A iMPORTÂNCiA DAS MiNHOCAS NOS

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A iMPORTÂNCiA DAS MiNHOCAS NOS
Iv
A IMPORTÂNCIA DAS MINHOCAS
NOS ECOSSISTEMAS TERRESTRES
4. A importância das minhocas nos ecossistemas terrestres
4.1. Benefícios para o solo e agricultura
Charles Darwin, o pai da teoria da «Evolução das Espécies», dedicou mais de 40 anos da sua vida
ao estudo das minhocas, tendo sido o primeiro a demonstrar o seu papel na Natureza através do
livro «A formação do húmus através da ação das minhocas», publicado em 1881.
No solo, a atividade das minhocas permite aumentar o volume de espaço poroso de 8 a 30%,
podendo meio hectare conter mais de 3 milhões de indivíduos e serem processadas aproximadamente 8 a 10 toneladas de materiais orgânicos por ano nesta área de camada arável. Este número
de minhocas poderá apresentar em peso aproximadamente 1,5 t.
As minhocas mineralizam azoto, fósforo e outros elementos de natureza orgânica e mineral
convertendo-os em formas mais facilmente assimiláveis pelas plantas, transformando, em curtos
períodos de tempo 20 a 200 kg de azoto por hectare, e aumentando os seus teores em mais de
85% (Patil, 1993). Após 28 semanas, um hipotético solo contendo minhocas apresentará 75 ppm
em azoto nítrico comparativamente a 45 ppm num solo sem minhocas. As minhocas aumentam
estes teores através do seu metabolismo e de produtos daí resultantes como os excrementos,
muco, fluidos corporais, enzimas e tecidos de outras minhocas mortas (Dash & Patra, 1979).
Para Satchell & Martin (1984), a passagem dos resíduos orgânicos pelo trato intestinal da mi-
21
v VERMICOMPOSTAGEM
(gasolina, elétricos ou diesel) diversas, bem como capacidade de trituração variável. Os
modelos elétricos (figura 10) e os a gasolina são indicados para operações de pequena e
média dimensão como na trituração de resíduos alimentares, papel, cartão, folhas secas
ou resíduos de jardim. Os modelos a diesel, designados por «woodchippers» (figura 11),
possibilitam a trituração de elevadas quantidades de resíduos agrícolas e florestais, podendo produzir em contínuo aproximadamente 5 m3 de estilha triturada por hora.
Figura 10 – Aspeto de um
Figura 11 – Aspeto de um woodchipper.
biotriturador de jardim.
–– Mistura:
Consiste na mistura de dois ou mais materiais com o objetivo de melhorar química,
física e microbiologicamente a qualidade do substrato final. Como iremos analisar, para
que a mistura seja o mais criteriosa possível, é necessário o conhecimento da densidade aparente dos materiais utilizados, sendo esta tanto maior quanto menor for a
sua natureza estruturante, ou seja, quanto menor for o seu teor em celulose e lenhina,
encontrando-se este parâmetro relacionado indiretamente com a porosidade total.
–– Adição/incorporação de elementos estruturantes:
Consiste na incorporação de diversos materiais secos que contenham quantidades apreciáveis de carbono facilmente biodegradável e que apresentem carácter
estruturante, e em proporções de 1/2 a 2/1 v v-1 entre o material estruturante e o
43
v VERMICOMPOSTAGEM
Os crivos em malha circular permitirão uma remoção mais segura de algumas minhocas
que se encontrem presentes no vermicomposto, contrariamente aos de natureza quadrangular, que poderão ferir e inviabilizar as mesmas para os processos subsequentes.
É frequente na horticultura familiar optar-se pela eliminação da operação de crivagem,
aplicando-se o vermicomposto apresentando materiais acima da granulometria exigida,
sobretudo os de natureza celulósica e lenhocelulósica (figura 16).
Figura 16 – Amostra de vermicomposto não crivado.
Caso se proceda à utilização do vermicomposto para produção de extrato ou chá, este
deverá ser crivado em malhas compreendidas entre 0,5 a 2,0 mm, de modo a que a dimensão das partículas crivadas facilite a extração dos nutrientes. Na preparação de substratos de cultivo em algumas culturas, para facilitar o arejamento das raízes e a correta
drenagem de água, é frequente o vermicomposto – quando aplicado a 100% – não ser
crivado, evitando-se potenciais situações de compactação.
Durante a crivagem de uma amostra de vermicomposto, obtiveram-se os seguintes valores de materiais recolhidos, correspondendo cada uma das fases a um diâmetro distinto
de malha (quadro 17).
49
v VERMICOMPOSTAGEM
Os excrementos possuem elevada superfície em relação ao seu volume, aumentando
consequentemente a taxa de decomposição (Lavelle et al., 1997; Lavelle & Spain, 2001) dos
substratos, razão pela qual, após colonizados, os resíduos se decompõem a taxas elevadas.
São pobres em argila e ricos em matéria orgânica, nitratos, fósforo, potássio, cálcio e magnésio, apresentando elevada capacidade de troca catiónica e saturação em bases (Kiehl, 1985).
Apresentam em média 70% mais nutrientes que o húmus produzido em condições não controladas no solo. Como analisámos, as minhocas possuem glândulas calcíferas, facilitando
a correção do pH dos substratos, pelo que os valores nos excrementos serão neutros ou
próximos da neutralidade (Longo, 1987).
Figura 29 – Amostra de excrementos de minhoca.
Uma vez que o vermicomposto apresenta com frequência elevados teores de materiais
orgânicos de natureza celulósica ou lenhocelulósica parcialmente decompostos e materiais
de origem antropogénica, a percentagem de excrementos de minhoca não deverá ser inferior
a 60% em volume, sob pena de reduzir o teor em nutrientes assimiláveis no vermicomposto.
Em termos de nutrientes, os excrementos contêm nutrientes em teores necessários para a
germinação, crescimento e desenvolvimento das culturas, pelo que a aplicação de 4 a 10 kg
m-2 de excrementos permitirá aumentos de produções relativamente à aplicação de 100 kg
de N m-2 (Saciragic et al, 1986) recorrendo-se a outros fertilizantes. Para além desse aspeto,
os excrementos permitem o aumento do peso seco da planta.
67
Manual de vermicompostagem e vermicultura para a Agricultura orgânica
5.7.2. Vermicomposto
O vermicomposto é o principal produto da vermicompostagem, podendo ser produzido em menor escala na vermicultura. Da ingestão dos resíduos por parte das minhocas, aproximadamente
60% são expulsos na forma de excrementos e materiais não ingeridos por estas. Fora do trato
digestivo das minhocas e em estado avançado de decomposição, os dejetos originam o vermicomposto, rico em nutrientes, fauna microbiana, hormonas de crescimento vegetal e enzimas.
Figura 30 – Amostra de vermicomposto.
O vermicomposto apresenta elevadas taxas de mineralização (em particular azoto amoniacal e nítrico), sendo para o autor entendido como o material enriquecido com os excrementos
das minhocas, em conjunto com matéria orgânica decomposta mas não ingerida por estas,
contendo, nas condições adequadas de humidade, intensa atividade microbiana. Alguns autores, grande parte da população em geral e até a grande maioria dos vermicultores denominam
o vermicomposto de «húmus de minhoca». Contudo, o termo encontra-se cientificamente
incorreto, podendo, pelo facto de apresentar um teor em matéria orgânica entre 30 e 70% e
esta conter húmus na sua constituição, levar a esta incorreta interpretação.
O vermicomposto, como matéria sólida, não poderá ser aplicado na forma foliar, embora
possa ser convertido na forma dos subprodutos como o lixiviado, o extrato ou o chá de
vermicomposto. O vermicomposto poderá ainda ser preparado fisicamente para uma aplicação mais eficaz, sendo a peletização uma solução que permite uma utilização ainda mais
prolongada dos nutrientes por parte da cultura.
Para identificação do vermicomposto poderão ser utilizados critérios científicos e empíricos (quadro 22).
68
v VERMICOMPOSTAGEM
O tempo de recirculação poderá variar entre 3 a 5 horas, dependendo da humidade e porosidade do vermicomposto. Em alguns casos, o período para recirculação poderá ultrapassar as 72
horas. Devido ao arejamento, poderão vir a desenvolver-se comunidades microbianas aeróbias.
Extrato não arejado:
No extrato não arejado, os nutrientes são removidos do vermicomposto sem recurso a arejamento manual e artificial, podendo facilmente adquirir condições anaeróbias caso o processo
se realize para além de 48 horas, sobretudo se o vermicomposto apresentar materiais orgânicos por decompor. Nestes casos, ainda que ocorra um arejamento natural, a concentração de
oxigénio irá gradualmente diminuir devido ao seu consumo pelos microrganismos aeróbios
presentes, podendo vir a desenvolver-se comunidades anaeróbias. Neste extrato, a única fonte
de arejamento provém das trocas de oxigénio ar-água.
Extrato anaeróbio:
Neste extrato, a concentração de oxigénio decresce rapidamente, uma vez que ocorre a utilização dos nutrientes adicionados para crescimento de microrganismos aeróbios. Tal como no
extrato não arejado, não existe arejamento artificial, não sendo o arejamento natural suficiente
para manter o meio oxidante e rico em oxigénio. Este tipo de soluções são consequência dos
extratos não arejados.
5.7.5. Chá de vermicomposto
No chá, as soluções são mantidas exclusivamente em meio aeróbio com recurso, normalmente,
a agitação e arejamento mecanizados. Contudo, em menores escalas de produção, a agitação
e arejamento poderão ser manuais. Para além dos nutrientes provenientes do vermicomposto, são incorporados nutrientes adicionais, de modo a incrementar o crescimento microbiano
aeróbio. A sua produção é dada pela reação (9):
Vermicomposto + água + nutrientes + oxigénio
tempo
Chá
(9)
As características do chá poderão variar em função de:
a) Natureza do vermicomposto:
A origem e natureza dos resíduos, bem como as características dos sistemas de tratamento, poderão contribuir para a qualidade do vermicomposto. Um teor residual de microrganismos patogénicos no vermicomposto extraído, na presença de nutrientes adicionais (ver
alínea c)), poderá originar na solução um crescimento exponencial destas populações.
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Manual de vermicompostagem e vermicultura para a Agricultura orgânica
a permitir a duplicação das populações entre cada 60 a 90 dias, dependendo da época do
ano. Densidades mais baixas do que as indicadas reduzirão bastante a frequência de acasalamento, tornando pouco rentável o processo. Contrariamente, densidades mais elevadas
impossibilitarão que as populações se dupliquem com a devida celeridade e que cada indivíduo atinja o peso ideal entre 0,5 e 1,0 g no estado adulto.
Na vermicultura, o conceito de «unidade de tratamento» é substituído pelo conceito
de «unidade matriz», uma vez que se origina o desenvolvimento de populações segundo
uma população inicial. Tal como na vermicompostagem, é produzido vermicomposto, embora como segundo objetivo, possuindo frequentemente um maior valor fertilizante em
função do maior tempo de retenção na unidade devido sobretudo ao maior período para
mineralização, bem como à menor relação C/N exigida para os substratos. Na vermicultura
é frequente recorrer-se ao L para quantificação das minhocas recolhidas. Tendo em conta
que na vermicompostagem 1 kg de minhocas no estado adulto apresentará como vimos,
aproximadamente 1800 indivíduos, na vermicultura, 1 L de volume apresentará aproximadamente 1300 indivíduos, numa variação em peso de 0,55 para 0,7 g, respetivamente. Tal
como na vermicompostagem, em Portugal, são utilizadas as espécies Eisenia fetida ou
Eisenia andrei (figura 45).
Figura 45 – Aspeto de minhocas Eisenia fetida.
Para uma quantidade hipotética e crescente de minhocas, admitindo-se uma quantidade
de resíduo fixo, a disponibilidade por alimento seguirá uma proporcionalidade inversa, ou
seja, para uma maior densidade de minhocas, a disponibilidade por alimento por minhoca
122
vi vermicultura
(1983), lhe conferem potencial para substituição da farinha de peixe em rações comerciais.
Neste caso particular, a farinha produzida a partir do género Eisenia spp. poderá apresentar
até 78% de proteína.
Em ensaios realizados com diversos mamíferos, aves e peixes, não foram encontrados
efeitos inibidores quando foram alimentados com minhocas vivas ou farinha proveniente destas (Ibáñez et al., 1993; Taboga, 1980; Hilton, 1983; Tacon et al., 1983; Nandeesha et al., 1988).
Contudo, ainda não foram obtidas conclusões acerca de possíveis fatores antinutricionais que
possam estar presentes na farinha.
6.6. Processamento das minhocas
Têm sido desenvolvidos diversos trabalhos com vista ao processamento das minhocas para complemento da alimentação animal (Edwards et al., 2010). A escolha do método levará em linha de
conta os seguintes aspetos:
¤¤ Necessidade nutritiva do animal.
¤¤ Custo de produção.
¤¤ Perda mínima em matéria seca, relacionada com o rendimento de produção em g de produto
seco 100 g-1 de peso fresco.
¤¤ Perda mínima em valor nutritivo.
Em qualquer dos métodos apresentados, as minhocas deverão apresentar o trato intestinal
limpo, pelo que, após recolhidas da unidade de vermicultura, deverão ser lavadas com água destilada e colocadas em algodão humedecido de modo a poderem ser libertados os excrementos. A
hemolisina, substância capaz de promover a destruição dos glóbulos vermelhos e a libertação da
hemoglobina no sangue, é uma das cinco principais proteínas encontradas no líquido celomático
da minhoca Eisenia fetida, admitindo-se que seja um fator antinutricional que, segundo Roch et al.,
(1981) e Nandeesha et al., (1988), poderá ser destruído pela ação do calor, razão pela qual se aconselha o aquecimento prévio das minhocas. Para além deste aspeto, acredita-se que a hemolisina
presente nas minhocas possua propriedades antibacterianas, sendo utilizado na defesa destas
contra organismos patogénicos presentes no solo (Roch et al., 1981).
Num primeiro método as minhocas são colocadas em água a ferver durante 60 segundos,
incorporando-se de seguida 30% de melaço e 0,3% de sorbato de potássio19 formando-se
uma pasta. A ação do melaço reduz a atividade da água20, reduzindo o sorbato de potássio
19
Sal de potássio do ácido sórbico, conservante bacteriano e fúngico, inibidor de crescimento de bolores e leveduras e utilizado
na alimentação como conservante.
131
vi vermicultura
90 dias, até ao seu estabelecimento em 6400 minhocas. O crescimento registado poderá ser
descrito por uma curva exponencial, admitindo-se que durante 540 dias o volume do sistema
acompanha o aumento da população.
População (n.º indivíduos)
Crescimento populacional
7.500
6.400
6.000
4.500
3.200
3.000
1.500
0
1.600
100
200
400
0
1
2
800
3
4
5
6
Tempo: grupos de 3 meses
Figura 52 – Crescimento populacional de minhocas com o decorrer do tempo.
Recorrendo a estrume suíno e à espécie Eisenia andrei, Domínguez & Edwards (1997)
obtiveram em função dos valores iniciais de humidade e densidade de indivíduos diferentes
taxas de crescimento de biomassa, tendo os maiores valores de µ em mg dia-1 sido obtidos
quando se mantiveram os teores de humidade em 85%.
Quadro 50 – Produção de biomassa de minhocas em função dos valores de humidade nos resíduos
(fonte: Domínguez & Edwards, 1997).
Biomassa
H (%)
µ (mg dia-1)
Valor máximo por
unidade (mg) ± EP
Valor médio de
maturação por unidade (mg) ± EP)
65
5,80
335 ± 72a
268 ± 12a
70
7,02
379 ± 90a
295 ± 15a
75
7,77
391 ± 90a
304 ± 12a
80
11,47
537 ± 162b
467 ± 36b
85
11,81
608 ± 181c
468 ± 31b
90
9,93
515 ± 149b
449 ± 46b
Médias com a mesma letra não apresentam diferenças significativas a p < 0,05.
139
vii DESCRIÇÃO DETALHADA DOS PRODUTOS E SUBPRODUTOS
Quadro 56 – Caracterização química de um extrato arejado.
Parâmetro
Valor
Unidade
0,26 ± 0,01
%
2,3 ± 0,06
mg L-1
Azoto nítrico – nitritos (N-NO2-)
0,23 ± 0,02
mg L-1
Azoto nítrico – nitratos (N-NO3 )
38,6 ± 0,2
mg L-1
Fosfato (PO43-)
57,0 ± 0,3
mg L-1
Fósforo solúvel
2,2 ± 0,3
mg L-1
Potássio solúvel* (K+)
104,8 ± 0,1
mg L-1
Potássio solúvel (K2O)
35,2 ± 0,2
mg L-1
Cálcio solúvel* (Ca2+)
17,4 ± 0,03
mg L-1
Magnésio solúvel (Mg2+)
5,89 ± 0,3
mg L-1
Sulfato (SO4 )
1106 ± 2
mg L-1
Sódio solúvel* (Na+)
29,6 ± 0,3
mg L-1
Ácidos húmicos (AH)
0,56 ± 0,03
mg L-1
Ácidos fúlvicos (AF)
154,7 ± 0,02
mg L-1
Relação AH/AF
4,0*10-3
–
*
Arsénio solúvel
nd
mg L-1
Cádmio solúvel*
nd
mg L-1
Crómio solúvel
nd
mg L-1
Chumbo solúvel*
nd
mg L-1
Níquel solúvel
nd
mg L-1
Mercúrio solúvel*
nd
mg L-1
Boro solúvel*
0,31 ± 0,03
mg L-1
Cobre solúvel
0,030 ± 0,005
mg L-1
0,35 ± 0,01
mg L-1
Manganésio solúvel
nd
mg L-1
Molibdénio solúvel*
nd
mg L-1
Alumínio solúvel*
3,40 ± 0,06
mg L-1
Azoto total (N)
Azoto amoniacal (N-NH4 )
+
-
*
**
2-
*
*
*
Ferro solúvel*
*
*Em água-régia.
**Em água.
nd: Não determinado. Abaixo do limite de deteção de: Fósforo solúvel: 0,01 mg L-1. Arsénio solúvel: 0,06 mg L-1.
Cádmio solúvel: 0,001 mg L-1. Crómio solúvel: 0,01 mg L-1. Chumbo solúvel: 0,03 mg L-1. Níquel solúvel: 0,02 mg L-1.
Mercúrio solúvel: 0,01 mg L-1. Manganésio solúvel: 0,06 mg L-1. Molibdénio solúvel: 0,04 mg L-1.
151
vii DESCRIÇÃO DETALHADA DOS PRODUTOS E SUBPRODUTOS
através da simbiose entre microrganismos e estas mesmas espécies, com estas últimas
apresentando valores próximos de 1,0 kg de biomassa m-2. Os resíduos são adicionados e
estabilizados periodicamente por camadas entre 0,5 a 2,5 cm, de acordo com a natureza e
capacidade de tratamento do sistema. Do processo é produzido de forma periódica o vermicomposto.
¤¤ Excremento de minhoca:
Material orgânico biologicamente estável produzido na vermicompostagem e vermicultura durante o processo de digestão dos resíduos de natureza vegetal e/ou animal pelas
minhocas, sendo constituído unicamente pelos seus dejetos.
¤¤ Vermicomposto:
Material orgânico produzido na vermicompostagem e vermicultura durante o processo
de digestão dos resíduos de natureza vegetal e/ou animal, sendo constituído por uma
proporção entre os excrementos de minhocas e os resíduos orgânicos decompostos mas
não digeridos por estas e num valor nunca inferior a 80% em peso entre o primeiro e o
segundo material, podendo, para aplicação ao solo e às culturas, encontrar-se nas formas
pulverulenta, granular ou peletizada.
7.3.1.3. Especificações para aplicação ao solo
Nesta secção são fixados critérios para a utilização do vermicomposto e as restrições de
modo a evitar eventuais efeitos indesejáveis para o solo, água, plantas, animais e saúde pública resultantes da sua aplicação, bem como para os resíduos utilizados na sua produção. São
definidas três classes diferentes do produto em função de indicadores de qualidade, podendo
os vermicompostos ser produzidos em vermicompostagem, vermicultura ou em ambas as
situações:
¤¤ Vermicomposto de classe 1, que pode ser utilizado em agricultura orgânica, quer na produção de extratos arejados e de chá de vermicomposto.
¤¤ Vermicomposto de classe 2, em que a sua aplicação não deverá exceder a quantidade
máxima de nutrientes respetiva de: 170 kg ha-1 de N-total, 100 kg ha-1 de P2O5 e 200 kg ha-1
de K2O.
¤¤ Vermicomposto de classe 3, com qualidade mínima obrigatória e que cumpre os valores
limite para utilização agrícola, florestal ou recuperação de solos, estabelecidos pela legislação portuguesa ou diretivas comunitárias. Deverá cumprir os requisitos relativamente ao
teor de humidade, granulometria, matéria orgânica, pH, condutividade elétrica e número
155
Manual de vermicompostagem e vermicultura para a Agricultura orgânica
de modo a evitar efeitos indesejáveis para o solo, água, plantas, animais e saúde pública.
Deste modo, com base em indicadores de qualidade, são identificadas e especificadas três
tipologias de subprodutos que poderão ser produzidos a partir de vermicompostos provenientes de vermicompostagem, vermicultura ou ambas, sendo a classificação respetivamente:
¤¤ Lixiviado de vermicomposto produzido unicamente a partir de vermicomposto, podendo
conter uma fração de material orgânico em decomposição que não comprometa a qualidade do solo e das culturas.
¤¤ Extrato arejado de vermicomposto, produzido unicamente a partir de vermicomposto.
¤¤ Chá de vermicomposto produzido a partir de vermicomposto e de nutrientes adicionais.
A proposta encontra-se dividida em quatro categorias que quantificam a natureza dos parâmetros a analisar. Cada categoria encontra-se estruturada segundo parâmetros, respetivas
unidades de medição e valor ou conjunto de valores expectáveis:
a)
H e condutividade elétrica.
b) Teor em matéria orgânica, húmus e macronutrientes minerais dissolvidos.
c) Metais pesados expressos em relação à matéria seca.
d) Microbiologia.
7.3.2.2. Definição dos processos produtivos e dos produtos obtidos
¤¤ Lixiviação (aplicável à vermicompostagem e vermicultura):
Percloração da água pela massa de resíduos e do vermicomposto, arrastando consigo nutrientes dissolvidos e em suspensão em quantidades mais ou menos variáveis em função
da rega, precipitação ou humidade existente nos resíduos.
¤¤ Extração natural de nutrientes:
Remoção de nutrientes do vermicomposto num recipiente ou saco de extração por ação
da água sem recurso a meios humanos ou mecanizados e por um período compreendido
entre 48 a 96 horas, difundindo-os para uma solução aquosa em concentrações variáveis,
de acordo com o período de processo e da temperatura do meio.
¤¤ Extração artificial de nutrientes:
Remoção de nutrientes do vermicomposto num recipiente ou saco de extração por ação
da água com recurso a meios humanos ou mecanizados e por um período compreendido
164
vIiI
APLICAÇÃO DOS FATORES DE PRODUÇÃO
8. Aplicação dos fatores de produção
8.1. Vermicomposto
8.1.1. Introdução
Na agricultura orgânica, os fertilizantes orgânicos sólidos, como já analisámos, são aplicados
com a finalidade de fornecer nutrientes ao solo, melhorar a sua estrutura, reação, capacidade
de retenção/circulação de água e capacidade de troca catiónica, podendo dividir-se em fertilizantes e substratos de cultivo, condicionadores ou suportes de cultura, dependendo dos
respetivos teores em matéria orgânica e N, P2O5 e K2O totais presentes, incluindo N orgânico.
Os fertilizantes, de acordo com o teor em macronutrientes, poderão ser definidos por adubos ou corretivos – nas formas pulverulenta, granular ou em peletes. Quanto aos substratos,
encontram-se unicamente no estado sólido.
Nos fertilizantes, os macronutrientes são frequentemente identificados como unidades
fertilizantes NPK indicando os teores expressos em percentagem de azoto (como N), fósforo
(como P2O5) e potássio (como K2O). Admitindo-se que um vermicomposto apresenta uma proporção 3-1-1, possuirá 3 vezes mais azoto, que fósforo ou potássio, apresentando estes dois
o mesmo teor. Nos substratos, o teor em nutrientes é normalmente apresentado em ppm ou
171
Manual de vermicompostagem e vermicultura para a Agricultura orgânica
sensíveis à compactação e eventualmente salinidade, aconselha-se a mistura com areia,
turfa de germinação ou perlite23, numa relação de 3:1 em volume, sobretudo em recipientes de volume superior a 10 L. Este método permitirá evitar a compactação e o decréscimo dos teores em oxigénio, em parte por o vermicomposto apresentar elevada superfície
específica e capacidade de retenção de água (Lourenço, 2010).
Figura 62 – Aplicação do vermicomposto
Figura 63 – Aplicação do vermicomposto
na germinação de espinafre (Spinacia oleracea).
na germinação de manjericão (Ocimum basilicum).
Figura 64 – Aplicação do vermicomposto na germinação
de tomilho (Thymus, spp.).
23
Material de origem vulcânica, proporcionando arejamento e adequada drenagem de água, nas condições em que se justifique.
Em germinação, e sob condições consideradas como normais, a sua mistura com o vermicomposto não se justifica.
178
ix
PLANEAMENTO DA FERTILIZAÇÃO
9. Planeamento da fertilização
9.1. Enquadramento e objetivos
Todas as culturas, durante as diferentes fases do seu ciclo vegetativo, exportam nutrientes do
solo e dos fertilizantes eventualmente nele aplicados, de acordo com as exigências culturais.
Para que exista um equilíbrio entre os inputs e os outputs de nutrientes estes deverão ser
restituídos ao solo após as colheitas. Para que não ocorra neste um desequilíbrio de nutrientes, é aconselhado que os índices de matéria orgânica possam, através da mineralização,
fornecer os nutrientes que foram exportados. Quando tal não acontecer, o solo entrará num
processo de desequilíbrio entre as quantidades exportadas e as quantidades disponíveis,
sendo frequente nestes casos a utilização de matérias fertilizantes.
O planeamento da fertilização envolve a quantificação no solo dos teores em N provenientes da matéria orgânica, dos teores de P2O5 e K2O assimiláveis disponíveis em boletins
de análises do solo (terras), e dos teores em N, P2O5 e K2O provenientes do vermicomposto,
permitindo deste modo:
¤¤ Identificar possíveis carências nutricionais no solo em função das exportações realizadas
pelas culturas.
193
ix PLANEAMENTO DA FERTILIZAÇÃO
Quando necessário, a quantidade de vermicomposto a aplicar ao solo será função do balanço efetuado, estimando-se o seu valor de acordo com a seguinte expressão (48):
V (t ha-1) = Mn / 1000 / (n * IC * MS)
(48)
V: Quantidade de vermicomposto.
Mn: Quantidade de nutriente a aplicar (kg ha-1).
n: Teor do nutriente na matéria seca (%).
IC: Índice de conversão do nutriente (%).
MS:Percentagem de matéria seca do vermicomposto (%).
Chama-se a atenção do leitor de que poderá recorrer às expressões acima indicadas de
acordo com as suas necessidades, nomeadamente com a quantidade de resíduos que prevê
recolher, a quantidade de vermicomposto que pretende produzir e as necessidades das culturas que possui na exploração agrícola.
9.4. Casos práticos
9.4.1. Produção de alface (Lactuca sativa)
Pressupostos:
Admite-se que um produtor deseje produzir 30 t ha-1 de alface com necessidades de 75,5 kg N
ha-1, 30 kg de P2O5 ha-1 e 180 kg K2O ha-1 numa área de cultivo situada em Cacela, no Algarve. A
partir das informações recolhidas, que quantidade de vermicomposto será necessário aplicar?
¤¤ Percentagem de terra fina (tf): 100%.
¤¤ Profundidade da camada arável do solo: 0,3 m.
¤¤ Dap do solo: 1400 kg m-3.
¤¤ Percentagem em MO: 0,44%.
¤¤ Percentagem de azoto presente na MO: 3%.
¤¤ Taxa de mineralização mínima do azoto existente na MO durante 6 meses: 1,5%.
¤¤ Teor em fósforo assimilável: 37 ppm (mg kg-1).
¤¤ Teor em potássio assimilável: 288 ppm (mg kg-1).
¤¤ Percentagem de matéria seca no vermicomposto: 70%.
¤¤ N.° meses em que a cultura permanece no solo antes da colheita: 3.
197