procedimentos terapêuticos não apenas os aspectos relacionados à redução dos sintomas e prolongamento da vida, mas, também, os relacionados à sobrevida do doente e como a QV se apresenta para ele próprio e para a sociedade 3. Estudiosos desta temática apontam três razões que explicam a ênfase dada à qualidade de vida relacionada às doenças cardiovasculares, que justificam a preocupação em aferi-la: primeiro, o dilema das intervenções que, embora prolonguem a vida, comprometem sua qualidade; segundo, a relação que há entre os efeitos de uma droga sobre a qualidade de vida e a aderência do paciente à prescrição; e terceira, a aferição da validade, do ponto de vista econômico de uma dada intervenção2. A importância da aferição da qualidade de vida afigura-se, pois, como inquestionável, principalmente nas doenças crônicas e incuráveis, como é o caso da maior parte das enfermidades cardiovasculares4. Por isso, cada vez mais são valorizadas as avaliações do impacto que uma nova terapêutica promove na qualidade de vida de um indivíduo. Entendemos que a avaliação da qualidade de vida em pacientes com infarto do miocárdio tem a ver mais com os Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 30 - 7. benefícios do que com os eventuais prejuízos da intervenção terapêutica. O que se vai medir é o quanto a insuficiência cardíaca impede ou dificulta a vida do paciente, pois esses portadores desenvolvem mecanismos para tentar diminuir os desconfortos que o tratamento lhes ocasiona e, dependendo da intensidade, acabam por afetar o seu estilo de vida. A escolha de um instrumento holístico para avaliar a QV nesta clientela é impor tante. A Escala de QV de Flanagan 5 é um dos instrumentos de avaliação. A enfermagem sempre teve e terá grandes preocupações com os cuidados prestados a uma pessoa em uma variedade de situações relacionadas à saúde, como o estado geral, o bem-estar, a qualidade de vida, dentre outras. Esse cuidado inclui papéis significativos na educação para a saúde, dentro da promoção da saúde, e a prevenção de doenças, bem como o cuidado individual do paciente, visto que este é o maior responsável pela manutenção de sua saúde e prevenção das doenças6. A enfermagem é co-participante direta na difusão de medidas preventivas à população, por incluir, em suas principais atribuições, a atenção primária à educação em saúde, atividades educativas, informativas e interativas direcionadas à população. Por tanto, a implementação de estratégias baseadas na promoção de um estilo de vida saudável requer esforço coordenado entre os provedores de cuidados com a saúde, tais como médicos, enfermeiros, nutricionistas e fisioterapeutas, odontólogos, o sistema escolar, outros órgãos governamentais, a indústria como a de alimentos e a farmacêutica. Diante destas considerações, objetivou-se para este estudo identificar as dimensões da qualidade de vida afetadas pelos pacientes pós-infarto agudo do miocárdio, tendo em vista a melhoria da assistência prestada por profissionais de saúde após a alta hospitalar. METODOLOGIA Trata-se de um estudo descritivo, exploratório, realizado com pessoas que sofreram infarto agudo do miocárdio, usuários do Sistema Único de Saúde (SUS), atendidos em hospital de referência estadual em doenças torácicas e cardiovasculares, situado na cidade de Fortaleza-CE. Participaram do estudo 30 clientes que sofreram infarto agudo do miocárdio – IAM, residentes da cidade de Fortaleza/ CE e que aceitaram contribuir com a pesquisa. A seleção dos participantes deveu-se aos registros de entrada na unidade de cardiologia clínica do hospital em estudo, nos quais foram levantados os números dos prontuários com historia de IAM, internados no ano de 2004. Por meio desses registros podemos localizar, no Serviço de Arquivo Medico – SAME, 30 prontuários contendo as informações que nos propiciaram a identificação e a localização desses clientes. Para coleta de dados, utilizamos, como instrumentos, um roteiro de entrevista composta de duas partes: a primeira, com dados de identificação e sociodemográficos e a segunda, com aplicação da Escala de Qualidade de Vida (EQV) de Flanagan, na qual estão contidos os itens conceituais da qualidade de 32 vida e representadas em cinco dimensões: bem-estar físico e material; relação com outras pessoas; atividades sociais, comunitárias e cívicas; desenvolvimento pessoal e realização; recreação. Essas dimensões são mensuradas através de quinze itens nos quais os respondentes têm sete pontos que variam entre: 1 = extremamente insatisfeito, 2 = bastante insatisfeito; 3 = insatisfeito; 4 = nem insatisfeito, nem satisfeito; 5 = satisfeito; 6 = bastante satisfeito e 7 = extremamente satisfeito. A pontuação máxima alcançada na avaliação da qualidade de vida proposta por Flanagan é de 105 pontos, e a mínima, de 15 pontos, que refletem baixa qualidade de vida5. Para aplicação das entrevistas e da Escala da Qualidade de Vida de Flanagan, foram realizadas visitas domiciliares. Os dados coletados foram tratados em conformidade com as alternativas mais adequadas ao conteúdo dos instrumentos utilizados e apresentados em gráfico e quadro e análise da distribuição das características dos escores da qualidade de vida de acordo com a Escala, assim como dos escores da média e do desvio-padrão obtidos por itens da escala em consonância com o referencial teórico. Vale ressaltar que os princípios éticos contidos na Resolução 196/96 do Conselho Nacional de Saúde, que trata da pesquisa com seres humanos, foram devidamente respeitados, garantindo-se o anonimato dos partícipes e sua saída da pesquisa quando considerasse necessário. RESULTADOS Caracterização da amostra Dados de identificação e sociodemográficos Para que pudéssemos caracterizar os participantes deste estudo, selecionamos algumas informações que julgamos pertinentes e que nos possibilitaram trabalhar os dados obtidos sob os enfoques planejados. O estudo foi realizado com a participação de 30 clientes acometidos com IAM, sendo 19 (63,3%) do sexo masculino e 11 (36,7%) do sexo feminino. Estudos realizados recentemente mostraram que doenças da artéria coronária atingem mais homens do que mulheres; entretanto, depois da menopausa, a incidência em mulheres aumenta rapidamente e passa a ser quase igual a dos homens jovens na faixa etária de 30 anos ou menos7,8. A prevalência de IAM no sexo masculino em relação ao feminino pode ser atribuída a uma menor tendência trombolítica e à proteção hormonal natural, determinada pelos níveis de estrogênios, cujos mecanismos estão relacionados à interferência nos níveis de lipídios plasmáticos (elevação do nível de HDL-colesterol e redução do LDL-colesterol), efeito direto na parede do vaso, reduzindo a captação de lipídios e a vasodilatação, com melhoria da pulsatilidade arterial8. Com relação à incidência de IAM em mulheres, cientistas revelaram que devem ser consideradas, além da causa fixa, que é a proteção hormonal, também as causas modificáveis, como, por exemplo, maior atenção às enfermidades e, consequentemente, maior utilização dos serviços de saúde, Qualidade de Vida Após Infarto Agudo do Miocárdio Caetano JA et al comportamento e condutas menos agressivas, hábitos mais saudáveis (sem o consumo de álcool e tabaco) e menor exposição aos riscos do trabalho9. A partir da década de 1980, este perfil vem mudando. A ocorrência entre as mulheres vem crescendo significativamente pelas transformações sociais e culturais que estimularam a maior participação da mulher no mercado de trabalho e a progressiva adoção de hábitos nocivos à saúde - tabagismo e etilismo que, aliados ao estresse e ao uso de contraceptivos orais, representam sérios fatores de risco. O excesso de adrenalina, gerado pela ansiedade e pela fadiga constantes, acelera o ritmo cardíaco, contrai as artérias e favorece a formação de coágulos, desencadeando, portanto, a angina e o IAM8. A doença do coração nas mulheres é uma preocupação mundial, por ser a primeira causa de morte feminina nos países mais desenvolvidos. Estatísticas nos Estados Unidos mostram que, em 1989, cerca de 329 mil mulheres morreram de doença cardiovascular. Esse número equivale a 3,8% do total de mortes entre as mulheres naquele ano. No Brasil, 40% das pessoas com problemas cardíacos são mulheres, sendo a proporção de morte de 3,5 homens para 1 mulher. Apesar das mudanças de hábitos, a probabilidade de o coração feminino infartar é quatro vezes menor do que o coração masculino, graças à ação do estrogênio10, 11. Neste estudo a faixa etária foi de 48 a 78 anos, com média de idade de 62 anos; com relação ao estado civil, os casados predominaram nesta amostra, com 24 (80,0%); seguidos pelos viúvos, três (10,0%); separados, dois (6,7%); e solteiros, um (3,3%). Dados estatísticos verificados em outros estudos12,13 mostraram que há relação entre estado civil e os processos de morbidade e mortalidade por doenças crônico-degenerativas. A freqüência das doenças eleva-se nos solteiros e a mortalidade é maior entre viúvos, divorciados e solteiros. A relação entre estado civil e saúde é vulnerável a mudanças, na proporção em que outros tipos de relacionamentos sejam incorporados ao conceito de vida conjugal. Na sociedade atual, o cônjuge tem papel fundamental na reabilitação do cliente coronariopata. Esse apoio favorece aquele que tem parceiro fixo, mesmo porque terá mais chances de reintegração em menor tempo9. As questões religiosas têm grande influência nesse momento da vida, de forma que 100% da população pesquisada (30) demonstraram afinidade com algum tipo de atividade ou prática religiosa, predominando o engajamento na religião católica com 25 (83,3%), seguida da religião evangélica, cinco (16,7%). Quanto às razões para a ocorrência desse fato, verifica-se que a prática de alguma religião permite estabelecer um elo entre as limitações e o aproveitamento de suas potencialidades, ou quando isso não ocorre, ajuda-o a vencer com mais facilidade essa fase que está vivenciando12. A tarefa de lidar consigo mesmo e a busca de paz interior parece ter um significado maior para a aceitação das condições de vida e de encontrar conforto na perda e na dor. A prática religiosa também tem papel social na convivência entre as pessoas, na terapia de relaxamento e nos problemas, pela conquista do céu diante da iminência da morte. A religião serve também de lenitivo à incapacidade humana de enfrentar Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 30 - 7. 33 Qualidade de Vida Após Infarto Agudo do Miocárdio Caetano JA et al fracasso e sofrimento – entrega-se tudo a Deus e aí vem o consolo. Os movimentos religiosos promovem um preenchimento saudável do tempo e de convivência social. Representam um compromisso na regularidade de uma ação agradável que serve de estímulo à pessoa com vistas à participação social13. A moradia e a convivência têm sido a grande preocupação, porém, nesta amostra. Constatou-se que 20 (66,7%) possuem casa própria, significando que a maioria acumulou ao longo dos anos algum patrimônio; três (10,0%) residem em casa alugada; dois (6,7%) moram com os filhos, e cinco (16,7%) residem na casa de outras pessoas. Possuir casa própria dá, acima de tudo, segurança e autonomia. Morar no que é seu e não ser hóspede tem forte valor significativo no processo de relacionamento familiar. Constatou-se que 24 (80,0%) vivem com os seus cônjuges; por outro lado, cinco (16,7%) convivem com outros familiares e um (1,3%) vive sozinho. Outro fator de relevância para a caracterização da amostra é a renda familiar dos seus integrantes. Agrupamos estes dados em quatro segmentos, tomando como base o salário mínimo nacional vigente (R$ 260, 00, em 2005). Verificamos que 26 (86,7%) dos clientes sobrevivem com um a três salários mínimos e somente dois (6,7%) informaram ter renda mensal superior a três salários mínimos. Observamos que os aposentados constituem o maior grupo - 21 (70,0%); seguidos de outras atividades - sete (23,3%); e doméstica - dois (6,7%). Incluídas na amostra estão outras categorias cujo esforço físico desempenhado é considerado de maior intensidade, como os profissionais de serviços gerais, quatro (13,3%), e os pedreiros, três (10,0%). Entende-se que o trabalho físico que produz exercícios sistemáticos estimula o miocárdio tornando-o menos vulnerável aos agravos isquêmicos. Ressalta-se também que os indivíduos habitualmente voltados para o desenvolvimento de atividades que exigem gastos energéticos significativos conseguem reduzir a influência dos fatores de risco com relação à mortalidade coronária9. O grupo que merece destaque é o dos profissionais que trabalham no período da noite, por vezes, inclusive, sem a compensação adequada do repouso necessário, ou excedendo as horas trabalhadas em duplas jornadas contínuas. Na realidade, podemos constatar que esta amostra é constituída por pessoas que não dispõem de condições sócio-econômicas para o custeio de despesas hospitalares, fazendo parte, portanto, da população usuária dos serviços públicos de saúde. Mesmo com o SUS garantindo o direito à saúde para todos, os cidadãos brasileiros têm sido vítimas da diminuição progressiva de recursos alocados para a garantia deste direito, e esta condição vem gerando uma assistência com pouca resolutividade e triagens contínuas14. A queda da qualidade da atenção prestada tem sido a principal fonte de desgaste e descrédito do SUS. É notório que a sociedade brasileira, com relação à opção de serviços de saúde, está classificada de acordo com o poder aquisitivo do usuário, ou seja, aqueles que podem escolher livremente profissionais e procedimentos e aqueles que são obrigados a recorrer às instituições públicas Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 30 - 7. e, conseqüentemente, submeter-se ao descaso das filas, às listas de espera, ao sucateamento dos serviços e aos atendimentos impessoais ou inadequados11. Observa-se que o acesso aos serviços de saúde não é igual ou universal e o poder aquisitivo vem se transformando em um determinante fator que assegura a poucos o direito à saúde. Esta realidade discriminatória e excludente, além de expor as fragilidades das políticas públicas de saúde e de tornar cada vez mais explícitas e cruéis as desigualdades sociais geradas pela concentração de renda, também interfere diretamente na qualidade de vida da sociedade, por ser a saúde considerada uma das dimensões fundamentais que possibilita ao ser humano uma vida plena e produtiva. Avaliação da Qualidade de Vida Na Escala da Qualidade de Vida de Flanagan, essa qualidade é alcançada pela interação de dimensões que se harmonizam segundo a concepção pessoal de cada indivíduo sobre suas condições de vida. Ela pode ser utilizada como atributo e também como variável, pois determina a existência e a continuidade das organizações (sistemas, processos, produtos e serviços) e a dos próprios indivíduos (vida) de uma comunidade (coletividade). O termo qualidade pode ser usado como valorização, comparação e caracterização na busca de estabelecer processo de juízo15. A mensuração da qualidade de vida vem-se tornando impor tante na avaliação de tecnologias e terapêuticas utilizadas na área da saúde. Com a evolução da ciência, que envolve condutas clínicas e procedimentos cirúrgicos, problemas oriundos da idade e do status no processo saúdedoença tornaram-se um fator primordial na adoção de novas alternativas de tratamento, para a recuperação e a respectiva melhora da vida. O interesse de pesquisadores em transformar o conceito de qualidade de vida em uma medida quantitativa para uso em ensaios clínicos e em modelos econômicos é crescente, para que esta medida possa ser comparada entre diversas populações e patologias12. Tomando-se como base a pontuação máxima alcançada na avaliação da qualidade de vida proposta por Flanagan, de 105 pontos, e a mínima, de 15 pontos, que refletem baixa qualidade de vida, podem-se observar, no Gráfico 1, a seguir, levando em conta os limites dos escores de 30-40, três pacientes neste limiar; nos limites de 41-50, somente um; 51-60, seis; 61-70, cinco; 71-80, nove e de 81-90, seis. Nenhum apresentou pontuação máxima, nem tampouco mínima, porém os limites que apresentaram maior número de pacientes foram no escore de 7180, o que mostra, neste estudo, que a qualidade de vida entre os participantes era alta. Tal resultado foi semelhante ao encontrado por outros autores que avaliaram a qualidade de vida. A qualidade de vida, além de ser ímpar, também é temporal, pois a vivência de uma determinada situação pode ou não proporcionar uma qualidade de vida momentânea ou por um período longo. Portanto, quem pode definir a qualidade de vida de uma pessoa é ela própria, vivendo e interconectando o interior com o exterior. Por isso, devemos ter consciência que a interconexão com o ambiente, a família e a sociedade pode causar mudanças relevantes na vida do portador de IAM. 34 Qualidade de Vida Após Infarto Agudo do Miocárdio Caetano JA et al Gráfico 1 - Distribuição das características segundo escores totais na EQV* apresentada pelos clientes do Hospital de Messejana da cidade de Fortaleza-CE, 2005 - Escala de qualidade de vida, segundo Flanagan. 105 Escala de Flangan 90 86 83 79 75 60 58 45 39 30 74 69 74 72 71 57 56 70 68 68 60 7981 81 81 79 78 81 80 59 65 60 44 34 32 15 0 5 10 15 20 25 30 Clientes Pelo caráter multifatorial da doença coronariana, e sendo a saúde vista como um fenômeno multidimensional que envolve aspectos físicos, psicológicos, sociais e espirituais, é necessário entender que a doença física pode ser contrabalanceada por uma atitude mental positiva e por um apoio social, de modo que o estado global do indivíduo seja de bem-estar 16. Como pode ser observado no quadro 1, a seguir, a média total da escala de qualidade de vida foi de 67,26 e a média de todos os itens foi de 4,48. Este resultado foi obtido somando todos os itens médios da escala - o resultado reflete que os participantes estão aproximadamente no grau 4-5, que com base nas respostas da escala de sete escores. O número 4 representa nem insatisfeito, nem satisfeito; já o 5 é satisfeito. O bem-estar físico e material, dimensão 1 da EQV de Flanagan, representada pelos itens “conforto material” e “saúde”, apresentaram médias de 5,20 e 4,20; respectivamente. O conforto material está diretamente vinculado à renda - vinte e seis dos pesquisados recebem até três salários mínimos, como renda familiar. Sentir a vida difícil tem a ver, também, com a escassez de recursos econômicos. Embora a renda seja um problema com o qual lidaram toda a vida, nesse momento se agudiza pela saída social do trabalho, pelo escasso valor da aposentadoria ou pensão, ou pelas dificuldades para conseguir, o que dizem eles, seus direitos. “Estar bem vigoroso”, para eles, está relacionado com a possibilidade de ter, ser, poder e saber. O ter traz referência ao conjunto de necessidades básicas parcialmente resolvidas, a possibilidade de contar com bom estado de saúde e capacidade para realizar suas atividades de vida diária. Possuir uma moradia própria gera uma sensação de bemestar, dá segurança e autonomia; alimentar-se bem, para eles, significa comer “tudo” do que gosta, sem restrições. A modificação da alimentação faz par te da terapia não farmacológica, pois a dieta inadequada pode comprometer mais ainda as coronárias; assim, essa modificação, por vezes, não é vista como parte do tratamento, deixando-os insatisfeitos e, às vezes, até deprimidos. Esta incompreensão pode estar relacionada com a falta de orientação sobre a doença e o tratamento, devendo, por conseguinte, ser realizada por médicos e enfermeiros logo após a estabilização da crise aguda do infarto17. Verifica-se, portanto, que, na área da saúde, a vida se torna difícil em virtude das dificuldades para acessar o sistema de saúde, da ineficiência desse sistema, dos problemas para compra de remédios ou para fazer o tratamento, da ansiedade por não compreender sua doença ou pela enfermidade de um ser querido. Nas relações interpessoais, representada pela dimensão 2 da EQV de Flanagan, observa-se que a média das respostas dos participantes no quesito relacionamento com a família foi 5,27, que se encontram satisfeitos. Registram-se aqui as expressões de afetividade percebidas nas respostas a este item, tendo algum cliente colocado a família como maior responsável pela sua recuperação. É de suma importância o apoio dos grupos, principalmente da família, dos filhos e amigos, em que o indivíduo pode se sentir intimamente aceito, respeitado e considerado, o que, sem dúvida, representa um fator de proteção para o coração14. Na relação da criação dos filhos, as respostas apresentaram uma média de 5,63, ou seja, os clientes não sentiram alterações Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 30 - 7. 35 Qualidade de Vida Após Infarto Agudo do Miocárdio Caetano JA et al Quadro 1: Estatística descritiva das respostas dos participantes aos itens da Escala de Qualidade de Vida de Flanagan. Fortaleza/CE. 2005. Escores Dimensões/Itens da EQV de Flanagan Média (x) Desvio-Padrão (s) 1. Conforto material: casa, alimentação, situação financeira. 5,20 0,76 2. Saúde: fisicamente bem e vigoroso(a) 4,20 1,97 3. Relacionamento com pais, irmãos e outros parentes: comunicação, visita e ajuda 5,27 1,44 4. Constituir família: ter filhos 5,63 0,49 5. Relacionamento íntimo com o esposo(a), namorado(a) ou outra pessoa relevante. 3,57 1,96 6. Amigos próximos: compartilhar interesses, atividades e opiniões. 4,97 1,38 7. Voluntariamente, ajudar e apoiar a outras pessoas 5,47 0,68 8. Participação em associações e atividade de interesse público 4,50 1,53 9. Aprendizagem: freqüentar outros cursos para conhecimentos gerais 4,13 1,59 10. Autoconhecimento: reconhecer seus potenciais e limitações 3,53 1,83 11. Trabalho (emprego ou em casa): atividade interessante, gratificante, que vale a pena. 3,23 2,0 12. Comunicação criativa 4,53 1,61 13. Participação em recreação ativa 4,23 1,59 14. Ouvir música, assistir à TV ou cinema, leitura ou outros entretenimentos. 4,33 1,73 15. Socialização: fazer amigos. 4,47 1,74 ou incapacidades. A família e os filhos são a primeira rede social do indivíduo, é nela que as relações acontecem e se desenvolvem9. Em um estudo realizado18 sobre QV do diabético, o autor identificou que o grau de satisfação familiar com a vida está relacionado às condições de saúde, à relação familiar harmônica e à resolução de problemas financeiros, familiares e de trabalho. O relacionamento íntimo com companheiro apresentou-se prejudicado, com uma média de 3,57, o que representa o ponto 3-4, onde temos no número 3 = insatisfeito e 4 = nem insatisfeito, nem satisfeito. A ansiedade, a depressão, o medo de morrer, a simbologia do coração doente, a revisão dos valores vitais, baixa auto-estima e, conseqüentemente, o sentimento de impotência diante da vida, decorrentes da doença, são generalizados para a área sexual, gerando um sentimento de que não vai conseguir lidar com os eventos da vida, simbolizados pela incapacidade e insatisfação sexual18. Quanto às relações com os amigos, as respostas apresentaram média de escore 4,97, quase 5, satisfeito. Mesmo justificando o apoio de amigos para o enfrentamento do Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 30 - 7. problema, das novas adaptações, ressaltamos, porém, a manifestação de sentimento como medo, limitações, dúvida, depressão, desânimo e mudanças de hábitos de vida, que retratam os desafios propostos ao ser humano pelo processo de adoecimento, pois a recuperação dos pacientes deve, necessariamente, ser complementada com outras ações que envolvem, além dos profissionais de saúde, a família e a comunidade, possibilitando a sua reintegração sócio-econômica19. Na participação em atividades sociais, comunitárias e cívicas, registrou-se uma baixa média, 4,50, nem insatisfeito, nem satisfeito. Em relação à ajuda e apoio a outras pessoas, 5,47, satisfeito. Portanto, foi possível constatarmos que a doença pode interferir no cotidiano dos indivíduos. Adoecer pode levar a um isolamento social, aumento da depressão e diminuição das expectativas de melhora, contribuindo para um sentimento de desesperança20. Há necessidade de compartilhar a experiência do adoecimento com outras pessoas que tenham passado por vivência semelhante, uma vez que a troca de informações poderia ser de grande valia nas conversas ou reuniões. 36 No desenvolvimento pessoal e realização, dimensão 4 da EQV de Flanagan, o processo de aprendizagem, que apresentou baixa média de escore, 4,13, nem insatisfeito, nem satisfeito, o que pode ser interpretado como uma estagnação no processo de conhecimento, em que a maioria dos clientes, com mais de 60 anos, já se encontram “aposentados”. No que diz respeito ao autoconhecimento, os clientes apresentaram média de 3,53, insatisfeito. A formação do indivíduo é refletida na vivência de situações estressantes, em que o indivíduo mostra a aceitação de seus limites e compreensão das perdas de suas capacidades5. O item trabalho apresentou 3,23 na média de escore, insatisfeito. A maior parte do grupo, 21, era inativa e atribuiu essa inatividade à doença. Esses achados reproduzem o que a literatura tem trazido sobre o impacto das doenças cardíacas na sociedade, que além de serem doenças com formas graves de manifestações clínicas, retiram precocemente o sujeito da vida produtiva, com conseqüências negativas para ele e para a sociedade12. Quanto ao retorno às atividades domésticas, dois clientes relataram que não houve alteração significante em relação ao trabalho doméstico. Estudos mostram um percentual entre 52 a 70% de respostas positivas ao trabalho doméstico. Em relação às atividades profissionais, sete (23,3%) se encontravam na ativa. As dificuldades em relação ao retorno ao trabalho ocorrem especialmente pelo cansaço físico e a dor. Um fator também observado, durante as entrevistas, é que os respondentes apresentavam-se pouco comunicativos, o que para eles pode dificultar a socialização. Entretanto, é nosso entendimento que a ajuda aos seus pares no processo de adaptação ao novo estilo de vida faz par te de sua personalidade, e não é em decorrência do infarto. A recreação/atividades/sociais teve dimensão 5, representada pelos itens “participação em recreação ativa”, média 4,23, nem insatisfeito, nem satisfeito; “ouvir música, assistir à TV ou ao cinema, leitura ou outros entretenimentos”, média 4,33, nem insatisfeito, nem satisfeito; “socialização: fazer amigos”, média 4,47, nem insatisfeito, nem satisfeito; com algumas restrições, desde o praticar esporte a sair de casa. A socialização/fazer amigos tem a ver com a capacidade de comunicação; é prejudicada não pelo agravo, mas, sim, pelas suas personalidades. Grande parte dos clientes continuou com sua atividade de lazer considerada passiva - cinemas, TV, leitura,entre outros, atividades de lazer que não requerem esforços. Com relação às viagens e às atividades “ativas”, como praticar algum tipo de esporte, os clientes demonstraram restrições. A maior parte do grupo, 21 (70%), era inativa e atribuiu essa inatividade à doença. Recreação com destaque para socialização, fazer amigos, apresentou uma média de escore 4,47, nem insatisfeito, nem satisfeito. O fato de receber apoio das pessoas queridas faz o doente sentir-se melhor. A doença, de certa forma, é também da família e dos amigos, e, quando essas pessoas estão presentes, dando apoio, a angústia é compartilhada, diluída12. O item ouvir música, assistir a TV, cinema, leitura ou outros entretenimentos apresentou uma média de escore de 4,33; participação em associações e atividades de interesse público, 4,23. Em nosso estudo foi possível constatar que a doença Qualidade de Vida Após Infarto Agudo do Miocárdio Caetano JA et al interfere no cotidiano dos indivíduos. Adoecer pode levar ao isolamento social, a um aumento da depressão e diminuição das expectativas de melhora, contribuindo para um sentimento de desesperança20. Na dimensão bem-estar físico e material, o item saúde apresentou média de escore 4,20. A doença cardíaca é para muitos dos nossos entrevistados fator limitante para ter uma “vida normal”, pois sabe-se que as doenças cardiovasculares podem levar a uma forte tensão, à medida que impingem outros desafios. Surgem as novas incumbências, como fazer regime e tomar medicação diariamente, além dos medos que podem aparecer em alguma fase da doença, como morrer ou evoluir para alguma deficiência. No item conforto material, nota-se um escore 5,20, satisfeito, pois, para os nossos entrevistados, ter uma casa própria representa segurança e autonomia. CONCLUSÃO O estudo revelou aspectos bastante importantes sobre a população estudada. Percebemos o quanto o infarto agudo do miocárdio afeta a qualidade de vida das pessoas, alterando diversos fatores de suas vidas. Pelos resultados, a investigação permitiu reafirmar que, indubitavelmente, as doenças da artéria coronária atingem mais o homem (63,3%) do que a mulher (36,7%), tendo como predominante neste estudo a faixa etária de 48 a 70 anos. Também pudemos constatar que a amostra foi composta de clientes que se encontravam na faixa etária de 48 a 78 anos, dos quais 80% eram casados e conviviam com os seus cônjuges; os aposentados representaram 70%; outras ocupações, 23,3%; e domésticos, 6,7%. Pontuamos a questão salarial quando identificamos que somente 6,7% dos clientes tinham renda mensal de 3 a 5 salários mínimos e que 86,7%, recebiam de 1 a 3 salários mínimos, contribuindo, de certa forma, para a determinação do nível de vida, uma vez que os clientes possuíam também índices menores de qualidade de vida. Apesar de apresentarem renda baixa, 66,7% possuíam moradia própria. Outro fator relevante observado foi a prevalência da religião católica (83,3%), seguida da religião evangélica, (16,7%). A adequação da EQV de Flanagan apontou dados gerais acerca da qualidade de vida, tendo sido detectadas restrições para o cliente acometido pelo IAM, como, por exemplo, autoconhecimento e trabalho. Em relação à escala como um todo, o maior índice de respostas se posicionou no nível 4, “nem insatisfeito, nem satisfeito”, a 5, “satisfeito”, com suas qualidades de vida. Os itens levantados como fontes de maior satisfação entre os par ticipantes foram: confor to material; moradia, alimentação, situação financeira; relacionamento familiar (pais, o irmão e outros parentes); comunicação, visita e ajuda; constituir família: ter filhos; e, voluntariamente, ajudar e apoiar outras pessoas. Quanto aos itens de insatisfação foram pontuados: relacionamento íntimo com esposo (a) ou outra pessoa Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 30 - 7. 37 Qualidade de Vida Após Infarto Agudo do Miocárdio Caetano JA et al relevante; autoconhecimento de seus potenciais e limitações; o trabalho (emprego ou em casa) como atividade gratificante, que vale a pena. Na perspectiva de que qualidade de vida digna é um direito do homem, ressaltamos a missão dos profissionais da saúde, com destaque para o enfermeiro, que, através da continência e da sensibilidade do saber e da cidadania, podem contribuir para a transformação das pessoas e da sociedade. Por isso, é importante que os profissionais de saúde se conscientizem da relevância dos programas de saúde preventiva para as doenças crônicodegenerativas e apliquem seus esforços na preservação da saúde e melhoria da qualidade de vida das pessoas sob seus cuidados. A escala de Flanagan é um instrumento genérico de avaliação da qualidade de vida, que pode ser usada pelos profissionais de saúde, especialmente diante do cliente com doença crônica, afetando vários aspectos do cotidiano de sua vida. Referências 12. Gallani MCBJ, Colombo RCR, Alexandre NMC, Bressan-Biojone AM. Qualidade de vida em pacientes coronariopatas. Rev Bras Enferm 2003 jan/mar; 56(1): 40-43. 13. Ide CAC, Schneck CA, Paz MO. Compartilhando uma vivência limite: as representações de familiares acerca do processo de hospitalização. O mundo da saúde 2000 jul/ago; 24(4): 278-83. 14. Ministério da Saúde(BR). Secretaria Nacional de Epidemiologia. Classificação brasileira de ocupação para o subsistema de informações sobre mortalidade. Brasília (DF); 1993. 15. Coelho Neto A. Planejamento estratégico para melhoria da qualidade de vida. Rio de Janeiro (RJ): Qualitymark; 1998. 16. Santos ZMA, Martins ZMDP, Valdés MTM. 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Recebido em 29/05/2006 Reapresentado em 23/08/2006 Aprovado em 15/12/2006 Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 30 - 7. 38 Nonverbal Communication: Aspects Observed During the Nursing Consultations Rebouças CBA et al NON-VERBAL COMMUNICATION: ASPECTS OBSERVED DURING NURSING CONSULTATIONS WITH BLIND PATIENTSa Comunicação não-verbal: Aspectos Observados Durante a Consulta de Enfermagem com o Paciente Cego Comunicación no-verbal: Aspectos Observados Durante la Consulta de Enfermería con el Paciente Ciego Cristiana Brasil de Almeida Rebouças Lorita Marlena Freitag Pagliuca Paulo César de Almeida Abstract Exploratory-descriptive study on non-verbal communication among nurses and blind patients during nursing consultations to diabetes patients, based on Hall’s theoretical reference framework. Data were collected by recording the consultations. The recordings were analyzed every fifteen seconds, totaling 1,131 non-verbal communication moments. The analysis shows intimate distance (91.0%) and seated position (98.3%); no contact occurred in 83.3% of the interactions. Emblematic gestures were present, including hand movements (67.4%); looks deviated from the interlocutor (52.8%), and centered on the interlocutor (44.4%). In all recordings, considerable interference occurred at the moment of nurse-patient interaction. Nurses need to know about and deepen non-verbal communication studies and adequate its use to the type of patients attended during the consultations. Keyw or ds ywor ords ds:: Communication Nonverbal. Nursing. Blindness. Resumo Resumen Estudo exploratório-descritivo sobre comunicação nãoverbal entre o enfermeiro e o cego durante a consulta de enfermagem ao diabético, a par tir do referencial teórico de Hall. Coleta de dados com filmagem da consulta, analisadas a cada quinze segundos, totalizando 1.131 momentos de comunicação não-verbal. A análise mostra distância íntima (91,0%) e postura sentada (98,3%); em 83,3% das interações não houve contato. Esteve presente o gesto emblemático de mover as mãos (67,4%); o olhar desviado do interlocutor, (52,8%) e o olhar centrado no interlocutor (44,4%). Em todas as filmagens, houve interferências consideráveis no momento da interação enfermeiro-paciente. Concluise, que o enfermeiro precisa conhecer e aprofundar os estudos em comunicação não-verbal e adequar o seu uso ao tipo de pacientes assistidos durante as consultas. Estudio exploratorio y descriptivo sobre comunicación noverbal entre el enfermero y el paciente ciego durante la consulta de enfermería al diabético, desde el referencial teórico de Hall. Colecta de datos con filmación de la consulta, analizadas a cada quince segundos, totalizando 1.131 momentos de comunicación no-verbal. El análisis muestra alejamiento íntimo (91,0%) y postura sentada (98,3%), en 83,3% de las intervenciones no hubo contacto. Estubo presente el gesto emblemático mover las manos (67,4%); el mirar desviado del interlocutor (52,8%) y al mirar centrado en el interlocutor (44,4%). En todas las filmaciones, hubieron interferencias considerables en el momento de la interacción enfermero y paciente. Concluyese que el enfermero precisa conocer y profundizar los estudios en comunicación no-verbal y adecuar su utilización al tipo de pacientes asistidos durante las consultas. Palavras-chave Palavras-chave:: Comunicação Não-verbal. Enfermagem. Cegueira. Palabras clave: Comunicación No verbal. Enfermería. Ceguera. Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 38 - 43. Nonverbal Communication: Aspects Observed During the Nursing Consultations Rebouças CBA et al 39 INTRODUCTION THEORETICAL FRAMEWORK In all manifestations of life, communication is present and represents an essential element for interaction between human beings. The communication process is a basic instrument in social experience. Thus, for communication to occur, comprehension must exist as, this way, ideas, images and experiences will be moved to a common area (1). In this process, social relations are established, understood in interpersonal communication, where experiences, feelings, emotions and discoveries are exchanged. Basically, communication can be classified as verbal and non-verbal (2) . While verbal communication is completely voluntary, the non-verbal type can be an involuntary reaction or an intentional communicative act. Non-verbal communication refers to messages sent by human actions and behaviors instead of words, representing the majority of messages sent and received, through facial expressions, mannerisms, voice, attitude and clothing. This kind of communication mainly occurs in personal meetings. Non-verbal signs can be categorized as follows: kinetic, proxemic and paralinguistic. Kinetics studies body movements, proxemics studies body position and spatial relations and paralanguage focuses on the study of the voice and vocalization. Many non-verbal behaviors are interrelated in a message, as one single body movement in itself rarely communicates a meaning (3). In nursing care delivery to patients, communication will facilitate the achievement of care objectives (4) . Communication should be seen in the relationship context it occurs in, as it is meaningless when removed from its context. It must be planned according to the clients, each interaction and each person in particular. In consultations to blind people, nurses can adopt therapeutic techniques, such as using silence for example, as non-verbal communication also occurs at these moments and validates messages sent and received by both sides. In this interaction, seeing nurses perceive both the verbal and non-verbal communication sent by the blind. However, these professionals should pay attention to their gestual expression, because the non-verbal signs they send to the blind do not refer to what they are verbally expressing. On the other hand, the non-verbal signs sent by the blind can have a different meaning for a seeing person, as it will depend on the social context and visual experiences or not which people live across life. Visual impair ment can hinder the nur se-patient relationship and jeopardize these professionals’ work in patient orientation, treatment adherence, understanding and interpretation of communication. It interferes with nurseblind patient communication, as vision is one of the main senses in the reception of non-verbal communication. Thus, this study aimed to analyze nurses’ non-verbal communication with blind patients during nursing consultations (7). Scholars have studied non-verbal communication, also known as the theory of non-verbal signs. In this study, Hall’s Theory of Proxemics (6) was chosen, which assesses individuals’ body posture and spatial relations as an elaboration of the culture they are inserted in. This theory recommends eight analytic factors, which constitute its primary categories: 1) Posture-gender: participants’ gender and interlocutors’ basic position (standing, seated, lying). 2) Sociofugal-sociopetal axis: while the former discourages interaction, sociopetal implies the opposite; the shoulders’ angle is analyzed in relation to the other person, and the interlocutors’ position as face to face, back turned or in any other angle. 3) Kinesthetic: short-distance physical contact, such as touching or brushing the skin and the positioning of body parts. 4) Contact behavior: tactile relations, such as caressing, grabbing, feeling, prolonged holding, pressing against, spot touching, accidental brushing or no physical contact. 5) Visual code: the visual contact mode in interactions, such as eye-to-eye, or the absence of contact. 6) Thermal code: heat perceived by the interlocutors. 7) Olfactory code: characteristics and degree of odor perceived by the interlocutors. 8) Voice loudness: interlocutors’ perception of voice volume and intensity. Besides studying various types of signs and distinctive traits related to the use of space in human relations, proxemics considers four interpersonal distances: intimate distance (from 0 to 50cm), involving physical contact, human warmth, transmission of odors and the most intimate personal meetings; personal distance (from 50cm to 1.20m): although close, physical contact may not occur and odors and body warmth may no longer be felt. In social distance (1.20m to 3.60m), there is no physical contact, but visual contact with the interlocutor; public distance (more than 3.60m) occurs in public speaking and conferences, with no individual but collective visual contact. Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 38 - 43. METHODS This exploratory, descriptive and quantitative study analyzed non-verbal communication between nurses and blind patients in order to suppor t interventions and quality improvements in care delivery to these clients. The project was elaborated according to the National Health Council guidelines for research involving human beings, as established in Resolution 196/96 by the Brazilian Ministry of Health (6), and approved under protocol No. 327/04. Data collection started after nurses, blind patients and their companions had signed the Free and Informed Consent Term. The research was carried out at a secondary health unit in Fortaleza-CE, which is a state referral institution for diabetes and hypertension care (5). Nurses were included if they delivered care to diabetes patients, a disease that can cause eye diseases like cataract, glaucoma and diabetic retinopathy. The choice of this service is justified by the fact that blind 40 Nonverbal Communication: Aspects Observed During the Nursing Consultations Rebouças CBA et al diabetics were followed-up at the institution. These blind diabetes patients were selected through a convenience sample, including patients with a medical diagnosis of blindness, who were attended by nurses who agreed to participate in the research. Inclusion criteria were blindness and age over 18, considering ethics and aptitude for decision making. Data were collected between February and April 2005, using a camera to film the nursing consultations between the nurse and the blind patient. Thus, non-verbal data were filed for analysis. Recordings were made at the nursing consultation room. The camera was strategically positioned on a fixed tripod. During care, one researcher remained inside the consultation room, without interfering with communication. The data analysis instrument to assess nurses’ non-verbal communication with the blind was elaborated on the basis of Hall’s theoretical reference framework (7) and was called NonVerbal Nurse-Blind Communication (CONVENCE)(8). The CONVENCE assesses Spatial Distance, as the first category or variable, divided in four subcategories. These are: 1. Distance, classified as intimate, personal, social and public; 2. Posture, delimited as: standing, seated, lying; 3. Axis, identified as: faceto-face, back turned, another angle, sociofugal and sociopetal; 4. Contact, called: touching, caressing, grabbing, feeling, prolonged holding, pressing against, spot touching, accidental brushing and no physical contact. The second category, social behavior, was subdivided into: 1. Emblematic gestures, classified as resisting, moving hands and others; 2. Illustrating gestures: either complementing verbal communication or not; 3. Regulating gestures: head nods, eye movements and others. The third category, called Facial Behavior, contained: perplexity, disgust, joy, fear, anger, sadness and others. The fourth category, Visual Code, covered two subdivisions of Eye opening: surprise, joy, sadness and others; and Eye direction: centered on or deviated from the speaker. The fifth, Voice Loudness, was classified as whispering, yelling, normal and silence. The recordings were analyzed by three experts, who watched the films and assessed the non-verbal categories of the communication instrument. Agreement levels among the experts’ answers ranged around 80%. Researchers adopt this rate, including because subjectivity in this research line never allows for clear-cut reliability among experts (8). All experts saw the full version of the film and, after this phase, analyzed it as previously established. Data were analyzed as absolute frequencies through a univariate table with relative frequencies and percentages, processed in Stats Direct (ST) software. RESULTS We analyzed five consultations, realized by four nurses. Each recording was analyzed every fifteen seconds, totaling a sample of 1,131 non-verbal communication analyses. The mean duration of the recordings was nineteen minutes, ranging between fifteen and twenty-four minutes. Table 1 shows absolute frequencies and percentages of non-verbal sign categories analyzed through the CONVENCE. TABLE 1 Univariate synthesis of non-verbal communication categories according to Hall (6) NUMBERS % 1.1 Distance Intimate Personal Absent 1,030 89 12 91.0 7.9 1.1 1.2 Posture Seated Absent/ Other 1,112 19 98.3 1.7 645 445 41 57.0 39.3 3.7 892 203 36 78.9 18.0 3.1 943 140 48 83.3 12.4 4.3 2.1 Emblematic gestures Moving the hands Not observed/ No contact Absent/ Other 762 247 122 67.4 21.8 10.8 2.2 Illustrating gestures Complement the verbal one Do not complement the verbal one Absent/ Other 566 510 55 50.0 45.1 4.9 2.3 Regulating gestures Not observed/ No contact Eye movement Head nod Absent/ Other 582 273 176 100 51.4 24.1 15.6 8.9 499 155 97 380 44,1 13.7 8.6 33.6 4.1 Ocular Opening Not observed/ No contact Joy Attention Absent/ Other 873 53 51 154 77.2 4.7 4.5 13.6 4.2 Eye Direction Deviated from the speaker Centered on the speaker Absent/ Other 597 502 32 52.8 44.4 2.8 746 365 20 66.0 32.3 1.7 1,131 100.0 CA TEGORIES CATEGORIES 1. SPATIAL DISTANCE 1.3 Axis 1.3.1 Axis/ Position Another angle Face to face Absent/ Other 1.3.2 Axis / Interaction Sociopetal Sociofugal Absent/ Other 1.4 Contact No Contact Localized touch Absent/ Other 2. SOCIAL BEHAVIOR 3. FACIAL BEHAVIOR Not observed/ No contact Attention Joy Absent/ Other 4. VISUAL CODE 5. VOICE VOLUME Normal Silent Absent/ Other TOTAL Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 38 - 43. Nonverbal Communication: Aspects Observed During the Nursing Consultations Rebouças CBA et al DISCUSSION Blind people are entitled to receive specialized nursing care. For this care to be successful, nurses need to develop specific skills for communicating with the blind. This can preserve and increase the efficacy of health care (5). As mentioned above, nonverbal communication allows for the direct expression of feelings and emotions, and its functions are to complement, contradict and replace verbal communication (9). During interpersonal relations, like in nursing consultations, the expression of these non-verbal signs can be perceived. The distances maintained in an interaction can vary according to the people’s culture and characteristics (gender, stature). The ideal distance for Latinos and Europeans to hold a dialogue is different. A very close distance can be considered an invasion of one’s intimacy, while too far a distance can be interpreted as a lack of interest. Exper ts disagreed about voice loudness and the subcategories emblematic and regulatory gestures and ocular opening. It can be inferred that this result derived from the large number of non-observed answers during the scenes. Voice loudness refers to a more subjective answer as, according to one expert, the nurse was talking normally, while another considered she was whispering and vice-versa. Moreover, loudness was influenced by the recording technique and the type of environment, as recordings were made in the actual consultation environment. As to Spatial Distance, intimate distance (91%) prevailed, followed by personal distance (7.9%) and cases in which the nurse was not seen or did not appear in the image (1.1%). The nurse should keep a distance that demonstrates interest (10) . Na attitude capable of inducing approximation can be very important during an initial contact, when the nurse-patient relation does not exist yet (11). During consultations, the seated position was predominant (98.3%) in the analyzed images. When the sender and the receiver maintain the same attitude, this means that they are in tune, sharing the same rhythm, level of interest and movement. Posture reveals the type of relation established with the other, demonstrating mastering or submission, territoriality, intensity of the relationship and attempts to strengthen the bond (5). During nursing consultations, the seated position is comfortable to realize anamnesis, record in the patient file what the patient is saying and expressing, measuring glucose levels and checking blood pressure. Literature recommends that the adequate posture should manifest availability (10). Body position reflects thoughts and feelings. The latter are communicated through the language of behavior (12). As to the axis/ position, 57% of interactions were related to another angle, 39.3% to the face-to-face position, and absent/other in 3.7%. As to the position of the shoulders towards the other person, among the total number of interactions, 78.9% demonstrated encouragement or were sociopetal, 18% showed discouragement or were sociofugal, and this aspect was absent in 3.1%. In a restricted environment, one tends to look at the other person less (9). Therefore, the most detected positions during consultations were different angles between sender and receiver. Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 38 - 43. 41 The assessment of contact showed interactions without any contact (83.3%), but localized touch or touch occurred in 12.4%. Human beings’ contact with the world starts through the senses, which are capable of transmitting pleasure and displeasure (13). Touching objects makes it possible to get a precise perception of their forms and textures. This feeling is not only limited to the hand, but extends throughout the human body (13) . Among all sensations, touch is experienced most personally and can be defined as the skin’s faculty to issue and detect feelings. As it is extraordinarily developed, it is believed that, in the past, touch provided a decisive contribution to the survival of mankind. And it still performs a certain role in this respect. Blind people, for example, perceive daylight or cold at night through thermal sensations (6). Touch can have different meanings for nurses as well as for patients. When used as a care humanization object, it can become a source of support to minimize patients’ suffering and create affective bonding, with a view to delivering a better form of care (14). A firm and secure touch is worth more than words (15). Nurses need to be aware of the importance of this resource in care humanization for clients and should use it effectively, in order to avoid turning it into a mechanical act, a source of distancing between nurses and patients and a barrier in the communication process. Social Behavior includes emblematic, illustrating and regulatory gestures. Emblematic gestures are cultural, learned and can directly express what is verbally pronounced. These gestures are supported by different body parts, mainly the upper limbs and the head. The characteristics of this gestuality are present in a wide range of cultures (9). In this research, the most observed gesture was moving one’s hands (67.4%). People move their hands when they face difficulties to express themselves or when their efforts to make themselves understood are enormous (16). Nurses gesticulated to try and make the blind patient understand what was being expressed. As blind patients do not have visual capacity, these professionals need to pay attention to explore other communication forms. Illustrating gestures are learned through imitation. They accompany discourse by emphasizing a pronounced word or sentence (9). This type of gestures refers to the signs sent by the hands and arms. There may be more than 700,000 different signs (16). The nurses’ illustrating gestures either complemented (50%) or did not complement (45.1%) verbal communication. Regulatory gestures regulate and maintain communication among people and guide the sender so as to continue, repeat, elaborate and give opportunity for other persons to speak (16). No contact/ not observed was identified in 51.4%, eye movements in 24.1% and head nods in 15.6%, while this aspect was absent or other categories were observed in 8.9%. Nodding one’s head reinforces the other person’s discourse and moving one’s eyes towards that person reinforces discourse, while deviating them inhibits. These gestures are at the periphery of our awareness and, therefore, they are difficult to inhibit, ad body movements are involuntary. The rest of the body and its position towards other persons reveal what is unconscious in the individual (10). The face is the most exposed part of the human body, where emotions are more explicit and more clearly 42 Nonverbal Communication: Aspects Observed During the Nursing Consultations Rebouças CBA et al demonstrated. The study of human facial expressions is difficult, because movements are often extremely subtle and ephemeral and because they are innate or hereditary, although they can partially be modified by learning or imitation (17). Some expressions are easily recognizable, but each person can judge them differently, depending on his/her imaginative capacity and way of acting. Expressions are better analyzed when they are not influenced by imagination. Moreover, facial muscles are quite confounding. Their physical structure is very variable, making it difficult to find equal muscles in half a dozen individuals (17). The study of blind and deaf children’s facial expressions made it possible to observe smile, laugh, anger and some other fundamental expressions, which demonstrated that these behaviors are innate. Moreover, from a cultural point of view, the main mimic expressions exhibited by people from different countries display important similarities (18). The nurses’ facial expressions during the consultations were either not observed (44.1%), or showed attention (13.7%) and joy (8.6%), or were absent/other (33.6%). Facial expressions are interrelated with the context in which the interaction occurs. The face is also considered as the best “liar” in non-verbal communication, as it is the body area people are most aware of and where control attempts are more constant (9). Face movements grant vivacity and energy to the words, revealing thoughts and intentions better than words themselves (17). Hence, nurses mainly need to observe the patients’ face (4). Blind patients are not capable of visually perceiving what nurses express through their faceo mais explis exposta do ser humano e onde as emoçcesso comunicativo./ APOSTILA_COMN_mpreender o mundo d. Nurses, however, can assess the efficacy of their communication with patients by observing their facial expressions. However, the blind’s facial expression can be poor in communicative terms, as they do not perceive the other person’s expressions, causing difficulties to communicate these expressions (19). But it is through this understanding that patients’ real needs are assessed and an individualized action plan can be programmed, considering the person as a whole (20). Hence, further knowledge about non-verbal communication is needed with a view to an effective interpersonal relationship. Looks also deserve emphasis in the human face, due to the wide range of signs they can issue (21). The Visual Code category is analyzed by ocular opening and eye direction. In this study, only nurses were observed in this sense, as blind people do not react to this stimulus. Thus, either contact was not observed or did not occur (77.2%), or the films showed joy (4.7%), attention (4.5%), and absent/other (13.9%). Looks can pass countless messages, including interest, disinterest, encouragement, attention and joy, and can even define domain. Another important function of looks is to establish and regulate the conversation flow (22). The eyes often reveal what is hidden in the soul and can arouse emotive feelings like love, sympathy, enthusiasm and tiredness (23). The eye direction subcategory registered: deviated from the interlocutor (52.8%), centered on the interlocutor (44.4%) and absent (2.8%). It is known that maintaining visual contact means avoiding to deviate one’s look frequently, which does not mean looking fixedly, as good contact suggests interest in listening to the other person. Deviating one’s eyes frequently suggests reluctance or discomfort about being with the person. When looks are a bit more intense, this suggests that the person is self-assured, sincere and interactive, which favors the deepening of the interpersonal relation (11). Nurses cannot expect the blind to react to a look, as there exists an obstacle that impedes this visual contact, although this does not mean a lack of interaction and harmony during care (19). The fifth category contemplated in the analysis of nurses’ non-verbal communication with blind patients was Voice Loudness, resulting in: normal tone (66%), silence (32.3%) and absent/other (1.7%). Tone of voice and gestures reinforce discourse; they are one of the most elaborate forms of human interaction (12). The act of listening to other persons is a nonverbal communication attitude inser ted in interpersonal relations, which is essential to achieve further understanding among the people involved in the process (24), as human beings are much more talkative than capable of listening (13). Effective listening occurs when the receiver is capable of discerning and understanding the meaning of the message issued by the other (25). The act of teaching and guiding requires people who learn and know how to listen (26). Active listening is a technique that must be learned and practiced, mainly by professionals dealing with the public, such as nurses in this study (25,26). Nurses need to actively and critically listen to patients with a view to positive communication. Listening requires maintaining silence, demonstrating interest and, mainly, learning how to control feelings, emotions and prejudices (9). CONCLUSION Nurses need to get to know and deepen studies about nonverbal communication theories and adapt its use to the type of clients they attend during consultations. These professionals should assess their behavior, gestures and attitudes, in short, their non-verbal communication, with a view to making effective interventions involving blind patients. Moreover, nurses should obtain deeper knowledge about blind people’s behavior in order to decode the non-verbal signs they send, as these can be expressed differently from seeing persons. Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 38 - 43. Nonverbal Communication: Aspects Observed During the Nursing Consultations Rebouças CBA et al References 1. Mendes IAC. Enfoque humanístico à comunicação em enfermagem. São Paulo (SP): Sarvier; 1994. 2. Stefanelli MC. Comunicação com o paciente: teoria e ensino. São Paulo (SP): Robe; 1993. 3. Littlejohn SW. Fundamentos teóricos da comunicação humana. Rio de Janeiro (RJ): Guanabara; 1998. 4. Silva LMG, Brasil VV, Guimarães HCQCP, Savonitti BHRA, Silva MJP. Comunicação não-verbal: reflexões acerca da linguagem corporal. Rev Latino- Am Enferm 2000; 8 (4): 52-8. 5. Rebouças CBA. Características da comunicação não-verbal entre o enfermeiro e o cego [dissertação de mestrado]. 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Recebido em 23/03/2006 Reapresentado em 06/11/2006 Aprovado em 20/12/2006 Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 38 - 43. 44 Avaliação de Enfermagem Acerca de Pacientes com Doença Renal Crônica: Competência para o Autocuidado Pacheco GS et al CLIENTES COM DOENÇA RENAL CRÔNICA: AVALIAÇÃO DE ENFERMAGEM SOBRE A COMPETÊNCIA PARA O AUTOCUIDADO Clients with Chronic Renal Disease: Nursing Evaluation about the Competence for the Selfcare Clientes con Enfermedad Renal Crónica: Evaluación de Enfermería Sobre la Competencia para el Auto-cuidado Gilvanice de Sousa Pacheco Iraci dos Santos Rachel Bregman Resumo O ingresso em terapias dialíticas em condições inadequadas demanda desconforto e sofrimento aos clientes com doença renal crônica (DRC), além de custos ao sistema de saúde e do trabalho de enfermagem. Visando incentivar o cliente para a adesão ao tratamento conservador dessa patologia, tem-se como objetivo: avaliar a competência e o déficit para o autocuidado do cliente com DRC. Implementou-se o método epidemiológico mediante entrevista com 51 clientes do ambulatório de uremia do HUPE/UERJ), em 2005. Evidenciou-se o déficit do conhecimento sobre as conseqüências da hipertensão arterial e diabetes associados à DRC e os limites na escolha e adesão das terapêuticas médica, nutricional e de enfermagem. Concluiu-se que dúvidas sobre essa doença permeiam a vida dos clientes e podem interferir na adesão ao tratamento e comprometer sua qualidade de vida. Esse achado reforça a importância do ensino do autocuidado para demonstrar seu potencial para enfrentar a DRC. Pala vr as-c ha alavr vras-c as-cha havve: Enfermagem. Insuficiência Renal Crônica. Autocuidado. Abstract Resumen The admission in dialysis therapies in inappropriate conditions demand discomfort and suffering to the clients with chronicle renal disease (CRD), besides the cost to the health system and of the nursing work. Aim to encourage the client for the adhesion to the treatment that preserves this pathology, it has as objective: to evaluate the competency and the deficit to the self care of the client with CRD. It was implanted the epidemiologic method trough interviews with 51 clients of the clinics of uremia of the HUPE/UERJ, in 2005. It became evident the deficit of the knowledge about the consequences of the arterial hypertension and diabetes linked to the CRD and the limits in the choice and adhesion of the medical therapies, nutritional and of nursing. It was conclude that the doubts about this disease, permeates the life of the clients and may interfere in the adhesion to the treatment and to compromise the client’s quality of life. This found it is a reinforcement to the importance of the self care learning to demonstrate its potential to face the CRD. El ingreso en terapias dialíticas en condiciones inadecuadas demanda incomodidad y sufrimiento a los clientes con enfermedad renal crónica (ERC), allende costas al sistema de salud y del trabajo de enfermería. Teniendo en vista incentivar el cliente para la adhesión al tratamiento conservador de esta patología, se objetiva: evaluar la competencia y el déficit para el auto cuidado del cliente con ERC. Implementóse el método epidemiológico por entrevista con 51 clientes del ambulatorio de uremia del HUPE/UERJ, en 2005. Evidencióse el déficit del conocimiento sobre las consecuencias de la hipertensión ar terial y diabetes asociados a la ERC y los limites en la elección y adhesión de las terapéuticas médica, nutricional y de enfermería. Concluyese que dudas sobre esa enfermedad atravesan la vida de los clientes y poden interferir en la adhesión al tratamiento y comprometer su cualidad de vida. Ese hallado refuerza la importancia de la enseñanza del auto cuidado para demostrar su potencial para enfrentar la ERC. Keywords: Nursing. Chronicle Renal Insufficiency. Self Care. Palabras clave: Enfermería. Insuficiencia Renal Crónica. Auto Cuidado. Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 44 - 51. Avaliação de Enfermagem Acerca de Pacientes com Doença Renal Crônica: Competência para o Autocuidado Pacheco GS et al INTRODUÇÃO O cliente iniciante em um programa de diálise é submetido a muitas mudanças em seu cotidiano, tais como cuidados com a dieta, controle da ingestão de líquidos, cuidados com a fístula arteriovenosa, além da necessidade de seguir um programa terapêutico delimitado por uma escala para cujos dias aprazados é imprescindível seu comparecimento e adesão. Todas essas mudanças geram estresse e desencadeiam sentimentos de revolta e conflito nessas pessoas, os quais interferem na adesão à sua terapia. Entende-se, então, a importância de se oferecer e desenvolver um programa de orientação e educação para que o cliente tenha consciência de sua doença renal, do autocuidado e escolha da terapia de substituição renal quando ainda se encontra na fase inicial da doença, acompanhado pelo tratamento conservador. OBJETO DE ESTUDO E OBJETIVOS Com a implementação do programa de orientação e educação para o autocuidado, pretende-se diminuir a ansiedade do cliente a respeito do seu tratamento e estimular seu interesse para o autocuidado e, conseqüentemente, a maior adesão ao tratamento, com a intenção de torná-lo membro ativo do processo saúdedoença e responsável por sua qualidade de vida. Nesse contexto, sobreleva-se a concepção de promoção da saúde explicitada na Carta de Ottawa, adotada durante a primeira Conferência Internacional sobre Promoção de Saúde1. Esse documento define promoção de saúde como o processo de oferecer à população capacidade de implementar o controle sobre sua saúde e de melhorá-la, e ressalta que a promoção da saúde ajuda no desenvolvimento individual e social oferecendo informações, assegurando a educação para a saúde e aperfeiçoando atitudes indispensáveis à vida, e, dessa forma, permitindo às pessoas aprenderem e terem controle sobre sua situação. O intuito, portanto, é propiciar as vantagens referidas, inclusive lembrando da afirmação de que 2:311: o cuidado prestado ao cliente em insuficiência renal irreversível na fase de tratamento conservador, estágio da doença que antecede a falência total do rim, é pouco discutido se comparado com o tratamento dialítico ou transplante renal. Do mesmo modo, ressalte-se o compromisso social do enfermeiro para com a sociedade que se concretiza na sua prática social interligada à técnico-científica, administrativa e de pesquisa, junto aos clientes em regime de internação ou não. Aqui destaca-se esta prática lembrando-se que 3:123: o enfermeiro que educa para o autocuidado desenvolve um papel diretamente político ao facilitar a autonomia de grupos sociais (...). Neste trabalho, reforça-se que a atuação do enfermeiro como educador do cliente com doença renal crônica é indispensável, pois o mesmo é responsável pelas orientações sobre o autocuidado, tornando-o membro ativo no processo saúde-doença. Nesse processo educativo é essencial que o indivíduo seja respeitado em sua totalidade, ou seja, holisticamente dentro do complexo biopsicossocial. Para desenvolver essa prática educativa, o enfermeiro necessita ter, além da fundamentação científica e da Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 44 - 51. 45 competência técnica, conhecimentos dos aspectos que levam em consideração os sentimentos, as necessidades e desejos dos clientes sob sua orientação4. Assim, o papel do enfermeiro é de grande colaboração na tentativa de ajudá-los a adaptarse a um novo estilo de vida. O desempenho deste papel ressalta a responsabilidade do enfermeiro, como membro de uma equipe multidisciplinar, ao identificar os problemas de saúde do cliente com doença renal e tentando resolvê-los, junto com ele, mediante uma assistência de enfermagem que proporcione a esta pessoa uma melhor qualidade de vida2. Ainda sobre a prática social e educativa, concorda-se com a seguinte concepção5:86: será a partir da situação presente, existencial, concreta, refletindo o conjunto de aspirações do povo, que poderemos organizar o conteúdo programático da educação ou da ação política. A partir dela determinou-se como objeto de estudo: a avaliação de enfermagem sobre a competência para o autocuidado. Neste trabalho, destaca-se como objetivo: avaliar a competência e o déficit para o autocuidado do cliente com DRC. MÉTODO Escolheu-se o método descritivo, para identificar as expectativas dos sujeitos sobre o tratamento e competência para se autocuidar. O referido método consistiu na quantificação de dados através da estatística descritiva, visando o estudo de fatos que se relacionam à compreensão de fatores determinantes para evolução do processo saúde/doença 6. Após aprovação do Comitê de Ética do Hospital Universitário Pedro Ernesto da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (HUPE/UERJ), iniciou-se a pesquisa mediante a técnica de observação indireta através da entrevista orientada por formulário, estruturando-se o instrumento de coleta de dados com questões objetivas. Foram entrevistados, em 2005, 51 clientes com DRC em tratamento conservador, acompanhados pela equipe multiprofissional, no ambulatório de uremia da disciplina de nefrologia desta instituição. Em cumprimento às normas éticas de pesquisa em seres humanos, essas pessoas foram convidadas e concordaram em par ticipar da investigação, após ciência dos riscos e benefícios da mesma. Ressalte-se que as entrevistas ocorreram no ambulatório de uremia durante o horário de atendimento, ou seja, na pré ou pós-consulta de saúde. Foram selecionadas como variáveis do estudo: conhecimento sobre DRC quanto a: funções dos rins, complicações da hipertensão arterial sistêmica e diabetes melito, hábitos de vida para manter PA e controlar a glicemia, modalidade e periodicidade de exercício físico praticado, ocorrência da anemia e doença óssea associadas à DRC. Os dados obtidos na entrevista através do formulário foram tabulados pelo programa Microsoft Excel ® , tratados estatisticamente por freqüência absoluta e percentual, representados em tabelas e descritos em linguagem numérica. 46 Avaliação de Enfermagem Acerca de Pacientes com Doença Renal Crônica: Competência para o Autocuidado Pacheco GS et al RESULTADOS Conhecimento dos sujeitos sobre HAS e Diabetes Constatou-se sobre o conhecimento dos clientes que: 41 (80,39%) clientes responderam que a hiper tensão compromete o coração, 41 (80,39%) clientes responderam que compromete os rins, 48 (94,12%) clientes responderam que pode causar derrame, nenhum cliente marcou a opção D (não acontece nada), e, para a opção “outros”, obtivemos as seguintes respostas: 1 (1,96%) perda da visão e 1 (1,96%) falta de ar. Entende-se que, a partir desses resultados, a maioria dos clientes tem noção das complicações ocasionadas pelo não-controle da HAS, sendo a complicação mais conhecida o AVC, comumente designado como “derrame”; entretanto, percebe-se que 10 clientes desconhecem a doença renal como conseqüência da hipertensão (Tabela 1). Tabela 1 Complicações da hipertensão arterial sistêmica, segundo informações dos clientes. Ambulatório de uremia. HUPE/UERJ. Rio de Janeiro, 2005. Complicações Cardiopatia Doença renal AVC SIM TOTAL NÃO N % N % N % 41 41 48 80,39 80,39 94,12 10 10 3 19,61 19,61 5,88 51 51 51 100 100 100 A hipertensão arterial provoca uma agressão mecânica ao sistema cardiovascular e renal que refletem o alto risco que apresentam os clientes a desenvolver vasculopatias graves, tais como as coronariopatias (como exemplo, angina e infarto do miocárdio) e os acidentes vasculares cerebrais. A hipertrofia cardíaca, conseqüência da maior quantidade de trabalho mecânico realizado pelo coração quando a pressão arterial está elevada, pode ocasionar a insuficiência cardíaca. Outra complicação é a doença renal crônica devida à exposição do tecido renal durante muitos anos a altas pressões de perfusão, acarretando fibrose crônica do parênquima renal e a perda irreversível da função desse órgão 7, 8. Nesta pesquisa, os principais sintomas citados pelos clientes quando estão com a pressão arterial alta são tontura, 12 (23,53%), e cefaléia, 11 (21,57%). Além destes sintomas apresentados na tabela, identificaram-se outros sintomas relatados de forma subjetiva por 11 clientes, os quais são: dor na nuca, visão turva, sensação de levitação, formigamento nas mãos, enjôo, sangramento pelo nariz, “agonia na cabeça”, “sangue fervendo no corpo” e “coração batendo no ouvido”. Portanto, deve-se ouvir com muita atenção a queixa do cliente quanto a esses sintomas, haja vista que pode indicar que o cliente não está seguindo a dieta ou tomando os medicamentos, ou mesmo a necessidade de adequação da dose da medicação, ou ainda que o cliente pode estar sofrendo problemas psicossociais (dificuldades financeiras, problemas familiares, negação da doença), os quais estão influenciando no controle da pressão arterial. É importante ressaltar que na maioria dos indivíduos a hipertensão arterial é absolutamente assintomática. Por isso, esses clientes devem ser orientados também quanto à importância da monitorizarão da pressão arterial, que pode ser feita não só durante a consulta médica, mas também em domicílio, em postos de saúde ou farmácia, desde que realizada por profissionais ou pessoas treinadas 8. Considera-se que dessa forma se pode evitar complicações como AVC, infar to, insuficiência cardíaca e comprometimento da visão e progressão da doença renal. Em relação à pergunta sobre quais medidas de pressão arterial são consideradas normais, a maioria dos clientes marcou as opções A e/ou C, embora existisse uma opção que engloba medidas apresentadas por estas opções, ou seja, a letra D (< que 140 x 90 mmHg). Considera-se que a maioria está informada sobre a pressão ideal. De acordo com as versões das Diretrizes Brasileiras de Hipertensão Arterial 9, conceitua-se hipertensão arterial os valores de pressão sistólica igual ou superior a 140 mmHg ou de pressão diastólica igual ou superior a 90 mmHg. Conforme relatado previamente, o controle adequado da pressão arterial retarda a progressão da DRC. Nos clientes com doença renal crônica, a pressão arterial deve se manter <125/75 mmHg, se apresentarem proteinúria > 1g/24horas, e naqueles com proteinúria <1g/24horas, a pressão arterial deve se manter < 130/80 mmHg 10. De acordo com os resultados apresentados na Tabela 2 referente à pergunta sobre o que fazer para manter a pressão ar terial dentro do limite normal, 3 (5,88%) clientes responderam somente exercício físico, 49 (96,08%) clientes marcaram não comer sal, 43 (84,31%) assinalaram não comer gordura, e 2 (3,92%) acharam correta a opção tomar remédio apenas quando a pressão estiver alta. A hipertensão arterial é o fator de risco mais importante para a perda progressiva da função renal, antecipando o início do tratamento dialítico; por sua vez, o controle da hipertensão Tabela 2 Hábitos de vida indicados para manter PA normal, conforme respostas dos clientes. Ambulatório de uremia. HUPE/UERJ. Rio de Janeiro, 2005. Hábitos de Vida SIM NÃO TOTAL N % N % N % Só exercício físico 3 5,88 48 94,12 51 100 Não comer sal 49 96,08 2 3,92 51 100 Não comer gordura 43 84,31 8 15,69 51 100 Remédio só qdo a pressão estiver alta 2 3,92 49 96,08 51 100 Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 44 - 51. Avaliação de Enfermagem Acerca de Pacientes com Doença Renal Crônica: Competência para o Autocuidado Pacheco GS et al é a intervenção clínica mais importante para retardar a progressão para insuficiência renal crônica terminal 11. O tratamento da hipertensão arterial sistêmica tem como principal objetivo melhorar a qualidade de vida dos clientes e diminuir o risco de complicações e pode ser dividido em tratamento não-medicamentoso e medicamentoso. O primeiro baseia-se em modificações do estilo de vida e consiste em: redução da ingestão de sal, prática de exercícios físicos regulares, controle do estresse, abandono do tabagismo e eliminação ou redução do consumo de álcool 8,12. Considera-se relevante informar aos clientes, sobre os benefícios do uso contínuo dos medicamentos, que, além da nefroproteção proporcionada pelo uso do inibidor da enzima conversora de angiotensina (IECA), controlam a hipertensão e previnem complicações como pico hipertensivo, AVC, infarto e outras, em decorrência de alguns acreditarem que só devem usar o medicamento quando a pressão arterial está elevada, fato comprovado por este estudo em que 3,92% dos clientes têm essa prática (Tabela 2). Esses clientes correm o risco de sofrer hipertensão por rebote ocasionada pela interrupção da terapia medicamentosa, além de favorecer a aceleração da DRC. Para o sucesso do tratamento e manutenção do bemestar é necessário o entendimento dos clientes sobre a importância da combinação de hábitos saudáveis e uso contínuo dos medicamentos. Quanto à cura da hipertensão arterial, 18 (35,29%) clientes responderam que acreditam e 33 (64,71%) clientes não acreditam. Conhecimento dos sujeitos sobre hábitos de saúde e bem-estar A resposta dos 51 clientes entrevistados foi unânime ao considerarem a prática de exercício físico importante para a sua saúde; no entanto, apenas 20 (39,22%) clientes praticam exercício físico: 14 (27,45%) clientes fazem caminhada, 3 (5,88%) exercitam-se na bicicleta e 2 (3,92%) realizam caminhada e bicicleta, e 1 (1,96%) cliente pratica dança (Tabela 3). A periodicidade varia de 2 a 6 vezes por semana, e 9 clientes relataram a prática diária (Tabela 3). A prática de exercício físico regular corresponde a uma das modificações do estilo de vida essencial para o controle da hipertensão arterial, do diabetes e das dislipidemias, além de prevenir complicações e melhorar a auto-imagem e a auto-estima. O exercício físico aeróbico ou isotônico regular é capaz de reduzir a pressão arterial, favorecer a perda de peso e/ou reduzir os fatores de risco cardiovascular. Tais exercícios (andar, correr, nadar, andar de bicicleta, futebol, dança e outros) devem ser realizados pelo menos três vezes por semana por um período mínimo de 40 minutos. Clientes com suspeita de doença coronária ou com idade superior a 50 anos devem ser, preliminarmente, submetidos a teste ergométrico. Caso contrário, devem apenas andar 8,13. No caso específico de clientes com DRC, a presença de proteinúria pode ser um fator limitante para a realização de determinados exercícios; portanto, esses clientes devem ser avaliados individualmente quanto ao tipo de exercício que podem realizar. Conhecimento dos sujeitos sobre complicações em DRC Nos dados sobre a questão subjetiva a respeito das possíveis complicações ocasionadas pela dislipidemia, observou-se que a principal complicação citada por 16 clientes foi o aumento do colesterol, 7 clientes falaram infarto, 4 clientes referiram-se à deficiência ou perda da função renal e 16 clientes não souberam responder. Clientes com DRC apresentam um perfil lipídico tipicamente trombogênico, com elevações dos níveis de triglicérides e reduções do HDL-colesterol, e devem ser considerados como de alto risco para doença cardiovascular, ou seja, apresentam risco equivalente ao dos indivíduos com insuficiência coronariana conhecida. As alterações do metabolismo lipídico na DRC podem ser observadas em fases iniciais do declínio da função renal (TFG < 60 ml/min)14. Indivíduos com hipertrigliceridemia devem ser tratados com modificações do estilo de vida (dieta, abstinência alcoólica, tratamento de hiperglicemia, atividade física), e, caso não haja redução dos níveis até abaixo de 150mg/dl, a utilização de drogas hipolipemiantes se faz necessária, já o LDL-colesterol deve ser de 100mg/dl ou menos 14. Tabela 3 Distribuição da modalidade e periodicidade de exercícios, realizados pelos clientes. Ambulatório de uremia. HUPE/UERJ. Rio de Janeiro, 2005. Bicicleta e Caminhada Modalidade Caminhada Bicicleta Periodicidade N % N % N % N % N % 3 vezes / sem 2 vezes / sem 4 vezes / sem 6 vezes / sem Diariamente Não praticam 4 3 1 1 5 - 28,57 21,42 7,14 7,14 35,71 - 1 2 - 33,33 66,67 - 2 - 100 - 1 - 100 - 31 100 Total 14 100 3 100 2 100 1 100 31 100 Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 44 - 51. 47 Dança Não Praticam 48 Avaliação de Enfermagem Acerca de Pacientes com Doença Renal Crônica: Competência para o Autocuidado Pacheco GS et al De acordo com a análise dos resultados, sobre o tipo de doença ocasionada devido ao não-controle do nível glicêmico, percebeu-se que 41 (80,39%) clientes citaram o diabetes melito. No entanto, 10 (19,61%) clientes não sabiam sobre a patologia ocasionada pelo não-controle glicêmico. O DM é uma síndrome decorrente da falta de insulina e/ou da incapacidade da insulina de exercer adequadamente seus efeitos. Caracteriza-se por hiperglicemia crônica com distúrbios do metabolismo dos carboidratos, lipídios e proteínas 15. Em relação ao nível de glicemia ideal em jejum, 16 (31,37%) clientes assinalaram a opção correta (opção B), 25 (49,02%) clientes não responderam e os demais assinalaram opções incorretas. Nota-se que predominou a clientela desinformada sobre o nível ideal da glicemia capilar ou plasmática em jejum, considerada uma das medidas primordiais para o controle do DM. Recorda-se que nessa pesquisa foram incluídos clientes com e sem diabetes melito. A medida da glicose plasmática em jejum, pela sua praticidade, é o procedimento básico empregado para fazer o diagnóstico de DM. Níveis de glicemia maior que 110 mg/dl e menor que 126 mg/dl são categorizados como glicemia de jejum alterada, e valor maior ou igual a 126 mg/dl é diagnóstico para diabetes melito15. Em clientes com nefropatia diabética, são desejáveis valores de glicemia de jejum entre 80 mg/dl e 120 mg/dl 10. O controle rigoroso da glicemia é fundamental, haja vista que o controle glicêmico em clientes com nefropatia clínica, associado a um controle dos níveis pressóricos, pode reduzir a perda de função renal. Conforme resultados da Tabela 4 referentes aos cuidados que o cliente deve tomar para o controle do diabetes melito, predominou o número de acertos referentes às opções de 1 a 4. Ressalte-se a maioria de 47 (92,16) clientes que responderam afirmativamente à opção 2, enquanto todos 51 (100%) responderam que não se deve comer doces. Tabela 4 Hábitos de vida indicados para o controle glicêmico, conforme respostas dos clientes. Ambulatório de uremia. HUPE/UERJ. Rio de Janeiro, 2005. Hábitos de Vida SIM NÃO TOTAL N % N % N % Verificar glicemia capilar diariamente 40 78,43 11 21,57 51 100 Usar medicamentos prescritos 47 92,16 4 7,84 51 100 Seguir dieta prescrita 46 90,2 5 9,8 51 100 Fazer exercícios regulamente 42 82,35 9 17,65 51 100 - - 51 100 51 100 Comer doces todos os dias Entretanto, considerando o somatório de 29 (56,14%) sujeitos que responderam incorretamente, o fato é significativo para nos certificar de que todos precisam ser orientados sobre a importância da combinação de todos os cuidados para que o controle do diabetes melito seja eficiente. O tratamento para o controle do DM inclui as seguintes estratégias: educação, modificações do estilo de vida que compreendem a suspensão do fumo, abandono da bebida alcoólica, realização de atividade física e reorganização dos hábitos alimentares, e uso de medicamentos conforme orientação médica. Quanto à cura do DM, 15 (29,41%) clientes responderam que acreditam, e 34 (66,67%) clientes não acreditam. As conseqüências do DM a longo prazo incluem danos, disfunção e falência de vários órgãos, especialmente rins (nefropatia), olhos (retinopatia), nervos (neuropatia), coração e vasos sangüíneos (micro e macroangiopatia). Essas complicações podem surgir precocemente caso não haja o controle da doença. A complicação mais conhecida e citada por 18 clientes é o comprometimento ou perda da visão; em segundo lugar, 11 clientes citaram a amputação de membros e/ou morte. Identificou-se que 38 (74,51%) clientes assinalaram associação da anemia e doença renal crônica e 38 (74,51%) clientes consideraram a ocorrência da doença óssea na vigência da doença renal crônica. Dois (3,92%) clientes afirmaram que não ocorre anemia na DRC e 11 (21,57%) clientes não sabiam responder. Quanto à doença óssea, 3 (5,88%) clientes falaram que não ocorre a doença óssea na DRC e 10 (19,61%) clientes não sabiam a resposta (Tabela 5). Tabela 5 Ocorrência de anemia e/ou doença óssea em pessoas com DRC, de acordo com as respostas dos clientes. Ambulatório de uremia. HUPE/UERJ. Rio de Janeiro, 2005. Ocorrência de anemia e doença óssea Anemia Doença óssea Sim Não Não sabe N 38 2 11 % 74,51 3,92 21,57 N 38 3 10 % 74,51 5,88 19,61 Total 51 100 51 100 A anemia e a doença óssea são algumas das principais complicações surgidas no curso da DRC, particularmente quando a FG diminui a valores < 60ml/min/1,73m2 16. Portanto, considera-se importante a orientação dos clientes quanto a essas complicações para que se sintam motivados para o autocuidado, haja vista que alguns deixam de seguir as orientações por desconhecerem as complicações da doença e os benefícios de seguir as orientações para o controle dela. A anemia ocorre em todos os clientes com DRC, inicialmente devido à deficiência da absorção intestinal de ferro e posteriormente devido à deficiência de eritropoetina, haja vista que uma das funções do rim é endócrina, em que o mesmo é responsável pela produção da eritropoetina. Em clientes com Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 44 - 51. 49 Avaliação de Enfermagem Acerca de Pacientes com Doença Renal Crônica: Competência para o Autocuidado Pacheco GS et al DRC acompanhados pelo tratamento conservador, pode ocorrer a resistência à ação da eritropoetina, ou seja, os níveis séricos de eritropoetina são normais, porém a medula óssea não responde adequadamente a ela 17. A anemia estigmatiza o cliente, conferindo-lhe um aspecto de doente, além de provocar também incapacidade física e mental, prejudicando de maneira importante sua recuperação social, sendo responsável pela redução da qualidade de vida 18. Desse modo, o principal objetivo do tratamento da anemia na doença renal consiste na promoção do restabelecimento social do cliente, evitando complicações e proporcionando-lhe melhor qualidade de vida. Os rins também têm importante papel na manutenção das quantidades adequadas de fósforo e cálcio no organismo, pois esses minerais juntos ajudam a manter os ossos saudáveis. No cliente com DRC, como os rins não funcionam adequadamente, o equilíbrio entre esses dois minerais está prejudicado. Assim, a eliminação de fósforo pela urina diminui, acumulando-se no sangue. Altos níveis de fósforo no sangue facilitam a retirada de cálcio dos ossos. Essa situação de desequilíbrio dos dois minerais pode levar à doença óssea, que provoca dores, enfraquecimento e quebra dos ossos se não tratada adequada e precocemente. Dessa forma, o controle dos níveis de fósforo e cálcio é o primeiro passo para prevenir e tratar essas condições. Geralmente, a primeira estratégia de controle dos níveis de fósforo e cálcio é a dieta planejada pelo nutricionista. No entanto, quando, apesar da restrição dietética, não houver o controle desses minerais, torna-se necessária a prescrição médica de quelantes de fósforo, medicamentos ingeridos junto com a alimentação para evitar a absorção intestinal do fósforo e conseqüente equilíbrio do cálcio, haja vista que o aumento dos níveis séricos do fósforo ocasionam uma queda dos níveis séricos de cálcio2. Referente ao comprometimento dos rins pela hipertensão arterial sistêmica, 49 (96,08%) clientes referiram que ocorre e apenas 2 (3,92%) clientes não souberam responder. Quanto ao acometimento renal pelo diabetes, 40 (78,43%) clientes afirmaram que pode ocorrer o comprometimento, 4 (7,84%) clientes falaram que não ocorre e 7 (13,73%) clientes não souberam responder . Aproximadamente 25% dos pacientes que são submetidos à diálise crônica e que necessitam de transplante renal têm como única causa da insuficiência renal a hipertensão arterial. Esses dados adquirem ainda maior importância quando a hipertensão está associada ao diabetes melito19. A hipertensão arterial compromete principalmente as estruturas vasculares renais (artérias, arteríolas e capilares glomerulares). Entretanto, são nas arteríolas e glomérulos que ocorrem as conseqüências mais sérias da hipertensão arterial sobre os rins. A parede das arteríolas renais sofre espessamento das camadas muscular e elástica, reduzindo o fluxo efetivo para o glomérulo e túbulo interstício. O diabetes melito constitui-se hoje na primeira causa de DRC em diversos países e na segunda causa no Brasil. A nefropatia diabética acomete de 30 a 40% dos indivíduos com DM tipo 1 e 10 a 40% daqueles com o tipo Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 44 - 51. 2, sendo os glomérulos as principais estruturas renais acometidas pelo diabetes melito20. A par tir dessas referências, torna-se evidente o comprometimento renal pela hipertensão e pelo diabetes, sendo estes considerados as principais causas da doença renal crônica. Ressalta-se a importância da prevenção secundária por meio do controle dos níveis pressóricos e glicêmicos, e dessa forma considera-se a educação desses clientes para o autocuidado a ferramenta ideal para incentivá-los à adesão ao tratamento. Tudo isso tem a finalidade de minimizar as conseqüências da doença já instalada e adiar o ingresso desses clientes em uma das terapias de substituição renal, além de prepará-los para que ingressem em condições clínicas adequadas. Conhecimento dos sujeitos sobre função renal e ocorrência da DRC Quanto às funções dos rins, a Tabela 6 expõe que 26 (50,98%) clientes escolheram a opção A, considerada correta (filtração, regulação de substâncias necessárias ao organismo e produção de hormônios). Os demais assinalaram as opções incorretas; entre eles, 14 (27,45%) clientes optaram pela letra B, a qual dizia que a função dos rins é somente filtração do sangue, e 4 (7,84%) clientes assinalaram a opção C (somente eliminação de substâncias nocivas ao organismo). Tabela 6 Conhecimento dos clientes acerca das funções dos rins. Ambulatório de uremia. HUPE/UERJ. Rio de Janeiro, 2005. N % 26 50,98 14 27,45 4 7,84 Não sabe 7 13,73 Total 51 100 Funções dos rins A) Filtração, regulação de substâncias necessárias ao organismo e produção de hormônios. B) Somente filtração do sangue C) Somente eliminação de substâncias nocivas ao organismo O rim possui duas funções: função endócrina e homeostática21 - Função endócrina: consiste na produção de hormônios como renina, 1,25 diidroxicalciferol e eritropoetina 21. - Função homeostática: manutenção de um volume hídrico adequado, a qual ocorre em função da excreção de água e solutos; regulação da concentração de íons como sódio, potássio, cloreto, bicarbonato, magnésio e fosfato; manutenção do pH, contando também com o auxílio do 50 Avaliação de Enfermagem Acerca de Pacientes com Doença Renal Crônica: Competência para o Autocuidado Pacheco GS et al pulmão; manutenção da concentração adequada de metabólitos, devida à capacidade de reabsorção presente nos túbulos renais; eliminação de produtos do metabolismo como uréia, ácido úrico e timina, além de drogas ou substâncias tóxicas presentes nos alimentos, em função da capacidade de excreção renal 21. Perguntou-se quando a doença renal ocorre, e 37 (72,55%) clientes optaram pela resposta correta, opção A; no entanto, os demais clientes demonstraram desconhecimento a respeito deste assunto. A doença renal crônica caracteriza-se pela incapacidade dos rins de remover os produtos de degradação metabólica do corpo ou de realizar as funções reguladoras. As substâncias normalmente eliminadas pela urina ficam retidas no sangue em conseqüência da excreção renal comprometida e levam a uma ruptura das funções endócrinas e metabólicas, bem como a distúrbios hidroeletrolíticos e acidobásicos 22. CONSIDERAÇÕES FINAIS Alcançando-se o objetivo referente à pré-avaliação, identificaram-se o déficit e o conhecimento dos clientes acerca da hipertensão arterial sistêmica e do diabetes melito (inclusive a crença na cura dessas patologias), conhecimento acerca das complicações da dislipidemia, modalidade de exercício físico praticada, atividade de lazer desenvolvida, hábitos de higiene corporal, conhecimento acerca das funções dos rins, da anemia e doença óssea associadas à DRC. Concluiu-se, através dos dados produzidos na pré-avaliação, que, para os clientes, as principais complicações da HAS são AVC, DRC e cardiopatia. Apesar de os clientes estarem cientes da não-ingestão de gordura e sal para o controle da pressão arterial, identificouse um déficit de autocuidado, haja vista que poucos clientes afirmaram só tomar remédio quando a pressão estava alta, Referências 1. Brienza AM, Mishimia SM, Frederico P, Clápis MJ. Grupo de reeducação alimentar: uma experiência holística em saúde na pespectiva familiar. Rev Bras Enferm 2002 nov /dez; 55(6): 697-700. 2. Lima EX.Atenção de enfermagem em nefrologia clínica e cirúrgica e o cuidar dialógico em transplante renal. In: Santos I, Figueiredo NMA, Padilha MICS, Cupello AJ, Souza SROS, Machado WCA. Enfermagem assistencial no ambiente hospitalar: realidade, questões, soluções. São Paulo (SP): Atheneu; 2004. p.311-40. 3. Gauthier J, Hirata M. A enfermeira como educadora. In: Santos I, Figueiredo NMA, Duarte MJRS, Sobral VRS, Marinho AM. Enfermagem fundamental: realidade, questões, soluções. São Paulo(SP): Atheneu; 2001. p.123-41. 4. Cesarino CB, Casagrande LDR. Paciente com insuficiência renal crônica em tratamento hemodialítico: atividade educativa do enfermeiro. Rev Latino-Am Enfermagem 1998; 6 (4): 31-40. 5. Freire P. Pedagogia do oprimido. 36. ed. Rio de Janeiro(RJ): Paz e Terra; 2003. enquanto a minoria considerou somente o exercício físico importante no controle da pressão arterial. Quanto aos hábitos de saúde e lazer, conclui-se que todos consideraram o exercício físico importante, embora poucos o praticassem, sendo a caminhada e a bicicleta, ou ambas, as modalidades mais praticadas. Evidenciou-se que um menor percentual de clientes considerou a verificação regular da glicemia capilar e o exercício físico importantes para o controle do DM. A maioria dos clientes demonstrou estar ciente do comprometimento renal pelo DM e pela HAS, bem como da ocorrência da anemia e doença óssea na DRC. Apenas a metade dos clientes respondeu corretamente sobre todas as funções dos rins, apesar da predominância daqueles que acertaram sobre a origem da DRC. Considera-se que é preciso que os clientes tenham consciência do seu potencial para se autocuidar, pois partese do princípio de que as pessoas não estão por completo doentes, dentro delas existe um núcleo saudável. Estes sujeitos devem ser incentivados para perderem a noção de passividade e tornarem-se protagonistas do seu próprio cuidado, este é um ato de cidadania. A educação à saúde é um direito de cidadania, muitas vezes não garantido pela instituição de saúde por questões financeiras, políticas e até por falta de conhecimento dos profissionais sobre sua importância para favorecer a adesão do cliente ao tratamento, garantindo-lhes qualidade de vida, além de reduzir os custos do sistema de saúde 23. Entre os resultados, observou-se o conhecimento dos clientes sobre seus próprios limites na escolha e adesão das terapêuticas médica, nutricional e de enfermagem, fato que leva à reflexão sobre o imperativo de se buscar entender o cotidiano do cliente e seus modos de viver a vida e sobreviver com a DRC. O ensino do autocuidado, portanto, deve valorizar os saberes, as vozes, a cultura e as forças de luta pela vida das pessoas, conduzindo-as à sua autonomia em questões de bem-estar e bem viver . 6. Pereira MG. Epidemiologia: teoria e prática. Rio de Janeiro(RJ): Guanabara Koogan; 1995. 7. Heimann JC, Krieger JE, Zatz R. Fisiopatologia da hipertensão arterial. In: Zatz R. Fisiopatologia renal. São Paulo(RJ): Atheneu; 2002. p. 173-88. 8. Almeida FA, Rodrigues CIS. Hipertensão arterial primária. In: Riella MC. Princípios de nefrologia e distúrbios hidroeletrolíticos. 4ª ed. Rio de Janeiro(RJ): Guanabara Koogan; 2003. p.730-56. 9. IV Diretrizes Brasileiras de Hipertensão Arterial. Sociedade Brasileira de Hipertensão. Sociedade Brasileira de Cardiologia. Sociedade Brasileira de Nefrologia. Campos do Jordão(SP); 2002. 10. Bregman R. Prevenção da progressão da doença renal crônica (DRC). In: Sociedade Brasileira de Nefrologia. Diretrizes de condução de doença renal crônica.[on-line] [citado 27 de julho de 2004.Disponível em: http://www.sbn.org.br. 11. Pereira ERS, Pascoal IF, Mion Junior D. Hipertensão arterial e doença renal parenquimatosa. In: Riella MC. Princípios de nefrologia e distúrbios hidroeletrolíticos. 4ª ed. Rio de Janeiro(RJ): Guanabara Koogan; 2003. p. 769-86. Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 44 - 51. Avaliação de Enfermagem Acerca de Pacientes com Doença Renal Crônica: Competência para o Autocuidado Pacheco GS et al 12. Tavares A, Ribeiro AB, Rodrigues CJO. Hipertensão arterial: diagnóstico e tratamento. In: Ajzen H, Schor N. Guia de medicina ambulatorial e hospitalar de nefrologia. 2ª ed. São Paul(SP): Manole; 2005. p. 171-82. 13. Berlin J.A, Colditz GA. A meta-analysis of physical activity in the prevention of coronary heart disease. Am J Epidemiol 1990; 132: 612-28. 14. Batista M, Oliveira CJR. Alterações metabólicas. In: Sociedade Brasileira de Nefrologia. Diretrizes de condução de doença renal crônica. [on-line] [citado 27 julho 2004].Disponível em: http://www.sbn.org.br. 15. Gross JL, Ferreira SRG, Franco LJ, Schimidt MI, Motta DG, Quintão E. Consenso: diagnóstico e classificação do diabetes melito e tratamento do diabetes melito tipo 2. Arq Bras Endocrinol Metab 2000; 44(4):1-32. 16. Batista LKC, Pinheiro HS, Fuchs RC, Oliveira T, Belchior FJE, Galil AGS. Manuseio da doença renal crônica em pacientes com hipertensão e diabetes. J Bras Nefrol 2005; 27(1): 8-14. 17. Mcgonigle RJ, Wallin JD, Shadduck RK et al: Erythropoietin deficiency na inhibition of erythropoiesis in renal insufficiency. Kidney Int 1984; 25: 437-44. 18. Abensur H, Alves MAR. Diretrizes da Sociedade Brasileira de Nefrologia para a condução da anemia na insuficiência renal crônica. J Bras Nefrol 2000; 22 (5):1-3. 19. Almeida FA, Rodrigues CIS. Hipertensão arterial primária. In: Riella MC. Princípios de nefrologia e distúrbios hidroeletrolíticos. 4ª ed. Rio de Janeiro(RJ): Guanabara Koogan; 2003. p.730-56. 20. Kohlmann Jr O, Zanella MT. Nefropatia diabética: diagnóstico e tratamento. In: Ajzen H, Schor N. Guia de medicina ambulatorial e hospitalar de nefrologia. 2ª. ed. São Paulo(SP): Manole; 2005. p.359-366. 51 21. Boim MA, Teixeira VPC, Schor N. Rim e compostos vasoativos. In: Zatz R. Fisiopatologia renal. São Paulo(SP): Atheneu; 2002. p. 21-39. 22. Smeltzer SC, Bare BG. Tratamento de pacientes com distúrbios urinários e renais. In: Smeltzer SC. Brunner& Suddarth: Tratado de Enfermagem Médico-Cirúrgica 9ª ed. Rio de Janeiro(RJ): Guanabara Koogan; 2002 . v. 3 p. 1086-1134. 23. Pacheco GS. O ensino do autocuidado junto a clientes com doença renal crônica em tratamento conservador: estudo epidemiológico e sociopoético [dissertação de mestrado]. Rio de Janeiro (RJ): Faculdade de Enfermagem/UERJ; 2005. 24. Santos I, Figueiredo NMA. A enfermagem como instituição hospitalar. In: Santos I, Figueiredo NMA, Padilha MICS, Cupello AJ, Souza SROSS, Machado WCA. Enfermagem assistencial no ambiente hospitalar. Rio de Janeiro(RJ): Atheneu p. 93-104. Sobre as Autoras Gilvanice de Sousa Pacheco Mestre em Enfermagem (FENF/UERJ). Especialista em Enfermagem em Nefrologia (Universidade Gama Filho/RJ). Especialista em Enfermagem Clínico-Cirúrgica (UFMA) e Saúde Pública (UNAERP). Email: [email protected] Iraci dos Santos Doutora em Enfermagem. Profª Titular da Universidade do Rio de Janeiro (UERJ). Professora do Programa de Mestrado em Enfermagem da UERJ. Rachel Bregman Doutora em Nefrologia. Profª da Disciplina de Nefrologia da Faculdade de Medicina da UERJ. Recebido em 21/03/2006 Reapresentado em 10/11/2006 Aprovado em 03/01/2007 Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 44 - 51. 52 Grupos Operativos de Aprendizagem nos Serviços de Saúde Soares SM et al GRUPOS OPERATIVOS DE APRENDIZAGEM NOS SERVIÇOS DE SAÚDE: SISTEMATIZAÇÃO DE FUNDAMENTOS E METODOLOGIAS Operative Groups of Learning in the Health Services: Basis and Methodologies Systematization Los Grupos Operativos de Aprendizaje en los Servicios de Salud: Sistematización de Fundamentos y Metodologías Sônia Maria Soares Aidê Ferreira Ferraz Resumo Trata-se de uma pesquisa com abordagem qualitativa, modalidade estudo de caso, que teve como objetivo analisar a aplicação da teoria e da metodologia dos grupos operativos, proposta por Pichon-Rivière em grupos de portadores de doenças crônico-degenerativas. Foi desenvolvida em um hospital universitário da cidade de Belo Horizonte – Minas Gerais/ Brasil, por meio de entrevistas e observação direta de um grupo de sete adultos com diabetes tipo 1, com idade entre 18 e 45 anos, durante os encontros no grupo operativo. A análise dos dados fundamentou-se no referencial dos indicadores do processo grupal, propostos por Pichon-Rivière (1998): afiliação e pertença, cooperação, comunicação, aprendizagem e pertinência. A aplicação da teoria e da metodologia proposta por Pichon-Rivière permitiu ao coordenador do grupo operativo e às pesquisadoras ampliar o olhar em relação à dinâmica grupal, o que contribuiu para que os conteúdos subjetivos, implícitos nas interações dos participantes fossem trabalhados, mas não verbalizados. Além disso, os indicadores do processo grupal permitiram reavaliar e adaptar o desenvolvimento do grupo operativo, norteando as ações desenvolvidas a cada encontro. Fundamentadas nos achados deste estudo, as autoras acreditam que esta pode ser uma estratégia eficaz para os profissionais de saúde, na construção de modelos que envolvam trabalhos com grupos. Pala vr as-c ha alavr vras-c as-cha havve: Estrutura de Grupo. Serviços de Saúde. Diabetes Mellitus. Abstract Resumen It is a research with qualitative approach, case study modality, witch had as purpose to analyze the theoretical application and the methodology of the operative groups, proposed by Pichon-Rivière in groups of people carrier of chronic degenerative disease. The research was developed in a universitarian hospital of Belo Horizonte city – Minas Gerais/ Brazil, by interview and direct observation of a group of seven adults with diabetes type 1, in age between 18 and 45 years old, during the meetings of the operative group. The analysis of the data was based in the indicatives of the group process referential, proposed by Pichon-Rivière (1998): affiliation and related, cooperation, communication, learning and importance. The application of the theory and of the methodology proposed by Pichon-Rivière allowed to the coordinator of the operative group and to the researchers to amplify the view about the group dynamics, what has contributed to the subjective contents, implicit in the participants’ interaction was worked, but not verbalized. Besides this, the indicatives of the group process allowed to re-evaluate and to adapt the development of the operative group, guiding the developed actions in every encounter. Based in the founds of this study, the authors believe that this could be a, effectual strategy to the health professionals, in the construction of models that could involve group works. Tratase de una investigación con abordaje cualitativa, modalidad estudio de caso, que tubo como objetivo analizar la aplicación de la teoría y de la metodología de los grupos operativos, propuesta por Pichon-Rivière en grupos de portadores de enfermedades crónico-degenerativas. Fue desarrollada en un hospital universitario de la ciudad de Belo Horizonte – Minas Gerais/Brasil, por medio de entrevistas y observación directa de un grupo de siete adultos con diabetes tipo 1, con edad entre 18 y 45 años, durante el encuentro en el grupo operativo. El análisis de los datos fue fundamentado en el referencial de los indicadores de proceso grupal, propuestos por Pichon-Rivière (1998): afiliación y pertenencia, cooperación, comunicación, aprendizaje y pertinencia. La aplicación de la teoría e de la metodología propuesta por Pichon-Rivière permitió al coordinador del grupo operativo y a las investigadoras ampliar el mirar en relación a la dinámica grupal, lo que contribuyó para que los contenidos subjetivos, implícitos en las interacciones de los participantes fuesen trabajados, pero non verbalizados. A más de los indicadores del proceso grupal permitieran reevaluar y adaptar el desarrollo del grupo operativo, norteando las acciones desarrolladas a cada encuentro. Fundamentadas en los hallados de este estudio, las autoras acreditan que esta puede ser una estrategia eficaz para los profesionales de salud, en la construcción de modelos que envuelvan trabajos con grupos. Keywords: Group Structure. Health Services. Diabetes Mellitus. Palabras clave: Estructura de Grupo. Servicios de Salud. Diabetes Mellitus. Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 52 - 7. 53 Grupos Operativos de Aprendizagem nos Serviços de Saúde Soares SM et al INTRODUÇÃO OBJETIVO Uma longa tradição tem marcado a utilização de grupos na área da saúde. Na década de 1970, os grupos denominados operativos ganharam a atenção dos profissionais de saúde pelo seu grande potencial de aplicabilidade e pela sistematização que traziam para o processo grupal1,2. A organização de grupos como modalidade de atenção coletiva à população tem sido cada vez mais freqüente nos serviços de saúde, o que se pode verificar pela participação de muitos clientes em vários grupos nos centros de saúde. Em geral, esses grupos têm como critérios organizadores o tipo de doença, a idade e outros. Dentre os benefícios dessa modalidade de atendimento destacam-se: maior otimização do trabalho com a diminuição das consultas individuais, participação ativa do cliente no processo educativo e o envolvimento da equipe de profissionais com o cliente. Entretanto, percebe-se a falta de referências teóricas e metodológicas que orientem as ações dos profissionais na coordenação de grupos nos serviços de saúde. É indispensável aos profissionais de saúde a discussão e a aprendizagem sobre os fenômenos grupais, com a finalidade de compreender os fundamentos teóricos da dinâmica grupal e ampliar o seu olhar sobre o grupo. As doenças crônico-degenerativas vêm merecendo, por parte do setor saúde, atenção cada vez maior, seja pela sua elevada prevalência em nosso meio, como também pelo alto custo que representam para os serviços de saúde. O diabetes mellitus, por exemplo, é hoje um dos mais significantes problemas de saúde pública, tanto em número de pessoas afetadas quanto em número de incapacitações e mortalidade prematura. Segundo dados do Ministério da Saúde3, sabe-se que mais de 40% da clientela atendida na rede básica é prioritariamente composta de pessoas acometidas por doenças crônico-degenerativas. É nesse contexto que os serviços de saúde têm enfatizado a importância do atendimento a essa clientela, seja no âmbito da atenção individual, seja no da coletiva, como é o caso dos grupos operativos. A partir desse quadro, o Ministério da Saúde, em parceria com as Secretarias Estaduais, Municipais e a Estratégia de Saúde da Família em todo território nacional, criou, em novembro de 2000, o Plano de Reorganização da Atenção à Hipertensão Arterial e ao Diabetes Mellitus3 com a finalidade de capacitar os profissionais de saúde que atuam na área da atenção básica, destacando-se nessa proposta a especificidade do trabalho com grupos operativos e a sua importância no acompanhamento e no controle do cliente. Diante do exposto, este estudo poderá ser um elemento facilitador para a construção e a sistematização de metodologia visando à sua aplicação mais definida para a educação permanente de profissionais e a formação do estudante na área da saúde. Assim, evidencia-se a necessidade de sistematização de metodologias com a finalidade de capacitar os profissionais de saúde para esse tipo de intervenção. Analisar a aplicação da teoria e da metodologia dos grupos operativos, proposta por Pichon-Rivière em grupos de portadores de diabetes mellitus e sua contribuição à assistência e ao ensino na área da saúde. Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 52 - 7. REFERENCIAL TEÓRICO Foi Pichon-Rivière4, psiquiatra e psicanalista argentino, quem elaborou, na década de 1940, a teoria do grupo operativo. Ele definiu o grupo como um conjunto de pessoas, ligadas no tempo e espaço, articuladas por sua mútua representação interna, que se propunham, explícita ou implicitamente, a uma tarefa, interatuando em uma rede de papéis com o estabelecimento de vínculos entre si. Assim, a teoria dá grande importância aos vínculos sociais, que são a base para os processos de comunicação e aprendizagem, considerando que o ser humano é essencialmente um sujeito social. O grupo se põe como uma rede de relações com base em vínculos entre cada componente e todo o grupo e vínculos interpessoais entre os participantes4 . O grupo se une em torno de uma tarefa, que é compreendida em nível consciente, mas que também implica uma dimensão afetiva que existe no inconsciente do grupo. Assim, um nível de funcionamento do grupo é lógico e relacionado à tarefa e outro está envolvido com as emoções e a dinâmica psíquica do grupo, seus medos e fantasias. Os objetivos conscientes do grupo delimitam a sua tarefa externa. Mas ele também tem uma tarefa interna, que é trabalhar com os processos vividos, em nível consciente e inconsciente, que dificultam ou mesmo impedem a realização da tarefa externa4,5. Conforme nos explicam Portarrieu e Tubert-Oaklander6, o grupo operativo constitui uma modalidade de processo grupal que, em princípio, deve ser: dinâmico - permitindo-se o fluir da interação e da comunicação para fomentar o pensamento e a criatividade; reflexivo – uma parte da tarefa é a reflexão sobre o próprio processo grupal, particularmente quando se trata de compreender os fatores que obstruem a tarefa; e democrático quanto à tarefa – o grupo origina suas próprias ações e pensamentos, em um princípio de autonomia. Todo grupo, ao formular seus objetivos, se propõe a uma mudança ou realização de uma tarefa; mas também apresenta um grau menor ou maior de resistência a essa mudança, diante da qual evidenciam-se os medos básicos de perda e de ataque; isto é, de um lado, o medo de perder o que já se tem – até mesmo a própria identidade – e que se relaciona a uma ansiedade depressiva, e, de outro, o medo do desconhecido, que se liga a uma ansiedade paranóica ou persecutória. Tal resistência à mudança provoca entraves psíquicos e afetivos à aprendizagem e à comunicação no grupo. Inspirado no filósofo Gaston Bachelard, Pichon-Rivière denomina esses entraves de obstáculos epistemofílicos4,5,6,7. Obstáculos que representam as dificuldades de apreender um objeto de conhecimento para efetuar uma leitura correta da realidade. 54 Os processos vividos no grupo geram uma ressonância, ou seja, o processo individual entra no campo grupal provocando identificações e reações em cadeia, conforme a distância psíquica entre os membros. Assim, um membro serve de suporte para processos psíquicos de outros membros e do grupo4,5,6. Conseqüentemente, o trabalho com o grupo visa à integração de duas dimensões: a verticalidade, que se refere à história de cada participante, e que o leva a uma reatualização emocional no grupo e a um processo transferencial; e a horizontalidade, que se refere ao campo grupal, consciente e inconsciente, que vai sendo modificado pela ação e interação dos membros4,5. No grupo operativo, instrumentaliza-se um processo que passa fundamentalmente pela diminuição dos medos básicos, com o fortalecimento do Eu e uma adaptação ativa à realidade. Hierarquiza-se, como tarefa grupal, a construção de um Esquema Conceitual, Referencial e Operativo (ECRO) comum, condição necessária para a comunicação e a realização da tarefa. A tarefa depende, portanto, do campo operativo do grupo: sua percepção, sua interação, sua linguagem4,5,6. Mas, se a realização da tarefa acrescenta experiência ao grupo, ela também o força a rever seus conflitos e formas de organização, de forma que o processo grupal envolve uma constante desestruturação e reestruturação desse campo e dos sujeitos nele envolvidos4. No processo do grupo, há os momentos da pré-tarefa, da tarefa e do projeto. A pré-tarefa é o momento em que predominam mecanismos de dissociação, com a finalidade de defender os sentimentos de culpa e ambivalência, a situação depressiva básica, as dificuldades de tolerância, a frustração e a postergação. A tarefa é o momento em que se rompe a estereotipia e se elabora a pré-tarefa, avançando na elaboração de seu objetivo. Nesse momento, alcança-se maior operatividade e criatividade, podendo-se sistematizar objetivos e realizar tarefas propostas e/ou novas. No momento do projeto, uma vez alcançado um nível de operatividade, o grupo pode se planejar3,4,5,6. O grupo vai se tornando mais consciente e flexível quanto aos seus papéis, centrando-se no rompimento de estereótipos e na modificação de vínculos internos e externos. Centra-se no campo grupal. Cada indivíduo, ao expressar-se, é portavoz de uma dimensão ou especificidade do campo grupal7,8. Esses momentos do grupo não seguem uma lógica linear e cumulativa. Pelo contrário, todo gr upo apresenta ambivalências, regressão, dispersão diante da constante demanda de sustentar seu processo e refletir sobre ele. Isso significa que ele tem de estar continuamente se reorganizando e se recriando. Ou seja, é necessário que se proceda a revisão – em um sentido imaginário, a destruição – de seus ideais para que se possa reconstruí-los no contexto, procurando a realização da tarefa. Pichon-Rivière4 aponta então para uma recriação do objeto destruído, isto é, a recuperação de uma imagem do grupo e dos seus objetivos, mas sempre de forma renovada4,7. Pichon-Rivière apresenta a concepção de uma espiral dialética relativa aos momentos do grupo, ou seja, diante da situação grupal, uma interpretação é gerada e provoca uma desestruturação, e, a seguir, o grupo responde tentando se Grupos Operativos de Aprendizagem nos Serviços de Saúde Soares SM et al transformar para dar conta de seu processo, passando por uma reestruturação, em uma nova situação (“emergente”). Cada ciclo abrange e supera o anterior4,6,8,910. A espiral dialética4 abrange o todo do processo grupal, como um movimento constante entre processos internos ao grupo. Esse movimento pode ser observado tomando como referência os indicadores do processo grupal, quais sejam: afiliação/per tença, comunicação, cooperação, tele, aprendizagem e pertinência. A afiliação e a pertença dizem respeito ao grau de identificação dos membros do grupo entre si e com a tarefa. Enquanto a afiliação indica apenas uma aquiescência em pertencer ao grupo, a pertença envolve um sentimento de identificação com o grupo. A pertença possibilita a identidade, mas também contém a diferenciação. A afiliação e a pertença são indicadores básicos para o desenvolvimento dos outros processos no grupo. A cooperação pressupõe ajuda mútua e se dá mediante o desempenho de diferentes papéis e funções. Na tentativa de articular demandas do grupo e dos indivíduos, muitas vezes surge a competição. A flexibilização dos papéis é uma forma de se trabalhar esse problema, buscando a “co-operatividade”. “Co-operar” não significa não discordar ou confrontar, mas, sim, atuar quando se é cúmplice (ou não ser cúmplice daquilo de que se discorda). Cooperação e comunicação interligam-se e favorecem a aprendizagem. A comunicação é um processo que leva em conta as redes de comunicação no grupo, contendo possibilidades e entraves. Envolve também o conflito e a necessidade de trabalhar sobre ele. É preciso elaborar o que se chama de “mal-entendido”, que está associado a conflitos diversos, tanto aqueles relacionados à organização do grupo quanto os concernentes a conflitos psíquicos7 8,9. A aprendizagem vai além da mera incorporação de informações e pressupõe o desenvolvimento da capacidade de criar alternativas – por meio dela percebe-se o grau de plasticidade grupal diante dos obstáculos e da criatividade para superar as contradições e mesmo integrá-las. Com a atenuação da ansiedade básica, o grupo pode operar melhor seus afetos e sua tarefa. A aprendizagem está inter-relacionada à comunicação, e o grupo precisa compreender seus obstáculos à comunicação para analisar os obstáculos à aprendizagem. Ao mesmo tempo, é apenas na dimensão da tele que o grupo consegue deslanchar todos os seus outros processos. A tele caracteriza a disposição positiva ou negativa dos membros do grupo entre si. Refere-se às relações no grupo tais como são percebidas e vividas. É uma disposição para atuar em conjunto e, assim, pode ser positiva ou negativa. As percepções entre os membros do grupo estão vinculadas aos processos transferenciais. Assim, a tele aparece como uma rede de transferências. É importante assinalar que, para Pichon-Rivière4, o que se encontra no grupo não é uma neurose transferencial, mas, sim, processos transferenciais em uma rede de relações. A transferência é um processo de atribuição de papéis ao outro com base nas expectativas inscritas na vida psíquica do sujeito. Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 52 - 7. 55 Grupos Operativos de Aprendizagem nos Serviços de Saúde Soares SM et al Comporta a reprodução de sentimentos inconscientes, que indica a reprodução estereotipada de situações, característica de uma forma de adaptação passiva, na qual o sujeito se vê atado a conflitos psíquicos não trabalhados. Essa reprodução tem o efeito de proteger contra o medo da mudança e, portanto, de fortalecer a resistência a ela4,7. A pertinência refere-se à produtividade do grupo, à sua capacidade de centrar-se em seus objetivos, de forma coerente com seus outros processos. A realização de objetivos em um contexto requer pertinência do agir, que se afasta tanto do conformismo quanto da ruptura total do contexto. Esses processos do grupo não são estanques e nem lineares. Há um constante ir-e-vir entre os momentos. Para PichonRivière4, são aspectos do processo grupal que interatuam de forma dinâmica permitindo mudanças no seu desenvolvimento. METODOLOGIA Trata-se de uma pesquisa na abordagem qualitativa na modalidade de estudo de caso. O estudo foi desenvolvido no serviço de endocrinologia de um hospital universitário de Belo Horizonte - MG/Brasil. A coleta de dados constou de entrevista durante a consulta de enfermagem e observação de um grupo de sete adultos, sendo cinco mulheres e dois homens com diabetes mellitus tipo 1, na faixa etária entre 18 e 45 anos, no período de novembro de 2003 a julho de 2004. Os princípios ético-legais foram observados conforme previsto na Resolução 196/96 do Conselho Nacional de Saúde. As atividades grupais foram desenvolvidas em encontros quinzenais, compreendendo as seguintes etapas: identificação dos clientes diabéticos para inserção no grupo; planejamento das atividades do grupo; observação e descrição do processo grupal; e elaboração e reflexão desse processo. Inicialmente, cada cliente foi submetido a uma avaliação individual por meio da consulta de enfermagem, onde foram levantados os principais fatores de risco para o aparecimento de complicações agudas e crônicas, além de ser avaliado o seu potencial para o autocuidado. As etapas subseqüentes constaram de atividades grupais, nas quais foram discutidas crenças em relação ao diabetes, os sentimentos que emergiram após o diagnóstico, temas relativos ao autocuidado para o controle da doença, riscos de complicações agudas e crônicas. Os participantes foram submetidos a uma segunda consulta de enfermagem três meses após o início do trabalho de campo, com a finalidade de avaliar o controle da doença e o impacto imediato da sua inserção no grupo. Nessa etapa foram utilizados jogos educativos para avaliar os indicadores relacionados ao processo grupal e o seu potencial para o autocuidado. Os grupos foram conduzidos pela pesquisadora e uma aluna do curso de graduação de Enfermagem, que atuou como observadora do grupo operativo, registrando cada encontro e elaborando relatórios de campo. A observação foi feita mediante o registro cursivo das reuniões do grupo, considerando os indicadores do processo grupal propostos por Pichon- Rivière4. Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 52 - 7. ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS Caracterização do grupo Cinco participantes do grupo dedicavam-se ao trabalho doméstico, um era aposentado por invalidez e outro trabalhava como cobrador de ônibus. O nível de escolaridade de seis participantes é o ensino fundamental incompleto, apenas uma participante tinha o curso superior incompleto. O tempo de diagnóstico da doença foi bem diversificado, sendo que três pessoas tinham mais de cinco anos de convivência com a doença, enquanto os demais tinham menos de dois anos. Demanda e formação dos grupos Observou-se que o critério organizador do grupo apoiavase nos seguintes aspectos: o diagnóstico de diabetes mellitus, a idade, o processo de tratamento, a avaliação dos resultados de exames e o tempo de convivência com a doença. Desde o primeiro encontro foi formalizado o contrato com o grupo, no qual foram definidos como e quando seriam realizadas as reuniões, os horários, os temas que seriam trabalhados, as expectativas dos participantes e a apresentação do coordenador. A forma de organização do grupo confirmava que a patogênese era o eixo norteador para abordagem clínica do mesmo com enfoque no modelo biomédico e na doença11, 12. Desenvolvimento do grupo O desenvolvimento do grupo ocorreu nas seguintes etapas: primeiro, cada participante foi avaliado individualmente para a realização do exame de glicemia capilar, controle de peso e sinais vitais. Em seguida, foi discutido um tema escolhido anteriormente pelo grupo com o apoio de jogos educativos e dinâmicas. A realização do exame de glicemia capilar para alguns pacientes, mesmo convivendo com a doença por muitos anos, ainda despertava resistência e tensão, como menciona uma das participantes: Eu não me acostumei com essa coisa de furar o dedo... não consigo nem olhar... A abordagem dos temas de interesse do grupo ocorreu por meio de dinâmicas e vivências11, que incentivavam as pessoas a falarem sobre si, daquilo que gostavam de fazer no seu cotidiano de convívio com a doença, e a linha da vida que discutiu as mudanças ocorridas antes e depois da doença por meio de desenhos que expressavam as dificuldades de seu controle, como menciona uma das participantes: Eu curto e faço esporte duas vezes por semana. O que eu não curto e faço é fumar... Eu não curto e não faço é beber, não gosto. Eu curto e não faço é ir em festas, eu adoro e não faço muito, gostaria de fazer mais. Esse foi um momento lúdico do grupo, que permitiu a cada membro se apresentar e falar de fatos que constituem a sua vida cotidiana, o seu trabalho, a sua família, a sua vida social. O fato de o grupo operativo falar do cotidiano é importante como forma de cada um ir reconhecendo o outro, suas necessidades e aquilo que identifica cada um2, 10. 56 Grupos Operativos de Aprendizagem nos Serviços de Saúde Soares SM et al Para o desenvolvimento das atividades foram elaborados folderes explicativos sobre complicações agudas e crônicas do diabetes mellitus e jogos educativos que discutiam temas sobre o uso de medicamentos orais, dieta e exercício físico. O jogo sobre dieta foi um dos mais utilizados. Ele propiciava ao cliente combinação de cardápios diferenciados, que eram discutidos em grupo, avaliando a composição e a combinação alimentar sobre o que devem e o que não devem comer e como preparar seus alimentos. unicação no grupo não ocorreu de forma linear, ou A com comunicação seja, apenas entre coordenador e participante. De modo geral, os participantes processavam uma comunicação integrada, entre eles próprios e entre a coordenação. endiza A a pr prendiza endizagg em foi claramente obser vada nos participantes do grupo. Novos conhecimentos foram adquiridos, o que foi explicitado pela preocupação com o manejo da doença e melhoria do controle glicêmico. Os integrantes que já tinham maior convivência com a doença expressaram preocupação com a qualidade de vida. A oportunidade de rever como estava sendo realizado o tratamento e o seu acompanhamento, nem sempre bem-sucedido, trouxe reflexões sobre o estilo de vida e o resgate de matrizes de aprendizagem que foram marcantes para as mudanças que cada um sabe que precisa realizar no seu cotidiano de vida. A relação dos participantes ocorreu de forma harmoniosa e caracterizou-se pelo respeito às diferenças. No tocante aos momentos do processo grupal, observou-se que nos primeiros encontros os participantes se mostraram receosos, possivelmente porque ainda não se conheciam. As primeiras impressões foram se formando e, mesmo participando dos momentos iniciais do trabalho em grupo, essa participação não era integral. Em geral, os clientes não se identificavam com as atividades do grupo, mostrando-se na fase de pré-tarefa. Depois de alguns encontros, os integrantes foram se desinibindo e se integrando ao grupo, contando suas experiências, propondo atividades. A partir de então, todos já se conheciam e as impressões do primeiro encontro foram dando lugar ao desejo de interagir e de atingir os objetivos que se tornaram comuns. Nessa etapa, o grupo já estava mais integrado com a tarefa. Em relação à tele tele, observamos que houve uma disposição positiva dos membros do grupo entre si, o que facilitou a atuação do coordenador e a interação entre os membros do grupo. Os indicadores do processo grupal Os processos intragrupos Retomando os indicadores de avaliação e acompanhamento do processo grupal propostos por Pichon- Rivière4, observa-se iliação e à per tença, desde o primeiro que, em relação à af afiliação encontro os integrantes demonstraram o interesse em estar no grupo, expresso no compromisso com a participação em todas as atividades propostas, indicadores que foram aumentando gradativamente a cada reunião. Mesmo com o interesse em discutir temas do cotidiano que emergiam no grupo, como o desemprego, a violência nos grandes centros urbanos, obser vou-se que foi preponderante na per tinência do grupo a tarefa de aprender o manejo do diabetes. Com objetivos comuns, os membros do grupo trocaram conhecimentos sobre o diabetes, além de exporem suas experiências e dificuldades, aprendendo, assim, a conviver com a doença. A cooperação foi demonstrada à medida que os membros do grupo buscaram complementar o outro com base em situações que eram trazidas do seu cotidiano. Isso ficou mais evidente quando um dos membros do grupo teve a confirmação que precisaria fazer uma pequena cirurgia, mas a glicemia estava muito descontrolada. Todos demonstraram solidariedade, e duas se ofereceram como acompanhantes. Um dos participantes do grupo, ao assumir uma posição de resistência, mantinha-se em pré-tarefa, sabotando as atividades que estavam previstas para o desenvolvimento do mesmo. Obser vou-se no grupo que tanto os aspectos da horizontalidade como os da verticalidade, que integram os processos intragrupos, mobilizaram ações capazes de modificar conceitos, crenças e valores em relação à doença. Temas emergentes Emergiram da discussão nos grupos as seguintes unidades temáticas: a revolta e o inconformismo no enfrentamento da doença; a consciência sobre os riscos de complicações advindas da doença; o inconformismo com a falta de assistência de saúde; a dificuldade em aderir à dieta; a influência emocional no controle do diabetes; e o medo das complicações futuras. Os depoimentos abaixo expressam cada um dos temas emergentes: ... 17 anos descobri o diabetes, foi uma revolta, estava na adolescência, foi difícil demais. Acho que o problema é a comida, a gente não pode comer e fica com vontade. [relato do participante se referindo a dificuldades de freqüentar festas.] É muito melhor fazer bem a dieta do que ficar uma semana no hospital, eu te garanto. Perdi o braço por causa de um acidente, o pronto-socorro engessou apertado, o sangue não circulou, a diabetes alterou e não conseguiram controlar, tiveram que amputar... Na finalização de cada encontro, era reafirmado o contrato grupal e eram discutidas as datas dos próximos encontros, horários e temas que seriam trabalhados. Elaboração de material didático O papel do coordenador no processo grupal No grupo operativo, a principal função do coordenador, após estabelecer um enfoque adequado para a operação do grupo, é ajudar, por meio de intervenções interpretativas, o grupo a realizar sua tarefa interna reflexiva, para colocar-se em condições de desenvolver sua tarefa externa. A explicitação e a interpretação dos fatores implícitos no acontecer grupal permitem aos membros tomar consciência e enfrentar obstáculos que, ao permanecerem inconscientes, continuariam a interferir na realização da tarefa externa12. Nos grupos atendidos na área da saúde, pode-se pensar até que ponto o processo grupal é específico, por exemplo, em relação à demanda por saúde, às fantasias e aos medos relativos à doença que identifica a escolha de participantes. Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 52 - 7. 57 Grupos Operativos de Aprendizagem nos Serviços de Saúde Soares SM et al Assim, o coordenador poderá conduzir melhor o grupo se puder interligar as dificuldades diante da tarefa externa (a necessidade de mudar os hábitos alimentares dos componentes do grupo) e ansiedades e angústias que essa tarefa provoca, como o medo de ser estigmatizado pela família ou pelo círculo de amigos e que pode ser vivida por um ou mais participantes do grupo. Assim, a troca de experiências entre eles pode ser esclarecedora e motivadora para a mudança necessária. O coordenador realizou seu papel assimétrico assinalando diferenças, esclarecendo dúvidas, estabelecendo um contrato com o grupo, que foi sempre respeitado. Ressalte-se que as intervenções realizadas pelo coordenador foram apropriadas, ajudando o grupo no processo de contenção e interação. CONSIDERAÇÕES FINAIS A teoria de grupos operativos proposta por Pichon-Rivière4 permitiu organizar o fazer grupal com referências conceituais e sistematizadas, o que facilitou de forma significativa a Referências 1. Fernandes MT. O trabalho com grupos na Saúde da Família: concepções e estratégias para o cuidado transcultural. [dissertação de mestrado]. Belo Horizonte (MG): Escola de Enfermagem, Universidade Federal de Minas Gerais; 2006 2. Soares SM. Os grupos operativos de aprendizagem nos serviços de saúde:uma análise crítica segundo a concepção de Pichon-Rivière. Anais do 48º Congresso Brasileiro de Enfermagem; 1996 out. 06-14; São Paulo(SP), Brasil.1996. São Paulo(SP): Aben; 1997. 3. Ministério da Saúde(BR). Manual de hipertensão arterial e diabetes mellitus: plano de reorganização da atenção à hipertensão arterial e ao diabetes mellitus. Brasília(DF); 2002. 4. Pichon-Rivière E. O processo grupal. São Paulo(SP): Martins Fontes; 1998. 5. Baremblitt G. Grupos: teoria e técnica. Rio de Janeiro(RJ): Graal; 1996. 6. Portarrieu ML, Tubert-Oklander J. Grupos operativos. In: Osório LC, organizador. Grupoterapia hoje. Porto Alegre(RS): Artes Médicas; 1989. 7. Berstein M. Contribuições de Pichón-Rivière à psicoterapia de grupo. In: Osório LC, organizador. Grupoterapia hoje. Porto Alegre(RS): Artes Médicas; 1986. 8. Osório LC, organizador. Grupoterapia hoje. Porto Alegre(MG): Artes Médicas; 1986. coordenação do grupo. Além disso, propiciou aos clientes um espaço terapêutico de discussão, no qual foi possível confrontar as fantasias inconscientes e medos sobre a repercussão do diabetes no seu cotidiano, contribuindo para o seu crescimento pessoal. Obser vou-se que a experiência do gr upo trouxe aprendizagem para melhor convivência com a doença, possibilitando a alguns dos participantes a ressignificação da experiência, o que transcendeu as limitações que ela provoca. Todo grupo tem a possibilidade de em algum momento se tornar um grupo de processo que contribua para que tudo o que emerge na sua dinâmica seja expresso e interpretado de forma contextualizada e no nível real. Assim, obser vou-se que os indicadores do processo grupal permitiram interpretar e reavaliar o desenvolvimento do grupo operativo, norteando as ações desenvolvidas a cada encontro. Certamente que essa pode ser uma estratégia, para os profissionais de saúde, na construção de modelos que envolvam os trabalhos com grupos. 9. Osório LC. Grupos, teorias e práticas: acessando a era da grupalidade. Porto Alegre(RS): Artes Médicas, 2000 10. Gayotto MLC, Domingues I. Liderança: aprenda a mudar em grupo. Petrópolis(RJ): Vozes, 1998 11. Minicucci A. Dinâmica de grupo: teorias e sistemas. 4ª ed. São Paulo(SP): Atlas; 1997. 12. Andaló C. O papel de coordenador de grupo. Psicol. USP 2001;12(1): 135-52. Sobre as Autoras Sônia Maria Soares Enfermeira. Doutora em Saúde Pública, Profa. Adjunta da Escola de Enfermagem da UFMG – Departamento de Enfermagem Básica. Coordenadora do Núcleo de Estudos e Pesquisas em Cuidado e Desenvolvimento Humano. E-mail: [email protected]. Aidê FFer er r eir er r az eiraa FFer Enfermeira. Doutora em Enfermagem, Profa. Associada da Escola de Enfermagem da UFMG – Departamento de Enfermagem Básica. Coordenadora do Núcleo de Estudos e Pesquisas sobre Comunicação em Enfermagem - NEPCE. E-mail: [email protected]. Recebido em 21/03/2006 Reapresentado em 06/11/2006 Aprovado em 07/01/2007 Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 52 - 7. 58 Perfil e Práticas Sexuais Entre Universitários Falcão Júnior JSP et al PERFIL E PRÁTICAS SEXUAIS DE UNIVERSITÁRIOS DA ÁREA DE SAÚDE Profile and Sexual Practical of College Students from Health Area Perfil y Prácticas Sexuales de Universitarios del Área de Salud José Stênio Pinto Falcão Júnior Lydia Vieira Freitas Samia Thábida de Oliveira Rabelo Ana Karina Bezerra Pinheiro Emeline Moura Lopes Lorena Barbosa Ximenes Resumo O estudo teve como finalidade descrever o perfil sexual de acadêmicos da área da saúde da Universidade Federal do Ceará e investigar o conhecimento dos mesmos acerca das condutas e práticas voltadas para a contracepção e prevenção das doenças sexualmente transmissíveis (DST). Os dados foram obtidos através da aplicação de um questionário composto de 16 questões objetivas, abordando dados biográficos e relacionados à educação sexual, práticas sexuais, aquisição de DST e gravidez não planejada. Os resultados encontrados mostram que não há uma associação direta entre o nível de escolaridade e o nível de conhecimento e a utilização dos métodos que previnem as DST/AIDS e gravidez indesejada. Pala vr as-c ha alavr vras-c as-cha havve: Sexualidade. Doenças Sexualmente Transmissíveis. Gravidez não Desejada. Comportamento Sexual. Abstract Resumen The study had as purpose to describe the sexual profile of academics of the health area of the Federal University of Ceará and to investigate their knowledge about the behavior and practices directed to the contraception and prevention of the sexual transmission disease (STD). The data was collected through the application of a composed questionnaire with 16 objective questions, approaching biographical data and related them to the sexual education, sexual practice, acquisition of STD and no planned pregnancy. The found results didn’t showed that there isn’t a direct association between the level of knowledge and the use of the methods to prevent STDs and AIDS besides not desired pregnancy. El estudio tuvo como finalidad describir el perfil sexual de académicos del área de salud de la Universidad Federal del Ceará e investigar el conocimiento de los mismos acerca de las conductas y prácticas relacionadas a la contracepción y prevención de las Enfer medades Sexualmente Transmisibles (ETS). Los datos fueron obtenidos a través de la aplicación de un cuestionario compuesto de 16 preguntas objetivas, abordando datos biográficos y relacionados a la educación sexual, prácticas sexuales, adquisición de ETS y embarazo no planeado. Los resultados encontrados muestran que no hay una asociación directa entre el nivel de escolaridad y el nivel de conocimiento y la utilización de los métodos que previenen las ETS/SIDA y el embarazo indeseado. K e yw or ds: Sexuality. Sexually Transmitted Diseases. ywor ords: Pregnancy Unwanted. Sexual Behavior. Pala br as ccla la alabr bras lavve: Sexualidad. Enfermedades Sexualmente Transmisibles. Embarazo no Deseado. Conducta Sexual. Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 58 - 65. 59 Perfil e Práticas Sexuais Entre Universitários Falcão Júnior JSP et al INTRODUÇÃO A sexualidade é vista como um conjunto de expressões ou comportamentos do ser humano, de modo a influenciar todo o ciclo de vida, por estar relacionada a fatores biológicos, psicológicos e sociais, dentre estes a procriação e a autoafirmação social e individual1. De acordo com Souza e Osório, a sexualidade faz parte da vida e o seu equilíbrio depende da estabilidade emocional do indivíduo. Entre os seres humanos, a sexualidade não diz respeito apenas às funções de reprodução; ela inclui necessariamente o amor e o prazer2. A sexualidade humana também é entendida como uma construção histórica e cultural com base nas experiências vivenciadas pelos indivíduos em seus vários ambientes de inserção3. Esta quando tratada como fator isolado a outros aspectos sócio-culturais é utópica, por ser um processo ininterrupto, acompanhando o indivíduo por todo o seu ciclo de vida, recebendo diversas influências, sendo estas fisiológicas, emocionais, culturais4. A sexualidade humana é um assunto inerente a todos os seres humanos e de suma importância, porém esta acarreta uma série de tabus no que diz respeito à sua discussão. Mesmo com o amplo avanço científico e tecnológico ocorrido nas últimas décadas, a sexualidade humana continua sendo considerada um tema repleto de mitos e preconceitos4. A concepção sobre a sexualidade humana tem evoluído historicamente. O século XVII marcou a história da sexualidade porque criou um conjunto de pudores que valorizava a decência e condenava o sexo pré-nupcial. As opiniões e as regras da época começaram a ser questionadas até que, no século XX, esses questionamentos chegaram a romper com as proibições da sociedade, eliminando muitos tabus relacionados à sexualidade humana, diminuindo o constrangimento e a recriminação5. Assim, as relações sexuais tornaram-se menos comprometedoras e a sexualidade feminina não inteiramente ligada à procriação, caracterizando a isenção às responsabilidades futuras, bem como um maior enfoque a conduzida pela busca do prazer6. Dessa forma, muitos jovens, em face da nova concepção liberal, passaram a iniciar a prática sexual de maneira desordenada, não se prevenindo contra as doenças sexualmente transmissíveis (DST) e de uma gravidez indesejada. A consciência de que algumas precauções são necessárias para se realizarem certas prática sexuais pode depender do nível sócio-econômico, de escolaridade e da idade. A taxa de fecundidade tende a ser maior entre adolescentes e jovens que apresentam menor escolaridade e que não possuem nenhuma atividade remunerada, e o uso de contraceptivos é menor quanto menor a idade do adolescente. Porém, é real o fato de que o uso de métodos contraceptivos não está necessariamente associado ao conhecimento. Um menor índice de uso de métodos anticoncepcionais não está relacionado diretamente com a falta de informação7. A adolescência é um estágio da vida em que a pessoa passa por profundas transformações e vivencia novas experiências no que diz respeito à sexualidade, porém, muitas Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 58 - 65. pessoas não estão preparadas para a iniciação sexual e submetem-se aos riscos ou até mesmo às frustrações. A idade da primeira relação sexual está entre 15 anos para os homens e 17 anos para as mulheres; dentre estes, apenas 51,4% fizeram o uso de métodos contraceptivos8. A atividade sexual tem se iniciado cada vez mais precocemente e é mantida de forma freqüente entre adolescentes9. Assim, a população jovem é considerada um grupo de relevância nas práticas de ações preventivas e em pesquisas acerca do tema DST/AIDS, isto por conta da alta exposição aos fatores e atividades que predispõem à contaminação. No Brasil, do total de 13.844 casos de AIDS diagnosticados em 2004, 1.085 casos (28,22%) são de jovens com idade de 13 a 24 anos3. Já quanto ao risco para aquisição de outras DST’s, indivíduos na faixa etária de 15 a 24 anos de ambos os sexos são os que apresentam as mais altas taxas de infecção na maioria dos países10. Certas práticas sexuais provocam uma maior exposição do jovem às doenças e/ou à gravidez não planejada, deixando-o em risco quanto a sua saúde. O não-uso do preservativo e de métodos contraceptivos estão incluídos entre os fatores que são considerados ao analisarmos as práticas de risco. Ao negligenciarem a prática da contracepção e de prevenção às doenças sexualmente transmissíveis, adolescentes e jovens podem se expor ao HIV/ AIDS e às demais doenças sexualmente transmissíveis, bem como à gravidez não planejada, revelandose esta realidade como potencialmente imediata10. Apesar de no meio acadêmico haver maior acesso às informações acerca da sexualidade humana e aos fatores de exposição às possíveis conseqüências de práticas sexuais inseguras, torna-se relevante o estudo do perfil sexual da população universitária, por estar a mesma em um período de transição em sua vida, no que diz respeito aos comportamentos social e sexual. Assim, surgiu o interesse em investigar as condutas e práticas voltadas para a contracepção e prevenção das doenças sexualmente transmissíveis na população de acadêmicos da Faculdade de Farmácia, Odontologia e Enfermagem da Universidade Federal do Ceará. METODOLOGIA Estudo de corte transversal realizado através de um inquérito. Pesquisa com desenho exploratório, em que interessa descrever e categorizar fenômenos em um grupo de pessoas. Utilizou-se abordagem quantitativa que se fundamenta no ser humano como um complexo de muitos sistemas que podem ser medidos objetivamente, de forma separada ou combinada, onde a pesquisa mede uma ou mais características humanas, controlando variáveis enfocadas no estudo11. A população foi composta pelos acadêmicos da Faculdade de Farmácia, Odontologia e Enfermagem (FFOE), da Universidade Federal do Ceará, durante os meses de maio e junho 2005. Foram escolhidos os alunos destes cursos por serem pertinentes à área da saúde, ou seja, um grupo que deveria possuir conhecimentos sobre o assunto e manter hábitos de vida saudável, estando aptos a expandir informações inerentes à sexualidade humana. Foi considerado ainda o fato 60 de que estes cursos per tencem ao mesmo centro da Universidade e se localizam na mesma área geográfica. A amostra foi composta por 303 alunos, sendo 129 alunos do curso de Farmácia, 78 alunos do curso de Odontologia e 96 alunos do curso de Enfermagem. A seleção da amostragem deu-se de forma aleatória, utilizando como critério de exclusão a recusa em preencher o questionário proposto, bem como buscou-se manter a proporcionalidade da amostra em relação ao número de acadêmicos matriculados em cada curso. Foi aplicado aos alunos selecionados um questionário composto de 16 questões objetivas, abordando dados biográficos e relacionados à educação sexual, práticas sexuais, aquisição de DST e gravidez não planejada. Os dados foram apresentados por meio de tabelas, analisados estatisticamente por meio do programa Epi Info versão 3.3 e discutidos a partir da literatura pertinente. Este trabalho foi previamente aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal do Ceará. Os entrevistados assinaram Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, que permitia utilizar os dados na pesquisa e garantia-lhes sigilo e anonimato com relação às suas respostas. Com isto, seguimos as diretrizes e normas de pesquisa envolvendo seres humanos da Resolução Nº 196/96 do Conselho Nacional de Saúde-Ministério da Saúde. ANÁLISE E INTERPRETAÇÃO DOS RESULTADOS Para se obter uma caracterização geral da amostra, foram investigados sexo, idade, estado civil, crença religiosa, curso superior e semestre que está cursando e a idade de cada um deles quando ingressou no ensino superior. (Tabela 1) A maioria dos estudantes entrevistados cursava o segundo ano acadêmico (25,7%), seguidos pelos alunos de primeiro e terceiro ano universitário que alcançaram a mesma porcentagem (25,4%). Em seguida, verificam-se os alunos do quarto ano (20,2%) e os estudantes de quinto ano universitário (3,3%). A amostra desta pesquisa foi composta em sua maioria pelo sexo feminino, que representou 66% do total, enquanto a participação masculina foi de 34%. Os estudantes, no momento da entrevista, apresentavam faixa etária predominante de 20 a 22 anos, correspondendo a 56,4% da amostra, seguida pelos intervalos de idade de 17 a 19 anos (23,0%), de 23 a 25 anos (17,2%) e de 26 a 29 anos (3,4%). Com relação ao estado civil dos entrevistados, observa-se que sua maioria foi composta por jovens solteiros, correspondendo a 92,1% do total. Também foram encontradas nesta amostra pessoas casadas (4,6%), pessoas unidas consensualmente (2,6%) e divorciadas (0,7%). Ao se investigar a situação conjugal, pode-se constatar que o adiamento do casamento é uma atitude comum aos jovens universitários, porém esse fato é reflexo do comportamento que está se estabelecendo no Brasil. Em pesquisa realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), ao comparar a idade dos Perfil e Práticas Sexuais Entre Universitários Falcão Júnior JSP et al Tabela 1: Caracterização do perfil geral dos universitários da FFOE. Fortaleza, 2005. Caracterização da amostra Sexo Feminino Masculino Total Idade 17 a 19 anos 20 a 22 anos 23 a 25 anos 26 a 29 anos Total Estado civil Solteiro Casado Divorciado União consensual Total Crença religiosa Católico Evangélico Espírita Não possui religião Outros Não respondeu Total Semestre em andamento Primeiro ou segundo Terceiro ou quarto Quinto ou sexto Sétimo ou oitavo Nono Total Idade de ingresso na Uni Univv er sidade 16 a 18 anos 19 a 21 anos 22 a 25 anos Maior de 26 anos Total Freqüência Porcentagem 200 103 303 66,0% 34,0% 100,0% 70 171 52 10 303 23,0% 56,4% 17,2% 3,4% 100,0% 279 14 02 08 303 92,1% 4,6% 0,7% 2,6% 100,0% 189 38 16 39 13 08 303 62,4% 12,5% 5,3% 12,9% 4,3% 2,6% 100,0% 77 78 77 61 10 303 25,4% 25,7% 25,4% 20,2% 3,3% 100,0% 162 120 20 01 303 53,5% 39,5% 6,5% 0,5% 100,0% cônjuges que se casaram nos anos de 1991 e 2002, averiguouse que, em 2002, as mulheres tinham, em média, 26,7 anos, e os homens, 30,3 anos; enquanto que, em 1991, tanto as mulheres quanto os homens casavam mais cedo (23,7 e 27 anos, respectivamente)12. Pessoas com maior número de anos de estudos adiam as relações matrimoniais e ainda preferem famílias menores, fazendo também um maior uso de métodos anticoncepcionais (quando usando o condom, protegem-se não só de uma gravidez indesejada, mas também de possíveis DSTs)9. A maioria dos pesquisados era católica (62,4%), seguidos pelas pessoas que não possuíam religião (12,9%), evangélicos (12,5%) e espíritas (5,3%), e 4,3% dos estudantes referiram possuir outra crença. Existe influência da religião na sexualidade humana, pois a moral cristã, de um modo geral, associa a Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 58 - 65. 61 Perfil e Práticas Sexuais Entre Universitários Falcão Júnior JSP et al sexualidade ao pecado, com exceção apenas para o aspecto reprodutivo das relações sexuais13. Este aspecto é agravado quando as relações sexuais ocorrem fora do matrimônio, sendo isto o acontece com a maioria dos jovens atualmente. A maioria dos discentes ingressou na universidade dos 16 aos 18 anos (53,5%), seguidos pelas pessoas que iniciaram seu curso superior dos 19 aos 21 anos (39,5%), dos 22 aos 25 anos (6,5%) e com mais de 26 anos (0,3%). Ao se averiguar a continuidade do tipo de parceria nos relacionamentos atuais dos indivíduos investigados, observaram-se os dados apresentados na Tabela 2: Tabela 2: Caracterização da vida sexual atual de universitários da FFOE. Fortaleza, 2005. Não Total Número de parceiros nos últimos três meses 1–3 4–6 Mais de 6 Nenhum Não respondeu Total Freqüência de relações nos últimos três meses Diariamente Semanalmente Mensalmente Outros1 Nenhum Não respondeu Total Porcentagem Parceiro fixo Sim Freqüência V ida Se xual Atual dos Uni Sexual Univv er sitários sitários,, FFOE, 2005 Feminino Masculino Feminino Masculino Feminino Masculino 102 58 17 34 119 92 85,7% 63,0% 14,3% 37,0% 100,0% 100,0% Feminino Masculino Feminino Masculino Feminino Masculino Feminino Masculino Feminino Masculino Feminino Masculino 113 82 1 5 0 3 2 1 3 1 119 92 95,0% 89,1% 0,8% 5,4% 0,0% 3,3% 1,7% 1,1% 2,5% 1,1% 100,0% 100,0% Feminino Masculino Feminino Masculino Feminino Masculino Feminino Masculino Feminino Masculino Feminino Masculino Feminino Masculino 8 4 66 47 32 32 10 6 1 1 2 2 119 92 6,7% 4,3% 55,5% 51,1% 26,9% 34,8% 8,4% 6,5% 0,8% 1,1% 1,7% 2,2% 100,0% 100,0% Nota 1: Alguns entrevistados especificaram em seus questionários freqüencias que não se enquadravam nas respostas propostas, tais como anualmente. Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 58 - 65. Dentre outros riscos que suscetibilizam os indivíduos às infecções por DST, vale ressaltar o aumento desses em proporção à quantidade de parceiros sexuais; as vias de sexo adotadas, dentre as quais o sexo oral e anal expõe a uma carga virótica e bacteriana potencialmente maior; o não-uso do preservativo nas relações sexuais14. Das 211 pessoas investigadas que já iniciaram sua vida sexual, 160 (75,8%) relatam possuir parceiro sexual fixo, enquanto 51 (24,2%) não o possuem. A existência de uma relação de confiança entre os parceiros pode ocasionar a displicência com relação ao uso de métodos contraceptivos que previnam a ocorrência de DST. Questionaram-se os nossos entrevistados sobre o número de parceiros sexuais nos últimos três meses, e foi verificado que a grande maioria, tanto dos homens quanto das mulheres, respondeu que o número variou entre 1 e 3 parceiros (89,1% para homens e 95,0% para mulheres). As mulheres ainda responderam 4 a 6 parceiros (0,8%) ou nenhum (1,7%). Nenhuma mulher respondeu que possuiu mais de 6 parceiros nos últimos três meses. Com relação aos homens, estes responderam que possuíram de 4 a 6 parceiros (5,4%), mais de 6 parceiros (3,3%) ou nenhum parceiro (1,1%). Assim observado, enfatiza-se a vulnerabilidade dos jovens que mais se expõem em proporção a um maior número de parceiros sexuais e a não-proteção pelo não uso do preservativo15. Quando se indagou sobre a freqüência de relações sexuais dos participantes nos últimos três meses, constatou-se que a maioria, tanto dos homens quanto das mulheres, relatou ter relações semanalmente (55,5% para mulheres e 51,1% para os homens). As mulheres relataram as freqüências: mensalmente (26,9%), anualmente (8,4%), diariamente (6,7%), e 0,8% não tiveram relações sexuais nos três meses antecedentes à pesquisa. Os homens relataram as seguintes freqüências: mensalmente (34,8%), anualmente (6,5%), diariamente (4,3%), e 1,1% dos homens não tiveram relação sexual nos últimos três meses. Durante o ato sexual, há uma relevante troca de fluidos sexuais, o que se relaciona diretamente à transmissão de diversos microorganismos, inclusive o HIV, dependendo principalmente da prática sexual realizada. O sexo vaginal e o anal apresentam um grande risco para ambos os parceiros, quando realizados sem camisinha, já que a troca de fluidos é intensa. Na prática de sexo oral, este risco está presente, porém em menor intensidade. Se houver pequenas lesões, o risco é potencialmente aumentado15. Com base na tabela 3, observa-se que a porcentagem dos entrevistados que mais se expõem às infecções é daqueles que sempre têm relação sexual sem camisinha, penetração oral (19,9%), vaginal (14,7%) ou anal (1,4%); e dos que freqüentemente fazem uso dessas práticas, igualmente sendo elas oral (32,2%), vaginal (20,4%) ou anal (3,3%). Já quanto à freqüência das práticas de menor risco, observa-se que 6,6% praticam a masturbação e as carícias, ditas como sexo sem penetração. Os entrevistados que afirmaram sempre fazer o uso de preservativos apresentaram, segundo o tipo de penetração, as 62 Perfil e Práticas Sexuais Entre Universitários Falcão Júnior JSP et al Tabela 3: Caracterização por freqüência das práticas sexuais por uso de preservativo de universitários da FFOE. Fortaleza, 2005. Nunca Raramente Freqüente Sempre Não Respondeu Total Sexo sem penetração % 32 15,2% 88 41,7% 61 28,9% 14 6,6% 16 7,6% 211 100,0% Sem pr eser v a titivv o preser Sexo oral % 44 20,9% 52 24,6% 68 32,2% 42 19,9% 5 2,4% 211 100,0% Sexo vaginal % 75 35,5% 56 25,5% 43 20,4% 31 14,7% 6 2,8% 211 100,0% Sexo anal % 150 71,1% 20 9,5% 7 3,3% 3 1,4% 31 14,7% 211 100,0% Com pr eser v a titivv o preser Sexo oral % 149 70,6% 34 16,1% 19 9,0% 4 1,9% 5 2,4% 211 100,0% Sexo vaginal % 17 8,1% 47 22,3% 64 30,3% 78 37,0% 5 2,4% 211 100,0% Sexo anal % 134 63,5% 32 15,2% 7 3,3% 16 7,6% 22 10,4% 211 100,0% seguintes freqüências: 37,0% (vaginal), 7,6% (anal) e 1,9% (oral). É importante ressaltar que aqueles que afirmaram fazer uso do preservativo com maior freqüência somente estarão protegidos nas relações com o uso de condom. Os indivíduos que usam condom freqüentemente (30,3% vaginal, 9,0% oral e 3,3% anal) apresentam menor risco que aqueles que raramente utilizam o preservativo (22,3% vaginal, 15,2% anal e 16,1% oral) ou nunca (8,1% vaginal, 63,5% anal e 70,6% oral). De acordo com as freqüências apresentadas, verificou-se que alguns jovens, apesar do maior nível de escolaridade, negligenciam o uso do preservativo durante as práticas sexuais, estando vulneráveis à aquisição de DST e a uma gravidez indesejada. São inúmeras as vantagens de se usar o preservativo. Dentre elas, destacam-se: a prevenção de DST/AIDS; a nãointerferência no ciclo menstrual; a divisão da responsabilidade da contracepção entre o homem e a mulher; a distribuição gratuita; e a ausência de efeitos colaterais, com exceção de uma possível irritação, que pode ser solucionada com a troca do tipo de condom e com o uso de lubrificante à base de água16. Contudo, o indivíduo somente estará protegido nas relações que estiver utilizando o preservativo. Por este motivo, a freqüência do uso do condom torna-se um determinante na prevenção a DST e a gravidez. Quando indagados se atualmente possuíam ou não parceiro sexual fixo, observou-se que 52,8% dos participantes o têm, e 47,2%, não. Das 211 pessoas entrevistadas, 199 (94,3%) usam algum método contraceptivo, sendo que destes, 153 (72,5%) possuem parceiro fixo e 46 (21,8%) não possuem. Das 12 (5,7%) pessoas que relataram não utilizar método contraceptivo, 7 (3,3%) possuem parceiro fixo e 5 (2,4%) não o possuem. A maioria dos entrevistados demonstrou uso consistente do preservativo, pois 38,9% das pessoas que iniciaram a vida sexual declararam utilizar preservativo em todas as suas relações sexuais, seguidos por aqueles que usam preservativo com parceiros fixos (20,9%). Já aqueles que apresentam uso inconsistente do preservativo são os representantes da amostra que somente o usam com parceiros esporádicos (10,0%) e os que nunca o usam (8,5%), bem como aqueles que nem sempre o utilizam (18,0%). Não responderam a esta pergunta 3,8% dos sexualmente ativos. Àqueles que em todas as relações fizeram uso e acondicionamento do preservativo de forma correta, submeteram-se à margem de segurança de 99% contra a AIDS e, durante o ano, de 97% para gravidez não planejada, com uso correto, e de 86% se usado sem muitos cuidados 17. Dentre as pessoas que tem maior grau de escolaridade, o uso de preservativo mostrou-se com maior consistência, porém esse não é o único fator que influencia na adoção da prática sexual com o condom. Sabe-se, ainda, que a idade, tipo de vínculo com o parceiro e o nível de informação quanto aos métodos preventivos e DST/AIDS são outros fatores que interferem nessa prática18. Os jovens atualmente possuem alto nível de conhecimento em relação a métodos anticoncepcionais, porém ainda ocorrendo relações sexuais isentas do uso do preservativo19. Acredita-se, assim, que o não-uso do preservativo está fortemente relacionado com a esporadicidade e a falta de planejamento das relações sexuais, dentre outros fatores. Na tabela 4, dentre os entrevistados que utilizam métodos contraceptivos, a camisinha é o método mais aceito, sendo usado por 148 (74,4%) pessoas, seguido pelos anticoncepcionais hormonais, que são usados por 92 (46,2%) Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 58 - 65. 63 Perfil e Práticas Sexuais Entre Universitários Falcão Júnior JSP et al pessoas; coito interrompido, que é usado por 17 (8,5%) pessoas; tabelinha, com 12 (6,0%) usuários; e a camisinha feminina, que foi o método contraceptivo menos usado, apenas com 1 usuário (0,5%). Algumas pessoas relataram utilizar mais de um método contraceptivo. Tabela 4: Classificação por freqüência do uso de método contraceptivo por parceria sexual da FFOE. Fortaleza, 2005. Parceiro sexual fixo Sim Não Total 153 7 160 46 5 51 199 12 211 Qual o método contraceptivo utilizado Camisinha 105 Anticoncepcionais hormonais 81 Coito interrompido 14 Tabelinha 12 Camisinha feminina 1 Outros métodos 2 43 11 3 0 0 0 148 92 17 12 1 2 Usa método contraceptivo Sim Não Total Entre as pessoas que não possuem parceiro sexual fixo e que utilizam algum método contraceptivo, o método mais aceito é a camisinha masculina com 93,5% de aceitação. Entre estes universitários também são aceitos os anticoncepcionais hormonais (23,9%) e o coito interrompido (6,5%). Os outros métodos não foram citados pelas pessoas que não possuem parceiro fixo. É importante ressaltar que métodos como coito interrompido e tabelinha são considerados de baixa eficácia quando utilizados isoladamente. Tabela 5 : Classificação por freqüência de ocorrência de DST da FFOE. Fortaleza, 2005. Freqüência Porcentagem Contraiu DST Não Não respondeu Não sabe Sim Total 174 1 20 16 211 82,5% 0,5% 9,5% 7,6% 100,0% Contraiu qual DST Candidíase Gonorréia Herpes Genital Outros Total 9 1 1 6 17 52,9% 5,9% 5,9% 35,3% 100,0% Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 58 - 65. As doenças sexualmente transmissíveis (DST) constituemse um crescente problema de saúde nas últimas décadas. Embora os dados relacionados às DST não revelem de forma fidedigna sua real magnitude, e não permitam a realização de inferências sobre sua ocorrência no Brasil, a conjugação desses dados com outros obtidos no âmbito internacional permite a realização de estimativas que confirmam sua elevada prevalência. A Organização Mundial de Saúde estima que ocorram cerca de 340 milhões de casos de DST por ano, no mundo20. Na tabela 4, quando se questionou sobre a ocorrência de doenças sexualmente transmissíveis nos participantes, constatou-se que a maioria que iniciou vida sexual referiu nunca ter contraído uma delas (82,5%), seguida daquelas pessoas que não sabem se já contraíram uma DST (9,5%) e das pessoas que já foram contaminadas durante o ato sexual (7,6%). Entre os jovens que já contraíram uma DST, houve 9 (52,9%) casos de candidíase, 1 (5,9%) caso de gonorréia, 1 (5,9%) caso de herpes genital, 6 (35,3%) de outras DST e nenhum caso de AIDS, sífilis, cancro mole ou cancro duro. Ressalta-se que um mesmo jovem referiu ter contraído duas diferentes DST. As DST acarretam não somente afecções físicas, que podem levar às disfunções sexuais, esterilidade, danos fetais, abortamentos, alguns tipos de câncer e até à morte, mas também geram impactos psicossociais em seus portadores. Além disso, os custos gerados para o tratamento da crescente demanda acarretam um importante impacto no sistema de saúde, produzindo gastos de milhões todos os anos, decorrentes de internações e procedimentos para o tratamento de suas complicações. E, embora a prevenção e o controle das DST estejam sendo priorizados, essas ainda se constituem um dos mais comuns problemas de saúde21. Outro fator também passível de prevenção, aqui investigado por sua considerável importância como fator modificador de papéis sociais, especialmente quando se trata de pessoas na faixa etária aqui especificada, foi a freqüência de gravidezes ocorridas nesse grupo de universitários. Através desse inquérito obtiveram-se os dados que seguem, na tabela 6. Nesta pesquisa foram encontradas 18 gestações. Duas mulheres relataram ter tido duas gestações, nove mulheres tiveram somente uma gestação e os cinco homens que relataram ter engravidado suas parceiras o fizeram somente uma vez. Essas gestações resultaram, na maioria das vezes, em crianças nascidas vivas (66,7%), e as outras em aborto provocado (22,2%) e aborto espontâneo (11,1%). Constatou-se que das 16 pessoas que engravidaram, 3 (18,75%) eram casadas, 2 (12,5%) eram divorciadas, 8 (50,0%) eram solteiras e 3 (18,75%) viviam em situação de uniões consensuais. Verificou-se que a maioria dos casos de gravidez aconteceu entre universitários solteiros (50,0%). O namoro pode ser a principal maneira como universitários mantêm uma relação afetivo-sexual, favorecendo, juntamente com a esporadicidade e o não- planejamento do ato sexual, o fato de a maioria das gravidezes ter ocorrido fora de uniões reconhecidamente estáveis. O namoro é o principal cenário das relações sexuais 64 Perfil e Práticas Sexuais Entre Universitários Falcão Júnior JSP et al Tabela 6: Caracterização por freqüência das gestações dos universitários da FFOE. Fortaleza, 2005. Freqüência Porcentagem Ocor r eu ggrr a vide videzz Sim Não 16 287 5,29% 94,71% Sexo Feminino Masculino Total 5 11 16 31,2% 68,8% 100,00% Estado civil Casado Solteiro Divorciado União consensual Total 3 8 2 3 16 18,75% 50,00% 12,50% 18,75% 100,00% Usa método contraceptivo Camisinha Anticoncepcional hormonal Coito interrompido Tabelinha Camisinha feminina Outros 4 13 4 1 0 1 25,0% 81,25% 25,0% 6,25% 0,0% 6,25% Contraiu DST Candidíase Herpes genital Total 3 1 4 18,75% 6,25% 100,0% Resultado da gravidez Aborto provocado Aborto espontâneo Nascido vivo Nascido morto Total 4 2 12 0 18 22,2% 11,1% 66,7% 0,0% 100,0% e é uma variável impor tante para a compreensão do comportamento sexual e reprodutivo9. Após a experiência de pelo menos uma gestação, poucos universitários (25,0%) utilizam condom, contrastando com um alto índice do uso de anticoncepcionais (81,25%). A utilização do anticoncepcional hormonal gera certa acomodação com relação ao uso do condom, fazendo com que 25,0% dos universitários que afirmaram gravidez nesta pesquisa já tenham contraído alguma DST. Apesar de o conhecimento ser importante, o uso de contraceptivos, tanto de barreira como hormonais, não estão sempre associados aos conhecimentos22, mesmo com maior nível de instrução. A maioria dos entrevistados obteve informações acerca de sexualidade entre amigos, ou seja, uma fonte que é considerada infiel, já que as pessoas podem transmitir informações errôneas acerca do tema, inclusive pela falta de experiência. Os jovens recebem informações limitadas e inadequadas, proveniente de amigos, de pessoas pouco preparadas para esta função23. CONCLUSÕES O tipo de prática sexual realizada pode determinar uma maior ou menor exposição aos riscos. Os estudantes entrevistados parecem ser conscientes disto, pois, no tipo de relação sexual comprovadamente mais exposto a riscos para a saúde, eles utilizavam preservativo. Os resultados encontrados mostram que, mesmo se tratando de pessoas com um maior nível de escolaridade, não há uma grande diferença quanto às porcentagens daqueles que tomam os devidos cuidados em relação àqueles que negligenciam a segurança, variando de acordo com a prática sexual adotada. De acordo com a pesquisa, os universitários utilizam com maior freqüência o condom quando realizam sexo vaginal e menos quando do sexo oral. Destaca-se o baixo número de universitários que usam o condom em todas as relações sexuais. Os demais usam apenas com determinados tipos de parceiros (fixo ou esporádico) ou até mesmo nunca usam. Isto nos mostra que estes universitários, conscientemente ou não, podem ter determinados critérios para o uso do preservativo, estando sujeitos aos riscos inerentes a uma relação sexual desprotegida. Verificou-se, ainda, o alto índice do uso de métodos contraceptivos e a baixa ocorrência de gravidez, de aborto e DST. O método anticoncepcional mais relatado foi a camisinha, tanto por aqueles que não têm parceiro fixo como por aqueles que o possuem. Entendemos que isto se deve à dupla função do condom: prevenção de DST e de gravidez indesejada. O relacionamento com parceiro fixo foi o tipo mais citado pelos universitários, o que significa um menor risco à aquisição de DST, pois quanto menor o número de parceiros, menor o risco de adquirir uma DST. Esse estudo revelou que, mesmo lidando com pessoas de um alto nível intelectual (universitários), ainda se faz necessária a implantação de políticas educacionais no âmbito da sexualidade, visando à orientação de jovens quanto às práticas sexuais, a fim de reduzir a incidência de DST/AIDS e gravidez indesejada nessa população; tornar os jovens mais responsáveis e mais atentos quanto aos cuidados com a saúde sexual deles e de seus parceiros e, imprescindivelmente, tornálos multiplicadores da saúde, com a dispersão de informações confiáveis e, assim, diminuir a exposição dos jovens a riscos que prejudiquem a saúde. Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 58 - 65. 65 Perfil e Práticas Sexuais Entre Universitários Falcão Júnior JSP et al Referências 1. Freitas F, Menke CH, Rivore W, Passos EP. Rotinas em ginecologia. 4ªed. Porto Alegre (RS): Artmed; 2003. 2. Berger I, Hutz CS. O perfil do educador gaúcho em relação à sexualidade. Rev Bras Sex Hum 1999 jan/ jun; 10 (1): 89-118. 3. 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Esc Anna Nery Rev Enferm 2005 ago; 9 (2): 214-20. 10. Ministério da Saúde (BR). Coordenação Nacional de DST e AIDS. Pesquisa de conhecimento, atitudes e práticas na população brasileira de 15 a 54 anos, 2004. Bol Epidemiol AIDS, 2004; [on line] 18 (1): 18-24 [citado 13 out 2005] Disponível em: <http://www.aids.gov.br/ final/dados/BOLETIM2.pdf.> 11. Wood GL, Habeer. Pesquisa em enfermagem: métodos, avaliação crítica e utilização. 4ª ed. Rio de Janeiro (RJ): Guanabara Koogan; 2001. 12. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Síntese de indicadores sociais: [on-line] [citado 05 out 2005]. Disponível em: < h t t p : / / w w w. i b ge . go v. b r / h o m e / p r e s i d e n c i a / n o t i c i a s / 13042004sintese2003html.shtm.> 13. Ministério da Saúde (BR). Secretaria de Políticas de Saúde. Coordenação Nacional de DST e Aids. Guia de prevenção das DST/Aids e cidadania para homossexuais. Brasília (DF); 2002. 14. Smeltzer SC. 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Infecciones de transmisión y otras infecciones del tracto reproductivo: una guía para la práctica basica. [on line] [citado 25 jan 2006]. Disponível em: http://www.who.int/ reproductivehealth/publications/es/stis_gep/ text_es.pdf 21. Loudermilk DL, Perry SE, Bobak IM. O cuidado em enfermagem materna. 5ª ed. São Paulo (SP): Artmed; 1999. 22. Bello MV, Silva JLP. Conhecimento, atitude e prática sobre métodos anticoncepcionais entre adolescentes gestantes. Rev Saúde Pública 2004 ago; 38 (4): 479-87 23. Gomes WA, Costa COM, Sobrinho CLN, Santos CAST, Bacelar EB. Nível de informação sobre a adolescência, puberdade e sexualidade entre adolescentes. J Pediatr 2002; 78 (4):301-08 Sobre os Autores José Stênio Pinto Falcão Júnior Acadêmico do curso de Enfermagem da Universidade Federal do Ceará. Bolsistas do Programa Especial de Treinamento-PET Emeline Moura Lopes Acadêmica do curso de Enfermagem da Universidade Federal do Ceará. Bolsistas do Programa Especial de Treinamento-PET Lydia Vieira de Freitas Acadêmica do curso de Enfermagem da Universidade Federal do Ceará. Bolsistas do Programa Especial de Treinamento-PET Samia Thábida de Oliveira Rabelo Acadêmica do curso de Enfermagem da Universidade Federal do Ceará. Bolsistas do Programa Especial de Treinamento-PET Ana KKarina arina Be Pinheiroo Bezz er errr a Pinheir Enfermeira; Doutora em Enfermagem; Docente do Departamento de Enfermagem – FFOE/UFC; Co-tutora do PET-Enfermagem/UFC Lorena Barbosa Ximenes Enfermeira; Doutora em Enfermagem; Docente do Departamento de Enfermagem – FFOE/UFC; Tutora do PET-Enfermagem/UFC Recebido em 07/06/2006 Reapresentado em 26/02/2007 Aprovado em 06/03/2007 Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 58 - 65. 66 Estresse no Cotidiano dos Alunos de Enfermagem da UFPI Monteiro CFS et al ESTRESSE NO COTIDIANO ACADÊMICO: O OLHAR DOS ALUNOS DE ENFERMAGEM DA UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ Stress in the Academic Daily: A Nursing Student View from the Federal University of Piauí - Brazil Estrés en el Cotidiano Académico: La Visión de los Estudiantes de Enfermería de la Universidad Federal del Piauí - Brasil Claudete Ferreira de Souza Monteiro Jairo Francisco de Medeiros Freitas Artur Assunção Pereira Ribeiro Resumo Este estudo objetivou conhecer situações geradoras de estresse vivenciadas pelos alunos do Curso de Graduação em Enfermagem da Universidade Federal do Piauí – UFPI no âmbito acadêmico. A metodologia constou de estudo exploratório, qualitativo, com produção de dados por meio de entrevista semi-estruturada aplicada a 22 alunos.Os resultados possibilitaram a construção das categorias de análise: situações estressoras, sintomas do estresse e desempenho das atividades acadêmicas. Constatou-se que as situações de estresse estão presentes durante o transcorrer do curso, com relevâncias em determinados momentos, como o ingresso na universidade, o cursar da disciplina Farmacologia para Enfermagem e o cumprimento de carga horária semanal irregular em períodos específicos do curso. Constatou-se que os sintomas apresentados pelos alunos foram de aspectos fisiológico e emocional. Por fim, revelou-se que as situações de estresse repercutem de forma negativa no desempenho das atividades acadêmicas desenvolvidas pelos alunos. Pala vr as-c ha alavr vras-c as-cha havve: Estresse. Programas de Graduação em Enfermagem. Ensino Superior. Abstract Resumen This study aimed at know stress’ situations lived by graduate students of nursing from Federal University of Piauí (UFPI) in the academic scope. The methodology consisted of an exploratory study, qualitative, with data collection through semistructured interview applied to 22 students. The results made possible the construction of categories of analysis: stressor situations, stress symptoms and the development of academic activities. It has been verified that stress situations are present during the course, with relevance in certain moments, such as the ingression in the university, the attending pharmacology course for nursing and irregular weekly course load in specific periods of the course. It was evidenced that the symptoms presented by the students was of physiological and emotional aspects. At last, was concluded that stress situations have a negative influence upon the development of academic activities developed by students. Este estudio tubo el objetivo de conocer situaciones generadoras de estrés vivenciadas por alumnos del Curso de Graduación en Enfermaría de la Universidad Federal del Piauí (UFPI) en el ámbito académico. La metodología constató de un estudio exploratorio, cualitativo, con colecta de dados basada en entrevistas semi-estructurada a 22 alumnos. Los resultados posibilitaron la construcción de categorías de análisis: situaciones de estrés, síntomas de estrés y el desempeño de las actividades académicas. Fue constatado que las situaciones de estrés están presentes durante el transcurso del curso, con relevancia en determinados momentos, tales como el ingreso en la universidad, como el curso de Farmacología para Enfermería y carga horaria semanal irregular en períodos específicos del curso. Los síntomas presentados por alumnos fueran de aspecto fisiológico y emocional. Por fin, se concluye que las situaciones de estrés repercuten de forma negativa en el desempeño de las actividades académicas desarrolladas por alumnos. Keyw or ds: Stress. Education, Nursing, Diploma Programs. ywor ords: Palabras clave: Estrés. Programas de Graduación en Enfermería. Enseñanza Superior. Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 66 - 72. Estresse no Cotidiano dos Alunos de Enfermagem da UFPI Monteiro CFS et al INTRODUÇÃO A sociedade, nas últimas décadas, tem utilizado a palavra estresse e suas derivações de forma corriqueira e quase instintiva. Sem maiores reflexões, diferentes formas de mídia colaboram para este acontecimento, o que generaliza e simplifica os reais significados da problemática do estresse. No transcurso da vida, em determinadas ocasiões, as pressões biopsicossociais são responsáveis por desequilíbrios na homeostase do indivíduo, prejudicando seu desempenho nas mais variadas circunstâncias. Essas pressões geradoras de estresse são vivenciadas em diversas oportunidades tanto na vida pessoal, social, profissional e, não menos diferente, durante a trajetória acadêmica. No ambiente acadêmico, a resolução de problemas se faz imperiosa. Além disso, é sabido que os estudantes universitários passam por momentos de mudança, desenvolvimento, frustração, crescimento, temores e angústias. Assim, o ambiente que contribuiria na edificação do conhecimento e ser a base para as suas experiências de formação profissional se torna, por vezes, o desencadeador de distúrbios patológicos, quando ocorre uma exacerbação da problemática do estresse acadêmico nos estudantes. Devido à complexidade do curso de enfermagem e o lidar com os limites humanos, o estudante desse curso freqüentemente desenvolve sentimentos de incapacidade frente às atividades exigidas durante sua formação profissional. Isto faz com que o mesmo possa desenvolver problemas advindos do estresse como baixa capacidade de concentração e memorização, favorecendo a diminuição do rendimento acadêmico e da qualidade da assistência de enfermagem durante os estágios. Como aquele que irá prestar cuidado, o estudante de enfermagem também necessita “estar sendo cuidado” e manter sua saúde física e mental em níveis adequados. Historicamente, o termo estresse (do inglês, “stress”) foi utilizado inicialmente na Física para traduzir o grau de deformidade sofrido por um material quando submetido a um esforço ou tensão. Em 1956, Hans Selye, endocrinologista americano, transpôs o significado para a Fisiologia, indicando-o como esforço de adaptação do organismo para enfrentar situações que considere ameaçadoras à sua vida e ao seu equilíbrio interno, as quais podem ser definidas como estressores.¹ O estresse é desencadeado a partir de “estressores” advindos do meio externo (como frio e calor), do ambiente social (como o trabalho insalubre) e do mundo interno (como as alegrias, os medos e angústias). Quando ocorre após o esforço em adaptação e há sensação de realização pessoal é dito eustresse. Quando porém ocorre quando há rompimento do equilíbrio biopsocossocial por uma sobrecarga ou falta de esforço, ocorrendo manifestações de doença é chamado distress. ² Stacciarini e Tróccoli 3 expõem três formas de definição para estresse: (1) como estímulo, com o enfoque no impacto dos estressores; (2) como resposta, quando examina a tensão produzida pelos estressores; e (3) como processo, quando entendido a partir da interação entre pessoa e ambiente. Essas Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 66 - 72. 67 diferenças de abordagem têm propiciado o questionamento se o estresse é uma demanda do ambiente, uma característica do indivíduo ou uma interação entre indivíduo e o ambiente. Neste estudo, utilizou-se a definição de estresse apontada por Molina4:18 como “qualquer situação de tensão aguda ou crônica que produz uma mudança no comportamento físico e no estado emocional do indivíduo”. Exige adaptações tanto físicas quanto psicológicas, entretanto o potencial do agente estressor pode ser maior ou menor dependendo do sujeito que o sente ou percebe. De certa maneira, a compreensão do mecanismo fisiológico de uma resposta ao estresse é necessária. Os caminhos do estresse são diversos e envolvem muitas regiões do cérebro. De acordo com Salposky5, a caracterização fisiológica da resposta estressora ocorre da seguinte maneira: (1) quando uma ameaça é percebida ocorre a ativação dos centros sensoriais, das áreas de raciocínio e da amídala (estrutura cerebral responsável por percepção e resposta ao medo); (2) a amídala libera o hormônio de controle da corticotropina (CRH), estimulando o tronco encefálico; (3) a via espinhal transmite impulsos do tronco até as glândulas adrenais ocasionando a produção de epinefrina (adrenalina) e glicocorticóides; (4) estes hormônios agem nos músculos, coração, pulmões, entre outros órgãos, para preparar o corpo para “luta” ou “fuga”. Se o estresse se torna crônico, há uma indução de uma região do cérebro chamada locus coereleus a liberar norepinefrina. Esse neurotransmissor, por fim, induz a amídala à produção de mais CRH com a concomitante reativação do sistema indutor do estresse. Ou seja, quanto mais se deixa de controlar o estresse mais este se torna evidente por conta da retroalimentação de seu mecanismo gerador, levando a uma exacerbação de sua sintomática. Entre os sinais e sintomas que ocorrem com maior freqüência, os sintomas físicos são os mais relatados: aumento da sudorese, tensão muscular, taquicardia, hipertensão, hiperatividade, náuseas, mãos e pés frios. Em termos psicológicos, vários sintomas podem ocorrer tais como: ansiedade, tensão, angústia, insônia, alienação, dificuldades interpessoais, dúvidas quanto a si própria, preocupação excessiva, inabilidade de concentrar-se em outros assuntos que não o relacionado ao estressor, dificuldade de relaxar, ira e hipersensibilidade emotiva6. Caso não haja uma resolutividade à situação estressora ou se nada é feito para aliviar a tensão, o organismo estará cada vez mais exaurido e sem energia. Na área física, muitos tipos de doenças podem ocorrer, dependendo da herança genética. Afecções cardiovasculares, funções imunológicas comprometidas, além de problemas como ansiedade, depressão e crises de pânico são comprometimentos que podem ter origem em situações de estresse contínuo ou não resolvido6. É justamente na resolução ineficaz da problemática e na sobrecarga de estímulos estressores durante a formação universitária que está fundamentada a premissa de que estudantes de enfermagem estão propícios em apresentar características evidenciáveis de estresse. O estudante de enfermagem, ao ingressar na vida acadêmica, passa por diversas situações de crises, vivenciando 68 Estresse no Cotidiano dos Alunos de Enfermagem da UFPI Monteiro CFS et al diversos sentimentos. Entre esses destacam a formação de um novo ciclo de amigos, adaptação a novos horários, problemas financeiros, preocupações com seu futuro mercado de trabalho, afastamento de seu ambiente familiar, as cobranças, o encontro com a dor, o sofrimento, a doença e a morte de pessoas são pontos que favorecem o desequilíbrio emocional. Todos esses fatores podem ser entendidos como estressores, desencadeando o estresse e fazendo com que o sujeito não consiga se adaptar a novas situações7. quais se encontravam na faixa etária entre 19 (dezenove) e 43 (quarenta e três) anos. Em relação ao momento no curso, 10 (dez) dos alunos se encontravam matriculados nos períodos da formação básica e 12 (doze) na fase profissionalizante. Os resultados foram obtidos por meio das respostas apresentadas pelos sujeitos aos questionamentos sobre as situações geradoras de estresse no cotidiano acadêmico do curso. Esses resultados são analisados e discutidos em três categorias: METODOLOGIA Percebemos que, ao longo da graduação em enfermagem da UFPI, os alunos se defrontam com variadas situações estressoras, as quais se fazem presentes durante o transcorrer do curso. Como essas circunstâncias são notadamente deflagradas e vivenciadas desde os primeiros períodos acadêmicos, a percepção desta problemática pelos sujeitos adquire destaque. Diante da problemática apresentada, figura como objetivo do estudo conhecer situações geradoras de estresse advindas do cotidiano acadêmico do curso de enfermagem – bacharelado, da Universidade Federal do Piauí (UFPI). Trata-se de um estudo exploratório descritivo, realizado segundo a abordagem qualitativa. Os termos exploratório e descritivo são utilizados para buscar informações precisas sobre as características dos sujeitos da pesquisa, grupos, instituições e ocorrência de um determinado fenômeno8. A análise do tipo qualitativa é caracterizada como “modos de inquisição sistemática preocupada com a compreensão dos seres humanos e da natureza de suas transações consigo mesmos e com seus arredores”9:270. O cenário de estudo foi o Departamento de Enfermagem da UFPI, Campus Ininga, situado na cidade de Teresina, PI. Os sujeitos da pesquisa foram os alunos regularmente matriculados no curso de enfermagem - bacharelado. Como instrumentos de coleta de dados foram utilizados o roteiro de entrevista, fitas cassete e gravador. A entrevista é um tipo de pesquisa em que o entrevistador faz questionamentos verbais ao sujeito da pesquisa 8. A escolha dos sujeitos que fizeram parte da pesquisa ocorreu de forma aleatória entre os alunos, até que se estabeleceu a saturação das falas, a qual, de acordo com Polit e Hungler9, refere-se à sensação de fechamento vivenciada pelo pesquisador quando a produção de dados deixa de trazer novas informações. Os sujeitos que aceitaram participar da pesquisa foram informados dos objetivos e da preservação do seu anonimato. Após estas informações, os sujeitos ofereceram seu consentimento autorizando a divulgação de seus discursos sobre o fenômeno tanto no meio acadêmico da UFPI como em publicações cientificas da área. Para tanto assinaram um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, em conformidade com a Resolução 196/96. O projeto foi submetido ao Comitê de Ética em Pesquisa da UFPI e autorizado para a realização do estudo. Foram realizadas leituras e re-leituras para identificar núcleos comuns nos discursos a fim de categorizá-los. A analise realizada foi, portanto, do tipo qualitativo e subsidiada no referencial teórico sobre o fenômeno estudado. DISCUSSÃO E ANÁLISE Foram entrevistados 22 (vinte e dois) alunos, sendo 15 (quinze) do sexo feminino e 06 (seis) do sexo masculino, os Situações Estressoras [...] um período em especial foi o primeiro período. Era tudo novidade para mim e eu não sabia como contornar ainda a situação. (Aluno c, sexo feminino, formação profissionalizante) [...] No terceiro período, quando a gente ia começar a disciplina de fisiologia. Todo mundo ansioso com a disciplina, por que tem laboratório, que tem aquelas práticas de trabalhar com rato, com cachorro [...] (Aluno h, sexo masculino, formação profissionalizante) Bernik¹0 afirma que mudanças no decurso da vida, sejam elas boas ou ruins, são caracterizadas por possuir o potencial efeito de repercutir em condição de estresse. O autor exemplifica mudança com situações de casamento, nascimento de um filho, divórcio, iniciar um novo emprego, morar longe da família, entre outras. No nosso estudo, a mudança que existe a princípio é o ingresso na universidade. O aluno inicia uma nova fase em sua vida e isso é um fato claramente caracterizado como mudança, e, portanto, é considerado como uma situação estressora. Ou seja, esta é traduzida em circunstâncias de adaptabilidade imediata como o ingresso na graduação ou o cursar de disciplinas que exijam um primeiro contato com práticas laboratoriais. O cumprimento das atividades acadêmicas distribuídas em uma carga horária dividida em dois turnos é também apontado pelos alunos como uma situação geradora de estresse. Os períodos acadêmicos, as atividades são distribuídas ao longo da semana nos dois turnos (manhã e tarde), pois não há no curso um turno único para cursar as disciplinas, o que os alunos apontam como situação estressora durante o curso. [...] tem dias que você assiste aula o dia inteiro, tem outros dias em que você não assiste aula de jeito nenhum. (Aluno v, sexo feminino, formação básica) Está sendo muito corrido, está tomando muito meu tempo e eu não estou conseguindo me organizar. (Aluno g, sexo masculino, formação profissionalizante) Eu fico época sobrecarregada e tem épocas em que passo dias até bem livres, assim, sem afazeres acadêmicos. É mais é essa inconstância. (Aluno r, sexo masculino, formação profissionalizante) Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 66 - 72. 69 Estresse no Cotidiano dos Alunos de Enfermagem da UFPI Monteiro CFS et al Molina4 contempla que a exacerbação no cumprimento de tarefas pelo homem no cotidiano das grandes cidades é uma das mais marcantes situações geradoras de estresse. A elevada dose diária dos mais diversos afazeres torna o homem urbano uma vítima da construção do seu próprio progresso e o estresse é então deflagrado. Em cer tos períodos do curso, a irregularidade dos horários destinados à realização das atividades, no transcorrer da semana, repercute de forma negativa no que é lembrado pelos alunos. Em certos momentos, há um excesso de atividades, o que ocasiona uma inabilidade de atender às demandas, gerando tensão e, por conseguinte, estresse. Outras vezes, o aluno se defronta com situações livres de afazeres acadêmicos, tornando-se confuso e inapto. E é justamente esta percepção confusa quanto à realização de suas atividades acadêmicas que resulta em sentimentos típicos de estresse nos alunos, como desgaste e sentimentos de inabilidade. Como exposto anteriormente, encontramos que as circunstâncias estressoras estão presentes em diversas ocasiões da graduação. Contudo, em determinados períodos do curso, a situação de estresse é apontada de forma notória e mais incisiva em detrimento de outros. Há um marcante momento referido por muitos alunos: o cursar da disciplina “Farmacologia para Enfermagem”, disposta no quarto período da formação acadêmica. A situação de estresse que melhor caracteriza foi no quarto período, durante farmacologia (Aluno b, sexo feminino, formação profissionalizante) [...] é uma disciplina bastante pesada, do curso em si, em que você tem que se dedicar muito. Praticamente ter uma dedicação bastante priorizada desta em relação às outras. (Aluno e, sexo masculino, formação profissionalizante) Às vezes a gente tinha aula prática, tinha aula teórica e tinha prova no mesmo dia. É uma situação de estresse, ansiedad, e ficou marcado especificamente em farmacologia. (Aluno s, sexo feminino, formação profissionalizante) De acordo com o seu plano de curso, a disciplina “Farmacologia para Enfermagem” oferece as seguintes atividades: aulas teóricas, aulas práticas (consistindo em atividade experimental com uso de drogas e animais de laboratório), grupos de discussão (discussão em grupos de temas previamente estudados), pequenos testes (avaliações compostas por pequena quantidade de questões a respeito do conteúdo de uma aula prática), seminários e avaliações teóricas. As atividades são distribuídas de tal forma no calendário acadêmico que em alguns dias há a realização de mais de uma dessas atividades. Podemos considerar que a forma do processo educacional utilizado pela disciplina com várias atividades em um mesmo dia torna-se estressante para o aluno, conforme o depoimento do alunos. [...] você vê que tem uma situação que está lhe prejudicando e prejudicando seu desempenho, que você poderia se sair bem melhor e você não poder fazer Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 66 - 72. nada. É muita exigência e sempre aquela sensação de que não sabe o que vai acontecer se vai tirar boa nota ou não, se estuda só farmacologia ou não. (Aluno v, sexo feminino, formação básica) Então, basicamente, fica a sensação de impotência mesmo, de ficar esperando ver o que vai dar. (Aluno n, sexo masculino, formação básica) Acreditamos que é justamente nesta neutralidade que reside uma das gêneses do processo de estresse do aluno que cursa a disciplina de Farmacologia para Enfermagem. Além da caracterizada exacerbação no número de atividades diárias, fundamentada anteriormente como circunstância estressora, encontramos na passividade do aluno uma fonte irradiadora de estresse. Isto é defendido por Lipp 6, quando afirma que a ausência ou a redução da participação do indivíduo em eventos que compõem e influenciam diretamente na sua vida implica estresse. Estresse esse que é derivado de sentimentos de frustração e da impressão tida por parte do homem de não estar sendo o responsável, ao menos em par te, pelos acontecimentos constituintes de seu dia-a-dia. Sintomas do Estresse A investigação da sintomática de estresse vivenciada pelos alunos revelou uma problemática tanto de âmbito fisiológico quanto de caráter psico-emocional. No entanto, o questionamento resultou num acentuado predomínio de sintomas de ordem emocional, tendo esses características de subjetividade. Destacou-se, ainda, a demonstração por parte dos alunos de sentimentos, muitas vezes, de revolta, passividade e frustração. Os sintomas são taquicardia, ansiedade, falta de paciência, suor nas mãos, às vezes tremor, às vezes tinha dificuldade pra falar, a voz não saía. (Aluno l, sexo feminino, fase profissionalizante). Os sintomas foram palpitação, tremedeira e pele fria. (Aluno m, sexo feminino, fase profissionalizante). Brunner e Suddart¹¹ relatam os mecanismos da resposta estressora, a qual é constituída inicialmente pela percepção de uma situação geradora de estresse pelo cérebro. É atribuído um significado àquela situação e há o desencadeamento de uma resposta efetuada por meio de mecanismos neuroquímicos com condução pelas vias neuroendócrinas. Ocorre primeiramente a descarga inicial do sistema nervoso simpático, a qual se dá por meio da liberação hormonal de noradrenalina e adrenalina, esta última pelas glândulas adrenais, visando aumentar a função de órgãos vitais e determinar o estado de alerta geral do organismo. A freqüência cardíaca aumenta, as pupilas dilatam, a pressão arterial eleva-se e há a constrição de vasos sanguíneos da pele e extremidades. Por conta disso, subjetivamente, o indivíduo refere sentir os pés frios, pele e mãos pegajosas, calafrios e palpitações. O indivíduo também se encontra tipicamente tenso devido ao aumento da contração muscular nas regiões do ombro e pescoço, além de apresentar respirações rápidas e superficiais. Tudo isso contribui para dificular 70 Estresse no Cotidiano dos Alunos de Enfermagem da UFPI Monteiro CFS et al o processo da verbalização. Ressalta-se, por fim, que esta sintomática está inter-relacionada e presente na fase inicial de uma resposta estressora, ou seja, na fase de alarme. Em alguns depoimentos foram relatados outros sintomas mais freqüentemente relacionados às fases secundárias de resposta ao estresse. [...] eu sentia dor de cabeça, sonolência, muita sonolência, desânimo mesmo. (Aluno t, sexo feminino, formação profissionalizante) Me irrito bastante, dor de cabeça [...] Não me concentro mais em nada com o que eu tenho que resolver. (Aluno f, sexo masculino, formação profissionalizante) [...] sintomas, pode-se dizer que nervosismo é um deles. Falta de concentração ocorre muito da minha parte. (Aluno e, sexo masculino, formação profissionalizante) A fase secundária de resposta ao estresse, ou fase de resistência, de acordo com a “Síndrome da Adaptação Geral” proposta por Selye 12, é caracterizada por reações de manutenção do estado de alerta. O autor afirma que o organismo busca ajustar-se continuamente à situação em que se encontra. A partir daí, ocorre a provisão de fontes de energia rapidamente metabolozáveis, ou seja, uma elevada produção e consumo de glicose. Toda essa mobilização de energia traz algumas conseqüências como cefaléia, sensação de desgaste, fraqueza, sonolência, falta de concentração e lapsos de memória. Recentes pesquisas relacionam estes últimos sintomas aos efeitos nocivos do estresse em uma das áreas do cérebro responsável pela memorização e aprendizado, o hipocampo. Sapolsky 5 aponta que a perduração do estresse aumenta a produção de glicocorticóides. Estes hormônios atuam em áreas hipocampais e possuem a propriedade de ocasionar a atrofia de neurônios e suas ramificações, implicando dificuldades de concentração e de memória. Em outros depoimentos demonstraram problemática de ordem emocional caracterizada mais subjetivamente. O que significa dizer que muitos alunos verbalizaram sentimentos advindos da representação que as situações estressoras ofereciam a eles.. Isto é exemplificado nas seguintes falas: [...] num momento como esse é comum o sintoma de raiva. Também de passividade. (Aluno h, sexo masculino, formação profissionalizante) Os sintomas foram muita raiva, muito cansaço e desestímulo (Aluno i, sexo feminino, formação básica) Muito nervosismo, irritação, falta de paciência, agressividade. Fico agressiva com as pessoas mais próximas a mim. (Aluno o, sexo feminino, formação básica) Essa obliqüidade no conteúdo das respostas poderia ser justificada pelo fato de o estresse ser uma problemática que traz ampla repercussão no organismo humano. Lazarus e Folkman 13 defendem que o sujeito vítima de uma situação de estresse desenvolve reações de adaptação qualificadas como bem ou mal sucedidas. Perturbações orgânicas ligadas ao estresse possuem uma etapa fisiológica, a qual sabemos não ser administrada voluntariamente pelo indivíduo. Mas também existe a fase na qual estão incluídas funções cognitivas, emocionais e comportamentais que refletem em outros tipos de sensações. No processo de adaptação a uma nova circunstância, o indivíduo controla a relação com o meio a fim de manter os estados físico, psicológico e social estáveis e controlar estressores potenciais, antes que estes se tornem um risco. Ter-se-á efetividade quando o comportamento utilizado amenizar os sentimentos desconfortáveis associados às ameaças. Ocorrerá ineficácia, se a situação ameaçadora não for manejada de forma eficaz, resultando em crise. Esta, se não for resolvida, pode implicar desequilíbrios traduzidos pelos sentimentos de raiva, agressividade, passividade, cansaço e desestímulo, os quais tiveram menção nos depoimentos. Situações Estressoras e o Desempenho das Atividades Acadêmicas Observamos que o estresse vivenciado pelos alunos implica de forma negativa no desenvolvimento das suas atividades acadêmicas. Em suas falas, muitos alunos expuseram que a repercussão das situações estressoras conduz a problemas de ordem motivacional em relação às atividades desempenhadas durante o curso. Outra interferência relatada é o próprio desgaste advindo do estresse ao atuar como agente condutor de baixo rendimento escolar. A primeira coisa que acontece é que você fica desmotivado. E essa desmotivação faz com que você não procure mais desempenhar as suas atividades acadêmicas com o mesmo vigor e com o mesmo afinco de antes. (Aluno a, sexo masculino, formação profissionalizante) Até pra vir pra universidade eu vinha porque eu tinha a obrigação de querer passar, mas eu não tinha aquela vontade de assistir aula, aquela vontade de participar [...]. (Aluno i, sexo feminino, formação profissionalizante) Eu costumo faltar às aulas. Tenho muitas faltas. Então eu vou perdendo os assuntos, vou perdendo o interesse pelo curso, pelas matérias e o desempenho vai diminuindo cada vez mais. (Aluno q, sexo feminino, formação básica) O homem, ao enfrentar uma situação estressora, possui dois caminhos: adaptar-se positivamente ou negativamente àquela situação. A adaptação positiva aos agentes agressores representa uma situação de saúde do ponto de vista biopsicossocial. Já a doença advém de um resultado negativo oriundo da má adaptação à circunstância estressora. Somente haverá respostas positivas de adaptação quando o homem adquire sucesso no enfrentamento dos estressores. Caso contrário, sobrevém as respostas de má adaptação, o que leva o homem condições consideradas como doenças da má adaptação14. Quando os alunos vivenciam situações estressoras com adaptação negativa ocorrem sentimentos de retração. Esta retração é por fim traduzida em sensações de apatia e falta de motivação para realização das atividades acadêmicas. De acordo com o conceito exposto por Pereira e Fávero15, “motivação” é considerada como a inclinação para ação que tem origem em um motivo. O motivo seria uma necessidade que, ao atuar sobre o intelecto, faz a pessoa movimentar-se ou agir. Percebemos, então, que alguns alunos, após sofrerem uma má Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 66 - 72. 71 Estresse no Cotidiano dos Alunos de Enfermagem da UFPI Monteiro CFS et al adaptação a determinada circunstância de estresse, obtêm a sensação de não “se movimentarem” ao exprimirem subjetivamente como problemática a falta de motivação. E isto possui caráter negativo no discurso destes alunos, por comprometer desfavoravelmente o desempenho das atividades acadêmicas. Observamos que muitos alunos relacionam os danos inerentes da problemática do estresse com uma baixa produtividade de seus afazeres acadêmicos, como visto nos seguintes discursos: O estresse em si desgasta muito e o desgaste traz o cansaço. Com o cansaço você acaba não estudando direito, você acaba não assimilando os conteúdos direito, acaba tirando nota baixa, perdendo aula [...] Acaba afetando o seu rendimento acadêmico (Aluno c sexo feminino, formação profissionalizante) [...] era muita coisa pra fazer e que você acabava não fazendo nada direito. Então, era sobrecarga demais e eu acho que não fica bem feito. (Aluno b, sexo feminino, formação profissionalizante) [...] quando não consigo me concentrar não consigo estudar de forma adequada e as notas tendem a não ser muito boas. (Aluno e, sexo feminino, formação básica) É notório o efeito negativo do estresse no âmbito cognitivo do ser humano. Souza16 destaca a importância que as situações estressoras adquirem na implicação de problemas de ordem de aprendizado, raciocínio, memória e outras funções do intelecto. O autor afirma que essa relação é alvo de diversas pesquisas que buscam explicações fisiopatológicas para fundamentação de como o mecanismo de estresse conduz às dificuldades no desempenho das funções cognitivas pelo homem. Muitas dessas pesquisas apontam que hormônios e mediadores químicos específicos, quando liberados durante as crises de estresse, são os responsáveis, a médio e longo prazo, pela baixa capacidade do indivíduo de deliberar suas funções cognitivas de maneira satisfatória. Outra explicação seria a utilização inconsciente de um mecanismo de autoproteção às demandas indesejáveis do meio, mediante o não cumprimento de determinados afazeres, como é defendido por Rodrigues 17. Sobrecarregados de afazeres, os alunos poderiam adotar como estratégia de enfrentamento a desvinculação a algumas atividades, com a finalidade de evitar sofrimentos adicionais ligados ao desgaste do estresse. Essa atitude, no entanto, é encarada negativamente como a responsável por ser prejudicial à performance no desenvolvimento das atividades acadêmicas. O estresse, por se constituir em alterações oriundas de situações novas ou de enfrentamento, exige esforço de adaptações físicas e psicológicas que pode ser negativo ou positivo para o organismo18. Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 66 - 72. CONSIDERAÇÕES FINAIS De acordo com o exposto, o estudo revelou o olhar dos alunos de graduação em enfermagem da UFPI a respeito da problemática do estresse por eles vivenciado no âmbito acadêmico. Verificou-se que as situações de estresse estão presentes no transcorrer do curso de graduação. Independentemente do período de formação em que estavam matriculados, se destacaram menções por parte dos alunos de outros momentos estressores do curso, que não aqueles em que se encontravam. O estudo apresentou que os alunos referem como ocasiões estressoras o ingresso na universidade e o cursar de determinadas disciplinas que exigem práticas laboratoriais não antes realizadas. Os alunos também apontaram como situação geradora de estresse o cumprimento de uma carga horária semanal distribuída em dois turnos. De acordo com o observado no discurso de muitos alunos, figura como momento estressor de bastante relevância o cursar da disciplina Farmacologia para Enfermagem. Determinados alunos, mesmo matriculados em períodos finais do curso, referiam o cursar da disciplina como circunstância estressora de maior destaque no âmbito acadêmico. Em relação à sintomática do estresse experimentada pelos alunos durante as situações estressoras, constatou-se a referência à sintomatologia clássica da fase de alarme ao estresse: taquicardia, tensão muscular, pele e extremidades frias, dentre outras. Houve também a menção da problemática relacionada às fases secundárias de resposta ao estresse, como cefaléia, sonolência, irritabilidade e dificuldade de concentração, além da citação de sentimentos subjetivos como raiva, passividade e o desestímulo. Por fim, o estudo demonstrou a relação da problemática do estresse e o desenvolver das atividades acadêmicas. Os discursos demonstraram a repercussão negativa do estresse na realização dos afazeres do curso, ou por excesso de estímulos ou por mecanismos de proteção, traduzindo-se em quedas da performance acadêmica. Os resultados evidenciam que os alunos vivenciam situações estressoras e que estas refletem na qualidade da sua saúde mental, deixando-os mais irritados, ansiosos, com baixa auto-estima e desestimulados. A partir das análises, é possível indicar algumas sugestões para o fenômeno estudado, entre elas citamos a distribuição da carga horária do curso em um único turno, o que facilitaria a disponibilidade de tempo para estudar e desenvolver outras atividades, bem como favorecer mais escuta e acolhimento aos alunos para detectar situações de estresse e buscar construir juntos formas de administrá-las. 72 Referências 1. Mendes IAC. Convivendo e enfrentando situações de stress profissional. Rev. Latino-Am Enfermagem 2001 mar/dez; 9 (2): 1-5. 2. Cataldi MJG. O stress no meio ambiente de trabalho. São Paulo(SP): LTR; 2002. 3. Stacciarini JM, Trocolli BT. O estresse na atividade ocupacional do enfermeiro. Rev Latino-Am Enfermagem 2001 abr; 9(2):17-25. 4. Molina OF. Estresse no cotidiano. 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Professora adjunto da Universidade Federal do Piauí (UFPI)/Depar tamento de Enfermagem. Coordenadora do Programa de Pós-Graduação Mestrado em Enfemagem da UFPI. Sub-Coordenadora do Núcleo de Estudos e Pesquisas Sobre a Mulher e Relações de Gênero da UFPI Teresina-PI. e-mail: [email protected] . Jairo Francisco de Medeiros Freitas Aluno do 9º período do curso de enfermagem da UFPI. Ar tur Assunção PPer er eir ereir eiraa Ribeir Ribeiroo Aluno do 9º período do curso de enfermagem da UFPI. Recebido em 26/09/2006 Reapresentado em 22/12/2006 Aprovado em 09/01/2007 Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 66 - 72. 73 Profissionais de Enfermagem e a Criança com Malformação Congênita Dias IAMV et al OS PROFISSIONAIS DE ENFERMAGEM DIANTE DO NASCIMENTO DA CRIANÇA COM MALFORMAÇÃO CONGÊNITA Nursing Professionals Before of the Birth of a Child with Congenital Malformation Los Profesionales de Enfermería En el Nacimiento de un Niño con Malformación Congénita Iêda Maria Ávila Vargas Dias Rosangela da Silva Santos Resumo Estudo de natureza qualitativa utilizou o Método História de Vida e teve por objeto de estudo a percepção da equipe de enfermagem de sua experiência em atuar no nascimento de uma criança portadora de malformação congênita. Os resultados permitiram a construção de três categorias temáticas: a percepção da equipe de enfermagem ao assistir o nascimento de uma criança com malformação congênita; as estratégias empregadas pela equipe de enfermagem; e os fatores que influenciam a atuação da equipe. O estudo evidenciou que a experiência de atuar no nascimento de criança malformada é percebida tanto como uma experiência prazerosa e gratificante quanto como uma experiência estressante e incômoda. A percepção dessa experiência é influenciada pela história de vida do indivíduo; processo de formação do profissional; tempo de atuação e suporte institucional em relação aos aspectos técnicos, científicos e emocionais. Pala vr as-c ha alavr vras-c as-cha havve: Anormalidades. Saúde da Criança. Enfermagem. Abstract Resumen Study of qualitative nature that used the History of Life Method and had as study subject the perception of the nursing staff about the experience acting in a child’s bir th with congenital malformation. The result allowed the construction of three thematic categories: the perception of the nursing staff when attending a child’s bir th with congenital malformation; the strategies used by the nursing team; and the factors that infuse on the performance of the team. The study evidenced that the experience of acting in malformed child’s birth is noticed as much a pleased and gratifying experience, as a stressful and uncomfor table experience. The perception of that experience is influenced by the history of the individual’s life; process of the professional’s formation; time of performance and institutional suppor t, concerning to the relation to the technical aspects, scientific and emotional ones. Estudio de naturaleza cualitativa que utilizó el Método Historia de Vida y tuvo por objeto de estudio la percepción del equipo de enfermería a través de la experiencia en actuar al nacimiento de un niño portador de malformación congénita. Los resultados permitieron la construcción de tres categorías temáticas: La percepción del equipo de enfermería al asistir el nacimiento de un niño con malformación congénita; Las estrategias empleadas por el equipo de enfermería; y los factores que influencian la actuación del equipo. El estudio evidenció que la experiencia de actuar en el nacimiento de un niño malformado es percibida tanto como una experiencia que da placer y que gratifica, así como una experiencia estresante e incómoda. La percepción de esa experiencia es influenciada por la historia de vida del individuo; proceso de formación del profesional; tiempo de actuación y soporte institucional en relación a los aspectos técnicos, científicos y emocionales. Keywords: Abnormalities. CHild Health. Nursing. Palabras clave: Anormalias. Salud del Niño. Enfermería. Esc Anna Enferm Esc Anna Nery R Enferm 2007 Nery mar; R11 (1): 732007 - 9. mar; 11 (1): 73 - 9. 74 Profissionais de Enfermagem e a Criança com Malformação Congênita Dias IAMV et al INTRODUÇÃO A malformação congênita existe desde os tempos mais remotos, havendo inúmeros tipos e gravidades variáveis. Algumas quase não causam problemas ao portador; outras são totalmente incompatíveis com a vida e contribuem consideravelmente para a morbimortalidade infantil. As malformações podem ser de origem genética, como as anomalias cromossômicas ou de genes mutantes, ou não genética, cuja causa é, muitas vezes, desconhecida, embora existam fatores inter-relacionados, como infecções perinatais, idade materna, uso de drogas e irradiação durante a gravidez. As gestações planejadas são as de menor risco para defeitos congênitos, por isso, a importância do acompanhamento gestacional por profissionais de saúde. O pré-natal efetivo é uma importante medida preventiva, pois permite a elaboração de um histórico de saúde da mãe e da criança, podendo indicar uma gravidez de risco. A habilidade dos profissionais em conduzir essa situação vai ter profundo impacto na assistência prestada. Em muitos casos, é no nascimento que a família é informada da malformação, o que torna este momento decisivo. Por isso, acredita-se que o nascimento de uma criança malformada é uma situação conflitante não só para os pais e familiares, mas também para a equipe de saúde que assiste este nascimento. Dentro deste contexto, a presente investigação teve como objetivo de estudo analisar a percepção que a equipe de enfermagem tem de sua experiência profissional diante do nascimento de uma criança com malformação congênita; descrever de que forma o profissional de enfermagem reage diante do nascimento de uma criança nesta circunstância e discutir as estratégias utilizadas pelos profissionais de enfermagem no enfrentamento desta conjuntura. Acredita-se que este estudo seja relevante para a assistência, o ensino e a pesquisa, porque oferece subsídios para melhorar a qualidade da assistência de enfermagem prestada no nascimento de uma criança com malformação congênita. REFERENCIAL TEÓRICO A Organização Pan-Americana da Saúde1 (OPAS) conceitua malformação congênita como toda anomalia funcional ou estrutural do desenvolvimento do feto, devido a fatores originados antes do nascimento, sejam estes genéticos, ambientais ou desconhecidos. Mesmo quando o defeito não é aparente e somente se manifeste clinicamente mais tarde, é considerado uma malformação congênita. Vários fatores influenciam a aceitação de uma criança malformada pela família. Pelchat et al.2 relacionam os principais fatores agrupados em três grandes categorias, a saber: preparação dos pais durante a gravidez, fatores sociais e culturais e atitudes da equipe de profissionais que assiste esse nascimento. As autoras referem que a preparação da mãe durante a gestação permite que ela se prepare, tanto física quanto psicologicamente, para a chegada de sua criança. Durante esse período, a mãe visualiza a imagem de sua criança, e essa imagem é composta das representações de seus preferidos, como: marido, mãe, pai, irmão, irmã. Este processo antecipatório de arranjos e adaptação faz parte da preparação à maternidade, mas é interrompido bruscamente pelo nascimento da criança malformada. Trabalhar de forma adequada e precoce essa possibilidade diminui o impacto e a frustração da mãe no momento do nascimento. No que diz respeito à atuação do profissional de saúde, Pelchat et al.3 destacam a sua relevância, uma vez que esta poderá desencadear reações negativas ou positivas nos pais. Para uma intervenção terapêutica, as autoras recomendam que a enfermeira se posicione como instrumento facilitador do processo vivenciado pelos pais, assegurando-lhes que tem tempo e está interessada em ouvir, encorajando os pais a falarem a respeito da malformação, compartilhando com eles seus próprios sentimentos de angústia ante o processo de luto pela ‘morte’ do filho idealizado, buscando compreender esse processo e, principalmente, reconhecendo as próprias reações diante da situação. Ao discutir a relação estabelecida entre os profissionais e as crianças com malformação congênita, é importante ressaltar duas questões apontadas por Glat4: a primeira se refere à relação de poder estabelecida entre a criança com malformação e o profissional que a atende; a segunda diz respeito ao que Omote apud Glat4 chama de processo de fabricação e manutenção da deficiência, que está estreitamente ligado aos mecanismos conceituais e operacionais de legitimização do estigma. Esse processo é a maneira de a sociedade garantir a coesão, mantendo o desvio inevitável, em nível controlável. Os profissionais que atendem as crianças com malformação congênita, apesar do desejo genuíno de ajudá-las, sofrem das mesmas representações estereotipadas que o resto da população. Santos 5 a partir dos resultados obtidos em tese de doutorado infere que o atendimento recebido pelas mães de crianças com malformação não tem atendido às expectativas maternas, trazendo conseqüências drásticas para a criança. Segundo os resultados apontados pela autora, essas mães ressentem-se da falta de orientação, de informação correta e de apoio profissional. Parafraseando Santos5, a comunicação do diagnóstico deve ser feita de maneira simples. Como a mãe se encontra sob forte comoção, muito do que for falado acaba não sendo totalmente assimilado por ela, independente do seu nível de esclarecimento. O fato de ser esclarecida ou até de ter tido experiência prévia com a deficiência, profissionalmente ou não, não impede nem facilita que o choque ocorra ou que ela aceite a deficiência. Ressalta que a notícia do diagnóstico pode ser comunicada por qualquer integrante da equipe de saúde, desde de que este esteja devidamente preparado. O importante é que não haja postergação ou omissão da informação. No período do nascimento e da infância, tanto a criança malformada como os pais necessitam de ajuda. Souza e Carvalho6 destacam a grande dificuldade em realizá-la. Para as autoras, a desinformação e desorientação dos familiares em relação ao cuidado com o filho malformado repercutem de forma decisiva no desenvolvimento da criança, na sua integração e na reestruturação do sistema familiar. As orientações são importantes e devem ser transmitidas pelos Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 73 - 9. 75 Profissionais de Enfermagem e a Criança com Malformação Congênita Dias IAMV et al profissionais tão logo possível, pois a estimulação precoce favorece o desenvolvimento da criança malformada. Sendo assim, compete ao profissional o papel de conscientizar e capacitar as pessoas a conhecer e refletir sobre a realidade, auxiliando-as a transformar ou redimensionar suas práticas, visando melhorar a qualidade de suas vidas. REFERENCIAL METODOLÓGICO Considerando a forma interpretativa com que se tratou o objeto de estudo, escolheu-se a abordagem metodológica qualitativa, por acreditar que esta fosse a mais apropriada para conduzir a presente investigação. A pesquisa qualitativa, também chamada de naturalística, de um modo geral, enfatiza a importância de conhecer, entender e interpretar a natureza das situações e eventos quer sejam eles passados ou presentes7. Dentro da abordagem qualitativa, elegeu-se o Método História de Vida como método de estudo da presente investigação. Também denominado Método Biográfico, é uma situação de intervenção social, de comunicação, onde se defrontam o pesquisador, com um projeto definido, e o pesquisado, que, aceitando a proposta, faz um relato de sua existência em que está contida uma mensagem destinada ao seu interlocutor. Segundo Brioschi e Trigo8, o método se constitui numa narrativa, cabendo ao narrador dar uma interpretação pessoal aos fatos de sua própria vida. No presente estudo, as participantes, após terem assinado o termo de consentimento livre e esclarecido, abordaram o tema de forma livre, com o mínimo de interferência, pelo tempo que acharam conveniente. Os depoimentos foram gravados em fitas magnéticas com aquiescência das depoentes e garantia de sigilo e anonimato, respeitando as diretrizes e normas regulamentadoras de pesquisa envolvendo seres humanos, previstas na Resolução 196/96 do Conselho Nacional de Saúde. Ressalta-se que o estudo obteve a aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) do Instituto Fernandes Figueira, parecer nº 213/02 e do CEP do Hospital Universitário Pedro Ernesto, parecer 789/HUPE. Seguindo a recomendação de Bertaux9, os registros dos relatos foram transcritos imediatamente após as entrevistas, o que permitiu à pesquisadora organizar as idéias em relação ao questionamento e ao ponto de saturação. Assim como é proposto no Método História de Vida, por Daniel Bertaux9, foram realizadas, concomitantemente à coleta de depoimentos, a transcrição e análise das entrevistas. Na busca de atingir os significados manifestos e latentes no material, recorreu-se à Análise Temática, também chamada Análise Categorial. De acordo com Rodrigues e Leopardi10, este tipo de análise comporta um feixe de relações que podem ser graficamente apresentadas através de uma palavra, uma frase ou um resumo. Funciona pelo desmembramento do texto em unidades, em categorias, segundo reagrupamentos analógicos. Foram convidadas para participar do estudo as integrantes da equipe de enfermagem (enfermeiras, técnicas e auxiliares de enfermagem) que prestam assistência de enfermagem no período perinatal e pós-natal imediato de crianças com Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 73 - 9. malformação congênita, de três maternidades públicas da cidade do Rio de Janeiro. Como critério de inclusão das participantes no estudo, foi estabelecida a necessidade de a profissional atuar em sala de parto ou alojamento conjunto; ter presenciado o nascimento de alguma criança malformada, independentemente do tempo de atuação no serviço ou na unidade; e aceitar participar do estudo, voluntariamente. Desta forma, obteve-se um total de 30 participantes, sendo dezesseis enfermeiras, quatro técnicas de enfermagem e dez auxiliares de enfermagem. No processo de coleta de dados, soube-se que, dentre as auxiliares e técnicas de enfermagem, cinco estavam em processo de formação acadêmica no Curso de Graduação em Enfermagem, e que uma das participantes passou pela vivência de ter concebido uma criança com malformação congênita, incompatível com a vida. APRESENTAÇÃO E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS A discussão e análise dos depoimentos foram construídas a partir da transcrição, leitura, codificação, desdobramento, agrupamento e síntese dos depoimentos, resultando nas três categorias seguintes: I - A percepção da equipe de enfermagem ao assistir o nascimento de uma criança com malformação congênita. Esta categoria aborda a percepção que as participantes têm de sua experiência em assistir o nascimento de uma criança malformada, as dificuldades e os sentimentos que permeiam essa experiência. As participantes descreveram diversos casos de nascimento de crianças malformadas que assistiram ao longo de suas atuações profissionais. Inicialmente, falavam com muita naturalidade, contavam detalhes das características estéticas do recém-nascido malformado, mas à medida que a conversa evoluía, tornavam-se visivelmente mais reflexivas, chegando a mencionar o quanto o nascimento de uma criança malformada gera desconforto entre os profissionais de enfermagem e como é difícil enfrentar esta situação. O depoimento ilustra essa percepção: (...) A gente se sente muito mal quando nasce uma criança malformada, é difícil e vou ser sincera eu não gosto, acho muito ruim, é sempre muito chocante, a gente sofre muito quando a gente vê (...). (Colias) A partir da leitura do depoimento, podemos aludir que o nascimento de uma criança portadora de malformação congênita é uma situação difícil e estressante para a equipe de enfermagem. As depoentes, ao descreverem o desconforto em lidar profissionalmente com o diferente e com os limites da vida, referiram que a experiência resulta em sofrimento. O depoimento abaixo evidencia o sofrimento da equipe de enfermagem ao assistir o nascimento de uma criança com malformação congênita: (...) A gente procura dar um bom atendimento. Hoje tem cirurgia para isso, cirurgia para aquilo, mas tem horas que desanima, o sofrimento é tanto que tem momentos que a gente desanima mesmo. É legal quando você acompanha uma ameaça de parto prematuro, 76 Profissionais de Enfermagem e a Criança com Malformação Congênita Dias IAMV et al fica no berçário, como a gente fala, aquecendo na incubadora até ter peso, mas depois vai embora e tudo bem, mas é bem diferente a hora que vê um malformado, se não sobreviver é triste e se sobreviver é triste também (...). (Eurema) Diante do depoimento, fica evidenciado que, por ocasião do nascimento de uma criança malformada, os profissionais experimentam um certo grau de estresse que resulta em sofrimento. Uma das possíveis razões que levam a esse sofrimento está relacionada ao fato de que, conforme Santos5, a criança malformada remete o ser humano à mais profunda de suas raízes, que, de alguma forma, procuramos sufocar e fazemos questão de não ver. Devido a isso, nesta situação, os profissionais têm dificuldade de trabalhar com seus próprios sentimentos, reagindo com frustração e ressentimento diante de uma situação que lhes causa impotência. Finalizando a análise da categoria denominada “A percepção da equipe de enfermagem ao assistir o nascimento de uma criança com malformação congênita”, cabe ressaltar a relevância desses dados, que possibilitaram evidenciar o quanto esta é uma situação estressante para a equipe de enfermagem, pela frustração que lhe é inerente. II - As estratégias empregadas pela equipe de enfermagem ao assistir o nascimento de uma criança malformada. Esta categoria trata das reações desencadeadas pela experiência de atuar profissionalmente ante a malformação congênita e das estratégias utilizadas pelas participantes no enfrentamento dessa situação. Os depoimentos evidenciam que várias reações emergem dessa experiência, tais como: empatia, busca pela espiritualidade e sublimação da situação, isolamento e banalização. Além dessas reações, outras estratégias defensivas foram mencionadas pelas participantes: procurar esquecer a qualquer custo o sofrimento cotidiano, procurar manter a vida social separada das situações do mundo do trabalho e vivenciar crises manifestadas através de doenças, tornando o corpo uma válvula de escape. Observou-se que as participantes reagem de maneira distinta diante do nascimento de uma criança com malformação congênita. A estratégia defensiva predominante foi a empatia, que é o esforço realizado para reconhecer e compreender os sentimentos e atitudes do outro, assim como as circunstâncias que os afetam num determinado momento, ou seja, é o exercício de se colocar no lugar do outro. Segundo Haddad11, a empatia nasce da autoconsciência: quanto mais abertos formos às nossas próprias emoções, mais capazes seremos de ler os sentimentos dos outros. O depoimento ilustra essa reação: Aqui tem muita mulher trabalhando, a maioria são mulheres e mulheres jovens, que estão em plena fertilidade e com certeza vão engravidar e aí vem esse tormento, porque, além da profissional, tem uma mulher. Você conviver com essas situações é complicado porque, querendo ou não, você reporta para você essa situação de gerar uma criança assim (...). (Adelpha) Quase na mesma freqüência da empatia, as participantes mencionaram a busca pela religião. A religiosidade foi fortemente pontuada tanto pelas participantes como, segundo os depoimentos, pelos familiares das crianças que apresentam malformação congênita. Deve-se ratificar essa busca pela espiritualidade da barganha, definida por Kubler-Ross12 como mecanismo psicológico que busca retardar o inevitável, envolvendo um processo de negociação, geralmente com Deus ou com algum poder maior. No caso, as participantes não chegam a propor uma troca, ou seja, não fazem barganha com ninguém, nem mesmo com Deus; apenas buscam neste Ser Supremo um conforto para superar as adversidades surgidas em sua prática profissional. O depoimento abaixo ilustra esta busca pela religiosidade: (...) Eu acredito muito em Deus, eu faço minhas orações, sempre rezo muito por isso, rezo para que Ele tire essa impressão da minha cabeça, que não deixe eu me influenciar por isso, para eu não ficar pensando (...). (Lysimnia) Diante dos depoimentos, pode-se aludir que a fé constitui uma fonte de conforto para as participantes, favorecendo o aparecimento da estratégia defensiva de sublimação. Uma outra estratégia defensiva observada em nosso estudo foi o afastamento, também chamado de isolamento. Segundo Gauderer13, o enfrentamento de uma situação difícil é muito desgastante, e como tudo o que é penoso precisa ser eliminado, o profissional desenvolve um sentimento de rejeição; mas como sabe que sentimentos de raiva, rejeição e agressão vão de encontro aos preceitos preconizados pela profissão, passa a se sentir culpado. Esse sentimento, em geral, é inconsciente e se camufla em inúmeras justificativas. Um dos mecanismos utilizados para trabalhar com a situação causadora de sofrimento é promover o afastamento. Desta forma, o profissional se isola, não participa, não compartilha, não se envolve e, conseqüentemente, não sofre, conforme está expresso no depoimento a seguir: (...) mas depois ela ficou chorosa, e eu saí até porque eu acho que eu não estava preparada, acho que eu não queria chorar junto com ela, independente de ter muito trabalho, porque às vezes você faz questão de ficar quase que distante (...). (Martia) O distanciamento é mencionado como uma tática para evitar o envolvimento e, conseqüentemente, o sofrimento. O emprego desse recurso, como forma de aliviar o desconforto sentido durante o trabalho, transmite a impressão de insensibilidade, podendo até parecer uma indiferença, o que pode ser deletério, pois que isso interfere sobremaneira nas relações estabelecidas no ambiente de trabalho. Acredita-se que a utilização dessa estratégia é empregada no sentido de autoproteção das participantes, embora este não seja o meio mais apropriado para estabelecer possibilidades de resolução dos problemas iminentes. A banalização, outra estratégia evidenciada neste estudo, é conceituada por Beck14 como um modo de enfrentamento de Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 73 - 9. Profissionais de Enfermagem e a Criança com Malformação Congênita Dias IAMV et al situações importantes que provocam sofrimento e são encaradas como comuns e inerentes ao contexto em que o trabalhador vive. Pode-se ainda entender a banalização como um processo de simplificação dos acontecimentos, como se os eventos passassem a ser apenas mais um. É como fazer de conta que nada está acontecendo, ou como se os acontecimentos fossem esperados e não requeressem decisões. Além das estratégias defensivas supracitadas, outras foram mencionadas pelas participantes para serem feitas diante do sofrimento, algumas delas consideradas positivas, outras nem tanto. Dentre estas últimas, destacam-se: Procurar esquecer a qualquer custo o sofrimento cotidiano, o que se considera inapropriado, porque em qualquer situação o custo deve ser sempre avaliado e, sensatamente, a relação custo-benefício é uma constante. Anular as emoções: isso pode ser uma estratégia pouco eficaz porque o beneficio, isto é, se conseguido, pode ser temporário, rever tendo-se, posteriormente, em mais sofrimento. Finalizando a categoria denominada “As estratégias empregadas pela equipe de enfermagem ao assistir o nascimento de uma criança malformada”, ressalta-se que a relevância da equipe permite traçar uma intervenção apropriada para o aprimoramento da mesma. III - Os fatores que influenciam a atuação da equipe de enfermagem em assistir o nascimento de uma criança portadora de malformação Essa categoria apresenta os fatores que exercem influência na atuação da equipe de enfermagem, como: história de vida do sujeito, tempo de experiência, processo de formação acadêmica e suportes que a experiência demanda. Vários fatores são suscetíveis de influenciar a forma como o profissional interpreta essa situação, o que tem repercussão direta na sua postura. Entre estes fatores, foram identificados nos depoimentos da equipe de enfermagem: a história de vida do sujeito, o tempo de experiência, o processo de formação acadêmica e os suportes que a experiência demanda. Esses fatores consistiram-se em subcategorias, descrita a seguir: A influência da história de vida das depoentes na experiência de assistir o nascimento da criança portadora de malformação: Nossa história de vida é construída ao longo do tempo e assinalada pelas lembranças e impressões significativas de nossa existência. A relação afetiva estabelecida com a figura materna, no início da vida, constitui-se em uma das mais importantes significações do indivíduo. Segundo Bowlby15, o desabrochar da personalidade e da consciência só pode se dar satisfatoriamente se as primeiras relações humanas forem constantes e satisfatórias. De acordo com os depoimentos, a frustração da mãe ao ver que seu filho é malformado, completamente diferente do idealizado, associada à preocupação em saber como vai ser a vida deste novo ser, dificulta a aceitação dessa criança e estabelece um processo relacional permeado por angústia e tristeza. A equipe de enfermagem compar tilha com os Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 73 - 9. 77 familiares essa vivência e, ao fazê-lo, defronta-se com os conflitos estabelecidos a partir de sua própria história de vida. Dejours16 refere que, como a percepção do sofrimento alheio provoca um processo afetivo, perceber o sofrimento alheio resulta numa experiência sensível a par tir das quais se associam pensamentos, cujo conteúdo depende da história particular do sujeito que percebe. A maioria dos profissionais de enfermagem mostrou-se sensibilizada pela fragilidade em que os pais se encontravam ao vivenciarem o nascimento de uma criança malformada. Reconheceram que o próprio encaminhamento para um hospital que atende gestações de alto risco já era causador de angústia e apreensão. E, de modo geral, mostraram-se solidárias e desejosas de confortar a mãe que teve um filho malformado. No entanto, algumas profissionais mostraram-se mais sensibilizadas do que outras; dentre esse grupo, algumas pessoas tinham uma vivência social, familiar, ou até mesmo particular, com malformação congênita, configurando-se essa experiência prévia um aspecto de forte repercussão na atuação profissional. A influência do tempo de atuação na experiência de assistir o nascimento da criança portadora de malformação: Se a experiência anterior com malformação congênita é um aspecto de for te repercussão na atuação profissional, conseqüentemente, o tempo de experiência vai ser um fator determinante. Quanto a isto, os depoimentos evidenciaram que esta é uma questão divergente, pois enquanto algumas participantes referiram que, com o passar do tempo, vão se habituando a esta situação, na medida em que as vivenciam constantemente, outras dizem não se acostumarem nunca, sendo para elas sempre um impacto vivenciar tal fato, conforme ilustra o depoimento abaixo: (...) Eu já estou acostumada, mas no início, quando eu comecei a trabalhar aqui eu dizia: caramba! Como é que eu vou cuidar dessa criança? Porque tem umas malformações gritantes, realmente o bebê parece um monstrinho, mas isso foi muito na fase inicial, depois você se acostuma (...). (Lycorea) Como se percebe no depoimento, parece haver uma habituação das participantes a tal situação. Contudo, concebese a idéia de que esta habituação esteja relacionada com os mecanismos de defesa dos quais o profissional lança mão no enfrentamento de uma situação de sofrimento, pois, ao refletirem sobre o cuidado prestado à unidade mãe e filho, nos casos de malformação congênita, caracterizam-no como complexo, requerendo conhecimento técnico e expressão afetiva, com isso estabelecendo uma estreita relação entre o ser cuidado e o ser cuidador, mesmo quando se deseja que esse envolvimento não aconteça. Mas como o cuidado demanda uma aproximação muito estreita, ela se torna inevitável. Por conta disso, o profissional procura se resguardar desenvolvendo estratégias defensivas pessoais, conforme foi visto na categoria em questão. A influência do processo de formação profissional na experiência de assistir o nascimento da criança portadora de malformação: Outro fator que exerce influência na experiência de assistir o nascimento de uma criança malformada, segundo os 78 Profissionais de Enfermagem e a Criança com Malformação Congênita Dias IAMV et al depoimentos, é o processo de formação acadêmica do profissional. No que se refere a este processo, a quase totalidade das participantes referiram que percebem uma lacuna em suas formações acadêmicas em relação à malformação congênita, que pode ser confirmada no depoimento que se segue: (...) Eu vi muito pouco de malformação congênita na faculdade e quando você chega para assumir o cargo daí que você vai ver o que realmente é, porque quando eu fiz materno-infantil eu não me lembro de terem abordado nada disso. A gente aprende no dia-a-dia. Ah! e como a gente aprende! Tem que aprender porque, se não, como os profissionais da saúde iriam sobreviver? (...). (Cytheritis) Pelchat e Lefèbvre17 referem que a maioria dos profissionais ainda não está preparada para este evento. Com isso, acabam transmitindo para os pais seus próprios sentimentos de choque, fracasso e rejeição, além de desenvolverem sentimentos de culpa e impotência, que resultam em sofrimento diante das muitas dificuldades do seu cotidiano. A própria experiência da pesquisadora confirma esses achados, pois ao cursar a graduação em Enfermagem não se deparou com a discussão desse tema no processo formal de ensino. A aproximação de forma sistemática ao tema se deu como bolsista do Programa de Iniciação Científica, participante de uma pesquisa, o que não é uma experiência prevista para todo e qualquer aluno da graduação, fato suficiente para desper tar as inquietações que motivaram o percurso profissional da pesquisadora. No próprio Curso de Especialização em Enfermagem Pediatria e Neonatal, realizado posteriormente, este tema não foi objeto de uma abordagem específica, e as discussões a respeito surgiam no decorrer das aulas, esporadicamente. De acordo com Popim18, há um hiato na formação dos profissionais de saúde no que se refere ao preparo destes para lidarem com situações críticas, como nos casos de morte e de malformação. Há uma tendência em falar mais sobre a vida, às vezes até negando a iminência da morte, posição que pode inviabilizar uma correta atuação profissional. Por fim, cabe destacar que, apesar de a literatura mostrar uma ascensão progressiva deste tema no cenário acadêmico, ainda é relativamente ínfima, tendo em vista o corolário suscitado pelo nascimento de uma criança malformada, demandando, desta forma, a contínua conquista de novos espaços de reflexão. Os suportes que a situação demanda e a influência desses na experiência de assistir o nascimento da criança portadora de malformação: O despreparo acadêmico do profissional para atuar especificamente nos casos de malformação congênita exige um aprimoramento profissional e pessoal para que ele possa fazer frente a tal situação. Neste contexto, são abordadas as questões referentes aos suportes que essa situação demanda e a influência desses na experiência de assistir o nascimento da criança portadora de malformação congênita. O primeiro suporte refere-se aos cursos de aprimoramento. As profissionais da equipe de enfermagem entrevistadas relataram perceber a fragilidade e a especificidade do cuidado a ser prestado nos casos de nascimento de uma criança portadora de malformação congênita, experiência tida como de grande complexidade e de muita responsabilidade, que demanda constante aprimoramento e muita sensibilidade nas ações de cuidar. O nascimento de uma criança malformada constitui-se numa experiência que, sem dúvida, torna mais difícil a vida dos pais e até mesmo o desempenho dos profissionais. Por conta disso, esta experiência pode resultar em uma ocasião de aprendizagem para todos envolvidos. O contínuo aprimoramento dos profissionais é fundamental ao seu desempenho e tem repercussões significativas na assistência prestada, pois aquele que obtém a devida qualificação, além de se apresentar mais seguro, é mais eficiente em sua atuação. Para as participantes do estudo, quando se pensa em qualidade do cuidado especializado, o suporte emocional dos profissionais se constitui num requisito indispensável, pois a efetiva preparação para tal situação demanda um preparo que vai além do técnicocientífico. Ou seja, o preparo do profissional está além dos livros; não basta que ele esteja preparado cientificamente. Em síntese, esta categoria evidenciou os fatores que influenciam a experiência de assistir o nascimento da criança portadora de malformação congênita, considerando que as par ticipantes das três instituições, indistintamente, reconheceram essa experiência como especial, além de exigir constante aprimoramento técnico-científico e emocional. CONSIDERAÇÕES FINAIS A equipe de enfermagem, ao assistir o nascimento da criança malformada, percebe sua experiência como estressante, incômoda e desconfortável, permeada por dificuldades, sendo a principal delas mostrar a criança ao pai, aos familiares e, em especial, à mãe. Surgem sentimentos de angústia, raiva, repulsão e frustração, que levam ao sofrimento. Tal experiência, ao mesmo tempo, é vista como prazerosa e gratificante, por propiciar o desenvolvimento pessoal e profissional, despertando, inclusive, sentimentos de orgulho e satisfação por permitir a utilização de tecnologia de ponta e a oportunidade de trabalhar com o diferente. Essa variação de sentimento entre perceber a experiência como frustrante ou prazerosa depende da singularidade do sujeito. Enquanto algumas pessoas vão achar sofrimento em tudo, até como estratégia de valorização do seu trabalho, pessoas vão usar a criatividade e buscar formas de atenuar este sofrimento. Ambas as posturas terão reflexos na saúde do indivíduo, deteriorando-a e causando ou propiciando condições que resultam na impossibilidade de mantê-la. Neste último caso, faz-se necessário que o profissional apresente maturidade e sensibilidade para tomar consciência da própria singularidade, o que se constitui num desafio para os componentes da equipe de enfermagem, pois demanda a busca por melhores condições de trabalho que permitam um efetivo aprimoramento profissional e pessoal, atendendo as necessidades do ser que cuida, mas que também precisa ser cuidado. A Enfermagem desempenha importante papel junto aos pais de crianças malformadas, em especial na orientação dos cuidados físicos, incentivando-os no sentido de que se Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 73 - 9. Profissionais de Enfermagem e a Criança com Malformação Congênita Dias IAMV et al responsabilizem pelo cuidado da criança, como um preparo para o retorno ao lar, quando esses cuidados deverão continuar; e também na identificação de desvios de comportamento dos pais que possam levá-los a negligenciar ou superproteger a criança, situação que precisaria de encaminhamento especial. Mas para isso, torna-se necessário que a Enfermagem compreenda o seu papel diante desse nascimento. Indubitavelmente, cuidar da família de uma criança malformada é tarefa de grande complexidade, por isso a prática requer um cuidado transdisciplinar, que traz como resultado 79 uma riqueza de experiências e uma assistência efetiva a essa clientela. A família deve ser trabalhada como um todo, incluindo avós, outros filhos do casal, normais ou não, e outros membros julgados impor tantes, para que se consiga êxito no desenvolvimento e na integração da criança malformada. Temos que convir que cuidar de uma criança malformada é tarefa árdua, que adquire importância significativa na medida em que a família deseja, efetivamente, tornar-se responsável pelo cuidado. Sendo assim, a interação entre profissionais e familiares deve ser permeada por sentimentos de partilha. Referências 1. Organización Panamericana de Salude – OPS. Salud materno infantil y atención primária en las Américas. Washington, DC(USA); 1994. 2. Pechalt D, Stefanelli RM, Spinks PE. Différences et similitudes dans l’experience des méres et péres d’un enfant ayant deficience. Les Cahiers Internationaux de Psychologie Sociale 2003; 3(5): 73-82. 3. Pechalt D. Lánnonce de la deficience et processus dádaptation de la famille handicap, medecine, éthique. 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Recebido em 25/01/2006 Reapresentado em 25/09/2006 Aprovado em 15/01/2007 Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 73 - 9. 80 Enfermagem ou Maternagem : Interação Enfermeira - Recém Nascido Falcão Júnior JSP et al ENTRE A ENFERMAGEM E A MATERNAGEM: UM ESTUDO SOBRE A INTERAÇÃO ENFERMEIRA E RECÉM-NASCIDO Between Nursing and Mother Nursing: a Study on the Nurse and the New-Born Interaction Entre La Enfermería y la Maternería: un Estudio Sobre la Interacción Enfermera y Recién Nacido Flávia Cristina Cordeiro Biesbroeck Mariana Gomes Cardim Maria Aparecida de Luca Nascimento Resumo Estudo descritivo exploratório que tem por objetivo correlacionar o comportamento afetivo e interacional das enfermeiras durante a oferta de alimento ao recém-nascido por meio da técnica do copinho, em uma unidade neonatal, a um cuidado essencial de enfermagem, tendo em vista a vulnerabilidade desta clientela. Foram observadas, através de imagens, vinte enfermeiras durante a execução do referido procedimento, e os seus gestuais são discutidos à luz de referenciais da fisiologia humana, da interação e da psicologia infantil, dentre outros. Conclui-se que o cuidado de enfermagem dispensado ao recém-nascido, além de cientificamente complexo, requer, de quem o pratica, atenção, ternura e sensibilidade, elementos subjetivos implícitos no cuidado de enfermagem, que não devem ser creditados à maternagem, mas ao cuidado revestido de profissionalismo, responsabilidade, cientificidade e ética. Pala vr as-c ha alavr vras-c as-cha havv e: Enfermagem. Recém-nascido. Comportamento. Abstract Resumen Descriptive and exploratory study with the objective to correlate the affective and inter-rational behavior of the nurses during the offer of food to the new-born by the technique of the small glass, in a neonatal unit, to a essential nursing care, aiming the vulnerability of these clientele. Was observed, trough images, twenty nurses during the execution of the cited procedure, and their gestures are discussed based in referential of the human physiology, of the interaction and of the child psychology, among others. It was conclude that the nursing care give to the new-born, besides be scientifically complex, demands, from whom do it, attention, tenderness and sensitivity, subjective elements implicit in the nursing care, that not must be credited to the mother nursing, but to the care dressed in the professionalism, responsibility, scientificity and ethics. Estudio descriptivo y exploratorio con el objetivo de correlacionar el comportamiento afectivo e inter-racional de las enfermeras durante la oferta del alimento al recién nacido por medio de la técnica del vaso pequeño, en una unidad neonatal, a un cuidado esencial de enfermería, teniendo en vista la vulnerabilidad de esta clientela. Fué observada, a través de imágenes, veinte enfermeras durante la ejecución del procedimiento citado, y sus gestos son discutidos a la luz de referencias de la fisiología humana, de la interacción y de la psicología infantil, entre otras. Concluyese que el cuidado de enfermería al recién nacido, además de científicamente complejo, demanda, de quien lo practica, atención, ternura y sensibilidad, elementos subjetivos implícitos en el cuidado de enfermería, que no se deben acreditar a la maternería, pero al cuidado revestido de profesionalismo, responsabilidad, cientificidad y ética. K eyw or ds: Nursing. New-Born. Behavior. ywor ords: Pala br as ccla la alabr bras lavve: Enfermería. Recíen Nacido. Conducta. Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 80 - 5. Enfermagem ou Maternagem : Interação Enfermeira - Recém Nascido Falcão Júnior JSP et al INTRODUÇÃO Este estudo foi elaborado a partir da observação de uma de suas autoras, quando, ainda acadêmica de enfermagem do último período da graduação, especificamente no estágio supervisionado da disciplina Atenção à saúde da criança, passou a notar os efeitos que o simples fato de cantar para um recém-nascido (RN) portador do diagnóstico de epidermólise bolhosa produzia. À época supracitada, não era comum observar, entre as enfermeiras, o comportamento descrito quando da realização dos procedimentos técnicos rotineiros, e o fato de cantar ao cuidar do RN supracitado podia ser creditado à descontração própria dos jovens. No entanto, o RN em referência se acalmava, participava do seu tratamento, por demais doloroso, e, sem dúvida nenhuma, uma forma de interação era estabelecida com ele. Nesse sentido, vale ressaltar que o ato de cantar ao cuidar, em uma unidade neonatal, pode ser uma atitude terapêutica de enfermagem, desde que a emissão do som permaneça dentro de uma faixa de freqüência de onda entre 65 e 80 Hz.1 A partir da observação da interação evidenciada em diversas literaturas sobre o tema no processo de cuidar de um ser humano em geral, e mais especificamente do recém-nascido, as autoras supracitadas desenvolveram este estudo evidenciando o quanto de ciência existe no ato de oferecer, aparentemente de forma afetiva, o alimento ao RN, procedimento que, muitas vezes, ao ser analisado pela sociedade, é creditado ao instinto materno da enfermeira, e não ao seu conhecimento sobre a importância da interação humana durante a execução de seus cuidados. Neste sentido, tem sido observado em alguns estudos que, quando se fala em interação, não se pensa em um bebê que apenas é estimulado pelas ações dos adultos, mas em trocas entre parceiros de capacidades distintas2. Entendemos que os comportamentos referentes ao diálogo comportamental que se estabelece entre a enfermeira e o RN, mas especialmente os da enfermeira, podem ser confundidos com compor tamentos meramente instintivos, por serem similares aos da mãe, mas que são, na verdade, revestidos de profissionalismo na medida em que incorporam/contemplam cuidados não apenas biológicos. Deste modo, com este estudo, pretendemos atingir o seguinte objetivo: Correlacionar o comportamento afetivo e interacional das enfermeiras a um cuidado essencial de enfermagem durante a oferta de alimento ao recém-nascido, utilizando a técnica do copinho em uma unidade neonatal, tendo em vista a vulnerabilidade desta clientela. Entendemos como cuidado essencial aquele que é dispensado ao RN com vistas à preservação da vida, focado em sua necessidade e vulnerabilidade. Este estudo se justifica na medida em que um cuidado de enfermagem, qual seja, a oferta de alimento ao recém-nascido pela enfermeira através da técnica do copinho, e a respectiva interação estabelecida durante este ato, é tratado à luz da cientificidade. Desta forma, ao abordarmos o citado procedimento de enfermagem para com a clientela em questão, observamos que os comportamentos aparentemente afetivos da enfermeira Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 80 - 5. 81 estão respaldados por aspectos éticos, técnicos e científicos, demonstrando que a enfermagem é subsidiada pela ciência, até mesmo quando se reveste de características aparentemente não profissionais. REFERENCIAL TEÓRICO Diversas são as ciências que estão inseridas nas disciplinas que compõem o currículo da formação profissional do enfermeiro e têm por finalidade subsidiar e fundamentar cientificamente o cuidado de enfermagem, dando-lhe o respaldo imprescindível para sua prática profissional. Entre as ciências supra-referenciadas, podemos citar a anatomia, a fisiologia, a farmacologia, a microbiologia, entre outras. No entanto, ressalta-se que outras ciências que não estão inseridas na área da saúde, e que são tão imprescindíveis para a prática profissional do enfermeiro quanto àquelas que a compõem, também fazem parte do acervo de conhecimento do enfermeiro, mesmo antes de ele ingressar na universidade, pois são requisitos para o exame de vestibular, tais como a física e a matemática. Este pensamento é corroborado por um estudo 3, ao citar que na prática profissional da Enfermagem podemos observar o quantitativo de aspectos interdisciplinares que a compõe, complementando, ainda, ao dizer que as relações entre as várias disciplinas que atuam diretamente no cuidado de enfermagem direto prestado ao cliente demonstram que o cuidado é complexo, transcendendo ao limite de uma só ciência. Portanto, ao estudarmos o cuidado de enfermagem, devemos buscar nas ciências que incidem sobre ele o devido respaldo científico para subsidiá-lo. Deste modo, ao considerar a complexidade do ato de cuidar de um recém-nascido, devida às especificidades desta clientela, levando-se em consideração a gama de saberes que incidem sobre esta interação, iremos nos apropriar da multireferencialidade para respaldar as questões deste estudo que se ancoram na fisiologia, comunicação e psicologia, entre outras ciências.. É importante observar que a interação comportamental ocorre à medida que vários aspectos da ação humana se entrelaçam, o que reforça a necessidade de se abordar, ainda que sucintamente, alguns deles. O diálogo comportamental, especificamente aquele que ocorre entre o adulto e o bebê em estágio inicial da vida, traz os seguintes componentes: (1) as modificações nas atividades dos parceiros (vocalização, fala, sorriso), (2) os tipos de estimulação por parte das mães (estimulação voltada para a mãe, estimulação voltada para os objetos do ambiente) – (3) os tons de conversação utilizados pelas mães (tom infantil, tom adulto) e (4) os diferentes contextos de interação 2. Ao apresentarmos os itens que compõem o roteiro de observação que serviu de base para o presente estudo, observamos que ele contempla aspectos relacionados à estimulação tátil, à estimulação sonora e à comunicação não-verbal. Deste modo, os referenciais que serviram de base para a sua construção estão relacionados a estes aspectos, os quais compõem a interação. Considerando que o comportamento aparentemente instintivo da enfermeira no momento da oferta de alimento ao RN se configura como uma forma de comunicação não verbal, 82 Enfermagem ou Maternagem : Interação Enfermeira - Recém Nascido Falcão Júnior JSP et al trazemos sua definição - “comunicação não-verbal refere-se à comunicação feita por meios diferentes das palavras” 4. O recém-nascido, por sua vez, devido às peculiaridades de sua idade, também encontra na linguagem não verbal e na estimulação tátil uma forma de perceber-se vivo 5. Neste mesmo sentido, autores comentam que após o nascimento, o corpo do bebê entra em relação com outro corpo, procurando a fusão e a unidade que ele acaba de perder 6. Sendo assim, de acordo com esta citação, o RN hospitalizado em unidade de cuidados intensivos vai buscar essa unidade com os profissionais que dele cuidam, especialmente o profissional da enfermagem, por ser ele quem mais o manipula. O estímulo tátil é tão importante para o RN que o toque suave, percebido como carícia, tem sua decodificação realizada em uma parte específica do cérebro, diferenciando-o dos demais tipos de toque. Esta área é denominada ínsula, uma região mais interna do córtex. O estímulo tátil suave é conduzido à ínsula por fibras também diferentes daquelas que conduzem os demais estímulos táteis, que não são carícias, ao córtex somestésico 7. A insula, região ainda pouco explorada pela neurociência, parece cuidar da representação do estado fisiológico do corpo, inclusive das mudanças associadas às emoções 7. Considerando a questão do toque suave, do afeto, existe um componente muito mais fundamental por trás deles,, que estaria relacionado à capacidade da estimulação tátil de reduzir ou inibir descargas simpáticas maciças, ou seja, o afeto seria o responsável, através da estimulação tátil, pela prevenção de danos causados tanto pela condição de hospitalização do RN quanto pela própria condição que o levou a esta hospitalização 8. Note-se neste ponto que, ao tomar ciência das inúmeras possibilidades de poder agredir o RN, a equipe de enfermagem deve apropriar-se de todas as possibilidades de resguardá-lo. A partir desta perspectiva, considera-se que o comportamento aparentemente instintivo da enfermeira, revestido de componentes afetuosos, não deve ser creditado à maternagem, entendida como “tratamento maternal” 9. Entendemos, sim, que a enfermeira pode agir de forma similar à da mãe sob o ponto de vista da interação que estabelece com o RN, por entender que esta interação provoca estímulos no RN que são imprescindíveis para a implementação de uma conduta terapêutica, ou seja, a conduta da enfermeira não deve ser creditada apenas ao acaso ou ao instinto. Desse modo, ao considerarmos a possibilidade da prestação de um cuidado responsável, e por si só complexo por envolver diversos saberes, podemos perceber que a interação que deve ser estabelecida entre a enfermeira e o RN, além de ser um dos seus componentes,, reveste-se de extrema relevância, por tratar-se de um fator responsável pelo seu desenvolvimento saudável 2. METODOLOGIA Estudo descritivo exploratório, realizado a partir da observação, por duas pesquisadoras, das imagens da populaçãoalvo, composta de vinte enfermeiras, enquanto realizavam a técnica de oferecer a alimentação ao RN pela técnica do copinho. A coleta de dados ocorreu entre os dias 2 e 8 de agosto de 2005 em um hospital-maternidade municipal da rede SUS na cidade do Rio de Janeiro, especificamente em uma unidade de cuidados semi-intensivos para neonatos. O trabalho obteve aprovação do comitê de ética em pesquisa da Prefeitura da cidade do Rio de Janeiro em 14 de junho de 2005, sob número de protocolo 43/05, além de ter obtido aprovação do diretor do hospital bem como das chefias médica e de enfermagem. Tanto as enfermeiras quanto os pais e/ou responsáveis pelo RN foram esclarecidos sobre os objetivos da pesquisa e puderam optar por participar do estudo. Aqueles que aceitaram tiveram garantido o anonimato e assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, respeitando-se, então, a resolução 196/96 do Conselho Nacional de Saúde (CNS). As imagens foram gravadas em uma filmadora JVC por um período não maior do que 15 minutos. A amostra foi selecionada por conveniência, ou seja, uma das pesquisadoras envolvidas no estudo, chegava ao setor pela manhã e, após conversa com o enfermeiro líder do plantão, aguardava o horário da alimentação e a ocorrência do evento (alimentação de RN pela técnica do copinho por enfermeiras). Este tipo de amostra acarreta o uso das pessoas mais convenientemente disponíveis como participantes do estudo.10 Os enfermeiros tinham, em média, seis anos e oito meses de formados, sendo apenas um do sexo masculino. A média de peso dos recém-nascidos foi de 2.057 gramas. A avaliação das filmagens foi realizada seguindo-se o roteiro abaixo descrito, e referia-se a presença ou não da ação/ comportamento descrito no item. O roteiro foi resultado de um ajuste da versão brasileira da Escala de Brown e Cols.11, A versão brasileira da escala de Brown e colaboradores foi ajustada para a interação enfermeira e RN durante a oferta de alimento pela técnica do copinho, passando pela validade de face, realizada por três especialistas, uma enfermeira especialista em neonatologia, uma enfermeira docente especialista em neonatologia e uma docente especialista em materno-infantil, além da concordância entre avaliadores12. Itens de Observação da enfermeira: 1. Embala 2. Segura no colo 3. Apóia no ombro 4. Toca ou estimula a boca do bebê 5. Afaga 6. Toca 7. Acalenta ou balança 8. Enxuga o leite que escorre da boca 9. Limpa e arruma cobertas e/ou roupas 10. Mantém contato olho-a-olho com o RN 11. Emite sons não-verbais 12. Conversa 13. Canta Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 80 - 5. 83 Enfermagem ou Maternagem : Interação Enfermeira - Recém Nascido Falcão Júnior JSP et al Itens de observação do Recém-nascido: 1. Aceita a dieta 2. Participa 3. Aperta as mãos/movimenta as pernas 4. Permanece com olhos abertos 5. Geme 6. Chora 7. Espirra 8. Soluça 9. Emite outros sons A análise das filmagens foi realizada à luz deste roteiro. RESULTADOS Observa-se que, de fato, é estabelecida uma interação entre a enfermeira e o RN quando da oferta da alimentação através da técnica do copinho na amostra selecionada, e que esta interação pode ser descrita ao se observar o gestual dos dois componentes do processo, enfermeira e RN. Os comportamentos da enfermeira mais presentes nas filmagens deste estudo foram: Quadro I: Freqüência percentual dos comportamentos das enfermeiras Compor tamento da enf er meir a enfer Freqüência percentual 1. Embala 2. Segura no colo 3. Apóia no ombro 4. Toca ou estimula a boca do bebê 5. Afaga 6. Toca 7. Acalenta ou balança 8. Enxuga o leite que escorre da boca 9. Limpa e arruma cobertas e/ou roupas 10. Mantém contato olho/olho com o RN 11. Emite sons não-verbais 12. Conversa 13. Canta 20,00 90,00 50,00 70,00 50,00 90,00 20,00 100,00 80,00 100,00 0,00 60,00 0,00 Observa-se que as enfermeiras estabelecem a interação com o RN através do contato, identificado nos seguintes itens de observação: segura no colo, toca ou estimula a boca do bebê, toca, enxuga o leite que escorre da boca. Além desta variedade de estímulos táteis, a enfermeira se preocupa em deixar o RN sempre bem coberto, ao arrumar suas roupas e cober tas, o que indica um cuidado de enfermagem de extrema importância para a preservação da temperatura corporal do RN. Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 80 - 5. O fato de a enfermeira manter contato olho-a-olho com o RN pode indicar que ela está atenta ao procedimento e às respostas neurológicas do RN e estabelecendo, concomitantemente, uma interação importante para ele, conforme explicitado no referencial teórico. Nota-se também que a conversa foi o estímulo sonoro mais presente nesta amostra. Sabe-se que, apesar de o RN ser incapaz de verbalizar, ele é sim capaz de se comunicar e de responder a estímulos sonoros e que o estímulo-resposta faz parte da relação atencional da enfermeira para com o RN e interacional entre eles13. Observa-se, a partir da freqüência da ocorrência dos comportamentos da enfermeira acima elucidados, que eles atendem aos requisitos citados em estudo anterior de Ribas e Moura2, relativos à interação, e presentes no roteiro de observação utilizado neste estudo, que são os comportamentos relativos à interação, como, por exemplo, a conversa e o toque. O recém-nascido, por sua vez, apresentou os seguintes comportamentos: Quadro II: Freqüência percentual dos comportamentos do RN Compor tamento do RN Freqüência percentual 1. Aceita a dieta 2. Participa 3. Aperta as mãos/movimenta as pernas 4. Permanece com olhos abertos 5. Geme 6. Chora 7. Espirra 8. Soluça 9. Emite outros sons 100,00 100,00 70,00 80,00 10,00 20,00 0,00 0,00 20,00 Nota-se que os RNs interagem com a enfermeira através de compor tamentos relacionados com a situação de alimentação através de movimentos corporais e aceitação da dieta. Além disso, o fato de o RN manter os olhos abertos indica que ele estava acordado e envolvido com a alimentação, interagindo com a enfermeira. Observa-se que os RNs não apresentaram comportamentos relativos ao som e fala. Credita-se esta ausência de comportamentos às características da clientela, quais sejam, a prematuridade ou o baixo peso ao nascer. Ao correlacionarmos os comportamentos do par enfermeira/ RN com os componentes da interação mencionados anteriormente 2 (as modificações nas atividades dos parceiros, os tipos de estimulação, os tons de conversação os diferentes contextos de interação), percebemos que se estabelece uma interação entre o par, tendo em vista que há modificações nas atividades dos parceiros, estímulo tátil e sonoro no contexto da alimentação pela técnica do copinho. 84 Enfermagem ou Maternagem : Interação Enfermeira - Recém Nascido Falcão Júnior JSP et al CONCLUSÕES Conclui-se que o cuidado de enfermagem dispensado ao recém-nascido, além de cientificamente complexo, requer, de quem o pratica, atenção, ternura e sensibilidade, elementos subjetivos implícitos no cuidado de enfermagem, que não devem ser confundidos com a maternagem, procedimento exclusivo das mães, cujos filhos encontram-se sob os cuidados das enfermeiras. Com relação ao exposto em parágrafo acima, convém mencionar citação de estudo de Santos, que pontifica que “o exercício da maternagem tem componentes biológicos comprovados cientificamente (bases neuroendócrinas)” 14,o que nos induz a pensar que a mãe se comporta de forma instintiva, e que a enfermeira, em contrapartida, também ciente de que para a criança “o relevante é a qualidade do cuidado, e não de quem o dá” 14, potencializa os seus cuidados de forma a abranger aqueles outros dos quais o RN hospitalizado está parcialmente ou totalmente privado, o que, para o olhar destituído de reflexão crítica, pode parecer um comportamento maternal ou instintivo, desvinculado de saber profissional e sem intenção terapêutica. Quando pensamos no RN hospitalizado e fazemos referência à alimentação,, entendemos que, com ou sem o acompanhamento da mãe, este momento é especialmente propício para que a enfermeira possa cuidar do RN de forma individualizada e peculiar. Além do alimento por si só ser de extrema importância para que o RN se recupere, cresça e se desenvolva, o momento da sua oferta é quando a enfermeira pode oferecer o cuidado consciente das necessidades daquele ser. Necessidades estas já citadas anteriormente, relativas ao estímulo tátil, sonoro, ao cuidado afetivo e ao cuidado terapêutico. Foi possível observar, durante o desenvolvimento deste estudo, que todos os profissionais interagiam bem,, à medida que tinham a atenção voltada para o RN e para o referido procedimento, o que reforça que é preciso agir de forma profissional, abrangendo os aspectos interacionais mencionados neste estudo, de forma a oferecer o cuidado que é imprescindível para o RN. Ao avaliarmos a interação que a enfermeira estabelece com o RN no momento da oferta de alimento pela técnica do Referências 1. Biesbroeck FCC, Novaes MC, Nascimento MAL. 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Na maternagem, a tônica é referente à importância de se estimular o mais precocemente possível o apego mãe/filho,, enquanto que na enfermagem, as ações são dimensionadas de forma a assegurar, no caso de RNs hospitalizados, além de uma perfeita recuperação, a garantia de um crescimento e desenvolvimento livres de seqüelas, tanto físicas quanto emocionais, e a formação de apego. Pensamos que, apesar de a enfermeira agir de forma aparentemente maternal, ela, por saber das necessidades físicas e emocionais de um RN, deve proceder de forma a tentar supri-las. Sendo assim, este estudo demonstrou que o cuidado de enfermagem essencial ao RN não se trata de reproduzir o comportamento afetivo materno, mas de um entendimento que perpassa pelo conhecimento da neurofisiologia e da psicologia infantis, além da ética profissional. Conclui-se que o cuidado de enfermagem em apreço, e que está voltado para o RN hospitalizado, não deve se restringir aos aspectos relativos ao seu corpo físico, e que todos os aspectos inerentes a ele devem ser observados durante a sua realização, sob pena de, ao não ser atendido em sua totalidade, se configurar em uma negligência, aqui entendida como “inobservância e descuido na execução do ato”9, considerando que o código de ética dos profissionais de enfermagem, em seus princípios fundamentais, prevê no artigo quinto o cuidado à saúde do ser humano como um todo15. Por oportuno, vale ressaltar que em estudo voltado para a conduta ética do profissional de enfermagem, ficou evidenciado que eles têm uma idéia ampliada a respeito do tema, não restringindo-o apenas ao aspecto moral ou normativo da profissão, mas extrapolando-o a todas as instâncias da relação humana16. Sendo assim, a alimentação do RN, realizada pela enfermeira, através da técnica do copinho, configura-se em um cuidado essencial e imprescindível, considerando a vulnerabilidade desta clientela, e que, até pode ser confundido com a maternagem, mas, em sua essência, é revestido de profissionalismo, responsabilidade, cientificidade e ética ao se compreender que não é apenas o alimento que está sendo oferecido. 5. Shiniaishiky R. A carícia essencial: uma psicologia do afeto. São Paulo(SP): Gente; 1985. 6. Leloup J. O corpo e seus símbolos: uma antropologia essencial. Petrópolis(RJ): Vozes; 1998. 7. Houzel SH. Sexo, drogas, rock’n roll... e chocolate. O cérebro e os prazeres da vida cotidiana. Rio de Janeiro(RJ): Vieira & Lent; 2003. 8. Montagu A. Tocar: o significado humano da pele. São Paulo (SP): Summus; 1988. 9. Houaisss A. Dicionário Eletrônico Houaiss da Língua Portuguesa. [CDROM]. Rio de Janeiro(RJ): Objetiva; 2002. 10. Polit DF, Beck CT, Hungler B. 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Recebido em 17/08/2006 Reapresentado em 27/02/2007 Aprovado em 10/03/2007 Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 80 - 5. 86 Percepções Maternas: O Neonato em Uso de Fototerapia Rodrigues FLS et al PERCEPÇÕES MATERNAS SOBRE O NEONATO EM USO DE FOTOTERAPIA Maternal Perceptions About the Newborn in Use of Phototherapy Percepciones Maternales Sobre el Recién Nacido en Uso de Fototerapia Francisca Leonilda Sampaio Rodrigues Isolda Pereira da Silveira Antonia do Carmo Soares Campos Resumo A fototerapia é o tratamento inicial da icterícia neonatal. Objetivamos conhecer a percepção da mãe acerca da fototerapia e identificar as suas dificuldades, relacionadas ao tratamento fototerápico. Estudo descritivo com abordagem qualitativa, realizado no Alojamento Conjunto (AC) de um hospital público em For taleza-CE, com 8 puérperas na faixa etária entre 13 e 25 anos. Os dados foram coletados em maio e junho/2006, mediante entrevista com duas questões de pesquisa: O que representa para a senhora ver o seu filho sob fototerapia; quais são as dificuldades enfrentadas em relação aos cuidados com o seu bebê na fototerapia? Na análise das falas, identificamos as categorias: percepção da mãe com relação ao cuidado com o bebê sob a fototerapia, dificuldades enfrentadas pela mãe com seu filho em fototerapia, e a mãe após as orientações recebidas. Concluímos que existe a necessidade de repensar as orientações e assumir autenticamente os cuidados de enfermagem ao binômio mãe-filho. Pala vr as-c ha alavr vras-c as-cha havv e: Fototerapia. Mães. Recém-Nascido. Enfermagem. Abstract Resumen Phototherapy is the initial treatment for neonatal ictericia. We aimed to know mother’s perception about this treatment and to identify theirs difficulties related to the phototherapy treatment. It is a descriptive study with qualitative approach. It was conducted in the shared accommodation (SA) of a public hospital in Fortaleza-CE, with 08 puerperal women in the age group from 13 to 25 years old. The data were collected in May and June/2006, before interview with two orienteering questions’s research: What does it mean for you to see your child under phototherapy; What are the difficulties faced in relation to the care with your baby under phototherapy? In the analysis of the speeches we identified the categories such as: perception of the mother about the care with her baby under phototherapy, difficulties faced by the mother with her child under phototherapy and the mother after receiving the orientations. We concluded that it is necessary to rethink the orientations and assume authentically the Nursing care to the binomial mother-son. La fototerapia es un tratamiento inicial de la ictericia neonatal. El Objetivo fue conocer la percepción de la madre sobre la fototerapia e identificar las dificultades de la madre con relación a este tratamiento. Estudio descriptivo con abordaje cualitativa. Realizado en el Alojamiento Conjunto (AC) de un hospital público en Fortaleza-CE, con 08 parturientas con edad entre 13 a 25 años. Los datos fueron colectados en mayo y junio/2006, a través de entrevista con dos cuestiones de investigacíon: ¿Qué representa para la señora observar su niño en fototerapia?¿Cualés las dificultades enfrentadas con relación a la atención con su niño en la fototerapia? En la análisis de las hablas, observamos las categorias: percepción de la madre con relación a la atención con el niño en fototerapia, dificultades sufridas por la madre, con su hijo en fototerapia, y la madre después de las orientaciones recebidas. Concluimos que hay la necesidad de pensar una vez más las orientaciones y asumir autenticamente las atenciones de Enfermería al binomio madre-hijo. Keywords: Phototherapy. Mothers. Newborn. Nursing. Palabras clave: Fototerapia. Madres. Recién Nacido. Enfermería. Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 86 - 91. 87 Percepções Maternas: O Neonato em Uso de Fototerapia Rodrigues FLS et al INTRODUÇÃO As doenças que acometem os neonatos têm sido tema de inúmeras pesquisas de Enfermagem. Dentre elas, a hiperbilirrubinemia, observada em unidades neonatais de alto e médio risco e em Alojamento Conjunto (AC), é tratada pela fototerapia, tratamento por meio da luz. O desenvolvimento da icterícia pode ser percebido pela cor amarelada da pele, considerado a evidência clínica mais visível. No Brasil nascem cerca de 200 mil crianças com índices elevados de bilirrubina no sangue, o que equivale em média a 5% dos nascimentos 1. A primeira referência escrita sobre a icterícia não patológica data de 1973 e se deve a Bartolomeu Metlinger, e sobre o tratamento da icterícia, a referência é devida a Michel Ettmüller, em 1708, que, em seu livro “De infantum morbis”, recomenda oferecer leite humano desde o primeiro dia de vida 2. A idéia da utilização do aparelho de fototerapia surgiu na década de 1950 pela observação de uma enfermeira, J. Ward, chefe da Unidade de prematuros de um hospital na Inglaterra 3:12. Foi em 1956 que a enfermeira inglesa J. Ward percebeu que as crianças diminuíam o tom amarelado da pele quando expostas à luz solar, quando dormiam próximas da janela ou tomavam banho de sol no jardim do Rockford General Hospital, na cidade de Essex .1.. Os primeiros estudos sobre os efeitos da luz no metabolismo da bilirrubina foram realizados pelo doutor R.J. Cremer, considerado o pai da fototerapia. No Brasil, a fototerapia teve seu início de uso em 1960, e na cidade de São Paulo havia um modelo inglês trazido por um médico hematologista, doutor Humberto Costa Ferreira, da Faculdade de Medicina de São Paulo 3. A icterícia aparece no período neonatal, sendo considerada benigna na maioria das vezes, cedendo nos primeiros dias após o nascimento, embora em algumas situações possa apresentarse patológica e neste caso necessitar de tratamento médico e terapêutica precoce, sendo uma alteração creditada ao metabolismo do neonato4 . A bilirrubina é um produto final do catabolismo dos aminoácidos e hemoproteínas, sendo formada, principalmente, pelo catabolismo da hemoglobina no baço e no fígado. A hiperbilirrubinemia tem como causa etiológica doenças hemolíticas tais como incompatibilidade sangüínea maternofetal (Rh-ABO), cefalematomas e policitemias. A icterícia neonatal é classificada em fisiológica e patológica, sendo considerada fisiológica quando o aumento da bilirrubina atinge 7mg/dl durante a primeira semana de vida, e patológica quando visível nas primeiras 36 horas, e com um aumento total maior que 5mg/dl 5. Para que a avaliação da icterícia em recém-nascidos seja possível sem a necessidade de coleta de sangue, utiliza-se uma nova tecnologia não invasiva denominada BiliCheckTM. Esse procedimento é indicado para avaliação da icterícia em bebês de até 20 dias de idade. O seu resultado é imediato e permite que a quantificação da bilirrubina forneça informações necessárias para que as condutas apropriadas sejam tomadas. Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 86 - 91. A fototerapia é o tratamento inicial da hiperbilirrubinemia não conjugada em neonatos. É considerado um método não invasivo e de alto impacto na diminuição dos níveis de bilirrubinas plasmáticas, independente da maturidade do recém-nascido 6. Contudo, para que o tratamento seja efetivo, alguns cuidados são necessários, tais como despir o neonato para que a incidência dos raios luminosos incidam sobre a maior extensão possível da superfície corporal, e proteger adequadamente os globos oculares com máscara opaca para evitar agravos à retina 7. Embora estes procedimentos sejam comuns aos profissionais de saúde, deve-se considerar que: Para a mãe que vivencia pela primeira vez um filho sob fototerapia, esta visão pode parecer assustadora ou, no mínimo, estranha, de acordo com sua percepção em relação ao tratamento, seus riscos e benefícios8:20. Nesse contexto, o presente estudo tem como objetivos: - Conhecer a percepção da mãe acerca da fototerapia e; - Identificar as dificuldades da mãe relacionadas ao tratamento fototerápico. METODOLOGIA Trata-se de um estudo descritivo com abordagem de natureza qualitativa, que responde a indagações de cunho particular, visto que corresponde a um espaço profundo das relações, dos processos e dos fenômenos que não podem ser reduzidos à operacionalização de variáveis 9. Teve como cenário o Alojamento Conjunto (AC) de um hospital público de médio porte, conveniado ao Sistema Único de Saúde (SUS), em Fortaleza, Ceará. Os sujeitos foram 8 puérperas com faixa etária entre 13 e 25 anos, sendo 3 primíparas, 3 secundíparas e 2 multíparas, independente do tipo de parto e da idade gestacional. Todas as participantes estavam acompanhando seus filhos submetidos à fototerapia. O critério de inclusão no estudo foi ser mãe de um neonato em tratamento fototerápico no AC. Os dados foram coletados no período de maio e junho de 2006, por meio de entrevista com duas questões de pesquisa: O que representa para a senhora (nome da puérpera) ver o seu filho sob fototerapia; quais são as dificuldades enfrentadas em relação aos cuidados com o seu bebê na fototerapia? Com o consentimento prévio das participantes, utilizamos como recurso adicional um gravador para registrar os discursos. O tempo médio de duração de cada entrevista foi de 30 minutos, durante o expediente de trabalho de uma das pesquisadoras. As falas das par ticipantes foram organizadas em categorias e submetidas à análise de conteúdo10, que permite enfocar seus principais aspectos em suas três etapas: préanálise (que corresponde à exploração do material), tratamento dos dados obtidos e interpretação. A presente pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisas, dentro dos princípios basilares da Resolução 196 de 10/10/199611. Todas as participantes assinaram um termo de consentimento livre e esclarecido e foram informadas do objetivo do estudo, sendo-lhes assegurados o direito à 88 privacidade, sigilo, acesso aos dados, bem como a liberdade de se retirarem do estudo se assim o desejassem sem que este fato representasse qualquer tipo de prejuízo para si ou para o neonato. Como forma de anonimato, atribuímos nomes fictícios às participantes. ANÁLISE E APRESENTAÇÃO DOS RESULTADOS As puérperas entrevistadas receberam nomes de pedras preciosas: Topázio, Turmalina, Ametista, Esmeralda, Brilhante, Ônix, Rubi e Ágata, pelo fato de representarem preciosidades comparadas às preciosidades existentes no ser mãe. Com as entrevistas já realizadas e analisadas, identificamos as seguintes categorias: percepção da mãe quanto ao cuidado com o bebê sob a fototerapia; dificuldades enfrentadas pela mãe com seu filho em fototerapia; e a mãe após as orientações recebidas. Categoria 1: Percepção da mãe quanto ao cuidado com o bebê sob fototerapia Os sentimentos são caracterizados por estados de afetividade diante os fenômenos da vida de cada ser humano. De acordo com o autor 12:118 “a linguagem dos sentimentos pode ser positiva e negativa, proveniente das percepções ou sensações que experimentamos em nosso cotidiano”. Portanto, os sentimentos podem afetar a vida cotidiana do ser humano, principalmente quando surgem situações delicadas que envolvam a família e particularmente os filhos. Diante das falas, entendemos que, na percepção das puérperas, o temor de colocar o bebê sob a luz é um dos pontos cruciais por abalar muito todo o seu ser. Subcategoria: Temor da luz Cientificamente, a luz faz parte de um comprimento de onda sensível ao olho humano, de uma radiação eletromagnética pulsante ou, em um sentido mais geral, qualquer radiação eletromagnética que se situe entre as gamas infravermelha e ultravioleta 13. A fototerapia é um aparelho que utiliza luz para fins terapêuticos, especialmente em bebês que necessitem permanecer expostos a essa luz. Entretanto, para as mães, a luz é temida e apavorante, como constatamos nas falas que seguem. [...] o calor da luz, os olhos cobertos devem doer muito, é ruim, pois tudo é escuro (Brilhante). [...] Tenho medo de ele não poder mais enxergar, penso que a luz está entrando nos seus olhos (Topázio). [...] Pra mim sinto que esta luz dá muito calor ao meu filho, e fico angustiada. Passo o tempo inteiro olhando se a proteção esta bem aderida, direitinha. E nem durmo bem de tanta preocupação (Turmalina). [...] Tive muito medo da luz. Mas depois vi que essa luz é uma cura. Ele está sofrendo, mas é o melhor, então fico conformada (Esmeralda). [...] Sinto pena por ele ficar com o corpo quente, como se a luz fosse queimar o seu corpo, e a proteção dos Percepções Maternas: O Neonato em Uso de Fototerapia Rodrigues FLS et al olhos deve maltratar meu filho... quando vão trocar ele chora, acho que dói (Rubi). [...] Se eu pudesse, ficaria no lugar dele, cuido o tempo todo dele. Não gosto de ver o meu filho com aquela coisa nos olhos, sinto que maltrata. Ele fica na escuridão e eu no claro (Ágata). Nos depoimentos de Ágata, Rubi e Brilhante, a venda nos olhos do bebê maltrata. Além do mais, acreditamos no impacto enfrentado pela mãe no primeiro momento, ao ver o bebê com a venda escura nos olhos. Para elas é apavorante. No entanto, elas se conformam, por cofiarem no referido tratamento. Topázio comenta sobre a preocupação com a luz, por temer que o seu filho não enxergue após o tratamento. Entendemos a sua preocupação e sabemos que o instinto materno é aguçado pelo fato de proteger sua cria. Torna-se necessário fazer a proteção dos olhos com venda escura afim de não lesar a retina. Por ocasião das mamadas, podese retirar a venda para que a mãe se sinta menos temerosa 6. A fototerapia não é isenta de risco, portanto, segundo a concepção de uma estudiosa no assunto: É de responsabilidade da enfermeira o cuidado com o perfeito ajuste desta máscara, o suficiente para evitar a penetração dos raios luminosos sem causar desconforto ao RN ou pressionar os globos oculares ou impedir a circulação 8:43. A equipe de enfermagem atenta, preparada e competente está sempre pronta para atender a mãe e o neonato. Assim, concordamos com a seguinte afirmação7:110: “é fundamental que a equipe de enfermagem esteja sensibilizada para remover a proteção ocular com cuidado especial”. No relato de Rubi, há a preocupação com o calor do corpo do bebê e com o manuseio de troca da venda dos olhos que, segundo refere, deve doer. A termorregulação é um dos importantes cuidados de enfermagem e, como tal, deve ser controlado, evitando maiores transtornos para o bebê. Pesquisadores 4 relatam que, dentre os efeitos colaterais, a luz pode provocar eritema e a síndrome do bebê bronze, além de causar queimaduras, que geralmente são mais graves em RN prematuros, alteração do equilíbrio hídrico, choque, hipertermia, diarréias e possível lesão da retina. Nos demais depoimentos, percebemos sentimentos de preocupação, de insegurança emocional e de temor, aliados ao sentimento maternal de amor pelo filho e até de tristeza, por todos os momentos que estão passando junto a eles. A proteção ocular com venda estéril, apropriada, de tamanho adequado e bem ajustada, evita lesões nos fotorreceptores da retina. A fixação da proteção ocular é de extrema impor tância. A inadequada fixação pode trazer grande risco ao recém-nascido, isto é, lesionar a retina 7. É interessante ressaltar que a troca da proteção ocular diária, e por ocasião das mamadas, favorece a interação do binômio mãe e filho, promove a comunicação não verbal e condição de aconchego, quando os olhos da mãe e do bebê se encontram 14. Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 86 - 91. Percepções Maternas: O Neonato em Uso de Fototerapia Rodrigues FLS et al Faz parte do cuidado de enfermagem fechar os olhos do neonato antes de colocar a venda e realizar a inspeção ocular para identificar drenagem de secreção ou abrasão. Subcategoria: Aceitação do tratamento Analisando essas falas, percebe-se o quanto é importante a conscientização da mãe com relação ao tratamento a que o seu filho está se submetendo. Entendemos todo o seu sofrimento, principalmente ao ver o quadro apresentado, isto é, o aparelho de fototerapia, o bebê com a venda escura nos olhos, a luz e, principalmente, a distância do aconchego dos braços da mãe. [...] Sei que ele tem que ficar per to da luz. Vejo as enfermeiras passando e olhando se estão per to da luz (Ágata). [...] Hoje faz três dias do tratamento. No primeiro dia chorei muito. Mas hoje sei que é para o bem dele. Sei que esta luz cura (Ônix). [...] A luz, mesmo tendo preocupação, sei que vai curar o meu filho, porque vai sair a amarelidão e ele vai ficar bom (Turmalina). [...] Estou consciente do tratamento, tem que ser assim. Então aceito. Queria estar com ele junto de mim (Esmeralda). [...] É uma barreira entre nós dois, mas tenho que suportar... essa luz é para o bem dele (Ametista). [...] Me assusta, me inquieta... sei que quanto mais tempo ficar na luz mais rápida é a cura e ele vem logo pra junto de mim (Topázio). Diante das falas, entendemos que as mães estão conscientes sobre o tratamento em fototerapia. Percebemos o quando é difícil enfrentar a situação apresentada. Mesmo manifestando sentimentos de inquietação e de tristeza, todas foram unânimes em aceitar e saber que o tratamento é importante e necessário para a cura. Como seres humanos, as mães experimentam sentimentos, especialmente o de amor, presente em todas as falas. O sentimento do amor é sabiamente descrito pela autora 15:95 desta maneira: “o amor implica a capacidade de estabelecer limites entre si e o outro, um contato de boa qualidade, com espontaneidade e aceitação”. Percebemos também que as mães ficam emocionadas diante das situações apresentadas de angústia e de aflição vividas com o bebê em uso da fototerapia. Nesse sentido, evidenciamos as palavras de outras autoras16quando enfatizam que as mães têm necessidade de segurança, de conversa, de orientação, de receber conforto, atenção e informação. Não obstante, na maioria dos neonatos, a icterícia seja classificada como fisiológica benigna e autolimitada, segundo a pesquisadora 8:33: Outros a apresentam como um sintoma de doença a ser investigada com a devida urgência, em razão da toxicidade da bilirrubina que, não estando ligada à albumina, pode facilmente atravessar a barreira hematoencefálica, atingir as células cerebrais e causar a cor amarelada do tecido cerebral, ou Kernicterus, Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 86 - 91. 89 cujos sobreviventes podem manifestar os mais variados graus de seqüelas neurológicas. O Kernicterus, provém da deposição de bilirrubina no tecido cerebral causando lesões celulares, podendo acarretar paralisia cerebral e outras complicações 19 Vale ressaltar que a patologia citada evolui em três fases clínicas, e a fase mais crítica leva a seqüelas neurológicas residuais, que evoluem para o retardo mental, surdez neurossensorial, paralisia do olhar superior, disfunções motoras e displasia do esmalte dentário 20 . Por tanto, quanto mais precocemente a icterícia for identificada e forem instituídas as medidas terapêuticas adequadas, melhor será o prognóstico. Autores5 versam sobre a progressão da icterícia, que pode ser lenta ou rápida. Quando a icterícia é fisiológica, não existe o comprometimento do estado geral do neonato; no caso da icterícia patológica, sinais como sucção débil, hipoatividade, hepatoesplenomegalia, anemia e anasarca podem se fazer presentes 8. Categoria 2: Dificuldades enfrentadas pela mãe com seu filho sob fototerapia No que tange às dificuldades enfrentadas, constatamos várias nesta categoria. Estas dificuldades foram oriundas de insegurança e desconhecimento antes de receberem as informações sobre o tratamento. [...] Tive dificuldades em dar de mamar porque não podia tirar ele da luz por muito tempo para dar uma volta com ele (Topázio). [...] É difícil manter o bebê no berço, ele chora bastante, deve ser incômodo para ele (Esmeralda). [...] Acho difícil trocar as fraldas dele debaixo da luz (Rubi). [...] Tive dificuldades para aceitar aquela coisa tapando os olhos do meu filho. Penso que maltrata. Sinto vontade de descobrir os seus olhos para olhar dentro dos olhinhos dele e ele olhar para mim (Turmalina). [...] Primeiro foi a de aceitar meu filho debaixo da luz e com aquela coisa nos olhos, mas fiquei conformada, pois sei que é para a cura dele (Ônix). [...] Dificuldade para amamentar e também com a venda é muito ruim... não podia ver os olhinhos dele. Quando tira a venda, dói e ele chora (Agata). [...] A minha dificuldade é se estou dando de mamar em quantidade certa para encher a barriga dele, pois sei que quando ele faz xixi ou cocô é porque ele está mamando bem e soltando esta substância que faz a pele dele ficar amarela (Ametista). Nas falas de Topázio, Ágata e Ametista, estão presentes as dificuldades quanto ao aleitamento materno. Ametista se preocupa com a quantidade do leite ingerido pelo bebê. Já Topázio demonstra dificuldades relacionadas ao bebê por não poder permanecer muito tempo fora da fototerapia, e Ágata, em amamentar com a venda nos olhos do filho. No entanto, para Rubi, a dificuldade é a troca de fraldas debaixo da luz. 90 Ficou evidente que estas dificuldades estão relacionadas ao próprio estado emocional no qual se encontram e ao desconhecimento de cuidar de seu filho sob fototerapia, o que as fazem temer por praticarem algo errado com o seu bebê. Dessa forma, evidencia-se a necessidade de maiores esclarecimentos e informações sobre o referido tratamento. Categoria 3: A mãe após as orientações recebidas A fototerapia, além de interromper o relacionamento amoroso mãe-bebê, é um tratamento que necessita de cuidados especiais e orientações específicas para quem cuida e principalmente às mães que ocupam lugar importante de ajuda no cuidado para com o seu filho. Entendemos que apesar da situação vivenciada, as mães, quando são orientadas acerca da patologia e do tratamento, aceitam e até colaboram com o cuidado de enfermagem ao neonato sob fototerapia. Nesse contexto, corroboramos as pesquisadoras17 quando enfatizam a extrema importância da orientação sobre todos os procedimentos realizados com o pequeno paciente, bem como sobre o aparato tecnológico ao redor dele. Para isso busca-se estar com a mãe e o RN. [...] Sei que quanto mais eu amamentar, mais esta substância que causa amarelidão na pele sai na urina e fezes como foi dito pela enfermeira do plantão ontem à noite (Brilhante). [...] A enfermeira falou ontem que tem que mudar o bebê de posição de vez em quando (Citrino). [...] Recebi informações sobre a doença, isto me tranqüiliza (Ágata). [...] Todos os dias as enfermeiras passam e me explicam como cuidar do meu filho (Topázio). [...] A enfermeira me orientou como posicionar o bebê para que a luz penetre melhor em todo o corpo do meu filho (Ametista). [...] A enfermeira me falou que a venda nos olhos é para proteger o meu filho da luz, e ter cuidado para não deixar a venda sair do lugar (Ônix). [...] Recebi orientação para não me preocupar com a luz, porque ela trata da amarelidão da pele e a substância que faz mal sai pelo xixi e cocô (Esmeralda). [...] Aprendi que o corpinho do bebê deve ficar descoberto. Agora aceito porque sei que faz bem (Turmalina). Percebemos as dificuldades enfrentadas pelas mães durante todo o período de internação do filho, as preocupações advindas, o sofrimento diante do quadro clínico e o Percepções Maternas: O Neonato em Uso de Fototerapia Rodrigues FLS et al desconhecimento sobre o tratamento. No entanto, entendem e mostram-se confiantes ao receberem as orientações. Nesse sentido, concordamos plenamente com o seguinte pensamento: a disponibilidade da enfermeira é essencial, para ouvir, dialogar, apoiar e transmitir confiança 18. CONSIDERAÇÕES FINAIS Neste estudo buscou-se conhecer e analisar a percepção da mãe ao ver o seu filho sob fototerapia. Foi importante e gratificante no sentido de entender a relevância desta experiência para as mães mediante seus depoimentos. As experiências verbalizadas pelas puérperas quanto as suas percepções sobre o tratamento fototerápico representaram paras elas situações de inquietação, de temor pela luz e de tristeza. Tais sentimentos merecem por parte dos profissionais de enfer magem atenção especial, principalmente sobre a orientação as estas mães. Nos relatos, um dos pontos que mais causou impressão negativa do tratamento sob fototerapia está relacionado ao uso da venda ocular, que foi referida pelas mães como incômoda e que maltrata os olhos do bebê, além de privá-las da sensação conseguida através da interação “olho no olho”. Consideramos outro fato importante, atribuído pelas mães ao calor da fototerapia, o temor de queimar a pele do seu filho. Os relatos destas mães representam as novas experiências vivenciadas com o neonato no ambiente hospitalar, onde percebemos o cuidado amoroso da mãe para com seu filho e, ao mesmo tempo, a sensação de medo para enfrentar o tratamento fototerápico, embora tenham sido orientadas pela equipe de enfermagem. O presente estudo expõe situações problema geradas nas falas das mães; por tanto, acreditamos que estas situações possam despertar para uma reflexão sobre a temática em pauta, assim como fazer repensar o nosso cotidiano com competência e humanismo. Compete a nós profissionais de enfermagem vislumbrar uma nova caminhada, lembrando da impor tância das orientações durante o pré-natal sobre o tema em foco. Percebemos que o desconhecimento sobre o tratamento é unânime. É necessário valorizar a comunicação efetiva da equipe de saúde com a mãe do neonato sob fototerapia para que esta, sendo conhecedora do tratamento e de seus riscos e benefícios, possa estar-bem e estar-melhor enquanto vivencia a experiência de presenciar seu filho sob fototerapia. Portanto, surge a necessidade de desenvolver novas formas de assistência, buscando a compreensão de cada mãe, além de repensar os ensinamentos e orientações para que possamos, finalmente, assumir autenticamente os cuidados de enfermagem ao binômio mãe-filho no sentido de proporcionar melhor qualidade da assistência. Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 86 - 91. 91 Percepções Maternas: O Neonato em Uso de Fototerapia Rodrigues FLS et al Referências 1. Cobertor de luz do recém-nascido.[on-line] 2005[citado 05 nov 2005].Disponível em: <http/www.fpesp.br/cap 2. Pediatria Evangélico.[on-line] 2005 [citado 03 nov 2005]. Disponível em: www.pediatriaevangelico.com.br/cient/liv/icter.htm 3. Arone ME. 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Escola Assis Chateaubriand (MEAC) – Universidade Federal do Ceará (UFC). Mestre em Enfermagem Clínico Cirúrgica. Docente do Curso de Enfermagem da Faculdade Integrada da Grande Fortaleza. E-mail: [email protected] Antonia do Car mo Soar es Campos Soares Enfermeira da UTI – Neonatal da MEAC/UFC. Doutora em Enfermagem. Docente do Curso de Enfermagem da Universidade de Fortaleza – UNIFOR. E-mail: [email protected]. Recebido em 03/10/2006 Reapresentado em 18/03/2007 Aprovado em 21/03/2007 Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 86 - 91. 92 A família da criança dependente de tecnologia Leite NSL et al A FAMÍLIA DA CRIANÇA DEPENDENTE DE TECNOLOGIA: ASPECTOS FUNDAMENTAIS PARA A PRÁTICA DE ENFERMAGEM NO AMBIENTE HOSPITALARa The Family of the Technology-Dependent Child: Fundamental aspects for hospital nursing practices La familia del Niño Dependiente de Tecnología: Aspectos fundamentales para la práctica de enfermería en el ambiente hospitalario Noélia Silva Ladislau Leite Sueli Rezende Cunha Resumo O objetivo deste artigo é discutir as mudanças significativas que ocorrem no interior da organização das famílias em função do cuidado da criança dependente de tecnologia (CDT). Realizamos um estudo com abordagem qualitativa, utilizando, como instrumento para coleta de dados, a entrevista semi-estruturada. Os sujeitos da pesquisa foram quatro famílias de CDTs. Delineamos quatro dimensões da mudança familiar: emocional, social, financeira e impacto nas atividades rotineiras. Verificamos que acontecem mudanças no interior das famílias que cuidam de uma CDT. Estas mudanças se apresentam de forma multidimensional. A complexidade do estado de saúde-doença associado à dependência tecnológica é um desafio para as organizações dos serviços e para a abordagem dos profissionais da área hospitalar. Torna-se necessário repensar o modo de atender centrado na doença e incluir a família no processo terapêutico. O estudo aponta a relevância de desenvolvermos modelos de cuidado centrado nas famílias aplicáveis ao cotidiano hospitalar. Pala vr as-c ha alavr vras-c as-cha havve: Crianças Portadoras de deficiências. Enfermagem. Família. Abstract Resumen The objective of this article is to discuss the significant changes that occurring inside of the organization of the families related to the care of a technology-dependent child (TDC). We carried out a qualitative study, using half-structured interviews for data collection. Research subjects were four TDC’s families. Four dimensions for family changes were outlined: emotional, social, financial and impact on daily activities. We observed that changes really occur within TDC’s families. And these changes are multidimensional. The complexification of the health-illness state and technology dependence remains a challenge for service organization and for approaching hospital staff, thus it becomes necessary to rethink disease-centered care and include the family in the therapeutical process. In this sense, this study points to the relevance of developing family-centered care model suitable for the hospital’s quotidian. El objetivo de este artículo es discutir los cambios significativos que ocurren en el interior de la organización de las familias en función del cuidado del niño dependiente de tecnología (CDT). Realizamos un estudio con abordaje cualitativo, utilizando como instrumento para recolección de datos la entrevista semiestructurada. Los individuos de la investigación fueron 04 familias de CDT. Delineamos cuatro dimensiones del cambio familiar: emocional, social, financiero e impacto en las actividades rutinarias. Verificamos que ocurrieron cambios en el interior de las familias que cuidan de un CDT. Estos cambios se presentan de forma multidimensional. La complejidad del estado de salud-enfermedad, asociada a la dependencia tecnológica, resulta un desafío para las organizaciones de los servicios y para el abordaje de los profesionales del área hospitalaria, volviéndose necesario repensar el modo de atender centrado en la patología/enfermedad e incluir a la familia en el proceso terapéutico. El estudio apunta hacia la relevancia de desarrollar modelos de cuidado centrado en las familias aplicables al cotidiano hospitalario. Keywords: Disabled Children. Nursing. Family. Palabras clave: Niños con Discapacidad. Enfermería. Familia. Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 92 - 7. 93 A família da criança dependente de tecnologia Leite NSL et al INTRODUÇÃO A sobrevivência de um elevado número de crianças foi possibilitada pelos avanços na tecnologia aplicada à saúde humana. Uma conseqüência destes avanços é a existência de um grupo de crianças com necessidades médicas e de enfermagem contínuas, as Crianças Dependentes de Tecnologia (CDTs)1 . As causas da dependência tecnológica variam. Podem resultar de malformação congênita, doença crônica ou genética ou podem estar associadas a prematuridade, acidente, infecção ou doença. Destacamos alguns tipos de dependência tecnológica: traqueostomia, gastrostomia, urostomia, colostomia e ileostomia. A palavra ostomia é um designativo genérico de uma condição orgânica resultante de inter venção cirúrgica com o objetivo de restabelecer a comunicação entre uma víscera/órgão e o meio externo, compensando seu funcionamento afetado por alguma doença. Esta designação é especificada com um prefixo da topografia cor r espondente, por exemplo: tr aque aqueostomia, gastr gastrostomia, ileo ileostomia, colo colostomia, nefro nefrostomia, ureter ureterostomia, vesic vesicostomia e cist cistostomia 2. O cuidado à criança dependente de tecnologia exige da família a adoção de inúmeras medidas de readaptação às atividades do dia-a-dia. É possível citar como exemplo, o aprendizado das ações de cuidado do estoma e da pele periestomal, manuseio de sondas e equipamentos médicos como aspiradores, nebulizadores etc. Percebe-se o quanto fica difícil para estas famílias a alta hospitalar e a volta ao lar e ao convívio social, associadas às complicações com o estoma que resultam em novas internações ou retornos freqüentes ao serviço em busca de solução. A Enfermagem tem o compromisso de incluir as famílias nos cuidados de saúde, considerando “a evidência teórica, prática e investigacional do significado que a família dá para o bem-estar e a saúde de seus membros, bem como a influência sobre a doença” 3. Neste sentido, entendemos que a Enfermagem desempenha um importante papel no cuidado das CDTs e de suas famílias, tornando-se então necessário compreender a família como sujeito principal da nossa ação de cuidar, em especial, da saúde da criança. O cuidado às CDTs deve envolver uma abordagem que reconheça a família em uma relação de parceria com os profissionais4. Na atualidade, notamos esforços de manter o enfoque familiar na assistência de enfermagem em razão da importância da família para a sobrevivência e, principalmente, para o cuidado de pacientes crônicos 5,6. Mediante isto, buscamos discutir quais as mudanças significativas que ocorrem no interior da organização das famílias em função do cuidado às crianças dependentes de tecnologia. METODOLOGIA Local do estudo: Departamento de Cirurgia Pediátrica do Instituto Fernandes Figueira, pertencente à Fundação Oswaldo Cruz, instituição Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 92 - 7. materno-infantil que ocupa importante papel no cenário das instituições públicas do Rio de Janeiro. Sujeitos: Os sujeitos deste estudo foram quatro famílias de CDTs que estavam ou estiveram em acompanhamento no Programa de Assistência Integral à Criança Ostomizada, ou que tinham sido submetidas à cirurgia na instituição antes da organização do programa. Coleta de dados: Utilizamos, como instrumento para coleta de dados, as entrevistas semi-estruturadas7. O roteiro da entrevista foi orientado pela questão norteadora que dá sustentação ao objetivo do estudo: que mudanças aconteceram no interior da família para cuidar da criança dependente de tecnologia? As entrevistas foram agendadas com as famílias e gravadas em meio magnético. Esta pesquisa foi submetida ao Comitê de Ética da instituição. Após a sua aprovação, iniciamos a coleta de dados. Organização dos dados para análise: A classificação dos dados foi realizada a partir do conceito de multidimensionalidade fornecido pelo referencial teórico do pensamento complexo. A compreensão de multidimensionalidade está pautada no entendimento de que os seres humanos são unidades complexas, comportando, ao mesmo tempo, o aspecto biológico, psíquico, social, afetivo e racional8. O caráter multidimensional do conhecimento deve ser reconhecido juntamente com a compreensão de que não se pode isolar uma parte do todo, já que as dimensões estão em constante interação com todas as outras dimensões. Como exemplo, a dimensão econômica está em permanente interação com todas as outras dimensões humanas. Isto porque a economia carrega em si, de forma holográfica, as necessidades, desejos e paixões humanas que estão além dos simples interesses econômicos8. O pensamento complexo aspira ao conhecimento multidimensional9. Durante e após a transcrição, foi possível a construção de quatro categorias: dimensão emocional, dimensão social, dimensão financeira e impacto nas atividades r otineir as otineiras as.. A partir destas categorias foram realizadas as primeiras classificações dos dados. Definimos trabalhar com estas quatro categorias resultantes das mudanças observadas pelas famílias para cuidar da CDT com o objetivo de dar visibilidade a estas dimensões, apontando caminhos para a compreensão das necessidades de intervenção junto às famílias. Verificamos, efetivamente, que acontecem mudanças no interior das famílias que cuidam de uma CDT e que estas mudanças se apresentam de forma multidimensional. A teoria dos sistemas tem sido utilizada para ajudar na compreensão das famílias pelos profissionais de saúde. Um conceito que consideramos fundamental para esta compreensão reconhece que a mudança em um membro afeta toda a família3. Este conceito nos ajuda a compreender as dimensões do impacto da doença na família, suas alterações na organização e funcionamento familiar. 94 A família da criança dependente de tecnologia Leite NSL et al Neste sentido, o artigo se aproxima do universo complexo da família que, a princípio, era imperceptível para o profissional de saúde. Torna-se possível, através do diálogo e das interações, identificar o que acontece no interior das famílias e como as mudanças afetam seu funcionamento. todo o sistema. O desequilíbrio contínuo causado pelo estresse prolongado e inquebrantável pode gerar sintomas físicos e psicológicos, como tensão muscular, indigestão, ansiedade e insônia, que poderão resultar em doença12. Isto foi revelado através dos seguintes depoimentos: RESULTADOS Eu estava estressada, estressada, sabe?Não estava agüentando mais nada... O primeiro contato das famílias com a situação de dependência tecnológica Mas ele (o pai) não aceita a doença dela. Família C. A primeira grande mudança é caracterizada pelo caos que se instala na família no momento em que se depara com a situação do seu filho quando este passa a depender de tecnologia. Este momento pode ser comparado à desordem que acontece numa suposta ordem estabelecida. Isto pode ser evidenciado no depoimento da família sobre o sentimento ao ter o primeiro contato com o problema de sua criança, relatado a seguir: Até mesmo, não sei se você se lembra, no período que ele estava aqui internado como que eu me deparei com a situação do B.E. Eu já sabia que não era uma coisa fácil de tratar, mas quando eu cheguei e vi o B.E. daquele jeito, você não sabe o que é. O meu chão abriu! Eu queria me enterrar ali dentro e não sair nunca mais, só quando ele tivesse sem aqueles aparelhos todos. Família B.E. As famílias entrevistadas demonstraram, através dos seus depoimentos, a importância do primeiro contato que tiveram com a situação das suas crianças, evidenciando ser aquele um momento de grande impacto, devendo, portanto, ser tratado por nós da equipe de saúde com igual importância e respeito. Esta é, então, uma questão que merece reflexão acerca da nossa prática profissional, que, ao privilegiar o cuidado em sua perspectiva biológica (patologia e doença), unidireciona nosso olhar, secundarizando o cuidado humano, que se reveste de amor, compaixão e solidariedade. Torna-se necessário repensar o modelo de assistência hospitalar vigente, que orienta as práticas profissionais, estruturado em torno de uma lógica cuja ênfase está na utilização crescente do aparato tecnológico e na sustentação de uma visão predominantemente biologicista e mecanicista dos responsáveis pela atenção à saúde 10. A dimensão emocional da mudança: O aspecto emocional da mudança nas famílias tem sido documentado em alguns estudos. Relata-se uma grande variedade de emoções experimentadas por estas famílias como: ansiedade, irritação, culpa e frustração1. Destacamos que as responsabilidades e desafios para cuidar da CDT acarretam sobrecarga física e emocional para a mãe 11. Em nosso estudo, as famílias referiram experimentar uma série de alterações emocionais, dentre as quais destacamos: estresse, medo, culpa, problemas conjugais e não-aceitação. Olhando pela perspectiva sistêmica, o fenômeno do estresse ocorre quando uma ou diversas variáveis de um organismo são forçadas até seu limite extremo, induzindo a um aumento da rigidez em Então eu fico muito, muito assim, o meu nervosismo, eu era uma pessoa calma, mudou porque eu estou muito nervosa, estressada, e é isso [...] Então mudou isso, o nervosismo, eu não estou me controlando, de jeito nenhum eu estou me controlando. ... Além de ver esse problema da B.J. eu fico me perguntando por que ela nasceu assim e não tem uma explicação. Os médicos dizem que não tem explicação. Mudou muito na relação com o meu marido. Eu brigo muito com ele, eu me estresso porque eu não tenho paciência [...] então aí a gente se estressa muito, a gente fala coisas que não devia falar um pro outro, entende? Já me separei dele uma vez... Família B.J. ... Tinha medo de cuidar, a princípio tinha medo de cuidar, medo de colocar a mão... Família D. Um estudo de revisão da literatura sobre a experiência das famílias no cuidado domiciliar das CDTs1 refere a presença de sintomas de doenças na família. Pudemos confirmar esta experiência no depoimento da família C, abaixo relatada, sobre o alcoolismo paterno que se inicia após a situação de doença da criança. Este estudo refere também a ocorrência de mudanças comportamentais dos irmãos das CDTs, que foi percebida pela família B.E. e destacada em seu depoimento. Porque ele passou a beber de domingo a domingo, sem parar. Família C. Eu acho que foi até aí que o L (irmão da CDT), de 5 anos, ficou assim muito à vontade, sabe, [...] sem limite [...] Aí aconteceu isso também, de eu achar o L, entre aspas, muito sem limites, né? [...] foi outro tipo de problema que vivenciamos também. Essa coisa, essa agitação do L. Família B.E. A dimensão social da mudança: A dimensão social é outro aspecto da mudança familiar que se apresenta de forma muito impactante. Verificamos a ocorrência deste aspecto em um estudo1 no qual considera-se que cuidar de uma CDT pode causar isolamento social para a família. As atividades sociais costumam ser drasticamente reduzidas em virtude das impossibilidades impostas pelo cuidado, levando a família a uma espécie de confinamento domiciliar. Este isolamento social ocorre devido à natureza do equipamento que a criança necessita, que pode ser pesado ou de difícil manejo, tornando um simples passeio uma expedição maior, ou devido ao sentimento de absoluta exaustão dos familiares1. Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 92 - 7. A família da criança dependente de tecnologia Leite NSL et al Devemos considerar, entretanto, que as famílias estudadas também se submetiam a este confinamento apesar de não haver entre suas crianças necessidade ou dependência de equipamentos pesados ou de difícil manejo. Sem poder, né, ter nossa vida, os nossos hábitos que nós tínhamos de ir à igreja, de ir à casa de um amigo, de ir a um aniversário, nós não podíamos ir... Família D. Você tem de abrir mão da tua vida, do teu trabalho, das pessoas com que você convive, das tuas saídas, da tua diversão[...]Então, houve uma época que X (pediatra que atendia a criança) falou assim: - Você evita, [...] sair ao máximo onde tem muita aglomeração. Aí eu arregalei um olho deste tamanho e fiquei com um medo danado, né? Você sabe que até hoje eu não saio para ir a parque, eu tenho medo, ela foi ao parque uma vez... Família C. Observamos, no depoimento da família D., que eles consideravam o trabalho para sair de casa tão desgastante que optaram pelo isolamento.Torna-se necessário esclarecer que, neste momento relatado pela família D., a criança ainda não estava utilizando o dispositivo coletor bolsa de colostomia e, conseqüentemente, a família se sentia insegura para sair de casa. Isto reforça claramente a importância do dispositivo adequado e acessível às CDTs, assim como das informações sobre o uso adequado, suas possibilidades e limitações. Assim, quando assistidas corretamente, a criança colostomizada/ ileostomizada e sua família não precisam estar limitadas ao confinamento domiciliar. Mais uma vez, revela-se o aspecto da inseparabilidade das dimensões afetadas pela doença na família. Pensando de forma sistêmica, é possível notar a alteração que a ausência do dispositivo, bem como da abordagem educacional adequada pode causar na família, gerando, como mostramos, um confinamento desnecessário, que também poderia ser correlacionado a alterações de ordem emocional dos membros da família. A dimensão financeira da mudança: O mais poderoso preditor de estresse para as famílias de CDTs são os problemas financeiros1. A ocorrência de estresse familiar relacionado ao cuidado da CDT no domicílio tem sido observada. Este estresse também é motivado pela sobrecarga financeira imposta à família, em que se nota um aumento de sintomas depressivos nas famílias com baixo nível socioeconômico que cuidam de CDTs13. Outro aspecto relevante foi a re-hospitalização da criança ou a descontinuação do tratamento em razão dos problemas financeiros14. Em nosso estudo, dois depoimentos refletiram este tipo de problema: ... A gente tem que abrir mão de tudo, do trabalho [...] pra poder cuidar da criança. Isso tudo, teu nível vai abaixando, (ri) até o ponto de você ficar totalmente dependente de todo mundo, entendeu? Família C. Eu tive que buscar recursos em outra cidade, eu tive que buscar recursos pela internet, sabe? Através de telefone, procurar o local onde esse material era mais Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 92 - 7. 95 barato, até mesmo porque a Secretaria de Saúde, ela me fornecia esse material, mas em quantidade mínima. Porque era um material importado, caro, de alto custo [...] Todas as pomadas que você imaginar eu tenho dentro desta caixa. Então, ali foi um gasto enorme... Família D. Constatamos ainda, a par tir dos depoimentos, uma mudança expressiva na vida profissional das mães. Estas referem que deixaram de trabalhar ou reduziram sua carga horária para cuidar da CDT. Este é um aspecto que pretendemos discutir pela necessidade sentida pelas famílias de estarem disponíveis para este cuidado. Observa-se que, no momento em que a família aumenta sua despesa com gastos extras, é exatamente o momento em que a receita familiar diminui com a saída da mãe do trabalho. Apesar de existirem subsídios para as famílias de doentes crônicos, tais como passe livre municipal e benefício de prestação continuada (um salário mínimo mensal pago às pessoas portadoras de deficiência), estes não parecem ser suficientes, ou as famílias não preenchem os critérios exigidos. Enfatizamos que uma possibilidade para atenuar esta situação, identificada mediante o diálogo com as mesmas, seria a mãe da CDT poder fazer jus a benefício previdenciário ou assistencial enquanto a situação de dependência tecnológica persiste, considerando que as ostomias em crianças são, em sua maioria, temporárias. A saída da mãe do trabalho torna-se um problema financeiro para as famílias, mas representa também um forte impacto emocional, pois diz respeito à necessidade que tem de estar produzindo, como reflexo de sua identidade na sociedade. A princípio você tem que parar de trabalhar para cuidar da criança, principalmente de uma criança com este tipo de problema que é ileostomia. Família C. ... Eu tive que sair do trabalho, né? Eu trabalhava, então eu tive que sair do trabalho porque não é todo mundo que toma conta de uma criança assim e sabe cuidar direitinho. Família B.J. Esta é uma questão na qual precisamos nos deter, considerando que a despesa extraordinária para cuidar da CDT deve ser discutida no âmbito dos programas de assistência primária à criança. Trata-se de uma agenda urgente visto que o cuidado destas crianças no domicílio diminui os gastos com despesas hospitalares para os cofres públicos, mas onera ou torna radicalmente insustentável o cuidado domiciliar com recursos exclusivos das famílias. Dimensão do impacto nas atividades rotineiras Nesta categoria, procuramos compreender o impacto que o cuidado domiciliar à CDT pode trazer nas atividades rotineiras familiares. Como atividades rotineiras, incluímos tarefas como limpar a casa, cuidar dos outros filhos, preparar alimentos, entre outras. As atividades rotineiras estão referidas como um aspecto instrumental do funcionamento da família, entendendo esta área como particularmente importante em famílias com 96 A família da criança dependente de tecnologia Leite NSL et al problemas de saúde. Isto ocorre porque as atividades da vida diária são, em geral, mais numerosas e freqüentes, assumindo maior significado devido à presença da doença em um membro da família3. As famílias referem ter identificado estratégias para contornar a situação de cuidados especiais à criança e ao mesmo tempo manter um ambiente limpo, adequado para a permanência da criança. Então, foi um cuidado a mais com a casa, que eu não tinha aquele tempo, de dar ao mesmo tempo carinho pra ele, olhar ele, e cuidar daquilo tudo. Então, quer dizer, foi muito difícil. Foi muito difícil conciliar as duas coisas, sabe? Então o que nós fizemos? Eu fiquei a parte da manhã, fazia esta parte, a higiene da casa, principalmente onde ele estava. Minha mãe ficava um pouco com ele, levava ele um pouco pra casa dela, eu organizava tudo lá em casa, fazia tudo assim correndo, a jato, pra poder pegar ele e levar ele pra casa. Aí organizamos dessa forma. Família B.E. A princípio você tem que ter muito cuidado com o material que ele utiliza, seja mamadeiras, seja pratos, copos que ele utiliza, sempre muito bem lavados, né? [...] Sempre desinfetados. [...] Nunca dar comida a ele da rua. Sempre coisas feitas em casa, sabe? Sempre alimentos assim, frescos. Nunca dou uma coisa assim de um dia para o outro pra ele, sabe? Sempre com essa preocupação de uma infecção intestinal. Família D. Outro aspecto destacado pela família D. foi quanto à alteração que ocorreu nas atividades de sono/repouso da família. Esta situação foi colocada como um fator de estresse familiar causado, obviamente, pela exaustão do cuidado sem pausas. Mais uma vez destaco a importância do uso do dispositivo adequado, neste caso, bolsa coletora para a ileostomia. O cuidado sem pausas referido pela família estava relacionado às lesões periostomais causadas pela nãoutilização do dispositivo que garantiria a integridade da pele e um sono tranqüilo e reparador para a criança e sua família. É preciso esclarecer que a família D., em alguns casos, nomeia o estoma da criança de colostomia e, em outros, de ileostomia. Na realidade, D. tinha uma ileostomia: Nós não tínhamos nem como dormir, porque o início da colostomia, o retorno dele pra casa, o que é que aconteceu?O ácido que saía dali era muito forte, o líquido que saía entre as fezes era muito forte. [...] Ficou em carne viva, aquela vermelhidão toda [...] Porque toda hora que o D. soltasse o líquido, que o líquido vazasse pela colostomia, tinha que ser trocado. Família D. CONSIDERAÇÕES FINAIS Através deste trabalho, foi possível uma análise profunda e multidimensional das famílias de crianças dependentes de tecnologia. Nessa análise, pudemos perceber que as mudanças na vida das famílias que cuidam de CDTs se apresentam em múltiplas dimensões. O primeiro impacto configura-se a partir do contato inicial com a situação de dependência tecnológica de seus filhos e se caracteriza como um importante momento nas suas vidas. Esta descoberta nos faz refletir sobre nosso papel de intervenção junto a estas famílias no início do processo. Ou seja, o nosso comprometimento profissional com as famílias deve se dar desde o momento em que estas têm este primeiro contato, e não no fim do processo, quando propomos a alta hospitalar. Precisamos estar atentos para este momento, oferecendo a esta família o suporte necessário para enfrentar a nova situação, vislumbrando a possibilidade de desordem que se apresenta por esta condição. Ressaltamos aqui também a nossa preocupação com a responsabilidade que é colocada nas famílias para o cuidado domiciliar da CDT. É necessário que as instituições de saúde assumam seus papéis no acompanhamento e suporte a estas crianças e suas famílias. Verificamos efetivamente que, na prática, ocorre uma desorganização da família em várias dimensões do seu viver para dar conta de cuidar da CDT. Nesta pesquisa foi possível destacar algumas destas dimensões: a emocional, a social, a financeira e o impacto nas atividades rotineiras. O aspecto emocional da mudança foi revelado como um importante fator de desorganização familiar que evidencia uma demanda por suporte emocional. É necessário que este seja um aspecto relevante na atenção a estas famílias, porque a falta deste supor te poderá comprometer o cuidado dispensado por elas à CDT. Outro aspecto que se apresentou de forma impactante foi o social. A situação de dependência tecnológica não precisa e nem deve ser acrescida deste confinamento domiciliar, como vimos nos depoimentos. Precisamos estar atentos para as causas deste confinamento como, por exemplo, a falta do dispositivo adequado. Constatamos uma mudança expressiva na vida profissional das mães, as cuidadoras das CDTs. Em geral, estas têm que sair do trabalho ou reduzir sua carga horária para cuidar da criança. Destacamos este aspecto porque, além do problema financeiro para as famílias, a saída do mercado de trabalho causa forte impacto emocional para as mães. Considerando que a situação de ostomização em pediatria tem a peculiaridade de ser temporária, consideramos recomendável propor alteração na legislação para que a mãe da CDT possa fazer jus a benefício previdenciário ou assistencial enquanto a situação de dependência tecnológica persistir. Esta medida certamente atenuaria uma situação de grande estresse familiar. Achamos importante demonstrar o impacto nas atividades rotineiras, já que estão relacionadas ao funcionamento da família e constituem um aspecto de singular importância quando tratamos de famílias com problemas de saúde. Estas atividades assumem uma dimensão maior se considerarmos os cuidados especiais que precisam ser dispensados às CDTs. A compreensão das mudanças que ocorrem no interior das famílias em função do cuidado às crianças dependentes de tecnologia nos permite identificar as múltiplas dimensões da vida familiar que são afetadas e perceber as ligações entre Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 92 - 7. 97 A família da criança dependente de tecnologia Leite NSL et al estas dimensões. A dimensão emocional, em alguns casos, está relacionada à dimensão financeira, que também produz uma situação de confinamento desta família (dimensão social). Desta forma, vemos a rede de implicações que se forma no cotidiano de cuidados às CDTs. Este entendimento possibilita pensar o caráter multidimensional do cuidado à CDT. Percebemos a inseparabilidade destas dimensões, as implicações das partes (dimensões) com o todo (o cuidar, o viver a situação de dependência tecnológica), do todo com as partes e das partes entre si. Disto resulta que a complexidade é a união entre a unidade e a multiplicidade8. A partir da complexidade e da visão multidimensional do problema estudado, é possível evidenciar a impossibilidade de tratar a doença sem compreender a família. Consideramos que a filosofia do cuidado centrado na família é um marco fundamental para os modelos de alta complexidade. Para atender às reais necessidades das famílias, torna-se fundamental a reorientação do modelo assistencial vigente em nossas instituições hoje baseado no modelo biomédico, essencialmente biologicista e tecnicista, que não contempla as múltiplas dimensões da saúde. Assim, tor na-se imprescindível que os profissionais do cuidado, em especial as enfermeiras, desenvolvam e apliquem modelos assistenciais que contemplem uma visão sistêmica e multidimensional do cuidar e, desta forma, possam atender as demandas urgentes e inadiáveis das famílias. Este momento de busca da realidade nos leva ao pensamento de Edgar Morin: O conhecimento é uma aventura em espiral que tem um ponto de partida histórico, mas não tem um fim, que deve, sem cessar, fazer círculos concêntricos, ou melhor dizendo, a descoberta de um princípio simples não tem fim; ela reconduz ao mesmo princípio simples que ela esclareceu em parte15. Referências 10. Silveira PAF. O acolher Chapecó. In: Franco BT, Peres MAA, Foschiera MMP, Panizzi M, organizadores. Acolher Chapecó: uma experiência de mudança do modelo assistencial, com base no processo de trabalho. São Paulo (SP): Hucitec; 2004. 11. Cunha SR. A enfermeira e a família dependente de tecnologia: a intermediação dos saberes. 1997.[dissertação de mestrado]. Rio de Janeiro (RJ): Escola de Enfermagem Anna Nery/ UFRJ; 1997. 12. Capra F. O ponto de mutação. 28a ed. São Paulo (SP): Cultrix; 2002. 13. Haffner JC, Schurman SJ. The technology-dependent child. Pediatr Clin North Am 2001 June; 48(3): 751-64. 14. 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Sobre as Autoras Noélia Silva Ladislau Leite Instituto Fernandes Figueira/Fiocruz- Rio de Janeiro e-mail: [email protected] Sueli Rezende Cunha Instituto Fernandes Figueira/Fiocruz- Rio de Janeiro e-mail: [email protected] Recebido em 06/06/2006 Reapresentado em 08/11/2006 Aprovado em 15/12/2006 Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 92 - 7. 98 Vivência de Mulheres no Parto Crizóstomo CD et al A VIVÊNCIA DE MULHERES NO PARTO DOMICILIAR E HOSPITALAR Women Experience with Home and Hospital Childbirth La Vivencia de Mujeres en el Parto Domiciliar y Hospitalario Cilene Delgado Crizóstomo Inez Sampaio Nery Maria Helena Barros Luz Resumo Estudo com abordagem qualitativa, objetivando compreender na vivência das mulheres a experiência do par to normal domiciliar e hospitalar bem como discutir a vivência das mulheres nos dois tipos de partos. Os sujeitos do estudo foram sete mulheres multíparas residentes em Batalha –PI, e o instrumento utilizado foi um roteiro semiestruturado com a técnica da entrevista. Os resultados revelaram que os partos domiciliares vivenciados pelas mulheres aconteceram mais rápido, de forma natural, sem intervenções e assistidos por parteiras ou por suas mães. As posições de preferência durante o parto domiciliar foram na rede e no assento, e os par tos hospitalares foram laboriosos, complicados e com intervenções traumáticas. A melhor posição e o melhor local do par to escolhidos pelas entrevistadas foram na rede e o domicílio, respectivamente. Conclui-se que o par to domiciliar foi natural e humanizado, já o par to normal hospitalar foi conduzido pelos profissionais com intervenções sem a par ticipação ativa das parturientes, tornando-o traumático, desumano e de risco. Pala vr as-c ha alavr vras-c as-cha havve: Mulheres. Parto Domiciliar. Parto Humanizado. Abstract Resumen Qualitative study that aimed to understand the experience of women in natural childbirth at home and at the hospital, as to argue the experience of the women in the both types of birth. The subjects of the study was seven multiparous women that lives in Batalha – Piauí – Brazil, and the used instruments were a half structurized script in a interview. The results revealed that the births at home experienced by women happened faster, in a natural way, without intervention and assisted by midwives or the mother of these women. The positions preferred during the birth at home was in a net and in a seat, and the births at the hospital was difficult, complicated and with traumatic interventions. The best position and the best location of birth, choused by the interviewed women, were the net and the birth at home, respectively. It was concluded that the birth at home was natural and humanized, but the birth at the hospital was conducted by professionals with interventions without the active participation of the pregnant woman, making it traumatic, inhuman and with risk. Estudio con abordaje cualitativo, objetivando entender la experiencia de mujeres en parto natural en el domicilio y en el hospital, en cuanto se discute la experiencia de las mujeres en ambos tipos de parto. Los sujetos del estudio fueron siete mujeres multiparas que viven en Batalha - Piauí - Brasil, y los instrumentos usados fueran un guión semi-estructurado con la técnica de la entrevista. Los resultados revelaron que los partos en el domicilio experimentados por las mujeres sucedieron más rápidamente, de una manera natural, sin intervenciones y asistido por parteras o por sus madres. Las posiciones preferidas durante el parto en el domicilio fueron en la red y en el asiento, y los partos en el hospital fueran laboriosos, complicados y con intervenciones traumáticas. La mejor posición y la mejor localización del parto, escogidos por las entrevistadas, fueron la red y el domicilio, respectivamente. Se ha concluido que el parto en el domicilio es natural y humanizado, pero el parto en el hospital fue conducido por los profesionales con intervenciones sin la par ticipación activa de la mujer embarazada, tornándolo traumático, deshumano y de riesgo. Keywords: Palabras clave: Mujeres. Parto Domiciliario. Parto Humanizado. Women. Home Childbirth. Humanizing Delivery. Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 98 - 104. Vivência de Mulheres no Parto Crizóstomo CD et al INTRODUÇÃO O parto domiciliar não-intervencionista por longo tempo foi prática comum, considerada normal na sociedade. E só a partir do século XX, a medicina transformou o parto, que é um evento fisiológico, em um evento patológico, que necessita, na maioria das vezes, de tratamento medicamentoso e cirúrgico, predominando a assistência hospitalar ao parto, tornando-o, a partir daí, institucionalizado. O ambiente onde é realizado o parto é importante, pois este pode ajudar ou atrapalhar a evolução do trabalho de parto. Aqui no Brasil, além do hospital, existem outros locais pouco difundidos, onde o parto é tratado como um processo fisiológico, sobretudo os que ocorrem nas casas de parto e em domicílio1. Segundo o Ministério da Saúde, embora tenha havido uma queda na Razão da Mortalidade Materna (RMM) a partir da década de 1980 no Brasil, essa RMM permanece elevada. No ano de 2001, a RMM corrigida foi de 74,5 óbitos maternos por 100.000 nascidos vivos, apesar da subinformação e do sub-registro2. Até o início do século passado, as parteiras, aparadeiras ou comadres eram mulheres de confiança da gestante e/ou reconhecidas pela comunidade por sua experiência na realização do parto e no acompanhamento durante o trabalho de parto e pós-parto, que ocorriam no domicílio, chamado de “cuidar do resguardo ”. Essas mulheres eram pobres e geralmente pouco ou nada recebiam por seu trabalho; no entanto, faziam disso um sacerdócio. Por ser uma atividade desvalorizada, o parto era deixado aos cuidados femininos, pois além de serem raros os médicos que existiam, estes eram pouco familiarizados com o atendimento ao nascimento3. No Brasil Colônia, as mulheres eram preparadas para parir na posição agachada ou sentada e contavam com o trabalho das parteiras. Os médicos se mostravam insensíveis à dor das parturientes. Por isso, as mulheres preferiam as parteiras por razões psicológicas, humanitárias e devido ao tabu de mostrar a genitália. Estas conheciam a gravidez, o puerpério e manobras que facilitavam o parto por experiência própria, portanto gozavam de enorme prestígio na sociedade3. No final do século XVI, o cirurgião inglês Peter Chamberlain passou a utilizar o fórceps obstétrico com freqüência, fazendo com que o trabalho da parteira, reconhecido pela sociedade, começasse a sofrer declínio. A intervenção masculina passou a substituir o paradigma não-intervencionista das parteiras, e estas passaram a ser rejeitadas3. No início do século XX, os médicos formados nas faculdades brasileiras não possuíam conhecimentos práticos, apenas teóricos, pois nos hospitais não havia gestantes internadas para parir. Após a Segunda Guerra Mundial, o parto no Brasil foi progressivamente institucionalizado, com o crescimento do número de partos hospitalares. Os médicos diminuíram de forma significativa os riscos hospitalares ao incorporarem novos conhecimentos e habilidades nas áreas relativas à cirurgia, assepsia, anestesia, hemo e antibioticoterapia3. As modificações da posição vertical para a deitada, litotômica, semi-sentada, foram sugeridas em Londres e Paris, tendo como causa a comodidade do médico ou do pessoal Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 98 - 104. 99 responsável pelo atendimento ao parto. Ressaltam-se, nesta mudança, o desrespeito aos mecanismos fisiológicos do parto e o prejuízo na qualidade do atendimento ao parto normal de baixo risco. Essa alteração passa a ser adotada pela maioria das escolas médicas4. Vale ressaltar que a Organização Mundial de Saúde propõe mudanças no modelo de atendimento ao parto hospitalar/ medicalizado no Brasil, recomenda a modificação de rotinas hospitalares consideradas desnecessárias, geradoras de risco e excessivamente intervencionistas no que tange ao parto, como episiotomia, amniotomia, enema e tricotomia e, particularmente, parto cesariano. A proposta da OMS não é eliminar tais intervenções, mas reduzi-las apenas às situações de necessidade comprovada, uma vez que se entende que o modelo de atenção ao parto e ao nascimento hospitalar estaria abusando de práticas prejudiciais à saúde da mulher e do bebê5. No Brasil, o Ministério da Saúde, visando à humanização da assistência ao parto normal e à redução do índice de morbimortalidade materna e perinatal, em 1998, por meio das por tarias Ministeriais nº 2815/98 e nº 2816/98 respectivamente, estabeleceu o pagamento pelo procedimento do parto normal sem distocia à enfermeira obstetra e estabeleceu o pagamento do percentual máximo de cesarianas, e, através da Portaria 163/98, estabeleceu a emissão de laudo de (AIH) de parto normal realizado pela enfermeira6. Ainda em 1999, o Ministério da Saúde publicou outra Portaria de n° 985/99, criando o centro de parto normal (CPN), no âmbito do SUS, com equipe mínima constituída por uma enfermeira obstetra, uma auxiliar de enfermagem, um auxiliar de serviços gerais e um motorista para o atendimento humanizado e de qualidade, exclusivamente ao parto normal sem distocia realizado por enfermeiro obstetra. Essas instituições possuem um ambiente e uma estrutura física semelhante ao domicílio6. Os centros de parto normal e/ou as casas de parto são espaços que estão surgindo e que o(a) enfermeiro(a) obstetra deve ocupar, uma vez que este foi reconhecido pela OMS como o profissional mais adequado e com melhor custo – efetividade de prestador de cuidados de saúde para ser responsável pela assistência à gestação e ao parto normal, incluindo a avaliação de riscos e o reconhecimento de complicações. Tendo em vista que a enfermagem vem se preocupando e se empenhando cada vez mais na melhoria da assistência, e em especial com a humanização da assistência ao parto normal, pretende-se com este estudo ampliar os conhecimentos sobre a assistência ao parto normal, para contribuir com sua melhoria e humanização. Para isso, faz-se necessário repensar, refletir e reavaliar qual o melhor local e em que condições as parturientes poderão ter seus filhos, respeitando os seus direitos, levando em consideração os benefícios para os protagonistas de todo o processo do nascimento – mãe e filho. Diante da problemática apresentada, tem-se por objeto de estudo as experiências das mulheres que vivenciaram o parto normal domiciliar e hospitalar. E dentre as questões norteadoras destacaram-se: como foram as experiências das mulheres, com relação aos partos normais que ocorreram no domicílio e no hospital? Qual a melhor experiência, parir no domicílio ou no hospital? Por quê? 100 A partir desses questionamentos elaboraram-se os seguintes objetivos: compreender na vivência das mulheres a experiência do parto normal domiciliar e hospitalar e discutir a vivência das mulheres no parto normal no domicílio e no hospital. METODOLOGIA Este estudo é de natureza qualitativa, cujo instrumento utilizado para produção de dados foi um roteiro semiestruturado com dados de identificação e questões abertas. A técnica empregada foi a entrevista previamente agendada nas visitas domiciliares por uma das autoras. As entrevistas foram realizadas no período de março e abril de 2004 no respectivo domicílio de cada participante da pesquisa. As sete mulheres que aceitaram participar do estudo assinaram um termo de consentimento esclarecido que lhes garantia o sigilo e o anonimato exigido pela resolução nº 196/ 96 do Conselho Nacional de Saúde. Procederam-se então as entrevistas nas quais os depoimentos foram gravados em fitas magnéticas e transcritos posteriormente. Ressalta-se que, na enfermagem, a pesquisa qualitativa tem contribuído para a compreensão holística do homem, além de permitir explorar melhor cada situação da assistência. A adoção de modelos para cuidar, embasados nas crenças, nos valores e nas experiências vividas pelo indivíduo, sugere uma fundamentação humanizada do processo saúde-doença, para qual a abordagem compreensiva demonstra ser promissora, pois estuda a vivência, o significado e as experiências vividas sob a perspectiva da clientela assistida7. A pesquisa foi realizada com as mulheres que utilizavam os serviços de planejamento familiar e de controle do câncer de colo de útero do Posto de Saúde na vila Kolping, localizado na periferia da zona urbana do município de Batalha-PI, onde está implantado o Programa de Saúde da Família (PSF). A seleção foi feita com a colaboração dos Agentes Comunitários de Saúde, que fizeram o levantamento, na sua microárea, das mulheres multíparas que já passaram pela experiência do parto normal domiciliar e hospitalar, independente de se encontrar no período gravídico-puerperal, residentes naquela área coberta pela equipe do PSF. Os dados foram obtidos após sua categorização, através da transcrição das falas gravadas, da leitura e releitura do material, organização e classificação dos relatos com base na fundamentação teórica, respondendo às questões norteadoras e aos objetivos do estudo. As falas dos sujeitos foram analisadas tomando por base conceitos de Bardin (1977), através da análise de conteúdos e com base na literatura da temática em estudo. Para Bardin (1977), a análise de conteúdo se aplica a um conjunto de técnicas de análise de comunicação que contém informações sobre o comportamento humano apresentado em forma documental8. RESULTADOS Os resultados compreenderam a análise dos relatos das depoentes, com base no referencial teórico que estão distribuídos em quatro categorias. Vivência de Mulheres no Parto Crizóstomo CD et al A Vivência do Parto Domiciliar Nesta categoria as sete mulheres relataram como foram suas experiências de vivenciar o parto em casa. Eis alguns depoimentos: Eu senti as dores e esperava o menino nascer, cortava o umbigo e esperava o resto nascer. No último [referindose ao parto] não tinha ninguém, eu mesma que fiz tudo; depois que nasceu, não demorou 10 minutos e o resto saiu [referindo-se à placenta], aí foram chamar a parteira, e eu não tive nada, e nem a criança. O outro [referindo-se ao parto] que eu tive foi ligeiro, aí depois a minha mãe cortou o umbigo. O último [referindo-se ao parto] não tinha ninguém, eu mesma que fiz tudo. O outro, a minha mãe cortou o cordão (E1) Tive ajuda só da minha mãe, que pegou [referindo-se ao RN] e cortou o cordão (E2) A parteira pegou três [referindo-se RN], os outros [referindo-se aos filhos] não deu nem tempo, aí a minha mãe cortava o cordão (E4) Teve uma que eu tive sozinha, que deu muito trabalho para nascer, aí fiquei esperando a parteira chegar. Quando ela chegou, ela cortou o cordão, ficou esperando a placenta descer, aí passou a noite fazendo remédio – azeite de mamona morno e passava no pé da barriga, aí puxou e saiu. Nos outros, quando começava a sentir, aí a parteira ficava na minha casa e dormia. Ela não fazia nada, só o que ela fazia era passar a mão na barriga e nas cadeiras. Graças a Deus eu nunca tive complicação. Quando o RN dá trabalho pra nascer, que bota só a cabeça e o pescoço fora, às vezes ela segura e puxa um pouco, mas é com um jeito, porque tem o jeito de puxar, quando a dor vem de novo, enquanto não tem dor não puxa, com a força da dor ela puxa (E5) Parteira, ela tinha o curso de parteira. Às vezes, quando ela chegava eu já tinha tido, ela só fazia cortar o cordão (E6) Foi normal, eu sentia dor nas cadeiras, eu sabia que estava com dor de parir quando eu vi o sinal de parir [perdendo líquido], aí ficava andando, caminhando, trabalhando, aí eu mandava chamar a parteira. Ela cuidava de mim, me dava chá de cebola branca, esperava até chegar a hora, ela pegava o menino, às vezes ela fazia toque, ela trazia o material dela todo. Teve um [parto] que eu tive sozinha. Foi rápido, veio com tudo [referindo-se à dequitação], aí chamaram a vizinha e ela cortou o cordão. Eu só ia pra rede ou assento quando não agüentava mais, mas o resto do tempo era caminhando direto até não agüentar mais. Aí o menino nascia, ela cortava o umbigo. Aí banhava, mas agora não banha mais; elas só limpavam ele. Aí ela cuidava de mim, aí quando dava 8 dias, elas iam perguntar como é que eu estava (E7). Pode-se perceber pelas falas das entrevistadas 1, 5, 7 que os partos ocorridos em casa foram rápidos, de evolução fisiológica, portanto de baixo risco, sem intervenções, onde as Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 98 - 104. 101 Vivência de Mulheres no Parto Crizóstomo CD et al mesmas tinham toda a liberdade de ficar caminhando e bebendo líquidos, o que tornou a mulher o sujeito ativo do processo parturitivo. Essas mulheres que pariram no domicílio foram assistidas, na maioria das vezes e predominantemente, por parteiras, embora as entrevistadas 1 e 6 tenham parido sozinhas ou sido assistidas por suas mães, e as entrevistadas 2, 4 e 7 tiveram partos em que receberam assistência somente de suas mães. Mesmo sem todo o suporte de profissionais qualificados e recursos tecnológicos presentes em uma instituição hospitalar que atende à mulher nesse período, esses depoimentos mostraram partos e pós-partos ausentes de complicações para a mãe e o recém-nascido. O parto não é uma doença, é um fenômeno fisiológico, salvo em gestações de risco. Portanto, a grávida não é paciente, pois não está doente, apenas vai parir um bebê, ela é uma parturiente. Acredita-se que cerca de 40% dos partos possam ocorrer fora dos hospitais, sejam em casas de parto ou nos domicílios, conquanto que atinjam determinadas condições de seguridade. O risco existe tanto no domicílio como no hospital. Ainda não se sabe qual dos dois é o de maior risco, se o hospital ou o domicílio, para casos específicos. Acredita-se que ambos tenham suas indicações9. O parto em casa atende, de maneira particular, às necessidades psicológicas e sociais e também permite a participação e a presença ativa do pai ou companheiro. Possui muitas vantagens, tais como a liberdade de movimentos, segurança, privacidade, condições excepcionais de acolhimento do bebê, necessidades afetivas atendidas e autonomia durante o processo10. O tipo de formação profissional - de parteira/obstetriz ou de enfermeira obstétrica - tem sido apontado como um fator que influi diretamente na forma de assistência ao parto, sendo considerado menos medicalizado o parto realizado por parteira. Visando a um melhor atendimento às parturientes com a redução do número de inter venções cirúrgicas e medicamentosas desnecessárias, profissionais de diferentes áreas têm defendido a criação de cursos de obstetrícia com exame de seleção e currículo próprios, para formação de parteira/obstetriz (técnico e universitário) 11. Apesar da institucionalização do parto, atualmente as parteiras tradicionais continuam prestando assistência à mulher no parto domiciliar no interior do Piauí. Elas possuem uma grande sabedoria e humanidade, o que tem contribuído bastante para essa assistência. As parteiras em geral passam vários dias na casa da parturiente à espera da hora do parto. Elas rezam, cantam, provêem a casa de tudo que é necessário, auxiliam nos trabalhos domésticos da cozinha, nos cuidados com as crianças, assistem à puérpera, observando sintomas e dando orientações. Vale destacar que “ainda exercem outras funções além da assistência no parto. Seu tempo é livre dedicado ao parto. Possuem uma sabedoria inata, não têm pressa, pois sabem que é prudente observar a natureza e deixá-la agir”10 Em alguns países desenvolvidos, criaram-se centros de parto em hospitais ou fora deles, onde mulheres de baixo risco podem dar à luz numa atmosfera semelhante à domiciliar, com assistência obstétrica primária, em geral aos cuidados de enfermeiras – parteiras. Geralmente esses centros realizam Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 98 - 104. pouca ou menos intervenções, como o monitoramento fetal eletrônico e a correção da dinâmica/aceleração do trabalho de parto, e o uso de analgésicos é mínimo13 A Vivência do Parto Hospitalar Nesta categoria, as mulheres relataram como foi vivenciado o parto no hospital, conforme os seguintes depoimentos: No hospital, passei 5 dias tendo as dores, a criança foi empurrada [refere-se à manobra de Kristeler]. Foi mais demorado. E a outra foi puxada também (E2) O primeiro foi no hospital, eu tive as dores, aí me levaram para o hospital, eu entrei quinta e fui ter sábado. Foi um parto complicado (E4) Foi porque eu comecei a perder muito líquido, mas não sentia dor de ter [parir]. No outro dia, eu fui para o hospital, aí demorou bastante [ par to ], aí elas chamaram o doutor e me espremeram [referindo-se a manobra de Kristeler]. Foi o mais demorado de todos [referindo-se aos partos] (E5) De acordo com os relatos, os partos que aconteceram no hospital foram laboriosos e mais demorados do que o parto em casa. Também foram complicados e com muitas intervenções traumáticas e desnecessárias, como as manobras de Kristeler, ao relatarem que a criança foi “empurrada e puxada”. O Brasil adotou o modelo americano de assistência ao parto, caracterizado pela medicalização e pelo processo intervencionista, buscando sua institucionalização, adaptandose cada vez mais às novas tecnologias, incorporando-as ao grande número de intervenções e apoiando-se no enfoque de risco. É necessário, portanto, a retomada da prática do parto normal humanizado, com a redescoberta do paradigma da integridade, vendo a mulher de uma maneira holística e o parto como um evento fisiológico13. Os efeitos perversos da tecnologia são numerosos - uma intervenção não justificada geralmente desencadeia muitas outras, cada uma com seus efeitos negativos e posteriormente perigosos à saúde da mãe e do seu filho10. A par turiente deve ser acompanhada por pessoal devidamente capacitado, para que as intervenções ocorram quando necessárias, e não como rotinas, privilegiando o bemestar da parturiente e do concepto, tentando não utilizar métodos invasivos. Esse modelo de assistência é mais característico da assistência pelas enfermeiras, que atuam dentro de uma visão mais humana e holística13. O parto convencional, em sua maioria, ocorre de uma forma agressiva, em que há muita intervenção externa da equipe que o acompanha. Muitas vezes, a mulher passa por uma série de rotinas que nem sempre é necessária para a aceleração do trabalho de parto, como medicamento, amniotomia, o bebê é afastado da mãe nos primeiros minutos, dentre outros procedimentos 14. Atualmente, na rede hospitalar, verifica-se que o atendimento à gestante é bastante sofisticado, especialmente nos grandes centros. Esses progressos são importantes, mas a obstetrícia não tem dado ênfase aos aspectos psicológicos e sociais da gravidez e do parto, dando a idéia de estar mais 102 Vivência de Mulheres no Parto Crizóstomo CD et al preocupada com os aspectos tecnológicos do que com os cuidados às mulheres que vão parir15. Por mais tecnologia que seja usada, nunca será capaz de oferecer uma situação completamente segura para a mãe, feto e recém-nascido. A segurança necessita de estudos mais cuidadosos, não só em relação ao local onde ocorre o parto, mas principalmente no que diz respeito ao tipo de formação das pessoas que o assistem15. Posição do Parto Domiciliar e a Preferência das Mulheres Nesta categoria, as mulheres relataram as posições de parir no domicílio, que foram no assento e na rede, sendo a primeira a posição mais citada, conforme os depoimentos: Na rede, deitada, esperando ela nascer, porque não tinha quem me ajudasse (E1) Foram na rede os dois (E2) Fico em pé. Fico em pé todo tempo, na hora que eu sinto que vai nascer aí eu entro pra dentro, aí meu marido me segura e a parteira segura o RN (E4) Era no assento e ficava alguém me segurando (E3, E6) Na rede e no assento, mas era mais na rede (E7). A posição de parir no domicílio adotada pelas entrevistadas 1 e 2 foi deitada na rede, por estarem sozinhas. As entrevistadas 3 e 6 pariram no assento; já a entrevistada 4 pariu em pé, com seu marido a segurando, e a E7 pariu tanto na rede como no assento. Observa-se que as mulheres pariram na rede quando não possuíam assistência, e que a posição mais freqüente foi o assento. Estudos realizados no período expulsivo do parto indicam que uma posição verticalizada ou uma inclinação lateral apresentam maiores vantagens do que uma posição dorsal, como: menor desconforto e dificuldades de puxos; menor dor durante o trabalho de parto; menor traumatismo vaginal ou perineal; menor duração do período expulsivo; melhores resultados neonatais com índices de Apgar < 7. Além disso, a posição ver tical (parada ou deambulando), ou em decúbito lateral, está associada a uma maior eficiência e intensidade das contrações16. A posição vertical durante o trabalho de parto está associada ao encurtamento do primeiro período clínico do parto e pode ser indicada como alternativa ao uso da ocitocina para intensificar as contrações uterinas, pois a deambulação é tão efetiva quanto o uso de ocitocina, e a participação ativa da mulher no trabalho de parto também contribuem para redução das taxas de cesarianas17. Quando se indagou às mulheres que tiveram a experiência do parto normal no domicílio e no hospital quais foram o melhor local e a melhor posição de parir, todas elas referiram o domicílio como o melhor local, e a posição de parir foi na rede e no assento, e a rede foi a posição preferida, conforme os depoimentos a seguir: É melhor na rede (E1 e E2 ); No assento (E3); A posição do hospital é muito mais ruim (E5); É melhor a posição de casa, no assento (E4 e E6) Segundo as mulheres, as posições do parto no domicílio, tanto vertical no assento como horizontal na rede, são melhores que a posição litotômica ou ginecológica adotada no hospital. Cada mulher encontra a sua melhor posição de parir. As posições de cócoras, em pé, sentada, apoiada em alguém de sua confiança ou na rede de dormir, que é um excelente apoio, são as posições que facilitam o parto, além de serem mais cômodas. No primeiro estágio do trabalho de parto, a mulher não deve ser obrigada a permanecer no leito. Deve-se incentivar a mulher a caminhar, a ficar de cócoras e depois em pé, enfim, a se movimentar bastante ou ficar na posição em que ela se sentir melhor. São condições que a gestante pode adotar no trabalho de parto e, em geral, de forma espontânea, existindo uma tendência à alternância de posições16. As entrevistadas 5 e 7 reclamavam da posição litotômica: A posição do hospital é muito mais ruim (E5); O pior é ficar “impindurada”, porque é quase “impindurada”, a posição da gente fica toda esquisita, isso aqui [referindo-se à região perineal e vagina] da gente fica todo dolorido, as cadeiras da gente ficam muito abertas. Em casa você pode pegar no punho da rede e puxar pra baixo. No hospital não tem onde segurar (E7). A posição horizontal no parto é usada para tornar fácil ao médico fazer seu trabalho. Quando a posição deitada ou reclinada foi proposta, no século XVII, era apenas para o momento do parto, nos séculos subseqüentes, seu uso foi estendido para o trabalho de parto também, principalmente quando a assistência à parturiente passou a ser hospital 17. A mesma autora afirma também que a prevalência de episiotomia foi maior em hospitais que adotavam a posição litotômica e menor nos que admitiam as posições alternativas; portanto, existe uma associação significante entre o uso de outras posições que não a litotômica e menores taxas de episiotomia. Realizando a episiotomia na maioria das pacientes, reforça-se nos médicos a noção de que o parto é um procedimento cirúrgico17. A Melhor Experiência Vivenciada Ao indagar às mulheres acerca de qual a melhor experiência no parto e quais as razões, com relação ao local de parir, seis delas referiram ser o parto domiciliar o melhor, por diversos motivos. As mulheres assim se expressaram: Foi tudo a mesma coisa. Tudo que a parteira fez o doutor fez também. Eu acho que em casa eu me senti melhor assim, porque quando eu cheguei do hospital, eu estava toda machucada, dolorida, eu dei até febre. Já em casa os dois que eu tive, eu não tive nada disso, eu me senti melhor. Lá faz muito toque machuca muito, eu fiquei toda dolorida, demorou [referindo-se ao parto]. Em casa ela só faz um toque quando está perto, foi mais rápido (E3) Eu acho melhor em casa, porque o primeiro eu sofri muito, aí eu fiquei com medo, eu fui judiada no hospital Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 98 - 104. 103 Vivência de Mulheres no Parto Crizóstomo CD et al (..) elas só faziam aqueles toques, aquelas coisas e eu já estava toda inchada. Eu não gosto de hospital, sinto mais segura em casa (E4); Eu achei melhor em casa, porque no hospital é ruim da gente andar. E na casa da gente vai por todo lugar, fazia as coisas, varria, pegava água (E5) Eu achava melhor o parto em casa, porque a gente já ficava logo na casa da gente. Só que no hospital, quando às vezes a gente fica sentindo uma dor, a gente toma injeção, toma um soro. Quando a gente pare sozinha não tem remédio. No hospital se correr um risco, o médico salva a gente, e, em casa, não (E6) Conforme os depoimentos, seis mulheres optaram pelo parto domiciliar por diversas razões, dentre elas: maior rapidez, menos intervenções, como a não-realização do toque vaginal, ter a presença de familiares, ter mais liberdade para movimentar-se e emitir sons durante as dores das contrações uterinas. Enquanto no hospital, elas referiram que o parto era mais demorado, realizavam muitos toques que as deixavam machucadas, não poderiam se movimentar e eram transportadas várias vezes de um local para outro. Existem outras razões, em ordem de importância, que fazem as mulheres optarem pelo parto no lar, como o controle de sua própria experiência de parir; experiência obtida pela própria família; a não-interferência nos processos naturais do parto; cuidados personalizados à parturiente e o baixo custo do parto6. Estudos realizados em uma casa de parto no Rio de Janeiro evidenciou o grau de satisfação das mulheres com seu atendimento, relatando como fatores: um ambiente acolhedor, a presença contínua de um acompanhante durante o trabalho de parto, o estímulo à liberdade e poucas intervenções18. No caso das entrevistadas 2 e 7, houve dúvida e ambigüidade nos depoimentos: Eu não sei nem dizer. A dor é uma só. Em casa a gente tem medo de morrer. No hospital qualquer problema eles podem socorrer (E2) Eu acho que tudo é uma coisa só, porque se você está em casa você sofre, e se está no hospital sofre também. Eu não sei nem dizer. Em casa eu acho melhor, porque a gente termina de ganhar o seu bebê, já fica ali quietinha naquela posição na rede ou na cama, ninguém fica preocupando, terminava [o parto] eu ficava tranqüila numa boa. No hospital me tiram do lugar, me carregam de lugar pro outro, é muito ruim, porque a mulher não fica normal, ela fica toda doída, é melhor ficar quietinha, tranqüila (E7) A partir destes depoimentos, pode-se comprovar a importância das recomendações para a humanização do parto e nascimento, e entre elas está a unificação da sala de pré-parto, parto e puerpério (sala PPP), pois transferir uma parturiente da sala de pré-parto para a sala de parto é muito penoso, além de ser uma conduta que cria tensão entre os profissionais14. O parto humanizado resgata a naturalidade desse momento para a mulher, para sua família e para a equipe de profissionais Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 98 - 104. envolvida. A idéia do parto humanizado é fazer com que o parto, geralmente objeto de medos e tensões, siga a ordem natural das coisas, obedecendo ao ritmo e às necessidades específicas do corpo de cada mulher, com profissionais interferindo o mínimo possível durante o processo parturitivo no momento de a mãe trazer uma criança ao mundo5. Nas instituições hospitalares onde o médico é responsável pelo parto, a enfermeira desenvolve um modelo de assistência em função do trabalho do médico, e não do trabalho de parto. O seu trabalho está condicionado ao modo de atuação do médico de plantão. Portanto, como os centros de nascimentos e casas de parto utilizam tecnologia apropriada, e é onde o parto normal fica a cargo de enfermeiras obstétricas, a assistência é menos intervencionista e o parto é mais humanizado 6. CONSIDERAÇÕES FINAIS Nesta pesquisa observou-se que os partos que ocorriam no domicílio foram rápidos, de forma natural, ou seja, de evolução fisiológica, sem intervenções e principalmente sem complicações para a mãe e o recém-nascido. Já os partos que aconteceram no hospital, foram laboriosos e mais demorados, com muitas intervenções traumáticas e desnecessárias, motivos pelos quais as mulheres optaram pelo parto normal domiciliar como a melhor experiência vivenciada. Com base neste estudo, pode-se afirmar que o parto domiciliar ocorre de forma natural, humanizada e que as parteiras tradicionais têm muita experiência, contribuindo na assistência ao parto. Os fatores que favoreceram a ocorrência de um parto normal de evolução fisiológica no ambiente domiciliar foram: a posição do parto, que geralmente é verticalizada, a liberdade de movimento, pouca ou nenhuma intervenção, a presença de familiares que fazem diminuir a tensão e ansiedade, dando apoio psicológico. O progresso tecnológico e científico da obstetrícia e a institucionalização do parto foram importantes e de grande valia para a assistência à gestante e ao parto de alto risco, embora a mortalidade materna e perinatal permaneça alta, e o parto de evolução fisiológica tornou-se de risco, devido ao excesso de intervenções desnecessárias e de assistência desumanizada. Portanto, há uma necessidade, por parte da clientela, da implantação de um maior número de casas de partos, que se assemelhem ao domicílio, tendo em vista ser inviável o retorno ao parto domiciliar na sociedade moderna e nas grandes cidades, onde não existem mais parteiras tradicionais13. Assim sendo é imprescindível que os profissionais de enfermagem reflitam sobre as vantagens e desvantagens de cada tipo de parto, sobre as condições mais humanas e seguras para o nascimento de uma criança, analisando a forma de atendimento que é oferecida à mulher nos serviços de saúde. Conclui-se que o Ministério da Saúde deve envidar mais esforços no sentido de melhorar cada vez mais a assistência à mulher no processo par turitivo com assistência mais humanizada e menos intervencionista. 104 Referências 1. Prado AA. Resgatando o parto. [online] [citado 29 dez 2002]. Disponível em: www.amigasdoparto.com.br/ 2. Ministério da Saúde(BR). Política Nacional de Atenção à Saúde da Mulher: princípios e diretrizes. Brasília; 2004 3. Brüggemann OM. Resgatando a história obstétrica para vislumbrar a melodia da humanização. In: Oliveira ME, Zampieri MFM, Brüggemann OM, organizadores. A melodia da humanização: reflexões sobre o cuidado no processo do nascimento. Florianópolis(SC): Cidade Futura; 2001. p. 23-30 4. Collaço VS. Parto vertical: vivência do casal na dimensão cultural no processo de parir. Florianópolis (SC): Cidade Futura; 2002. p. 25-28 5. Tornquist CS. Armadilhas da nova era: natureza e maternidade no ideário da humanização do parto. 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Vivência de Mulheres no Parto Crizóstomo CD et al 14. Amigas do Parto. Recomendações para humanização do parto e nascimento. In: Manual do Parto Humanizado. Projeto Luz da Jica. [on-line] [citado 29 dez 2002] Disponível em: www.amigasdoparto.com.br 15. Rocha MIM. Opinião de primigesta e de mães presentes em serviços de higiene, pré-natal e serviços de higiene infantil de TeresinaPI. [dissertação de mestrado] São Paulo (SP): Escola Paulista de Medicina; 1982. p. 1-18 16. Ministério da Saúde (BR) Curumim G (ONG). Trabalhando com parteiras tradicionais. Brasília (DF): MS/ Grupo Curumim; 2000. 17. Osava RH. Assistência ao parto no Brasil: a participação dos não médicos.[tese de doutorado]. São Paulo(SP: Faculdade de Saúde Publica /USP; 1997. p. 120-30 18. Progianti JM, Vargens OMC, Porfírio AB, Lorenzoni DP. A preservação perineal como prática de enfermeiras obstétricas. Esc Anna Nery Rev Enferm 2006 ago;10(2): 266-71 Sobre as Autoras Cilene Delgado Crizóstomo Especialista em Enfermagem Obstétrica da UFPI; Profª da Faculdade NOVAFAPI, FACID, em Teresina-PI. E-mail: [email protected] Ine Inezz Sampaio Ner y Doutora em Enfermagem Pela EEAN/UFRJ; Profª Adjunto IV da Universidade Federal Piauí. E-mail: [email protected] Maria Helena Bar r os Luz Doutora em enfermagem pela EEAN-UFRJ; Profª Adjunto IV da Universidade Federal Piauí. Recebido em 05/06/2006 Reapresentado em 16/03/2007 Aprovado em 19/03/2007 Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 98 - 104. 105 Percepção de Mulheres Sobre Atenção Pré-Natal Landerdahl MC et al A PERCEPÇÃO DE MULHERES SOBRE ATENÇÃO PRÉ-NATAL EM UMA UNIDADE BÁSICA DE SAÚDE Women’s Perception About Pre-Conception Attention in a Basic Health Unit La Percepción de Mujeres Sobre Atención Pre-Natal en una Unidad Básica de Salud Maria Celeste Landerdahl Fernanda Bheregaray Cabral Lúcia Beatriz Ressel Mariam de Oliveira Gonçalves Fernanda Badineli Martins Resumo Pesquisa com objetivo de conhecer a percepção de gestantes a respeito da consulta de pré-natal realizada por docentes e acadêmicos do Curso de Enfermagem da Universidade Federal de Santa Maria em uma Unidade Básica de Saúde (UBS) do município. Foram sujeitos da pesquisa dez puérperas que realizaram consultas de enfermagem na UBS, no período de julho de 2003 e agosto de 2004. A obtenção das informações foi realizada por meio de entrevistas semi-estruturadas. As respostas acusam, dentre outros dados, a consulta de enfermagem à gestante como espaço educativo do qual fazem parte também seus familiares, bem como o vínculo estabelecido entre profissional e gestante/família. Por outro lado, apontam para a necessidade de maior privacidade para o atendimento e criticam a troca eventual de profissionais/ docentes nas consultas. Nesse sentido, o estudo tem auxiliado no redirecionamento da atenção à gestante, de forma que venha ao encontro de suas necessidades e expectativas. Pala vr as-c ha alavr vras-c as-cha havv e: Pré-natal. Gestante. Cuidado. Enfermagem. Abstract Resumen This research aims to know the perception of pregnant women concerning to the prenatal appointment carried out by professors and pupils of the Nursing Course of the Federal University of Santa Maria in a city Basic Health Unit. Ten pregnant women who had nursing appointments in a Basic Health Unit from July 2003 until August 2004 were subjects of the research. Semi-structured interviews have been carried out in order to obtain the answers. The answers state, among other data, the nursing appointment as an educative space where all her family members also participate as well as a connection between the professional and the woman/family. On the other hand, the answers also show the need of a bigger privacy during the appointment and criticize possible changes of professionals or professors in these appointments. Thus, this study has helped in changing the atention provided to the pregnant women so that it reaches their necessities and expectations. Esta investigación tubo como objetivo conocer la percepción de gestantes respecto a la consulta de prenatal realizada por docentes y académicos del Curso de Enfermeros de la Universidad Federal de Santa María en una Unidad Básica de Salud del municipio. Fueron sujetos de la investigación diez puérperas que realizaron consultas con los enfermeros en la UBS, en el período de julio de 2003 y agosto de 2004. La obtención de las informaciones fue realizada por medio de entrevistas semiestructuradas. Las respuestas acusan, entre otros datos la consulta con enfermeros, a la gestante como espacio educativo del cual hacen parte también sus familiares; bien como el vínculo establecido entre profesional y gestante/familia. Por otro lado, apuntan para la necesidad de mayor privacidad para el atendimiento y critican el cambio eventual de profesionales/ docentes en las consultas. En ese sentido, el estudio ha auxiliado en el redireccionamiento de la atención a la gestante, de manera que venga al encuentro de sus necesidades y expectativas. Keywords: Prenatal. Pregnant Woman. Care. Nursing. Palabras clave: Prenatal. Gestante. Cuidado. Enfermería. Esc Anna Enferm 2007 mar; 11 (1): 105 - 11. Esc Anna Nery R Enferm 2007 Nery mar; R11 (1): 105 - 11. 106 INTRODUÇÃO A gestação, embora constituindo um fenômeno fisiológico que na maior par te dos casos tem sua evolução sem intercorrências, requer cuidados especiais mediante assistência pré-natal. Essa, por sua vez, tem como objetivo principal acolher e acompanhar a mulher durante sua gestação, período caracterizado por mudanças físicas e emocionais vivenciado de forma distinta pelas gestantes. No entanto, as consultas médicas de pré-natal no serviço público são muito rápidas, fazendo com que possíveis anormalidades não sejam percebidas e impedindo que as mulheres não manifestem suas queixas, dúvidas e medos intrínsecos à gravidez 1. Esse fato tem motivado a preocupação de gestores de saúde, tendo em vista que se relaciona aos altos índices de mortalidade materna no Brasil, o qual, em 2001, foi de 74.5 óbitos por 100.000 nascidos vivos2. Em comparação com países desenvolvidos, cuja taxa é de 9 óbitos por 100.000 nascidos vivos, percebese que essa cifra é muito alta 3. Ante tais dados, cabe aos profissionais de saúde uma reflexão acerca da assistência prestada às gestantes, bem como buscar subsídios para o planejamento, implementação e avaliação da assistência pré-natal que alcancem melhores níveis de qualidade. Em consonância ao exposto, a atenção ao pré-natal, par to e puerpério está muito interligada, e a impossibilidade de acesso às informações, em qualquer desses períodos, fragiliza a assistência, expondo a mulher a risco de vida 4. A atenção pré-natal objetiva acolher a mulher desde o início da gravidez, buscando assegurar, ao seu término, o nascimento de uma criança saudável e a garantia do bem-estar materno e neonatal 5. É importante enfatizar que a atenção pré-natal, por não envolver procedimentos complexos, favorece a interação entre o profissional e a gestante e sua família. Essa interação contribui para que a gestante mantenha vínculo com o serviço de saúde durante todo o período gestacional, reduzindo consideravelmente os riscos de intercorrências obstétricas. Além disso, a assistência gestacional, quando mediada por diálogo e respeito entre profissionais de saúde e gestantes, representa o primeiro passo para o parto humanizado. Na tentativa de contribuir com a qualidade da assistência a essa clientela, o Curso de Enfermagem da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) vem, desde 1993, implementando Consultas de Enfermagem às gestantes na Unidade Sanitária Kennedy, Santa Maria (RS), mediante um projeto de ensino, pesquisa e extensão em parceria com a Secretaria de Município da Saúde. Esse projeto tem como objetivo contribuir na efetivação do Sistema Único de Saúde, bem como na reorientação do caráter de formação dos acadêmicos de Enfermagem, de modo que venha a ser condizente com as diretrizes apontadas pelo modelo de saúde em construção no país. As consultas de enfermagem no pré-natal realizadas na referida unidade são intercaladas com consultas médicas e se restringem às gestantes sem risco obstétrico. Têm seu foco Percepção de Mulheres Sobre Atenção Pré-Natal Landerdahl MC et al centrado nos aspectos educativos, os quais possibilitam às gestantes espaços para expressarem seus medos, angústias, fantasias e dúvidas sobre as modificações que estão acontecendo com o próprio corpo, permitindo esclarecimentos mediante orientações pertinentes ao ciclo gravídico-puerperal. Sob esse viés, a dimensão educativa objetiva contribuir com o acréscimo de informações que as mulheres possuem sobre seu corpo, valorizando sua experiência de vida e contribuindo de forma relevante para a busca de sua autonomia. Para isso, as ações educativas devem superar o modelo biomédico de modo que valorizem as reais necessidades da gestante, considerando sempre seu contexto de vida/saúde. Com vistas à redução da morbimortalidade materna e fetal, durante as consultas de enfermagem - além da escuta e do diálogo estabelecido com a gestante - são realizados procedimentos técnicos de rotina, tais como medida da pressão arterial, peso, cálculo da idade gestacional, ausculta de batimentos cardíacos fetais e medida da altura uterina, que são registrados no histórico de enfermagem e na carteira da gestante. Fica evidente, assim, que a assistência pré-natal almejada com essa atividade na unidade básica referida, evidencia nossa preocupação com o bem-estar físico e mental do binômio mãe e filho. No entanto, com o desenvolvimento do trabalho, passamos a perceber a necessidade de saber se essa atividade estava em consonância com as expectativas e necessidades das gestantes assistidas, constituindo, desta forma, um primeiro passo no processo de avaliação das consultas de enfermagem na unidade. Para tanto, com o envolvimento de acadêmicas do Curso de Graduação em Enfermagem/UFSM, realizamos a pesquisa, objeto do presente relato, a qual teve como objetivo conhecer a percepção das gestantes a respeito da consulta de pré-natal realizada por docentes e acadêmicos do Curso de Enfermagem na Unidade Sanitária Kennedy, em Santa Maria (RS). METODOLOGIA A presente investigação delineou-se como uma pesquisa descritiva do tipo exploratória, com abordagem qualitativa. Foi desenvolvida em uma Unidade Básica de Saúde, local de aulas práticas e estágio supervisionado do Curso de Enfermagem da UFSM, onde são realizadas ações de atenção à saúde em sintonia com os preceitos do novo modelo assistencial legalmente assegurado na Constituição Federal de 1988. Como sujeitos desta pesquisa, elegeram-se dez mulheres em período de puerpério, que realizaram sua assistência pré-natal mediante consultas de enfermagem na UBS, no período de julho de 2003 e agosto de 2004, e que aceitaram participar do estudo. Para a obtenção de dados foi utilizada a entrevista semiestruturada, individual, com roteiro específico, a qual foi realizada e gravada durante visita domiciliar à puérpera, com duração média de 45 minutos mediante agendamento prévio. As informações gravadas foram transcritas na íntegra para, após, serem categorizadas e analisadas. Nenhuma informante demonstrou objeção ao uso do gravador. Foram utilizados, Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 105 - 11. 107 Percepção de Mulheres Sobre Atenção Pré-Natal Landerdahl MC et al nesta etapa, o formulário de registro das consultas de enfermagem no pré-natal, a fim de acessar os dados de identificação e de acompanhamento do pré-natal. Buscando uma condução ética para este estudo, embasamos nossa atuação na Resolução nº 196/96, publicada no Diário Oficial da União em 10/10/96, que institui as Normas de Pesquisa em Saúde com seres humanos. Assim, antes de iniciar a coleta de dados, cada participante autorizou, por meio do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, seu envolvimento no presente estudo, sendo assegurada a validação de seu depoimento ao final de cada entrevista, a partir da escuta da fita cassete; o direito de participar ou retirar-se da pesquisa; de informação quanto ao objetivo da pesquisa, proteção e guarda do material gravado, bem como uso deste material pelas pesquisadoras; e de resguardo da sua identificação. Em respeito a esse princípio, as mulheres foram identificadas com a letra “M” e numeradas de 1 a 10. Após a coleta, os dados foram analisados em consonância às orientações de estudo6 sobre pesquisa com abordagem qualitativa. Neste sentido, foram realizadas leituras sucessivas dos depoimentos, buscando uma impregnação das informações aí contidas; estas foram agrupadas e categorizadas de acordo com as afinidades temáticas; e, após a classificação e agregação dos dados, foi realizada a interpretação dos mesmos e a comparação com a literatura específica, bem como foram feitas inferências que esclareceram os achados da pesquisa. ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS DADOS O perfil das informantes Todas as mulheres eram casadas ou viviam com companheiros em união estável e residiam na área de abrangência da UBS. A idade das informantes variou entre 16 e 34 anos. Com relação ao grau de escolaridade, sete tinham o ensino fundamental incompleto; uma, o ensino fundamental completo; e duas, o ensino médio incompleto. A ocupação das entrevistadas foi assim referida: cinco eram “do lar”, uma era balconista e quatro realizavam trabalho como domésticas em casas de família, sendo que uma dessas estava desempregada no momento da obtenção de dados. A renda familiar variou de 2 a 4 salários mínimos. Uma mulher referiu não ter renda familiar no momento em razão de estar desempregada, assim como seu marido. A fala das informantes Em relação à primeira categoria, compreensão acerca da assistência pré-natal, todas as respondentes entendem que constitui um momento de aprendizado, o qual torna oportuno o maior conhecimento a respeito do processo gravídico-puerperal, além de possibilitar a prevenção de problemas tanto para mãe quanto para o concepto, conforme aparece nos relatos. Tenho um monte de filhos, tenho experiência, mas sempre tenho dúvidas e alguma coisa para aprender. É porque acho que cada gravidez é diferente da outra. M5 Embora admitindo vivências anteriores, que trouxeram experiência, a informante entende que cada gravidez é singular, necessitando, portanto, de aprendizado e cuidado específico. Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 105 - 11. Ser ve para a gente cuidar da saúde da gente, evitar problemas. M6 Aqui a informante expressa que a atenção no pré-natal também pode representar momento de aprendizado para sua saúde como um todo, inclusive fora do ciclo gravídico-puerperal. Nesse sentido, a assistência pré-natal se reveste de uma importância maior ainda, uma vez que para muitas mulheres esse é um dos poucos momentos de sua vida em que mantém contato com os serviços de saúde. Pensa-se, neste sentido, que compreender a importância do pré-natal para essas mulheres permite entender o significado deste cuidado para elas, auxiliando no direcionamento de nossa assistência. Como refere estudo da área da Antropologia7, as pessoas são extremamente variáveis e sujeitas a inúmeras influências. Expressam-se mediante símbolos e se organizam a partir de concepções na busca de significados. Como todos os acontecimentos têm significados específicos, ou seja, eles simplesmente não só acontecem, mas significam algo às pessoas envolvidas, é fundamental buscar a interpretação cultural deles para desenvolver um cuidado mais efetivo. E é por meio da compreensão da visão de mundo do “outro” que tornamos oportuno expressar diferenças e singularidades que precisam ser abarcadas em nosso cuidado. Quando questionadas sobre o que pensam os familiares sobre a assistência pré-natal, nove mulheres responderam que a família considera importante esse espaço de atenção à saúde. O pessoal aqui em casa gostava que eu ia, eles acham importante o pré-natal. M1 Meus familiares acham bem importante. M6 De acordo com pesquisa realizada na área da Enfermagem8:165 “há intrincada relação entre as crenças, valores e costumes que são desenvolvidos no cotidiano pelas pessoas e a forma como elas se expressam nas situações de saúde ou doença”. Com isso, é possível inferir que a importância dada pela família à realização do pré-natal direciona o caminho, as decisões e ações a serem seguidos pela gestante, uma vez que suas concepções e entendimentos dos eventos de saúde e doença são balizados pelas crenças e valores socializados na família. Neste sentido, um estudo referente ao cuidado cultural à mulher grávida9 salienta que a gestação é uma experiência familiar; logo, o cuidado prestado deve envolver toda família e buscar o sentido cultural dela para tal vivência. Isso ficou evidente quando as gestantes referiram que o conhecimento adquirido nas consultas de enfermagem era socializado na família. Percebe-se que, além de fortalecer a importância da realização do pré-natal às gestantes, os familiares participavam direta e indiretamente do evento. ...o meu marido ficava sempre perguntando, queria saber se eu tinha falado sobre o que acontecia comigo. M10 Em algumas ocasiões, acompanhavam as gestantes nas consultas, em outras, socializavam as informações adquiridas nestes momentos e buscavam saber como estava a saúde da gestante, bem como o desenvolvimento do feto. Dentre os 108 Percepção de Mulheres Sobre Atenção Pré-Natal Landerdahl MC et al familiares, foi citada a participação do marido, dos filhos, da mãe e irmãos da gestante. Ah... eu sempre ia com a mãe, com minha irmã ou com meu marido, quando ele podia né. M1 Algumas vezes trouxe os meus dois filhos mais velhos, o meu marido não podia ir, mas se interessava pelo que acontecia lá. M6 Os maridos participavam mais indiretamente, não podendo acompanhar muitas consultas devido ao horário de trabalho. No entanto, conforme a fala anterior, as informantes destacavam seu interesse sobre o que estava acontecendo. Isso é congruente com estudo antropológico 10, que afirma o envolvimento físico e emocional masculino nos eventos da gravidez e do parto de seus filhos; porém, a intensidade e a manifestação ocorrem de acordo com a cultura local. Nesta linha, percebemos a importância do entendimento de que a gestação, além de ser um processo biológico, é também um processo social e cultural. Cada mulher e sua família irá vivenciar esta experiência de forma singular dentro de sua unidade coletiva. Esta compreensão redireciona a assistência no prénatal e as práticas de saúde, exigindo a atenção não só ao binômio materno-fetal, constr uído em paradigmas biologicistas, mas ao núcleo familiar e social a que pertence esta gestante. Isto vem ao encontro das diretrizes preconizadas pelo Ministério da Saúde atualmente, nas políticas da atenção à saúde da mulher e de humanização ao pré-natal e ao parto, que trazem em seu bojo o enfoque cultural ao atendimento às pessoas, que deverá ser incorporado aos processos de sensibilização e capacitação para humanização das práticas de saúde. Uma depoente, no entanto, mencionou que os familiares não consideram relevante a atenção à mulher no pré-natal. A família acha que é bobagem, uma perda de tempo, mas eu fiz dos outros e gostei. M5 Nota-se nesta fala que, embora sua família não considere necessário e importante a assistência pré-natal, a própria gestante tem desenvolvido novos valores culturais em relação à gestação, opondo-se a antigos conceitos de familiares. É possível perceber que a cultura é dinâmica e mesmo dentro do grupo social as mudanças ocorrem, revelando espaços para as diferenças coexistirem, às vezes com conflitos, mas aceitando o pluralismo cultural e se opondo à rigidez e ao reducionismo cultural 11, 12. Ao serem questionadas a respeito do tempo de duração das consultas, nove mulheres referiram ser suficiente o tempo médio de 50 minutos para a primeira consulta e 30 para os retornos, conforme os depoimentos comprovam. ...eu acho que era bom, a gente conversava bastante, depois fazia o exame, via a pressão, escutava o coração do bebê... eu gostava muito de ir conversar com vocês. M5 ...acho ótimo... não fazem nada correndo para irem embora, ficam conversando, são atenciosas, é dez. ...era ótimo, esclarecia o que não conseguia com o médico; vocês fazem a gente entender. M7 Nota-se nas falas, que a avaliação positiva do tempo reservado às consultas está em íntima consonância com a satisfação das mulheres em relação à qualidade da consulta. Ao referirem-se às consultas como uma “conversa”, fica evidente, também, a relação horizontal que se busca no momento da consulta de enfermagem no pré-natal na unidade sanitária. A esse respeito, o Ministério da Saúde enfatiza em suas recomendações1:10 que a humanização da assistência à gestante requer relações menos desiguais e menos autoritárias, na medida em que o profissional, em vez de assumir o comando da situação, passa a adotar condutas que busquem o bem estar da gestante. Uma respondente identificada como M2 acusou que o tempo da consulta era insuficiente. No entanto, sua queixa não tinha relação com suas consultas, mas ao fato de que precisava esperar para ser atendida. De fato, não é incomum ocorrer atraso em virtude de situações não previstas. Uma delas ocorre quando a gestante procura o serviço, sem agendamento, em razão de alguma dúvida, ansiedade ou queixa importante; essas situações exigem nossa atenção no sentido de acolher a gestante, sendo necessário, muitas vezes, realizar um exame físico com vistas a tranqüilizá-la ou como subsídio para proceder algum encaminhamento importante. Outras motivações que justificam o atraso no atendimento cotidiano dessa atividade dizem respeito a fatores específicos às gestantes, como faixa etária em que elas se encontram, experiências anteriores, número de filhos, problemas familiares, dentre outros. Todas essas situações possibilitam, pela relação de interação que se estabelece na consulta, que a gestante se sinta à vontade para abordar temas que venham ao encontro de suas necessidades. É importante lembrar, ainda, que é inerente a todo o campo de aula prática acadêmica a utilização de um tempo maior no atendimento, tendo em vista o processo educativo que aí se efetiva. Algumas mulheres conseguem compreender essa realidade. É o que fica evidente na fala de M8 que, juntamente com outra respondente, apontou atraso ao ser questionada sobre o tempo de espera para o atendimento. ...sempre fui atendida no horário marcado, só quando tinha alguma gestante que passava mal, aí atrasava um pouco; mas a gente entende né. Depois vocês explicavam direitinho o porquê do atraso. Isso é legal, dá pra perceber o interesse e o comprometimento de vocês com as gestantes. M8 Além de compreender a razão do atraso, M8 percebe o respeito e compromisso que os envolvidos com a atividade reservam às gestantes, princípios fundamentais que devem pautar a atenção à saúde da população em geral e, em especial à gestante. As demais respondentes referiram que eram atendidas no horário agendado. Quando questionadas em relação ao acesso ao agendamento para as consultas, todas responderam que não havia problemas, pois para a primeira consulta o agendamento era realizado na própria sala de atendimentos pela secretária, enfermeira ou acadêmicos de enfermagem, enquanto que os retornos eram agendados no final de cada consulta. Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 105 - 11. Percepção de Mulheres Sobre Atenção Pré-Natal Landerdahl MC et al Quanto à categoria linguagem utilizada nas consultas, todas acusaram compreender o que era compartilhado nas consultas de enfermagem. Referiram também que, quando era necessário, solicitavam maiores explicações, o que evidencia que a gestante é co-partícipe na condução do processo que vive 13. Acho bem bom o jeito que vocês falam e explicam as coisas para a gente, porque às vezes os médicos falavam umas coisas que, nossa, eu nunca vi, e como não tinha tempo de perguntar eu até anotava algumas coisas e falava com vocês. M6 Entendia tudo que as gurias falavam, o que não entendia eu perguntava. M10 Os depoimentos, ao mesmo tempo em que expressam a importância da aproximação às falas das classes populares, revelam, novamente, mesmo que de forma subjacente, a interação que se estabelece entre os envolvidos, no qual a liberdade e o vínculo de confiança é evidente. Mostra também a consulta de enfermagem como importante instrumento de educação em saúde, no qual o profissional deve abandonar a postura de onipotência, mediando o saber científico com o popular. Reforçando tal compreensão, estudo de referência na Pedagogia14:29 assegura que: ...não podemos nos colocar na posição de ser superior que ensina um grupo de ignorantes, mas sim na posição humilde daquele que comunica um saber relativo a outros que possuem outro saber relativo. Com relação ao número de acadêmicos presentes na sala no momento da consulta, nove respondentes manifestaram que, embora em alguns momentos o número de acadêmicos fosse grande, esse fato não interferia na qualidade da consulta. Ao mesmo tempo, demonstraram, em sua maioria, a compreensão de que o espaço é oferecido como campo prático do Curso de Enfermagem da UFSM, sendo, desta forma, momento de aprendizado para os acadêmicos de enfermagem. Eu me sentia tão à vontade que não via problema nenhum, as pessoas que ficavam ali me deixavam bem à vontade. M5 Foi bom, as gurias aprendem e eu também, é muito bom. M4 É importante ressaltar que desde a primeira consulta procuramos estabelecer um vínculo com a gestante/familiares. Ao nos apresentarmos e explicarmos a dinâmica das consultas, bem como o motivo da participação dos alunos, criamos um clima de receptividade, liberdade e respeito que balizam nossos encontros. Acreditamos que essa postura tem sido facilitadora para o entendimento e boa aceitação dos acadêmicos nas consultas; ao mesmo tempo vem ao encontro de pressupostos de humanização recomendados em diretrizes de políticas públicas de atenção à saúde da mulher1 quando defende o acolhimento e o respeito à gestante no serviço de saúde. Dentre essas mulheres, no entanto, duas manifestaram que o movimento de entrada e saída da sala era muito grande e que isso interferia muitas vezes na conversa estabelecida Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 105 - 11. 109 com a enfermeira e seus alunos. Isso acontece porque a sala onde é realizada a consulta é a mesma onde são desenvolvidas atividades relacionadas ao planejamento familiar, porém em horário diverso das consultas. Assim, muitas mulheres que recorrem a tais atividades sem agendamento recebem, igualmente, a atenção da secretária, mesmo que somente para esclarecimentos e/ou encaminhamentos para o cadastro em outro horário. Essa situação parece constranger as mulheres. O número de alunos não incomoda, não gostava do entrae-sai da sala que alguns dias tinha. A gente tava à vontade falando ali certas coisas, então chegava alguém estranho, a gente já se retrancava. M1 No depoimento de M1 fica evidente que o movimento de pessoas entrando na sala, embora seja mantido um biombo separando os dois ambientes, tira a privacidade e naturalidade do momento, podendo comprometer a interação afetiva e o vínculo de confiança estabelecido entre os envolvidos durante o processo do cuidado à gestante, fatores fundamentais para a qualidade da atenção pré-natal. Informações com esse teor têm sido balizadoras das nossas ações com as mulheres, reforçando a importância da participação da comunidade nos rumos da saúde pública. Desta forma, alguns cuidados vêm sendo tomados pela equipe no sentido de oferecer um ambiente mais adequado ao atendimento da gestante. A troca de profissionais nas consultas foi apontada por sete respondentes, mesmo que em alguns momentos de forma sutil, como um fator que pode interferir na qualidade da atenção no prénatal. Alegam que, quando não são assistidas pela mesma profissional em todas as consultas, são repetidas muitas informações. Eu acredito que isso não interfere, só acontece que, às vezes tem que repetir as coisas... M6 Seria bom que começassem e fossem até o final. Quando troca, tu tem que falar algumas coisas de novo... mas não interferiu no pré-natal. M5 É importante esclarecer que a troca de enfermeiras/ docentes nas consultas de enfermagem na unidade básica em questão ocorre no período de férias letivas, quando acontecem substituições temporárias, a fim de manter a continuidade do atendimento. Como esse serviço tem sido realizado, exclusivamente, por docentes da universidade, sem a parceria efetiva das enfermeiras da unidade básica até o presente momento, essa lacuna se revela. Essa situação tem sido motivo de preocupação e exige mudanças que dependem de fatores diversos, dentre eles a compreensão urgente por parte de gestores municipais e profissionais da área da saúde que atuam neste serviço a respeito da importância da integração ensino/serviço como uma das molas propulsoras para a efetiva qualidade da assistência em qualquer nível de atenção à saúde. Tais depoimentos, todavia, não parecem afetar significativamente a interação e o vínculo entre profissional, acadêmicos e usuários do serviço. Isso ficou muito claro quando os sujeitos da pesquisa responderam a respeito de como se sentiam nas consultas de prénatal de enfermagem e sua relação com a enfermeira e acadêmicos. 110 Percepção de Mulheres Sobre Atenção Pré-Natal Landerdahl MC et al Ali eu encontrava atenção. Digamos assim, uma experiência de mãe e de irmã que elas tinham pra me passar. Cada consulta que chegava eu ficava muito contente, muito faceira.. me sentia em casa, ali eu tinha carinho. M1 O depoimento reforça a impor tância da interação gestante-profissionais de saúde. Estes, por sua vez devem ter ciência de seu papel como coadjuvantes dessa experiência, colocando sua sensibilidade e conhecimento a serviço do bem-estar da gestante/familiares. Quando questionadas de que forma as orientações recebidas no pré-natal de enfermagem influenciaram no momento do parto, todas as mulheres foram enfáticas em afirmar positivamente. Vocês me passavam muita segurança... o momento do parto foi maravilhoso, fiquei calma... estava bem orientada sobre como cuidar de mim e do bebê. M7 ... até as enfermeiras e o médico me disseram que eu estava bem calma, e eu falava que eu sabia que eles estavam ali para me ajudar... eu acho que o pré-natal também serve pra isso né, pra ensinar a gente e deixar a gente mais calma na hora do parto. M8 Sim, fiquei calma, pensava no jeito de respirar, que eu tinha que ajudar fazendo força pro meu nenê sair mais fácil, foi um ótimo parto. M6 As falas denotam a participação ativa e consciente das gestantes no processo de parir, evidenciando a ênfase dada, durante a atenção pré-natal, ao seu importante papel de sujeito no parto e nascimento. Acreditamos que tal postura somente é possível no momento em que a gestante tem conhecimento de seu corpo e de suas transformações durante o processo gravídico-puerperal. A compreensão sobre o contexto históricoestrutural onde se insere a mulher/gestante também se faz importante e pode contribuir na conscientização da gestante, dentre outras coisas, em relação a sua autonomia no parto. Ao serem argüidas sobre sugestões para melhorar a qualidade da atenção, sete respondentes referiram que nada precisava ser mudado. Uma mulher referiu que seria importante respeitar a pontualidade nas consultas, e duas pensam que, diminuindo o movimento de pessoas entrando na sala, elas se sentirão mais à vontade, conforme já foi referido anteriormente. Tais fatores podem ser considerados, evidentemente, como sugestões para o alcance da qualidade do serviço. Referências 1. Ministério da Saúde (BR). Parto, aborto e puerpério: assistência humanizada à mulher. Brasília (DF); 2001. 2. Ministério da Saúde (BR). Política Nacional de Atenção Integral à Saúde da Mulher: princípios e diretrizes. Brasília (DF); 2004. 3. Ministério da Saúde (BR). Urgências e emergências maternas. Brasília (DF): Febrasgo; 2000. CONSIDERAÇÕES FINAIS Ao final desta pesquisa vale destacar os pontos fortes e fracos revelados nas falas das informantes. Elas associam a atenção pré-natal a um momento educativo; sentem-se satisfeitas em relação à qualidade da consulta, no sentido de acolhimento, respeito e compromisso que os envolvidos com a atividade reservam a elas; compreendem as orientações compartilhadas nas consultas de enfermagem e sentem-se à vontade para solicitar maiores explicações, o que evidencia a interação e confiança estabelecidas, e consideram-se apoiadas na relação com a enfermeira e com os acadêmicos. Por outro lado, apontaram a necessidade de maior privacidade nas consultas e solicitam que o pré-natal seja acompanhado pelo mesmo profissional. O estudo reforçou a necessidade de a atenção pré-natal envolver a família da gestante e seu grupo social, uma vez que a gestação é entendida como um evento biológico e social, uma experiência familiar, portanto. Depreende-se disso, que todos são atores sociais neste acontecimento, e que sua bagagem cultural implica nos encaminhamentos a serem determinados em cada situação específica. Isso possibilita a enfermeira redirecionar seu cuidado, singularizando-o. Salientou também a necessidade urgente de compreensão por parte de gestores e profissionais da área da saúde que atuam neste serviço a respeito da importância da integração ensino/serviço como forma de qualificar a assistência em qualquer nível de atenção à saúde. Ao mesmo tempo, possibilitou iniciarmos um processo de avaliação do serviço, apontando para os aspectos que necessitam de reorientação, bem como reforçando aqueles que estão em sintonia com as expectativas das usuárias. Desta forma, o estudo não se encerra com esta análise, sendo para nós motivador de reconstruções permanentes na busca pela humanização da atenção à saúde da mulher em todo o seu ciclo vital. Em relação ao processo de gestar e parir, revela-se um desafio, uma vez que representa o resgate da autonomia feminina. Confirma-se, também, que todas essas demandas exigem dos profissionais envolvidos com a saúde da mulher a busca por referenciais éticos e humanísticos que estejam em consonância com suas expectativas e necessidades. Nessa perspectiva, é relevante darmos seguimento à investigação iniciada, objetivando conhecer a percepção que familiares e profissionais do serviço têm a respeito da consulta de pré-natal realizada por enfermeiros na referida unidade básica. Sem dúvida novos elementos serão pontuados, possibilitando melhor adequação às necessidades da gestante, ao mesmo tempo em que proporcionarão visibilidade ao trabalho do enfermeiro no cenário da saúde pública, no nível da atenção básica. 4. Tanaka ACA. Maternidade: dilema entre nascimento e morte. São Paulo(SP): Hucitec; 1995. 5. Cabral FB, Ressel LB, Landerdahl MC. Consulta de enfermagem: estratégia de abordagem à gestante na perspectiva de gênero. Rev Esc Enferm Anna Nery 2005 dez; 9 (3): 459 – 65. 6. Minayo MCS. O desafio do conhecimento: pesquisa qualitativa em saúde. 8ª ed. Paulo(SP): Hucitec; 2004. 7. Geertz C. A interpretação das culturas. Rio de Janeiro(RJ): LTC;1989. Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 105 - 11. 111 Percepção de Mulheres Sobre Atenção Pré-Natal Landerdahl MC et al 8. Denardin ML. Cuidando e sendo cuidado – um modelo cultural de saúde em comunidade rural. In: Gonzales RMB, Beck CLC, Denardin ML. Cenários de cuidado: aplicação de teorias de enfermagem. Santa Maria (RS): Pallotti; 1999. 9. Baruffi LM. O cuidado cultural à mulher na gestação. Passo Fundo (RS): UPF; 2004. 10. Helman CG. Cultura, saúde e doença . 4ª ed. Por to Alegre (RS): Ar tmed; 2003. 11. Featherstone MO. O desmanche da cultura: globalização, pósmodernismo e identidade. São Paulo(SP): Studio Nobel; 1997. 12. Robertson R. Globalização: teoria social e cultura global. Petrópolis(RJ): Vozes; 2000. 13. Ministério da Saúde (BR). Pré-natal e puerpério: atenção qualificada e humanizada. Manual técnico. Brasília (DF); 2005. 14. Freire P. Pedagogia do oprimido . Rio de Janeiro(RJ): Paz e Terra; 1987. Sobre as Autoras Maria Celeste Landerdahl Universidade Federal de Santa Maria, Santa Maria/RS Lúcia Beatriz Ressel Universidade Federal de Santa Maria, Santa Maria/RS Fer nanda Badineli Mar tins Secretaria de Município de Rosário do Sul/RS Fer nanda Bher br al Bheree g ar araa y Ca Cabr bral Universidade Regional Integrada do Alto Uruguai e das Missões, Santiago/RS Mariam de Oliveira Gonçalves Universidade Federal de Santa Maria, Santa Maria/RS. Recebido em 29/05/2006 Reapresentado em 08/09/2006 Aprovado em 25/11/2006 Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 105 - 11. 112 Práticas de Cura Utilizadas por Rezadores do Piauí Medeiros LCM et al AS PRÁTICAS POPULARES DE CURA UTILIZADAS POR REZADORES NO POVOADO BREJINHO, MUNICÍPIO DE LUIZ CORREIA - PIa The Popular Healing Practical Used by Prayers in the Brejinho Village, in Luiz Correia City - Piauí - Brazil Las Prácticas Populares de Cura Usadas por los Rezadores en el Pueblo Brejinho, Ciudad de Luiz Correia - Piauí - Brasil Lis Cardoso Marinho Medeiros Fábio Mota Machado Gláucia Antonia Viana de Azevedo Simone Ramos de Sousa Resumo O estudo analisou as práticas populares de cura utilizadas por rezadores. Objetivou-se, com o trabalho, analisar as práticas populares por rezadores procurando a associação da prática com a assistência à saúde da população. Foi uma pesquisa qualitativa do tipo descritiva. Os dados foram obtidos utilizando entrevista gravada. Foram realizadas oito entrevistas. Identificaram-se as categorias: herança cultural, clientela e forma de pagamento. Conclui-se que as comunidades buscam seu próprio meio de resolver questões sobre saúde-doença, e que a parceria dos rezadores e profissionais de saúde poderia melhorar a qualidade de vida da população intermediando saberes. Palavras-chave: Saúde. Cura pela Fé. Educação em Saúde. Abstract Resumen The study analyzed the popular practices of cure used by prayers. It aimed to analyze the popular practice of prayers looking for the association of the practice with the assistance of health of the population. It was a qualitative research of the descriptive type. The data was collected by recorded interview. Eight interviews were made. The identified categories were: cultural inheritance, clientele and payment form. It was conclude that the communities seek its proper way to decide questions about health, illness and the par tnership among the prayers and the professionals of health could improve the quality of life of the population intermediating the knowledge. El estudio analizó las prácticas populares de cura usadas por rezadores. El trabajo tubo el objetivo de analizar las prácticas populares de los rezadores buscando la asociación de la práctica con la ayuda a la salud de la población. Fue una investigación cualitativa del tipo descriptiva. Los datos fueron recogidos usando entrevista grabada. Fueron realizados ocho entrevistas. Las categorías fueron identificadas como: herencia cultural, clientela y forma de pago. Concluyese que las comunidades buscan su propio medio de resolver cuestiones sobre salud, enfermedad, y que la aparcería de los rezadores y los profesionales de salud podría mejorar la calidad de vida de la población intermediando el saber. Keywords: Health. Faith Healing. Education in Health. Palabras clave: Salud. Curación por la Fé. Educación en Salud. Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 112 - 7. 113 Práticas de Cura Utilizadas por Rezadores do Piauí Medeiros LCM et al INTRODUÇÃO A participação do Ser humano como sujeito na sociedade, na cultura, na história, faz-se na medida em que é capaz de transmitir situação-limite para verificar o que existe além delas, procurando responder os desafios que a vida lhe apresenta, muito embora as explicações que são dadas sobre alguns fenômenos sejam explicações mágicas, fabulosas, exigindo uma análise epistemológica mais detalhada. As transformações no processo histórico, social, econômico e cultural mudaram significativamente nos últimos séculos e foram acompanhadas de mudanças no paradigma norteador da área da saúde uma vez que o modelo biomédico se mostrou insuficiente para responder a todas as questões do cuidado à saúde 1 No Brasil, a mistura de invocação religiosa e cura é um fato presente em nossa sociedade, principalmente nas regiões nordeste e norte. Isto é resultante da influência cultural proveniente da colonização diversificada e plural. Pode-se, então, observar na práxis do povo nordestino o trabalho de rezadeiras, parteiras, raizeiros, curandeiros, todos convergindo para a cura das doenças. O aspecto cultural apresenta-se também com o emprego de plantas medicinais no cuidar da saúde, recomendado pela ANVISA (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) para programas de atenção primária à saúde, podendo ser uma alternativa terapêutica atrelada ao baixo custo, fácil aquisição e que se compatibiliza com aspecto cultural dos povos. As pessoas simples retratam uma visão ingênua, e ao mesmo tempo divina, acerca da doença e da cura. A consciência intransitiva e transitiva ingênua é caracterizada pela centralização dos interesses dos homens pelas explicações mágicas e fabulosas que se dão sobre os fenômenos e pela fragilidade da argumentação. A formação do profissional de saúde nas academias em geral não retratam essa realidade do saber. Assim, os profissionais de saúde, na maioria das vezes, ao chegar em uma localidade, recheados de conteúdos teóricopráticos adquiridos na academia e pouco ou nenhum preparo prático comunitário, esquecem ou mesmo não valorizam a cultura local, o saber comum das pessoas. O seu saber é imposto e não negociado. O saber técnico, ao se confrontar com o saber popular, não pode dominá-lo, impor-se a ele, a relação entre estes dois saberes não poderá ser a transmissão unidirecional,vertical, autoritária, mas deverá ser uma relação de diálogo, relação horizontal, bidirecional, democrática 2. Os rezadores possuem um saber místico que envolve energias muitas vezes inexplicáveis pela ciência tradicional. Segundo Barros, de 982 crianças com diarréia no nordeste do Brasil, 28% buscam o trabalho de rezadeiras para solucionar seu problema de saúde. Isso mostra o quanto estas práticas de saúde são valorizadas pela comunidade 3. Existe nos dias atuais um maior acesso da população aos meios e serviços de saúde e farmácias. Com toda essa disponibilidade, este percentual apresentado representa o relevante papel dos rezadores para a população. Este tratar, cuidar, é permeado de uma magia pela simplicidade com que são selecionados os remédios, disponibilizados em torno de seu próprio mundo. Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 112 - 7. É preciso delimitar com clareza, a partir de quando as mulheres passam a assumir este papel de cuidadora. Na era do pensamento místico, a mulher não era cuidadora. Relata-se que quando as mulheres passaram a assumir este papel, elas foram consideradas bruxas e feiticeiras pela Igreja Católica e aconteceu a Santa Inquisição, em que milhares de mulheres foram queimadas vivas na fogueira 4. Diante de tal realidade pode-se inferir a importância dos rezadores como elo de ligação significativo entre a população e o sistema formal de saúde, demonstrando que a existência destas práticas não é exclusiva de localidades distantes, isoladas e de falta de atendimento formal de saúde, mas um fenômeno cultural que sempre existiu e que dificilmente desaparecerá, pois fazer desaparecer essas práticas é excluir a cultura de um povo. Assim, investigou-se a realidade existente entre os rezadores e a assistência formal no povoado Brejinho, município de Luíz Correia. A este fato atrelaram-se as seguintes questões nor teador as as: Como acontecem as práticas populares de cura que são utilizadas por rezadores do povoado Brejinho, município de Luiz Correia? De onde provém esse saber que tem tanta credibilidade nos meios populares? Para responder essas questões elaborou-se o seguinte objetivo objetivo: Analisar as práticas populares de cura utilizadas por rezadores no povoado Brejinho, município de Luiz Correia – Piauí. CAMINHOS TEÓRICOS METODOLÓGICOS A pesquisa foi do tipo descritiva de natureza qualitativa. Optou-se pela pesquisa qualitativa por se adequar melhor à produção e análise dos dados5. O trabalho foi realizado no povoado Brejinho, município de Luiz Correia - PI. A produção dos dados da pesquisa aconteceu no período de dezembro de 2001 a junho de 2002. O município de Luiz Correia possui uma área urbana localizada na maioria das praias do município e cerca de apenas 30% da sua população de aproximadamente 23.000 (vinte e três mil) habitantes. A zona rural concentra cerca de 70% da população e fica distante do centro urbano. Todo o município hoje possui cobertura do PSF (Programa de Saúde da Família), e já existem quatro equipes de PSF. Há um grande esforço por parte das três equipes do PSF da zona rural existentes para manter uma boa cobertura de atendimento a zona rural. Os problemas de saúde mais encontrados pela equipe são as parasitoses intestinais e as infecções respiratórias e de pele. Além disso, há relativa escassez de água. Relativa, pois embora parte do problema da falta de água tenha sido resolvido com a construção de chafarizes, há várias localidades onde o teor de salinidade da água é muito elevado, levando à necessidade de dessalinizador nos chafarizes, conseqüentemente dificultando a construção e principalmente a manutenção dos mesmos. A presença do rezador nas microlocalidades da área de abrangência do estudo é grande. Percebeu-se isso pelos relatos da própria comunidade durante o atendimento médico e de enfermagem que muitas vezes referia ter procurado o rezador antes da consulta, ou fazia uso de “remédios” indicados pelo 114 mesmo.O local de coleta dos dados desse estudo foi o posto de atendimento do PSF dessa localidade e, por vezes, a própria casa do rezador, quando necessário. Os sujeitos da pesquisa foram oito rezadores que residem nas microlocalidades da região do Brejinho, onde se estabeleceu como critérios para escolha desses sujeitos: o tempo da sua prática (pelo menos três anos); ser residente na região do PSF já citado; e concordar em participar do estudo. Anteriormente às entrevistas, foi realizada uma dinâmica de grupo com os sujeitos da pesquisa de forma sensibilizadora, tornando acolhedor o momento da entrevista. Como pesquisa qualitativa utilizou-se, como instrumento de produção de dados, um roteiro de entrevista em associação à observação do participante, onde o entrevistador tem a possibilidade de discorrer sobre o tema proposto sem respostas ou condições pré-fixadas pelo pesquisador. A técnica de entrevista gravada em fita-cassete, ocorrida durante a visita domiciliar previamente agendada, respeitou a individualidade do sujeito participante, mantendo-se o sigilo dos dados fornecidos. A análise dos dados baseou-se nos objetivos previamente determinados. Estabeleceu-se o corpus de comunicação estruturado a partir dos aspectos percebidos nos discursos analisados, por similaridade. Constituíram-se então eixos geradores de discussão que correspondem aos objetivos que se buscaram atingir. Tais eixos, ao serem percebidos e captados nos discursos, deram origem a categorias. As categorias foram filtradas e sofreram nova análise para que se permitissem agrupar aquelas que fossem relevantes a todos os discursos, tornando a descrição dos temas geradores o mais abrangente possível. A síntese a seguir esquematiza a análise baseada nos eixos e categorias. A pesquisa encontra-se cadastrada no site de pesquisa com seres humanos e seguiu todas as normas previstas. ANÁLISE DOS DADOS As transcrições das entrevistas revelaram três categorias: her ança cultur al herança cultural al, c lientela e f or orma paggamento amento. A ma de pa primeira categoria foi identificada nos discursos dos Quadros 1 e 4; as demais, nos Quadros 2 e 3, respectivamente, em anexo. Percebeu-se uma forte influência cultural herdada dos seus antepassados. Alguns se apropriaram do saber como que de uma herança de um ente querido, outros receberam como missão essa arte de curar, passada por um familiar ou pessoa próxima. As práticas populares de cura seguem se desenvolvendo a ança Cultur al par tir desta Her Herança Cultural al, desta transmissão de saberes, crenças, valores e atitudes, tendo sua continuidade garantida, principalmente, pela comunidade, que as valoriza. A escolha do material a ser utilizado durante o ritual fica a critério de cada rezador, dependendo do tipo de cliente, do problema apresentado pelo doente e do costume de cada rezador. Além da reza como instrumento de trabalho, os rezadores utilizam também ramos de planta, e o rosário, uma espécie de terço, semelhante ao terço católico. Dentre os ramos mais utilizados foram citados a vassourinha e o pião roxo. Práticas de Cura Utilizadas por Rezadores do Piauí Medeiros LCM et al A importância da antropologia para a compreensão do fenômeno saúde-doença é incontestável. Junto com os dados quantitativos e com o conhecimento técnicocientífico das doenças, qualquer ação de prevenção, tratamento ou planejamento de saúde necessita levar em conta valores, atitudes e crenças de uma população6 Na análise dos discursos, a categoria Clientela revelou que o rezador é mais procurado para tratar de crianças. Tal fato também foi constatado porque cita o uso do benzimento como prática comumente utilizada na cura das doenças infantis, principalmente entre crianças de 0 a 2 anos. Todos referem ter freqüência esporádica da clientela, que busca o atendimento para o tratamento do quebrante. Tal doença se caracteriza por mal-estar, fraqueza e sonolência, por vezes acompanhados de febre, náusea e vômitos. O Quadro 3 apresenta o pensamento dos rezadores ante a ma de pa terceira categoria – For orma pagg amento amento. Como se percebe no quadro que mostra a categoria forma de pagamento, nenhum dos rezadores cobra pelo serviço realizado e todos realizam-no espontaneamente. Observouse, ainda, muita boa vontade quando da realização do trabalho e grande preocupação com a melhora ou não do cliente, formando-se até uma pequena rede de referência – contrareferência informal, onde vários deles relataram a preocupação de saber do quadro daquele cliente mesmo quando encaminhado a outro rezador, ou até mesmo ao sistema de saúde formal. Isso é claro quando o cliente já não sai daquele atendimento praticamente curado, pois todos referem grande eficácia do tratamento praticado por eles. Os rituais costumam ser simples, sem grande preparo, onde o ramo e o rosário são utilizados para passar na pessoa em movimentos ritmados quase sempre em forma de cruz. Alguns utilizam um rosário de grande dimensão para passar a criança através dele. A reza se dá quase sempre em voz baixa, algo sussurrado, resmungado, sem uma definição precisa. Algumas são variações de orações católicas, onde estão contidas invocações a santos diversos, sendo sempre um santo de devoção do rezador. Os ramos utilizados normalmente murcham após a reza. Indagados sobre o fato de o ramo murchar naturalmente depois de retirado da planta, eles respondem que o ramo murcha mais rápido após o ritual da reza, e que o ramo só murcha mais rápido se o problema da pessoa for realmente o quebrante. Poucas foram as rezas descritas, alguns se recusaram a dizer suas rezas, alegando que poderia ser feito mau uso delas ou com o simples argumento de não poderem revelar, sem dar maiores explicações. Outros dizem que, se a oração for ensinada, ela não serve mais para aquele rezador utilizar. CONCLUSÃO Por meio desta pesquisa concluiu-se que, na realidade de trabalho, mesmo com o amplo acesso ao sistema de saúde formal, as comunidades continuam buscando seu próprio meio de resolver suas questões sobre o processo de saúde-doença. Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 112 - 7. 115 Práticas de Cura Utilizadas por Rezadores do Piauí Medeiros LCM et al As práticas populares têm-se mantido nas diversas culturas e sempre foram utilizadas, essencialmente no seio familiar, como primeiro recurso para minimizar ou prevenir os males. Nesta perspectiva, compreende-se prática popular como todos os recursos utilizados pelas famílias, pessoas leigas e por terapeutas populares, onde a apreensão do saber se constrói no cotidiano e se transmite de geração a geração e cujo fazer não está ligado a serviços formais de saúde. Estes terapeutas, os rezadores, possuem grande credibilidade da comunidade, sendo, por vezes, os primeiros a terem contato com as pessoas doentes de uma determinada localidade. Tal proximidade da comunidade, o fácil acesso a eles, bem como o fato de não cobrarem pelo tratamento e também por estímulos culturais amplamente presentes faz com que a prática de cura dos rezadores permaneça presente em nossa realidade e se perpetue. Referências Sobre as Autoras 1. Schaurich D, Padoin SMM, Paula CC, Motta MGC. Utilização da teoria humanística de Paterson e Zderad como possibilidade de prática em enfermagem pediátrica. Esc Anna Nery Rev Enferm 2005 9(2): 265-70 2. Freire P. Concientización. Buenos Aires (AR): Busqueda; 1974 3. Barros FC, Victora CG. Avaliação do manejo da diarréia em menores de cinco anos no nordeste do Brasil. J Pediatr 1989 nov/ dez; 65(11/12): 420-64 4. Medeiros LCM, Cabral IE. As plantas medicinais e a enfermagem. A ar te de assistir, de curar e de transformar os saberes [tese de doutorado]. Rio de Janeiro (RJ): Escola de Enfermagem Anna Nery/UFRJ; 2001. 5. Minayo MCS, Alves PC. Saúde e doença: um olhar antropológico. Rio de janeiro(RJ): FIOCRUZ; 1994. 6. Minayo MCS. O desafio do conhecimento: pesquisa qualitativa em saúde.7ª ed. São Paulo (SP): Hucitec; 2000. Lis Cardoso Marinho Medeiros Enfermeira, Cirurgiã-dentista, Professora Associada I lotada no Deptº de Biofísica e Fisiologia da Universidade Federal do Piauí, Membro do Núcleo de Estudos em Saúde Pública . Gláucia Antonia Viana de Azevedo Enfermeira, Profª Adjunta IV do Deptº de Enfermagem, Coordenadora da Especialização em Saúde Pública e Membro do Núcleo de Estudos em Saúde Pública Fábio Mota Machado Enfermeiro do Programa Saúde da Família do Município de Luís Correia/PI Simone Ramos de Sousa Enfermeira do Programa Saúde da Família do Município de Luís Correia/PI Notas a Texto derivado de tese de doutorado defendida em 2001 (ver referência 4). Recebido em 31/10/2006 Reapresentado em 24/02/2007 Aprovado em 04/03/2007 ANEXOS QUADRO 1 1: A origem do saber do rezador da localidade Brejinho, Luiz Correia –PI. 2002. Eixo gerador ORIGEM Categoria HERANÇA CULTURAL Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 112 - 7. Depoentes Discur so Entrevistado 1 R– Com meu pai. Porque meu pai fazia. Um belo dia ele disse: — Você sabe que eu não vou rezar mais não. Isso não vale nada. — Pois me ensine — Não meu filho, não vale nada não. São só três palavras. — Mas eu quero essas três palavras. Ele me ensinou e eu fiquei rezando nos culumizim. Entrevistado 2 R– Com meus avós, que já até morreram. Morreram de velhice. Entrevistado 3 R– Com a minha mãe. Que era Católica Apostólica Romana. Entrevistado 4 R– Com uma tia minha que já morreu. Entrevistado 6 R– Com minha mãe. Entrevistado 8 R – Com a minha avó. 116 Práticas de Cura Utilizadas por Rezadores do Piauí Medeiros LCM et al QUADRO 2 2: Caracterização das práticas populares de cura do rezador da localidade Brejinho, Luiz Correia – PI. 2002. Eixo gerador A PRÁTICA Categoria CLIENTELA Discur so Depoentes Entrevistado 1 R– Criança. Entrevistado 2 R– É mais menino. A mãe traz pra rezar e eu rezo. É dor de dente, dor de cabeça e essas coisas assim. Entrevistado 3 R– Eu gosto mais de criança. Entrevistado 4 R– Criança. Entrevistado 5 R– É mais criança. Mas agora mesmo eu rezei em adulto. Entrevistado 6 R– Criança. Entrevistado 7 R – É mais criança. E gente adulto, mas não é direto não. É mais criança mesmo, que os pais trazem pra mim rezar. Entrevistado 8 R – Criança e adultos. QUADRO 3 3: Caracterização das práticas populares de cura do rezador da localidade Brejinho, Luiz Correia – PI. 2002. Eixo gerador Discur so Categoria R– Não. É um favor que eu estou fazendo. R– Não Senhor. Quem quiser dar alguma coisa... É um favor né... É um favor que a gente está fazendo... Né... Eu só faço favor. Às vezes me dão alguma coisa, mas eu não peço não. R– Eu atendo as pessoas que tem dinheiro... Se me dão alguma coisa é porque querem. Mas a criança carente eu rezo por nadinha. Não quero coisa nenhuma. A PRÁTICA FORMA DE PAGAMENTO R– Nunca cobrei. Sempre as pessoas me perguntam quanto é, e eu digo que não é nada. As pessoas que tem consciência me dão uma toalha de banho, me dão um jarrozinho, me dão um terço, me dão qualquer coisa. Mas cobrar mesmo eu nunca cobrei não. R– Não cobro não. Eu tive de cobrar duma pessoa. Ele perguntou quanto era aí eu fui e falei pra ele. Você me dá aí um agrado pra eu comprar um quilo de carne. Aí ele deu. R– Não cobro nada não. A pessoa dá o que quiser. Eu não cobro não. R- Não costumo cobrar R- Faço por paixão, não cobro Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 112 - 7. 117 Práticas de Cura Utilizadas por Rezadores do Piauí Medeiros LCM et al QUADRO 4 4: Procedimento do ritual de cura utilizado pelo rezador e a cura das doenças. Brejinho, Luiz Correia – PI. 2002. Eixo gerador Categoria RITUAL E CURA MATERIAL Depoentes Entrevistado 1 R– Eu tenho minha devoção mesmo só e pronto. Só rezo. R– Tanto faz como tanto fez. Pode ser com ramo ou não... Entrevistado 2 R– Eu uso só reza. R– Peão roxo, mandiroba, vassourinha. Entrevistado 3 R– Eu utilizo a medalha, um símbolo católico que é a bíblia católica, com o cinco Salomão de oito pernas ... A estrela de David com as três pessoas da Santíssima Trindade da Igreja Católica. R – É o credo em cruz. Entrevistado 4 R – A folha do peão roxo. Entrevistado 5 R – A vassourinha. Entrevistado 6 R – Uns ramos... Vassourinha. Entrevistado 7 R – Em crianças, é o rosário, em gente adulto é a folha de peão roxo. Entrevistado 8 R – Em criança a gente sempre reza com a vassourinha e folha de peão, ou de carambola, em gente adulto, com o rosário. Entrevistado 7 Entrevistado 8 Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 112 - 7. Discur so R – Não, é o que eu digo para pessoa quando vem. Minha filha, se você tiver fé, é a sua fé que vai lhe curar, que Deus quer que a pessoa tenha fé, não é? Que quando Ele andava no mundo, aquelas pessoas que tinham fé, então a pessoa era curada, bastava ver Ele. E do mesmo jeito eu digo para os meus irmãos aqui. É a sua fé que vai lhe curar. Aí a pessoa: Ave Maria Dona fulana, eu tenho muita fé, aí manda eu rezar, aí no outro dia ela já vem bem melhor, nem parece aquela que veio do jeito que veio. Já vem boazinha. Diz assim, olhe dona fulana, você não viu como eu saí daqui, que eu não podia nem me sentar, cheguei lá em casa me sentei, comi, dormi, e não senti mais nada. Já estou aqui de volta, morta de contente. R – Eu me sinto muito feliz, me sinto alegre e ainda peço que Deus cuide daquela criança. Oh Jesus, ele veio do jeito que veio. Só você pode curar meu Pai. Cuide dessa criança. Ah, eu fico tão preocupada quando eu vejo o estado da criança, e quando é no outro dia a mãe vem morta de alegre, e o pai, dona fulana, dormiu a noite todinha, não vomitou mais e nem chorou mais e está aqui ele. R – Se eles virem que não dão jeito, aí eles encaminham...Procure outro...Outra religião... Outro meio de se curar...Que a pessoa pode muito bem entender que já não é ali, tem que procurar outro... (alguém cita um psiquiatra local) Pelo menos o doutor fulano nas consultas dele, quando ele vê que não dá certo ele diz logo o que é e o que não é, e manda a pessoa procurar um rezador, outra pessoa que faça ele ficar bom. E aí a pessoa se manifesta para outro lado.Porque se ele conseguisse ficar bom a troco de remédios, só os remédios que ele tomasse já ficaria bom. Agora não é problema de remédio, tem que ser por oração, tem que ser por outros meios de reza para que aquela pessoa se restabeleça e tenha saúde. 118 Enfermagem no CNPq: história segundo representantes da área Erdmann AL et al A ENFERMAGEM COMO ÁREA DE CONHECIMENTO NO CNPq: RESGATE HISTÓRICO DA REPRESENTAÇÃO DE ÁREA Nursing as an Area of Knowledge in the CNPq: Historical Rescue of the Representation of the Area Enfermería como Área de Conocimiento en el CNPq: Rescate Histórico de la Representación del Área Alacoque Lorenzini Erdmann Isabel Amélia Costa Mendes Joséte Luzia Leite Resumo O Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) foi criado em 1951. Neste organismo nacional de apoio à pesquisa, a Enfermagem insere-se como área de conhecimento a partir da década de 70 e passa a ter representante de área desde a década de 80. O presente artigo tem como objeto o resgate histórico da Enfermagem como área de conhecimento no CNPq. Objetiva destacar a inserção da Enfermagem neste órgão e contribuição para o conhecimento da História da Enfermagem Brasileira. Trata-se de um estudo documental apoiado por depoimentos das enfermeiras representantes da área de Enfermagem no transcurso da presença da Enfermagem como área no CNPq. As informações descritas mostram a importância e a evolução da Enfermagem como ciência e tecnologia neste órgão, a importância do fomento para viabilização das pesquisas, o estímulo ao incremento da pesquisa, os avanços na produção de conhecimentos, os desafios enfrentados e as perspectivas como possibilidades para o fortalecimento e consolidação da Enfermagem. O CNPq é um importante órgão de fomento às políticas para o avanço da Enfermagem. Pala vr as-c ha alavr vras-c as-cha havve: Enfermagem. Ciência. Pesquisa em Enfermagem. História da Enfermagem. Abstract Resumen The National Council of Scientific and Technological Development (CNPq) was created in 1951. In this national organ of research support, the Nursing is inserted as a knowledge area from 1970’s and passed on to an area representative since 1980’s. This present article has as object the historical rescue of the Nursing as knowledge area at the CNPq. It aims to detach the Nursing insertion at this organ and its contribution for the knowledge of the Brazilian Nursing History. It is a question about a documentary study supported by depoiments of the representative nurses of the nursing area in the course of the existence of the Nursing as an area at the CNPq. The information described showed the importance and the evolution of the Nursing as science and technology in this organ, the importance of the promotion for making the research viable, the stimulation to the increment of the research, the advances in producing knowledge, the challenges faced and perspectives as possibilities for the strengthening and consolidation of the Nursing. The CNPq is an impor tant agency of promoting politics for the advance of the Nursing. El Consejo Nacional de Desarrollo Científico y Tecnológico (CNPq) fue creado en 1951. En este organismo nacional de apoyo a la investigación, la Enfermería se inserta como área de conocimiento partiendo de los años 70 y pasa a tener representante de área desde la década de los 80. El presente artículo tiene como objeto el rescate histórico de la Enfermería como área de conocimiento en el CNPq. Se objetiva destacar la inserción de la Enfermería en este órgano y su contribución para el conocimiento de la Historia de la Enfermería Brasileña. Tratase de un estudio documental apoyado por depoimentos de las enfermeras representantes del área de la Enfermería en el curso de la existencia de la Enfermería como área en el CNPq. Las informaciones descritas muestran importancia y la evolución de la Enfermería como ciencia y tecnología en este órgano, la importancia del fomento para la promoción de las investigaciones, el estímulo al incremento de la investigación, los avances en la producción de conocimientos, los desafíos enfrentados y las perspectivas como posibilidades para el fortalecimiento y consolidación de la Enfermería. El CNPq es un importante órgano de fomento a las políticas para el avance de la enfermería. Keyw or ds: Nursing. Science. Nursing Research. ywor ords: History of Nursing. P ala br as ccla la alabr bras lavv e: Enfermería. Ciencia. Investigación en Enfermería. História de la Enfermería. Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 118 - 26. 119 Enfermagem no CNPq: história segundo representantes da área Erdmann AL et al INTRODUÇÃO: ASPECTOS HISTÓRICOS SOBRE O CNPq O CNPq é uma das maiores e mais sólidas estruturas públicas de apoio à Ciência, Tecnologia e Inovação (CT&I) dos países em desenvolvimento. A idéia de criar uma entidade governamental específica para fomentar o desenvolvimento cientifico remonta ao ano de 1920, quando os integrantes da Academia Brasileira de Ciências (ABC) comentavam o assunto como conseqüência da Primeira Guerra Mundial. Em 1931, a ABC dá a sugestão formal ao governo, e este não se pronuncia a respeito. Em maio de 1936, o presidente Getúlio Vargas enviou uma mensagem específica ao Congresso sobre essa idéia, mas ainda não teve a acolhida desejada por parte dos parlamentares. A partir da Segunda Guerra Mundial, graças ao avanço das tecnologias bélica, aérea e farmacêutica, houve um despertar não só no Brasil, mas em todos os países, para a importância da investigação científica principalmente em energia nuclear. A bomba atômica era a prova real e assustadora do poder que a ciência poderia atribuir ao homem, ficando claro como a pesquisa deveria passar a ser vista pelos governos. Seria uma área a ser alvo de investimento, principalmente se fosse acompanhada de uma agenda de prioridades enfocando problemas de difícil resolução, ou ainda, se significasse desenvolvimento científico e tecnológico. Depois desses esforços, em maio de 1946, o Almirante Alberto da Motta e Silva, representante brasileiro na Comissão de Energia Atômica do Conselho de Segurança da recém-criada Organização das Nações Unidas (ONU), propôs ao governo, por intermédio da ABC, a criação do CNPq, denominado na época Conselho Nacional de Pesquisa. Dois anos mais tarde, em 1948, o projeto sobre a criação do CNPq era apresentado à câmara dos Deputados. Porém, somente em 1949, o presidente Eurico Gaspar Dutra indicou uma Comissão para apresentar um anteprojeto de lei sobre a sua criação. Depois de discutido em diversas comissões, em 15 de janeiro de 1951, foi criado o CNPq, pela Lei nº1310/51, chamada pelo Almirante Álvaro Alberto de Lei Áurea da Pesquisa do Brasil1. O Conselho Nacional de Pesquisas, fundado em 1951, pelo cientista pesquisador de energia atômica Álvaro Alberto, como órgão diretamente subordinado à Presidência da República, decorreu da necessidade de evitar a desapropriação das nossas reservas de material radioativo. Em 1964, o Conselho teve ampliada sua área de competência, incluindo a formulação e coordenação da política científica e tecnológica do país, deixando de ser sua competência as pesquisas no campo da energia atômica. A partir de 1972 surgem os Planos Básicos de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (PBDCTs) integrados aos Planos Nacionais de Desenvolvimento (PNDs). Em 1974, O Conselho torna-se fundação de direito privado, com a denominação de Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico, vinculado a Secretaria de Planejamento da Presidência da República (SEPLAN) e, posteriormente, à Secretaria de Ciência e Tecnologia ligada diretamente à Presidência da República com o objetivo de modernização científica e tecnológica do país1. Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 118 - 26. O Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico, que conserva a mesma sigla, vem assumindo maiores proporções. É uma Fundação, vinculada ao Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT), cuja missão é apoiar a pesquisa brasileira. Contribuindo diretamente para a formação de pesquisadores (mestres, doutores, pós-doutores e especialistas em várias áreas de conhecimento), o CNPq é, desde sua criação até hoje, uma das maiores e mais sólidas estruturas públicas de apoio à Ciência, Tecnologia e Inovação (CTI) dos países em desenvolvimento cujos investimentos são direcionados para a formação e absorção de recursos humanos e financiamento de projetos de pesquisa que contribuem para o aumento da produção de conhecimento e geração de novas oportunidades de crescimento para o país1. Estes investimentos resultam na identificação de novos talentos pelas atividades de iniciação científica com bolsas (IC); no apoio ao trabalho do pesquisador com bolsa de produtividade em pesquisa (PQ) e na manutenção do sistema Lattes de registro do curriculum vitae; no apoio aos Grupos de Pesquisa - Cadastrados no Diretório de Grupos de Pesquisa, no fortalecimento das Linhas de Pesquisa, na viabilização de Políticas e Prioridades em Pesquisa, dentre outros2. Este estudo tem como objeto o resgate da Enfermagem como área de conhecimento no CNPq. E como objetivos: (a) destacar a origem da inserção da Enfermagem como área de conhecimento no CNPq e sua contribuição para a profissão; e (b) contribuir para o conhecimento da História da Enfermagem Brasileira. A ENFERMAGEM COMO ÁREA DE CONHECIMENTO Somente a partir de 1970 é que se efetivaram as primeiras medidas de apoio em relação à Enfermagem. A evolução histórica dessas medidas transcorreu da seguinte maneira: a) Realização do primeiro evento “Avaliação e Perspectiva - Subárea de Enfermagem” em 1976; b) Em 1980 foi criado o código da Subárea de Enfermagem com suas subespecialidades, no sistema de classificação das áreas de conhecimento no CNPq; c) Em 1981/1982 foi realizada a segunda versão do evento “Avaliação e Perspectiva - subárea de Enfermagem”; d) Em 1984 foi iniciada a formação do quadro de Consultores “Ad hoc ” para apreciar os projetos, como subsídio ao cor po técnico e ao Comitê Assessor de Clínica (CA-CL) do CNPq, local onde esta subárea estava localizada. Realizou-se, assim, a concretização de duas recomendações contidas no documento da segunda “Avaliação e Perspectiva”, ou seja, a de existir um representante da subárea de Enfermagem como membro efetivo no Comitê Assessor de Clínica do CNPq e de um assessor técnico de desenvolvimento científico atuando na instituição, situações estas regularizadas a partir de 19863. Depois deste, foi constituído o Comitê Assessor de “Saúde Complementar” composto pelas áreas de 120 Enfermagem no CNPq: história segundo representantes da área Erdmann AL et al Odontologia, Enfermagem e Educação Física, que foi desmembrado do CA de Medicina II4. Portanto, vimos que, muito embora o CNPq tenha sido criado em 1951, a Enfermagem somente foi incluída como área de conhecimento em 1986, em razão dos esforços de uma professora da Universidade de Brasília, que compunha o quadro de técnicos da estrutura da agência4. Esta inserção da Enfermagem como área de conhecimento em 1986 coincide com os frutos do primeiro doutoramento em Enfermagem do Brasil - o Curso de Doutorado Interunidades em Enfermagem de responsabilidade das duas Escolas de Enfermagem da USP - Universidade de São Paulo: uma localizada no Campus da Capital (EEUSP); e outra localizada no Campus de Ribeirão Preto (EERP-USP)5. Em sua evolução, por três vezes o CNPq reformulou sua organização estrutural, e a Enfermagem consolidouse como área de produção de conhecimento fazendo jus ao direito de se inserir em um Comitê Assessor: o CA de Medicina II. No ano de 1991 foi criado o Comitê de Saúde Complementar para o qual a Enfermagem foi transferida. Este Comitê recebeu nova denominação em 1995: Comitê Multidisciplinar de Saúde (CA-MS) constituído pelas Subáreas da Educação Física, Enfermagem, Fisioterapia, Terapia Ocupacional, Fonoaudiologia e Odontologia. Em julho de 2005, a Odontologia é desmembrada constituindo sozinha um novo Comitê6. E, em outubro de 2006, ocorreu o marco histórico do Comitê: a implantação do Comitê de Enfermagem (CA-EF), aprovado pelo Conselho Deliberativo do CNPq, em junho de 2006. A indicação de seus membros (três membros titulares e um suplente) foi aprovada na mesma instância em 20 de setembro de 2006, tendo sua implantação ocorrido no dia primeiro do mês de outubro. Esta foi uma grande conquista da profissão e fruto do esforço coletivo. O CA-EF reuniu-se pela primeira vez em Brasília no período de 20 a 24 de novembro de 2006, com a presença das representantes titulares. Neste período os trabalhos do Comitê foram coordenados pela representante com maior tempo de exercício de representação6. Os Comitês Assessores têm por objetivo prestar assessoria ao CNPq na avaliação de projetos e programas, na formulação de políticas em assuntos de sua área de competência e na apreciação das solicitações de apoio à pesquisa e à formação de recursos humanos. Analisam, ainda, as solicitações de bolsas e auxílios pronunciando-se mediante pareceres fundamentados e conclusivos sobre o mérito dos mesmos. Para tal, contam com auxílio de consultores ad hoc7. Desde a instituição da Representação da Área da Enfermagem no CNPq, seis professoras doutoras foram responsáveis pela mesma e serviram como assessoras, ocupando a função de Representante e contribuindo significativamente para o processo de incremento à pesquisa em Enfermagem, incentivando a produção de projetos com condições de concorrer a financiamentos, ao tempo em que, internamente tornam a Enfermagem mais conhecida pelo órgão 7. A BUSCA DE INFORMAÇÕES SOBRE A ÁREA DE ENFERMAGEM NO CNPq Para o alcance dos objetivos estabelecidos no presente estudo, selecionou-se um estudo documental de caráter qualitativo, apoiado por depoimentos orais obtidos no período de março a junho de 2005 e consentidos pelas enfermeiras representantes da área de Enfermagem. Esses depoimentos exploraram o transcurso das suas presenças na área, no CNPq. Os principais aspectos abordados nos depoimentos centraram-se em dados como: formação (níveis, títulos, anos, escolas); período de atuação como Representante da Enfermagem no CNPq, composição do CA segundo áreas, identificação do processo de indicação; principais atividades realizadas e avanços obtidos para a área; parecer sobre a própria experiência de ser representante da área da Enfermagem no CNPq; indicação dos aspectos mais marcantes da experiência vivenciada; o significado do CNPq para a Enfermagem Brasileira; e a Enfermagem como profissão e como ciência e suas principais conquistas, dentre outros aspectos. A coleta e análise das informações e de dados constaram da busca de documentos disponíveis no site do CNPq, relatórios e artigos publicados, bem como dos depoimentos, observadas as seguintes etapas: (a) consulta às ex-representantes sobre a possibilidade de informarem sobre sua participação nesta representação, o que foi aceito por todas; e (b) a compilação de documentos com conteúdos sobre o tema explorado. Participaram deste estudo todas as cinco ex-representantes e a representante atual, mediante consentimento verbal das mesmas para utilização de seus depoimentos neste artigo. SÍNTESE DOS PRINCIPAIS RESULTADOS: As informações obtidas permitiram descrever sobre: os períodos de atuação das representantes, principais atividades realizadas, os avanços da área e, em especial, como foi a experiência de ser Representante da Área da Enfermagem no CNPq. A) O PERÍODO DE ATUAÇÃO DAS REPRESENTANTES é analisado como se segue: A representação da área inicialmente foi de dois anos, e de 1990 em diante passou para três anos, e é indicada pelo CNPq a par tir de consulta aos pesquisadores com bolsa de produtividade em pesquisa, sugeridos entre os mais qualificados. O início desta representação foi marcado por buscas não só de espaços, mas também de conquista de igualdades. À minha época, o comitê denominava-se “Medicina II”, e, por não concordar com a maneira como apreciados os pleitos no Comitê, fui substituída, portanto o meu mandato foi de 1988 a 1989 (Depoente 1). Neste depoimento percebe-se ainda a vulnerabilidade da Enfermagem na Agência, apesar dos esforços para colocá-la na mesma condição das outras áreas. Também, as conquistas por espaços e maior visibilidade e exclusividade são marcadas quando foi conseguido o desmembramento da Medicina II, área tradicional e consolidada. Eleita pela comunidade científica, atuei no Comitê Assessor de Saúde Complementar, no período 1990 Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 118 - 26. Enfermagem no CNPq: história segundo representantes da área Erdmann AL et al 1992. No meu mandato foi desmembrado o CA de Medicina II e criado o de Saúde Complementar (Depoente 2). A escolha da representante é prerrogativa da Presidência, que consulta a comunidade científica, analisa o currículo dos recomendados e então procede a indicação. E stive na agência no período de 1993-1995. A indicação foi pelo Conselho Diretor, após consulta à comunidade científica e análise dos currículos em apreço. Na ocasião era uma das três (3) pesquisadoras da área de nível 1 A. ... Quando encerrou o mandato recebi ligações de todas as regiões brasileiras pedindo para empenhar esforços para continuar. O estatuto do CNPq não permitia a recondução (Depoente 3). Neste depoimento vê-se a prerrogativa do Conselho Deliberativo em decidir a escolha. A quarta depoente também eleita pela comunidade científica, por duas vezes, foi indicada pela Presidência em dois períodos: Exerci a função de representante da Área de Enfermagem no CNPq de 07/1995 a 07/1998. Como no período de atuação havia exercido o papel de Coordenadora do Comitê, no julgamento seguinte (11/ 1998) fui também convocada para transmitir à equipe seguinte a memória do Comitê (CA-MS) integrado pelas áreas Odontologia, Enfermagem, Educação Física, Fisioterapia, Fonoaudiologia e Terapia Ocupacional. “Após um interstício de três anos, fui novamente indicada exercendo a representação no período de 07/ 2001 a 06/2004, também concluindo o mandato como coordenadora do Comitê (Depoente 4). Vimos que o período de vigência mudou de dois para 3 (três) anos e foi marcado pela constituição e denominação dos comitês, trazendo uma terminologia que dava maior identidade às diferentes áreas do conhecimento que faziam parte do Comitê. A quinta depoente esteve no CNPq de julho de 1998 até julho de 2001: Tive o prazer de atuar no Comitê Assessor Multidisciplinar de Saúde que era constituído pelas áreas de Odontologia, Fisioterapia, Educação Física e Fonoaudiologia (Depoente 5). B) AS PRINCIPAIS ATIVIDADES COMO REPRESENTANTE são destacadas nos depoimentos a seguir. Ao assumir a representação em 1995, levei comigo a experiência de 13 anos como usuária do sistema, pois havia percorrido toda a carreira de pesquisador iniciada no ano de 1982 como mestre e aluna de doutorado. Portanto, em minha bagagem levei toda a vivência, dúvidas, inquietudes e a certeza de que a comunidade de Enfermagem carecia de estímulo e orientações precisas sobre as possibilidades de apoio aos seus projetos. Deste modo, considero que a principal atividade que exerci foi política, pois tinha convicção de que era preciso dar visibilidade do real desenvolvimento da Enfermagem como área de conhecimento aos responsáveis e integrantes da estrutura do órgão. A primeira ação, portanto, foi relatar ao Presidente o estado da arte da Enfermagem brasileira, oferecendo dados Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 118 - 26. 121 com a proposta de instrumentalizar o Conselho Deliberativo sobre o crescimento da área e da relação demanda versus reduzida oferta de recursos destinados à área em todas as modalidades de fomento. Do ponto de vista técnico, a principal atividade foi a emissão de pareceres que incentivassem os colegas a aprimorarem seus projetos e continuarem pleiteando. Ao lado disto, passamos a interagir com pesquisadores com o propósito de estimular o aumento da demanda para que se conseguisse ampliar a fatia de recursos para a Enfermagem no contexto do total que era destinado ao Comitê. No período de 2001 a 2004 conseguimos imprimir maior aproximação com os pares, praticando o exercício da conscientização da necessidade de união de esforços da maioria por mais espaço e recursos. Conseguiu-se assim, através de preleções em Escolas de Enfermagem que nos convidavam, assim como nos eventos promovidos pela classe, produzir significativo crescimento da demanda. Tais indicadores reforçaram os pleitos levados à presidência e à coordenadoria da saúde, justificando a ampliação de recursos, quotas de bolsas, de modo que a Enfermagem passou a receber expressivo aumento no investimento de projetos pelo CNPq (Depoente 4). Neste depoimento relativo aos dois mandatos exercidos, observase o aumento da complexidade das atividades desenvolvidas e as conquistas da representação para a área de Enfermagem: Ao assumir as atividades de representante da área da Enfermagem busquei conhecer mais de perto o órgão CNPq, sua estrutura, dinâmica de funcionamento, políticas e, em especial, as pessoas, a equipe de técnicos, os diretores, os pares representantes e demais pessoas que circulam naquele órgão. Em especial, destaco o contato com a representante anterior, o qual foi muito importante para o reconhecimento das atividades inerentes a essa representação. Também, a recepção do Presidente e o acolhimento da equipe técnica foram marcantes. Ainda, se somou a vivência da evolução da pesquisa na área pela trajetória pessoal de quase três décadas em atividades na PG, publicação e orientação regular, atuação na Capes, enfim... Familiaridade com o julgamento de processos de produção de conhecimentos e formação de pesquisadores da área (Depoente 6). A estrutura do CNPq consolida experiência de funcionamento desde o ano de 1951. A presença das representantes de área é sentida como de suma importância, de reconhecimento e valorização do seu domínio e, ainda, competência na área que representa8. As atividades que realizam são descritas nos depoimentos a seguir: Análise dos processos nas reuniões semestrais de julgamento; análise de processos emergenciais de grandes eventos da área. À época havia uma reunião durante a semana de julgamento com todos os coordenadores dos Comitês Assessores, ou seja, dos representantes de cada comitê, com o coordenador geral deste grande grupo e o presidente do CNPq; e 122 Enfermagem no CNPq: história segundo representantes da área Erdmann AL et al elaboração dos relatórios das reuniões junto com os colegas de comitê, tentando inserir uma política mais agressiva nas nossas reivindicações (Depoente 5). Estas atividades são mantidas nos dias atuais, como segue. A representação inclui atividades diretamente no CNPq, tais como análise e julgamento dos processos relativos às diferentes modalidades de fomento que o órgão oferece mediante editais regulares e especiais, os quais são apreciados em reuniões periódicas dos membros dos CAS; análise de mérito de processos de fluxo contínuo; atividades externas junto à Comunidade Científica em eventos, visitas aos centros de pesquisa, e outros de caráter representativo no domínio da ciência, tecnologia e inovação da área da Enfermagem no país (Depoente 6). Nos dois depoimentos citados, as atividades destacadas mostram a relevância do trabalho realizado, o que envolveu domínio de conhecimento sobre as bases teórico-filosóficas e epistemológicas que sustentam a área da Enfermagem como ciência, tecnologia, inovação; e competência política para conquista de espaço e reconhecimento da profissão no cenário nacional e internacional. Incluem, também, a interface com as demais ciências, especialmente as da saúde, sociais e humanas, nas suas universalidade e especificidades, nos âmbitos regionais e internacionais. As discussões com os pares das demais áreas não se limitam à mera distribuição de recursos ou apoios para o desenvolvimento de atividades mais relevantes de cada área. Mas, na sustentação de políticas de desenvolvimento científico e tecnológico do país e sua projeção internacional, que possibilitem ganhos ou retornos significativos para as necessidades sociais ou impactos internos, regionais ou nacionais. A visão mais abrangente e profunda da realidade de sua área, bem como das demais áreas, possibilita a integração e o diálogo mais enriquecedores entre os pares, em prol de decisões mais pertinentes e mais seguras. havia um considerável desnível favorável à Enfermagem, em relação às demais áreas do Comitê. Isto graças à ação política de seus representantes e à correspondente resposta da comunidade apresentando demandas. No dizer de integrantes do Comitê, representando outras áreas, a Enfermagem tinha “um PIBIC inteiro”. E em termos de bolsas de Apoio Técnico havia para a Enfermagem, no mínimo, dez vezes mais quotas do que para as demais áreas somadas. Isto se deveu ao trabalho dos representantes que demonstraram à presidência do CNPq a especificidade da área (Depoente 4). Outra depoente considerou os avanços assim: As principais atividades que realizava e avanços para a área: Reuniões para julgamento, todas aprazadas, terminavam sempre com uma reunião do presidente com os coordenadores. Independente dessas reuniões, por duas vezes reuni-me com o presidente para solicitar aumento de bolsas tanto PQ quanto IC e AT, visando um maior crescimento da Enfermagem na produção do conhecimento. Nesta reunião estavam presentes a representante do período anterior, a atual (1998 a 2001) e a presidente do CEPEn/ABEn - Nacional (Depoente 5). Referindo-se à integração com os membros do Comitê, uma das representantes destaca: Quanto à integração com os demais membros do Comitê só tive problemas com um; ele queria tudo para a sua área. Até nas pontuações para alguma decisão sobre percentual de aprovação, por exemplo, nos casos de Editais, se alguém da Enfermagem apresentasse maior pontuação, ele criava estratégias para tentar levar vantagens. Sempre o enfrentei, e a Enfermagem sempre conseguiu ganhar dentro da distribuição eqüitativa com as demais. As outras profissões para ele eram inferiores. Embora o CNPq não adotasse que a representante comparecesse aos eventos da categoria (se convidado o CNPq, iria um técnico), apresentava-me em todos e em três participei de mesas redonda falando das atividades na área e apelando para enviarem seus projetos mais de uma, duas vezes até conseguirem, afim de aumentar a demanda. (Depoente 5) Não consideramos esta citação como expressão de conflito, mas como defesa e luta pela categoria afim de que a mesma angariasse o merecido: O exercício da coordenação do Comitê por dois períodos foi muito salutar no sentido da integração, do reconhecimento e respeito à força da área Enfermagem por parte dos integrantes do CA-MS que nos elegeram por aclamação, o que permitiu imprimir maior visibilidade da área, de um lado aos integrantes da estrutura do CNPq e, de outro, aos integrantes dos demais comitês. Ressalta-se que, para algumas modalidades de investimento, só participavam os coordenadores; portanto, representar a Enfermagem e as outras áreas do CA-MS, além de ter sido um avanço, C) OS AVANÇOS OBTIDOS PARA A ÁREA são descritos a seguir: Uma das depoentes considerou que os avanços obtidos passaram pela visibilidade da Enfermagem: O principal avanço foi mudar o nome do Comitê Complementar para Comitê Multidisciplinar de Saúde. Ressalto que tive uma grande preocupação em julgar as solicitações de bolsas com imensa responsabilidade, tentando identificar e ajudar os expoentes de cada região brasileira, sem corporativismo ou preconceitos. Por exemplo, tentávamos levar em consideração que um pesquisador do Acre não dispunha das mesmas facilidades para começar sua carreira como dispunham os de São Paulo, naquela época pré-internet (Depoente 3). O avanço mais significativo, no meu entender, foi a credibilidade da área refletida no aumento expressivo de recursos para as três modalidades [de bolsa]: PQ [produtividade], IC [iniciação científica], AT [apoio técnico]. Em relação a estas duas últimas modalidades, Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 118 - 26. Enfermagem no CNPq: história segundo representantes da área Erdmann AL et al permitiu aumentar a visibilidade da Enfermagem. Ao lado desta conquista, contamos com a confiança dos representantes das outras áreas do Comitê, em relação ao nosso trabalho, refletindo-se em credibilidade para a Enfermagem (Depoente 4). Com o passar do tempo, verifica-se cada vez mais o respeito e a confiança na Enfermagem como área, na figura de suas representantes, de modo que elas passaram a ser acionadas e destacadas para outros tipos de julgamento fora do CA-MS, representando a Enfermagem, mesmo após o término de seus mandatos. Nesse sentido, percebe-se o reconhecimento da competência e credibilidade da área e do profissional, o que é uma oportunidade para ampliar a visibilidade da área quando inserida em outros Comitês. É o que se depreende do depoimento a seguir: A Enfermagem tem tido oportunidade de demonstrar sua competência também em outros Comitês. Nos anos recentes participei do julgamento do Edital para Doenças Crônico-degenerativas representando a Enfermagem, Odontologia e Educação Física. Eu era a única não-médica neste Comitê Específico. Nesta oportunidade fui convidada para coordenar um julgamento no Comitê de Bioética. A justificativa da convocação era a de que minha experiência em coordenação de Comitê precisava ser transferida para aquele [Comitê] recém-criado (Depoente 4). Em retrospectiva, analisando-se a representação da Enfermagem no momento de sua inserção e sua evolução, evidenciase a atual marca conquistada em diferentes períodos, ou seja, a posição do CNPq em reconhecer que as representantes da Enfermagem poderiam e deveriam replicar suas experiências em outros Comitês. Um espaço de interações e associações entre pares, representantes de diferentes saberes, mas integrantes de uma grande área de conhecimento, é permeado por relações de força e de potencial crítico, reflexivo e argumentativo, num jogo do diferenciar e igualar ao mesmo tempo. Na medida em que avançam as práticas interdisciplinares na saúde, reconhecendo o potencial de força, interdependências e domínios específicos das diferentes disciplinas ou profissões da saúde, essa religação de saberes não admite mais a soberania ou a arrogância de uns sobre outros, e sim atitudes político-sociais na soma de esforços para conquistas maiores, co-responsabilidade pelos avanços e necessidades da sociedade demandadas pelo trabalho do coletivo de pesquisadores da área da saúde2,8. Além dos avanços em relação às experiências de representação e coordenação das representantes da Enfermagem, destaca-se, também, o aumento significativo do número de pesquisadores com bolsa de produtividade. Em 1991 contávamos com 49 doutores pesquisadores no sistema do CNPq4. Este número foi aumentando à medida que as representantes da área insistiam, negociavam e solicitavam aumento das cotas. Assim é que, em 1998, já contávamos com 80 cotas (depoente 4). Em 2001, a Enfermagem estava com 90 cotas (depoente 5). E hoje são 111 doutores pesquisadores no CA-EF (depoente 6). Assim como o número de pesquisadores cresceu, maior ainda foi o crescimento qualitativo, tomando-se em conta que Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 118 - 26. 123 em 1991 era um (1) pesquisador IA; em 1993 eram três (3) pesquisadores IA. E hoje são nove (9) pesquisadores neste nível e categoria. A proporção entre pesquisadores que atingiram o nível mais alto (IA) e o número de pesquisadores cadastrados (111) ainda não é a ideal, pois aponta para uma concentração de pesquisadores de categoria/nível 2. Possivelmente, isto resulta da produtividade dos pesquisadores, os quais não estão conseguindo manter a regularidade da publicação de qualidade e, também, não estão suficientemente envolvidos com a formação de recursos humanos de pós-graduação (mestrado e doutorado) e de iniciação científica, para assim atender às exigências do órgão, para fins de progressão9. Por outro lado, os mecanismos internos da agência também poderiam estar contribuindo tanto para um crescimento maior do número de bolsas de produtividade concedidas como para progressão dos próprios pesquisadores nos níveis/categorias do órgão. Registramos ainda como avanço a mobilização feita junto ao CA-MS, no sentido de conquistar a criação de mais dois novos Comitês, um para a Enfermagem e outro para a Odontologia, o que aconteceu em 2005. Assim: Ao perceber a já expressiva demanda de projetos e as dificuldades na partilha das quotas entre as subáreas no CA-MS, sondou-se junto à equipe técnica a viabilidade de infra-estrutura interna para a criação de novos comitês. Assim, partiu-se para a mobilização desta idéia mediante a elaboração de uma carta junto com a Coordenadora do CA-MS, representante da Odontologia, no último dia da reunião de trabalho, ou seja, em 11 de março de 2005. Esta carta foi assinada por nós duas e enviada ao Presidente. Também nesta ocasião, fizemos uma reunião com diretores expondo ... nossas necessidades, sendo amplamente apoiadas. A expectativa era pela criação de mais dois Comitês. Em maio, por ocasião da análise dos processos para reclassificação dos PQ [bolsas de produtividade], apresentamos critérios de análise já específicos para cada área: Odontologia, Enfermagem, e demais áreas. Embora o número de bolsistas de Produtividade da Odontologia e Enfermagem sejam bastante próximos, de 136 e 111 [respectivamente], há significativa diferença na média da pontuação dos currículos, o que é resultado de publicações em periódicos mais qualificados, que possibilitou à Odontologia criar critérios levando em conta o índice de impacto dos periódicos. A área da Enfermagem ainda não possui este perfil de publicações internacionais e consolidação como ciência e tecnologia. Assim, em julho de 2005 é criado um novo comitê CA-Odontologia, o que liberou espaço no CA-MS na competitividade das quotas e, do mesmo modo, propiciou um destaque para a Enfermagem no comitê em que permanece abrindo caminho para novas tentativas de emancipação na luta por um CA [da] Enfermagem (Depoente 6). A pesquisa tem sido uma área de contínuo crescimento e investimento por parte da Enfermagem Brasileira. O caminho 124 percorrido até o patamar atual foi longo e muito difícil. O Primeiro Congresso Brasileiro de Enfermagem (I CBEn), realizado em 1947, recomendou que as Enfermeiras se iniciassem na pesquisa. Em 1964, o tema central do XIV CBEn foi “Enfermagem e Pesquisa”, por sugestão da coordenadora da Comissão de Temas, Profa. Dra. Maria Ivete Ribeiro de Oliveira, da Escola de Enfermagem da Universidade Federal da Bahia, de saudosa memória8. A partir do ingresso da Enfermagem no Sistema Nacional de Pós-graduação, a pesquisa tomou vulto com o início do seu primeiro curso de mestrado em 1972, na Escola de Enfermagem Anna Nery da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Paralelo a isto, outras Instituições criaram os seus cursos de pós-graduação stricto sensu. Hoje, A Enfermagem conta com 29 Programas de Pós-Graduação em Enfermagem no país, dos quais doze possuem o nível de doutorado10. Os avanços são percebidos nos Programas de PósGraduação, considerados os maiores centros de produção de conhecimento científico, cuja prática de pesquisa em Enfermagem tem crescido qualitativa e quantitativamente. O aumento do número de Programas, bem como do volume e qualidade das publicações leva a um maior interesse pela pesquisa e busca de fomento. A demanda cada vez maior de solicitações de apoio do CNPq é resposta à necessidade de intensificar a produção de conhecimento nos Programas de Pós-Graduação, bem como de obter bolsas de formação (Mestrado, Doutorado, Pós-doutorado, Doutorado Sanduíche) e bolsas de iniciação científica e apoio técnico para os projetos de pesquisa dos doutores pesquisadores. D) A EXPERIÊNCIA DE SER REPRESENTANTE é mostrada nos depoimentos a seguir: A experiência de ser representante teve aspectos bons e outros limitantes. Os positivos são relacionados à oportunidade de conhecer líderes e a produção de conhecimentos da área de Enfermagem no território brasileiro (Depoente 3). A prática de análise de projetos ou de solicitações demandadas ao órgão propicia uma visão geral dos pesquisadores da área, do perfil de produtividade dos mesmos, das tendências de temáticas e métodos investigados, dos produtos obtidos e de sua distribuição nas diferentes regiões do país, bem como dos vazios e impropriedades encontradas11. Outro aspecto foi a oportunidade e prazer em pensar as questões acadêmicas com maior responsabilidade, o que foi enriquecido pela troca de experiência com colegas consultores Ad Hoc (Depoente 3). O aprendizado na leitura dos pareceres dos consultores ad hoc e seu confronto com as propostas analisadas é impar, motivante e desafiante, abrindo para a busca de inovações e diversidades de olhares na construção de conhecimentos da área: Outro fato foi vivenciar um momento de crescimento dos pesquisadores e da área, incentivando o aumento da demanda, numa época em que tínhamos mais Enfermagem no CNPq: história segundo representantes da área Erdmann AL et al liberdade pessoal para julgar segundo critérios qualitativos, e não apenas quantitativos (Depoente 3). O domínio dos critérios de análise, no sentido de julgar o mais corretamente possível os pedidos de fomento, passa pela estrutura definida de caráter quantitativo, somando-se aos aspectos qualitativos. Todavia, os aspectos quantitativos determinam os pontos de corte. Assim, quer qualitativo, quer quantitativo, após atender os critérios legais técnicos, o mérito referente ao conteúdo, pertinência, coerência e sustentabilidade da proposta e a capacidade produtiva do proponente, busca-se cercar a viabilidade da proposta com condições que assegurem a possibilidade de retorno significativo para a sociedade. Trata-se, portanto, de um exercício atentivo de análise de solicitações dentro da área com um olhar para as demais áreas que compartilham o Comitê. Esta é uma liderança de autonomia relativa e compartilhada. Assim: Os pontos limitantes foram mais relacionados ao pequeno número de bolsas em relação à oferta, resultando em situação dramática para a inserção dos novos doutores. Esses, muitas vezes com grande potencial para a pesquisa, tinham que ser preteridos em função de seus próprios orientadores, muitas vezes pessoas brilhantes, continuamente convidadas para falar em eventos (Depoente 3). Não há dúvida que o potencial para a pesquisa cresce numa proporção muito maior do que a oferta de cotas para atender a demanda. A qualidade das propostas analisadas e a produção mais qualificada dos pesquisadores da área são uma realidade: A experiência como pessoa e como profissional considero excelente, apesar das reclamações dos pares que solicitavam bolsas e não conseguiam. É um aprendizado ímpar. Na verdade, a demanda sempre foi maior que as cotas destinadas para a área. Sempre entendi a representação como uma maneira de mostrar que a Enfermagem existe como profissão caminhando para a Ciência. Das conquistas, consegui, embora um pequeno número, aumento das cotas. E acredito que a demanda aumentou também. Além da divulgação da área que sempre procurei fazer e auxiliar ao máximo a quem gostaria de pedir PQ. Durante o mandato, três presidentes passaram pelo CNPq; o primeiro, o Prof. Tundizi (da UFSC/São Carlos), aumentou nossas cotas e nos entendeu, ou melhor, compreendeu o que é a Enfermagem e parecia gostar de conversar conosco sobre a nossa profissão (Depoente 5). A necessidade de conviver com as insatisfações de quem não teve suas solicitações contempladas leva a um sentimento de serenidade pela consciência dos limites existentes, e, ao mesmo tempo, vislumbram-se outras possibilidades de demanda em órgãos de fomento ou fontes de recursos que pouco tem sido explorados. Existe o reconhecimento de que a produção de conhecimentos necessariamente requer recursos financeiros, Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 118 - 26. 125 Enfermagem no CNPq: história segundo representantes da área Erdmann AL et al humanos, físicos, materiais, logísticos, políticos e outros. A competitividade leva à busca de múltiplas tentativas. E este é um fenômeno que se dá em todas as áreas de conhecimento que, desde logo, marcaram presença em outras agências com a mesma força que se mostrou no CNPq. Parece que a Enfermagem Brasileira carece agora desta compreensão e de mais assertividade na busca de outras alternativas a serem exploradas simultaneamente com as propostas submetidas ao CNPq. A experiência vivenciada, ao atuar no órgão exercendo o papel de representante, avaliando os processos e os pareceres ad hoc e, ao mesmo tempo, interagindo com os pares que submetiam projetos, nos permitiu uma visão mais abrangente da situação da Enfermagem, de sua evolução, de suas perspectivas e limitações. Se os representantes muito bem convenceram a comunidade sobre a importância de ter sempre uma demanda elevada, precisam agora atuar no sentido de busca de espaços tanto para representação da Enfermagem em outros órgãos (Fundações de Apoio à Pesquisa em cada Estado, por exemplo), como de direcionamento de projetos demandando recursos em outras fontes. A capacidade de crescimento do CNPq é limitada para todas as áreas. Devemos manter nossa presença, buscar sempre a melhoria do perfil científico dos pesquisadores e da qualidade dos projetos, mas urge que outros espaços sejam também conquistados, para garantia de recursos à pesquisa e à transferência dos resultados aos serviços (Depoente 4). A análise da Enfermagem pelas agências, como profissão e ciência, revela algumas conquistas, aumento da demanda de doutores. Porém, é preciso avaliar o real significado que tem para agências, aquilo que consideramos “conquistas”. E é preciso avaliar o real significado para a sociedade. Que conhecimentos foram caracterizados, aprofundados, resultando em melhores condições para os sujeitos de nossas ações? Acredito que temos grande potencial para direcionarmos melhor nosso trabalho para adquirir conhecimentos que beneficiem mais objetivamente a sociedade e identificar focos de interesse. Por exemplo, tenho certeza que, se um grande contingente da Enfermagem estivesse voltado para buscar conhecimentos que melhorassem a qualidade de vida e atenção dos portadores de problemas oncológicos, certamente seríamos muito respeitadas. Referências 1. Méis L. O perfil da ciência brasileira. Rio de Janeiro (RJ): UFRJ; 1996. 2. Leite JL, Mendes IAC. Pesquisa em enfermagem e seu espaço no CNPq. Esc Anna Nery Rev Enferm 2000 dez; 4(3): 389-94. 3. Wright MGM. A imagem do enfermeiro e da profissão de enfermagem veiculada ao público. Anais do 1º Simpósio Brasileiro de Comunicação em Enfermagem-SIBRACEn 1988 maio 2-4; Ribeirão Preto(SP). Brasil. Ribeirão Preto (SP); 1988. p. 525-601. Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 118 - 26. Muitas de nossas pesquisas não vêm sendo bem compreendidas, e, se quisermos defendê-las, precisamos dar respostas bem fundamentadas, seja qual for o referencial teórico-metodológico, etc, etc (Depoente 3). Assim como as enfermeiras cresceram em qualidade e quantidade na prática investigativa, por outro lado, vazios de conhecimentos são perceptíveis, e as cobranças também são freqüentes. O impacto do que produzimos requer uma constatação mais precisa, como também a necessidade de dar conta das prioridades da saúde, de produtos tecnológicos que propiciem uma resposta mais incisiva na melhoria da qualidade de vida, e mesmo de inovação que dê retorno econômico mais expressivo. O benefício econômico e social dos conhecimentos produzidos e aplicados na prática da Enfermagem é ainda um desafio para os gerentes das práticas investigativas na área da Enfermagem. Estes depoimentos mostram alguns aspectos relativos às vivências e experiências das representantes na sua representação, bem como as perspectivas de mudança que nos apontam. CONSIDERAÇÕES FINAIS As informações descritas possibilitaram, de certo modo, mostrar a importância e a evolução da Enfermagem como ciência e tecnologia e, ainda, a importância do fomento para viabilização das pesquisas, o estímulo ao incremento da pesquisa, os avanços na produção de conhecimentos, os desafios enfrentados e as perspectivas como possibilidades para o fortalecimento e consolidação da Enfermagem11. O desenvolvimento da pesquisa é uma importante estratégia para o fortalecimento da Enfermagem como ciência e profissão. E o CNPq é um importante órgão de fomento às políticas para o avanço da Enfermagem. Neste estudo, vimos que as profissões de saúde possuem algum tipo de identidade coletiva, e existem peculiaridades que pertencem a uma distinta categoria profissional. Os comportamentos, os conhecimentos e as práticas próprias de cada categoria revelam uma cultura profissional específica. Neste sentido, percebe-se que as relações não estão expressas objetivamente. Elas são intersubjetivas, perpassando nas entrelinhas das relações por meio de expressões que não são mensuráveis, nem essencialmente abstratas12. Desta forma, este estudo traz dados sobre a presença da representação da Enfermagem no CNPq, que vem fazendo parte da História da Enfermagem Brasileira. 4. Barreira IA. A pesquisa em enfermagem no Brasil e sua posição em Agência Federal de Fomento. Rev Latino- Am Enfermagem 1993 jan; 1(1):51-7 5. Leite JL, Mendes IAC, Felli VE, Trezza MCF, Santos RM. Os projetos de pesquisa de enfermagem no CNPq: seu percurso, suas temáticas e suas aderências 1988-2000. Rev Bras Enferm 2001 jan/mar; 54(1): 81- 97. 6. Ministério da Ciência e Tecnologia (BR). Informativo Eletrônico do Comitê Assessor de Enfermagem-CNPq/CA-Enf.[on-line] 2006 dez; 5(2).[citado jun 2005]. Disponível em: http://www.cnpq.br. 126 7. Ministerio de Ciência e Tecnologia (BR). Conselho Nacional de Pesquisa.[on-line] [citado jun 2005]. Disponível em: http:// www.cnpq.br 8. Mendes IAC, Leite JL, Trevizan MA, Santos RM. Classificação dos pesquisadores/consultores da área de enfermagem no CNPq: contribuição para um banco de dados. Rev Bras Enferm 2003 set/ out; 56(5): 488-93 9. Gutierrez MGR, Leite JL, Erdmann AL, Pagliuca LMF. Os múltiplos problemas pesquisados e a pesquisar na enfermagem. Rev Bras Enferm 2002; 55(5): 535-41 10. Erdmann AL, Rodrigues RP, Silva IA, Fernandes JD, Santos RS, Araújo TL. A formação de doutores em enfermagem no Brasil. Texto&Contexto Enferm 2002;11(2): 66-76 11. Mendes IAC. Pesquisa em enfermagem: impacto na prática. São Paulo(SP): EDUSP; 1991. 12. Prochnow AG, Leite JL, Erdmann AL. Teoria interpretativa de Geertz e a gerência do cuidado: visualizando a prática social do enfermeiro. Rev Latino-Am Enfermagem 2005 jul/ago;13(4): 583-90. Enfermagem no CNPq: história segundo representantes da área Erdmann AL et al Sobre as Autoras Alacoque Lorenzini Erdmann Enfermeira. Professora Titular e Coordenadora do GEPADES / UFSC. Representante da área de Enfermagem no CNPq Gestão 2004-2007. Coordenadora do Comitê Multidisciplinar de Saúde 2005 a 2006 e do Comitê Assessor de Enfermagem 2006 a 2007. Pesquisadora 1A / CNPq. E-mail [email protected]. Isabel Amélia Costa Mendes Enfermeira Professora Titular da Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto / USP - Centro Colaborador da Organização Mundial de Saúde para a Pesquisa em Enfermagem. Representante da área de Enfermagem no CNPq e Coordenadora do Comitê Assessor Multidisciplinar de Saúde gestão 1995 a 1998; e 2001 a 2004. Pesquisadora 1A / CNPq. Joséte Luzia Leite Enfermeira aposentada. Professora Titular e Professora Emérita / UNIRIO. Membro da Diretoria do Núcleo de Pesquisa, Gerência, Exercício Profissional da Enfermagem (GESTÃO da EEAN).Ex-representante da área de Enfermagem no CNPq Gestão 1998 a 2001. Diretora do CEPEn / ABEn Nacional. Pesquisadora 1A / CNPq. E-mail [email protected]. Recebido em 25/05/2006 Reapresentado em 05/02/2007 Aprovado em 02/03/2007 Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 118 - 26. 127 Á PProcura rocura do Sujeito e as Sujeições do TTrabalhador rabalhador Vargas MA et al ENSAIO ESSAY - ENSAYO À PROCURA DO SUJEITO NO/DO TRABALHO DE ENFERMAGEM: O ACONTECIMENTO “FOUCAULTIANO” E AS SUJEIÇÕES DO TRABALHADOR The subject search at and of the nursing work: The Foucaul’s event and the worker’s subjections La procura del sujeto en/del trabajo de enfermería: El acontecimiento “Foucaultiano” y las sujeciones del trabajador Mara Ambrosina Vargas Joel Rolim Mancia Flávia Regina Souza Ramos Denise Pires Resumo O ensaio reflexivo aborda o sujeito no/do trabalho em Enfermagem, tendo como suporte teórico o conceito de acontecimento em Foucault. Descreve e analisa quatro acontecimentos que podem sintetizar algumas das problemáticas da Enfermagem contemporânea, a saber: diferenças de realidade, hibridismo humano-máquina, rede de relações e processo de construção do conhecimento científico. Constata que as atuais sujeições do trabalhador mostram-se muito mais complexas, o que inviabiliza entender a questão da subjetividade do trabalhador em Enfermagem somente a partir da noção de sujeições econômicas. Porém, sinaliza que, mesmo não escapando de determinados modos de sujeição do presente, há espaços produtivos de desafios, lutas, portanto de liberdade para repensar o trabalho na Enfermagem. Pala vr as-c ha alavr vras-c as-cha havve: Trabalho. Enfermagem. Trabalhadores. Abstract The reflexive essay approaches the subject at/of nursing work, grounded by the Foucault´s theoretical concept of event. It describes and analyzes four events that can synthesize some of the contemporary nursing problems, that is: different realities, man-machine hybridism, net of relations, and the process of construction of the scientific knowledge. It finds out that the current subjections of the nursing worker are much more complex, what makes impracticable to understand the subjectivity of the nurse considering only the notion of economic subjections. However, it indicates that, even not escaping from certain ways of subjection existing nowadays, there are some productive spaces proper for challenges, fights, and that offer the freedom required to rethink the nursing work. K eyw or ds: Work. Nursing. Workers. ywor ords: Esc Anna Enferm 2007 mar; 11 (1): 127 - 32. Esc Anna Nery R Enferm 2007 Nery mar; R11 (1): 127 - 32. Resumen El ensayo reflexivo aborda al sujeto en el/del trabajo en enfermería, tiene como soporte teórico el concepto de suceso en Foucault. Describe y analiza cuatro sucesos que pueden sintetizar algunas de las problemáticas de la enfermería contemporánea, como por ejemplo: diferencias de realidad, hibridismo humano máquina, red de relaciones y proceso de construcción del conocimiento científico. Constata que las actuales sujeciones del trabajador se muestran mucho más complejas, lo que hace inviable entender la cuestión de la subjetividad del trabajador en enfermería solamente a partir de la noción de sujeciones económicas. Sin embargo, señala que, aunque no escape de determinados modos de sujeción del presente, hay espacios productivos de desafíos, luchas Pala br as ccla la alabr bras lavve: Trabajo. Enfermería. Trabajadores. 128 Á PProcura rocura do Sujeito e as Sujeições do TTrabalhador rabalhador Vargas MA et al Quando Alice está na casa do rei, ele pergunta para ela: - Será que você pode dar uma olhada na janela e ver se meu mensageiro está chegando? Alice olha pela janela e diz: - Ninguém vem lá. - Meu Deus! Que menina! Que olhos! Puxa vida, os meus olhos, no máximo conseguem ver alguém. Você consegue ver ninguém! Gente, que coisa maravilhosa! - Em que sentido o senhor está falando? Então o mensageiro chega e o Rei pergunta para ele:Você chegou primeiro que ninguém? - Claro! Eu sou mais rápido que ninguém. - Não! Ninguém é mais rápido que você, porque ele veio na sua frente. - Mas ninguém veio na minha frente! - Mas como ninguém veio na sua frente se você é mais rápido do que ninguém? Ninguém deveria ter chegado antes! - Sim! Ninguém chegou antes, porque eu sou mais rápido do que ninguém. - Não, você não me entendeu. Ninguém é que deveria ter chegado antes... - Não é possível...(1: 62) QUEM VEM LÁ? Independente de ser ninguém ou alguém, pode-se dizer que tanto Alice como o Mensageiro “entendem” o mundo de modo diferente do Rei. Para Alice e o Mensageiro ninguém é ninguém; para o Rei, ninguém é alguém. Alice e o Mensageiro olham o que é possível olhar em determinada época e lugar; o Rei mesmo olhando o mundo através dos olhos de Alice e do Mensageiro, concebe ver ninguém. O Rei não vê ninguém, mas se regozija com a possibilidade de ninguém vir lá; Alice e o Mensageiro olham ninguém, mas não o percebem. Por analogia, na medida em que, atualmente, percebemos que o sujeito do/ no trabalho em Enfermagem se insurge como um acontecimento mergulhado em processos complexos que o constitui, acabamos por perguntar repetidas vezes, quem vem lá? Do que fala o Rei quando o mesmo indaga quem vem lá e, ao mesmo tempo, entende que é possível ninguém chegar na frente de alguém? Muito simples, o Rei não fala somente de alguém – um deter minado modo de trabalho –, fala de ninguém concomitante a alguém – em outros modos de trabalhar. Em suma, fala de um acontecimento como uma força que perturba os modos habituais de olhar o que somos e o mundo em que vivemos. Mas lembrem-se... Por mais que diga o que vê, o que se vê não se aloja jamais no que se diz e por mais que se faça ver o que se está dizendo por imagens, metáforas, comparações, o lugar onde estas resplandecem não é aquele que os olhos descortinam, mas aqueles que as sucessões da sintaxe define.(2:25) Logo, neste ensaio reflexivo, escreve-se uma das versões possíveis de se dizer do trabalho e do sujeito do trabalho em Enfermagem. Para tanto, em um primeiro momento descrevemse quatro acontecimentos que podem sintetizar algumas das problemáticas da Enfermagem contemporânea. O acontecimento é problemático. Um acontecimento é, sempre, uma singular ruptura com as racionalidades vigentes e uma problematização da atualidade. Ele - o acontecimento - opera por multiplicidades entrelaçadas, mesmo que aparentemente distinto, provocando o pensamento e questionando evidências(3,4). Diante do acontecimento, não reagimos com placidez, mas com perplexidade, tal como a do rei: Gente, que coisa maravilhosa! Concomitante a isto, busca-se vislumbrar algumas das diferentes formas de sujeição do presente para além da sujeição econômica, já tão bem explorada na vertente marxista. Mas convém explicitar que não são consideradas, aqui, tais sujeições do presente como algo negativo e alienante; pelo contrário, a idéia é sinalizar, criticamente, o que cada uma tem de produtivo, criativo, formativo e impactante sobre nós sujeitos trabalhadores da Enfermagem. UMA DESCRIÇÃO DOS ACONTECIMENTOS Acontecimento número 1: buscando analisar aquilo que se pode chamar de diferenças de realidade, este acontecimento reporta a dois trabalhos que discutiram o entendimento das Agentes Comunitárias de Saúde (ACS). O primeiro(5) – inserido em um Projeto de Educação Continuada a partir de um convênio da Faculdade de Educação/UFRGS com a Secretaria da Saúde e Meio Ambiente de Porto Alegre, direcionado aos Postos de Saúde do município e creches credenciadas – abordou as concepções de saúde, família saudável e criança saudável, a partir das próprias necessidades levantadas pelas agentes comunitárias. Ou seja, na medida em que muitas vezes há diferenças entre os conceitos veiculados pelo programa global (Programa de Saúde da Família) e a realidade social em que as agentes estavam inseridas, as ACS expressaram suas limitações e dificuldades em abordarem questões relativas ao tema nas suas visitas domiciliares. A partir daí, desenvolveuse uma atividade-oficina, fundamentada na visão que considera o sujeito constituído por sua inserção em um grupo social onde lida com diferentes tipos de conhecimentos, produzidos a partir de idéias, valores e crenças, os quais estruturam as influências sócio-culturais que acabam por definir sua vivência. Portanto, para estas ACS, articular a questão da igualdade de direitos e, ao mesmo tempo, contemplar as diferenças se constituía como um dos grandes desafios. O segundo(6) – constituído como parte de uma pesquisa financiada com recursos da Coordenação Nacional de Doenças Sexualmente Transmissíveis e AIDS, Ministério da Saúde e da UNESCO, no âmbito do Edital de seleção de pesquisas científicas e tecnológicas em DST/HIV/ AIDS – 2001-2002 – dirigiu o seu foco para os anúncios institucionais de saúde. Mais especificamente, foi apresentado o entendimento de que as ACS do PSF de Porto Alegre/RS fizeram relativamente a apresentação de cinco anúncios televisivos de campanhas nacionais de prevenção ao HIV/AIDS a elas apresentados. Deste modo, ao mostrarem como ‘as realidades’ enunciadas pelas ACS foram-se construindo em oposição a uma outra apresentada nas mídias, afirmaram que as ACS produziram um certo repertório (convergente) de Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 127 - 32. Á PProcura rocura do Sujeito e as Sujeições do TTrabalhador rabalhador Vargas MA et al interpretação dos anúncios, que construíram a partir de suas vivências, dos discursos que as atravessam (senso-comum e biomédico) e, particularmente, da experiência cotidiana de serem telespectadores (discurso midiático, em especial o televisivo). Essa convergência pode ser expressa em um enunciado – os anúncios televisivos das campanhas oficiais de prevenção ao HIV/AIDS deveriam mostrar uma realidade mais próxima da nossa –, que, embora não seja a fala de alguém em particular, procura mostrar um certo dito que atravessou praticamente todas as manifestações das ACS. Por tanto, foi considerado importantíssimo que as ACS avaliassem, criticassem e dessem sugestões quanto ao modo como esses anúncios deveriam ser, precisamente porque elas vêm de um segmento profissional que, no organograma do PSF, estabelece uma ‘ponte’ entre a comunidade e os saberes médicos que precisam ser aprendidos e seguidos na direção de se ter e manter a saúde. Assim, são profissionais posicionados (e que se posicionam) como aqueles que são capazes de fazer uma mediação entre comunidade e saberes médicos, bem como fazer visitas freqüentes às residências em sua região de atuação, exercendo, entre outras, a função educativa. Acontecimento número 2: para contemplar a problemática das possíveis noções de corpo e de sujeito, foi selecionada uma investigação (7) que – com base nos pressupostos teóricos do pós-estruturalismo – discutiu um processo de ciborguização da profissional enfermeira, isto é o hibridismo humanomáquina. Para tanto, utilizou como lócus de análise a unidade de terapia intensiva, justamente por ser um espaço amplamente mediado por máquinas produzidas pela indústria da bioeletrônica, tecnobiomedicina e tecnologia da informação. Entre as lições de terapia intensiva, discutidas neste estudo, optou-se por descrever, aqui, duas lições. A primeira lição, denominada “Uma UTI móvel em ação...”, compreendeu as enfermeiras intensivistas como usuárias de um programa de computador, estabelecendo contatos mediados e, porque mediados pelas tecnologias da informação, imediatos. Deste modo, para a enfermeira seguir passo a passo as orientações dos algoritmos de uma parada cardiorrespiratória, ela necessita estar em composição com a máquina. Foi argumentado que é a intensificação das nossas interações perceptivas e motoras com o meio, mediadas com tecnologias comunicacionais e por sistemas de processamento de informações, que nos possibilita agir imediatamente, nas situações que se configuram como emergências nesse contexto. A segunda lição, intitulada de “Imagens de corpos doentes”, explorou algumas das imagens de corpo doente que povoam e, por isso, constituem o ambiente de terapia intensiva. Essas imagens foram tratadas como um texto que deve ser lido pela enfermeira, e não como algo a ser contemplado. Logo, ao assumir o pressuposto de que o que se vê é o que se aprende a ver, procurou demonstrar que olhar essas imagens envolve um duplo aprendizado: aprende-se a operar com e a partir das imagens e aprende-se a olhar com elas; tomam-se decisões apoiadas no conhecimento extraído dessas imagens. Por conseguinte, enfermeiras intensivistas contam com aparelhos Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 127 - 32. 129 capazes de ler o corpo e de traduzir o seu interior em texto e imagem que pedem interpretações especializadas. Ao funcionar desse modo, esse acoplamento do humano com a máquina produz realidades corporais. Assim, devemos nos tornar responsáveis pelo que aprendemos a ver. Nesta direção, não se deveria pensar de forma separada e estanque em equipamentos disponibilizados pela indústria da tecnobiomedina, em enfermeiras cuidando de seus/suas pacientes na UTI e na informação gerada a partir desses equipamentos e suas implicações no tratar/cuidar desses/as pacientes; é necessário e pertinente visualizar e problematizar toda essa rede de relações como instâncias de produção e disseminação de sentidos sobre o corpo, o sujeito, a vida, o cuidado, etc... Em suma, não é mais possível separar o sujeito enfermeira, que é corpo, do sujeito enfermeira que pensa e age com a máquina. É um/a profissional que aprende a estar com a máquina: um profissional ciborgue. A sua conexão com a máquina é a ação específica. Fora dessa relação, nada sobra ou sobra outra coisa. No corpo-profissional ocorre, pois, uma transformação do próprio corpo, possibilitando que tecnologia e corpo atuem de forma concomitante. Essa concomitância não é a preservação do eu ou do outro, mas outro corpo que opera, e somente se manifesta, em conexão, combinação ou em composição, juntando em um mesmo corpo máquina e profissional. Sendo assim, procurou-se evidenciar que as lições de tecnologia no contexto de saúde e a maneira como tem sido tratada pelas/o estudiosas/ os da área do intensivismo contrastam com o consumo e a conversão dos/as profissionais em híbridos humanos-máquinas. Acontecimento número 3: Em julho de 2005, ocorreu um Seminário, promovido pela Associação Brasileira de Enfermagem/RS e pelo Grupo de Enfermagem do Hospital de Clínicas de Porto Alegre, intitulado Acolhimento e cuidado nas práticas educativo-assistenciais de saúde. Após a palestra houve um debate com a platéia, no qual uma das participantes afirmou a dificuldade ainda encontrada pela equipe de profissionais de Enfermagem em otimizar a proposta de acolhimento, na medida em que alguns ser viços não estavam adequadamente conectados a este rede de relações, desencadeando em tais profissionais, muitas vezes, sentimentos de insuficiência diante da demanda apresentada. Diante deste fato, esta participante reiterou que se faziam necessárias reuniões, e reuniões com esta mesma equipe, sempre com a finalidade de promover ajustes e aplacar anseios. Portanto, para deflagrar essa discussão, tomar-se-á o artigo do palestrante8, no qual analisa o discurso sobre a humanização e o acolhimento nas práticas de saúde, mais especificadamente hospitalar, veiculado e incentivado pelo Ministério da Saúde (MS) referentes ao Programa Nacional de Humanização da Assistência Hospitalar (PNHAH). Neste artigo, o autor refere-se às análises prévias de Deslandes sobre os sentidos da humanização encontrados nos documentos do MS. Ou seja, tais sentidos convergem para uma mesma grande questão: relações entre profissionais, relações entre usuários/profissionais (campo das interações face-a-face) e relações entre hospital e comunidade (campo das interações sociocomunitárias). Mesmo que para ele, e para outros/as autores/as, advenha o sentimento de satisfação 130 – na medida em que seja este o discurso já encontradiço em documentos oficiais, não se tratando, portanto, de levantar nenhuma divergência de fundo com essa posição oficial –, há uma compreensão da necessidade de nuançar diferenças por vezes bastante sutis, mas capazes de conduzir a questões e encaminhamentos diversos da mesma temática de preocupação. Nessa direção, indaga: como ampliar a capacidade ou simplesmente capacitar os profissionais de saúde para compreender as demandas e expectativas do público, para serem mais respeitosos e menos violentos na prestação de cuidados? Posta a questão, considera duas ordens de reducionismos: a idéia de “capacitar para” pode induzir a uma busca de soluções para o problema exclusivamente centrado na “formação” dos profissionais; a idéia do exclusivo centramento da solução nos “profissionais”, ao se reconhecer que gestores e formadores no campo da saúde só poderiam mesmo interferir neste pólo da problemática relacional. Outro aspecto referido pelo autor, diz respeito à proposição da competência do “sábio”, levando-nos a meditar sobre o alcance desse modo de pensar (e agir) nas práticas de saúde, quando lembra, por exemplo, do lugar ocupado na atualidade pelos “especialistas”. De outro modo, o autor propõe tratar as redes de serviços de saúde como grandes redes de conversações, ao mesmo tempo em que enfatiza a necessidade de uma dada técnica de conversa, convencido de que se trata de uma resposta adequada aos problemas, hoje intensamente discutidos, do acolhimento e do vínculo nos serviços de saúde. Afastando-se das soluções mais freqüentes que tendem a tratar o acolhimento como uma atividade (de recepção nos serviços) desempenhada por um profissional particular em um espaço específico, o acolhimento é proposto como um acolhimento dialogado, isto é, como uma técnica de conversa passível de ser operada por qualquer profissional, em qualquer momento de atendimento, isto é, em qualquer dos encontros, que são, enfim, os “nós” dessa imensa rede de conversações que são os serviços. E o que caracterizaria essa técnica de conversa? Em primeiro, o acolhimento dialogado seria o modo como esta técnica de conversa define a dimensão pragmática do encontro, os domínios da ação e de significação (linguagem, conhecimento). Em segundo, seria uma técnica de conversa de apoio ao processo de conhecimento das necessidades: o reconhecimento do outro como um legítimo outro; o reconhecimento de cada um como insuficiente; o reconhecimento de que o sentido de uma situação é fabricado pelo conjunto dos saberes presentes e, por fim, o reconhecimento da assimetria constitutiva deste encontro, em que uma das partes está em busca de uma satisfação de necessidades, enquanto a outra é presumida a deter os meios de satisfazê-la. Acontecimento número 4: para o último acontecimento articularam-se dois textos – um artigo (9) e um editorial (10) – buscando explorar o que eles têm em comum. Na verdade, o artigo discorre acerca do processo de cientifização da profissão e a necessária emergência de uma nova categoria de enfermeiro pesquisador. Já, o editorial traz à tona o desafio atual da Enfermagem brasileira de proliferar/impactar a sua produção científica a nível mundial. Portanto, a discussão, aqui, atémse ao que se denominou de “processo de construção do Á PProcura rocura do Sujeito e as Sujeições do TTrabalhador rabalhador Vargas MA et al conhecimento científico: espaço de lutas e visibilidades possíveis”. No artigo (9:296), é referido que, no interior do campo universitário, a capacidade de gerar conhecimentos é decisiva na luta pelo poder de fazer ver e fazer crer, acirrando-se a competição entre os grupos de interesse, com vistas ao controle das atividades de pesquisa aí desenvolvidas e do julgamento de seu mérito, tanto para fins de financiamento como para fins de publicação. Assim, as posições ocupadas no interior de um campo científico são o resultado de jogos aí disputados por atores sociais detentores de projetos que lutam por uma legitimação da sua visão de mundo, isto é, pela aceitação por todos (ou por quase todos) da evidência de seus enunciados. Ademais, o advento dos cursos de mestrado e de doutorado trouxe à Enfermagem visibilidade nas agências federais de fomento. Além disso, a preocupação com a dispersão temática da produção científica da área, muitas vezes realizada por um único pesquisador, cuja produção não apresentava características de continuidade e consistência, através de reuniões dos programas de pós-graduação em Enfermagem, levou-nos, atualmente, ao entendimento do que pode ser uma linha de pesquisa consolidada. Tal linha apresenta-se sob a forma de uma sucessão de projetos, desenvolvidos por um grupo de pessoas com vários níveis de qualificação e de experiência, que se organiza em torno de certas questões de determinada área do saber, e que se constitui para atender a uma necessidade social, mediante um trabalho coletivo, institucionalizado e apoiado por uma ou mais agências de fomento. No editorial(10:285), é acirrada a discussão em torno do pressuposto que, se o país consolida sua base científica, forma/habilita pesquisadores capacitados para solucionar problemas nacionais e regionais. E, com a estruturação de linhas de pesquisa autóctones, tornam-se multiplicadores na formação de novos pesquisadores e a produção originada deve ser referendada por avaliadores externos do contexto nacional e internacional. A nível mundial, pode-se dizer que, atualmente, a forma mais importante de divulgação da produção do conhecimento científico dá-se através dos artigos publicados em revistas científicas indexadas no ISI (Institute for Scientific Information). Ou seja, o prestígio da revista está relacionado à qualidade de arbitragem; a qualidade dos artigos publicados e a visibilidade da publicação (conseguida pelas indexações nas bases de dados e pelo fator de impacto). Só as revistas indexadas no ISI são consideradas para o cálculo do fator de impacto. Portanto, o fator de impacto passou a ser utilizado pela maioria dos pesquisadores, instituições de ensino e pesquisa e agências financiadoras de pesquisa e pós-graduação, particularmente pela Capes e pelo CNPq. O ISI indexa, aproximadamente, 16 mil periódicos em mais de 160 áreas de conhecimento. Dentre estes, estão 31 revistas de Enfermagem. Deste modo, apenas 0,44% das revistas científicas indexadas no ISI é da área da Enfermagem, sendo a maioria delas de origem anglosaxônica e norte-americana, e nenhuma revista de Enfermagem da América Latina conseguiu ainda ser indexada na referida base de dados. Assim, constata-se que a produção científica da Enfermagem tem pouca visibilidade internacional. Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 127 - 32. 131 Á PProcura rocura do Sujeito e as Sujeições do TTrabalhador rabalhador Vargas MA et al DA SUJEIÇÃO ECONÔMICA ÀS SUJEIÇÕES DO PRESENTE: ALGUMAS POSSIBILIDADES DE ANÁLISE... Um Trabalho Um Local Um relevo ACS em ação no desenvolvimento do PSF exercendo, entre outras, a função educativa. Que educação em saúde? Comunidades e unidades básicas Influências sócio-culturais que estruturam vivências, repertórios de interpretação e sentidos, enunciações possíveis – mais ou menos convergentes, mais ou menos diversas – a nãohomogeneidade Enfermeiras intensivistas cuidando de pacientes e operando tecnologias de ponta. Que implicações no tratar/cuidar? UTIs Interações (com o meio e com o outro) intensificadas e mediadas por tecnologias (novas formas de captar/ler/processar/ produzir dados). Compatibilidade e conexão enfermeira e máquina (orgânico e não-orgânico; sujeitocorpo e sujeito que pensa e age com a máquina - ação em conexão com a máquina.), o novo ser-profissional – híbrido humano-máquina; Equipe: atender/acolher demandas situadas na fronteira entre os “problemas da vida” e a patologia (sem resposta no arsenal diagnósticoterapêutico da biomedicina). O que é um acolhimento dialogado? Negociar atendimentos? Campo das interações face-a-face e instituição-comunidade portas de entrada dos serviços Nova exigência – novas tecnologias – Acolhimento/vínculo; Redes de serviços de saúde como grandes redes de conversações “Tecnologias de conversa”: identificação, elaboração e negociação com os usuários. Da assimetria para a zona de comunidade” - em torno do reconhecimento recíproco: o que um precisa e o que o outro tem a oferecer Enfermeiras pesquisadoras como novo perfil Academia, centros e grupos de pesquisa, diante do processo de cientifização da profissão agências de fomento, veículos de publicação Ao selecionar estes acontecimentos, o pressuposto era analisar as suas transversalidades. Nesta direção, o que se busca aqui é mostrar que, mesmo não escapando de determinados modos de sujeição do presente, o sujeito no/do trabalho em Enfermagem é encontrado, sim, ocupando espaços produtivos de desafios, de lutas, portanto de liberdade para repensar o seu fazer-saber. E, este repensar envolve, justamente, visibilizar e legitimar cada detalhe de uma miríade de fazeres e de saberes. Ou seja, a própria Enfermagem necessita legitimar e atualizar as múltiplas faces de um melhor cuidar e assistir o sujeito doente e o saudável que dela necessita para se restabelecer e para continuar saudável. Portanto, precisamos procurar pelas possibilidades de ruptura e de criação de novas relações e sentidos, rompendo com padrões preestabelecidos, caracterizando os movimentos atuais que buscam padrões heterogêneos, ressignificações do singular em composição com arranjos coletivos; procuram, assim, contemplar as diferentes realidades, o outro, os campos Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 127 - 32. P rocesso de construção do conhecimento científico: espaço de lutas e visibilidades possíveis; gerar conhecimentos é decisivo na luta pelo ‘poder de fazer ver e fazer crer”. Posições ocupadas no interior de um campo científico como resultado de jogos aí disputados por atores com projetos/ linguagens/ em luta por legitimação – quem pode enunciar o quê, com base em que critérios e sob que condições. Quem define enunciadores e enunciados legítimos? de luta em que nos situamos também como trabalhadores. Foucault11 sinaliza o termo singularidade - a singularidade dos acontecimentos, as descontinuidades e a afirmação da diferença atribuem a cada coisa sua medida e intensidade; por isto incomparáveis e incomensuráveis. Nesta perspectiva, não há totalidade, mas multiplicidades mutantes, marcadas por saltos, proveniências e emergências. Referem-se, aqui, a multiplicidade e a singularidade de espaços do fazer profissional: na comunidade, em conexão com a máquina, na porta de entrada nos serviços, nos terrenos vigiados da ciência, da pesquisa, da formação de novos pesquisadores, da busca legitimada por soluções nacionais e regionais. Espaços políticos, de visibilidade. Interessa, cada vez mais, o que se faz, como se faz e porque se faz. Não é mais possível pensar em categorias explicativas exclusivas (como trabalho alienado?) nestes espaços ocupados e em ocupação. Para pensarmos em todas estas relações teremos que pensar a tecnologia como hibridizada ao sujeito que pensa; construir 132 Á PProcura rocura do Sujeito e as Sujeições do TTrabalhador rabalhador Vargas MA et al conceitos que contemplem as vivências da comunidade, elaborar técnicas de conversação, manipular com desenvoltura máquinas e equipamentos e consolidar linhas de pesquisa objetivando a cientifização da Enfermagem e sua visibilidade no Brasil e no mundo. Todas são, nada mais e nada menos, que tecnologias; sujeitos que operam saberes e saberes que operam sujeitos. A tecnologia corporificada rompe a idéia de técnica como simples meio e do humano como fim em si mesmo; estamos em intercâmbios complexos e posições comunicantes. Para além disso, ao problematizar essa enganosa dicotomia “tecnologia” versus “fator humano”, poder-se-ia visibilizar o que a fórmula obscurece tanto: o caráter inalienavelmente humano das tecnologias e modo como os desafios da “humanização” passam por soluções tecnológicas. Nesta perspectiva, tais tecnologias se configurariam através de um constante processo, pois estabilizariam sempre outros e novos padrões e, simultaneamente, lidariam com a irrupção de contradições ao invés das composições baseadas em oposições binárias e hierárquicas. Assim, importa muito assumir que essas (e outras) oposições são aparentes; os pólos não são independentes e absolutamente distintos entre si e nem mesmo essências a serem re/descobertas à medida que o conhecimento técnico-médico-científico “avança”, mas conexões sempre parciais, instáveis, que se apresentam de diferentes modos com os outros e com todas as nossas partes. Assim, ao transformar as quatro descrições, selecionadas para análise, em acontecimento, a idéia era demonstrar o que cada um tinha e tem de único e agudo, de transgressivo em relação à ordem das coisas. Enfim, com baliza em Foucault, procurou-se fazer um diagnóstico do presente do processo de trabalho em saúde, especificadamente na Enfermagem. Um diagnóstico que, ao mesmo tempo, leva em consideração o desconhecido que bate à porta e que faz prosseguir a análise para outros caminhos... Referências 10. Marziale MHP. Produção científica da enfermagem brasileira: a busca pelo impacto internacional [editorial]. Rev. Latino-Am Enfermagem 2005 maio/jun; 13(3): 285-86. 11. Foucault M. Microfísica do poder. Rio de Janeiro (RJ): Graal; 1979. 1. Carroll L. Alice no país das maravilhas. São Paulo (SP): Nacional; 2005. 2. Foucault M. A arqueologia do saber. Rio de Janeiro (RJ): Forense Universitária; 1995 3. Foucault M. Mesa redonda em 20 de maio de 1978. In: Motta MB,organizador. Estratégia, poder-saber. Rio de Janeiro (RJ): Forense Universitária; 2003. Coleção Ditos e Escritos, 4. 4. Weinmann AO. O conceito de acontecimento na pesquisa em história da educação. Educação & Realidade 2003 jan/jun; 28(1): 49-63. 5. Vargas MAO, Heckler S. Saúde, família saudável e criança saudável: concepções e relações das agentes comunitárias. Rev Gaúcha Enferm 1999 jul; 20(2): 37-49. 6. Oliveira DL, Meyer DEE, Santos LHS, Wilhems DM. A negociação do sexo seguro na TV: discursos de gênero nas falas de agentes comunitárias de sáude do Programa Saúde da Família de Porto Alegre. Cad Saúde Pública 2004; 20 (5): 1309-18. 7. Vargas MAO. Corpus ex machina: a ciborguização da enfermeira no contexto da terapia intensiva [dissertação de mestrado]. Porto Alegre (RS): Programa de Pós-Graduação em Educação/UFRGS; 2002. 8. Teixeira RR. Humanização e atenção primária à saúde. Ciência & Saúde Coletiva 2005; 10(3): 315-27. 9. Barreira IA; Baptista SS. Nexos entre a pesquisa em história da enfermagem e o processo de cientifização da profissão. Anais do 51o Congresso de Enfermagem. 10º Congresso Panamericano de Enfermería: 1999 out. 2-7, Florianópolis (SC), Brasil. Florianópolis (SC): ABEn; 2000. p. 295-311. Sobre as Autoras Mar a Ambr osina Var Ambrosina argg as Enfermeira. Dda. em Filosofia da Enfermagem/UFSC. Professora Adjunta UNISINOS e atua no CTI HCPA. Membro do Grupo de Pesquisa Práxissaúde, trabalho, cidadania e enfermagem/UFSC. Bolsista do CNPq. Flávia Regina Souza Ramos Enfermeira. Dra em Filosofia da Enfermagem. Professora Adjunta da UFSC. Membro do Grupo de Pesquisa Práxis- saúde, trabalho, cidadania e enfermagem/UFSC. Bolsista do CNPq. Joel Rolim Mancia Enfermeiro. Ddo. em Enfermagem/UFSC. Servidor da Prefeitura Municipal de Porto Alegre. Membro do Grupo de Pesquisa GEHCEGrupo de Estudos de História do Conhecimento de Enfermagem/UFSC. Denise Pires Enfermeira. Pós-doutorado University of Amsterdam, Holanda. Dra Ciências Sociais/UNICAMP. Professor a Adjunta da UFSC. Membro do Grupo de Pesquisa Práxis-saúde, trabalho, cidadania e enfermagem/UFSC. Recebido em 09/03/2006 Reapresentado em 08/11/2006 Aprovado em 10/01/2007 Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 127 - 32. Estudo Eletrofisiológico e Ablação por Cateter: O que a Enfermagem Precisa Saber Vanheusden LMS et al REVISÃO 133 REVISION - REVISIÓN ESTUDO ELETROFISIOLÓGICO E ABLAÇÃO POR CATETER: O QUE A ENFERMAGEM PRECISA SABER Electrophysiologic study and catheter ablation: What the nursing should know Estudio electrofisiológico y ablación por catéter: Qué la enfermería precisa saber Lutgarde Magda Suzanne Vanheusden Deyse Conceição Santoro Resumo A ablação por cateter é um procedimento invasivo eletrofisiológico que visa eliminar ou obstruir um circuito arritmogênico. Atualmente o Brasil conta com mais de 30 centros eletrofisiológicos nas regiões diversas que desenvolvem rotineiramente a técnica da ablação por radiofreqüência. Neste cenário específico, a presença da enfermeira vem se destacando desde a preparação do paciente até sua orientação para a alta. O objetivo deste artigo é revisar as indicações do estudo eletrofisiológico e da ablação por cateter para o diagnóstico e tratamento das arritmias cardíacas. O detalhamento técnico, as complicações e os cuidados de enfermagem são apresentados. Pala vr as-c ha alavr vras-c as-cha havv e: Enfermagem. Arritmia. Ablação por Cateter. Abstract Resumen The catheter ablation is an electro physiologic invasive procedure that aims at to eliminate or to block an arritmogenic circuit. Currently, Brazil has more than 30 electro physiologic centers in diverse regions that routinely develop the ablation technique by radiofrequency. In this specific scene, the presence of the nurse has been detaching since the preparation of the patient until the orientation for discharge. The objective of this article is to review the indications of the electro physiologic study and of the catheter ablation for the cardiac arrhythmias’ diagnosis and treatment. The technician detailing, the complications and the nursing cares are presented. La ablación por catéter es un procedimiento invasivo eletrofisiológico que tiene como objetivo eliminar o bloquear un circuito arritmogénico. Actualmente el Brasil cuenta con más de 30 centros eletrofisiológicos en las diversas regiones que desarrollan rutinariamente la técnica de ablación por radiofreqüência. En esta escena específica, la presencia de la enfermera viene destacándose desde la preparación del paciente hasta su orientación para el alta. El objetivo de este ar tículo es revisar las indicaciones del estudio eletrofisiológico y de la ablación por catéter para el diagnóstico y tratamiento de las arritmias cardiacas. El detallismo técnico, las complicaciones y los cuidados de de enfermería son presentados. Keywords: Nursing. Arrhythmia. Catheter Ablation. Palabras clave: Enfermería. Arritmia. Ablación por Cateter. Esc Anna Nery R Enferm Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1):2007 133 -mar; 7. 11 (1): 133 - 7. 134 Estudo Eletrofisiológico e Ablação por Cateter: O que a Enfermagem Precisa Saber Vanheusden LMS et al INTRODUÇÃO No final dos anos de 1980, a técnica de ablação por radiofreqüência ficou disponível como terapia curativa para arritmias. No Brasil, os primeiros centros de eletrofisiologia a fazer a técnica de ablação começaram a funcionar nos primeiros anos da década de 1990. Os primeiros relatos foram realizados pelos 5 centros cardiológicos existentes nas cidades do Rio de Janeiro e São Paulo. Desde então, a especialidade de eletrofisiologia tem sido aprimorada muito nos últimos anos. Atualmente, o Brasil já conta com mais de 30 centros de eletrofisiologia nas diversas regiões que realizam rotineiramente a técnica de ablação por radiofreqüência. Neste cenário específico, a presença da enfermeira vem se destacando desde o preparo do paciente até sua orientação para alta1. A função maior do estudo eletrofisiológico é estabelecer o mecanismo da arritmia cardíaca do paciente e facilitar a escolha terapêutica para essas arritmias. Com o desenvolvimento da ablação estabeleceu-se uma terapia curativa definitiva para as taquiarritmias2. Na ablação por cateter, o mesmo equipamento básico do estudo eletrofisiológico é utilizado e inclui: um aparelho de RX e um polígrafo para obtenção e gravação de registros eletrocardiográficos. Esse polígrafo deve disponibilizar as 12 derivações simultâneas do eletrocardiograma e um mínimo de cinco canais intracavitários. Também é necessário um estimulador cardíaco com capacidade de programar estímulos básicos e no mínimo três extra-estímulos, um gerador de radiofreqüência, cateteres diagnósticos e terapêuticos e material de reanimação cardiopulmonar. Os cateteres são multipolares, e os usados para a ablação tem um eletrodo distal de 4-5 mm de comprimento3. Os profissionais necessários para fazer uma ablação por cateter são os mesmos necessários para fazer um estudo eletrofisiológico: um cardiologista com treinamento em eletrofisiologia cardíaca, um anestesista, um a dois enfermeiros com experiência com o equipamento do laboratório, com a administração de drogas antiarrítmicas e manobras de ressuscitação2,4. A ablação por cateter é um procedimento invasivo que visa a eliminar ou bloquear um circuito arritmogênico através da aplicação de energia de radiofreqüência no local-alvo do coração. A energia de radiofreqüência é uma energia elétrica de alta freqüência que, quando aplicada no tecido libera calor, desidrata a célula e assim provoca necrose destruindo o sítio responsável pela arritmia3. ESTUDO ELETROFISIOLÓGICO O estudo eletrofisiológico é um exame invasivo realizado através de introdução de cateteres por vias venosa e arterial, que visa a elucidar o mecanismo e identificar o local da arritmia cardíaca. Durante o estudo eletrofisiológico, é possível reproduzir taquiarritmias clínicas e aferir o nível de bloqueios no sistema de condução propiciando a indicação de órteses como marca-passo e desfibrilador. Para sua realização, é necessário um profissional treinado e qualificado, e autorizado pelo departamento de arritmias e eletrofisiologia clínica da Sociedade Brasileira de Cardiologia4. O exame é realizado em uma sala de hemodinâmica ou no centro cirúrgico sob a necessidade da utilização de um equipamento de fluoroscopia com alta resolução capaz de permitir a visualização da área cardíaca e campos pleuropulmonares em diversos planos. Incidências radiológicas ântero-posterior, oblíquas anterior esquerda e direita são fundamentais para definir a anatomia e permitir a aferição da localização de vias acessórias e de circuitos atriais e ventriculares responsáveis por taquiarritmias supra e ventriculares. Equipamentos específicos para o estudo eletrofisiológico incluem um polígrafo de eletrofisiologia com sistema de multicanais intracardíacos e das 12 derivações do eletrocardiograma de superfície para a aquisição, gravação e impressão de traçados eletrofisiológicos, estimulador programável e cateteres-eletrodos.2,3 No sistema de aquisição de dados, um computador grava e registra o eletrocardiograma de superfície e o eletrocardiograma intracardíaco. Os sinais intracardíacos podem ser adquiridos como unipolares ou bipolares. Esses sinais são mostrados em tempo real e podem ser registrados em diferentes velocidades (25, 50, 100, 300 mm/segundos) para permitir a análise detalhada de arritmias no momento do exame ou em qualquer momento posterior2. ABORDAGEM DOS CUIDADOS DE ENFERMAGEM DURANTE O PREPARO DO PACIENTE PARA A REALIZAÇÃO DA ABLAÇÃO Antes da ablação, o paciente necessita ser preparado para o procedimento. A preparação para procedimentos da eletrofisiologia é similar àquela para o cateterismo cardíaco. Os pacientes são sedados, geralmente durante o procedimento eletrofisiológico. O grau de sedação depende das indicações pelas quais a terapia está sendo executada e das preferências do serviço que executa o procedimento. Uma linha intravenosa periférica é requerida para a administração de medicação. A anticoagulação sistêmica pode ser usada durante o procedimento para diminuir a ocorrência das incidências de complicações tromboembólicas. O equipamento apropriado da emergência e de ressuscitação é requerido para todos os procedimentos eletrofisiológicos5. A ablação é realizada em jejum de 8 horas, com retirada das drogas antiarrítmicas por no mínimo dois dias antes. O tratamento da insuficiência cardíaca e isquemia deve ser otimizados antes do procedimento, bem como o controle de eletrólitos do paciente6,7. Os profissionais de saúde devem se importar com nível de conhecimento dos pacientes acerca do procedimento, pois sua compreensão sobre todo o processo e as condições necessárias para posterior acompanhamento aumentam as chances de eficácia da terapêutica7. Os cuidados educativos e de orientação antes da ablação devem incluir discussões sobre a natureza do procedimento, uma descrição do procedimento, sua duração, avaliação sobre as possibilidades de sucesso e taxas de complicação. As enfermeiras devem também incluir instruções para o pósEsc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 133 - 7. Estudo Eletrofisiológico e Ablação por Cateter: O que a Enfermagem Precisa Saber Vanheusden LMS et al procedimento.6,7 Após o procedimento, o paciente deve manter o membro utilizado para acesso venoso retificado por 3 a 4 horas, e o membro inferior, por 4 a 6 horas, se a artéria femoral tiver sido puncionada. Estes cuidados evitam eventos de sangramento pelos locais de punção. No momento do procedimento, o paciente é levado para o laboratório de eletrofisiologia, e os locais de punção são preparados, fazendo-se a tricotomia, se necessário. A maioria dos estudos eletrofisiológicos podem ser feitos utilizando-se somente o sistema venoso, não necessitando o acesso arterial.1,8 Em condições de assepsia e anti-sepsia e em estado pós-absortivo, realiza-se anestesia local ou sedação. A enfermeira deve manter-se próxima ao paciente explicando todas as etapas do procedimento, diminuindo sua ansiedade e transmitindo confiança. Os resultados preliminares do procedimento devem ser compartilhados imediatamente com o paciente e a família. As explanações freqüentes podem ser requeridas no início se o paciente estiver recuperado da sedação mais pesada. Após um ablação bem-sucedida, os pacientes não têm nenhuma limitação. A maioria dos cuidados durante o procedimento e pósprocedimento é centrada na monitorização do paciente para as complicações potenciais relacionadas ao procedimento. Na maioria dos casos, os pacientes apresentam-se ansiosos antes e durante o procedimento eletrofisiológico. A sedação adequada permite o confor to necessário ao paciente, evitando-se a supersedação5. As enfermeiras devem estar alertas para as complicações principais relacionadas diretamente à colocação dos cateteres dentro do coração, como o sangramento dos locais de inserção do cateter, a oclusão do curativo sobre o local de punção ar terial e os eventos de taquiarritmias e de bradiarritmias que podem ocorrer durante e após o procedimento de ablação. A enfermeira responsável pelo cuidado ao paciente com arritmia deve estar preparada para atender toda emergência que puder ocorrer. Outros problemas potenciais que requerem monitoramento incluem a tromboflebite, o tromboembolismo e a infecção.5 A INSERÇÃO E O POSICIONAMENTO DOS CATETERES A via de acesso é feita através das veias femorais. A técnica de Seldinger modificada é usada para punção venosa, permitindo, assim, a inserção de vários cateteres-eletrodos posicionando-os no átrio direito, feixe de His e ventrículo direito. A via de acesso através da veia jugular facilita o posicionamento do cateter e sua entrada no seio coronário para mapear o átrio esquerdo e a porção posterior basal do ventrículo esquerdo. Quando existe necessidade de acesso ao ventrículo esquerdo, a artéria femoral é normalmente usada. Com uso de fluoroscopia, os cateteres são posicionados até o local-alvo do coração, guiando-se também pelos eletrogramas intracardíacos2. No átrio direito, o cateter geralmente é posicionado na parede lateral alta, perto da desembocadura da veia cava superior. Essa região é próxima de onde se localiza o nó Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 133 - 7. 135 sinusal e é a primeira que se despolariza durante ritmo sinusal. A estimulação do átrio nessa região mostra uma onda P semelhante à onda P do ritmo sinusal.8,9 O acompanhamento através da monitorização cardíaca neste momento é importante, pois arritmias podem ser desencadeadas.10 Os cateteres no ventrículo direito são geralmente posicionados no ápice e no trato de saída para estimulação e registro de potenciais. Normalmente não são posicionados cateteres no ventrículo esquerdo. Entretanto, algumas taquicardias ventriculares originam-se no ventrículo esquerdo e sua indução depende da estimulação desta câmara9. Segundo a Sociedade Brasileira de Cardiologia 1, as indicações para a realização da ablação incluem: A. Indicações clínicas 1. Pacientes com palpitações não esclarecidas 2. Pacientes com síncope inexplicada 3. Estratificação de risco de morte súbita 4.Avaliação eletrofisiológica em pacientes recuperados de parada cardíaca B. Indicações por arritmias documentadas 1. Avaliação eletrofisiológica em pacientes com bradiarritmias 2. Avaliação eletrofisiológica em pacientes com taquicardia com QRS estreito 3. Avaliação eletrofisiológica em pacientes com taquicardia com QRS largo ABORDAGEM DO CUIDADO DE ENFERMAGEM AO PACIENTE DURANTE A INSERÇÃO E POSICIONAMENTO DOS CATETERES: A preparação do paciente é similar a de um estudo eletrofisiológico. Na chegada ao laboratório de eletrofisiologia, o paciente é monitorizado (eletrocardiograma de superfície, oxímetro de pulso e pressão arterial)10. Após os cateteres serem posicionados, o protocolo do estudo eletrofisiológico é iniciado. O estudo começa com a estimulação programada com um ou mais extra-estímulos sendo liberados durante ritmo sinusal ou com ciclos comandados de 600, 500, 430 ms (100, 120 e 140 bpm), no átrio e ventrículo direitos, respectivamente.4,9 Estes conhecimentos específicos auxiliam a enfermeira a entender o que está acontecendo com o paciente durante o procedimento, pois é neste momento que as ocorrências de arritmias se iniciam10. Quando o mecanismo da arritmia é diagnosticado, um cateter de ablação é colocado no local-alvo. Quando é necessário o acesso arterial, a artéria femoral direita pode ser abordada. A punção transeptal é uma alternativa para a abordagem do átrio esquerdo e é normalmente usada para a abordagem das veias pulmonares durante a ablação da fibrilação atrial. O cateter de ablação tem 125 cm de comprimento e 6 a 8 french de diâmetro. O eletrodo distal tem que ter pelo menos 4 mm de tamanho e serve como polo negativo (ativo) durante aplicação de energia. Esses cateteres de ablação são dirigíveis e têm várias curvaturas, e podem ser deflexíveis com ângulos de 0 a 180 graus.1,4 136 Estudo Eletrofisiológico e Ablação por Cateter: O que a Enfermagem Precisa Saber Vanheusden LMS et al A energia mais usada hoje para ablação com cateter é a radiofreqüência. A energia de radiofreqüência é uma corrente alternada de uma freqüência de 300-750 kHz fornecida entre um ponto do cateter de ablação e uma placa posicionada na pele do paciente. Durante a aplicação de radiofreqüência, a energia elétrica é transformada em energia térmica.1,4. O calor que é produzido é transferido para o tecido cardíaco, primariamente pela condução e menos pela radiação. Após a aplicação da energia e não-inducibilidade das arritmias, os cateteres são retirados, e se finaliza o procedimento. O paciente é removido para o quarto e recebe alta no dia seguinte. As orientações sobre a necessidade de seu acompanhamento clínico, possíveis manifestações clínicas, retorno às atividades diárias fazem parte dos cuidados dispensados pela enfermeira neste momento. A alimentação é liberada em algumas horas. A pressão sangüínea, o pulso e o local do curativo deverão ser examinados atentamente pela enfermagem até o momento da alta10. CONDUTA DIANTE DAS PRINCIPAIS COMPLICAÇÕES PÓS-PROCEDIMENTO10 - Hematoma: Pode aparecer no local onde foram feitas as punções. Normalmente são facilmente resolvidos. Para diminuir a chance de hematomas, o paciente deverá ficar em repouso algumas horas após a ablação. - Tr ombose: Na veia ou artéria onde foram feitas as punções, diante de situações especiais, poderá ocorrer a formação de coágulos no interior desses vasos. Rotineiramente, durante e após os procedimentos, são tomadas medidas para evitar este problema. O uso de anticoncepcionais hormonais, o tabagismo, a idade avançada, o diabetes, entre outros, são fatores predisponentes que necessitam de cuidados adicionais para prevenção deste problema. - Infecção: Pelo fato de ser procedimento realizado sem a abertura do tórax, o risco de infecção é muito baixo. Além disso, se a ablação é realizada em ambiente asséptico, o risco é ainda muito menor. É muito raro ocorrer infecção no local das punções. Não obstante, utiliza-se freqüentemente um Referências 1. Diretrizes para avaliação e tratamento de pacientes com arritmias cardíacas. Arq Bras Cardiol 2002; 79 (5): 1-50. 2. Cruz FESF, Fagundes MLA, Boghossian SH, Vanheusden L et al. Terapia ablativa do flutter atrial tipo I com radiofrequência. Arq Bras Cardiol 1995; 64(4): 323-30. 3. Sosa EA, Paola A, Gizzi J et al. Indicações para estudos eletrofisiológicos e ablação por cateter de arritmias cardíacas: recomendações do DAEC da SBC. Arq Bras Cardiol 1995; 64:149-51. antibiótico profilático. Atenção normal com o curativo complementa os cuidados necessários. - Bloqueios: Em casos raros, a via anormal ou o foco responsável pela arritmia pode estar muito próximo do sistema normal de condução. A eliminação desta via anormal ou foco poderá gerar certo risco de lesão do sistema normal, provocando algum tipo de bloqueio transitório ou permanente. Dependendo do bloqueio, poderá vir a ser necessário o implante de um marca-passo. Nestes casos especiais, a enfermeira deve estar preparada para as intervenções imediatas, provendo a equipe médica de todo material necessário. ORIENTAÇÕES PARA ALTA O paciente deverá ser orientado pela enfermeira quanto aos cuidados com o local da punção, não havendo necessidade de refazer o curativo. A região deve ser lavada com água e sabão, mantendo-a sempre seca e limpa. Em alguns casos, serão receitados alguns medicamentos, inclusive antiarrítmicos. O retorno ao trabalho geralmente pode ocorrer dentro de três dias a uma semana. O paciente deverá receber um relatório completo contendo as informações sobre tudo o que foi realizado, inclusive com fotos dos locais do coração que foram tratados5,10. Dependendo do tipo de arritmia e do local tratado, em 2% a 5% dos casos, a arritmia poderá voltar após a ablação. Nestes casos, freqüentemente uma aplicação complementar de radiofreqüência resolve definitivamente o problema. CONSIDERAÇÕES FINAIS As renovações tecnológicas das últimas décadas foram rápidas e inovadoras e ofereceram novas oportunidades para os profissionais de enfermagem para atuar na área de arritmias cardíacas. É essencial o conhecimento das indicações, resultados e limitações do estudo eletrofisiológcio e ablação por cateter por parte do profissional de enfermagem, uma vez que sua atuação efetiva se faz necessária em todo o processo terapêutico dos pacientes com arritmias. 4. Fagundes ML, Cruz Filho FES. Estudo eletrofisiológico nas taquiarritmias supraventriculares. In: Cruz Filho FES, Maia IG. Eletrofisiologia clínica e intervencionista das arritmias cardíacas. Rio de Janeiro (RJ): Revinter;1997. p.18; 253-75. 5. Tyndall A. A nur sing per spective of the inv asive electrophysiologic: approach to treatment of ventricular arrythmias. Heart Lung 1983;12: 620-29. 6. Santoro DC, Oliveira CM. Conduta da equipe de enfermagem diante das alterações clínicas com síndrome coronariana. Esc Anna Nery Rev Enferm 2004; 8(2): 267-74. Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 133 - 7. 137 Estudo Eletrofisiológico e Ablação por Cateter: O que a Enfermagem Precisa Saber Vanheusden LMS et al 7. Santoro DC. Situação do sistema de saúde no Brasil e os cuidados desenvolvidos nas unidades de terapia intensiva. Esc Anna Nery Rev Enferm 2001; 5(2): 259-61. 8. Cruz FESF, Fagundes M, Boghossian SH, Vanheusden L et al. O impacto da ablação com radiofrequência como terapia das arritmias. Rev Socerj 1994; 6 (4): 184-91. 9. Vanheusden LMS, Santoro DC. Assistência de enfermagem a paciente com fibrilação atrial. Esc Anna Nery Rev Enferm 2006;10(1): 47-53. 10. Vanheusden LMS, Cruz FES, Fagundes M et al. Participação e cuidados da enfermagem em procedimentos de ablação com radiofrequência nas taquicardias supraventriculares. Arq Bras Cardiol 1994; 62(5): 361-67. Sobre as Autoras Lutg ar de Ma gda Suzanne Vanheusden Lutgar arde Magda Enfermeira. Mestre em Enfermagem pela EEAN/UFRJ. Deyse Conceição Santoro Enfermeira. Professora Adjunta do Departamento de Enfermagem da EEAN/UFRJ. Pós-doutora pela USP. Recebido em 04/11/2005 Reapresentado em 16/08/2006 Aprovado em 20/09/2006 Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 133 - 7. 138 REFLEXÃO Setenta Anos de Vida Universitária da EEAN Tyrrell MAR et al REFLECTION - REFLEXIÓN SETENTA ANOS DE VIDA UNIVERSITÁRIA DA ESCOLA DE ENFERMAGEM ANNA NERY: UMA BREVE REFLEXÃO Seventy Years of the Anna Nery School of Nursing’s University Life: a Brief Reflection Setenta Años de Vida Universitaria de la Escuela de Enfermería Anna Nery: una Breve Reflexión Maria Antonieta Rubio Tyrrel Tânia Cristina Franco Santos Resumo O presente texto tem como objeto, o discurso de abertura das comemorações dos setenta anos de vida universitária da Escola de Enfermagem Anna Nery, proferido por sua Diretora. Ele tem como propósito refletir sobre a trajetória institucional da Escola de Enfermagem Anna Nery e sua importância para a proclamação de um modelo de enfermeiro para a sociedade brasileira. As fontes consultadas e analisadas à luz do pensamento do sociólogo francês Pierre Bourdieu evidenciaram que houve um grande investimento na formação do habitus profissional dos postulantes à profissão, culminando em um modelo de enfermeiro para a sociedade brasileira. Concluiu-se, nesta reflexão que os emblemas e rituais foram instrumentos simbólicos que legitimaram e consagraram esse modelo. Pala vr as-c ha alavr vras-c as-cha havve: História da Enfermagem. Emblemas e Insígnias. Memória. Abstract Resumen The present text has as object, the opening speech of the seventy years celebration of the Anna Nery School of Nursing’s university life, said by its Head Master. It has as purpose to reflect about the institutional trajectory of the Anna Nery School of Nursing and its importance to the proclamation of a nurse model to the Brazilian society. The sources used and analyzed to the light of the French sociologist Pierre Bourdieu toughs showed that a large investment was made in the formation of the professional habitus of the postulates to the profession, culminating in a nurse model to the Brazilian society. It was conclude that in this reflection the emblems and rituals was symbolical tools that legitimate and consecrated this model. El presente texto tiene como objeto, la habla de abertura de las conmemoraciones de los setenta años de vida universitaria de la Escuela de Enfermería Anna Nery, proferido por su Directora. Él tiene como propósito reflejar sobre la trayectoria institucional de la Escuela de Enfermería Anna Nery su importancia para la proclamación de un modelo de enfermero para la sociedad brasileña. Las fuentes consultadas y analizadas a la luz del pensamiento del sociólogo francés Pierre Bourdieu evidenciaran que hubo una gran inversión en la formación del habitus profesional de los postulantes a la profesión, culminando en un modelo de enfermero para la sociedad brasileña. Concluyese, en esta reflexión que los emblemas y rituales fueran instrumentos simbólicos que legitimaran y consagraran ese modelo. Keywords: History of Nursing. Emblems and Insignia. Memory. Palabras clave: Historia de la Enfermería. Emblemas e Insignias. Memoria. Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 138 - 42. Setenta Anos de Vida Universitária da EEAN Tyrrell MAR et al CONSIDERAÇÕES INICIAIS A Escola de Enfermagem Anna Nery comemora setenta anos de inserção no sistema universitário, e, no bojo dessa comemoração, torna-se pertinente retroceder no tempo, de modo a trazer a lume uma breve reflexão acerca de sua trajetória institucional gloriosa e profícua, vivida na luta permanente pelo reconhecimento e prestígio da profissão de enfermeiro no Brasil. Cumpre assinalar que a inserção do enfermeiro no espaço da saúde e seu reconhecimento pela elite da sociedade brasileira decorreram do empenho competente das pioneiras da Escola de Enfermagem Anna Nery e de suas seguidoras, que se dedicaram sem limites ao propósito de construir a imagem de um profissional solidamente preparado, através do rigoroso ensino, bem como da institucionalização de rituais, de cujas muitas funções destacamos o seu efeito consagrador de transmitir ao público uma imagem homogeneamente respeitável do grupo de enfermeiros. Inicialmente, sublinhamos que o ritual, enquanto um conjunto de atos formalizados, expressivos e portadores de uma dimensão simbólica, utiliza como recurso um sistema de linguagens e comportamentos específicos, bem como objetos emblemáticos cujo sentido representa um bem simbólico do grupo. O ritual aqui concebido como ritual de consagração tem o efeito de consignação estatutária, porque demarca não apenas a passagem de um estado a outro, mas determina a incorporação de atitudes profissionais consoantes com as expectativas sociais ligadas à sua categoria. A eficácia simbólica dos rituais reside na possibilidade de proclamar a identidade da profissão1. Assim é que na abertura das Comemorações dos Setenta Anos de Inserção da Escola de Enfermagem Anna Nery na Universidade Federal do Rio de Janeiro, realizou-se o ritual alho, o qual de Inaugur ação da Sala V ilma de Car v alho inclui a modernização e atualização do Laboratório de Informática de Graduação (LIG - Graduação). Desse modo, a importância de evocar a importante personalidade da Enfermagem brasileira, na pessoa da Enfermeira e Professora Emérita da Universidade Federal do Rio de Janeiro, Doutora Vilma de Car valho, remete a possibilidade de conclamar os nossos queridos alunos e professores à incorporação de um habitus profissional conquistado mediante a incorporação de atitudes profissionais calcadas no conhecimento, na ética e no respeito profissional. Vale ressaltar que, desde a implantação da Enfermagem Moderna no Brasil, em 1922, mediante a criação da Escola de Enfermeiras do Departamento Nacional de Saúde Pública, a atual Escola de Enfermagem Anna Nery, os emblemas e rituais passaram a fazer parte do cotidiano das instituições de ensino de Enfermagem no Brasil, criadas nos anos seguintes, com poucas modificações durante cerca de cinqüenta anos. Esses rituais, de inspiração religiosa e militar, inicialmente adaptados de escolas americanas, eram usados como modo de incorporação e divulgação de um modelo de enfermeira para a sociedade brasileira. Os rituais institucionais têm também o poder de agir sobre o real, agindo sobre a representação desse real, porque sancionam a nova ordem social estabelecida, evidenciando o poder das autoridades que os instauram. Assim, uma infinidade de rituais e emblemas foi produzida pelas escolas de Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 138 - 42. 139 Enfermagem na produção de enfermeiras e enfermeiros, pois aquele que é instituído, por exemplo, em seguida à colação de grau, sente-se obrigado a estar de acordo com aquilo que dele se espera, à altura de sua função: atuar como um profissional com compromisso técnico e social. A importância dos rituais para a Enfermagem brasileira, ao longo de mais de oitenta anos, encontra-se na possibilidade de consagrar um modelo de enfermeiro para a sociedade brasileira, pois eles assumem a dupla função de atribuir e distinguir qualidades novas, conferindo ao grupo os meios para atuar sobre a realidade social. Nesse sentido, a Escola de Enfermagem Anna Nery demarca a implantação do Sistema Nightingale no Brasil e também é a primeira a ser integrada a uma universidade em 1937, a atual Universidade Federal do Rio de Janeiro, à época denominada Universidade do Brasil, a mais antiga do país. A conjunção de fatores e circunstâncias que caracterizou o início do século XX ensejou a reforma sanitária de 1920, condizente com os interesses de expansão do Estado. No âmbito dessa reforma, ocorreram a criação do Departamento Nacional de Saúde Pública (DNSP) e o convênio de Cooperação Técnica para o Desenvolvimento da Enfermagem no Brasil, que institucionalizou, no interior do aparelho de Estado, a moderna Enfermagem profissional. A implantação desse novo modelo de enfermagem ocorreu sob a égide da saúde pública, no âmbito dessa reforma sanitária liderada pelo insigne cientista e sanitarista Carlos Chagas, então diretor do Departamento Nacional de Saúde Pública. Ele ensejou a vinda de um grupo de enfermeiras norte-americanas, patrocinadas pela Fundação Rockfeller, integrantes de uma missão, à época denominada Missão de Cooperação Técnica para o Desenvolvimento da Enfermagem no Brasil, considerada necessária à efetivação da Reforma Sanitária em desenvolvimento. Essa missão permaneceu no Brasil durante uma década (1921-1931). A primeira demonstração de poder dessa Missão de enfermeiras foi a criação, em 1921, de um serviço de enfermeiras, na mesma linha hierárquica das demais inspetorias do Departamento Nacional de Saúde Pública. E a segunda foi a implantação da Escola de Enfermeiras do DNSP de acordo com os padrões de ensino norte-americanos, ainda que essa necessidade não fosse compartilhada por todos os sanitaristas no interior daquele Departamento que apenas desejavam resolver os problemas mais prementes de sua prática cotidiana, e nem pela sociedade em geral2. A Superintendente do Ser viço de Enfermeiras do Departamento Nacional de Saúde Pública, Ethel Parsons, tomou providências no sentido de organizar o Hospital Geral da Assistência, o atual Hospital Escola São Francisco de Assis, para que o mesmo servisse como campo de estágio para a Escola de Enfermeiras e para a Faculdade de Medicina, criando, assim, nexos entre a Escola e a Universidade do Brasil. A Universidade havia sido criada em 1920, composta pela Faculdade de Direito, Faculdade de Medicina e a Escola Politécnica. A concepção que se deriva desse paradigma resume-se na definição de Enfermagem como a ciência, arte e ideal de cuidar das pessoas que, segundo Florence Nightingale, marcava a 140 diferença entre a Medicina e a Enfermagem, denominando-a como Arte de Enfermagem, com o significado da mais bela das artes. Com esse modelo nascem duas idéias teóricas da profissão: uma que fundamenta os estudos e estrutura as maneiras de fortalecer nos indivíduos suas potencialidades, para que por sua própria força natural se opere a cura. E a outra idéia que contribui para o florescimento de um processo de emancipação da mulher e da Enfermagem-profissão, denominado modelo científico e moderno, que impõe o cumprimento de quatro princípios básicos no processo de ensinar a Enfermagem: caráter público, ou seja, de responsabilidade do Estado; respeito à especificidade, ou seja, de responsabilidade da enfermeira; prática da integração da escola aos serviços; e formação integral, exigindo a residência nos serviços onde as estudantes aprendiam e atuavam. Fazem parte do legado da Missão de Enfermeiras Norteamericanas os instrumentos legais que asseguraram a institucionalização do ensino e da prática da Enfermagem, pois, em 1931, ocorreu a regulamentação do exercício da Enfermagem no país e foram fixadas as condições para a equiparação das demais escolas de Enfermagem existentes, ou a serem criadas, sendo a Escola de Enfermagem Anna Nery considerada a escola oficial padrão, o que institucionalizou o padrão ananeri (PAN) de formação, um alicerce para a configuração da identidade da enfermeira brasileira. Neste mesmo ano também fora decretado o Estatuto das Universidades Brasileiras, segundo o qual o sistema universitário era preferível ao das escolas superiores isoladas. Na ocasião, foram incorporadas à Universidade do Rio de Janeiro as Faculdades de Farmácia e de Odontologia e, apesar de se haver cogitado a incorporação da Escola de Enfermeiras do DNSP, uma vez que havia o reconhecimento, através do 4º Considerando do Decreto 20.109, de que a mesma “atendia aos padrões técnicos encontrados em universidades de outros países”, o fato é que esta Escola permaneceu neste Departamento. Somente com o advento do Estado Novo, quando a Universidade foi reestruturada, passando a ser denominada Universidade do Brasil (1937), a Escola de Enfermeiras Anna Nery passou a integrar esta nova Universidade. Para tanto foi decisivo o entrosamento entre a Associação Nacional de Enfermeiras Diplomadas Brasileiras, presidida por Edith de Magalhães Fraenkel, e a Federação Brasileira para o Progresso Feminino, presidida por Bertha Lutz. Cumpre ainda mencionar que a luta histórica das enfermeiras brasileiras pela formação de uma comunidade científica de enfermagem e estruturação do seu campo científico correspondeu à luta simbólica de grupos de enfermeiras dotadas de capital científico que envidou esforços continuados desde a implantação da Enfermagem moderna no Brasil, em 1922, com base no sistema Nightingale, mediante a criação da Escola de Enfermeiras Anna Nery. Para fundamentar essa afirmação, lembramos que a criação desta Escola demarcou o advento do ensino e da prática da Enfermagem calcado em bases científicas,, sob a égide da saúde pública, no bojo da reforma sanitária liderada pelo sanitarista Carlos Chagas. Também é relevante assinalar que a configuração de um campo científico corresponde a uma realidade em movimento, cujas determinações são sociais e históricas. Setenta Anos de Vida Universitária da EEAN Tyrrell MAR et al O investimento das enfermeiras brasileiras no aprimoramento profissional mediante cursos de pós-graduação teve seu início já na década de 1920, quando cerca de dezessete enfermeiras diplomadas pela Escola de Enfermeiras do DNSP realizaram cursos de pós-graduação nos Estados Unidos, com bolsa de estudos da Fundação Rockfeller. Também nos anos de 1940 e 1950, o espectro das brasileiras em cursos de pósgraduação no exterior foi amplo. Uma manifestação emblemática da luta das enfermeiras pela estruturação e reconhecimento de seu campo científico faz-se representar pela criação, em 1932, da Revista Brasileira de Enfermagem, à época intitulada Annaes de Enfermagem, a qual representou o primeiro espaço no país, no qual as enfermeiras tornaram visível a divulgação de seus enunciados. Os Congressos Nacionais de Enfermagem (iniciados na década de 1940) foram os primeiros ambientes intelectuais utilizados pelas enfermeiras. Tanto a criação da Revista como os dois primeiros congressos ocorreram nas dependências da Escola de Enfermagem Anna Nery. Vale ressaltar que a criação da Revista Annaes de Enfermagem significou um evento significativo para o progresso da Enfermagem brasileira. Tal iniciativa constituiu indicador concreto de que a Enfermagem já havia acumulado, à época, um certo volume de experiências e reflexões sobre suas vivências, enunciadas por suas porta-vozes autorizadas e competentes para se manifestarem nos espaços públicos reconhecidos pelos meios científicos3. A Escola de Enfermagem Anna Nery por mais de 50 anos perpetuou uma tradição da Enfermagem: a de ser uma profissão eminentemente feminina. A sua primeira turma de enfermeiras (1923-1925) formou 13 enfermeiras de 27 alunas, e, até 1937, ano em que passou a fazer parte do sistema universitário de ensino, havia formado um total de 245 enfermeiras. A entrada de alunos do sexo masculino deu-se, de fato e de direito, no bojo da reforma universitária do final da década de 1960, tendo em 1974 dos 51 enfermeiras(os) formadas(os), 10 do sexo masculino. A Escola de Enfermagem Anna Nery, até o primeiro semestre de 2006, formou um total de 4.461 enfermeiros, sendo destes 4.208 mulheres e 254 homens. A Escola de Enfermagem Anna Nery promoveu, a partir de 1947, o primeiro curso denominado “post-graduado” para a formação de professores, planejado pela professora Olga Salinas Lacorte. A partir de 1948, o ensino de especialidades, como Obstetrícia e Saúde Pública, passou a ser ministrado com o nome de especialização. Outros cursos de pós-graduação foram instalados solenemente em 1959, na Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo. A pós-graduação no Brasil, instituída pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional de 1961, aprovada pelo Conselho Federal de Educação em 1965, surgiu no bojo de uma nova concepção política de promoção do desenvolvimento econômico do país, que trouxe a necessidade de uma política de formação de recursos humanos qualificados. Ao final da década de 1960, a universidade brasileira foi submetida a uma reforma administrativa, num contexto de repressão política: foi implantado um modelo inspirado no sistema americano de institutos centralizados, de organização departamental, bem como os cursos de pós-graduação stricto Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 138 - 42. 141 Setenta Anos de Vida Universitária da EEAN Tyrrell MAR et al sensu, estabelecendo os princípios de articulação obrigatória entre ensino e pesquisa e entre ensino superior e pós-graduação. Tais mudanças ensejaram a necessidade de implantar cursos de pós-graduação em Enfermagem stricto sensu, mediante a busca do equilíbrio entre a obtenção do capital cultural institucionalizado, que oficializa a competência técnico-científica, e o desenvolvimento da capacidade de crítica social cuja manifestação emblemática está evidenciada no XVI Congresso Brasileiro de Enfermagem realizado em Salvador, Bahia, em 1964, onde se discutiu pela primeira vez a temática “A pesquisa em Enfermagem”. O desenvolvimento da pesquisa científica obteve maior respaldo no Parecer nº 77/69, para o magistério superior, o qual incentivou principalmente os docentes a defenderem suas teses de Docência Livre e Doutorado, no final da década de 1960 e início da década de 1970, a fim de se habilitarem à titulação de doutores. Como exemplo de iniciativa primeira, temos a tese intitulada “A observação sistematizada na identificação dos problemas de enfermagem nos seus aspectos físicos”, defendida por Wanda de Aguiar Horta, em 1968, na Escola de Enfermagem Anna Nery da Universidade Federal do Rio de Janeiro. No que tange à Enfermagem, a pós-graduação stricto sensu teve início em 1972, com a criação do curso de Mestrado da Escola de Enfermagem Anna Nery. Nesta mesma década foram implantados mais sete cursos de mestrado: quatro na região sudeste, dois na região nordeste e um na região sul. O advento dos cursos de pós-graduação contribuiu para a constituição do habitus científico das enfermeiras, mediante a concentração dos esforços individuais no sentido de realizar uma atividade de pesquisa como requisito necessário à obtenção da titulação requerida, caracterizando, assim, o estreito vínculo entre a pós-graduação e o desenvolvimento da pesquisa em Enfermagem no Brasil. Na década de 1980, houve menor expansão dos cursos de mestrado em Enfermagem, criando-se apenas mais três cursos, todos na região sudeste. Em contrapartida, a Enfermagem científica no Brasil teve como ponto alto a implantação dos cursos de doutorado em Enfermagem a partir de 1981, mediante a conjugação de esforços das duas escolas de Enfermagem da Universidade de São Paulo (USP), a de São Paulo e a de Ribeirão Preto. O Curso de Doutorado em Enfermagem da Escola de Enfermagem Anna Nery, o terceiro do país, foi criado em 1989. Cumpre assinalar que a criação dos cursos de doutorado para a Enfermagem representou a aquisição do capital cultural no estado legitimado necessário à luta por um espaço no campo científico. Ademais, na década de 1990, a Escola de Enfermagem Anna Nery foi pioneira na criação do primeiro Pós-Doutorado em História da Enfermagem no Brasil. Além disso, a Escola de Enfermagem Anna Nery foi a primeira escola de Enfermagem a ser inserida no sistema universitário como unidade suplementar (Lei nº 452, de 05 de julho de 1937), sendo transformada em unidade suplementar de ensino superior da Universidade do Brasil, atual Universidade Federal do Rio de Janeiro, em 1945 (Lei nº 8.393, de 17 de dezembro de 1945). Ela é uma instituição de extraordinária vitalidade que vem persistindo durante mais de oito décadas. Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 138 - 42. A Escola de Enfermagem Anna Nery, além de seu papel de difusora de conhecimento, mediadora entre gerações antigas e gerações novas e de crítica da sociedade, vem formando profissionais capacitados e capazes de assumir posições na sociedade, com reflexos positivos para o desenvolvimento da profissão. Numa avaliação de desempenho acadêmico nos últimos cinco anos, por meio de avaliação qualitativa, a Escola de Enfermagem Anna Nery se apresenta no cenário nacional e internacional como se segue: a) filiada à Asociación Latinoamericana de Escuelas e Facultades de Enfermería (ALADEFE /UDUAL), 1997; b) vinculada à ABEn Nacional desde 2005; c) conceito 4 (MB) atribuído ao curso de graduação pelo MEC/INEP; d) conceito 4 atribuído ao Programa de Pós-graduação pela CAPES; e) Escola Anna Nery Revista de Enfermagem (Qualis Internacional “C”); f) Jornada Científica da UFRJ de 2005: dos 25 melhores trabalhos do CCS, 05 foram da Escola de Enfermagem Anna Nery; g) o corpo docente da pós-graduação conta com sete pesquisadores do CNPq, sendo todos consultores Ad-hoc da CAPES, CNPq e outros órgãos de fomento à pesquisa; g) a Escola de Enfermagem Anna Nery conta com 72 docentes do quadro permanente com dedicação exclusiva (apenas 02 docentes com carga horária semanal de 20 horas). Destes, 49 (68%) são doutores, 72 são mestres (100%) e 72 (100%) são especialistas, alguns deles com até cinco especializações. Atualmente, o corpo docente conta com um professor visitante da Escola de Enfermagem de Montreal/ Canadá e com 22 professores substitutos; h) o corpo discente do Curso de Graduação em Enfermagem e Obstetrícia está composto por 622 alunos; o corpo discente de pós-graduação stricto sensu totaliza 150 alunos; e o corpo discente de especialização conta com 250 alunos. A vaga no Curso de Graduação é conquistada através do exame Vestibular, sendo contempladas em Edital Público 140 vagas anuais (70 por semestre) e, para o Curso de Licenciatura, mais 40 vagas anuais (20 por semestre). CONSIDERAÇÕES FINAIS À guisa das considerações finais é pertinente relembrar que, na trajetória desta Escola, os rituais e emblemas instituídos e perpetuados até nossos dias têm, acima de tudo, o sentido de intercâmbio entre quem enuncia determinada mensagem e os acadêmicos eruditos, com sensíveis reflexos para a categoria em sua totalidade 4, pois os rituais, enquanto rituais de institucionalização, legitimam e consagram as conquistas da profissão, mediante a criação de representações mentais à respeito dessas conquistas, favorecendo a construção de uma imagem positiva da profissão. Para fundamentar essa assertiva, lembramos que as instituições formadoras de enfermeiros, na esteira da Escola de Enfermagem Anna Nery, também utilizaram rituais e emblemas para a construção de um modelo de enfermeiro para a sociedade. É pertinente ainda ressaltar que os rituais vêm contribuindo para a formação de uma identidade grupal, mediante a consagração pública de porta-vozes autorizadas da Enfermagem brasileira, como é o caso da Professora Doutora Vilma de Carvalho, homenageada na abertura das comemorações dos setenta anos de vida universitária da Escola de Enfermagem Anna Ney. 142 Setenta Anos de Vida Universitária da EEAN Tyrrell MAR et al Referências Sobre as Autoras 1. Bourdieu P. A economia das trocas lingüísticas O que falar quer dizer. 2ª ed. São Paulo (SP): Edusp; 1998. 2. Santos TCF, Barreira IE. O poder simbólico da enfermagem norteamericana no ensino da enfermagem na capital do Brasil (19281938). Rio de Janeiro (RJ): Ana Nery; 2002. 3. Oliveira ST. Santos TCF. Rachel Haddock Lobo: vida profissional e sua contribuição para a REBEn. Rev. Bras. Enferm 2002 jan/ fev; 55 (3): 264-168. 4. Santos TCF. Significado dos Emblemas e Rituais na formação da identidade da enfermeira brasileira: uma reflexão após oitenta anos. Esc Anna Nery R Enferm 2004 abr; 8 (1): 81-86. Maria Antonieta RRubio ubio Tyr r ell Diretora da Escola de Enfermagem Anna Nery / UFRJ. Tânia Cristina Franco Santos Professora Adjunta do Departamento de Enfermagem Fundamental e Pesquisadora do Núcleo de Pesquisa em História da Enfermagem Brasileira da Escola de Enfermagem Anna Nery/UFRJ. Recebido em 10/03/2007 Reapresentado em 25/03/2007 Aprovado em 27/03/2007 Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 138 - 42. 143 P otencial TTerapêutico erapêutico da FFenitoína enitoína na Cicatrização de R adiodermites Radiodermites Firmino F RELATO DE EXPERIÊNCIA EXPERIENCE REPORT - RELATO DE EXPERIENCIA POTENCIAL TERAPÊUTICO DA FENITOÍNA NA CICATRIZAÇÃO DE RADIODERMITES Therapeutical potential of the phenytoin in the cicatrisation of radiotherapy lesions Potencial terapéutico de la fenitoína en la cicatrización de radiodermitis Flavia Firmino Resumo A fenitoína é um anticonvulsivante cujo potencial cicatrizante norteou investigações clínicas em relação à alta incidência de hiperplasia gengival em pacientes epiléticos. O texto seguinte traz o relato de seu uso em lesão causada pela radioterapia empregada em um paciente portador de câncer de laringe. Obteve-se epitelização após cerca de 14 dias de aplicação tópica da solução endovenosa de fenitoína. Este resultado pode ser um dado relevante para o desenvolvimento de produtos e formas de cuidado no tratamento das radiodermites. Palavras-chave: Fenitoína. Difenilidantoína. Cicatrização de Feridas. Radioterapia. Abstract Resumen The phenytoin is an anticonvulsant whose high incidence of gingival hyperplasia in epileptic patient orientated clinical investigations of the healing potential of this drug. The following text brings the repor t of his use in lesion caused by radiotherapy used in a patient carrier of larynx cancer. Get epithelium was obtained after approximately 14 days of topical application of the phenytoin endovenous solution. This result can be a relevant die for the development of products and care forms in the treatment of the lesions in radiotherapy. La fenitoína es un anticonvulsivo cuya alta incidencia de hiperplasia gingival en pacientes epilépticos orientó investigaciones clínicas del potencial cicatrizante de esta droga. El siguiente texto trae el relato de su uso en lesión causada por radioterapia empleada en un paciente portador de cáncer de laringe. Se obtuvo epitelización después de aproximadamente 14 días de aplicación tópica de la solución endovenosa de fenitoína. Este resultado puede ser un dato relevante para el desarrollo de productos e formas de cuidado en el tratamiento das radiodermitis. Keyw or ds: Phenytoin. Diphenilidantoine. Wound Healing. ywor ords: Radiotherapy. Palabras clave: Fenitoína. Difenilhidantoina. Cicatrización de Heridas. Radioterapia. Esc Anna Nery R Enferm Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 2007 143 - mar; 9. 11 (1): 143 - 9. 144 P otencial TTerapêutico erapêutico da FFenitoína enitoína na Cicatrização de R adiodermites Radiodermites Firmino F INTRODUÇÃO A fenitoína tópica é uma droga anticonvulsivante sintetizada desde 1937 e amplamente utilizada em nosso meio para o controle e/ou prevenção de crises convulsivas em adultos e crianças. A partir de seu efeito colateral de hiperplasia gengival, uma possível capacidade cicatrizante passou a ser considerada por volta de 1945. Esta capacidade foi confirmada em 1958 através de pesquisas experimentais em seres humanos não epiléticos portadores de lesões gengivais1. Posteriormente suas propriedades cicatrizantes foram exploradas em estudos in vitro e em estudos clínicos que envolveram outros tipos de lesões em animais de laboratórios2. O uso tópico nas lesões em seres humanos passou a ocorrer a partir da década de 1990. Registra-se sua aplicação em feridas decorrentes das úlceras venosas; abscessos secundários à injeção intramuscular na região glútea; úlceras por pressão; feridas por arma de fogo; lesões decorrentes da hanseníase; úlceras do pé diabético; e queimaduras 2,3,4,5,6. A possível efetividade da ação cicatrizante da fenitoína surgiu como questionamento da práxis de assistir pacientes oncológicos com doença avançada, fora de possibilidades terapêuticas atuais (FPTA), em um ambulatório de curativos de uma instituição pública, a partir da indagação do Serviço de Farmácia daquela instituição. Neste cenário, a prática profissional de enfermagem consistia na execução de curativos em clientes portadores de feridas agudas traumáticas, cirúrgicas e crônicas. O potencial cicatrizante da fenitoína despertou especial interesse tendo em vista a ocorrência das feridas traumáticas, e deu-se início a uma pesquisa bibliográfica que fornecesse evidências desta atuação. As evidências encontradas guiaram o uso desta droga em uma lesão por radiodermite em um paciente portador de câncer de laringe ressecado e que à época era recém-admitido na instituição referida. Durante a consulta de enfermagem, ele apontou como principal desconforto físico a demora no processo de cicatrização de sua lesão localizada na região cervical à direita, de espessura superficial, com cerca de 5 cm de cumprimento e 3 cm de diâmetro em sua base mais alargada. METODOLOGIA A busca bibliográfica se deu empregando o termo “topical phenytoin” nas bases Medline, LILACS e PubMed. Na base Medline foram obtidas indicações de 56 artigos correspondentes aos períodos de 1966 a 1995 e 1996 a 2004. Após a leitura dos títulos e resumos disponíveis foram excluídos 25 artigos. Eles versavam sobre interação com fármacos e fitoterápicos; ação da fenitoína no controle da dor neuropática e outras síndromes dolorosas; controle e prevenção da epilepsia nas cirurgias para hemostasia de aneurisma subaracnóideo e estudos experimentais que exploravam a ação da fenitoína em outros cenários que não na cicatrização da pele, como, por exemplo, na espasticidade e injúria neuronal. Dentre os artigos excluídos constou, ainda, um artigo que versava sobre outros tratamentos tópicos para cicatrização de lesões de pele. Na releitura do título e resumos disponíveis das 31 indicações restantes, compostas por experimentos clínicos randomizados, estudos não randomizados, relato de experiências, e estudos comparativos controlados, foi possível traçar a seguinte categorização: A) artigos que abordaram a aplicação da fenitoína tópica nos seguintes tipos de lesões: úlceras por pressão: 4; úlceras venosas: 1; úlceras mistas (sem especificação no texto): 1; hansênicas: 4; queimaduras: 1; cavidades de abscesso: 1; úlceras do pé diabético: 2; epidermólise bolhosa: 2; B) artigos que versavam sobre uso tópico e sistêmico em afecções de pele: 1 (“lichen planus”); C) artigos que compararam a eficácia da fenitoína tópica dentre outros produtos cicatrizantes convencionais: 7, a saber: película de poliuretano (op-site): 1; mel: 1; sulfadiazina + clorexedine (produto americano denominado Silverex – indicado como cicatrizante): 1; iodo (solução à base de iodo, produto americano denominado EUSOL igualmente indicado como cicatrizante): 1; extrato placentário: 1; hidrocolóide: 1 e solução salina normal: 1. D) artigos que versaram sobre a absorção sistêmica da fenitoína tópica quando utilizada como cicatrizante em feridas: 1. E) ar tigos que apontavam experimentos in vitro que investigaram o potencial cicatrizante da fenitoína: 2. F) artigos que mencionaram a indicação da fenitoína como cicatrizante tópico: 4. A seguir as indicações foram separadas e computadas por décadas considerando a data da publicação: década de 1980: 2 artigos; década de 1990: 19 artigos; e no período de 2000 a 2004: 10 artigos. Na base PubMed foram indicadas 53 referências. Seguindo o mesmo critério utilizado para a base Medline, foram selecionadas 31 indicações. Na separação por década observouse que na década de 1990 foram publicados 14 artigos, e os demais (17) foram publicados no período de 2000 a 2004. Foi realizada comparação entre as indicações obtidas nas duas bases mencionadas a fim de eliminar duplicidades. Detectaramse 18 duplicidades e 13 indicações inéditas compostas predominantemente por estudos clínicos experimentais. Dessa forma, foi realizada outra categorização: artigos que versavam sobre os mecanismos indutores do crescimento do tecido gengival induzido pela fenitoína: 6; artigos versavam sobre os efeitos adversos da fenitoína para o tegumento e as doenças de pele: 2; artigos que versavam diretamente sobre a atuação da fenitoína na cicatrização de feridas utilizando ratos como modelos experimentais: 4; artigos que versaram sobre os benefícios do uso fenitoína por administração retal na cicatrização de anastomose do intestino de ratos: 1. Na base LILACS, constou somente indicação de um artigo, o qual versa sobre o uso da fenitoína tópica em úlceras por pressão; estudo comparativo, não randomizado, com grupocontrole, envolvendo 20 pacientes. O levantamento bibliográfico evidencia a ausência de artigos nacionais sobre a presente temática. Este fato foi um dos fatores limitantes da pesquisa, pois a aquisição dos artigos identificados dependia da importação do texto. Foram importados artigos que descreveram as pesquisas iniciais do potencial cicatrizante da fenitoína, bem como aqueles que Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 143 - 9. 145 P otencial TTerapêutico erapêutico da FFenitoína enitoína na Cicatrização de R adiodermites Radiodermites Firmino F poderiam fornecer as informações mais recentes sobre a razão desta atuação. Dois artigos selecionados para captação estão disponíveis somente no idioma chinês; desta forma, foram considerados os seus respectivos resumos em inglês fornecidos na base de dados. FENITOÍNA Também denominada difenilidantoína, ela pertence ao grupo dos hidantoinatos e, em uma escala cronológica de descoberta das drogas anticonvulsivantes, é a terceira droga, antecedendo o sal de brometo, introduzido pelo pesquisador Locock em 1857, e o fenobarbital, desenvolvido pela empresa farmacêutica alemã Bayer em 1912. Foi descoberta em 1937 pelo farmacêutico Putnam quando ele testava hidantoinatos procurando um modelo que especificamente tivesse propriedades anticonvulsivantes sem os efeitos sedativos do fenobarbital. Constitui a primeira indicação no controle das crises convulsivas, assim como a carbamazepina, descoberta na década de 19607. Atua aumentando o tempo de inativação dos canais de sódio dos neurônios com hiperpolarização. Desta forma, ela se liga aos picos negativos dos canais de sódio. Seus efeitos colaterais são: hiperplasia gengival, hisurtismo e toxicidade relativa à dose; pequenos aumentos na dose geram grandes aumentos na taxa plasmática da droga. Situações passíveis de toxicidade incluem hipoalbuminemia, insuficiência renal crônica e disfunção hepática, podendo ocorrer manifestações na pele como rash cutâneo e desencadeamento da síndrome de StevensJohnson. Foram reportados efeitos teratogênicos após ingestão diária de 100 a 800 mg no primeiro trimestre da gravidez. Efeitos carcinogênicos são questionados, mas não foram comprovados em seres humanos8. É sintetizada pela via do citocromo P450 e eliminada na urina. Daí decorre sua interação com diversos medicamentos. Ainda pode desencadear a síndrome da hipersensibilidade (que tem incidência de 1 em 1.000 a 1 em 10.000 exposições à droga). Isto se dá pela produção do metabólito óxido de areno, também presente no fenobarbital e na carbamazepina. Nesta situação pode ocorrer rash cutâneo, síndrome de StevensJohnson e, inclusive, necrose epidérmica. A dose habitual para o adulto é de 300 mg/dia e para a criança, 5 mg/kg/ dia. Tem sido indicada como droga antiar rítmica, miorrelaxante esquelético e inibidora da secreção/síntese de colagenase; para tratamento da enxaqueca; controle da dor neuropática e outras síndromes dolorosas como a neuralgia do trigêmio. A toxicidade passa a ser considerada a partir da concentração de 20 mg/mL no plasma 9. Dentro do quadro de toxicidade são apontadas as seguintes manifestações clínicas: depressão da condução cardíaca, fibrilação ventricular e parada cardíaca em pacientes tratados com fenitoína intravenosa nas arritmias cardíacas; nistagmo, ataxia, disartria, tremor em repouso; confusão e desorientação na intoxicação grave; hepatite; hiper ou hipoglicemia; redução da concentração da tiroxina; leucocitose com linfócitos atípicos, leucopenia e agranulocitose, deficiência de folato e anemia megaloblásticas7,8,9. Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 143 - 9. Radiodermites Geralmente se define a radiodermite como uma lesão de pele conseqüente ao emprego da radioterapia. A radiodermite não é considerada uma lesão propriamente dita, mas uma reação da pele à radioterapia semelhante a uma queimadura superficial, onde podem estar presentes, ou não, áreas de ulceração10. Tratase de lesões potencialmente dolorosas que, na dependência da área envolvida, pode limitar os movimentos do corpo. A radioterapia é um método tradicional no tratamento oncológico. Pode estar associada ao tratamento cirúrgico e/ou quimioterápico. A radiação destrói células neoplásicas, mas, infelizmente, afeta células sadias adjacentes, e as estruturas intranucleares e os tecidos com maior capacidade de renovação celular são os mais afetados. O material intranuclear é essencial à reprodução e manutenção da estabilidade da célula. Desta forma, a cada sessão de radioterapia, as células do campo a ser irradiado sofrem uma nova agressão que provoca perda cumulativa da capacidade de proliferação celular. Este mecanismo de absorção e tolerância das células sadias pela radiação acaba por limitar a dose radioativa do tratamento. Em pacientes portadores de câncer da cabeça e do pescoço, as doses de radiação empregadas podem chegar a 7.000 centiGrays (cCy). Nesta população outros efeitos secundários à radioterapia podem ser: xerostomia, cáries, mucosite, osteorradionecrose, disfagia, perda ou alteração do paladar11. A partir de 1982 foi proposta uma classificação de estadiamento das radiodermites, considerando as alterações teciduais características10 conforme se descreve a seguir: Estágio I: Inflamação – eritema da região; a pele pode variar da tonalidade rosa a vermelho-brilhante. Pode ocorrer um leve edema. Estágio II: Descamação (com secura da pele) – eritema, além de uma aparência seca devida às lesões nas glândulas sebáceas no campo de tratamento. Pode haver irritação da pele ou uma leve sensação de queimadura. Estágio III: Descamação (com umidade da pele) – eritema, edema e bolhas. Estágio IV: Epilação, fibrose e atrofia – perda permanente de peles no local e danos às glândulas sebáceas e/ou sudoríparas. Isso pode provocar efeitos colaterais posteriores, como dano à drenagem linfática ou telangiectasia. Para o tratamento destas lesões não existe consenso. As intervenções estão baseadas na extensão do dano quanto ao acometimento das estruturas da pele e assentamento de protocolos institucionais, infelizmente nem sempre presentes nas instituições que fornecem o tratamento radioterápico. As lesões no estágio I geralmente são tratadas como queimadura de sol, aplicando-se produtos emolientes simples que não contenham metal, como, por exemplo, zinco; aquelas de estágio II também podem se beneficiar dos produtos emolientes e de soluções à base de hidrocortisona ou outros produtos de capacidade antiinflamatória. Soluções à base de 146 P otencial TTerapêutico erapêutico da FFenitoína enitoína na Cicatrização de R adiodermites Radiodermites Firmino F calêndula também podem apresentar resultados benéficos. No estágio III pode-se considerar uso de filmes poliuretanos e/ou curativos hidrocolóides, seguindo o princípio de tratamentos modernos de outras feridas. Nas lesões de estágio IV aplica-se o mesmo critério10 . Fundamentação científica O processo de cicatrização da pele envolve uma série de eventos biológicos, que se inicia com hemostasia e inflamação onde ocorrem caracteristicamente: aumento da permeabilidade vascular; quimiotaxia das células para dentro do meio ambiente da ferida; liberação de citocinas, incluindo interleucina 1 e 2, plaquetas, fatores de crescimento; e ativação de células migrantes. Em uma segunda fase, ocorre, caracteristicamente, a proliferação de fibroblastos, miofibroblastos e células endoteliais. Estas últimas desencadeiam a formação de novos capilares pelo processo de angiogenese. Na terceira e última fase, ocorrem maturação e remodelagem do tecido formado. A principal característica desta fase é a deposição do colágeno na ferida onde a velocidade e a qualidade da deposição na matriz celular vai determinar a resistência da cicatriz10,12. Os fatores que afetam o processo de cicatrização são: a idade, a imobilidade, o estado nutricional, as doenças associadas e o uso de medicamentos contínuos, principalmente as drogas imunossupressoras. No entanto, há impor tantes fatores locais a serem considerados: a localização anatômica da ferida, a presença de infecção, tecido desvitalizado e/ou necrótico, entre outros10. O câncer é um importante fator sistêmico que afeta o processo de cicatrização, por tratar-se de uma doença catabólica de conseqüente impacto desfavorável sobre o estado nutricional do paciente oncológico. Os tratamentos clássicos de quimioterapia e radioterapia constituem fator de interferência negativa adicional, pois ambos interferem no material nuclear da célula e, conseqüentemente, na síntese de proteínas e de divisão celular. Isto afeta diretamente a síntese de fibroblastos e produção de colágeno. Destaca-se que a radiação pode afetar a cicatrização de uma ferida já existente ou provocar mudanças na pele de forma que se torne lento qualquer processo de cicatrização10,11. Esta realidade justifica a demanda da atuação da enfermeira no tratamento da radiodermite e cicatrização de outras lesões de pele que o paciente sob tratamento radioterápico venha apresentar, além dos cuidados de prevenção, O mecanismo postulado para a ação cicatrizante da fenitoína tópica é de que ela estimula os fibroblastos na síntese de colágeno; facilita a deposição de colágeno; remodela a matriz extracelular; inibe a ação da colagenase e exerce atividade antibacteriana e, ainda, pode controlar o processo de morte celular (apoptose). A capacidade de ativar mediadores do processo de inflamação e a formação e reorganização da neovascularização, importantes na fase inicial do processo de cicatrização, também foram citadas nos estudos compulsados2,3,4,5. No entanto não há um mecanismo estabelecido. Exemplificando este fato, podemos citar estudos in vitro com fibroblastos da derme humana envolvendo conceitos e técnicas da engenharia genética, onde se concluiu que a fenitoína tópica não leva à proliferação celular propriamente dita, mas atua acelerando a atividade autócrina e parócrina dos fatores de crescimento por movimentos de regulação dos receptores envolvidos13. O efeito da fenitoína sobre a ferida causada por irradiação foi objeto dos estudos de médicos pesquisadores do Third Military Medical University, do Depar tment of Radiation Medicine. Foram verificados o efeito da irradiação nos macrófagos e a ação da fenitoína em uma ferida causada por irradiação em comparação com uma ferida normal. Foram coletados macrófagos da ferida e implantados na incisão feita no dorso de ratos que receberam irradiação. O número de macrófagos, função fagocitária, a liberação do fator de necrose tumoral, interleucina 1 liberada pelos macrófagos e a força tênsil das feridas foram investigados. Os animais irradiados receberam irradiação sistêmica (6 Gy) e local (20 Gy)14. Os autores descrevem como resultados que a força tênsil diminuiu após 6 Gy de irradiação sistêmica e 20 Cy de irradiação local, e a fenitoína melhorou a força tênsil na ferida normal e na ferida causada por irradiação. Após 6 Cy de irradiação sistêmica a função fagocitária dos macrófagos da ferida, a liberação de fator de necrose tumoral alfa e interleucina 1, bem como o numero de macrófagos na ferida, foram significativamente diminuídos nos dias 3, 5, e 8 após o ferimento. Nos ratos que receberam 20 Cy de irradiação local, a proporção de macrófagos na ferida foi significativamente diminuída nos dias 3, 5, 8 e 13 após o ferimento, mas a função dos macrófagos não foi significativamente diminuída. A fenitoína aumentou significativamente o número de macrófagos na ferida; melhorou a função fagocitária dos macrófagos; aumentou a liberação de fator de necrose tumoral alfa e de interleucina 1 da ferida, nos dias 3, 5, e 8 após o ferimento a despeito dos ratos irradiados ou não. Os autores concluíram que a diminuição do número e da função dos macrófagos na ferida tem importante papel na capacidade da irradiação tornar lento o processo de cicatrização das feridas. A fenitoína acelerou a cicatrização da ferida normal e da ferida prejudicada pela irradiação pelo aumento do número de macrófagos e por melhorar a função dos macrófagos já presentes na ferida. No entanto, o resumo não expõe como a fenitoína foi utilizada neste estudo. Em outro estudo, conduzido no Department of Clinical Pharmacology, do General Hospital of Guangzhou Military Área, os mesmos pesquisadores estudaram a influência da irradiação e da fenitoína tópicaa sobre a proliferação dos fibroblastos e da síntese do colágeno. Foram utilizados ratos de laboratórios (Wistar), machos, divididos em dois grupos: irradiados e nãoradiados. Cada um deles foi subdividido em grupo tratado com fenitoína e grupo-controle. Foi feita uma ferida incisional de 7 cm, longitudinal, no dorso de cada rato, onde uma esponja de polivinil com álcool (PVAS) do tamanho de 1 cm x 4 cm foi implantada dentro da ferida, e a ferida foi suturada. Antes da implantação, a esponja foi imersa em uma solução de fenitoína (10mg/mL) ou solução salina normal (grupo-controle). De cada ferida, o substrato e células fibroblastos foram coletados e Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 143 - 9. P otencial TTerapêutico erapêutico da FFenitoína enitoína na Cicatrização de R adiodermites Radiodermites Firmino F avaliados quanto à sua proliferação e síntese de colágeno após irradiação de corpo total com 6 Cy15. Os autores mencionaram como resultados que a proliferação de fibroblastos e a síntese de colágeno foram estimuladas do dia 5 ao dia 8 após o ferimento e que a irradiação de 6 Cy de corpo total diminuiu este efeito. Notaram que a fenitoína aumentou a atividade modulatória dos fibroblastos, a despeito de serem animais irradiados ou não. Concluíram que a irradiação do corpo total resultou em mudanças das condições locais da ferida, trazendo malefícios para o reparo tecidual. Porém, a fenitoína pode estimular a proliferação dos fibroblastos e síntese do colágeno, o que pode ser benéfico para a cicatrização da ferida. A avaliação da cicatrização pela fenitoína tópica foi investigada, também, através de um estudo clínico experimental, controlado, utilizando grupo de 20 pacientes portadores de cavidades por abscesso e tratados com fenitoína tópica, em comparação com grupo-controle de 20 pacientes onde foi aplicado tratamento convencional à base de solução salina. A taxa média de redução da área da ferida foi de 2,02 cm 2/dia no grupo da fenitoína em comparação com 1,58 cm2/dia do grupo-controle no dia 10; e 1,8 cm2/dia do grupo de fenitoína em comparação com 1,19 cm2/dia do grupo-controle no dia 20. A média de redução do volume de ambos no dia 10 e 20 foi de 0,48 cm3/dia para o grupo fenitoína versus 0,2 cm3/dia para o grupo-controle. No dia 20, 17 dos pacientes tratados com fenitoína foram considerados completamente cicatrizados, comparados com somente um caso de cicatrização do grupo-controle 4. Outro estudo clínico experimental controlado, não randomizado, verificou o potencial de cicatrização da fenitoína tópica em 20 pacientes portadores de úlceras venosas. Em um grupo de 10 pacientes, foi aplicada fenitoína tópica (comprimidos macerados aplicados sobre a lesão). O grupo-controle recebeu somente limpeza prévia com água e sabão e oclusão do curativo. Os autores relataram que, ao final do tratamento, 40% dos pacientes do grupo tratado com fenitoína respondeu à aplicação desta droga como agente indutor de cicatrização com desenvolvimento do tecido de granulação e reconstituição do epitélio, diminuindo a solução de continuidade da pele, ao passo que nenhum paciente do gr upo-controle manifestou algum grau de aumento no processo de cicatrização. Concluíram que a aplicação da fenitoína tópica é um recurso farmacológico para a cicatrização das úlceras venosas, pois favorece a diminuição do tempo de cicatrização e custos do tratamento3. Autores que realizaram revisão dos principais estudos que verificaram as propriedades cicatrizantes na fenitoína nos diversos tipos de feridas citados anteriormente apontam as seguintes formas de aplicação da fenitoína tópica: a) comprimido macerado e salpicado diretamente sobre a lesão; b) 100 mg de solução (2 mL) endovenosa diluída em 5 m de soro fisiológico; creme na concentração de 2% ou 5% (preparado por manipulação farmacológica com base Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 143 - 9. 147 hidrofílica) 5,6. No Brasil, pesquisas experimentais com o objetivo de avaliar a eficácia do gel de fenitoína na concentração de 0,1% em feridas no dorso de ratos diabéticos desnutridos estão sendo conduzidas 16. A TÉCNICA DE CURATIVO IMPLEMENTADA E RESULTADOS OBTIDOS A consulta de enfermagem no ambulatório de curativos consistia em examinar o paciente com ferida e como os cuidados adequados podem ser planejados e avaliados dentro da complexidade que o cuidado holístico direcionado ao binômio paciente-família contempla, considerando a aptidão auto-cuidado. À entrevista inicial, o paciente enfatizou sua preocupação e desconforto físico ocasionado pela demora no processo de cicatrização de uma lesão superficial situada na região cervical à D. Tratava-se de uma radiodermite de estágio III, de pequena extensão (cerca de 5 cm de cumprimento e 3 cm de diâmetro em sua base mais alargada). No entanto, a mesma localizavase sobre área de dobra e tensão e interferia na mobilidade da cabeça, limitando seus movimentos. Referia dor de pouca intensidade. Estava apto ao autocuidado, mas era acompanhado por um profissional técnico de enfermagem que pertencia ao serviço da rede básica de saúde do município onde residia. Realizava curativos duas vezes ao dia utilizando solução salina para limpeza e ácidos graxos essenciais (AGE) como produto cicatrizante, ocluindo, a seguir, com gaze e micropore. Já havia concluído seu tratamento radioterápico. Encontravase com perda ponderal continua indicando déficit nutricional. O AGE é um produto com ação cicatrizante amplamente utilizado em feridas das mais diversas naturezas. Tem indicação de uso em feridas que requeiram tecido de granulação. Na radiodermite do paciente em questão, sua lesão já tinha tecido de granulação constituído, havendo necessidade de ocorrer a reepitelização para diminuição da lesão de continuidade da pele. A partir das evidências descritas anteriormente, a fenitoína tópica serviu de base para a proposta de uma nova intervenção para indução da reepitelização da derme exposta. Foram planejadas realização do curativo com gaze embebida em 1 mL da solução endovenosa diluída em 5 mL de SF 0,9%. Nessa proporção, a concentração da fenitoína foi de 10 mg/mL. Manteve-se a periodicidade da troca 2x/dia no intervalo determinado de 12/12 h. Tínhamos a preocupação com riscos da manipulação da droga e a segurança do profissional cuidador. No entanto, nenhum artigo descreveu o uso de luvas ou máscara cirúrgica para tal finalidade. Porém o cuidador foi orientado ao uso destes equipamentos de proteção individual durante a manipulação da droga, após consentir a realização da pesquisa. Após 14 dias de uso desta intervenção, o paciente compareceu para nova consulta com o leito da lesão reepitelizado; ele havia deixado de realizar os curativos no dia anterior à consulta. Decorreu-se, então, 13 dias para consumação do processo de reepitelização. Este espaço de tempo está de acordo com aquele preconizado na literatura6. 148 P otencial TTerapêutico erapêutico da FFenitoína enitoína na Cicatrização de R adiodermites Radiodermites Firmino F DISCUSSÃO CONCLUSÃO A dose da fenitoína escolhida para a inter venção proposta está 50% inferior às doses de fenitoína demonstradas na literatura em relação à aplicação em feridas como as úlceras por pressão grau II6. Para o emprego de tal dose considerou-se o volume pequeno da área danificada pela irradiação e o cuidado em não causar danos à pele ao redor da lesão. Supõe-se que o pH da fenitoína tópica seja alto (cerca de 12), o que pode causar danos na pele adjacente à ferida, uma vez que o pH da pele normal é em torno de 4,5 ou 5. Daí decorre a indicação do uso da fenitoína manipulada na forma de creme por par te de alguns estudiosos 5,6. Na intervenção descrita, não foram relatados, e nem detectados à inspeção, danos na pele adjacente. Destaca-se que um ponto de conflito do uso da fenitoína tópica é a sua absorção sistêmica. Em pacientes portadores de extensas úlceras venosas, nos quais comprimidos de fenitoína foram macerados e aplicados durante o tempo médio de três meses, o maior nível sérico detectado foi de 4,3 mg/mL. Este resultado está abaixo dos índices terapêuticos da droga no plasma de pacientes que se utilizam cronicamente dela para controle das crises convulsivas 5 . Em relação ao uso da fenitoína tópica na cicatrização de radiodermites, não constou registro na literatura compulsada tal como constou para as úlceras venosas, por pressão, pé diabético, dentre outras. No entanto, a radiodermite grau III esboça ferimento similar à úlcera por pressão grau II e queimaduras, e, nestas, a fenitoína tópica foi utilizada com bons resultados 5,6,10 . Estas infor mações constituíram critérios decisivos para a transferência dos resultados das pesquisas para a implementação da prática assistencial no paciente em pauta, além do consentimento infor mado e outros critérios trazidos pelas evidências aqui contempladas. A revisão bibliográfica reforça a fenitoína como agente tópico cicatrizante, com capacidade de ação descoberta a partir de investigações sobre o seu principal efeito colateral, ou seja, a hiperplasia gengival. Estudos in vitro e em animais de laboratórios realizados nas duas últimas décadas sugerem que esta ação parece estar atrelada à interação da fenitoína sobre os fibroblastos, à síntese e remodelação do colágeno e à liberação e maximização dos efeitos dos fatores de crescimento celular. No entanto, um mecanismo definitivo não está estabelecido. A partir da década de 1990 pesquisas foram conduzidas explorando o potencial desta droga em lesões teciduais nos seres humanos, incluindo aquelas por úlceras por pressão, úlceras hansênicas, venosas, e as do pé diabético, em estudos controlados e comparativos. A indicação da aplicação da fenitoína tópica na concentração de creme de 2% a 4% nas lesões já consta como indicação em periódico farmacológico de circulação expressiva. Entretanto, esta pesquisa não identificou estudos clínicos onde a aplicação deste creme fosse explanada. A realização de pesquisas experimentais nesta temática está crescendo no âmbito internacional. Os chineses têm desenvolvido trabalhos promissores; no entanto, estão no idioma chinês com poucas informações disponibilizadas nos resumos em inglês. Este foi um fator limitante importante nesta pesquisa. Ainda que a fenitoína apresente resultados relevantes nos estudos compulsados, trata-se de uma droga de uso controlado, e, à luz dos produtos modernos de cicatrização, tem-se uma gama de variedades mais elegíveis para a prática assistencial. Ocorre que este fato não inviabiliza a condução de pesquisas com metodologias rigorosas que venham a explorar este temática em nosso meio. Trata-se de mais um desafio para a enfermeira quando se considera que a Enfermagem, como ciência holística, gera interações com questões complexas e relevantes, que requerem um pluralismo de paradigma e métodos, com a finalidade maior de diminuir o efeito da doença sobre a vida do indivíduo. Referências 1. Shapiro MDDS. Acceleration of gingival wound healing in nonepileptic patients receiving diphenylhydantoin sodium. Exp. Med. Surg 1958 Sep; 7 (3): 41-53. 2. Simpson GM, Kunz E, Slafta J. Use sodium diphenylhydantoin in treatment of leg ulcers. New York State J Medicine 1965 Apr; 1 (1): 886-88. 3. 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Recebido em 21/01/2006 Reapresentado em 17/07/2006 Aprovado em 01/09/2006 Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 143 - 9. 150 Programa Viva a Vida: Capacitação de Agentes Comunitários para a Saúde Mental Loyola C et al THE LIVING LIFE PROGRAM – STRATEGY FOR TRAINING OF COMMUNITY HEALTH AGENTS AS SOCIAL EDUCATORS TO GIVE COMMUNITY ATTENTION IN MENTAL HEALTH O Programa Viva a Vida – estratégia de capacitação de agentes comunitários de saúde como educadores sociais capazes de prestar atenção comunitária em saúde mental El Programa Viva la Vida – estrategia para entrenamiento de agentes comunitarios de salud como educadores sociales capaces de prestar atención comunitaria en salud mental Cristina Loyola Sebastião Rocha Abstract The Living Life Program which established in the state of Maranhão - Brazil 2001-2003, had three key areas: the excluded as clients, the training of the professionals involved as action strategy, and ethics which was orientated on the premise that every human being is born to be free, healthy, educated and happy as guidelines. Through the mental health training program, it was intended that the community health agents should gain the required knowledge to do three tasks: to identify suffering people mental problems, acknowledge this suffering in the patient’s home and thirdly, to send the patient for specialist care in the region when necessary. This should be done to avoid non-therapeutic interventions, such as that often provided by the police. The comprehension that Program studies pertinent questions relating to mental health, is necessary to consider what human resources are required, so as to redirect the model for providing care, remembering that success can only be achieved in psychiatric care if at every point of care there is acceptance, treatment and social inclusion. Keyw or ds ywor ords ds:: Public Health. Mental Health. Primary Attention to Health. Resumo Resumen O Programa Viva a Vida, desenvolvido no estado do Maranhão no período 2001-2003, trabalhou com três interfaces: com os excluídos como clientela, com o treinamento sofisticado dos profissionais envolvidos como estratégia de ação e com uma ética orientada pela premissa de que todo humano nasce para ser livre, saudável, educado e feliz como guia. Após o treinamento de dez mil agentes comunitários de saúde esperamos que eles sejam capazes de identificar pessoas em sofrimento psíquico, fazer o acolhimento deste indivíduo no próprio domicílio, em primeira instância, e quando não for possível, encaminhá-lo para atendimento especializado na região, evitando o envolvimento de instâncias não terapêuticas como a polícia . O entendimento que norteou o Programa foi o de que para estudar as questões pertinentes à saúde mental temos que definir que recursos humanos necessitamos para redirecionar o modelo assistencial. E reafirmar que para garantir o cuidado em saúde mental temos que ter acolhimento, tratamento e inclusão social. El Programa Viva la Vida, desarrollado en el estado del Maranhão en lo período 2001 hasta 2003, ha trabajado con tres interfaces: con los excluidos como clientela, con el entrenamiento sofisticado de los profesionales envueltos como estrategia de acción y con una ética orientada por la premisa de que todo ser humano nace para ser libre, saludable, educado y feliz. Después del entrenamiento de diez mil agentes comunitarios de salud esperamos que ellos sean capaces de identificar personas en sufrimiento psíquico, acoger a este individuo en su domicilio, en primera instancia, y cuando no es posible, encaminarla a la atención especializada en la región, evitando el envolvimiento de instancias no-terapéuticas, como la policía. El entendimiento que norteó el Programa fué de que para estudiar las cuestiones pertinentes a la salud mental tenemos que definir qué recursos humanos necesitamos para alterar el modelo asistencial. Y recordar que para garantizar el cuidado en salud mental tenemos que tener acogimiento, tratamiento e inclusión social. Palavras-chave Palavras-chave:: Saúde Pública. Saúde Mental. Atenção Primária à Saúde. Palabras clave: Salud Publica. Salud Mental. Atención Primaria a la Salud. Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 150 - 4. Programa Viva a Vida: Capacitação de Agentes Comunitários para a Saúde Mental Loyola C et al INTRODUCTION It is necessary to take acquaintance at certain key milestones in Brazil’s Mental Health initiative: At the 1987 Mental Health Conference in Brazil, the approach was the take care based in publics and privates psychiatric hospitals described as expensive, incompetent, and violator of the basic human rights1. In 1989, Representative Paulo Delgadoa criticized the barriers that prevented changes in the government regulation about the care, highlighting the negative impact this was having on the actions of the more proactive cities and states. In 1992, the model of hospital care provision was changed so as to be founded upon citizen’s rights. This was accompanied by reinforcement of the need to structure care provision around municipalities. And above all, local social control was seen as the strategic way forward. As result it was created the Center for Psychosocial Assistance (CAPS) and other points of clear treatment. Inspections, audits, and licensing of hospitals were introduced from the Center. However the core of the problem, which was the redirection of the model for care provision and a change in the lunatic asylum culture, which produced institutional rules, not as an optional activity but as the fundamental focus of all concerned. Thus, there were great challenges to be addressed: How do not produce more mental illness? How to protect individuals from institutionalized madness, the kind of institutional disease that kills slowly the human being undergoing rigid roles of health professionals and hard system of health? In front of professionals there is the daily reality of psychiatric hospitals in Brazil, so different from that aimed for. How to change long established practices in hospitals, and exhausting institutional regulations? To attempt to change psychiatric hospitals demands such a large investment that it almost outweighs the benefits. There are emotional, financial and human costs to transform poor personal relationships into professional ones. Changes need relationships that are based on the needs of the individual, that are ethical and which focus on the patient’s well-being. Is it possible to create professionals different to those currently found in hospitals, professionals who actually care? In 1995 ten proposals2 were written for the new millennium. The authors would highlight the first and last of these. The first was to “Develop backwards”, that was to bring ever larger masses of the under developed population to the first stages of progress; and the last was to “reduce the distance, which grows each day, between those who know a lot and those who know a little”. There seems to be agreement about what is essential, but maybe we disagree strongly on the details, which is where issues really get resolved. In order to debate mental health, culture and society have to be examined, and people’s quality of life expectations are to be faced. Aspirations of each and every one should be understood. In addition, some knowledge of the past trends and problems can help the management of the future. Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 150 - 4. 151 THE LIVING LIFE PROGRAM AND THE FAMILY HEALTH PROGRAM Talking about Maranhão State implies thinking of rhythms, sounds, colors, festivals, theater and dances that pulsates across diverse regions within a State. The diverse traditions reflect the ethnic mix of Maranhão – Native Brazilian, African, and Portuguese. The program LIVING LIFE (Viva a Vida)3, which is now discussed, is all about living together. Living together is the philosophy behind the program LIVING LIFE (Viva a Vida), an interstate and interinstitutional agreement signed in April of 2001, between the State Government of Maranhão and the Psychiatry Institute of Federal University of Rio de Janeiro. The utopian objective for this century is to give voice, power, dignity, and citizenship to these individuals. The program’s target was population with mental ill, leprosy sufferers, and those excluded from school - all diverse groups considered of as having high social fragility. It is an alliance of work, which requires a range of services and resources. Moreover, the more diverse and undefined the suffering is, the more diverse and undefined is the technology to be used. The technology may be diverse, but the objective must be clear; the principal humanistic idea of this project is that a person has the right to receive interventions based on his/her abilities and not on his/her difficulties. Another idea behind the LIVING LIFE (Viva a Vida) project is to instruct as much as possible those involved in health care. The Family Health Program (PSF) is a critical factor in forming what will be the Brazil’s Mental Health Care System in the near future. It is considered by those that run the Unified Health System (SUS) as the strategy for reorganizing primary care in the country, and of the whole care model. The PSF should be seen in Brazil as bringing the ideal of “health for all”4. The program aims to gradually deliver technical competence, structure, and direction to primary health care. Therefore a possible vision of health care in Brazil must consider the diverse strands of strategy in service organization centered on the family health. It is a health care system that is trying to project a bridge between tradition and progress3. It notes that the process of modernization must accept the need for continuity between the wisdom of tradition and the boldness of the new. This program works on the social inclusion and citizen building of three important groups; those suffering from leprosy, the mentally ill, and those excluded from schools. The reason they can be seen as one group, is not their pains, a micro bacteria, or unfair educational policies. They are united by their daily experience of social exclusion, and by the pain of living with prejudice. These groups represent one side of the work, and demand a highly qualified professional team. It is a reference to those professionals that make up the teams of the Family Health Program, and with large numbers of Community Health Agents. Community Health Agents today count more than one hundred forty thousand (140.000) participants, taking care of around 82 million people in four thousand five hundred (4.500) municipalities. They represent the main drive of health care in Brazil. At this moment, it’s important to comment that throughout the last 10 years, the program has operated in so distant 152 Programa Viva a Vida: Capacitação de Agentes Comunitários para a Saúde Mental Loyola C et al places that not everyone wants to visit, and few would want to live. It overcame the initial criticism of “poor medicine for the poor”. However the implementation of Community Health Agents (ASC) was not to replace the health professionals with a cheap and unqualified workforce. Their entry into local health services, is due to the gaps left by the professionals who didn’t value the presence of the community in their own locations and as co-responsible of professionals and communities. This desire to work with professionals with different background and training, more human in their method of caring for people, has caused difficulties at teaching institutions, both at higher level. The reasons for this were the urgent need to overcome the way in which professional training of health professionals in Brazil was under taken. Problems emerged because of the disassociation between the teaching of sciences (Anatomy, Physiology, Histology, and other) in the first years and the clinical disciplines taught later in the professional cycle. There was too much focus on the individual, to the detriment of the community, on cure rather than prevention, on working under stable situations rather the more common disorder. The reality facing health services is one where policies are not integrated, leading to low success rates, with uncoordinated, centralized and above all fragile and non-existent social control. The learning process of the Community Health Agents (ASC) shouldn’t just result in acquiring basic health care skills and that is widely known. It must also involve the understanding of man in his social context, as a means to tackling the health/ illness process and its determinants. In this way, the Community Health Agent (ASC) is a promoter of health by excellence, a permanent educator in defense of life. It is important not to create false separations along the processes of birth, life and death. Community’s participation in public policy as a strategy to improve quality of life should be encouraged. As well as the mission to improve the capacity of the community to look after its health and strengthen the integration between the community and the local health services, the biggest role of the Community Health Agent (ASC) is to have the ability to read, listen and translate population needs to public authorities. This must be done for each person, family, and community. When the Community Health Agent Program (PASC/1991) was designed, it was agreed that a Community Health Agent (ASC) should be someone who is totally identified with his/her own community. They should have the same values, customs and language. And their leadership abilities should reflect in improving health conditions for the community, helped by government action. The activities of the Community Health Agent (ASC) need to have, as basic support, a process of selfeducation. This process needs to be practical and should unify the community. It should lead to individuals and community groups engaging in the identification of their problems and needs. At the same time, the activities should direct make possible resources to respond to the identified needs, understanding their problems, valuing their potential. This is all done in the hope that communities will develop themselves in an integrated and sustainable manner. Teamwork and co-operation, form the pathway to community education/action and one should not forget that community education is a community task. On the other hand, a community is not an abstract entity, but it exists within a concrete reality, with its own knowledge, and can itself recognize the potential of partnerships. This means getting to know the families and communities, not as a place with people to be supervised, but as an educational process – learning through teaching. The idea is to secure the whole team’s par ticipation in the collective work process; to value professionals at all levels; to respect the characteristics and limits of each person; to discuss and resolve problems in an active and integrated manner; to demystify the absolute power of those in charge. Above all, the program seeks to recover the dignity of the local health services and to gain the respect of the population. These were extremely important premises for working out the methods of the local health professionals in these towns. The community education was done with the active participation of the Community Health Agents (ASC) and the nurses – the instructors and supervisors of PASC (Program of Community Health Agents). The Program LIVING LIFE (Viva a Vida) established in the state of Maranhão, Brazil since 2001, worked in three areas: the excluded, the training of involved professionals, and ethics. This was orientated on the premise that every human being is born to be free, healthy, educated and happy5. Many times using its own methods, the Program have constructed and deconstructed views and truths about mental health care. It was fundamental to establish a certain difference in relation to other processes which also seek to develop proposals, and the consequent definition of indicators of quality, but which arise from different values and perspectives and therefore come to conclusions very different to those taken as guidelines for the Living Life Program. Some values appeared, explicitly or implicitly, in the health proposal in which we believed in, and we can group them didactically into ethical values (happiness, health, hope, selfesteem, brotherhood, faithfulness, politeness, loyalty, tolerance, and justice), political values (autonomy, persistence, knowledge, and greed), and esthetic values (sensitivity, creativity, beauty, harmony, and simplicity). They express a social project that recognizes the centrality of the individual whose needs and rights are the focus of this program. The State of Maranhão has approximately ten thousand (10.000) Community Health Agents (ASC) who under take a very important public role. These agents, who strictly reside in the community in which they work, identify and record the population in their area, prioritizing needs and requirements, carrying out activities for the promotion of health for the individual and the community, encouraging society’s participation in public policies aimed at improving people’s quality of life. With a precious knowledge of local culture, the daily work of the Community Health Agents (ASC) is structured around regular home visits to monitor the health of families. It is from the health-illness continuum of the subject, within his culture and community, that the Community Health Agents can propose Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 150 - 4. Programa Viva a Vida: Capacitação de Agentes Comunitários para a Saúde Mental Loyola C et al health actions for both emergency and chronic cases. This work shows the difference, and the advantage, of out patient consulting. During the 24 months of this work, we have been able to count on the excellence of the Popular Center of Culture and Development (CPCD), a non-governmental organization and our partner in this project, in the stimulating and difficult task of training people, a challenge even greater when one is trying to instruct educators. We have trained more than eight thousand (8000) members of the teams from the Family Health Program as social educators, emphasizing the training of the health educators as proactive creators of opportunities, protagonists, and not as masters of knowledge. We are focusing our efforts on the health/education interface, the best way to impact primary health care. Our Community Health Agents have to be, above all else, educators. The general objective is that they create a position as social educators of children, teenagers and adults, and act as agents for the development of health in the community, contributing to turn each municipality into a community of permanent learning. This implies the breaking and changing of old conceptions, beliefs, and a discussion of a new social role from the perspective of integrated health for individuals and the community. We must also reduce the loss of experts from Family Health Program (PSF), improve work satisfaction, and the diligence of the experts, and create meetings with proactive suggestions. The proposal is to add to the dialogue a mediator between the participants, to value and respect the individual differences, knowledge and actions of each. There needs to be a collective search for educational solutions for all the issues being experienced by the participants. In this way it is possible to secure the involvement, the participation and project ownership by the target communities; the training and creation of educators at the front line, committed to the construction of new knowledge and new methods of collective health. In summary, what one gains is community participation, not as the objective, but as an educational health process, enabling the program to take root and consolidate itself. Once created, the ASC receive training in mental health in their own municipalities, in tandem with the opening of Psychosocial Care Centers (CAPS) in the regions. While training ten thousand (10000) of Community Health Agents (ASC) as mental health care givers, it became clear that these simple municipalities can be considered rural environments. For better or worse, the simple and generous ordinary inhabitants are distant from what psychiatry has created and produced in its model of hospital internship. A different solution is needed in this situation. Not exactly new asylum, but a further work on community support to deal with mental disease outside the hospital. Community Health Agents had to be trained to act as support for simple care issues. Home visit is able to deal with 60% of mental health problems1. The less complex social net organization is, such as a rural environment, the more empowered community health agent is. Moderate depression, some neurosis type, although allow social functioning need health mental care. Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 150 - 4. 153 CONCLUSION So what is needed in Maranhão? Two kinds of problems require two different strategies. The so-called “lunatics asylums” are really terrible and exist, at least, three of them there. To try and reorganize them demands a cost that almost overweighs the benefits. Emotional costs, enormous financial and human resources caused by poor relationships which do not deliver the best for the patient. To avoid this, new psychiatric hospitals6 must learn with this program. They take too much of our time and it’s no longer possible to wait another decade before change something at their lives. About inpatients, doesn’t seem to have any doubt to me. A census and analysis of the profile of inpatients must be done. It is urgent to establish what is necessary to help the patients face the challenge of life (for example, what is citizenship without the knowledge of read and write?). In relation to the primary health care, the staff of the Family Health Program (PSF) should carry it out, about one thousand (10.000) Community Health Agents (CHA), that are in Maranhão, must be available now. Through the mental health training, the expectation of the Community Health Agents is to get knowledge to do three things: Remember that they are dealing with primary care, where the ASC look after about 100 families and visit the houses of these families, attended to: firstly, identify people that suffers of mental problems7, people who are at risk and in severe emotional state, in crisis or close to it, in order to include them in the care program; secondly, acknowledge this suffering in the patient’s home, show that the ASC is there to help and care about the person, to clarify issues about the illness to family members, by visiting the house and avoiding non-therapeutic interventions, such as done by the police; thirdly, know when to send the patient for special care in the region, such as to a Center for Psychosocial Care (CAPS), avoiding send patients to the network of Asylums in the State Capital. Incorrect perceptions of life crisis, and the presence of stressful factors without the appropriate social support can lead to the poor functioning of society, which may or may not lead to mental illness. Many inappropriate solutions to the problem derive from a lack of understanding, a poor perception of correct control over one’s own life, or from strategies of conflict and of low selfesteem. Capabilities of individuals and groups must be raised, which means improving problem resolutions skills, interpersonal skills, stress tolerance, motivation, hope, selfesteem, and power8. Recently an experience in Laranjal do Jari, in the heart of the Amazon forest, with 50 females who were carers of the Forest, was carried out. It was a special day where mental health should be discussed. Using a life time-line as work methodology, a “woman’s head” had been created. First individually, then collectively and finally politically. These 50 women had more than 360 children, and so were very fertile. The largest risks to mental health were in the areas of child labor, denial of access to school, loss of mother at childbirth, separation from the family for the purposes of survival. Male domination by the father, step father or brother-in-law, sexual 154 Programa Viva a Vida: Capacitação de Agentes Comunitários para a Saúde Mental Loyola C et al abuse and physical violence, the consumption of alcohol as a clear cause of violence on the wife, premature birth, and the lack of information about contraceptives. How propose a policy to create social support for these risk situations were discussed9. Proposals included: raising the number of places at schools (Programs like “Sementinha” – Little Seed - and “Ser Criança”Been Child); scholarships for schools; the creation of a group of mothers to support babies who lost their mothers; groups of educators about contraceptive methods; a center to discuss issues involving female reproduction; a supply of herbs and teas (to facilitate the development of a culture of using medicine); A.A. groups. A therapeutic program, in which nothing from CID-10 or DSM IV had been used, was created10. For better or worse, the country side in Brazil is not at the same level as what Psychiatry has produced in hospitals in these last years. There is other method taking place there and other strategies against this crisis. We want every human being to be healthy, educated, free and happy, and to have in themselves readiness to care and to be cared for. Work with Community Health Agents in Family Health Program is to agree that mental health care is a task that has to begin, and end at the community. It is over there that we will find in the daily life, challenge, problem and solution. For us as example, the words of the great Brazilian psychoanalyst Costa11: It is up to us, to produce the necessary enjoyment for revolutionary passion, capable of giving back to other human being, his moral dignity. References 1. Delgado PG. O SUS e a Lei 10216: reforma psiquiátrica e inclusão social. In: Loyola C, Macedo PRA, organizadores. Saúde mental e qualidade de vida. Rio de Janeiro (RJ): CUCA/IPUB; 2001. 2. Saramago J. Cadernos de Lanzarote. Rio de Janeiro (RJ): Companhia das Letras;1995. 3. Loyola C. Viver a vida: identidade cultural, contexto social e qualidade de vida no estado do Maranhão. In: Loyola C, Macedo PRA, organizadores. Saúde mental e qualidade de vida. Rio de Janeiro (RJ): CUCA/IPUB; 2002. 4. Souza MF. Agentes comunitários de saúde: choque de povo. São Paulo (SP): Hucitec; 2001. 5. Rocha T. A rede em roda. In: Prefeitura Municipal de Belo Horizonte. Associação Municipal de Educadores Populares. Projeto Tudo Haver. Belo Horizonte (MG)); 2000. 6. Figueiredo AC, Cavalcanti MTM, organizadoras. A reforma psiquiátrica e os desafios da desinstitucionalização. Rio de Janeiro (RJ): CUCA/ IPUB; 2001. 7. Silva MCF, Furegato ARF, Costa Junior ML. Depressão: pontos de vista e conhecimento de enfermeiros da rede básica de saúde. Rev Latino-Am Enfermagem 2003 jan/fev; 11(1): 7-13. 8. Friedrich DBC, Sena RR. Um novo olhar sobre o cuidado no trabalho da enfermeira em unidades básicas de saúde em Juiz de Fora-MG. Rev Latino-Am Enfermagem 2002 nov/dez; 10(6): 772-79. 9. Loyola C, Rocha T. Fazendo história. In: Loyola C, Rocha T, organizadores. O caminho das pérolas: novas formas de cuidar em saúde. São Luís (MA): UNIGRAF; 2002. 10. Loyola C, Oliveira RMP. Devagar que temos pressa: a enfermagem e o campo da saúde mental. In: Venâncio AT, Cavalcanti MT, organizadoras. Saúde mental: campo, saberes e discursos. Rio de Janeiro (RJ): CUCA/IPUB; 2001. 11. Costa J. Sem fraude nem favor. Rio de Janeiro (RJ): Rocco; 1998. About the authors Cristina Loyola Coordinator of the Living Life Program in the Maranhão State, 2001-2002. Head Professor of the Anna Nery School of Nursing/ UFRJ. CNPq researcher. Sebastião Rocha Partner in the Living Life Program in the Maranhão State, 20012002. Anthropologist and Popular Educator. President of the Popular Culture and Development Center. Recebido em 10/10/2006 Reapresentado em 21/12/2006 Aprovado em 15/01/2007 Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 150 - 4. 155 P ráticas Educativas em Grupo com TTecnologia ecnologia Sócio -Educativa Teixeira E PRÁTICAS EDUCATIVAS EM GRUPO COM UMA TECNOLOGIA SÓCIO-EDUCATIVA: VIVÊNCIAS NA ILHA DE CARATATEUA, BELÉM Educational practices in group with a partner-educational technology: Existences in the Caratateua Island, Belém - Brazil Prácticas educativas en el grupo con una tecnología socio-educativa: Viviencias en la Isla de Caratateua, Belém - Brasil Elizabeth Teixeira Resumo O objetivo deste relato de experiência é socializar uma vivência em um projeto de extensão (Projeto Quartas Saudáveis), apoiado pela Universidade do Estado do Pará, desenvolvido no espaço do Instituto Saber Ser Amazônia Ribeirinha, com práticas educativas em grupo e com uma tecnologia sócio-educativa numa perspectiva freireana, com mulheres da ilha de Caratateua, Belém, PA, e apontar a necessidade de os (as) enfermeiros (as) ousarem na prática educativa, descobrindo as riquezas dos trabalhos com grupos em que se desenvolvem e/ou se aplicam tecnologias leves para produzir saúde. Destacam-se alguns pressupostos que orientam o projeto, a vivência da equipe com a Dinâmica Entre Nós, uma tecnologia sócio-educativa em construção, bem como reflexões sobre a vivência a partir de algumas falas das participantes. Pala vr as-c ha alavr vras-c as-cha havve: Enfermagem. Prática de Grupo. Educação em Saúde. Abstract Resumen The objective of this experience report is to socialize an existence in an extension project (Project Healthy Wednesdays), supported by the University of the State of Pará (Brazil), developed in the Amazonian Riverside Known Being Institute, with educational practices in group and with a social and educational technology in a Freire’s perspective with the women of the Caratateua Island, Belém - Pará Brazil, and to show the necessities of the nurses to dare in the educational practical, discovering the wealthy of the group work where is developed and/or is applied light technologies to produce health. Are stand out some presupposed that guide the project, the existence of the team with the Dynamics Among Us, a social-educational technology in construction, as well as reflections about the existence starting from some speeches of the participants. El objetivo de este informe de experiencia es socializar una vivencia en un proyecto de extensión (Proyecto Miércoles Saludables), apoyándose en la Universidad del Estado de Pará (Brasil), desarrollado en el espacio del Instituto Saber Ser Amazónica Ribera, con prácticas educativas en grupo y con una tecnología socio-educativa en una perspectiva de Freire con mujeres de la Isla de Caratateua, Belém, Pará, Brasil y apuntar la necesidad de los (as) enfermeros (as) en la práctica educativa, descubriendo las riquezas de los trabajos con grupos en que se desarrollan y/o se aplican tecnologías leves para producir salud. Destacase algunos presupuestos que guían el proyecto, la vivencia del equipo con la Dinámica Entre Nosotros, una tecnología socioeducativa en construcción, así como las reflexiones sobre la vivencia desde algunos discursos de las participantes. Keywords: Nursing. Group Practice. Health Education. Palabras clave: Enfermería. Práctica de Grupo. Educación en Salud. Esc Anna Nery R Enferm Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 2007 155 - mar; 9. 11 (1): 155 - 9. 156 INTRODUÇÃO Nos dias atuais, em que as certezas se esvaem, tudo se move e se desloca, e em que nada é certo, procuramos por grupos as quais pertencer, para nos apoiar. As “comunidadescabide” emergem, nesse contexto, pois com as vulnerabilidades das identidades individuais, busca-se pendurar seus medos e ansiedades individualmente experimentados e, depois disso, realizar os ritos de exorcismo em companhia de outros indivíduos também assustados e ansiosos1:21 Nenhum conjunto ou agregado de indivíduos será uma comunidade se não for tecido de histórias de vida/biografias compartilhadas; esse tecido é constituído de fios intersubjetivos ou juízos subjetivos embora o fato de que eles sejam tecidos juntos empreste a esses juízos um toque de objetividade1:62. Dentre os modelos de comunidade, destaca-se a comunidade estética e a ética. Na primeira, os laços são mais provisórios e frouxos, descartáveis e pouco duradouros. Na segunda, assumese compromisso de longo prazo, apontando segurança, proteção e certeza, um verdadeiro compartilhamento fraterno. Nesse sentido, tem uma durabilidade prevista (e às vezes institucionalmente garantida). O tipo de entendimento em que a comunidade se pauta é o ponto de partida de toda união, é um sentimento recíproco e vinculante [...], é graças a esse entendimento que na comunidade as pessoas permanecem essencialmente unidas a despeito de todos os fatores que as separam 1:15-6. Tal pertencimento, além de favorecer o viver no seu sentido mais amplo, também é mediador de processos de aprendizagem. Para aprender um saber, o indivíduo precisa fazer parte, estar entre, com e em uma comunidade-aprendente: a unidade da aprendizagem não é cada pessoa tomada individualmente. Ela é cada equipe, cada grupo-dialogante no momento em que algum conhecimento é vivido como uma experiência ativa de ensino-aprendizagem2:100. O outro / outra influi, colabora e participa do aprender, o verdadeiro “outro (a) coletivo”, interativo, social e cultural. Todos, assim, vão aprendendo conhecimentos, ampliando compreensões e alargando sentimentos. Considerando o atual contexto que suscita o viver / conviver em comunidade, práticas educativas em grupo, bem como tecnologias sócio-educativas (aqui representando as tecnologias leves), emergem como possibilidades para intensificar tais processos e fornecer subsídios para educarcuidar para a autonomia e a emancipação. Este relato tem como objetivos: socializar uma vivência em um projeto de extensão, Projeto Quartas Saudáveis (PQS), desenvolvido com práticas educativas em grupo e com uma tecnologia sócio-educativa com mulheres da ilha de Caratateua, Belém/PA, e apontar a necessidade de os (as) enfermeiros (as) ousarem na prática educativa, descobrindo as riquezas dos trabalhos com grupos em que se desenvolvem e/ou se aplicam tecnologias leves para produzir saúde. UM OLHAR ATENTO PARA ALGUNS PRESSUPOSTOS A literatura sobre os grupos aponta algumas questões interessantes para introduzir o debate. Destaca-se a natureza P ráticas Educativas em Grupo com TTecnologia ecnologia Sócio -Educativa Teixeira E gregária do homem para iniciar qualquer discussão sobre a relevância dos estudos e práticas em/um grupo; situa-se o surgimento na Grécia antiga; ressalta-se o papel social que desempenham; sinaliza-se uma polissemia conceitual, mas, na prática, os grupos têm existido à revelia da carência de uma maior precisão conceitual3. Numa primeira fase, os grupos passaram a ser utilizados com finalidades estritamente terapêuticas. Numa segunda, sob influência dos trabalhos de Kurt Lewin, na década de 30 (século XX), passaram a se voltar para o contexto educacional, o que aqui nos interessa debater. A diversidade de possibilidades é hoje notória e é nesse sentido que as atividades grupais vêm sendo inseridas no trabalho da área da saúde. Na nossa experiência, optamos por desenvolver em/com um grupo de mulheres mudanças de comportamentos cuidativos no que tange a saúde e o ambiente, com ênfase na ressignificação das práticas vividas e saberes produzidos num continuum movimento em tor no de conhecimentos e relacionamentos. Apostamos na produção de travessias de saberes e redes de afeto exatamente para operar as mudanças de comportamentos cuidativos. Para a mudança acontecer é preciso ocorrer aprendizagem significativa, que possibilita a aquisição de conhecimentos e informações. O aprender em/com um grupo é um movimento permanente que depende da convivência e da aderência de seus membros bem como da consistência e da fluência de seus mediadores/coordenadores. A nosso ver, os grupos emergem como verdadeiras estratégias para produzir o cuidar em saúde. Destaca-se que a formação de grupos sociais em saúde é uma forma de trabalho vivo em ato com dimensões tecnológicas e, portanto, uma das estratégias para produzir saúde [...] os pequenos grupos de convergência são como um método de desenvolvimento de tecnologias na enfermagem4:26. Constatamos, nesse sentido, que as práticas e atividades em grupo são cada vez mais constantes no cotidiano da enfermagem, mas muitas vezes as mesmas são desenvolvidas de forma “automática”. Nesse sentido, é válido enfatizar que existem condições e aspectos estruturais de funcionamento que precisam ser “bem pensados” para que as atividades desenvolvidas no grupo obtenham êxito. É necessário, para esse bom andamento e progresso das atividades grupais, conhecer e ouvir cada um que compõe o grupo, pois a partir de suas necessidades poderemos avaliar não só as dificuldades, mas achar sua verdadeira identidade e potencialidade. Nesse âmbito, perceber o grupo em sua totalidade ajuda a traçar seus verdadeiros objetivos. Sobre a Enfermagem e os grupos, identificam-se algumas razões que levam os profissionais de enfermagem ao trabalho grupal como a procura de uma alternativa para atender pessoas, opondo-se principalmente a um cuidado tradicional que privilegia o aspecto curativo e o atendimento das necessidades e/ou circunstâncias de alguns serviços, como ambulatórios e centros de saúde. No grupo de convivência, compartilham-se saberes e afetos bem como experiências e vivências que levam à profunda reflexão . Esse tipo de grupo tem como objetivos formar uma rede de suporte social; buscar autonomia de seus integrantes; Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 155 - 9. 157 P ráticas Educativas em Grupo com TTecnologia ecnologia Sócio -Educativa Teixeira E ampliar a criatividade; tornar oportuna a livre expressão dos participantes sobre suas emoções e seus conhecimentos5:106. Podemos dizer que todos os grupos têm, ao mesmo tempo, um jeito de ser próprio (uma singularidade) e um pertencimento social pelo qual se fazem similares a outros grupos6:95. Há que se considerar a dialética do grupo, pois nele convergem duas dinâmicas, uma interna e outra externa, que ao mesmo tempo os tornam singulares e plurais, e tais dinâmicas possuem um caráter diversificado que precisa ser respeitado. A modalidade sócio-educativa objetiva aumentar o nível de reflexão e conscientização das participantes. Nesse tipo de grupo, as novas informações, o questionamento de mitos e preconceitos, a possibilidade de tirar dúvidas representam elementos importantes na mudança das representações que as pessoas fazem das problemáticas de saúde / doença6: 112. Com base nesse primeiro pressuposto, acreditamos que práticas educativas em grupo precisam ser estimuladas e/ou fortalecidas para a manutenção e/ou promoção da saúde e da qualidade de vida. Em busca de outros pressupostos para subsidiar nosso trabalho, passamos a refletir sobre a concepção de trabalho em saúde e suas tecnologias. Considera-se o trabalho uma atividade que tem como essência alterar o estado natural dos materiais existentes no meio ambiente para serem melhor utilizados. O homem, através do seu trabalho, relaciona-se com outros homens e é transformado por essas relações sociais e por outras determinações que ocorrem nesse processo7. Afirma-se que, no trabalho em saúde, o produto final não se restringe a uma mercadoria, mas ao atendimento às necessidades do homem, as quais não são naturais, mas histórica e socialmente determinadas. O trabalho em saúde, nessa perspectiva, produz atos de saúde que têm a capacidade de intervir em diversas problemáticas, modificando-as e produzindo como resultado satisfação de uma necessidade/ direito do usuário. Nesse processo, ocorre efetivamente produção de saúde. Esse trabalho é centrado no trabalho vivo em ato e não pode ser capturado na lógica do trabalho morto, expresso somente nos equipamentos/máquinas (tecnologia dura) e nos saberes estruturados (tecnologia leve-dura), pois no campo das intervenções assistenciais há abordagem assistencial de um trabalhador de saúde junto a um usuário/ cidadão, em um processo de relações, que envolve tecnologia de relações (tecnologia leve), de encontros de subjetividades, de produção de vínculo, autonomização (aqui definida como a capacidade do indivíduo de governar o modo de conduzir a sua própria vida) e acolhimento7:40. A terminologia “tecnologias leves” 8 refere-se a um tipo de tecnologia que se torna relevante na medida em que se discute a necessidade de construir um outro modelo de atenção em saúde que explore positivamente a capacidade cuidadora do conjunto de trabalhadores de saúde para a defesa da vida. Nesse sentido, as tecnologias leves aproximam-se de atitudes relacionais intersubjetivas de acolhimento, escuta, estabelecimento e articulação de redes de conversas, vínculos, saberes e afetos. Só um modelo assistencial que produza modalidades tecnológicas de assistência, na base do sistema Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 155 - 9. de saúde, comandadas pelo universo das tecnologias leves e que tenham abrangência individual e coletiva, é que pode responder a esta situação, e isto implica em uma decisão política clara, pelos gestores do setor saúde, em investir na qualificação clínica das redes básicas de serviços, ao mesmo tempo em que se aposte na produção de intervenções sobre os fatores de riscos coletivos de adoecer. Só assim é possível construir um modelo assistencial com mais qualidade e mais barato, que respeite os direitos dos cidadãos na saúde, e que tenha a abrangência das ações individuais e coletivas8:13. As tecnologias leves configuram-se como dispositivos para educar-cuidar em saúde na medida em que são tecnologias contra-hegemônicas, ou seja, em vez de ser centradas em procedimentos, são centradas em relacionamentos. Ao não priorizar as ferramentas-máquinas, permite potencializar as abordagens-dinâmicas, em que os sujeitos se encontram, atuam entre si e operam um jogo de expectativas e produções em alguns momentos: momentos de falas, escutas e interpretações, nos quais há a produção de uma acolhida das intenções que estas pessoas colocam neste encontro; momentos de cumplicidades, nos quais há a produção de uma responsabilização em torno do problema que vai ser enfrentado; momentos de confiabilidade e esperança, nos quais se produzem relações de vínculo e aceitação. Com base nesse segundo pressuposto, acreditamos que programas educativos em grupo podem ser estimulados e/ou fortalecidos por tecnologias leves para a manutenção e/ou promoção da saúde e da qualidade de vida. UMA VIVÊNCIA EM GRUPO COM UMA TECNOLOGIA SÓCIO-EDUCATIVA Desde 2003 a autora coordena e realiza, com uma equipe multidisciplinar (acadêmicos e profissionais de enfermagem e pedagogia), práticas educativas em saúde e ambiente com/ entre um grupo de mulheres (cerca de 50), participantes de um Projeto de Extensão (PQS), da Universidade do Estado do Pará (UEPA), desenvolvido no espaço de uma ONG localizada na Ilha de Caratateua, em Belém, PA. Para for talecer a caminhada, a equipe se aproximou e vem se apropriando dos pressupostos destacados anteriormente para subsidiar o processo de (re) pensar o cuidar-educar na perspectiva da educação popular em saúde9, com vistas à produção da saúde. Buscar a ressignificação de tais pressupostos para torná-los visíveis foi o nosso primeiro objetivo. Para dar conta dos temas geradores demandados pelo grupo de mulheres e atender os pressupostos escolhidos pela equipe para nortear o PQS, fomos desenvolvendo, no percurso (2003/2006), uma tecnologia sócio-educativa que passamos a denominar “Dinâmica Entre Nós”. Fomos tecendo, com os fios teóricos adotados, uma tecnologia de cuidado educativo singular, organizada em quatro momentos de ação, integrados e relacionados entre si, que foram sendo aprimorados nos múltiplos encontros em grupo. O específico da discussão de grupo são as opiniões e os valores expressos pelos participantes que são de “inegável importância para se tratar das questões da saúde sob o ângulo social” 10:129. 158 P ráticas Educativas em Grupo com TTecnologia ecnologia Sócio -Educativa Teixeira E Não partimos de um modelo para a prática, mas exatamente do contrário. Ao longo do processo, fomos criando um conjunto de atividades que convergiam em uma mesma seqüência de passos, para possibilitar a interação e o diálogo entre as mulheres e nós; para viabilizar diferentes vivências educativas com os temas geradores entre as mulheres e nós; para facilitar a expressão das experiências cotidianas relacionadas com o cuidado e autocuidado entre as mulheres e nós; enfim, para favorecer e fortalecer os vínculos e afetos entre as mulheres e nós. A Dinâmica Entre Nós, ainda em construção e validação pela equipe do PQS, vem favorecendo o diálogo na perspectiva freireana, pois se aproxima do sentido dos círculos de cultura 11 que promovem e possibilitam o que entendemos por travessias de saberes com e entre afetos. A tecnologia está pautada em quatro momentos: MOMENTO DE APREENSÃO (M1): Quando EM GRUPO apresentam-se questões para discussão formuladas pelo próprio grupo ou equipe. MOMENTO DE EXPRESSÃO (2): Quando O GRUPO expõe o que apreendeu da discussão inicial sobre o tema. MOMENTO DE APRECIAÇÃO (3): Quando NO GRUPO emerge o debate mediado pelo facilitador. MOMENTO DE RECONSTRUÇÃO (4): Quando ENTRE NÓS compõe-se uma síntese, mesmo que provisória, sobre o tema em discussão. A tecnologia vem sendo usada nos encontros em grupo, e os temas tratados são relacionados tanto à saúde como ao ambiente. A equipe construiu um instrumento, denominado Ata do PQS, para registrar os momentos, dando ênfase às unidades de fala das participantes. transformam e recriam tudo o que envolve a realidade da vida . Podemos afirmar que existimos em função das trocas que produzimos em cada encontro educativo, em cada celebração, em cada entre nós. O ofício de educador (a) numa perspectiva freireana viabiliza sentimentos mútuos, emoções e acolhimento. Amamos e nos amamos reciprocamente em cada encontro, em cada Quarta Saudável. Esse “amor coletivo” nos envolve com e entre saberes, prazeres, dizeres, interações significativas que geram confiança e produzem vínculos. [...] A confiança, nesse sentido, é fundamental para um casulo protetor que monta guarda em torno do eu em suas relações com a realidade cotidiana1:127. Para Humberto Maturana a relação fundadora da experiência interativa é o amor. É preciso sentir uma troca amorosa para, efetivamente, suportar conviver. Viver à margem do amor não é ruim, é insuportável 1:131. Destaca-se o permanente inacabamento do ser, que se descobre aprendente e fica feliz por isso. Nós, juntos, em grupo, estamos intertrocando saberes e afetos, sensibilidades e significados, sensações e sociabilidades. Mutuamente nos ensinamos e aprendemos. Há sempre presente nas práticas educativas do PQS, uma dimensão de ser ensinante que se destaca como condição para uma outra de ser aprendente. E é com diálogo que esse continuum se dá plenamente. Reforça-se a idéia de “círculos de diálogos” a cada encontro, para pensar o saber enquanto fluido e fluxo de um movimento circular e dialógico; [...] estamos destinados a aprender a saber como uma atividade perene ao longo da vida, dentro e fora das estruturas e dos cenários da educação formal 1:45. Nesse sentido, o saber não tem lugar fixo, ator principal e/ou língua oficial, mas sim é um entre - lugar, entre e com todos, e que se traduz entre e com múltiplos signos e símbolos. Parte-se da compreensão de que os trabalhos em grupo favorecem travessias de saberes com e entre afetos e as tecnologias sócio-educativas numa perspectiva Freireana são meios que possibilitam produzir saberes e saúde. Acredita-se que as práticas educativas pautadas nos pressupostos aqui destacados poderão propiciar ganhos cognitivos e vínculos afetivos entre educadores de saúde e usuários. REFLEXÕES SOBRE A VIVÊNCIA: VOZES DOS SUJEITOS E NOSSO SENTIR Em 2005 e 2006 passamos a analisar os registros e declarações das participantes do PQS. Algumas dessas declarações apontam que a experiência em grupo com a tecnologia sócioeducativa Dinâmica Entre Nós, contribui tanto para o processo de aprender como o de conviver, tanto para dimensões cognitivas como afetivas, como podemos constatar a seguir: Ensinam bem explicado, é totalmente diferente. As explicações, as dinâmicas, brincadeiras, porque elas usam a linguagem de gente. O que facilita são as perguntas, é legal essa troca de perguntas. Tem apostilas, o conjunto faz a gente pensar mais rápido, o pessoal explicando, a gente entende melhor, trabalhar em grupo é muito bom, as figuras mostrando a realidade, depoimentos, sempre há uma resposta clara. Aquele calor humano, a acolhida que vocês têm com a gente faz a gente se sentir bem, a gente pergunta até entender, porque a gente não tem que sair de lá com dúvida (M10). No registro em destaque, manifesta-se o círculo de cultura que permite o diálogo eu-tu, a existência no grupo e o aprender com/entre nós. Com efeito, a existência se dá quando o que existe está situado dentro , entre e em algum tipo de relacionamento com. A Teia da Existência se constitui nas, entre as e através das relações de troca que a cada momento estabelecem, 2:21 CONSIDERAÇÕES FINAIS Os grupos são dispositivos de mudança, ou seja, instrumentos que possibilitam aos seus par ticipantes mudanças de idéias e práticas. Não podemos deixar de crer que tais mudanças trazem um impacto na cultura local e têm um papel multiplicador/irradiador no contexto mais global. Essa dialética entre a dinâmica interna e externa é que torna o grupo uma estratégia para produzir saúde. Assim, é preciso todos os tipos de tecnologias (duras, leveduras, leves), o que vai configurar toda a complexidade das ações e produção de saúde. É preciso ampliar as dimensões do fazer e, com isso, do saber ser dos profissionais de saúde. Queremos destacar o reconhecimento social das mulheres como sujeitos históricos que cuidam, e nesse sentido, nossa experiência com um grupo de mulheres da ilha nos tem mostrado que elas atendem ao “chamado” dos profissionais e se Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 155 - 9. 159 P ráticas Educativas em Grupo com TTecnologia ecnologia Sócio -Educativa Teixeira E interessam em participar de programas educativos, voltados para o cuidar cotidiano de saúde 12. O maior desafio, a nosso ver, é promover nesses programas conhecimentos e relacionamentos capazes de produzir saberes e afetos. Cada vez mais necessitamos nos sentir dentro/entre, cada vez mais precisamos pertencer a e viver em comunidade. O processo de aprender (e ensinar) caminha nessa mesma direção. Aprendemos mais dentro/entre comunidades aprendentes. Faz-se, assim, essencial no trabalho em saúde articular tais pressupostos. Concluindo, vários desafios ainda precisam ser vencidos para o fortalecimento do cuidar-educar para produzir saúde com tecnologias leves entre os (as) enfermeiros (as). Nós, profissionais de saúde, precisamos ampliar tanto as práticas cuidativas como as educativas e, com isso, alargar nosso pensar/ fazer/conviver no sistema. A nosso ver o cuidado solitário precisa ser substituído pelo solidário, em que nem eu, nem tu, mas NÓS participamos, aprendemos, ensinamos entre NÓS; em que produzimos saúde e realizamos travessias. Referências 8. Merhy EE. A perda da dimensão cuidadora na produção da saúde: uma discussão do modelo assistencial e da intervenção no seu modo de trabalhar a assistência. Disponível em: www.hc.ufmg.br/gids/perda/doc. 9 . Vasconcelos EM. Educação popular e a atenção à saúde da família. 2ª ed. São Paulo(SP): Hucitec; 2001. 10. Minayo MCS. O desafio do conhecimento. Paulo(SP): Hucitec; 1992. 11. Freire P. Pedagogia da autonomia. Paulo(SP): Cortez; 1996. 12. Teixeira E. Travessias, redes e nós: complexidade do cuidar cotidiano de saúde entre ribeirinhos. Esc Anna Nery Rev Enferm. 2000 ago; 4(2): 269-78. 1. Bauman Z. Comunidade: a busca por segurança no mundo atual. Rio de Janeiro(RJ): Zahar; 2003. 2. Brandão CR. A canção das sete cores: educando para a paz. São Paulo(SP): Contexto, 2005. 3 . Munari DB, Rodrigues ARF. Enfermagem e grupos. Goiânia(GO): AB; 1997. 4. Schier J. Tecnologia de educação em saúde: o Grupo Aqui e Agora. Porto Alegre(RS): Sulina; 2004. 5. Silva DGV et al. Grupos como possibilidade para desenvolver educação em saúde. Texto Contexto Enferm 2003 jan/mar;12(1): 97-113. 6. Afonso L et al. Oficinas em dinâmica de grupo na área da saúde. Belo Horizonte(MG): Campo Social; 2003. 7. Zerbetto SR, Pereira MAO. O trabalho do profissional de nível médio de enfermagem nos novos dispositivos de atenção em saúde mental. Rev Latino-Am Enfermagem 2005 jan. /fev; 13(1): 38-45. Sobre a Autora Eliza beth Teix eir Elizabeth eixeir eiraa Profª Drª do Curso de Graduação em Enfermagem e do Programa de Mestrado em Educação da Universidade do Estado do Pará. Doutora em Ciências Sócio-Ambientais (UFPA). Pós-Doutorado em Sociologia (Universidade de Coimbra). Pesquisadora do Núcleo de Educação Popular Paulo Freire. e-mail: [email protected] Recebido em 06/03/2006 Reapresentado em 25/09/2006 Aprovado em 15/01/2007 Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 155 - 9. Instruções para a publicação de manuscritos 160 ESCOLA ANNA NERY REVISTA DE ENFERMAGEM Instruções para a publicação de manuscritos A Revista aceitará para publicação, manuscritos nas línguas portuguesa, espanhola e inglesa. Os manuscritos devem ser apresentados exclusivamente à Escola Anna Nery Revista de Enfermagem, não sendo permitida sua apresentação simultânea a outro periódico. E conceitos, idéias e opiniões emitidos nos manuscritos, bem como a exatidão, adequação e procedência das citações bibliográficas são de inteira responsabilidade do(s) autor(es) dos mesmos, não refletindo necessariamente a posição do Conselho Editorial da Revista. Para tanto, os autores deverão encaminhar em anexo ao manuscrito, uma declaração de responsabilidade sobre o conteúdo do mesmo e a transferência de direitos autorais (modelo disponível em: www.eean.ufrj.br/Revista de Enfermagem) Portanto, os manuscritos publicados serão de propriedade da Revista estando vedadas a reprodução ou tradução parcial ou total dos mesmos. Para publicação total ou parcial (citações textuais com mais de 500 palavras, figuras, gráficos, tabelas e outras ilustrações) de texto de manuscrito publicado na Revista em outros periódicos (impressos e/ou eletrônicos), são necessárias autorizações por escrito de seus editores e do(s) autor(es) do manuscrito envolvido. Da mesma forma, publicações de manuscritos publicados em outros periódicos nesta Revista, através de reprodução ou tradução de texto total ou parcial (citações com mais de 500 palavras, figuras, gráficos, tabelas e outras ilustrações) torna necessárias autorizações por escrito dos editores daquele periódico e do(s) autor(es) do manuscrito originalmente publicado. O Conselho Editorial da Revista tem plena autoridade de decisão sobre a seleção e publicação de manuscritos, quando os mesmos apresentem os requisitos adotados para a avaliação de seu mérito científico, considerando-se sua originalida- de, prioridade, oportunidade, clareza e conhecimento da literatura relevante e adequada definição do assunto estudado. O Editor chefe, por delegação do Conselho Deliberativo da Revista poderá introduzir eventuais alterações, para efeitos de padronização de acordo com os parâmetros editoriais da Revista. O processo de avaliação do mérito científico gerenciado pelas editoras da Revista, considerará o atendimento destas instruções, o potencial do manuscrito para publicação e possível interesse dos leitores. O manuscrito será encaminhado para análise e emissão de parecer por três Consultores Ad Hoc, pesquisadores de competência estabelecida na área de conhecimento do manuscrito, processo em que se adotará de sigilo e anonimato tanto para o(s) autor(es)como para o(s) consultores. Depois, os manuscritos poderão ser classificados em uma das seguintes condições: manuscrito aprovado sem exigências; manuscrito aprovado com exigências devendo o(s) autor(es) recebê-las por escrito, para providenciar sua reapresentação à Revista; manuscrito recusado, com justificativa por escrito. No caso de aprovado, o manuscrito será publicado de acordo com o fluxo e o cronograma editorial da Revista. O manuscrito de estudo brasileiro que envolva pesquisa ou relato de experiência com seres humanos deverá apresentar em anexo uma cópia do documento de aprovação por um comitê de ética de pesquisa (de acordo com a Resolução n.º 196 / 96, do Conselho Nacional de Saúde) ou uma justificativa para ausência desse documento contendo a descrição dos cuidados éticos adotados pelo(s) autor(es) para substituí-lo. O manuscrito de estudo estrangeiro deverá estar acompanhado de cópia de documentação de aprovação de órgão similar em seu país de origem, que normaliza o desenvolvimento de investigação ou relato de experiência com seres humanos, ou uma justificativa para ausência desse documento contendo a descrição dos cuidados éticos adotados pelo(s) autor(es) para substituí-lo. Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 160 - 8. Instruções para a publicação de manuscritos Categorias de manuscritos: Editorial, Pesquisa,Reflexão, Ensaio, Relato de experiência, Revisão crítica, Biografia, Fac-símile, Resenha, Resumo de disser tação ou tese, Entrevista, Página do estudante, Comunicações breves, Carta ao editor. O detalhamento dos manuscritos está disponível em : www.eean.ufrj.br/Revista de Enfermegem Composição dos manuscritos Os manuscritos deverão ser redigidos na ortografia oficial e digitados em arquivo de processador de texto Word for Windows, versão 98 ou anterior, com parágrafos de 1,5 cm, impressos em papel A4 com margens de 3 cm, em espaço duplo na fonte Times New Roman tamanho 12, com páginas numeradas a partir da introdução até as referências. Somente o título e os sub-títulos do manuscrito poderão ser destacados em negrito sendo vedada a adoção de abreviaturas nos mesmos e no resumo. Deve-se adotar no texto apenas as abreviações padronizadas. A primeira citação da abreviatura entre parêntesis deve ser precedida da expressão correspondente por extenso, com exceção das medidas padronizadas. O recurso de itálico deverá ser adotado apenas para realmente destacar partes importantes do texto, como por exemplo citações ipsis literis de autores no texto do manuscrito, partes de depoimentos/entrevistas transcritas e palavras e expressões relevantes para o tema abordado. Tabelas, gráficos e outras ilustrações (figuras, mapas, gravuras, esquemas e fotos), em um número total de 6 (seis), devem ser apresentados em folhas separadas do texto, numeradas consecutivamente com algarismos arábicos, na mesma ordem em que forem citadas no texto. Para ilustrações extraídas de outros trabalhos previamente publicados, o(s) autor(es) deverão encaminhar em anexo a permissão escrita dos responsáveis pela publicação original, para posterior publicação nesta Revista. As fotos deverão evitar a identificação de pessoas ou apresentar permissão específica e escrita para a publicação das mesmas. Quando o manuscrito tiver mais de 06 autores, 06 deles constarão na folha de rosto identificada e os demais constarão em nota bibliográfica. É necessário ainda especificar, à parte por escrito e encaminhar juntamente com o manuscrito, a contribuição de cada um dos autores para a elaboração do manuscrito (modelo disponível em: www.eean.ufrj.br/Revista de Enfermagem). Para o primeiro encaminhamento, o manuscrito deverá ser apresentado em 03 cópias impressas, juntamente com 01 cópia em disquete. A composição dos manuscrito deverá constar de: Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 160 - 8. 161 - Folha de rosto identificada: título pleno do trabalho com até 15 palavras, versão do título completo em espanhol e inglês, título abreviado para cabeçalho com até 07 palavras, nome por extenso de cada autor (até seis autores) seguido de instituição de origem (apenas nome e cidade), e nome do autor e endereço completo de correspondência para manutenção de contatos sobre a tramitação do manuscrito com o editor (incluindo cep, telefone, fax e endereço eletrônico). - Folha de rosto não identificada: título pleno do trabalho com até 15 palavras e versão do título completo em espanhol e inglês. - Folha de resumo e descritores: resumo com até 150 palavras para manuscritos de pesquisa, reflexão, ensaio, relato de experiência, revisão crítica e biografia. Resumo de até 70 palavras para manuscritos de entrevista e página do estudante. Esses resumos deverão estar acompanhados das versões em espanhol (resumen) e inglês (abstract) acompanhados dos respectivos descritores. Os resumos devem ser informativos de acordo com a NBR 6028 da ABNT, de novembro de 2003, para manuscritos nacionais. Para manuscritos internacionais, o resumo informativo deve apresentar todas as partes do texto de maneira sintética. Os manuscritos de resenha, resumo de dissertação ou tese, comunicações breves e carta ao editor deverão ser acompanhados pelas versões integrais do texto em espanhol e inglês acompanhados dos respectivos descritores. Os descritores são palavras fundamentais para a classificação da temática abordada no manuscrito em bancos de dados nacionais e internacionais. Serão aceitos entre 03 e 05 descritores por manuscrito. Após a seleção desses descritores, sua existência em português, espanhol e inglês deve ser confirmada pelo(s) autor(es) do manuscrito no endereço eletrônico http://decs.bvs.br (Descritores em Ciências da Saúde - Bireme). A terminologia para os descritores deve ser denominada no manuscrito como se segue: palavraschave, palabras clave e keywords. - Corpo de texto: apresentando uma seqüência lógica (introdução, desenvolvimento e conclusão), organizada em partes distintas, considerando-se a categoria de manuscrito envolvida. O corpo do texto deve ser iniciado pela introdução, sem o título completo do manuscrito e sem os autores. Deve também ser apresentado de maneira contínua, sem novas páginas para cada subtítulo. As pesquisas devem apresentar obrigatoriamente as partes - introdução incluindo objetivos, metodologia, análise e interpretação dos resultados, conclusões e referências (ver detalhamento das categorias de manuscritos em: www.eean.ufrj.br/Revista de Enfermagem). Os locais sugeridos para a inserção de tabelas, gráficos e ilustrações, segundo sua ordem a aparição, 162 deverão estar assinalados no texto. As citações de autores no texto devem estar em conformidade com os exemplos sugeridos e elaborados segundo o estilo Vancouver e disponíveis em: www.eean.ufrj.br/Revista de Enfermagem. A transcrição ipsis literes de citações deve atender aos seguintes critérios: (a) até três linhas de citação, usar aspas na seqüência do texto normal; (b) mais de três linhas de citação, destacá-la em nova linha, em bloco próprio distinto do texto normal, sem aspas, com espaço simples e recuo de 3 espaços da margem esquerda. Deve-se evitar assinalar muitos autores números, em uma mesma parte de texto. Não devem ser introduzidas notas de rodapé. Elas podem estar contempladas nas notas bibliográficas, que deverão ser introduzidas ao final do texto. Os dados empíricos recortados em pesquisas qualitativas devem ser apresentados em nova linha, em bloco próprio distinto do texto normal, em itálico, sem aspas, com espaço simples e recuo de 2cm da margem esquerda. Esses dados devem estar identificados por siglas (exemplo: E1, E2 ... para entrevistas) ou pseudônimos relativos aos participantes das pesquisas. - Notas bibliográficas: autores além dos seis existentes na folha de rosto identificada; complementos e explicações necessárias à compreensão da temática abordada no manuscrito, que não cabem no texto; agradecimentos; apoios recebidos - financeiros e outros, e demais conteúdos considerados pertinentes. As notas bibliográficas devem ser apresentadas em número reduzido após as referências, apenas nos casos imprescindíveis. - Referências bibliográficas: número de referências segundo a categoria de manuscrito apresentado à Revista; e apresentação das referências em espaço simples e fonte Times New Roman tamanho 12, sem parágrafos, recuos ou deslocamentos de margens, com destaques em itálico (títulos de livros, periódicos em que foram publicados e outros detalhes) e numeradas de acordo com sua ordem de aparição no texto. As demais características das referências deverão estar em conformidade com os exemplos baseados no estilo Vancouver (disponíveis em: www.eean.ufrj.br/Revista de Enfermagem). - Anexos: a apresentação de tabelas, gráficos e outras ilustrações, por opção do(s) autor(es); apresentação de instrumentos utilizados (resumidos, quando extensos) e outros tipos. Os anexos devem adotados apenas quando significarem informação original ou destaque indispensável à compreensão de alguma seção do manuscrito. - Tabelas, gráficos e outras ilustrações: devem estar impressos em laudas distintas das laudas do texto do manuscrito e acompanhados de título e/ou legenda. Eles devem ser encaminhados em arquivos separados. Para tabelas e gráficos, usar preferencialmente arquivos dos softwares Word ou Excel. Para outras ilustrações (figuras, mapas, gravuras, esque- Instruções para a publicação de manuscritos mas e fotos somente em preto e branco), encaminhar obrigatoriamente arquivos de software Corel Draw ou arquivos com extensão TIF ou JPG. Para “escanear” as figuras e/ou fotos, selecionar 300 DPI de resolução, nos modos de desenho ou gray scale. Figuras de desenhos não computadorizados deverão encaminhadas em qualidade de impressão de fotografia em preto e branco. Para o segundo encaminhamento, depois de cumpridas as exigências estabelecidas para sua publicação, o manuscrito revisado deverá ser reapresentado à Revista em 01 cópia impressa, juntamente com uma cópia em disquete. Os manuscritos deverão ser encaminhados para: Escola Anna Nery Revista de Enfermagem Secretaria Administrativa Escola de Enfermagem Anna Nery / UFRJ Rua Afonso Cavalcanti, 275, Cidade Nova Rio de Janeiro, RJ, Brasil CEP 20.211-110 Outras formas de contato: Telefone: (21) 2293-0528 / ramal: 109 Fax: (21) 2293-8999 e-mail: [email protected] Maiores informações sobre: Submissão de manuscritos à periódicos Consultar: - http://www.jped.com.br/port/normas/normas_07.asp / - Requisitos uniformes para originais submetidos a revistas biomédicas. Jornal de Pediatria, 73:213-22, 1997 (verão integral em português). - Requisitos uniformes para originais submetidos a revistas biomédicas – atualização de dezembro de 2003 (em português). - Atualização de outubro de 2001 (em inglês). Abreviaturas de títulos de periódicos Consultar: - http://www.ibict.br (em português). - http://www.ncbi.nlm.nih.gov/entrez/query.fcgi?deb=journals (em inglês). - International Nursing Index (em inglês). - Index Medicus (em inglês). Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 160 - 8. Instruções para a publicação de manuscritos 163 ANNA NERY SCHOOL JOURNAL OF NURSING Instructions for manuscript publication The Magazine will accept for publication manuscripts written in Por tuguese, Spanish and English. The manuscripts must be submitted exclusively to the Anna Nery School of Nursing Magazine, not being allowed its simultaneous submittal to another periodical. Concepts, ideas, and opinions emitted in the manuscripts, as well as the exactness, adequacy and origin of bibliographical citations are of entire responsibility of the authors, not reflecting necessarily the position of the Magazine’s Publishing Commission. Thus, the authors will have to send attached to the manuscript a responsibility statement on the subject and the transfer of the copyrights (disponible in: www.eean.ufrj.br/Revista de Enfermagem). Therefore, the manuscripts published are property of the Magazine and the reproduction or partial or total translation is not permitted. For partial or total publication (texts citations with more than 500 words, figures, graphics, tables and other illustrations) of manuscript text published in the journal in another periodical (printed and/or electronic), written authorizations are needed from the editors and from the authors of the manuscript involved. Similarly, the publication in this magazine of manuscripts published in other periodicals, through reproduction or translation partial or total of text (texts citations with more than 500 words, figures, graphics, tables and other illustrations), requires written authorizations from the editors and from the authors of the manuscript originally published. The Editorial Commission of the Magazine has full authority to decide about the selection for the publication of the manuscripts, when they present the requirements for evaluation of the scientific merits. Considering the manuscripts originality, priority, opportunity, clarity and knowledge of relevant literature and appropriate definition of the subject studied. The Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 160 - 8. Chief Editor, by delegation of the Deliberative Committee of the Journal may introduce occasional alterations for standardization purposes, according to the journal’s editorial parameters. The evaluation process of the scientific merits managed by the editors of the Magazine, will be considered the fulfillment of these instructions, ithe potential of the manuscript for publication and possible readers’ interest. The manuscript will be forwarded for review and appraisal by three Ad Hoc consultants, researchers that have a established competence in the manuscript’s knowledge area, a process in which secrecy and anonymity as for authors and as for consultants will be adopted. After, the manuscripts may be classified as one of the following: manuscript approved without requirements; manuscript approved with requirements (the author(s) must receive them in writing, to carry out its re-submittal to the Magazine); refused manuscript, with justification in writing. If approved, the manuscript will be published in accordance with the flow and the publishing chronogram of the Magazine. The manuscript of a Brazilian study that involves research or case studies with human beings should present attached a copy of the approval document by a research ethics committee (according to Resolution 196/96, of the National Health Council) or a justification for the absence of this document containing the description of the ethical procedures adopted by the author(s) to replace it. The manuscript of a foreign study will have to be accompanied by a copy of the approval documentation of a similar agency in its native country, that normalizes the development of research or case studies with human beings, or a justification for the absence of this document containing the description of the ethical care adopted by the authors to replace it. 164 Categories of manuscripts Editorial, Research, Reflection, Assay, Case studies, Critical review, Biography, Facsimile, Summary, Summary of dissertation or thesis, Interview, Page of the student, Brief communication, Letter to the editor. More details about the manuscripts will be found at: www.eean.ufrj.br/Revista de Enfermagem Composition of the Manuscripits The manuscripts must be written in compliance with the official orthography and word processor files must be MS Word for Windows™, version 98 or earlier, with 1,5 paragraph indenting, printed in A4 paper with margins of 3 cm, in double spacing, using the font Times New Roman size 12, with pages numbered from introduction to references. Only heading and sub-headings of the manuscript can be highlighted in boldface, being forbidden the adoption of abbreviations for them and also for the summary. It must be adopted in the text only the standardized abbreviations. The first citation of the abbreviation in parenthesis must be preceded of the corresponding expression literally, with exception of the standardized measures. Italics should only be adopted to only hihlight important parts of the text, as for example ipsis litteris citations of authors in the text of the manuscript, relevant parts of depositions/transcribed interviews and words and expressions for the subject matter. Tables, graphs, and other illustrations (figures, maps, pictures, schematics, and photos) must be presented in sheets of paper separated from the text, numbered consecutively with Arabic numbers, in the order where they are cited in the text. For illustrations extracted from other previously published works, the author(s) will have to forward attached written permission from those responsible for the original publication, for posterior publication in this Magazine. The photos will have to prevent the identification of people or to present specific permission in writing for their publication to be allowed. When the manuscript has more than 06 authors, 06 of them will be shown in the identified face page and the others will be shown in a bibliographical note. It is necessary yet to specify, apart and in writing, and to forward along with the manuscript, the contribution of each of the authors for the elaboration of the manuscript (disponible at: www.eean.ufrj.br/ Revista de Enfermagem). For the first submittal, the manuscript must have 03 printed copies, together with 01 copy in floppy disk. The composition of the manuscript must consist of: - Identified face page: full title of the work with up to 15 words, version of the complete title in Spanish and English, short title for heading with up to 07 words, full name of each author (up to six Instruções para a publicação de manuscritos authors), followed by institution (only name and city), and name of the author and complete address for making contact on the status of the manuscript with the editor (including Zip code, telephone, fax, and e-mail). - face page unidentified: full title of the work with up to 15 words and version of the complete title in Spanish and English. - Summary page and describers: summary with up to 150 words for manuscripts of research, reflection, essay, case studies, critical review and biography. Summary of up to 70 words for manuscripts of interview and page of the student. These summaries will have to be accompanied by versions in Spanish (resumen) and English (abstract), followed by the respective describers. Summaries of Brazilian manuscripts must be informative according to ABNT’s NBR 6028, from November 2003. For international manuscripts, the informative summary must present all the parts of the text in a synthetic way. The summary manuscripts, brief summary of dissertation or theses, communications and letter to the editor must be followed by the integral versions of the text in Spanish and English, followed by the respective describers. The describers are basic words for the thematic classification of the manuscript in national and international databases. It will be accepted between 03 and 05 describers. After the selection of these describers, its existence in Portuguese, Spanish and English must be confirmed by the author(s) of the manuscript in the electronic address http:// decs.bvs.br (Describers in Health Sciences - Bireme). The terminology for the describers must be designated in the manuscript as follows: palavras-chave, palabras clave, keywords. - Body of text: presenting a logical sequence (introduction, development, and conclusion), organized in distinct parts, considering the category of manuscript involved. The body of the text must start by the introduction, without the complete title of the manuscript and without the authors. It must also be presented in a continuous way, without new pages for each sub-heading. The researches must present obligatorily the parts - introduction including objective, methodology, analysis and interpretation of the results, conclusions and references (disponible at: www.eean.ufrj.br/Revista de Enfermagem). The places suggested for the table insertion, graphs and illustrations, according to its order the appearance, must be designated in the text. The citations of authors in the text must be in compliance with the examples suggested and elaborated according to the Vancouver style (disponible at: www.eean.ufrj.br/Revista de Enfermagem). The transcription ipsis litteris of citations must comply with to the following criteria: (a) up to three citation lines: use quotations marks in the sequence of the normal text; (b) more than three citation lines: highlight it in a new line, distinct block from the normal text, without quotations Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 160 - 8. Instruções para a publicação de manuscritos marks, with single spacing and 3 spaces from the left margin. The designation of many authors - numbers must be avoided, in a same part of text. Footnotes must not be introduced. They can be left for the bibliographical notes, that must be introduced at the end of the text. The empirical data taken from qualitative researches must be presented in a new line, in a distinct block from the normal text, in italic, without quotations marks, with single spacing and 2 cm from the left margin. These data must be identified by acronyms (for example: E1, E2... for interviews) or pseudonyms relatted to the participants of the researchs. - Bibliographical notes: authors beyond the six existing ones in the identified face page; complements and necessary explanations to the understanding of thematic of the manuscript, that do not fit in the text; acknowledgments; received supports - financial and others, and other content considered pertinent. The bibliographical notes must be presented in reduced number after the references, only in the indispensable cases. - Bibliographical references: number of references according to the category of the manuscript presented to the Journal (see categories of manuscripts); and presentation of the references in single spacing and font Times New Roman size 12, without paragraphs, indenting or displacement of margins, with highlights in italics (book titles, periodicals where they have been published and other details) and numbered in accordance with its order of appearance in the text. The other characteristics of the references must be in compliance with the examples based on the “Vancouver” style (disponible at: www.eean.ufrj.br/Revista de Enfermagem). - Attachments: table presentation, graphs, and other illustrations, by author(s)’s choice; presentation of used instruments (summarized, when extensive), and other types. The attachments must be adopted when only if they represent original information or are indispensable to the understanding of some section of the manuscript. - Tables, graphs, and other illustrations: must be printed in distinct pages from the text of the manuscript and followed by title and/or header. They must be submitted in separate files. For tables and graphs, use software files MS Word™ or Excel™ preferentially. For other illustrations (figures, maps, pictures, schematics and photos should only be in black and white). It is obligatorily to submit software files of Corel Draw™ or files with extension TIF or JPG. To scan the figures and/or photos, select 300 DPI resolution, in drawing or gray scale mode. Figures of dr awings not computerized must be submitted in photographic quality an in black and white. Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 160 - 8. 165 For the second submittal, after fulfilling the requirements established for its publication, the revised manuscript must be sent in 01 printed copy, along with a copy in floppy disk. The manuscripts must be addressed to: Escola Anna Nery Revista de Enfermagem Secretaria Administrativa Escola de Enfermagem Anna Nery / UFRJ Rua Afonso Cavalcanti, 275, Cidade Nova Rio de Janeiro, RJ, Brasil CEP 20.211-110 Other forms of contact: Telefone: (21) 2293-0528 / ramal: 109 Fax: (21) 2293-8999 e-mail: [email protected] FURTHER INFORMATION ON: Submission of manuscripts to periodics: To consult: . htpp://www.jped.com.br/port/normas/normas_07.asp /: - Uniform requirements for originals submitted to biomedical magazines. Jornal de Pediatria, 73:213-22, 1997 (integral version in Portuguese). - Uniform requirements for originals submitted to biomedical magazines – Updating of December of 2003 (in Portuguese). . - Updating of October of 2001 (in English). Ab br tions of periodics titles: Abbr breevia viations To consult: htpp://www.ibict.br (in Portuguese). http://www.ncbi.nlm.nih.gov/entrez/query.fcgi?deb=journals (in English). International Nursing Index (in English). Index Medicus (in English). Instruções para a publicação de manuscritos 166 ESCUELA ANNA NERY REVISTA DE ENFERMERÍA Instrucciones para la publicación de manuscritos La revista aceptará para publicación manuscritos en portugués, español e inglés. Los manuscritos deben ser presentados exclusivamente a la Escuela Anna Nery Revista de Enfermería, no siendo permitida su presentación simultanéa a otro periódico. Conceptos, ideas y opiniones emitidas en los manuscritos, bien como la exactitud, adecuación y procedencia de las citaciones bibliográficas, son de total responsabilidad de los autores de los mismos, no reflejando necesariamente la posición del Consejo Editorialde la Revista. Para eso, los autores deberán enviar, anexada al manuscrito, una declaración de responsabilidad sobre el contenido del mismo y la transferencia de derechos autorales (modelos disponibles en: www.eean.ufrj.br/Revista de Enfermagem). Por tanto, los manuscritos publicados serán propiedad de la Revista, estando prohibidas la reproducción o traducción, parcial o total, de los mismos. Para publicación total o parcial (citaciones con más de 500 palabras, figuras, gráficos, tabelas y otras ilustraciones) de texto de manuscrito publicado en la Revista en otros periódicos (impresos y/o electrónicos), son necesarias autorizaciones por escrito de sus editores y de los autores del respectivo manuscrito. De la misma forma, publicaciones de manuscritos editados en otros periódicos en esta Revista, a través de la reproducción o traducción de texto total o parcial (citaciones con más de 500 palabras, figuras, gráficos, tabelas y otras ilustraciones), exigen las necesarias autorizaciones por escrito de los editores de aquel periódico y de los autores del manuscrito originalmente publicado. El Consejo Editorial de la Revista tiene plena autoridad de decisión sobre la selección de publicación de manuscritos, cuando los mismos presentan los requisitos adoptados para la evaluación de su mérito científico. Va a ser considerado el manuscrito por su originalidad, prioridad, oportunidad, claridad y conocimiento de la literatura relevante y adecuada definición del tema estudiado. El editor jefe, por delegación del Consejo Deliberativo, podrá introducir eventuales alteraciones para efecto de uniformidad, de acuerdo con los parámetros editoriales de la Revista. El proceso de evaluación del mérito científico administrativo por las editoras de la Revista va a considerar el atendimiento de estas instrucciones, el potencial del manuscrito para publicación y posible interés de los lectores. El manuscrito será enviado para análisis y emisión de parecer por 03 Consultores “Ad hoc”, investigadores de reconocida competencia en el ámbito de conocimiento del manuscrito, proceso en que se adoptará sigilo y anominato para autores y consultores. Los manuscritos podrán ser clasificados en una de las condiciones siguientes: manuscritos aprobado sin exigencias; manuscrito aprobado con exigencias, debiendo los autores recibirlas por escrito para providenciar la segunda presentación a la Revista; manuscrito recusado, con justificativa por escrito. Cuando aprobado, el manuscrito será editado conforme el flujo y el cronograma editorial de la Revista. El manuscrito de estudio brasileño, tratando de investigación o relato de experiencia con seres humanos, deberá presentar anexada una cópia del documento de aprobación por un comité de ética de investigación (de acuerdo con la Resolución 196/96, del Consejo Nacional de Salud) o una justificativa para ausencia de ese documento conteniendo la descripción de los cuidados éticos adoptados por los autores para substituirlo. El manuscrito de estudio extranjero deberá estar acompañado de copia de la documentación de aprobación emitida por órgano similar en su país de origen, lo cual normaliza el desarrollo de investigación o relato de experiencia con seres humanos, o una justificativa para la ausencia de ese documento conteniendo la descripción de los cuidados éticos adoptados por los autores para substituirlo. Categorías de Manuscritos Editorial, Investigación, Reflexión, Ensayo, Relato de experiencia, Revisón crítica, Biografía, Facsímile, Reseña, Resumen de disertación o tesis, Entrevista, Página del estudiante, Comunicaciones breves, Carta para el editor. Para más informaciones sobre los manuscritos buscar al sítio: www.eean.ufrj.br/Revista de Enfermagem. Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 160 - 8. Instruções para a publicação de manuscritos Composición de los manuscritos Los manuscritos deberán ser redactados en la ortografía oficial y digitados en archivo de procesador de texto Word for Windows, versión 98 o anterior, con párrafos de 1,5 cm, impresos en papel A4, com márgenes de 03 cm, en espacio duplo en la fuente Times New Roman” tamaño 12, con páginas numeradas a par tir de la Introducción hasta las Referencias. Solamente título y subtítulos del manuscrito podrán ser destacados en negrito, siendo prohibida la adopción de abreviaturas en los mismos y en el Resumen. Se debe adoptar en el texto las abreviaciones oficiales. La primera citación de la abreviatura entre paréntesis debe ser precedida de la expresión correspondiente por extenso, con excepción de las medidas padrón. El uso del itálico deberá ser adoptado solo para destacar partes importates del texto, como, por ejemplo, citaciones “ipsis literis”de autores en el texto del manuscrito, partes de testimonios/entrevistas transcritas y palabras y expresiones relevantes para el tema tratado. Tabelas, gráficos y otras ilustraciones (figuras, mapas, estampas, esquemas y fotos) deben ser presentados en hojas separadas del texto, numeradas consecutivamente con algarismos arábicos, en la orden de citación en el texto. Para ilustraciones tiradas de otros trabajos previamente publicados, los autores deberán encaminar anexada la permisión por escrito de los responsables por la publicación original para posterior publicación en esta Revista. Las fotos deberán evitar la identificación de personas o presentar permisión específica y escrita para publicación de las mismas. Cuando el manuscrito tiene más de 06 autores, 06 de ellos constarán en la portada identificada y los otros serán colocados en nota bibliográfica. Es también necessario especificar en separado, por escrito, y encaminar, juntamente con el manuscrito, la contribuición de cada un de los autores para la elaboración del manuscrito (ver el sítio: www.eean.ufrj.br/Revista de Enfermagem). Para el primero envío, el manuscrito deberá ser en 03 copias impresas, juntamente con una copia en disquete. La composición de los manuscritos deberá constar de: - Portada identificada: Título pleno del trabajo con un máximo de 15 palabras, versión del título completo en español y en inglés, título abreviado para el encabezamiento con hasta 07 palabras, nombre por extenso de cada autor (hasta 06 autores), seguido de institución de origen (solamente nombre y ciudad), y la direcición completa para manutención de contactos sobre la tramitación del manuscrito con el editor (incluyendo el código postal (CEP), teléfono, fax y e-mail). - Portada no identificada: Título pleno del trabajo, con un máximo de 15 palabras, y versión del título completo en español y en inglés. Hoja de Resumen y Descriptores: Resumen con un máximo de 150 palabras para manuscritos de investigación, reflexión, ensayo, relato de experiencia, revisión crítica y biografía. Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 160 - 8. 167 Resumen con un máximo de 70 palabras para manuscritos y página del estudiante. Esos resúmenes deberán estar acompañados de las versiones en español y en inglés (“abstract”) y de los respectivos descriptores. Los resúmenes deben ser informativos de acuerdo con la Norma Brasileña (NBR)6028, de la Asociación Brasileña de Normas Técnicas (ABNT) para manuscritos nacionales. Para manuscritos internacionales, el resumen informativo debe presentar todas las partes del texto de manera sintética. Los manuscritos de reseña, resumen de disertación o tesis, comunicaciones breves y carta para el editor deberán ser acompañadas de las versiones integrales del texto en español y en inglés de los respectivos descriptores con palabras fundamentales para la clasificación de la temática tratada en el manuscrito en bancos de datos nacionales e internacionales. Serán aceptos entre 03 y 05 descriptores. Después de la selección de esos descriptores, su existencia en português, español e inglés debe ser confirmada por los autores del manuscrito en la dirección electrónico http://decs.bvs.br (Descriptores en Ciencias de la Salud –BIREME). La terminología para los descriptores deben aparecer en el manuscrito de la manera siguiente: “palavras - chave”(portugués), “palabras clave” (español), “keywords”(inglés). - Cuerpo del texto : Presentado una secuencia lógica (introducción, desarrollo y conclusión) y organizado en partes distintas, considerandose la categoría del manuscrito. El cuerpo del texto debe ser iniciado por la Introducción, sin el título completo del manuscrito y sin nuevas páginas para cada subtítulo. Las investigaciones deben tener obligatoriametne las partes: introducción, incluyendo objetivos; metodología; análisis o interpretación de los resultados; conclusiones; y referencias (ver el sítio: www.eean.ufrj.br/Revista de Enfermagem). Los locales sugeridos para la inserción de tabelas, gráficos e ilustraciones, según su orden de surgimento, deberán estar señalados en el texto. Las citaciones de autores en el texto deben estar de conformidad con los ejemplos sugeridos y elaborados según el estilo “Vancouver”. La transcripción “ipsis literis”de citaciones debe atender a los criterios siguientes: (a) hasta 03 líneas de citación, usar comillas en la secuencia del texto normal; (b) más de 03 líneas de citación, destacarla en nueva línea, en bloco proprio distinto del texto normal, sin aspas, con espacio simple y reculada de 03 espacios de la margen izquierda. Se debe evitar señalar muchos autores/números en una misma parte de texto. No deben ser introducidas notas de rodapié. Ellas pueden constar como notas bibliográficas, que deberán ser colocadas al final del texto. Los datos empíricos recortados de investigaciones cualitativas deben ser presentados en nueva línea, en bloco propio distinto del texto normal, en itálico, sin comillas, con espacio simple y reculada de 02 cm de la margen ixquierda. Esos datos deben estar identificados por siglas (ejemplo: El, E1, e2 .... para entrevistas) o pseudónimos. - Notas bibliográficas : Autores además de los 06 existents em la hoja de rostro identificada; complementos y explicaciones necessárias a la comprensión de la temática tratada en el Instruções para a publicação de manuscritos 168 manuscrito que no caben en el texto; agradecimientos; apoyos recebidos (financieros y otros); y otros contenidos considerados per tinentes. Las notas bibliográficas deben ser presentadas en número reducido después de las referencias, apenas en los casos indispensables. - Referencias bibliográficas: Número de referencias segundo la categoría de manuscrito presentado en la Revista (ver categorías de manuscritos; y presentación de las referencias en espacio simple y fuente “Times New Roman” tamaño 12, sin párrafos, reculadas o deslocamientos de márgenes, con destaque en itálico (títulos de libros, periódicos que fueron publicados y otros detalles) y numeradas de acuerdo con su orden de surgimiento en el texto. Las otras características de las referencias deberán estar en conformidad con los ejemplos basados en el estilo “Vancouver”. (ver el sítio: www.eean.ufrj.br/ Revista de Enfermagem) - Anexos: Presentación de tabelas, gráficos y otras ilustraciones, por opción de los autores; presentación de instrumentos utilizados (resumidos, cuando extensos) y otros tipos. Los anexos deben ser adoptados apenas cuando significan información original o destaque indispensable a la comprensión de alguna sección del manuscrito. Tabelas, gráficos y otras ilustraciones: deben estar impresos en páginas distintas de las páginas del texto del manuscrito y acompañados de título y/o leyenda. Ellos deben ser enviados en archivos separados. Para tabelas y gráficos, usar de preferencia archivos de los software Word o Excel. Para otras ilustraciones (figuras, mapas, grabados, esquemas y fotos solamente en preto y blanco), enviar obligatoriamente archivos de software Corel Draw o archivos con extensión TIF o JPG. Para escanear las figuras y/o fotos, seleccionar 300 DPI de resolución, en los modos de diseño o “gray scale”. Figuras de diseños no computadorizados deberán ser encaminadas en calidad de impresión de fotografáia en preto y blanco. Para el segundo envío, después de cumplidas las exigencias establecidas para su publicación, el manuscrito revisado deberá ser enviado en 02 copias impresas, juntamente con una copia en disquete. Los manuscritos deberán ser enviados para: Más informaciones sobre: Sumisión de manuscritos a los periódicos Consultar: - http://www.jped.com.br/port/normas/normas_07.asp / - Requisitos uniformes para originales sometidos a las revistas biomédicas. Jornal de Pediatria, 73:213-22, 1997 (versión integral en portugués). - Requisitos uniformes para originales sometidos a las revistas biomédicas – actualización de diciembre de 2003 (en portugués). – Actualización de octubre de 2001 (en inglés). Abreviaciones de títulos de los periódicos Consultar: htpp://www.ibict.br (en portugués). http://www.ncbi.nlm.nih.gov/entrez/query.fcgi?deb=journals (en inglés). International Nursing Index (en inglés). Index Medicus (en inglés). Escola Anna Nery Revista de Enfermagem Secretaria Administrativa Escola de Enfermagem Anna Nery / UFRJ Rua Afonso Cavalcanti, 275, Cidade Nova Rio de Janeiro, RJ, Brasil CEP 20.211-110 Otras formas de contacto: Teléfono: (21) 2293-0528 / ramal: 109 Fax: (21) 2293-8999 E - mail: [email protected] Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 160 - 8. Instruções para a publicação de manuscritos 169 ESCOLA ANNA NERY REVISTA DE ENFERMAGEM Anna Nery School Journal of Nursing Escuela Anna Nery Revista de Enfermería www.eean.ufrj.br/revista - e-mail: [email protected] / [email protected] Assinatura Anual / 2007 Remeter Ficha de Assinatura, acompanhada do comprovante de depósito bancário original, para: Escola de Enfermagem Anna Nery Rua Afonso Cavalcanti, 275 - Cidade Nova - Rio de Janeiro - Brasil - Cep: 20.211-110 Telefone/Fax: 21 2293 8999 ramal 109 Banco: BANCO DO BRASIL - Agência: 0287- 9 / Botafogo - Conta: 7.333- 4 (no caixa com o código identificador: 8417- 4). Favorecido: Fundação Universitária José Bonifácio Periodicidade Trimestral Alunos de graduação: R$ 70,00( ) Individual: R$ 120,00( ) Institucional: R$ 160,00( ) Annual subscription / 2007 Send your subscription to: Escola de Enfermagem Anna Nery Rua Afonso Cavalcanti, 275 Cidade Nova - Rio de Janeiro - Brazil - Zip code: 20.211-110 Telefax: +55 21 2293 8999 BANCO DO BRASIL- Agência Botafogo - RJ Branch Number: 0287- 9 - Bank Account: 13.101- 6 To: Fundação Universitária José Bonifácio Money order Swift: BRASBRRJARJO - Identification code: 8417- 4 Every Quarter Suscripción anual / 2007 Enviar la inscripción a: Escola de Enfermagem Anna Nery Rua Afonso Cavalcanti, 275 Cidade Nova - Rio de Janeiro - Brasil - Código Postal: 20.211-110 Telefax: +55 21 2293 8999 BANCO DO BRASIL- Agência Botafogo - RJ Sucursal Número: 0287-9 / Cuenta de Banco: 13.101-6 En nombre de: Fundação Universitária José Bonifácio Orden de pago / Clave de Identificación: 8417-4 Periodicidad Trimestral Undergraduate students/Alumnos de pregrado: US$ 35.00( ) Individual: US$ 80.00( ) Institutional/Institucional: US$ 100.00( ) EXEMPLAR AVULSO / SAMPLE PRICE / EJEMPLAR SUELTO 1997 a 2001: R$ 10,00 / US$ 10.00 2002 a 2005: R$ 25,00 / US$ 20.00 2006 e 2007: R$ 40,00 / US$ 30.00 Nome / Name / Nombre: .................................................................................................................................................................................................... ................................................ Endereço / Address / Dirección: ......................................................................................................................................................................................... ............................................. Cidade / City / Ciudad: .................................................................................................. País / Country / Pais : .......................................................................................................... UF / State / Provincia : ................................................................................................ CEP / Zip Code / Código Postal: ........................................................................................ Tel. / Phone / Tel.: ..................................................................... fax: ................................................ celular / cell phone: ............................................... e-mail: ................................................................................................................................................................................................................................. Empresa / Company / Empresa:............................................................................................................................................................................................ Categoria Profissional / Occupation / Profesión: .................................................................................................................................................................. Data / Date / Fecha: ........................................................................................................................................................................................................... Assinatura / Signature / Firma: ............................................................................................................................................................................................ Esc Anna Nery R Enferm 2007 mar; 11 (1): 160 - 8. 1937 - 2007 ANOS 70 Anos de Inserção na Universidade 84 Anos de História na Enfermagem Brasileira PROGRAMAÇÃO 08 de março de 2007 ABERTURA: Inauguração da Sala Vilma de Carvalho Auditório Hélio Fraga CCSS - Ilha do Fundão 09 de março de 2007 AULA INAUGURAL: “Extensão Universitária: Desafios para a Enfermagem” Auditório Rodolpho Paulo Rocco CCSS - Ilha do Fundão 12 de abril de 2007 14:00 COMEMORAÇÃO DO DIA DA OBSTETRIZ: Temas Emergentes da Prática Profissional Pavilhão de Aulas Escola de Enfermagem Anna Nery 07 a 09 de maio de 2007 8:00 às 17:00 COMEMORAÇÃO DO DIA DO TRABALHO: “Álcool e Drogas - Trabalho e Saúde do Trabalhador” Pavilhão de Aulas Escola de Enfermagem Anna Nery 14 a 17 de maio de 2007 14:00 às 17:00 PESQUISANDO EM ENFERMAGEM Pavilhão de Aulas Escola de Enfermagem Anna Nery 08 de agosto de 2007 10:00 AULA INAUGURAL: “Relações de Gênero no Ensino e na Prática Profissional” Simpósio Pavilhão de Aulas Escola de Enfermagem Anna Nery ENCONTRO DE NÚCLEOS DE PESQUISA DA EEAN Pavilhão de Aulas Escola de Enfermagem Anna Nery outubro de 2007 ESCOLA ANNA NERY REVISTA DE ENFERMAGEM: Comemoração de uma Década de Existência Pavilhão de Aulas Escola de Enfermagem Anna Nery 20 de dezembro de 2007 ENCERRAMENTO DAS ATIVIDADES Pavilhão de Aulas Escola de Enfermagem Anna Nery 14 de setembro de 2007