GAPRI - UEPB

Transcription

GAPRI - UEPB
N
Nota do Coordenador
PROFESSOR DR.
CARLOS ENRIQUE RUIZ FERREIRA
É
com satisfação que apresentamos o primeiro Caderno do Grupo de Análise Política e de Relações Internacionais (GAPRI) da Paraíba, uma iniciativa da Coordenadoria de Assuntos Institucionais e Internacionais
da Universidade Estadual da Paraíba (CAII – UEPB).
O GAPRI objetiva discutir, promover a formação e o intercâmbio de experiências sobre a Política e as Relações Internacionais com os diversos representantes da sociedade civil, entidades religiosas, universidades,
poder público e setor empresarial da Paraíba.
Partimos da convicção de que a internacionalização é um imperativo do período histórico contemporâneo
e, se feita de forma consciente, com princípios e metas delimitadas, qualquer atuação política e social tende
a ganhar no processo. No mundo de hoje, é incauto não conhecer as dinâmicas internacionais e não ter um
projeto de inserção internacional, seja ele de um município, estado, de um movimento social, das empresas,
universidades, dentre outros.
Também, o imperativo torna-se mais pujante devido à recente inserção internacional brasileira por intermédio,
principalmente, da chancelaria brasileira e da Presidência da República. O Brasil, sem dúvida, adquiriu a característica de um global player importante na região e no mundo.
Em virtude disso, o GAPRI foi criado e, vale salientar, com o apoio vigoroso da Magnífica Reitora Marlene
Alves. Procuramos assim, aportar para os representantes da Sociedade e do Governo como um todo uma discussão de alto nível na matéria, buscando promover uma atuação internacional dos mais variados setores da
Sociedade e Governo, consciente, objetiva e pró-ativa, a espelho, se quisermos, da Política Externa Brasileira
dos últimos anos.
Destarte, o Caderno GAPRI, edição Celso Amorim, que ora apresentamos, contém a transcrição completa
(com uma edição mínima, sem grandes alterações textuais) da palestra proferida pelo Embaixador Celso
Amorim, que se tornou Ministro da Defesa em solo paraibano. Sua palestra foi destinada a mais de 40 participantes, membros do GAPRI (ver Anexo I, sobre os participantes) na Estação Ciência, em João Pessoa, no dia
do aniversário da cidade, 05 de agosto de 2011.
A palestra teve como título “O Balanço da Política Externa do Governo Lula”. Tratou-se, realmente, de uma
aula magistral, de grande valia, que acreditamos merecer ser divulgada não apenas devido ao interesse acadêmico e especializado, mas também pela sua importância para os diversos setores da sociedade civil e poder
público que discutem e trabalham com temas atinentes ao sistema internacional e política externa brasileira.
Ademais, vale ressaltar que a palestra, e sua transcrição, pode ser vista por um ângulo histórico: o Embaixador
havia sido convidado pela Presidenta Dilma Rousseff para ocupar o cargo de Ministro da Defesa no dia anterior, 04 de agosto, em João Pessoa.
Essa edição do Caderno GAPRI contempla também as palavras iniciais da Magnífica Reitora da UEPB, Professora Marlene Alves, do então Secretário de Educação do Estado, Prof. Afonso Scoccuglia (ora representando o Governador do Estado da Paraíba, o Excelentíssimo Sr. Ricardo Coutinho) e as intervenções dos
representantes do Governo e da Sociedade paraibana proferidas depois da palestra e as considerações finais do
Ministro. Boa leitura e avante!
Prof. Dr. Carlos Enrique Ruiz Ferreira
Coordenador de Assuntos Institucionais e Internacionais
Reitoria - Universidade Estadual da Paraíba
A
bertura
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C
PROFESSOR DR.
CARLOS ENRIQUE RUIZ FERREIRA
Presidente da mesa
B
om dia a todos e todas, senhoras e senhores, autoridades, colegas, companheiros e companheiras. É
uma honra iniciar essa primeira edição do Grupo de Análise Política e de Relações Internacionais da
Universidade Estadual da Paraíba, que conta com a presença do Embaixador, Ministro, cidadão Celso
Amorim.
Então, gostaria de, em primeiro lugar, agradecer. Para nós é uma honra, uma glória e uma alegria tê-lo
aqui conosco. Todos nós agradecemos a presença do Embaixador Ministro. Depois, agradecer a presença de
todas e todos presentes e, de forma especial, à Reitora Marlene. Agradecer, de igual forma, todo corpo de
funcionários da UEPB e aos nossos alunos que fizeram com que essa reunião fosse possível.
Bom, eu vou tentar ser bem breve, porque, como vocês já sabem, o Embaixador, hoje Ministro, está
recebendo uma série de telefonemas para resolver questões administrativas de posse, de sua ida à Brasília,
possivelmente hoje ainda, etc. Então, vou encurtar muito o que iria comentar com vocês.
Primeiro, devo dizer que o GAPRI é uma iniciativa da Universidade Estadual da Paraíba, que visa
criar um espaço de formação, de intercâmbio de experiências e de sensibilização dos movimentos sociais, das
organizações não governamentais, do setor empresarial e do poder público para as relações internacionais.
Então, essa é uma primeira reunião.
S
e este projeto for interessante, se os segmentos sociais e o poder público acharem que isso vale a pena,
que isso deve prosseguir, então nós devemos nos sentar com calma, não hoje, num outro momento, para
vermos de que forma o GAPRI pode se operacionalizar. A discussão está aberta. Esse é um primeiro momento de reflexão desse espaço. Espero seguir conversando com cada um de vocês para amadurecermos essa
ideia.
Sobre o Embaixador, Ministro, cidadão Celso Amorim, é muito difícil fazer uma apresentação. Vou
tentar ser bem breve e um pouco heterodoxo. Acho que uma das virtudes que eu não podia deixar de mencionar do Embaixador, Ministro Celso Amorim, é a união entre sua atividade intelectual, entre a sua postura
enquanto professor, pensador e sua capacidade de ação prática, de homem de Estado, de gestor sem igual – e
isso não é dizer pouco. Nós, da Universidade, sabemos que essa junção entre a capacidade e rigor intelectual, o pensador, e a ação prática é muito difícil de ser conquistada, de ser encontrada numa personalidade de
Estado. Então, o Celso reúne esse rigor do pensamento com essa práxis política.
A outra questão, também, é uma espécie de virtude artística ou criativa do Embaixador Celso Amorim, que pode ser encontrada já nos discursos de 93, 94, na Assembleia Geral da ONU, quando ele foi Chanceler do Presidente Itamar. Rapidamente, eu só queria mencionar que podemos encontrar alguns embriões da
Política Externa que vieram a se concretizar com mais firmeza no governo Lula. Algumas posturas e visões
políticas já estavam lá, nos discursos do Celso Amorim, seja na Assembleia Geral da ONU, nos discursos
aos formandos do Itamaraty, etc. Ou seja, essa preocupação com a América do Sul, com os países africanos,
com a América Latina, tudo isso, de certa forma, já estava delineado em 93, 94. Então há, digamos assim, um
pensamento de vanguarda, uma criatividade, uma importância dessa figura de Estado, desde os anos 90 até o
período atual. Portanto, realmente, é um homem da República.
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Essa criatividade que, talvez pelo seu gosto pelo cinema, suas relações com as artes, talvez daí, tenha tido um
pouco a influência para essa criação que o Celso Amorim imprimiu nas Relações Internacionais brasileiras
nas últimas décadas. Obviamente que existe toda uma tradição, até uma espécie de linhagem do pensamento
político, de Política Externa do Brasil, que vem desde Santiago Dantas, Araújo Castro, Afonso Arinos, quiçá
Azeredo da Silveira e Celso Amorim. Mas a criação e essa forma protagonista realmente são ímpares no caso
do Embaixador.
Eu queria, novamente, agradecer a presença de todos e todas. É uma honra, glória e alegria tê-los aqui conosco. Passo a palavra para a nossa Reitora Marlene.
Professora
MARLENE ALVES
Reitora da UEPB
M
uito obrigada. Muito bom dia a todos. Bom dia, Ministro, seja
bem vindo à Paraíba! Primeiro eu quero, em nome da UEPB,
agradecer o convite feito a todas as entidades, às instituições que
se fazem aqui presentes nesse momento.
Ontem à noite, quando recebemos a notícia do nosso Embaixador,
que hoje está como Ministro, foi uma grande satisfação, principalmente
pelo trabalho que todos nós, reconhecidamente, sabemos do nosso Ministro Celso Amorim, considerado o melhor chanceler do mundo, eu creio que
no ano de 2009.
Eu também irei evitar fazer uma fala longa, por uma questão muito
objetiva: é óbvio que o tempo do Ministro hoje, cada minuto vale outro
tempo. O tempo é relativo por uma questão óbvia. Mas eu gostaria, Ministro, só de colocar um pouco de ousadia para apresentar, rapidamente, a
Universidade Estadual da Paraíba, uma instituição de 45 anos (e vocês estão
recebendo um selo comemorativo).
É, portanto, uma instituição que nasceu como autarquia municipal
e, em 87, foi transformada em Universidade Estadual. Em 2004, ela ganha um instrumento que fez com
que mudasse mais radicalmente a face da Universidade: uma lei garantindo a autonomia financeira da
Universidade Estadual da Paraíba.
Isso serve de ponto basilar, porque a universidade, a ciência brasileira, precisa sair de um patamar, precisa ser tratada como uma política de governo que não pode ficar atrelada a uma repartição ou à
lógica de uma repartição pública, ou estaremos correndo o risco de atrasar o desenvolvimento através da
ciência e da tecnologia.
Então, em 2004, esta Universidade, que não tinha um só programa strictu sensu de mestrado e
doutorado, em seis anos, conseguiu quinze programas, todos recomendados e reconhecidos pela CAPES,
e os primeiros doutorados. Também conseguimos a ousadia de ter o primeiro curso de Relações Internacionais na Paraíba, bem como a primeira Pós-Graduação, o primeiro mestrado do Norte-Nordeste
em Relações Internacionais. Entendíamos, desde aquele momento, que era importante essa discussão na
Paraíba e passamos a qualificar pessoas para enfrentarem esse debate.
Na outra ponta, e eu já vou encerrando, porque não vou perder a oportunidade de estar com
tantos representantes de tantos segmentos sociais e o Ministro e de ouvi-los, gostaria de colocar sucintamente uma questão importante: a resolução que nós aprovamos no dia 26 de julho, que eu acredito que
daqui a 20 anos, talvez, mude a face da Paraíba que, seguramente, será outra.
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Nós temos, na nossa base, uma discussão seríssima no Nordeste, mais precisamente no Estado, que é
a questão do índice de analfabetos, tanto no âmbito urbano, quanto no rural. Nós temos, e colocamos nesse
conjunto, aqueles conceitos de analfabetos totais e funcionais. Passamos, seguramente, da casa dos 47% e
a UEPB, que é uma Universidade do Estado, financiada 100% pelo povo da Paraíba, cria um componente
curricular chamado ‘Fundamentos Teóricos e Metodológicos do Letramento’, o qual se tornou componente
obrigatório para os cursos de Licenciatura e optativo para os de Bacharelado.
O que isso significa? Na prática, este aluno da Licenciatura – e hoje temos 18 mil – só irá concluir
oficialmente seu curso quando alfabetizar um número mínimo de paraibanos. A partir de 26 de julho, esse
componente será também uma contribuição dessa Universidade para a Paraíba.
E
ntão, a UEPB é uma universidade que tem rigor acadêmico e científico, que busca se consolidar como
um Polo de Desenvolvimento do Estado da Paraíba, mas que também tem toda uma característica de
retribuir e entender que precisamos mudar efetivamente pela base, com programas consistentes, a realidade
do povo paraibano.
Agradeço, mais uma vez, em nome da UEPB. Agradecemos muito a sua presença aqui. Isso fortalece o
nome da nossa instituição. Gostaria de agradecer ao professor Carlos, à professora Giuliana e toda a equipe de
coordenadores desse evento. Vocês podem imaginar o carinho, o trabalho e o zelo que eles tiveram, tão grande
quanto representa a sua figura, Ministro.
Muito obrigada e parabéns pela sua nova missão. Tenho certeza que será de importância fundamental
para o Brasil. Obrigada.
Secretário de Educação da Paraíba
AFONSO CELSO SCOCCUGLIA
Representante do Governador do Estado,
Ricardo Vieira Coutinho
B
om dia a todos e a todas. Bom dia, Ministro. Os agradecimentos já foram feitos, mas eu acho que não
custa mais um. Assim, agradeço, em nome da Secretaria do Estado e, em particular, do Governador
Ricardo Coutinho que, infelizmente, está com uma agenda em Brasília e não pôde estar presente.
Eu queria dizer duas, três coisas que, pensando exatamente no aspecto intelectual, que foi ressaltado
no começo dessa mesa, poderia num certo momento contar com a reflexão também no Ministro Celso Amorim.
O Brasil virou protagonista internacional, protagonista no sentido exato do termo, sob a batuta do
Ministro Celso Amorim e esse reconhecimento é visível. Nós vivemos numa época caracterizada como globalização, ou melhor dizendo, de ‘glocalização’, como expõe Ulrich Beck. Isto nos chama para tentar, ao
mesmo tempo entender, que as relações internacionais têm uma dupla face, ou talvez, até uma única face, em
relação ao que acontece localmente.
E
eu gostaria de inserir isso rapidamente: que papel ou quais papéis a educação, a escolarização
e, no caso, a educação da Paraíba teriam nessas relações que envolvem o local e o global? Como
a nossa Reitora acaba de dizer, nós estamos em parceria, focando com muito rigor a questão, por exemplo, do
analfabetismo, que é esse um dos compromissos do Governo. Mas claro que todos que estão aqui entendem
que esse não é só um compromisso local, mas um compromisso que transcende a Paraíba.
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Por outro lado, a gente na Secretaria de Educação focaliza muito
o Ensino Médio em relação ao trabalho. Todo mundo sabe que as relações de trabalho, de emprego, etc.,
mudaram muito nesses últimos anos.
Talvez seja um dos setores nos quais
mais existiram mudanças, justamente em virtude da questão da globalização.
Costuma-se dizer que o mundo do trabalho virou de ponta cabeça e quem faz educação está sempre
perguntando: ‘E aí, o que é que a
gente vai fazer?’. A escola que, por
exemplo, preparou para o trabalho e,
mal preparado, com a ótica da Revolução Industrial, já não pode mais
continuar nesse sentido. Então, para
que lado a gente vai? Um dos lados,
por exemplo, é o empreendedorismo
na educação, bem como dos egressos
das escolas de maneira geral.
O que eu queria ressaltar é
que esse é um ponto absolutamente
chave para entender, na minha visão,
as relações internacionais, que não
existem em si mesmas, mas que só
ganham essa dimensão quando elas
têm a interface com o local.
A
última coisa que eu gostaria de acrescentar é que o protagonismo brasileiro no mundo tem como uma de suas identidades
a diversidade. E essa diversidade não poderia estar melhor representada do que hoje de manhã, nessa mesa,
com todos os órgãos, as instituições, os movimentos sociais que compõem essa diversidade, fato que o Ministro das Relações Exteriores, o nosso Embaixador teve, promovendo o protagonismo no Brasil a partir dessa
identidade.
Durante muito tempo, vocês sabem, essa identidade tentou ser escondida e um dos protagonismos
brasileiros no mundo foi ressaltado a partir, exatamente, do contrário. Assim, mostrar que essa diversidade representa a nossa identidade maior é mais um atributo, mais um elogio ao trabalho do Ministro Celso Amorim.
Eu queria, portanto, com essas palavras repetir as boas vindas, em nome do Governo do Estado, ao
Ministro, que essa seja a primeira de muitas vindas à Paraíba, tendo essa maravilha do Niemeyer como o local
adequado para isso. Obrigado.
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PROFESSOR DR. CARLOS ENRIQUE RUIZ FERREIRA
Presidente da mesa
O
brigado a todos e a todas. Eu acho que seria interessante, para que o Ministro tenha ciência, que
todos os movimentos, universidades e setor empresarial aqui presentes, rapidamente fizessem
uma apresentação pessoal, dizendo o nome e a instituição que estão representando. Por favor,
de forma rápida. Acho que não vamos conseguir terminar a reunião como planejamos, com uma participação
mais efetiva dos movimentos, segmentos e do poder público, mas acho que seria interessante essa apresentação para a gente ter a dimensão da representatividade da sociedade paraibana aqui presente. Então, de forma
breve, por favor.
(Listas de participantes em anexo)
PROFESSOR DR. CARLOS ENRIQUE RUIZ FERREIRA
Presidente da mesa
Obrigado a todos e a todas. Passo a palavra para o Embaixador Ministro Celso Amorim.
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P Palestra
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C
Embaixador:
CELSO LUIZ NUNES AMORIM
Ex-Ministro das Relações Exteriores
Ministro da Defesa da República Federativa do Brasil
E
m primeiro lugar, é um grande prazer estar aqui
na Paraíba, em João Pessoa, no dia do aniversário
da cidade, sendo duplamente homenageado nessas circunstâncias¹. Novamente, queria agradecer à Reitora não
só por suas palavras, mas por seu convite – transmitido através
do Professor Carlos Enrique – e também dos Secretários aqui,
inclusive o Secretário de Educação, representando o Governador.
Obviamente não posso mencionar um por um, porque são
muitas pessoas, mas é um grande prazer ter um leque tão amplo
da Sociedade, de Órgãos do Governo, de várias entidades. Não
vejo ninguém da área militar.
Como vocês sabem, estou num momento de transição.
Quando aceitei esse convite, eu era um ex-ministro mais dedicado à reflexão e ao diálogo. Ao diálogo continuarei sempre a estar,
digamos um diálogo muito livre. Inclusive tenho uma coluna na
Carta Capital que eu denominei Radical Livre. Acho que isso eu
não vou poder continuar sendo: radical livre. Não sei se posso
continuar a ser radical. Livre espero continuar a ser, mas, obviamente, sempre dentro dos parâmetros de quem faz uma política
de Estado, para quem serve à um Governo.
Então, é um momento um pouco especial para mim, até
do ponto de vista psicológico, porque essa transição impõe, naturalmente, algumas outras reflexões. Meu pensamento, de alguma
forma, já devia estar se concentrando naquilo que eu vou fazer, naquilo que eu fui convidado pela
Presidenta Dilma para fazer. Mas eu não quis cancelar esse evento. Primeiro, porque eu tive a notícia
mesmo, certa, dada pela própria Presidenta, ontem à noite, quando já estava jantando aqui, à beira-mar, num restaurante muito agradável, que não sei se por uma coincidência trabalhada, chamado
‘Olho de Lula’.
Mas enfim, o fato é que eu estava lá jantando quando a Presidenta me ligou e me convidou.
Seria, digamos, muito indelicado desmarcar o evento, dois eventos, já que terei mais um hoje à tarde
e ao mesmo tempo tiraria o prazer de estar com essas pessoas. Mas, naturalmente, não posso deixar
de dizer a vocês que minhas reflexões agora não sejam tão excitantes quanto talvez pudessem ser se
eu estivesse falado como uma pessoa, digamos, de fora do Governo.
¹Nota do editor. Optamos por colocar em rodapé: “Bom, antes de começar, eu vou pedir um favor: que fechassem essas
quatro primeiras cortinas que ficam bem de frente para mim, porque senão, não vejo o rosto das pessoas, que ficam
ofuscadas pelo sol. Eu acho que mesmo assim vai continuar suficientemente claro. Eu gosto muito de ver o rosto das
pessoas com quem estou falando”.
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Evidentemente, também não é uma diferença tão grande, porque tendo servido oito anos como
Ministro das Relações Exteriores do Presidente Lula e um ano e meio com o Presidente Itamar Franco,
lidei muito com as questões de defesa, com as questões que dizem respeito à estratégia nacional, que,
de alguma maneira, se casam. E, concretamente, também, em questões como a do Haiti, para citar
apenas uma das operações de paz, talvez a mais relevante que estivemos envolvidos até hoje – na qual
lidei diretamente com as Forças Armadas, claro, sempre respeitando a competência do Ministério da
Defesa.
Mas, então, eu vou tentar, de uma maneira breve, resumir um pouco o que eu acho que
há de mais importante na política externa nesses últimos oito anos e os desafios que existem.
Vou fazer isso até pedindo desculpas virtuais, porque não pude falar ainda com o Ministro
Patriota. Evidentemente, mais uma vez, uma coisa é falar como observador e outra como um
membro do Governo. Terei cuidado, sem perder, talvez, a franqueza e o rigor analítico que
me foi imputado².
Bom, eu diria o seguinte: como já foi dito aqui, o Brasil mudou de patamar nas
relações internacionais nos últimos oito anos. Não há dúvida sobre isso. É até interessante,
porque muitos críticos da política externa aceitam isso e, até quando tem de criticar alguma
ação atual, eles dizem: ‘Não, o Brasil agora está em outro patamar. Não pode fazer tal coisa,
não deve fazer tal coisa’. O que é curioso, porque quando dizíamos que íamos passar para
outro patamar eles diziam: ‘Não, isso é megalomania. O Brasil tem de cuidar aqui das suas
coisinhas e não pode se aventurar em projetos mais ambiciosos’. Mas isso não há dúvida. Então, o que é que basicamente foi responsável por essa mudança?
De uma maneira muito sumária, eu descreveria: primeiro a consolidação da democracia.
Eu acho que o Brasil, nos últimos vinte e poucos anos, consolidou a democracia, o que é algo
absolutamente extraordinário e fundamental para nossa ação internacional. Alguém, acho que
o Professor Carlos Enrique, citou aqui outros: o Ministro Araújo Castro, que foi o último Ministro de João Goulart... Este Ministro costumava dizer, já depois desse período, que o Brasil
tinha ‘hipotecas’ em sua política externa. Então, uma das ‘hipotecas’ era essa: a falta de democracia. Você não podia falar muito alto sobre certas coisas, porque você tinha telhado de
vidro em muitos sentidos. Então, a consolidação da democracia foi um aspecto fundamental
para o respeito que os outros países têm pelo Brasil – além de, naturalmente, ter contribuído
de forma decisiva, para o aumento da autoestima dos brasileiros, o que também é um fator
importante para a nossa ação internacional.
Esse é um processo longo, que não se iniciou no governo Lula. Ele vem de longa
data, desde o governo Sarney, e foi se aprofundando. Tivemos uma eleição presidencial. O
primeiro presidente eleito por voto direto sofreu impeachment. Isso também era outro trauma
que poderia ter acarretado um retrocesso. Mas o Brasil soube viver esses momentos e soube
transpor esses momentos – e a cada dia foi consolidando essa sua vocação democrática.
²Nota do editor. Neste momento o Ministro detalha questões operativas que optamos deixar em nota de rodapé: “Me
desculpem, previamente, se tiver alguma interrupção. Eu dei até algumas instruções. Não é qualquer telefonema
que eu vou receber, mas, naturalmente, se for um telefonema do Palácio, alguém que eu tenha que receber, obviamente... Eu quando fui, em uma época da minha vida, presidente da Embrafilme, eu dizia para minha secretária
que tinham três ‘M’, que eram as ligações que ela tinha de me passar diretamente. Eram: mãe, mulher e Ministro.
Hoje, infelizmente, minha mãe já não é mais viva, minha mulher é uma das pessoas que eu terei que atender e a Presidenta ou algo que tenha diretamente a ver com as providências administrativas para a minha posse que, provavelmente, será na segunda-feira. Mas como já está no Diário Oficial, eu já sou Ministro da Defesa, embora não empossado,
eu sigo por essa situação um pouco peculiar e, de certa maneira, esdrúxula, de falar sobre um tema de uma perspectiva diferente daquela que eu provavelmente terei, no ponto de vista funcional, num futuro próximo”.
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O outro elemento que é importante também, não se pode desconhecer, é o fato de que o Brasil, de
vinte, quinze anos para cá, passou a ter uma economia estável e, mais recentemente, com crescimento econômico. Isso também é importante.
Eu vivi uma grande parte da minha vida adulta e de criança – já como criança, percebia isso, porque
a mesada não dava no fim do mês – a inflação. Isto é uma fonte de instabilidade, não só financeira, mas
também psicológica. Tal cenário gera uma atitude de necessária timidez diante das relações internacionais.
Então, isso também foi outro passo importante que se consolidou como um objeto primeiro de ação
do governo do Presidente Itamar Franco, com quem tive a oportunidade de trabalhar. O então Ministro, Fernando Henrique, foi responsável também pelo Plano Real, depois se consolidou no próprio governo. Mas o
país ainda estava ameaçado, porque a credibilidade externa do Brasil ainda era muito discutida.
É até curioso notar isso, porque a gente lê os comentaristas internacionais falando de como o Brasil
evoluiu dos problemas que enfrenta hoje, mas de natureza totalmente diferente. Mas eu era Embaixador em
Londres, na época do período eleitoral em 2002, e a percepção de alguns comentaristas... Não digo nem esses comentaristas mais, digamos assim, com aspas ou sem aspas, neoliberais, mais críticos da economia em
geral, de uma visão mais aberta, como é o Martin Wolf, por exemplo, um economista muito conhecido, que
escreve para o Financial Times e acho que, agora, é até da Câmara dos Lordes... E ele dizia: “O Brasil não
resistirá à má relação entre dívida e PIB – Produto Interno Bruto”. Ele dizia que, se o Serra fosse eleito, o
Brasil ia quebrar em, sei lá, cinco anos. Os anos não são precisos. Se fosse o Lula, ia quebrar imediatamente.
Então, essa era a visão que havia: o Brasil ia quebrar de qualquer maneira, só não se sabia quanto tempo
levaria.
P
ara ele, o Lula levaria a uma falência imediata. Mas, ao contrário, o Brasil se consolidou com
uma estabilidade econômica e se criaram bases, inclusive, para o crescimento econômico. Então, esse é o segundo fator importante para que o Brasil pudesse atuar no mundo de uma maneira mais
livre. E, usando uma palavra que, talvez, depois eu possa voltar a ela: desassombrada. Eu gosto muito da
palavra desassombrada, porque desassombro significa não ter medo da própria sombra. E o Brasil antes
tinha medo da própria sombra, e isso foi uma das coisas que mudou.
B
em, e o terceiro fator também muito importante, tendo em conta que todos esses fatores estão
ligados, que se desenvolveu de forma muito mais clara no governo Lula, foi a diminuição da desigualdade. Porque a maior chaga da sociedade brasileira é a desigualdade. E, ocorresse o que ocorresse
no Brasil, com crescimento ou sem crescimento, eu não posso dizer com inflação ou sem inflação, porque
era sempre com inflação, mas enfim, no Brasil, a desigualdade aumentava.
Há um famoso índice que os economistas conhecem, que é o índice Gini, e esse sempre piorava. Eu
tomei conhecimento dele ainda na época do Governo Militar. Eu estava vivendo no exterior e me lembro de
um economista americano, Alfred Fishburne, que, estudando o problema da distribuição de renda no Brasil,
apontava esse fato, de como a distribuição de renda era ruim e piorava.
Acredito que essa mudança tenha sido basilar, claro, sem diminuir a relevância do crescimento, a
consolidação da democracia, o diálogo com os movimentos sociais, dentre muitos outros aspectos. Essa
consciência de que era preciso diminuir a desigualdade no Brasil, desigualdade de gênero, de raça, de classes sociais... A consciência disso e o fato de que isso tenha sido mudado na prática, não só os trinta milhões
que passaram para a classe média, mas a diminuição da pobreza, da pobreza extrema, foi um fator fundamental para a mudança de percepção que o mundo tem hoje do Brasil.
Mas não só isso. Mesmo antes dessa mudança se operar plenamente, o fato de que nós estávamos
empenhados nesse projeto, um projeto que procurava transformar o Brasil em um país mais igualitário, mais
justo, também melhorou nossa disposição, e isso foi percebido fora. Então, aí eu me lembro de um fator. Eu
citei três, mas tem um quarto fator que é o fator psicológico, e é muito importante, sobretudo, na política
externa. Você não pode desprezar o fator psicológico que é a autoestima.
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Lembro-me que nos primeiros dias tive de falar publicamente como Ministro escolhido, não ainda
nomeado, mas escolhido pelo Presidente Lula, numa cerimônia pública. Não tinha nem conversado muito
com o Presidente. Tinha tido umas duas conversas em que eu mais falei do que ouvi. Eu ainda não tinha uma
orientação precisa, mas iria falar para alguns Ministros em um curto período de tempo, e me concentrei no
aspecto da atitude.
P
orque, como não ia poder tratar de todos os temas (ALCA, OMC, Conselho de Segurança, Iraque,
etc.), que seriam tratados no discurso de posse, me concentrei na questão da atitude e disse que,
sendo necessário, o Brasil iria ter uma política altiva e ativa, porque eu achava que isso, realmente, estava
sendo necessário. O Brasil precisava mudar sua atitude externa.
A eleição do Presidente Lula que, de certa maneira, realizou aquilo que o Presidente Obama nos EUA
se propôs a fazer – não sabemos se eles realizarão ou não – mas o fato do ‘Sim, podemos’ é significativo. A
eleição do Presidente Lula já representava isso. Ela não teve esse slogan, mas podia ter tido:
N
ós podemos’. Nós podemos eleger um operário metalúrgico, líder de um Partido dos Trabalhadores, líder sindical, como Presidente da República e nós podemos, com esse líder, transformar o
Brasil. Então, essa percepção de que isso tava acontecendo, de que isso ia acontecer, sem dúvida foi, talvez,
o fato mais importante, pelo menos no meu espírito, para poder atuar na política externa.
Porque de início, claro que havia temas como a ALCA, que gerava polêmica, outras questões
que eram de ordem do dia, como o Iraque. Mas na realidade, se eu fosse tomar tema por tema, não
teria ainda tido uma definição completa de tudo que poderia mudar na política externa.
Eu tinha noção de que certas coisas tinham que ser objeto de uma nova ênfase: a integração
da América do Sul, por exemplo. Pouco se falava em América do Sul em geral, só mais de América
Latina, que na realidade é América Latina e Caribe, que é, digamos, um ideal.
Nós temos que integrar aquilo que é integrável, na medida do possível, que é América do Sul.
Por isso, foi esta a ênfase durante todo o governo Lula, sem menosprezar a América Latina e Caribe.
Inclusive, o Presidente Lula fez a primeira reunião de líderes da América Latina e Caribe, na Costa
do Sauípe, dos líderes e presidentes, Chefes de Governo de Estado
da América Latina e Caribe. Foi a primeira. Então, ele efetuou
reuniões específicas com o Caribe, nossa presença mesmo no Haiti... Enfim, relações muito boas com outros países: Cuba, óbvio,
México também. Então, não é que não tenha tido interesse, mas
integração de imediato tinha de ser o que dava para integrar, talvez, que é América do Sul. Então, esse aspecto era óbvio.
O outro aspecto que era óbvio era que a ALCA, que estava
sendo negociada, tinha de ser redefinida. Não se tratava, digamos,
só de rejeitar a ALCA em qualquer hipótese. Se pudéssemos transformar a ALCA numa negociação que fosse aceitável para nós,
que preservasse a nossa capacidade de desenvolvimento industrial,
tão importante e que está se revelando agora, novamente, com essas ações recentes do Governo, talvez fosse possível. Se houvesse
a possibilidade de fazer contas governamentais sem estar sujeito
a um ou outro tipo de regra, capacidade de dar incentivo a indústrias de várias formas, então, obviamente, era necessário ter uma
rediscussão das bases em que a ALCA estava colocada.
Nós tentamos fazer, depois não deu certo e ALCA hoje em
dia é história. Mas de qualquer maneira, havia uma necessidade
óbvia do Brasil de ter uma postura em relação à ameaça iminente
de invasão do Iraque e nós tivemos essa postura, e havia também,
digamos assim, a percepção de que as nossas relações com a África tinham ficado desprezadas nos últimos anos.
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Claro que se você perguntasse a qualquer Ministro, vamos ser justos aqui com meus antecessores,
eles todos diriam: ‘Não, não, o Brasil tem muito interesse na África’. Mas acontece que tinham um interesse que era teórico, abstrato. Na hora de viajar, viajavam para Paris, Londres, Nova Iorque, mas não para
a África. Eu não vou fazer a contabilidade e nem me interessa, mas se você comparar o número de vezes
que o Presidente Lula esteve na África, o número de países que ele visitou é, provavelmente... Não, eu diria
certamente, mais do que todos os antecessores somados. E eu também nunca fiz a conta do número de vezes
que eu estive na África, mas eu devo ter ido mais do que os meus antecessores também. Eu visitei todos os
países que o Presidente Lula visitou e ainda alguns outros, naturalmente, na minha função de Ministro do
Exterior, sendo que alguns várias vezes. Isso era uma coisa que a gente também precisava mudar.
Mas, outros aspectos foram surgindo com o tempo. Como é que o Brasil se posiciona com relação
à questão da Rodada de Doha, da Organização Mundial do Comércio? Nós tínhamos consciência de que o
principal problema que a Rodada de Doha tinha que resolver era o problema dos subsídios agrícolas, pois
eles prejudicam muito tanto a grande propriedade, quanto a pequena nos países em desenvolvimento. E por
isso, por ter essa consciência, justamente porque o Brasil se compõe desses dois lados, nós pudemos armar
uma colisão, a qual recebeu também o nome de G-20. (Não é o G-20 depois dos presidentes, o qual teve
uma grande influência nas discussões da Rodada de Doha, na Organização Mundial do Comércio). Essa
coalisão foi, talvez – à parte de algumas ações do país com relação à ALCA - o primeiro ato público reconhecido internacionalmente em que o Brasil disse a que veio.
O governo Lula disse a que veio nas relações internacionais quando criou esse G-20 e disse: ‘Nós
não vamos aceitar um mau acordo’. Porque o hábito era esse: os Estados Unidos e a União Europeia faziam
um acordo entre eles, depois chamavam o Canadá e o Japão, formavam um grupo que eles chamam de ‘4’,
uma espécie de G-4, e depois os outros iam aderindo. Ficavam: ‘Essa coisinha aqui que a gente pode oferecer para a Índia. Isso aqui para o Brasil’. Muito pouco a oferecer, em geral, como pude comprovar.
Eu fui negociador da Rodada do Uruguai durante um tempo, quando fui Embaixador em Genebra.
E não estou falando isso, portanto, em crítica a ninguém. Era a contingência da vida. Às vezes, você queria
endurecer uma posição um pouco e um telefonema direto para o Presidente da República e você recebia
uma ordem: ‘Olha, maneira aí’. Então, evidentemente, as limitações eram muito grandes, e em Cancun, nós
pudemos organizar esse grupo, resistir às pressões, que eram muito grandes, porque é muito difícil numa
negociação comercial você chegar e dizer: ‘Não, esse acordo não serve e nós não vamos permitir que ele
ocorra.’
Você precisa ter cautela e coragem, porque a dinâmica toda da negociação, que já vinha de algum
tempo, leva no sentido contrário e nós fizemos isso. Fomos muito criticados pela mídia brasileira, pela mídia internacional, mas, hoje, todos reconhecem que isso foi fundamental para mudar o perfil da Organização
Mundial do Comércio. Infelizmente, para outros talvez não. Mas, enfim, a Rodada de Doha não concluiu,
mas pelo menos não concluímos com uma Rodada que fosse negativa para nós e temos a esperança de algum dia, quem sabe, quando houver uma melhor liderança dos países ricos, que a gente possa concluir uma
Rodada que beneficie não somente o Brasil, mas países mais pobres, países da África, por exemplo.
L
embro também dos países do algodão... A Embrapa está aqui? Eu visitei vários países da África e outros que fazem parte do que é chamado ‘Os 4 do algodão’. A sigla em inglês se chama
‘Cotton 4’, inclusive alguns deles estiveram aqui na Paraíba para ver os trabalhos da Embrapa, e esses
países sofrem terrivelmente com os subsídios dos Estados Unidos e da União Europeia, mas, sobretudo,
dos Estados Unidos, nesse caso.
E não adianta implantar, nem dar assistência técnica, porque você não consegue competir
com o Tesouro Americano. Só os republicanos e democratas é que conseguem competir com ele.
Nós não temos condições. Então, a eliminação dos subsídios agrícolas, dos subsídios europeus é
muito importante em outras áreas como a do açúcar, por exemplo. Então, a eliminação ou, pelo
menos, a redução substancial desses subsídios era um aspecto fundamental e não fizeram parte do
acordo de Cancún. Por isso tivemos que dizer: ‘Assim nós não vamos fazer’.
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Queriam que nós fizéssemos concessão de produtos industriais, que nós fizéssemos concessões
em regras de investimento, concessões em compras governamentais e o que estava sendo oferecido em
agricultura, em relação aos subsídios, eram promessas vagas, linguagem ambígua, lista de produtos
que ainda iam ser definidos.
Bem, graças a essa aliança que juntou países como o Brasil, a Argentina, países que são altamente competitivos na área agrícola, com países como a Índia, que tem base na agricultura familiar e
na pequena propriedade, países como a Tanzânia, que é um país de menor desenvolvimento relativo,
para citar apenas alguns. Tem vários outros da América Latina e da África. E com base nesse grupo,
nós conseguimos, primeiro, impedir um mau acordo e, com o tempo, foi visto que o nosso papel não
era só o de impedir o negativo, mas também de construir o positivo.
Fomos chamados de novo para a negociação e as coisas foram avançando. Enfim, não vou
contar a história da Rodada de Doha, porque é uma história muito monótona e todo mundo vai dormir
antes de eu chegar no meio do capítulo. Mas só para dizer: várias coisas positivas ocorreram, como
por exemplo, o compromisso com a eliminação total dos subsídios para a exportação. Faz parte dos
acordos de Hong Kong, que são de 2005. Depois surgiram complicações várias, sobretudo durante a
transição do Presidente Obama e não se conseguiu concluir a Rodada até hoje.
Veio a crise, Lehman Brothers, que
tornou ainda mais delicada a situação.
Agora são outras crises. Então, não sei
quando ocorrerá. Mas no dia que ocorrer, não será aquela Rodada negativa
para o Brasil, que adiará a solução dos
problemas que estavam colocados.
A mesma coisa em relação à
ALCA. Nós, como eu já disse aqui,
passamos por negociações às vezes
difíceis, porque toda a trama da negociação... Não estou usando a palavra
trama aqui no sentido conspiratório,
estou usando como uma metáfora.
Todo tecido das negociações estava
feito de tal maneira que era muito difícil para que os nossos interesses fossem levados em conta. Por quê? Porque no acordo da ALCA, nas negociações da ALCA, estavam
envolvidos países que ou já tinham feito Acordo de Livre Comércio com os EUA, como era o México,
ou já tinham feito todas as concessões difíceis. O que o Brasil viesse a conceder era ganho líquido para
eles, porque abria o mercado e, ao mesmo tempo, politicamente, ainda ajudava a justificar o que eles
tinham feito antes.
Porque houve muitas críticas posteriores no México e, digamos, um país grande como o Brasil
vir a fazer concessões semelhantes como eles haviam feito, seria um ganho político. E outros países
também, porque eram países pequenos – longe de mim o desprezo pelos países pequenos, mas a verdade é que, do ponto de vista econômico, eles têm interesse é no produto. Quer dizer, uma pequena cota
de açúcar, uma pequena cota de produtos têxteis é suficiente para que um país da América Central, por
exemplo, se dê por satisfeito. Eles não têm pretensão de desenvolver uma indústria de medicamentos,
uma indústria de softwares – a maioria deles pelo menos, não estou dizendo todos – uma indústria de
bens de capital. Já o Brasil tinha e tem. Vocês que têm um polo tecnológico aqui na Paraíba, sabem da
importância inclusive do apoio do Estado a isso.
Então, eu diria que essas ações iniciais e outras, como a criação de novos fóruns de discussões,
como o Fórum IBAS – Índia, Brasil e África do Sul, foram fundamentais. A sugestão do IBAS surgiu
no segundo dia de governo, juntando três países em desenvolvimento, três democracias multirraciais,
multiculturais, multiétnicas, uma em cada continente do mundo em desenvolvimento. Tudo isso foram
coisas muito importantes feitas no governo Lula.
16
D
epois, a abertura para com os países árabes, a Cúpula do Brasil dos países árabes...
O Brasil tem dez milhões de descendentes árabes e nós fizemos isso sem hostilizar
Israel. Claro que nós defendemos os legítimos direitos do povo palestino, como defendemos até
de maneira mais enfática: o Brasil reconheceu o Estado Palestino nos últimos dias do governo
do Presidente Lula, nos últimos meses, depois já da eleição. Mas com respeito também a Israel,
porque sabemos que é preciso diálogo, que essas coisas são resolvidas também por diálogo.
Então, foram tomadas várias atitudes desse tipo. O Brasil, quando veio a crise financeira
global, estava preparado para enfrentá-la, graças, em grande parte, a essa diversificação de parceiros. Quer dizer, o Brasil não dependia de um único mercado.
O fato é que, para eles, talvez não tivesse muita alternativa. Não sei, não me cabe julgar.
Mas o fato é que o comércio do México com os EUA, já antes do NAFTA, era mais de 70%. Hoje
em dia é 90%. Mas o Brasil tinha uma diversificação e nos interessava aumentá-la. E aumentou
mesmo. Quando nós fomos à África pela primeira vez, na primeira grande viagem que o Presidente Lula fez à África, tivemos muita crítica: ‘Ah, por que está perdendo tempo’, ‘Uma bobagem!’.
Inclusive do ponto de vista da identidade nacional, essa viagem era importante, no sentido político mais profundo da palavra, sociológico, eu diria.
Mas além desse interesse sociológico, político, há também um bom negócio. Nosso comércio com a África aumentou durante o governo Lula, multiplicou-se por cinco. Caiu um pouquinho
com a crise. Está se recuperando... Não sei se já se recuperou, porque eu não tenho as últimas
estatísticas, pois uma das coisas que você descobre quando deixa de ser Ministro é que as informações param de fluir. Enfim, quintuplicou e a África... Eu gosto de dar esse número porque é
muito expressivo: Se a África fosse um país isolado, nos números de 2008, se eu não me engano,
ela seria o nosso quarto parceiro comercial.
Calestous Juma, uma pessoa muito inteligente, criou uma frase que eu acho excelente, que
acho muito gratificante, que nós não poderíamos ter inventado uma frase melhor se quiséssemos
fazer propaganda da nossa cooperação técnica, ou das possibilidades de cooperação técnica: ‘Para
cada problema africano, há uma solução brasileira’. Eu não sei se é totalmente verdadeira, mas é
muito bonita a frase e é muito estimulante para que haja essa cooperação.
E
ntão, a percepção existe também do outro lado. Não é só o Brasil voluntaristicamente
querendo ir ao outro lado. Eu dei um nome de um artigo meu: ‘A África tem sede de
Brasil’. Foi a percepção que eu tive na minha primeira visita à África e que continua dessa forma,
e acho que até de maneira mais forte.
Bem, então, isso tudo gerou uma posição muito mais sólida do Brasil, quando houve a crise,
e nós estávamos mais preparados. Foi muito interessante ouvir também vários economistas, inclusive economistas liberais, digamos assim, que costumavam criticar certas opções políticas nossas,
política comercial, sobretudo, e disseram: ‘Não, o Brasil escapou da crise, por causa do mercado
interno’ – interessante também, porque eles não favoreciam tanto o mercado interno assim – ‘porque não depende de um único mercado ou de dois’.
O nosso comércio é altamente diversificado hoje em dia. O nosso maior parceiro comercial,
que é a China, representa 14% do nosso comércio. Os EUA, acredito, representa 10%. A Argentina está encostando, não sei se passará ou não os EUA esse ano. O MERCOSUL já é mais do que
os EUA em termos de parceria comercial.
Descobriram, por exemplo, quando começou a chamada “primavera árabe”, as erupções dos
países árabes, que o maior superávit comercial que o Brasil tinha de região por região era com os
países árabes. Também tinha sido objeto de discursos como: ‘Olha, isso aqui é bobagem, é o Presidente Lula querendo aparecer. O Celso... ’. Enfim, e agora essas coisas todas revelaram também
as suas vantagens concretas. Obviamente que isso não é a única
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coisa política, nem necessariamente a principal, mas é também algo importante.
Então, graças a isso tudo, e com isso eu concluo, a percepção do Brasil mudou a tal ponto,
que há poucas semanas, acho que umas duas semanas atrás, três no máximo, um Órgão americano muito conhecido (nós temos o professor Altemani, meu colega da UNB, que sabe muito bem
disso) que é o Council on Foreign Relations - Conselho de Relações Internacionais... Relações
Exteriores, criou uma força tarefa para estudar o Brasil e fazer recomendações sobre o Brasil.
E essa força tarefa tem várias conclusões interessantes. Isso deve existir num site. Quem
quiser consultar: Council on Foreign Relations, em inglês apenas. Até seria útil se fosse traduzido. Essa força tarefa chega a várias conclusões, inclusive recomenda que o Presidente Obama
apoie, não na maneira morna, mas de uma maneira decidida, a entrada do Brasil no Conselho
de Segurança. O que também a oposição sempre tinha dúvidas, fazia críticas, dizia que isso não
interessava, etc. Não só isso, mas o documento tem uma frase interessantíssima que diz assim:
‘Os EUA têm que se ajustar ao novo papel global do Brasil’. Aqui era sempre ao contrário: nós é
quem tínhamos que nos ajustar ao que os EUA pediam, ao que o FMI pedia, ao que os europeus
pediam, e agora não.
Eu fui muito criticado, o Presidente Lula também, por não termos concluído o acordo MERCOSUL União Europeia. Lá no início do segundo mandato do Presidente Lula, um pouquinho depois, a
União Europeia nos propôs uma parceria estratégica com o Brasil. Ela que propôs. Não fomos nós que
propusemos, ela que propôs. Em suma, a percepção que existe hoje, no mundo, do Brasil é totalmente
diferente. Eu acho que a percepção dos brasileiros também.
Nesses meses em que estive na planície, digamos assim, na planície mesmo, porque eu moro no
Rio de Janeiro, então eu fico longe do planalto, pude conviver com vários setores da sociedade e eu percebo que existe essa nova atitude, uma atitude de autoestima e eu acho que isso mudou para sempre a
face do Brasil para o mundo.
Não quer dizer que outros problemas não surjam, que outras dificuldades não apareçam, mas eu
acho que o Brasil mudou e mudou graças ao povo brasileiro, que soube enfrentar. Essas coisas todas não
foram dadas pelo Governo, foram conquistas, muitas delas. A batalha pela igualdade, mesmo a luta do
combate à inflação e à democracia foram conquistas do povo brasileiro. Claro que aqui e ali muitos líderes como o Presidente Lula, agora a Presidenta Dilma, e outros encarnaram essa luta.
Mas é isso o que eu queria dizer acima de tudo e dizer que, na minha nova função, eu pretendo
também continuar ouvindo a sociedade como fiz, de certa medida, na medida do possível, no Ministério
das Relações Exteriores. O fato de você tratar de uma Política de Estado, não quer dizer que você não
esteja tratando de assuntos e de interesses da sociedade, do povo brasileiro. Muito obrigado.
18
D
ebate
D
19
C
PROFESSOR DR: CARLOS ENRIQUE RUIZ FERREIRA
Presidente da mesa
Bom, eu vou abrir a palavra para os participantes. Eu acho que nós temos 30 minutos para as considerações dos
presentes. Vamos fazer um bloco de quatro inscrições. Seria interessante, pelo menos, termos a participação
dos setores, dos movimentos sociais, da sociedade civil, depois bloco empresarial, as universidades e o setor
público. Aparecida pediu a palavra.
APARECIDA RAMOS
Secretária de Desenvolvimento do Estado da Paraíba
Bom dia a todos. Bom dia Ministro. Eu quero parabenizá-lo. É uma alegria saber que se tornou Ministro na Paraíba, às vésperas do aniversário da nossa capital. Agradecemos sua presença, reconhecendo a
importância do trabalho que foi exercido no período em que esteve à frente das relações internacionais do
nosso Brasil.
T
ambém gostaria de parabenizar a UEPB. Quero dizer que não é à toa que nós temos uma reunião
tão representativa. Poderíamos estar aqui na condição de cumprir uma agenda formal do Governo
do Estado, mas, como podem ver, existem representação das Igrejas, das universidades, do Movimento dos
Trabalhadores, movimentos sociais e isso significa que o interlocutor, a UEPB, tem legitimidade e credibilidade.
Todos estão aqui trazidos pelas mãos da UEPB, e isso é algo que também eu gostaria de destacar. É
muito bom que seja por uma universidade, porque nós temos aqui a UEPB, a UFCG, UFPB que são universidades públicas, e no estado da Paraíba, essas Universidades, mais do que em qualquer estado do Brasil, possuem um papel fundamental como indutoras do desenvolvimento econômico e social do nosso estado. Então,
a UEPB está de parabéns.
Ministro, eu achei importante a sua fala e eu gostaria de dizer que o Brasil tem vivido, eu diria, de uns
dez, quinze anos para cá, um processo de grandes transformações. Transformações que têm assumido, em especial nas relações internacionais, grande importância. O Brasil tem aparecido, e eu acho que esse é o grande
ganho, não reproduzindo fala de outros, mas dizendo que pode e tem o que falar.
Esse é o grande elemento da política internacional e eu diria que o importante é aparecer. Eu vou puxar
um termo que foi colocado, o da desassombração. A gente só se desassombra quando a gente fala com a própria voz e não através dos outros.
Eu gostaria de colocar, aí puxando um pouco para a área em que eu estou à frente, o desenvolvimento
humano, ou seja, o homem na sua integralidade, a questão dos direitos humanos e o problema da miséria.
Talvez o Brasil só tenha se desassombrado frente a outros países, quando ele assumiu que tinha miséria e que
nós precisávamos dar conta dela – e a miséria tratada não meramente como uma questão ética ou como uma
questão moral, mas a miséria sendo tratada da seguinte forma: não existe desenvolvimento econômico, onde
boa parte da nossa população esteja totalmente fora de qualquer crescimento econômico. Então, trazer essas
pessoas para o cenário e dizer o seguinte: ‘Sem você não há aquecimento econômico interno’. Portanto, isso
tem uma consequência direta nas relações internacionais.
É fundamental. O desafio da pobreza extrema está colocado. A Paraíba é o quarto estado mais pobre
deste país. Se a Paraíba não cumprir as metas – e esse é um dos grandes desafios nossos – a Presidenta Dilma
não cumpre a meta nacional. Eu gostaria de finalizar a minha fala dizendo que o Governo do Estado da Paraíba
está assumindo esse desafio.
20
Entendendo, Marlene, que a miséria na Paraíba passa necessariamente por uma ação, uma gestão transversal entre os diversos órgãos,
inclusive as universidades.
Eu não posso incluir pessoas e, meramente, distribuir renda, que é um dos eixos, mas é um eixo. Eu costumo dizer assim:
quando eu vou colocando uma pessoa no Bolsa-Família, minha
preocupação já é de ter que tirá-la, porque isto passa pela educação. Eu não posso incluir sem educação, porque esses pobres
são analfabetos, desdentados, desqualificados profissionalmente
e a reversão disso é tarefa de Estado, tarefa de todos nós. Muito
obrigada.
PROFESSOR DR. CARLOS ENRIQUE RUIZ FERREIRA
Presidente da mesa
Pediu a palavra o representante do Sindicato dos Bancários. Por favor.
MARCOS HENRIQUES
Sindicato dos Bancários
B
om dia. Marcos Henriques, Sindicato dos Bancários, Central Única dos Trabalhadores. Parabéns, Ministro, pela
nova nomeação. Acho que muito do sucesso do governo do Presidente Lula se deve à sua atuação solidária com os países e uma
atuação muito altiva. Tenho algumas perguntas aqui.
Por exemplo, eu queria que o senhor falasse um pouco sobre
os acordos bilaterais. A gente sabe que, com a extinção da ALCA,
tivemos alguns acordos bilaterais que, grande parte do mercado interno se queixou por conta de muitos produtos que entram, principalmente da China. A gente sabe que, na balança comercial, a
China é um grande parceiro. Mas eu queria que o senhor falasse um
pouco sobre esses acordos bilaterais, como eles foram realizados e
o custo benefício para o nosso país.
Em segundo, eu queira saber também sobre a questão das
empresas que entram no Brasil, empresas multinacionais, como é
que é feita essa universalização, no que diz respeito ao tratamento
aos trabalhadores. Porque, recentemente, o HSBC, que é um banco internacional, está demitindo, vai demitir
mais de seiscentos trabalhadores, enquanto que em outros países a demissão praticamente não existe. Então,
se existe alguma trava para que esses bancos, não só bancos, mas como, por exemplo, a Wallmart, que é uma
empresa de mercado, como é feita? Se existe algum filtro, alguma relação a respeito do trabalhador brasileiro,
coisa que a gente não percebe dessas empresas que vêm ao nosso país, usufrui da nossa terra e tratam muito
mal os nossos trabalhadores.
E, também, eu queria que o senhor falasse um pouco sobre a questão da agricultura. A gente sabe que,
hoje, o Brasil tem uma grande parte de seu território com agricultura familiar. Eu queria saber se existe algum
programa para que esses pequenos agricultores possam exportar. Se existe alguma política no sentido de favorecer esses pequenos trabalhadores.
E, no mais, agradecer o convite. Acho que os setores sociais estão muito bem representados aqui. Eu
queria parabenizar e deseja muito boa sorte na sua nova admissão. Muito obrigado.
21
ODON BEZERRA
Ordem dos Advogados do Brasil- Secção Paraíba
E
u vou buscar ser o mais sucinto possível e objetivo, pelo adentrar da hora e para a participação de
outras pessoas.
Ministro, primeiro, parabenizar a Vossa Excelência pela futura investidura no cargo. Agradecer, em
nome dos advogados e do povo brasileiro, a sua atuação na política internacional.
A minha pergunta se dirige para duas questões: uma sobre política internacional e outra sobre segurança nacional, aquela que o senhor vai assumir a partir de agora.
É com a questão da Amazônia. Estive recentemente na Argentina e lá há uma preocupação sistemática
também daquele povo com relação à invasão da Amazônia. Eu falo da Amazônia brasileira e como vai ficar
a nossa soberania, porque ao que se consta e ao que se propaga, seria uma zona internacional. Como o Brasil
vai tratar essa política com os países vizinhos, essa questão da soberania nacional da questão da Amazônia e
como tratar os países vizinhos?
SOCORRO PIMENTEL
Movimento Negro na Paraíba
B
om dia a todos e a todas. Senhor Embaixador, Ministro. Sou Socorro Pimentel, do Movimento
Negro. Eu quero agradecer, em nome da nossa entidade, o
convite formulado para podermos estar aqui sendo representados.
Aqui foram feitas as suas falas. Parabenizo toda a
sua explanação e a da nossa Secretária Cida. Eu gostei das
duas falas com relação à etnia negra deste país. A identidade
de um povo sofrido no constante das lutas diárias.
Algumas falas foram importantes como focos: pobreza, escolarização, dignidade humana, exercício pleno da
cidadania. Partindo desses pontos e o que foi elencado pelas
falas do Ministro e da Secretária, eu questiono ao Ministro
e ao Embaixador até então: o que é que pode ser feito nessas
relações internacionais, sobretudo na relação Brasil-África?
Somos um país multirracial, multicultural, como falar de políticas afirmativas que venham a contemplar de fato
e de direito a população negra brasileira no tocante à saúde,
à educação? Há a questão, que falou a nossa Secretária, da
fome e da miséria. A fome e a pobreza têm uma cor, e essa
cor é negra.
Eu gostaria que o senhor se posicionasse com relação
a essas políticas. Sei que estão sendo implementadas, mas,
de fato, não acontecem para nós.
22
DILEI SCHIOCHET
Movimento Sem Terra e Via Campesina
G
ostaria de parabenizar também o novo Ministro. E nós, camponeses, dizemos assim: ‘Se o boi
soubesse a força que ele tem, não deixava botar cangaia’. E o nosso país, se ele soubesse a força... Nós somos um dos países mais ricos nesse momento histórico, por causa das riquezas naturais que nós
temos hoje concentradas.
Não dá para negar o avanço que houve. Enormes avanços no governo Lula. Mas me parece que temos
que ser um pouco mais solidários, com ações solidárias com os países. Por exemplo, nós do MST temos uma
brigada no Haiti, trabalhando voluntariamente. Pergunto: qual é a contribuição para esses companheiros que
estão lá, do Estado brasileiro?
Então, eu acho que a nossa relação não pode ser uma relação de mercadoria, simplesmente de comercialização, mas ela tem que ser, também, uma relação de solidariedade entre os povos. E aí a gente vai para
países mais pobres, como Cuba. Quando houve o terremoto no Haiti, no outro dia estavam lá milhares de
médicos cubanos, contribuindo. Então, às vezes, aqui no Brasil a gente tem um potencial, mas tarda muito
no sentido de contribuir com a solidariedade com esses países.
E por último, a Paraíba é o estado no Brasil que tem mais doutor por metro quadrado. Porém, é o
quarto estado com maior miserabilidade. Isso é vergonhoso. Se quisermos ter médicos ou profissionais,
temos que enviar para outros países, pela solidariedade que temos com esses países, como nós temos hoje
pelo MST cento e dezoito alunos fazendo Medicina em Cuba, porque a educação brasileira não nos permite
capacitar filhos de pobres para serem médicos – e isso já faz mais de oito anos.
Nós tínhamos uma expectativa que com governo Lula podia se revalidar esses diplomas desses
companheiros que retornam de Cuba para o Brasil para exercerem a profissão de medicina entre os pobres.
Eu acho que isso é um débito que esse Governo teria que rever com os pobres, para a gente melhorar a questão da educação, que ela é central para a resolução dos nossos problemas.
Dizia José Martí: ‘Conhecer é resolver’. Parabéns à UEPB, porque vai conhecer, mas também vai
contribuir para resolver os problemas do povo. Obrigada.
ITAPUÃ TARGINO
Tribunal de Justiça
E
u queria que o senhor falasse a respeito da participação
do Brasil na independência do Timor-Leste. Também,
gostaria de aproveitar a oportunidade para comunicar a Vossa
Excelência que o Tribunal de Justiça acaba de prestar uma homenagem ao grande paraibano Epitácio Pessoa, que serviu aos três
Poderes deste país, restaurando e reabrindo o Museu e a Cripta
de Epitácio Pessoa. Convidando-o, igualmente, a visitá-los. Muito obrigado.
PROFESSOR DR. CARLOS ENRIQUE RUIZ FERREIRA
Presidente da mesa
Eu passo a palavra imediatamente, então, para o Ministro.
23
E
Embaixador : CELSO LUIZ NUNES AMORIM
B
Ex-Ministro das Relações Exteriores
Ministro da Defesa da República Federativa do Brasil
em, eu vou tentar fazer uns comentários rápidos sobre as questões levantadas pela Secretária
do Desenvolvimento, Aparecida. Estou de pleno acordo com tudo o que ela disse. É muito
difícil você tratar dos direitos humanos sem tratar da miséria, da pobreza, da doença, porque
tudo isso se resume numa única palavra. Quando você fala nos direitos humanos, aparecem muitos direitos.
Você pode exercer um sem exercer outro? Não é possível. A palavra que eu acho que, a meu ver, resume
isso tudo é a palavra dignidade. Então, eu acho que para você ter uma vida com dignidade, você tem que
ter liberdade de expressão. Você não pode ser preso por suas opiniões, muito menos torturado, mas não
pode também sofrer fome, miséria, não ter acesso a medicamentos com preços baratos. Eu acho que tudo
isso faz um conjunto.
É claro que o Brasil tem tarefas enormes pela frente, ainda, para resolver. Recentemente, eu fui convidado para fazer uma palestra, quando eu era Ministro, sobre Joaquim Nabuco, e ele dizia que a escravidão vai projetar sua sombra por décadas e décadas e décadas na vida brasileira – e a gente sabe que é assim.
A escravidão, realmente, criou uns timbres de desigualdade que atingem principalmente o negro,
mas não só o negro. Quer dizer, na realidade tornou-se um paradigma de convívio social, que na realidade
não é um convívio, mas que aos poucos está sendo modificado. Mas toma tempo, por isso temos que nos
esforçar ao máximo. Estou de pleno acordo que a educação tem um papel central nisso tudo, porque é a
educação que vai possibilitar uma integração verdadeira. Não vou me alongar, porque estou apenas concordando com o que disse a Secretária.
Com relação às perguntas feitas pelo Henriques, da CUT. Bom, acordos bilaterais não é bem o caso,
porque os acordos que nós fizemos chegaram a um impasse. A nossa ênfase foi a de fechar acordos com
países da América do Sul. Então, o acordo mais importante que se fechou a esse respeito foi o acordo entre
o MERCOSUL.
O Brasil não pode negociar sozinho, porque fazemos parte daquilo que, tecnicamente, chamam de
União Aduaneira. Negociamos junto com a Argentina, Paraguai e Uruguai. Então, o que nós fizemos foram
acordos com outros países da América do Sul. E se você for olhar, também, o nosso comércio com esses
países aumentou muitíssimo, diferentemente do que ocorre em outros casos, inclusive da China, como
você mencionou, com grande participação de manufaturas nas exportações brasileiras, o que significa
também empregos no Brasil.
A questão da China não tem a ver com nenhum acordo. Inclusive foi muito propalado na época que
teria causado problema o Brasil ter declarado a China como economia de mercado. Isso nunca foi sequer
regulamentado, de modo que isso não é o que afeta. O que afeta são as condições, provavelmente, de trabalho da China, as condições de cuidado ou não com o meio ambiente, o problema cambial que agravou
muito nos anos recentes, porque a China manteve uma política de manter a sua moeda atrelada ao dólar e
com isso também se beneficiou com a desvalorização do dólar em relação ao mercado brasileiro.
Mas não se deve a nenhum acordo bilateral. Pelo contrário, eu acho que nós, não só no caso da
ALCA... Na prática, não é que ele não fosse um acordo bilateral, mas para nós o que interessava, tanto pelo
lado positivo, quanto pelo lado negativo, eram os EUA e, o fato de não termos feito o acordo da ALCA da
maneira como ele estava feito, proposto, e também de não termos concluído da maneira como se propunha
um acordo com a União Europeia, foi salutar ao país.
Apesar de termos sofrido muita crítica, porque toda a opinião, digamos, sábia do Brasil achava que
nós tínhamos que acelerar e que era errado colocar as nossas fichas na Organização Mundial do Comércio.
24
S
e nós tivéssemos fechado esses acordos, da maneira como eles haviam sido propostos, digamos, em 2003, 2004 e 2005, o impacto da crise financeira sobre nós teria sido muitíssimo
maior. Uma das razões pelas quais a crise não foi tão forte foi porque nós fortalecemos o mercado
interno, como eu já disse, com ações que talvez não pudéssemos tomar se tivéssemos fechado aqueles
acordos. Não digo todas, mas algumas, e também porque nós diversificamos os nossos parceiros.
Agora, sem dúvida, existe um problema efetivo no caso da China e dos EUA. As pessoas falam
muito da China, mas os EUA têm hoje um superávit comercial com o Brasil que é da ordem de oito bilhões de dólares. É o maior superávit que os EUA têm com o mundo, porque os outros dois que aparecem
na frente são o de Hong Kong e o da Holanda. Na realidade não é Hong Kong, que é uma forte saída da
China para ir a outros lugares, e a Holanda, que também é uma passagem para toda a Europa Central,
pelo Porto de Roterdã, como vocês sabem.
Na realidade, parece que o país que está próximo ao Brasil, em matéria desse tipo de déficit em
relação aos EUA, de superávit para eles, é a Austrália. Então, não é só a China. Quer dizer, é um problema um pouco mais estrutural e por isso nosso Ministro da Fazenda tem falado tantas vezes em guerra
cambial e desalinhamento de moedas.
Como isso não faz parte da minha pasta, eu me eximo de sugerir qual é a solução. Mas eu acho
que o que foi feito na política industrial vai nessa direção. Se vai se conseguir fazer tudo, ou se vai ser
necessário um pouco mais, o tempo dirá. Mas, de qualquer maneira, vai nessa direção.
Com relação às condições de trabalho nas multinacionais não há rigor. Quer dizer, há os acordos
da OIT. Os acordos da OIT obrigam os países. Mas, independentemente dos acordos da OIT, as multinacionais são obrigadas a seguir a legislação brasileira. Elas não têm como deixar de segui-las. Se há
defeitos na legislação brasileira que permitem ações aqui que elas não fazem em outros lugares, então
nós temos que, pelas lutas trabalhistas, modificar isso.
Isso não é, propriamente, objeto de um acordo internacional dizer: ‘Olha, você não pode fazer
aqui o que faz na Holanda’. Eu acho que nós é que temos que fazer essa luta e internamente mudar a legislação, se for o caso. Embora tenha sido até Presidente Conselheiro de Administração da OIT, na realidade, o que se procura lá é melhorar o padrão de defesa dos trabalhadores em geral. Não especificamente
para empresas multinacionais ou empresas nacionais. A nossa obrigação é atualizar a nossa legislação.
Com relação aos agricultores, inclusive de pequeno porte, nós sempre procuramos ajudar. Não
posso dizer que isso tenha sido perfeito, mas, digamos, nós sempre procuramos ter, inclusive nas delegações brasileiras, vários representantes da sociedade civil, inclusive agricultores familiares, e atuar sempre em conjunto com o Ministério do Desenvolvimento Agrário, que, digamos, filtrava e nos transmitia
essas preocupações.
O Brasil pôde adotar, nas negociações na Rodada de Doha, uma atitude que levava em conta, também, não só os interesses do agronegócio, mas também de agricultura familiar. Nossa preocupação, por
exemplo, com questões como dumping e várias outras que talvez tivessem dificuldades, por assim dizer.
Agora, talvez, ainda possa ser feito mais pela exportação. Na realidade, hoje sabemos que a agricultura familiar brasileira, se eu não me engano, responde a 70% do consumo de alimentos no Brasil,
o que é uma coisa extraordinária, por ocupar uma área muito pequena, mas na exportação, talvez ainda
tenha que crescer mais.
Na exportação, nós temos que enfrentar a competição dos preços internacionais. Eu diria que,
nesse aspecto também, a principal medida que ajudaria – e aí ajudou tanto o agronegócio quanto a agricultura familiar – é a eliminação dos subsídios, porque, como eu digo, uma coisa é você competir com
um produtor norte-americano ou com um produtor europeu, outra coisa é você competir contra o Tesouro
Americano ou competir contra os Tesouros Europeus.
Bem, com relação à Amazônia e às preocupações de segurança nacional, eu acho que elas são totalmente legítimas e diria até que, não só pela biodiversidade, com tudo o que nós temos para preservar,
onde nós somos quem devemos fazer. Mas eu diria o seguinte: não é que nós não tenhamos que estar
alertas. Temos que estar alertas, tanto nas fronteiras, quanto alerta no ponto de vista conceitual na discussão global. Não podemos permitir que se discuta sequer a uma possibilidade de internacionalização
da Amazônia.
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Aliás, na estratégia nacional de defesa que foi feita no governo
anterior, no do Presidente Lula, na qual, naturalmente, os Ministros
Jobim e Mangabeira Unger participaram mais ativamente – mas o
Itamaraty também esteve envolvido – menciona-se especificamente
a Amazônia como objeto de preocupação. Essa preocupação deve
se tornar cada vez maior, porque nós vemos que o recurso que está
se tornando escasso no mundo é o recurso água e o Brasil o tem em
abundância.
Eu mesmo ia participar. Não vou mais, não irei mais participar. Mas, enfim, sobre o tema da água, porque o tema da água é
um tema complexo, fascinante, tem muitos aspectos interessantes.
Tem aspectos diplomáticos, quando se discute, por exemplo, bacias
hidrográficas, mas tem um aspecto muito importante que é o de preservar a soberania sobre esses recursos – e existem, às vezes, conceitos
muito discutíveis, que são preparados. Não estou dizendo que eles estão aceitos, nem que serão aceitos,
mas tratar da água como que fosse assim, o que eles chamam de recurso global.
Há uma expressão em inglês “global resourses”, recursos globais, recursos da humanidade, digamos assim. Tudo bem, são da humanidade, mas são nossos em primeiro lugar. Nós é que temos que cuidar
deles. Eu acho que essa é que tem sido a atitude.
Nós temos uma preocupação sim: o Governo tem uma preocupação muito forte com a sustentabilidade. Eu acho que é importante que tenha. Espero que o Ministério da Defesa também possa contribuir
com essa preocupação legítima com a sustentabilidade, porque isso é parte do nosso patrimônio, mas somos nós que vamos cuidar dela. Podemos até ter alguma cooperação internacional, se isso for conveniente. Por exemplo, tivemos até com a Noruega, quando houve aquela tremenda tragédia, um tremendo ato
terrorista, marcado também por esse estigma de preconceito.
Mas, tivemos, temos um programa com eles em que eles se comprometem a repassar recursos que
têm que ser usados para o desenvolvimento sustentável também, em função de desmatamento que deixou
de haver. Isso é positivo, porque é uma coisa que nós fazemos pelo nosso interesse. Eles não ditam as regras, somos nós que fazemos, mas se o resultado for X e beneficia a nós e à humanidade, eles transferem
recursos e nós investimos em outros projetos de desenvolvimento sustentável. Essas foram duas decisões
totalmente soberanas a esse respeito.
Bem, eu acho que o governo Lula fez muito pela causa dos negros no Brasil, mas eu concordo plenamente, há muito ainda o que fazer. Eu vou lhe dizer francamente: eu fui Embaixador na ONU e Ministro,
fui Embaixador em Genebra. Eu, frequentemente, quando se discutia
uma questão ligada a preconceito racial, ficava meio envergonhado,
porque na delegação brasileira não tinha nenhum negro e ninguém
que se considerasse negro. Quer dizer, a gente falava muito de democracia racial, mas se olhava em volta... não havia nenhum negro assumidamente negro. Quer dizer, nós todos somos misturados, graças
a Deus, mas não tinha nenhum. Essa mistura era um lado positivo,
mas isso também serviu muitas vezes de desculpa para não se fazer
o que é necessário em matéria de ação afirmativa.
Então, na minha posição pessoal, eu acho que, digamos, não
sei em que medida isso poderá se aplicar às Forças Armadas, terei
que estudar ainda. Mas a minha posição pessoal sobre esse tema é
que sim, nós temos que ter ações afirmativas. E eu ajudei a criar ou
desenvolver algumas no próprio Itamaraty: as bolsas de estudos para
estudantes afro-descendentes que temos hoje. Eu tinha um assessor no
meu gabinete que era afro-descendente. Como o nosso preconceito é muito mais de cor do que de raça no
sentido da palavra, vamos dizer, tinha sim pessoas que eram, de alguma maneira, mestiças, mas era a cor
da pele. Era aceito, mas negro mesmo era muito mais difícil. Isso está sendo superado.
26
Então, eu sempre dizia que isso não era um problema, na realidade, só de beneficiar a raça negra,
digamos, ou beneficiar as minorias, mas era uma necessidade nossa, porque o Ministério das Relações
Exteriores tem que ser representativo do povo brasileiro. Então, isso eu acredito que vai para todas as instâncias do Estado. Mas há muita coisa por fazer ainda.
Para mencionar uma última coisa: meu último ato administrativo da minha gestão foi uma Portaria
que criou uma cota para o exame do Instituto Rio Branco. O exame se divide em três fases, mas a primeira
é a que elimina mais candidatos, porque, em geral, são oito mil candidatos e o número de vagas varia – estava sendo cem. Esse ano vai ser menos, eu acho que ano que vem deve voltar a ser um número expressivo.
Mas enfim, a primeira fase diminui de oito mil para trezentos candidatos. Então, nós criamos uma
cota de pelo menos 10%. É um comecinho... Desses trezentos - aliás, é uma cota adicional: trezentos mais
trinta - pelo menos trinta teriam que ser negros. Então, isso é um passo positivo e eu acho que demonstra
uma atitude também antielitista por parte da nossa Administração. Mas eu concordo que ainda há muito o
que fazer.
Bem, com relação à solidariedade, eu estou de pleno acordo. Eu acho que a nossa presença no Haiti,
que foi muito, inclusive, às vezes criticada no início, possibilitou o exercício efetivo da solidariedade pelos
movimentos sociais, como é o caso lá do MST, e também por ações da Embrapa, por ações do MDA, por
ações de outros órgãos.
Os brasileiros estavam lá agindo na ocasião do terremoto, efetivamente. Existem projetos, vários,
na área agrícola que nós desenvolvemos. Nós conseguimos incutir nessa operação de paz, que inicialmente
visava apenas a ser uma operação de paz condicional, apenas para manter a segurança, um elemento de
desenvolvimento, um elemento de ajuda humanitária que não estava presente. Claro que depois do terremoto a ajuda humanitária ficou mais óbvia, e a ajuda humanitária brasileira pode, talvez, não ter, digamos
assim, tido o mesmo número de cubanos, mas foi muito expressiva.
Nós trabalhamos junto com os cubanos. Temos um projeto, aliás, curiosamente, Cuba, Brasil e EUA
na área médica no Haiti – trabalhamos muito diretamente. Hospitais que eram montados por brasileiros.
As pessoas dependiam dos médicos cubanos. Não sei exatamente agora o número, mas houve um número
expressivo de hospitais de campanha, postos de saúde que foram criados no Haiti e outras obras também
importantes. Tem obras de barragem.
Não estávamos fazendo isso por razões mercantis. Possa ser que alguma empresa acabe ganhando
algum dinheiro com isso, porque essas coisas acontecem. Alguém tem que construir a barragem. Mas de
qualquer maneira, foi feita com recursos do Estado brasileiro, sem pedir nada de volta, sem cobrar juros.
Isso vai ser complementado, porque precisa de recursos complementares. Então, eu diria que nós temos
feito, digamos, um avanço.
Aliás, para mencionar algo que vai na linha do que a Dilei disse, do MST. Eu costumava, no próprio
Haiti, ouvir uma coisa que, para mim, parece verdadeira que: ‘Não é preciso ser rico para ser solidário’.
Ao contrário, em geral, os pobres são os mais solidários. Porque nós costumávamos ouvir muita crítica:
‘Mas o Brasil tem tanta pobreza, como é que vai ser solidário?’. Não é isso. Você tem que ser solidário e
ao mesmo tempo resolver os seus problemas. Mas a solidariedade cria em si mesma, também, um ânimo
adicional para você resolver os seus problemas.
Eu acho que são esses os pontos. Obrigado.
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PROFESSOR DR. CARLOS ENRIQUE RUIZ FERREIRA
Presidente da mesa
Bom, então, algumas palavras finais sobre o GAPRI. Eu acho que foi um sucesso. O Grupo de Análise Política e de Relações Internacionais é uma iniciativa da Universidade Estadual da Paraíba pautada
em dois princípios muito fortes.
O primeiro princípio é a convicção que a Universidade Estadual da Paraíba tem de trabalhar diretamente com a sociedade, com os segmentos sociais, o setor empresarial, com as outras universidades, com
o poder público, etc.. Então, esse é um princípio, uma característica forte da Universidade. É preciso estar
junto da sociedade paraibana.
Em segundo lugar, uma convicção, quiçá um tanto recente, da necessidade de trabalharmos mais
fortemente na internacionalização do estado da Paraíba, da sociedade paraibana. Nós temos, você sabem,
o único programa de Pós-Graduação de Relações Internacionais da região Norte-Nordeste do Brasil. Nós
temos um programa de Graduação e de Mestrado em Relações Internacionais, que está se consolidando, e,
um pouco, por conta desse novo corpo chegado recentemente de várias universidades do Brasil. Nós levamos a ideia para a Magnífica Reitora e ela se empenhou pessoalmente nessa proposta do GAPRI. Então,
existe essa convicção.
O Movimento da Terra já está internacionalizado com a Via Campesina. O setor empresarial precisa estar atento aos novos mercados, seja na África, na América do Sul. Os governos municipais, o estadual,
obviamente o algodão... Enfim, todos os segmentos, de certa forma, precisam estar conectados e entendendo as relações internacionais contemporâneas.
Acreditamos que isso é um imperativo. O diagnóstico que nós fazemos é que é um imperativo se
internacionalizar. Obviamente com calma, com coerência, com estudo, etc.. E gostaríamos de partilhar
essa preocupação com vocês. Esperamos que essa preocupação seja, também, acolhida por parte dos movimentos sociais, dos segmentos empresariais, etc., e que a gente continue com esse trabalho do GAPRI,
que posteriormente nós vamos conversar com mais cuidado.
Novamente, quero agradecer a presença do Ministro. Espero que o sucesso pessoal siga no seu caminho, porque isso significa também o sucesso para o povo brasileiro.
Muito obrigado, Ministro.
Embaixador : CELSO
LUIZ NUNES AMORIM
Ex-Ministro das Relações Exteriores
Ministro da Defesa da República Federativa do Brasil
E
u só me limitei a responder as perguntas, mas eu também queria agradecer, mais uma vez, a
recepção. Dizer que foi um grande prazer para mim.
Espero que, de alguma maneira, possamos ter outro diálogo desse tipo, já talvez tratando de uma
visão mais propriamente da Defesa Nacional, que liga todas essas questões estratégicas.
Se vocês me permitem só um último comentário: nós estamos aqui no Cabo Branco, que poderia ser
o Cabo Negro também, mas é o Cabo Branco. Mas, enfim, que é o extremo oriental do país que talvez seja
o ponto mais próximo da África. Então, estamos aqui a menos de 4 horas de avião da África e, no entanto,
se você quiser ir à África hoje, você tem que fazer uma viagem de vinte e tantas horas, principalmente no
caso da Paraíba, que você vai ter que ir para um lugar que vai ter um voo. Eu acho que os governos estaduais têm que se interessar por isso.
Há um jurista chamado Themístoles Cavalcanti. Eu nem concordava com algumas coisas dele, mas
era um bom jurista. Ele dizia: ‘O homem não vive na União, vive no Município’. Então, nós temos que
tratar dos municípios, do estado, do poder local, porque eles também são muito importantes, também para
uma estratégia de defesa que se baseia, acima de tudo, na percepção da nossa brasilidade. Muito obrigado.
28
A
Anexos
Listas de Membros e Participantes
ALDO MACIEL
Vice-Reitor da Universidade Estadual da Paraíba
ALMIR NÓBREGA
Diretor de Formação Política Sindical do SINDIFISCO – PB.
ANAHI DE CASTRO
Representante da Secretaria de Estado do Turismo e Desenvolvimento Econômico
APARECIDA RAMOS
Secretária de Desenvolvimento Humano do Estado da Paraíba
ARIOSVALDO DINIZ
Diretor do CCHLA da Universidade Federal da Paraíba –UFPB
Representando o Reitor da UFPB
CARLOS DOMINGUES Pesquisador da EMBRAPA Nordeste
Representando o Presidente da EMBRAPA
CARLOS ENRIQUE RUIZ FERREIRA
Coordenador de Assuntos Institucionais e Internacionais da UEPB
Presidente de mesa
CÉSAR DE PAIVA LEITE FILHO
Conselheiro do Ministério das Relações Exteriores Lotado no Escritório em Recife
CÍCERA ROMEU
Articuladora Política do Centro de Assistência da Mulher 8 de Março
CHICO CÉSAR
Secretário de Cultura do Governo do Estado da Paraíba
DILEI APARECIDA SCHIOCHET
Representante do Movimento Sem Terra e da Via Campesina
29
EDGLEY DOS SANTOS
Representante do Serviço Social do Comércio – SESC – PB
EULLER JANSEN
Representante da Escola Superior de Magistratura – ES-MA
FELIPE XIMENES
Ass. Cultural José Martí
FELIX AUGUSTO RODRIGUES
Assessor para Assuntos Internacionais da Universidade Federal da Paraíba – UFPB
FILIPE REIS
Professor da Graduação e do Mestrado em Relações Internacionais da UEPB
FRANCILENE GARCIA
Diretora Geral da Fundação Parque Tecnológico da Paraíba
GIULIANA DIAS VIEIRA
Professora Doutora da Universidade Estadual da Paraíba – UEPB
HENRIQUE ALTEMANI
Coordenador Adjunto do Mestrado de Relações Internacionais da UEPB
IONE MEDEIROS
Representante do SENAI da Paraíba
ITAPUÃ TARGINO
Diretor Institucional do Tribunal de Justiça
Representando o Presidente, Desembargador Abrahan Lincoln
JOSÉ CARLOS DE ASSIS
Professor convidado da UEPB
JÚLIO RAFAEL
Presidente do SEBRAE – PB
KARINA GUEIROS LEITE
Representante do Centro Internacional de Negócios da FIEP
LUÍS LIMA
Sindicato dos Trabalhadores em Assistência Técnica e Extensão Rural da Paraíba
MARCELO SÁ
Pró-Reitor de Pesquisa e Extensão da Universidade Federal de Campina Grande – UFCG
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MARCOS HENRIQUES
Representante da Central Única dos Trabalhadores – CUT e Sindicato dos Bancários da Paraíba
MARIA GORETE DA SILVA
Representante do Grupo Iyalodê e das Comunidades Tradicionais de Terreiro
MARIA SOCORRO PIMENTEL
Coordenadora do Movimento Negro Organizado da Paraíba
MARIA VERÔNICA EDMUNDSON
Assessora Internacional do IFPB
MARLENE ALVES
Reitora da Universidade Estadual da Paraíba – UEPB
MICHEL FOSSY
Assessor Internacional da Universidade Federal de Campina Grande – UFCG
Representando o Reitor da UFCG
NELMA ARAÚJO
Pró-Reitora de Pesquisa e Pós-Graduação do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia da Paraíba – IFPB
ODON BEZERRA CAVALCANTI
Representante da Ordem dos Advogados Seccional do Estado da Paraíba
PASTOR ESTEVAM FERNANDES
Representante da Comunidade Evangélica da Paraíba
PAULO KUHLMANN
Coordenador do Curso de Graduação em Relações Internacionais da UEPB
RÔMULO ARAÚJO
Pró-Reitor de Integração e Desenvolvimento Estadual da UEPB
RONILDA CLAUDINO
Pró-Reitora de Finanças da Universidade Estadual da Paraíba – UEPB
UBIRAMAR PITA
Representando o Pró-Reitor de Recursos Humanos da UEPB
VICTOR HUGO
Presidente do Sindicato dos Auditores da Receita Estadual da Paraíba – SINDIFISCO – PB
31
WILBUR JÁCOME
Presidente da CIA das Docas da Paraíba
32
E
Equipe Técnica Organizadora
Reitoria
Magnífica Reitora Marlene Alves
Vice-reitoria
Aldo Bezerra Maciel
Pró-reitoria de Pós-Graduação e Pesquisa
Marcionila Fernandes
Pró-reitoria de Ensino de Graduação
Eli Brandão
Coordenadoria de Assuntos Institucionais e Internacionais
Carlos Enrique Ruiz Ferreira
Expediente:
Organização:
Carlos Enrique Ruiz Ferreira
Transcrição:
Síria Bandeira Bulcão
Arthur Murta
Flora Mariana
Maria Alice Venâncio
Revisão e Edição Geral:
Carlos Enrique Ruiz Ferreira
Alex Meaux
Síria Bandeira Bulcão
Revisão Ortográfica:
Síria Bandeira Bulcão
Karla Carolina Andrade
Criação de Logo: Valter Angelo Junior
Capa e Diagramção: Reginaldo Neto
Fotos: Paizinha Lemos
33
CAII
Coordenadoria de Assuntos Institucionais e Internacionais
34