Posse de Armas de Fogo no Brasil: Mapeamento das
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Posse de Armas de Fogo no Brasil: Mapeamento das
Posse de Armas de Fogo no Brasil: Mapeamento das armas e seus proprietários 1 PABLO DREYFUS E MARCELO DE SOUSA NASCIMENTO 1. Introdução: Objetivos, obstáculos, metodologia e fontes Se a violência armada no Brasil é vista como uma epidemia, tendo as armas de fogo como seu vetor de transmissão, é muito importante compreender a distribuição deste vetor (por exemplo, a posse de armas) pelo território brasileiro. Compreender onde estão as armas de fogo, quem as possui e que tipo de armas são, é crucial para entender a força da relação entre a violência e a disponibilidade de armas de fogo. Simplesmente contar o número de armas não é suficiente: as armas variam em termos de alcance efetivo, poder de fogo e cadência de tiro. Apesar de todas as armas de fogo serem letais, a magnitude dos estragos que podem provocar e disseminar está relacionada ao tipo de arma predominante e ao ambiente geográfico e socioeconômico aonde estão distribuídas. Por exemplo, uma área rural pouco habitada, com uma alta concentração de espingardas de tiro único e revólveres, muito provavelmente terá problemas diferentes relacionados a armas de fogo do que uma área densamente povoada de uma megalópole com uma alta concentração de pistolas semi-automáticas e armas de fogo de tipo militar em circuitos criminosos e/ou informais. Daí porque durante esta pesquisa enfatizamos a coleta e análise de dados sobre o tipo de arma predominante em cada estado do Brasil, bem como a distribuição rural / metropolitana destas armas. Isto foi feito através de uma combinação de entrevistas e coleta de dados quantitativos sobre armas de fogo registradas, apreendidas, vendidas, colecionadas ou destruídas. Como no caso de produção e comércio de fábricas de armas de pequeno porte e armas de fogo, a pesquisa sobre a posse é complicada devido aos obstáculos relacionados a fontes de dados incompletos, de baixa qualidade, ou confidenciais. A descentralização endêmica e histórica dos dados dos governos estaduais e federal 1 126 Para os fins deste trabalho “arma de fogo” será considerado sinônimo de “arma de pequeno porte” Brasil: as armas e as vítimas contribuiu para a sub-notificação de dados das autoridades estaduais para as federais, tornando a pesquisa sobre a propriedade de armas ainda mais difícil. Em um país em desenvolvimento do tamanho do Brasil, reunir os dados foi como lenta e pacientemente montar um quebra-cabeças. Os autores gostariam de agradecer especialmente a colaboração de Luiz Carlos Carvalho Silveira, investigador aposentado da Polícia Civil do Estado do Rio de Janeiro, atualmente trabalhando para o Viva Rio, que passou seis meses visitando as capitais de 25 estados brasileiros, coletando informações quantitativas e qualitativas sobre a posse legal e ilícita de armas de fogo. Também gostaríamos de agradecer a ajuda na pesquisa de Julio César Purcena, Pesquisador Assistente do Projeto de Controle de Armas de fogo do Viva Rio/ISER. Gostaríamos de expressar nossa gratidão aos seguintes funcionários estaduais e federais que colaboraram com entrevistas e dados estatísticos durante nossa pesquisa de campo: Delegado Ilzomar Pontes, Chefe da Polícia Civil do Estado do Acre; Sr. Nonato Sousa, Assessor de comunicação da Secretaria de Segurança Pública do Estado do Acre; Delegado Egivaldo de Farias, Chefe do Setor de Estatística da Polícia Civil do Estado de Alagoas; Sr. Adailson Calheiros, Assessor de imprensa da Secretaria de Segurança Pública do Estado de Alagoas; Delegada Sandra Dantas, Chefe da Polícia Civil do Estado do Amapá; Sr. Sérgio Bringel, Assessor de imprensa da Secretaria de Segurança Pública do Estado de Amapá; Sr. A.P.C. Marques, Chefe do Setor de Armas de Fogo da Polícia Civil do Estado de Amapá; Delegado Luiz Fernando do Nascimento, Chefe do Departamento de Ordem Pública e Social (DEOPS) da Polícia Civil do Estado de Amazonas; Dr. Edilamar Calazans, Chefe de Gabinete da Polícia Civil do Estado de Bahia; Dra. Iracema Silva de Jesus, Chefe do Setor de Estatísticas da Secretaria de Segurança Pública do Estado de Bahia; Delegado João Carlos Passos, Chefe da Divisão de Armas de Fogo, Munição e Explosivos (DAME) da Polícia Civil do Distrito Federal; Major (Polícia Militar) Carlos Alberto Teixeira Pinto, Secretaria de Segurança Pública do Distrito Federal; Delegado Luiz Carlos Dantas, Chefe da Superintendência da Polícia Civil do Estado de Ceará; Inspetor Nodege F. De Carvalho Nogueira, Chefe do Setor de Armas de Fogo da Polícia Civil do Estado de Ceará; Delegada Celma Couto, Chefe da Polícia Civil do Estado do Espírito Santo; Setor de Armas de Fogo da Polícia Civil do Estado de Espírito Santo; Delegado Humberto Jesus Teixeira, Gabinete do Chefe de Polícia do Estado de Goiás; Sr. Medrado, Polícia Civil do Estado de Goiás; Dr. Raimundo Cutrin, Secretário de Segurança Pública do Estado do Maranhão; Delegado Nordman, Polícia Civil do Estado do Maranhão; Delegado Robson, Polícia Civil do Estado do Maranhão; Delegado Victor Posse de Armas de Fogo no Brasil: Mapeamento das armas e seus proprietários 127 Sebastião Gonçalves, Diretor Geral da Polícia Civil do Estado do Mato Grosso; Sra. Nilzete, Assistente do Diretor da Polícia Civil do Estado do Mato Grosso; Delegado Marcelo Vargas, da Polícia Civil do Estado do Mato Grosso do Sul; Delegado Marcos Silva, Chefe da Divisão de Armas de Fogo, Munição e Explosivos (DAME) da Polícia Civil do Estado de Minas Gerais; Sra. Márcia Cristina Alves, Superintendente de Prevenção ao Crime da Secretaria de Defesa do Estado de Minas Gerais; Delegado Luiz Paschoal de Alcântara Neto, da Polícia Civil do Estado do Pará; Sra. Graça Mendes, Chefe de Estatística da Secretaria de Segurança Pública do Estado do Pará; Delegado Geraldo Veloso, Chefe da Divisão de Armas de Fogo e Explosivos (DAME) da Polícia Civil da Paraíba; Secretaria de Segurança Pública do Estado de Paraná; Sr. João Braga, Secretário de Defesa Social do Estado de Pernambuco; Deputado Federal Raul Jungman (Pernambuco); Deputado Estadual Herbert Gomes (Pernambuco); Dr. Djalma Raposo, Gerente de Análise Criminal e Estatística Secretaria de Defesa Social do Estado de Pernambuco; Delegado Emir Maia,Chefe da DAME do Estado do Piauí; Delegada Suerda, da Polícia Civil do Estado de Rio Grande do Norte; Delegado Joldeci, Chefe da DAME do Estado do Rio Grande do Norte; Delegado Artistóteles Bridi, Chefe da DAME da Polícia Civil do Estado de Rio Grande do Sul; Delegado Deraldo Escatolon, da Polícia Civil do Estado de Rondônia; Delegado Arilton Zanelatto, Chefe da DAME da Polícia Civil do Estado de Santa Catarina; Delegado Roberto de Mello Aníbal, Chefe da DAME da Polícia Civil do Estado de São Paulo; Major (Polícia Militar), Álvaro Batista Camilo, Secretaria de Segurança Pública do Estado de São Paulo; Dr. Túlio Kahn, Secretaria de Segurança Pública do Estado de São Paulo; Superintendência da Polícia Civil do Estado de Tocantins; Equipe da Divisão de Controle de Armas de Fogo e Explosivos (DFAE) da Polícia Civil do Estado de Rio de Janeiro; Coronel (Polícia Militar do Rio de Janeiro), Ângelo Ubiratan; Delegado Walter Barros, Delegacia Legal, Polícia Civil do Estado do Rio de Janeiro; Delegado Dr. Paulo Fernando da Costa Lacerda, Diretor Geral do Departamento de Polícia Federal; Delegado Fernando Oliveira Segovia, Chefe do SINARM, Departamento da Polícia Federal; Delegada Silvana Helena Vieira Borges, Coordenador Geral do Gabinete de Coordenação da Segurança Privada do Departamento da Polícia Federal; General de Brigada José Rosalvo Leitão de Almeida, Chefe da Diretoria da Produtos Controlados (DFPC) do Exército Brasileiro; Tenente Coronel Jorge Toledo Freitas, DFPC, Exército Brasileiro; Tenente Coronel Paulo Mendes, Gabinete do Comando do Exército; Agente Especial Marques, Rio de Janeiro escritório do SINARM, Polícia Federal. Também agradecemos a todas as pessoas que entrevistamos e consultamos e que, por razões metodológicas ou de confidencialidade, não estão mencionadas aqui. 128 Brasil: as armas e as vítimas 1.2 Obstáculos Entre os principais obstáculos encontrados estão: • Sub-notificação das estatísticas sobre armas de fogo das Secretarias Estaduais de Segurança Pública para o banco de dados central da Polícia Federal • No nível estadual, há freqüentemente uma falta de estatísticas exatas e digitalizadas sobre armas de fogo registradas e apreendidas • Para muitos estados brasileiros: falta de registros precisos sobre armas de fogo registradas e apreendidas • Falta de comunicação entre as autoridades federais e locais para a coleta e análise de dados • Confidencialidade e dificuldade de acesso a algumas estatísticas militares Historicamente nunca houve um controle eficiente de armas de fogo no Brasil. Como vimos no capítulo sobre legislação, a primeira legislação nacional sobre armas de fogo foi criada em 1934 (regulamentada em 1936). Apesar de haver organizado e regulado a produção e o comércio exterior de armas de fogo, o decreto não tratou diretamente da venda doméstica de armas de fogo e de seu registro. Apenas estabelecia diretrizes vagas para que o Ministério do Exército tratasse com as autoridades estaduais sobre questões de registro. A compra e o uso de armas de fogo por civis permaneceram sem regulamentação até 1980, quando o Ministério do Exército criou uma portaria que estabelecia o número e tipo de armamento que civis acima dos 20 anos poderiam comprar e também o registro obrigatório destas armas. O registro de armas de fogo, entretanto, deveria ser feito com a Polícia Civil de cada Estado, sem que houvesse uma instituição nacional encarregada de centralizar os dados referentes às armas de fogo e seus proprietários. Mesmo assim foi um avanço dado que anteriormente o registro de armas era opcional. Esta situação, acrescida da histórica falta de cooperação policial horizontal (de estado com estado) e vertical (estado com o governo federal), tornaria impossível acompanhar o movimento de armas de fogo importadas e produzidas. Apenas em 1997, com a lei do SINARM, foi criado o Sistema Nacional de Controle de Armas e introduzida a exigência legal de registro de todas as armas de propriedade particular. De acordo com esta lei, para comprar uma arma de pequeno porte, o indivíduo devia primeiro obter uma autorização para registro que é dada pelo SINARM, administrado pela Polícia Federal (o Brasil é uma República Federativa, dividida em 26 estados além do Distrito Federal). As autoridades locais (normalmente a polícia civil – investigativa) recebiam o pedido, enviavam para o SINARM em Brasília, e depois da ficha criminal ter sido verificada e ter Posse de Armas de Fogo no Brasil: Mapeamento das armas e seus proprietários 129 sido dada a autorização do SINARM, as autoridades locais emitiam a autorização para registro e então a arma era registrada. Este registro apenas autorizava a pessoa a possuir a arma em casa; não era uma permissão para porte de arma, para a qual outros procedimentos deviam ser encaminhados pelas autoridades estaduais (para posse nos limites estaduais) e pela Polícia Federal para o porte em todo o território nacional. De acordo com a lei, o SINARM devia centralizar e atualizar o banco de dados nacional de todas as armas de fogo registradas e apreendidas no país. Cada estado deveria periodicamente atualizar esta informação. No entanto, o processo de digitalizar os registros locais e conectá-los ao SINARM através de uma interface computadorizada foi mais do que lenta. A sub-notificação de dados a respeito tanto de armas registradas quanto apreendidas estava na ordem do dia e, entre 1997 e 2003 (quando foi aprovada a nova lei federalizando e centralizando o controle) o SINARM ainda estava incompleto e sujeito a notificações esparsas e inconsistentes. Isto devido a deficiências técnicas tais como, por exemplo, a falta de pessoal treinado e equipamento para digitalização eficiente dos dados (comum em estados mais pobres e com poucos recursos) mas também devido a rivalidades políticas entre autoridades locais e federais e à competição entre as burocracias das agências de polícia estaduais e federais. Para superar estes obstáculos decidimos fazer uma pesquisa de campo (completada com entrevistas por telefone) para a coleta de dados em 25 estados da Federação. Descobrimos que estados com controle de armas eficiente e bases de dados sofisticadas como o Rio Grande do Sul, frequentemente sub-notificavam seus dados, talvez devido a casos de rivalidade institucional. Em São Paulo, o estado mais rico, desenvolvido e populoso da Federação, a Polícia Federal sub-contratou uma empresa privada para digitalização de todos os dados relativos ao registro de armas de fogo. Este é o único estado no qual os registros locais estão de acordo com os dados do SINARM. No entanto, o atraso nos pagamentos do Governo Federal levou a empresa a parar a digitalização dos dados e as autoridades locais estimam que aproximadamente 200.000 armas podem ter ficado fora do sistema. Entre 1997 e 2000 o pessoal do SINARM abriu escritórios locais em cada estado da Federação e instalou computadores para o controle de armas pelas polícias locais. Os estados tendem a ter problemas mais sérios em relação aos dados de acordo com o seu nível de subdesenvolvimento e falta de infra-estrutura ou, simplesmente, devido à falta de coordenação entre o escritório central na capital do estado e as polícias locais nas áreas rurais e cidades médias. Em muitos estados, as armas de fogo podem ser registradas em formulários de papel na delegacia local e estes dados são enviados aleatoriamente, com atraso, para as centrais metropolita130 Brasil: as armas e as vítimas nas. Esta mesma dinâmica de atrasos e notificação aleatória era freqüentemente replicada quando os estado se reportavam ao escritório nacional, em Brasília.2 Outro obstáculo foram as diferenças nos períodos de tempo cobertos pela coleta de dados. Com poucas exceções (tais como o Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, São Paulo, Bahia, Santa Catarina, Distrito Federal, Amazonas, Pará e Paraná) as informações disponibilizadas pelos estados não cobriam todo o período entre o ano no qual o registro foi iniciado até 2004. A maioria dos estados forneceu informações do início dos anos 80 em diante ( quando o registro obrigatório foi regulamentado pelo Exército) ou de 1997 em diante, quando a Polícia Federal começou a prover a infra-estrutura para a digitalização dos dados e se tornou obrigatório reportar registros e apreensões de armas de fogo ao SINARM. Como resultado, temos um vácuo relativo aos dados sobre armas registradas em períodos que vão de 20 a 50 anos. A principal razão para esta sub-notificação é que os dados dos anos anteriores ainda estão em arquivos em papel e desorganizados, os quais em muitos casos foram danificados pelo passar do tempo.3 Mas as armas permanecem. Armas de fogo compradas nos anos 50, 60 e 70 podem estar em perfeitas condições de uso atualmente. Por exemplo, 85% dos revólveres Taurus ( o tipo mais comum de arma de pequeno porte tanto registrada quanto apreendida) recolhidos pelos postos de coleta do Viva Rio durante a campanha de entrega voluntária de armas de agosto a dezembro de 2004, foram manufaturados antes de 19814. Cerca de 90% das armas estavam funcionando e mais de 60% das pessoas que as entregaram tinham mais de 50 anos, indicando que a maioria das armas havia sido comprada antes de 1980 e certamente antes de 1997.5 A isto devemos acrescentar o fato de que a campanha de registro criada pela lei do SINARM de 1997 foi extremamente ineficiente devido à má coordenação entre as autoridades federais e estaduais e à falta de uma campanha consistente da mídia. 2 Entrevista com Luiz Carlos Carvalho Silveira, pesquisador de campo que coletou dados em 25 estados brasileiros. 3 Ibid. 4 Estas armas tinham números de série apenas com números, sem letras. A partir de 1981, a Taurus começou a usar combinações alfanuméricas em seus revólveres. Sobre isto ver: Toccchetto, Domingos (2003), Balística Forense: Aspectos Técnicos e Jurídicos (3rd edition), Campinas, Millenium Editora, pp.99-113 5 Foram recolhidas 5.870 armas (60% das quais revólveres) nos postos de coleta do Viva Rio, das quais 1.327 eram revólveres Taurus. Para mais informações ver:Gustavo Goulart/Dimmi Amora (2004). “Pesquisa do Viva Rio mostra que 62% dos que aderiram a campanha têm mais de 50”, O Globo, Outubro 19, p.16 Posse de Armas de Fogo no Brasil: Mapeamento das armas e seus proprietários 131 Além disso, voltando novamente ao caso do Rio de Janeiro, mais de 25% das armas de fogo apreendidas pela polícia entre 1951 e 2003 tinham registro prévio. Isto sugere um desvio de armas legais para o mercado ilegal (através de vendas irregulares ou furto). Daí a importância de manter os dados digitalizados atualizados, o que permitiria rastrear armas registradas caso sejam utilizadas para cometer crimes ou desviadas para circuitos ilegais. A tabela abaixo ilustra o alto nível de sub-notificação dos estados para o SINARM. Ela compara os números de armas de fogo registradas por entidades privadas legais e indivíduos no SINARM com as informações dadas pelas polícias estaduais a pesquisa de campo. Também informa o período coberto pela informação coletada durante a pesquisa de campo, bem como o ano no qual o registro começou em cada estado, de acordo com a fonte entrevistada. As sub-notificações estão marcadas em cinza, ou seja, casos nos quais o número de armas registrado no SINARM é mais baixo do que o número de armas notificadas pelos estados em nossa pesquisa de campo. Em outros estados o desencontro de dados é devido aos menores períodos de tempo compreendidos pela informação (geralmente 1995 – 2003). São Paulo é o único caso no qual as informações do estado combinam com os dados do SINARM. À crônica falta de comunicação eficiente e de cooperação entre os estados e o Governo Federal, devemos acrescentar a falta de cooperação histórica entre as instituições federais que monitoram o suprimento de armas e munição (manufatura, vendas, importação e exportação) e a demanda (compra, porte, uso e registro). O Exército ( que não tem poder nem deveres de polícia ) controla a produção; vendas por fabricantes à comerciantes e exportadores; importação, exportação e vendas diretas da fábrica às Forças Armadas, forças policiais, oficiais de polícias, militares enquanto usuários privados e colecionadores de armas. O Exército também sistematiza e centraliza informações sobre estas atividades. Por outro lado, a Polícia Federal (sob o Ministério da Justiça), como vimos através do SINARM, centraliza as informações sobre armas registradas por cidadãos, bem como as informações sobre armas apreendidas. Até 1997 não havia comunicação entre as agências. A lei do SINARM de 1997 estabeleceu que os Ministérios da Justiça e da Defesa deveria estabelecer um protocolo entre as agências para a troca de informações relativas a armas de fogo. Este protocolo nunca foi estabelecido e na prática não havia troca de informações. De acordo com a lei do SINARM, fabricantes e importadores deveriam remeter à Polícia Federal a lista de armas de fogo vendidas ou compradas com a identificação do comprador. Mas a informação não foi provida em tempo real 132 Brasil: as armas e as vítimas Tabela 1. Sub-notificação de dados sobre armas registradas: * Fonte: Departamento da Polícia Federal, SINARM, 2003 e Departamentos de Controle de Armas de Fogo das Polícias Civis estaduais * O primeiro registro de arma de fogo no antigo Distrito Federal (Rio de Janeiro) consta de 1937. Porém, segundo fontes consultadas da Policia Civil (DFAE), os registros de 1937-1951 estão ilegíveis, não foram digitados e são pouco representativos no total das armas registradas. (era enviada aleatoriamente em disquetes) e o SINARM não era alimentado de forma consistente.6 O software e a estrutura do SINARM foram criados em 1997 para funcionarem como no diagrama 1 mostrado abaixo. O sistema pode rastrear o “ciclo de vida das armas” desde que elas saem da fábrica ou são importadas até serem tiradas de circulação ou destruídas. O sistema deveria ser capaz de rastrear as transferências de propriedade e cruzar informações sobre armas fabricadas, comercializadas, registradas e apreendidas. A falta de notificação completa e consistente, porém impede que funcione com eficiência. O resultado prático resultante desta falta de cooperação é que a informação sobre as rotas de comercialização das armas produzidas ou importadas não é comparada com os dados sobre registro e apreensão de armas. Dada esta situação, é praticamente impossível traçar padrões para as rotas usadas para desviar armas e 6 Entrevistas com funcionários do SINARM Posse de Armas de Fogo no Brasil: Mapeamento das armas e seus proprietários 133 Diagrama 1. SINARM ideal (1997) para o tráfico ilegal, bem como para detectar irregularidades nas vendas de armas que permitem o estabelecimento de “mercados cinza”. As forças policiais e, particularmente, a Polícia Federal, ficam impossibilitadas de combater o tráfico ilegal de armas de fogo. Também ficam prejudicadas para determinar o volume, tipo e números de série das armas e munições que são exportadas para países que representam um risco potencial de triangulação como o Paraguai e o Suriname, por exemplo. Estes obstáculos impedem que pesquisadores dispunham de uma fonte centralizada de informações confiáveis, o que nos levou a buscar informações em diferentes agências federais e estaduais. Devido às mudanças introduzidas pelo Estatuto do Desarmamento, tais como a federalização dos registros e interligação obrigatória das bases de dados do Exército e da Polícia Federal, espera-se que o fluxo e a centralização das informações melhorem nos próximos anos. Os resultados, no entanto, não estavam visíveis ao final desta pesquisa, já que a lei entrou plenamente em vigor desde julho de 2004, quando foi regulamentada. Outro obstáculo previsível foi a confidencialidade e a falta de acesso a certas estatísticas. Não foi possível, por exemplo, obter acesso às estatísticas de armas apreendidas da base de dados da Polícia Federal (que mesmo assim foram extremamente acessíveis com os dados relativos a armas de fogo registradas e empresas 134 Brasil: as armas e as vítimas de segurança particular). Com base em entrevistas com policiais locais e federais arriscamos aqui supor que o nível de sub-notificação nos estados é muito alto. Outro desafio chave para a pesquisa foi a obtenção de dados da DFPC – Diretoria de Fiscalização de Produtos Controlados do Exército. Esta agência tem os dados-chave relativos à produção de armas, venda, (incluindo informações sobre lojas de armas) exportação, importação, registros da posse privada de armas de fogo restritas (normalmente de propriedade de militares, policiais, atiradores e colecionadores) bem como informações sobre inventários e estoques das Forças Armadas e da polícia. Depois de um longo processo de construção de confiança e sob um protocolo de confidencialidade, o Exército permitiu ao Viva Rio ter acesso ao Anuário Estatístico do Exército (ANEEX) que tem estatísticas sobre a produção e venda de armas de fogo (uso permitido) bem como sobre quantidade de colecionadores, caçadores e atiradores profissionais (CAC). As informações sobre a produção e vendas de armas de fogo e munição permitidas vai de 1967 até 2003. Por outro lado, as informações sobre a venda de armas de fogo restritas (a órgãos policiais) só estão disponíveis a partir de 2000. Os dados relativos aos CAC e a lojas de armas estão disponíveis a partir de 1997. No entanto, não foi possível obter dados relativos aos estoques e propriedades das Forças Armadas e policiais, bem como sobre as de propriedade privada de oficiais militares, policiais e sargentos (que são registrados no Sistema de Gerenciamento Militar de Armas – SIGMA – do DFPC). Como na maioria dos países latino-americanos, estes dados são considerados altamente confidenciais. Neste caso, tivemos que aplicar um multiplicador baseado em fontes secundárias e entrevistas. Um obstáculo menor que enfrentamos com as informações do ANEEX foi que os dados são apresentados e distribuídos não por estados, mas por regiões militares (RM) do Exército Brasileiro (equivalentes a Divisões do Exército). Cada RM abrange diversos estados. Por sorte há regiões com apenas um ou dois estados, para estados muito importantes (em termos de renda, população e/ou problemas relacionados a armas de fogo e/ou disponibilidade). Este é o caso de São Paulo (2ª Região Militar), Minas Gerais (4ª Região Militar), Rio Grande do Sul (3ª Região Militar), Rio de Janeiro / Espírito Santo (1ª região Militar), Santa Catarina / Paraná (5ª Região Militar) e Mato Grosso / Mato Grosso do Sul (9ª Região Militar). Para comparar os dados com a estrutura política da Federação (estados), os dados do ANEEX relativos às propriedades de CAC foram distribuídos de acordo com a proporção de armas de fogo legalmente registradas por civis em cada estado. Membros CAC, por outro lado, foram distribuídos de acordo com a proporção da população de cada estado. Mapas do Brasil e das Regiões Militares do Posse de Armas de Fogo no Brasil: Mapeamento das armas e seus proprietários 135 Exército Brasileiro são mostrados abaixo. Fábricas de armas de pequeno porte e armas de fogo estão representadas por cruzes brancas circuladas. A próxima seção explicará a metodologia utilizada para superar os obstáculos enumerados acima. Mapa 1. Regiões Militares Brasileiras Fonte: ANEEX diversos números 136 Brasil: as armas e as vítimas Mapa 2. Brasil (divisão política). Fonte: GuiaNet. O Guia do Brasil. Mapa Político do Brasil. www.guianet.com.br/brasil/mapapolitico.htm. 1.3 Metodologia 1.3.1 Contando armas: como elas estão distribuídas no Brasil e quem as possui Antes de explicar como estimamos a quantidade de armas, vale a pena explicar o que estamos medindo. Até aqui, já sabemos que o Brasil é afetado por uma epidemia de violência cujo grupo de risco são homens jovens entre 15 e 29 anos, com o ensino fundamental incompleto. Também sabemos que a violência se concentra nos grandes centros urbanos e que os vetores da violência são as armas de fogo. O Brasil é o segundo maior produtor de armas de fogo do continente americano e a produção de armas de fogo prosperou na mesma década na qual a violência começou a aumentar. Finalmente, também sabemos que devido a uma série de fatores descritos acima, o controle de armas de fogo é cronicamente ineficiente. Posse de Armas de Fogo no Brasil: Mapeamento das armas e seus proprietários 137 No capítulo da Dra. Phebo, tanto a violência quanto suas vítimas foram mapeadas. Precisamos então mapear o vetor desta epidemia. Sabendo onde estão as armas de fogo e quem as possui nos permitirá avaliar seu peso entre os demais fatores de risco para a violência urbana. Por onde começar? Por um lado existem, é claro, as armas do Estado as quais, em princípio, não deveriam ser parte do problema. Por outro lado, temos a posse privada. Estas armas estão nas mãos de cidadãos honestos e de criminosos. No entanto, a realidade não é tão simples. Em um país no qual o registro de armas de fogo só foi regulado sistematicamente em nível nacional em 1997, devemos assumir que existe um grande mercado informal. Ou seja, as armas de fogo que, apesar de não necessariamente estarem nas mãos de criminosos, estão em situação ilícita, ou seja, não estão declaradas ou controladas pelo estado e portanto são mais suscetíveis de serem desviadas para o mercado criminoso. O cenário fica ainda mais complicado se considerarmos que há certas “castas armadas” tais como os colecionadores (que podem ter armas de tipo militar tais como fuzis e submetralhadoras em casa), atiradores, caçadores, policiais e militares, que têm privilégios para comprar armas de fogo e não são diretamente monitorados pela polícia. A isto precisamos finalmente adicionar a crescente indústria da segurança particular, que como será mostrado aqui, tem o dobro de efetivos que os órgãos de segurança pública. O universo de nosso estudo está resumido no diagrama 2. O estado, representado pelas Forças Armadas e pela polícia, com seus estoques, e as armas de propriedade privada que estão divididas em dois principais grupos: posse legal e posse ilícita. Este último grupo está dividido entre posse informal (não declarada) e posse criminosa. Vamos começar pela posse privada e, mais especificamente, pelas armas civis registradas (indivíduos e entidades legais). Este é exatamente o tipo de posse de arma que supostamente deveria estar registrado no SINARM. Para estimar estas posses nós cruzamos as seguintes informações: • Dados do SINARM (totais 1997 – 2003) de armas de fogo registradas por civis e entidades legais privadas • Dados (quantidade e ano) sobre armas de fogo registradas (por civis e entidades legais privadas) recolhidas nas secretarias de segurança pública de cada estado brasileiro. Devido à relação de cooperação do Viva Rio com o Governo do Rio de Janeiro, tivemos acesso à base de dados da Divisão de Controle de Armas de Fogo e Explosivos da Polícia Civil do Rio de Janeiro (DFAE), que contém informações 138 Brasil: as armas e as vítimas Diagrama 2. Universo de Estudo: grupos de entidades e pessoas proprietárias de armas sobre número de série, marca, calibre e tipo de arma. Para os demais estados, através de uma combinação de dados quantitativos e qualitativos (entrevistas), em alguns casos conseguimos informações sobre o tipo e calibre de armas registradas e também sobre a distribuição rural/metropolitana dos registros de armas de fogo. Uma cópia dos protocolos usados para as entrevistas está incluída anexo a este trabalho. Apenas em alguns casos os estados providenciaram os dados de registro por ano; na maioria dos casos nos forneceram os totais para um determinado período de tempo. Vejamos então como a posse de armas foi estimada sobre um grupo de proprietários e então distribuída entre os municípios das 27 unidades (estados + Distrito Federal) da federação. Posse Privada (armas que não pertencem ao Estado) a) Civis (indivíduos civis e entidades legais tais como empresas de segurança privada e empresas com departamento de segurança): Posse de Armas de Fogo no Brasil: Mapeamento das armas e seus proprietários 139 De acordo com a lei de 1997 que criou o SINARM, dados sobre este grupo eram primeiro registrados pela polícia local e depois repassados ao SINARM. No entanto, vimos que existem sérios problemas de sub-notificação. Para superar este obstáculo, os dados foram divididos em três grupos de acordo com a qualidade provida por cada governo estadual durante nossa pesquisa de campo: Melhor Cenário; Segundo Melhor Cenário e Ausência de Dados. • Melhor Cenário: Estes são os dados tomados como parâmetro para as estimativas. Dez estados providenciaram informações integrais (número de armas registradas, ano de criação do registro de armas e período coberto pela informação). Estes estados são: Amazonas, Distrito Federal, Goiás, Pará, Paraná, Pernambuco, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, Santa Catarina, São Paulo e Tocantins. A informação provida pelos estados foi mantida intacta. • Segundo Melhor Cenário: Esta informação se refere aos estados que providenciaram informações que ou cobria períodos muito curtos de tempo ou períodos muito recentes. Estes estados são: Acre, Alagoas, Amapá, Bahia, Ceará, Espírito Santo, Minas Gerais, Mato Grosso do Sul, Mato Grosso, Rio Grande do Norte, Rondônia e Sergipe. Para estes estados nós consideramos 1980 (ano no qual a primeira regulamentação nacional referente ao registro obrigatório entrou em vigor) como ano base. Com a informação do período de tempo, calculamos a média anual do número de armas de fogo registradas em cada estado. Com este número estimamos qual seria o número total de armas de fogo registradas desde que o registro de armas do estado foi criado, ou desde 1980 nos casos nos quais esta informação não foi fornecida: Armas registradas = = m registro estadual anual * número de anos desde que o registro foi iniciado • Ausência de Dados: Esta informação se refere aos estados que não forneceram informações durante a pesquisa. São estes: Maranhão, Paraíba, Piauí e Roraima. Neste caso aplicamos um multiplicador refletindo a média de sub-notificação encontrada nos “Estados com Melhor Cenário”. O multiplicador resultante foi 2.52. Este multiplicador 2.52 foi aplicado aos dados do SINARM. Ou seja: Armas registradas = SINARM*2.52 O resultado estimado utilizando os critérios acima foi 5.568.621 armas de fogo civis registradas no Brasil 140 Brasil: as armas e as vítimas b) Registros de Armas de fogo na posse de oficiais e sargentos das forças armadas na ativa e reformados para uso privado: Serviço ativo: Consideramos aqui o uso pessoal de armas por todos oficiais e sargentos, ou seja, 41.3% da força total.7 Cada oficial ou sargento tem o direito de comprar 3 armas de fogo (uma arma curta, uma arma de cano longo de alma lisa e uma arma de cano longo de alma raiada) a cada dois anos. As Forças Amadas Brasileiras não entregam um arma curta de serviço a oficiais e sargentos para que a mantenham permanentemente com eles até o final de suas carreiras. Quando em serviço, oficiais militares e sargentos podem compartilhar armas curtas pertencentes aos estoques da força e podem usar uma arma leve (de calibre compatível) comprada por eles.8 Baseados em entrevistas, decidimos usar uma estimativa conservadora de 2 armas curtas compradas por oficiais e sargentos. Uma arma é usada como arma de serviço e a outra fica em casa. Assim, se considerarmos o uso privado, teremos o multiplicador conservador de uma arma por oficial ou sargento para uso privado. O resultado estimado utilizando os critérios acima foi 129.800 oficiais e sargentos na ativa e sargentos que possuem 129.800 armas de fogo para uso privado Reformados: De acordo com uma fonte secundária, se juntarmos todos, há até 500 mil militares na ativa, reformados e pensionistas (esposa de militar ou filha única) no Brasil.9 Há 314.300 homens na ativa entre os militares brasileiros, o que nos deixa com 185.700 militares reformados e pensionistas. Precisamos então calcular o número de militares reformados. Oficiais militares geralmente se reformam com uma média de 50 anos. A expectativa média de vida no Brasil para homens é de 65 anos, assim o reformado médio se beneficia durante 15 anos de uma pensão por aposentadoria. Em média, no Brasil, as esposas são 5 anos mais jovens que os maridos e a expectativa de vida feminina é de 70 anos. Assim, na média uma esposa de militar tem 60 anos quando seu marido morre e se beneficia por mais 10 anos da pensão. 7 Num efetivo total de 314.300 com 33.800 oficiais e 96.000 sargentos de acordo com a Nueva Mayoría (2004), Balance Militar de América del Sur, Colección Estudios 44, Buenos Aires, Nueva Mayoría editorial pp. 112-151 8 Entrevistas com pessoal militar na ativa e reformado 9 Mariz, Cristiano (2004), “Congresso garante reajuste de 10% no soldo de militares”, Jornal de Brasília, 15 de setembro de 2004, http://clipping.planejamento.gov.br/Noticias.asp?NOTCod= 150256 Posse de Armas de Fogo no Brasil: Mapeamento das armas e seus proprietários 141 Filhas, também com uma expectativa de vida de 70 anos, se beneficiam por mais 20 anos (assumindo uma diferença de 20 anos entre gerações). Assim o multiplicador usado é 15/45 para saber a proporção de militares reformados e sargentos. Isto corresponde aproximadamente a 35% de 185.700, o que, por sua vez, é equivalente a 20% do pessoal na ativa, uma proporção confirmada em entrevistas. Para saber o número de armas de posse deste grupo, multiplicamos o resultado por 2. Ou seja, 2 armas para cada militar reformado (neste caso, como não está mais em serviço, as duas armas estariam em casa). De acordo com estas estimativas, teríamos então 64.995 oficiais militares e sargentos reformados que possuem 129.990 armas de pequeno porte. c) Armas de fogo do pessoal da polícia para uso particular: Serviço ativo: Assim como o pessoal militar da ativa, nossas entrevistas revelaram que agentes da polícia normalmente têm duas armas para uso privado. Uma como “back up” da sua arma oficial de serviço, e outra mantida em casa. Assim, novamente adotamos um multiplicador conservador de uma arma leve (das duas compradas) considerada como de “uso privado”. Seguindo este critério estimamos 480.721 policiais na ativa que possuem 480.721 armas particulares. Aposentados: Com base nas entrevistas com policiais aposentados, estimamos que o número total de policiais aposentados no Brasil é 25% do total do pessoal em serviço ativo. Então aplicamos uma estimativa conservadora de duas armas de fogo por policial aposentado para calcular este grupo. Neste caso não diferenciamos entre oficiais, sargentos e soldados (ou agentes) porque é mais fácil (em comparação com civis) para policiais e soldados comprar armas de fogo e munição. A estimativa para este grupo então é de 120.180 policiais aposentados que teriam 240.360 armas de fogo. d) Colecionadores, Atiradores e Caçadores (CAC) Apesar de ser uma categoria civil, os proprietários de armas CAC registram suas armas de fogo com o Exército. Atiradores, colecionadores e caçadores têm o direito de possuir mais armas do que o cidadão comum e colecionadores também podem possuir armas de fogo de tipo militar em casa. Os dados sobre este grupo de pessoas foi colhido junto à ANEEX, onde os números são distribuídos por região militar. 142 Brasil: as armas e as vítimas Colecionadores podem ter grandes quantidades de armas de uso restrito, inclusive (se autorizados pelo Exército) fuzis de estilo militar. Nós então analisamos os dados relacionados a este subgrupo separadamente dos caçadores e atiradores. A quantidade de armas em posse dos colecionadores foi estimada com base numa tabela da ANEEX que cruza referências do número de armas possuídas (dividida em 4 categorias de 1 a 10 armas de fogo; de 11 a 49; de 50 a 100 e 101 ou mais) com o número de colecionadores de cada categoria. Os dados são apresentados por região militar. Calculamos a quantidade média para cada categoria e multiplicamos pelo número de colecionadores por categoria. Isto deu um resultado de 155.096 armas de fogo em posse de colecionadores. Tabela 2. Colecionadores segundo a ANEEX: Fonte: Aneex 2002 e 2003 Apesar de caçadores e atiradores terem extrema facilidade para comprar armas de fogo e renovar autorizações, com base em entrevistas e fontes secundárias, utilizamos um multiplicador conservador de 4 armas de fogo por caçador e atirador.10 O total de armas de fogo em posse do CAC foi estimado em 215.460. Dos quais 155.096 estão com colecionadores, 4.692 com caçadores e 55.672 com atiradores. e) Empresas de segurança privada As armas de fogo das empresas de segurança privada foram registradas até 2003 junto com as armas de fogo civis. Daí porque são contadas junto com o grupo “Civis”. Dada a importância do setor de segurança particular no país, e também porque (considerando o alto índice de criminalidade no Brasil) é mais provável que as armas de fogo de segurança particular venham a ser usadas ou roubadas, decidiu-se fazer uma estimativa da quantidade e distribuição de armas 10 Entrevista com colecionador de armas de fogo do Rio de Janeiro. Ver também: Arruda, Leonardo (1999), “Entrevista à Revista Época (Não Publicada)”, O Correio do Cidadão, Nº 76, http://www.armaria.com.br/corr_cid/correio076.htm Posse de Armas de Fogo no Brasil: Mapeamento das armas e seus proprietários 143 de fogo pertencentes a empresas de segurança particular.11 Esta estimativa tem o propósito de fazer uma representação geo-referenciada das armas de fogo de seguranças e guardas particulares. Novamente, o número de armas de fogo na posse de empresas de segurança particular está diluído na quantidade estimada para indivíduos e entidades legais. É importante considerar que, de acordo com a legislação brasileira, guardas particulares não podem servir com suas próprias armas. Eles trabalham com armas de fogo pertencentes à empresa de segurança privada para a qual trabalham. Foram usadas duas fontes de dados: • Informações oficiais enviadas a pedido pela Polícia Federal (responsável por monitorar a segurança privada no nível nacional).12 • Relatório da Federação Nacional das Empresas de Segurança e Transporte de Valores (FENAVIST)13 • Legislação específica sobre segurança privada. Tanto a FENAVIST quanto a Polícia Federal, apresentaram dados similares sobre o número de guardas particulares por estado de acordo com o seu nível de treinamento e especialização. O nível de especialização e treinamento é importante porque esta categoria irá determinar o número e tipo de armas de fogo que estes guardas podem usar quando estiverem a serviço. Existem três categorias básicas: • Guardas com treinamento básico – TB ( que só podem portar um revólver que pertence à empresa). • Guardas com treinamento para escolta de cargas valiosas e caminhões de carga de valores –TV/EA – Podem usar uma arma curta e uma arma de cano longo a serviço ( uma espingarda ou uma carabina .38). • Guardas com treinamento para segurança pessoal –SPP– que podem portar duas armas curtas. 11 12 13 144 De acordo com a Polícia Federal, existem 1.120.842 guardas de empresas legais de segurança privada no Brasil. Apesar de nem todos carregarem armas de fogo em serviço, todas as pessoas credenciadas (depois de exames) como guardas particulares pela Polícia Federal, podem usar armas de fogo em serviço. Levar ou não a arma dependerá da atividade designada pela empresa de segurança particular (que tem a posse das armas de fogo para o seu pessoal). Daí porque decidimos considerar o número total de seguranças particulares e para calcular o número de armas de fogo usados pelo setor de seguranças particular aplicamos um multiplicador baseado nos turnos de trabalho. Ministério da Justiça, Departamento da Polícia Federal, Gabinete da Coordenação Geral da Segurança Particular, Ofício N° 3559/04), Outubro 2004 Federação Nacional das Empresas de Segurança e Transporte de Valores (FENAVIST).(2002), Relatório Anual da Segurança Privada no Brasil 2002, 37pp., FENAVIST, Brasília, 2004. Brasil: as armas e as vítimas Esta informação foi cruzada com o número de guardas particulares pertencentes a cada categoria e o número de armas foi estimado assim. Então usamos multiplicadores conservadores para cada categoria baseados no fato de que as armas são compartilhadas por diversos guardas servindo em 3 turnos. (8/24, 12/ 36, 24/72). Guardas TB trabalham com uma única arma curta por turno enquanto TV/ EA e SPP trabalham com duas armas de fogo por turno. Então calculamos uma arma leve para cada 3 guardas no caso de guardas TB e 2 armas de fogo para cada 3 guardas para guardas TV/AE e SPP. Isto dá um multiplicador de 0,33 para guardas TB e 0.66 para guardas VT/AE e guardas SPP. A posse de armas para este grupo está representada na Tabela 3 abaixo: Tabela 3. Armas das empresas de segurança privada Fonte: Ministério da Justiça, Departamento da Polícia Federal, Gabinete da Coordenação Geral de Segurança Particular Ofício N° 3559/04), outubro 2004 Seguindo o critério acima, estimamos um total de 413.994 armas de posse das empresas de segurança privada. Posse de Armas de Fogo no Brasil: Mapeamento das armas e seus proprietários 145 f) Posse Criminosa e Informal Este foi o grupo mais difícil de estimar. Não há dados oficiais sobre a posse ilícita de armas de fogo. Dividimos a posse ilícita em dois grupos, a saber: • Posse informal: Estas são armas de fogo não registradas em posse de indivíduos ou entidades (tais como empresas de segurança particular não declaradas ou autorizadas). Não estão necessariamente nas mãos de criminosos ou sendo usadas em crimes. No entanto, como não estão registradas, o Estado não tem conhecimento delas e assim podem ser desviadas mais facilmente (e despercebidamente) para criminosos, por roubo ou vendas ilícitas. • Posse criminosa: Esta se refere a armas de fogo nas mãos de criminosos, sendo usadas para a prática de crimes. Na ausência de dados oficiais usamos as seguintes fontes para calcular o número de armas nesta categoria: • Nossa principal referência foi a Base de Dados da polícia do Rio de Janeiro sobre armas registradas (550.669 armas de fogo) e armas apreendidas (232.997 armas de fogo). Esta base de dados foi exaustivamente depurada e corrigida em um esforço de cooperação com o ISER. Cruzamos os dados para determinar a proporção de armas registradas com não registradas entre as armas apreendidas e esta proporção tornou-se nossa principal referência. • Secretarias de Segurança Pública dos estados (informações sobre armas de fogo registradas e apreendidas). Obtida através de pesquisa de campo. • Pesquisa voluntária com 2.207 indivíduos que participaram da campanha de devolução voluntária de armas de fogo no Viva Rio do Rio de Janeiro e com 350 indivíduos que entregaram suas armas nos postos de recolhimento do Sou da Paz, em São Paulo. • Pesquisa realizada por Renato Sérgio Lima, Jaqueline Sinhoreto e Luci Gati Pietrocolla, da USP, sobre armas em São Paulo, estimando o número de armas para São Paulo e para o Brasil.14 Usando as fontes acima, seguimos estes passos para chegar a uma estimativa da posse ilícita: 1. Começamos com a pergunta: Como estimar o número de armas civis em circulação no Estado do Rio? 14 146 De Lima, Renato Sergio;Sinhoreto, Jaqueline and Gati Pietrocolla, Luci, “Armas de Fogo, Medo e Insegurança em São Paulo: Risco de Uma Pessoa que Possui Arma de fogo Ser Vítima Fatal de Um Roubo”, Revista do ILANUD, 16, 2001, pp.33-40 Brasil: as armas e as vítimas 1.1 Sabemos o número de armas registradas, de 1951 a 2003 (Reg) 1.2 Sabemos o número de armas apreendidas, de 1951 a 2003 (Apr) 1.3 Sabemos a porcentagem de armas registradas encontrada entre as (Apr): 25,7% 1.4 Assumimos que (Apr) é uma amostra razoável de todas as armas em circulação (Circ), registradas e não registradas. 1.5 No entanto esta suposição (1.4) tem pelo menos dois desvios: 1.5.1 A maior parte de (Apr), 78%, foi apreendida entre 1981 e 2003, o que corresponde ao aumento da epidemia de armas no Rio. 1.5.2 Sabemos que além do universo das armas Registradas e Ilegais há um importante terceiro segmento: armas não registradas na posse de cidadãos honestos. Há um mercado informal (Inf) de armas no Brasil que não deve ser confundido com o mercado criminoso (Crim). 1.6 Estimamos (Inf) de acordo com os resultados da amostra voluntária da campanha de desarmamento voluntário. Um resultado bastante conservador estabelece o mercado informal em 46% de todas as armas em mãos de cidadãos honestos (Reg) + (Inf). 1.7 Para tornar a suposição de que (Apr) é uma amostra de todas as armas em circulação (Circ) mais razoável, consideramos, nesta etapa, os números de (Apr) e (Reg) apenas entre 1981/2003. Descobrimos que a mesma proporção de (Reg) em (Apr) permanecia válida aqui. No lote todo (item 1.3 acima) encontramos 25,7%. Aqui, entre 1981 e 2003 encontramos 25,6%. 1.8 Tínhamos o número de (Reg) de 1981 a 2003: 179,166, o qual estimamos represente 54,6% de (Reg)+(Inf) no período. Da mesma forma estimamos (Inf), 45,4% de (Reg)+(Inf) , em: 149.129. Assim obtivemos (Reg)+(Inf) as armas em mãos de cidadãos honestos que entraram no mercado entre 1981 e 2003. (Reg)+(Inf) foi 328.295. 1.9 Como então estimar o número de armas nas mãos de criminosos (Crim)? Assumindo o ponto 1.4, que (Apr) é uma amostra de todas as armas em circulação (Circ), e sabendo que (Reg) representa 25,6% de (Apr), arriscamos resolver a equação: (Reg) 1981-2003 = (Circ) 81-03 * 25,6% ou (Circ) 1981-2003 = (Reg) 1981-2003 / 25,6% (Circ) 1981-2003 = 179.166 / 25,6% = 700.711 Então (Crim) 81-03 pode ser estimado como (Crim) 81-03 = (Circ) 81-03 – (Leg) 81-03 = (Circ) 81-03 – (Reg) 81-03 – (Inf) 81-03 ou (Crim) 81-03 = 700.711 – 328.295 = 372.416 Posse de Armas de Fogo no Brasil: Mapeamento das armas e seus proprietários 147 1.10 Para expandir esta estimativa de 1981 a 2003 para o período total de nossa base, 1951 a 2003, fizemos mais um cálculo: tendo estabelecido que este período representa 78% de (Apr), ponto 1.5.1 acima, estimamos que o universo total (Crim) em 372.416 / 78% = 477.925 1.11 Tínhamos o número de (Reg) de 1951 a 2003: 550.669, o qual estimamos representar 54,6% de (Reg)+(Inf) Da mesma forma, estimamos (Inf), 45,4% de (Reg)+(Inf) em: 457.882. Assim obtivemos (Reg)+(Inf), armas em mãos de cidadãos honestos no Rio de Janeiro: 1.008.551. Somando o número estimado de armas em mãos criminosas, 477.925, encontramos (Circ), o total de armas circulando no Rio em 1.486.476. 1.12 Resumindo, (Circ) = 2,7 X (Reg). 2. Testamos em São Paulo o fator multiplicador encontrado no Rio: (Circ) SP = 2,7 * (Reg) SP = 2,7 * 1.593.902 = 4.302.801 No entanto, para todos os estados subtraímos todas as armas apreendidas relacionadas como destruídas pelo Exército (ANEEX) e/ou entregues durante o programa de desarmamento voluntário de 2004 (e assim fora de circulação e passíveis de serem destruídas). No caso de São Paulo, por exemplo, 444.180 armas foram destruídas ou recolhidas pelo programa de desarmamento voluntário e o número de armas de fogo em circulação nas mãos de civis naquele estado foi calculado em 3.858.621. Em 2001 uma pesquisa sobre armas de fogo em São Paulo, usando uma metodologia diferente, estimou o total de 3.608.789 armas em mãos de civis15 . O número deles é apenas 1,7% mais baixo que o nosso. O multiplicador 2,7 foi aplicado à estimativa de armas de fogo civis registradas por estado. Ao número resultante aplicamos a percentagem estimada de armas informais do Rio de Janeiro e São Paulo: 45,4%. A posse criminosa então resultaria de Circ – (Inf + Reg) Vale a pena mencionar que ao aplicar este multiplicador 2,7 o que obtemos é o total de armas de fogo na posse de civis (excluindo aquelas na posse de militares, CAC e particulares de policiais). Estas armas estão representadas na tabela 4 abaixo. 15 148 De Lima, Sinhoretto, Gati Pietrocolla, op.cit., Brasil: as armas e as vítimas Tabela 4. Armas lícitas e ilícitas em posse de civis (não inclui armas de fogo na posse de CAC e de uso privado de militares ou policiais) Fontes: SINARM, Secretarias de Segurança Pública dos Estados, ANEEX diversos anos (para armas de fogo destruídas), Polícia Federal (programa de recompra), Análise, ISER/VivaRio. Ou seja, 4.635.058 armas de fogo na posse informal e 3.857.794 na posse de criminosos. Posse do Estado: As armas de posse do Estado são por definição lícitas. Em princípio, armas de fogo institucionais não deveriam ser consideradas parte do problema da violência no Brasil. No entanto, o desvio de armas de fogo e munição policiais e militares para o crime organizado e o abuso do poder letal pela polícia é uma realidade que não pode ser ignorada.16 Assim, além do simples exercício de contar armas, loca16 Considerando apenas o Rio de Janeiro e São Paulo, o número de civis mortos pela polícia chegou a 1.195 e 868 pessoas respectivamente, em um país no qual execuções extra judiciais estão na ordem do dia. Sobre isso, ver Centro de Justiça Global. 2003. , Human Rights in Brazil 2003, Global Justice Annual Report, Rio de Janeiro, Centro de Justiça Global, p. 13 ver também: Cano, Ignacio.1997. The Use of Lethal Force by Police in Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, ISER, 1997,81pp. Posse de Armas de Fogo no Brasil: Mapeamento das armas e seus proprietários 149 lizar e identificar arsenais de armas de fogo militares e policiais é uma maneira de abordar os problemas colocados por este tipo de posse quando há falhas nas medidas de segurança adequadas dos arsenais e naqueles nos quais a polícia não tem o treinamento apropriado.17 a) Forças Armadas:18 Já que os dados sobre os arsenais das Forças Armadas não estão abertos ao público (o que é comum na América Latina), nossa estimativa baseou-se em fontes secundárias e entrevistas com militares da ativa e da reserva das três Forças Armadas. Ao invés de desenvolver um multiplicador geral para as três armas das Forças Armadas, consideramos as especificidades da administração dos arsenais e rotina do uso de armas de fogo por cada força. Nossas principais fontes de referência foram: • A publicação editada periodicamente por um instituto argentino de análise de políticas públicas e defesa chamada O Balanço Militar da América do Sul (BMAS). O BMAS fornece dados exaustivos e detalhados (baseados em pesquisa de campo e fontes secundárias) sobre o número de pessoal e equipamento (pesado) das Forças Armadas de cada país sul-americano.19 O BMAS foi usada para obter dados sobre números de efetivos em cada Força Armada, bem como as proporções de oficiais, sargentos e soldados em cada serviço armado. Esta fonte também foi utilizada para estimar o número de unidades especiais significativas dentro de cada força que poderia ter mais armas de fogo que o resto da força, tal como os fuzileiros navais da Marinha, por exemplo. • The Military Balance 2003-2004 publicado pelo Instituto Internacional para Estudos Estratégicos, Londres (IISS/MB). Esta fonte foi usada para verificar 17 Também, para dar a amplitude do possível desvio (por roubo ou corrupção) de armas de fogo policiais e militares, na base de dados de armas apreendidas da divisão de controle de armas de fogo da polícia do Rio de Janeiro, existem 244 fuzis IMBEL (calibres 7.62 and 5.56 NATO), 579 sub-metralhadoras produzidas no Brasil (INA, URU e Taurus-Beretta 9mm e .45) e 109 fuzis Colt M16 cujos números de série começam com as letras AO o que as identifica como pertencentes à polícia (vale a pena mencionar que as armas de fogo apreendidas não relacionadas a crimes foram eliminadas da base de dados para esta análise). Todas estas armas são de uso exclusivo das forças policiais . Esta informação vem da análise da base de dados do DFAE realizada pelo ISER. 18 Como no Brasil não há conflitos armados internos e já que armas leves (metralhadoras pesadas, morteiros, lança rojões e armas anti-aéreas portáteis) não são comumente usadas pelos grupos criminosos urbanos, por posse das Forças Armadas estamos nos referindo a pequenas armas portáteis (rifles de assalto, sub-metralhadoras, e pistolas).Armas leves não foram consideradas aqui. 19 Nueva Mayoría, op.cit. 150 Brasil: as armas e as vítimas os reservistas de primeira linha e também para comparar seus números com os do BMAS, entrevistas e outras fontes. • Informações contidas no censo nacional de 2000 (o último disponível) que dá informações sobre a população por categoria de trabalho (incluindo militares) para cada estado brasileiro. Esta informação foi utilizada como parâmetro para distribuir os militares dentro de cada estado de acordo com a proporção de pessoal militar em cada unidade da federação. • Entrevistas com militares da ativa e reformados das três armas.20 • Legislação em vigor. No Brasil o número máximo de pessoal por força armada em tempos de paz é fixado periodicamente por um Decreto Presidencial.21 Esta informação foi usada como parâmetro para verificar a validade e confiabilidade de outras fontes ( ou seja, os números não deveriam ultrapassar a quantidade máxima estabelecida por lei). Também foi usada para estimar a proporção de oficiais na Infantaria da Marinha e da Aeronáutica. • Publicações especiais tais como Jane´s Infantry Weapons, e Forecast International foram consultadas para triangular informações relativas ao tipo de armas de fogo usadas por cada serviço. Estas publicações bem como os dados de importação (CACEX e CECEX) e de produção (ANEEX) foram úteis no sentido em que proveram dados indiretos através da análise do número de armas de fogo importadas/produzidas para as Forças Armadas brasileiras. Como procedemos para estimar o número de armas de posse desta categoria? Estimar estoques militares não é tão simples quanto contar uma arma por soldado ou aplicar multiplicadores como se o uso de armas de pequeno porte fosse o mesmo nas três forças. Além disso, o uso de armas de pequeno porte pode variar dentro de cada força. Por exemplo, tanto a Marinha quanto a Aeronáutica têm unidades de infantaria que, naturalmente, possuem mais armas de pequeno porte que o resto da força. A Marinha tem os fuzileiros navais, uma força com efetivo de 14.600 homens, cujo papel é proteger determinadas bases navais e levar a cabo operações anfíbias.22 A Aeronáutica tem uma pequena unidade de infantaria cujo papel principal é proteger as bases aéreas. 20 21 22 Um oficial reformado de alta patente da Marinha brasileira, um oficial reformado de patente media da Aeronáutica e um soldado profissional da Marinha que também serviu numa brigada de infantaria do Exército Consultamos o decreto N° 5710/2004 o qual estabelece o número máximo de pessoal para o Exército (incluindo recrutas); o decreto N° 7150/2004, que estabelece o número máximo de oficiais para a Aeronáutica ( por departamento e especialização) e o Decreto N°5019/2004 que estabelece o número máximo de oficiais para a Marinha (por departamento e especialização). Todos os decretos estão disponíveis em www.planalto.gov.br Dados do BMAS e IISS/MB Posse de Armas de Fogo no Brasil: Mapeamento das armas e seus proprietários 151 O critério utilizado aqui foi considerar as diferenças e especificidades de cada força. Esta diferenciação vem de conhecimentos sobre a matéria e de entrevistas com militares da ativa e reformados. O Exército é uma força terrestre com um grande componente de infantaria e faz um uso mais amplo de armas de fogo. Presumimos que cada oficial e sargento use uma arma curta quando em serviço. O Exército, uma força menos técnica, que depende do poder humano de combate, também tem um componente maior de recrutas e cabos. Consideramos, então, que o Exército poderia ter uma proporção maior de fuzis (arma padrão básica da infantaria). Com base em entrevistas, no caso do Exército determinamos um multiplicador de 2 armas por soldado (sem considerar a patente). Cabos e soldados não têm um fuzil especificamente para si. Pegam uma arma diferente a cada vez que vão fazer manobras, patrulhas, guardas, etc. No entanto, o critério do Exército é de que deve haver dois fuzis para uso de cada cabo e soldado. Um para treinamento básico e outro para situações que não são de treinamento ou manobras de treinamento mais sofisticadas.23 No caso de oficiais e sargentos, seguimos a seguinte linha de raciocínio: cada um deles carrega permanentemente uma arma curta enquanto está de serviço (ou a deixa à disposição na base/quartel). Esta arma curta foi comprada por eles já que, como já foi dito, nas Forças Armadas brasileiras oficiais e sargentos não recebem uma arma curta específica para seu uso pessoal, de forma permanente, durante toda a carreira24. Além da arma curta, também calculamos um fuzil para cada dois oficiais e sargentos que poderia ser usado no caso de treinamento, exercícios, ou outras situações (tais como tarefas de paz internacionais), e uma pistola do patrimônio da unidade militar para cada dois oficiais e sargentos. O mesmo multiplicador, de 2 armas por soldado (independente da patente), foi usado para os fuzileiros navais e para a infantaria da Aeronáutica, duas unidades específicas da Marinha e da Aeronáutica que, devido às suas tarefas, usam armas de fogo de infantaria em suas atividades básicas. No caso dos fuzileiros navais, o multiplicador de 2 armas por soldado se aplica com mais força ainda porque, entre 1997 e 1998, os fuzileiros navais trocaram seus fuzis FAL por fuzis M16A2 comprados dos EUA. Os FAL não foram descartados como excedentes mas guardados para situações de treinamento pesado (na gíria militar “para ralar”)25 23 Entrevista com um militar de patente inferior que serviu numa unidade de infantaria do Exército e atualmente serve com os fuzileiros navais 24 Esta é uma das principais diferenças de outras Forças Armadas latino-americanas, nas quais os oficiais recebem ao menos um arma curta que fica com eles permanentemente durante suas carreiras. Entrevistas com pessoal militar na ativa e reformados. 25 Ibid. 152 Brasil: as armas e as vítimas Para o resto da Marinha e Aeronáutica usamos um multiplicador de 0.5 para cabos e soldados ou marinheiros (ou seja, 1 fuzil para cada dois homens) e 1.5 armas curtas por oficial ou sargento. Isto baseou-se no fato de que tanto na Aeronáutica quanto na Marinha, um número reduzido de armas de fogo é compartilhando entre o pessoal para turnos de guarda, ou guardadas para uso na defesa das bases, ou do navio no caso de um eventual ataque armado.26 No caso dos oficiais, uma das armas curtas seria de uso privado, usada em serviço, e a outra permaneceria na base ou navio e é compartilhada por dois oficiais / sargentos por turno de guarda.27 Nossa estimativa para o total de armas de fogo nas Forças Armadas brasileiras para o pessoal da ativa é de 549.505. Este total foi distribuído proporcionalmente entre os estados brasileiros de acordo com a proporção de pessoal militar declarado no censo de 2000. Tabela 5 – Estimativa do Número de Armas de Pequeno Porte nas Forças Armadas (serviço ativo) Fontes: El Balance Militar de América del Sur, e entrevistas 26 Ibid. 27 Ibid. Posse de Armas de Fogo no Brasil: Mapeamento das armas e seus proprietários 153 Finalmente, calculamos as armas de fogo disponíveis para a reserva. Os dados foram obtidos do IISS/MB, de acordo com os quais o Brasil tem 400 mil reservistas sujeitos a chamada imediata em caso de guerra. De acordo com as fontes entrevistadas, as armas excedentes militares raramente são destruídas no Brasil. Os excedentes são armazenados por anos e anos e muitas destas armas são deixadas para os reservistas. As mesmas fontes afirmaram que apenas a primeira linha de reservistas de prontidão conta e o planejamento atual é para que haja pelo menos uma arma leve para cada reservista. A proporção de oficiais na ativa e sargentos foi usada para calcular o número de oficiais na reserva e sargentos (estimado em 163.762) e então usamos um multiplicador bem conservador de 0,5 armas curtas para este grupo. Isto resultou em um total de 81.881 armas de fogo adicionais para oficiais e sargentos da reserva. O total de armas para uso dos reservistas das Forças Armadas então é: 481.881. As armas de fogo de reserva também foram distribuídas proporcionalmente usando dados do censo. Como uma forma indireta de confirmar nossas estimativas, e sempre considerando que o mercado para armas de fogo no Brasil é bem fechado e muito protegido, devemos ressaltar que o Exército interrompeu suas compras da IMBEL (pistolas e fuzis FAL) em meados dos anos 80. Os fuzis FAL do Exército são periodicamente enviados à IMBEL para consertos e manutenção mas nenhuma nova grande compra foi realizada.28 De acordo com fontes secundárias, a IMBEL não produziu mais que 200 mil FALs do início dos anos 60 até 1984 (a isto devemos acrescentar os FAL fabricados na Bélgica importados no início dos anos 60)29 . Ao mesmo tempo, de acordo com informações do Exército, entre 1977 e 2004, a IMBEL reportou uma produção total de 334.534 (incluindo fuzis e pistolas).30 Por outro lado, a sucursal brasileira da Beretta (comprada no início dos anos 80 pela Taurus), produziu um total de 40.000 pistolas Modelo 92 9 mm (em uso na Marinha e na Aeronáutica) para as Forças Armadas.31 No Brasil, cada força decide de forma autônoma sobre compra de armas, e a Aeronáutica usa outros tipos de armas de fogo: comprou fuzis Heckler und Koch G-3 e HK-33 no começo dos anos 70, bem como algumas metralhadoras MP5 28 Entrevista com o Coronel Alte S. E. Zylberberg, Superintendente da Fábrica da IMBEL de Itajubá, em 4 de maio de 2004 e entrevista com pessoal militar da ativa (fuzileiros navais e exército). 29 Klare, David e Andersen Arthur (1996). A Scourge of Guns: The Diffusion of Small Arms and Light Weapons in Latin America, Federation of American Scientists, Washington D.C., p 19 30 DFPC, Relatorio da Situação do SICOFA, Brasilia 2004. 31 Wilson, R.L.(2001), Il Mondo Beretta: una leggenda internationale, Sperling & Kupper, p.222 154 Brasil: as armas e as vítimas para suas forças especiais. Com exceção de uma compra bem limitada de fuzis SIG 551 em meados dos anos 90, a Aeronáutica não fez outras compras. A Marinha escolheu o M16A2 americano no final de 1997 para os fuzileiros navais e manteve os antigos fuzis FAL para treinamento.32 Como vimos no capítulo sobre produção legal de armas de pequeno porte e armas de fogo, até o fim desta década a IMBEL está planejando equipar todo o Exército com fuzis MD97L 5.56mm de desenho nacional. Seguindo a tradição, espera-se que os velhos fuzis FAL 7.62mm sejam guardados para recrutas e reservistas. b) Polícias e Justiça Criminal: A complexidade do sistema judiciário e policial no Brasil está de acordo com o tamanho e a diversidade do país. Cada um dos 26 estados, além do Distrito Federal, tem sua própria Polícia Militar, organizada em estilo militar (patentes militares, uniformes e, em alguns casos, armas de fogo de tipo militar) e a Polícia Civil, investigativa / judiciária (detetives à paisana). Isto dá um total de 54 forças policiais estaduais com aproximadamente 461.069 homens e mulheres. Cada estado pode decidir de forma autônoma o tipo de armas que sua polícia usará e como gerir e usar seus arsenais. Diversos fatores, no entanto, contribuem para diminuir a tendência à pluralidade nos equipamentos e práticas policiais: • Consideradas como “forças auxiliares” das Forças Armadas, as corporações das Polícias Militares têm doutrina e organização similares em todos os estados. • A natureza fechada e protecionista do mercado de armas de fogo no Brasil previne uma diversificação de calibres, modelos e marcas diferentes entre as forças policiais no país que, com raras exceções, compram armas e munições fabricadas no país. • Tanto a administração de Fernando Henrique Cardoso quanto a de Lula desenvolveram e implementaram Planos Nacionais de Segurança Pública que incluíam apoio econômico aos estados para a compra de novas armas de fogo com modelos e calibres do mesmo padrão. De acordo com nossa pesquisa de campo, a maioria das corporações policiais civis e militares atualmente adota pistolas Taurus calibre .40 como arma leve padrão bem como carabinas e sub-metralhadoras Taurus .40. 32 Entrevista no Rio de Janeiro com o proprietário de uma firma que importa armas de fogo para órgãos policiais e entrevista com pessoal militar da ativa (fuzileiros navais e Exército). Ver também Jane’s Infantry Weapons, National Inventories section. Posse de Armas de Fogo no Brasil: Mapeamento das armas e seus proprietários 155 Devemos acrescentar às corporações policiais dos estados os 7.800 membros da Polícia Federal presente em todo o território nacional, e os 7.300 membros da Polícia Rodoviária Federal responsável pelo cumprimento da lei nas estradas federais. Finalmente, devemos contar os departamentos estaduais de bombeiros (que no Brasil são unidades paramilitares ligeiramente armadas), guardas penitenciários (até o ano passado o Brasil não tinha um sistema carcerário nacional), guardas municipais,33 e juízes e magistrados que no Brasil têm o direito de requerer do Estado uma arma leve para fins de defesa pessoal. Consultamos diversas fontes para elaborar nossas estimativas: • Informações coletadas em pesquisa de campo nos estados brasileiros (questionários e entrevistas). Estas informações se relacionam a números de policiais em serviço, armas que estes usam e turnos de trabalho; • Fontes secundárias (comunicados à imprensa), checadas com a instituição apropriada (Polícia Federal e Polícia Rodoviária Federal); • Fontes primárias (o estado do Rio de Janeiro divulga o número de policiais na página oficial da polícia); • Revistas e outras publicações policiais; • Censo de 2000 (IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). Polícia Federal: Os dados sobre a Polícia Federal foram coletados de fontes secundárias e entrevistas com agentes na ativa. Este corpo policial tem a particularidade de ter equipes muito móveis que são convocadas caso a caso. Os agentes da Polícia Federal não têm necessariamente turnos fixos de trabalho. Por exemplo, um policial federal trabalhando no Rio de Janeiro, por exemplo, apoiando o programa de entrega voluntária de armas, pode subitamente ser chamado a viajar (junto com outros agentes vindos de outros estados) para Manaus para prender um falsificador. Agentes da Polícia Federal geralmente recebem uma arma curta do arsenal oficial que permanece com eles durante toda a carreira e também têm o direito de usar uma arma curta particular. Quando em missão especial podem escolher carregar uma arma de cano longo (geralmente um AR-15 ou uma sub-metralhadora H&K MP-5). De acordo com nossas entrevistas, cada sede local da Polícia Fede33 156 Algumas cidades brasileiras têm guardas municipais com a responsabilidade de cuidar de prédios públicos e do trânsito. Em alguns casos estes guardas estão armados com revólveres. De acordo com o Estatuto do Desarmamento (regulamentado em junho de 2004), cidades com mais 250.000 habitantes podem ter guardas municipais armados, desde que cumpram uma série de requisitos (a maioria relacionada a treinamento adequado). Esta questão pode contribuir para aumentar a posse de armas no setor de policial no futuro próximo. Brasil: as armas e as vítimas ral tem aproximadamente 1 arma de cano longo para cada 4 policiais. Nosso multiplicador para a Polícia Federal (incluindo armas portáteis e armas de cano longo) é 2.25. As armas de fogo da Polícia Federal foram distribuídas entre os estados brasileiros usando a proporção dada no censo de 2000 do IBGE do número de policiais por estado. Seguindo esse critério, estimamos 17.550 armas em posse da Polícia Federal. Polícia Militar Estadual (PM), Polícia Civil Estadual (PC) e Polícia Rodoviária Federal (PRF): Para as corporações policiais estaduais civis e militares, desenvolvemos um multiplicador base nos denominadores comuns encontrados nos questionários distribuídos durante nossa pesquisa de campo. Tanto nas corporações civis quanto nas militares, os policiais usam uma única arma curta institucional quando em serviço. A esta arma curta institucional devemos acrescentar uma segunda, particular (registrada), que policiais estão autorizados a carregar em serviço. Há uma terceira arma de pequeno porte e cano longo, que é compartilhada entre três policiais e normalmente fica na viatura ou na delegacia ou batalhão.34 Adotamos um multiplicador de 1,33 (1 arma curta + 1/3 uma arma longa por três policiais) armas de fogo institucionais por agente. As armas institucionais não permanecem com os policiais o tempo todo, elas são devolvidas às delegacias ou quartéis depois do turno de serviço. Outro denominador comum encontrado nas corporações civis e militares é que elas funcionam em turnos de 8/24; 24/72 e 12/36 horas, ou seja, normalmente 1/3 da força policial está trabalhando. Aplicamos o mesmo critério à Polícia Rodoviária Federal, chegando a um multiplicador para as três forças: 1 (arma pessoal de backup) + 1,33 (armas institucionais) * 1/3 (policiais em serviço) = 1,433 Seguindo esse critério, estimamos 538.422 armas para a Polícia Militar (378.332 policiais); 135.082 armas para a Polícia Civil (87.288 policiais); e 10.463 armas para a Polícia Rodoviária Federal (7.300 policiais).35 34 A única exceção a esta regra é o estado do Ceará, onde policiais usam duas armas institucionais. 35 Durante a pesquisa de campo seis estados informaram o número de armas institucionais que possuem a PC ou a PM, e nestes casos usamos o número oficial no lugar de nossas estimativas. Posse de Armas de Fogo no Brasil: Mapeamento das armas e seus proprietários 157 Juízes e Magistrados: Nossa pesquisa de campo indicou que cada poder judiciário estadual tem um determinado número de armas curtas para juízes e magistrados, que podem requerer uma arma do estado para sua defesa pessoal. Esta arma geralmente é dada a um motorista/guarda-costas e fica no carro oficial.36 Usamos uma estimativa bem conservadora de uma arma leve para cada 10 juízes ou magistrados. Isto baseou-se em dois fatos: primeiro, como juízes têm o direito de portar armas de fogo e muitas facilidades para comprar uma arma, em princípio o estado não precisaria de armas para a maioria deles. Segundo, de acordo com nosso pesquisador de campo, a maioria dos estados tem um número bem limitado de armas a serem designadas a pedido de juízes para proteção.37 Seguindo esse critério, estimamos um total de 1.207 armas nas mãos de 12.067 juízes e ministros de tribunais. Outros: Para outros grupos, tais como guardas penitenciários (que de acordo com a especialista Julita Lemgruber apenas portam armas de fogo no perímetro das penitenciárias e enquanto estão transportando presos), guardas municipais armados e bombeiros, também usamos um multiplicador muito conservador de 0,1. Este multiplicador foi aplicado à categoria do censo “outros policiais e guardas de trânsito”. Seguindo esse critério, estimamos 19.023 armas em posse destas instituições. 1.3.2 Olhando a posse de armas de perto: Finalmente, além de uma simples estimativa do número de armas de fogo no Brasil, este estudo buscou entender como as armas de fogo estão distribuídas em cada estado de acordo com parâmetros rurais/urbanos, bem como caracterizar o tipo de armas de fogo utilizadas pelos diferentes grupos mencionados acima. A coleta e análise de dados baseou-se em questionários distribuídos às agências estaduais de controle de armas de fogo durante a pesquisa de campo em todo o país. Foram solicitados dados sobre armas apreendidas e registradas de acordo com tipo, marca, modelo, calibre e fabricante. Apesar de não ter sido possível reunir estas informações em cada um dos estados, conseguimos uma amostra bem 36 Entrevista com o pesquisador de campo Luiz Carlos Carvalho Silveira 37 Ibid. 158 Brasil: as armas e as vítimas significativa do tipo de armas possuídas e usadas por civis, militares e policiais no Brasil, bem como das armas de fogo usadas em atividades criminosas. A metodologia adotada foi comparar os dados de nossa pesquisa de campo com as estatísticas da ANEEX sobre vendas de armas de fogo de uso permitido, trianguladas com o material das entrevistas, para analisar e mapear a distribuição das vendas de armas de fogo e munição no mercado civil por década. Uma análise detalhada (incluindo representação geográfica) da posse de armas por grupo, tipos de armas de fogo e distribuição geográfica está apresentada na seção 2 deste capítulo. 2. Contando armas: como as armas de fogo estão distribuídas no Brasil e quem as possui Esta sessão analisa a posse de armas pelo estado e particulares, por proprietário e de acordo com sua distribuição geográfica no Brasil. É muito importante que o leitor tenha em mente os mapas exibidos no capítulo Dra. Phebo sobre o impacto da violência armada, enquanto olha os mapas sobre a distribuição da posse de armas. No primeiro vemos a expansão da epidemia de violência e a localização do grupo de risco afetado por ela e, no segundo, como o vetor da epidemia está distribuído no território. 2.1 Quantas armas e quem as possui: Usando a metodologia explicada na seção 1 acima, o total de armas de fogo no Brasil foi estimado em 17.010.941. Este total foi distribuído da seguinte maneira por grupo de possuidores: Posse de Armas de Fogo no Brasil: Mapeamento das armas e seus proprietários 159 Diagrama 3: Distribuição da quantidade estimada de armas por grupo de entidades e pessoas proprietárias de armas de fogo Graficamente, a posse de armas está distribuída como mostrado abaixo: Gráfico 1. Estimativa da distribuição de armas por grupos de entidades e pessoas proprietárias de armas de fogo no Brasil 160 Brasil: as armas e as vítimas Gráfico 2.Um zoom nas armas legais Gráfico 3 Um zoom nas armas ilícitas Posse de Armas de Fogo no Brasil: Mapeamento das armas e seus proprietários 161 Gráfico 4 Um zoom nas armas legais civis Gráfico 5 Um zoom nas armas legais particulares de militares, policiais e do CAC 162 Brasil: as armas e as vítimas Gráfico 6. Um zoom nas armas do CAC Gráfico 7 Um zoom nas armas do Estado Posse de Armas de Fogo no Brasil: Mapeamento das armas e seus proprietários 163 O que estas estatísticas nos dizem a respeito da distribuição de armas de fogo entre os grupos de proprietários? Em primeiro lugar, a posse lícita ou ilícita está distribuída em uma proporção de 50 / 50. Este é um equilíbrio muito tenso e delicado em um país que não tem boa comunicação entre as agências de controle federal e estaduais e, além disso, onde até a promulgação do Estatuto do Desarmamento havia pouca colaboração entre a instituição que controla de produção e comércio (Exército), e a instituição que controla a posse e o uso (Polícia Federal). Basicamente, as autoridades não sabem aonde está metade das armas de fogo do país, nem quem as possui. Metade do estoque em circulação está ou nas mãos de criminosos ou na informalidade. Controlar o mercado criminoso é uma questão de eficiência, honestidade e inteligência da polícia. Controlar o mercado informal é uma questão ainda mais delicada: o estado precisa convencer os cidadãos a voluntariamente entregarem suas armas (através de programas de coleta de armas ou anistia para armas não registradas) ou registrá-las, o que é exatamente o que vem sendo feito agora com a aplicação do Estatuto do Desarmamento. Em 11 meses do programa nacional de compra, foram recolhidas mais de 350.000 armas de fogo, o que representa 3% dos estoques privados legais e informais estimados nesta pesquisa. Como vemos no Gráfico 3, a proporção entre armas de fogo criminosas e informais quase espelha a distribuição entre as legais e as ilícitas: meio a meio. Armas de fogo migram do circuito legal para o ilegal. No Rio de Janeiro sabemos que 25.6% das armas de fogo apreendidas (1981 – 2003) pertenciam a proprietários legais que as haviam registrado. Em São Paulo esta proporção era de 52% para armas de fogo apreendidas entre 2000 e 2003, enquanto em Brasília, esta proporção era de 29% de 2001 a 2003.38 Se as armas registradas, teoricamente monitoradas pelo Estado, migram em tal quantidade para circuitos criminosos, não seria de se esperar que um número ainda maior de armas não registradas vá parar em mãos de criminosos, seja através de vendas ilícitas, roubo ou uso em atividades criminosas? Quando focamos a posse lícita vemos no Gráfico 2 que a maioria das armas de fogo, 52%, estão nas mãos de indivíduos civis. É de se esperar que com o sistema de registro mais estrito e mais caro implementado pelo Estatuto do Desarmamento, o número de armas de fogo registradas venha a diminuir com o tempo. Isto estaria de acordo com o que aconteceu no Estado do Rio, que implementou 38 164 Fontes: DFAE para o Rio de Janeiro; gabinete da Coordenação de Planejamento e Análise da Secretaria de Segurança Pública de São Paulo e Divisão de Controle de Armas e Explosivos (DAME) da Polícia Civil de Brasília. Brasil: as armas e as vítimas medidas semelhantes em 2001. É claro que este efeito em parte dependerá da eficácia da troca de informações entre o SINARM e os estados, bem como da habilidade da Polícia Federal em identificar e punir os proprietários que não renovarem suas permissões. Ao focar nas “castas privilegiadas armadas” ou seja, grupos que têm acesso mais fácil à compra de armas de fogo (militares, polícia, juízes, CAC) e cujas posses são controladas diretamente pelo Exército e não pela Polícia Federal; vemos que o grupo predominante em termos do número de armas é o dos policiais. Isto tem a ver com o “espírito” de ser um policial “24 horas por dia” (mesmo quando servem em turnos) e com o fato de que policiais fora de serviço são especificamente (e às vezes morbidamente) visados para assassinato nos casos de roubo à mão armada.39 Entre os CAC encontramos o fato perturbador de que o principal grupo é o de colecionadores, que podem ter grande número de armas de fogo de uso restrito em casa, e as vezes fuzis semi-automáticos. O grande risco aqui é a possibilidade de assalto e roubo de armas de tipo militar em perfeitas condições de uso. 2.2 Aonde estão as armas? Distribuição geográfica das armas de fogo no Brasil, por grupo de proprietários: Uma vez que estimamos quantas armas de fogo e quem as possui (por grupo), podemos ver como estas estão distribuídas em um país com 177 milhões de habitantes dos quais 23.908.303 são homens entre 15 e 29 anos (dentro do grupo de risco).40 Vejamos os mapas: Vemos uma importante concentração de armas de fogo (acima de 10 armas por 100 domicílios) nos estados que passaram por processos recentes de colonização, especialmente Rondônia, Amazonas, Roraima, Tocantins, Pará, Mato Grosso e Mato Grosso do Sul. Estes estados, a partir dos anos 70, receberam grandes contingentes de migrantes masculinos jovens vindos do Rio Grande do Sul, Paraná e Santa Catarina e também de estados do Nordeste (Bahia, Paraíba, Pernambuco e Ceará). Enquanto Mato Grosso e Mato Grosso do Sul sofreram uma expansão da fronteira agrícola, os demais estados mencionados receberam migrantes masculinos que foram trabalhar na extração (legal e ilegal) de madeira, ouro e pedras 39 Entrevistas com policiais estaduais e federais em atividade e aposentados. 40 Vale a pena lembrar que com o Estatuto, a idade legal para a posse é de 25 anos quando até dezembro de 2003 era 21 e, também, que soldados da polícia podem comprar armas desde a idade de 18 anos. Posse de Armas de Fogo no Brasil: Mapeamento das armas e seus proprietários 165 preciosas. Os migrantes levaram com eles a cultura gaúcha de armas característica do sul (principalmente do Rio Grande do Sul, aonde a criação de gado predomina) e a cultura de “macho” que caracteriza a vida dura dos camponeses nordestinos.41 São Paulo, Minas Gerais e Rio de Janeiro, por outro lado, são três estados densamente povoados com alta renda per capita, onde as classes média urbana e rural (como demonstra o estudo de caso de demanda) compraram armas de fogo em períodos de controles e regulação frouxos ou inexistentes. O caso de Brasília é muito especial: uma alta concentração de renda (basicamente funcionários públicos bem pagos) agentes de segurança pública e efetivos militares que também têm armas de fogo de uso privado. Os dados são apresentados por 100 domicílios. Como o país está passando por uma epidemia de violência, considerou-se que os domicílios seriam uma unidade útil para medir a propriedade privada de armas, já que uma arma leve possuída por uma pessoa do grupo familiar pode ser mal empregada por qualquer membro da família ou pode matar ou ferir quaisquer membros desta família. Mapa 3 Armas particulares por 100 domicílios (2003) por estado 41 166 Informação coletada em entrevistas por nosso pesquisador de campo. Brasil: as armas e as vítimas Mapa 4 Armas particulares legais por 100 domicílios (2003) por estado Mapa 5. Armas ilícitas (informal+criminal) por 100 domicílios (2003) por estado Posse de Armas de Fogo no Brasil: Mapeamento das armas e seus proprietários 167 Além das posses individuais por civis, também é preciso entender onde estão localizados os militares, a polícia e os seguranças particulares (com suas armas de fogo). Outro grupo importante é o CAC, especialmente no caso de colecionadores. A importância destes grupos de proprietários é que eles estocam uma grande quantidade de armas de fogo e munições, algumas vezes muito perto de áreas com forte presença do crime organizado, favorecendo o aparecimento de casos de corrupção e roubo. Fontes militares entrevistadas, por exemplo, manifestaram preocupação com o fato de recrutas que servem em bases militares na área metropolitana do Rio de Janeiro (onde há uma alta concentração de unidades militares) serem, na maioria das vezes, originários de favelas com forte presença do crime organizado. Estes jovens podem tanto se envolver com o roubo de armas e munições, como serem alistados ao final de seu serviço militar como soldados do tráfico, que são os membros armados das facções traficantes de drogas. Finalmente, compreender onde estão as armas de fogo da polícia é importante por causa da freqüente falta de treinamento adequado e do comum e propagado abuso de força letal por policiais no Brasil. Tabela 6. Distribuição das armas do CAC por região militar (2003) Fonte: ANEEX 2002 e 2003 168 Brasil: as armas e as vítimas Mapa 6 Guardas de segurança privada por 100 pessoas (por estado) Fonte: Polícia Federal. Gabinete da Coordenação Geral da Segurança Privada Mapa 7. Pessoal das policias militares e policias civis dos estados por 100 pessoas (2003) Fontes: Dados reunidos de secretarias de segurança pública estaduais Posse de Armas de Fogo no Brasil: Mapeamento das armas e seus proprietários 169 Mapa 8. Distribuição das armas de pequeno porte das Forças Armadas por 100 pessoas (por estado) Fontes: BMAS e IBGE/Análise ISER Repare que no mapa 8 acima os símbolos marcam municípios que abrigam ou Brigadas do Exército (cruzes), ou esquadrões da Aeronáutica (aviões) ou bases navais (barcos). A distribuição de brigadas, esquadrões e bases por cidade é mostrada na tabela 7 a seguir. 170 Brasil: as armas e as vítimas Tabela 7. Brigadas do Exército, Bases Navais e Esquadrões da Força Aérea Fonte: BMAS Em relação à questão do desvio e roubo de material militar para organizações criminosas, vale a pena notar as altas concentrações de bases militares no município do Rio de Janeiro. A maioria das bases logísticas e de material da Força Aérea estão no Rio de Janeiro, bem como a maioria das armas de fogo pertencentes à infantaria da Aeronáutica que guarda estas bases. Em 2004, foram comunicados dois episódios envolvendo o desvio de fuzis HK-33 e granadas de mão pertencenPosse de Armas de Fogo no Brasil: Mapeamento das armas e seus proprietários 171 tes à Aeronáutica. Os fuzileiros navais (uma força de elite) também têm suas principais bases e estabelecimentos no Rio de Janeiro, bem como a Brigada de Pára-quedistas do Exército, que é basicamente formada por recrutas do município. Prisões e apreensões envolvendo o roubo de armas de fuzileiros navais e do Exército também são comuns.42 Muitas destas bases ficam vizinhas a favelas controladas por organizações criminosas. 2.3. Olhando dentro dos estados e os grupos de proprietários Já estimamos como as armas de fogo estão distribuídas entre os estados do Brasil, quem são seus proprietários e quantas armas eles têm. Podemos ir além e perguntar como as armas de fogo estão distribuídas dentro de cada estado: são predominantes em áreas metropolitanas densamente povoadas ou em mãos de fazendeiros, trabalhadores rurais e camponeses em áreas rurais? Mais importante, que tipos de armas de fogo cada grupo possui? Todas as armas de fogo são letais, mas algumas, como pistolas e revólveres, são simples de esconder e assim mais facilmente utilizadas para fins criminosos e/ou transportadas. A potência e cadência de tiro também fazem diferença: os problemas de uma cidade grande com alta concentração de armas automáticas nas mãos de bandidos, são diferentes de uma cidade rural de porte médio na qual os ladrões usam revólveres e pistolas. O mesmo se aplica às armas institucionais: a polícia está equipada adequadamente no Brasil? É este tipo de perguntas que responderemos nesta seção. As informações apresentadas aqui combinam respostas a questionários e dados estatísticos das secretarias estaduais de segurança pública durante nossa pesquisa de campo, bem como respostas às entrevistas conduzidas por nosso pesquisador de campo. Como nem todos os estados responderam às perguntas relacionadas ao tipo de armas de fogo comumente registradas e apreendidas, decidimos apresentar uma análise caso a caso, destacando as semelhanças e as diferenças entre as diversas regiões do país. 2.3.1 Distribuição urbana e rural Abaixo apresentamos dados quantitativos ou qualitativos sobre a distribuição rural/metropolitana de armas de fogo registradas e/ou apreendidas e/ou portes de arma dos estados que os disponibilizaram (Tabela 8). 42 172 Ver: Grupo de Estudos de Defesa e Segurança Internacional (GEDES).2004. Observatório Cone Sul de Defesa e Forças Armadas, Informe Brasil, Números 120, 141 e 122 ,Universidade Estadual Paulista, Campus Franca, São Paulo. Brasil: as armas e as vítimas Tabela 8. Distribuição urbana/rural de armas particulares Fonte: Secretarias de Segurança Pública de diversos estados e entrevistas de campo. Em estados com muita criação de gado, tais como Rio Grande do Sul, Mato Grosso e Mato Grosso do Sul, um proprietário apenas pode possuir diversas armas de fogo para seus trabalhadores. Estas são áreas nas quais o roubo de gado através de fronteiras é extensivo e comum e é normal que os vaqueiros trabalhem armados. Esta situação leva a casos nos quais armas de fogo são compradas por proprietários rurais em países vizinhos (Uruguai e Bolívia) e depois transportadas através de fronteiras terrestres mal guardadas. Estas armas geralmente não são registradas. Então temos aqui uma situação de propriedade informal rural de Posse de Armas de Fogo no Brasil: Mapeamento das armas e seus proprietários 173 armas. Por outro lado, um tipo de demanda totalmente diferente aparece nos mercados informais de estados como o Rio de Janeiro e São Paulo.43 2.3.2 Quem tem o quê? Tipos de arma por grupo de proprietários Quais tipos de armas de fogo tem cada grupo de proprietários? Esta pergunta é relevante para avaliar o poder de fogo destas armas bem como para avaliar a adequação das políticas de escolha dos tipos de armas para as polícias. Propriedades Individuais Legais de Civis Apesar da maioria dos estados consultados ter fornecido o total de armas de fogo registradas e apreendidas, como mostrado na tabela 9 abaixo, apenas sete Secretarias de Segurança Pública responderam às perguntas relativas ao tipo e calibre das armas de fogo registradas. Tabela 9. Proporção de armas registradas por espécie e UF (informações disponíveis) Fonte: Secretarias estaduais de Segurança Pública 43 174 Entrevista com pesquisador de campo Luiz Carlos Carvalho Silveira. Ver também o capítulo de Benjamin Lessing sobre demanda no Rio de Janeiro. Brasil: as armas e as vítimas Estes dados mostram uma variação de região para região. Enquanto revólveres são o tipo predominante de arma na posse de indivíduos civis no Rio de Janeiro, isto não parece ser o caso nos estados mais rurais como o Rio Grande do Sul ou Mato Grosso. O último mostra uma distribuição mais equilibrada entre revólveres e espingardas. No Acre, predominam armas de cano longos (espingardas e carabinas). Há poucas informações sobre calibres e marcas. Os únicos estados que ofereceram informações confiáveis foram Rio de Janeiro, Sergipe, Ceará e Pernambuco. No entanto, dada a natureza fechada no mercado de armas de fogo no Brasil, é possível inferir as marcas dos diferentes tipos de armas de fogo de uso permitido (as permitidas a civis): • Revólveres Taurus e Rossi .38 e .32 (.38 é o calibre mais popular) • Pistolas Taurus .380 e 7.65 (7.65 é um calibre comum antes de 1980 quando a maioria das pistolas era importada já que a Taurus não as produzia antes deste ano). • Espingardas CBC, Boito e Urko em diversos calibres • Carabinas Rossi .38 Segurança Particular: Os tipos de armas de fogo que os guardas particulares são autorizados a usar depende do seu nível de treinamento. Guardas com treinamento básico podem usar ou um revólver .32 ou .38 ou uma carabina .38. Guardas com treinamento para escolta de transporte de valores podem usar revólveres .32 ou .38 ou pistolas 7.65mm ou .380 e uma arma longa que pode ser uma espingarda calibre .12 ou uma carabina .38. Guarda-costas (treinamento para segurança pessoal) podem carregar revólveres .32 ou .38 ou pistolas 7.65mm ou .380.44 Policiais e Militares para Uso Particular: Segundo a Legislação, este grupo pode escolher ter armas de porte de uso restrito ou de uso permitido em casa. Mas nenhuma destas armas pode ser automática. Segurança Pública:45 Até o final dos anos 90 a arma de porte mais comum, tanto para a polícia civil quanto para as corporações militares estaduais, era um revólver .38, apesar das 44 Polícia Federal. Gabinete da Coordenação Geral da Segurança Privada. Op.cit.. 45 Informações reunidas em pesquisa de campo e questionários Posse de Armas de Fogo no Brasil: Mapeamento das armas e seus proprietários 175 corporações de polícia militar muitas vezes comprarem pistolas Taurus 9mm (geralmente PT92) e revólveres .38. O material excedente era raramente ou nunca destruído. Armas de fogo antigas eram frequentemente estocadas para terem suas peças usadas para conserto de armas em funcionamento em serviço. Mas desde o final dos anos 90, com apoio federal, há um esforço pela padronização dos estoques policiais em todo o país. Todas as corporações policiais estaduais, mantendo a tradição de proteção ao mercado interno, estão substituindo seus antigos revólveres .38 e pistolas 9mm por pistolas Taurus calibre .40. A maioria dos policiais consultados declararam que, já que estas não são compatíveis com as novas armas incorporadas para a troca de peças, as armas antigas excedentes estão sendo sistematicamente enviadas ao Exército para serem destruídas. O Estatuto do Desarmamento determina que armas capturadas ou apreendidas não podem mais ser incorporadas ao patrimônio da polícia, uma situação que antes era comum. A partir de dezembro de 2003 armas apreendidas devem ser destruídas 48 horas após passarem por análise forense. A maior parte das armas de cano longo usadas pelas polícias estaduais são as espingardas de repetição de calibre 12, bem como as recentemente incorporadas carabinas Taurus .40 e, no caso de equipes de operações especiais, sub-metralhadoras. Fuzis de assalto geralmente são usados para a patrulha de fronteiras (em estados que têm fronteiras com outros países), em postos de controle das estradas (para serem usadas no caso de roubo de caminhões de carga) e em operações especiais (tais como libertação de reféns, etc.). No entanto, há exceções: no Rio de Janeiro e no Espírito Santo a polícia usa rifles de assalto (carabinas M-4 e FAL no Rio e FAL no Espírito Santo) para atividades rotineiras de polícia urbana. A polícia de Minas Gerais também está começando a aumentar o uso de novos fuzis MD97 de assalto em suas unidades de patrulha metropolitana. Os policiais alegam que este poder de fogo é necessário, porque as organizações criminosas nestas cidades também usam armas automáticas. Considerando que o treinamento médio policial estadual é fraco, carregar armas totalmente automáticas em áreas densamente povoadas pode representar mais uma ameaça do que um fator de proteção. No capítulo sobre a demanda por armas de fogo, são apresentadas evidências que sugerem que o uso de armas automáticas pela polícia pode ter contribuído para uma escalada na corrida armamentista entre facções de traficantes de drogas e forças estaduais. Agentes da Polícia Federal geralmente usam uma pistola 9mm ou .40 como arma de serviço e fuzis M16A2 e sub-metralhadoras MP-5 quando em operações especiais. 176 Brasil: as armas e as vítimas Forças Armadas:46 O fuzil padrão do Exército é o FAL 7.62mm fabricado pela IMBEL (ainda há FAL belgas em serviço), algumas versões 5.56mm do FAL foram fabricados pela IMBEL para unidades de infantaria ligeira (caçadores). Como mencionado no capítulo sobre produção, a IMBEL espera re-equipar o Exército ainda nesta década com fuzis MD97 5.56mm de produção recente. Armas de porte incluem: pistolas IMBEL 9mm e .45. Pequenas unidades de operações especiais podem usar carabinas M-4 e sub-metralhadoras MP-5. Os fuzileiros navais usam fuzil americanos M16A2 como seu rifle padrão. Antigos rifles IMBEL-FAL ainda estão em serviço para treinamento dos fuzileiros e no resto da Marinha para a proteção de navios e base. Armas de porte incluem: pistolas PT92 e Beretta 9mm. As equipes de operações especiais da Marinha usam sub-metralhadoras UZI, sub-metralhadoras MP-5 e carabinas M-4. A Aeronáutica usa fuzis G-3 e HK-33 comprados da Alemanha nos anos 70. Equipes de operações especiais usam sub-metralhadoras MP-5. A pistola Taurus PT92 é usada como arma de porte. Armas de Posse Ilícita: Um grande número de estados contribuiu com informações sobre o tipo de armas de fogo apreendidas, permitindo uma análise mais abrangente das armas de posse ilícita: 46 Entrevista com o Coronel Alte S. E. Zylberberg, Superintendente da Fábrica da IMBEL de Itajubá, Itajubá, 2 de maio de 2004 e entrevista com pessoa militar da ativa (fuzileiros navais e exército).Entrevista no Rio de Janeiro com o proprietário de uma firma que importa armas de fogo para órgãos policiais. Ver também Jane’s Infantry Weapons, National Inventories section. Posse de Armas de Fogo no Brasil: Mapeamento das armas e seus proprietários 177 178 Brasil: as armas e as vítimas Fonte: Secretarias estaduais de Segurança Pública Tabela 10. Armas apreendidas por espécie e UF Com a exceção do Acre (onde as espingardas também são predominantes como posse lícita), invariavelmente as armas de porte (revólveres seguidos por pistolas) são o tipo predominante de arma apreendida pela polícia. Apenas no Rio de Janeiro (1,6%) e no Pernambuco (1,2%), vemos uma proporção significativa de armas de fogo de tipo militar (fuzis e sub-metralhadoras). Que, no Rio de Janeiro, subiu para 3% nos anos 90.47 Nos demais estados as apreensões de armas de assalto não é significativa. Informações sobre marcas e fabricação só foram fornecidas por São Paulo e Rio de Janeiro: nos dois casos a apreensão de armas de fogo replica o mercado legal no que diz respeito às armas de fogo de uso permitido (revólveres Taurus .38 e Rossi e pistolas Taurus .380). Por outro lado, no Rio de Janeiro, o número de armas de fogo estrangeiras de uso restrito apreendidas pela polícia, é o dobro do número de armas de fogo nacionais de uso restrito.48 Armas de fogo de uso permitido podem ser compradas no comércio de armas, enquanto as de uso restrito só podem ser compradas diretamente da fábrica e apenas por órgãos policiais ou membros de CAC com a autorização do Exército. Assim, a presença de armas de uso restrito indica ou o desvio de armas de atores estatais, tráfico internacional de armas, ou ambos. O calibre restrito predominante é 9mm. Devido ao histórico controle leniente de armas de fogo de uso permitido e à predominância da indústria nacional, presumiremos aqui que a maioria dos revólveres e pistolas apreendidos nos demais estados também sejam brasileiros. 2.3.3 Comparando com vendas: As vendas de fábrica para lojas e depósitos de armas também podem ser tomadas como uma medida indireta do consumo e disponibilidade de armas de fogo em diferentes regiões do Brasil. Analisamos e mapeamos informações do ANEEX a respeito do uso de armas de fogo e munição de uso permitido. Esta informação foi apresentada em categorias gerais: armas de porte, armas de cano longo, cartuchos carregados à bala e cartuchos carregados à chumbo. Além de medir as vendas em geral para o varejo de armas como um indicador indireto da demanda, a informação por tipo de arma leve e munição também nos dá um indicador indireto do tipo de produto consumido por região. Mas as informações do ANEEX têm diversas limitações: 47 Ver o capítulo de Patricia Rivero sobre o mercado criminoso no Rio de Janeiro. 48 Análise dos dados da DFAE do Rio de Janeiro. As armas de fogo de uso restrito representaram 8.5% do total de apreensões na última década. Posse de Armas de Fogo no Brasil: Mapeamento das armas e seus proprietários 179 • O ANEEX só relaciona vendas ao mercado civil privado. Vendas a instituições policiais só estão disponíveis para 2000, 2001 e 2002. • Como no caso da informação do ANNEX sobre produção, verificamos vácuos de informação (sem vendas para determinados anos) que não foram claramente explicados pela fonte. Podem estar relacionados à sub-notificação ou simplesmente a erros no processo de inserção de dados no ANNEX. • Informações dadas por região militar e não por estado (o que fica abrandado no caso de regiões militares formadas por apenas um estado) • Os valores dos dados podem variar em proporção à eficiência no controle e procedimentos de notificação em cada região militar. • Empresas e indivíduos podem comprar armas nos estados onde os impostos e exigências para compras são menores. Este desvio não deve ser importante considerando que o único estado com maiores exigências e impostos sobre a compra de armas de fogo é o Rio de Janeiro, e só a partir de 200149. As informações do ANNEX são usadas aqui mais como um indicador indireto para verificar e confirmar tendências identificadas na análise de informações da polícia a respeito do registro e apreensões de armas de fogo, do que como um indicador direto da disponibilidade de armas de fogo. Nos mapas abaixo as cruzes brancas indicam as localizações das principais fábricas de armas e munições de pequeno porte. 49 180 Fontes da DFAE entrevistadas declararam que depois de 2001, por exemplo, empresas de segurança privada começaram a comprar suas armas e munições no Paraná, que tem uma maior concentração de lojas e não tem altos impostos sobre a venda de armas de fogo. Brasil: as armas e as vítimas Mapa 9. Vendas (da fábrica para o comércio especializado) de armas de uso permitido por 1000 domicílios 1968-1976 (por região militar) Fonte: ANEEX Mapa 10. Vendas (da fábrica para o comércio especializado) de armas de uso permitido por 1000 domicílios 1977 – 1985 (por região militar) Fonte: ANEEX Posse de Armas de Fogo no Brasil: Mapeamento das armas e seus proprietários 181 Mapa 11. Vendas (da fábrica para o comércio especializado) de armas de uso permitido por 1000 domicílios 1986-1994 (por região militar) Fonte: ANEEX Mapa 12. Vendas (da fábrica para o comércio especializado) de armas de uso permitido por 1000 domicílios 1995-2003 (por região militar) 182 Brasil: as armas e as vítimas Mapa 13. Vendas de munição por domicílio 1968-1976 (por região militar) Fonte: ANEEX Mapa 14: Vendas de munição por domicílio de 1977-1985 (por região militar) Fonte: ANEEX Posse de Armas de Fogo no Brasil: Mapeamento das armas e seus proprietários 183 Mapa 15. Vendas de munição por domicílio 1986 – 1994 (por região militar) Fonte: ANEEX Mapa 16. Vendas de munição por domicílio 1995-2003 (por região militar)50 Fonte: ANEEX 184 Brasil: as armas e as vítimas O que vemos nos mapas acima é a distribuição da venda de armas de fogo e munições por região militar (da fábrica aos depósitos e comércio de armas) em quatro períodos diferentes abrangidos por este estudo: 1968-1976, 1977-1985, 1986-1994 e 1995-2003. Este último período também ilustra (marcada em pontos pretos) a distribuição de depósitos e lojas de armas em 2002. Em todos os mapas, fábricas relevantes de armas de fogo e de munição estão marcadas com cruzes brancas dentro de círculos. Os dados sobre armas de fogo estão distribuídos (usando dados do IBGE) por 1.000 domicílios e, no caso das munições, por 100 domicílios. O que vemos nestes mapas confirma a tendência mostrada nos mapas da posse de armas: ao norte e oeste do país, a venda de armas de fogo e munições parece seguir a trilha da ocupação da bacia amazônica, bem como a expansão da fronteira agrícola do Mato Grosso e Mato Grosso do Sul. Por outro lado, as vendas também estão concentradas nos estados que tradicionalmente consomem armas como o Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paraná. As vendas também são proporcionalmente altas em São Paulo, o estado mais rico e populoso. Verificamos uma queda na venda de armas de fogo entre 1995-2003 que provavelmente é devida ao aumento das exigências para a compra e registro de armas de fogo pela lei do SINARM de 1997. Porém, esta queda não é constatada no Rio Grande do Sul. Neste estado as vendas subiram de 186,3 armas por 1.000 domicílios em 1986-1994, para 276,5 armas por 1.000 domicílios no período 1995-2003. No entanto, quando olhamos detalhadamente as vendas no Rio Grande do Sul neste período, é possível constatar (como mostra o gráfico 8) que em 1996 (um ano antes da lei SINARM), a venda foi 20 vezes maior que a média dos outros anos. Depois, seguindo a tendência nacional caem abruptamente. 50 ANEEX não fornece dados de vendas de munição para 2003. Para este ano usamos a estimativa conservadora de projetar a venda do ano anterior. Posse de Armas de Fogo no Brasil: Mapeamento das armas e seus proprietários 185 Gráfico 8. Venda (para o comércio especializado) de armas de uso permitido Fonte: ANEEX Esta tendência se confirma pelos dados de registro e licença de porte da Polícia Civil do Rio Grande do Sul mostrados abaixo:51 Gráfico 9. Rio Grande do Sul: Armas de fogo registradas por delegacia de polícia regional 1990 / 2003 51 186 Diferentemente dos totais usados para calcular o número de posses no Rio Grande do Sul, estes dados incluem renovações e transferências. Brasil: as armas e as vítimas Gráfico 10 .Rio Grande do Sul: Porte de Armas de fogo autorizados por delegacia de polícia regional 1990 / 2003 DAME: divisão de armas de fogo (escritório de Porto Alegre). DPI – delegacias policiais em áreas rurais, DPM = delegacias policiais na área metropolitana de Porto Alegre. Parece plausível que o Estatuto do Desarmamento causará uma queda ainda maior nas compras e registros de armas de fogo. Não vemos uma queda semelhante na venda de munição. Isto sinaliza que a mesma ênfase deve ser dada à venda de munição ao se analisar e planejar políticas de controle de armas de fogo. Em algumas regiões tais como a 12ª e a 9ª (estados do Acre, Mato Grosso e Mato Grosso do Sul) a proporção de vendas de armas de fogo e munição por 1000 domicílios e por domicílio é alta. No entanto, quando vemos o tipo de armas de fogo e munição encontramos uma maioria de armas de cano longo (apenas rifles de caça e espingardas são permitidos a civis) e munição para espingardas a chumbo. Estes são os estados nos quais as armas de fogo estão concentradas em áreas rurais ermos. Nas regiões sudeste e nordeste do país encontramos uma predominância clara na venda de armas portáteis e cartuchos a balas. Ver tabela 11 a seguir. Posse de Armas de Fogo no Brasil: Mapeamento das armas e seus proprietários 187 188 Brasil: as armas e as vítimas Fonte: ANNEX Tabela 11 Vendas (da fábrica para o comercio especializado) de armas e munição por tipo geral e região militar 3. Conclusão Como tantos outros fatores socioeconômicos, a posse de armas de fogo é extremamente heterogênea nos diversos estados e regiões do Brasil. A falta de registro e controle adequados estão em toda parte, mas se manifestam de formas diferentes: desde o revólver .38 sem registro que acaba nas mãos de bandidos em uma favela de São Paulo ou do Rio de Janeiro, até o rifle ou espingarda sem registro em uma propriedade rural do estado em Mato Grosso ou no Rio Grande do Sul ou a espingarda usada para patrulhar minas de ouro ilegais em Rondônia. Assim, o problema das armas de fogo não pode ser analisado através de um único ponto de vista. Realidades locais e regionais devem ser consideradas para que políticas adequadas de controle sejam propostas. Mas mesmo assim, no final das contas, estas realidades estão conectadas através do país como um todo, e são sujeitas à influência de instituições e legislação nacionais. Sabendo para onde vão as armas de fogo, qual o seu estado legal e quais grupos as possuem, é um primeiro passo para a implementação eficiente de controles e legislação para armas de fogo. Isto tem suprema importância em um país no qual vemos que 50% das armas estão em situação ilícita (seja criminal ou informal) e estima-se que cerca de 27% do universo das armas de fogo seja informal e assim mais propenso a ser desviado para circuitos criminosos. Posse de Armas de Fogo no Brasil: Mapeamento das armas e seus proprietários 189 Anexo – Questionários utilizados durante a pesquisa de campo Questionário 1 sobre estoques de armas de fogo e munições: Armas registradas e portes 1) Quantas armas de fogo foram registradas por pessoas físicas desde a época em que começou o registro de armas no o seu Estado? São registros de armas novas, ou incluem renovação de registros de armas previamente registradas? (para evitar duplicação) Fornecer informações sobre a “espécie” das armas (por exemplo: revólver, pistola, espingarda, fuzil, garrucha, submetralhadora, etc.) e do calibre. 2) Quantas armas de fogo foram registradas por pessoas jurídicas desde a época em que começou o registro de armas no o seu Estado? (especificar por ano). São registros de armas novas, ou incluem renovação de registros de armas previamente registradas? (para evitar duplicação) Fornecer dados da “espécie” das armas (por exemplo: revólver, pistola, espingarda, fuzil, garrucha, submetralhadora, etc.) e do calibre. 3) Mesmas perguntas que 1 e 2 mas referente à autorizações de porte de arma. Diferenciar entre porte para pessoas jurídicas, porte para pessoas físicas civis, porte para pessoas físicas militares ou policiais (em atividade ou reformados). 4) Antes da nova lei (Estatuto do Desarmamento), no seu Estado, quais eram os órgãos públicos estaduais encarregados do: registro e autorização de porte de arma? 5) Que quantidade de munição e apreendida anualmente no o seu Estado? Quais são os calibres e marcas que predominam? Quais são as regiões do Estado com maior apreensão de munição? 6) O Estado celebrou convênios de cooperação com o SINARM (Sistema Nacional de Armas do DPF) para o registro de armas de fogo segundo o estipulado no artigo 22 da Lei 10826 ( Estatuto do Desarmamento)? Em caso positivo, qual o órgão estadual que registra as armas e concede autorização de porte? 7) Como tem mudado o procedimento de registro/autorização de porte de armas desde a implementação do Estatuto? Se ainda não houve mudança, que mudança está por vir nesse sentido? 190 Brasil: as armas e as vítimas 8) Existe uma base de dados centralizada de armas registradas e portes concedidos no Estado inteiro? A informação de na base de dados e disponível para público em geral? 9) Qual é a localidade (rural e urbana) com maior número de registros e/ou pedidos de porte? Armas apreendidas e acauteladas: 1) Qual tem sido o número total ao longo do tempo de armas de fogo apreendidas no o seu Estado? Poderia dar uma serie histórica (ano por ano)? 2) Quais as espécies e calibres dessas armas? 3) Quantas armas do patrimônio público estadual são aproximadamente perdidas, furtadas ou roubadas por ano do patrimônio público estadual. 4) Qual e quantidade aproximada de munição apreendida por ano no o seu Estado? 5) Qual o órgão encarregado do acautelamento das armas apreendidas no Estado? 6) Qual e o percurso seguido pelas armas e munições apreendidas desde o momento de apreensão? 7) Tem uma base de dados centralizada de armas apreendidas no Estado inteiro? A informação na base de dados e disponíveis para o público em geral? 8) Qual é a localidade (rural e urbana) com maior incidência de apreensão? 9) Existe um depósito central estadual de armas e munições apreendidas? Se a resposta é sim, quem administra esse depósito e quantas armas existem atualmente acauteladas nesse depósito? 10) Caso a resposta para a pergunta 9 seja negativa, onde são acauteladas as armas apreendidas? 11) Como tem mudado o procedimento de acautelamento de armas desde a implementação do Estatuto? Se ainda não houve uma mudança, que mudança está por vir nesse sentido? Posse de Armas de Fogo no Brasil: Mapeamento das armas e seus proprietários 191 Gerenciamento e segurança das armas do patrimônio do Estado: A) Policia Civil: 1) Em referência às armas do patrimônio público estadual: (a) Qual o efetivo da Polícia Civil? (b) Quantas armas o policial usa quando em serviço?(c) Quantos turnos têm cada uma dessas polícias? 2) Existem calibres, espécies, modelos e marcas padronizados para as armas utilizadas pelos órgãos policiais do seu Estado? Qual e o critério adotado para as? a) armas longas b) armas curtas 3) Existem procedimentos e/ou regulamentos padronizados para a identificação (marcação) é segurança dos estoques e inventários do patrimônio desta instituição? 4) Qual é o procedimento seguido para a perícia oficial de armas do patrimônio da Policia Civil envolvidos em troca de tiros? Existe um depósito oficial para essas armas? B) Policia Militar 5) Em referência às armas do patrimônio público estadual: (a) Qual o efetivo da Polícia Militar? (b) Quantas armas o policial usa quando em serviço?; (c) Quantos turnos têm cada uma dessas polícias? 6) Existem calibres, espécies, modelos e marcas padronizados para as armas utilizadas pela Policia Militar ? Qual e o critério adotado para as: a) armas longas b) armas curtas 7) Existem procedimentos e/ou regulamentos padronizados para a identificação é segurança dos estoques e inventários do patrimônio da Policia Militar? 8) Qual é o procedimento seguido para a perícia oficial de armas do patrimônio da Policia Militar envolvidos em troca de tiros? Existe um depósito oficial para essas armas? C) Outros organismos/agentes estaduais 9) Estimativa das armas distribuídas pela segurança pública a funcionários do Judiciário, Ministério Público e Poder Legislativo? 192 Brasil: as armas e as vítimas 10) Existem calibres, espécies, modelos e marcas padronizados para essas armas? Qual e o critério adotado para as? a) armas longas b) armas curtas 11) Existem procedimentos e/ou regulamentos padronizados para a identificação (marcação) e para a segurança dos estoques e inventários do patrimônio do Estado? 12) Qual é o procedimento seguido para a perícia oficial de armas do patrimônio do Estado envolvidos em troca de tiros? Existe um depósito oficial para essas armas? Questionário 2 Políticas, leis, compras e excedentes: 1) A partir de qual ano começou o registro de armas no Estado? 2) Qual é o nº de lojas de armas e munição no Estado? Fazendo a comparação com uma década atrás é maior ou menor? 3) O seu Estado tem alguma lei Estadual referente ao controle da venda de armas, como o caso do Rio de Janeiro? 4) Se a resposta anterior for afirmativa, poderia tirar uma cópia e nos mandar? Caso contrário, poderia nos dar o número da lei para procurarmos no Diário Oficial? 5) Caso tenha lei estadual, a lei alterou ou não a disponibilidade de armas? 6) A sua instituição está comprando novas armas? 7) Planejam em curto prazo comprar uma arma para cada policial? 8) Para que órgãos serão enviadas as armas velhas? Perguntas específicas para a polícia militar: 1) Estão comprando novas armas? 2) Planejam em curto prazo comprar uma arma para cada policial? 3) Para que órgãos serão enviadas as armas velhas? Posse de Armas de Fogo no Brasil: Mapeamento das armas e seus proprietários 193 Bibliografia Fontes publicadas: “Segurança para os policiais: R$ 287,5 milhões investidos em equipamentos e tecnologia”, Jornal da Polícia do Estado do Rio de Janeiro, Novembro 2004, p.4 Arruda, Leonardo (1999), “Entrevista à Revista Época (Não Publicada)”, O Correio do Cidadão, Nº 76, http://www.armaria.com.br/corr_cid/correio076.htm Cano, Ignacio (1997). 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Entrevistas com pessoal ativo e aposentado das três forças armadas, Rio de Janeiro, janeiro –fevereiro 2005. Entrevistas com policiais civis, militares e federais aposentados e na ativa, Rio de Janeiro, janeiro de 2005. Entrevista com o Coronel (R/1) Eng. Mil. Alte S.E. Zylberberg, Superintendente da Fábrica Itajubá (Indústria de Material Bélico do Brasil, IMBEL), Itajubá, May 4, 2004. Posse de Armas de Fogo no Brasil: Mapeamento das armas e seus proprietários 195 Estatísticas de armas registradas e apreendidas entregues as secretarias de segurança pública das 27 unidades federais. Respostas das policias estaduais aos questionários entregues durante a pesquisa de campo (ver anexos) PABLO DREYFUS E MARCELO DE SOUSA NASCIMENTO Pablo Dreyfus é o Coordenador de Pesquisa do Projeto de Controle de Armas de Fogo no Viva Rio/ISER e Marcelo de Sousa Nascimento é o Coordenador de Estatística do ISER. Texto original em inglês. Tradução: Patricia Kranz 196 Brasil: as armas e as vítimas