Síndrome de Wobbly em Hedgehog
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Síndrome de Wobbly em Hedgehog
RPCV (2015) 110 (593-594) 124-126 Síndrome de Wobbly em Hedgehog (Atelerix albiventriz.) (Wobbly Hedgehog Syndrome) – Primeiro Relato de Caso no Brasil Wobbly Hedgehog Syndrome – First Case Report in Brazil. Kamal A. Filho* 1, Vanessa B. Pasqualetti1, Alessandro F. A. Bijjeni2, Natália C. C. A. Fernandes3. Universidade Anhanguera Educacional – Santo André – SP – Brasil. 2 Exotic Pets Clínica Veterinária – São Paulo – Capital – Brasil. 3 Instituto Adolfo Lutz – São Paulo – Capital – Brasil. 1 Resumo: Os Hedgehogs (Atelerix albiventris) são pequenos mamíferos que se tornaram populares como animais de estimação, tendo como principal característica seu corpo coberto por espinhos. Dentre as doenças que podem acometê-los, está a Síndrome de Wobbly, uma condição neuropatológica que provoca sinais clínicos como tremores, quedas constantes para um lado e em seu estágio mais avançado, tetraplegia e morte. O presente relato descreve a evolução, achados histopatológicos e os possíveis tratamentos como tentativa de minimizar os danos e sinais causados pela doença, em um paciente de um ano e meio de idade, acometido com a Síndrome de Wobbly. Palavras-chave: Animais exóticos; Diagnóstico; Neuropatia; Ouriço pigmeu africano. Summary: Hedgehogs (Atelerix albiventris) are small mammals that have gradually become more popular as pets. There are mostly characterized by a body covered with spines. Among the diseases known to affect them, the Wobbly Hedgehog Syndrome is a neuropathological condition that causes clinical signs such as tremors, constant falls to one side, and in its most advanced stage, quadriplegia and death. This report shows the evolution, histopathological findings and possible treatments in a one year and a half old patient affected with the Wobbly Hedgehog Syndrome, in an attempt to minimize the damage caused by the disease. Keywords: African pygmy hedgehog; diagnosis; exotic pets; neuropathy. Introdução Hedgehog, ou Ouriço Pigmeu Africano, é um pequeno mamífero originados no continente africano e presentes atualmente em todos os continentes (Banks et al., 2009). São onívoros e tem como principais características seu dorso coberto por espinhos, barriga coberta por pelagem branca e hábitos noturnos (Heatley, 2009). No início dos anos 90, começaram a ser criados em cativeiro, tornando-se animais de estimação populares na América do Norte, América do Sul e Europa. Dentre Correspondência: [email protected] Telefone: +55 11 9-6437-8975 124 as espécies domesticadas estão o Atelerix albiventris, proveniente da África Central e o Atelerix algerius, encontrado na Algéria (Graesser et al., 2006). Aproximadamente 10% dos Hedgehogs de cativeiro da América do Norte sofrem de uma paralisia progressiva ou mielopatia degenerativa denominada Wobbly Hedgehog Syndrome (Síndrome de Wobbly). Os sinais neurológicos iniciais são ataxia e perda do equilíbrio, com evolução gradual e contínua de maneira gradativa, relatados em animais de todas as idades, porém com uma incidência maior entre animais com menos de 2 anos de idade (Graesser et al., 2006; Lennox, 2007). A etiologia da Síndrome de Wobbly não foi definida, porém suspeita-se que possa ter origem genética, autoimune ou nutricional (Graesser et al., 2006). O presente relato descreve o caso de um espécime de Hedgehog com suspeita inicial de Síndrome de Wobbly, sendo confirmado no exame post-mortem. Relato de caso Um exemplar de Hedgehog fêmea, dois anos de idade, padrão albino, foi atendido na Exotic Pets Clínica Veterinária com a queixa principal de desequilíbrio há cerca de 15 dias, apresentando quedas mais frequentes para o lado esquerdo e dificuldade de locomoção, principalmente em membros pélvicos. Durante exame clínico, o animal apresentou-se alerta e responsivo a estímulos. Seu peso era de 290 gramas e temperatura retal em torno de 37.0°C, sendo notadas mucosas discretamente cianóticas e leve dispneia. Solicitou-se exames radiográficos de todas as porções da coluna vertebral, em projeções dorsoventral e laterolateral e também hemograma completo. Não foram observadas alterações dignas de nota nas imagens e o hemograma apresentou valores dentro da normalidade. Em virtude dos sinais clínicos exibidos pelo animal e ausência de achados nos exames hematológicos e Filho K. et al. radiográficos, levantou-se provável diagnóstico de Síndrome de Wobbly. Como tratamento, instituiu-se protocolo a fim de minimizar as lesões causadas pela doença e tentar postergar a progressão da mesma, prolongando a vida do paciente com qualidade. O tratamento consistiu em suplementação de Vitamina E em pó (dose empírica) diretamente na alimentação e aplicações de Sulfato de Condroitina (0,02ml) a cada 48 horas, sendo solicitado um retorno para nova avaliação em sete dias. Foi estabelecido também, protocolo de fluidoterapia em todos os retornos, com solução fisiológica 0,9%, glicose e Vitamina B (1 ml/Kg, SC). No retorno, o proprietário relatou que o animal não apresentou melhoras no quadro de desequilíbrio e paraplegia, sendo que no exame clínico notou-se considerável perda de peso, chegando a 260 gramas (em torno de 10%). O tratamento foi mantido e foram solicitados retornos a cada 10 dias. Após dois meses do início do tratamento, o animal apresentou severa perda de peso, chegando a 190 gramas. Apresentou também ataxia e disfagia mais severas, mantendo-se apenas em decúbito lateral (Figura 1). Devido ao quadro clínico progressivo e grave e prognóstico reservado da Síndrome de Wobbly, o proprietário e o médico veterinário responsável pelo caso optaram pela eutanásia do animal. Figura 1 - Hedgehog (Atelerix albiventris), dois anos de idade, em decúbito lateral, devido à tetraplegia. O proprietário autorizou o exame necroscópico do espécime e posterior envio de fragmentos de órgãos para exame histopatológico. Os achados macroscópicos foram: perda de massa muscular em membros pélvicos e discreta redução de volume hepático. Não foram observadas alterações em Sistema Nervoso Central. Microscopicamente, observou-se atrofia de musculatura estriada esquelética moderada, e hipotrofia de hepatócitos. O Sistema Nervoso Central apresentou áreas multifocais de degeneração de substância branca com vacuolização moderada em cérebro e cerebelo, por vezes associada à discreta gliose focal e discreta degeneração de neurônios, com eosinofilia dos mesmos (Figura 2). A correlação de RPCV (2015) 110 (593-594) 124-126 achados macroscópicos, microscópicos e sinais clínicos permitiu o diagnóstico definitivo de Síndrome de Wobbly. Figura 2 - Fotomicrografia de cérebro, evidenciando a vacuolização de substância branca (setas). Coloração: H&E. Aumento: 400x. Discussão A crescente introdução de Hedgehogs como animais de estimação, juntamente com a crescente demanda por clínicas de animais silvestres, faz médicos veterinários de todo o mundo, procurarem formas de tratar as injúrias que acometem esses animais (Quesenberry e Carpenter, 2011). Hedgehogs com suspeita de Síndrome de Wobbly apresentam inicialmente ataxia leve, perda de equilíbrio, tropeços ou balanços, sinais de fraqueza e incoordenação, sendo recidivantes e remitentes (Graesser et al., 2006; Judah e Nuttall, 2008). Os sinais tornam-se progressivamente mais graves durante a evolução do quadro, incluindo quedas constantes para um lado, tremores, escoliose, atrofia muscular e disfagia (Gibson et al., 2008). Já no estágio mais avançado da doença, o animal evolui para tetraplegia, estase intestinal e retenção de urina, tendo sua qualidade de vida ainda mais comprometida, até culminar em paralisia completa, a qual ocorre em até 15 meses após o início dos sinais clínicos (Palmer et al., 1998; Gibson et al., 2008; Judah e Nuttall, 2008). Todos os sinais clínicos e a evolução da doença descritos na literatura corroboram os achados em nosso relato. Apesar do sinal clínico de paralisia progressiva ser compatível com a Síndrome de Wobbly, é necessário sempre pensar no diagnóstico diferencial, como quadros virais, formações em sistema nervoso, doença do disco intervertebral e encefalopatia hepática (Vizoso e Thomas, 1981; Graesser et al., 2006). As doenças do disco intervertebral também são progressivas e envolvem a degeneração de um ou mais discos intervertebrais e exames de imagem e histopatológico do tecido nervoso são fundamentais para a diferenciação 125 Filho K. et al. das duas moléstias (Raymond et al., 2009). Nakata et al. (2011) relataram caso de astrocitoma em Hedgehog de 28 meses de vida, cuja suspeita inicial foi Síndrome de Wobbly, mas ao exame necroscópico revelou-se neoplasia. Quadros virais causados por morbilivirus foram relatados em exemplares de Hedgehogs europeus (Erinaceus europeus), que apresentavam sinais neurológicos como andar em círculos e quedas constantes. Os resultados sorológicos e histológicos apontaram para o vírus da cinomose canina (Vizoso e Thomas, 1981). A confirmação da suspeita diagnóstica de Síndrome de Wobbly é obtida apenas no exame post-mortem, através de avaliação histopatológica do sistema nervoso central. As lesões histológicas primárias mostram vacuolizações dos tratos de substância branca do cérebro, cerebelo e tronco cerebral, sem sinais inflamatórios (Graesser et al., 2006; Heatley, 2009). No presente caso, observou-se vacuolização de substância branca, além de gliose focal. Outro achado microscópico descrito por Graesser et al. (2006) são lesões de sistema musculoesquelético, caracterizadas por atrofia neurogênica dos miócitos, sem sinais inflamatórios, corroborando mais uma vez com nossos achados. O tratamento mais comumente relatado é de suplementação com vitamina E, selênio, vitamina B, e/ou xarope de cálcio, para eliminar uma possível desordem nutricional como causa da doença. Tratamentos com glicocorticóides, interferon beta-1a, fisioterapia, acupuntura e homeopatia também são descritos, porém sem eficácia comprovada. Nenhum protocolo demonstrou-se capaz de interromper ou controlar totalmente a progressão da Síndrome de Wobbly (Graesser et al., 2006; Lennox, 2007; Heatley, 2009). A utilização de nutracêuticos como o sulfato de condroitina pode diminuir a inflamação de articulações causadas por osteoartrose de origem neurogênica em cães (Hellyer et al., 2007). Acreditamos que seja uma alternativa que propicia um conforto para o animal que apresenta os estágios iniciais da doença. Apesar dos tratamentos possibilitarem uma estabilidade temporária do quadro, reduzindo discretamente os sinais da doença, ressaltamos que os mesmos podem ser recidivantes e remitentes, não tendo nenhuma relação tratamento/estabilidade da doença. A progressão da doença, apesar da idade média de 15 meses até o óbito, descrita na literatura, ocorreu em apenas três meses desde os primeiros tremores relatados pelo proprietário, até o estado de tetraplegia. Conclusão Os achados clínicos, juntamente à ausência de alterações hematológicas ou radiográficas, atuaram como um importante diagnóstico diferencial no presente relato. O tratamento preconizado mostrou-se pouco eficiente perante o quadro clínico do paciente, definindo um prognóstico desfavorável. O diagnóstico definitivo 126 RPCV (2015) 110 (593-594) 124-126 só pôde ser obtido através do exame post-mortem, através de achados histopatológicos. Bibliografia Banks RE, Sharp JM, Doss SD, Vanderford DA (2009). Exotic small mammal care and husbandry. Ames: John Wiley and Sons, 161-174. Gibson CJ, Parry NMA, Jakowski RM, Eshar D (2008). Anaplastic Astrocytoma in the Spinal Cord of an African Pygmy Hedgehog (Atelerix albiventris). Veterinary Pathology Online, 45(6), 934-938. Graesser D, Spraker TR, Dressen P, Garner MM, Raymond JT, Terwilliger G, Madri JA (2006). Wobbly hedgehog syndrome in African pygmy hedgehogs (Atelerix spp.). Journal of Exotic Pet Medicine, 15 (1), 59-65. Heatley JJ (2009). Hedgehogs In: Manual of Exotic Pet Practice. St Louis: Elsevier/Saunders, 433-455. Hellyer P, Rodan I, Brunt J, Downing R, Hagedorn JE, Robertson SA (2007). AAHA/AAFP Pain management guidelines for dogs and cats. Journal of Feline Medicine & Surgery, 9 (6), 466-480. Judah V, Nuttall K (2008). Exotic Animal Care & Management. Clifton Park: Thomson Delmar Learning, 69-77. Lennox AM (2007). Emergency and Critical Care Procedures in Sugar Gliders (Petaurus breviceps), African Hedgehogs (Atelerix albiventris), and Prairie Dogs (Cynomys spp). Veterinary Clinics of North America: Exotic Animal Practice, 10(2), 533555. Nakata M, Miwa Y, Itou T, Uchida K., Nakayama H, Sakai T (2011). Astrocytoma in an African hedgehog (Atelerix albiventris) suspected wobbly hedgehog syndrome. The Journal of veterinary medical science/the Japanese Society of Veterinary Science, 73(10), 1333-1335. Palmer AC, Blakemore WF, Franklin RJM, Frost LM, Gough, RE, Lewis JCM., Stocker LR (1998). 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