capítulo 2 – mortes no trânsito na cidade do rio de Janeiro

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capítulo 2 – mortes no trânsito na cidade do rio de Janeiro
PCRJ©2013
Prefeito da Cidade do Rio de Janeiro
Eduardo Paes
Secretário Municipal de Saúde
Hans Fernando Rocha Dohmann
Subsecretário de Atenção Primária, Vigilância e Promoção da Saúde
Daniel Ricardo Soranz Pinto
Superintendente de Promoção da Saúde
Márcia Regina Cardoso Torres
Coordenadora de Políticas e Ações Intersetoriais
Viviane Manso Castello Branco
PROJETO MOBILIDADE, SEGURANÇA E CIDADANIA
Coordenadoras
Viviane Manso Castello Branco (SMS-RJ)
Maria Teresa de Castro Lima Pereira (SMS-RJ)
SUB-PROJETO “Pesquisa Segurança e Civilidade no Trânsito Urbano do Rio de Janeiro”
Coordenadoras
Barbara Musumeci Mourão (Cesec/Ucam)
Silvia Ramos (Cesec/Ucam)
Pesquisadores
Alberto Alvadia Filho
Eduardo Mattos
Daniel de Pádua Ribeirinha
Estatístico
Leonardo Leão de Paris
Estagiária
Andréia Cidade Marinho
Colaboradora
Ilmar Gazé Holguin
Consultores
Gláucio Ary Dillon Soares, Viviane Manso Castello Branco e Maria Teresa de Castro Lima Pereira
Normatização e Revisão Documental
Ercilia Mendonça / Núcleo de Publicações e Memória – SMS-RJ
Capa
Carlos Eduardo Ribeiro (arte) / Mariana Massarani (ilustrações)
Projeto Gráfico
Carlos Eduardo Ribeiro
Diagramação
Fagner Santos
Sandra Araujo (Assessoria de Comunicação Social da SMS-Rio)
Revisão e Copydesk
Isabel Levy
Luiza Silva
Ricardo Villa Verde
Rafael Cavadas
Rio de Janeiro. Secretaria Municipal de Saúde. Subsecretaria de Atenção Primária, Vigilância e Promoção da Saúde. Superintendência de Promoção
da Saúde. Segurança e Civilidade no Trânsito Urbano do Rio de Janeiro. Superintendência de Promoção da Saúde. – Rio de Janeiro: SMS, 2014 (Série
D. Programas, Projetos e Relatórios)
80p.
ISBN 978-85-86074-36-3
1.Trânsito urbano – Rio de Janeiro. 2. Trânsito – transporte – segurança. 3. Trânsito virtual. 4. Trânsito – Distrito federal. I. Título. II. Série.
CDU 614.8+351.81
Catalogação na fonte – Núcleo de Publicações e Memória – SMS/SUBPAV
Agradecemos a interlocução com as seguintes instituições e pessoas:
SMS – Secretaria Municipal de Saúde do Rio de Janeiro
Marina Carvalho
Silvana Costa Caetano
Márcia Regina Torres
Marcio Garcia
CET Rio – Companhia de Engenharia de Tráfego da Cidade do Rio de Janeiro
Mauro Cezar de Freitas Ferreira
Sheila Castro
Unicef – Fundo das Nações Unidas para a Infância
Luciana Phebo e Equipe
SMTR – Secretaria Municipal de Transportes e Coppe/UFRJ – Instituto Alberto Luiz Coimbra de Pós-Graduação e Pesquisa de
Engenharia da Universidade Federal do Rio de Janeiro
Eloir de Oliveira Faria
ONG Transporte Ativo
José Lobo
Coppe/UFRJ – Instituto Alberto Luiz Coimbra de Pós-Graduação e Pesquisa em Engenharia da Universidade Federal do Rio de
Janeiro
Romulo Orrico
Sindicato dos Rodoviários do Rio de Janeiro
Leila Maria Araújo de Souza
Samuel Freire
Jornal o Globo
Jorge Antônio Barros
Rede Globo de Televisão
Marcelo Moreira
Sindmotos – Sindicato dos Empregados Motociclistas do Rio de Janeiro
Carlos Augusto
Fetranspor – Federação das Empresas de Transportes de Passageiros do Estado do Rio de Janeiro e Rio Ônibus – Empresas de
Ônibus da Cidade do Rio de Janeiro
Lélis Marcos Teixeira
ITDP – Institute for Transportation and Development Policy
Helena Orenstein
Roberto Adler
Detran-RJ – Departamento de Trânsito do Rio de Janeiro
Janete Blois
Abraspe – Associação Brasileira de Pedestres
Vilmar Miranda
Cetran-RJ – Conselho Estadual de Trânsito
Antônio Sérgio de Azevedo Damasceno
Ipea – Fundação Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada
Ernesto Pereira Galindo
Iuperj – Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro e IBPS – Instituto Brasileiro de Pesquisa Social
Geraldo Tadeu
Datafolha Instituto de Pesquisas
Luiz Barata
Rio Como Vamos
Thereza Lobo
Técnicos do Centro de Operações Rio
editorial
Trânsito seguro para uma cidade mais saudável
Promover uma mudança coletiva de consciência, capaz de transformar uma realidade complexa como a dos acidentes e violências associados ao trânsito, não é tarefa
fácil. E esse é o desafio a que a Secretaria Municipal de Saúde do Rio de Janeiro (SMS-RJ)
se propõe, ao assumir como prioridade o cumprimento das determinações da Política
Nacional de Prevenção de Acidentes e Violência e da Política Nacional de Promoção da
Saúde – dentre elas, promover a adoção de comportamentos e de ambientes seguros
e saudáveis.
A iniciativa carioca está alinhada à Década de Ações para a Segurança no Trânsito, mobilização promovida pela Organização Mundial da Saúde (OMS) que envolve
centenas de países – dentre eles o Brasil –, com o objetivo de preservar cinco milhões
de vidas nos próximos dez anos, por meio da prevenção de acidentes de trânsito. Em
âmbito nacional, as ações incluem o lançamento, pelos ministérios da Saúde e das Cidades, do Pacto Nacional pela Redução dos Acidentes de Trânsito – Pacto pela Vida,
que tem como meta estabilizar e reduzir o número de mortes e lesões em acidentes de
transporte terrestre nesse mesmo prazo.
Integrando esses esforços, nossa cidade vem investindo em ações em prol da mobilidade urbana e do trânsito seguro, no contexto da promoção da saúde. Na SMS-RJ, o
trabalho é pautado pelo projeto Mobilidade, Segurança e Cidadania e Vida no Trânsito,
desenvolvido com o apoio do Ministério da Saúde. As iniciativas combinam pesquisa,
campanha educativa e ações intersetoriais.
Esta publicação apresenta os primeiros resultados do projeto Mobilidade, Segurança e Cidadania, com a intenção de inspirar e mobilizar profissionais de saúde, educação, comunicação e demais parceiros intersetoriais a desenvolver ações integradas
para o enfrentamento do problema. A proposta é fornecer subsídios para mobilizar diferentes setores da sociedade para o trabalho conjunto – estratégia em que a Coordenação de Políticas e Ações Intersetoriais da Superintendência de Promoção da Saúde
da SMS-RJ, responsável pelo projeto, tem papel central.
A todos, uma ótima leitura!
Daniel Ricardo Soranz Pinto
Subsecretário de Atenção Primária, Vigilância e Promoção da Saúde
prefácio
Mobilidade urbana saudável: um compromisso intersetorial
“Todo mundo tem direito à vida, todo mundo tem direito igual; sem ter medo de
andar na rua, porque a rua é o seu quintal; boa noite, tudo bem, bom dia, gentileza é
fundamental.” Os versos da música Rua da Passagem, de Lenine e Arnaldo Antunes, traduzem o conceito de mobilidade urbana. Este transcende a noção de transporte urbano ao considerar, além do deslocamento de pessoas, a interação desta dinâmica com
a cidade. A ideia central é que a mobilidade é um importante determinante social da
saúde e da qualidade de vida, sobretudo nas grandes cidades. Mais que isso: a mobilidade urbana segura é um direito, e sua garantia envolve questões relativas à equidade
e à acessibilidade dos equipamentos públicos.
Em uma cidade com mais de seis milhões de habitantes, como o Rio de Janeiro,
que assiste ao aumento da frota de veículos em progressão geométrica, a mobilidade
urbana é uma questão prioritária, com impactos diretos sobre a saúde da população.
Longos congestionamentos, poluição do ar e sonora e o crescente número de acidentes de trânsito resultam em mortes, incapacidades físicas, doenças respiratórias, obesidade e estresse. A situação é tão grave que a Organização Mundial da Saúde (OMS)
já considera a ocorrência de óbitos e lesões envolvendo transportes uma epidemia
global. Estima-se que mate um milhão de pessoas e fira ou incapacite de 20 a 50 milhões de indivíduos em todo o planeta. No Brasil, os acidentes de trânsito representam
a segunda maior causa de internação hospitalar, dentre as ocorrências externas e as
mortes violentas.
Diante deste cenário, a atuação intersetorial e colaborativa de toda a sociedade
é decisiva para gerar melhor qualidade de vida e mais equidade em saúde para os
cariocas. Comprometida com este desafio, a Coordenação de Políticas e Ações Intersetoriais, vinculada à Superintendência de Promoção da Saúde da Secretaria Municipal
de Saúde do Rio de Janeiro (CPAI/SPS/SMS-RJ), vem trabalhando para integrar esforços
de gestores públicos, técnicos, acadêmicos, educadores, profissionais de comunicação,
empresários, sindicatos e associações de usuários de diferentes meios de transporte.
Um resultado concreto desta iniciativa é a realização da pesquisa Segurança e Civilidade no Trânsito Urbano do Rio de Janeiro, encomendada a pesquisadores do Centro de
Estudos de Segurança e Cidadania da Universidade Cândido Mendes (CESeC/Ucam), cujo
relatório apresentamos nesta publicação. A investigação integra o projeto Mobilidade,
Segurança e Cidadania, da CPAI/SPS/SMS-RJ que, entre outras ações, vem promovendo
parcerias com escolas municipais, discussões técnicas em grupos de trabalho intersetoriais, capacitações, produção de materiais educativos e de um plano de comunicação.
O estudo analisa os dados epidemiológicos sobre acidentes de trânsito na cidade
do Rio de Janeiro, entre 2000 e 2010. Chama atenção o aumento do número de mortes
por acidentes com motocicletas e a reprodução do mesmo cenário de óbitos por homicídios: as principais vítimas são jovens negros, de baixa escolaridade e renda reduzida,
o que reforça iniquidades em saúde.
A pesquisa também revela as percepções e sentimentos dos cidadãos cariocas a
respeito de suas experiências cotidianas ligadas à mobilidade urbana, levando em consideração não apenas seus anseios, temores e a sensação de risco, mas também os
prazeres, facilidades e sugestões para melhorar o fluxo e as condições de trânsito na
cidade. A proposta é gerar subsídios para construir políticas públicas que contribuam
para uma cultura de paz no trânsito, baseada no respeito mútuo entre pedestres, usuários de transporte coletivo, motoristas, motociclistas e ciclistas.
Os desafios são muitos, mas não faltam boas ideias. Experiências internacionais
demonstram que transformar essa realidade e promover a civilidade e a segurança no
trânsito é mais que uma possibilidade: é uma conquista da cidadania. Bogotá, na Colômbia, é um exemplo de sucesso. Lá, os investimentos para promoção da mobilidade
urbana segura ultrapassam as obras tradicionais de concreto e asfalto contemplando
o fortalecimento de uma cultura cidadã, baseada no sentimento de pertencimento à
cidade, no respeito ao patrimônio público e no reconhecimento de direitos e deveres.
O resultado é uma mudança coletiva de mentalidade, essencial para uma relação mais
sustentável entre os cidadãos e a cidade.
Convidamos todos para enfrentarmos, juntos, esse desafio.
Viviane Manso Castello Branco e Maria Teresa de Castro Lima Pereira
Coordenação de Políticas e Ações Intersetoriais
Sumário
Lista de Gráficos.........................................................................................................10
Lista de Tabelas..........................................................................................................11
Apresentação.............................................................................................................12
Parte 1:
A PESQUISA “SEGURANÇA E CIVILIDADE NO TRÂNSITO URBANO
DO RIO DE JANEIRO”
Capítulo 1. Transporte, mobilidade e segurança no trânsito: uma agenda
para o Rio...................................................................................................................16
A transformação de um paradigma................................................................................................16
Mudanças na sociedade e na mídia................................................................................................19
Dificuldades, silêncios e descoordenação.................................................................................... 20
Capítulo 2. Mortes no trânsito na cidade do Rio de Janeiro entre os anos
2000 e 2010................................................................................................................24
Os dados, suas características, seus problemas...........................................................................25
Patamares das taxas cariocas e as tendências em curso: o que está mudando..............26
A distribuição desigual das mortes por sexo, idade e raça.....................................................29
Capítulo 3. Percepções sobre o trânsito...................................................................32
A cidade do Rio de Janeiro e seus arredores.................................................................................32
O questionário e o perfil dos respondentes..................................................................................32
Meio de transporte utilizado...............................................................................................................33
Local de moradia.....................................................................................................................................34
Idade e gênero.........................................................................................................................................35
Experiências negativas vividas pelos entrevistados....................................................................35
Experiências positivas no trânsito.....................................................................................................37
O que provoca medo no trânsito......................................................................................................39
Capítulo 4. Considerações finais...............................................................................43
O trânsito “como ele é”: observações finais...................................................................................43
Sugestões para melhorar o trânsito na cidade.............................................................................44
Capítulo 5. Trânsito virtual........................................................................................48
A Esfera Pública........................................................................................................................................49
Associações, ONGs e Empresas..........................................................................................................51
Twitter e Facebook.................................................................................................................................52
Parte 2:
LEITURA COMPLEMENTAR
Capítulo 6. A morte sob rodas...................................................................................62
A extensão da tragédia.........................................................................................................................62
Como são os atropelamentos?...........................................................................................................62
Como estão o Brasil e o Estado do Rio de Janeiro?.....................................................................62
A influência da legislação e das políticas públicas......................................................................64
Os efeitos das culturas cívica, política e automobilística...........................................................65
Variações nas culturas cívicas, política e automobilística........................................................65
Tem jeito!...................................................................................................................................................66
Capítulo 7. Projeto Paz no Trânsito no Distrito Federal: um modelo possível......68
Introdução.................................................................................................................................................68
As tentativas iniciais de apoio do setor público...........................................................................69
Surgem as primeiras bolsas.................................................................................................................69
Algumas medidas...................................................................................................................................70
Funções das pesquisas..........................................................................................................................72
Cultura automobilística, cultura cívica............................................................................................74
Algumas lições.........................................................................................................................................75
Reportagens consultadas.....................................................................................................................75
Referências Bibliográficas
10
Lista de Gráficos
Lista de Gráficos
Gráfico 1
Gráfico 2
Gráfico 3
Gráfico 4
Gráfico 5
Gráfico 6
Gráfico 7
Gráfico 8
Gráfico 9
Comparação entre mortos e feridos em acidentes de trânsito na cidade do Rio de Janeiro
de 2005 a 2010
Taxas de óbitos por 100 mil habitantes no Brasil e no estado, na Região Metropolitana e
na cidade do Rio de Janeiro – 2000 a 2010
Evolução das taxas de mortes por tipos de acidentes no Brasil e no estado, na RMRJ e na
cidade do Rio de Janeiro – 2000 a 2010
Evolução das causas de mortes por acidentes no Rio de Janeiro – 2000 a 2010
Crescimento da frota de automóveis, motos e veículos pesados na cidade do Rio de
Janeiro – 2001 a 2010
Distribuição da proporção média de mortalidade no trânsito, por tipo de locomoção e
sexo na Capital do Rio de Janeiro – 2000 a 2010
Distribuição percentual das vítimas fatais segundo faixa etária e tipo de acidente de
trânsito na Capital do Rio de Janeiro – 2000 a 2010
Taxas de mortalidade por 100 mil habitantes por cor e idade na cidade do Rio de Janeiro
– 2000 a 2010
Meio de transporte utilizado em 2011 pelos habitantes da RMRJ entrevistados (%)
27
29
31
32
33
34
35
36
40
Gráfico 10 Local de moradia em 2011 dos habitantes da RMRJ entrevistados
41
Gráfico 11 Idade em 2011 dos habitantes da RMRJ entrevistados
42
Gráfico 12 Frequência em 2011 dos problemas mencionados pelos habitantes da RMRJ entrevistados
Frequência em 2011 da variável “motoristas”, segundo a idade e o local de moradia dos
Gráfico 13
habitantes da RMRJ entrevistados
Frequência em 2011 das experiências positivas mencionadas pelos habitantes da RMRJ
Gráfico 14
entrevistados
Frequência em 2011 da variável “Nada é positivo”, segundo a idade e o local de moradia
Gráfico 15
dos entrevistados
Gráfico 16 Elementos que geram percepção de risco para os habitantes da RMRJ entrevistados em 2011
Identificação da violência criminal como fator de risco no trânsito em 2011, segundo a
Gráfico 17
região de moradia dos entrevistados
Gráfico 18 Avaliação do trânsito em 2011 pelos habitantes da RMRJ entrevistados
44
Gráfico 19 Sugestões para melhorar o trânsito dadas pelos habitantes da RMRJ entrevistados em 2011
73
Gráfico 20 Entrevistados em 2011 que sugeriram a variável “Campanhas/educação”, segundo o sexo
74
Gráfico 21 Sugestões dos entrevistados em 2011, segundo o local de moradia
74
Gráfico 22 Mortes por atropelamento, Brasil e Rio de Janeiro, em duas escalas, 1995 a 2010
81
Gráfico 23 Brasil, taxa de acidentes por 10 mil veículos em 2008, por região
Porcentagem dos óbitos por acidentes no trânsito nos quais as vítimas são pedestres –
Gráfico 24
Brasil, 1996 a 2008
Gráfico 25 Número de mortos no trânsito no Distrito Federal até o governo de Cristovam Buarque
Número de mortos no trânsito no Distrito Federal durante a administração Cristovam
Gráfico 26
Buarque
Percentual de concordância com a afirmação “o GDF está resolvendo os problemas do
Gráfico 27
trânsito”
Gráfico 28 Risco de morte do pedestre por velocidade do veículo
84
45
46
47
48
50
70
85
87
88
91
94
Lista de Tabelas
Tabela 1
Tabela 2
Panorama das mortes no trânsito: taxas médias por 100 mil habitantes no Brasil e no
estado, na cidade e na RMRJ – 2000 a 2010
Comparativo da distribuição de usuários dos diferentes meios de transporte, por instituto
de pesquisa
30
40
Tabela 3
Distribuição das páginas pesquisadas
55
Tabela 4
Distribuição de sites e blogs por localização geográfica
56
Tabela 5
Endereços não-governamentais segundo sua natureza jurídica
56
Tabela 6
Sites e blogs, de acordo com sua abrangência
57
Tabela 7
Distribuição de sites e blogs de acordo com os meios de transporte
57
Tabela 8
Distribuição de sites e blogs de acordo com o ano de criação
58
Tabela 9
Distribuição de perfis de Twitter por estado
59
Tabela 10 Distribuição de perfis de Facebook por estado
59
Tabela 11 Relação entre a velocidade do veículo e o risco de morte do pedestre
93
Lista de Tabelas
11
12
Apresentação
Apresentação
No início do ano de 2009, construiu-se o diálogo que resultou na elaboração do projeto Segurança e Civilidade no Trânsito Urbano do Rio de Janeiro, desenvolvido pela equipe
de pesquisa do Centro de Estudos de Segurança e Cidadania – CESeC, da Universidade
Candido Mendes, em parceria com a Secretaria Municipal de Saúde do Rio de Janeiro. O
projeto foi concebido conjuntamente, em múltiplos encontros das equipes da SMS e do
CESeC, nos quais foram delineados seus objetivos centrais: não apenas mapear a morbimortalidade associada ao trânsito, ou seja, os riscos reais de acidentes e violências, mas
produzir também um levantamento de impressões, objetivas e subjetivas, a respeito de
um aspecto crucial da vida urbana, que são os deslocamentos cotidianos através de diferentes meios de locomoção.
Buscou-se captar, para além das avaliações sobre a qualidade das vias públicas, dos
transportes coletivos ou das políticas de trânsito, os fatores que geram temor, desconforto, mal-estar e indignação, assim como os que produzem prazer e satisfação. Visava-se,
portanto, compreender os sentimentos e os significados associados à mobilidade urbana. Para isso, além da análise dos microdados do sistema de saúde, do Datasus, foram
previstas análises quantitativa e qualitativa, baseadas em entrevistas com especialistas
em trânsito, pesquisa em pontos de fluxo e entrevistas em profundidade, com usuários e
profissionais dos diferentes meios de transporte.
Por uma série de problemas de ordem administrativa, o projeto teve que ser redesenhado. Com isso, os dois principais recursos metodológicos previstos, como a pesquisa em
pontos de fluxo e as entrevistas qualitativas, tiveram que ser substituídos por abordagens
alternativas. É inegável que as restrições a que o projeto precisou se adaptar interferiram
em seus resultados. A despeito disso, porém, foram produzidos dados inéditos sobre mortes por acidentes de trânsito na cidade e no estado, a partir da base de dados do Ministério
da Saúde, de forma até então inexplorada no plano municipal.
Além disso, com base em entrevistas com especialistas, realizou-se um mapeamento
do campo de debates e políticas relativas ao trânsito, um levantamento de percepções
sobre o trânsito baseado em questionário autopreenchido, aplicado a uma amostra não-aleatória de usuários dos diversos meios de locomoção, um levantamento sobre o mundo do trânsito na Internet (sites, blog e perfis no Twitter) e um relato sobre a construção
do projeto Paz no trânsito, de Brasília.
Os capítulos que compõem este relatório correspondem, respectivamente, a cada
uma das abordagens adotadas. O primeiro deles, transporte, mobilidade e segurança no
trânsito, traz uma reflexão sobre o próprio campo do trânsito, entendido aqui em sentido
próximo ao definido por Bourdieu como um espaço no qual se constituem e se legitimam
certos temas, questões, nomenclaturas, modos de fazer e atores específicos. Mesmo que
os atores sociais que compõem esse campo não reconheçam a sua existência, ou que
suas agendas sejam tão díspares que não se possa sequer identificar um denominador
comum, o fato é que há um determinado conjunto de personagens atuando, simultânea
ou sucessivamente, em torno da mesma arena: gestores públicos, técnicos, acadêmicos,
empresários, sindicatos e associações de usuários de diferentes meios de transporte – os
quais, necessariamente, produzem intervenções e reflexões com base em suas experiências e interesses.
Tomando o relato desses diferentes profissionais, o capítulo analisa o estado da arte
dos debates, propostas, impasses e perspectivas atinentes ao campo do trânsito – ou,
como indicam as tendências mais recentes, ao campo da mobilidade urbana. Com isso,
traz à tona uma discussão sobre os próprios termos em que se constitui essa área, tanto
no espaço acadêmico, quanto no mundo das políticas públicas.
O segundo capítulo, Mortes no trânsito, contém uma análise dos dados sobre mortalidade no trânsito do Rio de Janeiro. A partir dos microdados do Sistema de Informação
sobre Mortalidade (SIM), do Ministério da Saúde, traçou-se um perfil dos acidentes com
mortes ocorridos no município, de 2000 a 2008, contra o pano de fundo das mortes por
acidente no estado e no país. A partir da análise, foram identificadas características das
vítimas e dos meios, assim como as mudanças nos padrões dos acidentes fatais.
Em seguida, no terceiro capítulo, Percepções Sobre o Trânsito, são examinadas as respostas, formuladas espontaneamente, a um questionário aberto aplicado a 568 pessoas
que circulam diariamente pela cidade do Rio de Janeiro. Através desse levantamento, de
natureza qualitativa, procurou-se conhecer as experiências positivas e negativas de motoristas e passageiros, bem como suas avaliações, tanto objetivas quanto subjetivas, a respeito das condições de locomoção na cidade.
O quarto capítulo, Trânsito Virtual, agrega uma reflexão sobre o campo do trânsito na
esfera virtual, a partir de um levantamento de blogs e sites que tratam do tema. Um quinto capítulo é dedicado às Considerações Finais.
Temos na Parte 2 – Leitura Complementar, em A morte sob rodas, a caracterização das
mortes por acidente, no Brasil e no Estado do Rio de Janeiro, apontando caminhos que podem levar à redução do número assombroso de mortes, com base na demonstração dos
dados resultantes do projeto Paz no Trânsito, implementado no Distrito Federal, em 1995. A
propósito, em O projeto Paz no Trânsito no Distrito Federal: um modelo possível, que fecha
este trabalho, é descrita em detalhes a experiência de implantação dessa iniciativa.
O propósito deste trabalho, que reúne observações provenientes de fontes distintas,
é justamente compor um mosaico de informações, capaz de subsidiar eventuais campanhas sobre comportamento no trânsito. Para isso, buscou-se, de um lado, caracterizar os
acidentes viários e suas principais vítimas na cidade do Rio de Janeiro, de forma a que as
mensagens de prevenção pudessem focar diretamente as situações de maior risco.
De outro lado, procurou-se captar os elementos que compõem o imaginário dos habitantes da cidade, pressupondo que a comunicação com o público ganhará eficiência
na medida em que incorporar o repertório de ideias e expressões por meio das quais o
trânsito é percebido.
Silvia Ramos
Barbara Musumeci Mourão
Apresentação
13
PARTE
1
A Pesquisa “Segurança e
Civilidade no Trânsito
Urbano do Rio de Janeiro”
16
Capítulo 1 – Transporte, mobilidade e segurança no trânsito: uma agenda para o Rio
Capítulo 1 – Transporte, mobilidade e segurança no trânsito: uma
agenda para o Rio
Silvia Ramos1
Barbara Musumeci Mourão2
No Rio, a era do fluxo está sendo substituída
pela era da mobilidade, porque o que acontece
em todas as Prefeituras e Secretarias de Transporte do mundo inteiro é que o técnico que está
lá teve uma formação rodoviarista [...]. É isso que
está mudando, não são os carros que têm que
passar, são as pessoas que têm que se locomover. – representante de ONG.
A transformação de um paradigma
Nosso objetivo primeiro, na pesquisa Segurança e Civilidade no Trânsito Urbano do Rio de Janeiro, foi compreender como as políticas públicas
neste campo se constituíram nos últimos anos e
que mudanças estavam ocorrendo no momento. Na fase inicial da pesquisa e, posteriormente,
ao longo do processo de análise de dados e elaboração e aplicação da pesquisa de percepção3,
durante o ano de 2011, entrevistamos interlocutores de diferentes áreas relacionadas ao transporte, ao trânsito e à segurança – que passaremos a denominar contexto do trânsito.
Conversamos com representantes dos órgãos públicos de transporte e trânsito (Companhia de Engenharia de Tráfego da Cidade do
Rio de Janeiro, Secretaria de Transportes), com
representantes de ciclistas, pedestres, motociclistas, motoristas rodoviários e empresários
de transporte coletivo, com responsáveis pela
produção e armazenamento de dados (Instituto de Segurança Pública e Superintendência de
Vigilância em Saúde da SMSDC-RJ), com pessoas
envolvidas com educação, segurança e prevenção da violência no trânsito (Detran, SMSDC-RJ,
Unicef ), além de especialistas de diferentes áreas
e jornalistas.
A primeira e surpreendente constatação é
que interlocutores de diferentes setores afirmavam que o contexto do trânsito, no Rio, passava
por mudanças grandes e decisivas, principalmente desde o início da presente gestão municipal. As principais mudanças, indicavam eles, se
explicavam por uma alteração conceitual sobre
as prioridades para a cidade. Algo que foi definido diversas vezes como uma “mudança de paradigma”: uma transição do paradigma da rapidez
e do fluxo (prioridade para os carros, construção
de viadutos, abertura de vias etc.) para o paradigma da mobilidade (prioridade para o transporte
público, articulação entre os meios de transporte, foco na pessoa e não no carro). Há depoimentos muito expressivos sobre a percepção de que
o contexto do trânsito mudou na cidade.
É muito difícil, na área de transporte, mudar essa
boca torta do cachimbo da locomoção do carro
de passeio. [...] Em relação aos transportes, essa
administração da prefeitura estabeleceu um
novo marco regulatório, ao acabar com as concessões de empresas de ônibus. A implantação
do BRS e outras mudanças que virão definiram
prioridades que o secretário e o prefeito bancaram. [...] Esse é um conceito que precisa ficar muito claro: não adianta mais criar espaço viário, não
existe tecnologia de infraestrutura que dê conta
dessa quantidade de automóveis. Entramos agora em um paradigma de mobilidade em que o
carro não é a prioridade – especialista da Secretaria Municipal de Transportes do Rio de Janeiro.
Os Jogos Olímpicos contribuíram para as mudanças que estão em curso, sem dúvida, mas
também houve mudanças políticas nesses tempos. A Prefeitura mudou muito o foco, com a
vontade política de fazer alguma coisa e entendendo que outros assuntos são prioridade. No
Rio de Janeiro, os investimentos no Metrô, ainda
que este só circule na cidade, e no trem, a SuperVia, são administrados pelo governo do Estado;
da mesma forma, as Barcas. O Município não
investia em infraestrutura de transportes havia
mais de vinte anos. Somaram-se duas questões
muito fortes: os Jogos Olímpicos e a mudança
política, pois o prefeito entendeu que este aspecto deveria ser uma prioridade. – representante dos empresários de ônibus.
Contudo, houve entrevistados que indicaram que as mudanças ocorridas no Rio nos últimos anos eram importantes, porém tardias, e
que outras cidades brasileiras já haviam feito a
transição do paradigma da prioridade do fluxo
para a prioridade da mobilidade. Cidades como
São Paulo, Curitiba e diversas outras no país, a
despeito de seus problemas, desenvolvem experiências e iniciativas de priorização do transporte
público sobre o automóvel particular, como bilhetes únicos, rodízio, regulamentação das empresas, corredores preferenciais, ampliação das
linhas de metrô e outros exemplos.
O primeiro desafio do transporte público é entrar na agenda política principal, pois só entra
quando está causando problema de trânsito
para os automóveis, ou quando é um bom momento para cortar fita e inaugurar alguma coisa.
Mas entrar mesmo, seriamente, na agenda, com
impacto na economia e na vida das pessoas... Eu
diria que agora no Rio esse tema deu um passo
para entrar, mas ainda não entrou totalmente –
Especialista
Entre os exemplos que ilustrariam a recente
inversão de prioridades no Rio de Janeiro, foram
citados4:
1. Bus Rapid System (BRS)5. Sistema que cria a
circulação de ônibus em corredores expressos, exclusivos para ônibus e táxis embarcados, implantado inicialmente em Copacabana em fevereiro de 2011. Já há corredores
expressos para ônibus em Ipanema, Leblon,
Copacabana e Centro e pretende-se estendê-los a ruas da Zona Norte em 2012. O sistema prevê a redução do número de ônibus
e do número de paradas, resultando na redução do tempo de realização do percurso
na via expressa.
2. Bus Rapid Transit (BRT)6. O projeto consiste em vias segregadas para ônibus, que
param somente em estações fixas. Estas são
elevadas para ficarem no nível do piso do
coletivo. O pagamento da passagem é feito na estação, permitindo embarques e desembarques mais ágeis. Uma via exclusiva
e pontos de parada fixos permitem um sistema sincronizado em que os ônibus saem
e chegam às estações no tempo planejado,
sem enfrentar congestionamentos. As duas
primeiras vias neste modelo são a Transoeste7 e a Transcarioca8.
3.O novo marco regulatório das empresas
de ônibus. Assinado em agosto de 2010,
implicou o fim das antigas concessões e a
criação de quatro consórcios, que passaram
a responder ao poder público com novas regras e compromissos, e a redução do número de linhas.
4. Bilhetes únicos. Criaram-se tarifas únicas
para integração municipal, o Bilhete Único
Carioca – no valor de R$2,50 para ônibus-ônibus e de R$3,70 para ônibus-trem, por
até duas horas – e, para integração intermunicipal, o Bilhete Único RJ, no valor de R$4,40
por até duas horas e trinta minutos.
5. A Linha 4 do Metrô. Em junho de 2010, o
governo do Estado deu início à construção
da Linha 4, que consiste na extensão de rede
de metrô até a Barra da Tijuca. A nova linha
de seis estações terá conexão com a Linha
1, na Praça General Osório, em Ipanema. É
um projeto com vistas aos Jogos Olímpicos
de 2016, cujas competições esportivas serão
sediadas, em sua maioria, na Barra. O trecho
terá seis estações (Nossa Senhora da Paz,
Jardim de Alah, Antero de Quental, Gávea,
Capítulo 1 – Transporte, mobilidade e segurança no trânsito: uma agenda para o Rio
17
18
Capítulo 1 – Transporte, mobilidade e segurança no trânsito: uma agenda para o Rio
São Conrado, Jardim Oceânico), ligando a
Praça General Osório, em Ipanema, à Barra
da Tijuca. Orçada em R$5 bilhões, a linha
deve transportar 300 mil passageiros por
dia. Segundo a Fundação Getúlio Vargas,
dois mil veículos devem deixar de circular
nas avenidas Vieira Souto, Delfim Moreira e
Niemeyer. O governo sustenta que também
está investindo nos trens urbanos e que os
270 quilômetros de vias férreas urbanas passarão por melhorias. Para a Copa de 2014,
planeja-se que a rede ferroviária da cidade
passe a operar com uma frota superior a 190
trens, todos com ar condicionado. Segundo
o governo do Estado, os investimentos até
2016 para o setor de transportes dos governos federal, estadual, municipal e iniciativa
privada, somados, chegam a R$11 bilhões.
6. A restauração das linhas férreas de Santa Teresa. Outros meios de transporte têm
sofrido mudanças. Após anos de sucateamento, e depois de um grande acidente em
que houve mortos e feridos, em agosto de
2011, o governo do Estado decidiu investir
R$40 milhões até 2013 na recuperação e
modernização dos bondes de Santa Teresa
– o mais antigo sistema de transporte da cidade, inaugurado em 1896.
7. Atenção aos meios de locomoção nas favelas. Também no nível estadual, obras do
PAC das Favelas (Programa de Aceleração
do Crescimento) têm se preocupado com
a mobilidade no interior das comunidades,
procurando construir e integrar meios de
transporte locais (teleféricos, planos inclinados e elevadores) aos sistemas de transporte da cidade, como as estações de trem, metrô e sistemas de ônibus. Em julho de 2011
foi inaugurado o teleférico do Complexo do
Alemão. A viagem pelas seis paradas leva
cerca de 15 minutos, até a integração com a
estação de trens urbanos Bonsucesso. O in-
vestimento foi de R$210 milhões, e a tarifa é
de R$1,00.
8. As bicicletas. Bicicletas passaram a ser pensadas não apenas como lazer, mas como
meio de transporte. Foram criadas estratégias de integração com outros meios, ampliando-se uma malha que inclui ciclovias,
ciclofaixas e faixas compartilhadas. Além
disso, foram criados bicicletários – estacionamentos para bicicletas – nas estações de
metrô e adotado um sistema de locação de
bicicletas em vários pontos da cidade. Na
verdade, o governo municipal passou a incorporar a perspectiva dos ativistas da bike,
que há muito defendem que a bicicleta é veículo e, como tal, não deve ser segregada em
cima das calçadas, mas integrada aos outros
meios. Até julho de 2011, foram implantados na cidade cerca de 250 quilômetros de
ciclovias e a meta declarada da Prefeitura é
chegar a 300 quilômetros ao fim de 2012.
9. A implantação das “Zonas 30”. No projeto
Zona 30, a Secretaria Municipal de Transportes regulamentou o limite de velocidade
máxima em 30km/h em ruas de bairros da
Zona Sul. A implantação das Zonas 30 tem
como objetivo também permitir a circulação
de veículos motorizados e bicicletas, seja por
faixas compartilhadas, seja por ciclofaixas.
10GEO-GIT. A Secretaria de Transportes do
Município e a CET Rio definiram, entre suas
metas, a redução de acidentes com vítimas
na cidade e criaram um sistema georreferenciado de monitoramento de acidentes,
baseado nos dados gerados pelas ligações
da população ao sistema 190 da Polícia Militar do Estado do Rio de Janeiro (PMERJ). Esse
sistema, denominado GEO-GIT, tem capacidade de identificar não apenas quantidade,
horários e tipos de acidentes, mas também
os hot spots, locais com forte intensidade de
acidentes. Potencialmente, o sistema permite uma intervenção rápida em caso de crescimento de eventos em determinadas áreas.
Também foi inaugurado, em 2010, o Centro
de Operações do Rio (COR), que consiste
numa sala de controle com um telão de 80
metros quadrados (além de 300 monitores
espalhados em 100 salas), onde 70 operadores trabalham com acesso a imagens da
cidade, captadas através de câmeras da CET
Rio e outras, instaladas em ônibus.
11.Lei Seca. Diversos entrevistados mencionaram a importância das blitz da Lei Seca, no
cenário de intervenções públicas positivas
no trânsito. No Rio de Janeiro, em especial,
as operações assumiram uma configuração
consistente e até agora sustentável, sendo
que a reputação de seriedade na fiscalização
teria contribuído para a redução da violência letal no trânsito carioca.
Mudanças na sociedade e na mídia
Mudanças estão ocorrendo não apenas no
âmbito das políticas governamentais, mas também na esfera da sociedade civil e da mídia.
Entre as organizações não-governamentais, já
havia níveis de mobilização com o surgimento
de grupos de familiares de vítimas de acidentes
na década passada. No momento atual, o ativismo em favor das bicicletas chamou nossa atenção por suas ações serem mais técnicas, visíveis
e articuladas – mais até que as de passageiros,
pedestres ou mesmo que as de motociclistas e
motoristas rodoviários.
Essas duas últimas categorias, a despeito de
sua importância no contexto do trânsito, estranhamente – e contrariando a tendência que se
verifica na área – mantêm modelos sindicais tradicionais de organização, com baixa relação com
o conjunto dos membros e com reduzida articulação com os demais representantes sociais e go-
vernamentais, seja em fóruns de trânsito, seja na
mídia ou na sociedade.
Por outro lado, constatamos o surgimento
de organizações civis com um perfil técnico e
profissional que têm a perspectiva de trabalhar
em parceria com governos, como o Institute for
Transportation and Development Policy (Instituto de Política de Transporte e Desenvolvimento,
ITDP), criado no Brasil em 2002, tendo estabelecido um escritório no Rio de Janeiro em 2009.
Além disso, foram muitos os seminários, debates e conferências sobre o trânsito durante 2011,
promovidas por organizações como o Instituto
dos Arquitetos do Brasil (IAB), a Associação Nacional de Transporte Público (ANTP), ONGs e
também por universidades e órgãos públicos
– como o seminário Caminhos da Educação e
Segurança no Trânsito, realização da SMSDC-RJ.
A multiplicação de iniciativas em torno de
temáticas associadas ao trânsito – voltadas para
redução de acidentes e punição de agressores,
ampliação de direitos de usuários e profissionais
de diferentes veículos e para o debate em torno
de diversos temas, como a Lei Seca e as grandes
obras de mobilidade associadas à Copa e Jogos
Olímpicos – correspondeu ao crescimento visível
de blogs, sites e discussões na Internet, um fenômeno que mereceu todo um capítulo neste livro.
Os blogs, como se verá, contemplam desde espaços para reclamações de passageiros de ônibus
até debates sobre a Transolímpica9 ou as linhas
do Metrô.
Observamos, igualmente, que a cobertura
dos grandes meios de comunicação dedicada ao
assunto se intensificou nos últimos anos e, mais
visivelmente, ao longo do ano. Além da divulgação sistemática de estatísticas de mortes nas estradas depois dos feriados, adotada por grandes
grupos como Globo, Folha, Estado, Band e demais, a visibilidade de questões sobre violência
e segurança viária ganhou espaço nos grandes
veículos.
Capítulo 1 – Transporte, mobilidade e segurança no trânsito: uma agenda para o Rio
19
20
Capítulo 1 – Transporte, mobilidade e segurança no trânsito: uma agenda para o Rio
Entre diversos outros – como a discussão sobre o crescimento de frota de motocicletas e automóveis –, temos o caso da ampla receptividade
à divulgação de que o Brasil ultrapassara a barreira dos 40 mil óbitos em 2010, segundo dados do
Caderno Complementar Mapa da Violência 2011:
Acidentes do Trânsito, publicação organizada pelo
Instituto Sangari para o Ministério da Justiça, com
base nas Declarações de Óbito compiladas no
Sistema de Informações sobre Mortalidade (SIM)
do Ministério da Saúde.
Em resumo, a grande mídia não está mais
apenas reagindo à notícia factual do dia anterior,
cobrindo pontualmente um acidente envolvendo muitas vítimas, ou a morte de uma pessoa
de classe média numa via em área abastada da
cidade. Está produzindo matérias de fundo que
envolvem os temas do trânsito, da mobilidade
ou da segurança.
Um exemplo dessa mudança de perspectiva é a série de reportagens “Conviva”, no jornal O
Globo, apoiada pelo Banco Bradesco.
Para ilustrar, vale mencionar que a campanha se concentra em ideias como: “pensar antes
de buzinar”, “respeito à faixa de pedestre”, “bike”,
“pilotagem segura”, “pistas compartilhadas” etc.
Também chama a atenção que outro banco tenha ingressado na área de apoio a iniciativas de
mobilidade: o Banco Itaú financia o sistema de
aluguel de bicicletas na cidade do Rio de Janeiro
e em outras.
Há um contraste com um silêncio relativo
ao assunto trânsito que predominou no passado: provavelmente, jornais, rádios e TVs do Rio
enfocaram prioritariamente o tema da violência
criminal nos últimos vinte anos. A importância
crescente para os diversos aspectos associados
ao trânsito nos grandes meios de comunicação
se reflete também no investimento da cobertura
do trânsito por helicópteros, uso de imagens de
câmeras da CET-Rio e a divulgação de informações pelo Centro de Controle da Prefeitura.
Colaboram também para a circulação permanente de informação as fontes que comentam sobre a Campanha da Lei Seca e, ainda, em
outro nível, os resultados de sistemas e estudos
desenvolvidos por entidades como Ipea – como
a Pesquisa sobre Mobilidade Urbana, no âmbito
do Sistema de Indicadores de Percepção Social
(Sips/Ipea) –, Rio como Vamos e CESeC, entre
outros. Existem ainda as pesquisas por iniciativa
dos próprios veículos de comunicação, como os
dados do Instituto Brasileiro de Pesquisa Social
(IBPS), divulgados pelo jornal O Globo (2011).
O Globo também tem dado espaço destacado para matérias sobre ONGs de parentes de
vítimas de mortos no trânsito, como o perfil do
criador da ONG Trânsito Amigo, e para ONGs ligadas ao movimento das bikes. Faz coberturas sistemáticas de assuntos como BRS, BRT e a construção das “Trans”.
Após o conjunto de entrevistas e observações, nossa hipótese é de que, assim como
o tema da violência urbana tornou-se assunto
permanente de governos, sociedade e mídia, há
uma tendência de que os temas da mobilidade,
segurança e trânsito se tornem mais e mais centrais no dia-a-dia do Rio de Janeiro.
Dificuldades, silêncios e
descoordenação
A despeito dos avanços e mudanças visíveis
no setor, encontramos, entre entrevistas e conversas com os interlocutores da área e observações de campo, alguns temas, pontos cegos, ausências e atrasos que chegam a surpreender em
meio ao cenário positivo de avanços. São aspectos de naturezas diferentes, que listamos abaixo,
sem pretensão de hierarquização ou identificação de prioridades. A indicação desses pontos é
dotada de caráter de análise e desejo de traçar,
em grandes linhas, um panorama capaz de identificar as principais características e dificuldades
do cenário do trânsito no momento atual no Rio
de Janeiro. Nossa posição de quem analisa “de
fora” do campo do trânsito pode favorecer possíveis vieses, mas também permite percepções
que algumas vezes não são facilmente identificadas pelos “nativos”10.
1.Um ponto problemático é a baixa articulação entre os produtores de dados
primários sobre o trânsito, os acidentes
e o controle do tráfego. A elaboração do
fluxograma relativo aos procedimentos de
notificação, pelo Instituto de Segurança Pública (ISP-RJ)11, envolvendo desde o evento
do acidente até a produção dos registros sobre mortos e vítimas não-fatais no trânsito,
revelou a alta complexidade da transmissão
de dados entre órgãos oficiais e a ausência
surpreendente e preocupante de relações
permanentes entre os seguintes sistemas,
todos envolvidos na produção dos dados:
Secretaria Municipal de Saúde e Defesa Civil
do Rio de Janeiro (SMSDC-RJ), Instituto Médico Legal (IML), 190, Polícia Civil, ISP, Corpo
de Bombeiros, Guarda Municipal, Detran,
Secretaria Estadual de Saúde, Ministério da
Saúde e CET-Rio.
Alguns elementos dessa rede, como o Corpo
de Bombeiros, mantêm sistemas segregados de informação, sem pontos de contato
com outros órgãos do mesmo sistema. Vale
mencionar, além do papel pioneiro do ISP, a
estratégia de transparência da CET-Rio, que
tenciona dar amplo acesso aos seus diversos sistemas de monitoramento. A despeito
desses exemplos, uma das conclusões do
presente trabalho diz respeito à necessidade imperiosa de promover o estabelecimento de vínculos permanentes entre esses órgãos, com vistas à produção, análise e troca
de informações de dados primários sobre o
trânsito e os acidentes.
2. Percebemos a existência de um debate
hesitante sobre os meios de transporte
alternativos. Não apenas o caso das vans,
que vem sendo enfrentado pelo poder municipal, mas também o caso dos mototáxis
e cabritinhos – carros improvisados que fazem o transporte da entrada das favelas até
o ponto mais alto. Esses sistemas permanecem sem regulamentação, embora sejam
utilizados por parte expressiva dos moradores das favelas, que representam aproximadamente 20% da população carioca. Motos
e carros são usados como transporte alternativo em bairros pobres do Rio e da Região
Metropolitana. Os sistemas alternativos de
transporte têm estado à margem das dinâmicas de regulamentação e de melhoria de
qualidade. Não surpreende, portanto, que,
em várias áreas, sejam controlados por grupos criminosos ilegais, como as milícias e o
narcotráfico.
3. Há uma enorme insatisfação cotidiana de
usuários em relação aos transportes coletivos, aos motoristas e ao comportamento
no trânsito desses profissionais, contra uma
capacidade relativamente baixa dos órgãos
públicos para promover mudanças significativas no setor. Este aspecto, que nos parece pouco discutido no âmbito dos debates
atuais, contrasta com a percepção da população, revelada em reiteradas pesquisas
– entre elas a pesquisa desenvolvida pelo
CESeC, cujos resultados se encontram descritos neste livro. É verdade que a Rio Ônibus e a Fetranspor, que representam os empresários do setor, vêm investindo esforços
no treinamento de profissionais. Segundo
essa Federação, no estado do Rio de Janeiro
há 21 mil ônibus circulando, sendo 14 mil na
Região Metropolitana.
Capítulo 1 – Transporte, mobilidade e segurança no trânsito: uma agenda para o Rio
Os profissionais se revezam em turnos, tornando necessários três ou quatro funcioná21
22
Capítulo 1 – Transporte, mobilidade e segurança no trânsito: uma agenda para o Rio
rios para a operação diária de cada ônibus.
Portanto, hoje existem 102 mil profissionais trabalhando em empregos diretos
no setor, mas a insatisfação dos usuários
com ônibus que não param nos pontos,
excedem em velocidade, viajam superlotados na hora do rush e desaparecem nos
horários de pouco movimento não tem
encontrado correspondência com ações
públicas. Também encontramos entre os
motoristas e cobradores ampla e profunda insatisfação com os salários, os tiros
(jornadas dobradas), o sistema de controle
de horários e os veículos sem ar condicionado e mal conservados – uma realidade
que ainda predomina, sobretudo nas Zonas Oeste e Norte.
zação com que, via de regra, tratamos os
acidentes e mortes com motocicletas. Um
dado adicional, que pode expressar parte da percepção sobre os condutores de
motos, é o uso generalizado da expressão
motoqueiros, que é atribuída aos representantes dos motociclistas para se referir especificamente a condutores de motos que
não têm carteira, que dirigem ilegalmente
motos roubadas ou sem documentação
etc. Como mostramos no presente relatório, tudo indica que tem havido algum
grau de queda no número geral de mortes
no trânsito na cidade. Mas, na medida em
que caem os acidentes com automóveis,
aumentam, proporcionalmente, os acidentes com motos.
4.O Rio de Janeiro mantém, ao longo de
toda a década, taxas de atropelamento
bastante superiores às médias nacionais. Há muita inovação e mobilização em
algumas áreas, mas há silêncios incompreensíveis em outras. Os atropelamentos são
a principal característica carioca de insegurança no trânsito e, possivelmente, efeito do célebre estilo carioca de desrespeito às leis – “cariocas não gostam de sinais
fechados”12 – e das incivilidades típicas
locais, como estacionar sobre as calçadas.
Não temos nos mobilizado suficientemente, tanto os poderes públicos como a sociedade, para responder à crescente onda
de acidentes com motos.
6.Uma palavra sobre os engarrafamentos.
Na pesquisa de percepção que apresentamos neste trabalho, os engarrafamentos
são a principal experiência negativa dos
moradores do Rio. E sua presença é ainda
maior entre moradores das Zonas Oeste e
Norte. Embora quem mais reclame seja o
usuário de automóvel, que perde em tempo e em combustível, quando há engarrafamentos quem mais sofre é o usuário de
transportes públicos, que gasta mais em
tempo e, mais tarde, sofrerá com um aumento de tarifa. Como nos disse um especialista:
5. Não encontramos, nos interlocutores
das diferentes áreas, percepção sobre
a gravidade do problema das motos
como um elemento estabelecido na agenda do trânsito na cidade. Os representantes dos motociclistas mantêm-se e têm
sido mantidos à margem dos conselhos,
fóruns e espaços de decisão. Também é
preciso chamar a atenção para a naturali-
“O usuário de transporte público não precisa estar em um engarrafamento específico para perder, ele perde com toda a situação, sofre e paga
por ela”.
7. Por último, uma reflexão sobre a ausência de espaços e fóruns capazes de reunir as diferentes frentes envolvidas na
temática do transporte, da mobilidade
e da segurança no trânsito. É surpreendente que, a despeito dos fortes avanços
e da alteração de prioridades pelos quais
o Rio vem passando nos últimos anos, não
existam espaços permanentes de interlocução entre órgãos públicos, sociedade civil,
pesquisadores e meios de comunicação. Verificamos, ao longo do mergulho nesse campo durante 2011, que as ações são muitas
vezes intensas e bem-sucedidas mas, em geral, isoladas e não coordenadas em relação a
esforços complementares ou mesmo similares. O setor que compreende as esferas trânsito, transporte e segurança é complexo e
multidisciplinar. Demanda uma integração
de esforços que, muitas vezes, verificamos
não existir. Uma recomendação do presente
trabalho é a criação de espaços de diálogo
e o esforço para o estabelecimento de uma
cultura de interlocução. Talvez a criação de
fóruns permanentes de produtores de dados e fóruns de atuação pela segurança no
trânsito seja uma boa oportunidade para
avançar nessa direção.
Notas
Pesquisadora do Centro de Estudos de Segurança e Cidadania da Universidade Candido Mendes e uma das coordenadoras da pesquisa.
1-2
3
Ver capítulos 2 e 3.
É importante notar que, no momento em que foi redigido
o texto, algumas soluções de mobilidade, como o BRT e o
BRS ainda estavam em testes ou não haviam sido implantados. Valores citados referem-se à data da pesquisa, não
da publicação.
4
Sistema de faixas seletivas, implantado inicialmente em
Copacabana, em 2001, e expandido, posteriormente, para
outras áreas.
5
BRT Transcarioca: corredor expresso de ônibus articulado,
com 39km. Ligação da Barra da Tijuca ao aeroporto internacional do Galeão, passando por Jacarepaguá (Curicica,
Taquara, Tanque, Praça Seca), Campinho, Madureira, Vaz
Lobo, Vicente de Carvalho, Vila da Penha e Penha. Obra iniciada em março de 2011.
8
Mais um corredor nos moldes BRT, ligando o Recreio dos
Bandeirantes a Deodoro, na Zona Oeste do Rio de Janeiro,
com 23 quilômetros de extensão. As obras foram iniciadas
em julho de 2012.
9
A antropologia é rica em reflexões sobre as possibilidades do trabalho do etnógrafo, que se dirige a uma cultura que não lhe é familiar para conhecê-la, descrevê-la e
analisá-la. Um trabalho interessante a ser consultado é “De
perto e de dentro: notas para uma etnografia urbana”, de
José Guilherme Cantor Magnani, cuja referência pode ser
encontrada ao fim deste livro.
10
Importante mencionar que o ISP publicou um estudo denominado Dossiê Trânsito 2011. O estudo traz uma análise
dos dados de 2010 sobre mortes e lesões no trânsito, ocorridas no estado, usando como fonte a base de dados de registros de ocorrência da Polícia Civil. O objetivo do dossiê
foi apresentar a situação do ano de 2010, em relação ao
número de vítimas no trânsito, e a sua evolução frente aos
anos anteriores. Os dados foram organizados por tipos de
acidente, por consequências, distribuição geográfica (por
municípios e por Áreas Integradas de Segurança – AISP);
foram calculadas taxas por população residente e por frota
de veículos automotores, além da indicação do perfil das
vítimas. Foi elaborado também um fluxo dos acidentes de
trânsito e a participação das diversas instituições envolvidas no atendimento desses eventos, como polícia civil e
polícia militar, guardas municipais, corpo de bombeiros e
serviços de saúde, dentre outros. Com esse estudo, o ISP
mantém sua tradição de divulgar e analisar dados gerados
no âmbito da segurança pública.
11
Trecho de “Cariocas”, composta e gravada pela cantora
Adriana Calcanhoto em 1993 para o disco A Fábrica do Poema, de 1993.
12
Sistema de trânsito rápido, com veículos articulados, que
trafegam em corredores exclusivos e com modelo de pré-pagamento de tarifas (em construção, no período em que
essa pesquisa foi realizada).
6
BRT Transoeste: corredor expresso de ônibus articulado,
com 56km de extensão e 64 estações. Linha que liga a Barra da Tijuca a Santa Cruz e Campo Grande, passando pelos
bairros do Recreio, Guaratiba, Barra de Guaratiba e Sepetiba. Primeiro trecho inaugurado em junho de 2012.
7
Capítulo 1 – Transporte, mobilidade e segurança no trânsito: uma agenda para o Rio
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24
Capítulo 2 – Mortes no trânsito na cidade do Rio de Janeiro entre os anos 2000 e 2010
Capítulo 2 – Mortes no trânsito na cidade do Rio de Janeiro entre
os anos 2000 e 2010
Silvia Ramos1
Leonardo Leão de Paris2
As mortes no trânsito representam uma
proporção muito importante das mortes por
causas externas3 no Brasil. Seus patamares e seu
crescimento refletem em grande medida a pouca atenção e a baixa eficácia com que governos e
sociedade têm tratado o assunto nas últimas décadas. O rompimento da barreira simbólica dos
40 mil óbitos por ano é um sinal de alerta que
não deveria ser desprezado e reforça a importância de olharmos para as informações que o país
produz. É isto que faremos a seguir.
Em outubro de 2011, o Ministério da Saúde
divulgou dados nacionais sobre mortes provocadas por acidentes de trânsito e revelou que
o Brasil bateu o recorde de ocorrências letais
por meio de acidentes terrestres ao ultrapassar, em 2010, 40 mil óbitos. Considerado o país
com o maior número absoluto de homicídios
e situado entre os dez países com a maior taxa
de mortes intencionais do mundo, o Brasil está
também entre os países com a maior taxa de
acidentes de trânsito.
Gráfico 1 – Comparação entre mortos e feridos em acidentes de trânsito na cidade do Rio de Janeiro de 2005 a 2010
20000
17.263
15.300
15000
19.782
18.724
18.420
Feridos
Mortos
14.924
10000
5000
885
0
2005
800
2006
972
874
2007
2008
676
2009
679
2010
Fonte: Instituto de Segurança Pública – ISP
As mortes são uma fração dos acidentes com
vítimas não fatais que, por sua vez, representam
uma fração dos acidentes sem vítimas. O Gráfico
1, que focaliza o caso do Rio de Janeiro e é baseado nos registros da Polícia Civil, mostra que os
óbitos por acidentes de trânsito constituem uma
proporção entre 20 e 30 vezes menor do que o
número de feridos por acidentes de trânsito. Os
acidentes sem vítimas ocorrem em escala ainda
maior. Dados da Companhia de Engenharia de
Tráfego contabilizam entre 60 e 70 mil acidentes por ano na cidade. Mais precisamente, a base
da CET-Rio registrou 68.587 acidentes em 2008,
68.296 acidentes em 2009, e 75.970 em 20104.
Portanto, olhando a cidade e pensando no curso
de um ano, temos a seguinte ordem de grandeza:
70 mil acidentes, 20 mil feridos e mil mortos no
trânsito. É preciso manter em mente, ao analisar
os dados a seguir, que os óbitos são a parte mais
visível e mais extrema de dinâmicas muito frequentes e cotidianas de desrespeito às leis que,
muitas vezes, levam a desfechos letais. As mortes são a ponta visível de um iceberg. Em outras
palavras, são a parte final do funil que se inicia
por eventos que se repetem, apenas na cidade
do Rio de Janeiro, na proporção de 200 por dia.
O presente capítulo analisa os microdados
do Sistema de Informações sobre Mortalidade
(SIM) – do Datasus, o sistema de dados do Ministério da Saúde – detalhados para o Rio de Janeiro. Vamos indicar não apenas a magnitude das
mortes no trânsito na cidade, mas as principais
mudanças ocorridas ao longo da década passada e suas principais características sociodemográficas, isto é: as grandes tendências de distribuição das mortes por gênero, idade e raça/cor,
além da distribuição por tipos de acidente. Este
olhar meticuloso sobre a violência letal no trânsito no Rio de Janeiro tem por objetivo produzir
indicações que contribuam para a elaboração de
políticas públicas focalizadas nas dinâmicas de
vitimização presentes na cidade.
Os dados, suas características, seus
problemas
As análises realizadas a seguir baseiam-se
nos microdados disponíveis na base de dados do
SIM para os anos de 2000 a 2010. O sistema guarda informações sobre todos os tipos de óbitos
no país, desde a década de 19705. Para as mortes ocorridas em acidentes de trânsito, o Sistema
Internacional de Classificação de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde (CID10) trata dos
acidentes de transporte no intervalo de categorias que vão de V01 a V99. Dividido em acidentes
terrestres e não-terrestres, tem categorias ordenadas de forma que seja possível identificar, de
imediato, se a vítima foi pedestre (V01-V09) ou
se usava algum tipo de veículo: bicicleta (V10-V19), motocicleta (V20-V29), triciclo (V30-V39),
automóvel (V40-V49), caminhonete (V50-V59),
veículo pesado (V60-V69) ou ônibus (V70-V79).
O penúltimo intervalo de categorias (V80-V89) é destinado a meios de transporte menos
utilizados ou com menor número de ocorrências
(trem, bonde, trator etc.) ou que não puderam
ter o tipo de veículo especificado. As últimas categorias correspondem aos acidentes não terrestres (V90-V99) e não serão usadas no presente
trabalho. Para cada um dos meios de transporte
é possível, também, identificar como se deu o
evento que gerou a morte: sem colisão, colisão
com objeto fixo ou colisão com algum dos meios
de transporte mencionados anteriormente.
No presente trabalho, utilizamos apenas as
categorias que englobam a totalidade dos acidentes terrestres. Adicionalmente, em análises
específicas, é necessário agregar algumas categorias para reduzir as distorções na apresentação
dos resultados, devido à pouca participação de
um meio de transporte no total de ocorrências e/
ou à semelhança entre tipos de acidentes. Dessa
forma, algumas agregações melhoram o entendimento das mortes no trânsito. Assim, usamos
as seguintes agregações: Automóvel (automóvel
+ caminhonete), Moto (motocicleta + triciclo) e
Pesado (veículo pesado + ônibus), além das categorias Pedestre e Bicicleta.
Outro problema da base de dados são as
mortes sem causas esclarecidas. Como se observa no Gráfico 2, uma barra preta mostra que crescem ao longo da década as mortes por causas
externas sem intencionalidade especificada, ou
seja, mortes violentas cuja intenção – se homicídio, suicídio, acidente de trânsito ou outros acidentes – não foi esclarecida. Entre 2000 e 2006,
esse resíduo ficou na faixa de 10 a 20 casos por
100 mil habitantes na cidade do Rio de Janeiro.
Mas, a partir de 2007, a proporção de mortes cuja
intencionalidade permanecia não esclarecida no
Rio subiu dramaticamente para 31,4 por 100 mil
habitantes, passando a 23,8 e a 21,4 em 2008 e
em 2009, respectivamente. Dados mais recentes
não haviam sido divulgados até novembro de
2010. Naqueles anos, essa taxa tornava-se maior
do que a própria taxa de acidentes no Brasil, no
estado, na Região Metropolitana e na cidade, lu-
Capítulo 2 – Mortes no trânsito na cidade do Rio de Janeiro entre os anos 2000 e 2010
25
26
Capítulo 2 – Mortes no trânsito na cidade do Rio de Janeiro entre os anos 2000 e 2010
gar onde se mantém bastante baixa.
É difícil precisar quanto da queda da taxa de
mortes por acidentes de trânsito no Rio a partir
de 2007 se deve à efetiva redução das mortes
e quanto se deve ao aumento dos registros de
mortes por causas não esclarecidas. As razões
para o aumento destas não foram elucidadas durante a presente investigação, mas técnicos da
Secretaria Municipal de Saúde e Defesa Civil do
Rio de Janeiro informaram que uma parte significativa dessas mortes deverá vir a ser, no futuro próximo, adicionada às mortes por acidentes
de trânsito. Por essa razão, sempre que possível,
procuramos não trabalhar com os anos de 2007,
2008, 2009 e 2010 separadamente, mas tomamos os dados para os 11 anos (2000 a 2010), de
modo a reduzir possíveis vieses provocados pelos dados faltantes.
Gráfico 2 – Taxas de óbitos por 100 mil habitantes no Brasil e no estado, na Região Metropolitana e na cidade do Rio de Janeiro – 2000 a 2010
35
BR
31,4
30
19,6
14,6
10,4
12,6
14,4
10,5
12,0
16,3
12,2
13,1
21,4
23,8
20,2
11,5
2006
19,8
17,1
15,8
19,5
19,8
18,2
16,3
14,5
2005
10,4
19,5
18,9
17,0
15,3
20,1
19,6
19,1
15,5
16,2
18,7
18,9
15,4
15,5
15,4
10,2
9,8
18,8
19,0
14,5
17,2
16,3
17,7
18,5
13,4
10
10,5
15
17,1
17,8
14,1
15,5
20
21,3
RJ
25
2007
2008
2009
2010
Reg. Met.
Capital (RJ)
N. esp.
5
0
2000
2001
2002
2003
2004
Fonte: SIM/Datasus
Como dissemos, os dados sobre as mortes
no trânsito representam o extremo de dinâmicas que ocorrem em grande escala diariamente,
envolvendo pedestres, condutores de veículos
automotores, passageiros, ciclistas e usuários de
outros meios de transportes, cujos disfuncionamentos resultam em acidentes sem vítimas, com
vítimas e com vítimas letais. Os dados sobre as
mortes, portanto, interessam neste estudo menos como a expressão matemática precisa dos
óbitos ocorridos na cidade no período e mais
como a aproximação possível para compreendemos melhor a natureza, as características e as
tendências das dinâmicas em curso.
Os dados sobre as mortes são importantes,
pois nenhuma outra base se aproxima do SIM
em termos de cobertura nacional, homogeneidade das informações e precisão, a despeito dos
seus problemas. Os dados sobre morbidade do
próprio Datasus (informações produzidas a partir das internações hospitalares) são imprecisos
e dificilmente expressam o conjunto dos acidentes não-fatais. Já a base que reúne informações
sobre acidentes sem vítimas (desenvolvida pela
CET-Rio) permite o georreferenciamento de milhares de ocorrências, mas não possibilita visualizar informações sobre os envolvidos nos acidentes (se homens ou mulheres, sua faixa etária etc.)
e não oferece cobertura total da cidade6.
Patamares das taxas cariocas e as
tendências em curso: o que está
mudando
Como se verifica na Tabela 1, a taxa média
das mortes por acidentes no Brasil, entre 2000 e
2010, é de 19,3 por 100 mil habitantes7. A taxa
média para o Estado do Rio de Janeiro é 17,7. Para
os municípios da Região Metropolitana do Rio de
Janeiro (RMRJ)8, a taxa é 14,3 fora a capital9; para
a cidade é 14,7, abaixo da média nacional. Quando olhamos a distribuição média pelos principais
tipos de acidente, chama a atenção o fato de que
a taxa de mortes por atropelamentos no Rio (7,6
por 100 mil habitantes) seja maior do que a taxa
do país (5,3): quando tomamos as mortes por
tipo de acidente e usamos como contraste o panorama do país na década passada, configura-se
um cenário em que os pedestres podem ser vistos como o principal problema da cidade.
tabela 1 – panorama das mortes no trânsito: taxas médias por 100 mil habitantes no Brasil e no estado, na cidade e na rmrJ – 2000 a 2010
Brasil
Estado
RM (sem capital)
Capital
Acidentes
19,3
17,7
14,3
14,7
Pedestres
5,3
7,9
7,8
7,6
Bicicleta
0,8
0,7
0,3
0,3
Moto
3,4
2,5
1,3
1,8
Automóvel
4,0
3,0
1,5
2,3
Pesado
0,5
0,4
0,2
0,2
outros
5,3
3,2
3,1
2,4
Fonte: SIM/Datasus
Ao analisarmos essa evolução usando o Gráfico 3, surge um aspecto muito importante de
mudanças no perfil dos acidentes entre 2000 e
2010: as mortes por acidentes de motos (a linha
em vermelho), que estavam em terceiro lugar
tanto no país como no estado, na RMRJ e na cidade, em todos os casos mudaram de posição e ga-
nharam relevância, indo para o primeiro lugar no
caso do Brasil e para o segundo lugar no ranking
das mortes no RJ, na RMRJ e na cidade. É importante observar que, na cidade e nos demais municípios da RMRJ, as mortes por acidentes com
motos crescem, mas os atropelamentos ocorrem
em proporção maior.
Gráfico 3 – evolução das taxas de mortes por tipos de acidentes no Brasil e no estado, na rmrJ e na cidade do rio de Janeiro – 2000 a 2010
Fonte: SIM/Datasus
Outra evidência da mudança de padrão dos
acidentes que mais provocam mortes pode ser
confirmada no Gráfico 4. quando tomamos todas
as mortes por acidentes e pensamos na proporção de cada modalidade em comparação com as
demais, verificamos que as mortes provocadas
Capítulo 2 – Mortes no trânsito na cidade do Rio de Janeiro entre os anos 2000 e 2010
27
28
Capítulo 2 – Mortes no trânsito na cidade do Rio de Janeiro entre os anos 2000 e 2010
por acidentes com moto (em vermelho), que representavam 1,5% do total de mortes, passaram
a corresponder a 21,4% – o que representa um
crescimento de 14,2 vezes em 11 anos.
Gráfico 4 – Evolução das causas de mortes por acidentes no Rio de Janeiro – 2000 a 2010
1,5
2000
56,2
Outros
6,0
Bicicleta
35,6
Pesado
Moto
1,2
Automóvel
2010
52,6
0
10
20
13,5
30
40
50
21,4
60
70
80
3,7
90
7,5
Pedestres
100
Fonte: SIM/Datasus
De fato, a grande mudança da década foi
o crescimento não só das mortes por acidentes
com motos, mas de todos os indicadores associados a este modal.
Se a frota de motocicletas (no Brasil) cresceu
369% nessa década (2000), as mortes de motociclistas cresceram 506%. Em outras palavras:
369% do incremento da mortalidade devem-se
a esse aumento drástico da frota de motocicletas. Mas 137% (a diferença entre ambas as percentagens) só podem ser interpretados como
um aumento do risco-motocicleta no trânsito.
[...] Já com o automóvel ocorreu processo inverso: a frota aumentou 88% e as vítimas de
acidentes com automóvel 57%. Assim, por motivos diversos, o risco-automóvel caiu 31 pontos percentuais no período. [...] Já no início do
período, em 1998, o risco-motocicleta era 75%
maior que o risco-automóvel. Para o fim do período, no ano de 2008, esse risco ampliou-se
ainda mais: 170% maior que nos automóveis.
(Waiselfisz, 2011, p. 16).
O autor acrescenta um dado nacional muito
importante: em 1970, as 62 mil motocicletas registradas no país representavam só 2,4% do total
de veículos motorizados. Para 2010 já podiam
ser contadas 16,5 milhões de unidades, representando 25,5% dos veículos motorizados.
Na cidade do Rio de Janeiro, segundo dados do Detran, havia 89.406 motos em 2001, e
193.135 em 2010, mostrando um crescimento de
159%. A frota de automóveis aumentou 22,5% e
a de veículos pesados 33,2% (Gráfico 5). A frota carioca de motos aumentou 159% e as mortes por acidentes de motos cresceram 365% no
mesmo período, passando de 38 em 2001 para
177 em 2010.
Gráfico 5 – Crescimento da frota de automóveis, motos e veículos pesados na cidade do Rio de Janeiro – 2001 a 2010
200
BR
159,0
150
100
50
0
22,5
Pesado
33,2
Automóveis
Fonte: Detran
Motocicletas
A distribuição desigual das mortes
por sexo, idade e raça
todos os acidentes, olhando-se para o Rio de Janeiro, a distribuição entre masculino e feminino
guarda a proporção em que aproximadamente
80% das vítimas são homens, contra 20% de vítimas mulheres. Nos acidentes envolvendo pedestres, a proporção se aproxima de um terço de
mulheres para dois terços de homens. No caso
de automóveis e veículos pesados, a proporção
é ligeiramente mais acentuada.
Quando as vítimas se acidentaram em motos ou bicicletas, o perfil de gênero se radicaliza.
No caso das motos, 89,8% das vítimas fatais são
do sexo masculino e, no caso das bicicletas, essa
proporção é de 89,3% (Gráfico 6). O desequilíbrio de gênero entre as vítimas de acidentes de
trânsito lembra características similares entre as
vítimas de violência intencional. Em homicídios,
os homens são 92% das vítimas, e em suicídios,
79,1%. Essas indicações nos mostram que a mortalidade violenta é essencialmente masculina e
os acidentes de trânsito confirmam a regra.
Quando analisamos as mortes no trânsito
desagregadas por variáveis demográficas, isto é,
por sexo, idade e raça, verificamos que a distribuição dos óbitos não é homogênea na população. As mortes são concentradas em segmentos
da população com características específicas.
E quando complexificamos essas variações por
tipos de acidentes, obtemos indicações capazes
de orientar políticas públicas de prevenção, sejam campanhas educativas, sejam estratégias de
legislação e fiscalização. Acresce-se a isto o fato
de que as variáveis de cor/raça podem ser tomadas como uma aproximação a indicadores socioeconômicos de renda e escolaridade.
Em primeiro lugar, as mortes por acidentes
de trânsito, tais como as mortes por agressões
intencionais e os suicídios, são extremamente
concentradas entre os homens. Na média de
Gráfico 6 – Distribuição da proporção média de mortalidade no trânsito, por tipo de locomoção e sexo na Capital do Rio de Janeiro – 2000 a 2010
100
93,1
Mulheres
89,9
73,4
75
73,4
76,6
73,0
Homens
50
26,6
25
6,9
0
Bicicleta
26,6
27,0
23,4
10,1
Moto
Pesado
Pedestre
Automóvel
Trânsito
Fonte: SIM/Datasus
As faixas de idade são importantes para
compreendermos as dinâmicas dos acidentes
e produzirmos estratégias de prevenção destinadas a públicos-alvo definidos. No Gráfico 7, é
possível visualizar, dentro das diferentes faixas
de idade, a distribuição dos acidentes por tipos.
Nitidamente, verificamos que entre as faixas
mais baixas (0 a 14), predominam os atropelamentos (marcados em cinza no gráfico), que voltam a crescer nas faixas mais velhas (acima de
50), até chegar a 86% das mortes quando as vítimas têm 80 anos e mais. As mortes por acidentes
de automóveis crescem dos 15 anos em diante e
começam a cair quando as vítimas têm acima de
50 anos. As mortes por acidentes de motos (em
amarelo) dão um salto assustador na faixa dos 15
aos 19, e se mantêm muito numerosas até a faixa
dos 25 a 29, sendo evidente a concentração desse tipo de ocorrência entre os jovens.
Capítulo 2 – Mortes no trânsito na cidade do Rio de Janeiro entre os anos 2000 e 2010
29
30
Capítulo 2 – Mortes no trânsito na cidade do Rio de Janeiro entre os anos 2000 e 2010
Gráfico 7 – distribuição percentual das vítimas fatais segundo faixa
etária e tipo de acidente de trânsito na capital do rio de Janeiro – 2000 a 2010
100%
80%
14,4
20,6
12,7
15,3
12,0
6,2
10,1
5,7
9,0
73,3
79,9
82,4
86,0
10-14 15-19 20-24 25-29 30-34 35-39 40-44 45-49 50-54 55-59 60-64 65-69 70-74 75-79
80+
10,7
6,7
9,9
27,5
60%
40%
61,9
21,5
71,3
20%
67,1
16,7
32,5
22,4
30,0
20,1
25,8
19,7
22,4
26,5
17,4
19,0
31,0
18,8
16,5
17,4
11,1
10,3
6,1
15,6
15,5
16,3
56,1
59,0
18,7
17,6
10,7
11,9
14,5
12,8
66,4
67,6
8,8
20,1
37,7
46,5
53,2
0%
0-4
5-9
pedestre
automóvel
motocicleta
outros
Fonte: SIM/Datasus
O conjunto de dados organizados no Gráfico 8 mostra a distribuição das mortes no trânsito, na cidade do Rio de Janeiro, de 2000 a 2010,
por idade e raça/cor. Nesses gráficos, verificamos
que a vitimização fatal por acidentes de trânsito
é significativamente modulada por idade e também por cor. A indicação por raça/cor10 traz uma
nova perspectiva ao debate, com a aproximação
de variáveis socioeconômicas, sugerindo que as
vítimas classificadas como “não-brancas” tendem
a ter menor renda e escolaridade que as vítimas
classificadas como “brancas”.
Nesse caso, chama a atenção o fato de que
– mesmo quando tomadas no conjunto dos acidentes de trânsito – negros (soma de “pretos” e
“pardos”) predominam ligeiramente entre as
vítimas. Também predominam quando nos debruçamos sobre os atropelamentos e, principalmente, quando olhamos para as mortes por
acidentes com motos e, especialmente, na faixa
mais jovem. O único tipo de acidente em que
brancos são maioria, comparativamente às vítimas não-brancas, é o que envolve automóveis.
Gráfico 8 – taxas de mortalidade por 100 mil habitantes por cor e idade na cidade do rio de Janeiro – 2000 a 2010
Fonte: SIM/Datasus
Vale recordar que o Brasil tem feito progressos importantes na redução de violência letal
por acidentes de trânsito, não apenas a partir de
iniciativas como a reforma do Código de Trânsito
(1998) ou a adoção de legislação mais rigorosa
em relação ao uso do álcool (Lei Seca), mas também em relação à obrigatoriedade dos dispositivos de segurança em automóveis, destinados à
redução da letalidade em caso de acidentes: por
exemplo, cinto de segurança, freio ABS, airbags e
outros recursos.
No caso dos acidentes de motos, em que as
vítimas são predominantemente jovens, do sexo
masculino e negros – portanto, jovens pobres e
muitas vezes moradores de bairros de periferia,
muitos dos quais usam as motocicletas como
meio de subsistência – tudo indica que os governos, os legisladores, a mídia e a sociedade
não têm dedicado importância equivalente à
dos acidentes com automóveis. É preciso acrescentar que as vítimas de acidentes de motos, ao
lado de menor renda e menor escolaridade, também têm menor capital social, por causa da faixa
etária mais jovem, por causa da classe social, dos
locais de moradia, do menor acesso à mídia e da
menor tradição de ação coletiva.
Observando os dados do Rio de Janeiro,
devemos concluir que os atropelamentos são
o problema permanente da cidade, persistindo
ao longo da década passada em patamares bastante acima da média nacional. Por outro lado,
as motos são a grande novidade no cenário de
preocupações – e não só pelo crescimento da
frota, pelo novo uso que se faz do veículo (meio
de subsistência para alguns jovens), ou o desrespeito frequente às sinalizações e à legislação sobressai a tendência à naturalização sobre a sorte
de suas vítimas e à banalização dos acidentes
que envolvem motos, sejam eles fatais ou não.
Tudo isso deveria constituir um foco de atenção
nos próximos anos.
Notas
Pesquisadora do Centro de Estudos de Segurança e Cidadania da Universidade Candido Mendes e uma das coordenadoras da pesquisa.
1
Estatístico do Centro de Estudos de Segurança e Cidadania da Universidade Candido Mendes.
2
Segundo a Classificação Estatística e Internacional de
Doenças e Problemas Relacionados à Saúde, mortes por
causas externas são mortes não naturais que sobrevêm da
decorrência de acidentes, homicídios, suicídios ou qualquer outro tipo de violência.
3
Trata-se da base GEO-GIT desenvolvida pela CET-Rio a
partir das ligações ao sistema 190 da Polícia Militar do Estado do Rio de Janeiro.
4
Para uma descrição detalhada do SIM, veja Daniel Cerqueira. Mortes Violentas Não Esclarecidas e Impunidade
no Rio de Janeiro, outubro de 2011. Disponível em: www.
forumseguranca.org.br
5
Por uma série de razões, a base não registra acidentes em
algumas das principais artérias da cidade, como Avenida
Brasil, Linha Vermelha, Linha Amarela e outras.
6
A taxa se calcula pela divisão do número de acidentes em
determinado ano pelo número de habitantes, ponderado
por 100 mil. No caso da taxa média de vários anos, procede-se à soma dos acidentes por todos os anos, dividido
pelo número de anos.
7
A RMRJ compreende os seguintes 19 municípios: Belford
Roxo, Duque de Caxias, Guapimirim, Itaboraí, Itaguaí, Japeri, Magé, Mangaratiba, Maricá, Mesquita, Nilópolis, Niterói, Nova Iguaçu, Paracambi, Queimados, Rio de Janeiro,
São Gonçalo, São João de Meriti, Seropédica.
8
Para permitir a comparação com as taxas da capital, sempre que aparecer RMRJ neste trabalho, a cidade do Rio do
Janeiro foi excluída da categoria.
9
A categoria “não-brancos” reúne as vítimas identificadas no Datasus como “pretos” e “pardos” segundo a classificação adotada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística (IBGE). A base populacional para esses cálculos
foi retirada do site do Instituto Pereira Passos (IPP), para o
ano de 2000 e baseia-se nos dados do IBGE.
10
Capítulo 2 – Mortes no trânsito na cidade do Rio de Janeiro entre os anos 2000 e 2010
31
32
Capítulo 3 – Percepções sobre o trânsito
Capítulo 3 – Percepções sobre o trânsito
Barbara Musumeci Mourão1
A cidade do Rio de Janeiro e seus
arredores
Neste capítulo, serão apresentados os resultados de um levantamento de natureza qualitativa, realizado com uma amostra não aleatória
de 568 jovens e adultos que fazem uso dos mais
diversos meios de locomoção. A enquete buscou
apreender os sentimentos de motoristas, passageiros de transportes coletivos e pedestres a
respeito de suas experiências cotidianas ligadas
à mobilidade urbana. Avaliaram-se não apenas
seus anseios, temores e a sensação de risco, mas
também os prazeres, as facilidades e as propostas para melhorar o fluxo e as condições de trânsito na cidade.
Para isso, os entrevistados foram solicitados
a responder, de forma espontânea, a perguntas abertas sobre suas experiências, positivas e
negativas, no dia-a-dia; sobre o que os levava a
sentir-se em risco no trânsito; sobre o que fariam
para melhorá-lo e de que maneira definiriam o
trânsito no Rio de Janeiro. Salvo nas situações
que exigiram a intervenção direta do pesquisador, nas ruas, os questionários foram respondidos de próprio punho pelos entrevistados, por
e-mail, em escolas ou em locais de trabalho.
O que se pretendeu, com este trabalho, foi
trazer à luz o repertório de ideias e expressões
associadas a experiências de locomoção na cidade do Rio de Janeiro e em suas vias de acesso. Os
resultados que aqui se encontram quantificados,
assim como os cruzamentos de variáveis, têm
um caráter apenas aproximativo e indicativo,
não podendo, portanto, ser generalizados para
a população do município, tampouco de sua Região Metropolitana.
Diante da quantidade e da multiplicidade
de respostas, foi necessário agregar e consolidar
as informações contidas nos questionários para
que finalmente elas se tornassem inteligíveis.
Ainda assim, a leitura dos dados privilegiou o aspecto qualitativo, focalizando a singularidade e
a recorrência das variáveis, fundidas ou destacadas, como se verá, em função de seus significados subjacentes.
Evidentemente, como o objetivo era produzir um inventário de questões, ideias, vocabulários e imagens apresentados de maneira inteiramente espontânea pelos respondentes, os
percentuais expostos não se referem ao número total de entrevistados, mas sim aos múltiplos
conteúdos expressos em suas respostas.
O questionário e o perfil dos
respondentes
Embora não se trate de uma amostra estatisticamente representativa da população do município, nem de uma amostra estratificada por usuários dos distintos meios, buscaram-se formas de
diversificar o conjunto de entrevistas: os questionários foram aplicados nas diferentes regiões da
cidade a uma população diferenciada tanto do
ponto de vista de idade e de gênero, quanto da
condição de motorista profissional ou particular.
O que diferencia este levantamento de outros realizados anteriormente é que a maior parte das pesquisas efetuadas até então buscava
mensurar as formas de uso dos transportes e as
avaliações de seus usuários. Aqui, trata-se também de capturar, sem qualquer tipo de indução,
as percepções subjetivas, expressas nos sentimentos revelados e nas atribuições de sentido
associadas às observações individuais. Surpreende, como se verá adiante, a convergência da
uso de um só meio de transporte e que, mesmo privilegiando um ou dois deles, não tenham
também experiências nos demais. Para qualquer
pessoa que se locomove pela cidade, portanto,
é difícil restringir suas observações a uma perspectiva única.
Isso explica, provavelmente, as enormes
discrepâncias entre as pesquisas sobre usos e
avaliações dos meios de transporte. Em parte
porque, além de circunscreverem áreas geográficas e períodos distintos2, cada base de dados,
dependendo dos objetivos da instituição que a
produz, considera conjuntos diferentes de meios
de transporte, definindo inclusões, exclusões e
agregações segundo uma lógica própria.
Além disso, alguns levam em conta apenas
o transporte principal ou os que foram utilizados
na véspera da entrevista, enquanto outros englobam todos os meios usados pelos entrevistados.
As pesquisas adotam ainda abordagens metodológicas diversas (como aplicação de questionários em domicílio e entrevistas telefônicas) e
seus totais também são distintos, expressando
ora 100% da amostra, ora a soma de todos os
meios apontados pelos entrevistados. Na Tabela
2, foram reunidos os resultados de diferentes levantamentos, de forma a permitir a visualização
de seus pontos convergentes e contrastantes:
gramática através da qual o trânsito da cidade é
concebido e adjetivado, a despeito das variações
etárias e regionais, que serão, por sua vez, igualmente exploradas no curso do capítulo.
Os entrevistados responderam às seguintes
perguntas:
1. Que experiências ruins o(a) senhor(a) tem
tido no seu dia-a-dia no trânsito?
2. Que experiências boas o(a) senhor(a) tem
tido no seu dia-a-dia no trânsito?
3. Tem alguma coisa que faz o(a) senhor(a) se
sentir em risco no trânsito?
4. O que o(a) deixa estressado(a) no trânsito?
5. O que o(a) senhor(a) acha que deveria ser
feito para melhorar o trânsito?
6. Se o(a) senhor(a) tivesse que escolher uma
palavra para definir como é o trânsito na cidade do Rio de Janeiro, qual escolheria?
Meio de transporte utilizado
Por razões óbvias, dividir os habitantes da
cidade em motoristas, pedestres, ciclistas, passageiros de transportes coletivos e usuários de
outros modais não é uma tarefa fácil. Além de
praticamente toda a população ser, em algum
momento, pedestre, poucos são os que fazem
COMPARATIVO DA DISTRIBUIÇÃO DE USUÁRIOS DOS DIFERENTES MEIOS DE
Tabela 2 – Comparativo da distribuição
de usuários
dos
diferentes meios
de transporte, por instituto de pesquisa3
TRANSPORTE,
POR
INSTITUTO
DE PESQUISA
FETRANSPOR 4
IPEA5
RMRJ - 2009
STRJ6
RIO COMO
VAMOS7
IBPS / O GLOBO8
BRASIL
SUDESTE
RMPRJ -
Município do Rio
Município do Rio
- 2011
– 2011
2002/2003
de Janeiro - 2011
de Janeiro - 2011*
Ônibus
91%
33,08%
45%
Van / kombi/ besta
39%
8,19%
5%
4%
Trem
15%
1,52%
1%
3,2%
Metrô
14%
1,78%
3%
6,3%
Carro
12%
23,8%
25,6%
10,58%
-
12,6%
11,6%
0,51%
-
0,70%
-
-
12,3%
8,3%
33,85%
19%
4,7%
7%
3,8%
3,24%
-
-
6,32%
-
28,9%
Moto
44,3%
3%
Taxi
A pé
Bicicleta
Outros 9
-
50,7%
37,9%
11,3%
“veículo
próprio” 10%
2%
1,7%
*Deslocamentos para o trabalho
Fonte: CESeC/SMS-Rio
Capítulo 3 – Percepções sobre o trânsito
33
34
Capítulo 3 – Percepções sobre o trânsito
utilizados no dia-a-dia, sem especificar o motivo das
viagens – se a trabalho ou a passeio. Como se verá
no Gráfico 9, onde estão registrados os primeiros
meios de locomoção mencionados por entrevistado, os ônibus predominaram de maneira absoluta.
Ao contrário de alguns dos levantamentos relacionados acima, cujos questionários continham
respostas de múltipla escolha, nesta enquete pediu-se aos entrevistados para indicar, de forma totalmente espontânea, o(s) meio(s) de transporte
Gráfico 9 – Meio de transporte utilizado em 2011 pelos habitantes da RMRJ entrevistados (%)
90
Pedestre
79,0
60
30
8,1
0
ônibus
Carro
4,6
2,6
1,9
1,9
0,7
0,9
0,2
Metrô
Táxi
Bicicleta
Moto
Trem
Van
Barca
Fonte: CESeC/SMS-Rio
Por diversos motivos, o trajeto feito a pé não
foi mencionado, provavelmente pelo fato de os
respondentes não estarem sugestionados por
opções de respostas previamente definidas e porque a expressão “meios de transporte”, contida na
formulação da pergunta, está fortemente associada, no imaginário, a algum veículo, motorizado ou
não. Por outro lado, tanto as entrevistas por e-mail
quanto as realizadas em escolas e, sobretudo,
aquelas aplicadas em locais de trabalho tendem a
cobrir os segmentos que se deslocam com maior
regularidade usando veículos automotores.
Seria necessária, portanto, uma pesquisa
domiciliar para que fosse possível captar a camada da população que se desloca somente a pé, já
que, como revela a Pesquisa de Origem-Destino,
realizada pela Secretaria Estadual de Transportes e pela Companhia Estadual de Engenharia
de Transportes e Logística, com dados de 2002 e
2003, a imobilidade e a mobilidade não-motorizada se relacionam ao nível de renda e de escolaridade da população.
Local de moradia
Os gráficos que se seguem expressam uma
sobrerrepresentação, no conjunto dos entrevistados, dos moradores das Zonas Norte e Oeste.
Esse viés foi deliberadamente mantido no cômputo das respostas, já que se procurou captar
particularmente os problemas vividos pela população mais pobre da cidade, sujeita às maiores dificuldades nos seus deslocamentos diários. Para a
melhor visualização das questões específicas de
cada área, agregaram-se as diferentes regiões da
cidade e arredores segundo sua distância física
e social do Centro (dados seus impactos diretos
sobre a mobilidade) e como indicador aproximativo de renda. Assim, foram consideradas:
1. Região Metropolitana do Rio de Janeiro
(RMRJ), excluindo a cidade do Rio de Janeiro e abrangendo Baixada Fluminense, São
Gonçalo e Itaboraí.
2. Zona Sul e Barra da Tijuca, em função da proximidade de renda e de acesso comum a bens
materiais e simbólicos de seus moradores.
3. Tijuca e Vila Isabel, pelos mesmos motivos
que levaram a agregar Zona Sul e Barra.
4. Zona Norte, excluídos Tijuca e Vila Isabel.
5. Zona Oeste.
Gráfico 10 – Local de moradia em 2011 dos habitantes da RMRJ entrevistados (%)
50
Pedestre
43,4
40
30
20
17,0
13,8
10
0
13,7
10,8
1,2
RMRJ
Zona Sul/
Barra
Tijuca/
Vila Isabel/
Maracanã
Zona Norte
Zona Oeste
Outros
Fonte: CESeC/SMS-Rio
Idade e gênero
A distribuição por faixa etária e a proporção
de homens e mulheres no conjunto dos respondentes aproximou-se consideravelmente dos
percentuais relativos à população do Rio de Ja-
neiro. Como mostra o gráfico seguinte, 48% dos
respondentes eram do sexo masculino – a população de homens, no município é de 46,8% – e
metade dos entrevistados tinha entre 19 e 39
anos – 47% dos moradores do município têm
entre 15 e 39 anos.
Gráfico 11 – Idade em 2011 dos habitantes da RMRJ entrevistados (%)
30
25
20
Pedestre
26,3
23,3
19,8
17,5
15
9,3
10
3,9
5
0
Até 18
19-29
30-39
40-49
50-59
60+
Fonte: CESeC/SMS-Rio
Experiências negativas vividas
pelos entrevistados
O relato mais frequente, quando se trata de
lembrar dos sofrimentos e desconfortos vividos
no trânsito é o dos “congestionamentos”: engarrafamentos, lentidão, tempo gasto entre a casa e
o trabalho etc. Em seguida, destacam-se as “condições” gerais do trânsito, tais como longas esperas
nos pontos de ônibus; paradas mal posicionadas;
falta de informação nas ruas; o mau estado dos
Capítulo 3 – Percepções sobre o trânsito
veículos que fazem o transporte público; o mau
estado das vias públicas, constantemente esburacadas; problemas de sinalização; mau atendimento e, em quantidade muito significativa, a
superlotação, seja de trens, metrôs ou ônibus.
O terceiro tipo de relato mais comum refere-se à forma como os motoristas conduzem, sejam eles profissionais ou particulares11. Excesso
de velocidade – sobretudo dos motoristas de
ônibus –, direção agressiva dos condutores em
geral e desrespeito às regras de trânsito, aos ci35
36
Capítulo 3 – Percepções sobre o trânsito
clistas e motociclistas, conformam um conjunto
de experiências aqui referidos como problemas
ligados aos próprios “motoristas”.
te porque na Avenida Niemeyer os motoristas
correm muito e dão a impressão de que vamos
cair no mar. É uma loucura. A forma como eles
dirigem é horrível. Parece que eles não dirigem,
eles voam. – moradora de Jacarepaguá, 35 anos.
A cidade hoje parece parada. Os congestionamentos são diários. Além disso, o transporte
público, sobretudo o metrô e os trens, demonstram que a oferta de serviços não corresponde
à demanda. Muitos veículos estão em péssimo
estado de conservação e a administração dos
mesmos ainda pouco fez para satisfazer minimamente as necessidades do cidadão. – morador de Jacarepaguá, 38 anos.
Cenas de violência, acidentes e comportamentos negativos de passageiros de coletivos –
tais como fumar, não ceder o lugar ou falar alto –
também compõem, ainda que em menor escala,
o leque de experiências negativas dos entrevistados (Gráfico 12):
É muito ruim ser obrigada a compartilhar a ciclovia com os entregadores de água que usam
os triciclos e teimam em fazer uso dela, os cadeirantes, as pessoas que insistem em fazer caminhadas ou corridas por ali e os caras das carrocinhas de sorvete. [...] Outra coisa que é muito
ruim para nós, ciclistas que usamos a bicicleta
constantemente, [...] são os motoristas de carro
que não respeitam a gente, os ônibus que vêm
em cima da gente. Qualquer motorista de veículo automotor não respeita o ciclista. E depois
querem fazer do Rio a cidade das bicicletas. –
moradora de Copacabana, 56 anos.
Nos trens e nos ônibus, a lotação é constante
em horas de grande fluxo. Nos ônibus, há a falta de educação dos motoristas, com ênfase no
desrespeito para com os idosos. Há também a
falta de educação dos usuários uns com os outros, na forma de empurrões e aparelhos de som
com volume alto. [...] Nos trens, há muito desrespeito aos vagões exclusivos para mulheres e
também desordem no fluxo de entrada e saída
dos vagões, ocasionando empurra-empurra e
discussões constantes. [...] Recentemente, tive
que interceder quando dois homens iam bater
em um idoso bêbado que estava gritando dentro de um ônibus. Além disso, o que posso dizer
é que já fui assaltado quatro vezes em ônibus e
em todas elas ele estava vazio – morador do Encantado, 30 anos.
Os ônibus são muito cheios. [...] Sofro muito
com os ônibus lotados. Sinto muita falta de segurança dentro do ônibus: tenho medo de ser
assaltada e tenho medo de sofrer algum aciden-
Gráfico 12 – Frequência em 2011 dos problemas mencionados pelos habitantes da RMRJ entrevistados (%)
Experiências Ruins
Congestionamento
Espera, falta de informação, veículos e vias
em mau estado, superlotação, sinalização.
Condições
Direção agressiva, desrespeito às regras
e aos outros veículos, alta velocidade.
Motoristas
33,1
28,7
20,4
Outros
8,7
Violência
4,2
Acidente
Fumam, não cedem o lugar, falam alto,
dão calote.
3,4
Passageiros
1,6
0
5
Fonte: CESeC/SMS-Rio
10
15
20
25
30
35
Entretanto, as avaliações não são as mesmas
para todo o conjunto da amostra. Quanto maior
a idade do entrevistado, por exemplo, mais frequente é a menção a experiências negativas
associadas à forma de os motoristas dirigirem.
Somadas aos dados que indicam um padrão
predominantemente juvenil de mortalidade por
acidentes – ver capítulo 2 deste relatório –, essas
variações etárias reforçam a associação entre juventude e direção temerária, explicando, de certa forma, a maior tolerância dos mais jovens com
os maus motoristas.
Relatos negativos ligados ao modo de con-
duzir os veículos são mais comuns entre moradores das duas regiões mais ricas da cidade –
Zona Sul/Barra e Tijuca/Maracanã –, compostas
por população provavelmente mais exigente e
crítica, já que usufrui dos melhores serviços disponíveis, tal como mostram o depoimento e os
gráficos seguintes.
Os ônibus desrespeitam as regras do trânsito, às
vezes na frente da guarda municipal e da polícia.
Já caí no ônibus, já fui deixado no ponto diversas vezes e já vi mãe cair com filho no colo e ser
hostilizada pelo motorista. Já reclamei inúmeras
vezes – morador da Barra da Tijuca, 30 anos.
Gráfico 13 – Frequência em 2011 da variável “motoristas”, segundo a idade e o local de moradia dos habitantes da RMRJ entrevistados (%)
45
40
35
30
25
20
15
10
5
0
40
41,4
Pedestre
25,6
15,0
Até 18
21,2
21,7
30-39
40-49
17,8
19-29
50-59
60+
Pedestre
35,5
30
25,9
18,3
20
16,0
12,6
10
0
Zona Sul/
Barra
Tijuca/Vila Isabel/
Maracanã
Zona Norte
Região
Metropolitana
Zona Oeste
Fonte: CESeC/SMS-Rio
Experiências positivas no trânsito
Quando chamados a descrever bons momentos ligados à mobilidade urbana, quase metade dos entrevistados afirmam que não tiveram, ou
não têm, cotidianamente, nenhuma boa vivência
para relatar. Neste caso, excepcionalmente, a resposta se torna única e excludente, ou seja, o perCapítulo 3 – Percepções sobre o trânsito
centual das afirmações “nenhuma experiência positiva” coincide exatamente com a proporção dos
entrevistados da amostra que forneceram essa
resposta, já que ela não comporta nenhum acréscimo ou complemento. É notável, portanto, que
mais de 40% dos respondentes, como indicado no
Gráfico 14, tenham tido dificuldade em identificar
qualquer experiência positiva nesse campo.
37
38
Capítulo 3 – Percepções sobre o trânsito
Gráfico 14 – Frequência em 2011 das experiências positivas mencionadas pelos habitantes da RMRJ entrevistados (%)
Nenhuma
42,4
Fluxo
Abundância de modais e vagas, integração,
ar condicionado, 'quando funciona'.
14,3
Facilidades/Conforto
11,7
Políticas Públicas
Tudo. Custo das passagens.
Cortesias, conversas, novas amizades.
Mais respeito, bom atendimento.
Paisagem, ouvir música, leitura,
não ter que dirigir.
8,0
Outros
7,1
Sociabilidade
6,2
Bons comportamentos
5,3
Prazeres particulares
5,1
0
10
20
30
40
50
Fonte: CESeC/SMS-Rio
Já entre os que admitem a existência de
aspectos positivos, os itens mencionados com
maior frequência foram categorizados como Fluxo – rapidez de tráfego para determinados transportes coletivos e carros particulares – e certas
Facilidades e confortos – como a abundância de
modais e de vagas em algumas áreas, ônibus
que fazem a integração com o metrô, ônibus que
possuem ar-condicionado etc. Em menor proporção, foram citadas algumas iniciativas, classificadas abaixo como Políticas Públicas, tais como
o BRS, o BRT, a Lei Seca e a construção de ciclovias, além de melhorias na sinalização e nas vias.
A Sociabilidade também aparece como um
elemento valorizado, englobando gentilezas,
conversas nos coletivos, estabelecimento de novas amizades e motoristas cordiais. Os Bons comportamentos e os Prazeres particulares, aludidos
com menor frequência, resumem experiências
como bons atendimentos e condução respeitosa, de um lado, e, de outro, a possibilidade de
ouvir música, admirar a paisagem, ler, passar por
lugares aprazíveis e não ter que dirigir.
Quando consigo pegar um ônibus com ar-condicionado, mesmo que a viagem demore por
conta do engarrafamento, a experiência é bem
interessante, pois, no tempo de viagem, é possí-
vel ir planejando o dia e refletindo sobre a vida.
Muitas vezes, quando termina a viagem, tenho
alguma solução para problemas do cotidiano. –
moradora de Alcântara, 47 anos.
Ouvir as conversas nos ônibus entre o motorista
e o trocador, ou entre um deles e algum passageiro é sempre interessante; no Rio, o ônibus é
um espaço de sociabilidade também. – moradora de Copacabana, 64 anos.
Considero o metrô o mais seguro dos transportes
na nossa cidade e todos os funcionários são muito bem treinados para atender ao bem-estar dos
passageiros. – morador de Copacabana, 51 anos.
O tempo de deslocamento é muito bom de
moto. O Rio é lindo, [tem] uma vista incrível a
cada passagem pelo Aterro do Flamengo, orla,
Perimetral, Linha Vermelha, Linha Amarela – morador de Botafogo, 29 anos.
A idade e o local de moradia estão associados à percepção de que nada no trânsito é positivo. Como mostra o Gráfico 15, são os mais
jovens que, com maior frequência, fazem esse
tipo de afirmação, ou seja, expressam uma visão
um tanto niilista, quando se trata de descrever
suas experiências do dia-a-dia no trânsito. Não
surpreende que a mesma inclinação à negatividade absoluta se verifique também em maior
proporção entre os moradores das zonas Oeste,
Norte e Região Metropolitana e, em menor escala, entre os moradores da Barra e Zona Sul ou
mesmo da área da Tijuca/Maracanã. São, assim,
os entrevistados das regiões mais desfavorecidas
os que encontram maior dificuldade em identificar qualquer elemento positivo nos seus deslocamentos diários.
Gráfico 15 – Frequência em 2011 da variável “Nada é positivo”, segundo a idade e o local de moradia dos entrevistados (%)
70
60
Pedestre
57,8
46,6
50
40,0
40
39,3
33,3
30
20
11,1
10
0
60
Até 18
19-29
30-39
40-49
50-59
60+
Pedestre
52,7
47,9
44,3
45
35,1
30
21,1
15
0
Zona Oeste
Zona Norte
Região
Metropolitana
Tijuca/Vila Isabel/
Maracanã
Zona Sul/
Barra
Fonte: CESeC/SMS-Rio
Quando viajo de qualquer meio de transporte,
não tenho experiência boa nenhuma vez. – morador de Senador Camará, 23 anos.
Que eu me lembre, nenhuma [experiência positiva]. Trânsito é trânsito e é sempre ruim. – moradora de Bangu, 18 anos.
Nenhuma [experiência positiva], pois venho
apertadíssima, com pessoas mal-humoradas e
exaustas. – moradora de Tomás Coelho, 19 anos.
Finalmente, vale ressaltar que houve muito poucas menções ao custo do transporte, seja
relacionando-o à implantação do bilhete único
como elemento positivo de facilitação da mobilidade – apenas quatro referências –, seja ao valor
excessivo das passagens dos coletivos, quando
se trata de experiências negativas – apenas oito
Capítulo 3 – Percepções sobre o trânsito
menções. O relativo silêncio sobre o preço das
passagens se torna surpreendente, na medida
em que 74% dos entrevistados residem nas áreas
mais pobres da RMRJ e, como mostram os dados
do IPEA, mais de 28% da população brasileira
(assim como da Região Sudeste) teriam desistido
de ir a algum lugar ou recorrido a outro meio de
transporte por falta de condições financeiras, no
período da pesquisa (IPEA, 2011).
O que provoca medo no trânsito
Os entrevistados que, espontaneamente,
afirmam não se sentir em risco jamais, respondendo “Nada” à pergunta sobre o que provoca
medo – resposta, nesse caso, também única e
39
40
Capítulo 3 – Percepções sobre o trânsito
excludente –, não passam de 3,4% do total, tal
como expresso no Gráfico 16. Ainda que se possa supor uma tendência, sobretudo entre os homens jovens, a sonegar informações sobre seus
próprios medos, o número seria pequeno.
O que chama a atenção, ao contrário, é a abundância dos elementos ansiogênicos identificados,
sem nenhuma forma de indução, pelos respondentes da enquete. Chama a atenção também o fato
de que o segundo fator mais citado, “Risco de vio-
lência”, não se refere ao trânsito propriamente dito,
mas a um tipo de violência de natureza criminal:
assaltos, brigas e presença de ‘cracudos’ no interior
dos transportes coletivos ou nos sinais e nas áreas congestionadas. Por sua vez, o que se chamou
de Condições (13,8% das respostas) expressa um
conjunto de situações propiciadoras de acidentes,
como vias em mau estado, sinalização deficiente,
tachões no asfalto (para os motociclistas) etc.
Gráfico 16 – Elementos que geram percepção de risco para os habitantes da RMRJ entrevistados em 2011 (%)
Direção perigosa, desrespeito,
alta velocidade, embriaguez.
Risco de assalto, brigas, 'cracudos',
bala perdida.
Vias em más condições, má sinalização,
tachões.
Travessia, tudo.
Motoristas
40,3
Risco de violência
25,2
Condições
13,8
Outros
11,1
Risco de acidente
4,6
Nada
3,4
Congestionamento
1,6
0
5
10
15
20
25
30
35
40
45
Fonte: CESeC/SMS-Rio
Tenho medo de assaltos, medo de batidas de
carro, medo de cair quando estou em pé e mal
posso me segurar, medo do mau humor de
todo mundo e do meu e medo de o motorista,
que agora virou cobrador, se distrair ao volante
porque tem que contar moeda para dar troco o
tempo todo. – moradora de Niterói, 55 anos.
Quando a polícia para a moto, eles sempre querem um “cascalho”. Mesmo estando certinho e o
dono da farmácia dando todo mês um “cascalho” para eles. – morador da Usina, 26 anos.
O problema aludido pelos entrevistados
com maior frequência (40% das respostas) diz
respeito à responsabilidade de quem conduz os
veículos. Essa variável, indicada no gráfico abaixo pela categoria Motoristas, agrega elementos
como direção perigosa e agressiva, desrespeito
às regras e aos demais condutores, excesso de
velocidade e uso de álcool ao volante. A impru-
dência – sempre vista como uma atitude dos outros indivíduos, sejam eles motoristas de ônibus,
motociclistas ou motoristas de carros particulares – é, portanto, o principal fator responsável
pelo sentimento de que se está em risco.
[O que me faz sentir em risco é] esse comportamento desses motoristas que eu estou falando,
que pode causar um acidente, além dos assaltos, que estão rolando direto, a gente sabe, principalmente nos sinais. Estar na rua é correr risco.
– moradora da Ilha do Governador, 36 anos.
Me sinto constantemente em risco no trânsito.
Risco de ser “massacrada” pelos outros motoristas, risco de ser assaltada etc. – moradora do
Recreio dos Bandeirantes, 26 anos.
A falta de educação, a arrogância, a agressividade e a atitude dos motoristas de [...] ônibus e
carros privados, demonstrando ostensivamente
que os veículos valem mais do que as pessoas. E
também falta de respeito dos motoristas pelos
pedestres que tentam atravessar nas faixas de
pedestres. – moradora da Gávea, 60 anos.
Somando-se a isso o que foi identificado
abstratamente como Risco de acidente (4,6% das
respostas), verifica-se que, no conjunto, as duas
principais preocupações referem-se a colisões,
quedas ou atropelamentos provocados por maus
motoristas ou por condições externas, segundo
uma perspectiva; segundo outra, à violência de
natureza criminal a que se sentem expostos os
motoristas e passageiros dos diferentes meios
de transporte.
Gráfico 17 – Identificação da violência criminal como fator de risco no trânsito em 2011, segundo a região de moradia dos entrevistados (%)
Região Metropolitana
Pe
29,4
27,0
Zona Oeste
25,9
Zona Norte
Tijuca/Vila Isabel/Maracanã
19,4
Zona Sul/Barra
18,9
0
5
10
15
20
25
30
35
Fonte: CESeC/SMS-Rio
Se a percepção de estar exposto aos riscos de
acidente é comum aos entrevistados de todas as
idades e proveniências, a exposição à violência criminal é percebida desigualmente por moradores
das diferentes áreas da cidade. Os que habitam as
regiões mais pobres – seguramente, as que concentram as maiores taxas de criminalidade e os menores efetivos policiais – previsivelmente expressaram com maior frequência essa preocupação.
Indicador contundente de que há problemas
graves no universo da mobilidade – isto é, de que
deslocar-se pela cidade implica experimentar um
deficit de cidadania – é esse sentimento de insegurança vivido por quem transita a pé, de bicicleta ou em algum veículo motorizado. Seja porque
os veículos e as vias não oferecem condições
mínimas ou os motoristas não se portam como
deveriam, seja porque é insatisfatória a qualidade
das políticas públicas e da segurança pública.
denadoras da pesquisa.
2
Note-se, por exemplo, que a frota de motocicletas cresceu 116 %, entre 2001 e 2008, como indicado no relatório.
A diferença na proporção de motociclistas, entre as pesquisas realizadas no início da década passada e o começo
desta, expressa também, além das diferenças metodológicas, esse crescimento real do número de veículos.
Em sua pesquisa de percepção de 2008 e 2009, o Rio
Como Vamos havia encontrado os seguintes resultados,
relativos à cidade do Rio de Janeiro, para os dois anos,
respectivamente: ônibus comum (44% e 47%); a pé (18%
e 19%); veículo particular (12%); van/Kombi/ônibus
pirata (6% e 10%); metrô (3%); ônibus executivo (2% e
3%); bicicleta (2%); moto (2% e 1%); taxi (1%); trem (2%
e 1%). Ver referência ao final da publicação. http://www.
riocomovamos.org.br/arq/pesquisa_percepcao_2009.pdf
3
Para os deslocamentos a passeio a distribuição se dá da
seguinte forma: ônibus (35,8%), carro (40,4%), van (65),
bicicleta (4,5%) e outros (13,3%), segundo pesquisa do IBPS
para o jornal O Globo. Ver referência ao final da publicação.
Notas
FETRANSPOR – IMAGEM DOS MEIOS DE TRANSPORTE
COLETIVOS: Etapa quantitativa. Região Metropolitana do
Rio de Janeiro, 2009 (http://pt.slideshare.net/Fetranspor/
imagem-dos-meios-de-transportes-rj-pesquisafetranspor-de-opiniao-publica-fev09: última consulta em
novembro de 2011).
Pesquisadora do Centro de Estudos de Segurança e Cidadania da Universidade Candido Mendes e uma das coor-
IPEA – SISTEMA DE INDICADORES DE PERCEPÇÃO
SOCIAL – MOBILIDADE URBANA,2011(http://
1
Capítulo 3 – Percepções sobre o trânsito
4
5
41
42
Capítulo 3 – Percepções sobre o trânsito
www.ipea.gov.br/portal/index.php?option=com_
content&view=article&id=12932: última consulta em
novembro de 2011).
SECRETARIA DE ESTADO DE TRANSPORTES (RJ) –
PESQUISA DE ORIGEM-DESTINO, 2002/2003. http://www.
setreri.com.br/dados/pdtu2010.pdf
6
7
RIO COMO VAMOS. Como vamos em transporte. Base de
dados. Disponível em: http://www.riocomovamos.org.br/
rcv/conteudo.php?cod=107. Acesso em novembro de 2011.
IBPS / O GLOBO – O RIO QUE DÁ PEDAL, 2011 Para os
deslocamentos a passeio a distribuição se dá da seguinte
forma: ônibus (35,8%), carro (40,4%), van (65), bicicleta
(4,5%) e outros (13,3%) (http://www.ibpsnet.com.br/index.php/pesquisa/2011/117-jornal-o-globo-rj-o-rio-que-da-pedal última consulta em novembro de 2011).
8
Passageiro de auto, transporte escolar, transporte fretado, caminhão, bonde e barcas/aerobarco/catamarã.
9
A pesquisa de percepção Rio Como Vamos/Ibope, feita
por amostragem domiciliar, encontrou um percentual de
19% de respondentes que dizem se deslocar a pé, quando
solicitados a responder, também espontaneamente, sobre
o seu principal meio de locomoção.
10
Embora muitos ciclistas e motociclistas (entregadores,
vigilantes etc.) utilizem também seus veículos como instrumento de trabalho, estamos considerando como “motoristas profissionais” os condutores de ônibus, trens e metrô.
11
Capítulo 4 – Considerações Finais
O trânsito 'como ele é'
efeitos negativos sobre os indivíduos, como
aborrecedor, tedioso, chato, irritante, sufocador.
Quando se pediu aos 568 entrevistados que
definissem o trânsito carioca em uma palavra,
foram elencados 121 diferentes vocábulos. Do
conjunto dos adjetivos e substantivos que compuseram esse extenso repertório, menos de 10%
carregavam algum significado positivo, ou mesmo neutro. Todos os demais eram claramente
críticos e negativos. A palavra “caos”, por exemplo, surgiu espontaneamente 174 vezes. As palavras “péssimo” e “estressante” foram utilizadas 56
e 30 vezes, respectivamente.
Para que esse oceano de ideias e imagens
escolhidas pelos entrevistados gerasse alguma
taxonomia, foram definidas oito diferentes classes de palavras (expressas no Gráfico 18), capazes de demarcar as principais noções subjacentes. Chegou-se, assim, às seguintes categorias:
4) Positivo/neutro, para simples valorações
como ótimo, normal, satisfatório, razoável,
bom.
5) Problemático, para avaliações do trânsito
em sua complexidade, como insustentável,
saturado, demorado, imprevisível.
6)Incompetente, para palavras que exprimem a falha de responsabilidade de alguém, como desrespeitoso, imprudente,
vergonha, injusto, covarde.
7)Ameaçador, em referência aos riscos que
o trânsito comporta, como hostil, violento,
mortal, agressivo, perigoso.
8)Outros, para todas aquelas expressões que,
embora sempre negativas, não correspondem a nenhuma das categorias precedentes.
1)Caótico, reunindo termos como confusão,
tumulto, selvageria, descontrole
Como se poderá observar no Gráfico 18, os
dois conjuntos de palavras mais frequentes referem-se à noção de caos (39,8% das definições) e à
percepção de algo meramente negativo (26,3%).
2)Ruim/péssimo, para simples adjetivações
negativas, como horrível, lixo, ridículo, ruim.
3) Estressante, abrangendo as remissões aos
Gráfico 18 – Avaliação do trânsito em 2011 pelos habitantes da RMRJ entrevistados (%)
Caótico
39,8
Ruim/péssimo
Tedioso, irritante, perturbador, sufocador,
chato etc.
Bom, normal, tolerável, solucionável,
intenso etc.
Complicado, engarrafado, dramático, crítico,
imprevissível, difícil etc.
Abandono, 'caça-níquel', inconsequência,
desrespeito, covarde, vergonha etc.
Agrassivo, hostil, violento, mortal etc.
26,3
Estressante
8,0
Positivo-neutro
7,8
Problemático
5,3
Outros
4,3
Incompetente
4,3
Ameaçador
4,3
0
5
10
15
20
25
30
35
40
45
Fonte: CESeC/SMS-Rio
Capítulo 4 – Considerações Finais
43
44
Capítulo 4 – Considerações Finais
Ainda que essas expressões não correspondam plenamente a todas as experiências e
avaliações dos entrevistados ao longo de suas
vidas, importa registrar que é nesse repertório
que a maioria deles encontra os elementos para
expressar suas visões. Isso significa que não se
pode desconsiderar, seja em campanhas educativas, seja em processos pedagógicos de maior
envergadura, os vocabulários a que o imaginário
recorre para compreender o universo do trânsito. Se os ignoramos, as mensagens podem não
encontrar eco naqueles para os quais elas se destinam, e a comunicação corre o risco de se transformar em um monólogo incapaz de atingir as
subjetividades, único caminho produtor de mudanças de comportamento.
Em suma, o que este levantamento de percepções nos traz de surpreendente, em particular quando os entrevistados definem o trânsito,
quase unanimemente, de forma tão negativa, é,
por contraste, a naturalização, no dia-a-dia, desse
problema grave, crônico e generalizado. Parte significativa das nossas vidas é consumida em deslocamentos cotidianos, em condições tidas como
desagradáveis por praticamente todos os que manifestaram suas opiniões neste levantamento. Esse
desconforto, transparente nos números exorbitantes de acidentes apontados pela pesquisa, parece
ter sido assimilado como parte natural da vida.
Engarrafamentos, transportes superlotados,
condução agressiva, exposição à violência e os
demais fatores inventariados pelos que responderam à pesquisa parecem ter sido incorporados
à própria noção do que seja o trânsito ou a mobilidade. Acabamos, assim, por interpretar os sentimentos de medo, desconforto, ansiedade e irritação como meras idiossincrasias, mesmo que esses
sentimentos sejam compartilhados por grande
parte da população. Da mesma forma, subdimensionamos os aspectos culturais e sociais dos
comportamentos ao volante, individualizando a
responsabilidade pelas condutas censuráveis2.
[O que estressa é] ver a imensa ignorância que
ainda faz parte da nossa cultura: pessoas que
se atiram na frente do carro sem olhar direito
a sinalização, motociclistas apressados saindo
pelos corredores que o trânsito forma, atrevidas bicicletas disputando com motos e ônibus.
E o mais incrível é ver um ônibus imenso, comandado por um louco motorista que dispara
quando vê uma rua mais aberta, sem trânsito. E
eles voam no Aterro. Então é bem comum ver
acidentes bem estúpidos. Isso dá arrepios, dá
medo. – moradora de Botafogo, 47 anos.
Então, [o que estressa é] o conjunto da obra.
Muitos carros, engarrafamentos, sinais mal sincronizados e falta de educação geral, de todo o
mundo com todo mundo; e eu me incluo nisso.
– morador de Bonsucesso, 49 anos.
Quase tudo [estressa]: o fato de o taxista parar
repentinamente, o ônibus que para no meio da
rua para deixar descer ou subir um passageiro, as
motos que costuram o trânsito. Enfim, o trânsito
como ele é. – morador de Laranjeiras, 50 anos.
Vê-se que, diferentemente das respostas
sociais aos altos índices de mortalidade ligada à
violência criminal, os acidentes não mobilizam
reações coletivas e acabam sendo vivenciados
como eventos únicos, singulares, inscritos na
ordem do acaso ou do destino. No entanto, a
quantidade de vidas humanas perdidas, nos dois
casos, é muito semelhante.
No trânsito, tudo se passa como se as mortes,
os ferimentos e os padecimentos fossem um mal
necessário, o preço a pagar pela vida na metrópole. A experiência cotidiana transformou o que
deveria ser excepcional e inaceitável em uma espécie de segunda natureza da vida urbana. Com
isso, a perspectiva de que vias públicas, meios de
transporte e relações entre indivíduos em deslocamento possam representar momentos de prazer, segurança, fruição, conforto ou bem-estar
tornou-se uma ideia estranha e praticamente desapareceu do horizonte da imaginação coletiva.
Sugestões para melhorar o
trânsito na cidade
Instados a fazer propostas concretas sobre
como resolver os problemas que eles mesmos
identificaram, os entrevistados forneceram respostas que remetem a concepções e campos
de intervenção distintos. As mais frequentes
referem-se a uma lógica de organização do tráfego: sincronização de sinais, controle de pistas,
melhoria da iluminação, alteração de linhas de
ônibus e mudanças de itinerário. Essas sugestões
foram agregadas aqui sob o título Engenharia –
26% das respostas –, para marcar claramente sua
premissa de racionalização do fluxo de veículos.
A segunda proposta mais frequente – Melhorar o transporte público, com 19% – já sugere
preocupações de outra ordem, indicando um
redirecionamento de prioridades e a aposta no
sistema de transporte coletivo. Uma terceira categoria de recomendações, com 15% das respostas e definida como Campanhas/educação,
deriva da percepção de que o problema está no
comportamento imprudente, agressivo ou desrespeitos de motoristas e de pedestres e de que
as soluções passam por orientações para a mudança do comportamento individual.
Os motoristas de ônibus precisavam de um treinamento diferente, de conscientização de que
estão prestando um serviço importante pela cidade, que estão transportando vidas. Morro de
pena de gente mais idosa que circula de ônibus,
porque o degrau é muito alto e é complicado se
segurar nas curvas em alta velocidade. O tempo
e a sincronia de alguns sinais precisam de ajustes. – moradora de Botafogo, 32 anos.
Diminuir o número de carros na rua, oferecendo
transporte público de qualidade para todos os
cidadãos, em todos os horários. Eu, por exemplo,
que tenho uma certa “claustrofobia”, evito andar
em ônibus e metrô lotado. Isso me faz quase não
utilizar esses tipos de transporte porque, nos horários em que eu os utilizaria, eles estão muito
cheios. – moradora de Copacabana, 49 anos.
A recomendação de que se tenha Menos
carros nas ruas, com 13,1% das respostas, poderia perfeitamente ser agregada à segunda proCapítulo 4 – Considerações Finais
posta, mas foi deliberadamente mantida como
uma postulação em separado por associar-se à
perspectiva, que vem ganhando cada vez mais
força, de valorização dos indivíduos e do meio
ambiente em detrimento dos automóveis e da
velocidade. Essa orientação indica, portanto, que
uma parte da população está sensibilizada para
os debates e, consequentemente, para as mudanças que estão acontecendo em diversas cidades do mundo – algumas na própria cidade do
Rio de Janeiro, como o BRS e o BRT, entre outros.
Diminuir as passagens dos transportes públicos.
Colocar mais ônibus na rua e utilizar menos os
carros. Usar mais bicicleta. – moradora de Tomás
Coelho, 16 anos.
O quinto tipo de sugestão aparece tanto em
contraposição quanto de forma complementar
à realização de campanhas e processos educativos. Trata-se de mecanismos de Fiscalização/
punição – 11,2% das respostas –, que compreendem aplicação de multas, ampliação do número
de guardas municipais, aumento da quantidade
de fiscais, prisão para infratores, diminuição da
impunidade dos que provocam acidentes e até
mudanças na legislação.
Levar a legislação a sério. Ela já é boa. Só falta
ser exercida. Tem que multar, rebocar, tirar ponto da carteira. Tem que acabar a mentalidade de
“mas... pobrezinho! Se eu tirar a carteira, ele vai
trabalhar como?” – morador de Niterói, 39 anos.
Multar tanto os motoristas e as companhias
como os pedestres. Tem coisa pior do que ver
alguém atravessar impunemente o Aterro a dois
metros da passarela? Os alemães não cumprem
as regras por serem melhores do que ninguém:
apenas, quando erram, pesa bastante no bolso...
– moradora do Leme, 58 anos.
Finalmente, em menor escala – 6,9% das
respostas – foram compiladas sugestões de ampliação das vias de rodagem, como duplicação
de pistas e construção de viadutos. Essa variável
também poderia se agregar facilmente ao tópico Engenharia, mas foi mantida como um item à
45
46
Capítulo 4 – Considerações Finais
parte exatamente por sua afinidade com a perspectiva tradicional de privilegiar o espaço dos
veículos automotores e seu fluxo acelerado.
Começar a obra na Avenida Brasil depois de 1h,
pois o trânsito está mais tranquilo. Porque começar a obra às 22h atrapalha o trabalhador a chegar em casa – morador de Jardim Sumaré, 31 anos.
Gráfico 19 – Sugestões para melhorar o trânsito dadas pelos habitantes da RMRJ entrevistados em 2011 (%)
O QUE DEVE SER FEITO PARA MELHORAR O TRÂNSITO
Sincronização de sinais, controle de pistas,
iluminação, linhas de ônibus, itinerários.
Engenharia
26,0
Melhorar
transporte público
Mudança de mentalidade dos usuários,
motoristas e pedestres, campanhas,
educação.
19,1
Campanha/educação
15,0
Menos carros
Multas, guardas municipais, fiscais, cadeia,
menos impunidade, mudanças legais.
13,1
Fiscalização/punição
11,2
Viadutos
6,9
Não sabe
5,7
0
5
10
15
20
25
30
Fonte: CESeC/SMS-Rio
Gráfico 20 – Entrevistados em 2011 que sugeriram a variável “Campanhas/educação”, segundo o sexo (%)
Masculino
33,3%
Feminino
66,7%
Fonte: CESeC/SMS-Rio
Gráfico 21 – Sugestões dos entrevistados em 2011 segundo o local de moradia (%)
CAMPANHAS / EDUCAÇÃO
Tijuca/Vila Isabel/Maracanã
Pe
23,9
Zona Sul/Barra
23,7
13,8
Zona Norte
Zona Oeste
11,8
9,6
Região Metropolitana
0
10
20
30
ENGENHARIA
Pede
33,3
Zona Oeste
30,3
Região Metropolitana
Zona Norte
26,2
Zona Sul/Barra
20,6
Tijuca/Vila Isabel/Maracanã
20,5
0
10
20
30
40
Fonte: CESeC/SMS-Rio
Algumas sugestões estão claramente associadas a certas características do perfil dos entrevistados. Como indica o Gráfico 20, a maior parte
das pessoas que propuseram medidas informativo-educativas era do sexo feminino. Isso não
significa que elas não tenham feito outras propostas simultaneamente, já que, como se disse,
as respostas eram espontâneas e, portanto, continham múltiplos conteúdos. Mas não se pode
deixar de notar a predominância das mulheres
entre os que recorrem ao caminho pedagógico.
Da mesma forma, a abordagem educativa se
faz mais presente entre os moradores das zonas
de maior poder aquisitivo, como Tijuca/Vila Isabel/Maracanã e Zona Sul/Barra. No sentido inverso, as propostas de mudança ligadas ao campo da
Engenharia de Trânsito se concentraram nas respostas dos moradores das regiões mais pobres.
Capítulo 4 – Considerações Finais
Notas
Pesquisador que colaborou no desenvolvimento da pesquisa.
1
Sobre os aspectos culturais no trânsito, ver o importante
trabalho de Roberto DaMatta, Fé em Deus e Pé na Tábua.
Nessa obra, o autor descreve o trânsito como um espaço
em que convivem, de forma sempre conflitiva, tal como
nas demais esferas em que se organiza a sociedade brasileira, o individualismo, dos sistemas políticos modernos,
e as relações hierárquicas, herdeiras do período colonial.
O comportamento dos motoristas brasileiros (particularmente os habitantes da cidade de Vitória, onde o autor
desenvolveu sua pesquisa) expressaria a tensão entre uma
lógica de reconhecimento e sujeição a regras universais,
portanto igualitárias, e de afirmação de direitos e privilégios, em um mundo naturalmente desigual.
2
47
48
Capítulo 5 – Trânsito virtual
Capítulo 5 – Trânsito virtual
Alberto Alvadia Filho1
Desde a explosão da Internet, no fim dos
anos 1990, experimentamos uma verdadeira revolução na forma de nos comunicarmos e nos
relacionarmos com as pessoas e com o mundo.
A Internet tem sido um espaço de participação e
intervenção em constante transformação, onde
os indivíduos podem tratar, de forma praticamente ilimitada, dos mais variados assuntos. Por
meio dela, pode-se ir virtualmente, por exemplo,
ao mercado ou ao banco e ter acesso rápido à
cultura, a espaços para manifestação de opiniões
e de prestação de serviços.
O fato é que, com a rede mundial de computadores, como a Internet também é conhecida,
passamos a conhecer e a acessar, mais direta e
rapidamente, uma outra realidade, que nos permitiu explorar novos parâmetros de sociabilidade e de exercício de interesses.
Em linhas gerais, estamos tratando aqui daquilo que autores contemporâneos como Pierre
Levy e Manuel Castells designam, em suas respectivas obras, como “cibercultura” e “sociedade
da era da informação”. Essa nova maneira de produzir e intercambiar informações “especifica um
conjunto de técnicas materiais e intelectuais, de
práticas, atitudes, modos de pensamento e valores que se desenvolvem juntamente com o crescimento do ciberespaço” (LEVY, 1999, p. 17).
Como um movimento que parece penetrar
em todos os campos de nossas vidas, a Internet
abriga também o tema da mobilidade. Como expressão de um tempo em que predomina a cultura do automóvel, a Internet não ficou imune
a um assunto cada vez mais central na vida da
sociedade de fins do século XX e início do século
XXI, sobretudo quando pensamos em grandes
contingentes populacionais, meio ambiente e
planejamento urbano. São do conhecimento de
todos, e discutidos com frequência na mídia, os
desafios que a questão do trânsito representa
hoje em termos de políticas públicas.
Nesse sentido, podemos encontrar no mundo virtual uma gama de endereços dedicados ao
tema do trânsito e da mobilidade, com as mais
diversas abordagens, perspectivas e finalidades.
Alguns contêm propostas educativas e operam
na lógica da prevenção; outros prestam assistência, serviços e informações, ou recebem reclamações e denúncias. Há os que utilizam a Internet
para anunciar produtos, mobilizar ideias e interesses. É possível encontrar endereços virtuais
de seguradoras, montadoras, grupos de aficionados, colecionadores e praticantes de esportes.
O objetivo deste capítulo é realizar o mapeamento desses endereços, localizados em espaços virtuais conhecidos, na linguagem própria
ao mundo virtual, como páginas, canais, grupos
ou perfis. Importante ressaltar aqui que esse tipo
de inventário requer atualização permanente,
uma vez que o dinamismo da rede faz com que,
potencialmente, a cada momento surjam novos
dados e endereços e extinguam-se outros.
Como metodologia para a busca e a identificação de endereços a serem visitados e catalogados, recorreu-se a um site de buscas, para que,
a partir de determinadas palavras-chave, fosse
possível localizar sugestões de endereços associados ao tema em questão. Essa procura excluiu
os endereços dedicados a transportes aéreos e
aquáticos. Desse modo, as palavras-chave empregadas na busca foram: trânsito, mobilidade,
transporte, carro, automóvel, motocicleta, rodoviário, ônibus, pedestres, passageiro e bicicleta,
utilizadas tanto individualmente como associadas umas às outras.
Para contemplar o universo da pesquisa,
além dos endereços ligados a instâncias governamentais, foram selecionados aqueles que discutem o trânsito associado à mobilidade, privilegiando-se as páginas mais tradicionais e mais
visitadas. Além dos sites, foram incluídos blogs
e páginas de redes sociais, como o Facebook e o
Twitter. O levantamento revelou a existência de
189 endereços: 85 sites, 21 blogs, 24 grupos no
Facebook e 59 contas Twitter dedicados aos temas do trânsito.
Portais são páginas de maior porte, que
contam com recursos gráficos geralmente avançados e têm grande capacidade de receber informação. São denominados assim porque por intermédio deles se pode chegar a outras páginas,
sites ou blogs. Blogs são páginas de caráter mais
simplificado, que permitem grande interação
entre quem posta uma mensagem e quem a lê:
há sempre caixas de comentários, espaços onde
se pode escrever e enviar mensagens para que
todos compartilhem a leitura.
As chamadas redes sociais são novas formas
de comunicação e interação, nas quais o cidadão pode criar perfis, encontrar e reencontrar
amigos, divulgar eventos, notícias etc. Elas se
tornaram instrumentos de comunicação virtual
amplamente utilizados, como um espaço imaterial de sociabilidade, manifestações de protestos,
difusão de informação, definição de agendas etc.
O Facebook é a principal rede social da atualidade, em termos de popularidade e adesão. Seu
principal mérito consiste na integração de diversas propriedades amplamente utilizadas antes
de seu advento, tais como blog, fotolog, vlog,
dentre outros recursos, para uma única conta de
usuário. Pode ser utilizado nos computadores
pessoais, mas também através dos chamados
meios dispositivos móveis, tais como celulares e
smartphones. Tal propriedade possibilita o envio
e troca de mensagens e informações instantâneas entre o usuário e outros que estejam conectados ao Facebook. Nesse ambiente, desde que
possua um perfil de usuário, qualquer pessoa
Capítulo 5 – Trânsito virtual
pode criar um grupo temático, em torno do qual
é possível debater um assunto, inclusive empregando fotos e vídeos.
O Twitter é outra rede social, a princípio baseada somente em texto, mas que, atualmente,
se estende para outros formatos (fotos e vídeos).
Bastante popular, tem como principal característica a limitação de 140 caracteres no texto da
postagem, ou tweet. Tal como no Facebook, o sistema permite compartilhamento instantâneo de
mensagens, ou retweet, para que seus usuários
troquem informações e notícias, de uma maneira dinâmica, e a criação de grupos com interesses e objetivos comuns.
Com o avanço da tecnologia, essas ferramentas são frequentemente acrescidas de novos
recursos e, usualmente, cada uma oferece opção
de acesso às demais – ou na linguagem da rede,
a interface entre os diversos meios: blogs trazem
um ícone que leva a um vídeo do Youtube; sites e
blogs oferecem links para perfis do Facebook e do
Twitter. Assim, indefinidamente, expandem-se as
possibilidades de interação. Se um site de um
produto dá informações completas sobre ele, no
seu respectivo blog é possível opinar sobre ele
e, ao mesmo tempo, aderir ao respectivo grupo
no Facebook, além de disseminar informação
para todo um conjunto de seguidores via Twitter.
Tudo instantaneamente.
A esfera pública
Entre as entidades governamentais, foram
encontrados 27 sites Detran estaduais e 20 sites
DER estaduais, além das páginas oficiais do Ministério dos Transportes, do Departamento Nacional de Trânsito (Denatran), do Departamento
Nacional de Infraestrutura de Transportes (DNIT)
da Agência Nacional de Transportes Terrestres
(ANTT), do seguro por Danos Pessoais Causados por Veículos Automotores de Via Terrestre
(DPVAT) e da Frente Parlamentar em Defesa do
Trânsito Seguro, da Câmara dos Deputados.
49
50
Capítulo 5 – Trânsito virtual
Nesse campo, a grande referência em nível
nacional é o site do Denatran – na verdade, um
portal que funciona como um canal de conteúdo informativo e de oferta de serviços. Oferece
acesso a informações sobre campanhas, cursos,
eventos, concursos, convênios, orçamentos e dados estatísticos sobre a frota de veículos no país.
Na página principal, encontra-se um ícone que
opera como uma espécie de index de sites de
outras entidades governamentais e associações,
tais como os Detran e DER; Contran; DNIT e ANTT.
No site do Ministério dos Transportes, que
abriga os do DNIT e da ANTT, há anuários estatísticos e informações sobre rodovias e suas condições, sobre as linhas de ônibus que operam no
país, sobre cursos e eventos em todo o território
nacional e mapas. Um ícone leva ao Banco de
Mapas e Informações de Transporte, que oferece ao usuário, mediante um cadastro simples,
acesso a um banco de dados georreferenciados
e vídeos do setor de transportes e, ainda, a possibilidade de receber um DVD com informações
do site do Ministério.
Além desses, há outros endereços ligados a
campanhas de conscientização e serviços. Dois
são de São Paulo: o Blog do Ônibus e o Ciclofaixa. O
primeiro destina-se à fiscalização e a reclamações
relativas ao serviço de transporte coletivo na cidade de São Paulo; o segundo divulga informações
do Projeto Ciclofaixa, da prefeitura de São Paulo,
que consiste na criação e manutenção de uma
área de lazer de 45 quilômetros para o trânsito de
bicicletas e o lazer nos fins de semana e feriados.
No âmbito federal, o Parada pela Vida –
Pacto Nacional para a Prevenção de Acidentes, é
promovido pelo governo federal com apoio do
Denatran e tem por objetivo “conscientizar a
população da necessidade de respeitar as boas
regras de trânsito, independente de fiscalização”.
No Rio de Janeiro, por meio do blog da CET-Rio, o usuário pode ter informações sobre campanhas e projetos para o trânsito na cidade; pelo
site da prefeitura da cidade, no canal destinado
ao trânsito, pode-se visualizar em tempo real o
fluxo de ruas e avenidas de toda a cidade através
de câmeras instaladas em pontos estratégicos.
Embora tenham sido catalogados quase
duas vezes mais sites governamentais do que
não-governamentais, entre as ferramentas que
oferecem maior dinamismo na comunicação e
na interatividade, como os blogs, o Facebook e
o Twitter, predominam os endereços não-governamentais, como indica a tabela a seguir:
Tabela 3 – Distribuição das páginas pesquisadas
Páginas
Páginas Não
Governamentais Governamentais
Total
Sites
56
29
85
Blogs
3
18
21
Facebook
4
20
24
Twitter
4
55
59
Total
67
122
189
Na esfera governamental, o caráter é predominantemente de prestação de serviços e informação geral, como o agendamento de serviços
e a disponibilização de estatísticas, campanhas
institucionais e conteúdo normativo, como leis e
portarias, além do agendamento de exame para
a primeira habilitação ou para sua renovação. Na
esfera não-governamental, encontram-se espaços em que o associativismo e as iniciativas pessoais e locais são valorizados, dando margem,
por exemplo, a que organismos de comunicação
locais possam debater a questão do trânsito em
suas respectivas regiões.
Observa-se que 85% dos endereços governamentais são sites, enquanto apenas 25% dos
endereços não-governamentais o são. O fato de
que quase a metade dos endereços fora da esfera do governo são perfis de Twitter diz respeito à
grande quantidade de usuários que se dedicam
a trocar informações sobre condições de trânsito
em âmbito local. Um caso exemplar é o Twitter
da Lei Seca, no Rio de Janeiro.
Associações, ONGs e empresas
Assim como na esfera institucional do Estado, a Internet representou uma nova e importante ferramenta para o cidadão, as entidades
de classe e as empresas de mídia, constituindo-se como um poderoso veículo de comunicação
e de acesso a serviços. No campo do trânsito e
da mobilidade, como já foi dito, as páginas não-governamentais oferecem um leque variado:
algumas têm caráter meramente informativo;
outras propõem campanhas, abrem espaço para
reclamações e denúncias, sustentam bandeiras
empresariais ou procuram se associar a determinados conceitos.
Elas diferem também quanto ao propósito
de estabelecer maior ou menor interação com o
usuário e com o potencial de uso de tecnologias
disponíveis e hospedagem de informação – dado
que, por sua vez, remete à capacidade financeira
do owner para investir na confecção da página.
Entre os 4.778 endereços não-governamentais encontrados, apenas 15 dedicam espaço à
divulgação de pesquisas, o que reafirma o caráter informativo de grande parte desse universo,
pouco tendente ao rigor científico e que privilegia o dinamismo e a interatividade com o usuário. Vale destacar que alguns sites, como o Trânsito Amigo e Chega de Acidentes, possuem um
contador de vítimas, com registro desde 18 de
setembro de 2009 e atualizado a todo instante.
Este último endereço apresenta, inclusive, a forma como é feito o cálculo da estimativa.
Quanto ao local-sede, dos 47 espaços levantados, 15 estão em São Paulo e dez no Rio de
Janeiro. Percebe-se uma concentração de endereços nos dois estados mais populosos do país,
com capitais que contam com as maiores frotas
de veículos. No rastro dos problemas urbanos,
como a poluição e os desafios para a mobilidade, predominam endereços ligados ao exercício
da cidadania – associado, por sua vez, ao acesso
Capítulo 5 – Trânsito virtual
à tecnologia. É nas grandes capitais que estão os
grandes jornais, as sedes das grandes empresas
e organizações, bem como as maiores tensões
da vida cotidiana, que levam as pessoas e se associarem em prol de causas comuns.
Tabela 4 – Distribuição de sites e blogs por
localização geográfica
UF
Site
Blog
DF
2
0
ES
1
0
MG
2
1
MT
1
0
PA
1
0
PB
1
1
PE
1
1
PR
2
3
RJ
6
4
RS
0
3
SP
11
4
Total
28
17
Com relação à natureza jurídica de sites e
blogs, percebe-se que 49%, ou seja, quase a metade são de organizações ou associações sem
fins lucrativos.
Tabela 5 – Endereços não-governamentais
segundo sua natureza jurídica
Natureza
No
ONG/OSCIP/associação da Sociedade Civil
20
Empresa
5
Jornal
11
Particular/Pessoal
6
Total
42
A abrangência geográfica de certos endereços denota uma concepção de trânsito ampla e
muitas vezes não restrita localmente. Isso ratifica
a idéia de que, embora o trânsito seja um problema percebido localmente, no dia-a-dia de cada
cidadão, tem também uma dimensão universal:
um problema que afeta determinada área tanto
pode repercutir quanto inspirar soluções em outras, mesmo distantes.
51
52
Capítulo 5 – Trânsito virtual
Tabela 6 – Sites e blogs, de acordo com sua abrangência
Abrangência
Municipal
Estadual
Nacional
Mundial
Total
No
4
13
24
1
42
Entre os endereços analisados, 75% não se
destinam a um meio de transporte em particular.
Dois endereços tratam exclusivamente da questão do pedestre, sendo que um é brasileiro e de
âmbito nacional; o outro é de âmbito mundial e
sediado na Suíça. Um deles, que traz o sugestivo título Transporte Ativo, dedica-se a todos os
meios de transporte movidos à propulsão humana, como bicicleta, skate e patins.
Tabela 7 – Distribuição de sites e blogs de acordo
com os meios de transporte
Tipo de transporte
Bicicleta
Meios de transporte com propulsão humana
Caminhão e Ônibus
Carros
Ônibus
Pedestre
Todos (genérico)
Total
No
4
1
1
1
2
2
31
42
De 42 endereços encontrados, entre sites
e blogs, 25 foram registrados nos últimos cinco
anos. Não obstante o crescimento progressivo
da Internet desde o início da última década, houve um aumento ainda maior do número de usuários, sobretudo com a chegada no mercado de
dispositivos eletrônicos como telefones e tablets,
que permitem acesso à rede a qualquer tempo e
em qualquer lugar.
Tabela 8 – Distribuição de sites e blogs de acordo com o ano de criação
Ano de criação do endereço
2007
2008
2009
2010
2011
Total
5
2
6
4
8
25
Twitter e Facebook
Nos perfis do Twitter e nos do Facebook,
ao contrário do que acontece com sites e blogs,
o trânsito local tem mais destaque. No universo
que compõe o resultado da pesquisa, 18 entre
os 59 perfis Twitter e 14 dos de Facebook têm
conexão com um site ou blog, operando como
uma espécie de expressão destes em uma outra dimensão. Entre aqueles exclusivamente do
universo do Twitter, a maioria parece dedicar-se
a informar onde estão acontecendo bloqueios
policiais – blitz – para que os interessados evitem
o risco de passar pelo teste do bafômetro. Em sua
maioria, não possuem descrição, com exceção do
Blitz em Salvador, que orienta 5.406 seguidores a
não passar por certos locais, caso dirijam alcoolizados, e se descreve como um “twitter para indicar onde tem blitz de alcoolemia em Salvador”.
No Rio de Janeiro e em São Paulo encontramos perfis Twitter com mais seguidores e, entre
os localizados, tem destaque Trânsito mais Gentil,
patrocinado pela Companhia Seguradora Porto
Seguros, com 270.043 seguidores. Nesse endereço há propagandas de eventos da campanha homônima, ou outros ligados ao trânsito em geral.
É dessas cidades o maior número de perfis twitter
criados para informar onde esteja acontecendo
uma blitz – e como burlá-la. O Twitter da Lei Seca,
no Rio de Janeiro, é o segundo em número de
seguidores – tem 256.238. Além de avisar onde
esteja acontecendo uma blitz, abriga algumas
postagens referentes a engarrafamentos e acidentes nas vias. Vale destacar, ainda, o Trânsito
de São Paulo, com 147.000 seguidores. Os números chamam a atenção quando comparados, por
exemplo, aos maiores representantes da capital
mineira, como o Blitz Belo Horizonte, com 40.800
seguidores, e o Radar Blitz, com apenas 12.788.
Alguns governos estaduais têm considerado a possibilidade de utilizar bafômetros digitais
nas abordagens, uma vez que não requerem a
permissão do motorista para serem utilizados.
Nesse caso, o nível de álcool no sangue do condutor pode ser aferido simplesmente através do
hálito exalado ao falar. As operações para controle de alcoolemia geraram, por sua vez, um
mercado de equipamentos para os motoristas
medirem seu nível de ingestão de álcool antes
de dirigir. A partir de R$50,00 qualquer indivíduo pode comprar um dos curiosos aparelhos
portáteis à venda – em formatos diversos, como
chaveiro e caneta e, algumas vezes, com funções
agregadas, como mp3 e GPS.
A Tabela 9 revela o número de perfis twitter
encontrados em 15 estados da federação. Assim
como na relação de sites e blogs, nota-se aqui
uma predominância dos estados do Rio de Janeiro e São Paulo. Há três endereços de abrangência nacional, todos dedicados à conscientização: dois na esfera pública e um na esfera
privada – Trânsito Amigo, Chega de Acidentes e
o site da Agência Nacional de Transportes Públicos, respectivamente. Em relação aos perfis do
Facebook, percebe-se uma concentração ainda
maior de grupos em São Paulo (40% dos casos).
Tabela 9 – Distribuição de perfis de Twitter por estado
UF
BR
Amazonas
Bahia
Ceará
Distrito Federal
Espírito Santo
Goiás
Minas Gerais
Pará
Paraná
Pernambuco
Rio de Janeiro
Rio Grande do Norte
Rio Grande do Sul
Santa Catarina
São Paulo
Total
Twitter
3
1
2
2
4
2
2
5
2
3
7
11
1
2
2
10
59
Tabela 10 – Distribuição de perfis de Facebook por estado
UF
BR35
AM
BA
PA
PE
PR
RJ
SP
Total
Facebook
1
2
1
2
2
2
3
8
21
Nos perfis do Twitter há grande representatividade daqueles dedicados à questão do
trânsito local, com foco na fluidez das vias, blitz,
acidentes e obras. Em comparação ao Facebook,
tem mais perfis em mais estados do país e permite maior praticidade no manuseio e, com isso
mais rapidez na postagem. Seguem as páginas
pesquisadas:
Endereços Governamentais
Departamento Nacional de Trânsito
http://www.denatran.gov.br
http://www.paradapelavida.com.br/
https://www.facebook.com/pages/Parada-umpacto-pela-vida/131289717036742
https://twitter.com/#!/ParadaPelaVida
Ministério dos Transportes
http://www.transportes.gov.br/
Departamento Nacional de Infraestrutura de
Transportes
http://www.dnit.gov.br/
Agência Nacional de Transportes Terrestres
http://www.antt.gov.br/
Frente Parlamentar em Defesa do Trânsito
Seguro
http://www.frentetransitoseguro.com.br/
Seguro de Danos Pessoais Causados por
Veículos Automotores de Via Terrestre
http://www.dpvatseguro.com.br/
Acre
http://www.detran.ac.gov.br/
http://www.ac.gov.br
Capítulo 5 – Trânsito virtual
53
54
Capítulo 5 – Trânsito virtual
Alagoas
http://www.detran.al.gov.br/
http://www.der.al.gov.br/
http://www.detran.pr.gov.br/
http://www.der.pr.gov.br/
Amapá
http://www.detran.ap.gov.br/
Pernambuco
http://www.detran.pe.gov.br/
http://www.der.pe.gov.br/
Amazonas
http://www.detran.am.gov.br/
Piauí
http://www.detran.pi.gov.br/
Bahia
http://www.detran.ba.gov.br/
http://www.derba.ba.gov.br/
Rio de Janeiro
http://www.detran.rj.gov.br/
http://www.der.rj.gov.br/
http://cce-cetrio.blogspot.com/
https://www.facebook.com/cce.cetrio
http://twitter.com/CCE_CETRIO
http://www.centrodeoperacoes.rio.gov.br/
Ceará
http://portal.detran.ce.gov.br/
http://portal.der.ce.gov.br/
Distrito Federal
http://www.detran.df.gov.br/
http://www.der.df.gov.br/
Espírito Santo
http://www.detran.es.gov.br/
http://www.der.es.gov.br/
Goiás
http://www.detran.goias.gov.br/
http://www.agetop.go.gov.br/
Maranhão
http://www.detran.ma.gov.br/
Mato Grosso
http://www.detran.mt.gov.br/
Mato Grosso do Sul
http://www.detran.ms.gov.br/
Minas Gerais
https://www.detran.mg.gov.br/
http://www.der.mg.gov.br/
Pará
http://www.detran.pa.gov.br/
http://www.setran.pa.gov.br/
Paraíba
http://www.detran.pb.gov.br/
http://www.der.pb.gov.br/
Paraná
Rio Grande do Norte
http://www.detran.rn.gov.br/
http://www.der.rn.gov.br/
http://www.setransrn.com.br/index.php
Rio Grande do Sul
http://www.detran.rs.gov.br/
http://www.daer.rs.gov.br
Rondônia
http://www.detran.ro.gov.br/
http://www.rondonia.ro.gov.br/der/
Roraima
http://www.detran.rr.gov.br/
Santa Catarina
http://www.detran.sc.gov.br/
http://www.deinfra.sc.gov.br/
São Paulo
http://www.detran.sp.gov.br/
http://www.der.sp.gov.br/
http://blogpontodeonibus.wordpress.com/
https://twitter.com/#!/blogdoonibus
http://www.ciclofaixa.com.br/blog/
http://www.ciclofaixa.com.br/
http://www.facebook.com/ciclofaixa
https://twitter.com/#!/ciclofaixasp
Sergipe
http://www.detran.se.gov.br/
http://www.der.se.gov.br/
Tocantins
http://www.detran.to.gov.br/
http://dertins.to.gov.br/
Endereços Não-Governamentais
Abetran – Associação Brasileira de Educação
no Trânsito
Tem como missão principal a “Educação no Trânsito”. Persegue este objetivo com a realização de
palestras, cursos e projetos educativos, tendo
como público alvo o cidadão. O fundamento é
a mudança de comportamento e um melhor conhecimento de direitos e deveres. Possui um link
para o usuário se cadastrar e tornar-se membro
de um grupo de discussão na Internet.
• http://www.abetran.org.br/
Abramet – Associação Brasileira de Medicina
de Tráfego
Elabora e publica trabalhos científicos, buscando
“colaborar com o poder público na concepção,
elaboração e aplicação de uma legislação adequada e eficiente, relativa à medicina e à segurança de tráfego”.
• http://www.abramet.org.br/
• http://www.facebook.com/abramet
Abraspe – Associação Brasileira de Pedestres
Agrupa indivíduos e entidades em prol da luta
pelos direitos dos pedestres, investindo no fortalecimento das instituições e na participação da
sociedade civil.
• http://www.pedestre.org.br/
Abutran – Associação Brasileira de Vítimas do
Trânsito
Colabora com as autoridades legais para a redução do número de vítimas de acidentes nas
rodovias brasileiras. Ao longo do tempo, vem
implementando alguns projetos com essa finalidade e promovendo campanhas informativas e
de estímulo ao cumprimento das leis de trânsito.
• http://www.abutran.org.br/
Capítulo 5 – Trânsito virtual
ANTP – Associação Nacional de Transportes
Públicos
Conta com uma boa estrutura organizacional e
com um site para promover eventos ou apoiados
pela associação, além de dados sobre tarifas de
transporte e um relatório intitulado Sistema de
Informações da Mobilidade Urbana.
• http://www.antp.org.br/website/
• http://www.facebook.com/antpbrasil/
Apocalipse Motorizado
Investiga iniciativas e reflexões sobre possibilidades alternativas do uso da tecnologia, nos dias
de hoje, para a garantia da qualidade de vida das
pessoas. Sem restringir seu escopo, o blog dá
destaque ao uso da bicicleta em substituição ao
automóvel.
• http://www.apocalipsemotorizado.net/
Associação Brasileira de Prevenção aos Acidentes de Trânsito – Por Vias Seguras
Atua na conscientização das pessoas pela adoção
de um comportamento responsável no trânsito.
• http://www.vias-seguras.com/
Bicicleta Motorizada
O blog se apresenta como um local de encontro
e intercâmbio entre os proprietários de bicicletas
com motor e interessados em geral no assunto.
Conforme disposto na página, o fórum oferece
ainda “as últimas novidades, guias e dicas sobre
os motores para as bicicletas motorizadas”.
• http://bicicletamotorizada.org/
• http://www.facebook.com/www.bicimoto.com.br
• https://twitter.com/#!/bicimotobr
Blog do Caminhoneiro
Blog criado por um autodenominado apaixonado por caminhões desde pequeno, com atualizações diárias sobre o que diz respeito a este
universo.
• http://blogdocaminhoneiro.com/
• https://www.facebook.com/
BlogdoCaminhoneiro
55
56
Capítulo 5 – Trânsito virtual
Blog do Edson Lima / O Diario.com
Mantém uma seção de posts dedicados ao tema
trânsito em Maringá, apresentando desde notícias pontuais, como acidentes, até debates sobre
temas atuais, como instalação de radares e proibição da garupa em motos.
• http://maringa.odiario.com/blogs/edsonlima/
category/transito/
Cesvi – Centro de Experimentação e Segurança
Viária
Oferece soluções para a qualificação do setor automotivo, apresentando pesquisas, treinamentos e publicações, com vistas à redução dos acidentes e à melhoria da segurança viária.
• http://www.cesvibrasil.com.br/
Chega de Acidentes
Mobiliza os diversos setores da sociedade, pessoas físicas e jurídicas, “para pressionar e pleitear
a elaboração de um Plano Nacional de Segurança Viária”.
• http://cesvibrasil.com.br/chegadeacidentes/
• https://www.facebook.com/pages/Chega-deAcidentes/191158200910769
• https://twitter.com/#!/ChegadeAcidente
Debike
Permite a troca de informações, experiências e
ideias entre usuários e interessados em bicicleta.
• http://oglobo.globo.com/blogs/debike/
Dirigindo Seguro
Espaço de discussões sobre possibilidades de
melhorar a segurança no trânsito, com informações sobre formas de dirigir, manutenção de automóveis e ações preventivas em geral.
• http://www.dirigindoseguro.com.br/
• https://www.facebook.com/dirigindo.seguro
Etev – Educar para o Trânsito
Contribui para a construção de um trânsito seguro, por meio do investimento em educação e
pelo respeito a valores como ética, cidadania e
valorização da vida. Para isso, promove cursos e
campanhas de conscientização.
• http://ongeducarparaotransito.blogspot.com/
Instituto Rodrigo Marcheschi
Contribui para a redução do número de acidentes com vítimas fatais de trânsito, por meio da reeducação da sociedade pela informação, tendo
como base o foco em alunos do ensino fundamental, médio e universitários.
• http://www.marcheschi.org.br/
Instituto Rua Viva
Restauração da função social e incentivo ao uso
de modos de transporte coletivo, a pé e bicicleta.
Tem como proposta principal o tema da Mobilidade Sustentável em sentido amplo, com iniciativas sempre associadas à integração com o
meio ambiente e à preservação do patrimônio
histórico, cultural e artístico.
• http://www.ruaviva.org.br/
IFP – International Federation of Pedestrians
Promover e defender o direito dos pedestres de
acesso e mobilidade.
• http://pedestrians-int.org/
Mobilidade Urbana
Trata da questão da mobilidade em sentido amplo. Traz discussões sobre legislação, acidentes,
condições de conservação das vias e alternativas
de transporte como o BRT e o VLT.
• http://blogs.diariodepernambuco.com.br/
mobilidadeurbana/
• https://www.facebook.com/pages/
Mobilidade-Urbana/118249588379794
• https://twitter.com/#!/taniapassos_dp
Mobilize – Mobilidade Urbana Sustentável
Pretende ser um facilitador para o encontro de
cidadãos, ONGs, empresas e governos, para que
possam apresentar e trocar ideias acerca do tema
da mobilidade urbana.
• http://www.mobilize.org.br/
• https://www.facebook.com/portalmobilize
• https://twitter.com/#!/portalmobilize
MNDT – Movimento Nacional pela Democratização no Trânsito
Autodenominado intersetorial, interinstitucional
e interdisciplinar, congrega 27 instituições e atua
com a perspectiva de construir políticas públicas
voltadas para o trânsito, a partir de uma discussão crítica, democrática e transparente.
• http://www.mndt.org.br/
Notícias R7 Trânsito
Oferece informações sobre estradas de todos os
estados da Região Sudeste, além de Santa Catarina, Bahia e Pernambuco. O usuário pode ficar
sabendo, em tempo real, a situação no trânsito
nas principais avenidas das cidades do Rio de Janeiro e São Paulo.
• http://noticias.r7.com/transito/
ro, como o número de vítimas fatais e não-fatais
desde 2007, e a frota de veículos desde 2006.
• http://www.riocomovamos.org.br
Rodas da Paz
Sua meta é colaborar para reduzir o crescente
número de acidentes e mortes no trânsito do DF,
em especial entre os usuários de bicicleta. Suas
ações são palestras educativas, protestos e passeios ciclísticos, com o intuito tanto de conscientizar as pessoas quanto de pressionar o Estado
para ações que garantam a todos o trânsito seguro pela cidade.
• http://www.rodasdapaz.org.br/
Sustentável Transporte
Discute a mobilidade sustentável, constituindo
um ambiente para críticas, sugestões e ações em
favor da melhoria das condições de trânsito.
• http://2020sustentaveltransporte.blogspot.com/
Ponto de Ônibus
Espaço dedicado exclusivamente ao ônibus enquanto meio de transporte. Há posts sobre greves de profissionais de transportes coletivos, sobre o serviço prestado por algumas linhas, sobre
vias com engarrafamentos constantes e o estado
de conservação de ruas e avenidas.
• http://blogpontodeonibus.wordpress.com/
Trânsito – Folha de São Paulo
Divulga informações sobre o trânsito em São
Paulo e em todo o país. Oferece um serviço que
permite saber a situação do trânsito nas principais capitais do país e em algumas cidades da
região metropolitana de São Paulo.
• http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/
transito/
Portal do Trânsito
Pretende operar como um integrador de informações, atividades, produtos e serviços na área de
trânsito. Para isso, desenvolve atividades como divulgar a legislação sobre o tema, oferecer e facilitar acesso à obtenção de produtos e serviços com
vistas a conquistar a adesão da sociedade na promoção da educação para as gerações vindouras.
• http://www.portaldotransito.com.br/
• http://www.blogdotransito.com.br/
Trânsito – Jornal do Brasil
Veicula notícias diversas sobre o trânsito na cidade do Rio de Janeiro, no Estado e no país. Coluna
do site do Jornal do Brasil.
• http://www.jb.com.br/transito/
Rio como Vamos
A ONG apresenta uma série de indicadores relativos ao trânsito no município do Rio de JaneiCapítulo 5 – Trânsito virtual
Trânsito – O Globo
Oferece informações última hora sobre a situação do trânsito nas principais vias do Estado do
Rio de Janeiro.
• http://oglobo.globo.com/rio/transito/
Trânsito Amigo – Associação de parentes, amigos e vítimas do trânsito
Presta apoio emocional, jurídico e social às víti57
58
Capítulo 5 – Trânsito virtual
mas e aos familiares de vítimas da violência no
trânsito. Fundado por um pai de vítima de acidente de trânsito em 2003, dedica-se a iniciativas
que contribuam para a redução da violência no
trânsito no Brasil.
• http://www.transitoamigo.com.br/
• http://transitoamigo.blog.terra.com.br/
• http://www.facebook.com/transitoamigo/
• https://twitter.com/TRANSITOAMIGO
Trânsito Brasil
Tem como missão “promover a ética, a cidadania
e a segurança para o trânsito com a finalidade de
contribuir na construção de um trânsito seguro”.
• http://www.transitobrasil.net/site/home
• https://twitter.com/#!/transitobrasil
Trânsito Dez
Oferece informações sobre solicitação da primeira habilitação e renovação, além de simulados e
testes.
• http://www.transitodez.com.br
Trânsito e Vida
Prestar atendimento social e jurídico a pessoas
que são vítimas de acidente de trânsito e seus
beneficiários.
• http://transitoevida.com.br/
Trânsito em Foco
Hospedado na página de notícias PortalAZ, apresenta-se como um espaço onde são tratados “assuntos sobre trânsito e tudo que está relacionado”.
• http://transitoemfococte.blogspot.com.br/
Trânsito em SP
Presta informações sobre o tráfego nas ruas e
avenidas da cidade e nas principais rodovias do
Estado.
• http://blogs.estadao.com.br/transito/
• http://www.facebook.com/estadao
Trânsito Mais Gentil
Promove iniciativas que motivem motoristas e
pedestres a adotarem comportamentos mais
gentis no trânsito, contando, para isso, inclusive
com o apoio de artistas.
• http://www.transitomaisgentil.com.br/
• http://www.transitomaisgentil.com.br/blog/
• http://www.facebook.com/transitomaisgentil
• https://twitter.com/#!/transitogentil
Transporte Ativo
Busca conscientizar as pessoas a respeito do uso
de meios de transporte baseados na propulsão
humana para um trânsito com menos poluição e
maior inclusão social.
• http://www.ta.org.br/
• http://blog.ta.org.br/
• http://www.facebook.com/transporteativo
• https://twitter.com/#!/TransporteAtivo
Facebook
Brasil
• Parada pela Vida
https://www.facebook.com/pages/Parada-umpacto-pela-vida/131289717036742
Amazonas
• Manaus Trânsito
http://www.facebook.com/manaustrans
• Trânsito Manaus
http://www.facebook.com/TransitoManaus
Bahia
• Trânsito Salvador
http://www.facebook.com/TransitoSalvador
Pará
• Trânsito Belém
http://www.facebook.com/TransitoBelem
• Belém Trânsito
http://www.facebook.com/belemtransito
Paraná
• Blog do Caminhoneiro
https://www.facebook.com/blogdoCaminhoneiro
Rio de Janeiro
• Transporte Ativo
http://www.facebook.com/transporteativo
• Bicicleta Motorizada
http://www.facebook.com/www.bicimoto.com.br
• Trânsito Amigo
http://www.facebook.com/transitoamigo
• CET Rio
https://www.facebook.com/cce.cetrio
São Paulo
• Dirigindo Seguro
https://www.facebook.com/dirigindo.seguro
• Chega de Acidentes
https://www.facebook.com/pages/Chega-deAcidentes/191158200910769
• ANTP
http://www.facebook.com/antpbrasil
• Abramet
http://www.facebook.com/abramet
• Mobilize
https://www.facebook.com/portalmobilize
• Trânsito Mais gentil
http://www.facebook.com/transitomaisgentil
• Trânsito em SP
http://www.facebook.com/estadao
• Ciclo Faixa
http://www.facebook.com/ciclofaixa
Twitter
Brasil
• Legal no Trânsito – Brasil
https://twitter.com/#!/legalnotransito
• Tráfego_Brasil
https://twitter.com/#!/trafego_br
• Parada pela Vida
https://twitter.com/#!/ParadaPelaVida
Amazonas
• Trânsito Manaus
https://twitter.com/#!/TransitoManaus
Bahia
• Blitz em Salvador
https://twitter.com/#!/BlitzEmSSA
Ceará
• Lei Seca Fortaleza
https://twitter.com/#!/LeiSecaFortal
• Trânsito Ceará
https://twitter.com/#!/transitoce
Distrito Federal
• Lei Seca DF
https://twitter.com/#!/LeiSecaDF
Capítulo 5 – Trânsito virtual
• Blitz em Brasília
https://twitter.com/#!/BlitzDF
• Fuja do Trânsito no DF
https://twitter.com/#!/fujadotransito
• Trânsito Brasília
https://twitter.com/#!/transitoBSB
Espírito Santo
• Ligado no Trânsito – ES
https://twitter.com/#!/ligadotransito
Goiás
• Radar Blitz GO
https://twitter.com/#!/RadarBlitzGO
• Trânsito em Goiânia
https://twitter.com/#!/transitogo
Minas Gerais
• Blitz Belo Horizonte
https://twitter.com/#!/BlitzBH
• Trânsito de BH
https://twitter.com/#!/TransitoBH
• Trânsito BH
https://twitter.com/#!/transito_bh
• Blitz e Trânsito em BH
https://twitter.com/#!/blitz_BH
Pará
• Trânsito Belém
https://twitter.com/#!/TransitoBelem
• Belém Trânsito
https://twitter.com/#!/belemtransito
Paraná
• Sinal Vermelho Curitiba
https://twitter.com/#!/VermelhoCWB
Pernambuco
• Trânsito Recife
https://twitter.com/#!/transitorec_
• CTTU – Recife
https://twitter.com/#!/CTTU_RECIFE
• Lei Seca Recife
https://twitter.com/#!/LeiSecaRec
• Trânsito Livre PE
https://twitter.com/#!/transitolivrePE
DetranPe
• https://twitter.com/#!/DetranPE
Trânsito Brasil
https://twitter.com/#!/transitobrasil
59
60
Capítulo 5 – Trânsito virtual
• Mobilidade Urbana
https://twitter.com/#!/taniapassos_dp
Rio de Janeiro
• Lei Seca RJ
https://twitter.com/#!/LeiSecaRJ
• JC Trânsito RJ
https://twitter.com/#!/jctransito
• Trânsito RJO
https://twitter.com/#!/transitoRJO
• Trânsito RJ
https://twitter.com/#!/transitorj
• Trânsito Rio
https://twitter.com/#!/transito_rio
• Trânsito na Ponte
https://twitter.com/#!/TransitoNaPonte
• Lei Seca Niterói
https://twitter.com/#!/leisecaniteroi
• Trânsito Amigo
https://twitter.com/TRANSITOAMIGO
• Transporte Ativo
https://twitter.com/#!/TransporteAtivo
• Bicicleta Motorizada
https://twitter.com/#!/bicimotobr
• CET Rio
http://twitter.com/CCE_CETRIO
Rio Grande do Norte
• Trânsito em Natal
https://twitter.com/#!/transitonatal
Rio Grande do Sul
• Radar Blitz RS
https://twitter.com/#!/RadarBlitzRS
• Radar Blitz Porto Alegre
https://twitter.com/#!/RadarBlitzPOA
Santa Catarina
• Seterb – Blumenau
https://twitter.com/seterb
• Trânsito DC – Florianopolis
https://twitter.com/transitodc
São Paulo
• Lei Seca SP
https://twitter.com/#!/LeiSecaSP
• Band Trânsito São Paulo
https://twitter.com/#!/bandtransitosp
• Radar Blitz SP
https://twitter.com/#!/RadarBlitzSP
• Trânsito SP
https://twitter.com/#!/transito_sp
• Trânsito–SP
https://twitter.com/#!/transito_estado
• Chega de Acidente
https://twitter.com/#!/ChegadeAcidente
• Mobilize
https://twitter.com/#!/portalmobilize
• Trânsito Gentil
https://twitter.com/#!/transitogentil
• Blog do Ônibus
https://twitter.com/#!/blogdoonibus
• Ciclo Faixa
https://twitter.com/#!/ciclofaixasp
PARTE
2
LEITURA COMPLEMENTAR
62
Capítulo 6 – A morte sob rodas1
Capítulo 6 – A morte sob rodas1
Gláucio Ary Dillon Soares2
Andreia Marinho3
Sandra Andrade4
A extensão da tragédia
Morreram, no Estado do Rio de Janeiro, 84.188
pessoas no trânsito desde 1980 até 2010, inclusive. As cifras superam o número de mortes causadas pela bomba atômica jogada em Nagasaki, estimado entre 60 mil e 80 mil. No Brasil os números
são aterrorizantes: 931.785, no mesmo período.
Quase um milhão de vidas! Incluindo 2011, teríamos aproximadamente a soma da população de
alguns municípios importantes do Estado do Rio
de Janeiro: Macaé, Cabo Frio, Teresópolis e Niterói.
Zerando a população desses municípios, teríamos
o equivalente ao total dos mortos no Brasil desde
1980. E somente no trânsito.
Somos um país violento. Entre os vários tipos de mortes no trânsito, os atropelamentos
são uma categoria especialmente triste e socialmente injusta. Quem dirige veículo, particularmente quem possui um veículo, está acima da
moda estatística da população, mas os números
dos atropelamentos se aproximam dos da população como um todo.
Como são os atropelamentos?
O título desse artigo é atraente, mas incorreto. A maioria das mortes por atropelamento
não é sob as rodas dos veículos: deriva de uma
colisão entre um carro andando para a frente e
uma pessoa. O pedestre é projetado com a mesma velocidade do carro e se choca duas vezes. É
lesão ou morte em dois tempos. O carro usualmente freia e para, mas o pedestre continua, por
ter sido projetado.
Mudanças no desenho dos veículos reduziram a severidade das colisões com pedestres
em várias marcas de carros. Há, por exemplo, um
novo sistema de proteção, chamado Frontal Protection System, que, colocado na parte dianteira
dos carros, reduz substancialmente as mortes e os
casos de invalidez. E já houve experimentos com
air bags que, colocados do lado de fora do carro,
reduzem os danos ao pedestre, conforme indicam estudos de Crandall, Bhalla e Madeley (2002).
Não obstante esses avanços, há muita evidência demonstrando que o impacto do carro
provoca mais mortes e piores ferimentos do que
o impacto secundário contra a rua, calçada ou
outro objeto. Primeiro, o para-choque atinge as
pernas e, microinstantes depois, o capô atinge a
área da bacia; finalmente, o tórax e a cabeça são
atingidos pela área de cima do capô ou pelos vidros frontais. A causa individual mais frequente
das mortes é o traumatismo craniano, ao passo
que os ferimentos nas pernas e nos quadris são a
maior causa de invalidez.
Como estão o Brasil e o Estado do
Rio de Janeiro?
As mortes por atropelamento estão aumentando ou diminuindo? Os dados mostram que os
atropelamentos estão mudando e, no Brasil, particularmente no Rio de Janeiro, ajustam-se muito
bem a um polinômio. De um lado, a mortandade
crescente; de outro, a legislação introduzida na
segunda metade da década de 1990, inclusive
com um novo Código do Trânsito, provocou uma
queda substancial na carnificina. No Brasil, o pico
foi em 1996, com 12.952 mortes, seguido por uma
baixa acelerada: 12.580 em 1997, salvando 372
pedestres, e 11.227 em 1998, salvando mais 1.725.
de 2001, no Brasil, a tendência à baixa terminou,
iniciando novo período sem melhorias no total
de mortes6. Tanto no Brasil quanto no estado, a
tendência dominante foi de pequenas variações
ao redor do mesmo patamar, durante cinco anos,
para o Brasil – até 2005, segundo algumas fontes,
e 2007, segundo outras – e sete anos, para o Rio
de Janeiro – até 2006.
Os efeitos das políticas que salvaram tantas
vidas acabaram? Talvez não. Possivelmente, novas administrações, mais responsáveis, voltaram
a aplicar a lei de forma mais rigorosa e/ou desenvolveram novas legislações e regulamentos que
foram colocados em prática. Os polinômios mostram que o período de estagnação foi substituído por um período de nova queda no número de
atropelamentos. No Rio de Janeiro, esse período
corresponde ao de uma administração que parece conceder uma prioridade mais alta à segurança pública, durante a qual houve uma queda
substancial dos homicídios. Portanto, é possível
salvar mais vidas com uma melhor aplicação das
mesmas leis.
Em 1999 houve uma baixa espetacular:
9.886 mortos, salvando mais de 3.000 pedestres
somente naquele ano e, finalmente, 8.696 mortos em 2000, quando as vidas de mais de 4.200
pedestres foram salvas. Durante esses quatro
anos de queda na mortalidade, 9.419 pedestres
deixaram de morrer no Brasil. No Rio de Janeiro,
o processo inicialmente foi semelhante, ainda
que, como esperado, com números menores: o
estado tem 8% da população do país. Em 1997,
salvaram-se 139 pedestres; em 1998, mais 490 e,
em 1999, mais 864, perfazendo um total de quase 1.500 vidas poupadas em apenas três anos5.
Entretanto, às vezes os efeitos benéficos de
políticas públicas duram pouco. Em alguns casos, o tema não é relevante para o novo mandatário; em outros, por ideologia e ignorância, as
leis são abolidas ou sua implementação é afrouxada. A cultura cívica, a cultura política e a cultura automobilística não são processos lineares. Há
retrocessos que podem se refletir no número de
mortes, seja através de novo aumento, seja através de estagnação relativa, o que é mais comum:
com efeito, a partir de 2000, no Rio de Janeiro, e
Gráfico 22 – Mortes por atropelamento, Brasil e Rio de Janeiro, em duas escalas, 1995 a 2010
14500
2500
13500
12500
2000
11500
10500
1500
9500
8500
1000
7500
Brasil
Rio de Janeiro
Polinômio (Brasil)
Polinômio (Rio de Janeiro)
6500
5500
500
4500
Capítulo 6 – A morte sob rodas1
2009
2008
2007
2006
2005
2004
2003
2002
2001
2000
1999
1998
1997
1996
1995
0
63
64
Capítulo 6 – A morte sob rodas1
Claramente, as políticas públicas contam e
bons governos salvam vidas. Em 1995, os Estados
Unidos aboliram os limites de velocidade nas rodovias interestaduais, no que foram seguidos por
32 estados que aumentaram suas velocidades
máximas. As mortes nessas rodovias aumentaram
em 15%, o que significou 450 a 500 mortes a cada
ano. Em 2003, a maioria dos estados já tinha aumentado o limite de velocidade nas estradas rurais, o que provocou um aumento anual de 38%
nas mortes. Simulações, usando outros países
como padrão, são úteis: se os americanos adotassem os padrões britânicos, perto de 10 mil americanos não teriam morrido – mais de três vezes os
que morreram nos ataques às Torres Gêmeas.
Houve progressos nas taxas, no Brasil e no
Rio de Janeiro, cuja demonstração é prejudicada
por deficiências dos dados e pela falta de formação metodológica de muitos autores. A tradição
nos países subdesenvolvidos, reforçada pela Organização Pan-americana de Saúde, é computar taxas pela população (por 100 mil pessoas),
mas o tamanho da frota altera dramaticamente
o risco de atropelamento. A frota de veículos registrados no Estado do Rio de Janeiro aumentou
de dois milhões, em 1998, para quase quatro milhões e meio, em 2010. A frota de 2010 equivale
a 231% da de 1998. A taxa inicial, de 8,2 por 10
mil veículos, foi reduzida gradativamente até 2,2,
em 2010. Esses dados se referem a mortes por
atropelamentos e não a mortes no trânsito, cujo
número pode ser consideravelmente maior.
A influência da legislação e das
políticas públicas
Os acidentes de trânsito, muitas vezes, estão
relacionados com excesso de velocidade e problemas decorrentes do consumo de álcool. Maria Thereza Bonilha Dubugras, Jair de Jesus Mari
e José Francisco Fernandes Quirino dos Santos
são alguns dos pesquisadores brasileiros que en-
fatizaram o impacto do excesso de velocidade e
do consumo de álcool. Pesquisadores e ativistas
foram além da constatação de que o alcoolismo
aumenta o risco, analisando a influência da propaganda sobre o consumo. Reclamam da ausência ou debilidade de controles públicos sobre a
propaganda no Brasil. É uma discussão sobre a
influência dos meios de comunicação e sobre os
limites da autorregulamentação.
No que concerne ao alcoolismo, pelo menos
dois tipos de políticas produzem o resultado desejado de reduzir a mortalidade e a morbidade
no trânsito. A primeira, muito eficiente se implementada com seriedade, reside na proibição de
dirigir após a ingestão de álcool, demonstrada
pelos vários testes de alcoolemia. A outra, indireta, se dá por meio de impostos que aumentam o
preço das bebidas.
Em seus estudos, autores como Chaloupka,
Grossman e Saffer (2002) argumentam que a teoria econômica mais básica já permite compreender que o aumento dos preços provoca uma
redução no consumo. Defendem o aumento
de impostos sobre as bebidas alcoólicas, com
o objetivo de reduzir o consumo e suas consequências negativas. Citam muitos estudos que
demonstram que bebidas alcoólicas mais caras
reduzem as taxas de motoristas bêbados, em todas as idades. Como o consumo em geral é diminuído e não apenas controlado, acidentes e violências de todos os tipos diminuem de número.
As políticas públicas e as leis, se efetivamente implementadas, podem salvar vidas, ou podem ficar no papel e deixar que os que seriam
salvos morram. No Brasil, a inflexão da legislação
veio em etapas, primeiro em fins de 19977, contra
dirigir alcoolizado8. Em junho de 2008, acentuaram-se as modificações favoráveis ao controle do
consumo de álcool9.
Promulgação e implementação efetiva são
coisas diferentes e, ainda assim, essas leis inverteram uma tendência ao crescimento das mortes no
trânsito, em geral, e dos atropelamentos, em particular. Os mortos no trânsito decresceram acentuadamente entre 1996 e 2000: 12.952, 12.500,
11.227, 9.886 e 8.696 pessoas, com o passar dos
anos. O número de atropelados mortos também
desceu. Se fosse mantido o nível de 1996, teríamos 9.499 mortos a mais, dos quais 2.327 atropelados. Essas não são variações explicáveis pelo
acaso. É a coincidência temporal entre a promulgação das leis e o início da redução nas mortes
que sugere a existência de uma relação causal10.
Os efeitos das culturas cívica,
política e automobilística
A combinação entre uma cultura automobilística recente, baixa cultura cívica e um aumento
explosivo na frota provoca, usualmente, um crescimento acelerado de mortos e feridos, como no
caso da China – em duas décadas, o número de
mortes dobrou. Não foi um fenômeno metropolitano nem urbano, como é frequente. Marcou
todo o país: em verdade, as taxas mais altas por
100 mil veículos aconteceram nas regiões menos
populosas. O resultado se transformou num problema de saúde coletiva: as mortes no trânsito
já lideram as causas de morte na população até
45 anos. No entanto, é difícil trabalhar com os
dados chineses porque, infelizmente, continuam
medindo os acidentes usando somente a taxa
pela população – como o fazem muitas instituições brasileiras –, registrando um aumento de
3,9 por 100 mil para 7,6 entre 1985 e 2005.
Por que teriam os acidentes crescido tanto num país com controle populacional rígido?
Porque o número de carros aumentou 900% e
o de outros veículos, sobretudo motocicletas,
5.400%11. Daí a necessidade de também medir as
mortes por quilômetro rodado ou, pelo menos,
por 10 mil veículos. Um aumento gigantesco da
carnificina, mas sabemos que vai ficar pior: entre
2000 e 2020 espera-se um aumento de 92% nas
mortes, pois há um descompasso entre o nível
Capítulo 6 – A morte sob rodas1
da produção industrial automobilística chinesa
e o nível da cultura cívica e, particularmente do
seu conteúdo automobilístico: o baixo nível da
cultura cívica se percebe no fato de que metade
dos motoristas não usa cinto.
Variações nas culturas cívica,
política e automobilística
O espaço e suas subdivisões administrativas
(países, regiões, estados etc.) são substitutos –
proxies – de um conjunto amplo de fatores, entre os quais se encontram a cultura cívica e uma
componente sua, a cultura automobilística. Dados americanos de boa qualidade, da National
Highway Traffic Safety Administration – NHTSA
(2002), mostram que 69% dos pedestres mortos são homens. O motivo, em nossa opinião,
é a maior exposição dos homens: em qualquer
momento, particularmente nas horas e dias mais
perigosos, há mais homens atravessando as ruas
do que mulheres. A taxa dos feridos também é
maior entre os homens.
Há dias e horas “da morte”. Dados americanos de 2005 informam que 49% ocorrem no final
da semana – sexta a domingo – e 51% dividem-se nos demais quatro dias. O risco representando pelo “espírito” de muitas pessoas no fim de semana mostra que 45% das mortes de pedestres
ocorreram entre as seis da tarde e a meia noite e
55% dividem-se nas demais 18 horas do dia.
Nós, brasileiros, temos pouca resistência à
afirmação de que a cultura automobilística, e a
própria cultura cívica, esteja mais avançada em
vários países do que no Brasil. Porém, resistimos à
ideia de que as mesmas diferenças caracterizem
nossos estados e regiões, uma postura reativa à
existência de padrões internos de segregação. A
segregação existe, mas essas diferenças regionais também. Ano após ano, as taxas de morte
por 10 mil veículos são mais altas no Norte e no
Nordeste do que nas demais regiões: um gráfico
mostra a extensão das diferenças em 2008.
65
66
Capítulo 6 – A morte sob rodas1
Gráfico 23 – Brasil, taxa de acidentes por 10 mil veículos em 2008, por Região
15
Pedestre
10
5
0
Região
Norte
Região
Nordeste
Região
Centro-Oeste
Tem Jeito!
Há solução para os problemas do trânsito.
Muitas medidas já se encontram nas ruas e estradas de todo o mundo. Na Suécia, os limites
de velocidade reduziram as mortes em 21%. Já
na Dinamarca, 24%; na província de Victoria, na
Austrália, a redução foi de 40%. Os nossos conhecidos pardais também têm efeitos benéficos: em
Queensland, na Austrália, 2.500 deles reduziram
as mortes em 31% em 15 anos; na Grã-Bretanha,
pardais, glorietas, limites de velocidade e outras
medidas reduziram as mortes em 34%.
Há, literalmente, centenas de constatações
sistemáticas dos efeitos da redução da velocidade média sobre a mortalidade. No Brasil, porém,
o lobby da velocidade conseguiu que fossem colocados avisos da proximidade dos pardais. Esses
avisos não só impediram que a cultura automobilística apresentasse um padrão mais baixo de
velocidade média e constante, como permitiram
que se instalasse outro padrão, nada desejável: o
Região
Sul
Região
Sudeste
de alta velocidade média, interrompida por desacelerações súbitas e breves diante da presença
dos aparelhos.
A avaliação de uma cultura cívica e automobilística não se faz apenas a partir das taxas
de mortalidade, mas também a partir da participação dos atropelamentos no total de mortes:
quanto maior a percentagem de atropelamentos, pior. Uma alta participação indica uma cultura automobilística menos avançada e experiente.
Uma alta participação sugere que, até nas mortes no trânsito, a desigualdade social persiste:
enquanto uns morrem nos carros, outros morrem a pé. Os dois segmentos não são amostras
aleatórias de um total maior. Não são farinha do
mesmo saco. E a evolução do Brasil nesse quesito é incontestável: a participação dos pedestres
no total de mortos no trânsito, como mostra o
Gráfico 24, entre 1996 e 2008 teve redução de
aproximadamente 1% ao ano, saindo de mais de
36% e terminando em pouco menos de 24%.
Gráfico 24 – Porcentagem dos óbitos por acidentes no trânsito nos quais as vítimas são pedestres – Brasil, 1996 a 2008
38
36
34
32
30
28
26
24
22
20
1996
1997
1998
1999
2000
2001 2002
2003
2004
2005
2006
2007
2008
As mortes no trânsito, inclusive os atropelamentos, incluem muitos dados de origens diferentes. Com frequência, a frota de veículos de
todo tipo cresceu aceleradamente, transferindo
parte significativa dos trajetos antes percorridos
a pé para o interior de veículos. O aumento das
colisões e das mortes era uma consequência esperada devido ao crescimento das frotas.
Esses fenômenos se deram num vazio de
conhecimento e de decisões políticas inteligentes. As pesquisas, porém, aumentaram o conhecimento e as mortes aumentaram a pressão
popular, midiática e política sobre os governos,
embora em todos os casos tenha havido um hiato entre a criação dos problemas e a entrada em
vigor de políticas públicas inteligentes. Contudo,
esse hiato variou muito entre os países e entre
regiões do mesmo país: nos países de maior renda per capita, o crescimento ocorreu antes; nos
de menor desenvolvimento, depois.
Entre os países menos desenvolvidos há
muita variação na cultura política, que se reflete
no tempo para reduzir o hiato até níveis aceitáveis. Governos melhor informados reduzem esse
hiato antes, usando uma combinação entre o
conhecimento que provém dos países mais experientes e das pesquisas feitas localmente. Os
governos mais tradicionais, caracterizados pela
desatualização técnica e por uma cultura política
reacionária, levam mais tempo.
Essa diferença não significa apenas tempo,
mas vidas humanas salvas ou perdidas. A morte
– e, portanto, a vida –, depende dos governos e
das políticas públicas. A cultura automobilística
progride lentamente, mas as políticas públicas
de segurança nas ruas e estradas produzem efeitos quase imediatos, tanto no sentido de reduzir
as mortes, quanto no de deixar morrer.
Não sabemos exatamente como se dá a
vinculação entre um papel assinado pelo governador e o fato de que milhares e milhares de
motoristas respondem, e seus pés não apertam
Capítulo 6 – A morte sob rodas1
tanto o acelerador. Há muitas mediações, mas a
relação funciona como se houvesse fios invisíveis ligando a lei, o papel assinado e o cérebro
de centenas de milhares de motoristas que modificam seu comportamento. Fios invisíveis que
salvam vidas. Bons governos usam esses fios e
salvam vidas.
Notas
Texto publicado na revista Inteligência, Outubro/Novembro/Dezembro de 2011.
1
2
Consultor que colaborou no desenvolvimento da pesquisa.
3
Estagiária que colaborou no desenvolvimento da pesquisa.
4
Estagiária que colaborou no desenvolvimento da pesquisa.
É necessário repetir que essas baixas se deram após a entrada em vigor do Novo Código do Trânsito e de leis suplementares que o aperfeiçoaram.
5
Como a frota continuava crescendo, houve melhora nas
taxas. Como a população brasileira aumentou em todos os
períodos analisados e a frota aumentou muito, os números
absolutos podem ocultar mudanças positivas havidas no
trânsito.
6
Lei no 9.503, de 23 de setembro de 1997, que instituiu o
Código de Trânsito Brasileiro.
7
8
Lei no 9.294, de 15 de julho de 1996.
Lei no 11.705, de 19 de junho de 2008, parcialmente vetada no que concerne à prisão e ao flagrante.
9
Essa associação, que lemos na direção de que as leis favorecem o decréscimo das mortes, não exclui outra, anterior, que ensina que o crescimento das mortes pressiona o
poder público para que adote políticas públicas eficientes
que previnam as mortes no trânsito.
10
Segundo a NHTSA (2002), nos acidentes com pedestres,
40% dos ferimentos resultam do contato direto com o veículo, 32% com o chão ou pavimento, e 26% com objetos
não identificados.
11
Nota: As informações contidas neste capítulo são de
inteira responsabilidade dos autores.
67
68
Capítulo 7 – Projeto Paz no Trânsito no Distrito Federal: um modelo possível
Capítulo 7 – Projeto Paz no Trânsito no Distrito Federal: um
modelo possível
Gláucio Ary Dillon Soares1
Introdução
Os efeitos das políticas públicas podem ser
melhor observados quando correspondem a
mudanças de governos e de programas de governo, particularmente se decompusermos o
tempo em antes e depois do governo analisado.
Usamos essa estratégia para ver as diferenças
entre os governos anteriores ao de Cristovam
Buarque e os anos em que ele e seu governo
participaram do programa Paz no Trânsito. Entre
1980 e 1994, o número de mortos no trânsito do
Distrito Federal aumentou gradativamente, cada
ano com mais 33 mortos do que o anterior.
A linearidade temporal desse processo pode
ser aquilatada pelo coeficiente de determinação
do número de mortos pelo ano das ocorrências
(R² = 0.84). Não houve “explosões” de mortes,
mas, com o passar do tempo, aumentava gradativamente o número de mortos. Brasília, nos
anos de 1996 e 1997, era uma das cidades mais
violentas no trânsito pelo grande números de
acidentes, com pedestres atropelados e vítimas
fatais. O número de atropelamento nesses anos
representava respectivamente 49,8% e 47,3% do
número total de acidentes, com morte, no Distrito Federal (LÉ SÉNÉCHAL-MACHADO, 2007).
Gráfico 25 – Número de mortos no trânsito no Distrito Federal até o governo de Cristovam Buarque
800
700
600
500
400
300
200
100
0
1980 1981 1982 1983 1984 1985 1986 1987 1988 1989 1990 1991 1992 1993 1994
Gráfico 26 – Número de mortos no trânsito no Distrito Federal durante a administração Cristovam Buarque
750
700
650
600
550
500
450
400
1995
1996
1997
1998
As tentativas iniciais de apoio do
setor público
As tentativas de obter um pequeno financiamento para uma pesquisa piloto sobre trânsito
naufragaram. Para a Financiadora de Estudos e
Projetos (Finep), os projetos tinham que ser aplicáveis e, como a aplicação dependeria de governos, o objetivo era demonstrar que as medidas
salvavam vidas. Não houve como. Um tecnocrata
bem vestido não entendia o papel da prevenção.
Com um ar desinteressado, aconselhou-me a escrever outro projeto. E isto, em bom burocratês,
quer dizer “desista dessa”.
Também encontrei resistências dentro da
universidade, sobretudo por parte do Departamento. O cacoete teórico que domina as ciências
políticas e sociais no Brasil fez mais uma vítima.
É irônico: um projeto que alavancaria um programa de governo que, na prática, acabou salvando
cerca de 900 vidas era rejeitado porque não tinha
“profundidade teórica”. Pior: os teóricos fugiam
da pesquisa empírica, particularmente da quantitativa, como o diabo da cruz. Já ocorrera antes,
quando co-orientei a monografia de uma aluna
da graduação da Uerj. As pessoas não se interessavam por uma pesquisa simples para a monografia, mas que poderia salvar muitas vidas – afinal, o
que interessava era ter “profundidade teórica”.
Mal sabia eu que David Duarte, que seria
meu colega de jornada, encontrava problemas
semelhantes na Escola de Medicina, onde encontrava grande oposição. A epidemiologia de
mortes violentas por causas externas não era
aceitável pelos senhores e senhoras vestidos de
branco. Sabíamos que países com mais experiência automobilística implementaram programas para reduzir a mortalidade e a morbidade
no trânsito e queríamos usar essas experiências
para salvar vidas no Distrito Federal.
Como as tentativas institucionais falhavam
desde o início, sobrou o caminho da mobilização
Capítulo 7 – Projeto Paz no Trânsito no Distrito Federal: um modelo possível
cidadã – uma importante lição que haveria de
marcar-me. Ficáramos conscientes de que, para
obter bons resultados rapidamente, era necessário não depender do setor público, lento demais
para nosso sentido de urgência. Unimos nossos
esforços e ampliamos nossas ações para fora da
universidade: formamos um grupo que incluía
alunos, policiais, membros do staff do Detran –
entre os que há que sublinhar o diretor, Luis Miúra, e os que mantinham boas estatísticas – e outros voluntários. Até os trabalhadores do Detran
juntaram-se a nós como cidadãos e não como
funcionários, embora o seu diretor, que participava também como cidadão, nos desse pleno apoio.
Criava-se um movimento que uniu forças
com o Correio Braziliense. Formamos um grupo de
estudantes voluntários. Eu não tinha recursos e
simplesmente pagava as passagens deles. Andaram para cima e para baixo em todas as linhas de
ônibus, conversando com motoristas, trocadores
e passageiros. Uma inspeção mais detalhada e
competente da mortalidade e da morbidade nos
coletivos revelou uma realidade chocante. Com
os dados do SUS, suplementados pelos do Hospital Sarah Kubitschek – felizmente, organizado,
competente e informatizado já naquela época –
consegui ser recebido por Nazareno Affonso, então Secretário dos Transportes do DF.
Surgem as primeiras bolsas
Esses bons resultados permitiram obter
para alguns participantes bolsas de graduação
pelos programas de Iniciação Científica (Pibic)
e de Educação Tutorial (PET). Porém, apareceram obstáculos de outra ordem que, devido à
minha ingenuidade, me pegaram de surpresa. Os que trabalharam como voluntários não
eram amostra aleatória do total dos participantes. Entre os que vieram depois, atrás das
bolsas, a rotatividade foi alta – as faltas, o acúmulo ilegal de funções remuneradas e minha
incompetência como supervisor fizeram com
69
70
Capítulo 7 – Projeto Paz no Trânsito no Distrito Federal: um modelo possível
que fosse assim. Esperara encontrar, entre os
jovens do Distrito Federal, a capital do privilégio, uma ética de trabalho e profissional que
eu observara e incorporara nos Estados Unidos.
O resultado foi uma redução na produtividade. Os participantes que pertenciam às classes média e alta, acostumados a considerar privilégios como normalidade, não se sentiam na
obrigação moral de repor, em trabalho, o que
recebiam. Os mais pobres acumulavam, ilegal e
irresponsavelmente, bolsas e bicos de todos os
tipos. Tive que aprender, com a professora Maria das Graças Rua, que administrava com rigor
o programa de bolsas da Ciência Política na Universidade de Brasília, a tratar os estudantes com
um certo distanciamento pessoal, dispensando
bolsistas na segunda infração.
Algumas medidas
Uma das medidas, inicialmente fonte de controvérsia, se referia às faixas de pedestres. Acrescentou a punição, com multas e advertências, aos
motoristas que desrespeitassem a lei. O coronel
Reinaldo Azevedo fez um período de estudos na
Europa e argumentou a favor da plausibilidade
de que, eventualmente, os motoristas respeitassem a faixa. Uma estória, verídica, de cunho anedótico, mostra como era a cultura automobilística da época no Distrito Federal. Pediu à própria
filha que testasse as respostas às novas diretrizes
e a filha se negou, dizendo que era morte certa...
As faixas de pedestres tiveram início em abril de
1997. Houve resistência da parte dos motoristas,
como fica claro na entrevista do próprio Coronel
a Vívica Lé Senéchal-Machado (2007).
Poucos meses depois, em 23/12/1997, foi promulgado o Novo Código de Trânsito Brasileiro (Lei
9.503/97) que instituiu a faixa para pedestres e a
obrigatoriedade de parar na faixa. A importância
do Novo Código de Trânsito Brasileiro tornou-se
clara: agora havia respaldo em legislação federal
para multar quem não obedecesse à faixa, o que
permitiu muitas vitórias no fronte legal.
Gradualmente, cresceu o respeito aos pedestres nas faixas. Não usamos palhaços como em Bogotá, mas crianças uniformizadas ocasionalmente
participaram dos sabões passados aos infratores.
Nas relações com o público, a grande dificuldade
era a ausência de compreensão de noções elementares de estatística e probabilidade – e não apenas
no público com baixa escolaridade. As entrevistas
e artigos tinham que incluir noções básicas para
que a mensagem pudesse ser transmitida.
O auge da mobilização popular e da campanha ocorreu em agosto de 1996, quando, com o
apoio do Fórum Permanente pela Paz no Trânsito
e de várias instituições e da mídia, sobretudo do
Correio Braziliense, foi organizada uma marcha
pela paz no Eixão. Os participantes, vestidos de
branco, fizeram apenas uma marcha silenciosa,
em homenagem aos que foram silenciados para
sempre pela violência no trânsito. Estimar o número de participantes de eventos abertos pode
ser feito, particularmente do ar, usando amostras
espaciais. Embora isso não tenha sido feito, houve várias estimativas e a oficial ficou em 25 mil
pessoas. Não foi uma megademonstração, como
as que vivemos na campanha pelas Diretas Já,
nem tampouco uma pequena demonstração de
algumas centenas de pessoas.
Para quem participava, foi emocionante. Para
quem sonhava com a demonstração de apoio popular, foi marcante. Porém, era impossível estimar,
sem pesquisa, o apoio ao movimento: para cada
um que se dispôs a se vestir, buscar transporte
e investir algumas horas em uma demonstração
durante o fim de semana, quantos mais apoiavam
o movimento? Tentando responder à pergunta,
havia diferentes especulações. Nós nos perguntávamos, e os políticos também: como muitos participantes e muitos apoiadores votavam?
A alta participação conferiu ao Paz no Trânsito
um caráter político, com todos os inconvenientes
que acompanham essa transformação. A impossibilidade da oposição ao governador de incorpo-
rar o movimento levou alguns de seus membros
a agir contra ele, capitaneados por Luis Estevão2.
A preocupação com o apoio da população, indispensável para a continuidade do movimento, gerou muitas outras formas de informação: artigos
em jornais, participação em programas de rádio
e de televisão, palestras, conferências, grupos de
estudo e outras. O resultado foi um crescimento
rápido do apoio à iniciativa, ainda que vista como
um programa de governo.
A administração do Distrito Federal, que
apoiara a causa desde o início, incorporou os
objetivos do movimento que continuou a existir.
Em frente ao edifício da administração do Governo do Distrito Federal (GDF) foi instalado um placar, com atualização contínua, com referências
aos três últimos anos. Paralelamente, calculávamos o número projetado de mortos, o número
de mortos e o número de vidas salvas.
Em resposta à afirmação “o GDF está resolvendo os problemas do trânsito”, os entrevistados poderiam concordar ou discordar. A percentagem concordando – e, portanto, denotando
aprovação – começou em um patamar baixíssimo: 16%, em 30 de agosto de 1996. Menos de
dois meses depois, em 19 de outubro, já alcançava 40%; dez dias depois, galgaria mais quatro
pontos. Em 19 de novembro, última data de aferição, a concordância estava em 59%.
Essas iniciativas não se limitaram ao trânsito.
Depois de conhecidos, fomos procurados pelos
bombeiros, que queriam saber por que tantas
pessoas se afogavam no DF – como não se tem
mar, essas mortes causaram estupefação, chegando a ser matéria do Fantástico. Nasceu um
miniprojeto com análise das estatísticas, com
base em uma forma elementar de análise espacial e na determinação dos hot spots. Um local de
lazer de classes menos favorecidas, na barragem
do Descoberto, respondia por boa parte das
mortes. A inspeção dos laudos das necropsias revelou que muitos tiveram traumatismo craniano
seguido de afogamento.
Medidas preventivas foram tomadas, como
impedir que pulassem em áreas com vazão insuficiente – no fundo, havia ora pedras, ora troncos
submersos – e, nas áreas de correnteza, foram
chumbados postes conectados com correntes.
A presença, permanente, de um grupo de bombeiros nas áreas de alto risco transformou muitas
mortes em afogamentos incompletos. O resultado: de aproximadamente 100 mortes anuais,
passamos a 40. A junção informal, mas sólida,
entre a pesquisa – com os métodos mais rigorosos aplicáveis à situação – e os segmentos do governo – que implementaram políticas públicas
informadas e inteligentes – salvou vidas.
Gráfico 27 – Percentual de concordância com a afirmação “o GDF está resolvendo os problemas do trânsito”
80
Pedestre
59
60
40
40
20
0
44
16
30/08/96
19/10/96
O Paz no Trânsito não foi uma política pública
instalada de uma só vez: veio por etapas. Por se
Capítulo 7 – Projeto Paz no Trânsito no Distrito Federal: um modelo possível
29/10/96
19/11/96
tratar de um movimento social primeiro e de uma
política do GDF como consequência, respondia às
71
72
Capítulo 7 – Projeto Paz no Trânsito no Distrito Federal: um modelo possível
inúmeras contribuições feitas no Fórum e às contribuições de um pequeno grupo de pesquisadores que varriam as experiências de outros países,
em busca de medidas promissoras tais como os
pardais. Porém, concluindo-se, por exemplo, que
pardais salvariam vidas, surgiam questões práticas para implementação de inovações, relativas a
financiamento e localização, entre outras.
Quase não havia dinheiro público, o que ensejou uma negociação com os fabricantes que
instalariam os pardais, pagos com uma percentagem das multas. A parceria pelo programa foi
benéfica: vidas foram salvas e aumentaram-se os
recursos, com gastos públicos mínimos. Em novembro de 1996, três meses depois das marchas,
os pardais foram instalados. Houve resistência,
recursos judiciais e interrupções.
Outros recursos foram usados pelo movimento: como em Bogotá, houve Anjos do Asfalto.
A mobilização também envolveu as mães. A participação foi ampliada e a cidadania começou a
educar a população. A participação cidadã também tomou a forma de protestos: em Planaltina,
uma cidade satélite, as crianças saíram às ruas
contra a violência no trânsito.
Os resultados da campanha e sua divulgação contínua ajudaram, e muito. Em janeiro de
1998, último ano da administração Buarque,
as mortes mensais baixaram a 20. O papel dos
meios de comunicação foi analisado por vários
autores. Um dos trabalhos mais interessantes foi
uma “simples” monografia de graduação, Placar
da vida: bastidores da prática de jornalismo público que mudou o trânsito do Distrito Federal, de
Josivânia Ferreira dos Santos. No fronte da mídia
houve progressos. Discutiu-se, no Correio Braziliense, se uma campanha desse tipo cabia a um
jornal. A disputa interna continuava quando o
programa começou a produzir resultados e alguns jornalistas ganharam reconhecimento.
Ana Júlia Pinheiro, repórter do Correio Braziliense, foi a autora da série de reportagens sobre
a campanha Paz no Trânsito, no período de 1996
até 1997, no Caderno Cidades. Essas reportagens
e a campanha deram certo, e era evidente que
seu prestígio crescia: o Correio Braziliense realizou
uma pesquisa de opinião diária, com 100 assinantes do jornal, que revelou o entusiasmo dos leitores. Cerca de 70% estavam interessados na matéria, sendo que o máximo atingido anteriormente
por outro tema estivera perto dos 40%. O apoio
incondicional de um jornalista de renome da Rede
Globo, Alexandre Garcia, colaborou de forma fundamental para decidir que a campanha convinha
ao jornal. Garcia comentava inteligentemente as
tragédias no trânsito do Distrito Federal.
Outro fator de interesse tem a ver com a
consciência cívica de um jornal. A consciência
cívica é uma das diretrizes que influenciam as
ações de um jornal, de uma revista, de um canal de televisão. O Jornal de Brasília, que tentava
competir com o Correio, protagonizou um exemplo primoroso de como a ética da competitividade se sobrepôs à consciência cívica:
Durante a campanha Paz no Trânsito, em
1996, o Jornal de Brasília fez agendamento por
omissão da campanha. A cobertura foi omissa.
Em nenhum momento o Jornal de Brasília citou o
nome da campanha Paz no Trânsito. As coberturas eram simplesmente sobre os acidentes e não
que a população estava mobilizada pela Paz no
Trânsito. Os interesses do jornal, em não apoiar
o concorrente, ficaram acima do propósito da
campanha, que era a redução da velocidade e
dos acidentes de trânsitos no Distrito Federal. A
campanha não tinha dono. Esperava-se o apoio,
se não a prática de um jornalismo cidadão, de
todas as mídias por uma causa urgente, que beneficiava toda a sociedade (SANTOS, 2008, p. 35).
Funções das pesquisas
Pesquisas relativamente simples e baratas
podem ajudar muito, de diversas formas. Uma
das principais é desmistificar crenças erradas, e
há muitas delas nas explicações para as mortes
violentas. Muitos mitos. Pesquisas podem otimizar o destino dos recursos. Os comportamentos,
inclusive os errados, dos motoristas variam no
tempo e no espaço; necessitamos de medidas
corretas para prevenir os comportamentos errados nos lugares onde existem.
Tomemos um exemplo: uma das maneiras
de averiguar se há uma relação íntima entre o
consumo nacional de álcool e as taxas de morte
em vários tipos de acidentes foi usada por Skog
(2001). O autor demonstra, após analisar dados
de 14 países europeus, que há dois padrões diferentes: a íntima associação com os acidentes de
trânsito na Europa Central e no Sul da Europa e
a íntima associação com os demais tipos de acidentes na Europa do Norte. A pesquisa secundária é, portanto, muito importante: propõe, para
testar, medidas que deram certo em outros lugares. Adendo importante: aprendemos, também,
com experiências negativas, programas e medidas que não deram certo. E é muito mais barato
aprender com os erros alheios.
Finalmente, as pesquisas podem formar a
opinião pública. Considero uma tarefa prioritária
divulgar, e não apenas entre acadêmicos, os resultados das pesquisas. Um dos resultados mais
desejados do Paz no Trânsito foi a redução da
velocidade média. Brasília fechou o ano de 1998
com 5,6 mortos por 10 mil veículos. Em janeiro
de 1995, esse mesmo índice era de 11,6 mortos
por 10 mil veículos. Quatro anos de Paz no Trânsito reduziram a mortalidade em 48,3%. A velocidade média da cidade, em 36 meses, baixou de
100
90km/h para 55km/h (AFFONSO, 2000). A preocupação com a velocidade urbana não é gratuita.
A velocidade do veículo é a grande determinante
do risco de morte, particularmente de pedestres.
Tabela 11 – Relação entre a velocidade do veículo
e o risco de morte do pedestre
Velocidade
(em milhas)
20
30
40
Risco de morte do pedestre
Reino Unido50 Austrália51
5%
45%
85%
5%
37%
83%
A preocupação com a velocidade urbana
não é gratuita. O risco cresce como uma função
exponencial da velocidade. A razão é simples:
a Lei de Newton ensina que dobrar a velocidade significa quadruplicar a distância até parar e
também quadruplicar a energia cinética que será
absorvida em uma colisão, seja por um pedestre,
seja por outro veículo. O risco cresce como uma
função exponencial da velocidade do veículo,
tornando-a a grande determinante do risco de
morte, particularmente de pedestres. Dados australianos e britânicos o confirmam.
Os resultados relativos ao Reino Unido –
apresentados em forma de gráfico de barras
– talvez sejam ainda mais impactantes. Na Austrália, país com boa legislação e bons estudos,
uma pesquisa sobre 176 mortes de pedestres
em Adelaide entre 1983 e 1991 revelou que uma
redução de 5km/h na velocidade provocava uma
redução de 30% nas mortes de pedestres. Ainda nessa simulação estatística, a mesma redução
evitaria 10% dos atropelamentos.
Gráfico 28 – Risco de morte do pedestre por velocidade do veículo (%)
85
Pedestre
75
45
50
25
5
0
32km/h
Capítulo 7 – Projeto Paz no Trânsito no Distrito Federal: um modelo possível
48km/h
64km/h
73
74
Capítulo 7 – Projeto Paz no Trânsito no Distrito Federal: um modelo possível
Há centenas de exemplos da influência da
legislação e das políticas públicas sobre as taxas
de mortalidade e de morbidade. Outra pesquisa, na área metropolitana de Zurique, mostrou
que a redução da velocidade máxima de 60 para
50km/h provocou uma redução de 16% nos acidentes com pedestres e de 25% na mortalidade. Não deixa de ser interessante que, também
nesse país, houve resistências de todos os tipos,
inclusive dos que não “acreditam” que a velocidade tenha alguma relação com o impacto e,
através dele, com a mortalidade e a morbidade.
Ironicamente, o autor da pesquisa comenta que
“é preciso demonstrar em todos os países que as
leis de Isaac Newton são válidas” (MCLEAN et alli.,
1994, p. 41).
Os dados posteriores ao período de, aproximadamente, quatro anos, em que o Paz no Trânsito esteve em vigência sugerem algumas linhas
de pensamento:
A generalização. A expressão Paz no Trânsito passou a integrar o vocabulário das políticas
públicas relacionadas ao trânsito. O Ministério
das Cidades o incorporou no Comitê Nacional
de Mobilização pela Saúde, Segurança e Paz no
Trânsito, que é constituído por representantes
de nada menos do que 20 instituições e técnicos
de outras 32. O leitor me perdoe por compartir
minha incredulidade a respeito da eficiência de
comitês compostos de representantes de vários
órgãos públicos. Dificilmente se sai do papel ou
chega à aplicação de medidas inteligentes. Seja
como for, seus objetivos são modestos:
•
Expandir a fiscalização eletrônica de velocidade e avanço de sinal vermelho;
•
Expandir a fiscalização de: alcoolemia, faixa
de pedestre, motocicleta, uso do capacete,
cinto de segurança, celular, transporte de
crianças e ultrapassagem proibida;
•
Padronizar e divulgar as boas práticas através dos órgãos de comunicação social.
•
Metas físicas: redução de 50% do índice de
fatalidade dos acidentes de trânsito na década. No DF, a redução na taxa por 10 mil veículos à metade foi alcançada em quatro anos.
O apoio governamental. O êxito e a popularidade de um programa de redução da violência no trânsito dependem, parcialmente, do
apoio governamental. No primeiro ano da administração Roriz, a taxa de mortalidade por 10 mil
veículos não só parou de cair como experimentou leve subida. O antagonismo daquela administração se revelou na falta de apoio ao Fórum
Permanente pela Paz no Trânsito, que acabou cerrando as portas. Sua importância fora bem entendida pelo governo de Cristovam Buarque.­
Cultura automobilística, cultura
cívica
As nossas primeiras pesquisas empíricas
com dados agregados3 mostravam a situação sui
generis do DF: as unidades da federação com renda per capita mais alta tinham taxas mais baixas
de mortalidade e de morbidade por dez mil veículos; os municípios das capitais e das grandes
cidades tinham taxas mais baixas do que as cidades menores e os municípios rurais; finalmente,
as 12 taxas mais altas eram de estados do nordeste e do norte. O Distrito Federal, com a renda per
capita mais alta do país, deveria ter a taxa mais
baixa, mas estava pela média das unidades federadas. Considerando a renda, era um outlier. Eram
necessárias políticas públicas específicas para o
DF, com pesquisas originais para informá-las.
A pesquisa sobre as mortes nos ônibus, simples e baseada em voluntários, deu resultados: a
maioria dos casos de morte e de morbidade de
nível hospital acontecia na subida ou na saída do
veículo. Os motoristas e trocadores concordaram
que não havia sistema de comunicação para avisar que as portas poderiam ser fechadas. Uns trocadores batiam com moedas na parte metálica,
outros com a mão etc. E motoristas e trocadores
não eram equipes permanentes. Vários motoristas
sugeriram a colocação de um gato, um espelho
grande externo. Apenas um tomou a iniciativa de
propor um sistema, simples, através do qual a marcha não engatava se as portas estivessem abertas.
O sistema foi imediatamente adotado pelos ônibus do GDF. Não obstante, a despeito do
baixo custo (trezentos reais), nenhum ônibus de
empresa privada o instalou. Dois anos após, o secretário de Transportes me chamou para mostrar­
um gráfico das mortes nos ônibus do GDF: tinham sido zeradas. Nenhuma morte. Infelizmente, a mortalidade e a morbidade continuaram nas
famigeradas empresas do setor privado daquele
setor. A mídia deu boa cobertura à campanha da
segurança nos ônibus.
Brasília fechou o ano de 1998 com 5,6 mortos por dez mil veículos. Em janeiro de 1995, esse
mesmo índice era de 11,6 mortos por dez mil veículos. Quatro anos de Paz no Trânsito reduziram
a mortalidade em 48,3%. A velocidade média
da cidade, em 36 meses, baixou de 90km/h para
55km/h (AFFONSO, 2000).
Algumas lições
Governos contam, políticas públicas contam. Bons governos salvam vidas. O conhecimento, derivado do estudo das experiências
em outros lugares e tempos, assim como das
pesquisas feitas com o objetivo de informar políticas públicas inteligentes, é a contribuição que
pesquisadores podem fazer para salvar a vida de
muitos compatriotas.
A cidadania brasileira foi, e continua sendo,
tutelada pelo Estado. Não é participante, ativa,
muito menos proativa. Milhões morrem inermes,
sem ação, sem se organizarem, esperando que
um governo solucione os problemas. Contraditoriamente, os brasileiros não acreditam que os
políticos levam os interesses da gente comum
em consideração: somente 5% estão “muito de
Capítulo 7 – Projeto Paz no Trânsito no Distrito Federal: um modelo possível
acordo” com esta afirmação. Raramente tomam
a iniciativa. Talvez não tomem iniciativas políticas porque se sentem inadequados. Em um país
com grande deficit educacional e deficit analítico
ainda maior, poucos se sentem competentes para
entender os meandros das decisões políticas, que
afetam a vida de todos. Está acima deles.
A mesma pesquisa revela que somente 5%
têm certeza de que entendem bem os assuntos
políticos. E, se o governo não for competente ou
for corrupto, muitos morrerão sem esboçar uma
ação. Não obstante, problemas como os da violência no trânsito não podem esperar que um
governo honesto e competente seja eleito, e que
o Estado supere tanto as sabotagens entre suas
subdivisões quanto a sua própria inércia. A cidadania precisa se informar, se mobilizar e agir. No
Distrito Federal, a grande vitória foi da cidadania,
que criou um movimento e uma parceria com
um governo do bem, aberto à inovação. E muitas,
muitas, vidas humanas foram salvas.
Reportagens consultadas
“Anjos no asfalto: atores com auréola e vestidos
de branco surpreendem motoristas de Brasília
ao sair às ruas para pedir paz no trânsito” Em Correio Braziliense, Caderno Cidades, de 22/10/1996.
“Mães se tornam anjos do trânsito: Marilza e Rita
resolvem exercer o papel de guardas de trânsito
e ajudar a travessia dos estudantes em frente ao
colégio dos filhos, na 908 Sul”. Idem, 01/11/1996.
No mesmo número, foi notificada a maior participação da cidadania, cuja eficiência pode ser
demonstrada estatisticamente: “utilização de
voluntários dirigindo carros disfarçados com
agentes do Detran a bordo aumenta a média de
multas diárias em 3%”.
“Anjos e crianças educam motoristas: eles estão
soltos e pedem aos alunos das escolas públicas
e particulares que vigiem e controlem os pais no
trânsito” Publicada no dia 6/11/1996.
Crianças de Planaltina saem às ruas: eles percorrem as avenidas da cidade para protestar contra
os abusos dos motoristas. Correio Braziliense, em
28/09/1996.
75
76
Capítulo 7 – Projeto Paz no Trânsito no Distrito Federal: um modelo possível
Notas
1
Consultor que colaborou no desenvolvimento da pesquisa.
Parlamentar que, posteriormente, tornar-se-ia o primeiro
senador cassado da Nova República.
2
Para uma análise adequada, precisávamos dos microdados que se encontravam, no DF, em órgão equivalente ao
Instituto Médico Legal. Evidentemente, como manda a ética científica, a base de dados seria organizada de maneira
a impedir a identificação de qualquer indivíduo. Porém, a
médica que dirigia essa seção apropriou-se dos dados e só
os cedia (ou não) conforme a sua vontade. Além disso, usou
os mesmos dados que me negava em apresentações em
convenções médicas na área de Epidemiologia. A cessão arbitrária pela privatização dos dados sobre mortes violentas
no DF causou um atraso considerável nas nossas pesquisas.
3
Nota: As informações contidas neste capítulo são de
inteira responsabilidade dos autores.
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“institui o Código de Trânsito Brasileiro”, e a Lei nº 9.294, de 15 de julho de 1996, que dispõe sobre as
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Prefeitura da Cidade do Rio de Janeiro
Secretaria Municipal de Saúde
Subsecretaria de Atenção Primária, Vigilância e Promoção da Saúde
Superintendência de Promoção da Saúde
Rua Afonso Cavalcanti, nº 455 / bloco I / 8º andar / sala 807 – Cidade Nova
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