história de frei miguelinho - Liber
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centro de estudos de história municipal HISTÓRIA DE FREI MIGUELINHO O BANDOLEIRO/ A FONTE E O FRADE SEVERINO R. DE MOURA biblioteca pernambucana de história municipal 15 Tem o Centro de Estudos de Historia Municipal, da FIAM, especial alegria na publicação deste livro. Imaginado inicialmente para divulgar originais já escritos mas com dificuldades de publicação, logo as atividades do CEHM ganharam outro vulto com o surgimento de pesquisadores que se sentiram estimulados seja a desdobrar ou concluir suas investigações, seja a reduzí-las a texto corrido. Apareceram-nos, assim, trabalhos novíssimos, que não teriam vindo à luz, se não fosse a existência do Centro. Será o caso do livro sobre Ouricuri, de Raul Aquino, ou deste aqui, sobre Frei Miguelinho, Município só há bem pouco emancipado, em 1964, mas , que, graças a Severino Moura, Já pode contar sua caminhada. E o segundo livro do autor. No primeiro, "Memórias de um camponês", ele contou sua própria história — a epopeia de um "curumba" que vai ascendendo na vida, a partir de paupérrimos começos, tendo feito da educação dos filhos o ideal supremo e da retidão e da integridade pessoal, a regra máxima de seu viver. Agora, Severino Moura nos vem relatar a história de sua terra, desenvolvida em torno de uma fonte de águas cristalinas, nas cercanias do riacho Topada, afluente do Capibaribe. E "a fonte" do expressivo subtítulo e primeira parte do livro. As duas outras partes tratam da biografia de dois importantes personagens da história pernambucana, separados no tempo, por todo um século, e nas vocações, sendo um frade e o outro, cangaceiro, mas aproximados seja nas agitações que promoveram, e agitações armadas (de diferentes inspirações, é certo), seja na ligação a Frei Miguelinho. "O frade", a que Mário Melo recorreu para rebatizar o Município, antigamente chamado de Olho d'Agua da Onça, é o importante Frei Miguel Joaquim de Almeida Castro, do movimento de 1817: acossado pelas forças governamentais, ele teria ido parar no território do Município onde, segundo carta lenda, enterrou valioso canhão que Já não mais podia transportar, uma vez que precisara abater alguns animais para o sustento da tropa. "O bandoleiro" é o famoso Antônio Silvino, Manoel Batista de Morais que, segundo Severino Moura, "viveu constantemente nas fazendas vizinhas do povoado". Nem tudo, no entanto, são violências e sangue na história de Frei Miguelinho: enquanto o frade via desabar sua revolução, os Irmãos Moura abriam campos para criação de gado, nos quais se iriam erguer as casinhas, as lojas, a igreja, o cemitério, o povoado todo. Severino Moura cuida de tudo isso: não só dos fatos extraordinários, as revoluções, a agitação, mas também da rotina árdua e maçante do dia-a.dia, e mergulha num levantamento, decerto incompleto mas, sem dúvida, Já precioso, até da genealogia das principais famílias que povoaram a região. José Luiz Delgado HISTÓRIA DE FREI MIGUELINHO O BANDOLEIRO, A FONTE E O FRADE Governador do Estado de Pernambuco JOSÉ MUNIZ RAMOS Secretário de Planejamento ELIESER MENESES DOS SANTOS Fundação de Desenvolvimento Municipal do Interior de Pernambuco EVANDRO SANTOS NASCIMENTO Moura, Severino Rodrigues de História de Frei Miguelinho. Recife, FIAM/Centro de Estudos de História Municipal, 1982. 190 p. (Biblioteca Pernambucana de História Municipal, 15) I. Frei Miguelinho História. I FIAM/CEHM, Recife. II. Título. FIAM/DDRR/DI/SD C.D.U. 981.342(813.4) HISTÓRIA DE FREI MIGUELINHO O BANDOLEIRO/ A FONTE E O FRADE Severíno Rodrigues de Moura biblioteca pernambucana de história municipal CENTRO DE 15 ESTUDOS DE HISTÓRIA MUNICIPAL RECIFE — 1983 VOLUMES PUBLICADOS BIBLIOTECA PERNAMBUCANA DE LITERATURA MUNICIPAL 1 — HISTÓRIA DE VITÓRIA DE SANTO ANTÃO ( 1º VOLUME: 16261843) — JOSÉ ARAGÃO. 2 — CABOCLOS DO URUBA (CAMINHOS E PERSONALIDADES DA HISTÓRIA DE PESQUEIRA) — NELSON BARBALHO. 1— JABOATÃO DOS MEUS AVÓS — VAN-HOEVEN VELOSO. 2— CANHOTINHO — COSTA PORTO. 3— HISTÓRIA DE LAGOA DOS GATOS — (lº. VOL. — JOÃO PEREIRA CALLADO. 6, 7 e 8 — ROTEIRO DE VELHOS E GRANDES SERTANEJOS — LUIZ WILSON. 9 — PESQUEIRA E O ANTIGO ALMEIDA MACIEL. TERMO DE CIMBRES — JOSÉ DE 10 — PETROLINA NO TEMPO, NO ESPAÇO, NA VEZ — António de Santana Fadilha. 13 — CARUARU: DE VILA A CIDADE — NELSON BARBALHO 14 — OURICURI: HISTÓRIA E GENEALOGIA — RAUL AQUINO TEMPO MUNICIPAL l — A IMPRENSA DE JABOATAO (l p . VOL.) — ELIEZER FIGUEIROA CRONOLOGIA PERNAMBUCANA — NELSON BARBALHO PUBLICADOS OS 6 PRIMEIROS VOLUMES PREFÁCIO NELSON BARBALHO Certa vez, a um cara que eu pensava fosse amigo meu, solicitei prefácio para um livro de minha autoria e, surpreen dentemente, o sujeito recusou-se em atender-me, sob a alegaçao, de que, mesmo sendo escritor, não era costume seu prefaciar livro de quem quer que fosse. Mandei-o às favas e tratei de nunca mais falar sequer em seu nome, pondo sua "amizade" no congelador, para a frieza eterna, patati, patatá. Acho mesquinhez sem conta a recusa de quem é habituado a escrever em apresentar um livro cujo autor pede para fazê-lo. E, por pensar assim, foi que, quando Eleny Pinto da Silveira me falou num prefácio para o novo livro de Severino Rodrigues de Moura (a quem não conheço), logo em cima da bucha lhe fui dizendo um sim aprovador da ideia. Quem era Severino Rodrigues de Moura? Como seria o livro de sua autoria? Recebidos os originais, levei_os para casa, li-os, reli-os e aqui confesso minha imensa alegria em não ter dado o fora na proposta de minha querida amiga Eleny, pois o livro de Severino Rodrigues de Moura é daqueles cuja leitura sempre me agrada em cheio e trata da história de uma das mais simpáticas localidades do Agreste Setentrional de Pernambuco — FREI MIGUELINHO, antigo OLHO D'ÁGUA DA ONÇA, a Terra dos Mouras e do pioneiro Tomé José, falecido com 110 anos de idade, na santa paz do Senhor e solteiro da silva e souza OLHO D'AGUA DA ONÇA vem de terras sesmariais concedidas no século XVIII em local onde havia uma fonte de águas cristalinas, nas proximidades do Riacho Topada, que é afluente do Capibaribe. o antigo rio das Capivaras 7 Durante as lutas libertárias de Pernambuco — tanto no Movimento Revolucionário de 6 de março de 1817, quanto nas pendengas advindas da Confederação do Equador, em 1824, — OLHO D'ÁGUA DA ONÇA serviu de cenário para algumas de suas escaramuças, pois muitos dos líderes dos revolucionários separatistas e ao mesmo tempo republicanistas transitaram por seus caminhos, abrigaram-se em suas matas, pelejaram em suas terras, foram perseguidos dentro de suas fronteiras. E as. sim acontecendo, OLHO D'ÁGUA DA ONÇA entrou em cheio na História de Pernambuco. Entre os heróicos líderes que palmilharam o solo de OLHO D'ÁGUA DA ONÇA, no primeiro quartel do século XIX, destacam-se dois frades notabilíssimos - Frei Miguel Joaquim de Almeida Castro, em 1817 e Frei Caneca, em 1824. Miguel Joaquim de Almeida Castro, herói-mártir da Re volução Republicanista de 1817, é o FREI MIGUELINHO, cujo apelido é o atual nome do antigo povoado de OLHO D'ÁGUA DA ONÇA, por sugestão, surgida em 1939, do historiador Mário Melo, de saudosa memória. Justa homenagem a um grande vulto de nosso passado histórico, em torno do qual, com muita propriedade, o autor da HISTÓRIA DE FREI MIGUELINHO, no texto deste livro, traça excelente resumo biográfico, valorizando sobremaneira a obra aqui focalizada. Severino Rodrigues de Moura, ao que me contam, é um homem bom e simples, um eterno apaixonado pela terra na. tal, um chefe de família exemplar. Gostei demais de seus escritos em torno de FREI MIGUELINHO, de suas gentes, sua flora, seus usos, seus costumes, sua evolução político-social. administrativa, suas lutas, inclusive as lutas travadas durante o reinado do cangaceiro António Silvino, que, por sinal, em 1914, seria dominado pelos milicos do sertanejo Teófanes Ferraz exatamente em terras de OLHO D'ÁGUA DA ONÇA, terras nas quais também transitou um outro heróico personagem da História do Brasil — o bravo Tenente Valdemar Lima, ré. voltoso de 1926, companheiro de Cleto Campeio na campanha tenentista terminada vitoriosa com a Revolução de 1930. Por sinal, quando em marcha para juntar-se à Coluna Prestes, o Tenente Valdemar Lima seria morto em terras de OLHO D'ÁGUA DA ONÇA, exatamente no Riacho, ou melhor, no Povoado Topada, que hoje se chama VALDEMAR LIMA, em sua homenagem. Tudo quanto aqui estou dizendo é pinto diante do que historia Severino Rodrigues de Moura no extraordinário tra8 balho que fez acerca do passado histórico de FREI MIGUELINHO, trabalho gigantesco, inclusive de cunho genealógico, para mim simplesmente notável. Melhor, porém, que estas minhas pobres palavras é o livro de Severino Rodrigues de Moura, autor já publicado e que dispensa apresentação. Que o leitor esqueça o prefácio e emburaque no miolo da obra, escrita em estilo ameno e agradável, tudo com muita simplicidade e também com segurança invulgar. Vale a pena tomar-se conhecimento da HISTÓRIA DE FREI MIGUELINHO, de Severino Rodrigues de Moura. 9 AGRADECIMENTOS A minha querida esposa Bibi, meus queridos filhos especialmente Maria José Moura. A José Carlos Morotó. A Maria José Morotó. A Juarez Valdivino da Silva, estudante de geologia —• Palmarense A José António da Silva Fraga, funcionário da Usina Pedroza e outros 11 ESCLARECIMENTOS Este livro compõe-se de três partes, com um total de nove capítulos, escrito por incentivo dos habitantes do lugar e a confiança no diretor do Centro Histórico Municipal de Pernambuco, Dr. José Marques Luiz Delgado. O autor, além de ter apenas instrução primária, nas suas pesquisas, teve grandes dificuldades por falta de dados históricos. Portanto, é uma história pobre de detalhes, escrita com o máximo de boa vontaade, no intúito de que nossa comunidade disponha de um ponto inicial para a sua futura história Lendo livros, observei as narrativas ricas de detalhes, referentes às origens de outros municípios, o que não existe na humilde história que escrevi da minha terra, chegando até a pensar de impedir sua publicação. Porém, a gente dá aquilo que pode. A primeira parte, como já foi dito acima, com pobreza de detalhes, compreendidos de cinco capítulos, referese à fundação da nossa cidade, desde a descoberta da fonte até o mandato do prefeito Zezon Alexandre de Oliveira, quando do seu afastamento ocorrido no dia 15 de março de 1981, incluindo os 06 povoados, quase todas as famílias que povoaram o município, as manifestações populares e fatos pitorescos. Na segunda parte com apenas um capítulo, está inserido um trabalho de pesquisas sobre o Frade revolucionário de 1817, Miguel Joaquim de Almeida Castro, (o Frei Miguelinho), que é hoje o nome de nossa cidade em substituição ao seu primeiro nome Olho D'Água da Onça. A troca de nome foi uma lembrança do jornalista Dr. Mário Melo, no ano de 1939. Naquela mesma época, Dr. Mário Melo escreveu com ênfase uma crónica divulgando que o Frade estivera na fonte (Olho D'Água da Onça) acompanhado de vários companheiros revolucionários em 1817, acossado pela força do governo. Em condições precárias, mandou abater alguns animais para saciar a fome da tropa, ficando sem possibilidades de transportar um dos canhões. 13 Disse ainda Dr. Mário Melo que o Frade ordenou abrir uma vala na areia da Serra da Onça, próximo à fonte, e enterrou a peça bélica. Isso criou, tempos depois, motivos de discussões entre os habitantes da localidade, ao ponto de alguns proprietários abrirem valas em diversas direções, na tentativa de achar o canhão que alguns ainda julgam enterrado. Não tive oportunidade de ler a crónica publicada em uma das revistas da época em que o Dr. Mário era um dos mais destacados jornalistas brasileiros. A referida crónica depois que virou história na região, deve estar diferente da escrita na revista. No começo do século XIX, a nossa região ainda era quase desabitada. A estrada mais próxima era a que passava em Bezerros. Como poderia uma tropa transportar carretões, puxando canhões, em tais condições? Pela lógica deduzimos que o Frade nem sabia que os irmãos Moura estavam abrindo os primeiros campos para criação de gado, onde hoje está encravada a sede do município. Os comentários que vêm passando de gerações a gerações, dizem que em 1824 o Frei Joaquim do Amor Divino (o Frei Caneca), percorrendo parte do Nordeste, perseguido pelas forças do governo, seguindo por estradas precarissimas; margeando o rio Capibaribe, chegou até o povoado Capivara do nosso município e quando estava acampado, foi surpreendido pela tropa do governo, havendo um choque onde morreram vários revolucionários, sendo os mesmos sepultados no mesmo local, cujo acontecimento ocorreu quando já haviam passados sete anos do fuzilamento do Frei Miguelinho e outros companheiros de ideias, na cidade de Salvador. A terceira parte, composta de três capítulos, narra parte da história do senhor Manoel Batista de Morais, o famoso capitão António Silvino, em vista do mesmo ter vivido constantemente nas fazendas vizinhas do povoado Olho D'Água da Onça, ao ponto de imprimir respeito e angariar até simpatia de muitos habitantes da região, deixando motivos para ser incluído na história do hoje município de Frei Miguelinho. Utilizei como fontes revistas do Instituto Arqueológico e Geográfico de Pernambuco, arquivo do Diário de Pernambuco, e comentários populares. Humildemente, peço desculpas dos inúmeros erros contidos nesse trabalho. O AUTOR 14 PRIMEIRA PARTE O MUNICÍPIO DE FREI MIGUELINHO Criada em 1973 por José Vltorino de Almeida, estudante da Escola São José. — VERDES — As matas que aqui existem — BRANCO — A paz da nossa terra — CIRCULO — A terra — PAISAGEM DO CÍRCULO — A fonte, qulxabeiras, e pedras existentes no local, de descoberta do Município — Olho D'água da Onça, nome primitivo de Frei Miguelinho. — ONÇA — A soberana do local descoberto. CAPITULO I LOCALIZAÇÃO O município de Frei Miguelinho, antigo "Olho d'Água da Onça", está situado no agreste setentrional, com uma longitude 'de 35° 57' e 00" e uma altitude de 380 metros acima do nível do mar. Dista 146 km da capital do Estado de Pernambuco. Apresenta um clima semi-árido, com excelentes terras para agricultura e pecuária. Segundo Tadeu Rocha, em 1968 foi elaborada pelo I.B.G.E. a divisão regional de Pernambuco e este município está inserido na micro-região 7 do agreste pernambucano. LIMITES Os limites geográficos apresentam uma vizinhança constituída dos seguintes municípios: ao Norte -- Santa Maria do Cambucá e Vertentes; ao Sul — Caruaru e Riacho das Almas; a Leste — Surubim; a Oeste — Vertentes. A descrição das linhas limítrofes, segundo a Lei 4877 de 20 de dezembro de 1963, é a seguinte: Ponto inicial - - Foz do riacho "Topada", no rio Capibaribe, ascendendo deste riacho até o sítio "Cumaru", segue esta linha até a estrada que liga Vertentes a Surubim, no povoado Livramento (Junco), pela antiga linha divisória, donde segue a estrada asfaltada até os limites com o município de Surubim, no ponto de interseção de uma reta projetada da nascente do riacho "Pinhão", à nascente do riacho "José Ne- 17 gro". Segue este até à sua foz no rio Capibaribe, acompanhan. do-o até a foz do riacho "Topada". Dizem que a área do município antigamente pertenceu a uma Sesmaria, doada pelo Imperador a Dona Maria Ferraz de Brito, dona de Taquaritinga. Outros afirmam que eram terras devolutas, em vista de se acharem muito distantes das primeiras estradas construídas pelos pioneiros. TOPOGRAFIA A área é plana e suave, destacando-se apenas as elevações das serras da Onça ao Sul e do Manso ao Norte. O município ocupa uma área de 144 km2, densamente habitada, com seis povoados: Lagoa do João Carlos, Algodão do Manso, Capivara, Chã do Carmo, Placas e Valdemar Lima, todos eletrificados com energia de Paulo Afonso. Destas terras férteis sente-se a euforia dos lucros agrícolas, por todo o ano, na serra de Taquaritinga, verdadeiro oásis, e o clamor ressequido dos limites da Paraíba com suas caatingas características de um sol implacável e explorações rudimentares. VEGETAÇÃO Os primeiros povoadores encontraram uma vegetação composta de marmeleiro, umbuzeiro, caatingueira, baraúna, arueira, juá, velame, angico, bom-nome, jurema, jucá, pinhão, pereiro, umburana e muitos outros. Descrevemos abaixo pequenas definições sobre os vegetais acima citados, como também sua utilidade para os antigos colonos; MARMELEIRO — Servia para fazer cerca. Era a lenha preferida por todos, haja vista sua facilidade de combustão. Seco, verde ou na chuva, não dava trabalho para se acender a fogueira. UMBUZEIRO – Apresentava frutos deliciosos e batatas ricas em água, sendo estas utilizadas em doces e cocadas. Antes, matava a sede dos cangaceiros, quando perseguidos pela polícia. CAATINGUEIRA — Muito utilizada como lenha de primeira qualidade, devido ao calor que desprendia e o tempo que durava aceso o seu carvão. A flor serve de medicamento contra a. tosse e é muito procurada pelas abelhas. 18 BARAÚNA — Considerada a madeira mais forte da região,usada para esteio, travejamento de casas e vigas de ponte, setindo centenas de anos sem deteriorar-se.Usava-se também para dormente de estrada de ferro, reconhecida pela sua durabilidade no solo. AROEIRA — Diziam os sertanejos que bode só era gostoso quando comia folha de aroeira. A casca é cicatrizante. Usavam-na da seguinte forma: pegavam-se as cascas verdes, machucavam-nas até formar uma bucha, colocavam-na dentro do ferimento, sem mais nenhum curativo. Dias depois, estava completamente curado. Esse socorro foi feito diversas vezes pelos machadeiros acidentados, quando a medicina ainda não havia penetrado nas fazendas e povoados pequenos. JUÁ — Conhecido também como JUAZEIRO. A casca ou raspa deste vegetal era frequentemente utilizada na água para fazer espuma, que servia para lavar os cabelos e escovar os dentes dos matutos, que com esse processo mantinham os dentes limpos e ainda imunizados contra a piorreia. Servia .bem como proteção para a pele, contra irritações, coceiras, etc. Esse vegetal forma uma sombra deliciosa e sua folhagem é sempre verde e brilhante, mesmo na época do verão. Isto deve-se ao fato de sua raiz apresentar grande profundidade, atingindo assim todo o solo em busca de água. Anualmente produz uma grande safra de frutos que são verdadeiros presuntos para cabras e ovelhas, e ainda servem de medicamento para os próprios animais. VELAME — Existia em grande quantidade. Conhecido de duas qualidades, branco e roxo, sendo o branco muito raro, era usado pelos curandeiros para fazer garrafadas, que depois de vários dias de curtida enterrada no solo servia especialmente para sífilis e outras doenças venéreas. Às vezes curava, outras vezes os pacientes ficavam doentes ou morriam. Era um grande remédio para reumatismo. ANGICO — Além de medicinal, nos tempos rudimentares servia para curtume (beneficiamento de peles de animais) . Como medicinal, salientamos que o referido vegetal é um dos ingredientes que compõem o Elixir Sanativo. 19 BOM-NOME — Um vegetal muito utilizado pelo sertanejo como medicamento, servindo para proteger o fígado. A casca era colocada dentro de um depósito de água e o líquido tomado durante vários dias ou mesmo por tempo indeterminado. Essa madeira, devido a sua estrutura ser tortuosa, é escolhida de preferência para fazer paus de cangalha. JUREMA - - Divide-se em duas qualidades, branca e preta, sendo a branca rara e a preta em grande quantidade. A jurema é uma das melhores madeiras para estacas. Dura muito e com os anos muda de cor, tornandose esbranquiçada. A flor é procuradíssima pelas abelhas, tornando-se o mel, segundo os sertanejos, um grande remédio para todas as doenças. Contam os mais antigos que existia uma lenda dizendo que a jurema preta atraía o demônio. JUCÁ — Planta rara. Quando nova, suas hastes são flexíveis. Era muito usada para cabos de relhos e para dar surras, consistindo as ameaças dos policiais e dos chefes em "O jeito que tem é ir para o cipó de jucá". O chá deste serve para quedas e pancadas. PINHÃO — Há duas qualidades: roxo e branco. Na casca deste vegetal existe um líquido leitoso e muito tóxico. A semente serve como purgativo, bastando duas ou três para cada animal. Aumentando a dosagem o animal está sujeito a morrer de disenteria violenta. Afugenta o demônio. Suas variedades são muito usadas nos jardins, especialmente dos supersticiosos. Vale salientar que das duas variedades de pinhão roxo há uma que cresce menos. O leite do pinhão branco apesar de tóxico, é coagulante PEREIRO - - Serve para caibros e estacas de cercas e se sobressai pelo seu amargor. Nas pescarias de açude juntava-se uma quantidade de casca e folha, conforme o volume d'água. Botava-se dentro de um barril e batia-se até a água ficar verde e espumosa. Jogava-se dentro da água onde se encontravam os peixes e os mesmos morriam intoxicados. Suas hastes, quando novas, eram excelentes para fazer bodoques para matar rolinhas e outros pássaros. UMBURANA - - Madeira procurada para fazer tábua de porta, cocho e gamela. O miolo deste vegetal quando apodrece, forma um oco, servindo assim de morada para as abelhas. 20 QUIXABEIRA — Serve como medicamento para quedas, pancadas e escoriações diversas. Era muito usada pelos curandeiros. Todos os anos botavam uma grande safra de frutos pegajosos que servem para a saúde de bodes e ovelhas. É espinhosa e faz boa sombra PAU-D'ARCO — Existem dois tipos, roxo e amarelo. O roxo é raro e o amarelo existe em grande quantidade. Sua casca esmagada dentro d'água serve para o estômago e doenças intestinais. Madeira de alto valor, usada como travejamento de casas e esteios. Nas primeiras chuvas é uma das que primeiro florescem. Dentro de poucos dias elas se denunciam com suas flores roxas e amarelas chamando a atenção de todos. JABUTICABEIRA — O chá da casca e da folha serve para dor de barriga e câimbra de sangue. Hoje, na nossa região, é raro esse fruto gostoso. É a primeira árvore que, depois que caem as chuvas iniciais do ano, dentro de poucos dias produz a sua deliciosa fruta, a jabuticaba. CUMARU — Planta rara, muito procurada como medicamento. Era usada para combater tosse impertinente. Como defumador servia para dor de dente, dor de cabeça e encostos de espíritos maus. A casca torrada exalava um cheiro penetrante que adicionada ao rapé (tabaco), fazia este ficar mais gostoso, descongestionava as narinas e aumentava a inteligência dos tomadores de rapé MULUNGU - - Madeira mole usada para se fazer cochos e gamelas, também servia para a construção de jangadas e para cercas vivas. Muito utilizado para a demarcação de limites de propriedades. Era falta grave exterminar um pé de mulungu. Na encruzilhada de caminhos que existisse um pé de mulungu, segundo as superstições dos povoadores. o diabo não passava. CAJÁ — Vegetal raro em nossa região, produz deliciosos frutos usados para saborosos refrescos. Muito utilizado na construção de cercas vivas. ALFAVACA — Vegetal periódico, nasce nas primeiras chuvas. O seu ciclo de maturação é semelhante ao do milho 21 e do feijão. Produz sementes que, depois de maduras, ficam pretas e são mais ou menos do tamanho de sementes de mostarda. Estas sementes são usadas para se tirar argueiros nos olhos de qualquer vivente. Usa-se da seguinte forma: pega-se uma ou mais sementes e joga-se dentro do olho doente. Não dói; sente.se apenas a sensação de um objeto estranho na vista. No espaço de alguns minutos, ela cria em torno de si uma baba branca e pegajosa que, com o movimento do globo ocular, percorre o olho até encontrar o argueiro. Este é envolvido pela "baba" e sai de maneira impressionante para fora do olho. Isto sem deixai irritações, a não ser as provocadas pelo objeto estranho que esteve dentro do olho Quem não acreditar, basta experimentar MUÇAMBÊ -- Planta periódica, nasce na época do in. verno e cresce até uma altura de sessenta centímetros. O chá desse vegetal serve para fraturas, tosse e outras doenças, especialmente de crianças. Seu lugar preferido é a margem de lagoas, barreiros e em volta de currais (pequena área onde se prende o gado) CABEÇA DE NEGRO — Uma batata que existia na região, usada como medicamento contra catarro. Afinava o sangue e dava brilho à pele dos animais. Em quantidade grande provocava disenteria, podendo até matar o bicho BATATA DE PURGAS ~ Muito usada para curar vermes em crianças e adultos, sendo no entanto muito perigoso, pois nem todo mundo sabia preparar ou medir a quantidade que deveria ser tomada de acordo com o doente. Muitos daqueles que usavam batatas de purgas ficavam doentes do fígado. IPECACUANHA — Vegetal encontrado às margens de estradas e dentro de cercados, medindo aproximadamente vinte centímetros de comprimento. Como chá ou em pó adicionado em pequenas quantidades à comida, servia para feridas, pele estragada e para afinar o sangue. Em grande quantidade era prejudicial à vista. Era preferido pelo gado, que em cercado onde houvesse essa variedade em abundância, esses animais morriam magros e arrepiados. Pois, quando ingerido demasiadamente, funciona como veneno lento. 22 SETE PATACAS — Vegetal rasteiro existente em fartura na serra da Onça. Depois das primeiras chuvas, em poucos dias, ficam floridos. Encontra-se em duas espécies: o roxo, mais comum e o amarelo. Na época dessas flores a serra fica linda, apresentando um verdadeiro espetáculo de beleza aos nossos olhos. Esse vegetal é tóxico aos animais, irrita a pele, ocasionando coceiras e até feridas. CAROÂ - - Utilizada para fazer cordas. Planta da família das bromeliáceas, já quase extinta na região. PALMATÓRIA BRAVA -- Desconhecemos a sua utilidade. Seu pelo quando atinge a pele "queima", provocando irritações muito dolorosas. Por este motivo era "respeitada" até pelos animais GRAVATA — Seu pendão, chamado de "barandão", era muito procurado no mês de maio para hasteamento das bandeiras consagradas a Nossa Senhora, em vista de serem leves e altos. Encontramos ainda o mandacaru, faxeiro, coroa de frade, xique-xique, lastrado, macambira e muitos outros, que em épocas de secas eram cortados pelos criadores, queimados os espinhos em coivaras e serviam para alimentar e saciar a sede do gado. Deve-se salientar que na área ocupada por macambira é comum a moradia de preás, onde também as cascavéis formam seu paraíso devido à abundância de preás novos, verdadeiros presuntos para as cobras, A nova geração já não conhece a maior parte dos vegetais naturais, em virtude dos mesmos, aos poucos, terem sido substituídos pela agricultura e pastagens, pois é fato que o nosso município já está totalmente cultivado. PASTAGENS NATURAIS As pastagens naturais existentes naquela época eram: capim mimoso, capim de flecha, mão de sapo, milhã, beldroega, capim roseta, carrapicho, vassourinha e outros, as quais estão sendo substituídas pelas artificiais abaixo relacionadas: NOME VULGAR Capim pangola Capim buffel NOME CIENTÍFICO Digitaria decumbens Cenchrus ciliares 23 Capim sempre-verde Capim colonião Capim elefante Capim planta Grama de burro Algaroba Palma gigante Palma miúda Panicum maximum Panicum maximum Pennisetum purpureum Brachiaria purpuracens Cynodon doctylon Prosopis juliflora Opuntia ficus indica Nopalia cochenillífera Estas duas últimas são imprescindíveis nas épocas de estiagem pois, além de alimentarem, saciam a sede do gado. Eram facilmente encontradas. FAZENDAS Hoje, a maior parte do município é dividida em minifúndios, muito explorados, com pequenos e médios criadores de gado das diferentes espécies. Quem observa de avião, quase não percebe nenhuma vegetação natural a não ser juazeiros, baraúnas e aroeiras, conservados para oferecer sombra aos animais. Está subdividido em pequenas e médias propriedades, vendo-se nitidamente seus limites pelas cercas de aveloz. Numa visão aérea, não é difícil localizar a maior fazenda do lugar, pertencente ao senhor Teófilo Arruda, bem próximo ao povoado de Lagoa de João Carlos; a fazenda Manso, do ex-Senador Dr. Paulo Pessoa Guerra, também exgovernador e líder político no Estado de Pernambuco, que situa-se no extremo do município de Surubim, tendo seu início no povoado de Algodão do Manso e estendendo-se até o povoado de Capivara, às margens do rio Capibaribe. A terceira fazenda é MARACAJÁ, de propriedade do senhor António Manoel de Morais — falecido. Fica próxima à sede do município. Recentemente, após a morte do proprietário, foi dividida em três propriedades. Ainda podemos divisar, entre outras fazendas de menor porte, a fazenda Lagoa da Lage, famosa pelo seu valor histórico, devido ao último combate do Capitão António Silvino com a polícia. Localizá-se quase no extremo do município de Vertentes, quase às margens do riacho Topada. Portanto, resumindo esta visão aérea, vemos com destaque as três fazendas maiores e as restantes menores bem delimitadas pelas cercas de aveloz. 24 O município possui vários barreiros, açudes pequenos e médios. Sua agricultura é composta principalmente de milho, feijão e algodão que são periódicos e mandiocas, além de fruteiras permanentes, destacando-se entre essas o caju, por seu excelente sabor e a produção da castanha. FAUNA Povoavam a fauna primitiva onças de várias espécies, guará, gato do mato ou maracajá, raposa, tamanduá, teju, camaleão, lagarto privilegiado pela natureza, pois muda de cor de acordo com o ambiente onde se encontra. Por exemplo, se a madeira onde ele estiver for esbranquiçada, ele fica com a mesma coloração, assim sucedendo de conformidade com várias tonalidades. Segundo os observadores ele tem a capacidade de distinguir dois pontos opostos ao mesmo tempo, isto é; observa uma pessoa situada ao seu lado esquerdo e ao mesmo tempo, pode ver uma outra pessoa ao seu lado direito. Talvez seja o único animal no mundo a realizar esta façanha. Havia também a capivara, mocó, preá, punaré, tatu (em suas variedades: peba, bola e verdadeiro), cobras de várias espécies como corre-campo, preta, coral, jararaca, cascavel, etc. Dentre as aves encontramos canário, rouxinol, galo de campina, concris, patativa, curió, casaca de couro, maria já é dia, pintassilgo, juriti, lavandeira, sangue de boi, anum preto, coruja, rolinhas de várias espécies — vermelha, branca, azul, cascavel ou fogo-pagou e febute ou cafôfa — carcará, gavião e beija-flor. Há várias espécies desta divina ave, cujas penas furtam de cor tomando as mais variadas colorações. Entre elas existe o colibri ou tesourão que é bem maior que as outras. O beija-flor tem o dom de voar em qualquer direção, pairar no ar o tempo que quiser e realizar a incrível façanha de voar de ré. A reversão de suas asas é feita tão rapidamente que não se percebe. Esta ave está em fase de extinção Ao se alimentar do néctar das flores, realiza a fecundação das mesmas, assemelhando-se às abelhas que realizam a mesma missão e estão sendo extintas pelos herbicidas. Na época de inverno, os campos eram invadidos por grande quantidade de "aves de arribação". Várias destas espécies já desapareceram da região. 25 FONTES Fontes naturais. A fonte principal "O Canudo", é a que deu origem à cidade. No seu prolongamento existe uma barragem que serve como reservatório, o famoso "Açude Velho" que resistiu às inclemências das secas periódicas da região, saciando as necessidades da vizinhança. Existem outros mananciais encontrados a baixas profundidades nos riachos, no entanto a água não se presta ao consumo doméstico. Fontes anificais — há vários poços artesianos no município, em sua maioria de água salubre. Açudes públicos — a pouca distância da cidade existem os açudes Velho, Novo e o do Estado. Distribuídos no município temos o açude da Chã e o do Algodão, além de outros particulares. ESTRADAS Temos acesso à cidade que dista 9 km da estrada asfaltada PE-90, mais ou menos à altura do km 137 desta rodovia, no povoado denominado Junco, ou Livramento. Da cidade partem várias estradas, todas carroçáveis, integrando-a aos sítios, povoados e cidades vizinhas: FREI MIGUELINHO - - VERTENTES, passando pela famosa Fazenda Lagoa da Lage; FREI MIGUELINHO - - VALDEMAR LIMA, passando pela localidade de Patos onde se bifurca com um ramo para o povoado de Valdemar Lima e outro atravessando o rio Capi-baribe, dando acesso ao município de Caruaru FREI MIGUELINHO — TRAPIÁ, parte da cidade, pás. sando no povoado Placas, onde forma dois ramos, um que vai ao povoado de Chã do Carmo e outro às margens do rio Capibaribe, onde se encontra a vila de Trapiá, pertencente ao município de Riacho das Almas, seguindo para o município de Bezerros. FREI MIGUELINHO - - CAPIVARA, passa pelo povoado de Algodão do Manso, onde se bifurca com um ramal para o povoado de Capivara, às margens do rio Capibaribe, 26 que dá acesso ao município de Cumaru, e o outro dá acesso ao município de Surubim. FREI MIGUELINHO -- LAGOA DO JOÃO CARLOS, sai da cidade direto a este povoado, ultrapassando-o e formando dois ramos; uma, próxima ao município de Santa Maria do Cambucá e a outra, a cidade de Surubim. Um dos maiores desejos dos freimiguelinhenses é asfaltar os 9 km de estrada que dão acesso à cidade. Com a ascensão do Dr. José Francisco de Moura Cavalcanti ao Governo do Estado, tivemos quase a certeza que este sonho seria realizado, pois o mesmo esteve na cidade e nos prometeu o asfaltamento. No entanto, isto ficou só na promessa e a esperança está depositada agora no governo do Dr. Marco António Maciel. BANDEIRA DO MUNICÍPIO DE FREI MIGUELINHO Criada em 1973 por José Vitorino de Almeida, estudante da Escola São José VERDE — As matas que aqui existem BRANCO — A paz da nossa terra CÍRCULO — A terra PAISAGEM DO CIRCULO -- A fonte, quixabeiras, e pedras existentes no local, de descoberta do Município — Olho D'água da Onça, nome primitivo de Frei Miguelinho. ONÇA — A soberana do local descoberto. 27 Capela de São José Frei Miguelinho — PE — Construída em 1899. Escola São José — Ensino de l*?, e 2°. graus, inaugurada no dia 14 de dezembro de 1974. Frei Miguelinho — Administração Gaudêncio José Assunção — Prefeito. CAPÍTULO II Prosseguindo com o relato dos aspectos históricos que deram origem ao nosso município, falemos agora dos homens que constituíram as famílias que formaram o aspecto humano da nossa querida terra. Além da família do fundador, mais duas chegaram ao mesmo tempo e, da fusão das três, temos a comunidade freimi-guelinhense. Estas famílias são: MOURA, HIPÓLITO DE MEDEIROS e ALEXANDRE. FAMÍLIA MOURA Torne José de Moura - - fundador do município, faleceu com 110 anos, ainda solteiro. Seus irmãos que também vieram para cá, foram: 1António Francisco de Moura 2João de Moura Cabra] 3Manoel José de Moura António Francisco de Moura — casado com dona Con ceição de Moura, teve os seguintes filhos: Pedro Pereira de Moura, Sebastião Pereira de Moura, João Francisco de Moura, Gonçalo Pereira de Moura (morreu solteiro), Francisco Pereira de Moura, José Pereira de Moura, Ana Pereira de Moura, Maria Pereira de Moura, António Pereira de Moura (morreu solteiro), Manoel Pereira de Moura. 29 Dos seus filhos, destacamos o casal João Francisco de Moura e Maria Francisca da Conceição, que tiveram os seguintes filhos: Vítor, Joventino, Porfírio, Trajano, João Morotó, João Brito, António Pedra, António "Chocho", Pedro, Maria Quitéria e Felicidade. Destes, destacou-se João Morotó, casado com Maria Branca, que se dedicou ao comércio de gado e hoje, é fazendeiro no município. A origem do nome Morotó, deve-se ao fato de que João Francisco de Moura e dona Conceição tiveram, entre outros, dois filhos de nome João. Resolveram então denominar a um deles por Morotó em vez de Moura. Batizado, registrado e casado com esse nome, deu origem à família Morotó, que está projetando-se no município. Através dos esforços do casal, seus filhos, conseguiram estudar em outros municípios. São eles: Maria Medeiros Morotó — diretora do Órgão Municipal de Educação, formada em Pedagogia, no ano de 1970, em Caruaru; Maria José Morotó — diretora da Escola São José, formada em Pedagogia, em 1970, na cidade de Caruaru; José Carlos Morotó - - ex-vice-prefeito do município; Maria Isabel Morotó — supervisora, formada em Pedagogia no ano de 1975, na U.F.PE., e estudante de Odontologia em Caruaru; António Medeiros Morotó — médico veterinário, casado com a médica Maria José de Moura, formado em 1977 na U.F.R.-PE.; Luis Medeiros Morotó — médico veterinário, formado em julho de 1978, na U.F.R.PE. Citaremos ainda Manoel Pereira de Moura, filho de António Francisco de Moura, casado com Maria Leonor do Carmo. Não sabemos por que motivo, ele decidiu que seus filhos passariam a chamar-se, em vez de Moura, MORAIS; daí a origem dessa família. Seus descendentes são: António Manoel de Morais, Leonel Manoel de Morais, Luis Manoel de Morais, Dalila Manoel de Morais, Idalina Manoel de Morais, Capitulina Manoel de Morais. 30 António Manoel de Morais foi um grande fazendeiro município e ex-vereador. Casou-se com Maria Fonseca de Morais, tendo os seguintes filhos: Regina Morais (professora e fazendeira), Olímpio Morais (fazendeiro), Abdias Morais (atual vice.prefeito e fazendeiro). Leonel Manoel de Morais, casado com Delmira Fran-cisca de Arruda, teve os seguintes filhos: Josberto José de Morais (militar), Adão José de Morais (militar), Adauto José de Morais, Adonias José de Morais (funcionário da Prefeitura). Severina José de Morais (doméstica, esposa do exprefeito de Vertentes, José França de Assunção (Zuza Pinheiro) ,que atualmente reside no Estado do Paraná. Seus filhos: Eva José de Morais, Maria José de Morais, Enedina José de Morais. O segundo irmão de Tomé chama-se João de Moura Cabral, é casado com Ana Cabral e seus filhos foram: José de Moura Cabral (morreu solteiro), Domingos José de Moura, Angelo José de Moura (morreu solteiro), Rosa de Moura, Maria de Moura (Neném), Conceição de Moura. Destes, citamos os filhos de Rosa de Moura com Amâncio, que foram Sebastião Amâncio, Manoel Amâncio, António Amâncio, Francisco Amâncio, Maria Amâncio e Ana Amâncio. Domingos José de Moura e Maria, seus filhos: José Domingos, António Domingos, Henrique Domingos, Carolina Domingos, Maria Severina Domingos, Maria Domingos, Tertuliana Domingos e Apolinário Domingos. 31 Maria de Moura (Neném) e António Lúcio, seus filhos: Sabino Lúcio de Almeida, João Lúcio de Almeida, João Lúcio de Melo, António Lúcio de Almeida, Joaquim Lúcio de Almeida, Manoel Lúcio de Almeida e Pedro Lúcio de Almeida. O terceiro irmão de Tomé chama-se Manoel José de Moura. Casou-se com dona Maria de Moura. Seus filhos: José Possidônio de Moura, João Possidônio de Moura, Vitorino Possidônio de Moura. Desta família destacamos José Possidônio de Moura e Maria Cordeiro de Moura, cujos filhos são: Maria de Moura Clemente, António Possidônio de Moura, Maria Senhorinha Possidônio de Moura, Maria Possidônio de Moura, Paulina Possidônio de Moura, Alexandrina Possidônio de Moura, Ana Possidônio de Moura, Manoel Possidônio de Moura, Maria José Possidônio de Moura, João Paulo Possidônio de Moura, João Possidônio de Moura, Severina Possidônio de Moura, Amara Possidônio de Moura. Da união de Manoel Possidônio de Moura e Josefa Maria de Jesus, nasceram Severino Rodrigues de Moura, Maria, Severina, António (morreu solteiro), Zulmira e Inácio Erigido. Severino Rodrigues de Moura, autor deste livro e de um outro que já foi publicado, "MEMÓRIAS DE UM CAMPONÊS", casado com Severina Azevedo de Moura e, seus filhos são: José Agápito de Moura — médico cirurgião na cidade de Custódia, nascido em 25 de maio de 1939 e formado em 08 de dezembro de 1965, pela U.F.PE. Casado com Maria José Ribeiro Lins, da tradicional família Novais, de Floresta do Navio. Já tem dois filhos: 32 Marcos Eduardo Ribeiro Lins de Moura Fernanda Ribeiro Lins de Moura José Moura - - engenheiro agrónomo do INCRA. Nascido em 06 de outubro de 1941, formou-se no dia 16 de dezembro de 1967, pela U.F.R.PE. Casado com Zilma Vidal de Negreiros Moura, descendente de histórica família paraibana, natural de Campina Grande. Tem os seguintes filhos: Katharina Vidal de Negreiros Moura José Moura Júnior Teresa Cristina Vidal de Negreiros Moura. José Edson de Moura — médico cirurgião em Tabira e Afogados da Ingazeira, nascido no dia 22 de setembro de 1942. Fomado em Medicina no dia 08 de dezembro do 1968. Casado com Márcia Soares de Moura, de destacada família de Afogados da Ingazeira e Tabira, radicada em Fortaleza — Ceará. Já tem dois filhos: José Edson de Moura Júnior, e Michele Soares de Moura. José Evoide de Moura — especialista em Direito Trabalhista, foi advogado da Imobiliária Lucas Simon Ltda. e Secretário do Vice-Consulado da Espanha em Recife Nascido em 22 de outubro de 1944, formou-se em Direito pela U.F.PE., em dezembro de 1969. Faleceu no dia 19 de abril de 1975, vitimado de leucemia. Casado com Kátia Maria Calazans Bacelar de Moura, da respeitável família Calazans, radicada em Palmares e Recife. Deixou dois filhos: José Evoide de Moura Júnior e Bruno Bacelar de Moura. Maria José Moura Morotó — médica anestesista, cirurgiã e ginecologista na cidade de Caruaru. Nascida no dia 22 de agosto de 1949, formada em Medicina no dia 06 de dezembro de 1974, pela Faculdade de Ciências Médicas de Pernambuco. Casada com o médico-veterinário António Medeiros Morotó, da nossa família Moura, radicado em Frei Miguelinho. Já tem uma filha, Bianca Moura Medeiros Morotó. Destacamos ainda António Ferreira de Moura, descendente da família dos fundadores, também conhecido como António de Moura do "Aborrecido", criador de gado e dono de uma bolandeira, benefíciadora de algodão. É irmão de dona Zefinha, esposa de Manoel Alexandre de Oliveira, e pai da es33 posa de Manoel de Alexandre de Oliveira Filho. Casou-se com dona Francisca Maria da Conceição tendo os seguintes filhos'. Manoel Ferreira de Moura (Bei.), Severino Ferreira de Moura (militar), Maria Ferreira de Moura (esposa do farmacêutico José Rafael que, apesar de não ser formado em Medicina, notabilizou-se pelas suas intervenções cirúrgicas realizadas com êxito). Ana Ferreira de Moura (esposa do Sr. Lalau) Josefa Ferreira de Moura Maria Silvina de Moura (esposa de Manoel Alexandre de Oliveira Filho). Muitos são os Mouras que deixamos de citar por falta de dados concretos sobre suas vidas, onde se encontram, como também datas de nascimentos. Antigamente quase ninguém possuía certidão de nascimento, e a maioria se batizava em Santas Missões. FAMÍLIA ALEXANDRE Manoel Gomes de Oliveira (patriarca de toda família Alexandre) era oriundo de Portugal, vindo para o Brasil forçado por uma guerra de seu país com a Espanha. Aqui chegando, comprou terras e casou-se com uma cabocla. Era conhecido por "Marinheiro" (nome que davam a todo português que imigrava para o Brasil, por via marítima). Destacou-se pela audácia e capacidade como boticário. De sua união com a nativa, nasceram Manoel Alexandre de Oliveira e Maria José de Oliveira. Manoel Alexandre de Oliveira —• herdou de seu pai, terras, gado, audácia e a mesma habilidade como boticário. Casou-se com Josefa Maria da Conceição, descendente da família Moura e teve os seguintes filhos: João Alexandre de Oliveira (primeiro Tabelião Público) Julião Alexandre de Oliveira António Alexandre de Oliveira (Vereador em Altinho) 34 Manoel Alexandre de Oliveira Filho. João Alexandre de Oliveira — casou-se com a Sra Amara Pereira de Sousa. Seus filhos: Zezon Alexandre de Oliveira Engrácia Alexandre de Oliveira(solteira) Maria Anunciada de Oliveira Aliete Alexandre de Oliveira (Tabeliã) Ivanildo Pereira de Oliveira (solteiro) Nair Pereira de Oliveira (solteira, formada em Ciências Sociais pela Faculdade de Formação de Nazaré da Mata) José Carlos de Oliveira (solteiro, ex-prefeito do município, advogado e delegado de carreira, nascido a 02 de outubro de 1942, formou-se na Faculdade de Direito de Caruaru em 1972). Zezon Alexandre de Oliveira — casou-se com Severina Soares de Oliveira. Atualmente é o prefeito do município. Seus filhos: Maria Dorotéia de Oliveira — Secretária da Prefeitura. Maria Dulcinéia de Oliveira — Supervisora do Órgão Municipal de Educação. José Dilson de Oliveira José Arnaldo de Oliveira José Edmilson de Oliveira João Alexandre de Oliveira Neto Maria Divaneide de Oliveira José Adalberto de Oliveira Maria Dulcicleide de Oliveira Maria José de Oliveira Ademar Alexandre de Oliveira Maria Anunciada de Oliveira — casou-se com o Sr. Severino Francisco da Silva (Biu Pacote), comerciante no município. Seus filhos são: José Ednaldo Silva — nasceu no dia 23 de junho de 1951. É médico, estudou na Faculdade de Ciências Médicas, formando-se com a turma de 1978; 35 Maria José Silva — supervisora do Órgão Municipal de Educação; Normando José da Silva — fiscal do DETERPE; Paulo Roberto da Silva — alto comerciante; Rejane Maria da Silva — cursando o 4°. ano de Medicina; Vital Romero da Silva Fábio Rogério da Silva. Aliete Alexandre de Oliveira — casou com o Sr Bezerra de Medeiros. Seus filhos: Juarez Maria Gorete de Oliveira Medeiros Juarez Bezerra de Medeiros Júnior Julião Alexandre de Oliveira — é casado com a Sra. Santa Hipólito de Medeiros. Seus filhos são: Maria Alexandre de Medeiros Juliana Oliveira de Medeiros António Alexandre de Oliveira — casou-se com a Sra. Francisca Maria da Silva. Vereador em Altinho e Farmacêutico. Seus filhos: Severino Alexandre de Oliveira Edite Alexandre de Oliveira Erinete Alexandre de Oliveira Maria do Carmo de Oliveira Juracy Alexandre de Oliveira António Alexandre de Oliveira, conhecido como Sambu, era enfermeiro e dedicava-se de corpo e alma aos doentes, sentindo-se realizado quando distribuía seus remédios. Sentia-se como um médico, pois não era formado, mas atuava como se o fosse. Manoel Alexandre de Oliveira Filho — casou-se com a Sra. Maria Silvina Moura e teve os seguintes filhos: Maria Alexandre de Oliveira António Alexandre Sobrinho Agaton Alexandre de Oliveira Epiópia Alexandre de Oliveira Laura Alexandre de Oliveira Elza Alexandre de Oliveira (solteira) 36 Maria Alexandre de Oliveira — casada com o Sr. Cornélio Lucas de Arruda. Possuem quatro filhos: Ivete Lucas de Arruda (esposa do vereador Severino Bezerra Batista) Ismael Lucas de Arruda Maria das Graças de Arruda José Everaldo Lucas António Alexandre Sobrinho — casou-se com a Sra. Maria Santa de Medeiros. Seus filhos são: Leny Alexandre de Medeiros — funcionária do INPS, esposa do Sr. Luiz Gonzaga de Melo, funcionário federal; Laurinete Alexandre de Medeiros — casada com o Sr. Ivo Siqueira de Miranda, contador; Linete Alexandre de Medeiros — casada com Manoel Bezerra; Leda Oliveira de Medeiros — professora; Laurinéia Oliveira de Medeiros — formada em Advocacia, e em Ciências Sociais, casada com o advogado Joelson; Lenilson Oliveira de Medeiros — casado com Lucilene Oliveira; António Oliveira de Medeiros — casado com Maria Gorete, é fazendeiro; Lenilda Oliveira de Medeiros — professora; Lecilda Oliveira de Medeiros — casada com Cláudio Lucena; José Lupércio de Oliveira de Medeiros. Agaton Alexandre de Oliveira — casou-se com a Sra. Maria de Lourdes Bezerra. Seus filhos são: Wilson Bezerra de Oliveira — Agente da Polícia Federal; Lindomar Bezerra de Oliveira — professora; Vanda Maria Bezerra — dentista. Epiópia Alexandre de Oliveira – casou-se com o Sr. Manoel José de Medeiros. Seus filhos: Eriberto José de Medeiros Edilene Alexandre de Medeiros Eurídice Alexandre de Medeiros Elizabete Alexandre de Medeiros 37 Loura Alexandre de Medeiros — casada com o Sr. Davino Luiz da Silva. Tiveram dois filhos: Dalvanise Alexandre da Silva — estudante de Filosofia; Laurinete Alexandre da Silva FAMÍLIA HIPÓLITO DE MEDEIROS José Hipólito de Medeiros, de origem portuguesa, pá. triarca da família, chegou a Frei Miguelinho como criador, pastoreando seu gado por estas regiões. Gostou do lugar e fixou residência em Xiquexique, fazenda construída por ele próprio. Casou-se com Dona Izabel de Medeiros, natural de Bengala, fazenda localizada nas imediações de Limoeiro do Norte O casal teve os seguintes filhos, que foram casando e morando perto da fonte, onde foi surgindo a povoação que hoje forma a cidade de Frei Miguelinho: Manoel Hipólito de Medeiros António Hipólito de Medeiros (Nó) Laurentino Hipólito de Medeiros João Hipólito de Medeiros Bernardino Hipólito de Medeiros Maria Hipólito de Medeiros Ana Hipólito de Medeiros Balbina Hipólito de Medeiros Maria Silvina Hipólito de Medeiros Manoel Hipólito de Medeiros — casou-se com a Senhora Maria de Medeiros. Seus filhos: Maria Hipólito de Medeiros: José Hipólito de Medeiros Rosa Hipólito de Medeiros Ana Hipólito de Medeiros Inácio Hipólito de Medeiros Maria Hipólito de Medeiros— casou-se e teve dois filho: Manoel e Severino. Antônio Hipólito de Medeiros — casou-se com a Sra. Maria Hipólito de Medeiros. Tiveram os seguintes filhos: Manoel Arruda de Medeiros Apolônio Hipólito de Medeiros 38 Noé Hipólito de Medeiros — foi Prefeito por duas vezes em Riacho das Almas; Maria Ferreira de Medeiros João Hipólito de Medeiros Ana Hipólito de Medeiros — casada com o Bel Moura. Apolônio Hipólito de Medeiros — casado e pai de dois filhos: Hilário Hipólito de Medeiros e José Hipólito de Medeiros . João Hipólito de Medeiros — casado com a Sra. Josefa Oliveira de Medeiros. Seus filhos: Ivanildo, Ivaldecí (vereador, advogado em Caruaru), Ivaldenise, Ivonete, Hipólito, José Hipólito, João Hipólito Irmão e António Hipólito de Medeiros Neto. Laurentino Hipólito de Medeiros — casou-se com a Sra. Minervina Viturina de Moura. Tiveram os filhos: Crispim Hipólito de Medeiros Maria José de Medeiros Maria Minervina de Medeiros Maria Branca de Medeiros Maria Santa de Medeiros Crispim Hipólito de Medeiros — casou-se com a Sra. Martinha Jerônimo de Medeiros. Deste casal nasceram três filhos: Severino Hipólito de Medeiros Apulclo Hipólito de Medeiros Etemistoclis Hipólito de Medeiros Maria José de Medeiros (falecida) — casou-se com o Sr. Artur Gonçalves de Lima. Tiveram duas filhas: Diva Gonçalves de Lima Iraci Gonçalves de Lima Maria Minervina de Medeiros — casada com o Sr. Manoel Pereira de Sousa. Não tiveram filhos. Era conhecida por todos como dona Quirina. Maria Branca de Medeiros — casada com o Sr. João Pereira Morotó. Falamos sobre a mesma, quando tratamos da família Moura. 39 Maria Santa de Medeiros — casou-se com o Sr. António Alexandre Sobrinho. Também falamos sobre a mesma, quando descrevemos a família Alexandre. Crispim Hipólito de Medeiros -- arrematador de feira, depois foi comerciante. Comprou o primeiro fogão a lenha e, depois, a gás; o primeiro rádio e foi comprador de algodão. Como político, exerceu a função de vereador por três vezes, procurando atender e defender os interesses do Distrito de Frei Miguelinho. Batalhou pela emancipação do município, conseguindo realizar seu sonho em 1963. Lutou pela questão dos limites territoriais do município, sendo definitivamente resolvido após a sua morte, pelo Tabelião Público João Alexandre de Oliveira, que contratou o advogado Barros Melo, para resolver a questão, ficando o povoado de Lagoa do João Carlos pertencendo a Frei Miguelinho. Desejava ser prefeito para beneficiar a fonte (ainda hoje desprezada), e construir um novo cemitério. Todas as vezes que submeteu-se a votação (para Vereador, pelo Distrito), nunca foi derrotado, pois seus amigos políticos sempre lhe foram fiéis. Faleceu em 23 de setembro de 1965, de colapso cardíaco João Hipólito de Medeiros — foi para Contendas, em Vertentes. Seus filhos: Hipólito Laurentino de Medeiros Amaro Hipólito de Medeiros Raul Hipólito de Medeiros João Hipólito de Medeiros Filho Santa Hipólito de Medeiros Manoel Hipólito de Medeiros Todos desempenham atividades como agricultores e criadores. Bernardino Hipólito de Medeiros — casou-se com a Sra. Maria Silvina de Medeiros, e tiveram duas filhas: Maria Bernardina de Lima (falecida) Severina Bernardna de Lma Maria Bernardina de Lima — casou-se com o Sr. Anísio Gonçalves de Lima, e tiveram os seguintes filhos: Hilda Gonçalves de Lima António Gonçalves de Lima 40 Emílio Gonçalves de Lima Maria Socorro Gonçalves de Lima Berenice Gonçalves de Lima Severina Bernardina de Lima — casada com o Sr. Delmiro Gonçalves de Lima. Não tiveram filhos. Maria Hipólito de Medeiros — casou-se com o Sr. João Ferreira de Melo. Seu filho: António Simão de Arruda — casou-se com Ana Ferreira de Medeiros e tiveram os seguintes filhos: Eva Simão de Arruda António Simão de Arruda Filho Eunice Simão de Arruda Enok Simão de Arruda (faleceu solteiro) Enedina Simão de Arruda Elizabete Simão de Arruda Maria Ferreira de Arruda — casou.se com o Sr José Bezerra de Barros. Seus filhos: Anália Hipólito de Medeiros Hipólito de Medeiros Maria Hipólito de Medeiros José Ferreira de Melo — casou-se com a Sra Pereira de Sousa. Não tiveram filhos. Idalina Ana Hipólito de Medeiros — casou-se com o Sr. Cirilo Ferreira de Melo. Seus filhos e netos foram descritos na família Alexandre, com exceção de: José Cirilo de Medeiros Júlia Hipólito de Medeiros Balbina Hipólito de Medeiros — (solteira) Maria Silvina Hipólito de Medeiros — casou-se com o Sr. José Ferreira de Melo. Seus filhos foram, Ana Ferreira de Medeiros Maria Silvina de Lima Maria Bezerra de Medeiros Ana Ferreira de Medeiros — casou-se com o Sr. Inocêncio Jerônimo da Silva, e teve os seguintes filhos: Demétrio Jerônimo da Silva (médico veterinário) 41 Abel Jerônimo da Silva Maria Jerônimo da Silva (Diretora da Escola Maria Antonia) Nelson Jerônimo da Silva Severina Jerônimo da Silva Maria Silvina de Lima — casou-Se com o Sr. José Domingos de Lima. Tiveram dois filhos: Maria Ferreira de Araújo — proprietária da única farmácia da cidade; Lindalvo Ferreira de Lima. Maria Bezerra de Medeiros — casou-se com o Sr Hipólito Laurentino de Medeiros. Seu único filho é: Juarez Bezerra de Medeiros António Bezerra de Barras - - Capitão da Guarda Nacional e fazendeiro, oriundo da família Bezerra, de Vertentes, parente próximo do Coronel Braz Bezerra da Silva, chefe político de Vertentes, ex-deputado por mais de uma legislatura e ex-prefeito várias vezes, de Vertentes e Taquaritinga. Seus filhos: João Bezerra (Coletor de Vertentes) José Bezerra (Investigador em Maceió — falecido) Manoel Bezerra (fazendeiro e comprador de algodão) António Bezerra (fazendeiro e comprador de algodão) Antonia Bezerra Teodora Bezerra (casada com Severino Almeida) Severina Bezerra Teodora Bezerra (dona Nanica) — casou-se com Severino Almeida, fazendeiro e político, descendente dos fundadores do povoado Capivara, às margens do rio Capibaribe, nesse mesmo município. Transferiram-se para Santa Maria do Cambucá e têm os seguintes filhos: Agripino Ferreira de Almeida — Na intentona comunista de 1935, era militar e foi gravemente ferido. Formado em Direito, foi Juiz em Maniçobal (hoje São José do Belmonte) . Foi professor do ginásio de Limoeiro e ainda, Deputado por duas legislaturas. Mentalmente enfermo, suicidou-se no dia 28 de novembro de 1966. Valdemar Almeida — ex-Prefeito da cidade de Vertentes e fiscal da Receita Federal; 42 Péricles Almeida — ex-Prefeito de Maraial e por duas vezes Prefeito da cidade de Santa Maria do Cambucá; Severino de Almeida Filho — advogado e Deputado Estadual; Eurídice de Almeida — advogada; Maria de Jesus Almeida — professora; Jeruza de Almeida — professora; Dalva de Almeida José Bezerra de Almeida Santozinho de Almeida — Tabelião de Santa Maria do Cambucá; Abgail de Almeida — esposa do Dr. Rubens Rodrigues dos Santos, médico cirurgião descendente da família Rodrigues, de Vertentes. António Francisco da Silva (não sabemos sua origem; surgiu como comerciante, político e criador de gado no município. É o pai de Manoel António da Silva (Neco de Toinho). Foi vereador em Vertentes e candidato a Prefeito. Ca. sou com Emília Duarte, os quais tiveram os seguintes filhos: Risoaldo Duarte da Silva — primeiro médico do município. Iniciou o curso de Medicina na Bolívia, logo depois .transferiu-se para o Recife. Atualmente, é médico em Aliança; Romilda Duarte da Silva — professora; Rildete Duarte da Silva Ridalva Duarte da Silva — funcionária estadual; Nilza Duarte da Silva — funcionária estadual; Margarida Duarte da Silva — professora. Joaquim Pedro Ferreira — veio de São José de Pedra Tapada, perto de Limoeiro do Norte, residir em Frei Miguelinho com sua esposa Antônia Gonçalves de Lima, que é irmã de Manoel Clementino Gonçalves de Lima — conhecido como Manoel Mendes. Seus filhos: Maria Umbelina de Alcântara Artur Gonçalves de Lima Manoel Gonçalves de Lima Adelina Gonçalves da Costa Delmiro Gonçalves de Lima Anísio Gonçalves de Lima Manoel Clementino Gonçalves de Lima — era proprietário da famosa fazenda LAGOA DA LAGE, casado com Se43 verina Maria da Conceição, dona da maior coleção de jóias antigas da região. Sua única filha: Severina Gonçalves de Oliveira — esposa do atual Prefeito — Zezon Alexandre. Manoel Sardote de Sousa e Ana Maria da Conceição — vieram de Boa Vista, atual João Alfredo. Os mesmos eram os pais de Manoel Pereira de Sousa que casou com Belarmina Barbosa da Silva, e tiveram os seguintes filhos: José Pereira de Sousa Amara Pereira de Oliveira António Pereira de Sousa Manoel Pereira de Sousa Filho Artur Pereira de Sousa Adalberto Pereira de Arruda Severino Pereira de Sousa Severino Pereira de Sousa Irmão (bilota) Brasiliano Pereira de Sousa Idalina Pereira de Medeiros Laura Pereira de Sousa Sobre José Pereira de Sousa, sabemos que casou e conseguiu formar dois filhos: Djalma Pereira de Sousa (Contador) e Josenildo Pereira de Sousa (Professor). De Artur Pereira de Sousa, sabemos que é casado com Josefa Arruda de Sousa. Seus filhos são: Maria Zélia Pereira de Sousa (professora e secretária de colégio e estudante de Pedagogia); Zenaide Marly de Sousa (vice.Diretora da Escola São José); José Artur Pereira de Sousa Artur Pereira de Sousa Filho (funcionário da Prefeitura) . Severina Pereira de Sousa — casada com o Sr. Severino Cardoso de Arruda. Seus filhos são: Manoel Pereira de Arruda (Técnico Agrícola) Adalberto Pereira de Arruda) Maria Eunice de Arruda (professora) Terezinha Pereira de Arruda Cristina Pereira de Arruda Severino Pereira de Sousa (Bilota) -- casado com a Sra. Dulce Dalva de Sousa. Seus filhos: José Edno Pereira de Sousa 44 António Pereira de Sousa (Guarda Rodoviário Federal) Maria de Fátima de Sousa (professora) Laura Pereira de Sousa — casada com o viúvo Sr. Artur Gonçalves de Lima (falecido). Tiveram os filhos: Domingos Gonçalves de Lima (Guarda da Secretaria da Fazenda, de Mercadoria em Trânsito); Marlene Gonçalves de Lima (professora e formada em Pedagogia); Marluce Gonçalves de Lima (professora e também formada em Pedagogia); Marinalva Gonçalves de Lima (professora); Maria das Graças Gonçalves de Lima (professora e funcionária do DETRAN); Maria Aparecida Gonçalves de Lima (Universitária de Veterilnária). Devido a contradições quanto às informações das árvores genealógicas das citadas famílias, é bem possível que hajam sido cometidos enganos, pelos quais, humildemente peço desculpas. 45 CAPÍTULO III LAGOA DE JOÃO CARLOS Segundo a tradição, São José dos Bezerros foi fornecedor de algodão e gado para a Bahia, isto no tempo do BrasilColônia. Alguns criadores que povoavam o lugar saíram à procura de área melhor, que proporcionasse boas condições para seus rebanhos Um deles, João Carlos, nessa busca agradou-se da região onde existe uma lagoa, fazendo aí seu campo e edificando um curral para estabelecer sua criação. Construiu uma casa para sua moradia e daí por diante a lagoa passou a ter seu nome: LAGOA DE JOÃO CARLOS. O povoado surgiu disso, mas não sabemos a data inicial. Além das ótimas condições para criação de gado, o lugar é também de primeira qualidade para o cultivo de todo tipo de lavoura, devendo-se a isso também a chegada dos seus povoadores. PRIMEIROS HABITANTES: Manoel Pereira Ramos, casado com Dona Ana, vinda de São José dos Bezerros (atualmente Bezerros). Tiveram entre outros, os seguintes filhos: João Pereira de Souza Francisco Pereira Ramos Amâncio Pereira Ramos José Pereira Ramos Severino Pereira Ramos José Pereira Ramos Irmão Maria José Ramos Ana Pereira Ramos 47 Maria Pereira Ramos Madalena Pereira Ramos Conceição Pereira Ramos João Pereira de Souza, casado com Maria Luisa da Conceição, tiveram os seguintes filhos: Joaquim Pereira Ramos Manoel Pereira Alves (declarante) José Pereira Alves Luzia Pereira Alves Manoel Pereira Alves, casado com Josefina Maria de Jesus, tiveram os seguintes filhos: José Manoel de Souza — ex.vereador Otávio Pereira Alves Eugênio Pereira Alves Luiz Pereira Alves Irene Rosa de Lima Aurora Maria de Jesus Maria Pereira Alves Júlia Alves de Jesus — esposa do ex-prefeito Gaudêncio José Assunção Ivone Maria de Morais Edite Pereira Alves FAMÍLIAS INFLUENTES DO POVOADO: Teófilo Severino de Arruda — oriundo de Surubim, um dos maiores proprietários do município. Dono da Fazenda Lagoa de João Carlos, próxima ao povoado do mesmo nome. Não sabemos ao certo de quem ele comprou as terras primitivas que originaram o nome de Lagoa de João Carlos. O fato é que ele adquiriu várias pequenas propriedades e, anexandoas, transformou-as na segunda fazenda em extensão do município, depois da fazenda Manso. Casado com Maria Astrogilda de Arruda. O Sr. Teófilo Arruda era um verdadeiro fidalgo na maneira de vestir e tratar. Primava pela boa aparência e bons modos na convivência com os demais. Gostava de visitar os amigos e ser visitado. Era bastante procurado e estimado tanto pelos mais humildes como pelas pessoas influentes da região. Apreciava bons cavalos, macios e andadores. Seus arreios eram de primeira qualidade. Considerado exímio mon48 tador por seu porte, elegante em comandar o animal. filhos: Seus Edson Teófilo de Arruda Edmilson Astrogildo de Arruda Maria do Socorro de Arruda — casada com um fun cionário da EMATERPE, Herculano Nilton Cunha. Maria Auxiliadora de Arruda — casada com um fun. cionário do Banco do Brasil — Severino Gilson Belarmino de Arruda Elizete Arruda Elizabete Arruda — tem curso superior Elza Maria de Arruda — tem curso superior. José Francisco de Souza — Major Duda, da Guarda Nacional - - casado com Joana Maria da Conceição Moura, patriarca da família Assunção João Francisco de Souza, filho do Major Duda, casado cem Lucinda Maria de Assunção. José Pedro de Assunção — neto do Major Duda e pai do ex-Prefeito Gaudêncio José de Assunção. A primeira capela do lugar foi construída por Manoel Pereira Ramos, mais ou menos em 1850. Sua padroeira é Nossa Senhora da Conceição. Segundo declarações do informante, o Sr. Manoel Pereira Ramos vendeu uma "partida" de gado e não teve uma boa ideia para aplicar esse dinheiro, resolvendo assim construir a capela. Fez doação à Santa, património que existe até hoje. O vigário que celebrou a primeira missa na capela, não sabemos ao certo. Em 1932 a capela foi reconstruída e nesta época recebia a assistência do Padre António Lima. Quando terminaram os trabalhos de reparos, o Sr. Miguel Alves de Moura, seu benfeitor, manifestou o desejo de quando Deus chamasse o seu espirite para o Alto, o seu corpo fosse sepultado dentro igrejinha tão amada. Miguel Alves de Moura foi o primeiro comerciante do lugar e também proprietário da segunda bolandeira. Procedia do mesmo modo que os demais: comprava toda a produção da região, descaroçava o algodão e enviava a lã em lombos de burro para Limoeiro, em fardos de 80 kg. Excepcionalmente 49 alguns produtores descaroçavam sua produção nas bolandeiras, cujo beneficiamento era pago com o caroço. Miguel Alves, tempos depois, foi o pioneiro em colocar caldeira para funcionar a bolandeira na região. O proprietário da primeira bolandeira foi o Major Duda, em sociedade com o cunhado, José Alves de Moura. As bolandeiras movidas a boi ou a vapor (caldeira) entraram em decadência no período de 1925 à 1935, depois que surgiu uma grande beneficiadora em Surubim, que além de comprar toda a produção da região para beneficiamento da lã extraía o óleo do caroço. Ainda como subproduto tinha-se a torta de algodão (casca). O caroço antigamente servia para animais desnutridos e excelente ração para vacas leiteiras. INDÚSTRIAS DO POVOADO: Cerâmicas em quantidade de dez, tendo entre outros, por proprietárioLuis Pereira Alves Linaldo Manoel de Souza Valdecir Alves de Assunção A de maior produção pertence ao Sr. Pedro Cordeiro COMISSÁRIOS: José Gomes de Souza José Pedro de Souza José António Leandro José Pedro Alves. "MIGUEL ALVES DE MOURA" Data do Nascimento: 26 de junho de 1884 Falecimento: 25 de fevereiro de 1955 Miguel Alves de Moura nasceu e viveu em Lagoa de João Carlos, onde constituiu família e fincou as raízes de sua vida criando um nome que se firmou em uma base de honradez e dignidade, merecendo o respeito e admiração de todos os que o conheceram. 50 Exerceu intensa atividade que abrangeu todos os setores da sua vida naquela comunidade que era constituída praticamente de uma só família. Sem ter frequentado escolas em centros adiantados, idquiriu vasto cabedal de conhecimentos práticos com o que pontificava não só na povoação onde viveu mas em todo o município de Vertentes, ao qual pertencia Lagoa de João Carlos. Dono de uma inteligência fulgurante, era o tipo do homem dos sete instrumentos. Em todos os serviços onde fosse necessaria a sua presença, sua atuação era preponderante e, por isso, tinha sempre a palavra final na execução de serviços, obras ou negócios. Existem particularidades de aspectos bastante interessantes da vida de Miguel Alves de Moura, que merecem destaque na análise de sua atuação como homem público. Lembra Dr. Otávio Correia de Araújo, ex-governador de Pernambuco, seu compadre e amigo, que Miguel Alves de Moura poderia ter ficado com a maior parte das terras da região. Sendo agrimensor prático, fez a divisão de todas as terras da região e muitas vezes teve oportunidade de oficializar áreas consideradas "sem dono", talvez devolutas, regularizando tudo em nomes daqueles que ali trabalhavam. Na época, o Dr. Otávio era Promotor Público de Vertentes e a autoridade que homologava as demarcações. Ninguém melhor do que aquele ilustre homem público pernambucano para atestar a idoneidade do "capitão" Miguel. Fazia as demarcações, estabelecia os limites, lavrava escrituras particulares, fazia acordos e arrumações e os tabelionatos a tudo reconheciam, respeitavam e davam a cobertura legal que veio assegurar ao povo da região a legitimidade da posse de suas terras, nunca havendo desentendimentos que provocassem rupturas na paz daquela gente que tinha no velho Miguel o amparo, o apoio e a orientação segura e firme de que necessitassem. Muito teríamos que falar sobre a personalidade marcante do patriarca de Lagoa de João Carlos, o que serviria de exemplo para as gerações de hoje. Conversando com José Dudu, seu sobrinho-neto, foi lembrado o fato de que o "capitão" tinha um bom rebanho de gado leiteiro mas nunca vendeu um litro de leite à pobreza da vizinhança. De manhã quando tiravam o leite no curral,, quem quisesse podia chegar com seu vasilhame e levar a quantidade que precisasse para alimentar os filhos, demonstrando qualidades humanitárias sem limites. 51 Bastante ligado à política, era um entusiasmado pessedista, aliado do seu compadre e amigo Dr. Emílio Cavalcante. Vivia lendo o que lhe chegasse as mãos e não dispensava a leituia da "Folha da Manhã", jornal de Agamenon Magalhães, cacique do PSD de Pernambuco, interventor federal e governador eleito, com quero Miguel Alves mantinha relacionamento. Outra figura da política pernambucana com quem manteve bom relacionamento, foi Etelvino Lins. Este o nomeou fiscal arrecadador da coletoria de Vertentes. Sua autoridade moral pairava acima de tudo. Não gostava de jogos e enquanto viveu ninguém jogava em Lagoa de João Carlos e não era preciso que ele proibisse. Foi casado em primeiras núpcias com Dona Maria Madalena de Moura que, faleceu muito jovem em 1939, deixando um casal de filhos, Manoel e Maria. Casado pela segunda vez com Maria Azevedo Moura, nascendo da união dez filhos, todos vivos e residindo parte em Lagoa de João Carlos e parte em São Paulo, onde também reside a viúva junto aos filhos: Mércia Maria de Moura, Glória, Maria, Maria de Lourdes, Maria do Rosário, Maria do Amparo, José, Júlio e Jaime. Este último, professor em Frei Miguelinho. Dos filhos do primeiro casamento, só Maria Alves de Moura está viva, casada com um primo, José Pedro de Moura, residente em Lagoa de João Carlos e tem três filhos que vivem do comércio e da agricultura. Para fechar a análise sumária da vida de Miguel Alves de Moura, gostaríamos de destacar o fervor religioso que marcou sua vida. Construiu às suas expensas a capela de Nossa Senhora da Conceição em Lagoa de João Carlos. Perto da data de sua morte, lembrou-se de que havia feito uma promessa a Santa Luzia, quando sofreu de um problema de visão Iria construir a calçada da capela assim que estivesse curado do mal que lhe afetava a vista. Esqueceu de cumprir por um certo tempo e, de repente, mandou fazer a calçada com a maior pressa. No dia em que foram concluídos os trabalhos, sofreu o terceiro enfarte e morreu. Está enterrado na capela que construiu e no beiral da capela está gravada a data em que ficou pronta no cumprimento de sua promessa: 25-02-1955. Hoje a igreja é conservada pelos seus netos, José Pedro de Moura Filho, Severino Alves de Moura e Lindalvo Alves de Moura com a colaboração da comunidade. 52 MANUEL ALVES DE MOURA Data do Nascimento: 17 de outubro de 1908 Falecimento: 30 de março de 1973. Nasceu em Lagoa de João Carlos como seus antepassados e ali, também, constituiu sua família. Fez o curso que era possível fazer na escola do professor João Gualberto. onde o seriado era medido em termos de primeiro, segundo e .terceiro livros, todos de autoria de Felisberto de Carvalho. Manuel Alves chegou ao terceiro livro e sem dificuldades endeu as chamadas "quatro peças de conta", surpreendendo pela agilidade de seus cálculos. Logo cedo abriu uma "bodega" onde vendia de tudo: secos e molhados. Na mercearia de Manuel Alves todos se abasteciam tivessem ou não dinheiro para pagar na hora. O fiado, às vezes passava de um ano para o outro. Muita gente comprava durante todo o ano e pagava na safra do algodão. Outros mais necessitados trocavam na venda seus produtos por outros que não produziam. Não raro chegava uma mulher com uma dúzia de ovos e levava sal, açúcar e café. Outros traziam mamona e levavam um corte de tecido: brim, caque, Doriano ou mescla alvorada. O sistema era bom para as duas partes. Montou uma padaria e foi o primeiro na produção de pães e bolachas na região com seu compadre Severino Rufino fazendo entrega em Olho D'Água da Onça (atual Frei Migue. finho), Algodão do Manso, Capivara e Santa Maria do Cumbuca, município vizinho. Trabalhava duro das cinco da manhã às oito da noite e ainda tinha tempo para fazer um roçado de milho, feijão e algodão, sem falar nas doces melancias e nos suculentos jerimuns. Casou com Dona Guilhermina de Albuquerque Moura, filha de João Urbano e Maria Carneiro de Albuquerque. Sua esposa apareceu em sua vida quando veio do Algodão do manso para ensinar as primeiras letras às crianças de Lagoa de João Carlos. Atravessaram períodos difíceis e juntos enfrentaram as dificuldades. Enquanto Manuel enfrentava a luta no roçado, Guilhermina tomava conta do balcão da mercearia e costurava em sua velha singer. Também ensinava à meninada de lagoa de João Carlos. Manuel foi o pioneiro em instalar um gerador elétrico para iluminação e para carregar baterias para 53 rádios. O primeiro rádio foi comprado em 1939 e vinha gente de toda redondeza para ouvir os programas da Rádio Clube e da Rádio Nacional. Comprou o primeiro automóvel a rodar naquelas plagas. Durante a segunda guerra, conseguiu com um amigo de Vertentes uma quota de querozene e, graças a isso, melhorou suas vendas em face da grande procura daquele derivado de petróleo para iluminação. Tendo o querozene para vender, aumentou as vendas de géneros e outros produtos. No ano de 1949, transferiu-se para Surubim, onde estabeleceu-Se com uma boa mercearia e uma seção de tecidos. Com o crédito amealhado durante o tempo em que trabalhou em Lagoa de João Carlos, foi fácil expandir-se em Surubim. A mercearia de Lagoa de João Carlos, com padaria e tudo, ficou para o cunhado e primo José Pedro, casado com sua irmã Maria. Trabalhando com afinco, firmou-se como um dos maiores comerciantes de Surubim. Matuto humilde de Lagoa de João Carlos, chegou onde podia chegar com esforço, abnegação e serenidade, criando seus filhos com o exemplo do trabalho persistente, recebendo a homenagem de Surubim com seu nome em uma das ruas da cidade. São filhos do casal: o economista Valdemir Alves de Moura, casado com Eunice Moura e que tem quatro filhos. Valdemir Moura, tem atuação na área de planejamento, sendo um dos pioneiros da SUDENE e autor de mais de uma centena de projetos industriais, agropecuários e de reflorestamento implantados em quase todos os Estados do nordeste. Teve destacada atuação no jornalismo e na política e atualmente presta assessoria empresarial a grupos económicos de São Paulo e, também, dirige um empreendimento florestal e agroindustrial em implantação na Bahia. Vanildo Alves de Moura, bacharel em direito. É um destacado dirigente da SUDENE, altamente relacionado nas altas esferas administrativas e técnicas do governo federal, tendo inclusive, feito o curso da Escola Superior de Guerra por designação do presidente da República General Ernesto Geisel, Casado com Eralda Andrade Moura, tem um casal de filhos e reside em Recife; Maria do Carmo Moura Santos, diplomada em pedagogia (licenciatura plena) é supervisora local do setor "B" do DERE de Limoeiro. Casada com o comerciante Edvaldo Leal Santos e tem seis filhos. Colabora com o esposo nas ati54 vidades do Rotary Club de Surubim e na direção do Clube Social "Cara e Coroa" daquela cidade; Valdomiro Alves de Moura, tem o curso médio e prepara-se para ingressar na Universidade. É funcionário da SUDENE e participa das gestões de administração da Associação dos Servidores da SUDENE. Casado com Mirian Barreto de Moura e tem quatro filhos. VALDEMAR LIMA — ANTIGA "TOPADA" O primeiro nome dessa localidade foi "Topada", pelo motivo de dois agrimensores enviados pelo governo, ao que todo indica vindo demarcar sesmarias, ou áreas devolutas, encontrarem-se nesse pequeno rio que desemboca no rio Capi. baribe, e que até hoje permanece com o nome de "Riacho de Topada". Outros dizem que é devido à posição da desembocadura do riacho Topada no rio Capibaribe, desembocando de supetão e formando com este um ângulo de quase 90°. É esse mesmo riacho que serve de limite entre os municípios de Vertentes e Frei Miguelinho. Os dois agrimensores partiram, um da nascente do rio Capibaribe, na serra de Jacarará e o outro de Limoeiro, pró vavelmente. Um deles, o Comandante Barros, de nacionalidade italiana, permaneceu no lugar, fixando residência na foz do riacho. Fez doação de uma área de 420 braças de frente por 5/4 de léguas de fundo — cuja área, tempos depois conferida, verificou-se ser equivalente a l km de frente por 12 km de fun- a Nossa Senhora da Conceição, edificando aí uma Capela e o cemitério. Até hoje é festejado o dia 08 de dezembro, em homenagem à Santa padroeira. A terra que foi doada à Santa foi depois ocupada por dezenas de pequenos agricultores, sendo posteriormente vendida pelo Bispo de Nazaré aos mesmos, restando hoje uma limitada área onde está localizado o povoado. A transação foi realizada pelo Pé. José Távora, representando D. Ricardo Vilela, Bispo da Diocese de Nazaré. Foi patrono dos posseiros o advogado Dr. Otávio Correia de Araújo, radicado em Vertentes, ex-deputado Federal e Estadual, ex-Presidente da Assembleia Legislativa do Estado e ex-Governador interino do Estado de Pernambuco. Podemos encontrar no Livro de Registro de Imóveis de nº 11°, folhas 23 e 24, uma Escritura de Compromisso de Compra e Venda de vários posseiros. O primeiro comerciante da localidade foi Francisco Alves do Nascimento, oriundo do município de Caruaru, tendo 55 constituído família e sendo um dos primeiros habitantes do lugar. Casou com Paulina Vieira de Melo e teve entre outros filhos Manoel Vieira de Melo. casado com Francisca Vieira de Melo. Manoel Vieira de Melo, também conhecido por Manoel Alves, foi fazendeiro, agricultor e chefe político do povoado por muito tempo. Junto a Dona Francisca teve três filhos: Severino Alves do Nascimento, que foi o primeiro vereador da localidade, compondo a Câmara Municipal de Frei Miguelinho; fazendeiro e agricultor. Agripina Terezinha de Jesus, casada com Luiz Avelino da Silva; também comerciante no lugar e posteriormente próspero comerciante em Campina Grande. Josefa de Lourdes do Nascimento, casada com José Vitorino de Moura; professora por nove anos no povoado, sendo depois professora municipal e transferida para Recife. A primeira bolandeira foi construída pelo senhor António Costa, parente do fundador do lugar, na fazenda Pitombeira, às margens do rio Capibaribe. Anualmente ele comprava toda a produção de algodão, beneficiava e vendia em Caruaru, a 40 km ou em Limoeiro, a 100 km, transportando em lombo de animais os fardos de 80 kg. As estradas eram precárias e esse percurso era feito num período de três dias, para cobrir os cem quilómetros. A bolandeira, após o falecimento do seu proprietário e o aparecimento de modernas beneficiadoras em Caruaru, en trou em decadência, sendo a fazenda Pitombeira hoje de criação de gado, com modernas instalações, eletrificada e pertencente ao senhor João Galdino. O fundador Francisco Alves do Nascimento, Tenente da Guarda Nacional, na mesma época do início da bolandeira fundou uma engenhoca por nome de Engenho TOPADA, onde eram fabricadas rapaduras e aguardente em alambiques de barro. A variedade de cana usada era a saborosíssima cana caiana, variedade quase extinta, cuja produção distribuia-se com os fazendeiros e habitantes da região. Não se pagava imposto à Fazenda Nacional. O primeiro vereador pela Câmara Municipal de Vertentes, representando a localidade, foi o senhor Severino Avelino de Barros, vulgo Biu de Isaac — filho do Sr. Isaac Ave56 lino de Barros, proprietário da fazenda Barro Vermelho, hoje encravada no município de Vertentes. A primeira professora foi dona Mocinha, filha de Vertentes e tia do Coronel Braz Bezerra. FAMÍLIAS INFLUENTES: Manoel Soares da Silva e Maria Soares da Silva, que fundaram a localidade de Patos, ali construindo uma capela. Entre outros filhos do casal se sobressaiu o Sr. João Soares da Silva, vulgo João Doutor — próspero comerciante e industrial na cidade de Caruaru. O segundo vereador do lugar foi Luis Dionísio dos Santos vulgo Lu Fonseca, representante na Câmara Municipal de Frei Miguelinho. AUTORIDADES José Batista da Silva e Severino José de Oliveira, comissários no povoado e parentes do fundador O TENENTE MORTO DE EMBOSCADA Em fevereiro de 1926, o Tenente Cleto Campelo conseguiu levantar parte do exército contra o Governo daquela época. Chegando em Jaboatão tomou o trem de passageiros, seguindo destino ao Sertão pela linha central. No percurso parou em Gravata, sendo aí assassinado por um militar da polícia do Estado, de nome Machadinho. Após a morte do Comandante, o Tenente Valdemar Lima assumiu o posto de chefia dos revoltosos e ordenou ao maquinista seguir em frente. Nas imediações da estação Gonçalves Ferreira, entre Bezerros e Caruaru, o trem descarrilhou por motivo duvidoso. O Tenente Valdemar Lima, sem condução, resolveu desistir do seu plano: atingir as margens do São Francisco, onde se encontrava a Coluna Prestes, comandada pelo Capitão Luís Carlos Prestes, Cavaleiro da Esperança, até 1928, quando lançou um manifesto à Nação, renunciando à chefia dos revolucionários e se transformando num líder comunista. Valdemar Lima rumou sem destino para o Norte. A essa altura, todas as autoridades constituídas haviam se mobilizado para conter os revoltosos. Coube ao Sargento José Joaquim, vindo de Limoeiro pelas margens do rio Capibaribe e sendo informado que os revoltosos iriam atravessar o rio na 57 fazenda Pitombeira, bem próximo ao povoado de topada, estrategicamente assassinar o Tenente Valdemar Lima. Preparou uma emboscada, escondendo-se com seus comandados atrás de umas pedras, ficando seguramente protegido. O oficial revoltoso vinha montado a cavalo, guiado pelo senhor Amaro Jerônimo, pequeno proprietário na região, que na noite anterior havia hospedado a tropa em sua casa. A força do governo, em número de dezesseis, rompeu fogo contra os revoltosos (trinta) que não fizeram nenhuma vítima e sequer viram seus inimigos. Valdemar Lima e dois soldados morreram no mesmo instante, ficando ferido mais um soldado revoltoso e o senhor Amaro Jerônimo. O resto da tropa debandou na hora, e não mais se organizou. Os três cadáveres foram postos na calçada da capela do povoado Topada. O Sr. Amaro Jerônimo, depois de provada sua inocência, foi encaminhado para tratamento de saúde em Vertentes e ficou bom. O soldado ferido foi fuzilado, e sepultaram todos os cadáveres no cemitério de Vertentes. Após algumas horas, chegou também ao lugar o tenente Zumba, acompanhado de trinta e dois soldados, encontrando o Sargento José Joaquim e sua tropa na casa do Sr. Manoel Alves. Os dois militares se desentenderam no momento, quase havendo graves consequências, pelo seguinte motivo: O tenente morto trazia uma bolsa contendo muito dinheiro — era o que diziam naquele tempo. No entanto, quando o sargento apresentou a importância para contar havia apenas trinta e dois contos de réis, quantia que Zumba acreditava ser mais. Porém José Joaquim perguntou por que ele. com trinta e dois soldados e tão pertinho, em Vertentes, não chegou antes para matar os revoltosos e apanhar a bolsa em primeiro lugar. "A importância é esta, que lhe entrego devido às minhas condições de subalterno". O tenente guardou a bolsa e ainda exigiu o revólver de Valdemar Lima, que o sargento pretendia guardar pelo resto da vida. Um fenômeno importante aconteceu naquele dia: a população de Topada saiu em polvorosa para se embrenhar nos matos, apavorada com a notícia de que as tropas do Governo iriam exterminar com todos dali. Até 1930 os mortos eram considerados "fora da lei" mas após esse tempo tornaram-se heróis. Daí mudaram o nome de Topada para Valdemar Lima, em homenagem àquele tenente que tombou às margens do rio Capibaribe, dando sua vida por um Brasil melhor. Era pernambucano do Recife. 58 Declarantes — Manoel Alves do Nascimento e Severino Alves do Nascimento. ALGODÃO DO MANSO A origem do nome deve-se ao fato de que inicialmente, seus fundadores plantaram no local uma lavoura ou roçado de algodão, às margens de um riacho chamado riacho do Manso, denominando-se assim naturalmente o lugar de Algodão do Manso. Esse povoado foi fundado pelo Capitão da Guarda Nacional António Cabral de Arruda — oriundo do senhor Manoel Baié, residente às margens do rio Capibaribe. Em 1890, o Capitão Cabral deixou a sede da fazenda e construiu sua residência próximo ao riacho, por ser mais fértil Seus amigos, seguindo seu exemplo, construíram aí suas casas. FILHOS DO FUNDADOR: João Cabral de Arruda — casado com Dona Luisa Baié, sua parente; Manoel Cabral de Arruda — casado com Antônia, descendente da família Moura: José Cabral de Arruda — casado com Maria, também descendente da família Moura. Dessa família existe Conrado Cabral de Arruda, filho de Manuel Cabral de Arruda, casado com Raimunda — descendente das famílias Moura e Cabral. O restante da família emigrou para o Estado de Mato Grosso. Conrado Cabral de Arruda — viúvo, não possui filhos. O senhor Manoel Vitor Chaves de Araújo, vindo do município de Bom Jardim, estabeleceu-se na localidade como comerciante de estivas e construiu a primeira capela em 1931. Tempos depois emigrou para o município de Caruaru. A capela desmoronou e foi reconstruída em 1933 por Henrique José de Souza e demais pessoas, contando com a orientacão do Padre Lima, de Surubim. 59 A padroeira é Santa Teresinha, que recebe todas as homenagens . Chegou ao povoado o senhor Manoel Francisco da Silva, que fez negócios com diversas propriedades, formando a Fazenda União. Veio do município de Surubim e tornou-se conhecido como Néu Chico. Casado com Dona Guilhermina, teve um filho, José Francisco da Silva — que apesar da fazenda estar em decadência, continua como agricultor. FAMÍLIAS INFLUENTES: João César da Silva — vindo de Surubim, casado com Dona Maria César da Penha, tendo como filhe Alberes César da Silva, formado em Engenharia, emigrado para o Sul do país. 1°. comerciante — António Cabral de Arruda e seu filho João Cabral de Arruda; 1°. padre a celebrar missa — Padre António Lima; Ia. bolandeira -- pertenceu ao Capitão António Cabral. Construída em 1890, funcionou até 1912, quando foi comprada pelo Tenente Galdino. Em 1915 vendeu, tendo reformado para caldeira. Em 1932 foi extinta. A produção de algodão, após ser comprada, sofria o processo de descaroçamento e era vendida em fardos de 80 kg. O transporte era feito em lombos de burros e o comprador era o Dr. Pinheiro, de Limoeiro. O célebre bandoleiro António Silvino visitou o lugar, por mais ou menos quatro vezes, entre 1907 a 1914. Hospedava-se na Fazenda Manso, pertencente ao Dr. Joaquim Guerra acompanhado de no máximo seis bandoleiros. 60 1°. sub-delegado — Capitão António Cabral, e também Conselheiro; 2°. sub-delegado -- Capitão Firmino Correia Queiroz; 3°. sub-delegado — Manoel Deodato, Brinco: morador no sítio 4°. sub-delegado - - Capitão Severino Almeida, que per maneceu por mais de dez anos. Constituiu famí lia e mudou-se para Santa Maria do Cambucá; António Vítor Chaves de Araújo, irmão de Manoel Vítor Victor -- residiu no povoado, também foi negociante; DECLARANTE: José Maria de França, morador do povoado e próprietário do sítio Lagoa do Pega-Pé. Nasceu em 1895. Descendente de portugueses, aqui chegando construiu casa e família — 15 filhos. Sua esposa chama-se Adélia Maria da Conceição . Todos os fundadores de Algodão do Manso, são oriundos de Capivara. A fazenda Manso, uma das maiores do município, fundada pelo Dr. Joaquim Guerra, foi vendida em 1916 ao Dr. José Gayão e tempos depois passou para o Dr. Paulo Guerra, pertencendo até hoje à mesma família, Chã Grande — Chã do Carmo José Agostinho Maciel e Manoel Pereira de Lucena, doaram uma área para construção da capela. No entanto, por ser este terreno pequeno para o fim a que se destinava, os habitantes circunvizinhos se reuniram para pagar outra área adquirida dos herdeiros de Manoel Pereira de Lucena. Depois de legalizado o local e com permissão do pároco da freguesia, teve início a construção. O senhor Severino Braz Pereira de Lucena — vulgo Doutorzinho, assumiu a responsabilidade de angariar fundos para a construção da futura igreja. Dedicava tempo integral ao seu trabalho. Logo cedi. nho saía montado a cavalo, vestindo roupas pretas, chapéu de abas largas e um bornal a tiracolo. Convencia, além dos fa. zendeiros que recebiam sua visita, aos mais humildes na feira. Dispunha sempre de santos, rosários, crucifixos, terços, escapulários, etc., para trocar pela oferta em dinheiro. Os mais antigos poderão lembrar-se de Doutorzinho, em suas andanças por Toritama (antiga Torre), Vertentes, Santa Maria do Cambacá, Junco ou Livramento, Frei Miguelinho (antigo Olho D'Água da Onça) e Surubim. 61 Apesar de seu trabalho extenuante, como é comum até hoje, ainda existiam as "más línguas" que duvidavam de sua honestidade. Todavia, com o passar dos tempos, provou ser correto e sua fidelidade ao ideal escolhido. A construção da Capela foi feita pelo pedreiro Manoel Xavier de Oliveira, vulgo Manoel Peroba; o mestre de obras foi o Mestre Amaro Zumba, conhecido em toda a região, e o administrador o senhor João de Souza, que muitas vezes teve que recorrer aos seus próprios recursos e do Doutorzinho para efetuar pagamentos de mão-de-obra e material empregado, quando as ofertas não eram suficientes. Iniciada a capela em 1924 e concluída em 1925, o Doutorzinho sentiu-se recompensado de todo seu trabalho e até das calúnias que lhe foram lançadas. No dia 16 de julho de 1925, foi celebrada a primeira missa pelo Padre Manoel da Rocha de Carvalho, com a realização de uma grande festa. Nessa ocasião, o padre explicou aos habitantes que o nome do povoado poderia mudar para CHÁ DO CARMO, em homenagem à padroeira Nossa Senhora do Carmo, uma vez na freguesia existir outro local denominado Chã Grande. Foi aceita com grande entusiasmo a denominação que permanece até hoje. Padres que celebraram missa nessa capela: Padre Manoel da Rocha 4Padre Barbosa 5Padre Petrônio Padre Manoel Gomes. 6Padre Renato 7Padre Calixto 8Padre Jonas 9Padre Olezil 10Padre Mário O primeiro professor — Severino Braz Pereira de Lucena (o Doutorzinho); A primeira professora diplomada - - Josefa Cabral de Souza, vinda de Toritama. O cemitério foi construído em 1940, por Manoel Braz Pereira de Lucena e Severino João da Mata. O terreno foi doado por João Agostinho Maciel e os recursos angariados na própria povoação. 62 A primeira bolandeira pertencia ao Tenente da Guarda nacional -- Manoel Pereira da Silva Braz, que comprava a produção da região, descaroçava e enviava a lã para Limoeiro em fardos de 80 kg, em lombo de burros. Inicialmente, a bolandeira era movida por intermédio de bois e posteriormente a vapor. Quando surgiu a beneficiadora moderna em Surubim, a bolandeira entrou em decadência, extinguindo.se no ano de 1938. O primeiro comerciante — mestre Zumba, que estabeleceu-se com uma venda de estivas; A primeira padaria pertenceu Braz de Souza ao senhor Severino O primeiro proprietário de caminhão — José Leitão Filho, vulgo Duda Leitão; O primeiro proprietário de automóvel — José Braz da Paixão. Em 1955, chegou no povoado o senhor José Marques, vindo de Santa Maria do Cambucá, estabelecendo-se com uma farmácia. Infelizmente faleceu, sendo extinto aquele estabelecimento que tanto serviu aos habitantes. FAMÍLIAS TRADICIONAIS: Manoel Pereira de Lucena — casado com Isabel Pereira de Lucena; Manoel Barbosa de Lucena — casado com Maria Francisca de Jesus, vindos de João Alfredo, antigo Boa Vista; José Agostinho Maciel — casado com Maria Maciel; João Agostinho Maciel — casado com Joana Maria da Conceição, vindos de Bom Jardim; Manoel Pereira da Silva Braz — casado com Francisca Maria da Conceição. Tiveram os seguintes filhos: Manoel Félix Pereira da Silva — casado com Vicência Isabel das Mercês; 63 Francisco Braz da Silva — casado com Belarmina Francisca de Jesus; Braz Pereira de Souza — casado com Francisca Maria da Conceição; Firmino Braz da Silva - - casado com Maria Francisca de Jesus; João Pedro Pereira da Silva — casado com Joaquina Francisca das Mercês. — José Pereira da Silva Braz — casado com Amara Josefa da Conceição, tiveram os seguintes filhos: Joaquim Braz da Silva — casado com Olímpia Francisca de Jesus; Anacleto Braz da Silva — casado com Maria Ferreira da Silva; Maria Francisca de Jesus — casada com João Adelino Pereira de Lucena; Josefa Francisca de Jesus — casada com Braz Pereira de Lucena; Rita Francisca de Jesus — solteira. O primeiro vereador -- João Braz de Lucena, vulgo João Pimpa; O segundo vereador — Braz Pereira de Sousa Filho. -Graciete Alves de Almeida Calado — universitária no Rio de Janeiro, filha de Manoel Braz de Souza e Josefa Cabral de Souza; -Marcos José de Aguiar — universitário no Rio de Janeiro, e Michel António de Aguiar -- pré-vestibulando também no Rio de Janeiro; filhos de Miguel António de Aguiar e Justina Braz da Silva; — Everaldo Braz de Souza — filho de Braz Pereira de Souza Filho e Judite Costa de Lucena, cursando o 2°. Grau em Frei Miguelinho; 64 Elizabete Lucena de Souza e Eliane Lucena de Souza — filhas de Higino Braz de Souza Irmão e Laura Maria de Lucena Souza — cursando o 1°. Grau em Frei Miguelinho; Ivone Agostinho da Silva — filha de Abdias Agostinho da Silva e Iraci Fonseca da Silva, cursando o 1°. Grau em Frei Miguelinho; Eugenia Deodato de Lucena -- filha de Pedro Deodato de Lucena e Maria Deodato de Lucena — curso superior, Diretora de um educandário em Caruaru; Berenice Pedro da Silva — universitária no Rio de Janeiro e Eunice Pedro da Silva — 2°. Grau em Frei Miguelinho, filhas de Francisco Pedro da Silva e Joaquim Maria da Conceição; Severino Adelino de Lucena — engenheiro no sul do País e Maria Helena de Lucena — médica no Rio de Janeiro, filhos de Sebastião Braz de Lucena e Severina Adelino de Lucena; Sandro Adelino de Lucena — filho de João da Mata de Lucena e Terezinha Adelino de Lucena, 1°. Grau; Protázio Leitão Alves — filho de José Leitão Neto e Severina Josefa da Conceição, cursando o 1°. Grau; Delia Carlos de Lucena — Luciene Carlos de Lucena e Severino Carlos de Lucena Neto — filhos de Isaías Carlos de Lucena e Agripina Pereira de Lucena, cursando o 1°. Grau; Maria José da Silva — filha de Josefa Soares da Silva e Pedro Damião Pereira da Silva, cursando o 1° Grau; Vilma Pessoa da Silva — filha de Justo Pessoa da Silva e Maria Pessoa da Silva, cursando o 2°. Grau; Marinalva Nativa Pereira e Lenilda Nativa Pereira — filhas de Nativa Bernardina Pereira, 1°. e 2° Graus; Joselito Xavier de Lucena — filho de Severino Xavier de Lucena e Maria Vitorina da Mata, cursando o 1°. Grau; 65 Marta Lucena da Mata — filha de Manoel Pedro de Lucena e Margarida Vitorina da Mata, cursando o 1°. Grau; Marina Severina da Silva — filha de Firmino Pedro da Silva e Severina Maria da Conceição; — Teodora Maria Cursino Gomes — filha de João André Cursino Gomes e Maria Cursino Gomes, cursando o 1°. Grau; Todos os citados são estudantes em Frei Miguelinho. Podemos citar também: Emídio Adelino de Lucena — militar, sargento da Força Pública de São Paulo; João Pedro Pereira da Silva — sargento do Exército; Aurimendes Pereira de Lucena — aeronáutica. Foi declarante o senhor Miguel António de Aguiar, que merece um destaque todo especial: é escultor nato. Fez a escultura de Nossa Senhora de Fátima em 1942, em homenagem a Santa que apareceu em Portugal. É uma grande obra de arte, segundo observadores competentes. Esculpiu também o busto de Padre Renato e atualmente está esculpindo o busto do Dr. Emídio Cavalcante de Albuquerque, médico e ex-deputado, descendente da tradicional família Cavalcante, de Vertentes. Esse grande artista, que tem apenas o curso primário, sem recursos técnicos adequados, consegue fazer tudo isso apenas olhando a fotografia. É um filho da terra que é digno de todo respeito e admiração por parte de seus conterrâneos, pelo privilégio que recebeu da Natureza Criadora. Ventura — Placas A denominação de Placas deve-se ao fato de que, na bifurcação da estrada onde indicava o rumo a Trapiá e Chã do Carmo, existia uma placa indicativa. O fundador da povoação foi o senhor João Leitão Filho, vindo das redondezas. Em 1949, ele iniciou a construção de algumas casas, chegando a concluir vinte e uma delas. Em 1950 deu início à construção também da capela, só terminando em 1952. As casas eram construídas e revendidas aos novos moradores que iam chegando. 66 A área onde se encontra instalado o povoado foi comprada pelo fundador — João Leitão Filho, a Francisco André da Silva e João Ferreira de Moura, doando em seguida à Santa Nossa Senhora das Dores -- padroeira de lugar cuja festa realiza-se todo dia 1°. de fevereiro. A 1ª missa foi celebrada na casa de Francisco Leitão, no dia 10 de fevereiro de 1949, pelo Padre António Barbosa. O fundador nesse dia, manifestou o desejo de construir a capela, expondo suas ideias ao Padre Barbosa que respondeu-lhe negativamente, achando que prejudicaria a capela de Chã do Carmo. No entanto, após sua transferência para outra paróquia, chegou Padre Renato Correia Guedes que aprovou a ideia e demarcou o local da capela. E assim, a primeira missa celebrada na capela foi no dia 1° de fevereiro de 1951, por Padre Renato. O mesmo permaneceu dando assistência espiritual por trinta longos anos, sendo muito estimado por toda a população do povoado. Faleceu no dia 06 de julho de 1978, deixando uma lacuna na nossa comunidade. João Leitão Filho organizou ainda, uma feira que teve a duração de apenas três anos, extinguindo.se em 1952 devido à seca. O primeiro comerciante foi o senhor Francisco Leitão Alves, irmão do fundador. A primeira professora foi Dona Delfina, lecionando pelo município. FAMÍLIAS ILUSTRES: Manoel Ferreira de Moura, casado com Maria Severina de Jesus, pais da primeira professora filha da localidade - Maria Severina de Moura, formada em Frei Miguelinho, em 1977. Filhos do fundador que se destacaram no ramo do comércio: Odilon Leitão Alves, casado com Efigênia Cecília Alves; Alves; Albertino Leitão Alves, casado com Maria José Alves; Maria Tertulina Alves, casada com Abílio Leitão Alves, ex-vereador do município e pai de Lourinaldo Leitão Alves, candidato não eleito a vereador. Estudantes cursando 1°. e 2°. Graus, na Escola São José, de Frei Miguelinho: Maria de Fátima de Lucena, filha de Arlindo Cassimiro de Lucena e Enedina Pinheiro de Lucena; 67 Ivonete Josefa Alves e Ivaldete Josefa Alves, filhas de Abdias Leitão Alves e Josefa Maria Alves; Severino Cassimiro de. Lucena, filho de José Cassimiro Sobrinho e Edite Pinheiro de Lucena; Sueli Iracema de Lucena, filha de Inocêncio Ferreira de Moura e Iracema Francisca de Lucena. Esses, portanto, são os primeiros ginasianos do povoado. A população vive de agricultura e pequeno criatório, além do comércio de cereais. CAPIVARA O nome teve origem devido à existência desse animal às margens do rio Capibaribe, encontrado com muita frequência pelos caçadores da época, que assim o denominaram: CAPIVARA, O senhor Manoel Ferreira da Silva, vindo de São José dos Bezerros, conhecido também por Manoel Baé, em 1825 construiu na localidade três casas e aí fixou residência. Filhos do fundador Manoel Baé: Serafim Ferreira da Silva, casado com Ana Maria Conceição; João Ferreira da Silva, casado com Luiza Maria Conceição; António Cabral de Arruda, casado com Josefa Maria Conceição; Joaquim Ferreira da Silva, casado com Antônia Maria Conceição; Amaro Ferreira de Arruda, casado com Maria Prancisca Conceição; Francisco Ferreira da Silva, casado com Josefa Ferreira Souza; José Ferreira da Silva. Manoel Baé doou uma área de terra à Santa — Nossa Senhora da Conceição, construindo aí sua primeira Capela, em 1833. 68 A festa tradicional do lugar, portanto, é no dia 08 de dezembro. A capela foi reformada em 1875 por Nito Joaquim Gomes de Souza; e em 1951 pelo povo em geral e sob a orientação do Padre Jonas Menezes. Um dos primeiros padres a celebrar na capela foi o Padre França. Esse religioso morou durante muitos anos em Santa Maria do Cambucá, e celebrava nas capelas de toda a região, durante longo tempo. Outro padre que prestou assistência ao local, foi o padre Tejo. Contamos também com a presença do padre António Lima, de Surubim, orientador espiritual que edificou no dia 14 de dezembro de 1933 o primeiro cruzeiro do lugar, erigido a monte, em cima de uma pedra, dominando o panorama do povoado. Tivemos ainda a assistência do Padre Rocha, de Taquaritinga. Dos filhos do fundador, um dos que conseguiram pror-se, como fazendeiro, criador de gado e agricultor foi Joaquim Ferreira da Silva. Após a sua morte, a fazenda entrou em decadência, subdividiu-se, e seus filhos se transformaram em humildes agricultores, permanecendo ainda na região. Outro filho que se sobressaiu foi Francisco Ferreira da Silva, dando origem posteriormente à família Almeida. Uma sua filha de nome Josefa (dona Senhorinha), casou com Manoel Almeida, nascendo entre outros: José Ferreira de Almeida (Dedé de Almeida), morto em corrida de mourão ainda jovem; Miguel de Almeida Sebastião de Almeida Libânio de Almeida Severina Freire de Almeida, casada com o Sr. Aureliano Ferreira de Almeida. Ela foi ferida pelos cangaceiros do Capitão António Silvino no dia 12/06/1912, em Santa Maria do Cambucá; Eulália de Almeida, casada com o Sr. Pedro de Moura Pororoca; Josefa Ferreira de Almeida, casada com o Sr. Cassiano Valentim de Lima; 69 Maria Emília de Almeida, casada com o Sr. António José de Lima; Severino Ferreira de Almeida, casado com Dona Teodora Bezerra, já citada na relação das famílias que povoaram Frei Miguelinho. Entre dezenas de netas de Dona Senhorinha, podemos citar com destaque Dona Izabel Ferreira de Almeida, prima Manoel Cabral de Arruda, casado com Antônia Josefa Conceição; José Cabral de Arruda, casado com Maria Josefa da Conceição; e esposa do Sr. Péricles de Almeida, filha de Dona Severina Freire de Almeida, atingida pelas balas dos cangaceiros. Entre os povoadores da região, inclusive Algodão do Manso, encontramos António Cabral de Arruda, que conseguiu destacar-se como família influente, casado com Josefa Maria da Conceição, tendo os seguintes filhos: Luisa Josefa de Arruda, casada com Tomé Lourenço dos Santos; Isabel Josefa de Arruda, casada com Manoel José Pedro; Ana Josefa de Arruda, casada com Manoel Moura da Silva; todos agricultores na região. Do casal Luisa Josefa de Arruda e Tomé Lourenço dos Santos, nasceram: João Tomé de Arruda, casado com Flora Maria Conceição; Vitorino José de Arruda, solteiro; Joaquim Tomé de Arruda, casado com Guilhermina Maria Conceição; Valdivino Tomé de Arruda, solteiro; Salvina Josefa de Arruda, casada com António José de Souza; 70 Isabel Josefa de Arruda, casada com Pedro Galberto de Souza; Francelina Josefa de Arruda, casada com Luiz Gomes de Moura; Laurentina Josefa de Arruda, casada com João Ferreira de Souza; todos vivendo da agricultura local; José Moreno dos Santos, fazendeiro na região; ex.vereador, líder local. Manoel Ferreira da Silva, inspetor de quarteirão e primeira autoridade. Manoel Pontes, praticou o primeiro crime, assassinando duas pessoas: Joaquim Maria e Andrade, tendo revoltado toda a população. Foi preso pelo Tenente Galdíno, proprietário da bolandeira de Algodão do Manso. Serafim Ferreira da Silva, dono da primeira bolandeira do lugar. Comprava a produção da região, descaroçava e mandava para comercializar em Limoeiro com o Dr. Pi. nheiro — o maior comprador de algodão da época. O algodão era transportado em lombo de burros, em fardos de 80 kg. O cemitério foi construído pelo fundador, Manoel Baé. As maiores cheias registradas no Capibaribe: 1914, 1916, 1941, 1960, 1977 — sendo essa última a maior de todas. O primeiro comerciante foi Joaquim Ferreira da Silva Atrações do povoado: —Festas na igreja, durante o mês de maio. —Festa da Padroeira Nossa Senhora da Conceição. — Festa de São João, ---Festa de São Pedro. — Festa de Santo António. Foi declarante do histórico do povoado acima, João Tomé de Arruda, casado com Libertina Maria da Conceição, nascido em 1899 na localidade. 71 CAPÍTULO IV OS PRIMEIROS POVOADORES Contam que o criador de gado Tomé José de Moura, residente na margem direita do rio Capibaribe, no município de Bezerros (início do século XIX), sentiu falta de alguns animais de sua propriedade. Reclamando a seus empregados, o escravo Mateus disse-lhe que tinha quase certeza que as mesmas estavam desaparecendo para o lado norte do rio, região desabitada e de difícil acesso, onde havia onças e outros animais ferozes. O fazendeiro levou em conta as informações do seu escravo e, munido de ferramentas e armas, seguiu para a região citada, indo encontrar uma fonte natural de água e vários cadáveres de animais que haviam sido devorados pelas onças. Impressionado com a abundância da água, resolveu construir uma fazenda no local. Com habilidade, armou uma tocaia e matou a tiros todos os gatos selvagens que ali apareceram. Ao mesmo tempo foi abrindo uma clareira, onde fundou uma fazenda e pôs-lhe o nome de Olho D'água da Onça, em alusão às onças que povoavam o lugar para onde, posteriormente, veio residir com seus irmãos António Francisco de Moura, João de Moura Cabral e Manoel José de Moura. Devido à falta de documentos comprobatórios, não temos certeza se as terras eram devolutas ou se pertenciam ao terreno que foi doado a D. Maria Ferraz de Brito, dona de uma sesmaria com uma vasta área em Taquaritinga. O que conhecemos é que tempos depois os habitantes da região foram definitivamente legalizando as propriedades. Depois que estavam localizados, Tomé de Moura e seus irmãos, foram aparecendo outros povoadores, entre eles José Estanderlau, que com o consentimento de Tomé de Moura teve a primazia de construir as primeiras casas da localidade e 73 abrir o primeiro estabelecimento comercial. Resolvendo retirar-se para outras paragens, vendeu suas casas e o estabelecimento comercial ao Capitão Manoel Gomes de Oliveira (Marinheiro) que, tempos depois, deixou como herança para o seu filho Manoel Alexandre de Oliveira. O Arruado tomou o nome de Olho D'água da Onça, em referência à fonte que deu início ao povoamento. O progresso da localidade foi muito lento e só em 1883 Olho D'água da Onça era povoado, pertencendo ao município de Taquantinga. Naquela época, o vigário chamavase Padre Renovato de Assis Pereira Tejo, vindo do Estado da Paraíba, conhecido em toda a freguesia como Padre Tejo, que, além de religioso era o chefe político da região, o qual nomeou como primeiro professor interino, José de Moura que voltava a sua terra como cabo reformado. Ele agora seria o responsável pela alfabetização dos moradores do povoado. A PRIMEIRA MISSA A primeira missa da localidade foi celebrada pelo Padre Tejo, no Natal de 1883, numa capela improvisada na casa de Maria Fonseca, onde hoje se encontra o cemitério velho. Esta moça uniu-se em matrimónio com um membro da família Moura. Em 1899, foi construída a capela pelos colonizadores, tendo como padroeiro o Glorioso S. José e como primeiro vigário o padre Tejo. Podemos deduzir que os Mouras não eram muito religiosos, pois se o fossem não haveriam passado dezenas de anos sem que doassem uma área de terra para se construir uma capela para o santo. Segundo diziam os seus descendentes mais chegados, o Senhor Tomé de Moura durante sua longa existência, só se preocupava com a criação de gado. Gostava de lugares desertos, não gostava de política e não incentivava o progresso da terra. Daí os motivos de haver passado tanto tempo sem os habitantes edificarem uma capelinha, tão necessária para a população. A igreja localizada na sede do município de Frei Miguelinho é atualmente a comprovação de que os nossos conterrâneos herdaram do primeiro habitante do lugar a indeferença para a religião católica. A igreja é muito pequena e se apresenta como uma capelinha de povoado decadente. As paredes manchadas denunciam o desprezo que há muito vem recebendo. Os bancos e cadeiras de inferior qualidade e ainda 74 sem conservação. Até as imagens parecem tristes e desassistidas, diferente da capela de Chã do Carmo, povoado do mesmo município, que tem aspecto de matriz bem cuidada. Somente agora no ano de 1980, João Morotó e Manoel Pereira doaram uma área onde está sendo construída uma igreja que, como demonstra o projeto e construção já em andamento, é um templo moderno de acordo com o progresso atual. O primeiro professor diplomado foi o Sr. João Sizino que lecionou por muitos anos, até quando foi substituído pela professora Maria Antônia. Infelizmente não dispomos de dados biográficos para fazer referência a esses dois educadores que por aqui passaram, semeando a cultura e o saber em nossa terra. Até 1915, Olho D'Água da Onça pertenceu ao município de Taquaritinga, com o povoado situado no Distrito de Vertentes. O PRIMEIRO TABELIÃO E AS LUTAS PELA SEDE DO MUNICÍPIO A 16 de novembro de 1928, por lei municipal, foi criado o 1°. Distrito de Olho D'Água da Onça e nomeado oficial de Registro Civil, com as funções de Tabelião, João Alexandre de Oliveira, pelo Dr. Álvaro Simões Barbosa, Juiz de Direito da Comarca de Taquaritinga do Norte. A 03 de março de 1939, o Distrito de Olho D'Água da Onça passou a chamar.se Frei Miguelinho, em homenagem ao frade revolucionário. Adiante iremos dar a biografia do padre. Vale salientar que Olho D'Água da Onça — Frei Miguelinho, não tomou parte ativa nas lutas políticas entre Vertentes e Taquaritinga. Conta a tradição que, sendo o Dr. Maciel Pinheiro nomeado Juiz de Direito da Comarca de Taquaritinga, instalou a sede da Comarca no povoado de Vertentes, motivado pela dificuldade de transporte para a cidade serrana, haja visto naquela época não existir estrada. Por força da lei Provincial n°. 1260, de 26 de maio de 1877, foi Vertentes tornada sede da Comarca de Taquaritinga. Instalada a sede em Vertentes, foi esta elevada a Vila, pela lei Provincial n°. 1517, de 04 de fevereiro de 1879. A rivalidade entre taquaritinguenses e vertentenses pela primazia da sede do município e da Comarca, começou em 1879 e prolongou-se até 1945, quando o Estado Novo extinguiu os termos. 75 TORNOU-SE MUNICÍPIO Quase todas as informações acima foram baseadas em histórias que passaram de pais para filhos e destes para os netos e que, pelos fatos, achamos certas e estamos registrando, enquanto ainda podemos ouvir algumas pessoas de idade avançada, que não esqueceram as palestras dos seus avós. A televisão não deixa mais se ouvir histórias do passado, fora dos arquivos já anotados. Em 1963, após reivindicações e debates, o deputado António de Arruda Farias conseguiu a aprovação do seu projeto de Lei, subscrito pelo então Governador do Estado, Dr. Miguel Arraes de Alencar, no dia 20 de dezembro, elevando-se à categoria de município pela Lei n°. 4977. Foi realizada a instalação no dia 10 de agosto de 1964. PRIMEIRO PREFEITO Depois de emancipado, teve como seu primeiro Prefeito nomeado (interventor) o 1°. Tenente do Exército, Geraldo Soares da Silva, empossado no dia 04 de agosto de 1964. No dia 20 de março de 1965, às 14:00 horas, tomou posse como Prefeito o Dr. António Heráclio do Rego, nomeado por ato do Exmo. Sr. Governador Paulo Pessoa Guerra. Político influente na região, fazendeiro e filho do Capitão Jerônimo Heráclio do Rego, um dos maiores valores do norte de Pernambuco . Com as eleições de 1964, teve o nosso município a sua primeira legislatura, através do voto livre. Foi eleito para o cargo de Prefeito o Sr. Naércio Correia Gayão, que administrou o município de 16 de maio de 1965 a 30 de janeiro de 1970. A PRIMEIRA CÂMARA A primeira câmara constituiu-se dos seguintes vereadores: 76 Crispim Hipólito de Medeiros António Manoel de Moraes Domingos Gonçalves de Lima Severino Cardoso de Arruda José Pedro de Moura Filho "ANTÓNIO ARRUDA DE FARIAS" Relator do projeto que emancipou o município de Frei Miguelinho, Nasceu em Surubim em 28 de novembro de 1932. Filho de Severino Barbosa de Farias e Estefânia Arruda de Farias. Fez seus primeiros estudos no Colégio N. S. do Amparo em Surubim. Fez o ginasial e clássico nos Colégios Pedro Augusto e Nóbrega em Recife. Formou-se em Economia, pela Universidade Católica em 1955. Casado com Maria Geralda Heráclio de Farias. Tem 03 filhos: António Farias Filho (desaparecido) ; Maria Carmem, casada com José Roberto de Almeida; Eduardo José, estudante de Economia e Marcelle Maria, estudante de 13 anos. Foi Deputado Estadual em duas legislaturas — 1962 a 1966 e 1966 a 1970. Foi Prefeito do Recife no período de 1975 a 1979. Na época em que apresentou o projeto de emancipação de Frei Miguelinho, o presidente da Comissão de Negócios Municipais era Osvaldo Coelho, hoje Deputado Federal e o Presidente da Assembleia era Inácio de Lemos. O número do projeto é ...... 148-16.4-63, a lei é de n<?. 4977 — 20.12.63. Durante os períodos legislativos em que foi Deputado, António Farias foi Presidente da comissão de Finanças em 67 — 68 — 69. Foi também 4º. Secretário da Assemblei em 63 _ 64 — 6 5. José Manoel de Souza Severino Alves do Nascimento Saturnino Severino da Silva Abílio Leitão Alves. Presidiu as eleições como primeiro Juiz Eleitoral o Dr. Edgar Sobreira de Moura, Juiz de Vertentes. Também como primeiro Promotor de Justiça o Dr. Ivens Peixoto. Vale salientar que o Moura de Dr. Edgar vem da tradicional família de São José do Belmonte, alto sertão pernambucano . As primeiras realizações do primeiro Prefeito foram as seguintes: 1 — Prédio da Prefeitura Municipal de Frei Mi. guelinho; 2 — Grupos Escolares: 1Lucy dos Santos — no povoado de Placas; 2Princesa Isabel — no povoado de Algodão do Manso; 3 — Calçamentos das ruas Capitão Manoel Alexandre — Av. Presidente Kennedy; 12— Quadra de Esportes (já destruída); 13— Instalação de um Parque Infantil (já destruída) ; 6 — Cemitérios, na Sede do município e no povoado de Algodão do Manso; 7 — Projeto do Mercado Público da cidade. Transcrevemos abaixo, a cópia da Ata de Instalação do Município: PRIMEIRAS AUTORIDADES ATA DE INSTALAÇÃO DA PREFEITURA MUNICIPAL DA CIDADE DE FREI MIGUELINHO — ESTADO DE PERNAMBUCO Aos quatro (04) dias do mês de agosto do ano de mil novecentos e sessenta e quatro (1964), às dezesseis horas, foi instalada oficialmente a Prefeitura Municipal da Cidade de Frei Miguelinho, distrito desmembrado do município de Vertentes, em reunião realizada no salão situado à Praça Dr. Joaquim Nabuco ; nesta cidade, contando com a presença de 77 várias autoridades civis e militares, inclusive com a presença do 1°. Tenente do Exército Sr. Geraldo Soares da Silva, Prefeito nomeado pelo Exmo. Sr. Governador do Estado Dr. Paulo Pessoa Guerra, para este município, tendo sido convidado para presidir o ato solene o Exmo. Dr. Jaime Santana, mui digno Prefeito da cidade de Vertentes, que fazendo uso da palavra convidou o Tenente Geraldo Soares da Silva, para que procedesse a instalação do município que ficará sob a sua legislação. O Prefeito deste município fez uso da palavra agradecendo e convidando o Sr. Maurício Ferreira Chaves, para servir de Secretário "ad-hoc'', autorizando ao mesmo a proceder a leitura da ata, Atos e Portarias baixadas pelo Exmo. Sr. Prefeito, 1°. Tenente Geraldo Soares da Silva. Nada mais havendo a tratar foram encerradas as festividades de instalação, tendo seu Secretário "ad-hoc" lavrado esta ata, assim e se acharem de acordo passarei para assinarem. Maurício Ferreira Chaves Geraldo Soares da Silva Dr. Jaime Justiniano de Santana Severino de Almeida Filho João Alexandre de Oliveira Delmiro Gonçalves de Lima Manoel António da Silva Péricles Bezerra de Almeida Irineu Jófili Correia de Araújo José Barbosa da Silva Filho António Manoel de Freitas Severino Francisco da Silva Ivo Siqueira de Miranda Artur Gonçalves de Lima Severino Lúcio de Melo Manoel Pereira da Silva António Alexandre Sobrinho Artur Pereira de Souza José Pereira de Souza Solon Barbosa da Silva Inocêncio Jerônimo da Silva Severino Pereira de Melo Joaquim António da Silva Crispim Hipólito de Medeiros Manoel Pereira de Souza Filho Lindalvo Ferreira de Lima José Ferreira de Medeiros 78 Porfírio Pereira de Moura Valdomiro Jorge de Lima O primeiro Delegado, depois que Frei Míguelinho passou à categoria de cidade, foi o 3°. Sargento Felinto Figueira de Farias, tendo como auxiliares os soldados Rubens Santos Galvão e Pedro Alcântara Tavares da Silva. O primeiro médico que trabalhou no município foi o Dr. Reginaldo Ferreira da Silva, seguido por outros, como José Figueroa Neto, Mário Alves de Lima, Jaime Justiniano de Santana, Maria José Moura, Everaldo de Holanda Borges, Solón de Melo e ainda os estagiários de Medicina Deoclécio Rosendo de Lima e José Ednaldo Silva. De 1925 até a data presente, lecionaram em Frei Miguelinho as seguintes professoras, todas diplomadas: Maria José Moreira da Silva Pinto, exemplo de educadora, filha da cidade do Recife; Dulce Torres Galindo, natural de Alagoinha, cidade do Agreste pernambucano; Enoquina de Jesus, veio de Limoeiro; Maria José Cavalcanti, natural do município de Macaparana; Celina Bandeira de Melo, natural de Recife, dona de uma cultura fora do comum e professora exemplar; Doraziza da Silva Menezes, natural da cidade de Taquaritinga; Regina Morais do Nascimento, filha da terra, descendente da família Moura e proprietária da Fazenda Maracajá; Teresinha Pontes de Lima, natural da cidade de São Caetano; Nair Pereira de Oliveira, descendente da família Alexandre; 79 Maria Medeiros Morotó, filha da terra e descendente da família Moura; Maria Jerônimo da Silva, filha da terra; Maria Zélia Pereira de Souza, também filha da terra; Maria José Medeiros Morotó, também filha da terra. Na segunda legislatura foi eleito para o cargo de Prefeito o Bel. José Carlos de Oliveira, que administrou o município de 1970 a 1972. O Vice-Prefeito foi o Sr. Gaudêncio José Assunção. Ocupava o cargo de Juiz da Comarca o Dr. Senyr Jatahy de Sampayo. O promotor era o Dr. Enéas Chaves Filho. O novo Prefeito tomou posse em 31 de janeiro de 1970. Esta segunda legislatura marcou a mudança da liderança da Arena l para a Arena 2. O que mais chamou a atenção foi que a ala vitoriosa era representada por jovens de 16 a 25 anos, totalmente desacreditada e sem recursos financeiros, a não ser a ajuda de alguns pais. Os adversários que disputaram e perderam a eleição foram os senhores Manoel Antônio da Silva, candidato a Prefeito e o Sr. Nelson Jerônimo da Silva, candidato a Vice Prefeito. A Câmara constituiu-se dos seguintes vereadores: Abílio Leitão Alves José Manoel de Souza Braz P. de Souza Filho Severino Alves do Nascimento Honório Sabino de Almeida Odon David de Souza Saturnino Severino da Silva Severino Bezerra Batista Manoel de Souza Filho As principais realizações do segundo Prefeito eleito do município foram as seguintes: 4 — Construção do Mercado e Açougue Público; 5— Reconstrução do açude de Chã do Carmo; 6— Linha Telefônica — Centro Telefônico; 80 11— Aquisição de Veículos: 12— Perfuração de cinco poços artesianos: l em Placas, l em Algodão do Manso, l em Lagoa de João Carlos e 2 em Frei Miguelinho; 6 — Grupos Escolares: João Bezerra da Silva — Sítio Manduri; Manoel Soares da Silva — Sítio Patos; 7 — Eletrificação: Urbana — duas extensões: Bica e Fazenda Velha; Rural — Povoados: Valdemar Lima e Lagoa de João Carlos; 8 — Calçamentos: Travessa Cleto Campelo Travessa José Estanislau; 9 — Bueira sobre o riacho Salitre; 10 — Instalação de um posto dos Correios e Telégrafos; 11 — Televisores públicos para a sede e os po voados; 14— Arborização das principais ruas da cidade; 15— Fundação da Associação Educacional de Frei Miguelinho, mantenedora da Escola S. José, Ensino de 1°. e 2°. Graus. Na terceira legislatura foi eleito para o cargo de Prefeito o Sr. Gaudêncio José Assunção, que administrou o município durante o período de 1973 a 1976. O Vice-Prefeito foi o Sr. José Carlos Morotó, sendo Juiz da Comarca o Dr. Senyr Jatahy de Sampayo e Promotor o Dr. Enéas Chaves Filho. Concorreram à eleição os seguintes candidatos: Gaudêncio José Assunção — Prefeito José Carlos Morotó — Vice-Prefeito Odon David de Souza — Prefeito Delmiro Gonçalves de Lima — Vice-Prefeito 81 O novo Prefeito tomou posse em 31 de janeiro de 1973. A Câmara Municipal constituiu-se dos seguintes vereadores: Anastácio Severino da Silva (MDB) Nelson Alves de Souza (MDB) Abdias Morais da Fonseca Severino Cardoso da Silva Filho Severino Bezerra Batista Honório Sabino de Almeida Manoel de Souza Filho As principais realizações do novo Prefeito, foram: 1 — Prédio da Escola São José — Ensino de 1°. e 2°. Graus; 2 — Posto de Saúde no povoado de Lagoa de João Carlos; 3 — Mercado Público no povoado de Lagoa de João Carlos; 4 -- Calçamento na rua principal do povoado de Lagoa de João Carlos; 5 — Grupo Escolar Tomé de Moura, no sítio Gavião; 6 — Grupo Meio. Escolar Amaro Bayer em Lagoa do Na quarta legislatura foi eleito para o cargo de Prefeito o Sr. Zezon Alexandre de Oliveira, que administrou o município de 1977 a janeiro de 1981, quando por motivo de doença grave, foi forçado a passar o Governo' Municipal ao vice-Prefeito Abdias Morais da Fonseca. O Juiz da Comarca foi o Dr. Senyr Jatahy de Sampayo e Promotor o Dr. Enéas Chaves Filho. O Sr. Zezon concorreu às eleições como candidato único. A. Câmara Municipal constituiu-se dos seguintes vereadores: 82 Escola São José — Ensino de !<?. e 2>. graus, inaugurada no dia 14 de dezembro de 1974 — Frei Miguelinho — Administração Gaudêncio José Assunção (Prefeito), José de Moura Sobrinho -- agricultor; Saturnino José da Costa — agricultor de Algodão do Manso; Manoel de Souza Filho Luís Amaro de Assunção -- criador e parente de Zuza Pinheiro; Luis Dionísio dos Santos; Braz Pereira de Souza Filho; Severino Bezerra Batista; Severino Cardoso da Silva Filho; José António da Silva — agricultor. As principais realizações do novo Prefeito, foram: 4— Maternidade; 5— Aquisição de veículos; 6— Projeto de Construção de Grupos Escolares: no sítio Maracajá, l no sítio Pintos, estes já com plantas e terrenos adquiridos. Mais seis em outros sítios; 4 — Calçamentos nas ruas: Pedro II — Santo Antônio — Av. Municipal. Ia. CONCLUSÃO DA ESCOLA SÃO JOSÉ ENSINO DE 1° e 2° GRAUS Ano: 1974 Dia e mês: 14 de dezembro de 1974. Paraninfo: Dr. José Carlos de Oliveira. Patrono: Gaudêncio José Assunção. Madrinha: Maria José Morotó (Diretora) Concluintes: Anísio Amaro de Moura (Orador) Adonias José de Morais Eliane Maria Gonçalves de Lima Elzir Medeiros de Assunção Glaucilda Carmo dos Santos Ivone Maria de Souza Jader Pessoa da Silva 83 José Vitorino de Almeida José Vitor de Moura Irmão Josenildo Pereira de Souza Maria Aparecida de Moura Maria Aparecida Monteiro de Arruda Maria Aparecida dos Santos Maria da Conceição Barbosa da Silva Maria da Conceição de Moura Maria Dorotéia de Oliveira Maria de Lourdes de Barros Maria de Lourdes Santana Maria Severina de Moura Maria Silvina de Melo Maria Soares de Moura Mário Samuel Pereira Natália Pereira de Moura Regina Conceição de Moura Rita Barbosa de Barros Severina Maria de Almeida Severina Maria dos Santos 2a. CONCLUSÃO Dia; mês e ano: 07 de dezembro de 1975. Paraninfo: Gaudêncio José Assunção. Patrono: Dr. José Carlos de Oliveira. Madrinha: Zenaide Marly de Souza (Vice-Diretora) Concluintes: Ana Paula Barbosa da Silva Edelzir Adécia de Souza Edelzir Medeiros de Assunção Ivete Ferreira de Moura Lucidalva Arruda da Silva Maria Arruda dos Santos Maria José de Moura Maria Morais da Fonseca (Oradora) Neusa Maria de Almeida Severino Ramos de Lima Terezinha Pereira de Moura Verónica Maria Gonçalves Barbosa da Silva 84 3a. CONCLUSÃO Dia, mês e ano: 18 de dezembro de 1976. Paraninfa: Dra. Maria José Moura. Patrono: Ivanildo Pereira de Oliveira, Madrinha: Maria Medeiros Morotó. Concluintes: Betânia Maria de Melo Eraci Medeiros de Assunção Eunice Pedro Silva Ivonete Josefa da Silva João Alexandre de Oliveira Neto José Alberes da Mata José Evandro Gonçalves de Lima José Patrocínio Pereira Jeruza Maria de Moura Maria Adélia de Almeida Maria da Conceição Ferreira de Macedo Maria José Pereira de Melo (Oradora) Maria José dos Santos Lima 4a. CONCLUSÃO Dia, mês e ano: 17 de dezembro de 1977. Paraninfo: Ivanildo Pereira de Oliveira. Patrono: Gaudêncio José Assunção. Madrinha: Laurinéia da Conceição Oliveira de Medeiros Concluintes: Carlos Felício da Silva Cleonice Pereira de Moura Edite Santos de Lima Egilson Vitorino de Arruda Everaldo Braz de Souza Francisco de Assis Almeida José Jerônimo da Silva (Orador) Maria do Carmo Silva Maria de Fátima de Barros Maria Ivanise de Moura Maria José de Espíndola Maria de Lourdes Ferreira de Macedo 85 Michel António de Aguiar Severino Deodato de Lucena Neto Vilma Pessoa da Silva Ia. FORMATURA DA ESCOLA SÃO JOSÉ ENSINO DE 1°. E 2°. GRAUS FREI MIGUELINHO PERNAMBUCO Dia, mês e ano: 17 de dezembro de 1977. Turma: Maria Branca Morotó Paraninfa: Maria José Morotó Patrono: Zezon Alexandre de Oliveira. Padrinho: Dr. José Carlos de Oliveira. Curso: Magistério. Formandosr José Vitorino de Almeida Josenildo Pereira de Souza Maria Aparecida de Moura Maria da Conceição Barbosa da Silva Maria Dorotéia de Oliveira Maria de Lourdes de Barros Maria de Lourdes Santana Maria Severina de Moura Maria Silvina de Melo Maria Soares de Moura Mário Samuel Pereira (Orador) Natália Pereira de Moura Regina Conceição de Moura Rita Barbosa de Barros Severina Maria de Almeida Souza Preparam-se para o Vestibular em 1979: Josenildo Pereira de Souza José Vitorino de Almeida (Filosofia) Mário Samuel Pereira (Filosofia) Maria Dorotéia de Oliveira (Filosofia) Eliane Gonçalves de Lima (Medicina) Maria Aparecida Monteiro de Arruda (Medicina) 86 LUIZ DE GONZAGA ANDRADE VASCONCELOS Representante ao município de Frei Miguelinho na Câmara Federal. O nosso representante na Câmara Federal é o deputado Gonzaga Vasconcelos, que tudo faz para atender às reivindicações do município, que tem como objetivo melhorar mais um pouco a nossa cidadezinha humilde, que vive as condições de satélites de Surubim e Caruaru. O Dr. Luiz Gonzaga Andrade Vasconcelos, nasceu no dia 27 de julho do ano de 1933 em Surubim, filho do Senhor Oliveiros de Andrade Vasconcelos e de Dona Inácia de Alcântara Vasconcelos. Recebeu suas primeiras instruções escolares na sua cidade natal e colegial e de grau superior no Recife. Formando-se em Ciências Jurídicas e Sociais na Faculdade de Direito da Universidade Federal de Pernambuco, no ano de 1958. Iniciou suas atividades na vida pública como Delegado da primeira distrital de polícia; Delegado de Vigilância Geral e Costumes; Delegado de Ordem Política e Social; Inspetor Geral de Polícia; Chefe de Gabinete da Secretaria de Segurança Pública; Professor da Escola de Polícia do Estado de Pernambuco. Todas essas atividades exercidas pelo Dr. Luiz Gonzaga aconteceram do ano de 1959 a 1963. Como vereador do Recife de 1964 a 1967. Foi vice.presidente da Câmara Municipal do Recife, líder do governo também na Câmara Municipal; Secretário Geral da União dos Vereadores do Brasil; Deputado Estadual de 1967 a 1971; Presidente da Comissão de Justiça da Assembleia Legislativa de Pernambuco; Relator Geral do Estado da Constituição de Pernambuco; Membro das Comissões de Constituições e Justiça da Bacia do São Francisco, na Câmara dos Deputados; Deputado Federal de 1971 a 1975 e 1979 a 1983; vice-Presidente da Comissão de Minas e Energia; Suplente da Comissão da Constituição de Justiça da Câmara dos Deputados; primeiro tesoureiro da ARENA (Aliança Renovadora Nacional). Convidado pelo governador Marco António Maciel, assumiu a Secretaria da Justiça do Estado de Pernambuco, Secretário Geral da Comissão Regional provisória do PDS (Partido Democrático Social) em Pernambuco. Foi designaodò pelo governo federal para missões no exterior. (Missão nas Ame. ricas, Associação Interparlamentar de Turismo Grupo Brasileiro. Fez parte da Comissão do Polígono das Secas na Câmara 87 dos Deputados, no Arizona, E.U.A. Fez parte da Conferência do Parlamento Latino-Americano, realizada em Roma no ano de 1979). É casado com Dona Wilma D'Arce Vasconcelos. Dessa união tiveram os seguintes filhos: Anne Elizabeth, Luiz Eduardo, Ana Luiza, Izabela e Luiz Roberto. 88 CAPÍTULO V MANIFESTAÇÕES POPULARES l — NOVENAS Considerando a influência que recebemos dos descendentes lusos que aqui se fixaram, poderemos salientar o gosto do nosso povo pelas novenas dedicadas a diversos santos, e a Nossa Senhora, no mês de maio, que reflête mais um divertimento do que mesmo uma devoção. Além da reza tradicional do terço, coloca-se uma bandeira no topo de um enorme mastro em frente à casa, enfeitase com bandeirinhas coloridas e improvisa-se um oratório, onde se colocam enfeites de papel, velas e muitas flores. As flores ofertadas à Santa são guardadas, dia-a-dia, embaixo do altar. Durante esse período o chá das flores serve para os males do corpo, e como defumador para doenças do espírito (mau-olhado, encosto, etc.). A cura depende sempre da fé. Os moradores dos arredores comparecem às novenas e trazem flores, fogos e velas Depois do terço, ficam conversando sobre o inverno, lavoura e criação. Comem cocadas, tapiocas, rapaduras e os homens bebem pinga. As moças arriscam um namoro e contam estórias. No último dia do mês de maio, quando termina o terço, todas as flores são queimadas numa fogueira, acompanhadas de cânticos e louvações à Santa, que lá no céu recebe a fumaça com as mensagens dos devotos. Nessa mesma ocasião arreia-se o mastro e guarda-se a bandeira com muito respeito, para ser novamente hasteada no ano seguinte. Ainda são festejados com muito entusiasmo os padroeiros de cada localidade. Na cidade temos a festa de São José, em 19 de março, cujo ponto alto é a procissão com banda de música, fogos de artifício, parque de diversões, barracas de 89 prendas e tiro ao alvo. Ainda observam-se outros jogos populares, pastoris e bares de palha de coco espalhados pela rua principal. À noite acontece o tradicional baile, que reúne a sociedade local. De maneira idêntica acontece em Chã do Carmo, festejando Nossa Senhora do Carmo; em Placas, Nossa Senhora das Dores; em Valdemar Lima, Nossa Senhora da Conceição; em Algodão do Manso, Santa Teresinha; em Lagoa de João Carlos, Nossa Senhora da Conceição, que é também festejada no povoado de Capivara. 2 — BANDA DE PÍFANOS É organizada por populares da zona rural do município, cultiva a música caipira e faz suas apresentações em festejos populares, geralmente passando pelas ruas e tocando na frente das residências dos mais abastados da localidade, para que os mesmos ajudem financeiramente os que formam a banda. Infelizmente contamos com apenas duas bandinhas deste tipo. Os instrumentos que formam uma banda de pífanos, são os seguintes: bombo, tarol, surdo, pratos, sineta e FLAUTAS. 3 — MAMULENGO É um folguedo popular que ainda existe no município, havendo um esquecimento total das autoridades no sentido de ajudar e preservar este tipo de cultura popular. Apesar disso, com dificuldades, alguns ainda se apresentam em terreiros, contando a estória tradicional de Simão e Quitéria, onde os seus donos arrecadam algum dinheiro para o seu sustento. O mamulengo é muito apreciado na zona rural. 4 — PASTORIL Também em decadência, face ao despreparo das autoridades no sentido de incentivar a prática deste grupo folclórico. É constituído de um grupo de pastoras e um palhaço, que cantando e dançando conseguem levantar uma forte disputa entre dois cordões: vermelho e azul. O cordão vencedor é aquele que arrecadar mais dinheiro . 90 Geralmente aparece no mês de dezembro. Suas cantigas são próprias. As pastoras iniciam assim: "Boa noite, meus senhores todos Boa noite, senhoras também Somos pastoras, somos pequeninas Alegremente vamos a Belém. . . " 5 - - VIOLEIROS Muito atuantes na zona rural. Marcam a cantoria na casa de um líder da localidade e este se encarrega da propaganda Na noite da apresentação, o pessoal bebe pinga, paga para que sua amada seja cantada ou ainda outro assunto que esteja interessando no momento. Os violeiros afinam as violas e "boca no mundo". Para assistir à cantoria basta trazer alguns trocados e ter coragem para pedir versos. São tratados assuntos da roça e também novidades da cidade. Os violeiros aproveitam para mostrar a sua sabedoria, cantando os feitos dos grandes centros, pois assim eles se sentem superiores aos assistentes. Cantam também os amores acatados pelos pais e os amores proibidos, mesclando os versos de dificuldades e heroísmo. 6 — FESTA JUNINA É realizada no mês de junho, com forró, quadrilha, a tradicional fogueira, bandeirinhas e fogos de artifícios. Geralmente é realizada em frente às residências, em especial na zona rural. A dona da casa se encarrega de preparar as comidas típicas, que constam de pamonha, canjica, pé-de-moleque, bolo de milho, munguzá, etc. Encarrega-Se também de enfeitar o terreiro, enquanto os homens preparam a fogueira. A bebida preferida é sempre a pinga. É indispensável a presença do sanfoneiro, que é a figura mais importante da festa. O povo sempre está feliz nesta época, porque ela representa o início da colheita, quando todo o trabalho duro, realizado durante os primeiros meses do ano, é recompensado. 91 Antes de começar o forró, é realizado o casamento matuto, onde se fazem gozações. A parte mais divertida é quando se anunciam os bens levados pelo noivo e pela noiva. Depois de realizado o casamento, o dono da casa inicia o forró e os que não dançam correm para a beira da fogueira a fim de assarem milho e fazerem adivinhações. Na cidade, os festejos são realizados de maneira semelhante, mas no lugar de forró realizam bailes e coroam a rainha do milho. 7 _ VAQUEJADA Festa de gado, realizada na sede do município. É organizada por criadores de gado. Os vaqueiros preparam seus cavalos, para na pista de corrida mostrarem as qualidades das suas montarias. Os vencedores da disputa recebem prémios que são angariados das autoridades e dos próprios criadores. É uma diversão muito rude e perigosa, mas muito popular entre os criadores de gado. O povo assiste entusiasmado e vibra com o sucesso do seu preferido. Os pares vencedores recebem prémio que constam de garrotes, taças e medalhas. Podemos observar que, em geral, o nosso município não dispõe de uma organização que preserve estas manifestações populares, e por isso algumas tendem a desaparecer por falta de organização e incentivo. Mas mesmo assim elas ainda permanecem, porque há uma preocupação de continuidade ou mesmo de imitação dos velhos tempos e que sendo tradição, muitos fazem força para que elas não desapareçam, embora estes esforços sejam, muitas vezes, individuais. Podemos considerar ainda que a sobrevivência destas manifestações populares é decorrente da falta de outros meios de diversão, que a comunidade não dispõe para aproveitar as folgas semanais e os feriados. GONÇALO E O ECLIPSE No dia primeiro de outubro do ano de 1940, das 8:30 às 8:40 horas, o Nordeste escureceu. Houve naquele dia um eclipse do sol, que já vinha sendo anunciado e divulgado há vários dias, pelas rádios e jornais de todo o Brasil. Foi um espetáculo lindo; aquele fenómeno para as pessoas que o espe92 ravam e sabiam o que significava a passagem da lua nova entre o sol e a terra. Quando a lua é nova e passa entre a terra e o sol ocasiona o eclipse do sol, quando a lua está cheia e a terra passa entre a lua e o sol ocorre o eclipse da lua. Gonçalo Moura, já citado na família Moura, teve uma mocidade muito movimentada. Como todo mundo, ele pensava ser um homem rico e para alcançar o que 'desejava, já era proprietário de uma área de terra no Maracajá, o suficiente para fundar a futura fazenda, algumas cabeças de gado, muito dinamismo e o curso primário daquela época. Classificavam como um candidato a futuro fazendeiro e grande agricultor da região. Gonçalo Moura era um tipo atlético e muito simpático, considerado como um bom partido para qualquer moça da sua época casar.se. Enamorou-se de uma jovem do mesmo lugar e quando esperava com toda confiança ser correspondido com o mesmo calor de sua paixão, pelo seu único amor em toda a vida, sua amada o desprezou para casar-se com outro. Foi tão grande a sua decepção e desgosto que adoeceu mentalmente. Passou muitos dias trancado dentro de casa, sem falar com ninguém. Quando apareceu nas casas dos parentes e amigos era completam ente diferente. Abandonou a sua propriedade e todas as suas atividades agrícolas, perdeu o entusiasmo pelo futuro. Apenas se manteve usando roupas limpas, no entanto como um dos protestos contra a traição recebida, passou a usar o cabelo cortado a zero; de 8 em 8 dias mandava passar a navalha na cabeça, passou também a usar chapéu de palha de carnaúba. Andava sempre pelas estradas conversando só. Visitava as pessoas mais humildes da vizinhança, oferecendo.se para escrever cartas para quem não sabia ler, nem escrever. Gostava de fazer discursos nas reuniões e festinhas de gente muito pobre. Chamavam-lhe de doido útil e manso. Não gostava de falar do futuro e menos do passado. Naquele tempo, ou seja, até mais ou menos 1950, ainda existia em todas as cidades do interior do Estado, um pequeno cercado denominado de Quintal da Prefeitura, onde todo feirante guardava os animais pagando uma taxa ao município. Porém, naqueles locais, nos dias de feira, muito cedo do dia, lá encontravam-se diversos garotos pobrezinhos para lavar cavalos e dar água, ganhando alguns tostões. Gonçalo Moura, sem necessidade e contra a vontade dos parentes, todos os dias de feira de Olho D'água da Onça, hoje Frei Miguelinho, dirigia-se para o Quintal para executar o mesmo trabalho que os garotos faziam, entendendo-se bem com os mesmos. Alguns 93 amigos aproveitavam a oportunidade para lhe dar dinheiro, além do valor do serviço prestado. Ele recebia o pagamento sem comentários. Gonçalo tornou-se uma pessoa que servia de brincadeiras, para os que não conseguiam entender o seu drama. Jamais procurou outra namorada, ficou velho dizendo que o homem só ama uma vez. No dia primeiro de outubro de 1940, várias pessoas reuniram-se para esperar o eclipse, na fazenda de nome Maracajá, de propriedade do Sr. António Manoel de Morais, sobrinho de Gonçalo Moura, que também se encontrava no mesmo local. Quando o tempo começou a mudar com a aproximação do feuômeno, Gonçalo foi ficando muito triste até o momento que escureceu. Naquele instante Gonçalo deu um grito com expressão de horror dizendo, com toda força dos pulmões: é o fim, o mundo acabou, ficando mudo a partir daquele momento. Sete minutos depois o sol apareceu e, aos poucos, todas as atividades foram voltando ao ritmo normal, seguidos de comentários. Gonçalo recolheu.se dentro de sua casa no Maracajá por muito tempo, sem falar, os vizinhos, uns achavam que não podia falar e outros que ele não queria. Fizeram muitas tentativas e não conseguiram arrancar uma só palavra dele, nem sequer deu a entender se ouvia ou não os apelos. Sua fisionomia não demonstrava expressão de horror ou de alegria, era como se estivesse vivendo num mundo diferente. Alimentava-se quando os parentes colocavam a comida ao alcance da sua mão. Não teve mais cuidado de barbear-se, nem cortar o cabelo de 8 em 8 dias, como era acostumado a fazer. Os parentes e amigos procuraram os médicos das cidades vizinhas, sem lograr êxito, foram aos médicos do Recife e até de São Paulo, sem nenhum resultado, apelaram para os padres, bispos e até Frei Damião e Gonçalo nem assoviou, recorreram ao espiritismo de Allan Kardec até a baixa magia e Gonçalo continuou mudo até o ano de 1946, quando faleceu sem dar um gemido. O AVIÃO No mês de fevereiro do ano de 1949, os habitantes de Frei Miguelinho. foram surpreendidos com um pequeno avião sobrevoando a Vila. Era uma quinta-feira, infelizmente não 94 sabemos a data. A pequena nave voava tão baixo que quando declinava o povo via perfeitamente os ocupantes do avião, só não conheceram o aviador por causa do capacete e os grandes óculos que usava. Depois de muitas voltas e quando o povo já esperava o avião regressar tiveram mais uma surpresa, viram o aparelho baixar a venta em direção de uma área plantada com mandioca, bem perto da rua, aterrissando sem nenhum problema, apenas estragando um pouco a lavoura do Sr. Juventino Moura, que muito admirado não reclamou nada réferente ao estrago, especialmente porque foi um fato inédito no lugar. Depois dos solavancos o avião parou e descendo do mesmo José Bezerra e mais dois colegas alagoanos que não sabemos os nomes. Dentro de poucos minutos era uma verdadeira multidão para ver de perto e saber o motivo que ocasionou a descida da nave em lugar impróprio. Era voz geral que o avião cairá e para os que presenciaram de longe o previsto era que morreram todos os ocupantes, e para o local corriam espalhando boatos sinistros e todos muito apreensi. vos. Para a população de Frei Miguelinho aquele dia tornou-se histórico porque o solo da Serra da Onça foi tocado pela primeira vez por um avião. O ocorrido foi motivo de comentários por muito tempo. Embora no momento ninguém se lembrou de anotar com detalhes o acontecido por exemplo o prefixo do avião e os nomes dos colegas de José Bezerra. Não houve pane no avião, foi apenas José Bezerra que como filho da Terra lembrou-se de fazer mais uma façanha para os seus conterrâneos como antes era acostumado a por em provas a sua audácia. José Bezerra de Barros, já citado como membro da família Bezerra, homem de génio forte e muito destemido, cursou apenas o ginásio daquela época no Recife, saiu de Frei Miguelinho para residir em Maceió, Ca. pitai do Estado das Alagoas. Lá chegando ingressou na Polícia Civil e não demorou a se entrosar com as altas autoridades alagoanas, passando a ser homem de confiança do Governo. Era considerado detetive de primeira classe e como tal era designado para desvendar os mais difíceis problemas, sempre com êxito nas tarefas que assumia. Muitas vezes chegou a se disfarçar de trabalhador rural, operário e até de malandro para alcançar objetivos. Morreu em Maceió, na sua residência cercado de amigos e admiradores. Depois de 31 anos é que estamos registrando o fato com falhas e muito pobre de detalhes, por falta de informações 95 que poderiam ter sido feitas nos momentos que ocorreram os acontecimentos que forma a história de um lugar. José Bezerra quando jovem, antes da revolução de 1930, nunca permitiu que forasteiros desmoralizassem o povoado de Olho D'água da Onça, Frei Miguelinho, nem a polícia ele respeitava, os soldados que vinham de Vertentes para os dias de feira ou festas, tinham que policiar com muito cuidado, porque se cometessem qualquer arbitrariedade teriam que acertar contas com José Bezerra, as poucas vezes que alguns soldados quiseram bancar os valentões, foram desmoralizados, chegando a voltar para Vertentes sem os fuzis, divisas de cabos e quepes. Quando o problema ficava difícil os Alexandres de Oliveira entravam na briga a favor de José Bezerra e tudo que fosse forasteiro, ou corria ou ficava preso e humilhado. Por muito tempo, os habitantes de Frei Miguelinho eram cognominado nos Municípios e Vilas vizinhas de as "Onças". Esse apelido foi desaparecendo depois que Zé Bezerra, Júlio Alexandre e António Alexandre Sambul, Manoel Alexandre e João ficaram mais velhos. MOROTÓ — O FURA MUNDO João Pereira Morotó, filho do senhor João Francisco de Moura e de dona Maria Francisca da Conceição, nascido no dia 22 de maio de 1899 na fazenda Maracajá, naquele tempo pertencia ao município de Taquaritinga, depois ao município de Vertentes e por último ao município de Frei Miguelinho, Iniciou sua vida de adolescente como humilde agricultor, não vendo resultado passou a negociar com caprinos de sua região para Surubim. No ano de 1925 o senhor João Vitorino fazendeiro e negociante de animais da região do agreste até na zona da Mata, notou que João Morotó era um bom conhecedor do assunto de compra e venda de animais, sabendo distinguir raças e idades de todos animais, exímio avaliador de pesos de gado, dizia ele: não preciso de balança para comprar ou vender bois. Sabia também castrar garrotes, poltros, carneiros, cabritos, gatos, porcos e cães. O senhor João Vitorino muito inteligente, convidou João Morotó para trabalhar como tangerino, proposta aceita e iniciadas as viagens para Vitória de Santo Antão, Cabo, Escada, Amaraji, Cortês, Ribeirão, Gameleira, Água Preta. Pal96 mares, Catende e as usinas Santo Inácio, José Rufino, Maria das Mercês, Mameluco, Nossa Senhora do Carmo, Massauaçu, União Indústria, Cucau, Cachoeira Lisa, Estreliana, Caxangá, Pedroza, Serro Azul, Treze de Maio, Santa Terezinha, Catende, Roçadinho e dezenas de engenhos. Como auxiliar do senhor João Vitorino, negociou mais ou menos oito anos. O seu patrão e amigo já não andava nas usinas e engenhos, permanecia na sua propriedade no Maracajá ou nas feiras de Vitória de Santo Antão, enquanto João Morotó sustentava os negócios de compra e venda de bois e burros para as usinas de açúcar e engenhos de cana. O João Vitorino já de idade avançada e em condições financeira equilibrada, abandonou os negócios de animais, ficando apenas na sua fazenda criando e trabalhando na agricultura. Antes fez uma visita a todos os compradores de bois e burros apresentando João Morotó como uma pessoa que merecia confiança para continuar fornecendo animais por sua própria conta. Todos aceitaram a indicação com bom grado, pois se tratava de uma pessoa já bastante conhecida. João Morotó muito agradecido continuou com o mesmo critério de antes. Entre dezenas de homens de bom conceito, compradores de bois e burros, podemos citar: Dr. José Henrique, da usina Massauaçu, Dr. José Lopes, das usinas Estreliana e Caxangá, Sr. Carlos de Barros Cavalcante, da usina Pedroza, Sr. Santino, da Usina Catende, Dr. Waldeci Goveia de Melo da usina Serro Azul, Dr. Lourival Goveia de Melo da usina Treze de Maio e outros usineiros e ainda os senhores Paulo Gouveia de Melo, do engenho Barra do Dia — Palmares, Lauro de Castro, do engenho Poço Dantas — Joaquim Xabuco, Francisco Pedro Cavalcante do engenho Cumaru — Palmares, José Valença Borba do engenho Baependy — Bonito, José Cândido Carneiro Leão do engenho Araruna — Joaquim Nabuco, Rui Dias do engenho Ditoso — Ribeirão, José Ernesto do engenho Cocula — Ribeirão, Joãosinho do engenho Cabeça de Negro — Escada, Arlindo Araújo do engenho Tranquilidade — Cortês, Raul Araújo do engenho Refrigerante - Cortês, João Fraga do engenho Águas Finas — Cortês, Venâncio Lopes do engenho Pedrezinho — Bonito, José Leonardo do engenho Recurso — Joaquim Nabuco, Hilton Alves Cavalcante do engenho Sebastiãozinho — Bonito, José Vitorio do engenho Barra Azul — Bonito Lirô do engenho Viração — Ribeirão, Luiz do engenho Matas — Moreno, João Cordeiro do engenho São Miguel — Escada, Aloízio Moreira Alves do engenho Arariba de Baixo — Escada, Dr. Manoel Clementino do engenho Pantorra — Cabo, Luiz Caldas Lins gerente de campo 97 da usina José Rufino — Cabo, Guilherme do engenho Vila Real -- Cabo, João Docas do engenho Arariba da Pedra de Cima — Escada, João Benedito do engenho Dois Braços — Escada, Dr. Luiz Alvin de Palmares e muitos outros que negociavam bois e burros com João Morotó, mantendo a mesma tradição de honestidade recíproca João Morotó além de cavaleriano ou boiadeiro como era chamado, também se orgulhava de ser vaqueiro e derrubador de bois nas corridas de pé de mourão, foi dono do melhor cavalo de vaquejada de toda a região, o cavalo chamavase Miron, tinha pelos caxitos. Miron não era para vender, chegou a recusar um automóvel zero km pelo cavalo Nos idos de 1935 a 1950, os vaqueiros que faziam vaquejadas em toda a região eram muitos, entre os mais famosos podemos citar: João Morotó, de Frei Miguelinho no seu cavalo Miron, António Alexandre Cabral, de Serra da Cachoeira no seu cavalo Dourado (aliás Miron e Dourado disputavam o 1°. lugar), José Francisco Macacos, de Cabaceira, Paraíba, vaqueiro de primeira categoria quando montado em bons cavalos e dos aboios sonoros, Apolinário Farias, de Gameleira, Rui Dias, de Ribeirão, Raul Araújo, de Amaraji, José Vitorio, de Palmares (este transportava cavalos até de avião para as vaquejadas distantes), Severino Miguel, de Salgadinho (Cabeça Branca), Severino Miguel, de Caruaru, Severino Vicente, de Pinhões, município de Riacho das Almas, Zezinho Queiroz de Escada, Genaro Trajano de Vitória de Santo Antão, Manoel Pereira de Caruaru (este também gostava de prado junto Zezon Alexan, dre de Frei Miguelinho), Cabo Lúcio, de Caruaru. Outro cavalo que marcou época foi Cadilac de pelos caxitos quase preto do Senhor Daniel, poeta repentista, tendo gravado toadas poesias em discos, foi substituído pelo Senhor Manoel de França, dono do burro Cebola que não tinha inveja de cavalo para correr em pé de mourão, um dos vaqueiros mais famosos de todos os tempos, conhecido em todo Brasil como um dos melhores improvisadores de versos bonitos em festas de vaquejadas da fazenda Calderões — Caruaru. Eram esses os homens que faziam as festas de corrida de mourão, também chamadas de vaquejadas até mais ou menos 1950. Uns eram Senhores de engenhos, outros fazendeiros e os que eram apenas exímios montadores de cavalos e derrubadores de bois nas pistas ou nas caatingas adentro como Piteta. Muitos deles já partiram definitivamente, outros envelhecidos vêem com saudades as vaquejadas de hoje, muito diferentes do tempo passado. É negócio de gente, com pistas 98 sofisticadas feitas a capricho, com luminárias e serviço de som, inscrições acima de um salário mínimo da região, prémios de milhões e muito Whisky. Os atuais vaqueiros são: Romildo Brandão no seu cavalo Sabu, substituindo João Morotó e Miron, Genildo Gonçalves, de Caruaru, Herculano, de Limoeiro, António Galdino, de Surubim, Abdias Nunes, de Fazenda Nova, Zezinho, de Tacaimbó, Dr. Luiz Morotó e Dr. António Medeiros Morotó, de Frei Miguelinho, Dr. Carlos António, de Caruaru, Carlos Vidal, de Bezerros, Zezinho Andrade, de Vitória de Santo Antão, Adélio Andrade, de Vitória de Santo Antão, dono do cavalo Urubu um dos melhores da época, animal de pelos castanhos, Dr. Laert Pedrosa, da usina Nossa Senhora do Carmo, dono do cavalo Latino de pelos alazão, que também marcou época nas corridas de pé de mourão, Piteta, vaqueiro de primeira grandeza, atualmente morando no Estado do Rio Grande do Norte, Dr. Joaquim Guerra, de Igarassu, Dedé Galdino e Dão Galdino de Surubim, José Carlos Pedrosa, de Barreiros, Carlos Romero, do engenho Jatobá da usina Catende, Dr. Romero e Dr. Marcelo Lacerda, de Recife, filhos do ex-secretário da agricultura, Dr. Mário Lacerda, Odimilson Mendes de Palmares e muitos outros até de outros Estados que vem concorrer com os vaqueiros de nossa região nas mais famosas vaquejadas. No ano de 1976, Morotó compareceu a uma corrida de pé de mourão na cidade de Caruaru. O Manoelzinho aboiador notou que ele estava se lembrando do tempo de moço, aproveitou a oportunidade e dedicou-lhe presente a vaqueirama com força dos pulmões o aboio Coração de Vaqueiro Morotó chorou de saudade. "CORAÇÃO DE VAQUEIRO" —I— Hoje estou velho acabado vivendo no sofrimento minha vida é um tormento por me afastar do gado to vivendo despresado fora dos meus companheiros não vou mais no taboleiro perdi toda rapidez vou dividir com vocês meu coração de vaqueiro 99 — II Quem fui eu na mocidade quem estou sendo hoje em dia só me chega agonia perdi toda liberdade não tem mais velocidade correndo no mameleiro pegando boi vi ligeiro já estou velho e cocundo mas dividi com o mundo meu coração de vaqueiro — III As festas que eu já andei as canas que eu tomava quando eu mesmo aboiava mostrava de ser cortês eu tinha mais rapidez era honesto verdadeiro era caboclo faceiro hoje estou um morimbundo mas eu dividi com o mundo meu coração de vaqueiro — IV As meninas que amava quando eu estava bebendo parecia está roendo que elas me atraçoava muitas vezes me enganava judiava com o vaqueiro eu por ser prisioneiro e elas por me ouvir pra o mundo eu vou dividir meu coração de vaqueiro — V Já gostei de vaquejadas e de pegar boi no mato mostrava de ser pacato 100 brincar e cantar toadas arranjar as namoradas e brincar com meus companheiros já me tornei cachaceiro perdi tudo num segundo e vou dividir com o mundo meu coração de vaqueiro — VI — Vou falar noutro momento nas festas que eu já andei os touros que já peguei não me sai do pensamento já fui homem de talento já fui forte brasileiro hoje eu sou um mensageiro do símbolo da poesia mas divido em garantia meu coração de vaqueiro — VII Andando no meu cavalo quando andava cantando a poesia inventando somente sentindo os calos do mato recebo abalo por dentro dos taboleiros destrui tudo em segundo já dividi com o mundo meu coração de vaqueiro. João Morotó de 1933 a 1965 vendeu burros e bois nas usinas e engenhos de cana de açúcar da zona mata sul do Estado, comprando-os nos Estados da Paraíba, Ceará, Piauí, Alagoas, Sergipe, aqui em Pernambuco, na Bahia, Goiás e Minas Gerais. Até o ano de 1965 andava a cavalo passando depois a viajar de jeep, trem e até de avião. Comprava a bur. rama ou boiada, entregava a Nito Alexandre seu genro, a seus filhos António, Luiz e José Carlos (Carlinhos) para serem transportados em caminhões e distribuídos em Surubim e Caruaru. 101 Entre as centenas de viagens que João Morotó fez tangendo burros e bois no tempo que não havia estradas asfaltadas, a mais famosa em distância, despesas, trabalho, sofrimento e tempo, foi uma que ele junto com seus trabalhadores de viagem saiu do município de Teófilo Otoni, Estado de Minas Gerais, no dia 02 de maio de 1944 e chegando na usina Pedroza no dia 22 de agosto do mesmo ano. Naquele tempo a usina Pedroza pertencia ao município de Amaraji, Cortês ainda era distrito. Eram 120 burros e 6 cavalos, 8 tangermos, um cozinheiro responsável pelas compras de alimentação. João Morotó e António Alexandre de Oliveira no coice da burrama. No início da viagem houve muito trabalho devido os animais estarem descansados e não quererem sair do pasto. Precisava de muitos vaqueiros para conduzi-los até aos lugares estranhos distantes das fazendas onde nasceram quando então se tornava um pouquinho mais fácil tanger a burrama pelos caminhos desconhecidos para os burros. A caminhada era executada da seguinte maneira: na frente seguia um portador conhecedor da estrada, dos caminhos e veredas, montado num cavalo enchocalhado, no meio da burrama outro portador cavalgando outro cavalo também enchocalhado. Chamavam-se aqueles trabalhadores de guias. É difícil de acreditar que os burros depois de chegarem em pastagens diferentes seguiam os cavalos enchocalhados como se fossem bezerros novos atrás das vacas suas mães. Só os muito cansados ou manhosos tentavam uma fuga. Mesmo assim era preciso fazer esteira dos dois lados por 6 tangerinos, mais ou menos em distâncias iguais, sendo 3 de cada lado dos animais e com muito cuidado, porque quando menos se esperava, um burro manhoso ou estropiado desgarrava mato a dentro. Morotó não se afastava do coice da burrama e sempre muito vigilante corrigindo as falhas dos portadores. Quando desconfiava de alguma fuga de animais, parava em lugares mais ou menos apropriados, num recanto de cerca ou margem de um rio e recontava todos os bichos. Era difícil João Morotó desconfiar de alguma fuga para de fato não ter acontecido. Justificava ele, é aquele ou aquela burra dos sinais tais que compramos na fazenda tal, não está aqui, vamos procurá-la ou procurá-lo e logo encontrava fora da burrama o animal procurado. Nas pousadas, todas as noites conferia os animais e de manhã também na saída do rancho. Muitas vezes no fim do 102 dia não encontravam acomodação, era só ficar em redor dos animais no pé de um monte, improvisarem uma barraca com uma lona e passarem a noite revezando-se na vigilância dos animais. Às vezes chovia para aumentar o sofrimento. Dizia António Alexandre de Oliveira concunhado de Morotó, se eu não morrer nesta viagem, vou pagar muitas promessas. Nas paradas enquanto se organizava a burrama para repouso, o cozinheiro e vaqueiro Domingos preparava o jantar mais delicioso que você possa imaginar. Carne assada no espeto, farofa de farinha de mandioca, cebola, rapadura, banana, bolacha e café fervido na hora sem cuar. Quando havia tempo cozinhava-se feijão e arroz. O cozinheiro viajava montado num burro encangalhado conduzindo dois baús feito de couro cru, munido de géneros alimentícios. De manhã, enquanto Morotó contava os animais e preparava as montarias, Domingo preparava o café reforçado para aguentarem até a noite. Durante o dia poderiam ou não encontrar alguma coisa para comer andando estrada a fora Eram contratados vários vaqueiros em Minas Gerais para trabalharem até o limite com o Estado da Bahia, onde mais uma vez eram contratados outros vaqueiros agora baianos, para chegarem até as margens do rio São Francisco, limite de Pernambuco. Com os burros já viajados seguiam dando menos trabalho. Os cavalos já sem condições de continuarem viagem eram trocados por outros para continuarem viajando até as margens do São Francisco, onde foram trocados por outros descansados para terminarem a jornada. O percurso desta viagem foi assim: saíram do município de Teófilo Otoni. Estado de Minas Gerais, passando por Padre Paraíso, Itaobim, Medina e Pedra Azul, entrando no Estado da Bahia no município de Cândido Sales, passando por Belo Campo, Vitória da Conquista, Manoel Vitorino, Maracás, Irajuba, Marcionilo Souza, laçu, Itaberaba, Rui Barbosa, Mundo Novo, Perituba, Miguel Calmon, Jacobina, Caem, Saúde, António Gonçalves, Campo Formoso, Senhor do Bom Fim, Auá, Tabatinga, Santa Rosa, Caldeirão, Cana Brava, Patamuté. Região do Curaçá, Xorroxó, Tarrachi, Rio São Francisco. Para atravessarem os animais utilizavam-se de barcos conduzindo 15 cabeças de cada vez. Precisaram dar 9 viagens para ficarem todos do lado de cá do rio ou seja no Estado de Pernambuco. Depois de efetuado o pagamento dos vaqueiros baianos, os agradecimentos e despedidas, o vaqueiro e cozinheiro Domingos resolveu voltar para sua terra natal, havia acerta103 do com João Morotó vir morar em Pernambuco na fazenda Maracajá, onde queria mais vez a sua amada, sendo noiva de outro vaqueiro, porém decidiu voltar e lutar para ver se conseguia uma reconciliação com o seu amor. Pediu desculpas a João Morotó e acompanhou os vaqueiros baianos. Do lado de cá do rio era como se estivessem em casa. Os burros cansados viajando em terra diferente, com melhores condições para os tangermos, conhecedores da região, não havia porque temer de continuar andando apenas com os portadores de sua confiança, seus moradores da fazenda Maracajá; Severino Paulino na guia montado num cavalo enchocalhado descansado, Pedro Moura e Targino fazendo esteira, enquanto João Morotó e António Alexandre de Oliveira viajavam palestrando no coice da burrama um pouco mais tranquilos. O problema maior era os animais estropiados que para não interromperem a jornada, era preciso botar sapatos nos burros de patas doentes. A operação era feita assim: Morotó conduzia na sua bagagem câmaras de ar velhas de pneus de caminhões; pegavam um pedaço de borracha e protegia o casco do burro afetado, para que continuasse andando. Os tangermos diziam-se sapateiros de burros. Foi assim que partiram das margens do velho Chico, passaram por Belém do São Francisco, Floresta, Ibimirim, Cruzeiro do Nordeste, Arco Verde, Mimoso, Pesqueira, Sanharó, Belo Jardim, Tacaimbó, São Caetano, Caruaru, Encruzilhada, Sapucaia, Camocim de São Felix, Barra de Guabiraba, Cortês e Usina Pedroza. Naquela época era assim que se conduziam animais, ais caminhadas eram penosas. Quando a burrama atingiu a zona dos brejos, surgiram problemas com os donos de lavoura das margens das estradas. Os animais esfomeados não respeitavam as cercas de madeira e de construção frágil e invadiam os roçados. Morotó pagava as lavouras estragadas dialogando com muita inteligência com os prejudicados que sempre ficavam mais ou menos satisfeitos. De Sapucaia até a usina eram contratados novos tangerinos. Os estragos não eram maiores porque a notícia da burrama ia na frente e quase todos os proprietários de roças nas beiras das estradas, lá estavam para ajudarem os tangermos na protecão de suas lavouras. Na usina, oito dias antes da chegada de Morotó todo mundo já sabia. O Sr. Carlos de Barros Cavalcante (Sr. Carlinho) ia encontrá-lo e fazia questão que ele viesse na frente deixando os animais com os tangermos. Morotó não aceitava a ideia, só chegando na usina no coice dos burros. A marcha era lenta e muitas vezes Morotó atrasava ainda mais a fim 104 de os animais pastarem em alguns locais das estradas. Esta foi a maior burrama que a usina comprou de uma só vez em toda sua história. Os burros comprados foram colocados na solta do engenho Ilha de Flores, para descansarem alguns dias. Morotó hospedava.se na casa do Sr. Carlinho gerente da usina, apenas para dormir e quase não fazia refeições porque desde das quatro horas da manhã até a noite não saia de perto dos burros. O negócio da venda dos animais já estava fechado ; porém ainda tinha Morotó a obrigação de ferrar os burros dividi-los para os engenhos de acordo com o número que o Sr. Carlinho determinasse. No dia da partilha o Sr. gerente com uma relação nas mãos, chegava no curral do engenho Ilha de Flores, já encontrava Morotó com os burros presos e recontados. Todos os administradores e cargueiros dos engenhos estavam presentes. Várias marcas de ferro com as iniciais U. P. e uma coivara de lenha especial de piripitanga e murici. Mais ou menos às nove horas começava-se a marcar os animais que destinavam-se para os engenhos mais distantes, ferrava.se por último os burros que ficariam no engenho Ilha de Flores. Eram 18 administradores que haviam pedido para Morotó trazer um burro bom de sela para a sua montaria no serviço do engenho. Morotó prometia a todos que não esqueceria de atendê-los. Quando chegava a hora de separar os burros, os administradores perguntavam qual o burro de sua montada. Morotó rapidamente apontava um qualquer dizendo é este aí, é bom de mais, é uma rede, viajei muito nele de Minas Gerais até aqui, é um animal lorde, dengoso, foi o mais caro que comprei nesta burrama. Agora tem uma coisa, burro viajado é diferente de burro descansado. Ele já engordou, mande o cargueiro montar primeiro, você sabe que todo burro é manhoso. Assim ele convencia a todos que não havia esquecido o pedido. A primeira coisa que o administrador fazia quando chegava no seu engenho, era mandar o cargueiro experimentar o animal escolhido. Era aquela decepção. O burro quando não era bravo ou manhoso, era lerdo. Dias depois quando se encontravam com João Morotó comentavam tristes, o burro não prestou para a sela, Morotó respondia penalizado, é uma pena, um bicho tão bonito como aquele não prestar pra gente andar. Não sei como é uma coisa dessa, aquele burro de Minas até aqui não deu uma poupa. Eu acho que ele estranhou a zona da cana; é Sr. Morotó eu mandei os cambiteiros transportarem canas nele; Mo105 roto respondia, fez bem já vi que homem não conhece burro. É mesmo de admirar, ajeite ele pra ver se presta pra sela. O serviço de marcar os burros e distribuí-los para os engenhos era a última tarefa pesada que Morotó realizava, para então sentir-se livre das responsabilidades com os animais. Depois era só receber o dinheiro e regressar montado no seu burro gigante para Frei Miguelinho, onde repousava alguns dias com a família e voltar para Minas Gerais e Bahia, a fim de fazer novos negócios com burros e bois para as usinas e engenhos da zona mata sul do Estado de Pernambuco, enfrentando os mesmos problemas das viagens anteriores. Os burros foram vendidos para a usina Pedroza a Cr$ 500,00 daquele tempo em 1944. Os tangermos de confiança que viajaram com João Morotó, especialmente nas viagens da Bahia e Minas Gerais foram Severino Paulino, Pedro Moura e Targino, que enfrentavam qualquer obstáculo, frio, calor, as distâncias e as exigências de Morotó, que dificilmente dizia a hora de partir ou de dormir ou para onde ia ou quando vinha. Os seus trabalhadores comentavam escondidos: "oh homem difícil de a gente entender". Não gostava de dormir em hotéis ou dormitórios de beira de estrada. Quando menos se esperava, ele arranchava debaixo de um pé de umbu dentro do mato. Armavam as redes e dormiam. Às vezes quando chovia protegiamse com lonas. Os tangermos reclamavam e ele argumentava; aqui estamos mais seguros e o ar livre aumenta a saúde. O dinheiro era guardado nos lugares mais fáceis que se possa imaginar, dentro de um bornal velho e sujo, debaixo de uma cangalha ou numa estopa misturado com outros apetrechos de viagens, sempre a poucos metros de sua rede. Nunca foi assaltado ou roubado, era precavido e muito desconfiado, especialmente viajando. Em algumas viagens foi acompanhado por seu cuncunhado e amigo António Alexandre de Oliveira, que ia apenas para conhecer. Outro amigo e companheiro de vaquejada que também viajou foi o Sr. António Alexandre Cabral, de Serra da Cachoeira . João Morotó como vendedor tinha o dom de convencer os compradores. Pintava os seus animais como os mais bonitos e melhores do mundo. Certa vez o Sr. Hilton Alves Cavalcante, fornecedor de cana do engenho Sebastiãozinho para a usina Pedroza, precisou comprar um animal que lhe servisse de montada para o seu trabalho de administração e acima de tudo fazer as viagens dos dias de sábado para a usina 106 e para tal procurou João Morotó; este prontamente lhe disse que possuia uma mula linda de mais, um pouco cara, no entanto era uma jóia que não podia pertencer a todo mundo, tão mansa que podia carregar até criança sem nenhum risco de acidente, boa e famosa que no mundo não existia outra igual. Faz o que você quiser sem apanhar, é uma beleza rara, até hoje nunca montei num animal tão bom. Só tem um defeito para quem comprá-la, é porque quando você viaja nelu só pode andar só. Hilton indagou: Como se explica que uma burra tão completa, de tão bons predicados só possa andar sozinha? Morotó emendou, é o seguinte: ela anda tão rápido que ninguém acompanha. Hilton comprou a jóia de animai pelo preço que ele pediu. Dias depois Hilton comentava com os amigos das viagens dos engenhos nos dias de sábado para a usina e até com o próprio vendedor, que de fato estava sempre andando sozinho, porém atrás de todo mundo. Não havia mais lerda do que a burra famosa que Morotó tanto elogiou. Certa vez Morotó tangendo uma burrama de 70 ani. mais na ladeira do Mimoso, um caminhão sem freio entrou no meio dos burros matando 9 na hora e deixando 26 feridos. Morotó prestou queixa na justiça, constituiu advogado de defesa, levantou a tese que a burrama viajava na ladeira cheia de curvas sem a bandeira vermelha de uso obrigatório nas ladeiras, tanto na frente como atrás da burrama. Por isso Morotó além de perder os animais ainda pagou as custas e o conserto do caminhão. Foi um grande prejuízo. Poucos acidentes aconteceram durante toda sua vida. Era precavido e teve muita sorte. Não gostava de cheques, dizia que aquele pedaço de papel não era dinheiro. Fazia questão de pagar com dinheiro e também de receber. Muitas vezes dizia quando lhe pagavam com cheques: Eu gostaria que você trocasse e me desse o dinheiro. Achava também que o verdadeiro banco era o seu cofre dentro do quarto de dormir. Passou a usar bancos para depósitos ou empréstimos depois que seus filhos e o genro Nito Alexandre o convenceram da facilidade dos negócios feitos com a participação dos estabelecimentos bancários. Mesmo assim ele sempre dizia: ninguém brinque com bancos, por qualquer descuido a gente perde o que tem. Quando a pessoa fica sem direitos, além do mais ninguém sabe quem é o dono do banco. Todos os funcionários só sabem dizer que receberam ordens para isso ou aquilo. Já vi amigos ficarem na miséria por causa de empréstimo em bancos Vem a seca, 107 a doença ou os roubos e o banco não quer saber de justificativas, quer é receber. Como Morotó comprou a primeira geladeira? Chegaram dois vendedores de eletrodoméstico na sua casa, fazendo propaganda. Dona Branca interessou-se pelo objeto mas só podia comprar com o consentimento do esposo que no momento encontrava-se na fazenda. Os rapazes resolveram esperá-lo. Quando Morotó chegou os moços fizeram as mesmas explanações das utilidades da geladeira, inclusive que a mesma servia para guardar resto de comida. Morotó respondeu: até que eu poderia comprar esse negócio para atender o pedido de minha mulher mas pelo que os senhores estão dizendo, aqui em casa não precisa dessa coisa que vocês e Branca acham tão necessária para uma casa de família. Para guardar restos de comida aqui já temos duas geladeiras. Por obséquio me acompanhem. Atravessaram a casa e no quintal mostrou aos rapazes dois suínos de uns 100 quilos cada. Olhe aí duas geladeiras para guardar restos de comida. Os vendedores acharam que haviam perdido o tempo e Dona Branca ficou triste pensando que não iria ficar com tão útil objeto dentro de casa. Porém Morotó continuou o diálogo com os vendedores dizendo que entre as apresentações que vocês fizeram da geladeira, se eu não estou enganado, ela esfria água, só por isso Branca pode comprar esse negócio tão desejado. A compra foi realizada e o pagamento feito na hora de Cr$ 700,00. Era muito dinheiro no ano de 1958. Em tom de brincadeira dizia aos vendedores: vocês acabem com esse negócio de estarem botando nas cabeças das mulheres que geladeira serve para guardar restos de comida. Vamos ensinar essas mulheres a criarem porcos. Morotó só alimentava-se de comida feita na hora e não comia enlatados. Marcou época como vaqueiro em corrida de pé de mourão, como cavaleriano e boiadeiro, como benfeitor da sua gente humilde no Maracajá. Era analfabeto (avalia se não fosse) e muito inteligente, fazia qualquer conta de cabeça. Orientado por sua esposa Maria Branca, Morotó criou seis filhos condignamente. Conseguiu educá-los da melhor maneira que podia. Deixou cinco deles formados, apenas um não quis ingressar numa escola de nível superior. Orgulhavase muito deles. Seus filhos são os seguintes: Maria Medeiros Morotó formada em pedagogia, Maria José Morotó também formada em pedagogia, José Carlos Morotó terminou apenas o científico (2°. grau), Maria Izabel Morotó formada em pedagogia e em odontologia, António Medeiros Morotó médico 108 veterinário e Luiz Medeiros Morotó também médico veterinário. Morotó foi embora para o outro lado da vida no dia 31 de março do ano de 1981 com 81 anos de idade, quando era útil devido a seu estado físico, acostumado com os trabalhos pesados. Deixou muitas saudades. Muita gente desejaria ir como ele foi. A CONFISSÃO João Francisco de Moura, sobrinho do Senhor Tome José de Moura, fundador da fazenda São José, hoje município de Frei Miguelinho e avô do Dr. António Medeiros Morotó, foi pai de uma numerosa família, casado com Dona Maria Francisca da Conceição, descendente da família Lúcio de Almeida. Radicado no Maracajá, que é uma pequena região composta de várias propriedades e fazendas com o mesmo nome, distante da sede do município uns 6 quilómetros. O Senhor João Moura fez questão que todos os seus 9 filhos homens e as 4 mulheres se dedicassem à agricultura. Não teve o mínimo interesse para a sua família estudar. Entre os filhos e filhas que assinam os nomes, foram por iniciativas próprias procurando escolinhas particulares. Não praticava nenhuma religião. Os meninos aprenderam algumas orações com a genitora que também não se preocupava muito com a educação da família. A Dona Conceição exercia a profissão de parteira prática em todas as propriedades vizinhas e até na vila. Viveu muitos anos atendendo a quantas parturientes lhe chamavam, a qualquer hora do dia ou da noite. O cavalo vivia de prontidão bem perto de sua casa. Quando batiam na porta, mesmo chovendo ou alta madrugada, dentro de poucos minutos a Dona Conceição estava cavalgando acompanhada do portador que na maioria das vezes era o compadre e pai da criança que ia nascer. Dona Conceição foi uma das primeiras mulheres que deixaram de andar a cavalo de Silhão, utilizando celas, considerado feio na época, não era bem recomendado uma senhora andar de calça comprida montada num cavalo. Dona Conceição não deu ouvidos aos comentários e usava calças compridas por baixo do vestido, utilizando-se de celas, porque além de firmar-se melhor na montaria evitando quedas, podia correr com menos perigo de cair. Nesse ofício de parteira passou muitos anos, chegan109 do a contar mais de dois mil partos que assistiu. Dona Conceição faleceu já de idade avançada cercada de centenas de afilhados na fazenda Maracajá. João Moura era o agricultor dos serviços rústicos, homem do queixo do burro, perdidos por mulheres. Gostava de piadas obscenas e não escolhia ambientes para contá-las. Era muito conhecido em toda região. Nos dias de feira em Olho D'Água da Onça, hoje Frei Migue, linho, onde estivessem João Moura e Laurentino Hipólito, encontravam-se também todos os que gostavam de ouvir piadas safadas. Era proibido às famílias passarem por perto. Nos idos de 1935, João Moura já era um homem velho. Naquela época a Senhora Maria Luzia separou-se do esposo o Senhor João Amâncio. Mulher bonita e leviana, depois que considerou-se livre dos compromissos de senhora casada, causou um grande desassossego para as mulheres casadas com homens jovens de boa situação financeira. Muitos olhares maliciosos da Dona Maria Luiza permaneciam no pensamento de muitos senhores casados, aguardando uma oportunidade propícia, para viver o prazer de alguns momentos gozando os carinhos de uma mulher bonita e acima de tudo casada. Depois de separada usou de todos os seus encantos e malícias para gozar a vida de mulher cobiçada. Vestia-se da melhor maneira, usando jóias e perfumes de primeira qualidade, cheia de meiguice provocante fazendo todos os homens suspirarem de ansiedades e as esposas desconfiarem da fidelidade dos maridos. Maria Luzia gostava de usar vestidos pretos. Ela achava-se mais irresistível para os seus amantes se trajando assim. Era de pele alva, achando que a cor preto lhe caia bem. Por isso passou a ser chamada de a mulher do vestido preto. João Moura vivia recordando o tempo de moço com inveja dos que eram cortejados pela mulher do vestido preto. Dizia ele que ficaria muito feliz se Maria Luzia lhe desse a oportunidade de abraçá-la e sentir o calor do seu corpo e o cheiro de mulher nova. Ela não lhe dava a mínima importância, não lhe concedia nem sequer um olhar. O velho octagenário lastimava-se porque sabia que ia morrer sem abraçar a mulher mais bonita da época e que vendia amor em retalhos. Pensando assim, adoeceu sem conseguir o seu desejo. Quando estava nas últimas horas de vida, no leito da morte, as filhas combinaram para chamar um padre, para ver se conseguiam fazer seu pai mudar de ideia a respeito de religião e se confessasse, para assim a família ficar tranquila com o destino da alma do genitor morrendo nas graças de Deus. Quando o padre chegou, uma das filhas disse baixinho bem no ouvido do velho enfer110 mo: "papai, ô papai, o padre está aqui, o Senhor vai se confessar para ficar bom e ir para o céu sem pecados". João Moura abriu os olhos já sem luz, com a sonolência da morte e divulgou a figura do padre de pé a beira da cama com a sua batina preta. Com dificuldades, perguntou com a voz arrastada. É Maria Luzia? vamos fazer menino? e com grande esforço levantou a mão trémula tentando acariciar a batina preta do padre à altura do ventre, interrogando: Tá raspadinho? vamos Maria Luzia, deita aqui junto de mim. Pousou a palma da mão no colchão do seu lado direito, repetindo várias vezes, "deita aqui Maria Luzia, vamos para o céu comigo". As filhas se retiraram do quarto enquanto o sacerdote comentava comovido; coitado ele enlouqueceu. É possível que o vigário tenha se lembrado de algumas queixas de mulheres casadas da sua paróquia, contra a mulher do vestido preto. Horas depois João Moura deu o último suspiro balbuciando as palavras: "vamos Maria Luzia para o céu". o fato. João Negrinho, genro de João Moura foi quem relatou FAMÍLIA DO SENHOR E SENHORA HERÁCLIO Capitão Jerônimo Heráclio, pai do segundo Prefeito de Frei Miguelinho e Coletor de Vertentes. Esposo de Dona Josefa Lucena Heráclio e genitor dos seguintes filhos: Maria Geralda Farias, professora, esposa do ex-Prefeito do Recife, Dr. António de Arruda Farias, exdeputado estadual em duas legislaturas, proprietário da Usina de óleo de algodão em Surubim (sua terra natal), da Usina Pedroza, situada no município de Cortês, dono de destilaria de álcool no município de Baía Formosa, no Estado do Rio Grande do Norte e acionista das empresas Rádio Jornal do Comércio, escrita, falada e televisionada de Pernambuco. Dona Geralda é uma das primeiras damas, de alto valor social e de coração filantrópico, merecedora do respeito e admiração de todos os pernambucanos. Dr. António Heráclio do Rego, advogado, foi deputado estadual por quatro legislaturas, tendo sido constituinte em 1946. Era o deputado mais jovem nesta legislatura. ExDiretor de várias autarquias estaduais e criador de gado, conhecido em toda região do agreste como um homem destemido, capaz de sacrificar-se por um amigo. Foi o segundo Prefeito nomeado de Frei Miguelinho. É falecido. 111 Dr. Luis Heráclio do Rego, advogado, foi funcio nário da Secretaria da Fazenda, Delegado de Polícia na capi tal e era Diretor do I.P.S.E.P., quando faleceu. -Dr. Jader Heráclio do Rego, advogado no foro da capital, funcionário do I.P.S.E.P. e criador de gado em Bom Jardim. -Dona Maria do Carmo Heráclio do Rego, professora, esposa do senhor Francisco de Morais, fazendeiro de projeção, ex-deputado atuante na Assembleia Legislativa do Estado. Prefeito do município de Passira. É pai do atual deputado estadual Luis Heráclio (advogado) . -Dona Maria de Lourdes do Rego Ferreira, profes sora, esposa do senhor José Joaquim, comerciante de nacionalidade portuguesa. — Dona Maria José Heráclio Cabral, professora, es posa do senhor António Farias Cabral, criador de gado em Surubim. — Dona Maria Bernadete Heráclio do Rego, solteira, professora, funcionária da U.F.PE. O Capitão Jerônimo veio de famílias tradicionais de Pernambuco. Projetou-se no Estado como grande construtor de estradas, reabrindo veredas de povoados a povoados, ainda na época em que quase não havia veículos motorizados. Porém o Capitão Jerònimo Heráclio previa o progresso, tornandose um verdadeiro baluarte das construções de estradas na nossa região. Quase todos os governadores daquela época lhe confiaram os trabalhos das rodagens. Não era engenheiro diplomado mas sua prática no setor era reconhecida por todos os engenheiros de seu tempo. Era o melhor construtor. A dificuldade de viajar constituia-se num grande problema. De Vertentes a Recife, o pior trecho situava.se perto de PaudaIho, numa ladeira onde qualquer chuva interrompia o trânsito por dias seguidos. Certa ocasião, o Capitão Jerônimo, num dos seus conhecidos impulsos violentos, concentrou todo seu dispositivo de trabalho para acabar com aquele flagelo que existia perto de Paudalho. Iniciou o trabalho sem a autorização do Governo, o que só veio depois. Recebeu apoio de todos que trafegavam por aquela rodagem e dentro de poucas semanas conseguiu colocar pedras em todo trecho, trabalho que beneficiou bastante a região. Foi elogiado pelos governantes de então e para o povo tornou-se ainda mais respeitado. 112 Devido a sua profissão, viajava muito pelo agreste e norte do Estado. Apesar de ser conhecido como homem de génio forte e quando ofendido até violento, gostava de brincar e dar caronas. Contam que no povoado de Tamboatá, município de Bom Jardim, ele gostava de parar e conversar com todos e não demorava para vários garotos se aproximarem dele e pedir dinheiro, se oferecendo para qualquer mandado. Certo dia ele parou o carro e distribuiu laranjas da baía para todas as crianças, avisando que na volta queria as sementes. Os garotos se prontificaram alegres a cumprir a ordem do Capitão. Todavia, como laranja-baía não tem sementes, na volta o Capitão estacionou o carro, perguntando pelos garotos do lugar, sem que ninguém desse notícias. Também gostava de dar caronas. Uma vez surgiu um homem pedindo ao Capitão Jerônimo para conduzi-lo até um pouco adiante. Foi atendido e logo o Capitão iniciou um diálogo, perguntando se o passageiro conhecia os Heráclios de Limoeiro. O idiota disse que apenas ouvia falar que eram homens maus, que gostavam de espancar gente e que o pior deles era um tal de João Heráclio. O Capitão insistiu, perguntando: O senhor acredita que João Heráclio é ruim mesmo? - resposta afirmativa. O senhor Jerônimo freou o veículo bruscamente e então o biguzeiro perguntou: O que foi que houve? o automóvel desmantelou? o Capitão respondeu com violência: Não, o senhor João Heráclio é meu pai e não é o que você disse. Desça do carro. O homem obedeceu, e o Capitão aplicou-lhe uma surra com varas de mameleiro dizendolhe: nunca mais fale de quem você não conhece e corra se não quiser morrer. O homem embrunhou-se mato a dentro. 'As estradas eram precaríssimas, verdadeiras veredas. O senhor Jerônimo Heráclio viajava no seu Ford, modelo 1920, em alta velocidade. As vezes quando trafegava trechos melhores, acelerava até 60 kms, uma verdadeira loucura, recebendo denominações de corredor e bom volante. Não respeitava galinhas, cabritos, carneiros, porcos e outros animais domésticos. Só respeitava crianças, as quais eram difíceis de aparecer na estrada, com medo tremendo dos automóveis, Comentavam em palestras: — "Quem não quiser morrer que saia da frente do automóvel do Capitão". Assim era o pensamento de muita gente daquele tempo, nas estradas de Vertentes a Limoeiro, embora jamais tenha acidentado uma pessoa. 113 Quanto aos animais domésticos, se os atropelava, de volta saia perguntando quem eram os donos dos "bichos" acidentados e pagava um preço acima do valor real, com uma recomendação: "cuidado com seus bichinhos, para não morrerem na estrada". Gostava muito de buzinar. De longe as donas-de-casa quando ouviam a buzina "ron-ron-ron", gritavam para os filhos: "tange os bichos do terreiro e da estrada que lá vem o Capitão Jerônimo, buzinando em toda carreira no seu automóvel". Era aquele corre-corre, espantando os animais para dentro do mato. Os garotos mais inteligentes, diziam: "Mãe, deixe o Capitão matar as galinhas, porque ele paga e a gente come". O Capitão Jerônimo foi coletor de Vertentes e chefe político da região até a sua morte em 22 de março de 1950. Udenista, fazia oposição à altura ao seu poderoso irmão Coronel Chico Heráclio, pessedista até a medula. Os dois irmãos marcaram épocas na política do agreste pernambucano. 114 SEGUNDA PARTE O FRADE Miguel Joaquim de Almeida Castro "Frei Miguelinho" (bico de pena de Angelo Meyer) CAPÍTULO VI FREI UM FRADE MIGUELINHO RE VOLUC IONÁR IO Sua certidão de idade, extraída dos livros existentes na matriz da cidade de Natal, Rio Grande do Norte, mostra-nos que o padre MIGUEL JOAQUIM DE ALMEIDA CASTRO, nasceu em Natal a 17 de setembro de 1768, filho legítimo do capitão Manoel Pinto de Castro, natural de São Veríssimo de Valbom, bispado do Porto (Portugal), e de Dona Francisca Antonia Teixeira, natural da freguesia de Natal. Teve oito irmãos, dos quais seis varões, sendo três, como ele, padres. Com o Rio Grande do Norte, Frei Miguelinho teve de comum os laços familiares e a educação primária. Quando completou seus dezesseis anos de idade, foi enviado para o Recife. Chegando lá, entrou na ordem dos frades carmelitas. Professou a 4 de novembro de 1784, com o nome de Frei Miguel de São Bonifácio, donde lhe veio o apelido de "Frei Miguelinho". Dos seus oito irmãos, o padre Ignácio Pinto de Almeida Castro foi vigário de Jaboatão; o padre Manoel Pinto de Castro figurou na política da província, que chegou a administrar; o Coronel Joaquim Felício Pinto de Almeida Castro apresentou papel importante nos acontecimentos de Pernambuco, em 1824; Dona Bonifácia Pinto Garcia de Almeida, residente sempre em Natal, foi mãe de uma descendência ilustre e Dona Clara Joaquina de Almeida Castro foi a companheira fiel e devotada do herói Frei Miguelinho (seu irmão), acompanhando-o até o começo do seu martírio. Frei Miguelinho não mais voltou ao Rio Grande do Norte e não teve portanto, interferência direta no movimento 117 patriótico chefiado em Natal pelo Coronel André de Albuquerque . O desejo constante de aperfeiçoar cada dia mais seus conhecimentos, levou-o a Portugal, na qualidade de companheiro do procurador que sua ordem tinha junto à Corte. Ao chegar a Lisboa, Miguelinho cultivou as Ciências e as Letras, frequentou Cursos e as instituições científicas e literárias, onde sempre foi acolhido com respeito e agrado o "frade rio-gran. dense". como era chamado no convívio dos maiores sábios da época. Reconhecendo que não possuía muita vocação para a vida monástica, obteve da Santa Sé o breve de secularização e retornou em 1800 a Pernambuco. Foi recebido com entusiasmo pelo público e todos o respeitavam, segundo o padre Dias Martins, como grande Teólogo, sublime filósofo, profundo político e consumadíssimo orador. Tudo isto, além do mais, realçado por sua modéstia, sua religião, sua humanidade e todas as virtudes sociais. Já em Pernambuco, o bispo Azeredo Coutinho, um dos grandes luminares da igreja brasileira, que o havia conhecido em Lisboa, chamou-o para o seminário de Olinda, confiandolhe a cadeira de Retórica, que regeu até a época do seu martírio. Partidário ardente e ferrenho das doutrinas democráticas, conseguiu impor.se aos adeptos das ideias liberais em Pernambuco, que o escutavam como a um Deus e dizem que: "Quantos mancebos se haviam educado com ele, todos abraçaram ardentemente a causa da liberdade". Convivendo no meio pernambucano, exercendo semelhante ascendência, era, portanto, natural que tomasse parte saliente e preponderante no movimento revolucionário de 1817, cuja celebridade deve-se mais à hecatombe de homens ilustres que ocasionou do que pelo resultado do próprio movimento, visto que, na insuspeita opinião de Oliveira Lima, "não fora a revolução um plano bem combinado para simultaneamente rebentar em outras capitanias, não possuía elementos materiais e morais para vingar, nem em número de soldados, nem em universalidade de convicção e não passou duma explosão frenética do sentimento nacional desdenhado, brotada de cérebros exaltados pelos sucessos da Revolução Francesa, afervorados em seus sonhos por uma misteriosa solidariedade e ansiosos pela integração da liberdade americana". 118 A marcha para a Liberdade O sistema de colonização portuguesa favoreceu a rormação da nacionalidade brasileira. Ao contrário dos americanos do norte que repeliram o gentio, o português a ele se aliou, misturando-se o sangue das duas raças, surgindo assim o aborígene, com a epopeia do Caramuru, o valor de Camarão, a graça de Paraguaçu, nos acontecimentos mais notáveis da nossa história. O elemento negro vindo para aqui devido à escravização de várias tribos livres da África, vinculou-se ao solo, ligando-se aos povoadores e entrando também na formação da raça, saindo daí o tipo brasileiro, preso desde logo à terra do seu berço por esses laços indefiníveis que só o amor pátrio sabe explicar. No Brasil-Colônia só permanecia português de coração o funcionário público ou o soldado que vinha a serviço da Mãe Pátria. O colono, o homem de negócios, ligando.se ao índio e ao negro pelas relações sexuais ou pelas conveniências do trabalho, tornava-se 'brasileiro. Pouco a pouco, a distância ia diminuindo os laços que prendiam a colónia à metrópole; a pátria livre tornou-se a aspiração geral dos brasileiros — desde que a expulsão dos holandeses lhes dera a consciência de sua força, concretizada de fato na guerra dos Mascates de 1710, na sublevação de Vila Rica, de 28 de junho de 1710, na Inconfidência de Minas Gerais, a célebre revolução, sonho dos poetas, que levou à forca Tiradentes, no projeto de república dos irmãos Suassuna, de Pernambuco em 1800; na revolução de 06 de março de 1817; no Grito do Ipiranga a 7 de setembro de 1822. Influências da Corte portuguesa no Brasil Logo, como sabemos, foi lento o percurso dos brasileiros na sua aspiração emancipacionista, o que é explicado pela disseminação da população em um território vasto, de comu. nicações difíceis entre si, pela indolência que nos é própria e pela sujeição severa às antigas leis e regulamentos coloniais, peculiares do caráter brasileiro. A mudança da Corte portuguesa para o Brasil (1808), muito influiu nos intuitos autonomistas dos nacionais, que a esta altura acalentaram a esperança de se tornarem independentes sem a agitação revolucionária. Portanto, para o Brasil foi muito vantajosa a vinda da Corte portuguesa, em consequência das novas relações que 119 adquiriu a colónia, aberta ao convívio mundial, e pela posição em que os acontecimentos a colocaram, muito superior à Mãe Pátria. Segundo escrevia Henry Koster, em 1808, a chegada do soberano D. João VI despertou o desejo de competição entre alguns brasileiros que de há muito estavam entregues a hábitos de indolência e aumentou a atividade de outros que aguardavam como paciência ocasião para evidenciá-la. Os brasileiros sentem que se tornaram uma nação, a sua terra natal dá presentemente leis à mãe pátria. D. João VI, debaixo de uma aparência de grande co. vardia, era, no entanto, um consumado e hábil político. Fugindo à invasão napoleônica, poupou sua autoridade às humilhações por que passaram todas as cortes europeias, com exceção da Rússia e Inglaterra e, chegando ao Brasil concebeu o "plano ardiloso de resistência, que consistiu em conceder à colónia o máximo das franquias económicas para garantir o mínimo das cedências políticas", segundo Oliveira Lima. Os brasileiros, porém, logo compreenderam que da corte portuguesa nenhum benefício lhes podia advir, uma vez que estavam destinados a servir de "bestas de carga" para saciar a ganância da fidalguia ociosa e faminta que acompanhara D. João VI e se apoderara de todas as posições e de todos os empregos, com exclusão acintosa dos nacionais. Lavrava intenso, como um fogo subterrâneo, o espírito de discórdia e rivalidade entre brasileiros e portugueses, o que fazia com que uns e outros ficassem inquietos. Motivos porá um governo provisório republicano Descrevendo o cenário onde se desenrolou a revolução de 1817, Oliveira Lima salienta que a ideia emancipacionista crescia com exaltação nos quartéis, pela preferência concedida aos oficiais portugueses e ainda mais nas cinco Lojas Maço. nicas que existiam na capital de Pernambuco em 1816, e que estavam então no seu auge de animação, ligadas às de outras capitanias e às do Velho Mundo por laços de irmandade e de filiação, propositalmente avivadas pelas viagens de alguns consórcios. O sentimento independente transparecia até publicamente nos banquetes, donde eram banidos como protesto o pão e o vinho de Portugal, substituídos pela mandioca e aguardente indígenas. Quanto à parte doutrinária do movimento de emancipação era incentivada pelos padres que formavam a classe 120 mais ilustrada da sociedade e que, para honra do clero brasileiro, tomaram parte principal, ativa e saliente nas revoluções, pagando alguns com a vida o seu amor à liberdade. O campo estava preparado para a revolta, mas não havia concerto para ela conforme os acontecimentos posteriores demonstraram. A 6 de março de 1817 ninguém, no Recife, cogitava organizar um movimento revolucionário. A denúncia falsa de um pequeno motim, que as autoridades portuguesas consideravam verdadeira, a displicência do governador Caetano Pinto, a violência do brigadeiro Barbosa determinaram o movimento do quartel de Cinco Pontas e o levante da soldadesca, obrigando o governador a refugiarse na fortaleza do Brum, organizando.se logo o Governo Provisório, cuja posse foi solenizada por um "Te Deum" a meio do qual orou Miguelinho, particularmente reputado pela eloquência de suas palavras, que realmente, naquela ocasião, honrou o género pela unção comovedora e doce evangelismo do discurso que proferiu, provocando inclusive, lágrimas de contentamento entre portugueses e brasileiros, que se abraçaram jurando muito concórdia, ao que afirma Muniz Tavares. Vitoriosa a Revolução Iniciada portanto, com bom êxito a revolução, com intuito de conciliação e paz, mais ainda com um caráter francamente republicano e autonomista, abraçaram-na as capitanias da Paraíba, Rio Grande do Norte e Ceará. Ao certo não se sabe se foi Miguelinho que teve ação direta no movimento revolucionário em Natal, desde que os documentos conhecidos não se referem a ele e nem a nenhum dos seus familiares, como participante da revolução. Foi organizado ainda um governo provisório no período do governo Martins, para substituir o da capital, porém seus membros logo se dispersaram, porque a causa da revolução fracassava desde Alagoas ao Ceará. No seu começo nenhum obstáculo havia encontrado a revolução de 1817, e talvez seja isso que a destruiu, porque os revolucionários confiaram demais em sua obra. Homens que, como Frei Miguelinho, faziam da liberdade um novo evangelho, custavam a acreditar que a tirania fosse tão terrível e tão desumana na represália de um movimento que se apresentava com incidentes tão pacíficos. Confiavam também, os revolucionários na proteção e bons ofícios 121 dos Estados Unidos da América, para onde foi mandado um emissário e, na incumbência do padre Abreu e Lima, da qual esperavam a adesão das capitanias de Alagoas e Bahia. Nenhuma atitude dos revolucionários demonstrava espírito violento. Com exceção de alguns criminosos que fugiram à regra normal, mas que logo depois foram reintegrados na cadeia, a Revolução não se manchou com represálias pessoais, nem com destruições vergonhosas. Os adversários foram tratados com toda educação, o que deu à revolução um aspecto simpático de doutrinarismo e desinteresse, desistindo com nobreza o diretório de qualquer ordenado que lhe competisse e dirigindo um apelo aos cidadãos distintos da capitania, no qual dizia: "A capital está em nosso poder; a pátria está salva. Ela vos chama; vinde unir-vos aos vossos irmãos. Eles vos esperam com os braços abertos e ansiosos por vos apertar entre eles. O céu abençoará o fim de nossa obra, assim como tem abençoado o seu princípio". Realizações dos republicanos no curto período que conseguiram governar Foram adotadas no entanto, medidas que mostram que, se os revolucionários de 1817 não possuíram o senso prático para fazer vingar o movimento, tinham a intuição dos governos democráticos. Foi assim que abateram-se as coroas, inutilizaram-se as armas portuguesas e emblemas reais, decretaram-se leis e estabeleceram.se novas bandeiras. Deliberou-se ainda que os atos do governo seriam datados da "segunda era da liberdade pernambucana; escolheu-se a bandeira — duas cores, azul e branca, repartidas horizontalmente, a- primeira na parte superior, onde haveria um arco-íris com uma estrela por cima e o sol por baixo e, a segunda tendo ao centro uma cruz vermelha. O Governo Provisório foi instalado composto de cinco membros representando as classes seguintes; as quais hoje seriam os ministérios: Militar — Domingos Teotônio Jorge Eclesiástico — Padre João Ribeiro Judicial — Dr. José Luís de Mendonça Agrícola — Manoel Correia de Araújo Comerciante — Domingos José Martins. Deste modo, adquiria a revolução características de grande revolta social; as classes burguesas, cansadas do pre122 domínio de nobreza abusiva, subiam ao poder para defesa dos seus interesses. Decretou-se ainda a tolerância religiosa, aboliu-se o tratamento de excelência, sendo substituído pelo de "vós", pátriota, tomaram medidas que tendiam a acabar com a escravatura e não se descuidaram dos meios de resistência à reação monárquica, organizando-se o exército e a armada para a defesa da Pátria. Derrotados pela Contra-Revolução O Recife foi bloqueado pela esquadra do Almirante Lobo e, com a aproximação por terra, do exército sob o comando do Marechal Lacerda, o Governo Provisório sentiu.se enfraquecido pelas falhas de alguns revolucionários e pelo terror que foi se apoderando da população. Em meio a tudo isto, Domingos José Martins vai combater o inimigo e é derrotado em Pindoba. Ocorre então, o conflito de jurisdição entre Domingos Martins e Suassuna. Domingos Teotonio Jorge assume a ditadura e declara a pátria em perigo. O Almirante Lobo proclama aos habitantes do Recife e faz intimação insolente aos revolucionários. Domingos Jorge responde propondo a rendição com as honras de guerra, sob pena de serem passados a fio de espada todos os europeus residentes no Recife. A resposta de Domingos Teotonio foi levada ao Almirante Lobo, por Cruz Ferreira, e aceita. No entanto, voltando o enviado a Recife, não mais encontrou com quem tratar, visto que, de véspera, na noite de 18 de maio, o Governo Provisório havia se retirado com todas as suas forças para a cidade de Olinda. , Epopeia do martírio de Frei Miguelinho É justamente aqui que tem início a epopeia do martírio de Frei Miguelinho. Na qualidade de secretário do governo, possuía em suas mãos muitos papéis e documentos comprometedores de inúmeras pessoas. Para livrá-las da fúria dos agentes da tirania, o herói potiguar, em vez de acompanhar seus amigos para o engenho "Paulista", na noite de 20 de maio, condenou-se voluntária, mente à morte e tratou, antes de morrer, de salvar o maior número possível dos seus concidadãos implicados no movimento revolucionário. 123 Nessa mesma noite, Miguelinho subiu as escadas da casa de sua residência em Olinda, onde, banhada em lágrimas, recebeu-o sua irmã, D. Clara. Frei Miguelinho estreitou ternamente a irmã querida e disse-lhe com meiguice: "Mana, não quero choro. Estás órfã. Tenho enchido os meus dias, logo me vêm buscar para a morte; entrego-te à vontade de Deus; n'Ele terás um pai que não morre. Mas aproveitemos a noite; imita-me e ajuda-me a salvar a vida de milhares de desgraçados". Imediatamente trataram os dois heróis de queimar todos os documentos e papéis sobre a revolução, que havia na sala e que podiam complicar a sorte dos seus companheiros. Cumprida tão patriótica quão humanitária missão, esperou que o dia amanhecesse e resignado aguardou que se verificassem, a seu respeito, as ameaças de morte, com que pró, curavam abater-lhe o ânimo varonil. Estas felizmente não se realizaram; e, apesar de estai ainda em tempo de fugir à sanha de seus perseguidores, se deixou ficar em Olinda, onde foi preso; caminhando satisfeito para o cárcere, por se haver devotado pela salvação de seus companheiros, desviando-lhes da cabeça o cutelo do algoz. Preso e encafuado no porão do navio "Carrasco", juntamente com outros companheiros seguiu para a Bahia, onde o aguardava o rancor feroz do Conde dos Arcos. Encerrado nos cárceres daquela cidade, foi conduzido à presença da comissão militar, a 10 de junho, para ser interrogado . Miguelinho espantou os juizes com a doçura evangélica da sua fisionomia, onde transparecia a calma absoluta da sua consciência. O mártir, semelhante a Cristo, conservou-se mudo e parado diante dos juizes impiedosos. Nem uma palavra de defesa, nem um gesto de revolta! O Conde dos Arcos, no entanto, fascinado pela sublimidade desse martírio, ou preso pelo remorso na condenação de um inocente, propôs a si mesmo salvar Miguelinho e admirado do silêncio que este guardava sobre todos os artigos da acusação, disse-lhe, em plena sessão: — Padre, não pense que somos alguns bárbaros e selvagens, que somente respiramos sangue e vingança. Fale! diga alguma coisa em sua defesa. E continuando o silêncio por parte de Miguelinho, o Conde retrucou, como que insinuando-lhe logo a resposta: 124 — O padre não tem inimigos? Não seria possível que eles lhe falsificassem a firma e com ela subscrevessem todos ou parte dos papéis que estão presentes? Falou então, pela primeira vez o herói, para responder ao Conde: — Não, senhor, não são contrafeitas; as minhas firmas nestes papéis são todas autênticas, e por sinal, em um deles, o de Castro ficou metade por acabar, porque faltou papel. Calou-se, recusando outra qualquer resposta. E nesse traço de coragem, foi o epílogo glorioso de sua vida de mártir, impondo ainda mais à nossa admiração o ato de devotamento com o Padre Miguelinho, antes de ser preso, sacrificou-se pelos seus companheiros de infortúnio na revolução de 1817. Foi proferida contra ele a sentença de morte, com data de 11 de junho de 1817. Miguelinho ouviu, em profundo silêncio, a leitura cruel e, sem o menor sinal de impaciência, encaminhou-se para o terrível oratório. Sendo, pela manhã de 12 de junho, ele e José de Mendonça intimados da rejeição dos embargos, José Luis exclamou indignado: — Juizes malvados! Cegos e vis instrumentos da tira nia! Eu vos emprazo para os infernos! Setenta réus de pena última tenho livrado da forca sem alegar um só fato que ti vesse meio peso dos muitos dos meus embargos; juizes... Ia continuar, quando, pela segunda vez, faiou o herói riograndense, que fitando-lhe os olhos, disse: — Querido amigo, façamos e digamos unicamente aquilo para que temos tempo. Ajoelhou diante do crucifixo e começou a repetir, debulhado em lágrimas, o salmo "miserere mei Deus" que não cessou de alternar com José Luis de Mendonça, enquanto durou sua agonia. Às quatro horas da tarde desse mesmo dia, 12 de junho de 1817, Miguelinho, revestido da alva, corda ao pescoço, algemado, pés descalços, cabeça descoberta, no meio de uma escolta de soldados, foi conduzido ao Campo da Pólvora, onde foi fuzilado, sendo, na mesma tarde, enforcados os seus companheiros de infortúnio. A sorte, todavia dentro de pouco tempo tornou-se contrária à revoloção, que não teve elementos para oferecer resistência às forças que foram enviadas da Bahia e do Rio de Janeiro para combatê-la. 125 Desta maneira brilhantíssima consumou o seu martírio o insigne astro natalense, exclama um seu contemporâneo, padre Dias Martins. Foram muitos os brasileiros que, demonstrando patriotismo, sacrificaram-se para nos legar uma Pátria gigante, livre e feliz; no entanto, quase todos são esquecidos, como se o ato extremo de dar a vida pela liberdade do Brasil não valesse a pena para nós que temos o dever de reverenciar os heróis brasileiros, a exemplo do que fazemos imerecidamente para com Tiradentes, que não foi maior do que Miguel Joaquim de Almeida Castro. Já houve quem dissesse que as revoluções no Brasil prescindem, em geral, do sangue, o elemento vital que lhes dá força e vigor, a argamassa com que podem ser solidamente cimentadas. Em todas elas, tem predominado um certo fundo de misticismo, ou um entusiasmo ingénuo e transbordante, talvez em acordo com a índole da nossa raça. São, no começo, aplaudidas incondicionalmente para serem, mais tarde, verberadas sem exame. Foi assim a Revolução de 17; assim, o 7 de Setembro; assim, o 15 de Novembro... A força do tempo vai depois polindo a figura dos protagonistas desses movimentos, sagrando heróis da liberdade os que nele preponderaram. A figura de Miguelinho tem-se tornado épica e legendária através dos tempos. Místicos ou guerreiros, são por igual beneméritos da Pátria os que sonham e os que combatem, porque, não sei qual mais meritório, se a bala que redime uma afronta ao brio nacional, se a ideia, se o sonho que voam aos corações, num cântico de fé, como aspiração de liberdade. Frei Miguelinho foi fuzilado no dia 12 de junho de 1817, depois de preso, julgado e condenado à morte com infâmia, tudo isto realizado no curto espaço de tempo de apenas 98 dias. O mesmo aconteceu com os mártires Dr. José Luis Mendonça e Domingos José Martins, que foram também fuzilados no mesmo local, dia e hora, em Salvador, Bahia, pelo ideal de uma nação independente. Quanto aos outros presos, foram-se protelando os processos, embora nas prisões fossem amarrados com ferros nos pés e nas mãos. 126 O Governador de Pernambuco, depois de Caetano Pinto, Luiz do Rego Barreto, mandou executar com a pena má. xima, entre outros revolucionários, Domingos Teotonio e o tenente António Henrique. Os mártires foram servindo de bandeiras para aumentar o idealismo de independência, e não demorou muito a realizar-se o sonho dos revolucionários pernambucanos de 1817, que era um país republicano. Por ocasião do I Centenário da Revolução de 1817, os poetas Francisco Palma e Ezequiel Wanderley recitaram inspirados sonetos, que foram extraordinariamente aplaudidos: INVOCAÇÃO (À memória de Míguelinho) Berço pendente ao sol puríssimo do Norte, Terra cheia de luz, de bondade e carinho, Já tingiram teu seio os negrores da sorte, Já mancharam de sangue o teu longo caminho. Berço cheio de amor, terra de Miguelinho, Seio imenso de mãe consolador e forte, Que lhe deste a beber o generoso vinho Da Virtude e da Fé para enfrentar a morte. Dá-me a triste visão do Calvário bendito» A tirania humana em face do infinito E o sereno perfil do grande fuzilado. Morreu, dentro da luz de um ensinamento novo. E é preciso guardar no coração do povo O valor dos heróis e as glórias do passado. 12-junho-917. Francisco Palma IMORTAL (No monumento a Miguelinho; Padre, tu que surgiste aureolado da Lua Que o futuro desvenda, o passado redime. E, entre rubros clarões, a tu'alma conduz — A bendita visão do teu bendito crime. 127 Padre, tu que aprendeste os mistérios da Cruz, Fonte augusta do Amor, redivivo e sublime! E, entre salmos triunfais, disseste ao teu Jesus: "A bendita visão, do teu bendito crime". Padre, tu que afrontas os peloiros da sorte, Sem curvares o joelho às leis do despotismo, Na vida foste herói e foste herói na morte Morreste sem morrer, e altivo e sobranceiro, No zimbório da Fé, na torre do Civismo. Legaste um nobre exemplo ao povo Brasileiro. Ezequiel Wanderley. Natal, 12 de junho de 1917. No monumento a Miguelinho, existem estas inscrições, compostas pelo exímio latinista, Cónego Estêvam José Dantas: MICHAELI J. DE ALMEIDA CASTRO ET ANDRADE DE ALBUQUERQUE MARANHÃO MULTA PRÓ PÁTRIA LIBERTATE PASSIS QUAM ET FORTITER MORIENDI EXTULERUNT CONCIVES SUI CENTÉSIMO OCCURRENTE ANNO HOC MONUMENTUM POSTERIS COLENDUM EREXERE A Miguel J. de Almeida Castro e André de Albuquerque Maranhão que padeceram muito em prol da liberdade da Pátria, que, morrendo corajosamente, exaltaram os seus concidadãos, erigiram este monumento, por ocasião do centésimo aniversário, para ser honrado pelas gerações futuras Os riograndenses do Norte, também homenagearam o seu grande filho, Miguel Joaquim de Almeida Castro (Frei Miguelinho), dando o seu nome em ruas, avenidas e praças. Em Natal, além de constar o seu nome no hino do Estado é ainda citado por todos os historiadores potiguares. 128 Apelo para os habitantes da minha terra comemorarem com alegria o dia 17 de setembro, que marca o aniversário de nascimento de Frei Miguelinho, e lembrem com respeito o dia 12 de junho, data em que o Frade passou para a imortalidade. 129 TERCEIRA PARTE O BANDOLEIRO Manoel Batista de Morais, ou "Nezinho Morais", o famoso Capitão António Silvino, Chefe de cangaceiros que se considerou por 18 anos governador ao Sertão. (Do Arquivo Aziz Elihimas). CAPÍTULO VII DECLARAÇÕES DE UM SOBRINHO DE ANTÓNIO SILVINO OLEGÁRIO LINO DE MORAIS, filho de dona Rita, irmã do Capitão António Silvino, conta atualmente 86 anos de idade. É proprietário da fazenda Cedro, situada no município de Iguaraci, nas margens do rio Pajeú, limitando-se com o município de Ingazeira. Apesar de sua idade, é um homem forte, em plena atividade na sua fazenda, na criação de gado e agricultura. De estatura elevada, alvo, olhos azuis, denunciando que na mocidade foi possuidor de um físico atlético, característico da família Morais. Depois de uma certa relutância, resolveu prestar as seguintes informações relacionadas com o seu avô, Batistão, sua mãe e seus tios, inclusive os motivos que levaram seu tio Manoel Batista de Morais, depois António Silvino, a transformar-se no chefe dos cangaceiros. Em certa ocasião, interpelado, ele falou que quase tudo que foi narrado a respeito de António Silvino até hoje, não é verdadeiro. Perguntei-lhe: Por que você não conta a verdade? Ele respondeu: E, se alguém contar história de parente, quem irá acreditar? Porém, após um longo diálogo, ele resolveu contar esta história, relatando fatos conforme constam neste livro. OS MOTIVOS QUE LEVARAM ANTÓNIO SILVINO A TORNAR-SE O CHEFE DOS CANGACEIROS Os pais de António Silvino Em meados do século XIX, Pedro Rufino Batista de Almeida, também conhecido como Pedro Batista de Morais, 133 apelidado de Batistão, partiu do município cearense de Inhaúmas e localizou-se no povoado de Colónia, do vastíssimo município pernambucano de Flores, no médio sertão, onde corre o decantado e histórico rio Pajeú. Ali fixado, casou com a senhorita Balbina Pereira de Morais, descendente das famílias Alencar, Peitosa e Brilhante, parenta próxima do Barão do Pajeú, sertaneja do vale daquele rio, e decidiu residir em uma das suas propriedades, Fazenda Cajueiro, encravada hoje no atual município de Princesa Isabel. Depois de um certo tempo voltou à Colónia, estabelecendo-se definitivamente, onde procriou. Fez um ótimo relacionamento com os fazendeiros vizinhos, gozando assim do prestígio e confiança de todos. Progrediu com toda a família e em sociedade com duas irmãs, era proprietário, além da fa. zenda Cajueiro, das fazendas Jasmim, Jardim e Batinga, todas no vale do Pajeú. SUAS VIRTUDES INVEJÁVEl O tempo foi passando e seu prestígio pessoal aumentava na região, pois era considerado homem justo, honesto e de atitudes firmes e acertadas. Como consequência dessas virtudes e de sua personalidade líder, surgiu a inevitável figura daqueles tempos, tornou-se político. Por tudo isso, foi nomeado Juiz Distrital. Como todo homem que procura agir corretamente dentro dos princípios legais encontra opositores ferrenhos quando a lei incide sobre essas pessoas, exatamente por este critério de aplicar a lei, não agradou a um certo grupo político da época, encontrando assim dificuldades em fazer respeitar suas atitudes e atribuições legais perante seus comandados, já que os opositores exortavam seus simpatizantes a desobedecerem suas decisões, tendo às vezes até mesmo de arriscar a própria vida para não ser desmoralizado. Contudo, esses eram fatos corriqueiros e comuns naqueles tempos. Quem representava tal autoridade sabia dos riscos a que se expunha. E não havia de ser diferente. Em toda sociedade há duas tendências: uma que acata pacificamente e a outra que se rebela. Além desses aspectos comuns em todo conjunto humano, Batistão, como era também conhecido, possuía virtudes invejáveis: uma audácia incomum, muito simpático e bastante inteligente, sabia o momento psicológico de atacar e en134 volver as pessoas com as quais mantinha relacionamento, a ponto de ser invejado por seus inimigos, especialmente políticos, pois tinha um poder extraordinário de persuasão para fazer valer suas ideias. SUA LEI ERA IGUAL PARA TODOS Um dos seus maiores opositores políticos foi o Sr. António Chaves, contando este com o apoio político dos governantes da região, que faziam política sistemática no sentido de derrubar o prestígio cada vez mais promissor do Sr. Batista de Morais, pois tornava-se perigosa sua popularidade e intransigência no cumprimento do dever, sem respeitar grupos fortes. Sua lei era igual para todos, sendo, portanto, um obstáculo indesejável aos grandes chefes da época. Somando a tudo isso a função de Juiz Distrital, era obrigado a resolver muitos problemas, nos quais tinha que opinar. Vizinho a uma de suas propriedades, residia um senhor por nome de Desidério Ramos, conhecido como pistoleiro e que era protegido pelos inimigos de Batistão. Certo dia, na fazenda do Sr. Desidério apareceram três cavalos que ninguém sabia a quem pertenciam. Levado o caso ao Juiz Distrital, o representante instruiu o seu vizinho a tratar dos animais, pois logo que o verdadeiro dono aparecesse lhe pagaria o trabalho com dinheiro ou com um dos animais; isto contudo dependeria do tempo que os equinos permanecessem em seu poder, decisão aceita e levada a cabo por seu temeroso vizinho. Passados alguns dias, apareceu o dono dos animais a procurá-los, encontrando-os na fazenda do Sr. Desidério. Reivindicou sua posse, o que foi prontamente negado, afirmando o Sr. Desidério que não devolvia os quadrúpedes que já lhe pertenciam, assim havia dito o Juiz Distrital. O dono dos cavalos procurou o Sr. Batistão, a fim de esclarecer o motivo de tão drástica medida, o que surpreendeu o Juiz, aborrecendo-o e obrigando-o a tomar resolução mais forte, pois achavase desrespeitado pelo seu vizinho, diante da interpretação dada pelo mesmo. Zangado, ordenou a entrega dos animais sem nenhuma indenização, visto que não admitia um desrespeito a um trato seu e do próprio vizinho, que havia concordado em receber uma gratificação, e não apoderar.se dos animais alheios. 135 MORTE DE BATISTÃO Desidério não reagiu na hora. Embora não fosse de carregar desfeitas, tinha medo de Batistão. Procurou o apoio dos adversários do Juiz e conseguiu contratar onze capangas para dar uma lição no afoito representante da lei, já que com homens de certo porte, não se pode tomar atitudes contrárias a sua vontade. Dito e feito. Traçaram um plano e os doze esperaram Batistão na feira de Afogados da Ingazeira. Assassinaram-no no meio da rua, sem lhe dar uma mínima chance de defesa. Não chegou sequer a tocar em suas armas. Nenhuma providência foi tomada para prender os facínoras, ou para remover seu cadáver, exposto ao sol no local do assassinato, cheio de poeira, à vista dos curiosos, como se fosse um animal cujo proprietário não tomasse conhecimento de sua morte. Assim ficou até que seus familiares o vieram buscar para o sepultamento em Colónia, distante dezenas de quilómetros do local do crime. Seu enterro foi acompanhado pelos parentes e habitantes daquele povoado. FESTIVAL FUNÉREO Os adversários de Batistão festejaram o acontecimento, enquanto a família do morto esperava a intervenção da justiça para castigar os malfeitores. Desidério, achando pouco o que tinha feito, insuflou uma turma de mais ou menos dez elementos e resolveram, juntamente com os inimigos políticos de Batistão, realizar uma festa em cima da cova do morto. E assim invadiram o campo santo, cantando e dirigindo insultos ao morto e seus familiares, sapateando em cima da cova e gritando: "Aqui plantamos uma semente tão ruim que jamais vai nascer"! Era o ano de 1896. No limiar do século XX, nos sertões pernambucanos, nascia uma semente mais tarde conhecida nacionalmente, pelas mãos e injustiças do próprio sertanejo. Modelava-se seu flagelo maior daqueles tempos, os Grandes Cangaceiros. Ao saberem do que estava ocorrendo no cemitério, os habitantes do povoado ficaram surpresos com tamanho absurdo e tomados de medo, pois os invasores eram conhecidamente desordeiros sem escrúpulos e respeito, chegando ao ponto de entrarem no cemitério cantando e dizendo palavrões. Se para 136 os desconhecidos o fato era estarrecedor, imaginem para a família do morto; para um filho que ama e admira a figura destemida e respeitada do pai, seu único amigo real e ídolo. Ma. noel Batista de Morais, filho de Batistão, contava naquele tempo 21 anos de idade. Nascido no dia 2 de novembro de 1875, era forte e destemido como o pai, rapaz pacato e moderado em seus atos, porém aquilo era demais. Encontrava-se em casa com as irmãs quando soube do festival funéreo. Sentiu-se profundamente ofendido e resolveu tirar a limpo a desonra de ver seu pai morto injustamente e ainda por cima ultrajado. Armou-se e dirigiu-se ao cemitério para protestar a falta de respeito ao seu genitor falecido. Foi também insultado com garagalhadas e impropérios. Enfurecido, reagiu sozinho. Depois da troca de tiros, ficaram três mortos dentro do cemitério, entre esses um chamava-se João Rosa e outro Manoel Cabaceira. Os demais fugiram com alguns feridos, em desabalada carreira para dar a notícia em Afogados da Ingazeira. Manoel Batista de Morais saiu sem ferimentos e até aquele dia a família Morais jamais havia brigado. Começou aí a odisseia de Manoel e seus irmãos, conhecidos como homens pacatos, trabalhadores, de porte alto, alvos, robustos, de cabelos castanhos e olhos azuis, bons dançarinos, disputados pelas moças. BATISTINHA TORNA-SE CANGACEIRO Manoel Batista de Morais, conhecido também como Batistinha ou Nezinho, depois daquele encontro no cemitério com os capangas dos inimigos de seu pai, perdeu o sossego. Começaram as perseguições; era caçado como animal selvagem, assim também como o resto da família Morais. As arbitrariedades chegaram a tal ponto que Batistinha e Zeferino, seu irmão, juraram vingança, mesmo que fossem obrigados a morrer lutando para acabar com tal estado de coisas. E foi em face desses acontecimentos que, contra sua própria vontade, ou talvez seguindo as estradas do seu destino, Batistinha ingressou no cangaço, conforme dizia em conversas aos seus amigos. Cangaceiro ou bandido era como o denominavam alguns, no entanto ele classificava-se como Vingador ou Justiceiro e ainda Governador do Sertão. 137 FAMÍLIA DE BATISTÃO A família do senhor Pedro Batista de Morais e dona Balbina era constituída dos seguintes filhos: Zeferino, Manoel (ou Batistinha - - o famoso António Silvino), Gino, Olegário e Francisco; Ana, Antônia, Belarmina, Cândida, Doninha, Donana e Rita, num total de doze. Entre suas tias e irmãs, Rita era a mais destemida. Não se negava a prestar qualquer ajuda a seu irmão e protestava todas as injustiças de público, praticadas contra ele. Certa vez, a polícia desconfiou que ele estava na casa de sua irmã Rita. Marcharam para lá, encontrando-a preparando um verdadeiro banquete. Quando interpelada, disse: — "Estava preparando um almoço para meu querido irmão e camaradas mas, infelizmente, a presença de vocês nos privou desse encontro maravilhoso. Alguém avisou-nos e pedilhe para ir embora. Faço tudo por ele e me sinto mal com a presença de vocês em nossas propriedades. Façam o favor de retirar-se". QUATRO IRMÃOS MORTOS POR TRAIÇÃO Todavia, a onda de violência não estacionou, muito pelo contrário, seguia seu ritmo crescente. Os inimigos dos Morais queriam de qualquer modo vingar a morte dos três desordeiros no cemitério, Batistinha havia desaparecido com o Zeferino. O ódio e a vingança, pesavam sobre todos os membros da família que encontravam-se no lugar. As autoridades, especialmente a polícia, que nenhuma providência tomara quando da morte de Batistão, agora estavam contra os Morais, facilitando para seus inimigos agirem como bem quisessem. O pensamento deles era eliminar toda a família. Inicialmente, contrataram dois pistoleiros de fama comprovada — Manoel e António Gato — para matar Gino. O trabalho miserável foi realizado de emboscada e o cadáver foi encontrado depois de alguns dias, dentro de uma cacimba, causando tristeza e revolta diante de tanta injustiça. Insatisfeitos, em seguida prepararam uma cilada para exterminar o resto da família que encontrava-se no Pajeú. Organizaram uma "festinha" em Teixeira, na Paraíba. Planejaram tão bem que, por intermédio de pessoas que se diziam amigas dos Morais, conseguiram a vinda de três componentes da família: Olegário, Belarmina e Doninha. Morreram todos os três envenenados com vinho, em casa de pessoas que julga138 vam poder confiar. Mais uma vez, as autoridades não tomaram a mínima providência. REVOLTA DA FAMÍLIA O resto da família, em desespero por tanta injustiça, não confiava mais em ninguém e se afastou de quase todo mundo. O ódio e a sede de vingança aumentaram assustadoramente no cérebro já conturbado de Batistinha que, desesperado, uniu-se a Silvino Aires — homem mais farnoso da época, conhecido como valente e chefe de cangaceiros, no momento com inimizade com os Dantas do Teixeira, da Paraíba — família rica, tradicional, de políticos e destemidos. E foi neste estado d'alma que, sob o comando de Silvino Aires de Alencar, visualizou-se a possibilidade de um revide à chacina por envenenamento de seus queridos irmãos no Teixeira. Invadiram o lugar dos Dantas, cometendo verdadeiros absurdos: depredações, incêndios e crimes de morte. MUDOU DE NOME Depois desses acontecimentos em Teixeira, o Batistinha tornou-se grande admirador de Silvino Aires, passando inclusive a usar o nome de António Silvino, para homenagear o companheiro, seu ídolo, e também para despistar a polícia e seus inimigos. Daí por diante denominava-se Manoel Batista ou Batistinha, apenas entre os familiares. Silvino Aires de Alencar, chefe do grupo, caiu morto em um combate que teve com o tenente Luis Mansidão no Estado da Paraíba, no ano de 1900, data em que Manoel Batista de Morais mudou o nome para António Silvino e assumindo o chefe do grupo. Naquele mesmo ano, os habitantes do Pajeú já sentiamse aterrorizados em virtude do perigo que os ameaçava, o ódio e a sede de vingança de António Silvino. Agora eram testemunhas das façanhas daquele jovem revoltado que eles mesmos haviam criado tempos atrás. Neste período, António Silvino comandava um grupo de cangaceiros, todos injustiçados e com todo empenho em vin. gar-se dos seus inimigos. Os soldados eram poucos nas cidades e vilas e já não tinham condições de enfrentar tão temeroso grupo. 139 UM DOS PRIMEIROS ENCONTROS COM A POLÍCIA O governo, atendendo a solicitações da alguns prefeitos e fazendeiros, destacou tenentes comandantes de tropas para o sertão, no propósito de prender ou matar António Silvino. Um dos primeiros encontros que teve repercussão nacional foi com o capitão José Augusto, comandando mais de 30 soldados. Após cinco horas de luta, os cangaceiros estrategicamente foram saindo de mansinho, enquanto os soldados ficaram brigando sozinhos, uns contra os outros, espalhados na caatinga. Era noite. Todavia, era uma "caçada" muito perigosa. Quase sempre caíam em emboscadas, sem o mínimo perigo para os cangaceiros que os esperavam de tocaia. Além do mais, não havia estradas e os proprietários das fazendas só possuíam duas opções: ser amigo do Capitão António Silvino (como já era chamado) e ter direito de permanecer em paz no lugar, ou ser inimigo, perdendo tudo e fugindo para as grandes cidades. A maioria deles, como era de se esperar, ficaram seus amigos, e assim o Capitão imperou durante mais ou menos quatorze anos, no norte do Estado de Pernambuco e sul do Estado da Paraíba, ou seja, do litoral até o médio sertão, cobrindo toda a área do agreste. Apesar de suas andanças no Estado do Ceará e Rio Grande do Norte terem sido menores, não deixou de haver repercussão quando passava naqueles dois Estados. Contam que, já considerado pelo povo como Governador do Sertão, foi recebido no Rio Grande do Norte com banda de música, foguetes, tomou cerveja e conferenciou com políticos e demais autoridades da época e, até um bilhar foi reservado para o capitão passar algumas horas de lazer. A FAMÍLIA RAMOS QUEBROU COMPROMISSO Francisco Batista de Morais, único filho de Batistão que não saiu do vale do Pajeú, e que não se envolvera em crimes, apesar das perseguições, atendendo ao pedido do seu irmão António Silvino para tomar conta das fazendas, irmãs e tias, nunca deixou de realizar seus negócios em Afogados da Ingazeira. Procurava ser sempre precavido, levando alguns trabalhadores como guarda-costas e regressando assim que concluía suas compras, sem deixar "brechas" para quem quer que fosse. 140 Os inimigos dos Morais, já receosos e esperando a qualquer momento uma represália de António Silvino, propuseram um acordo para que Francisco Morais não viesse em Afogados, enquanto os Ramos não poriam os pés em Espírito Santo (hoje Tabira), onde Francisco Morais deveria fazer suas compras e resolver seus negócios. O irmão de António Silvino cumpriu o que haviam combinado, porém, certo dia, Manoel Ramos foi ao povoado Espírito Santo e Francisco Morais o eliminou com um punhal, no meio da rua. Não reagiu à prisão e esperou a resolução da justiça. Não queria ser cangaceiro, havia assumido o compromisso com o irmão de cuidar das propriedades e do resto da família. Era comentário geral que Francisco ou seria condenado a muitos anos de prisão ou morto. Não se falava noutra coisa. O chefe político da época era responsável inclusive por tudo que acontecia, até pelos estragos feitos nas propriedades dos Morais. Já haviam incendiado por duas vezes a fazenda Jasmim. António Silvino, considerado o terror da região, sabendo do que se passava com seu adorado irmão que sempre acatara suas determinações, apareceu no Pajeú para confirmações de uns e surpresa e medo de outros. O Capitão António Silvino surgiu na frente do Coronel chefe político da região dizendo: — "Não tenha medo, Coronel. Não vim lhe matar agora, porém se o meu irmão for morto ou pelo menos condenado, lhe sangrarei como se faz com um bode". O Coronel sentiu-se apavorado e desprotegido naquela hora, e até agradeceu ao Capitão tê-lo deixado vivo. Houve o julgamento e o réu foi absolvido e solto por unanimidade de votos. Regressou para a fazenda onde faleceu de idade avançada, embora as perseguições só tenham cessado quando o Capitão entregou-se no ano de 1914. Severino Manoel das Mercês, cavalariano, conhecido na região de Palmares como Severino da Cabeça Branca, nasceu no dia 05 de novembro de 1895, na fazenda Vargem Verde, naquele tempo encravada no município de Limoeiro, atual-mente no município de Passira. Filho de Manoel Vicente de Santana Borba (grande amigo do Capitão) e de Eleonora Ana das Mercês. Continua sendo proprietário da mesma fazenda. 141 Genro do Sr. Francisco Alexandre do Nascimento, proprietário do sítio Pedra da Cinta, naquele tempo município de Bom Jardim, e atualmente tem o nome de CAIAÍ. Este era também amigo do Capitão. Foi dele as informações seguintes das escaramuças do Capitão António Silvino. 142 Demonstração da vigilância utilizada pelo Capitão António Silvino, onde podemos ver um dos seus em posição estratégica, enquanto os companheiros repousavam. Severino Manoel das Mercês, caválariano, conheci na região de Palmares como Severino da Cabeça Branca. Nascido no dia 05 de novembro de 1895, na fazenda Vargem Verde, naquele tempo encravada no município de Limoeiro, atualmente no município de Passira. Filho de Manoel Vicente de Santana Borba (grande amigo do Capitão) e de Eleonora Ana das Mercês. Continua sendo proprietário da mesma fazenda. Genro do Sr. Francisco Alexandre do Nascimento, proprietário do sítio Pedra da Cinta, naquele tempo município de Bom Jardim, e atualmente tem o nome de CAIAI. Este era também amigo do Capitão. Foram dele as informações das escaramuças do Capitão António Silvino, narradas a partir do título " Cangaceiros mansos". CAPÍTULO VIU ASSASSINATO DE ZEFERINO Zeferino era tão valente quanto o seu irmão. Nas opoitunidades em que atuavam juntos, julgavam-se invencíveis, aumentando assim o ciclo de inimizades contra os dois. Partindo daí seus inimigos arquitetaram um plano que demorou muito tempo para ser realizado com êxito. Conseguiram que Zeferino confiasse num suposto amigo pistoleiro, muito perigoso, de nome Pedro Rosa que traiçoeiramente o assassinou. Mais uma vez a revolta de António Silvino recebia impulso. Portanto, redobrou suas precauções e desconfianças, apesar de possuir muitos amigos entre os fazendeiros. Os tenentes que mais perseguiram António Silvino, foram Chico Tolentino, Pedro Malta, Frederico, José Caetano, Zacarias Neves, Maurício (morto em combate com o Capitão, no município de Batalhão, hoje Taperoá, na Paraíba), Teófanes Torres e muitos outros. Entre os cangaceiros que fizeram parte do grupo do Capitão António Silvino, levando uma vida de crimes e incertezas por muito tempo, nos Estados do Ceará, Paraíba e Pernambuco, citamos: Cocada, Carcará, Salvino, Biano, Pilão Deitado, Cobra Verde, Criança, Munguzá, Chico da Banda, António Félix (foi chefe do grupo por pouco tempo, morto no município de Canhotinho, numa emboscada), Borboleta, Ventania, Tempestade, Jararaca e vários outros. (Salientamos que o Jararaca de Lampião foi outro). MORTE DE ANTÓNIO ROSA E SEUS CANGACEIROS Muitas tentativas foram feitas para exterminar o famoso Capitão, sem no entanto lograr êxito. Dizem que em certa ocasião a família Pessoa, da Paraíba, preparou uma cilada com o maior zelo para matar ou 143 prender todos os cangaceiros. Acontece que nessa época, encontrava-se com o Capitão António Silvino o seu colega chamado António Rosa e seu grupo. António Silvino, desconfiando de uma possível emboscada, não atendeu a um convite, alertando ao seu colega de sua desconfiança. António Rosa porém, menos precavido, seguiu com seu grupo para onde os esperavam dezenas de soldados. Morreram todos, inclusive o chefe. Com a finalidade de evitar perseguições aos seus parentes, António Silvino afastou-se do vale do Pajeú por muito tempo, passando a viver no Agreste. Escolheu para o seu reinado, uma região que iniciava no litoral indo até Caruaru, chegando ao município de Escada onde certa vez, no Engenho Jundiá, em um tiroteio, morreu uma professora de nacionalidade francesa, que lecionava para a família Santos Dias, grandes proprietários de cana-de.açúcar. Os municípios mais atingidos pelo cangaceiro, naquela época, foram: Timbaúba, Nazaré da Mata, Limoeiro, Bom Jardim e Taquaritinga, onde terminou seu rosário de .crimes e vinganças contra os milhares de inimigos que possuía. JULGAVA-SE SENHOR DA REGIÃO À medida que o tempo ia passando, aumentava o temor que se tinha do Capitão, devido às medidas enérgicas que tomava contra aqueles que julgava errados. Nos povoados e pequenas cidades, não se cobrava impostos, não construíam estradas nem instalavam linhas telegráficas . O Capitão António Silvino não gostava e nem permitia ser fotografado, apesar de seu tipo atlético, de jovem bonito que encantava as mulheres por onde passava. Comentam que fora conquistado ou conquistara o grande amor de sua vida, uma jovem formosa e educada, filha de gente da alta sociedade de então. Desta união surgiram filhos para os quais desejava um futuro brilhante, diferente de sua vida tão sem sossego. Sua amada criou os filhos com amor e dedicação, dando-lhes o sobrenome do pai. António Silvino julgava-se senhor absoluto de toda aquela região, onde implantou sua lei. Os fazendeiros eram obrigados a fornecer dinheiro, roupas, alpercatas de camurça ou peles bem flexíveis, para não fazerem calos quando das grandes caminhadas forçadas pela polícia, nas horas em que não dispunham de cavalos. Forneciam ainda munições, armas 144 e até perfumes e baralhos para jogarem nos momentos em que os soldados os esqueciam um pouco. Quando faziam compras de objeíos para o Capitão, os fazendeiros não queriam receber nenhum dinheiro em troca. Quando ele chegava numa cidade em que os ricaços eram seus inimigos, pegava todo o dinheiro de níquel e cobre, assim também os géneros alimentícios e cortes de fazenda, levava para a frente da igreja e distribuía com os pobres e necessitados. HAVIA MOMENTOS EM QUE CHORAVA Entre tantos sonhos de sua vida, possuía o de ser um grande criador de gado, numa fazenda organizada. Com essa esperança, possuía suas reses espalhadas pelo Sertão e Agreste da Paraíba e Pernambuco, sob os cuidados de seus amigos, donos de propriedades. Acontecia até um fato interessante, digno de nota: seus rebanhos eram sempre bem protegidos. Nunca morria uma rês, não adoeciam, as cobras não picavam-nas e muito menos eram roubadas. Os acidentes ocorriam mais para os animais dos fazendeiros donos das terras. Não gastava um tostão com vaqueiros e poucas pessoas sabiam que ele possuía tanto gado. Porém, não podia realizar seu sonho que era juntar tudo em um só lugar. Quando ocultava-se em casa de amigos, saboreava com emoção a tranquilidade de viver em liberdade, direito que havia perdido por culpa dos outros. Nesses instantes brotavamlhe as lágrimas do mais íntimo do seu ser. Às vezes, porém, recordava o passado com rancor e transformava-se num monstro que atemorizava até seus companheiros de luta. Não era muito religioso, mas respeitava padres, seminaristas, mulheres casadas, moças donzelas e crianças, a não ser que fossem delatores. A esses ele castigava. Era supersticioso e qualquer coisa o fazia desconfiar, mudar de rumo ou ideia. Suas precauções em excesso, por muitas vezes o salvaram da morte em emboscadas ou por envenenamento. O QUE CONTAVAM A SEU RESPEITO A simplicidade e inocência dos matutos o transformaram num super-homem. Adivinhava e possuía o dom de transformar-se no que bem quisesse: carneiro, cabra, jumento, toco de madeira, cupim e, ainda por cima, transformava tantos 145 cangaceiros quanto estivessem em sua companhia. Era só rezar a "Oração da Cabra Preta". Comentam que em certa ocasião o Capitão António Silvino viu um tenente com uma tropa a sua procura. Imediatamente, transformou-se com o seu grupo em vários tocos de madeira. Todavia, entre a tropa de soldados, vinha um que também sabia a oração tão famosa. Aproximou-se do toco, que sabia ser António Silvino e dando-lhe uma boa "mijada", disse-lhe baixinho: -- "Eu também sei da oração, de mim você não se esconde. Mas não é nestas condições que vamos lhe pegar. Nos encontraremos noutra oportunidade". Em seguida juntou-se aos seus e seguiu caminho. Muitas histórias de António Silvino, fantasiadas pelos repentistas e contadores de estórias, deixaram de existir depois que as façanhas de Lampião surgiram, superando-as. A única solução para os fazendeiros daquele tempo não saírem de suas propriedades, era ser amigo dos cangaceiros. Não havia meio de comunicação além do portador a pé ou montado num animal. As autoridades não possuíam condições para garantir a integridade das famílias sertanejas. Os matutos não dispunham de recursos para morar nas cidades. Evidentemente, só tinham duas opções: ser amigo do Capitão e seus cangaceiros e viverem atemorizados, apreensivos com a ação da polícia que cometia verdadeiros absurdos e os taxava de Coiteiros; caso informassem aos soldados, recebiam o castigo dos cangaceiros, que muitas vezes chegavam a verdadeiros extremos. Portanto, os habitantes das fazendas e pequenos povoados onde os cangaceiros atuavam, viviam em verdadeiro pânico. Pelas vestimentas não se reconheciam as tropas, pois muitas vezes os cangaceiros andavam com a farda da polícia, assim também os soldados vestiam indumentárias usadas pelos participantes do grupo de António Silvino. Os matutos ficavam na dúvida e ocasionalmente prestavam informações erradas. COMO VIVIA O CAPITÃO ANTÓNIO SILVINO Procurar António Silvino dentro da caatinga era tarefa muito difícil. Poucos se atreviam a enfrentar as dificuldades do Sertão e Agreste daquele tempo, expondo-se às emboscadas e estratégias do Capitão que era conhecedor de todos 09 labirintos das terras desabitadas, onde formava seus escon146 derijos. Somente homens da mesma têmpera do Capitão se atreviam a esta aventura. Um dos valentes que António Silvino encontrou foi o subdelegado Francisco Braz, que o deixou ferido em certo combate, embora tenha falecido no cumprimento do dever. Certa ocasião, disfarçado em suas vestimentas, passando na casa de uma senhora viúva, mãe de duas filhas moças, perguntou se as mesmas sabiam alguma notícia de António Silvíno. A dona da casa sem imaginar o perigo a que se expunha, respondeu que António Silvíno era um bandido desonrador, assassino, ladrão e amaldiçoado. Tão empolgada estava em suas acusações que não percebeu a oportunidade dada pelo Capitão, que lhe perguntou: - - A senhora, por acaso, já viu esse António Silvino? Ao que ela respondeu: — Não senhor, mas tenho certeza que ele é tudo que falei e mais algumas coisa! Uma das filhas pressentindo a difícil situação, tentou apelar para sua mãe mudar de ideia, alegando que elas nunca sofreram nada e nem sequer conheciam o Capitão ou seus motivos para agir de semelhante maneira. A viúva no entanto, por inocência ou por ignorância, continuou sustentando o pensamento a respeito daquele homem. António Silvino, já um pouco irritado, insistiu: —Quer dizer que ele é tudo isso e mais alguma coisa do que disse? E ela: —É, e peço a Deus que os soldados o matem o mais depressa possível, e que ele vá para o inferno! O Capitão no auge de sua cólera, sentindo-se injustiçado, soltou um grito para surpresa das pobres mulheres, surgindo nesse momento, por trás de uma cerca, vários cangaceiros. Ele fitando-a com ira, falou: — "Eu sou o António Silvino e vou dar-lhe uma lição, sua velha linguaruda, para nunca mais você falar mal da vida de ninguém, especialmente de quem não conhece"! No terreiro da casa havia um pé de mandacaru e o Capitão ordenou que o cangaceiro Cocada sustentasse a mulher pelas mãos com firmeza, ficando o pé de espinho entre eles. Quando ambos se encontravam nessa posição. O Capitão disse: — Agora, quem tiver mais força defenda-se dos espinhos! Em seguida, o Cocada puxou a pobre mulher contra os espinhos umas três vezes, deixando-a sangrando do rosto até os joelhos. Enquanto isso, uma das moças chorava dizendo em voz alta: "Eu bem que disse a mamãe para não falar do Capitão que nunca nos ofendeu". "Tenha piedade, deixe ela viva". Antô147 nio Silvino atendeu por ter ficado com raram, o chefe fez mem, teria cortado ao pedido e a mulher agradeceu de joelhos vida, pedindo até perdão. Quando se retio seguinte comentário: "Se fosse um hoa língua". CANGACEIROS MANSOS No auge de sua odisseia, o Capitão organizou um grupo de companheiros que lhe foi muito eficiente. Classificou-os de cangaceiros mansos. Esses homens eram praticamente forçados a assumir compromisso com o Capitão, uma vez que necessitavam ter trânsito livre e manter suas atividades normais. Entre eles encontravam-se almocreves, vaqueiros, compradores de gado e até caixeiros-viajantes. Por intermédio deles o chefe sabia de todos os movimentos da polícia, que nunca conseguia pegá-lo de surpresa, pois ele, ciente de tudo, fugia para outros lugares ou preparava uma emboscada com todas as possibilidades de êxito. Os cangaceiros mansos, que de tudo sabiam, permaneciam de "bico calado" para não atrapalhar suas negociações e muito menos as estratégias do misterioso cangaceiro que adivinhava por onde os tenentes passariam com suas tropas. Um dos oficiais da polícia mudou o rumo que deveria seguir à procura dos cangaceiros e, para surpresa dos dois grupos, encontraram-se quando julgavam estar em rumos opostos. Nesse encontro morreram alguns companheiros de António Silvino. Este, todavia, desconfiou da informação do seu cangaceiro manso, de nome Manoel Fortunato, o qual retirouse imediatamente para o Recife, depois do apelo comovedor do seu sogro José Possidônio ao Capitão, para deixar o pai de seus netos vivo, prometendo que jamais ele poria os pés naquelas terras. Contam também que dois vizinhos, proprietários de terras e amigos do Capitão, se desentenderam por motivos de rumos de terras e não havia jeito de chegarem a um acordo. A situação a cada dia se complicava mais e os familiares já se preparavam para um choque de graves consequências, quando um outro fazendeiro amigo resolveu pedir a António Silvino para solucionar aquele problema pacificamente. O Capitão, ciente do que estava acontecendo, prontificou-se a agir como se fosse uma autoridade constituída. Ordenou que o amigo intermediário conseguisse um agrimensor e que os dois brigões, e todos os familiares em questão, se encontrassem num determinado dia e hora no lugar litigioso, sem 148 saberem com certeza o que ia ser feito. Tudo aconteceu conforme determinara o juiz bandoleiro, e no dia marcado António Silvino e vários companheiros chegaram no local com a fisionomia "fechada". Cumprimentou a todos com um bom dia e foi logo perguntando aos proprietários onde era o rumo certo. Cada qual indicou um ponto diferente. Ele, sem nenhum comentário mandou o agrimensor, bastante apreensivo e temeroso com sua missão, medir a distância entre os dois pontos indicados. Em seguida, ordenou que fosse posta a baliza no meio, dividindo pela metade a área em litígio. Mandou colocar também uma pedra servindo de marco. Feito isso, disse ele: "O rumo certo é aqui. Pode fazer a linha divisória. Há alguma objeção por parte das duas famílias?". O silêncio foi completo, o trabalho foi executado, as famílias se reconciliaram e as pedras criaram lodo no lugar. SOU APENAS UM JUSTICEIRO Um pernambucano de Palmares, paupérrimo, porém muito esperto e com tendências de poderio, foi residir na Paraíba e conseguiu ser fornecedor de dormentes à Great Western. Ganhou com isso muito dinheiro e comprou um engenho denominado BURACO. Mudou o nome da propriedade para engenho Nossa Senhora da Conceição, construiu um sobrado, instalou várias casas comerciais e tornou-se o "poderoso" do lugar, atemorizando os habitantes e conhecidos. António Silvino conhecendo seu rigor contra aquele povo, invadiu suas casas comerciais, propriedades e distribuiu com todos os pobres o estoque completo de mercadorias e dinheiro. Na cidade de Pilar na Paraíba, António Silvino foi à casa do comerciante Pio Napoleão e mandou que ele abrisse o cofre onde guardava quarenta contos de réis. Retirou apenas duzentos mil réis que precisava, e disse: "Caso fosse ladrão levaria toda sua fortuna, mas sou apenas um justiceiro". O pobre homem agradeceu, ficando muito surpreso com a atitude. Segundo pesquisas feitas pelo historiador Mário Souto Maior, certa ocasião António Silvino, julgando-se Governador do Sertão, passou um telegrama ao Governador do Estado da Paraíba, Dr. Castro Pinto, usando os seguintes termos: "Governador bandido. Não precisa reunir quatro Estados para perseguir-me, pois garanto que de dois não saio, fazendo perseguição ao seu governo. Dr. Massa (chefe de polícia), toda perseguição que me fizer vingarei em sua família. Dr. José 149 Rodrigues (Secretário do Governo), pise milho, cesse massa e dê a esse pinto que o mal dele é fome". Assinado: António Silvino de Morais. Nessa época havia mais ou menos quinhentos soldados, empenhados em eliminar o Capitão que contava com um grupo de mais ou menos quinze homens, além de seus cangaceiros mansos. VISITA À FAZENDA MANSO — MUNICÍPIO DE TAQUARITINGA Como já foi dito, os fazendeiros e proprietários na época dos cangaceiros não distinguiam as forças volantes ou os homens do Capitão António Silvino pelas vestimentas, quando surgiam em suas terras. Os habitantes viviam preocupados na maneira como se conduzirem, pois tanto os soldados andavam disfarçados de cangaceiros com suas indumentárias características, como também os cangaceiros usavam a mesma tática, andando fardados, semelhantes aos militares. Ainda por cima usavam também distintivos: O Capitão com a farda de Coronel, seu imediato com farda de Tenente, Sargento, Cabo e vários soldados. Contam que foi nessas condições que António Silvino fez uma visita ao Dr. Joaquim Guerra, nos meados de 1910, proprietário da fazenda Manso, naquele tempo pertencente ao município de Taquaritinga. Esta fazenda passou a pertencer ao Dr. José Gaião em 1916, e atualmente faz parte do espólio do ex-Governador e Senador Dr. Paulo Pessoa Guerra. Chegando na fazenda, deixou sua tropa sob o comando de seu imediato (tenente), pediu licença e subiu para falar com o dono do local, no terraço da Casa Grande. Cumprimentou-o com todo o respeito e solicitou dinheiro para alimentar sua tropa de "soldados", identificando-se como paraibano à procura de cangaceiros -- assunto principal daquela época. O fazendeiro atendeu o pedido do suposto militar, ofereceu almoço e pousada para todos, embora sabendo que o viajante era António Silvino. O mesmo agradeceu o almoço e o descanso saindo em seguida, justificando que tinha pressa. A visita do Capitão António Silvino ao Dr. Joaquim Guerra na fazenda Manso foi quase idêntica à visita que fez ao Dr. José Gaião no engenho Palma, pertencente ao município de Bom Jardim. Atualmente é de propriedade do Dr. Enio Pessoa Guerra, neto do Dr. José Gaião. Contam que para o Dr. José Gaião ele identificou-se como cangaceiro usan150 do farda de Coronel e pedindo cento e cinquenta mil réis, lamentando-se que estava sendo muito perseguido pela polícia e se encontrava em dificuldades financeiras. SUAS BOAS AÇÕES Em suas jornadas o Capitão passou por um pequeno povoado no município de Bom Jardim e deparou-se com um pequeno cemitério, cercado apenas de arame farpado, onde haviam, no dia anterior, sepultado o cadáver de uma criança numa cova rasa e, naquele momento, uns cachorros estavam comendo o braço do pequenino defunto. O Capitão presenciando aquele quadro triste, parou no lugar, mandou chamar todos os habitantes a sua presença e, muito zangado com a falta de respeito ao ser humano, ordenou que se construísse um cemitério com paredes de tijolos, todo rebocado, com portão de ferro e cadeado, determinando um curto prazo para a construção do mesmo, avisando que voltaria e, caso não encontrasse como determinara, aplicaria sua lei para os faltosos No prazo determinado o Capitão apareceu no lugar, e lá estava o cemitério construído. Agradeceu a todos e disse ainda: Fiquem descansados que não mais passarei aqui. O Capitão António Silvino mandou também construir o cemitério de Malhadinha, nas margens do rio Capibaribe. Outro caso muito comentado foi o de um homem que não podia trabalhar porque sofria de um desvio da coluna Sentia-se muito triste e envergonhado ao pedir esmolas. Di. zia ele que se possuísse dois jumentos, arranjaria um garoto e abasteceria o povoado d'água, apenas administrando seus animais, que viveria condignamente e seria útil para os seus vizinhos. Procurou alguns fazendeiros, expondo seu pensamento na esperança de um deles doar ou vender-lhe fiado os dois jericos. As respostas eram sempre desanimadoras. Certo dia, alguém disse-lhe que o seu caso só poderia ser resolvido pelo Capitão António Silvino — comentando em tom de brincadeira. O aleijado porém, levou em conta as palavras que ouvira e aproveitando uma oportunidade contou sua história ao Capitão, que sem nenhuma objeção redigiu de próprio punho um bilhete para o senhor Álvaro Timóteo, proprietário abastado do município de Taquaritinga, mandando entregar dois animais encangalhados com caçambas para o serviço de abastecimento. O doente de posse dos animais cumpriu o que havia planejado, servindo seu povoado Serrinha da 151 Cachoeira e agradecido pelo ato digno do "Governador do Sertão", daquela época. FAZIA JUSTIÇA ATÉ COM OS SEUS Havia época em que a polícia perseguia com mais intensidade os cangaceiros. Isto ocorria dependendo do Chefe de Polícia ou do Governador daquela época. Numa temporada dessas, em que os soldados desenvolviam uma luta sem trégua contra os homens do Capitão, os mesmos eram obrigados a fazer longas caminhadas, tendo muitas vezes que abandonar os cavalos e andar quilómetros e quilómetros a pé, atravessando os maiores labirintos, das caatingas nordestinas. Ocultavam-se durante o dia, e durante a noite percorriam grandes distâncias. Em uma dessas jornadas, chegou a uma casa encontrando apenas a mulher sem a companhia do esposo que havia viajado. Moravam no município de Taquaritinga, próximo aos limites da Paraíba. Com um grupo aproximou-se da casa, enquanto os cangaceiros escondiam-se debaixo de um umbuzeiro aguardando o chamado. O Capitão pediu alimento e a dona da casa prontificou-se a atendê-los, solicitando que esperassem enquanto ela guisava uma galinha. Quando a comida, preparada às pressas, estava pronta, fora servida, a qual saborearam com gulodice devido à fome dos últimos dias. De repente, um dos "cabras" disse que a galinha não estava melhor porque a cozinheira esquecera de botar sal. A mulher a esta altura, tremendo de medo, sentiuse completamente perdida, julgando que iria morrer naquele instante. Jogou-se de joelhos no chão, e abraçando as pernas do Capitão, implorou perdão alegando esquecimento. Ele a suspendeu, dizendo: — "A senhora não vai sofrer nada; a comida está ótima. A senhora tem sal em casa?". A mulher respondeu: Tenho quase um saco de cinquenta quilos, Capitão. Não sei como fui esquecer, O chefe dos cangaceiros, já de fisionomia "carregada", ordenou que ela fosse buscar um quilo de sal e uma vasilha contendo certa quantidade de água. Dissolveu o sal, enquanto todos esperavam apreensivos. Com uma rapidez inesperada António Silvino tomou as armas do cangaceiro indiscreto, dizendo: - "Você agora vai engolir todo este sal para aprender a ficar calado em certas ocasiões". O infeliz homem depois 152 de ingerir certa quantidade, já sem ação, seguiu em frente do seu chefe por uma vereda e todos os acompanharam. O Capitão agradeceu mais uma vez, pediu desculpas e deixou o seguinte recado: "Diga a seu esposo que faça o enterro desse meu ex-companheiro, pois tenho pressa e não posso demorar". Instantes depois a dona da casa ouviu o estampido de um tiro. No dia seguinte o seu marido sepultou o cadáver, que tinha uma perfuração no meio da testa. Medida tão drástica seria apenas pelo alimento sem sal ou pela somação de outros inconvenientes? Segundo comentários dos fazendeiros daquela época, ele possuía inimigos dentro do seu grupo. NÃO ACEITAVA A DENOMINAÇÃO DE BANDIDO Naquela época, em que o Capitão António Silvino imperava no agreste como "Governador do Sertão" e "protetor dos pobres", o senhor Pedro Limeira era grande comprador de algodão na região e criador de gado na fazenda Barreira Queimada, situada no município de Caruaru, onde existia um motor potente com capacidade de fornecer luz à fazenda e descaroçar algodão em grande quantidade. O negociante e fazendeiro era um dos inimigos do Capitão que não se omitia de classificá-lo de bandido e salteador. António Silvino para arranjar um pretexto a fim de saber se o fazendeiro era ou não seu inimigo, mandou um portador com um recado, pedindo certa importância em dinheiro. Esse não foi atendido e ainda teve a confirmação do que lhe falaram, pôs o senhor Limeira de fato era seu inimigo e não fazia segredo de que não media esforços para prendê-lo ou matá-lo. Sabendo dessa notícia o Capitão, irritadíssimo, invadiu a fazenda Barreira Queimada acompanhado do seu grupo, no propósito de exterminar o proprietário e queimar tudo que houvesse no lugar. Porém, foi informado pelos moradores que o patrão se encontrava na cidade de Caruaru, juntamente com a família. António Silvino falou aos trabalhadores que tinha vindo a fim de matar o dono da fazenda, mas como não o encontrara, iria deixar uma lembrança para ele ter razão de chamá-lo de "bandido", pois sabia que ele vivia falando dele injustamente sem nunca ter sofrido nada. Em seguida, obrigou aos próprios trabalhadores incendiar todo o algodão que estava estocado nos armazéns e os 153 cercados de pastagens. Embora os moradores se encontrassem em pânico, não maltratou a nenhum, e disse ainda: — "Digam a seu patrão que não inutilizei o motor porque serve para vocês, e se ele continuar a me maltratar voltarei numa oportunidade em que possa encontrá-lo, pois desta vez a viagem considero perdida". Tirou uma bala da cartucheira, mostrou aos seus moradores dizendo: Com esta eu ia matá-lo, mas como não o encontrei, vou gastar a bala e, atirou na testa do melhor touro da fazenda. No outro dia, o senhor Limeira chegou à fazenda acompanhado da polícia e vários amigos bem armados, encontrando um quadro desolador. No entanto, tudo isso de nada adiantou, uma vez que os cangaceiros estavam bem distantes e a fazenda arrasada. Dentro de poucos dias a fazenda estava recuperada, e por falta de garantias o senhor Limeira passou a residir definitivamente em Caruaru. Deixou de maltratar o Capitão e este nunca mais voltou ao lugar. A VALENTIA DO INSPETOR ANTÓNIO NICÁCIO VIROU HISTÓRIA Em Trapiá, pequeno povoado às margens do rio Capibaribe, pertencente ao município de Caruaru e que atualmente pertence ao município de Riacho das Almas, havia missa todos os meses, como também casamentos e batizados celebrados por um padre que vinha a cavalo da cidade de Caruaru. Naquelas oportunidades, o lugarejo ficava com aspecto de festa. Numa dessas ocasiões, sem ninguém esperar, chegou o Capitão António Silvino cavalgando um bonito cavalo. O Capitão havia deixado seus companheiros escondidos debaixo dê umas moitas, na margem do rio a pouca distância dali. O Capitão não queria que o povo ficasse em pânico ou abandonasse as festividades, pois tinha vindo com espírito festivo. Contam que quando o Capitão desmontou do cavalo, o senhor António Nicácio, inspetor de quarteirão, reconheceu o homem "fora-da. lei", e munido de punhal e garrucha interpelou o recémchegado para confirmar: — "Você é António Silvino?", ouvindo a resposta afirmativa com um gracejo: "Pronto para servi-lo". O inspetor, rapidamente usando a sua pistola, atirou em direção ao peito do Capitão, indo o tiro atingir a parede de uma casa. Quase ao mesmo tempo o Capitão, usando seu rifle, errou também. Estavam tão próximos um do outro que 154 não foi possível usar armas de fogo. Logo depois, resolveram utilizar os punhais. Foi uma luta tremenda, resultando a mesma na morte do inspetor e vários ferimentos no seu adversário. Os cangaceiros que haviam ficado escondidos, ouvindo os tiros, apro. ximaram-se para ajudar seu chefe, porém quando chegaram no local não encontraram mais ninguém, inclusive o padre, noivos e pais dos recém-nascidos haviam desaparecido. Apenas dois matutos vendedores de farinha permaneceram juntos de sua mercadoria. Os cangaceiros enfurecidos assassinaram os indefesos e derramaram toda a farinha que havia para o abastecimento da feira, sobre os cadáveres, bem defronte da capela. António Silvino enquanto se recuperava dos ferimentos, em casa dos amigos, dizia que sentia-se triste pelo acontecimento em Trapiá e fazia elogios da bravura do inspetor, dizendo: "Poucos foram os homens que tiveram a coragem de enfrentar-me frente a frente, como o valente Nicácio". A valentia do inspetor Nicácio virou história que passou de pai para filho, como um dos homens mais destemidos que viveu nas margens do rio Capibaribe, na época dos cangaceiros MOMENTOS MAIS DIFÍCEIS DE SUA VIDA Certa vez, um amigo fazendeiro perguntou a António Silvino quais foram as horas mais difíceis de sua vida. Ele respondeu: "Quando fui atacado por uma onça dentro da caatinga, em lugar difícil de lutar, após ter caído de minhas mãos o rifle e o punhal grande. Usando apenas um punhal pequeno e um chapéu de couro, consegui dominá-la. Outro momento difícil foi quando lutei com António Nicácio e um subdelegado no Estado da Paraíba. Outro dia, numa noite de trovões e relâmpagos, tempestade nunca vista antes, encontrei-me sozinho numa loca de pedras, onde vi fantasmas e tive a impressão que iria enlouquecer. Foram esses os momentos mais difíceis de minha vida. COMO ANTÓNIO SILVINO FEZ AMIZADE COM MANOEL ALEXANDRE DE OLIVEIRA Em 1911, o General Dantas Barreto venceu as eleições como candidato da oposição. O jovem político Brás Bezerra 155 da Silva, um dos incentivadores da polémica entre Vertentes e Taquaritinga, foi o chefe da campanha eleitoral em prol da candidatura do militar. Depois da vitória recebeu o apoio do Governador eleito, começando aí a sua carreira política. Antes do General Dantas Barreto assumir o governo do Estado, o Capitão António Silvino soube que o senhor Manoel Alexandre de Oliveira usava com o fim de prender ou castigar as pessoas, um tronco de madeira que havia sido utilizado no tempo da escravidão como instrumento de tortura dos negros cativos e rebeldes, em sua propriedade. Acampados na fazenda Manso, o Capitão mandou o cangaceiro Cocada com um bilhete, pedindo uma importância em dinheiro ao senhor Manoel Alexandre. A resposta do farmacêutico foi que não dispunha do dinheiro no momento e, também, não devia nada a cangaceiros, falando em tom arrogante. Horas depois, Cocada estava de volta, na casa do fazendeiro, dizendo que o Capitão não gostara da maneira como foi dado o recado, sentindo-se ofendido e que na próxima sexta-feira viria ao povoado a fim de ver se Manoel Alexandre mantinha o que mandou dizer. Espalhou-se a notícia. No dia marcado, o povoado amanheceu deserto. Apenas o sentenciado à morte permaneceu a espera do Capitão. Às sete horas da noite, conforme havia prometido, e acompanhado de quatro companheiros, o Capitão chegou ao alpendre do chalé, deu boa-noite e perguntou: "É o senhor Manoel Alexandre de Oliveira?" a resposta foi afirmativa. Então disse o Capitão: "Quando mando dizer que vou matar uma pessoa é dando uma oportunidade de fuga, porém você esperou e por isso vai morrer". O dono da casa respondeu: "Capitão António Silvino, quando um homem foge de sua casa sem cometer crime, não pode mais voltar, com vergonha da família. Vou morrer constrangido porque estou vendo diante de mim, um grupo. Por que o senhor não veio só?" Um dos cangaceiros que estava de prontidão aguardando ordens, disse para o chefe: Vamos matar logo esse homem. Mas foi repreendido. Dona Zefinha, esposa do dono da casa, aguardava o desfecho. Nesse momento, falou António Silvino: "Manoel Alexandre, não me agrada matar um homem de sua qualidade. Vamos fazer um trato: Você queima o tronco que a tantos maltratou, vai criar tua família e nos tornaremos amigos. Feito isso, e após algumas horas, a dona da casa serviu um jantar aos visitantes, havendo a partir daí o respeito e ami156 zade entre eles até o fim da vida atribulada do Capitão. Naquele dia os cangaceiros ficaram acampados na fazenda Manso. Assim, muitas e muitas histórias eram contadas a respeito dos crimes e atos bons praticados por António Silvino e seu bando. Naturalmente, uma boa parte não passava de frutos da imaginação fértil dos seus contemporâneos. A verdade é que existiu no agreste e sertão nordestino, de 1896 a 1914, um grupo de cangaceiros comandados por um homem que se transformou num fora-da.lei, forçado por tantas injustiças, querendo vingança com as próprias mãos. Dizia ser o defensor dos pobres contra os poderosos. ANTÓNIO SILVINO EM SANTA MARIA Naquela época, Santa Mana era apenas um pequeno povoado pertencente ao município de Taquaritinga, onde todas as segundas-feira era realizada uma feirinha. O homem mais influente do lugar era o senhor José Braz, político, proprietário de terras e criador de gado.. Naquele tempo o Governador do Estado era o General Dantas Barreto. A pressão sobre os cangaceiros se intensificava, embora o Capitão António Silvino reagisse, como sempre fizera com outros governos. Considerava-se "Governador do Sertão" e não admitia comentários a respeito de sua pessoa. Apesar de viver ocultamente dentro das caatingas, sabia de tudo que se comentava ao seu respeito e do seu próprio grupo. Sabemos que o Capitão António Silvino e o Coronel José Braz eram amigos, porém, foi o Coronel obrigado a fornecer animais selados, redes, dormida e alimentação de primeira para a tropa de soldados, comandada pelo Sargento João Nunes e o cabo António Tetéu, que em perseguição aos cangaceiros haviam acampado em Santa Maria. Após iniciada a desavença o senhor José Braz não demonstrou medo de António Silvino, afirmando que se ele tivesse a audácia de vir a Santa Maria, não seria recebido com banda de música e fogos, como foi numa cidade do Rio Grande do Norte, mas seria sim, recebido à bala porque era o que merecia diante de sua prepotência e de todo o mal que fizera no Nordeste. Não demorou muito tempo para o Capitão António Silvino ficar sabendo das ideias e propósitos do senhor Braz a 157 seu respeito. Mandou um portador saber se era verdade o que lhe disseram. A resposta do proprietário e criador de gado foi afirmativa. Então, o mesmo portador que levara a resposta voltou dizendo que a qualquer hora o Capitão visitaria o povoado, para ter certeza da valentia do chefe do lugar. Nesse povoado não havia soldados para manter a ordem e garantir a segurança dos moradores. Havia apenas um subdelegado civil e um inspetor de quarteirão. Depois que a notí. cia espalhou-se, o povo ficou bastante apreensivo, querendo inclusive abandonar suas atividades. Porém o chefe (Zé Braz) tranquilizou a todos dizendo que o senhor Pequeno, inspetor do povoado, era um homem muito disposto e que de modo algum tinha medo dos cangaceiros. Além disso, haviam contratado dez homens corajosos para defender o povoado. Diante das precauções tomadas, não havia razão para ninguém retirarse. O senhor Pequeno não iria permitir que bandidos desmoralizassem aquele povo. Os voluntários recebiam um salário acima do normal, naquele tempo, e em virtude de ser uma missão perigosa recebiam café, almoço e ceia. armas de fogo e munição para enfrentar os foras-da-lei. A expectativa era grande nos primeiros dias, mas os cangaceiros não deram sinal de vida durante meses. Ninguém dava notícia do Capitão. A feira que quase acabara estava voltando ao seu ritmo normal. Além do senhor José Braz, se destacavam ainda os senhores José Patrício e José Alvino de Queiroz, sem falar no senhor Pequeno que dizia a todos com plena convicção, que os cangaceiros não iriam cumprir o recado enviado pelo Capitão, garantindo ao senhor Zé Braz que "dois bicudos não se beijam". O senhor José Braz todavia, tinha suas dúvidas, e como chefe, repetia as mesmas instruções de sempre para o inspetor, perguntando se os voluntários enfrentariam mesmo os bandidos, correndo o risco de morrer lutando. O inspetor sempre respondia: "Vá dormir descansado, que cangaceiro só entra aqui depois que eu estiver morto com meus companheiros, o que é muito difícil". Entretanto, o senhor José Braz não duvidava da audácia de António Silvino e esperava-o a todo momento. Dizia sempre que António Silvino era audacioso e felino como um gato selvagem, e que a qualquer instante apareceria. Ficava de prontidão em sua residência. Seus colegas José Patrício e José Alvino, também aguardavam nas suas casas. 158 Quando a maioria já pensava que o Capitão desistira de invadir o povoado, num dia de segunda-feira, na hora em que a feira estava repleta de pessoas, surgiram por trás do cemitério os cangaceiros, fazendo alguns disparos para o ar, amedrontando os feirantes. O senhor Pequeno e seus homens romperam fogo contra os invasores. O Capitão António Silvino revidou com tamanha violência e rapidez que impressionou o inspetor, de maneira que o mesmo, tomado de medo, fugiu com os seus companheiros voluntários, enquanto os outros, sem comando, abandonaram o campo de luta. Os senhores Alvino e Patrício ocultaram-se diante do perigo, haja vista que naquele momento o povoado estava entregue aos "fora-da-lei". O senhor José Braz ficou sozinho, entrincheirado num prédio de primeiro andar que era a sua residência, sustentando o tiroteio até a munição acabar. DONA JOSEFA LUCENA HERÁCLIO RELATA ESSE FATO Dona Santa Heráclio conta que esse acontecimento ocorreu no dia 12 de junho de 1912. António Silvino invadiu o povoado de Santa Maria, acompanhado de vinte e quatro cangaceiros. Após dominar o lugar, ocupou o mercado público como se fosse legalmente um oficial do governo. O irmão de Dona Santa, Miguel Braz Pereira de Lucena, temendo ir pela rua, foi de telhado em telhado até conseguir chegar no mercado para conversar com o Capitão, na esperança de que ele mudasse de ideia e não matasse seu pai. Os cangaceiros ficaram admirados com a audácia do Dr. Miguel (era advogado), especialmente pela eloquência e maneira de falar com o Capitão, dizendo-se amigo e na certeza que pouparia, a vida do seu genitor. Soltando gracejos, os cangaceiros disseram que teria sido ótimo caso o tivessem visto andando por cima das casas, pois certamente receberia uma bala muito certeira. António Silvino ordenou que seus cabras terminassem as brincadeiras e disse para o Dr. Miguel: - "Foi até bom você vir se entregar, porque ficou mais fácil de sangrar seu pai. Você ficará aqui enquanto eu vou matar seu velho". Ordenou aos companheiros não fazerem nada com o advogado e nem deixá-lo fugir, o que os cabras cumpriram à risca, e foi com outros capangas matar o Coronel José Braz que se encontrava com a família, no primeiro andar de sua residência. O Capitão, aos gritos, perguntava se José 159 Braz preferia morrer em cima, no sobrado, ou na calçada da rua. Nesse momento, José Braz desceu a escadaria acompanhado de sua filha Santa, dizendo: "Você só chegou à minha porta, porque as balas acabaram e já não tenho com que me defender". Os cangaceiros fizeram um círculo, dentro do qual ficaram António Silvino, o Coronel José Braz, Jararaca e Santa. O Capitão iniciou, dizendo: "José Braz, você sabia que não podia comigo e por que ficou contra mim? Agora vai morrer sangrado como um porco". Com um punhal chamado "bico de lavandeira" na mão, colocava a ponta do mesmo na garganta do Coronel. Santa, que de tudo participava, tomou posição entre o cangaceiro e seu pai, sustentando a lâmina da arma, e pediu: "Mate-me, mas deixe meu pai vivo, eu lhe suplico" O Capitão retirou o punhal, no entanto continuou torturando-o com sua arma, que encostava ora no peito, ora na barriga do seu inimigo, ouvindo as súplicas da moça. Já estavam sem condições de suportar tanto sofrimento e humilhação, quando António Silvino afastou-se um pouco e o cangaceiro Jararaca aproximou-se de Santa, dizendo baixinho no seu ouvido: — "Não tenha medo, moça. Seu pai não vai morrer. Quando ele quer mesmo matar, não judia". MOMENTO DE CORAGEM DA MENINA SANTA Atualmente, ao relatar esse fato, D. Santa diz que as palavras de Jararaca, naquele momento, foram mesmo que uma injeção energética, tornando-a mais tranquila e ao mesmo tempo afoita, chegando a dizer ao Capitão: —"Você só mata Papai, porque o meu noivo não está aqui". Ele observando-a, sem maltratar o Coronel, perguntou: —"Quem é seu noivo, menina?". Ela respondeu: - "É Jerônimo Heráclio". O Capitão, muito sério, guardou a arma e disse para José Braz: "Você não vai morrer agora; agradeça à sua filha, que me impressionou com tanta coragem. E além disso, não quero encrencas com os Heráclios, Agora, tem uma coisa: mande para mim dois contos de réis, pelo Coronel António Farias". Naquele tempo, dois contos de réis era muito dinheiro, mas o Coronel foi obrigado a cumprir a palavra. O senhor Jerônimo Heráclio foi de opinião que o seu futuro sogro mandasse o dinheiro imediatamente, servindo ele mesmo de portador para entregar a importância ao Coronel 160 António Farias (pai do senhor Severino Farias e avô do Dr António de Arruda Farias, ex-Prefeito do Recife) O Coronel António Farias era amigo do Capitão, e párente do senhor José Braz, que forçado pelas circunstâncias, continuou amigo do Capitão, que recebeu o dinheiro, dizendo: "Só perdi a amizade de José Braz por causa daqueles macacos safados", referindo-se ao Sargento João Nunes e ao Cabo António Tetéu. Por ter dado pousada aos soldados, o Capitão achou que o Coronel havia se tornado inimigo seu, daí os recados desaforados e os preparativos que culminaram com o encontro e invasão do povoado por vinte e quatro cangaceiros, juntamente com seu chefe, quando incendiaram quase todas as casas comerciais, após retirar e fazer entrega ao povo de tecidos, géneros alimentícios e tudo que encontraram. Somente o dinheiro em cédulas António Silvino guardava. Níquel, prata e cobre eram distribuídos com os curiosos que já haviam invadido o lugar a chamado do "bandido-chefe". Foi verdadeiramente um dia de juízo para os moradores do povoado. Os amigos do Coronel José Braz, que tanto o incentivaram, sem falar no senhor Pequeno, se omitiram de aparecer na hora difícil. Eram eles José Patrício e José Alvino de Queiroz que, tempos depois, demonstraram tanta audácia sob o comando do alferes Teófanes Ferraz Torres. O senhor Pequeno, ex-inspetor, com vergonha de apresentar-se ao chefe político (o único a enfrentar os cangaceiros) , demorou muito tempo a aparecer, e quando voltou não era mais o valentão de antes. O senhor José Braz (que também ocupava o posto de sub-delegado) demitiu-o. DONA SANTA NÃO ESQUECEU A BOA AÇÃO DO CANGACEIRO JARARACA Após afastar-se da senhorita Santa e do Coronel, Antonio Silvino foi para o mercado público onde o Dr. Miguel Braz Pereira de Lucena se encontrava sob a guarda incómoda de vários cangaceiros. Ao chegar, chamou seus companheiros para irem embora, dizendo ainda: "Não matei José Braz, nem vou matar o Dr. Miguel". Enquanto o Dr. Miguel esteve com os cangaceiros aguardando o desfecho daquele triste dia, não demonstrou muito medo, mas o contrário, conversando com eloquência, impressionando aos bandoleiros. 161 O Capitão disse ao Dr. Miguel: "O seu pai sabia que não podia comigo". Após esse encontro, retirou-se com seu grupo, deixando os habitantes do povoado sofrendo os prejuízos material e moral por muito tempo. Santa ficou muito grata ao cangaceiro Jararaca e ainda hoje tem gravado na mente o perfil do mesmo: homem preto, de estatura elevada, timbre de voz bonito e olhos verdes. Apesar de sua cor preta não era feio, e pareceu-lhe até bonito naquela hora tão amargurada. Ainda hoje ela comenta: "agradeço e ainda ouço aquelas palavras de esperança, pronuncia, das por um bandido num momento tão difícil. Diariamente, faço preces a Deus por sua alma". Era um verdadeiro inferno na época de António Silvino, naquelas regiões. Naqueles dias ela contava com apenas 16 anos de idade. No ano seguinte, em 1913, com 17 anos casou-se com o senhor Jerônimo Heráclio do Rego, homem azogado, muito trabalhador e honesto. A FAMÍLIA SALDANHA A demora da invasão dos cangaceiros em Santa Maria, no período das trocas dos recados entre o Coronel José Braz e o Capitão António Silvino, foi porque o chefe dos cangaceiros desconfiou que seria derrotado, levando em conta a maneira como recebia os recados desaforados do representante de Santa Maria. Por isso, enviou um seu companheiro para cientificar seu poderoso amigo, Coronel Quincas Saldanha, que o Coronel José Braz havia dito que Santa Maria não era a cidade do Rio Grande do Norte onde um bandido da qualidade de António Silvino era recebido com festas pelas autoridades . O Coronel Quincas Saldanha, proprietário da fazenda Sauim, encravada no distrito de Jardim das Piranhas naquele tempo município de Caicó, no vale do Seridó. O Coronel amigo do Capitão António Silvino, prontamente atendeu a solicitação do bandoleiro enviando dez cabras de confiança para ajudar a derrotar o Coronel José Braz. Os homens vieram do Rio Grande do Norte disfarçados de almocreve, montados em mulas, encangalhados como se fossem compradores de géneros alimentícios. A vitória do chefe dos cangaceiros foi total e os dois amigos, Coronel Quincas Saldanha e o Capitão António Silvino, comemoraram o êxito obtido. 162 A família Saldanha era das mais destacadas no vale do Seridó, em propriedades e audácia. O Coronel Quincas Saldanha tinha um irmão tão valoroso quanto ele e eram adversários políticos, viviam em constantes litígios, revidando qualquer ofensa recebida de um ou de outro; incendiavam cercados, sacrificavam os animais e até os moradores de confiança. O irmão do Coronel Quincas chamava-se Coronel Antonino Saldanha, da fazenda São Pedro do mesmo vale do Seridó. Os descendentes dessa valorosa família (Saldanha) ainda hoje gozam de prestígio no Rio Grande do Norte. Atualmente, um deles é deputado Estadual, Dr. William Saldanha. 163 Dona Josefa Lucena Heráclio "Dona Santa". Esata casa, 1914 era a residência do fazendeiro Joaquim Gonçalves de Lima, conhecido por todos como Joaquim Pedro. Atualmente, a casa serve de depósito de utensílios agrícolas e esta em verdadeiro abandono. Anízio Gonçalves de Lima, conhecido como Anízio Pedro, o mesmo que foi levar almoço aos cangaceiros. Atualmente com 75 anos de idade, reside em Frei Miguelinho. Manoel Gonçalves de Lima, conhecido como Nenéu, conta atualmente 79 anos de idade. Foi quem levou almoço para os cangaceiros e foi mostrá-los ao alferes, junto ao seu genitor. CAPÍTULO IX O ÚLTIMO ENCONTRO DO CAPITÃO ANTÓNIO SILVINO COM A POLÍCIA O Governador Dantas Barrete havia prometido ao povo nordestino que acabaria com António Silvino e seu grupo, durante o seu período governamental. Ordenou aos oficiais da polícia que queria de qualquer maneira os cangaceiros, presos ou mortos. Com ordens severas do Governo do Estado, uniram-se os delegados de Timbaúba, Igarassu, Nazaré, Limoeiro, Bom Jardim, Taquaritinga e muitos voluntários dos distritos e povoados, para realizar as determinações do Governo. O cangaceiros, acossados pelos comandantes, começaram a fazer zig-zags dentro da caatinga, sem no entanto os soldados perderem o seu rastro. Nesse esconde.esconde, o capitão com seu grupo já bem menor, quando regressava, não sabemos se de Timbaúba ou Bom Jardim, tentando despistar a polícia, deu a entender que estrategicamente havia seguido para o Estado da Paraíba. Porém voltou, passando por Santa Maria e dirigindo-se para a fazenda Lagoa da Laje, que no ano de 1914 pertencia ao distrito de Vertentes, município de Taquaritinga. Esta propriedade localizava-se bem perto do povoado Olho D'água da Onça, pertencente ao ex-distrito de Vertentes . Era uma quinta.feira, 25 de novembro de 1914. O fazendeiro Joaquim Pedro achava-se na sua residência, no seio da família, discutindo assuntos corriqueiros, juntamente com a sua esposa dona Tatá e os filhos Adélia (Moça), Maria (Liça), Delmiro, Manoel (Nenéu), e Anízio. Naquele dia Artur, o filho mais velho, achava-se em Caruaru. Quando menos esperavam, foram surpreendidos com a presença, na calçada da Casa Grande, do famoso Capitão An. 165 tônio Silvino e os cangaceiros "seu Sempre" (não sabemos seu verdadeiro nome), Joaquim de Moura (lugar-Tenente), Espalhado (Paulino), Copeiro (Severino) e Pau Reverso (Jordão). PENSAVA EM ENTREGAR-SE O capitão apresentava-se desanimado e cansado da vida que levava. Comentou com o fazendeiro que pensava seriamente em entregar-se à Justiça, pois já não suportava a perseguição dos "macacos". O que mais lhe ofendia era os soldados cometerem crimes e toda falta de respeito nas fazendas contra os pobres, e ainda espalharem boatos que era ele e seus companheiros os culpados. Acrescentou: "Já que não posso sangrar todos meus inimigos, qualquer dia desses vou procurar um amigo para que me acompanhe, na hora em que for me entregar a um Juiz de Direito. O senhor Joaquim Pedro achou boa a ideia e lembrou que havia muitos soldados à sua procura. Depois que jantaram, o cangaceiro-chefe disse que no dia seguinte iria para um lugar mais seguro, até a polícia diminuir a perseguição. Terminado o diálogo, recolheu-se no mato em lugar combinado para receber o café da manhã. No dia seguinte, Dona Tatá mandou os meninos (Anízio e Nenéu) levar o café para os cangaceiros. António Silvino mandou dizer ao senhor Joaquim Pedro que havia amanhecido doente e naquele dia não podia viajar, lembrando aos garotos para ao meio-día trazerem o almoço para o pé de juá. Na hora marcada, a dona da fazenda enviou o almoço pelos filhos Anízio e Nenéu. Uma hora depois que os meninos saíram, chegou o alferes Teófanes Ferraz Torres, acompanhado do comandante do destacamento Cabo José Alvino de Queiroz, José Patrocínio — negociante em Santa Maria do Cambucá e inimigo do capitão, além dos soldados, Pedro da Silva, António Tavares dos Santos, Manoel Correia, Ernesto Lucena, João Farias Filemon Gomes e ainda vários homens trajando roupas civis. Perguntaram pelo bandido António Silvino, ao que o proprietário respondeu que não sabia nem de notícia. Todavia, a polícia desconfiada, prendeu toda a família do fazendeiro e começou a fazer um interrogatório violento contra o dono da casa, que continuava sustentando o desconhecimento do paradeiro dos cangaceiros. No auge da investigação, Nenéu e Anízio vem se aproximando. Ouvindo os gritos do alferes dirigidos ao seu genitor, tomados de medo, 166 procuraram esconder-se dentro do mato, bem perto da casa. O senhor José Patrocínio viu-os e foi buscá-los para a presença do alferes. Os meninos traziam enrolados numa toalha, uma bacia contendo talheres, pratos, garrafas de vinho vazias, restos de alimentos, e de boas sobremesas. O almoço fora carne de carneiro guisada. O FAZENDEIRO NÃO PODIA NEGAR Desfeito o embrulho, o militar olhou para o fazendeiro, rindo com ironia: "E agora não vá me dizer que serve tão bem aos seus trabalhadores". Diante do tão forte argumento, o homem não teve outra desculpa. A solução foi contar que o capitão estava nos fundos da propriedade com cinco cangaceiros, embaixo de um pé de juá O alferes prendeu dentro de um dos quartos da casa Dona Tatá, Adélia, Maria, Delmiro, Anízio e um trabalhador de nome Manoel Purça. O Nenéu foi obrigado a ir com o pai, mostrar onde os cangaceiros estavam. Estes encontravam-se jogando sueca embaixo do juazeiro, tão entretidos que Joaquim Pedro e o filho fizeram vários zig.zags e eles não notaram. O fazendeiro pensava que eles perceberiam a aproximação da polícia e dariam o fora, o que não aconteceu. Pai e filho na frente da tropa se aproximaram até uma distância de mais ou menos 120 metros dos bandoleiros, quando o alferes, certo que era mesmo o capitão António Silvino, mandou Joaquim Pedro e Nenéu voltarem. Naquele momento um dos soldados, tremendo de medo, queria correr. Teófanes encostou a boca do rifle em suas costas, dizendo baixinho: "Ou enfrenta os cangaceiros ou lhe mato primeiro", empurrando-o com força para frente, embora não fosse somente esse soldado que demonstrasse medo. O comandante avançou mais uns vinte metros, arrastando-se todos de peito no chão, dilacerando a pele nos espinhos. Tomou posição e rompeu fogo, atirando de pontaria, enquanto o fazendeiro e o filho escondiam-se por trás de uns tocos de madeira. Em fração de segundos os cangaceiros soltaram as cartas do baralho e revidaram o ataque, com uma precisão impressionante. Passados os primeiros minutos, o comandante percebeu que os cangaceiros haviam desaparecido caatinga a 167 dentro. O encontro aconteceu às quatorze horas do dia 26 de novembro. Os policiais, com muito cuidado, chegaram até o pé de juá e apanharam alguns objetos deixados no local: baralhos, lenços, cigarros, perfumes e uma espingarda de matar nambu. Havia sangue no lugar. Não havia dúvidas de que havia bandoleiro ferido, confirmando-se o que o comandante dissera: ter visto um cabra sair cambaleando, O CAPITÃO NÃO TEVE CORAGEM DE MATAR-SE António Silvino, gravemente ferido, encontrou apenas Joaquim de Moura com um ferimento grave, encostado numa cerca, sustentando o rifle. Foi o próprio António Silvino quem contou ao senhor Manoel Mendes que Joaquim de Moura o aconselhou a não entregar-se à polícia, dizendo que cadeia não foi feita pra cangaceiro e na presença do seu chefe, armou o rifle, colocou-o debaixo do queixo, retirou o pé da alpercata e com o dedo puxou o gatilho. António Silvino presenciou a cena dramática, e ouviu o estampido e a queda do cadáver do leal amigo e companheiro de infortúnios. Eram mais ou menos quinze horas. Olhando seu companheiro morto diante de si, sentiu o maior desânimo de toda sua vida atribulada, e conscientizou-se naquele momento que Joaquim, sim, é que era o verdadeiro homem, valente cangaceiro, para quem deveriam todas as glórias. Chorou como menino e não teve coragem de suicidar-se, a essa altura ferido moral e fisicamente, pois uma bala o atingira no peito e a hemorragia era constante. Foi nesse estado que procurou o fazendeiro Manoel Mendes, entregando-se e pedindo para que o fazendeiro chamasse a polícia. O que acima foi dito, foi narrativa do próprio Antônio Silvino, conforme Manoel Mendes contou milhares de vezes aos seus amigos e trabalhadores. O senhor Manoel Mendes mandou imediatamente o almocreve Martins Figueiredo avisar à polícia. O portador viajou as pressas para Vertentes e Taquaritinga, não encontrando o comandante Teófanes Torres, o que não surpreendeu Manoel Mendes, porque dona Tatá, sua irmã, na ausência do portador, mandara uma empregada avisar que o tenente e seus comandados se encontravam aquartelados em sua casa, esperando notícias dos cangaceiros. Quando o portador Martins Figueiredo voltou de Taquaritinga, Manoel Mendes o enviou à casa do seu cunhado Joaquim Pedro, avisar 168 que António Silvino estava em sua residência, ferido, querendo se entregar. Ciente do recado, o alferes pôs o portador na sua frente, nas condições de que se fosse mais uma das artimanhas do cangaceiro, ele, o portador, seria o primeiro a morrer e, seguiu na frente da tropa para o encontro do chefe ferido, na mira do rifle do alferes. Às cinco horas da manhã do dia 27 de novembro de 1914, a polícia chegou à casa citada e viu com surpresa o famoso chefe dos cangaceiros deitado numa cama, gravemente ferido. Os soldados de arma em punho, em posição de combate apontavam para o ferido, aguardando ordens do alferes. António Silvino olhou para o alferes e disse: "só pode ser um castigo contra mim. Desde minha mocidade que sou insultado. Até neste instante, que me encontro entre a vida e a morte, faltando-me por momentos até a visão, ainda sou ameaçado. Seu Tenente, estou entregue". Disse ainda: "Joaquim de Moura está morto", e indicou o lugar dentro da caatinga. "Os outros quatro companheiros não mais os vi". Queria esconder a pista dos mesmos, que se despediram chorando, e aos quais pedira para irem pra bem longe e viverem como homens de bem. Jamais ouviu-se falar daqueles cangaceiros, depois da prisão de António Silvino. VIAJOU A CAVALO, QUASE MORTO O comandante Teófanes mandou buscar o cadáver de Joaquim de Moura para o cemitério de Vertentes, e autorizou o senhor Joaquim Barbosa, sub-delegado, a fazer o sepultamento do suicida. Em seguida mandou buscar, às pressas, o cavalo de Joaquim Pedro para conduzir o baleado para a sede do município de Taquaritinga, distante uns 10 kms da fazenda. Foi uma tarefa penosa. Ninguém acreditava que o homem resistisse à viagem, porém o cabra era forte e acostumado à dureza da vida, possuidor de um preparo físico inacreditável. Recebeu também ajuda do alferes, que o cercou de todos os cuidados possíveis. Alguns dos primeiros socorros práticos de fonte natural, eram indicados pelo próprio António Silvino, que era acostumado a socorrer seus homens dentro da caatinga. O prisioneiro estava entre a vida e a morte. Assim mesmo, a cavalo, subiu a serra e chegou na sede de Taquari169 tinga. No mesmo dia, a altas horas da noite, foi transportado num jumento até o povoado de Torres, hoje Toritama. O preso sentia uma pequena melhora devido aos curativos de urgência, aplicados pelo oficial, que não se afastava do doente. Sob indicação do próprio António Silvino, o oficial extraiu leite de pinhão, aplicando sobre o ferimento, a fim de estancar a hemorragia. A essa altura, o alferes Teófanes não media esforços para seu prisioneiro não morrer, pois além de já admirá-lo, queria ter o orgulho de entregá-lo vivo a seus superiores. CARREGADO NUMA REDE, COMO UM DEFUNTO Em Torres já o esperava o médico Dr. Frederico, que recebeu ordens em Caruaru para ir urgente socorrer o cangaceiro, utilizando todos os meios possíveis para salvá-lo, porque as altas autoridades queriam vê-lo vivo e ouvir a sua voz. Para Caruaru, o ferido não pôde mais viajar a cavalo. O Dr. Frederico mandou providenciar uma rede e pessoas para conduzi-lo. O médico lançou mão de todos os meios de socorro para o paciente. O alferes não se afastava do seu ex-inimigo um só minuto, fazendo tudo que estivesse ao seu alcance. A caravana era grande, acompanhando o homem mais falado daqueles dias. De Torres a Caruaru, não faltaram voluntários para carregar o doente dentro da rede. Os habitantes da região corriam curiosos para a margem da estrada, a fim de ver e ter transportado. De quilómetro em quilómetro, o Dr. Frederico examinava seu paciente. O alferes não admitia que estranhos se aproximassem, e o prisioneiro indefeso já começava a confiar no oficial, seu ex-perseguidor. Num sofrimento extremo chegou à estação da Great Western, em Caruaru, acompanhado por centenas de pessoas e grande número de autoridades da época, vindas do Recife. Algumas dessas autoridades, montados a cavalo, foram encontrar com a tropa comandada pelo alferes Teófanes Ferraz Torres, que conduzia o prisioneiro mais importante da época. Entre as autoridades que vieram do Recife estava o Chefe de Polícia ou Secretário Geral e muitas altas personalidades. O trem foi especial, com percurso sem escala — Recife a Caruaru. De volta, parou alguns minutos em Gravata, para um cafezinho. Em Caruaru, Dr. Frederico, contando com melhores meios de atendimento e ajuda de colegas, proporcionou ao doente melhor assistência médica. Além das altas autorida. 170 dês, acompanharam o preso o alferes e seus comandados que participaram do combate. No Recife, o ferido submeteu-se a uma junta médica, na Penitenciária onde passou 23 anos. Lá, aumentou seus conhecimentos culturais, recuperou-se fisicamente e fazia de tudo em artesanato. Tornou-se líder respeitado e estimado. Um dos Diretores da Casa de Detenção, senhor Carlos de Barros Cavalcanti (Carlinhos), tornou-se seu amigo e admirava-o por sua força de vontade. No dia de sua libertação, presenteou-o com uma bengala de sua estimação. O Capitão António Silvino foi identificado na Polícia sob o número 1122, e seu prontuário na casa de Detenção do Recife era o de número 959. Recolhido à Detenção no dia 01 de dezembro de 1914, foi processado em apenas seis comarcas e indiciado em 26 processos, sendo condenado a 239 anos e 8 meses de prisão. Se fossem julgados todos os processos, de todas as Comarcas dos quatro Estados, Paraíba, Ceará, Rio Grande do Norte e Pernambuco, teria sido condenado a quase mil anos. O capitão, durante seus dias na Detenção, estava acabrunhado. Não era mais aquele homem disposto e temido, considerado Governador do Sertão durante quase catorze anos, período em que muitos o acharam bom e outros ruim, em toda a zona nordestina. Sabia que não ia mais usar seu repetição de 14 tiros e nem seu famoso punhal "bico de lavandeira", de 12 polegadas. Estava agonizante, o vingador e protetor dos pobres. Depois da prisão do Capitão António Silvino, mais de oitenta por cento dos que ele considerava amigos se declararam muito satisfeitos com sua prisão, inclusive aqueles que tomavam conta do seu gado. Dizem que apenas um fazendeiro do Rio Grande do Norte e outro de Pernambuco venderam seus animais, entregaram o dinheiro e guardaram conveniências das transações que mantiveram com o ex-capitão. António Silvino foi libertado em 1937, por um indulto decretado pelo Presidente da República, na época Getúlio Vargas. Quando saiu da prisão era um homem sem ódio. Não procurou seus amigos e muito menos seus inimigos. Nunca se ouviu falar que tenha procurado reaver o que deixou entregue a alguns fazendeiros. Dizia ele: "Não quero mais encrenca com ninguém". Passou a viver humildemente em companhia de parentes. 171 No período de sua liberdade fez uma carta ao Presidente da República, Getúlio Vargas, pedindo uma indenização pelos trabalhos prestados ao Nordeste, no soerguimento moral da região. Getúlio Vargas mandou que ele trabalhasse na rodovia Rio-Bahia. O capitão residia em Muriaé, e aceitou por um curto tempo. Deixou porque o ordenado era pouco. Voltando ao Nordeste, aqui viveu seus últimos anos, vindo a falecer em Campina Grande, conforme se comprova pela certidão de óbito 16.195, cuja cópia reproduzimos. 172 ANEXOS "TEÓFANES FERRAZ TORRES» Bravo oficial que acabou o banditismo comandado pelo Capitão António Silvino. Neste pé de juá ocorreu o último encontro do Capitão António Silvino com o tenente Teófanes Ferraz Torres, no dia 26 de novembro de 1914. Entre milhões de juazeiros do agreste, este poderá ser identificado, por uni "caldeirão" ou tanque natural, existente a uns 500 metros de distância* onde os cangaceiros se abasteciam de água, na fazenda Lagoa da Lage, municícipio de Frei Miguelinho. "Caldeirão" ou tanque natural encravado nas terras da fazenda Lagoa da Laje, bem próximo ao local onde o Capitão António Silvino e seu grupo foram surpreendidos pelas tropas do alferes Teófanes Ferraz Torres. A fazenda Lagoa da Laje pertencia aos senhores Joaquim Pedro e Manoel Mendes, cunhados, que vieram de Limoeiro e aqui se localizaram ,mais ou menos em 1900. Demonstração da vigilância utilizada pelo Capitão António Silvino, onde podemos ver um dos seus em posição estratégica, enquanto os companheiros repousavam. Manoel Clemente Gonçalves de Lima, conhecido como "Manoel Mendes", proprietário da fazenda Lagoa da Laje, o mesmo que socorreu o Capitão António Silvino no dia 26 de novembro de 1914, quando ferido pela tropa do Alferes Teófanes Ferraz Torres. Casa.Grande da fazenda Lagoa da Laje, pertencente em 1914 a Manoel Clementino, conhecido como Manoel Mendes, onde António Silvino, nos dias 26 a 27 de novembro deste ano, entregou-se ferido. Atualmente a fazenda pertence a famíliia Simão, radicada em Vertentes. Sr. Olegário Lino de Morais, sobrinho do Capitão António Silvino e fazendeiro no Vale do Pajett, ANEXO I NOTA PUBLICADA NO DIÁRIO DE PERNAMBUCO Quarta-feira, 02 de dezembro de 1914 ANTÓNIO SILVINO Quase nada mais há a acrescentar sobre António Silvino, hoje trancafiado na casa de Detenção, para tranquilidade dos moradores da zona sertaneja de quatro Estados e satisfação da sociedade vilipendiada durante quatro lustros com as cenas bárbaras do terrível bandoleiro. Eram 11 horas, hoje, quando o Dr. Vieira da Cunha Filho, acompanhado dos Drs. Thomé Dias e Odilon Gaspar entraram na casa de Detenção. Na enfermaria daquele estabelecimento procederam os três facultativos minucioso exame, no célebre bandoleiro António Silvino. O criminoso acha-se irrequieto, numa grande excitação nervosa. Foram-lhe aplicadas seis ventosas secas, sendo quatro anterior e duas posteriormente, sobre o hemi-thorax direito. Depois da aplicação das ventosas o enfermo ficou mais calmo e respirando melhor. Após, foram-lhe dadas injecções de óleo canforado e estriquinina. Quando o dr. Vieira da Cunha falou em estriquinina o bandoleiro retorquiu-lhe: "estriquinina mata, dr." Objectado pelo dr. Vieira da Cunha que não era para matar e sim para lhe dar vida, António Silvino sujeitouse docilmente à injeção. O estado geral do enfermo é o mesmo, apresentando, porém, um sintoma alarmante, ainda bem caracterizado — estremecimentos espasmódicos, que bem podem ser ameaças de tétano. Em vista do estado de excitação do enfermo esse sintoma pode ser também atribuído razoavelmente a esta causa. 175 Além das injecções de óleo canforado e estriquinina, António Silvino está tomando uma porção de morfina e hidrolato de canella, à noite, como calmante. O estado do doente é considerado grave pelo dr. Vieira da Cunha Filho. Às 11 1/2 de hoje o pulso acusava 112 pulsações. As visitas ao criminoso foram absolutamente proibidas. Somente quando Silvino apresentar sensíveis melhoras, será interrogado pelo dr. chefe de polícia em companhia do major Santiago Ramos. Também será interrogado o terrível Balisa, que foi companheiro de António Silvino durante muito tempo e se acha preso na casa de Detenção. Os companheiros dos oficiais que prenderam António Silvino cogitam de inaugurar seus retratos no gabinete do comando da força pública desta capital, fazendo-lhes os inferiores grande manifestação de apreço. * * * Telegramas de felicitações recebidos pelo alferes Teophanes Torres RECIFE, 29. — Deante vosso rasgo heroísmo, felicitovos — Capitão Carlos Afonso. RECIFE, 29. — Deante vossos relevantes serviços prestados causa publica e ato bravura praticado combate contra horda celerados cangaceiros infestaram sertão este Estado, resultando prisão bandido António Silvino congratulo-me juntamente oficiaes intrepidez demonstrastes campo ação que muito nos rejubila e glorifica governo — Coronel Alfredo Duarte. ANEXO II NOTÍCIA DO "CORREIO DE CAMPINAS" Uma das últimas proezas que António Silvino preparava era certamente um assalto à fazenda e propriedade do coronel Lauritzen, prefeito do município de Campina Grande. Em princípios do mês passado o famoso bandoleiro mandara pedir ao coronel Lauritzen a quantia de dois contos de réis, não sendo, ao que parece, prontamente atendido. Do "Correio de Campinas", órgão político desse município, e de propriedade do coronel Lauritzen, extraímos a seguinte notícia publicada em o número de 22 de Novembro findo: 176 "António Silvino — Este destemido e audaz bandoleiro que há mais de 10 anos vem caminhando com desassombro na sua estrada intérmina de crimes e ladroeiras, esteve quartafeira da semana decorrida no povoado Focinhos, distante desta cidade 6 léguas. Ali chegou aproximadamente 7 horas da noite, retirando-se às 12 horas, segundo informaram-nos. Fez a sua costumeira visita de grande senhor das zonas dos Carirys, encontrando da parte dos habitantes daquelle vilarejo a melhor acolhida, atenta a circunstancia gravíssima de nunca existir força pública nesses lugares, a fim de evitar as encomodas visitas de um homem destituído das honrarias de cidadão. ANEXO III TELEGRAMAS AO ALFERES TEÓFANES TORRES Diário de Pernambuco TERÇA-FEIRA, 01 DE DEZEMBRO DE 1914 Telegramas de felicitações recebidos pelo alferes THEOPHANES TORRES RECIFE, 29. -- Felicito-vos pelo vosso procedimento na captura do celebre facinora António Silvino, cuja acção criminosa fazia o terror dos Estados vizinhos de Pernambuco. Informae acerca do procedimento do inferior, vosso auxiliar, e das praças. — Saudações — Dantas Barreto". FLORESTA, 29. — Parabéns — Miguel Cyrillo. FLORESTA, 29. -- Felicitações — Odorico. "7LORESTA, 29. -- Parabéns — Saudações — sargento Alfredo. FLORESTA, 29 — Parabéns — Manoel Henrique. OLINDA, 29. — Felicitações brilhante feito — Padre Moura Lyra. 177 FLORESTA, 29. — Parabéns. Saudações — José Januário. RECIFE, 29. - - Apertado abraço mil parabéns captura terrível cangaceiro Silvino — Jacyntho. PESQUEIRA, 29. - - Abraço e felicito valorozo amigo — Correia. BOA VISTA, 29. - - Cumprimento amigo feliz diligência captura Silvino — Balduino. TRIUMPHO, 29. - - Queira aceitar sincero abraço vitória prizão bandido Silvino - - Saudações — Aprigio. FLORESTA, 29. — Parabéns — Leoncio, Apollonio, Joaquim Barboza. RECIFE, 29. - - Sinceros parabéns — Elisio. FLORESTA, 29. — Aceite bênçãos pães avô abraços irmãs parabéns amigos - - João, Quincas, Manoel, Tiburtino, Café. FLORESTA, 29. — Abraça-o — Correia Cruz. FLORESTA, 29. — Parabéns prisão António Silvino - - Saudações — Américo Leite| FLORESTA, 29. — Parabéns memorável feito. Abraço — Diniz. FLORESTA, 29. — Parabéns prisão António Silvino — Alfre Barros. FLORESTA, 29. — Parabéns prisão António Silvino — Saudações — Gominho. VILLA BELLA, 29. — Sinceros parabéns — Ribeiro. Elias Amaro, Corte. Innocente, Joca, Cassiano e Nozinho. RECIFE, 29. - - Felicito-o pelo seu denodo, prova evidente e manifesta do que é e do que merece — Abraços -- Saudações -- Olympio Magalhães. TRIUMPHO, 29. — Parabéns amigos regosijados ato heróico felicitam affectuosamente — Themistocles, Piloto, Prides, Aprigio, Tude, Ernestinho, Pompilio Malaquias, Luiz Maria, Maria Maia, Emygdio, Alcochiades, Izaias, João Ribeiro, Manoel Lima, Modesto José e Manoel. FLORESTA, 29. — Enthusiasmados enviamos felicitações vietoria acontecimento estrondoso alcançado pelo nosso patrício — Que exerça altas funções, são os nossos votos. Glória! -- Adelino, Toinho, João Maneco, Ancilou, Aristides, Miguel Yôyô. 178 ANEXO IV TEÔFANES TORRES Teófanes Ferraz Torres, filho de Floresta, cidade encravada nas margens do rio Pajeu, no alto sertão de Pernambuco. Na sua terra educou-se até quando ainda quase menino e incorporou-se na polícia do Estado de Pernambuco. Não fez curso superior. No entanto, cultivou o que aprendera nas escolas de sua cidade, ao ponto de ser elogiado como um bom orador de português correto e caligrafia muito bonita. Motivos pelos quais, também ajudou junto a sua bravura para as merecidas promoções na sua carreira militar. Aos vinte anos, já era alferes e delegado do município de Taquaritinga. Nesse cargo coube-lhe a difícil missão de prender o famoso capitão António Silvino, na Lagoa da Lage, perto do povoado de Olho d'Água da Onça, pertencente ao distrito de Vertentes, que por sua vez pertencia ao município de Taquaritinga, cujo povoado é hoje o município de Frei Miguelinho. Enfrentou o capitão António Silvino, dentro da caatinga com apenas cinco soldados e alguns civis, prendendo o chefe do grupo e desbaratando o resto dos cangaceiros. Por esse ato de bravura, merecidamente tornou-se um herói para o orgulho da polícia pernambucana, seus parentes e conterrâneos. Anos mais tarde, por um triz, não acabou também com Lampião, comandando ele mesmo uma tropa, quando era chefe das forças volantes contra os bandidos que flagelavam todo o Estado de Pernambuco, com sede em Serra Talhada. Quando rebentou a revolução de 1930, Teófanes Ferraz Torres contava apenas 36 anos de idade e já ocupava o posto de Coronel e comandava o primeiro batalhão de polícia do Estado de Pernambuco. Vitoriosa a revolução pelos liberais, o comandante do quartel do Derbi reuniu todos os oficiais, para juntos levantarem a bandeira branca aos vitoriosos. O coronel não concordou e no momento colocou um caminhão na frente do quartel e convidou voluntários para o acompanhar para lugar indefinido. Não estava ele ainda acreditando na derrota do governo. Com alguns? soldados, rumou para o sertão, indo se acampar na Serra da Cangalha, município de Custódia, região do Moxotó. Quando soube que a revolução estava definitivamente consolidada, mandou os seus fiéis seguidores apresentarem-se e permanecerem dentro do mato, disposto a não se 179 apresentar ao novo governo. Porém a sua esposa não mediu esforços para encontrar o esposo, tentando normalizar a vida do seu companheiro com o novo governo. Pensando assim, a sua dinâmica mulher procurou o Dr. Caio de Lima Cavalcante, irmão do Dr. Carlos de Lima Cavalcante e pediu a sua interferência para o seu esposo se apresentar, merecendo o respeito de oficial que foi fiel ao seu governo até o último momento. Depois que o irmão do novo governador prometeu que o coronel poderia se deixar prender ou se entregando receberia o tratamento de oficial de nível superior, a Dona Amélia viajou às pressas para o sertão, sem saber onde encontrar o esposo. Foi indagando até quando um farmacêutico em Custódia, com um gesto no olhar, deu a entender que sabia de alguma coisa a respeito do coronel. Particularmente informou para Dona Amélia que o seu esposo se encontrava na Serra da Cangalha, ali mesmo no município de Custódia. Horas mais tarde o coronel foi localizado pela esposa, já muito doente, com as roupas todas rasgadas pelos garranchos e espinhos. Na sua túnica existia, apenas um botão e estava muito edemaciado. A sua esposa voltou com ele para o Recife, indo residir numa casa muito humilde perto de uma vacaria no Cordeiro, concedida por um seu amigo, até a noite que a polícia foi prendê-lo. O Dr. Caio não cumpriu a promessa que havia feito, que seu irmão governador, reconheceria os méritos de um oficial que muitas vezes expôs a sua própria vida para defender a comunidade pernambucana. Foi colocado numa prisão muito inferior a sua posição de oficial de posto superior. Depois de libertado e reformado, viveu apenas 3 anos. Traumatizado, faleceu no dia 11 de setembro do ano de 1933, contando apenas 39 anos. Era casado com Dona Amélia de Sá Torres, filha também de Floresta. Tiveram dessa união os seguintes filhos: Teófanes Ferraz Torres Filho, coronel reformado da polícia, bacharel em Direito e professor universitário, casado com a Senhora Carolina de Godoy Neiva Torres; Senhora Maria Enida Torres Medeiros, esposa do médico Mário Medeiros, residente e clínico em Caruaru; Senhora Zilda Torres Maia, esposa do Senhor Alcides Rodrigues Maia, funcionário público estadual; Geraldo Ferraz de Sá Torres, tenente reformado da polícia militar de Pernambuco e Maria José de Holanda Ferraz. 180 ANEXO V FALA DE HELENA DE MORAES AO AUTOR A SRA. HELENA DE MORAES VERAS SOBREIRA, DIRIGIU A SEGUINTE CARTA: "As alusões às atividades de MANOEL BATISTA DE MORAIS, narradas nos Capítulos VII a IX vem atender de um certo modo à aproximação maior da realidade dos fatos que aconteceram naquela época, ao contrário do que é narrado por aí em livros diversos, que só procuram explorar aspectos sensacionalistas e denegrir a imagem de um homem que procurava Justiça. "A FAMÍLIA MORAIS é grata pelo interesse do autor em buscar os fatos que envolveram a vida agitada de "António Silvino" de fontes fidedignas e que sentiram na pele os problemas da época". Vale ressaltar que Manoel Batista de Morais faleceu em Campina Grande nas condições que ele de própria e espontânea vontade escolheu, contra o desejo dos parentes mais próximos, pois o mesmo, ao deixar a Detenção de Recife, viveu vários meses em casa de um sobrinho e lá poderia viver o restante de sua vida, se não fosse o seu temor às vinditas dos inimigos que não o havia esquecido e procuravam vingar-se nos membros de sua família. ANEXO VI CERTIDÃO DE ÓBITO DE ANTÓNIO SILVINO REPÚBLICA DOS ESTADOS UNIDOS DO BRASIL ESTADO DA PARAÍBA SEDETDA COMARCA Município de Campina Grande 1°. CARTÓRIO — Avenida Floriano Peixoto REGISTRO Severino Cavalcanti Júnior Escrivão do Registro Civil DE ÓBITO Hélio Cavalcante Albuquerque Escrivão Substituto Certidão de óbito de Manoel Batista de Morais (António Silvino) 181 Certifico a pedido de pessoa interessada que, revendo em meu cartório o livro de registros de óbitos número 27, folhas número 55, sob o número de ordem 16.195, consta o termo do teor seguinte: "Aos vinte e nove dias do mês de julho de mil novecentos e quarenta e quatro, nesta cidade de Campina Grande, Estado da Paraíba, em cartório compareceu Manoel Severo da Costa, motorista, exibiu uma guia de óbito firmada pelo médico Dr. Bezerra de Carvalho, exibiu uma guia, digo, atestando ter falecido ontem às dezenove horas, à rua Arrojado Lisboa, nesta cidade, em consequência de glomerulonefrite crónica — Uremia, MANOEL BATISTA DE MORAIS, sexo masculino, cor branca, com setenta e dois anos de idade, fazendeiro, pernambucano, residente nesta cidade, solteiro, também conhecido por ANTÓNIO SILVINO, nada deixa para inventário, deixa oito filhos naturais de nomes seguintes: José, Manoel, José Batista, José Morais, Severino, Severina, Isaura, Damiana; era filho de Pedro Rufino de Almeida e Balbina Pereira de Morais; naturais de Pernambuco e ambos falecidos; e o cadáver será sepultado no cemitério desta cidade. Para constar mandei lavrar este termo que lido e achado conforme assina o declarante. Eu, Severino Cavalcanti Albuquerque, Oficial do Registro o subscrevo, (a) Manoel Severo da Costa. Era o que se continha em dito termo e foi datilografado em seu inteiro teor. O referido é verdade. Dou fé. Campina Grande, 26 de setembro de 1969 Severino Cavalcanti Júnior Escrivão do Registro Civil ANEXO VII DADOS DA VIDA DO AUTOR Dados Pessoais: Nome — Severino Rodrigues de Moura Data de Nascimento — 08.12.1914 Nacionalidade — Brasileira Naturalidade - - Vertentes, Pernambuco Estado Civil — Casado — 5 filhos Função — Agricultor Título de eleitor — Cortês, Pernambuco 182 Filiação: Manoel Possidônio de Moura Josefa Maria de Jesus Residência: Usina Pedroza — Cortês — Pernambuco Serviço Militar: 1942 — Reservista de 3a. categoria Escolaridade: Não frequentou nenhuma escola regularizada até aos 18 anos Alfabetizado na escola da vida Atividade profissional: 1939/1968 - Usina Pedroza S. A. -- Cortês — PE. Trabalhador rural, encarregado de turmas, chefe dos encarregados de turmas (conferente), apontador, administrador de engenhos de cana, inspetor agrícola, gerente agrícola. 1968/1971 - - Usina Serro Azul -- Palmares — PE. Chefe de campo. 1971/1973 - - Usina 13 de maio — Palmares — PE Chefe de campo 1979/1980 -- Cia. Agro-Industrial Zabelê — Touros — RJN. Gerente. 1981 - Usina Pedroza S. A. — Cortês — PE. Chefe de campo. Reassumindo o mesmo cargo quando desligou-se da mesma no ano de 1968. Outras atividades: 1973/1977 — Fornecedor de cana — Palmares — Pfc 1954/1959 -- Avaliador da Fazenda — Governo Etelvino Lins e Cordeiro de Farias. 1977/1978 — Avaliador do Banco do Brasil S/A — Agência Palmares — PE. 183 Atividade Política e Social. 1973/1980 -- Sócio fundador do Lions Club de Palmares 1973/1974 — Presidente de comissão 1975/1976 -- 3a., 2a. e Ia. vice-presidência 1976/1977 — Presidente do Lions Club de Palmares 1977/1978 — Presidente da divisão E.l — distrito L. 14 e Presidente da Comissão de Programas atual. 1977/1978 — Padrinho e fundador do Lions Club de Barreiros 1952/1958 — Loja Cruzeiro da Verdade n°. 3 "OBREIRO" —Sócio do Club Recreativo e Esporte da Usina Pedroza —Sócio do Club 6 de Janeiro — Usina Pedroza — Cortês —Fundador do Club Associação Recreativa da Fa zenda Zabelê (AREFASA) — Touros — RN Trabalhos realizados: "Memórias de um Camponês" — Livro — impresso nas oficinas gráficas da Editora Universitária de Pernambuco — Rua Académico Hélio Ramos n°. 20 — Engenho do Meio — Recife — Pernambuco. "O Último Reduto dos Quilombos" — Pesquisa — impresso Rápidos Ltda. — Rua da Concórdia n°. 201 — 1°. andar — Recife — Pernambuco. "Zabelê" - Livro a publicar. "Fatos pitorescos vividos em engenhos e usinas de cana-deaçúcar" — a publicar "A Serra da Prata" — Conto — a publicar. Dados adicionais. Esposa: - - Severina Azevedo Moura Filhos: - José Agápito Moura — Médico —José Moura — Eng°. Agrónomo —José Edson de Moura — Médico —José Evoide de Moura — Advogado (falecido; - Maria José de Moura Morotó — Médica Sevenno Rodrigues de Moura 184 ÍNDICE Págs Prefacio ...................................................................... .......................... Agradecimentos..................................................................... ................. Esclarecimentos....................................................................................... 7 11 18 PRIMEIRA PARTE — O MUNICÍPIO DE FREI MIGUELINHO Capítulo l Localização ............................................................................................. Limites .................................................................................................... Topografia ............................................................................................ .. Vegetação................................................................................................ Fazendas ................................................................................................. Fauna ..................................................................................................... Fontes ..................................................................................................... Estradas ....................................................................................................... 17 17 18 18 24 25 26 26 Capítulo H Família Moura ............................................................................................ Família Alexandre ...................................................................................... Família Hipólito de Medeiros.................................................................... António Bezerra de Barros ...................................................................... António Francisco da Silva ...................................................................... Joaquim Pedro Ferreira ............................................................................. Manoel Clementino Gonçalves de Lima ............. ................................... Manoel Sardote de Souza ........................................................................ 29 34 38 42 43 43 43 44 Capítulo III Lagoa de João Carlos ........................................................................... Primeiros habitantes ............................................................................. Famílias influentes do povoado ........................................................... Valdemar Lima (antiga Topada) ....................................................... Famílias influentes ................................................................................ O Tenente morto de emboscada .......................................................... Algodão do Manso ................................................................................. Chã Grande ou Chã do Carmo .......................................................... Famílias tradicionais.............................................................................. Venturosa — Placas .............................................................................. Famílias ilustres..................................................................................... Capivara ................................................................................................. Filhos do fundador Manoel Baé .......................................................... Atrações do povoado ................................................... ........................... 47 47 48 55 57 57 59 81 63 66 67 68 68 71 Capítulo IV Os primeiros povoadores ........................................................................ A primeira missa ................................................................................... O primeiro tabelião e as lutas pela sede do município........................ Tornou-se município .............................................................................. Primeiro Prefeito . . . . ......................................................................... A primeira Câmara ............................................................................. Ata de instalação da Prefeitura Municipal da cidade de Frei Miguelinho, no Estado de Pernambuco .......................................... Primeira conclusão da escola São José, ensino de l', e 2'. graus -----Segunda conclusão .. ............................................................................ Terceira conclusão .................................................................................. Quarta conclusão .................................................................................. Primeira formatura da escola São José, ensino de l 9 , e 2"?. graus .. Luiz Gonsaga de Andrade Vasconcelos ................................................. 73 74 75 76 76 76 77 83 84 85 86 86 87 Capítulo V Novenas .................................................................................................. Manifestações populares......................................................................... B anda de pif anos— . . . . . . . . ....................................................... Mamulengo............ ................................................................................ Pastoril ............... ................................................................................ Violeiros.................................................................................................. Festa Junina . . . . ; ........................................................................................................................... Vaquejada .. .... ............................................................................... Gonçalo e o eclipse ................................................................................ O avião ................................................................................................... Morotó o fura mundo ........................................................................... Coração de vaqueiro .............................................................................. A confissão ............................................................................................. Família do senhor e senhora Herácllo ................................................. 89 89 90 90 90 91 91 92 92 94 96 99 109 111 SEGUNDA PARTE — O FRADE Capítulo VI Frei Miguelinho (um Frade revolucionário) ....................................... A marcha para a liberdade .................................................................. Influências da Corte Portuguesa no Brasil ......................................... Motivos para um governo provisório republicano ................................ Vitoriosa revolução................................................................................. Realizações dos republicanos no curto período que conseguiram governar ........................................................................................ Derrotados pela contra revolução.......................................................... Epopeia do martírio de Frei Miguelinho ......................................... Invocação ................................................................................................ 117 119 119 120 121 Imortal ................................................................................................... 127 122 123 123 127 TERCEIRA PARTE — O BANDOLEIRO Capitulo VII Declarações de um sobrinho de António Silvino................................. Os motivos que levaram António Silvino a tornar-se o chefe dos Cangaceiros..................................................................................... 133 133 Suas virtudes invejáveis ........................................................................ 134 Sua lei era igual para todos ................................................................. Morte de Batistão .................................................................................. Festival funério.............................................................................. .... Batistinha torna-se cangaceiro ................................................... ........ Família de Batistão .............................................................................. ................................................................................................................'138 Quatro irmãos mortos por traição ........................................................ Revolta da íamilia ................................................................................. Mudou de nome ...................................................................................... Um dos primeiros encontros com a polícia ......................................... A família Ramos quebrou compromisso ................................................ 135 136 136 137 138 139 139 140 140 Capitulo VIU Assassinato de Zeíerino ......................................................................... Morte de António Rosa e seus cangaceiros ......................................... Julgava-se senhor da região ............... ................................................ Havia momentos em que chorava ......................................................... O que contavam a seu respeito ........................................................... Como vivia o capitão António Silvino ................................................. Cangaceiros Mansos ............................................................................... Sou apenas um Justiceiro ..................................................................... Visita a fazenda Manso, município de Taquaritinga ....................... Suas boas ações ...................................................................................... Fazia Justiça até com os seus ................................................................ Não aceitava a denominação de bandido ........................................ A valentia do Jnspetor António Nicácio, virou história ....................... Momentos mais difíceis de sua vida ............................... ................ Como António Silvino fez amizade com Manoel Alexandre de Oliveira ........................................................................ 4........... António Silvino em Santa Maria .......................................................... Dona Josefa Lucena Heráclio relata esse fato ....................* .......... Momentos de coragem da menina Santa ............................................ Dona Santa não esqueceu a boa ação do cangaceiro Jararaca ---A família Saldanha ...................................................... •....................... 143 143 144 145 145 146 148 149 150 151 152 153 154 155 155 157 159 160 161 162 Capitulo IX O último encontro do capitão António Silvino com a policia............ Pensava em entregar-se ........................................................................ O fazendeiro não podia negar .......................................................... 0 capitão não teve coragem de matar-se.......................................... Viajou a cavalo quase morto ................................................................ Carregado numa rede como um defunto............................................. 165 166 167 168 169 170 ANEXOS 3— Nota publicada no Diário dP Pernambuco ................................. 4— Noticia do "Correio de Campinas"................................................ 5— Telegramas ao Alferes Teófanes Torres .. .... ....................... 6— Teófanes Ferraz Torres................................................................... 7— Fala de Helena de Moraes ............................................................ 8— Registro de óbito............................................................................. 9— Dados da Vida do autor................................................................. 175 176 3.77 179 181 181 182 impresso nas oficinas gráficas da COMPANHIA EDITORA DE PERNAMBUCO Rua Coelho Leite 530, Santo Amaro Recife, Fone: 231-3310 C.G. C. 10.921.252/0001-07 — Insc. 18.1001.01117-2 O "CENTRO DE ESTUDOS DE HISTÓRIA MUNICIPAL" "Há muitas perspectivas na investigação e no conhecimento do passado. Nem a grande História se teria escrito se não fossem os depoimentos humildes de pequenos observadores que se punham a registrar as coisas que viam,'sem bem saberem ao certo, algumas vezes, para que é que o estavam escrevendo. (...) Em nossas cidades modorrentas, onde não há bibliotecas nem se conservam papéis, o importante não é sonhar com investigações em arquivos monumentais que não tivemos nunca, ou com a elaboração de teorias grandiosas que só alguns mestres estarão em condições de empreender. O importante há de ser mesmo esse recolher de sementes que outros, de mais recursos intelectuais ou técnicos, classificarão e replantarão. talvez. Se estas reflexões são certas, titula mais úttl do que dar aos pesquisadores perdidos na indiferença ou na solidão, um apoio, um estímulo, um aplauso. E um meio de jazer o seu trabalho render um pouco mais". Assim pensava e escrevia em 1961 o professor Luiz Delgado ao propor ao Instituto Histórico de Olinda a criação de uma "Associação Intermunicipal de História", iniciativa que tornaria a empreender, nos fins da década, com a Comissão de História Local do Conselho Estadual de Cultura, onde conseguiu publicar quatro "Cadernos de História Local". Inspirada neste exemplo e nesta lição, a Fundação de Desenvolvimento Municipal do Interior de Pernambuco — FIAM — criou o "Centro de Estudos de História Municipal" objetivando, para usar ainda as palavras do professor Luiz Delgado, "congregar esses trabalhadores solitários que, em muitas de nossas cidades do interior, vivem voltados para o estudo da história local, esclarecendo datas, revivendo episódios, evocando personalidades". BIBLIOTECA PERNAMBUCANA DE HISTÓRIA MUNICIPAL próximos lançamentos: 11 — NAZARÉ, TERRA E GENTE Pé. Petronilo Pedrosa 12 — MACAPARANA CENTENÁRIA Geraldo Batista dos Santos 15 — O BANDOLEIRO, A FONTE E O FRADE Severino Moura 16 — HISTÓRIA DA VITÓRIA DE SANTO ANTAO (vol. II) José Aragão governo do estado secretaria de planejamento fundação de desenvolvimento municipal do interior de pernambuco — fiam