Informe nacional sobre áreas protegidas no Brasil

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Informe nacional sobre áreas protegidas no Brasil
República Federativa do Brasil
Presidente: Luiz Inácio Lula da Silva
Vice-Presidente: José Alencar Gomes da Silva
Ministério do Meio Ambiente
Ministra: Marina Silva
Secretário Executivo: João Paulo Ribeiro Capobianco
Secretaria de Biodiversidade e Florestas
Secretária: Maria Cecília Wey de Brito
Departamento de Áreas Protegidas
Diretor: Maurício Mercadante
Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade
Presidente:
João Paulo Ribeiro Capobianco
Diretor de Unidades de Conservação de Proteção Integral:
Marcelo Françoso
Diretor de Conservação da Biodiversidade:
Rômulo José Fernandes Barreto Mello
Diretor de Unidades de Conservação de Uso Sustentável e Populações
Tradicionais:
Paulo Henrique Borges de Oliveira Junior
Ministério do Meio Ambiente
Secretaria de Biodiversidade e Florestas
Departamento de Áreas Protegidas
Informe Nacional
sobre Áreas
Protegidas no Brasil
Série Áreas Protegidas do Brasil, 5
Brasília
2007
Coordenação
Departamento de Áreas Protegidas
Projeto Gráfico
Ana Flora Caminha e Ângela Ester Magalhães Duarte
Mapas
Renato Prado e Walda Veloso
Fotos
André Stella, Carlos Terrana, Enrico Marone, Ferderico Genésio, Glauco
João Paulo Ribeiro Capobianco, Jefferson Rudy, José Sabino, Leo
Francini, Marcelo Neiva de Amorim, Maria Carolina Hazin, Miguel von
Beher, Sandra Magalhães, Wigold B. Schäffer.
Edição e redação
Marco Antonio Gonçalves
I96
Catalogação na fonte
Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis
Informe nacional sobre áreas protegidas no Brasil / Ministério do Meio Ambiente,
Secretaria de Biodiversidade e Florestas, Departamento de Áreas Protegidas. –
Brasília: MMA, 2007
124p. ; 29 cm. (Serie Áreas Protegidas de Brasil, 5)
ISBN 978-85-7738-087-9
1. Área Protegida – Brasil. 2. Gestão ambiental. I. Ministério do Meio Ambiente.
II. Secretaria de Biodiversidade e Florestas. III. Título. IV. Série.
CDU (2.ed.)502.4
Informe Nacional
sobre Áreas
Protegidas no Brasil
Série Áreas Protegidas do Brasil, 5
Série Áreas Protegidas do Brasil, 5
Pessoas que colaboraram com informações e sugestões para esse
documento:
Alexandre Martinez (CNRPPN), Ana Lúcia Chagas (Instituto Chico Mendes),
Ana Paula Prates (MMA), Analuce Freitas (TNC), Andréa Zarattini (Instituto
Chico Mendes), Bóris Alexandre César (Instituto Chico Mendes), Camila
Rodrigues (MMA), Cecília Manavella (MMA), Danielle Calandino (MMA),
Érika Fernandes-Pinto (Instituto Chico Mendes), Fabiana Regina P. Santos
(MMA), Fabio França Araújo (MMA), Fany Ricardo (ISA), Iara Vasco
(FUNAI), Iolita Bampi (Instituto Chico Mendes), José Geraldo de Araújo
(Instituto Chico Mendes), Maria da Glória Brito Abaurre (ABEMA/Governo
do Estado do Espírito Santo), Maria da Penha Padovan (INCAPER), Maria
Janete Carvalho (FUNAI), Juliana Sellani (Funai), Larissa Godoy (MMA),
Marcos Reis Rosa, Maria Carolina Hazin (MMA), Marco Antônio Salgado
(MMA), Maurício Mercadante (MMA), Michele de Sá Dechoum (Governo
do Estado do Espírito Santo), Nurit Bensusan (IIEB), Pedro Eymard C. Melo
(Instituto Chico Mendes), Renata Pires Lima (MMA), Sara Mota (IBAMA),
Sumário
Apresentação.............................................................................. 09
1 - Evolução conceitual de Santa Marta a Durban
1.1 - De Santa Marta a Durban...................................................... 13
1.2 - Convenção de Ramsar e avanços na conservação
de zonas úmidas........................................................................... 17
2 - Marco político, normativo e de contexto nacional
2.1 - Marco político atual para as áreas protegidas..........................
2.1.1 - O Sistema Nacional de Unidades de
Conservação da Natureza (SNUC).................................................
2.1.2 - O Plano Estratégico Nacional de Áreas
Protegidas (PNAP).......................................................................
2.1.3 - O Instituto Chico Mendes de Conservação
da Biodiversidade........................................................................
2.1.4 - As áreas protegidas no contexto da integração
continental.................................................................................
2.1.4.1 - Plano Estratégico da OTCA.............................................
2.1.4.2 - Estratégia de Biodiversidade do Mercosul..........................
2.2 - Marco legal para as áreas protegidas......................................
2.3 - Integração das áreas protegidas a planos
de desenvolvimento nacional.........................................................
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3 - Estado atual da política nacional de áreas protegidas
3.1 - Estrutura do Sistema Nacional de Unidades
de Conservação da Natureza..........................................................
3.1.1 – Principais desafios para a implementação do SNUC.............
3.2 - Incremento de áreas protegidas..............................................
3.2.1 - Áreas prioritárias para a conservação da
biodiversidade e análise de lacunas de representatividade.................
3.2.2 - Incremento das unidades de conservação
entre 1997 e 2007.....................................................................
3.2.3 - Incremento de terras indígenas entre 1997 e 2007..............
3.3 - Equivalência entre as categorias de manejo
do SNUC e da IUCN....................................................................
3.4 - Demarcação física e regularização fundiária
das áreas protegidas.....................................................................
3.4.1 - Consolidação territorial das unidades de conservação
federais......................................................................................
3.4.2 - Demarcação física das terras indígenas................................
3.5 - Áreas protegidas privadas......................................................
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3.6 - Experiências de manejo comunitário de áreas
protegidas - diversidade cultural e biológica.....................................
3.6.1 – Manejo comunitário de ecossistemas em unidades
de conservação.............................................................................
3.6.2 – Manejo comunitário em terras indígenas..............................
3.7 - Ameaças ao Sistema e às áreas protegidas..............................
3.7.1 - Mineração em áreas protegidas...........................................
3.8 - Conectividade entre áreas protegidas.......................................
3.8.1 - Corredor Ecológico do Paranã-Pirineus.................................
3.8.2 - Projeto Corredores Ecológicos..............................................
3.8.3 - Reservas da Biosfera..........................................................
3.8.4 - Programa Sítios do Patrimônio Mundial Natural....................
3.8.5 - Mosaicos de unidades de conservação e integração
de ecossistemas terrestres e marinhos............................................
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4 - Manejo de Áreas Protegidas
4.1 - Proteção e controle das áreas protegidas.................................
4.1.1 – Proteção e controle de unidades de conservação federais.......
4.1.2 - Proteção e fiscalização nas terras indígenas..........................
4.2 - Análise de efetividade de gestão das unidades
de conservação.............................................................................
4.2.1 - Análise de efetividade de gestão das unidades
de conservação federais.................................................................
4.2.2 - Análise de efetividade de gestão das unidades
de conservação do Programa Arpa..................................................
4.2.3 – Análise de efetividade das unidades de conservação
do estado de São Paulo..................................................................
4.2.4 – Análise de efetividade das unidades de conservação
do estado do Espírito Santo............................................................
4.3 - Planos nacionais e planos diretores.........................................
4.4 - Planos de manejo de unidades de conservação federais............
4.5 - Planos de pesquisa em áreas protegidas..................................
4.6 - Planos de aproveitamento de recursos naturais
em áreas protegidas.......................................................................
4.7 - Uso público e outros planos definidos no país..........................
4.7.1 – Evolução na política de turismo em unidades
de conservação no Brasil................................................................
4.7.2 – Situação atual e iniciativas para aprimorar a gestão
do turismo em Parques Nacionais...................................................
4.7.3 – Turismo em unidades de conservação
de uso sustentável federais.............................................................
4.7.4 – Turismo em terras indígenas...............................................
4.7.5 - Visitação pública em unidades de conservação estaduais.......
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5 - Sustentabilidade das áreas protegidas
5.1 - Administração das unidades de conservação federais................ 101
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5.2 - Fortalecimento de capacidades para a administração
das áreas protegidas..................................................................... 103
5.3 – Financiamento para as áreas protegidas................................. 104
5.3.1 - Orçamento governamental para as unidades
de conservação federais................................................................ 104
5.3.2 - Orçamento governamental para as terras indígenas............... 106
5.4 - Planos de sustentabilidade financeira..................................... 107
5.5 - Cooperação financeira e assistência técnica internacional
para as áreas protegidas................................................................ 110
5.5.1 – O Programa Áreas Protegidas da Amazônia (Arpa)................ 110
5.5.2 - Programa Piloto para a Proteção das Florestas
Tropicais do Brasil........................................................................ 113
5.5.2.1 – Subprograma Mata Atlântica........................................... 114
5.5.2.2 - Subprograma Projetos Demonstrativos (PDA).................... 114
5.5.2.3 - Projeto Integrado de Proteção às Populações
e Terras Indígenas da Amazônia Legal (PPTAL)................................ 115
5.5.2.4 – Projetos Demonstrativos dos Povos Indígenas (PDPI)......... 115
5.5.3 – Outros projetos apoiados pela cooperação internacional........ 116
Fontes cartográficas e bibliográficas.............................................. 119
Siglas utilizadas neste documento................................................. 123
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Apresentação
O ano de 2007 marca não apenas os 10 anos da realização do I Congresso
Latino-Americano de Parques e Outras Áreas Protegidas, realizado em Santa
Marta, na Colômbia, mas também o aniversário de 70 anos de criação do
primeiro parque nacional do Brasil – o Parque Nacional do Itatiaia, na
região Sudeste do país, no bioma Mata Atlântica. A década transcorrida
permitiu ao Brasil chegar ao II Congresso Latino Americano de Parques e
Outras Áreas Protegidas em condições de exibir avanços significativos na
política nacional de conservação, segundo as premissas postuladas pela
Convenção de Diversidade Biológica e seu Programa de Trabalho para
Áreas Protegidas, dos quais o Brasil é parte atuante.
De fato, foi nesse período que o país instituiu o Sistema Nacional de Unidades
de Conservação da Natureza (SNUC), marco inicial para o planejamento
consistente da conservação, sob uma abordagem ecossistêmica. O SNUC
consolidou uma nova atitude do Estado na relação com a sociedade no
âmbito da conservação da natureza, criando uma série de mecanismos que
asseguram maior participação pública no processo de criação e gestão das
áreas protegidas.
Esse novo marco legal possibilitou, na última década, um incremento
histórico na área do país destinada à conservação. Até 1997, haviam
sido criadas 345 unidades de diferentes categorias, que protegiam
aproximadamente 47,5 milhões de hectares dos ecossistemas brasileiros.
Em março de 2007, o país contabilizava 596 unidades de conservação, ou
99,7 milhões de hectares protegidos – um incremento de mais de 100%.
Quando somados a essa área os 575 mil hectares de reservas privadas
existentes, a superfície do território brasileiro protegida por unidades de
conservação ultrapassa 100 milhões de hectares. Além disso, o governo
federal, com a aprovação, em 2006, do Plano Estratégico Nacional de
Áreas Protegidas, passou a reconhecer a importância das terras indígenas
- que somam mais 105 milhões de hectares -, para a conservação da
biodiversidade e vem trabalhando para fortalecer a integração dessas terras
ao planejamento e à gestão da conservação no Brasil.
Ao lado do incremento da área destinada à conservação, o Brasil empreendeu
ações para aprimorar a gestão do SNUC. Foram realizados os primeiros
estudos para dar base técnica e científica à conservação, que identificaram
as áreas prioritárias para a conservação e o uso sustentável da biodiversidade
– trabalho que, inclusive, permitiu identificar as lacunas de conservação e
aprimorar o planejamento para a expansão futura do Sistema. Investimentos
crescentes têm sido feitos, por meio de programas nacionais e de outros
apoiados pela cooperação internacional, para aprimorar as condições de
13
manejo das unidades existentes. E, em 2007, a gestão das unidades de
conservação federais passou a ser responsabilidade de um órgão próprio, o
Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade.
Esse esforço empreendido pelo Brasil, descrito em detalhes ao longo deste
Informe Nacional sobre Áreas Protegidas, produzido sob a coordenação do
Ministério do Meio Ambiente, representa uma contribuição relevante ao
objetivo de instituir uma rede mundial de áreas protegidas, integrada por
sistemas nacionais e regionais eficazmente administrados e ecologicamente
representativos, como propugnado pelo Programa de Trabalho para Áreas
Protegidas da CDB. Porém, como também poderá ser constatada nessa
publicação, há pela frente enormes desafios a serem enfrentados para
alcançar um nível adequado de gestão das áreas protegidas no Brasil.
Conscientes da importância das áreas protegidas para o desenvolvimento
nacional e o enfrentamento de problemas globais como as mudanças
climáticas, estamos trabalhando para dar nossa contribuição para a
melhoria das condições de vida no país, no continente e no planeta.
Mauricio Mercadante
Diretor de Áreas Protegidas / MMA
14
Brasil: divisão política, biomas e Amazônia Legal
15
1 - Evolução conceitual de Santa Marta a Durban
1.1 - De Santa Marta a Durban
O primeiro Congresso Latino-Americano de Parques e Outras Áreas
Protegidas, ocorrido em 1997 em Santa Marta, Colômbia, foi marcado
por um compromisso dos participantes em prover a proteção de 10%
de seus territórios nacionais por meio de áreas protegidas. No Brasil, o
simples estabelecimento de uma meta percentual, apesar de servir como
referência geral para a sociedade e como marco para catalisar esforços
destinados à conservação, recebeu muitas críticas, tendo sido considerado
insuficiente como medida para orientar a política nacional e permitir o
estabelecimento de prioridades para a conservação da natureza. De fato, nos
anos seguintes, a definição de metas evoluiu da fixação de um percentual
do território nacional a ser protegido para a adoção de uma “abordagem
ecossistêmica” e a utilização de metodologias de planejamento sistemático
da conservação, com o estabelecimento de alvos prioritários, considerando
espécies e ambientes específicos, e integração entre diferentes categorias
de áreas protegidas.
Essa mudança de enfoque no âmbito das políticas de conservação marcou
o quinto Congresso Mundial de Parques Nacionais da IUCN, que teve lugar
em Durban, África do Sul, em 2003. O encontro, realizado sob o tema
“Benefícios além das fronteiras”, pôs em discussão a importância das
áreas protegidas como parte das políticas de desenvolvimento sustentável
dos países. Nessa ocasião, os participantes reconheceram que as áreas
protegidas não poderiam mais ser concebidas como um espaço isolado
da realidade social e econômica circundante. Ao contrário, as políticas de
conservação dos países deveriam empreender esforços para que as áreas
protegidas fossem parte de programas de desenvolvimento sustentável e
de preservação da biodiversidade, buscando agregar a participação social
e o desenvolvimento local como condições para o sucesso do esforço de
conservação.
Ao mesmo tempo, ao vincular as áreas protegidas a compromissos
assumidos pelos países no âmbito da Cúpula Mundial da ONU sobre
Desenvolvimento Sustentável (Johanesburgo, 2002), dos Objetivos de
Desenvolvimento do Milênio e da CDB, os participantes do Congresso de
Durban enfatizaram a necessidade de incluir o combate à pobreza entre
as preocupações dos responsáveis pelas políticas de conservação dos
países – relação enfatizada, inclusive, pela Decisão VII/28, que definiu o
Programa de Trabalho para Áreas Protegidas da CDB. Nesse sentido, Durban
reconheceu que, no passado, os executores das políticas de conservação
não se comprometeram o suficiente com as comunidades cujos interesses
foram afetados pela criação dessas áreas.
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Enfatizando o nexo entre preservação da diversidade biológica e a promoção
do desenvolvimento sustentável, o Plano de Ação de Durban estabeleceu
ações, desde o nível internacional ao nacional e local, a serem empreendidas
pelos países, destacando metas-chaves que permitissem avaliar e informar
sobre os progressos realizados. No Quadro 1, destacamos de forma sucinta
as metas do Plano de Ação que têm recebido maior atenção do Brasil.
Quadro 1 - Avanços segundo o Plano de Ação de Durban
Meta-chave 1: Ação de medidas específicas para melhorar
a contribuição das áreas protegidas para a conservação da
diversidade biológica.
O Programa de Trabalho da CDB, aprovado na COP 7 (Kuala
Lumpur, Malásia), foi adotado pelo país, que apoiou ativamente
sua aprovação, defendendo inclusive a necessidade de definir
recursos financeiros adicionais suficientes para financiá-lo.
Como conseqüência, o Brasil formulou o Plano Estratégico
Nacional de Áreas Protegidas (PNAP), aprovado em abril de
2006 (ver item 2.1.2).
Meta-chave 3: serão adotadas medidas para que as áreas
protegidas contribuam para reduzir a pobreza e que de forma
alguma a agrave.
A criação e estruturação de unidades de conservação de uso
sustentável no período e programas destinados a ordenar o
uso dos recursos naturais, pacificando conflitos pelo acesso
a tais recursos, têm como um de seus objetivos melhorar a
produtividade de populações locais de forma conjugada à
conservação da biodiversidade. Produtores que vivem em
Reservas Extrativistas foram reconhecidos como beneficiários
do Programa Nacional de Reforma Agrária, passando a ter
acesso a créditos de programas federais. Ao mesmo tempo,
iniciativas recentes do governo brasileiro destinadas a estruturar
25 Parques Nacionais têm como entre seus objetivos fomentar
o desenvolvimento local, integrando populações do entorno aos
serviços prestados aos ecoturistas (ver item 4.7.2).
Meta-chave 4: até 2010, será estabelecido um sistema de áreas
protegidas que seja representativo de todos os ecossistemas
do mundo.
Entre 2005 e 2006, o Ministério do Meio Ambiente coordenou
um trabalho de atualização dos estudos para o estabelecimento
de áreas prioritárias para a conservação e utilização sustentável
da diversidade biológica brasileira (leia mais no item 3.2.1).
Nos últimos quatro anos foram criados 20 milhões de hectares
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de novas unidades de conservação em quase todos os biomas
brasileiros, alguns dos quais extremamente ameaçados, casos
da Mata Atlântica e do Cerrado.
Meta-chave 5: até 2010, todas as áreas protegidas estarão
conectadas em sistemas ecológicos/ambientais terrestres e
marinhos mais amplos.
A integração de áreas terrestres e marinhas por meio de um
sistema de áreas protegidas está contemplada como um dos
objetivos do PNAP (ver item 2.1.2). Entre 2005 e 2006, o
Ministério do Meio Ambiente reconheceu três mosaicos de
unidades de conservação na Mata Atlântica que integram
áreas terrestres e marinhas; ao mesmo tempo, por meio de um
fundo federal para projetos ambientais denominado FNMA,
está fomentando a criação de novos mosaicos. Iniciativas como
o Projeto Corredores Ecológicos tem como proposta a criação
do primeiro corredor ecológico marinho brasileiro, no Corredor
Central da Mata Atlântica (leia mais a respeito no item 3.8.2).
Iniciativas no âmbito da Convenção de Ramsar também têm
contribuído para o cumprimento dessa meta (ver item 1.2).
Meta-chave 8: todas as áreas protegidas existentes e futuras
serão manejadas e estabelecidas em plena conformidade
com os direitos dos povos indígenas, nômades e comunidades
locais.
No Brasil os direitos territoriais dos povos indígenas estão
consagrados na Constituição federal, que lhes assegura o
usufruto exclusivo das terras que tradicionalmente ocupam,
havendo, por isso, legislação distinta da que versa sobre as
demais áreas protegidas. As comunidades de remanescentes
de quilombos1 também têm direitos assegurados
constitucionalmente e por legislação infra-constitucional. De
forma complementar, a Lei nº 9.985/2000, que criou o Sistema
Nacional de Unidades de Conservação da Natureza (SNUC),
contempla as demandas fundiárias e de uso dos recursos
naturais de comunidades locais não-indígenas por meio de
categorias de uso sustentável. Adicionalmente, em fevereiro
de 2007 foi instituída a Política Nacional de Desenvolvimento
Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais (Decreto
nº 6.040/07), cujo principal objetivo é “promover o
desenvolvimento sustentável dos Povos e Comunidades
Tradicionais, com ênfase no reconhecimento, fortalecimento
e garantia dos seus direitos territoriais, sociais, ambientais,
Segundo o Decreto nº 4.887/2003, são considerados remanescentes de comunidades de
quilombos “os grupos étnicos-raciais (...) com presunção de ancestralidade negra relacionada com
a resistência à opressão histórica sofrida”.
1
19
econômicos e culturais, com respeito e valorização à sua
identidade, suas formas de organização e suas instituições”.
Meta-chave 9: os povos indígenas e as comunidades locais
estarão representadas na gestão das áreas protegidas por
representantes eleitos, de forma proporcional a seus direitos
e interesses.
No Brasil, as terras indígenas são geridas pelos próprios índios com
a participação do órgão federal, a Funai. Há várias experiências
de sociedades indígenas que, com a assessoria técnica de
órgãos governamentais e não-governamentais, incrementam
a gestão de suas terras segundo suas necessidades. A Lei nº
9.985/2000, que instituiu o SNUC, possibilita a participação
da sociedade civil e de populações locais - inclusive indígenas,
quando habitam a zona de amortecimento de unidades de
proteção integral – na gestão de unidades de conservação
de proteção integral por meio dos Conselhos. No caso das
categorias Reserva Extrativista e Reserva de Desenvolvimento
Sustentável, a participação das comunidades locais se dá por
meio dos conselhos deliberativos. De forma complementar, o
Decreto nº 4.340/2002, que regulamentou o SNUC, garante
a participação de representantes de associações indígenas na
gestão integrada de mosaicos de unidades de conservação,
por meio de um Conselho de Mosaico, de caráter consultivo.
Meta-chave 13: em todos os países se estabelecerão sistemas
eficazes de governança de áreas protegidas.
Desde a aprovação do SNUC, o Brasil adotou uma série de
medidas visando aprimorar a governança das áreas protegidas.
Iniciativas como o PNAP, a definição de áreas prioritárias para
a conservação a biodiversidade, o Programa Áreas Protegidas
na Amazônia (Arpa), o Plano de Ação da Política Nacional
de Biodiversidade, a criação do Instituto Chico Mendes de
Conservação da Biodiversidade, entre outras descritas ao longo
deste documento, visam prover maior eficiência e eficácia à
política nacional de áreas protegidas.
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1.2 - Convenção de Ramsar e avanços na conservação de zonas úmidas
No âmbito dos compromissos assumidos perante a Convenção de Ramsar,
em outubro de 2003 o Brasil instituiu o Comitê Nacional de Zonas
Úmidas, composto pelo Ministério do Meio Ambiente e outros setores
do governo, pela sociedade civil organizada, academia e setor privado,
que participam da tomada de decisões e definição de diretrizes para
a conservação e o uso sustentável das zonas úmidas brasileiras. Até o
momento, o Brasil possui oito sítios que integram a Lista de Zonas Úmidas
de Importância Internacional, segundo propugna o artigo 2º da Convenção:
os Parques Nacionais do Pantanal Mato-grossense, Araguaia e Lagoa do
Peixe; a Reserva Particular do Patrimônio Natural do Sesc Pantanal, as
Áreas de Proteção Ambiental da Baixada Maranhense e das Reentrâncias
Maranhenses; o Parque Estadual Marinho do Parcel de Manuel Luis e a
Reserva de Desenvolvimento Sustentável de Mamirauá. Ao mesmo tempo,
o Brasil tem diversas unidades de conservação, tanto federal como estadual
ou municipal que, embora não constem da lista da Convenção, protegem
a diversidade de ecossistemas úmidos encontrados em território brasileiro
(artigo 4°).
Em atenção ao Plano Estratégico da Convenção, está em fase de execução
o projeto “Fortalecimento de capacidade institucional dos Sítios Ramsar
brasileiros” que visa consolidar as unidades de conservação incluídas
pelo Brasil na Lista Ramsar. O Projeto está elaborando planos de ação
a partir da visão de gestores governamentais e não-governamentais,
representantes de movimentos sociais e da academia. Foram definidos
alvos de conservação para cada área, identificadas as fontes de impacto e
estabelecidas estratégias e ações prioritárias. O Projeto tem como parceiros
as ONGs Mater Natura e TNC e conta com o apoio financeiro do Fundo de
Pequenas Subvenções da Convenção de Ramsar.
O Brasil vem ainda trabalhando em normas, diretrizes e metodologias para
a gestão integrada de bacias hidrográficas e zona costeira no âmbito do
Conselho Nacional de Recursos Hídricos, atendendo a um dos objetivos
operativos do Plano Estratégico 2003-2008 da Convenção. Outras áreas
úmidas que são objeto de políticas brasileiras são:
- recifes de corais: reconhecidos como áreas úmidas pela Convenção,
motivaram a elaboração do Programa de Conservação dos Recifes de
Coral brasileiros, do qual destacam-se as seguintes ações: publicação
do Atlas de Recifes de Coral nas Unidades de Conservação Brasileiras, o
primeiro mapeamento desses ambientes no país; Campanha de Conduta
Consciente em Ambientes Recifais, cujo objetivo é esclarecer turistas sobre
a conservação dos recifes; Programa de Monitoramento dos Recifes de
Coral Brasileiros (Reef Check Brasil), que objetiva estabelecer as bases
para o programa nacional de monitoramento das unidades de conservação
que protegem esses ambientes e já conta com cinco anos de coleta de
dados e uma publicação dos resultados lançada em 2006; parcerias com
outros projetos como o Coral Vivo, em que são desenvolvidas técnicas de
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reprodução de corais, e a adesão do Brasil ao International Coral Reef
Initiative.
- manguezais: o recém-aprovado Projeto de Conservação Efetiva e Uso
Sustentável dos Manguezais no Brasil em Áreas Protegidas (Projeto GEF
Mangue) tem como objetivo desenvolver uma rede de áreas protegidas que
propicie a conservação e o uso sustentável dos 13.400 km2 de manguezais
do país - que correspondem a 9% desse ecossistema no mundo. O
projeto ainda prevê o desenvolvimento de modelos de manejo sustentável
envolvendo comunidades locais e a criação de áreas de exclusão de pesca
como instrumento da gestão pesqueira.
- bacia do rio da Prata: Argentina, Bolívia, Brasil, Paraguai e Uruguai estão
formulando o Programa de Sustentabilidade do Sistema de Áreas Úmidas
Paraguai-Paraná, que visa a construção de um plano integrado que garanta
a conservação e o desenvolvimento sócio-econômico para a população que
depende diretamente desses ambientes. Abrange um corredor de mais de
3.400 km de rios livres de represas onde vivem mais de 20 milhões de
pessoas e que abriga áreas reconhecidas internacionalmente como Sítios
Ramsar, Sítios do Patrimônio ou Reservas da Biosfera. O compromisso
de cooperação foi aprovado por meio da Ata de Poconé, aprovada em
2005, que traz diretrizes e linhas de ação para o Programa, reconhecido
pela Resolução IX.7 da Convenção de Ramsar durante a COP-9 (Kampala,
Uganda).
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2 - Marco político, normativo e de contexto nacional
2.1 - Marco político atual para as áreas protegidas
O marco político relacionado à criação e gestão de unidades de conservação
no Brasil está assentado na Lei nº 9.985, que em julho de 2000 instituiu
o SNUC; no PNAP e, no âmbito da gestão federal, na criação do Instituto
Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade. A seguir, descrevemos
a articulação entre esses três componentes da atual política nacional para
as áreas protegidas.
2.1.1 - O Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza
(SNUC)
A preparação de um sistema de unidades de conservação no Brasil teve início
ainda em 1976, num trabalho denominado “Uma análise de prioridades em
conservação da natureza na Amazônia”, que fundamentou a elaboração do
Plano do Sistema Nacional de Unidades de Conservação do Brasil, publicado
entre 1979 e 1982 (MERCADANTE 2001). Concebido como um apêndice
do II Plano Nacional de Desenvolvimento – que incrementaria programas
oficiais de colonização, infra-estrutura viária e energética e de exploração
dos recursos naturais na Amazônia brasileira -, esse documento propunha
a imediata criação de Parques Nacionais, Reservas Biológicas e Florestas
Nacionais na região, invariavelmente em áreas descartadas pelos projetos
econômicos planejados. De fato, entre 1979 e 1985, foram criados dez
Parques Nacionais, quatro dos quais na Amazônia; 13 Reservas Biológicas,
cinco delas na mesma região, e 15 Estações Ecológicas, 11 na Amazônia,
totalizando 20 unidades de conservação de proteção integral nessa parte
do país, ou 9,7 milhões de hectares (BARRETTO FILHO 2003).
Nesse mesmo contexto histórico, populações amazônicas iniciaram uma
mobilização contra a implantação de projetos de desenvolvimento que traziam
danos ao seu estilo de vida, tendo à frente lideranças como o sindicalista
Chico Mendes. Tal reação levou à interrupção de financiamentos externos
a esses projetos e resultou na formulação de uma inovadora categoria de
área protegida que, adaptada às condições amazônicas, conciliava uso
econômico, regularização fundiária e conservação dos atributos naturais
- a Reserva Extrativista, regulamentada em 1990 pelo Decreto nº 98.897
como “espaço territorial destinado à utilização sustentável e conservação
dos recursos naturais renováveis”. A emergência dessas populações no
debate sobre o modelo de desenvolvimento para a região – do qual a
criação de unidades de conservação era um componente - ensejou a gradual
incorporação de uma visão mais abrangente de conservação no âmbito do
debate público, nacional e internacional, influenciando, posteriormente, as
normas e as políticas públicas para o setor.
23
Em 1988, ano da promulgação da Constituição em vigor, o governo
federal encomendou uma avaliação crítica das categorias de unidades de
conservação existentes no país, bem como a elaboração de um anteprojeto
de lei visando instituir um sistema nacional de unidades de conservação
(MERCADANTE 2001). Em maio de 1992 uma proposta foi encaminhada
como Projeto de Lei ao Congresso Nacional pelo então presidente da
República, permanecendo em debate nessa Casa até junho de 2000,
quando foi finalmente aprovado. No dia 19 de julho, foi publicado com
vetos no Diário Oficial da União como a Lei nº 9.985/2000, que instituiu
o SNUC.
Sinteticamente, a Lei nº 9.985/2000 define 13 objetivos para o Sistema e
o organiza em torno de 12 categorias de manejo, divididas em dois grupos:
o grupo das unidades de conservação de proteção integral, composto por
cinco categorias, e o grupo de unidades de conservação de uso sustentável,
com sete categorias. Os principais avanços trazidos pela nova lei à
estruturação de um sistema de unidades de conservação são:
- o planejamento da conservação deve assegurar representatividade à
diversidade de ecossistemas terrestres e marinhos do país, protegendo
amostras significativas e ecologicamente viáveis do patrimônio biológico
existente no país;
- o processo de criação e a posterior gestão de unidades de conservação
devem ser realizados com a participação efetiva das populações locais, por
meio de consultas públicas - excetuando as categorias Reserva Biológica e
Estação Ecológica -, e da instituição de conselhos de gestão;
- populações locais cuja subsistência dependa de recursos naturais
localizados dentro de áreas declaradas como unidades de conservação
devem ser justamente indenizadas ou providas com meios alternativos de
subsistência;
- o Sistema deve buscar proteger grandes áreas integrando diferentes
categorias e formas de manejo e uso do solo, constituindo corredores
ecológicos; quando existir um conjunto de unidades de conservação de
diferentes categorias, próximas, justapostas ou sobrepostas, a gestão
deverá ser feita de forma integrada e participativa, constituindo mosaicos;
- inclusão no SNUC das Reservas Particulares do Patrimônio Natural
(RPPN), fortalecendo a integração de reservas em propriedades privadas à
estratégia de conservação do país;
- estabelecimento de mecanismos de compensação para empreendimentos
com significativo impacto ambiental, por meio do qual o empreendedor
fica obrigado a destinar no mínimo 0,5% do valor total do empreendimento
para a implementação e manutenção de unidades de conservação de
proteção integral;
24
- reconhecimento da presença humana em unidades de conservação de
proteção integral já existentes, com sugestão de mecanismos para enfrentálo, assegurando respeito aos direitos dessas populações.
Como destacado, o SNUC introduziu na legislação mecanismos e normas
que, quando bem aplicados, trazem maior efetividade às unidades de
conservação como instrumento de conservação da natureza e uso sustentável
dos recursos naturais. Esses mecanismos e normas asseguram processos
de criação e gestão de unidades de conservação mais participativos e,
conseqüentemente, unidades de conservação melhor ajustadas à dinâmica
social e econômica local. Uma descrição da estrutura e dos instrumentos
trazidos pelo SNUC está no item 3.1 - Estrutura do Sistema Nacional de
Unidades de Conservação da Natureza.
2.1.2 - O Plano Estratégico Nacional de Áreas Protegidas (PNAP)
Ainda que tenha trazido mecanismos úteis para solucionar impasses
históricos relacionados às unidades de conservação, o SNUC representa uma
abordagem parcial face às possibilidades existentes no Brasil de instituir
um planejamento mais abrangente da conservação e do uso sustentável
da biodiversidade, especialmente em regiões com extensas áreas naturais
bem conservadas e manejadas de forma diversificada por populações
humanas, como é o caso da Amazônia brasileira. Argumentos científicos
– como os derivados da biologia da conservação, de que escalas maiores
são mais eficazes para a conservação, pois os processos biológicos se dão
em condições que extrapolam os limites das áreas protegidas - e mesmo
políticos – como introduzir a variável da conservação e do uso sustentável da
biodiversidade no planejamento mais amplo do desenvolvimento regional justificam plenamente a necessidade de conceber a conservação de forma
ecossistêmica no país.
Em 2004, diante da adoção do Programa de Trabalho sobre Áreas
Protegidas da CDB (Decisão VII/28), aprovado na COP-7 com o apoio
do governo brasileiro, o Ministério do Meio Ambiente e organizações da
sociedade civil brasileira assinaram um protocolo de intenções objetivando
construir e implementar uma política abrangente para as áreas protegidas
no Brasil, dando origem ao Fórum Nacional de Áreas Protegidas, espaço de
participação, colaboração e controle social sobre essa política.
Em janeiro de 2005, foi criado o Grupo de Trabalho Ministerial para a
elaboração do Plano Nacional de Áreas Protegidas composto por especialistas,
gestores de unidades de conservação e lideranças de organizações da
sociedade civil e de movimentos sociais, envolvendo aproximadamente
400 pessoas. Em abril de 2006, o PNAP foi oficialmente instituído por
meio do Decreto nº 5.758, assinado pelo presidente da República.
Coerentemente com a Decisão VII/28, o PNAP reconhece a importância das
terras indígenas e das terras de comunidades remanescentes de quilombos
como parte da política de conservação da biodiversidade brasileira. Ao
25
integrá-las ao esforço de planejamento da paisagem, ao lado das unidades
de conservação estabelecidas pela Lei nº 9.985/2000, o PNAP amplia
de forma inovadora a abordagem ecossistêmica dada à política nacional,
contemplando ainda as áreas de preservação permanente e as reservas
legais2 como elementos de conectividade entre fragmentos naturais e as
próprias áreas protegidas.
O Plano define princípios, diretrizes, objetivos e estratégias para o Brasil
estabelecer um sistema abrangente de áreas protegidas, ecologicamente
representativo e efetivamente manejado, integrando paisagens terrestres e
marinhas mais amplas até 2015.
Terras indígenas e conservação da biodiversidade no Brasil
Com 109.231.453 de hectares, as terras indígenas ocupam
aproximadamente 12,8% da superfície do território brasileiro,
sendo que 98% desse total estão localizados na Amazônia
(ISA 2007). A distribuição geográfica das terras sob domínio
indígena assegura a conservação de ecossistemas que já
não têm mais condições de serem protegidos em dimensões
adequadas à manutenção dos processos biológicos que geram
e mantêm a biodiversidade. Especificamente no chamado
“arco do desmatamento” – região da Amazônia onde estão
os municípios que apresentam as maiores taxas anuais de
desmatamento – as terras indígenas funcionam como uma
barreira à especulação fundiária e à conversão da cobertura
florestal em pastagens e cultivos agrícolas. Estudo publicado
em 2006 concluiu, com base na análise de imagens de
satélites de diferentes categorias de unidades de conservação
e terras indígenas da Amazônia brasileira, que estas últimas
são especialmente importantes para prevenir desmatamentos
em larga escala em áreas de avanço da fronteira agrícola
(NEPSTAD et al. 2006).
O primeiro mapeamento das áreas prioritárias para a
conservação e uso sustentável da biodiversidade no Brasil,
realizado pelo Ministério do Meio Ambiente entre 1998 e
2000, concluiu que 40% da área total considerada como
de extrema importância, 36,4% da área total de muito alta
importância e 25% do total de alta importância estavam
sobrepostas a terras indígenas (CLEARY 2004). A atualização
Segundo a Lei nº 4.771/65, que instituiu o Código Florestal, é considerada de preservação
permanente a vegetação situada ao longo de rios, lagos, reservatórios de água e nascentes; nos
topos de morro, montanhas, serras, chapadas ou tabuleiros; nas encostas com declividade superior
a 45º; nas restingas, dunas e mangues. A reserva legal corresponde a uma área de vegetação,
variável de 20% a 80% de cada propriedade rural, segundo o bioma onde está localizada, onde não
é permitido o corte raso.
2
26
desse estudo (veja item 3.2.1 - Áreas prioritárias para a
conservação da biodiversidade e análise de lacunas de
representatividade), ao elevar para 80% a superfície do bioma
Amazônia considerada como prioritária para a conservação,
confirmou o caráter insubstituível das terras indígenas para a
conservação do patrimônio biológico do país.
Apesar dessas evidências, até o advento do PNAP o Brasil
não incluía as terras indígenas como parte da estratégia para
a conservação e uso sustentável da diversidade biológica.
Sua inclusão no PNAP demandou a constituição de um
grupo de trabalho específico, composto paritariamente por
representantes do governo e de povos indígenas, que formulou
o projeto “Proteção, Conservação, Recuperação e Uso
Sustentável da Biodiversidade em Terras Indígenas”, que está
sendo negociado junto ao Fundo Global para o Meio Ambiente
(GEF). Além disso, a implementação do PNAP contempla o
estabelecimento de um programa nacional para a conservação
da biodiversidade em terras indígenas, com detalhamento de
metas e estratégias específicas.
2.1.3 - O Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade
A necessidade de prover maior eficácia e eficiência à política nacional
de conservação e uso sustentável da biodiversidade levou o Governo
Federal a publicar a Medida Provisória nº 366, de 26 de abril de 2007,
criando o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade, que
assumiu a gestão das unidades de conservação federais até então sob a
responsabilidade do Ibama3.
À nova autarquia cabe a proposição, implantação, gestão, proteção,
fiscalização e monitoramento das unidades de conservação instituídas
pela União, bem como a execução das políticas relativas ao uso
sustentável dos recursos naturais renováveis, apoio ao extrativismo e às
populações tradicionais nas unidades de conservação de uso sustentável
instituídas pela União. O novo Instituto terá, ainda, o papel de fomentar
e executar programas de pesquisa, proteção, preservação e conservação
da biodiversidade, de acordo com as diretrizes proferidas pelo Ministério
do Meio Ambiente. Sob seus cuidados está a gestão de 288 unidades
de conservação que abrangem cerca de 8% do território nacional – além
criar e apoiar a gestão de 432 reservas privadas reconhecidas pelo órgão
federal.
A medida provisória em questão foi convertida na Lei nº 11.516/2007, publicada no Diário
Oficial da União em 28/08/07. Para detalhes das atribuições do Instituto Chico Mendes, ler o item
2.2 – Marco legal para as áreas protegidas. A íntegra da lei pode ser encontrada em http://www.
planalto.gov.br/CCIVIL/_Ato2007-2010/2007/Lei/L11516.htm.
3
27
2.1.4 - As áreas protegidas no contexto da integração continental
2.1.4.1 - Plano Estratégico da OTCA
O Plano Estratégico da Organização do Tratado de Cooperação Amazônica
(OTCA) para o período 2004-2012 foi aprovado por seus estados-membros
em Manaus em 14/09/2004. Trata-se de um acordo sobre as políticas
nacionais dos países membros “para o desenvolvimento sustentável e
integral da Amazônia e uma carta de navegação para os próximos anos,
assegurando sua viabilidade política, técnica e financeira” (OTCA 2004).
O Plano Estratégico visa orientar o trabalho da Secretaria Permanente
da OTCA, sediada em Brasília, e observa compromissos contidos em
convenções internacionais como a CDB; o Comércio Internacional
de Espécies Ameaçadas; Convenção sobre a Proteção ao Patrimônio
Mundial, Cultural e Natural; a Convenção sobre Mudanças Climáticas; a
Convenção de Ramsar, entre outras. O Plano menciona, ainda, iniciativas
da Secretaria Permanente para “desenvolver laços de cooperação com o
Programa Homem e Biosfera da Unesco, que permitam aproveitar esse
espaço intergovernamental para a consolidação, preservação e ampliação
das reservas da biosfera” que abranjam porções do território amazônico
dos países membros.
Entre os “eixos estratégicos” que orientam o Plano está “Conservação e
Uso Sustentável dos Recursos Naturais Renováveis”, do qual consta uma
série de áreas programáticas relacionadas ao meio ambiente, à produção
sustentável e ao bem-estar das populações amazônicas dos países
membros. A área temática Florestas, Solos e Áreas Naturais Protegidas tem
em seu escopo um Plano Regional de Ação da Biodiversidade Amazônica,
apresentado na oitava Conferência das Partes da CDB, em Curitiba, Brasil.
Trata-se de uma proposta enfocando vários programas regionais, entre eles
um Programa de Gestão Sustentável de Áreas Protegidas, que está sendo
formulado por técnicos governamentais dos países membros.
2.1.4.2 - Estratégia de Biodiversidade do Mercosul
No âmbito do Mercado Comum do Cone Sul (Mercosul), Brasil, Argentina,
Paraguai e Uruguai realizaram, nos últimos oito anos, uma aproximação
visando estabelecer políticas e leis comuns direcionadas ao meio ambiente
e à promoção do desenvolvimento sustentável na sub-região. Em junho
de 2001, os representantes do Poder Executivo dos quatro Estados partes
aprovaram a Decisão no 2/01 do Conselho do Mercosul, que trata do
Acordo-Quadro sobre Meio Ambiente do Mercosul, ratificado posteriormente
pelos respectivos Parlamentos e em vigor desde junho de 2004. O Acordo
propõe a cooperação entre os quatro países para implementar 14 ações
com vistas a aprofundar a análise dos problemas ambientais da região, por
meio dos órgãos nacionais competentes e com a participação da sociedade
civil organizada.
28
Em março de 2006, durante a realização da I Reunião Extraordinária de
Ministros do Meio Ambiente dos Estados Partes, foi assinada a Declaração
dos Ministros de Meio Ambiente sobre a Estratégia de Biodiversidade
do Mercosul, na qual os signatários propõem, como objetivo geral dessa
iniciativa, “estabelecer diretrizes e linhas prioritárias para a integração de
políticas e ações (...) que se orientem para a conservação da biodiversidade,
o uso sustentável de seus componentes e a participação justa e eqüitativa
nos benefícios que derivem dos recursos genéticos, para avançar na
construção do desenvolvimento sustentável do Mercosul”. O horizonte
fixado para a consecução desse objetivo é 2010.
A Estratégia de Biodiversidade do Mercosul está estruturada em sete
componentes ou eixos temáticos: i) conhecimento e informação sobre
a biodiversidade; ii) conservação da biodiversidade; iii) uso sustentável
dos componentes da biodiversidade; iv) monitoramento, avaliação,
prevenção e mitigação de impactos sobre a biodiversidade; v) acesso aos
recursos genéticos, conhecimentos tradicionais associados e repartição de
benefícios; vi) educação, sensibilização pública, socialização e divulgação
sobre biodiversidade; vii) fortalecimento político, jurídico e institucional.
Cada componente contém diretrizes gerais complementadas por linhas
de ação que visam integrar, fortalecer e coordenar iniciativas já em curso
bem como indicar ações consideradas essenciais e viáveis dentro do
horizonte temporal da Estratégia (veja as diretrizes para o Componente 2
– Conservação da biodiversidade no Quadro 2).
Quadro 2 - Estratégia de Biodiversidade do Mercosul
Diretrizes do componente II – Conservação da Biodiversidade
Diretriz II.1: Conservação a nível dos biomas, ecorregiões,
bacias e ecossistemas
Os Estados Partes desenvolverão ações integrais para a proteção
dos ecossistemas e ecorregiões (terrestres e aquáticas) do
Mercosul, especialmente em áreas consideradas estratégicas e
críticas para a biodiversidade e em áreas que estejam afetadas por
processos significativos de conversão de ecossistemas naturais
para outros usos, avançando na identificação e na definição
de áreas prioritárias para uma ação conjunta, promovendo o
intercâmbio de informação e de experiências nacionais sobre
gestão da biodiversidade e criando condições que assegurem
os processos naturais de fluxo genético e evolução.
Diretriz II.2: Manejo Integrado de espécies e/ou populações
compartilhadas, com ênfase especial às ameaçadas e
migratórias.
Os Estados Partes promoverão a conservação in situ de espécies
e/ou populações compartilhadas, com o objetivo de promover
29
sua conservação e utilizações sustentável bem como dos processos
ecológicos e evolutivos a elas associados.
Diretriz II.3: Conservação ex situ como estratégia complementar
de conservação in situ.
Os Estados Partes desenvolverão ações para a consolidação de
iniciativas de conservação ex situ e on farm de espécies e variedades,
bem como de sua variabilidade genética, com ênfase nas espécies
ameaçadas e com potencial de uso econômico e social. Isso
requer fortalecer a capacidade institucional, financeira, científicotecnológica e de gestão, bem como promover o intercâmbio de
informação e a interação entre as diferentes iniciativas existentes e
entre estas e os sistemas e áreas de conservação in situ.
Diretriz II.4: Desenvolvimento de instrumentos econômicos para a
conservação da biodiversidade no âmbito do Mercosul.
Os Estados Partes promoverão ações com vistas a desenvolver,
identificar e avaliar a efetividade de distintos instrumentos
econômicos que contribuan para as ações conjuntas de conservação
da biodiversidade no Mercosul.
Entre as linhas de ação apontadas na Diretriz II.1 está a seleção de áreas
prioritárias para a criação e consolidação de áreas protegidas, terrestres ou
aquáticas. Essa diretriz indica ainda a necessidade de empreender esforços
para “estabelecer um programa de intercâmbio de informação, equipes
técnicas e experiências em áreas protegidas, de forma a gerar sinergias e
aprendizados mútuos entre os países na gestão das ditas áreas, assim como
políticas adequadas para as zonas de amortecimento e as relacionadas
às populações locais”. Destaca, também, a necessidade de desenvolver
mecanismos comuns de planejamento e ordenamento territorial em
áreas com ecossistemas compartilhados e desenvolver planos conjuntos
de proteção, recuperação e incremento de biomas e ecossistemas em
estado crítico, citando nominalmente as Florestas do Alto Paraná, a Mata
Atlântica, o Cerrado e os Pampas – que no Brasil recebem o nome de
Campos Sulinos.
2.2 - Marco legal para as áreas protegidas
Embora parte relevante do atual arcabouço normativo referente às áreas
protegidas no Brasil tenha sido instituído nos últimos dez anos, há normas
estruturantes da política nacional que entraram em vigor antes desse
período. É caso específico da Lei nº 6.938, que em 1981 estabeleceu a
Política Nacional do Meio Ambiente; da Constituição Federal, promulgada
em outubro de 1988, e de outras leis importantes para o planejamento e
a gestão das áreas protegidas.
30
No âmbito do PNAP, as terras indígenas e as terras de comunidades
remanescentes de quilombos são consideradas áreas protegidas. Porém,
não são unidades de conservação, já que, segundo a legislação em vigor,
apenas as 12 categorias de manejo estabelecidas pelo SNUC têm esse
status. A seguir, descrevemos em ordem cronológica as leis que conformam
o marco legal para a atual política de áreas protegidas no país.
- Lei n° 4.771/1965 (Código Florestal): ao instituir o Código Florestal, a Lei
nº 4.771, de 15/09/1965 e suas alterações posteriores trouxeram para a
legislação brasileira as figuras das áreas de preservação permanente (APP)
e da reserva legal, cuja vegetação deve ser mantida livre de corte raso em
função do papel que exercem para a manutenção de serviços ecológicos.
Segundo o Código Florestal, as florestas que integram o patrimônio indígena
estão sujeitas ao regime dispensado às áreas de APPs.
- Lei n° 6001/1973 (Estatuto do Índio): regula a situação jurídica dos índios
e das comunidades indígenas. Embora muitos de seus dispositivos tenham
sido revogados por legislação posterior, incluindo a Constituição Federal de
1988, parte da lei se mantém em vigor, como o artigo 22, segundo o qual
os índios detêm a posse permanente das terras que habitam e o usufruto
das riquezas naturais existentes em suas terras.
- Decreto n° 84.017/1979: publicado em 21/09/79, aprova o regulamento
para os Parques Nacionais.
- Lei n° 6.938/1981: aprovada em 31//08/1981, instituiu a Política Nacional
do Meio Ambiente, estabelecendo como princípio “a ação governamental na
manutenção do equilíbrio ecológico, considerando o meio ambiente como
um patrimônio público a ser necessariamente assegurado e protegido,
tendo em vista o uso coletivo” (artigo 2º, inciso I). Também previu a
“definição de áreas prioritárias de ação governamental relativa à qualidade
e ao equilíbrio ecológico, atendendo aos interesses da União, dos Estados,
do Distrito Federal, dos Territórios e dos Municípios” (artigo 4º, II). Em seu
artigo 9º, essa lei define a criação de “espaços territoriais especialmente
protegidos pelo poder público federal, estadual e municipal” como um de
seus instrumentos, demandando uma lei específica para regulá-lo. A Lei nº
6.938/81 criou, ainda, o Sistema Nacional do Meio Ambiente (Sisnama),
composto pelos órgãos de meio ambiente da União, Estados, Distrito
Federal e Municípios, responsáveis pelas respectivas políticas de áreas
protegidas, e o Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama), colegiado
consultivo e deliberativo incumbido de acompanhar a implementação do
SNUC, criado posteriormente pela Lei nº 9.985/2000.
- Constituição Federal de 1988: promulgada em 1988, estabelece que
“todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de
uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se
ao poder público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para
as presentes e futuras gerações” (artigo 225). Para dar-lhe efetividade, o
inciso I do parágrafo 1º desse artigo incumbe o poder público de “preservar
31
e restaurar os processos ecológicos essenciais e prover o manejo ecológico
das espécies e ecossistemas” e, em seu inciso III, de “definir (...) espaços
territoriais e seus componentes a serem especialmente protegidos, sendo a
alteração e a supressão permitidas somente através de lei, vedada qualquer
utilização que comprometa a integridade dos atributos que justifiquem sua
proteção”. Estabeleceu, ainda, “os direitos originários dos índios sobre
as terras que tradicionalmente ocupam”, conceituando-as como “as por
eles habitadas em caráter permanente, as utilizadas para suas atividades
produtivas, as imprescindíveis à preservação dos recursos ambientais
necessários a seu bem-estar e as necessárias a sua reprodução física e
cultural, segundo seus usos, costumes e tradições” (artigo 231), e “aos
remanescentes das comunidades dos quilombos que estejam ocupando
suas terras” o reconhecimento da propriedade definitiva, “devendo ao
Estado emitir os títulos respectivos” (artigo 68 dos Atos das Disposições
Constitucionais Transitórias).
- Decreto nº 99.274/1990: esse decreto, de 06/06/90, regulamenta a lei
da Política Nacional do Meio Ambiente, explicitando que sua execução será
efetivada quando o Poder Público, nos diferentes níveis de governo, “proteger
as áreas representativas de ecossistemas mediante a implementação de
unidades de conservação (...)” (artigo 1º, inciso II).
- Decreto nº 1.141/1994 (com alterações efetuadas pelo Decreto nº
3.799/2001): publicado em 19/05/1994, dispõe sobre as ações de
proteção ambiental, saúde e apoio às atividades produtivas para os povos
indígenas. Além disso, frisa que “as ações voltadas à proteção ambiental
das terras indígenas e seu entorno destinam-se a garantir a manutenção
do equilíbrio necessário à sobrevivência física e cultural das comunidades
indígenas” (artigo 9º).
- Decreto n° 1.298/1994: publicado em 27/10/94, aprova o regulamento
de Florestas Nacionais.
- Decreto n° 1.775/1996: editado em janeiro de 1996, regulamenta o
processo de demarcação das terras indígenas, descrevendo as etapas que
devem ser cumpridas pelo poder público.
- Convenção sobre Diversidade Biológica (CDB): a CDB foi assinada
pelo Presidente da República durante a Conferência da ONU sobre Meio
Ambiente e Desenvolvimento, em junho de 1992, tendo sido ratificada
pelo Congresso Nacional por meio do Decreto Legislativo nº 2/94, em
08/02/94, e promulgada através do Decreto nº 2.519, em 17/03/98.
O Brasil, na qualidade de país signatário, tem acatado seus princípios
e determinações, com atenção especial ao artigo 8º, que versa sobre a
conservação in situ, e artigo 6º, que define medidas para a conservação e
utilização sustentável da biodiversidade. O PNAP atende aos compromissos
assumidos pelo Brasil no âmbito da CDB, em especial, àqueles advindos
da Decisão VII/28 e VII/5.
32
- Lei nº 9.985/2000: criou o SNUC, composto por espaços territoriais
definidos e seus respectivos recursos ambientais que possuam características
naturais relevantes, legalmente instituídos pelo Poder Público, com objetivos
de conservação e sob regime especial de administração, denominados
unidades de conservação. O estabelecimento e a gestão das unidades de
conservação, bem como seus conceitos, objetivos, diretrizes e estrutura
estão previstos nessa norma. De acordo com o SNUC, as unidades de
conservação são divididas em dois grupos de proteção compostos por
diferentes categorias de manejo (mais informações nos itens 2.1.1 - O
Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza e 3.1 Estrutura do Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza).
A íntegra dessa lei está disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/
LEIS/L9985.htm.
- Decreto nº 4.340/2002: regulamentou artigos da Lei nº 9.985/2000
(SNUC) relativos aos seguintes temas: criação de unidade de conservação,
definição de limites do subsolo e do espaço aéreo da unidade de conservação,
criação e funcionamento de mosaico de unidades de conservação, plano
de manejo, funcionamento de conselhos consultivo e deliberativo, a
gestão compartilhada com organizações da sociedade civil de interesse
público, autorização para a exploração de bens e serviços em unidades
de conservação, compensação por significativo impacto ambiental,
reassentamento de populações tradicionais residentes em unidades de
conservação, reavaliação de unidade conservação de categoria inexistente
no SNUC, funcionamento das Reservas da Biosfera. A íntegra desse Decreto
está publicada em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/2002/
D4340.htm.
- Decreto nº 4.339/2002: publicado em 22/08/2002, instituiu os
princípios e as diretrizes para a implementação da Política Nacional da
Biodiversidade, considerando os compromissos assumidos pelo Brasil na
CDB de desenvolver estratégias, políticas, planos e programas nacionais
de biodiversidade e as demais normas vigentes relacionadas ao tema. O
Decreto abriga, em documento anexo, a íntegra da Política Nacional da
Biodiversidade, explicitando seus princípios, diretrizes e objetivos, além
de dispor sobre seus sete componentes e respectivos objetivos específicos,
quais sejam: i) Conhecimento da Biodiversidade; ii) Conservação
da Biodiversidade; iii) Utilização Sustentável dos Componentes da
Biodiversidade; iv) Monitoramento, Avaliação, Prevenção e Mitigação de
Impactos sobre a Biodiversidade; v) Acesso aos Recursos Genéticos e
aos Conhecimentos Tradicionais Associados e Repartição de Benefícios;
vi) Educação, Sensibilização Pública, Informação e Divulgação sobre
Biodiversidade; vii) Fortalecimento Jurídico e Institucional para a Gestão
da Biodiversidade. A íntegra desse Decreto está disponível em http://www.
planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/2002/D4339.htm.
- Decreto nº 4.887/2003: esse Decreto, de 20/11/2003, regulamenta o
procedimento para identificação, reconhecimento, delimitação, demarcação
e titulação das terras ocupadas por remanescentes das comunidades
33
quilombolas de que trata o artigo 68 do Ato das Disposições Constitucionais
Transitórias da Constituição Federal de 1988. É um marco no reconhecimento
dos territórios quilombolas, viabilizando sua demarcação. A inclusão das
terras quilombolas no PNAP reflete o reconhecimento de sua função
ambiental, fortalecendo o esforço de conservação da biodiversidade.
- Decreto nº 4.703/2003 e alterações: publicado em 21/05/2003,
dispõe sobre o Programa Nacional da Diversidade Biológica (Pronabio) e
a Comissão Nacional da Biodiversidade (Conabio). O Pronabio tem como
objetivo principal promover parceria entre o Poder Público e a sociedade
civil na conservação da biodiversidade, na utilização sustentável dos seus
componentes e na repartição justa e eqüitativa dos benefícios decorrentes
dessa utilização. É um importante instrumento na implementação da (CDB).
A Conabio tem a responsabilidade de debater e consultar diversos setores
de governo, o setor produtivo e a sociedade civil organizada, visando a
implementação do principal objetivo da Política Nacional de Biodiversidade,
qual seja, a promoção da efetiva conservação da diversidade biológica
brasileira.
- Decreto nº 5.092/2004: esse Decreto, de 21/05/2004, define regras
para a identificação de áreas prioritárias para a conservação, utilização
sustentável e repartição dos benefícios da biodiversidade, no âmbito das
atribuições do Ministério do Meio Ambiente. Estabelece que essas áreas
serão definidas por portaria ministerial, considerando-se os seguintes
conjuntos de biomas: Amazônia; Cerrado e Pantanal; Caatinga; Mata
Atlântica e Campos Sulinos (Pampas); Zona Costeira e Marinha. Ainda
segundo esse Decreto, as áreas prioritárias devem fundamentar-se nas
áreas identificadas no “Projeto de Conservação e Utilização Sustentável
da Diversidade Biológica Brasileira (Probio)” e serem discriminadas em
mapa das áreas prioritárias para conservação e utilização sustentável
da diversidade biológica brasileira. Essas áreas prioritárias devem ser
consideradas para o estabelecimento de unidades de conservação.
- Lei nº 11.132/2005: acrescentou à Lei nº 9.985/00 o artigo 22-A,
prevendo a possibilidade de o “Poder Público, ressalvadas as atividades
agropecuárias e outras atividades econômicas em andamento e obras
públicas licenciadas, na forma da lei, decretar limitações administrativas
provisórias ao exercício de atividades e empreendimentos efetiva ou
potencialmente causadores de degradação ambiental, para a realização
de estudos com vistas à criação de Unidade de Conservação, quando, a
critério do órgão ambiental competente, houver risco de dano grave aos
recursos naturais ali existentes”.
- Decreto n° 5.746/2006: publicado em 05/04/06, aprova regulamento
para as Reservas Particulares do Patrimônio Nacional.
34
- Decreto n° 5.758/2006: publicado em 13/04/06, institui o Plano
Estratégico Nacional de Áreas Protegidas - PNAP, seus princípios, diretrizes,
objetivos e estratégias, e dá outras providências. Sua íntegra está disponível
em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/2002/D4339.htm.
- Decreto n° 5.950/2006: publicado em 31/10/06, estabelece condições
para o plantio de organismos geneticamente modificados nas áreas que
circundam as unidades de conservação.
- Lei n° 11.428/2006 (Lei da Mata Atlântica): ao dispor sobre a utilização e
proteção da vegetação nativa do bioma Mata Atlântica, esta lei estabelece a
definição do bioma e condições para sua conservação, utilização econômica
e recuperação, já que se trata do bioma brasileiro mais drasticamente
reduzido, com menos de 8% de sua vegetação original.
- Lei n° 11.516/2007: publicada em 28/08/07, cria o Instituto Chico
Mendes de Conservação da Biodiversidade - Instituto Chico Mendes,
autarquia federal vinculada ao Ministério do Meio Ambiente, com
a finalidade de: a) executar ações da política nacional de unidades de
conservação da natureza, referentes às atribuições federais relativas à
proposição, implantação, gestão, proteção, fiscalização e monitoramento
das unidades de conservação instituídas pela União; b) executar as políticas
relativas ao uso sustentável dos recursos naturais renováveis e ao apoio ao
extrativismo e às populações tradicionais nas unidades de conservação de
uso sustentável instituídas pela União; c) fomentar e executar programas
de pesquisa, proteção, preservação e conservação da biodiversidade e
de educação ambiental; d) exercer o poder de polícia ambiental para a
proteção das unidades de conservação instituídas pela União; e) promover
e executar, em articulação com os demais órgãos e entidades envolvidos,
programas recreacionais, de uso público e de ecoturismo nas unidades
de conservação, onde estas atividades sejam permitidas. Sua íntegra está
disponível em http://www.planalto.gov.br/CCIVIL/_Ato2007-2010/2007/
Lei/L11516.htm.
Outras convenções internacionais relevantes:
- Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar: concluído em
Montego Bay, Jamaica, em 10/12/1982, esse tratado foi aprovado pelo
Congresso Nacional por meio do Decreto Legislativo nº 5, de 09/11/1987,
e entrou em vigor internacional e para o Brasil em 16/11/1994, pelo
Decreto nº 1.530, de 22/06/1995. A Convenção das Nações Unidas sobre
Direito do Mar garante ao País direito à conservação da Zona Econômica
Excluxiva, possibilitando o estabelecimento e a administração das áreas
protegidas marinhas.
- Convenção de Ramsar: a Convenção sobre Zonas Úmidas de Importância
Internacional, especialmente como Habitat de Aves Aquáticas (Convenção
de Ramsar) foi aprovada no Brasil pelo Decreto Legislativo nº 33, de
16/06/1992, e promulgada pelo Presidente da República pelo Decreto nº
1.905, de 16/05/1996.
- Tratado de Cooperação Amazônica (TCA): esse Tratado é um relevante
instrumento multilateral para promover a cooperação entre os países
amazônicos - Brasil, Bolívia, Colômbia, Equador, Guiana, Peru, Suriname
35
e Venezuela - em favor do desenvolvimento sustentável da região. Esse
documento, firmado em Brasília em 03/07/1978, foi internalizado através
do Decreto Legislativo nº 69, de 18/10/1978, e promulgado pelo Decreto
nº 85.050, de 18/08/1980.
- Convenção relativa à Proteção do Patrimônio Mundial, Cultural e
Natural: oficializada pela Unesco em 1972, a Convenção do Patrimônio
Mundial, Cultural e Natural foi aprovada pelo Decreto Legislativo nº 74, de
30/06/1977, e promulgada através do Decreto nº 80.978, de 12/12/1977.
Esse documento tem a finalidade de garantir a proteção de obras e áreas
de grande interesse cultural e natural para a humanidade. Cada país que
passa a integrar essa Convenção deve buscar proteger esses Sítios, além de
colaborar com outros países para que também o façam da melhor maneira
e com a técnica mais adequada possível. A seleção das áreas deve ser feita
pelas nações signatárias, garantida a soberania sobre esses bens.
- Convenção nº 169 da Organização Internacional do Trabalho: editado
em 07/06/1989, esse tratado sobre Povos Indígenas e Tribais em Países
Independentes foi aprovado no Brasil pelo Decreto Legislativo nº 143, de
20/06/2002, e promulgado através do Decreto nº 5.051, de 20/04/2004.
Seu artigo 7º, inciso I, garante que “os povos interessados deverão ter
o direito de escolher suas próprias prioridades no que diz respeito ao
processo de desenvolvimento (...) e de controlar, na medida do possível,
o seu próprio desenvolvimento econômico, social e cultural. Além disso,
esses povos deverão participar da formulação, aplicação e avaliação dos
planos e programas de desenvolvimento nacional e regional suscetíveis de
afetá-los diretamente”. Assegura que “os governos deverão adotar medidas
em cooperação com os povos interessados para proteger e preservar o
meio ambiente dos territórios que eles habitam” (artigo 7º, inciso IV). A
Convenção dispõe que “os governos deverão respeitar a importância especial
que para as culturas e valores espirituais dos povos interessados possui a
sua relação com as terras ou territórios, ou com ambos, segundo os casos,
que eles ocupam ou utilizam de alguma maneira e, particularmente, os
aspectos coletivos dessa relação” (artigo 13). O artigo 15, inciso 1 garante
que “os direitos dos povos interessados aos recursos naturais existentes nas
suas terras deverão ser especialmente protegidos. Esses direitos abrangem
o direito desses povos a participarem da utilização, administração e
conservação dos recursos mencionados”. A Convenção estabelece, ainda,
que “os governos deverão adotar medidas (...) para facilitar os contatos e a
cooperação entre povos indígenas e tribais através das fronteiras, inclusive
as atividades nas áreas econômica, social, cultural, espiritual e do meio
ambiente” (artigo 32). Esse dispositivo é atendido, no que toca a aspectos
ambientais, pela adoção da CDB.
36
2.3 - Integração das áreas protegidas a planos de desenvolvimento
nacional
Na última década, o deslocamento da fronteira agropecuária do Planalto
Central brasileiro em direção à região administrativa denominada
Amazônia Legal4 – processo decorrente, sobretudo, do aumento da
demanda internacional por produtos como soja e carne bovina – resultou
na elevação das taxas anuais de desmatamento e no incremento dos focos
de queimadas, trazendo como uma de suas conseqüências o lançamento
de milhares de toneladas de carbono na atmosfera terrestre5. Ao mesmo
tempo, esse processo acirrou conflitos pela posse da terra e de recursos
naturais entre prepostos de agentes econômicos recém-chegados à região
e comunidades locais, com relatos recorrentes de violência contra estes
últimos.
Definidos pela Lei nº 5.173/66, os limites da Amazônia Legal abrangem os territórios dos estados
do Acre, Amazonas, Roraima, Rondônia, Pará, Amapá, Mato Grosso e Tocantins e o estado do
Maranhão a oeste do meridiano 44º, compreendendo uma área de aproximadamente 5,5 milhões de
km2. Esse território inclui a totalidade do bioma Amazônia e partes de outros biomas brasileiros.
5
De acordo com avaliações do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, cerca de 70% das
emissões de gás carbônico registradas no Brasil têm origem na eliminação de florestas.
4
37
A conversão de áreas naturais em pastagens e monoculturas tem sido
especialmente impactante nas porções norte do estado do Mato Grosso,
sudeste do estado do Pará e sul do estado do Amazonas, onde estão alguns
dos municípios que registram as mais altas taxas anuais de desmatamento.
Trata-se de uma região de paisagens diversificadas, compostas por cerrados
(savanas), campinas, ecótonos e diferentes fitofisionomias florestais. Uma
avaliação da biodiversidade presente nessa região identificou 385 áreas
prioritárias para a conservação da biodiversidade, bem como formações
raras, centros de endemismos e áreas úmidas relevantes para a reprodução
da fauna aquática (GTI 2006). A região é caracterizada, ainda, pela
presença de extensas terras indígenas e de comunidades extrativistas e de
pequenos produtores rurais.
O adensamento da ocupação econômica nessa região fomentou a
reivindicação pela pavimentação do trecho amazônico da rodovia BR163, sob a justificativa de que a obra reduziria custos no escoamento
da produção regional. Aberta na década de 1970, a Cuiabá-Santarém
percorre 1.780 quilômetros na direção sul-norte, servindo como um eixo
de penetração em direção a regiões mais remotas e conservadas da calha
sul do rio Amazonas, no interflúvio Tapajós-Xingu.
Em junho de 2003, a divulgação de projeção de aumento de 40% na
taxa de desmatamento para o período 2001-2002 na Amazônia Legal
levou o Governo Federal a instituir um Grupo de Trabalho Interministerial
(GTI) com o objetivo de propor medidas e coordenar ações que resultassem
na diminuição das taxas anuais de desmatamento registradas na região.
Em março de 2004, foi lançado o Plano de Ação para a Prevenção e
Controle do Desmatamento na Amazônia Legal dentro do Programa
Amazônia Sustentável – cujo objetivo é viabilizar um novo modelo de
desenvolvimento para a região, “baseado na inclusão social com respeito
à diversidade cultural, na viabilização de atividades econômicas dinâmicas
e competitivas e no uso sustentável dos recursos naturais” (PRESIDÊNCIA
DA REPÚBLICA 2005).
Nesse mesmo ano, setores organizados da sociedade civil, incluindo
associações de produtores locais, passaram a reivindicar medidas que,
ao lado da pavimentação da rodovia BR-163, disciplinassem a ocupação
e o uso da terra, minimizando impactos ambientais e conflitos fundiários
e fortalecessem a produção local. Em atenção a esta reivindicação, o
Governo Federal criou o Plano de Desenvolvimento Regional Sustentável
para a Área de Influência da BR-163 (Plano BR-163 Sustentável), cuja
formulação contou com a participação de setores organizados da sociedade
civil, empresários, prefeitos e órgãos estaduais.
Conjugado ao Plano de Ação para a Prevenção e Controle do Desmatamento
na Amazônia Legal, o Plano BR-163 Sustentável dividiu a área de influência
da rodovia em três mesoregiões. A estratégia do plano contemplou quatro
grandes eixos temáticos, entre os quais, “ordenamento territorial e gestão
ambiental”, que resultou na instituição de cinco Áreas de Limitação
38
Administrativa Provisória para conter de imediato a especulação com terras
públicas e o corte raso numa área de 8,2 milhões de hectares6.
A adoção dessa medida possibilitou a realização e o aprofundamento
de estudos técnicos e negociações com diversos setores da sociedade,
governamental e não-governamental, visando dar destinação adequada às
terras interditadas. Entre novembro de 2004 e fevereiro de 2006, foram
criados três mosaicos de unidades de conservação federais e estaduais
na área de abrangência do Plano BR-163 Sustentável, totalizando 15,1
milhões de hectares de ecossistemas sob proteção - 6,2 milhões de
hectares sob proteção integral e 8,9 milhões sob uso sustentável (veja
Quadro 3 – Unidades de conservação criadas no âmbito do Plano BR-13
Sustentável na próxima página). Adicionalmente, foram tomadas medidas
para finalizar o processo de reconhecimento de terras indígenas na região.
A implementação das unidades de conservação na área de abrangência
da rodovia Cuiabá-Santarém visou reverter um processo de ocupação
desordenada em curso sobre uma vasta parte do território nacional,
que atingia especialmente terras públicas, fenômeno que tenderia a se
intensificar com a pavimentação da rodovia. Por meio da análise das
múltiplas variáveis existentes, foi possível estabelecer uma estratégia
negociada com setores diversos da sociedade a fim de ordenar a ocupação
da terra e o uso dos recursos naturais, conciliando tal ordenamento com as
necessidades de conservação da biodiversidade.
Assim, para as áreas ocupadas por populações extrativistas, a estratégia
adotada foi a de criar reservas extrativistas e reservas de desenvolvimento
sustentável. Nas áreas com predomínio de cobertura florestal e potencial para
o manejo sustentável, foram estabelecidas florestas nacionais ou estaduais
com o objetivo de promover a conservação e a geração de emprego e renda,
envolvendo a estruturação de cadeias produtivas associadas à exploração
de produtos florestais. Nas áreas de elevado valor para a conservação da
biodiversidade, manutenção de serviços ecológicos e o ecoturismo, foi
priorizada a criação de unidades de conservação de proteção integral, com
destaque para os parques nacionais (GTI 2006).
Em julho de 2005, a Lei nº 11.132 acrescentou à Lei nº 9.985/00 o artigo 22-A, prevendo
a possibilidade de o “poder público, ressalvadas as atividades agropecuárias e outras atividades
econômicas em andamento e obras públicas licenciadas, na forma da lei, decretar limitações
administrativas provisórias ao exercício de atividades e empreendimentos efetiva ou potencialmente
causadores de degradação ambiental, para a realização de estudos com vistas na criação de unidade
de conservação, quando, a critério do órgão ambiental competente, houver risco de dano grave aos
recursos naturais ali existentes”.
6
39
Quadro 3 - Unidades de conservação criadas no âmbito do Plano BR-163 Sustentável
Fontes: Plano de Desenvolvimento Regional Sustentável para a Área de Influência da BR-163; Amazônia Brasileira 2007. Instituto Socioambiental/
Programa Áreas Protegidas da Amazônia/ MMA
40
De imediato, as ações de ordenamento territorial – especialmente o
estabelecimento de mosaicos de unidades de conservação - sobre essa
parte do país contribuíram para uma substancial redução nas taxas anuais
de desmatamento na região, evitando o lançamento na atmosfera de
toneladas de carbono.
Gráfico 1 – Desmatamento na Amazônia Legal entre 1988 a 2006
É lícito supor, ainda, que a decretação das unidades de conservação tenha
reduzido a especulação fundiária e a violência no campo, já que ao serem
formalmente delimitadas como terras públicas, essas unidades tendem a
desestimular pretensões de posse por parte de agentes privados, que não
teriam como legalizá-las posteriormente por meios legítimos. Cabe ressaltar
ainda que essa experiência resultou no fortalecimento, no âmbito do
Governo Federal, das unidades de conservação como instrumento relevante
de políticas públicas capaz de mitigar conflitos e promover um modelo
de desenvolvimento em bases mais justas e adequadas às peculiaridades
regionais da Amazônia.
41
3 - Estado atual da política nacional de áreas protegidas
3.1 - Estrutura do Sistema Nacional de Unidades de Conservação da
Natureza
O SNUC foi instituído pela Lei nº 9.985, de 18/07/2000 que, ao regulamentar
o artigo 225 da Constituição Federal, estabeleceu critérios e normas para
a criação, implantação e gestão das unidades de conservação no Brasil. O
SNUC é constituído pelo conjunto das unidades de conservação federais,
estaduais e municipais e é gerido pelos seguintes órgãos:
- Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama)7, órgão consultivo e
deliberativo, com atribuições de acompanhar a implantação do Sistema;
- Ministério do Meio Ambiente, órgão central responsável pela coordenação
do Sistema;
- órgãos executores dos níveis federal, estaduais e municipais, responsáveis
por implantar o SNUC, por subsidiar as propostas de criação e administrar
as unidades de conservação em suas respectivas esferas de atuação.
O Sistema está organizado em dois grupos de unidades de conservação,
totalizando 12 categorias de manejo: as unidades de proteção integral,
cujo objetivo básico é preservar a natureza, sendo admitido apenas o
uso indireto dos recursos naturais, e as unidades de uso sustentável, que
objetivam compatibilizar a conservação da natureza com o uso sustentável
de parcela dos recursos naturais existentes em seu interior (veja Quadro 4
– Categorias e respectivos objetivos de manejo do SNUC).
Instituído pela Lei 6.938/81, o Conselho Nacional do Meio Ambiente é o órgão consultivo e
deliberativo do Sistema Nacional do Meio Ambiente (Sisnama) e tem “a finalidade de assessorar
e propor diretrizes de políticas governamentais para o meio ambiente e os recursos naturais e
deliberar (...) sobre normas e padrões compatíveis com o meio ambiente ecologicamente equilibrado
e essencial à sadia qualidade de vida”.
7
42
Quadro 4 - Categorias e respectivos objetivos de manejo do SNUC
Fonte: Lei no 9.985/2000 - Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza
Segundo a lei, as unidades de conservação são criadas por ato do poder
público. Do ponto de vista da posse e do domínio da terra, quatro das 12
categorias instituídas pelo SNUC – Estação Ecológica, Reserva Biológica,
Parque Nacional, Reserva de Fauna e Floresta Nacional - são de domínio
43
público e não admitem a presença de populações humanas em seu
interior, exigindo, por isso, o reassentamento de populações eventualmente
residentes e a desapropriação das terras privadas existentes em seu interior.
As Reservas Extrativistas e as Reservas de Desenvolvimento Sustentável
são também áreas de domínio público; porém, podem ser habitadas e
ter seus recursos explorados por populações locais, que devem assinar
contrato de concessão de uso com o órgão gestor. As categorias Monumento
Natural e Refúgio de Vida Silvestre admitem áreas privadas em seu interior,
desde que seja possível compatibilizar os usos privados com os objetivos
de preservação descritos na lei – caso contrário, devem ser desapropriadas
pelo poder público. As categorias Área de Proteção Ambiental e Área
de Relevante Interesse Ecológico são constituídas por terras públicas e
privadas. E as Reservas Particulares do Patrimônio Natural são constituídas
por áreas privadas (leia mais no item 3.5 - Áreas protegidas privadas).
No que tange ao planejamento da gestão das unidades de conservação,
todas elas devem dispor de um plano de manejo, que deve abranger a
área da unidade, sua zona de amortecimento (buffer zone) e os corredores
ecológicos de que façam parte, visando integrá-las à vida econômica e social
das comunidades vizinhas. A lei assegura a participação da sociedade na
elaboração, implementação e atualização de planos de manejo de todas as
categorias de unidades previstas no SNUC.
As unidades do grupo de proteção integral, as Áreas de Proteção Ambiental
e as Florestas Nacionais, Estaduais e Municipais devem ter um conselho
consultivo, presidido pelo órgão responsável por sua administração e
constituído por representantes de órgãos públicos, de organizações da
sociedade civil, por proprietários de terras localizadas em Refúgio da
Vida Silvestre e Monumento Natural e, quando for o caso, de populações
tradicionais residentes. As Reservas Extrativistas e as Reservas de
Desenvolvimento Sustentável devem ter conselhos deliberativos (ler mais
no item 3.6.1 – Manejo comunitário de ecossistemas em unidades de
conservação). A lei faculta a organizações da sociedade civil de interesse
público a possibilidade de assumirem a gestão compartilhada de unidades
de conservação mediante instrumento firmado com o órgão responsável
por sua administração e sob sua supervisão.
Em agosto de 2002, o Decreto nº 4.340 regulamentou artigos da lei do
SNUC relativos aos seguintes temas: criação de unidade de conservação,
definição de limites do subsolo e do espaço aéreo da unidade de conservação,
criação e funcionamento de mosaico de unidades de conservação, plano
de manejo, funcionamento de conselhos consultivo e deliberativo, a
gestão compartilhada com organizações da sociedade civil de interesse
público, autorização para a exploração de bens e serviços em unidades
de conservação, compensação por significativo impacto ambiental,
reassentamento de populações tradicionais residentes em unidades de
conservação, reavaliação de unidade conservação de categoria inexistente
no SNUC, funcionamento das Reservas da Biosfera.
44
Em julho de 2005, a Lei nº 11.132 acrescentou à Lei nº 9.985/00 o
artigo 22-A, prevendo a possibilidade de o “poder público, ressalvadas as
atividades agropecuárias e outras atividades econômicas em andamento
e obras públicas licenciadas, na forma da lei, decretar limitações
administrativas provisórias ao exercício de atividades e empreendimentos
efetiva ou potencialmente causadores de degradação ambiental, para a
realização de estudos com vistas na criação de unidade de conservação,
quando, a critério do órgão ambiental competente, houver risco de dano
grave aos recursos naturais ali existentes”.
3.1.1 – Principais desafios para a implementação do SNUC
Os principais desafios para a implementação de um sistema nacional de
unidades de conservação ecologicamente representativo e bem gerenciado
são:
- assegurar sustentabilidade financeira ao SNUC: a insuficiência de recursos
financeiros para viabilizar o bom funcionamento do Sistema é uma questão
crítica, considerando, inclusive as expectativas quanto à sua ampliação;
é preciso incrementar o orçamento governamental destinado ao SNUC,
consolidar fontes alternativas de financiamento, como a compensação
ambiental, arrecadação via visitação pública, pagamento por serviços
ambientais, concessões florestais e regulamentar fontes de receita que
demandem essa medida;
- dotar o sistema de unidades de conservação com pessoal em número e
qualificação adequados: a dificuldade de contratação e de manutenção de
funcionários apareceu como um dos problemas críticos para nove categorias
de unidades de conservação avaliadas pelo método Rappam em um estudo
recente realizado pelo órgão gestor federal em parceria com o WWF-Brasil;
adicionalmente, deficiências na qualificação de parte do quadro técnico do
órgão gestor federal dificultam o enfrentamento de questões-chaves para a
efetividade do Sistema;
- providenciar a regularização fundiária das unidades de conservação:
um percentual substancial do SNUC apresenta pendências fundiárias que
comprometem o planejamento, o funcionamento e a gestão das unidades de
conservação; a solução dessas pendências passa pela alocação de recursos
financeiros e humanos em quantidades compatíveis com a demanda, bem
como pelo aprimoramento das normas pertinentes;
- regulamentar as categorias de manejo contidas no SNUC: a entrada
em vigor da Lei nº 9.985/2000 estabeleceu mecanismos de gestão para
as unidades de conservação que necessitam ser melhor detalhados por
meio de regulamentação específica. A demanda vale, inclusive, para
categorias regulamentadas antes do SNUC, caso dos Parques Nacionais,
Reservas Extrativistas e Florestas Nacionais, que precisam ser atualizadas;
a regulamentação das Reservas Particulares do Patrimônio Natural, em
2006, representou um avanço para solucionar essa questão.
45
- instituir sistemas estaduais e municipais compatíveis com o SNUC:
diagnosticar a situação dos sistemas estaduais e municipais de unidades
de conservação existentes e fomentar a instituição de sistemas nos estados
em que não existam ainda, a fim de compatibilizá-los com o SNUC e,
assim, adotar medidas visando a consolidação do Sistema.
- incrementar a elaboração e implementação de planos de manejo das
unidades de conservação: segundo a lei que instituiu o SNUC, as unidades
de conservação devem ter um plano de manejo que contemple sua área, a
zona de amortecimento e os corredores ecológicos, prevendo medidas que
as integre à vida econômica e social das comunidades vizinhas. Embora
essa demanda venha merecendo atenção dos órgãos responsáveis pela
gestão das unidades de conservação federais, há ainda um grande passivo
a ser enfrentado, já que apenas 28% da parte federal do Sistema tem planos
aprovados (não há dados consolidados sobre a situação do planejamento
no âmbito das unidades estaduais).
Análise de efetividade da gestão no âmbito do SNUC
Entre 2005 e 2006, Ibama e WWF-Brasil conduziram
um estudo que, utilizando o método Rappam, analisou a
efetividade da gestão em 84,4% das unidades de conservação
federais e avaliou o SNUC por meio de questões relacionadas
aos módulos “desenho do Sistema”, “políticas relacionadas às
unidades de conservação” e “contexto político existente”. O
trabalho atendeu a uma das demandas trazidas pelo Plano de
Trabalho sobre Áreas Protegidas da CDB, Decisão VII/28 (mais
informações sobre esse estudo estão publicadas no item 4.2 Análise de efetividade de gestão das unidades de conservação).
As conclusões mais relevantes sobre o funcionamento do
SNUC foram:
- Desenho do Sistema: esse módulo avaliou se os objetivos de
proteção das unidades e de conservação das espécies e cultural
local estavam sendo atendidos. O resultado da avaliação foi
média (47%), destacando-se positivamente a pertinência das
categorias de manejo do Sistema. Um dos aspectos menos
positivos desse módulo é a inadequada proteção de espécies
vulneráveis, o que retrata, entre outros fatores, a insatisfatória
conectividade entre as áreas protegidas, uma vez que a
conservação de espécies pode demandar a manutenção de
padrões de migração e áreas de reprodução e alimentação
entre fragmentos protegidos. A integridade ecossistêmica
também obteve baixa avaliação, apontando a necessidade
de incorporação de maior variedade de processos naturais e
padrões de paisagem ao Sistema.
46
- Políticas relacionadas às unidades de conservação: as
políticas para as unidades, que envolvem planejamento e outras
práticas de gerenciamento do sistema, foram avaliadas como
“críticas”, obtendo avaliação de 23%. Segundo o documento,
tais políticas comprometem o alcance dos objetivos nacionais
de conservação, uma vez que: a) a extensão de áreas sob
proteção no Sistema é inadequada para a conservação da
biodiversidade e de aspectos socioculturais; b) há pouco
comprometimento com a proteção de uma rede viável de
unidades de conservação; c) as pesquisas sobre diversidade
biológica são insuficientes, assim como a avaliação de lacunas
visando identificar espécies inadequadamente protegidas; d)
há necessidade de investimentos em programas de capacitação;
o monitoramento do manejo e da gestão de unidades de
conservação é deficiente; e) as estratégias voltadas para a
sustentabilidade dos recursos naturais e o desenvolvimento
das populações tradicionais são falhas; f) a gestão do Sistema
carece de melhorias na estrutura organizacional.
- Contexto político existente: avaliado também como tendo
resultados baixos (23%), esse módulo conclui que: a)
as políticas nacionais que favorecem a participação da
sociedade e o diálogo entre as instituições governamentais e
não governamentais são medianamente satisfatórias; b) não
existem recursos financeiros comprometidos e disponíveis em
montante suficiente para a gestão efetiva do Sistema; c) as
metas de conservação não estão incluídas em todos os aspectos
das políticas de desenvolvimento nacional; d) a comunicação
interinstitucional é falha; e) há sérios problemas na aplicação
efetiva das leis; f) as políticas nacionais relacionadas à
educação ambiental, manejo e conservação de recursos
naturais necessitam ser melhoradas; g) a capacitação dos
funcionários públicos de vários setores da área ambiental é
deficiente.
A conclusão geral do estudo é que tais problemas sistêmicos
influenciam negativamente a gestão das unidades de
conservação do país, e seu reconhecimento aponta a
necessidade de maior articulação e o desenvolvimento de um
planejamento estratégico intersetorial.
47
3.2 - Incremento de áreas protegidas
3.2.1 - Áreas prioritárias para a conservação da biodiversidade e análise
de lacunas de representatividade
Entre 1998 e 2000, o Projeto de Conservação e Utilização Sustentável da
Diversidade Biológica Brasileira (Probio), do Ministério do Meio Ambiente,
realizou ampla consulta para a definição de áreas prioritárias para a
conservação, uso sustentável e repartição de benefícios da biodiversidade
em cada um dos biomas do país. Desde então, novas informações
sobre os ecossistemas brasileiros e novas metodologias de identificação
de prioridades se tornaram disponíveis, ensejando a oportunidade para
atualizar o mapeamento das áreas prioritárias no país e, por conseguinte,
a identificação das lacunas existentes em termos de conservação da
diversidade biológica.
O processo de atualização das áreas prioritárias, realizado em 2005 e
2006, teve, inicialmente, reuniões técnicas para a definição dos alvos de
conservação, das metas e importância relativa de cada alvo e a elaboração
do Mapa das Áreas de Importância para a Biodiversidade, produtos que
subsidiaram seminários regionais por biomas. De forma geral, a atribuição
de importância a cada área foi baseada nas informações disponíveis
sobre biodiversidade e pressão antrópica, bem como na experiência dos
pesquisadores participantes dos seminários de cada bioma. O grau de
prioridade de cada área foi definido por sua riqueza biológica, importância
para as comunidades tradicionais e povos indígenas e por sua vulnerabilidade.
Os resultados dos seminários por bioma foram sistematizados num mapa
com as áreas prioritárias atualizadas, posteriormente aprovado pelo
Conselho Nacional de Biodiversidade (Deliberação Conabio nº 46, de
20/12/2006) e reconhecido pela Portaria MMA nº 9, de 23/01/2007, se
convertendo, assim, em referência para a formulação e implementação
de políticas públicas destinadas à conservação e ao uso sustentável da
biodiversidade.
Ao final desse esforço, o número de áreas prioritárias para a conservação,
uso sustentável e repartição de benefícios da biodiversidade brasileira subiu
de 900, identificadas no processo de 1998-2000, para 2.684. Desse
total, 1.123 são áreas já protegidas por unidades de conservação ou terras
indígenas, sendo que as demais 1.561 constituem novas áreas propostas
– apontando, portanto, as lacunas existentes segundo as novas prioridades
de conservação identificadas. Em virtude da metodologia adotada nesse
processo, a zona costeira foi distribuída segundo os biomas que permeiam
o litoral brasileiro, indicando 506 áreas prioritárias. Já para a zona marinha,
foram identificadas 102 áreas prioritárias.
48
Gráfico 2 – Distribuição das áreas prioritárias por bioma do processo 2005-2006
Fonte: Áreas Prioritárias para Conservação, Uso Sustentável e Repartição de Benefícios da Biodiversidade Brasileira: Atualização - Portaria MMA n°
09/01/2007. Biodiversidade 31/CD-Rom.
Esse aumento substancial no número de áreas prioritárias, de 1998-2000
para 2005-2006, se deveu a um conjunto de fatores, entre os quais os
coordenadores do processo destacam a melhoria quantitativa e qualitativa
dos dados disponibilizados pelos pesquisadores, centros de pesquisa e
órgãos públicos; à metodologia empregada, que contou com a participação
de um grande número de especialistas na definição dos alvos e metas de
conservação, que utilizaram novos softwares para construir cenários de
conservação; e também pela maior participação da sociedade civil, que
pôde agregar seu conhecimento empírico ao conhecimento científico dos
especialistas na construção desse instrumento de gestão.
Considerando a importância biológica, social e econômica da floresta
amazônica, os diversos grupos sociais envolvidos no processo concluíram
que 80% do bioma deveriam ter o status de área prioritária para a
conservação, uso sustentável e repartição de benefícios da biodiversidade.
O mapa final de áreas prioritárias para a Amazônia é constituído por 825
áreas, das quais 335 são novas áreas e 490 são áreas já protegidas.
A análise das conclusões do novo mapeamento das prioridades para a
criação de unidades de conservação de proteção integral indica que as
áreas mais extensas estão no bioma Amazônia, um total de 207.218 km2.
No entanto, a Caatinga e o Pantanal foram os biomas com a maior área
percentual indicada como alvo de criação de unidades de proteção integral,
respectivamente 11% e 9,5% da área total de cada um dos biomas. No
caso da Mata Atlântica, embora a recomendação para criação de unidades
de proteção integral englobe apenas 3,5% de sua área total, esse número
representa 50 áreas prioritárias, situação explicada por se tratar do bioma
mais ameaçado do país.
49
Em relação às prioridades para a criação de unidades de conservação de
uso sustentável, o bioma Amazônia registrou a maior extensão territorial
e também o maior número de áreas prioritárias, perfazendo um total de
437.273 km2 - 10,3% do total do bioma - distribuídos em 97 áreas. Esses
números atestam que um dos caminhos a seguir para diminuir a perda
de cobertura vegetal e de diversidade biológica e social é a adoção de
políticas públicas que possibilitem a inclusão social e o uso sustentável dos
recursos naturais na Amazônia, diretrizes que norteiam o PNAP. E, embora
os resultados da análise da criação de unidades de conservação de uso
sustentável para os biomas Cerrado e Mata Atlântica, os mais ameaçados
do país, tenham se mostrado menos expressivos que os da Amazônia,
o número de áreas apontadas – 30 e 37 áreas, respectivamente - e a
extensão correspondente - 105.911 km2 e 16.641 km2, respectivamente
- indicam o anseio da sociedade em reverter o quadro de fragmentação,
mau uso e perda de biodiversidade nesses biomas. A classificação do grau
de importância biológica dessas áreas como extremamente alta - 47 na
Amazônia, 17 no Cerrado, 14 na Mata Atlântica - justifica as preocupações
da sociedade e corrobora ainda mais suas recomendações.
3.2.2 - Incremento das unidades de conservação entre 1997 e 2007
A última década propiciou condições para que o Brasil promovesse um
substancial incremento da área submetida à proteção por meio de unidades
de conservação. Em 1997, ano do Congresso de Santa Marta, havia no país
196 unidades de conservação de proteção integral federais e estaduais,
abrangendo uma área de aproximadamente 21,6 milhões de hectares, e
149 unidades de uso sustentável, federais e estaduais, recobrindo 25,9
milhões de hectares. Do total de unidades então existentes, 283 protegiam
cerca de 46,5 milhões de hectares de ambientes terrestres, ou 5,46%
do território continental brasileiro, e 62 protegiam aproximadamente um
milhão de hectares de ambientes marinhos, ou 0,32% da área marinha
brasileira.
Em março de 2007, o Cadastro Nacional de Unidades de Conservação
contabilizava 310 unidades de proteção integral e 286 de uso sustentável,
federais e estaduais, abrangendo respectivamente 41,5 milhões de hectares
e 58,2 milhões de hectares. Nessa mesma data, o Cadastro Nacional
registrava 505 unidades que protegiam cerca de 98 milhões de hectares de
ambientes terrestres, ou 11,49% do território continental do país, e 91 que
protegiam ecossistemas marinhos, o equivalente a 0,59% da área marinha
do Brasil. Se somados à área brasileira já protegida os 575 mil hectares
de reservas privadas existentes, a área do país integrada ao sistema de
unidades de conservação ultrapassa hoje cem milhões de hectares8.
A versão do Cadastro Nacional de Unidades de Conservação, atualizada em março de 2007, contém
dados de unidades federais e estaduais cujos atos de criação foram devidamente identificados.
Porém, não contém dados sobre as unidades de conservação municipais, que estão excluídas desse
cálculo. Os dados referentes às reservas privadas são da CNRPPN, considerados mais atualizados.
8
50
Sistema Nacional tem um milhão de quilômetros quadrados
Segundo os dados mais atualizados do Cadastro Nacional de
Unidades de Conservação, administrado pelo Ministério do Meio
Ambiente, o Brasil tem 596 unidades de conservação federais
e estaduais oficialmente reconhecidas como parte do SNUC.
Se somadas suas áreas e extraídas as sobreposições, o Sistema
submete à proteção formal 997 mil km2 dos diferentes biomas
brasileiros. A Confederação Nacional de Reservas Particulares
do Patrimônio Natural (CNRPPN) contabiliza 5,75 mil km2 de
reservas naturais privadas, reconhecidas em âmbito federal
e estadual. Assim, o Brasil tem hoje aproximadamente 1,05
milhão de km2 de seu território delimitados como unidades
de conservação, terrestres e marinhas. Essa área é superior à
soma dos territórios de França, Alemanha e Portugal.
Um detalhamento do tipo de proteção fornecida por essas unidades de
conservação está presente no Quadro 5 - Detalhamento do SNUC por
grupo de manejo, jurisdição e condição geográfica. A análise da situação
atual referente à representatividade dos diferentes biomas no conjunto
das unidades de conservação declaradas, federais e estaduais, permite
identificar a existência de uma disparidade entre a área da Amazônia
submetida à proteção e a área dos demais biomas, conforme demonstra o
Quadro 6 - Extensão e percentual de unidades de conservação por bioma
e grupo de manejo.
Quadro 5 – Detalhamento do SNUC por grupo de manejo, jurisdição e condição geográfica
Fonte: Cadastro Nacional de Unidades de Conservação, março de 2007.
51
Quadro 6 – Extensão e percentual de unidades de conservação por bioma e grupo de manejo*
*Não inclui as Reservas Particulares do Patrimônio Natural, tratadas à parte neste documento.
Fonte: Cadastro Nacional de Unidades de Conservação, março de 2007.
No processo de incremento do SNUC ocorrido na última década há casos
que merecem destaque, seja pelas dimensões da superfície convertida
em unidades de conservação seja pela importância biológica das áreas
declaradas. É nesse período que foram declaradas as duas mais extensas
unidades de conservação de proteção integral tropicais da América Latina
– o Parque Nacional Montanhas do Tumucumaque, criado em agosto
de 2002 com 3,87 milhões de hectares no nordeste da Amazônia, e a
Estação Ecológica do Grão-Pará, criada pelo governo estadual do Pará em
dezembro de 2006, com 4,25 milhões de hectares, também na Amazônia.
Juntas, essas unidades compõem um extenso corredor de áreas protegidas
na calha norte do rio Amazonas.
Na área de influência da rodovia BR-163, que abrange áreas de Cerrado,
fitofisionomias de transição e de Floresta Amazônica, foram criados nos
últimos cinco anos 15,1 milhões de hectares de novas unidades de
conservação de diferentes categorias de manejo (mais detalhes no item 2.3
- Integração das áreas protegidas a planos de desenvolvimento nacional).
Também nos últimos cinco anos foi empreendido um grande esforço
para preservar remanescentes significativos de Floresta Ombrófila Mista
e campos naturais associados, ecossistemas do domínio do bioma Mata
Atlântica que recobriam cerca de 20 milhões de hectares do Planalto
Meridional brasileiro. Trata-se de uma formação florestal marcada pela
imponente presença da conífera Araucaria angustifolia, drasticamente
reduzida ao longo do último século a ponto de pesquisadores questionarem
a viabilidade ecológica dessa espécie (MEDEIROS 2004).
Entre 2003 e 2006, foram realizados estudos em regiões com remanescentes
de Floresta Ombrófila Mista e campos associados, resultando na criação
52
de seis unidades de conservação de proteção integral, totalizando 81.335
hectares. Uma nova unidade de conservação de proteção integral, com
25.719 hectares, está planejada para ser declarada em breve. No conjunto,
essas sete áreas permitirão elevar o percentual desses ecossistemas sob
proteção de 0,36% para cerca de 1% de sua área original, um incremento
de quase 150%.
Plano Nacional fixa meta para proteger ambientes
marinhos até 2012
Considerando a extensão da chamada Zona Econômica
Exclusiva9, e conseqüentemente, a diversidade de ambientes
aquáticos existentes, vis-à-vis a extensão das áreas submetidas
à proteção por meio de unidades de conservação federais, que
alcança 0,59% do território, o Brasil necessita empreender
um esforço maior para atender o item 1.1.3 do Programa de
Trabalho da CDB – “direcionar ações para eliminar o problema
da sub-representação de ecossistemas de águas continentais
e ecossistemas marinhos”.
Essa lacuna foi reconhecida pelo PNAP, que criou um grupo
de trabalho para elaborar ações específicas dirigidas à zona
costeira e marinha, incluindo a gestão e o manejo das unidades
de conservação que protegem ecossistemas aquáticos. Segundo
esse grupo, a rede de unidades marinhas deve alcançar, até
2012, no mínimo 20% a 30% de cada ecossistema (PRATES
2007). A criação de novas unidades deverá se guiar pelas
conclusões da revisão das áreas prioritárias para a conservação
da biodiversidade, que identificou 506 áreas costeiras e 102
marinhas como prioridades (leia mais detalhes no item 3.2.1
- Áreas prioritárias para a conservação da biodiversidade e
análise de lacunas de representatividade).
Com base no artigo 55 da Convenção das Nações Unidas sobre Direitos do Mar, a Lei nº
8.617/1993 definiu a Zona Econômica Exclusiva (ZEE) como “uma faixa que se estende das doze
às duzentas milhas marítimas, contadas a partir das linhas de base que servem para medir a largura
do mar territorial”. Nessa faixa, que corresponde a 3.129.069 km2, o Brasil “tem o direito exclusivo
de regulamentar a investigação científica marinha, a proteção e preservação do meio marítimo, bem
como a construção, operação e uso de todos os tipos de ilhas artificiais, instalações e estruturas”.
9
53
3.2.3 - Incremento de terras indígenas entre 1997 e 2007
Os dados disponíveis sobre o número e a área coberta pelas terras indígenas
no Brasil hoje são ligeiramente divergentes. Segundo a Funai, órgão
indigenista oficial, há no Brasil 611 terras indígenas abrangendo uma área
de 105.672.003 hectares10. De acordo com o Instituto Socioambiental
(ISA) – organização da sociedade civil que há 25 anos monitora a situação
jurídica das terras indígenas com base em atos publicados no Diário Oficial
da União -, há 596 terras reconhecidas como indígenas pelo Estado
brasileiro, o que equivale a 109.532.490 hectares. A divergência se deve
à metodologia adotada por cada instituição11. Assim, segundo os dados
citados, as terras indígenas ocupam entre 12,4 % a 12,8% do território
brasileiro e, embora se distribuam por quase todo o país, 98% da extensão
total dessas terras está localizada na Amazônia Legal.
O número de terras indígenas demarcadas sofreu incremento substancial
a partir de 1996, quando foi iniciada a implantação do Projeto Integrado
de Proteção às Populações e Terras Indígenas da Amazônia Legal (PPTAL).
Componente do Programa Piloto para a Proteção das Florestas Tropicais
do Brasil, o PPTAL forneceu à Funai recursos técnicos e financeiros para
dar conta do passivo envolvendo a demarcação de terras indígenas no
país (para detalhes, ler o item 5.5.2 - Programa Piloto para a Proteção
das Florestas Tropicais do Brasil). Até dezembro de 2006 - em dez anos,
portanto - o Projeto viabilizou a demarcação de 97 terras indígenas na
Amazônia Legal, o equivalente a 38 milhões de hectares - pouco mais de
um terço da extensão total das terras indígenas na região (PPTAL s/d).
3.3 - Equivalência entre as categorias de manejo do SNUC e da IUCN
De acordo com o Atlas de Conservação da Natureza Brasileira, editado
sob a coordenação técnico-científica do Ibama em 2004, todas as 12
categorias de manejo que constituem o SNUC encontram equivalência no
sistema de categorias estabelecido em 1994 pela IUCN, conforme descrito
no Quadro 7. A fim de propiciar uma idéia mais clara da abrangência de
cada categoria no âmbito do Sistema Nacional e sua equivalência com o
sistema IUCN de classificação, publicamos também o Quadro 8, no qual
estão descritas o número de unidades por categoria, federais e estaduais
somadas, e a correspondente superfície coberta por cada qual.
Os dados citados foram extraídos de http://www.funai.gov.br/
Os dados atribuídos ao ISA foram extraídos de http://www.socioambiental.org/pib/portugues/
quonqua/ondeestao/locext.html
10
11
54
Quadro 7 – Equivalência entre as categorias do SNUC e do Sistema IUCN
Fonte: Atlas de Conservação da Natureza Brasileira – Unidades Federais, Ibama 2004.
55
Quadro 8 – Número e área de unidades de conservação por categoria da IUCN e sua
equivalência segundo o SNUC
Fontes: Atlas de Conservação da Natureza Brasileira – Unidades Federais, Ibama 2004; Cadastro Nacional de Unidades de Conservação/ MMA,
março 2007; CNRPPN.
3.4 - Demarcação física e regularização fundiária das áreas protegidas
3.4.1 - Consolidação territorial das unidades de conservação federais
Ainda que não haja dados globais disponíveis sobre o percentual de
unidades de conservação federais com pendências fundiárias e problemas
de demarcação, esse universo é representativo no conjunto do Sistema e
é tido como um dos maiores entraves à sua implementação e gestão. A
demarcação física e a regularização fundiária das unidades de conservação
federais são, atualmente, abordadas como parte de um processo que o
Instituto Chico Mendes classifica como “consolidação territorial”, e que,
inclusive, ensejou a formulação de um programa específico - o Programa
de Consolidação Territorial de Unidades de Conservação (PCTUC), iniciado
em 2006.
A demarcação de unidades de conservação, assim como a demarcação
de imóveis rurais no Brasil, é regulada pela Lei nº 6.015/73, a Lei de
Registros Públicos, que especifica a metodologia, o nível de precisão e os
equipamentos necessários para demarcar imóveis rurais. O trabalho de
demarcação física é antecedido pela elaboração de um plano de trabalho
que leva em conta não apenas a descrição dos limites da área protegida,
contida no memorial descritivo, mas também informações como os pontos
56
mais suscetíveis a pressões externas, a localização de linhas secas, as
condições do relevo, entre outras. Com o plano em mãos, os técnicos
executam a demarcação no terreno com dois objetivos: caracterizar
fisicamente a área, em cumprimento à lei, e implantar medidas que
resultem em reforço à proteção dos limites, como sinalização ou mesmo o
cercamento de limites identificados como vulneráveis. É o que os técnicos
denominam “demarcação como fator de proteção”. No caso das unidades
de conservação marinhas, a demarcação é realizada por meio da instalação
de bóias de sinalização segundo parâmetros técnicos estabelecidos pela
Marinha do Brasil.
A falta de demarcação física nas unidades federais afeta principalmente
aquelas criadas em décadas passadas e resulta de imprecisões na descrição
dos limites que impedem o “fechamento” da poligonal da área. Embora a
intensidade do impacto dessa situação varie de acordo com o contexto
da unidade, essa situação acaba comprometendo a execução de medidas
essenciais para a consolidação da unidade: dificulta a correta identificação
dos imóveis particulares passíveis de desapropriação; traz insegurança a
processos de licenciamento, autorização de desmatamento ou outros que
envolvam imóveis situados no entorno das unidades; fragiliza as ações
de proteção e fiscalização, impedindo processos contra invasores das
unidades; compromete a elaboração de planos de manejo, de pesquisa
e outros estudos relevantes para a implementação da unidade; bloqueia
as exigências legais relacionadas ao registro público dos imóveis que
compõem as unidades (PCTUC 2006). Em síntese, a falta de demarcação
física debilita a proteção e a própria gestão da área e acirra conflitos com
atores envolvidos no problema, já que seus limites não ficam claros para a
sociedade e para o órgão gestor.
A regularização da situação fundiária das unidades de conservação federais
envolve, basicamente, pendências de dois tipos: a) proprietários privados
com documentação legalizada e b) pessoas ou comunidades que têm a
posse, mas não possuem títulos de propriedade (SOARES et al. 2002, p.
13-14). No primeiro caso, a regularização fundiária se dá fundamentalmente
pela aquisição dos imóveis incidentes sobre a unidade, solução que ao
longo dos anos tem esbarrado na insuficiência de recursos financeiros,
resultando em um grande passivo para o órgão gestor federal.
Para o segundo tipo de pendência, a legislação em vigor admite, no caso
de pequenos posseiros, populações tradicionais e agricultores familiares, a
presença temporária no interior das unidades, de forma regulada por termo
de compromisso, assinado entre o gestor da unidade e as populações
residentes, até que o poder público adote medidas como o reassentamento,
por meio de programa de reforma agrária, e indenização por benfeitorias,
segundo cada caso. Essa situação, porém, representa restrições ao uso dos
recursos e à comercialização de matérias-primas, prejudicando a economia
das famílias residentes (SOARES et al. 2002, p.18-20).
Além dessas duas classes de problemas, o órgão gestor do SNUC enfrenta
57
a questão da “dupla afetação”, decorrente da implementação de políticas
que resultaram na sobreposição entre unidades de conservação e outras
terras públicas, como áreas indígenas, assentamentos de reforma agrária ou
terras reconhecidas como de comunidades remanescentes de quilombos.
A solução para essa categoria de problemas passa necessariamente pela
harmonização das políticas governamentais e entendimentos entre os
órgãos responsáveis por sua execução, esforço que inclusive demandou
a criação de um grupo de trabalho coordenado pela Advocacia Geral da
União.
Dados preliminares da Coordenadoria Geral de Regularização Fundiária do
órgão gestor federal apontam que aproximadamente 50% da extensão das
unidades de conservação federais são terras públicas - áreas que, portanto,
demandariam indenização por benfeitorias de posseiros, cujos custos são
menores. Quanto aos outros 50% que abrangem terras presumivelmente
particulares, cerca de 30% dos imóveis já teriam sido indenizados. Esses
dados, no entanto, exigem ser confirmados por meio de levantamentos na
documentação existente.
Os passivos envolvendo a demarcação física e a regularização fundiária das
unidades de conservação federais são preocupações do PCTUC, Programa
que avança no tratamento da questão fundiária ao pensá-la além da mera
aquisição de imóveis e indenização de benfeitorias, como era no passado.
A partir de um diagnóstico amplo da origem dos problemas e das limitações
institucionais e orçamentárias do órgão para dar conta dessa demanda,
o PCTUC propõe “um conjunto de medidas que deve ser adotado para
garantir a plena governabilidade das áreas protegidas” (PCTUC 2006). O
programa se organiza em torno de três grupos de objetivos:
- objetivos finalísticos: envolve atividades voltadas para consolidar os limites
das unidades de conservação mediante a revisão de memoriais descritivos
e, posteriormente, a demarcação das unidades; regularização das terras
públicas, incorporando as unidades declaradas ao domínio do órgão gestor,
de forma a aumentar sua governabilidade sobre essas áreas; aquisição
de terras e indenização de benfeitorias, visando promover a remoção de
proprietários e posseiros de unidades de conservação que não admitem
sua permanência; reassentamento de populações residentes, mediante
processos participativos e articulações interinstitucionais com órgãos
responsáveis pela política fundiária, visando a transferência das famílias
para projetos de reassentamento; mediação de conflitos socioambientais,
por meio de negociações com os atores envolvidos, visando articular
soluções participativas.
- objetivos meio: envolve a realização de um levantamento da documentação
existente em outros órgãos da Administração Pública, como o Serviço de
Patrimônio da União, com vistas a identificar a situação do patrimônio
fundiário cadastrado referente às unidades de conservação, e de um
levantamento fundiário sobre as unidades de conservação federais;
58
- objetivos estruturantes: estruturar um sistema de informações
georreferenciadas com foco no monitoramento da situação fundiária das
unidades de conservação federal; fazer a revisão dos mecanismos de
regulação e de normas internas que tratem da regularização fundiária e
dos procedimentos para compensação de reserva legal e para dação em
pagamento – abatimento de dívidas com o governo do valor a ser pago a
um proprietário com direito à indenização -, visando aumentar a receita
do órgão gestor; elaboração de manuais voltados para a avaliação de
terras e de benfeitorias e para a demarcação e sinalização de unidades
de conservação; consolidar parcerias com o órgão federal de colonização
e reforma agrária (Incra) a fim de avaliar os imóveis situados em unidades
de conservação federais e organizar o reassentamento de populações
residentes em unidades de conservação; promover a capacitação de
procuradores federais para a análise de cadeia dominial e do corpo técnico
do órgão gestor para a elaboração de planos de consolidação territorial e
a formação de forças-tarefas especializadas em avaliação de imóveis e
perícia judicial; agilizar a obtenção de recursos por meio de instrumentos
como a compensação ambiental e incrementar a aquisição de terras via
compensação a reserva legal e da dação de pagamento.
3.4.2 - Demarcação física das terras indígenas
Segundo a Constituição, cabe ao poder público, por meio do órgão indigenista
oficial (Funai), a responsabilidade de promover o reconhecimento das terras
indígenas através de ato declaratório que faça conhecer seus limites, assegure
sua proteção e impeça sua ocupação por terceiros. Desde a aprovação do
Estatuto do Índio (Lei nº 6.001/1973) esse reconhecimento formal pelo
Estado passou a obedecer a um procedimento administrativo, que estipula
as etapas do processo de demarcação, incluindo etapa de demarcação in
loco. Atualmente, tal processo é regulamentado pelo Decreto nº 1.775,
editado em janeiro de 1996 pelo Poder Executivo federal. Segundo este
decreto, a demarcação das terras indígenas deve cumprir as seguintes
etapas:
a) identificação e delimitação: um antropólogo de qualificação reconhecida
elabora estudo identificando os limites da terra indígena a ser demarcada.
O estudo antropológico é acompanhado por estudos complementares
necessários à delimitação, realizado por um grupo técnico especializado.
Um relatório circunstanciado é enviado à Funai, caracterizando a terra
indígena a ser demarcada;
b) declaração: vencido o prazo para contestações por terceiros, e não
havendo motivo que justifique a interrupção do processo, a Funai
encaminha o respectivo relatório ao Ministro de Estado da Justiça que,
mediante portaria, declara os limites da terra indígena e determina a sua
demarcação;
c) demarcação: o processo de demarcação física é realizado no terreno;
59
d) homologação: concluído o processo de demarcação física, a terra
indígena é homologada por decreto do presidente da República;
e) registro imobiliário: em até trinta dias após a publicação do decreto
de homologação, a Funai deve promover o registro dos limites da terra
indígena em cartório imobiliário da comarca correspondente e na Secretaria
do Patrimônio da União do Ministério do Planejamento.
O processo de demarcação física de uma terra indígena pode variar de
acordo com condições como o acesso aos limites reconhecidos; a extensão
de linhas secas versus limites naturais; a pressão de interesses contrários à
demarcação - que, em alguns casos, exige proteção policial às equipes de
demarcação -; o nível de organização e participação dos próprios índios.
Desde 1996, o Projeto Integrado de Proteção às Populações e Terras
Indígenas da Amazônia Legal (PPTAL), financiado pelo Governo da
República da Alemanha pelo RFT no âmbito do Programa Piloto para
a Proteção das Florestais Tropicais do Brasil, viabilizou experiências de
demarcação participativa de terras indígenas. Segundo essa modalidade,
uma empresa de topografia é contratada para a realização do levantamento
geodésico, abertura de picadas e colocação de marcos. Paralelamente, os
índios são mobilizados diretamente por sua própria associação, ou por
alguma entidade de apoio que goze de sua confiança, para acompanhar
todas as etapas e frentes de trabalho, incluindo a colocação de placas
de sinalização dos limites e a divulgação, nas aldeias e no entorno da
área em demarcação, do limites da terra indígena (MENDES 1999). A
adoção da demarcação participativa se fundamenta no pressuposto de que
um papel mais ativo desempenhado pelos índios é crucial para assegurar
sustentabilidade futura ao trabalho de demarcação física, já que essa
participação tende a fortalecer iniciativas indígenas de controle e vigilância
territorial, inibindo invasões.
Embora a demarcação da terra como indígena não bloqueie automaticamente
iniciativas de esbulho dos recursos naturais dos índios - como a ação
de caçadores, pescadores, extratores de espécies de fauna e flora ou de
madeiras -, estudos realizados nos últimos anos atestam sua relevância
para conter o avanço do desmatamento em larga escala. Um estudo
publicado na revista Conservation Biology, em 2006, concluiu, com base
na análise de imagens de satélites de diferentes categorias de unidades
de conservação e terras indígenas da Amazônia brasileira, que estas
últimas são especialmente importantes para prevenir desmatamentos
em larga escala em áreas de avanço da fronteira agrícola (NEPSTAD et
al. 2006). Assim, de forma semelhante ao que ocorre com as unidades
de conservação, a demarcação de um território como indígena tende a
bloquear a presunção de posse por parte de empresas e indivíduos, já que
mais cedo ou mais tarde seriam retirados da terra ilegalmente ocupada e
perderiam os investimentos feitos.
60
3.5 - Áreas protegidas privadas
Embora no Brasil a existência de áreas submetidas à proteção legal em
propriedades privadas remonte ao Código Florestal de 1934, as Reservas
Particulares do Patrimônio Natural (RPPN) foram criadas em 1990 pelo
Decreto nº 98.914. Com a publicação da Lei n˚ 9.985/2000, que institui
o SNUC, as RPPN passaram a ser uma das categorias de unidades de
conservação do grupo de uso sustentável. Para adequar os procedimentos
de criação de uma RPPN à lei do SNUC, foram publicadas duas instruções
normativas do Ibama (24/2004 e 62/2005). Paralelamente, a necessidade
de regulamentar a categoria e aprimorar os procedimentos para sua criação
e manejo resultou na publicação do Decreto n˚ 5.746 em abril de 2006,
tornando a RPPN a primeira categoria de unidade de conservação com
regulamentação específica após a publicação do SNUC.
As RPPN são criadas pela livre vontade do proprietário de uma área rural,
sem prejudicar seus direitos sobre a propriedade, podendo ele requerer o
reconhecimento integral ou parcial de seu imóvel. De acordo com o Decreto
n° 5.746/2006, a RPPN é uma “unidade de conservação de domínio
privado, com o objetivo de conservar a diversidade biológica, gravada
com perpetuidade, por intermédio de Termo de Compromisso averbado à
margem da inscrição no Registro Público de Imóveis”.
Dentro de uma RPPN somente é permitido o desenvolvimento de atividades
de pesquisas científicas e visitação com objetivos turísticos, recreativos e
educacionais previstas no seu plano de manejo. Com a criação, a reserva
passa a receber atenção especial dos órgãos de meio ambiente, instituições
de pesquisas e entidades ambientalistas. A propriedade pode ainda se
beneficiar com isenção de imposto sobre a área reconhecida como RPPN,
prioridade na análise de projetos pelo FNMA, preferência na análise de
pedidos de concessão de crédito agrícola junto às instituições oficiais e
possibilidade de cooperação com entidades privadas e públicas visando a
proteção da reserva.
Gráfico 3 – Percentual de RPPN por bioma
Fontes: CNRPPN e Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade
61
Existem atualmente 743 RPPN distribuídas por todos os biomas brasileiros,
protegendo cerca de 575.000 hectares (veja Gráfico 3 – Percentual de
RPPN por bioma). Desse total, 432 são reservas privadas reconhecidas
pelo órgão gestor federal, que abrangem 444.270 hectares, e 311 reservas
reconhecidas pelos órgãos estaduais, abrangendo cerca de 130.730
hectares. Segundo a Confederação Nacional de RPPN, 84% de todas as
reservas privadas se concentram nos biomas Mata Atlântica (66%) e Cerrado
(18%), os dois biomas brasileiros mais ameaçados, o que reforça sua
relevância no âmbito de iniciativas governamentais e não-governamentais
destinadas a ampliar a conectividade entre áreas protegidas e a recuperar
paisagens altamente fragmentadas.
3.6 - Experiências de manejo comunitário de áreas protegidas - diversidade
cultural e biológica
3.6.1 – Manejo comunitário de ecossistemas em unidades de
conservação
O manejo comunitário de ecossistemas para fins de subsistência ou
comerciais é prática comum entre populações extrativistas de diferentes
regiões brasileiras. Envolve não apenas recursos de origem florestal, mas
também faunísticos e pesqueiros, em águas interiores e marinhas.
A partir da década de 1980, conflitos pelo acesso e exploração desses recursos
ganharam maior visibilidade pública num contexto de democratização do
país e, conseqüentemente, de reconhecimento de direitos civis. Ao mesmo
tempo, a política vigente, de declaração de grandes unidades de conservação
em áreas habitadas por populações tradicionais, sofria crítica crescente. É
nesse momento, em que o Estado é pressionado a agir frente aos conflitos
na Amazônia, que são criados alguns dos principais instrumentos para
ordenar a exploração dos recursos naturais e pacificar disputas pelo acesso
a eles, entre os quais estão duas categorias de unidades de conservação:
as Reservas Extrativistas e as Reservas de Desenvolvimento Sustentável.
62
A Reserva Extrativista e a Reserva de Desenvolvimento
Sustentável, segundo o SNUC
Art. 18 - A Reserva Extrativista é uma área utilizada por
populações extrativistas tradicionais, cuja subsistência baseiase no extrativismo e, complementarmente, na agricultura de
subsistência e na criação de animais de pequeno porte, e tem
como objetivos básicos proteger os meios de vida e a cultura
dessas populações, e assegurar o uso sustentável dos recursos
naturais da unidade.
Art. 20 – A Reserva de Desenvolvimento Sustentável é uma
área natural que abriga populações tradicionais, cuja existência
baseia-se em sistemas sustentáveis de exploração dos recursos
naturais, desenvolvidos ao longo de gerações e adaptados às
condições ecológicas locais e que desempenham um papel
fundamental na proteção da natureza e na manutenção da
diversidade biológica.
Criadas por demanda de populações locais e geridas por um conselho
deliberativo, as Reservas Extrativistas – federais e estaduais - cobrem
hoje uma superfície de 10,6 milhões de hectares, 97,4% dos quais
concentrados no bioma Amazônia12. Embora tenham sido concebidas
tendo como referência o modo de vida de populações amazônicas,
especialmente os seringueiros, as Reservas Extrativistas se adaptaram
a outros contextos sociais e ecológicos, havendo hoje unidades dessa
categoria em outros biomas (veja o Quadro 9 - Reservas Extrativistas e
Reservas de Desenvolvimento Sustentável por bioma). Essa categoria tem,
inclusive, sido adotada como solução para proteger e possibilitar o manejo
comunitário por populações tradicionais litorâneas - atualmente, há 430
mil hectares marinhos protegidos por 15 Reservas Extrativistas federais.
Se agregarmos a essas áreas marinhas os ambientes costeiros – que, no
âmbito do Cadastro Nacional de Unidades de Conservação, são tratados
como extensão dos biomas terrestres –, as Reservas Extrativistas totalizam
19 unidades, protegendo cerca de 836 mil hectares.
A Reserva de Desenvolvimento Sustentável, por sua vez, surgiu no início
dos anos 1990 quando pesquisadores que trabalhavam numa área da
Amazônia convertida na Estação Ecológica Mamirauá - unidade estadual
de uso indireto criada para proteger o primata uacari branco (Cacajao
calvus) - apontaram a necessidade de uma categoria de manejo que
propiciasse a permanência de centenas de famílias que viviam em seu
interior. Na ocasião, a categoria Reserva Extrativista não se prestava a
solucionar adequadamente a questão, já que não se tratava de famílias de
extrativistas em conflito pela posse da terra e dos recursos naturais, mas
12
Fonte: Cadastro Nacional de Unidades de Conservação, março de 2007.
63
sim da necessidade de conciliar os objetivos de conservação da área com
as demandas produtivas da população residente. Atualmente, as Reservas
de Desenvolvimento Sustentável federais e estaduais cobrem uma área
de aproximadamente 9,57 milhões de hectares, 98,3% dos quais na
Amazônia13.
As categorias de manejo Floresta Nacional e Área de Proteção Ambiental,
embora não tenham explícito objetivo de proteger formas culturalmente
diferenciadas de utilização dos recursos naturais, também acolhem
experiências de manejo comunitário. Segundo o texto do SNUC, as Florestas
Nacionais se destinam ao “uso múltiplo sustentável dos recursos florestais
e à pesquisa científica”; porém, unidades dessa categoria, existentes
especialmente na Amazônia, exibem situações semelhantes a de Reservas
de Desenvolvimento Sustentável: apresentam populações tradicionais que
combinam o extrativismo com outras formas de produção, como pequena
agricultura. Essa exploração, um dos itens regulamentados pelo Decreto nº
4.340/02, está lastreada em termos de compromisso, assinados entre os
comunitários e o órgão gestor, e nos planos de manejo.
Quadro 9 – Reservas Extrativistas e Reservas de Desenvolvimento Sustentável por bioma
Fonte: Cadastro Nacional de Unidades de Conservação, março de 2007.
No início dos anos 1990, a necessidade de solucionar conflitos pelo
acesso aos recursos pesqueiros presentes nos lagos amazônicos produziu
os “acordos de pesca”. Formulados originalmente por grupos da sociedade
civil, essa solução acabou sendo adotada pelo poder público como um
instrumento para regular o manejo comunitário e assegurar a conservação
dos estoques pesqueiros nas várzeas amazônicas.
Segundo norma editada em 2003 pelo órgão federal de meio ambiente,
o acordo de pesca é “um conjunto de medidas específicas decorrentes de
tratados consensuais entre os diversos usuários e o órgão gestor dos recursos
pesqueiros em uma determinada área”14. Seus termos são negociados pelos
próprios interessados na exploração da área disputada, que definem entre
13
14
64
Fonte: Cadastro Nacional de Unidades de Conservação, março de 2007.
Definição dada pela Instrução Normativa nº 29/03, do Ibama.
si as regras e condições para a atividade pesqueira, fixando limites por
zona, áreas reservadas à reprodução, equipamentos e métodos admitidos.
Os acordos são, então, apresentados ao órgão fiscalizador que, no caso
federal, os formaliza por meio da edição de um ato oficial.
Levantamentos realizados no final dos anos 1990 constataram que os lagos
submetidos a acordos de pesca eram 60% mais produtivos que aqueles
sem medidas de manejo: enquanto os primeiros produziam 41 quilos, os
lagos sem manejo produziam 26 quilos (WWF-BRASIL E PROVÁRZEA
2003). Porém, o sucesso dos acordos depende essencialmente das ações
de fiscalização dos comunitários e do órgão governamental, de forma que
uma fiscalização deficiente resulta em acordos pouco efetivos. Segundo o
Ibama, desde 1999 foram formalizados 25 acordos de pesca no âmbito
federal, cinco dos quais incidem sobre unidades de conservação (veja
Quadro 10 - Acordos de pesca incidentes sobre unidades de conservação
reconhecidos pelo órgão federal).
Quadro 10 – Acordos de pesca incidentes sobre unidades de conservação
reconhecidos pelo órgão federal
Fonte: Coordenação de Ordenamento de Recursos Pesqueiros/ Ibama, julho 2007.
3.6.2 – Manejo comunitário em terras indígenas
Ainda que não haja um cadastramento oficial de experiências de gestão
territorial e aprimoramento do manejo em terras indígenas, há uma grande
variedade de iniciativas formuladas pelos índios e/ou suas associações com
a assessoria técnica de entidades não-governamentais e o apoio do órgão
indigenista federal (Funai). Tais iniciativas - presentes especialmente na
Amazônia, onde estão 98% das terras indígenas – têm, recorrentemente, o
objetivo de preparar os indígenas para os efeitos da incontornável necessidade
de conviver e se relacionar política e, muitas vezes, economicamente com
agentes da sociedade envolvente.
Projetos de auto-gestão em terras indígenas têm como prioridade o controle
e a vigilância de áreas oficialmente reconhecidas pelo Estado brasileiro.
Muitas dessas iniciativas têm um componente destinado a decifrar a
ocorrência de recursos naturais relevantes cultural e/ou economicamente,
visando planejar seu uso. A abordagem e os objetivos de cada projeto estão
65
condicionados a outras demandas identificadas como prioritárias pelos índios
e pelas instituições que gozam de sua confiança. Assim, em alguns casos
o esforço de manutenção da integridade física do território é combinado
com a recuperação de áreas degradadas por exploração econômica de
não-índios e/ou com o manejo de espécies utilizadas tradicionalmente
pelas comunidades, inclusive economicamente. Há experiências em que
o esforço de levantamento dos recursos naturais e de planejamento de
seu uso resultou no zoneamento de terras indígenas e na confecção de
instrumentos de gestão semelhantes aos planos de manejo adotados para
as unidades de conservação.
Entre as iniciativas de gestão executadas pelos índios em suas terras podem
ser destacados os projetos ambientais e de gestão territorial dos índios
yanomami, em parceria com a Comissão Pró-Yanomami, desenvolvidos
em aldeias dos estados do Amazonas e Roraima (mais informações em
http://www.proyanomami.org.br); dos índios wajãpi do estado do Amapá,
com a assessoria do Iepé - Instituto de Pesquisa e Formação Indígena no
Amapá (mais em http://www.institutoiepe.org.br); de etnias do estado do
Acre em parceria com a Comissão Pró-Índio do Acre (mais informações em
http://www.cpiacre.org.br); dos povos timbira dos estados do Maranhão
e Tocantins, em parceria com o Centro de Trabalho Indigenista (mais
informações em http://www.trabalhoindigenista.org.br); de associações de
três terras indígenas situadas em Rondônia, com assessoria da Kanindé ¬Associação de Defesa Etnoambiental (mais informações em http://www.
kaninde.org.br). Uma lista de iniciativas de gestão autônoma de terras
indígenas pode ser encontrada também em http://www.socioambiental.
org/pib/portugues/indenos/projparc.shtm.
3.7 - Ameaças ao Sistema e às áreas protegidas
A avaliação mais abrangente, feita até a publicação deste Informe, a
respeito dos impactos decorrentes de políticas de integração econômica
para a América do Sul e de projetos de desenvolvimento regional sobre
as áreas protegidas existentes no Brasil foi assinada pela entidade nãogovernamental Conservação Internacional - Brasil e publicada, em maio de
2007, em sua revista eletrônica Política Ambiental15.
Segundo seus autores, a análise, denominada “Implicações da Iniciativa
de Integração da Infra-Estrutura Regional Sul-Americana e projetos
correlacionados na política de conservação no Brasil”, selecionou os
empreendimentos chancelados como prioritários tanto no âmbito da IIRSA
quanto no âmbito do planejamento orçamentário federal (Plano Plurianual)
e que constam do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), reputado
como estratégico pelo governo brasileiro. No recorte geográfico analisado
predomina a região centro-norte da América do Sul, onde estão os biomas
Amazônia, Cerrado e Pantanal.
A citada publicação está disponível em http://www.conservation.org.br/publicacoes/files/politica_
ambiental_3_maio_2007.pdf
15
66
A análise levou em conta apenas os projetos do setor de transporte
(rodoviário, ferroviário, marítimo e hidroviário) e de geração de energia,
historicamente mais impactantes sob a perspectiva socioambiental. Foram
delimitados buffers em torno de cada obra de infra-estrutura, de modo a
estimar a influência direta de cada projeto, segundo os seguintes critérios:
para empreendimentos hidrelétricos, 100 km lineares à montante da
barragem, com 60 km de largura; para os gasodutos, cinco km de cada
lado ao longo de seu traçado; para as hidrovias, 10 km além de cada
margem; para as rodovias, 50 km de cada lado ao longo de seu traçado;
para as ferrovias, cinco km de cada lado; e um raio de 15 km ao redor dos
portos.
Os potenciais impactos foram assinalados a partir da sobreposição do mapa
dos projetos selecionados e seus respectivos buffers a um mapa reunindo
as áreas prioritárias para a conservação da biodiversidade, atualizado
em 2006 pelo Ministério do Meio Ambiente; o mapa das unidades de
conservação no Brasil; o mapa das unidades de conservação existentes
em outros países na área analisada; o mapa das terras indígenas no Brasil.
O resultado final da análise dos impactos, feita por eixo de integração e
desenvolvimento, é de que:
- cerca de 17% do total das áreas mapeadas como prioritárias para a
conservação da biodiversidade serão afetadas pelos projetos, 9% das quais
são áreas incluídas na atualização feita pelo Ministério do Meio Ambiente.
A Amazônia se apresenta como o bioma a ter o maior número de áreas
prioritárias afetadas;
- os projetos selecionados devem afetar 137 unidades de conservação – 47
de proteção integral e 90 de uso sustentável – que, juntas, totalizam 39,8
milhões de hectares – ou seja, cerca de 40% da extensão do Sistema;
- 107 terras indígenas foram identificadas como estando na área de
influência dos projetos;
O estudo da Conservação Internacional aponta preocupação com o fato
de que não existem, no âmbito da IIRSA, recursos alocados para estudos
socioambientais mais amplos e aprofundados ou previsão de medidas
mitigadoras. No caso brasileiro, essa deficiência poderá ser remediada, ao
menos em parte, pelo processo de licenciamento ambiental ao qual todos
os empreendimentos “considerados efetiva ou potencialmente poluidores,
bem como os capazes, sob qualquer forma, de causar degradação
ambiental” devem se submeter, segundo o que dispõe o artigo 10º da Lei
nº 6.938/81.
Os efeitos sociais e ambientais de alguns dos projetos contidos na IIRSA
e no PAC poderiam ainda ser mitigados caso medidas de ordenamento
territorial - para conter processos de especulação fundiária, historicamente
associados a projetos de infra-estrutura econômica em regiões de fronteira
- complementadas por políticas públicas dirigidas às populações locais,
67
ambas participativamente discutidas, fossem adotadas, a exemplo do que
ocorreu na obra de pavimentação da rodovia BR-163 (ler mais no item 2.3
- Integração das áreas protegidas a planos de desenvolvimento nacional).
3.7.1 - Mineração em áreas protegidas
Os documentos mais completos disponíveis sobre a incidência de interesses
de empresas mineradoras sobre unidades de conservação e terras indígenas
foram editados pela organização não-governamental ISA, com base nos
processos minerários registrados pelo governo federal, e têm como área de
abrangência a Amazônia Legal.
A primeira análise feita por esse Instituto, em 1994, totalizou 1.377
processos incidentes sobre unidades de conservação federais. Em janeiro
de 2006, a mesma análise constatou a existência de 5.283 processos
sobrepostos a unidades federais e 880 sobre unidades estaduais na
Amazônia. A pesquisa apurou, ainda, que 406 processos registrados já
estavam em fase de pesquisa ou mesmo de exploração em 32 unidades
de proteção integral e em 23 Reservas Extrativistas. Havia, também,
571 processos em fase de pesquisa ou exploração em 33 unidades de
conservação onde a exploração é admitida (RICARDO e ROLLA 2006).
Essa análise excluiu a categoria Área de Proteção Ambiental.
Uma análise da legislação em vigor, presente na mesma publicação,
assegura que “a atividade de mineração não pode ser realizada, em nenhuma
hipótese, dentro de unidade de conservação de proteção integral e nas
Reservas Extrativistas”. Segundo tal análise, “a Lei do SNUC é expressa
ao proibir o uso direto dos recursos naturais” nas unidades de conservação
de proteção integral; a mesma lei veta expressamente “a exploração de
recursos minerais” em Reservas Extrativistas, de forma que o poder público
não pode conceder licença de exploração sobre tais espaços e, havendo
concedido, deve cancelá-las. Ademais, segundo a legislação, devem ser
anuladas as autorizações de pesquisa concedidas sobre área posteriormente
declarada como unidade de conservação (LIMA 2006).
Nas demais unidades do grupo de uso sustentável, o direito de exploração
é tema controverso para algumas categorias e está condicionado a normas
específicas, como o decreto de criação, a regulamentação da categoria, o
plano de manejo e o zoneamento de cada unidade. De acordo com a citada
análise jurídica, a mineração em Área de Proteção Ambiental depende do
que dispuser o zoneamento da unidade e requer autorização do órgão
responsável por sua gestão, ouvido o conselho gestor, se houver. No caso
das Reservas de Desenvolvimento Sustentável, a falta de clareza sobre o
assunto abre a possibilidade para a instalação de empreendimentos de
mineração, desde que previstos no plano de manejo e que não contrariem
seu zoneamento (LIMA 2006).
Entre as 12 categorias do SNUC, as Florestas Nacionais e seus equivalentes
68
estaduais e municipais são as que mais claramente admitem a atividade
mineradora em seu interior, já que o Decreto nº 1.298/94, que regulamenta
a categoria, abre espaço para essa possibilidade. A prática atual do órgão
gestor, o Instituto Chico Mendes, é condicionar a mineração em Floresta
Nacional à previsão da atividade em seu decreto de criação – além de
exigir a devida licença ambiental, a ser concedida pelo órgão gestor, no
caso federal, o Ibama, com a anuência do órgão gestor da unidade. O
estudo do ISA contabilizou oito unidades dessa categoria cujos decretos
prevêem exploração mineral em seu interior; segundo o Instituto Chico
Mendes, quatro dessas unidades teriam, de fato, empreendimentos ativos.
O documento do ISA cita casos em que os processos minerários incidem
sobre 99% da extensão de algumas Florestas Nacionais.
No caso das terras indígenas, a mineração é permitida constitucionalmente;
porém, as condições para que ocorra devem ser fixadas em lei. Como as
iniciativas de regulamentação do dispositivo constitucional apresentadas
pelo Parlamento desde a promulgação da Constituição, em 1988, ficaram
inconclusas, o tema permanece sem lei específica16.
Levantamentos feitos pelo ISA, com base em informações publicadas no
Diário Oficial da União, constataram que, até fevereiro de 2005, existiam
5.064 processos minerários incidentes sobre 164 terras indígenas situadas
na Amazônia Legal, em benefício de 432 mineradoras. A análise dos dados
aponta que seis terras indígenas têm mais de 90% de seu subsolo bloqueado
por interesses e títulos minerários, havendo um caso em que a totalidade
da terra indígena está requerida para pesquisa mineral (ISA 2005).
3.8 - Conectividade entre áreas protegidas
A gestão integrada de áreas protegidas visando promover a conectividade
entre ecossistemas - incluindo paisagens terrestres e marinhas, de modo a
manter a sua estrutura e função ecológicas e socioculturais - está entre os
objetivos do PNAP. Ao mesmo tempo, a Lei nº 9.985/2000 (SNUC) fornece
instrumentos para a execução de uma gestão ecossistêmica das unidades
de conservação, caso dos corredores ecológicos e dos mosaicos de áreas
protegidas, objeto do artigo 26 contido nessa lei. O funcionamento de
mosaicos de áreas protegidas foi, inclusive, foco do Decreto nº 4.340/02.
De acordo com esse decreto, os mosaicos devem ser formalmente
reconhecidos por ato do Ministério do Meio Ambiente e devem ser geridos
por um Conselho de Mosaico, de caráter consultivo e presidido pelo
chefe de uma das unidades de conservação que compõe o mosaico. O
conselho tem a função de implementar a gestão integrada das unidades
que o compõem e propor diretrizes e ações para compatibilizar, integrar e
otimizar as atividades desenvolvidas em cada unidade de conservação e
Conflitos envolvendo índios Cinta-Larga e garimpeiros na Amazônia, que resultaram em mortes em
2004, açularam o interesse do Parlamento pela regulamentação da mineração em terras indígenas;
nesse contexto, o governo federal iniciou a formulação de um anteprojeto de lei cujo conteúdo ainda
não foi trazido a público.
16
69
as relações com a população residente na área do mosaico. Cabe ainda ao
Conselho manifestar-se sobre propostas que visem solucionar eventuais
sobreposições entre áreas protegidas. Para fins de gestão, os corredores
ecológicos, que também devem ser reconhecidos por ato do Ministério do
Meio Ambiente, integram os mosaicos.
O Brasil conta atualmente com várias iniciativas de gestão integrada
de ecossistemas envolvendo áreas protegidas, sucintamente descritas a
seguir. Destacamos, ainda, a adoção de medidas destinadas a integrar
áreas protegidas terrestres, costeiras e marinhas, em conformidade com a
meta e as atividades contidas no Objetivo 1.2, do Plano de Trabalho para
Áreas Protegidas, e com a Meta-chave 5, do Plano de Ação de Durban.
3.8.1 - Corredor Ecológico do Paranã-Pirineus
Iniciado em fevereiro de 2003 e encerrado em janeiro de 2006, o Projeto de
Conservação do Ecossistema Cerrado - Corredor Ecológico Paranã-Pirineus
foi a primeira experiência de gestão integrada de ecossistemas utilizando o
conceito de corredores ecológicos implantada pelo órgão gestor federal - à
época, o Ibama. Financiado pela Agência de Cooperação Internacional do
Japão (JICA) e contando com contrapartidas governamentais do Brasil, o
Projeto foi executado em uma área de 99.734 km2 do bioma Cerrado, no
Planalto Central brasileiro, considerada a savana mais rica em biodiversidade
do mundo, porém extremamente fragmentada pelo predomínio de uma
economia de base agropecuária.
As ações do Projeto se concentraram em duas áreas-piloto, tendo o Parque
Nacional da Chapada dos Veadeiros - declarado como Sítio do Patrimônio
Mundial Natural em 2001 - e a Área de Proteção Ambiental Nascentes do
Rio Vermelho como seus núcleos.
Para alcançar o objetivo geral de promover o manejo integrado de
ecossistemas nas áreas-piloto, o Projeto investiu no fortalecimento técnico
e institucional do órgão gestor federal e implementou programas de
capacitação em novas práticas de gestão ambiental, uso sustentável dos
recursos naturais e educação ambiental, dos quais participaram cerca de
3.350 pessoas entre agentes comunitários, proprietários rurais, guias de
ecoturismo, pequenos produtores, educadores e estudantes de municípios
das áreas-piloto (JICA 2006).
Um efeito colateral positivo produzido pelo Projeto foi a criação de
dois Centros Integrados de Atividades Ambientais, um para cada áreapiloto, caracterizados como um “centro de diálogo e articulação” entre
os diversos participantes dessa iniciativa, com um conselho composto
por representantes governamentais e não-governamentais (JICA 2006).
Com o fim do Projeto, a continuidade do processo de gestão integrada
dos ambientes desse corredor passou a ser uma demanda do Programa
Nacional de Conservação e Uso Sustentável do Bioma Cerrado, criado em
2005 pelo Ministério do Meio Ambiente.
70
3.8.2 - Projeto Corredores Ecológicos
No contexto do Projeto coordenado pelo Ministério do Meio Ambiente,
corredores ecológicos são grandes áreas localizadas nos biomas Amazônia
e na Mata Atlântica que abarcam unidades de conservação de diferentes
categorias de manejo, terras indígenas e áreas de interstício submetidas a
diferentes formas de uso da terra. Sua abrangência geográfica foi definida
a partir de critérios biológicos, com base em conhecimentos científicos,
para fins de planejamento e conservação, como a presença de espécieschave relevantes nos contextos global, regional e local. São dois os
corredores prioritários do Projeto: o Corredor Central da Mata Atlântica,
com aproximadamente 12,5 milhões de hectares, e o Corredor Central
da Amazônia, com mais de 52 milhões de hectares. O Projeto é parte do
Programa Piloto para a Proteção das Florestas Tropicais do Brasil (mais
detalhes no item 5.6.2 - Programa Piloto para a Proteção das Florestas
Tropicais do Brasil).
Sua primeira fase, encerrada no final de 2005, foi dedicada ao planejamento
e ao estabelecimento da estrutura institucional descentralizada, composta
pela Unidade de Coordenação Geral (UCG), no Ministério do Meio
Ambiente, e uma Unidade de Coordenação Estadual (UCE) e um Comitê de
Gestão (instância deliberativa) em cada um dos três estados participantes
(Amazonas, Bahia e Espírito). Ambos os Corredores possuem como instância
deliberativa os Conselhos Estaduais da Reserva da Biosfera, colegiado
composto paritariamente por representantes do governo e sociedade civil,
responsável por estabelecer as prioridades de aplicação dos recursos a
serem investidos segundo critérios técnicos.
O ano de 2006 marcou a transição da primeira para a segunda fase
do Projeto, com atividades dirigidas à consolidação de unidades de
conservação, restauração ambiental, fiscalização e monitoramento e
desenvolvimento sustentável. A segunda fase, iniciada no final de 2006,
concentra investimentos e esforços na implementação de ações por um
período de três anos, num total de R$ 70 milhões (aproximadamente US$
31 milhões) provenientes de doações do governo da Alemanha, por meio
do Banco Alemão de Desenvolvimento (KfW); da Comunidade Européia e
do Fundo Fiduciário para Proteção das Florestas Tropicais (RFT), operados
pelo Banco Mundial, além dos Governos Federal e Estaduais e demais
executores que participam do Projeto.
Para o Corredor Central da Amazônia (CCA), a estratégia é manter o contínuo
florestal por meio de ações de fiscalização, da consolidação das unidades
de conservação existentes e da implementação de procedimentos de uso
sustentável dos recursos naturais nas áreas de interstícios. Para o Corredor
Central da Mata Atlântica (CCMA), a prioridade é assegurar a proteção
dos remanescentes florestais significativos e incrementar, gradativamente,
a ligação entre unidades de conservação, terras indígenas e fragmentos
da paisagem por meio do controle, proteção e recuperação da cobertura
florestal aliado a um trabalho orientado ao desenvolvimento sustentável
nas áreas prioritárias, 95% das quais situadas em propriedades privadas.
71
O CCA se estende ao longo das calhas dos rios Solimões e do Baixo
Rio Negro, no Estado do Amazonas. Em seu perímetro está a Reserva
da Biosfera da Amazônia Central (leia detalhes a seguir), um Sítio do
Patrimônio Mundial Natural e 53 unidades de conservação, num total de
mais de 13 milhões de hectares, aos quais se somam 11 milhões de
hectares de terras indígenas. O corredor está organizado em cinco subregiões para as quais estão previstas atividades segundo quatro linhas de
ação: 1) fiscalização, vigilância e monitoramento; 2) planejamento e gestão
de unidades de conservação; 3) chamada para subprojetos e outras ações
em áreas de interstício; e 4) proteção da diversidade biológica em terras
indígenas, realizada por intermédio do Programa Demonstrativo dos Povos
Indígenas, também integrante do Programa Piloto.
O CCMA estende-se por cerca de 1,2 mil quilômetros ao longo da costa
do Oceano Atlântico, no sentido Norte-Sul. A quase totalidade dos
remanescentes florestais está em propriedades particulares, em geral
sob ameaça de alguma forma de exploração ou desflorestamento. As 83
unidades de conservação existentes em seu perímetro, assim como as terras
indígenas, são pouco representativas em termos de área. As ações previstas
para esse corredor estão divididas em três linhas de ação: 1) fiscalização,
vigilância e monitoramento; 2) planejamento e gestão de unidades de
conservação; e 3) áreas de interstício, prevendo inclusive a implementação
de mini-corredores em áreas prioritárias. Há dentro do CCMA a proposta
de criação do primeiro corredor ecológico marinho brasileiro, tendo como
área nuclear o Parque Nacional Marinho de Abrolhos.
A fim de consolidar as unidades de conservação contidas nos dois
corredores, o Projeto tem investido na regularização dos planos de manejo
pendentes. No CCA, um plano de manejo foi revisto, oito planos estão
sendo elaborados e três outros estão sendo implementados. No CCMA,
quatro unidades de conservação estão elaborando planos de manejo com
o apoio do Projeto e está sendo revisto o zoneamento de duas outras
unidades (veja o Quadro 11 - Planos de manejo apoiados pelo Projeto
Corredores Ecológicos). Adicionalmente, foram investidos recursos na
capacitação de gestores em temas relevantes visando aprimorar a gestão
das unidades e na instalação de nove conselhos de gestão, três dos quais
já em funcionamento no CCA.
72
Quadro 11 – Planos de manejo apoiados pelo Projeto Corredores Ecológicos
Fontes: Projeto Corredores Ecológicos/MMA; Amazônia Brasileira 2007 - ISA e Arpa/MMA; IDAF-ES; Semarh-BA.
3.8.3 - Reservas da Biosfera
Ao aderir ao Programa Homem e Biosfera (MaB), da Unesco, o Brasil
definiu como meta a criação de pelo menos uma Reserva da Biosfera nos
biomas Mata Atlântica, Cerrado, Pantanal, Caatinga e Amazônia. O país
possui hoje seis Reservas da Biosfera, uma das quais – a Reserva da
Biosfera do Cinturão Verde da Cidade de São Paulo - totalmente inserida
73
na Reserva da Biosfera da Mata Atlântica, abrangendo uma área total de
aproximadamente 1,3 milhões de km2, ou 15% do território nacional (veja
Quadro 12 - Reservas da Biosfera no Brasil). Em 2000, as Reservas da
Biosfera foram oficializadas como áreas protegidas especiais pelo capítulo
VI da Lei nº 9.985, que instituiu o SNUC.
Um convênio entre o Ministério do Meio Ambiente e a representação da Unesco
no Brasil instituiu, em 1996, o Programa de Consolidação das Reservas
da Biosfera, com duração de três anos, por meio do qual foram investidos
cerca de US$ 712 mil no fortalecimento institucional das Reservas, da Rede
Nacional de Reservas da Biosfera e da Comissão Brasileira para o Programa
Homem e Biosfera (Cobramab). Em 2001, o Programa foi renovado por
mais quatro anos, tendo como objetivo principal implementar as Reservas
da Biosfera da Mata Atlântica, do Cinturão Verde da Cidade de São Paulo e
do Cerrado, além de fortalecer o Cobramab e a Rede Brasileira de Reservas
da Biosfera. Foram investidos R$ 1,5 milhão17 nesse segundo período.
Em seu desenho, as Reservas da Biosfera incorporam, sempre que
possível, corredores ecológicos, cinturões verdes de áreas urbanas,
mosaicos de áreas protegidas, reservas privadas e comunitárias e bacias
hidrográficas, integrando e valorizando esses instrumentos de planejamento
e ordenamento territorial. As Zonas Núcleos são compostas por unidades
de conservação de proteção integral às quais são agregadas as Reservas
Particulares do Patrimônio Natural (RPPN), categoria que, embora seja
classificada como de uso sustentável pelo SNUC, tem relevância para a
gestão da paisagem em biomas altamente fragmentados e com unidades
de conservação de proteção integral de pequenas dimensões e isoladas,
caso da Mata Atlântica, da Caatinga e do Cerrado.
Quadro 12 - Reservas da Biosfera no Brasil
Fonte: Ministério do Meio Ambiente/ Secretaria de Biodiversidade e Florestas.
O período entre 2001 e 2004 foi marcado por grandes variações na cotação do dólar americano,
entre R$ 2 e R$ 3 para cada 1 US$.
17
74
A fim de obter sinergia financeira, administrativa e política em sua
implementação, as Reservas da Biosfera são geridas de forma integrada
com outras iniciativas nacionais, como o Programa Sítios do Patrimônio
Mundial Natural e o Projeto Corredores Ecológicos.
3.8.4 - Programa Sítios do Patrimônio Mundial Natural
O Programa de Conservação da Biodiversidade nos Sítios do Patrimônio
Mundial Natural do Brasil é coordenado pelo Ministério do Meio Ambiente
e congrega Unesco, Fundação das Nações Unidas, Ibama, WWF-Brasil,
Conservação Internacional e The Nature Conservancy do Brasil. Primeira
ação brasileira de gestão diferenciada do patrimônio mundial natural,
seu objetivo é consolidar os Sítios e estabelecer uma gestão coordenada,
integrando responsabilidades e ações nos níveis nacional, estadual e
municipal.
São sete sítios no Brasil: Parque Nacional do Iguaçu (1986), Costa do
Descobrimento Reservas de Mata Atlântica (1999), Mata Atlântica
Reservas do Sudeste (1999), Área de Conservação do Pantanal (2000),
Complexo de Conservação da Amazônia Central (2000/2003), Ilhas
Atlânticas Brasileiras: Fernando de Noronha e Atol das Rocas (2001) e
Área de Proteção do Cerrado: Parques Nacionais Chapada dos Veadeiros e
Emas (2001).
A primeira fase (2004-2008) contempla apenas os sítios reconhecidos até
2000 e objetiva fortalecer iniciativas em conservação da biodiversidade
e promover atividades econômicas sustentáveis para comunidades do
entorno das áreas, bem como gerar conhecimento sobre os sítios e promover
treinamentos e capacitações para a conservação da biodiversidade, o
manejo de áreas protegidas e o desenvolvimento de práticas sustentáveis.
A execução das atividades demandou um comprometimento de US$ 4,52
milhões (aproximadamente R$ 13,4 milhões), dos quais 20% são recursos
do Governo Brasileiro e o restante proveniente de doações da Fundação
das Nações Unidas (50%), do WWF (19%), da Conservação Internacional
(9%) e da The Nature Conservancy (2%).
3.8.5 - Mosaicos de unidades de conservação e integração de ecossistemas
terrestres e marinhos
Em anos recentes, a constituição de mosaicos integrando unidades de
conservação de diferentes categorias de manejo e outras áreas protegidas
ganhou maior relevância na política de conservação brasileira. Em atenção ao
disposto no Decreto nº 4.340/2002, anteriormente citado, cinco mosaicos
de unidades de conservação, três dos quais englobando unidades terrestres
e marinhas, foram formalmente reconhecidos por meio de portarias do
Ministério do Meio Ambiente entre 2005 e 2006, que também instituíram
seus respectivos conselhos consultivos, compostos por representantes de
órgãos governamentais e de entidades da sociedade civil com atuação em
cada região. São eles:
75
- Mosaico dos Parques Nacionais Serra da Capivara e Serra das Confusões:
criado em março de 2005 com o intuito de estabelecer um corredor
ecológico entre esses dois parques nacionais, abrange 414.565 hectares
de terras em 10 municípios. É um mosaico terrestre localizado no bioma
Caatinga.
- Mosaico Paraná-São Paulo: em dezembro de 2006 foi reconhecido
como o primeiro mosaico terrestre-marinho, englobando 11 unidades de
conservação federais, duas das quais reservas particulares (RPPN); 18
unidades de conservação estaduais e cinco municipais, situadas no maior
continuum de Mata Atlântica do país, localizado na zona costeira entre os
estados de São Paulo e Paraná.
- Mosaico Mantiqueira: reconhecido em dezembro de 2006, trata-se de
um mosaico exclusivamente terrestre, que abrange cinco unidades de
conservação federais - entre as quais o Parque Nacional de Itatiaia, primeiro
a ser criado no Brasil, em 1937; sete unidades de conservação estaduais,
quatro unidades municipais e três reservas privadas, todas localizadas na
Serra da Mantiqueira, no domínio do bioma Mata Atlântica.
- Mosaico Bocaina: também reconhecido em dezembro de 2006, é um
mosaico terrestre-marinho situado no bioma Mata Atlântica que abrange
três unidades de conservação federais, seis estaduais e três municipais
localizadas nos estados do Rio de Janeiro e São Paulo.
- Mosaico Mata Atlântica Central Fluminense: reconhecido em dezembro
de 2006, trata-se de um mosaico terrestre-marinho, também do bioma
Mata Atlântica, que envolve cinco unidades de conservação federais; sete
estaduais e seis municipais e quatro reservas privadas, localizadas no
estado do Rio de Janeiro.
Ao mesmo tempo, o Ministério do Meio Ambiente tomou iniciativas para
fomentar a gestão integrada de áreas protegidas de diferentes categorias
de manejo, de forma que, no futuro, possam ser reconhecidos como novos
mosaicos. A primeira dessas medidas foi o lançamento, em 2005, do
edital “Mosaicos de Áreas Protegidas: Uma Estratégia de Desenvolvimento
Territorial com Base Conservacionista”, destinando R$ 4 milhões (cerca de
US$ 1,75 milhão) do Fundo Nacional do Meio Ambiente (FNMA), a projetos
que contribuam para a formação de novos mosaicos de áreas protegidas e
que resultem na implementação de Planos de Desenvolvimento Territorial
com Base Conservacionista (DTBC).
O DTBC visa estabelecer formas de associação entre desenvolvimento
e conservação da natureza num determinado território composto por
unidades de conservação, outras áreas legalmente protegidas e as zonas
de interstícios entre elas. Em síntese, seu objetivo é fortalecer cadeias
produtivas baseadas no manejo sustentável dos recursos naturais que,
articuladas a iniciativas de gestão ecossistêmica do território, resultem
em geração de renda para os produtores e em conservação dos recursos
76
naturais. Foram selecionados nove projetos, oito dos quais em execução,
em diferentes biomas brasileiros.
A segunda iniciativa é o recém-aprovado projeto Conservação e Uso
Sustentável de Ecossistemas de Mangues no Brasil, que prevê investimentos
de US$ 20 milhões - US$ 5 milhões provenientes do Fundo Global para
o Meio Ambiente (GEF) e US$ 15 milhões de contrapartidas do Brasil
- em ações destinadas a promover a gestão integrada de unidades de
conservação costeiras que protejam manguezais. Entre as cinco áreas
selecionadas pelo projeto está o já reconhecido Mosaico Paraná-São Paulo,
que receberá recursos para implantar seu conselho gestor. As outras quatro
áreas-piloto – zona costeira do estado Pará; zona costeira do estado do
Maranhão; Delta do rio Parnaíba, entre os estados do Piauí e Maranhão, e
foz do rio Mamanguape, no estado da Paraíba – poderão ser reconhecidas
como novos mosaicos após a execução do projeto.
77
4 - Manejo de Áreas Protegidas
4.1 - Proteção e controle das áreas protegidas
4.1.1 – Proteção e controle de unidades de conservação federais
Diante da diversidade de contextos sociais, econômicos e ecológicos que
caracterizam as unidades de conservação federais no Brasil, as atividades
de proteção e controle – sob responsabilidade do órgão gestor federal têm sido planejadas e executadas de forma descentralizada, no âmbito de
suas gerências regionais e da administração de cada unidade. Segundo o
disposto no Decreto nº 4.340/02, que regulamentou o SNUC, os órgãos
gestores devem executar ações de proteção e fiscalização desde o momento
da criação da unidade de conservação.
De fato, é no diagnóstico do contexto regional das unidades - uma das
etapas do processo de elaboração dos planos de manejo - que deve ser
feita a identificação das ameaças que pairam sobre a área, criando, assim,
a oportunidade de planejar as atividades rotineiras de proteção a serem
executadas segundo a infra-estrutura e o pessoal disponíveis.
Como regra geral, o esforço de proteção de uma unidade de conservação
pode envolver ações preventivas, como educação ambiental e divulgação de
informações sobre a unidade junto a comunidades e municípios localizados
em suas proximidades; ações rotineiras de fiscalização e de repressão,
quando necessárias, o que, inclusive, pode resultar em onerosas operações
envolvendo contingentes militares. Cabe ao chefe da unidade e à sua equipe
definir quando e onde realizar tais ações. A proteção do Parque Nacional
do Iguaçu, por exemplo, conta com o apoio do batalhão da polícia florestal
estadual, solução decorrente de um convênio assinado entre o governo do
estado e o órgão gestor federal.
Ao avaliar a vulnerabilidade das unidades de conservação federais, o
estudo “Efetividade de Gestão das Unidades de Conservação do Brasil”,
realizado pelo Ibama e pelo WWF-Brasil entre 2005 e 2006, constatou
que a proteção e o controle são um aspecto crítico do Sistema, de
acordo com os próprios chefes de unidades entrevistados. Segundo as
conclusões desse estudo, as unidades pertencentes às categorias de uso
sustentável são as mais vulneráveis, embora o peso relativo dos fatores
que determinam a vulnerabilidade tenha sido semelhante para ambos
os grupos de unidades18. As dificuldades envolvendo a contratação
Para os fins do citado estudo, nove das 12 categorias do SNUC foram selecionadas e agrupadas
segundo o sistema de classificação da IUCN. Mais detalhes no item 4.2 – Análise de efetividade de
manejo em unidades de conservação federais.
18
78
e manutenção de funcionários e o monitoramento das atividades
ilegais foram apontados entre os cinco principais fatores a fomentar a
vulnerabilidade em todas as categorias de unidades de conservação federais.
A contratação temporária de indivíduos locais para o apoio a atividades
como prevenção e combate a incêndios e o recrutamento de voluntários
são medidas que têm sido adotadas pelo órgão gestor federal. Em 2005,
foi criado o Programa de Agentes Ambientais Voluntários com o intuito
de mobilizar indivíduos de comunidades localizadas dentro ou no entorno
de unidades de conservação para a sua proteção. Se, por um lado,
contribui para mitigar o déficit de pessoal, por outro o Programa fomenta
a participação e a responsabilidade da sociedade na gestão - no caso das
unidades de uso sustentável, as ações são realizadas coletivamente, por
meio dos chamados “mutirões”.
Ligados a entidades civis de defesa do meio ambiente, esses agentes passam
por uma capacitação específica e, posteriormente, são credenciados para
atuar em sua região, de forma voluntária. E, embora a capacitação enfatize
o caráter preventivo da atuação, com ênfase na educação ambiental, os
agentes ambientais têm a prerrogativa de apreender equipamentos de
infratores e lavrar “autos de constatação”, que são encaminhados ao poder
público para as medidas cabíveis.
Uma iniciativa promissora no âmbito da proteção e controle das unidades de
conservação está sendo montada na Amazônia pelo Programa Arpa. Tratase do Sistema de Monitoramento da Biodiversidade (Simbio), um sistema
georreferenciado de monitoramento que, quando implementado, permitirá
identificar alterações na dinâmica biológica nas unidades, incluindo aquelas
decorrentes de pressões antrópicas nas áreas monitoradas, auxiliando sua
gestão. O sistema está em fase de testes, monitorando algumas variáveis
de cinco unidades de proteção integral e uma de uso sustentável, e deverá
ser ampliado para 56 unidades de conservação estaduais e federais do
bioma Amazônia.
4.1.2 - Proteção e fiscalização nas terras indígenas
A proteção e o controle territorial é uma questão crítica para vários povos
indígenas do Brasil, que têm seu patrimônio natural dilapidado e seus
modos de vida afetados pela presença de intrusos – processo que, muitas
vezes, tem participação de indivíduos indígenas, cooptados pelos invasores.
Constitucionalmente, é responsabilidade do Estado brasileiro assegurar
proteção às terras indígenas e aos recursos nelas existentes.
O atendimento dessa demanda compete ao órgão indigenista federal, a
Funai e, de forma geral, é realizado rotineiramente pelas exíguas equipes
alocadas nos postos instalados nas próprias terras, podendo ter ou não a
participação dos próprios índios. Porém, há terras em que as invasões se
processam com freqüência, face às dificuldades enfrentadas pelas equipes
locais para realizarem ações de proteção eficazes. Nessas situações, quando
79
a invasão atinge um nível crítico, são organizadas operações especiais, de
custos elevados, envolvendo forças policiais19.
No caso da Amazônia, onde estão 98% da área do país reconhecida como
indígena, especialistas identificam a origem do problema no histórico
paternalismo da política empreendida por agentes oficiais e não-oficiais
- como agências missionárias, que, num passado não muito distante da
política indigenista, atuaram de forma suplementar ao Estado - e na forma
convencional de conceber a demarcação, centrada fundamentalmente
na sinalização dos limites identificados. Tais especialistas defendem que
“limites demarcatórios só podem ser mantidos em caráter permanente por
meio da intervenção e do controle direto dos grupos indígenas” (GALLOIS
1999). Sob esta abordagem, que busca fortalecer o controle territorial e
imprimir uma gestão mais autônoma das terras indígenas, foram formulados
projetos com o apoio técnico de organizações não-governamentais (ver o
item 3.6.2 – Manejo comunitário em terras indígenas).
Nos anos 1990, a Funai incorporou essa concepção ao processo de
demarcação realizado no âmbito do PPTAL, o que representou uma mudança
conceitual sem precedentes em sua política. Parte do Programa Piloto para
a Proteção das Florestas Tropicais do Brasil, do então G-7, o PPTAL criou as
condições para que o processo demarcatório contemplasse a participação
indígena e, de forma conjugada, fomentasse ações de controle e vigilância
sobre os limites demarcados empreendidas pelos próprios índios (ver item
5.5.2.3 - Projeto Integrado de Proteção às Populações e Terras Indígenas
da Amazônia Legal). Segundo um informe do Projeto, a demarcação de
todas as 97 terras indígenas apoiadas teve acompanhamento indígena.
Várias estratégias para conferir sustentabilidade ao processo de demarcação
foram testadas e implantadas, como o estímulo a uma ocupação territorial
que propiciasse maior presença indígena nas áreas vulneráveis, a instalação
de plantios de espécies úteis às comunidades em áreas mais assediadas por
invasores, apoio a projetos de instalação ou ampliação de redes internas de
radiofonia operadas pelos índios. Dados sobre o componente de Vigilância
e Proteção das Terras Indígenas, fornecidos pelo Projeto, indicam que foram
implantados 43 projetos em 90 terras (PPTAL s/d).
4.2 - Análise de efetividade de gestão das unidades de conservação
Em atenção ao disposto no Programa de Trabalho para as Áreas Protegidas
(Decisão VII/28) da CDB - que estabelece que os países signatários devem
avaliar a efetividade de gestão de seus sistemas de áreas protegidas até o
ano de 2010 -, foram realizados esforços no Brasil por meio da aplicação
do Método de Avaliação Rápida e Priorização da Gestão de Unidades de
É o caso, por exemplo, da Terra Indígena Yanomami, que recorrentemente é invadida por hordas de
garimpeiros interessados em explorar ouro aluvional. Em abril de 2007, um ilustre líder yanomami
denunciou, ao Ministério Público Federal em Brasília, a existência de um mil garimpeiros dentro da
terra indígena.
19
80
Conservação (Rappam) e do Tracking Tool junto a unidades de conservação
federais. O estado de São Paulo também realizou um trabalho de análise
da situação do manejo em suas unidades de conservação. O resultado
dessas iniciativas está detalhado a seguir.
4.2.1 - Análise de efetividade de gestão das unidades de conservação
federais
Entre 2005 e 2006 o Ibama, então órgão gestor federal, em parceria
com a organização não-governamental WWF-Brasil, realizaram a análise
da efetividade da gestão, por meio do Rappam, de 246 unidades de
conservação - 116 pertencentes ao grupo de proteção integral e 130 ao
grupo de uso sustentável -, cobrindo todos os biomas e estados brasileiros,
o que correspondia a 84,48% das unidades federais então existentes no
país. O trabalho, que estabeleceu o marco zero para avaliações futuras,
produziu também um amplo diagnóstico da situação da parte federal do
SNUC. Os resultados foram publicados em maio de 2007 sob o título
“Efetividade de Gestão das Unidades de Conservação Federais do Brasil” 20.
Das 12 categorias do SNUC, nove foram utilizadas na amostra, sendo
quatro de proteção integral e cinco de uso sustentável. Essas nove categorias
foram agrupadas em cinco conjuntos, considerando as afinidades de manejo
segundo as categorias da IUCN (veja quadro a seguir).
Quadro 13 - Categorias, número e área das UCs analisadas no estudo
Fonte: Efetividade de Gestão das Unidades de Conservação Federais do Brasil: Implementação do Método Rappam - Avaliação Rápida e Priorização
da Gestão de Unidades de Conservação. Ibama e WWF-Brasil, 2007.
Os questionários foram aplicados a gestores das unidades de conservação
em eventos regionais, segundo as diretorias das diferentes categorias de
unidade de conservação e cada bioma, e coordenadores de núcleos de
unidades de conservação. Esses questionários compreenderam três áreas
A íntegra do estudo está disponível em http://www.wwf.org.br/natureza_brasileira/meio_ambiente_
brasil/arpa/efetividade_de_gestao_de_unidades_de_conservacao/index.cfm.
20
81
de análise distintas: i) análise do contexto, ii) análise da efetividade de
gestão e iii) análise do sistema de unidades de conservação. Cada uma
dessas áreas reuniu questões agrupadas em módulos, e esses, por sua vez,
foram agrupados em elementos de análise.
As conclusões gerais extraídas das análises foram de que, das 246 unidades
de conservação avaliadas, 32 (13%) apresentam alta efetividade de gestão,
89 (36%) efetividade média e 125 (51%) efetividade baixa. Os gráficos 3
e 4 apresentam, respectivamente, o número e o percentual de unidades de
conservação por categorias de manejo e faixa de efetividade de
Gráfico 4 – Unidades de conservação federais por categoria e faixa de efetividade de gestão
82
Gráfico 5 – Percentual de unidades de conservação federais por faixa de efetividade de gestão
segundo as categorias de manejo
83
Podemos observar que um número menor de unidades de conservação
apresentou alta efetividade em todas as categorias (0% a 20%). O percentual
de efetividade média de gestão das diferentes categorias varia entre 27%
e 46% e de baixa efetividade entre 40% e 66%. Os cinco conjuntos de
unidades de conservação possuem efetividade de gestão semelhante (entre
35% e 44%), elevada importância biológica e insumos como o elemento
que mais compromete a gestão das unidades.
Além dessas conclusões globais, o estudo extraiu outros resultados que
merecem destaque:
- embora as categorias Área de Proteção Ambiental, Área de Relevante
Interesse Ecológico, Reserva Extrativista e Reserva de Desenvolvimento
Sustentável sejam as mais vulneráveis, em todos os cinco grupos de
unidades de conservação a facilidade de acesso favorece o desenvolvimento
de atividades ilegais, há dificuldades de contratação e manutenção de
funcionários, há grande demanda por recursos vulneráveis e de alto valor
de mercado;
- as dificuldades de monitoramento das atividades ilegais são comuns a
quatro dos cinco conjuntos de unidades de conservação analisados e a
baixa aplicação das leis aparece em três delas;
- caça, presença de espécies exóticas invasoras, influências externas e
impactos negativos decorrente da presença humana foram considerados
pressões e ameaças mais críticas e freqüentes, com maior crescimento nos
últimos anos e maior probabilidade de ocorrência nos próximos anos em
três dos cinco grupos de unidades de conservação analisados;
- impactos relacionados à pesca preocupam mais intensamente os gestores
de Estações Ecológicas, Reservas Biológicas, Reservas Extrativistas e
Reservas de Desenvolvimento Sustentável;
- a expansão urbana é o fator mais preocupante para os gestores de Áreas
de Proteção Ambiental, Áreas de Relevante Interesse Ecológico, Reservas
Extrativistas e Reservas de Desenvolvimento Sustentável;
- a conversão da vegetação nativa para usos econômicos é o fator que
mais traz preocupação aos gestores de Parques Nacionais, Refúgios de
Vida Silvestre, Áreas de Proteção Ambiental e Áreas de Relevante Interesse
Ecológico;
- como impacto extremamente crítico, que abrange todos os parâmetros
de análise em sua mais alta intensidade, a extração de madeira é bastante
destacada em Florestas Nacionais e a construção de infra-estrutura e a
disposição de resíduos em Áreas de Proteção Ambiental e Áreas de Relevante
Interesse Ecológico, categorias que, em muitas situações, abrangem zonas
urbanas.
84
Recursos humanos, recursos financeiros e questões relacionadas ao
desenvolvimento de pesquisas, avaliação e monitoramento foram apontados
como questões críticas para todo o sistema, enquanto que planejamento
da gestão, infra-estrutura existente e resultados são aspectos críticos para
quatro dos cinco grupos analisados. Os autores ressaltam que módulos de
análise avaliados com valores baixos foram comuns a pelo menos quatro dos
cinco grupos, o que sustenta a conclusão de que os problemas relacionados
à gestão de unidades de conservação no Brasil são sistêmicos.
4.2.2 - Análise de efetividade de gestão das unidades de conservação do
Programa Arpa
O Programa Arpa iniciou, em 2005, a aplicação da ferramenta de
acompanhamento da efetividade de gestão conhecida como Tracking Tool
com o intuito de monitorar os avanços obtidos pelos investimentos feitos
em unidades de conservação do bioma Amazônia21. Naquele ano, foram
avaliadas 34 unidades de conservação de diferentes categorias; a análise
foi repetida em 2006 sobre as mesmas 34 unidades, às quais foram
adicionadas outras 17 unidades incorporadas ao Programa. As 51 unidades
de conservação analisadas em 2006, federais e estaduais, abrangem 27,8
milhões de hectares, 66% dos quais mantidos sob proteção integral.
Do total analisado, apenas dez unidades de conservação tinham 80%
ou mais de sua área total regularizada; 13 possuíam 80% ou mais de
sua área territorial demarcada e somente três delas estavam devidamente
sinalizadas; oito unidades (16%) possuíam plano de manejo elaborado e
aprovado pelo órgão gestor. Além disso, 59% da amostra não atendiam a
meta do Programa de ter ao menos cinco funcionários alocados em sua
equipe (PROGRAMA ARPA 2006).
As questões para a avaliação foram organizadas segundo cinco elementos:
contexto, planejamento, insumos, processos e produtos. Os resultados
acima de 60% foram considerados altos; entre 40% e 60%, médios e,
abaixo de 40%, baixos.
Segundo as conclusões publicadas, a efetividade média do conjunto de
51 unidades de conservação apoiadas pelo Programa Arpa é de 38%,
praticamente a mesma das 34 avaliadas um ano antes, que foi de 37%.
Ainda segundo o documento em questão, quando avaliado, em 2006,
o resultado do subconjunto das 34 unidades apoiadas desde 2004,
percebeu-se uma evolução na efetividade média, que passou de 37% para
43% de um ano para o outro. Com isso, a efetividade média do conjunto
de unidades apoiadas pelo Programa passou, assim, de baixa para média,
permitindo aos analistas dos dados inferir que a atuação do Programa
foi benéfica, considerando a amostra e recorte cronológico utilizados
(PROGRAMA ARPA 2006).
Elaborada pela Aliança Pró-Florestal Banco Mundial / WWF, a ferramenta Tracking Tool faz parte
de uma série de métodos desenvolvidos para fornecer informações sobre a situação atual e para a
avaliação da efetividade de gestão de unidades de conservação.
21
85
4.2.3 – Análise de efetividade das unidades de conservação do estado de
São Paulo
Em 2003, o estado de São Paulo (Região Sudeste do país) analisou a
efetividade de parte do sistema estadual por meio de uma parceria entre
a Secretaria de Estado de Meio Ambiente, através da Fundação Florestal
e do Instituto Florestal, e o WWF-Brasil. Segundo os autores do estudo,
aproximadamente 50% desses remanescentes no estado estão protegidos
por unidades de conservação de proteção integral, sendo que a maior parte
delas está na área avaliada pelo Rappam (SEMA e WWF-Brasil s/d).
Formada por ecossistemas terrestres, costeiros e marinhos, a área analisada
tem, em seu perímetro, cinco Estações Ecológicas, 25 Parques Estaduais
- o Parque Estadual da Serra do Mar, por sua extensão, foi dividido em
oito segmentos para fins de análise e coleta de dados - e dois Parques
Ecológicos22. A importância dessa parte do estado para a conservação
da biodiversidade pode ser aferida pelo fato de abrigar parcialmente o
Sítio Mundial do Patrimônio Mundial Natural Reservas do Sudeste e as
Reservas da Biosfera da Mata Atlântica e do Cinturão Verde da Cidade de
São Paulo. Trata-se, ainda, de uma área onde está a região metropolitana
mais densamente povoada do país – a cidade de São Paulo e seu entorno,
onde vivem 17,8 milhões de habitantes, segundo o censo demográfico de
2000. Por isso, sua paisagem, incluindo as unidades de conservação, é
constituída não apenas por cobertura vegetal da Mata Atlântica, mas por
outras formas resultantes da conversão do uso do solo.
A análise visou decifrar, em primeiro lugar, o contexto da inserção das
unidades de conservação, composto pelos módulos: a) importância
biológica, b) importância socioeconômica, c) vulnerabilidade e d) pressões
e ameaças. As pressões e ameaças foram classificadas como “biota”, para
aquelas que afetam diretamente os seres vivos e seu ambiente; “conflitos”,
por envolver o uso de terras em conflito com a legislação; “infra-estrutura”,
para as atividades que geram obras; e “uso público” para aquelas que
decorrem da visitação à unidade.
Para fins de análise de pontos fortes e fracos, as respostas colhidas foram
classificadas em relação à pontuação máxima possível, considerando
“alto” o resultado acima de 60%; médio, de 40% a 60%, incluindo os
dois limites; e “baixo”, para resultados abaixo de 40%. Os resultados mais
expressivos, segundo os participantes consultados, são:
- importância biológica: a média para o módulo importância biológica foi
alta (80%), variando de 26% a 100%, com 25 unidades de conservação
com valores acima de 60%. Foi destacado o papel das unidades de
conservação na manutenção dos processos ecológicos, dos altos níveis
Trata-se de categoria que não integra o SNUC, e que por isso, poderá ser reclassificada para uma
categoria do grupo de proteção integral.
22
86
de biodiversidade e sua contribuição para a representatividade dos
ecossistemas. Os aspectos menos relevantes apontados foram o número
de espécies raras, ameaçadas ou em perigo de extinção; a diversidade de
plantas e animais e o nível de endemismo.
- importância socioeconômica: a média para o módulo importância
socioeconômica foi de 65%, sendo que 15 ficaram acima de 70%, 12 abaixo
de 60% e cinco apresentaram valores próximos à média (64% a 67%).
Os valores de importância socioeconômica foram maiores para o papel
educacional e/ou científico das unidades e para sua importância cênica;
foram considerados menores os valores relacionados ao uso sustentável
de recursos naturais das unidades, à dependência para a subsistência e à
importância religiosa ou espiritual.
- vulnerabilidade: a média geral da percepção sobre o grau de vulnerabilidade
foi relativamente alta, com 67%, sendo que 15 unidades apresentaram
valores acima de 70%, cinco variando entre 65% e 69% e 12 abaixo de
65%. A análise conclui que das 13 unidades com mais de 20 mil hectares,
11 têm vulnerabilidade acima de 70%, sendo que para as demais unidades
a vulnerabilidade média foi de 59%. Os itens de vulnerabilidade que
apresentaram maior valor foram a falta de infra-estrutura de fiscalização, a
dificuldade de contratação de pessoal e a facilidade de acesso às unidades
por intrusos.
- pressões e ameaças: As quatro principais pressões e ameaças identificadas
foram: a) pressão urbana pelo fato de que algumas unidades não possuem
área de transição entre seus limites e a malha urbana, sofrendo os impactos
negativos do crescimento das cidades; b) extração ilegal do palmito juçara
(Euterpe edulis) para subsistência ou para o comércio, nesse caso, em
associação com empresas que atendem cidades próximas; c) expansão da
ocupação irregular, decorrente tanto da falta de fiscalização como da falta
de regularização fundiária, no caso de ocupantes que tinham propriedades
antes da criação das unidades; d) presença de estradas dentro dos limites
das unidades e/ou que facilitam o acesso a seu interior, fomentando
invasões, visitação sem controle, atropelamento de animais, escoamento
de produtos do extrativismo ilegal.
A análise da efetividade de manejo das unidades de conservação contidas
na área analisada mostrou que seis das 32 alcançaram alta efetividade de
manejo, com valores acima de 60%; 17 unidades apresentaram efetividade
de manejo média, entre 40% e 60%; nove unidades ficaram com avaliação
baixa, ou seja, menor que 40% - situação relacionada sobretudo à falta de
insumos, como recursos humanos.
A análise do sistema de unidade de conservação enfocou os módulos
“desenho do sistema de unidades de conservação”, “políticas de unidades
de conservação” e “contexto político”. Sucintamente, as conclusões
são de que, embora o desenho do sistema represente a diversidade de
ecossistemas da região, há ainda algumas fitofisionomias insuficientemente
87
representadas. Além disso, o desenho e a configuração do sistema “não
otimizam totalmente a conservação da biodiversidade” por não contemplar
áreas que garantam os fluxo entre os ecossistemas e as áreas com proteção
insuficiente. Os outros dois módulos obtiveram avaliação acima de 60%,
indicando que a política estadual para as unidades de conservação, que
obteve 67%, e o contexto político, com 64%, são satisfatórios. A íntegra do
documento, incluindo as recomendações para aprimorar o gerenciamento
do sistema, pode ser encontrada em http://www.wwf.org.br.
4.2.4 – Análise de efetividade das unidades de conservação do estado do
Espírito Santo
Estado costeiro localizado na Região Sudeste do Brasil, o Espírito Santo
tem em seu território 31 unidades de conservação, sendo 17 estaduais
e 14 federais, cujas áreas somadas correspondem a 2,62% da superfície
estadual. A exemplo do que ocorre em outros estados que abrigam o bioma
Mata Atlântica, essas unidades de conservação apresentam pequenas
dimensões e os demais remanescentes relevantes se encontram isolados
em propriedades privadas.
Em 2003, o governo do estado e a organização não-governamental Instituto
de Pesquisas da Mata Atlântica (Ipema) realizaram, com o apoio do Fundo
para Ecossistemas Críticos, um trabalho que, pela primeira vez, avaliou
a efetividade em 70% das unidades estaduais de diferentes categorias,
visando obter resultados que pudessem ser utilizados pelos órgãos gestores
para a definição de políticas e estratégias que aprimorassem seu manejo.
A avaliação foi conduzida por uma equipe multidisciplinar, previamente
capacitada, constituída por técnicos externos aos órgãos gestores para
diminuir a subjetividade dos resultados. O método utilizado consistiu
na aplicação de um conjunto de princípios, critérios e indicadores de
sustentabilidade considerando os âmbitos social, econômico, ambiental e
institucional, estabelecidos por Padovan (2002)23. Foi adotado um “guia
para a avaliação do manejo“ definindo os parâmetros, a escala de valoração
e o procedimento de medição em campo para cada um dos 67 indicadores
utilizados.
Sucintamente, a metodologia estabeleceu três etapas: a) levantamento
de dados, realizado por meio da revisão de informações secundárias,
entrevistas com representantes dos setores relacionados com a gestão das
unidades e observações de campo; b) reuniões de consenso, realizadas
após cada avaliação e ao final dos trabalhos, para dar uniformidade aos
resultados; c) elaboração de relatórios para cada área estudada que,
integrados, permitiram uma análise do conjunto.
A metodologia formulada por Padovan tem como um de seus objetivos contribuir para o debate
sobre a instituição de um sistema de certificação de unidades de conservação que, por exemplo,
forneceria à sociedade um instrumento para maior conhecimento sobre o estágio de implementação
e de efetividade das unidades e poderia gerar um ranking global considerando certos mercados,
como o de ecoturismo e de serviços ambientais.
23
88
A integração dos resultados indicou que, de modo geral, o manejo das
unidades analisadas apresenta limitações em todos os âmbitos considerados.
A média da pontuação obtida para o conjunto das unidades alcança pouco
mais de um numa escala de zero a quatro, indicando que o desempenho
do manejo é pouco satisfatório. Segundo os autores, “significa que as áreas
possuem certos recursos que são indispensáveis ao manejo, mas faltam
elementos para alcançar o mínimo aceitável”. O conjunto das unidades
de conservação foi considerado em situação de “alta vulnerabilidade a
fatores internos e externos”, de forma que não existem garantias de sua
permanência futura caso não sejam melhoradas as condições de manejo
(PADOVAN e LEDERMAN 2004).
A comparação dos quatro âmbitos avaliados permitiu aos avaliadores
concluir que o conjunto das unidades apresenta melhores resultados na
dimensão ambiental (55,75% do ponto ótimo), enquanto que os valores
mais críticos foram obtidos na dimensão social (10% do ótimo). O âmbito
econômico-financeiro também apresentou baixa pontuação e alcançou
apenas 12% do ótimo. A dimensão institucional obteve um índice de
28,25% (PADOVAN e LEDERMAN 2004).
As conclusões extraídas, que apontam problemas comuns a outros sistemas,
são:
- âmbito social: os órgãos gestores não têm uma política de integração
da sociedade organizada ao manejo das unidades; ao mesmo tempo, a
participação das organizações sociais é incipiente e há pouco entendimento
sobre seu papel nos processos de gestão compartilhada;
- âmbito econômico: o potencial econômico das unidades de conservação
está comprometido pela falta de uma política de gestão financeira que
contribua para suprir os custos do manejo. É necessário ampliar as
discussões sobre os mecanismos de geração de recursos, valoração de bens
e serviços ambientais, sistemas de concessão e exploração sustentável dos
recursos naturais.
- âmbito institucional: embora o planejamento e a estrutura física sejam
parcialmente atendidos, a falta de recursos humanos se reflete em todos os
aspectos do manejo, comprometendo a eficácia e a eficiência das unidades
e a garantia de conservação dos recursos naturais no médio e longo prazos.
A falta de regularização fundiária é também apontada como um aspecto
crítico.
- âmbito ambiental: a falta de planejamento e de prioridade para o
desenvolvimento de pesquisas e as limitadas parcerias com instituições
acadêmicas têm deixado lacunas no conhecimento sobre as espécies de
especial interesse para a conservação; espécies indicadoras da qualidade
do ambiente não são monitoradas.
89
Para aprimorar as condições de manejo das unidades estaduais, os autores
do estudo apresentam as seguintes recomendações: a) considerando o nível
de isolamento das unidades, a sustentabilidade dessas áreas protegidas
depende da conservação dos remanescentes naturais situados no entorno,
o que demanda incentivo à proteção em áreas privadas e a geração de
conhecimentos científicos direcionados ao manejo dos recursos naturais;
b) é necessário criar novas unidades de conservação para preencher
lacunas de conservação nos diferentes ambientes, incluindo o marinho;
c) é necessário mudar o sistema de fiscalização existente para tornar mais
efetiva a proteção dos recursos que se pretende conservar; d) é necessário
instituir legalmente um sistema estadual de unidades de conservação
que estabeleça políticas ambientais, sociais, institucionais e econômicas
claras.
4.3 - Planos nacionais e planos diretores
Os compromissos do Brasil com a CDB - em especial, com o artigo 6º, que
determina às Partes desenvolver planos ou programas para a conservação
e a utilização sustentável da biodiversidade – resultou na formulação do
Plano de Ação da Política Nacional de Biodiversidade (PAN-Bio), cujas
diretrizes e prioridades foram aprovadas em 07/02/2006 pela Conabio24.
O PAN-Bio traz 142 ações dividas em sete componentes contendo diretrizes
específicas, nível de prioridade, prazo de execução, viabilidade financeira,
órgãos executores potenciais e indicação de rubricas orçamentárias. O
monitoramento de sua implantação cabe à Câmara Técnica Permanente
criada para esse fim na Conabio, coordenada pelo Ministério do Meio
Ambiente e integrada por outros ministérios e representantes dos estados,
cientistas, indústrias, ONGs ambientalistas e movimentos sociais.
Embora o PAN-Bio seja permeado por ações que podem beneficiar
indiretamente áreas protegidas, há, em alguns componentes, ações que
as afetam diretamente. O componente “Conservação da Biodiversidade”
concentra ações importantes como: a) ampliar a discussão e fortalecer
o PNAP, b) regulamentar e implementar a legislação sobre o uso dos
recursos florísticos e faunísticos nas unidades de conservação de uso
sustentável, c) realizar o levantamento das terras devolutas25 em território
nacional com vistas à criação de novas unidades de conservação, d) criar
e operacionalizar comitês de manejo para conservar todas as espécies
da fauna ameaçadas de extinção, e) instituir metodologia de cálculo
para a compensação ambiental por significativo dano ambiental; f) criar
mecanismos de gestão dos contratos de concessão e da estrutura física
existente em unidades de conservação de proteção integral; g) aprimorar
a legislação federal e fomentar leis estaduais para a criação e apoio às
Para uma breve descrição da Conabio, ver o item 2.2 – Marco legal para as áreas protegidas,
especificamente o Decreto nº 4.703/2003.
25
São consideradas devolutas as terras públicas sem dominialidade definida.
24
90
reservas privadas (RPPN).
O componente “Monitoramento, Avaliação, Prevenção e Mitigação de
Impactos sobre a Biodiversidade” traz as seguintes ações, com impactos
diretos sobre o SNUC: a) mapear e monitorar, em cada bioma, o uso do solo,
as práticas de uso sustentável, os remanescentes de vegetação, as unidades
de conservação, as áreas de preservação permanente e as reservas legais26;
b) implantar parcelas permanentes para monitorar a biodiversidade nas
unidades de conservação e nas áreas prioritárias para a conservação nos
biomas; c) avaliar periodicamente as áreas prioritárias para conservação; d)
estabelecer programas de recuperação e monitoramento de áreas degradadas
em terras indígenas e quilombolas. Por fim, o componente “Fortalecimento
Jurídico e Institucional para a Gestão da Biodiversidade” traz como ações
que afetam o Sistema: a) fortalecer o SNUC, estabelecendo infra-estrutura
necessária para o funcionamento das unidades de conservação; b) ampliar
o quadro de pessoal dos órgãos gestores e estabelecer planos de carreira e
salários que permitam a fixação desses profissionais.
Ainda no âmbito do planejamento das áreas protegidas, tem destaque a
formulação do PNAP, descrito no item 2.1.2 - O Plano Estratégico Nacional
de Áreas Protegidas (PNAP).
4.4 - Planos de manejo de unidades de conservação federais
Segundo a Lei nº 9.985/00, que instituiu o SNUC, as unidades de
conservação devem ter um plano de manejo abrangendo a área da
unidade, sua zona de amortecimento e os corredores ecológicos, devendo
ainda incluir medidas para “promover sua integração à vida econômica
e social das comunidades vizinhas” (artigo 27). Esse artigo assegura
“ampla participação da população residente” na elaboração e implantação
dos planos de manejo das unidades de conservação de uso sustentável
– excetuando-se a Reserva Particular do Patrimônio Natural, cujo plano
deve ser elaborado pelo proprietário da área, segundo orientações técnicas
do órgão responsável por sua aprovação.
Das 288 unidades de conservação federais existentes, 81 têm planos
de manejo aprovados, o que corresponde a 28% do total, sendo que 29
pertencem ao grupo de uso sustentável. Outras 75 estão em processo de
elaboração, o equivalente a 26% do total, restando que 46% das unidades
de conservação federais não tiveram o processo de elaboração de seus
planos iniciado27 (veja Quadro 14 - Situação dos planos de manejo das
unidades de conservação federais).
Para uma explicação sucinta sobre áreas de preservação permanente e reserva legal, ler o item
2.2 – Marco legal para as áreas protegidas, especificamente a Lei nº 4.771/1965.
27
Não há dados completos disponíveis sobre a situação das unidades de conservação estaduais.
26
91
Quadro 14 - Situação dos planos de manejo das unidades de conservação federais
Fontes: Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade, abril de 2006 e janeiro de 2007.
Ao regulamentar alguns dos artigos da lei que criou o SNUC, o Decreto nº
4.340/02 definiu procedimentos diferentes para a aprovação do plano de
manejo segundo suas categorias de manejo. Para as Reservas Extrativistas
e Reservas de Desenvolvimento Sustentável, o plano deve ser aprovado em
resolução do conselho deliberativo da unidade, após aprovação do órgão
executor. Nas demais categorias, o plano de manejo deve ser aprovado por
portaria do órgão executor, preferencialmente – mas não obrigatoriamente
- com a participação dos conselhos das unidades. Esse Decreto também
determinou aos órgãos executores do SNUC atenção à formulação de roteiros
metodológicos destinados a guiar a elaboração dos planos de manejo.
A defasagem entre o número de unidades de conservação existentes e o
número de planos de manejo efetivamente aprovados pode ser explicada
por um conjunto de fatores mais ou menos consensuais entre integrantes
da comunidade conservacionista no Brasil: a) o substancial incremento
de novas áreas protegidas ocorrido nos últimos anos, especialmente na
Amazônia, vis-à-vis a indisponibilidade de recursos financeiros e de equipe
técnicas capacitadas para elaborar os documentos na mesma proporção;
b) a necessidade de atender as novas diretrizes trazidas pelo SNUC e sua
posterior regulamentação, como formular novos roteiros metodológicos e
criar conselhos, questões que afetaram mais diretamente as unidades de
uso sustentável; c) a necessidade de regularizar as questões fundiárias
pendentes. Há, ainda, quem debite essa defasagem à metodologia vigente
para o planejamento de unidades de proteção integral, argumentando que
“o volume de pesquisas exigido na elaboração de um plano de manejo
implica um custo elevado e a necessidade de mais ou menos dois anos de
trabalho”, não só “para elaborar as pesquisas, mas também para analisálas28” (RICARDO e LIMA 2007).
Ainda que não tenha sido possível calcular o incremento anual de planos de
manejo aprovados, há pelo menos duas evidências de que tenha se dado
No artigo citado, os autores e diretores do Projeto Corredores Ecológicos, do Ministério do
Meio Ambiente, defendem “uma abordagem gradualista” na formulação dos planos, com maior
envolvimento das equipes técnicas locais do órgão federal e a participação dos conselhos
consultivos.
28
92
em escala crescente nos últimos cinco anos. A primeira é a formulação e
aprovação de roteiros metodológicos de planejamento para as categorias
Parque Nacional, Reserva Biológica e Estação Ecológica, em 2002;
para as Florestas Nacionais, em 2003; para as Reservas Particulares do
Patrimônio Natural, em 2004, e para as Reservas Extrativistas e Reservas
de Desenvolvimento Sustentável, em 2005. A segunda evidência decorre
do fato de que quase todos os programas nacionais e de cooperação
internacional para o meio ambiente implantados no período contemplaram,
entre suas finalidades, a elaboração de planos de manejo de unidades de
conservação contidas em suas áreas de abrangência.
A instituição do SNUC e sua posterior regulamentação trouxeram novas
demandas para os órgãos gestores. Uma delas foi a revisão de planos de
manejo elaborados antes da Lei nº 9.985/2000 para adequá-los às novas
diretrizes do Sistema – a título de exemplo, entre abril de 2006 e janeiro de
2007 havia seis Parques Nacionais, uma Reserva Biológica e seis Florestas
Nacionais com planos de manejo sendo atualizados. Outra demanda se
refere à adequação do planejamento das Reservas Extrativistas e Reservas
de Desenvolvimento às condições trazidas pelo Decreto nº 4.340/02, o
que suscitou “o estabelecimento de procedimentos que garantissem a
participação qualificada da população local e o uso de metodologias que
permitam gerar uma integração dos conhecimentos locais aos técnicocientíficos” (DISAM/CGREX 2007). Até então, o planejamento e a gestão
dessas duas categorias se fundamentavam em planos de utilização e em
termos de compromisso29.
Em 2003, o órgão gestor federal iniciou a formulação do roteiro metodológico
para essas duas categorias com a participação de técnicos do órgão gestor
federal e de lideranças comunitárias. Paralelamente, foram iniciados
os processos para a criação de conselhos deliberativos – instância que,
segundo as diretrizes estabelecidas pelo órgão, deve participar das etapas
de planejamento das unidades. A versão final do roteiro metodológico foi
aprovada em 2005, mesmo ano em que foi formalizada a constituição dos
dois primeiros conselhos deliberativos - os das Reservas Extrativistas Chico
Mendes e de Soure, ambas na Amazônia. Ainda em 2005, teve início
a elaboração do primeiro plano de manejo de uma Reserva Extrativista
federal – o da Reserva Chico Mendes –, concluído no ano seguinte.
A definição de procedimentos para a elaboração de planos de manejo e
para a criação de conselhos deliberativos deve incrementar o processo
de implementação das 51 Reservas Extrativistas federais existentes.
Atualmente há 12 conselhos deliberativos instalados e outros 14 estão
sendo constituídos. Para 2007 está previsto o início da elaboração de 20
Construídos pelas próprias comunidades, os planos de utilização são um conjunto de regras internas
das unidades de conservação referentes ao manejo dos recursos naturais, ao uso e ocupação da
área e à conservação ambiental, considerando-se a legislação vigente. É o documento que serve de
base para o termo de compromisso, um acordo que estabelece os direitos e deveres da comunidade
e por meio do qual ela se compromete a seguir o disposto no planejamento da unidade.
29
93
planos de manejo. O órgão gestor avalia, porém, que o ritmo de tal avanço
depende da obtenção de recursos financeiros para viabilizar a capacitação
e a atuação dos conselhos no processo de implementação das unidades
e da capacitação de seu quadro técnico para a adequada aplicação da
metodologia recém-formulada para seu planejamento. Uma de suas atuais
prioridades é a construção de um programa para a formação e capacitação
de conselhos de unidades de conservação, que buscará recursos junto à
Câmara de Compensação Ambiental30 (DISAM/CGREX 2007).
4.5 - Planos de pesquisa em áreas protegidas
A pesquisa científica feita hoje nas unidades de conservação federais atende
basicamente às prioridades oriundas do meio acadêmico e de organizações
conservacionistas não-governamentais. Sua aplicação no aprimoramento
da gestão e do manejo das unidades pesquisadas depende, essencialmente,
do compromisso desses pesquisadores com a efetiva conservação in situ
e com os órgãos e técnicos responsáveis pela gestão das unidades objeto
de seu interesse científico. Ao mesmo tempo, nem sempre o interesse do
pesquisador coincide com a prioridade do órgão gestor no que se refere
ao objeto a ser pesquisado, considerando as lacunas de conhecimentos
relacionadas à gestão e ao manejo das unidades federais.
As iniciativas de caráter científico existentes no órgão federal - o Instituto
Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade, que assumiu algumas
atribuições do Ibama - compõem, sobretudo, programas dirigidos à
conservação e ao manejo de espécies ameaçadas - programas que, em
alguns casos, geram conhecimentos úteis para unidades de conservação,
como são os casos do Programa de Conservação dos Pinípedes (leões e lobos
marinhos)31, que contribuiu para a criação de uma unidade de conservação
marinha no extremo sul do Brasil, e do Projeto Golfinho Rotador32, que visa
proteger esse mamífero no arquipélago onde está o Parque Nacional Marinho
Fernando de Noronha. No entanto, não constituem um programa integrado
voltado para fomentar a pesquisa científica em unidades de conservação
com o objetivo de produzir conhecimento aplicável às necessidades de
gestão e manejo dessas áreas.
Essa lacuna poderá ser em parte suprida pela criação, em 2006, do
Programa de Gestão do Conhecimento no âmbito da Diretoria de Unidades
de Conservação de Proteção Integral do Instituto Chico Mendes. Seus
objetivos são a promoção da pesquisa científica voltada ao monitoramento,
ao manejo e à gestão das unidades de conservação; geração de informações,
análise e gerenciamento de dados e conversão dos resultados em ações de
Criada pela Portaria Ibama nº 7, de 19/01/04, a Câmara de Compensação Ambiental tem,
entre suas atribuições, definir a distribuição dos recursos financeiros oriundos de compensação por
significativo impacto ambiental para aplicação nas unidades de conservação. Para mais informações
sobre compensação ambiental, ler o item 5.3.1 – Orçamento governamental para as unidades de
conservação federais.
31
Informação disponível em http://www.ibama.gov.br/projetos_centros/mamiferos.htm.
32
Informação disponível em http://www.ibama.gov.br/projetos_centros/golfinho.htm.
30
94
manejo e gestão das unidades de conservação; internalização e divulgação
interna e externa dos conhecimentos gerados; aumento da capacidade
de interlocução com o meio científico e acadêmico e da atração de
pesquisadores para o órgão gestor federal; fortalecimento institucional e do
corpo técnico do órgão federal; e incremento do fluxo de pesquisadores nas
unidades de conservação.
O Programa está organizado em torno de três linhas de ação. A linha
prioritária visa apoiar projetos de pesquisas aplicadas à gestão, à proteção
e ao manejo de unidades de conservação, que deverão ser financiados com
recursos de compensação ambiental destinados às unidades de proteção
integral nos biomas Cerrado e Caatinga e na zona marinha costeira. O apoio
a tais projetos consistirá em bolsas para os pesquisadores selecionados e
custeio para viabilizar a realização dos estudos. Além disso, as unidades
de conservação a serem contempladas receberão recursos para montar a
estrutura necessária para apoiar os pesquisadores. Os editais para seleção
dos projetos de pesquisa exigirão que apresentem formas de envolvimento
do gestor da unidade de conservação na concepção, desenvolvimento e
repasse dos resultados dos estudos e, ainda, formas de o pesquisador se
aproximar das atividades de gestão.
A segunda linha de ação do Programa planeja investir na capacitação de
seu corpo técnico institucional, estimulando-o a realizar cursos de pósgraduação que sejam capazes de produzir resultados aplicáveis ao manejo,
proteção e gestão de unidades de conservação. Este projeto será desenvolvido
inicialmente em unidades de conservação do bioma Amazônia.
A última linha de ação é a publicação da Revista Brasileira de Unidades
de Conservação (Brasil UC), criada em 2006 com o objetivo de publicar
conhecimentos científicos aplicados ao manejo de unidades de conservação.
O público-alvo da Revista é constituído por técnicos especializados, gestores
e pesquisadores que atuam em atividades de proteção, manejo, gestão e
pesquisa em unidades de conservação. A administração da Revista cabe ao
órgão gestor federal, enquanto que a avaliação e a revisão de manuscritos
serão realizadas por pesquisadores de notório saber sobre os temas a serem
publicados.
4.6 - Planos de aproveitamento de recursos naturais em áreas
protegidas
No Brasil, a formulação e a implantação de projetos de uso sustentável dos
recursos naturais em áreas protegidas habitadas por populações locais,
incluindo aqui as terras indígenas, estão intrinsecamente relacionadas ao
ordenamento e à gestão territorial e ao manejo comunitário realizado por
essas populações, conforme descrito no item 3.6 – Experiências de manejo
comunitário em áreas protegidas – cultura e biodiversidade.
No âmbito das políticas oficiais de uso econômico de recursos naturais
em unidades de conservação, as Florestas Nacionais e suas congêneres
95
estaduais e municipais integram um programa federal de gestão de florestas
públicas destinadas à exploração sustentável, que ganhou maior impulso
nos últimos cinco anos.
Segundo a Lei nº 11.284, de março de 2006, que “dispõe sobre a gestão
de florestas públicas para a produção sustentável”, além dessa categoria
de unidades de conservação, são passíveis de serem exploradas, mediante
concessão feita pelos órgãos públicos competentes, as florestas públicas
destinadas às comunidades locais, por meio de projetos de assentamento
de reforma agrária, e as demais florestas públicas existentes. Todavia,
segundo a lei em questão, estão excluídas das áreas destinadas à outorga
florestal as unidades de conservação de proteção integral e as demais
unidades de uso sustentável.
4.7 - Uso público e outros planos definidos no país
4.7.1 – Evolução na política de turismo em unidades de conservação no
Brasil33
A concepção de uso público das unidades de conservação evoluiu de
forma conjugada às mudanças na própria concepção de como planejar e
gerir a conservação da natureza no Brasil. O primeiro texto legal a tratar
de visitação em unidade de conservação no âmbito federal foi o Decreto
nº 84.017, de 21/09/1979, que aprovou o Regulamento dos Parques
Nacionais Brasileiros e definiu as condições e restrições básicas de uso
público. Sob esse decreto a visitação pública é extremamente regulada,
a gestão é centralizada nas instâncias superiores do órgão federal e não
há preocupação com a integração da unidade ao mundo existente em seu
entorno.
Entre 1985 e 1994, foram tomadas as primeiras iniciativas destinadas a
ordenar o “turismo ecológico”, então um conceito novo no país. Em 1994
foram publicadas as “Diretrizes para uma Política Nacional de Ecoturismo”,
estabelecendo o marco conceitual do ecoturismo, definido como “um
segmento da atividade turística que utiliza, de forma sustentável, o
patrimônio natural e cultural, incentiva sua conservação e busca a formação
de uma consciência ambientalista através da interpretação do ambiente,
promovendo o bem-estar das populações envolvidas”. De acordo com o
texto, o ecoturismo deveria abranger em sua conceituação a experiência
educacional interpretativa, a valorização das culturas tradicionais locais e
a promoção do desenvolvimento sustentável, utilizando racionalmente os
recursos naturais sem comprometer a sua capacidade de renovação e sua
conservação. O texto se torna referência para outras iniciativas normativas
no país.
O texto desse item é uma adaptação do conteúdo do documento “Visitação como Mecanismo
de Recursos Financeiros para o SNUC no Brasil”, produzido pelas consultoras Anna Júlia Passold
e Sônia Maria S. Kinker para o GT Sustentabilidade Econômica das Unidades de Conservação,
instituído em 2005 pelo Ministério do Meio Ambiente no âmbito do Fórum Nacional de Áreas
Protegidas.
33
96
Em 1997, o Ibama publicou o “Marco Conceitual das Unidades de
Conservação Federais do Brasil”, em que cada categoria de manejo comporta
diferentes tipos de uso público. Nesse texto a postura defensiva inicial dá
lugar a propostas mais pró-ativas visando o ordenamento e a consolidação
da visitação, de modo a assegurar a sustentabilidade ambiental da unidade
de conservação conjugada à geração de benefícios locais, tornando-a parte
do desenvolvimento regional.
A publicação afirma o objetivo de promover a participação das comunidades
locais nas atividades de ecoturismo, de modo a contribuir para a melhoria
de sua qualidade de vida mediante a criação de mecanismos que levem à
utilização da mão-de-obra local, ao desenvolvimento das potencialidades
das comunidades, o apoio à criação de pequenas empresas de serviços
ligados ao ecoturismo e incentivo à produção de artesanato. Ao mesmo
tempo, aborda a necessidade de que as unidades de conservação
adotem programas para prevenir e monitorar os impactos decorrentes do
ecoturismo; que os planos de manejo estabeleçam as zonas, as atividades
mais apropriadas e as condições para que seu desenvolvimento; que as
atividades decorrentes da visitação incentivem a interpretação da natureza,
o despertar para o patrimônio natural e cultural, a educação ambiental e a
valorização das unidades de conservação. Estabelece, ainda, os centros de
visitantes ou de vivência como espaços difusores e dispersores de todas as
atividades de uso público nas unidades de conservação.
Ao instituir o SNUC, a Lei nº 9.985/2000 lista entre os objetivos do
Sistema “favorecer condições e promover a educação e a interpretação
ambiental, a recreação em contato com a natureza e o turismo ecológico”.
Segundo a lei, todas as categorias de unidades de conservação admitem
visitação pública, com maiores ou menores restrições. No caso das
Estações Ecológicas e Reservas Biológicas, as duas categorias mais
restritivas quanto à presença humana, a visitação pública só é permitida
com fins educacionais, de acordo com o que dispuser o plano de manejo da
unidade ou regulamentação específica. Nas demais categorias, a visitação
pública é admitida segundo o que for estabelecido no plano de manejo,
no regulamento de cada categoria e nas normas fixadas pelo órgão que
administra a unidade – inclusive nas esferas estaduais e municipais.
A partir do SNUC, os órgãos responsáveis pela política do setor passam
a formular programas e projetos visando estruturar a visitação pública em
unidades de conservação, superando gradativamente os receios de que
o incremento da visitação comprometa os objetivos de conservação. A
necessidade de planejamento, de investimentos em capacitação e infraestrutura, de controle e gestão adequados, de participação da comunidade
local e regional nos benefícios econômicos desse mercado passa a ser
encarada como questões essenciais para o setor. Uma síntese da visão atual
do turismo ecológico pode ser encontrada nos programas em curso no país,
como o Plano de Ação para a Estruturação e Promoção do Turismo nos
Parques Nacionais e o Programa Nacional do Ecoturismo (PNE), tratados
no item a seguir.
97
4.7.2 – Situação atual e iniciativas para aprimorar a gestão do turismo
em Parques Nacionais34
A visitação pública em Parques Nacionais no Brasil está condicionada à
existência de plano de manejo aprovado, à disponibilidade de infra-estrutura
adequada e à regularização da situação fundiária nas zonas abertas ao
uso público, segundo o plano de manejo. O órgão gestor federal estima
que, atualmente, cerca de três milhões de pessoas visitem anualmente
os Parques Nacionais brasileiros, havendo expectativa de um gradual
incremento desse número nos próximos anos.
Dos 62 Parques Nacionais existentes em julho de 2007, 30 possuíam plano
de manejo. Ao mesmo tempo, 23 estavam abertos à visitação e realizavam
o controle da entrada de visitantes, cobrando ingressos; outros seis parques
permitiam a visitação com autorização especial, sem cobrança de taxa pelo
acesso a seus atrativos. Porém, apenas três Parques Nacionais - do Iguaçu,
da Tijuca e de Brasília - concentravam 84% do fluxo de visitantes.
Nesse contexto, a estruturação de um maior número de Parques Nacionais
tem sido reconhecida pelas instâncias responsáveis pela política de turismo
e do meio ambiente como uma questão premente. Nos últimos dez anos
foi adotada uma série de iniciativas destinadas a enfrentar as questões que
constrangem o desenvolvimento do ecoturismo nos Parques, tido como
de grande potencial face à diversidade de atrativos naturais e culturais
disponíveis no Brasil.
A mais recente dessas iniciativas foi a constituição, em junho de 2006,
de um Grupo de Trabalho Interministerial (GTI) formado pelo Ministério
do Meio Ambiente, pelo órgão gestor federal, pelo Ministério do Turismo
e pelo Instituto Brasileiro de Turismo (Embratur), com o objetivo de
promover o turismo nos Parques Nacionais como medida dinamizadora do
desenvolvimento local. A partir de indicadores como a existência de plano
de manejo, a situação fundiária da unidade, a infra-estrutura disponível, o
fluxo de visitantes, o apelo paisagístico, as condições de acesso e a situação
dos serviços oferecidos na região, o Grupo selecionou 25 unidades dessa
categoria, em diferentes biomas brasileiros, para serem alvos do Plano de
Ação para a Estruturação e Promoção do Turismo nos Parques Nacionais.
A seleção levou em consideração, também, as prioridades contidas em um
acordo de cooperação, firmado em 2004 entre a Embratur e o Ibama, e no
Programa de Regionalização do Ministério do Turismo.
O Plano de Ação tem como objetivo integrar as ações das instituições
envolvidas e fortalecer políticas que assegurem o desenvolvimento
As informações contidas nesse item foram extraídas majoritariamente do estudo “Visitação como
mecanismo de geração de recursos financeiros para o SNUC”, referenciado na nota anterior; do
“Plano de Ação para a Estruturação e Promoção do Turismo nos Parques Nacionais”, do MMA/
Ibama e Ministério do Turismo/Embratur, versão de maio de 2007; e da publicação “Unidades de
Conservação do Brasil”, lançada pelo MMA em julho de 2007.
34
98
sustentável da atividade turística em Parques Nacionais. Sua elaboração
tomou como base as linhas de ação e as prioridades do Programa de
Visitação em Parques Nacionais, desenvolvido pelo Instituto Chico Mendes
em parceria com o Ministério do Meio Ambiente (leia mais sobre o Programa
de Visitação em Parques Nacionais neste item).
No segundo semestre de 2006, o GTI realizou um levantamento sobre
a situação de cada um dos 25 parques selecionados visando identificar
suas vantagens e deficiências e, assim, definir prioridades de ação no
curto, médio e longo prazos, estimando as necessidades de investimentos
correspondentes. Com o resultado do levantamento em mãos, o grupo
estimou em R$ 51 milhões (aproximadamente US$ 26 milhões) os
investimentos necessários para viabilizar condições de visitação a essas
áreas. Outros projetos e programas destinados a fomentar e ordenar o
ecoturismo em unidades de conservação têm sido implantados nos últimos
anos, conforme listamos a seguir.
- Programa de Visitação em Parques Nacionais: anteriormente citado,
trata-se de iniciativa do então Ibama (hoje, Instituto Chico Mendes)
destinada a estruturar e qualificar a visitação em 25 Parques Nacionais
brasileiros em consonância com os objetivos de manejo e as prioridades de
planejamento e implementação de cada unidade. Os recursos financeiros
aplicados, oriundos de compensação ambiental, possibilitaram obras como
a construção de dois centros de visitantes, nos Parques Nacionais Marinho
de Abrolhos e Chapada dos Veadeiros, e a elaboração dos planos de
manejo dos Parques Nacionais Serra das Confusões e Aparados da Serra.
As metas iniciais do Programa são: incrementar em 15% ao ano o número
de visitantes; implementar a primeira fase de um programa de arrecadação
em seis parques; estabelecer novos serviços de concessão e planejar ações
de implementação dos Parques Nacionais e de desenvolvimento do turismo.
O Programa inspirou a formação do GTI responsável pela formulação do
Plano de Ação para a Estruturação e Promoção do Turismo nos Parques
Nacionais.
- Diretrizes para Visitação em Unidades de Conservação: sintetizam um
conjunto de princípios e recomendações para os gestores das unidades
com vistas a ordenar a visitação e promover sua sustentabilidade. A adoção
dessas diretrizes foi recomendada aos órgãos gestores que compõem o
SNUC e aos demais atores envolvidos com a visitação em unidades de
conservação.
- Plano Nacional de Turismo 2007-2010: visa estruturar 65 destinos
turísticos com padrão de qualidade internacional por meio do Programa
de Regionalização do Turismo, que selecionou roteiros e regiões brasileiras
que apresentam condições de serem trabalhados. Os 65 destinos devem
receber investimento para que, até 2010, sirvam de modelo para o
desenvolvimento turístico-regional em outras regiões, considerando
princípios como sustentabilidade ambiental, sociocultural e econômica.
99
- Programa para o Desenvolvimento do Ecoturismo na Amazônia Legal
(Proecotur): resultado de um acordo firmado entre o governo brasileiro
e o BID, o Proecotur tem o intuito de viabilizar o desenvolvimento do
ecoturismo como uma das bases para o desenvolvimento sustentável da
Amazônia Legal, criando as condições necessárias para que os estados da
região administrem de forma eficiente áreas com potencial para o turismo
ecológico segundo critérios estabelecidos pelo Projeto (PROECOTUR s/d).
A fase 1 do Programa, prestes a ser concluída, fez investimentos de US$
5,53 milhões no planejamento estratégico para receber os investimentos
previstos para a fase 2. Um dos itens do Componente II, “Planejamento
do Ecoturismo na Amazônia Legal”, realizou investimentos na elaboração
de cinco planos de manejo de unidades de conservação, em planos de uso
público, no zoneamento de áreas de interesse turístico por seus atrativos
naturais e culturais, na infra-estrutura de unidades de conservação, na
criação de duas Áreas de Proteção Ambiental e de um Parque Estadual
e em estudos que poderão resultar na criação de três novas unidades de
conservação vocacionadas para o ecoturismo. Ainda nessa fase, foram
investidos recursos na elaboração de estratégias estaduais para o setor,
na implantação de centros de atendimento a turistas, em infra-estrutura
de recepção dentro e fora de unidades de conservação e em capacitação
nos 15 pólos de ecoturismo identificados. Em 2005 foi iniciado o
planejamento de um projeto voltado para o desenvolvimento ecoturístico
de base comunitária, com foco em comunidades localizadas em unidades
de conservação e/ou em seus entornos. Os investimentos para a fase 2 do
Proecotur estão calculados em US$ 200 milhões.
- Programa Nacional de Ecoturismo (PNE): Incluído pelo Ministério do
Meio Ambiente como uma rubrica do Plano Plurianual 2004-2007, o PNE
tem como metas concluir a primeira fase do Proecotur; implantar o Sistema
de Informações Georreferenciadas para o Ecoturismo (SIG Ecoturismo),
de forma a subsidiar os diversos segmentos governamentais e nãogovernamentais envolvidos com a atividade no país; fomentar a capacitação
de “monitores ambientais locais”, gerando novas oportunidades de
trabalho para indivíduos de comunidades locais; e aprimorar o marco legal
referente ao turismo no Brasil. Faz parte do PNE a implantação da Agenda
Ambiental para o Turismo, a ser realizada conjuntamente pelas pastas do
Meio Ambiente e do Turismo com o objetivo de integrar ao planejamento e
à gestão do setor parâmetros de sustentabilidade social e ambiental.
- Programa de Desenvolvimento do Turismo no Nordeste (Prodetur/NE):
fruto de uma parceria entre o Banco do Nordeste do Brasil – banco de
desenvolvimento regional da Região Nordeste - e o BID, o Programa
objetiva a melhoria da qualidade de vida da população residente nas áreas
selecionadas por meio do estímulo à cadeia produtiva do turismo, do
aumento das receitas provenientes das atividades turísticas e da capacitação
gerencial dirigida a estados e municípios. Sua primeira etapa destinou US$
670 milhões para investimentos em infra-estrutura turística; a segunda
etapa tem como objetivo consolidar as ações necessárias para tornar o
turismo sustentável nos pólos beneficiados na etapa anterior. Em sintonia
100
com o Plano Nacional de Turismo 2007-2010, o Programa selecionou
dois Parques Nacionais e três Áreas de Proteção Ambiental para receber
investimentos estimados em US$ 3,4 milhões.
4.7.3 – Turismo em unidades de conservação de uso sustentável
federais
A visitação pública em unidades de uso sustentável, incentivada por meio
de projetos de base comunitária, tem sido tema de reuniões e debates entre
técnicos governamentais e lideranças comunitárias com vistas a extrair
conclusões que possam orientar a estruturação do setor. A diversidade de
situações que caracterizam essas unidades – o acesso, a infra-estrutura e
os atrativos naturais e culturais disponíveis – condiciona o interesse das
comunidades por esse mercado. Assim, enquanto há reservas em que a
visitação pública já é parte do cotidiano, outras avaliam os prós e os contras
de aderiram a qualquer iniciativa que signifique incorporar a presença de
ecoturistas ao seu dia a dia.
No âmbito do governo federal, o Programa Nacional de Ecoturismo
(PNE) criou uma carteira para financiar projetos de ecoturismo de base
comunitária em áreas de uso sustentável, terras indígenas e terras de
remanescentes de quilombos, com o intuito de conciliar “a conservação
ambiental, o manejo sustentável dos recursos naturais e a geração de
trabalho e renda” (DISAM e CNPT/ Ibama 2006). O relatório de uma
reunião entre técnicos do órgão gestor federal e lideranças de Reservas
Extrativistas e Reservas de Desenvolvimento Sustentável, realizada no final
de 2006 para discutir o financiamento do PNE, demonstra que, enquanto
algumas comunidades já administram programas de visitação, outras vêem
o assunto com cautela: ao mesmo tempo em que identificam no ecoturismo
uma oportunidade para melhorar sua renda, temem o impacto cultural e
ambiental gerado pela visitação (DISAM e CNPT/ Ibama 2006). A principal
conclusão extraída desse encontro é que a implantação de projetos de
ecoturismo nas reservas demanda o fomento de condições para receber
os visitantes, como capacitação gerencial, instalação de infra-estrutura
mínima e fortalecimento das associações de comunitários. A constituição
de parcerias com entidades que tenham experiência no setor foi apontada
como parte da solução para esses problemas.
Paralelamente ao PNE, em 2005 foi iniciado o planejamento de um
programa federal voltado para o ecoturismo no âmbito do Proecotur, citado
anteriormente. Essa iniciativa – que tem um projeto-piloto em implantação
na Reserva Extrativista de Soure, na Ilha de Marajó, no bioma Amazônia,
com o apoio da Agência de Cooperação Espanhola - será executado por
meio de uma carteira destinada a apoiar projetos comunitários a partir de
2007.
Na falta de regulamentação específica para a visitação pública em unidades
de uso sustentável – algo que, inclusive, não tem sido apontado como uma
necessidade pelos que participam desse debate -, a atividade e os eventuais
101
conflitos decorrentes da presença de ecoturistas têm sido regulados pelos
planos de utilização ou pelos planos de manejo, quando já elaborados35.
Esse procedimento á válido para outras categorias de unidades de uso
sustentável, como as Áreas de Proteção Ambiental e Florestas Nacionais.
4.7.4 – Turismo em terras indígenas
A visitação pública em terras indígenas é tema controverso no Brasil.
Profissionais e indígenas mais cautelosos alertam para as possíveis
conseqüências que o contato regular com turistas possa ocasionar sobre
o modo de vida dos índios. Apontam impactos como a introdução de
dinheiro em escala ignorada e de produtos industrializados hoje inacessíveis
aos índios; problemas sanitários e produção de resíduos nas aldeias; a
introdução de novos hábitos e rotinas que certamente afetarão o cotidiano
indígena, podendo resultar em descaracterização sócio-cultural (PASCA
2007).
Desde a década de 1990, no entanto, o mercado de turismo ecológico
demonstra interesse crescente pela visitação pública em terras indígenas.
Ao mesmo tempo, alguns povos indígenas vêem nessa atividade uma
possibilidade de receita econômica para suas comunidades. Frente a
esse contexto, o órgão indigenista oficial - a Funai - tem participado e
promovido fóruns de discussão sobre o tema, tendo inclusive lançado em
1997 o Manual Indígena de Ecoturismo (PASCA 2007). Em 2006, criou
um grupo de trabalho com o propósito de avaliar o tema. As experiências
de visitação identificadas pelo grupo apontam que “o turismo se apresenta
como uma forma de sustentabilidade econômica para as comunidades
indígenas”. Entretanto, seus impactos precisam ser melhor avaliados ao
longo do tempo, sob um ambiente regulatório que vise garantir os direitos
constitucionais dos índios (SILVA 2006).
4.7.5 - Visitação pública em unidades de conservação estaduais
Embora não haja um documento sistematizando informações sobre as
políticas públicas estaduais para o turismo ecológico no Brasil, foi possível
mapear a existência de iniciativas orientadas para o setor em alguns
estados nos quais tal atividade tem relevância econômica. Basicamente,
tais iniciativas ou são empreendidas pelos estados, que investem recursos
orçamentários próprios ou de empréstimos externos em programas
destinados a aprimorar as condições para a visitação pública em suas
unidades de conservação, ou são resultado de programas coordenados por
instâncias governamentais federais, descritos anteriormente. A seguir, um
relato sucinto dessas iniciativas nos estados.
- Estado de São Paulo: localizado na Região Sudeste do país, São Paulo
elaborou em 1996 as “Diretrizes para uma Política Estadual de Ecoturismo”.
Para uma definição de plano de utilização, ver o item 4.4 - Planos de manejo de áreas
protegidas.
35
102
O documento traz orientações para ações públicas, privadas e da sociedade
civil para o desenvolvimento da atividade em áreas protegidas, ou não,
sob jurisdição estadual, predominantemente situadas no bioma Mata
Atlântica. Em 2005 o governo estadual obteve financiamento junto
ao BID para viabilizar o “Projeto de Desenvolvimento do Ecoturismo na
Região da Mata Atlântica”, orçado em US$ 15 milhões – US$ 9 milhões
do acordo de empréstimo e US$ 6 milhões de contrapartidas do governo
estadual. O Projeto contempla investimentos em seis Parques Estaduais
– Carlos Botelho, Turístico do Alto Ribeira, Intervales, Ilha do Cardoso,
Jacupiranga e de Ilhabela – para “consolidar o turismo sustentável como
forma de desenvolvimento socioeconômico regional, aliado à estratégia de
conservação da natureza”36.
- Estado do Paraná: situado no domínio da Mata Atlântica, no sul do país,
o estado do Paraná elaborou suas “Diretrizes para o Turismo em Áreas
Naturais no Estado” em 2000, fruto de um processo iniciado em 1996. O
documento aponta como diretrizes da política estadual “a conservação dos
espaços naturais, o envolvimento das comunidades e a geração de emprego
e renda sob os princípios da sustentabilidade”. Entre as estratégias para
implementar o turismo em áreas naturais está “fomentar a estruturação das
unidades de conservação”, por meio da elaboração de planos de manejo,
da criação de um fundo para administrar as receitas obtidas, viabilizar
concessões e terceirizar serviços37.
- Região Nordeste e norte de Minas Gerais: o estado da Bahia elaborou,
em 2001, as “Diretrizes para a Prática do Mergulho Recreativo, Turístico e
de Lazer em Unidades de Conservação”, a partir de uma oficina realizada
no Parque Estadual da Ilha Anchieta. A “Carta da Ilha Anchieta para o
Mergulho Recreacional”, elaborada no evento, vem inspirando gestores
de outras unidades de conservação costeiras e marinhas a estabelecer
regras para atividades de mergulho. O programa federal Prodetur/NE
prevê investimentos na implantação de infra-estrutura para o uso público
em algumas unidades de proteção integral da região, como é o caso dos
Parques Estaduais Pico do Itambé, do Biribiri e do Rio Negro, no Vale do
Jequitinhonha, estado de Minas.
- Estado do Mato Grosso: situado na Amazônia Legal, na área de
transição entre os biomas Cerrado e Floresta Amazônica, o estado recebeu
investimentos da fase 2 do Programa Nacional do Meio Ambiente (PNMA
II), do Ministério do Meio Ambiente, para o desenvolvimento do ecoturismo
nos Parques Estaduais de Serra Azul e do Araguaia. No caso do Serra Azul,
o parque obteve apoio para formular o projeto do Centro de Visitação e
reativou o conselho consultivo, elaborando inclusive seu regimento interno.
Viabilizou, ainda, a aquisição de equipamentos de combate a incêndios
florestais. Já o Parque Estadual do Araguaia, criado em setembro de 2001,
Informação disponível em http://www.ambiente.sp.gov.br/ecoturismo/mataatlantica/projeto/
projeto.asp.
37
A íntegra do documento está disponível em http://www.pr.gov.br/turismo/diretrizes_tan.pdf.
36
103
recebeu investimentos na formulação do plano de manejo e na capacitação
de servidores do município de Novo Santo Antônio, que hoje atuam como
agentes ambientais.
- Amazônia Legal: os nove estados da Amazônia Legal têm o apoio técnico e
financeiro do Proecotur, que possibilitou a elaboração de estratégias estaduais
para o ecoturismo, considerando os pólos previamente qualificados (para
mais detalhes, veja o item 4.7.2 – Situação atual e iniciativas para aprimorar
a gestão do turismo ecológico em Parques Nacionais). Os investimentos
permitiram a elaboração de planos de manejo e investimentos em infraestrutura de unidades de conservação geridas pelos estados, bem como a
formulação de estudos para a criação de novas unidades estaduais.
104
5 - Sustentabilidade das áreas protegidas
5.1 - Administração das unidades de conservação federais
Os dados referentes ao pessoal designado para a administração e o manejo
de áreas protegidas no Brasil são incompletos, considerando que o SNUC é
integrado por unidades de conservação federais, estaduais e municipais. Os
números disponíveis, coletados pelo Grupo Temático de Sustentabilidade
Financeira do SNUC, referem-se exclusivamente à sua parte federal (leia
a respeito no item 5.3.1 - Orçamento governamental para as unidades de
conservação federais).
Segundo o levantamento desse Grupo, em 2006 havia 1.995 funcionários
com atribuições relacionadas ao SNUC, sendo 212 deles lotados na sede
do órgão, na cidade de Brasília, e os 1.783 restantes, nas 288 unidades
de conservação federais. Outros 35 profissionais do Ministério do Meio
Ambiente foram identificados como relacionados à gestão do Sistema,
totalizando 2.030 pessoas. O trabalho formulado pelo Grupo calculou que
o número mínimo de pessoas para a gestão das unidades federais seria de
9.076, o que resulta em um déficit de 7.046 pessoas somente na parte
federal do Sistema, incluindo-se aí pessoal administrativo e de campo38.
Criado em fevereiro de 1989, o Ibama realizou o primeiro concurso público
de sua história em 2002, quando foram contratados 915 novos servidores,
300 dos quais distribuídos para as unidades de conservação. Em 2005, foi
realizado um novo concurso público, resultando em mais 915 servidores
contratados para todas as áreas; uma pequena parte desse contingente, cujo
número não foi possível precisar, foi destinada às unidades de conservação
para repor movimentações dos anos anteriores.
Ainda que houvesse sido deslocado um número maior desses novos
funcionários para as unidades, esses esforços recentes não teriam sido
suficientes para assegurar equipes em número adequado para suprir as
necessidades das unidades de conservação federais. Em 2006, o Plano de
Ação para a Estruturação e Promoção do Turismo em Parques Nacionais fez
um levantamento da situação dos recursos humanos junto a 25 unidades
de conservação dessa categoria (leia no item 4.7.2 - Situação atual e
iniciativas para aprimorar a gestão do turismo ecológico em Parques
Nacionais). O levantamento, cuja metodologia priorizou a densidade de
pessoal de campo como a base para a gestão das unidades, constatou um
O citado Grupo Temático calculou que a necessidade total de pessoal para as unidades de
conservação federais e estaduais é, atualmente, de aproximadamente 16 mil pessoas. A falta
de dados disponíveis sobre o pessoal designado para a gestão das unidades estaduais inviabiliza
calcular o provável déficit de pessoal existente tomando como base esse número.
38
105
déficit de 21 analistas ambientais, 35 técnicos e 1.038 funcionários de
nível básico nas 25 unidades analisadas (GTI 2007).
Conforme destacado no item 4.1.1 - Proteção e controle das unidades
de conservação federais, dificuldades envolvendo a contratação e a
manutenção de funcionários foram apontadas, pelos chefes ouvidos no
estudo “Efetividade de Gestão das Unidades de Conservação do Brasil”,
como um dos cinco principais fatores que comprometem a gestão das
unidades federais. O mesmo estudo constatou que é nas unidades de
conservação situadas no bioma Amazônia que a questão envolvendo a
contratação e permanência de servidores tem maior peso. O problema
foi detectado também pelo Programa Arpa, que tem exatamente o bioma
Amazônia como seu foco de atuação. De fato, é seguro afirmar que a maior
parte dos servidores aprovados nos dois últimos concursos realizados
pelo Ibama são oriundos da metade meridional do Brasil, que apresenta
contextos culturais, econômicos e climáticos muito distintos das condições
amazônicas39. Resulta, dessa situação, uma intensa movimentação desses
servidores para regiões mais próximas de suas realidades pregressas,
causando desequilíbrios na distribuição de funcionários dentro do
Sistema.
A relevância do enfrentamento dessa questão – que tem impacto direto
sobre a efetividade da gestão no âmbito do SNUC - tem resultado em muitos
debates e algumas propostas. Os organizadores do estudo “Efetividade de
Gestão das Unidades de Conservação do Brasil” listam recomendações
como investimentos em insumos, para melhorar as condições de trabalho
dos funcionários; o estabelecimento de políticas de recursos humanos que
estimulem a permanência de servidores em locais mais remotos; o rodízio
entre funcionários e a determinação de um número mínimo de indivíduos
para as funções relacionadas à gestão das unidades de conservação.
No âmbito do Programa Arpa, as negociações entre os parceiros resultaram
na decisão de assegurar a existência de um mínimo de cinco servidores por
unidade de conservação beneficiada, sendo no mínimo dois de nível superior
e três de nível técnico. Essa exigência é um dos critérios adotados para
que uma unidade seja considerada apta a receber investimentos para sua
manutenção permanente (ver detalhes no item 5.5.1 - O Programa Áreas
Protegidas da Amazônia - Arpa). As instituições que integram o Programa
recomendaram, ainda, a adoção de uma política de recursos humanos
para criar estímulos à permanência de equipes numérica e tecnicamente
satisfatórias nas unidades de conservação atendidas (PROGRAMA ARPA
2006).
Essa afirmação decorre da própria vivência desse consultor, que por dois anos trabalhou
como assessor de uma organização não-governamenal que apóia a implantação de unidades de
conservação na Amazônia, e de informações obtidas em diálogos com funcionários do órgão de
meio ambiente federal.
39
106
5.2 - Fortalecimento de capacidades para a administração das áreas
protegidas
Ao lado do provimento de funcionários em número adequado, a capacitação
dos profissionais que desempenham funções relacionadas ao SNUC é
reconhecida como uma questão premente na busca de maior efetividade para
a gestão das unidades de conservação no Brasil. A maior evidência dessa
afirmação é o fato de que quase todos os programas governamentais que
têm as unidades de conservação como objeto apresentam um componente
destinado à capacitação, com ênfase em questões específicas segundo as
necessidades identificadas – planos de manejo, conselhos consultivos ou
deliberativos, manejo, uso público, regularização fundiária, entre outros.
Uma análise dos conteúdos priorizados por esses programas permite afirmar
que a capacitação tem sido abordada no Brasil de uma forma abrangente,
ou seja, envolve não apenas os gestores das unidades de conservação,
mas também outros atores relevantes para a efetividade do Sistema, como
membros de conselhos consultivos e deliberativos, pessoal de nível técnicos
dos órgãos gestores, guias, agentes ambientais voluntários. Desta forma,
a capacitação vem sendo tratada, no âmbito dos órgãos responsáveis
pela gestão do SNUC, de forma descentralizada, descontínua e ocasional,
considerando as necessidades e as oportunidades identificadas. As
iniciativas de capacitação que integram programas e projetos relacionados
ao SNUC estão mencionadas ao longo deste documento.
Em 2004, porém, o Ministério do Meio Ambiente iniciou um processo
destinado a formular diretrizes e referenciais para a capacitação de gestores
de unidades de conservação dos níveis federal, estadual e municipal processo ainda não concluído. Foram realizados dois levantamentos
sucintos visando identificar, primeiro, a oferta de capacitação para gestores
de unidades de conservação e, segundo, a demanda de capacitação por
parte dos envolvidos com a gestão das unidades.
Resumidamente, o levantamento da oferta constatou que o mercado de
cursos na área de gestão ambiental prioriza a formação de técnicos e
engenheiros para a agenda urbana, de forma que o tema unidades de
conservação é pouco explorado pelas instituições de ensino mapeadas.
Sua conclusão é que há “a necessidade de investimento na estruturação
da oferta de capacitação, considerando o foco temático gestão de unidades
de conservação” (DAP/SBF 2004a).
Na outra ponta, a da demanda, um levantamento feito com 20 gestores
de unidades de conservação constatou que apenas a metade deles havia
participado de cursos na área de gestão. Ademais, as áreas de maior
interesse eram plano de manejo, biodiversidade, geoprocessamento e
desenvolvimento sustentável. Os gestores também reclamaram uma
formação continuada e cursos que conciliem teoria e prática, especialmente
nas próprias unidades de conservação, como forma de encarar as questões
reais da gestão (DAP/SBF 2004b).
107
5.3 – Financiamento para as áreas protegidas40
5.3.1 - Orçamento governamental para as unidades de conservação
federais
O Programa de Trabalho da CDB propôs às Partes, como uma das atividades
para atender o Objetivo 3.4, a realização, até 2005, de um estudo de âmbito
nacional sobre a eficácia do uso dos recursos financeiros e as necessidades
financeiras do Sistema Nacional, levando em consideração toda a gama
de instrumentos e fontes de financiamento disponíveis. A meta proposta
pelo Programa de Trabalho é que os países garantam, até 2008, recursos
financeiros e técnicos suficientes para implantar e administrar, de forma
eficaz, seus sistemas de áreas protegidas.
No início de 2005, o Ministério do Meio Ambiente criou, no âmbito do Fórum
Nacional de Áreas Protegidas - espaço de caráter consultivo destinado a
discutir a implementação do PNAP - o Grupo Temático de Sustentabilidade
Financeira do SNUC, com mandato para fazer um diagnóstico da situação
atual do financiamento do Sistema brasileiro, decifrar suas necessidades e
sugerir medidas para planejar a manutenção do Sistema.
Composto por representantes governamentais e de organizações
conservacionistas da sociedade civil, o GT trabalhou ao longo de 18 meses,
oferecendo ao final desse período recomendações para a elaboração de um
plano nacional de sustentabilidade financeira para o SNUC. Considerando
que os dados orçamentários para as unidades de conservação estaduais
e municipais não estavam disponíveis, o GT restringiu sua análise às
unidades federais.
A análise da execução do orçamento destinado anualmente pelo
Planejamento central ao Ministério do Meio Ambiente e aos órgãos a ele
subordinados - entre os quais o Instituto Chico Mendes, responsável pela
gestão das unidades de conservação federais – concluiu que os gastos totais
com a gestão ambiental são, em média, de R$ 1 bilhão (aproximadamente
US$ 500 milhões), valor que permaneceu estável nos cinco anos analisados
(2002 a 2006). Essa cifra equivale a apenas 0,11% do orçamento federal
anual.
A redação deste item se baseou prioritariamente no documento “Pilares para o Plano de
Sustentabilidade Financeira do SNUC”, preparado pelo Grupo Temático de Sustentabilidade
Financeira.
40
108
Quadro 15 – Orçamento federal para a gestão ambiental entre 2002 e 2006
Fonte: Grupo Temático de Sustentabilidade Financeira do SNUC.
Para estimar os recursos de origem federal efetivamente aplicados no
SNUC, o GT adotou os dados do ano de 2006 como referência. Foram
considerados os recursos orçamentários destinados a programas com
foco em unidades de conservação e adicionada a despesa com pessoal;
os recursos do Fundo Nacional do Meio Ambiente que beneficiaram o
Sistema; os recursos investidos pelo fundo de compensação ambiental e
as cifras executadas por programas de cooperação internacional de âmbito
federal. Outras fontes de receita identificadas pelo GT – como visitação
pública e concessão de serviços, que geram receita para o poder público
- não puderam ser avaliadas por falta de informações confiáveis sobre a
aplicação dos recursos obtidos em benefício das unidades. Analisando
a execução dessas fontes, o GT concluiu que foram destinados R$ 229
milhões (aproximadamente US$ 115 milhões) para o SNUC, conforme
descrito a seguir.
Quadro 16 – Resumo das fontes de financiamento do SNUC e seus respectivos percentuais
(ano base 2006)
Fonte: Grupo Temático de Sustentabilidade Financeira do SNUC.
Entre as fontes de financiamento acima descritas, o Ministério do Meio
Ambiente aponta a compensação ambiental como a mais promissora para
custear as demandas das unidades de conservação.
A compensação ambiental tem origem no artigo 36 da Lei nº 9.985/00,
que instituiu o SNUC. Segundo esse artigo, empreendimento considerado
de significativo impacto pelo órgão ambiental competente “é obrigado a
apoiar a implantação e manutenção de unidade de conservação do grupo de
proteção integral”. O parágrafo 1º desse artigo determina que “o montante a
ser destinado pelo empreendedor para esta finalidade não pode ser inferior
a 0,5% dos custos totais previstos para a implantação do empreendimento,
sendo o percentual fixado pelo órgão ambiental licenciador, de acordo com
o grau de impacto ambiental causado pelo empreendimento”.
109
Os recursos devem ser empregados diretamente pelo empreendedor,
em comum acordo com o órgão gestor, na gestão de uma unidade de
conservação, especialmente de proteção integral, cuja área ou zona de
amortecimento tenha sido diretamente afetada pelo empreendimento.
Esses recursos também podem ser usados para criar ou gerir unidade
de conservação de proteção integral não diretamente afetada pela obra,
de preferência localizada no mesmo bioma ou bacia hidrográfica onde o
empreendimento esteja situado. A destinação dos recursos é decidida no
âmbito da Câmara de Compensação Ambiental.
Por sua importância, o mecanismo passou por uma reestruturação recente,
resultando, a partir de 2005, em incremento de sua execução. O montante
de recursos de compensação ambiental, atualizado em abril de 2007, é de
aproximadamente R$ 409 milhões (cerca de US$ 205 milhões). Porém,
desse total apenas 7,8% foram executados e 46% estão reservados para
execução. Os 46,2% restantes estão em outras fases de tramitação que
antecedem a execução propriamente dita. Há ao todo 157 empreendimentos
no Brasil, que poderão beneficiar 241 unidades de conservação federais,
estaduais e municipais (MMA 2007).
O enfrentamento de gargalos que dificultam o incremento da utilização
desses recursos é um dos desafios dos órgãos de meio ambiente. Questões
como indisponibilidade financeira por parte do empreendedor e deficiências
relacionadas ao planejamento e à execução por parte dos órgãos gestores
são reconhecidas como entraves ao aumento da utilização dos fundos
vindos de compensação ambiental.
5.3.2 - Orçamento governamental para as terras indígenas
Segundo a Lei Orçamentária Anual de 2007 (LOA 2007), o órgão federal
responsável pela política para os índios (Funai) tem disponível R$ 273,7
milhões para cobrir todas suas despesas, valor superior em R$ 50 milhões
ao destinado pelo Orçamento da União ao órgão em 2006.
Dentro da LOA 2007, o programa “Proteção de Terras Indígenas, Gestão
Territorial e Etnodesenvolvimento” é o que tem impacto direto sobre a gestão
e a proteção das terras habitadas pelos povos indígenas no Brasil. O programa
destina R$ 55,6 milhões para ações de proteção, fiscalização, atividades
produtivas, bem como à conservação e recuperação da biodiversidade41.
Fazem parte, também, desse programa as ações relacionadas à demarcação
e regularização de terras indígenas, incluindo aquelas executadas no
âmbito do PPTAL, cujos recursos são majoritariamente oriundos de
doação internacional (ver item 5.5.2.3 - Projeto Integrado de Proteção às
Populações e Terras Indígenas da Amazônia Legal).
Esta ação, denominada Conservação e Recuperação da Biodiversidade em Terras Indígenas, é
realizada em parceria com o Ministério do Meio Ambiente.
41
110
Complementando os recursos vindos do Orçamento, há a Renda do Patrimônio
Indígena, fundo formado pela arrecadação de multas, compensação
ambiental e outras situações que afetam o patrimônio indígena. Gerido
pela Funai, a Renda do Patrimônio Indígena tem previsão de receita de R$
28,6 milhões para 2007. Segundo a legislação, os recursos provenientes
da renda indígena devem ser aplicados preferencialmente em benefício
da comunidade em cujas terras a arrecadação foi gerada. Somados os
recursos da LOA 2007 e da Renda do Patrimônio Indígena, a Funai tem à
sua disposição, no ano corrente, R$ 84,2 milhões (aproximadamente US$
42 milhões) para investimentos nas terras indígenas.
5.4 - Planos de sustentabilidade financeira
A constituição do Grupo Temático de Sustentabilidade Financeira do
SNUC, conforme descrito no item 5.3.1 - Orçamento governamental para
as unidades de conservação federais, representou o passo inicial para a
formulação de um plano de sustentabilidade financeira que atenda as
necessidades do SNUC. O GT concentrou seu trabalho nos seguintes
aspectos: a) fontes de recursos existentes, descrevendo as fontes atuais
e identificando as potenciais e o quão acessíveis e efetivas elas são; b) a
demanda financeira real necessária para manter o Sistema Nacional; c) os
mecanismos de gestão e monitoramento dos recursos existentes, a fim de
identificar o quão eficiente tem sido a gestão desses recursos.
Para fazer o cálculo do custo anual para a manutenção das unidades de
conservação federais e estaduais que integram o SNUC, o GT adotou
uma ferramenta chamada Micosys42. Projetando as necessidades de
quatro categorias de despesas - pessoal, administração, equipamentos e
programas de gestão -, o GT calculou que são necessários R$ 860 milhões
(aproximadamente US$ 430 milhões) anuais para que as unidades federais
e estaduais que compõem o SNUC funcionem adequadamente43.
Em seu documento, o GT identificou 14 fontes de financiamento para o
SNUC, que foram classificadas em três categorias: a) receitas efetivas, que
já financiam o Sistema; b) receitas potenciais, que poderão vir a financiar
diretamente o sistema, e c) mecanismos financeiros indiretos, que são fontes
possíveis de contribuírem para manter o Sistema futuramente. No âmbito
das receitas efetivas de origem federal, descritas no item mencionado no
parágrafo anterior, o GT concluiu que, em 2006, foram destinados R$
229,3 milhões ao Sistema.
O Micosys (Minimun Conservation System) é um conjunto de planilhas em Excel, calibráveis em
função da realidade local tratada, que projeta os custos individuais de cada item para o Sistema,
baseado nas entradas tanto das categorias de despesas quanto de seus valores unitários locais.
43
Para a obtenção de um valor aproximado em dólares americanos (US$) dos valores em reais
(R$) citados ao longo desse item, sugerimos a paridade US$ 1 igual a R$ 2, vigente em meados
de agosto de 2007.
42
111
No âmbito das receitas potenciais, o estudo aponta cinco fontes passíveis
de aportarem recursos adicionais para a gestão do SNUC (veja abaixo).
O Grupo identificou, ainda, três mecanismos financeiros que, embora
não destinem diretamente recursos para o SNUC, podem vir a adicionar
recursos ao financiamento do Sistema. São eles o ICMS Ecológico, o Fundo
de Direitos Difusos e o Fundo de Participação Estadual Verde.
Fontes potenciais de financiamento do SNUC
-Fundo de Áreas Protegidas (FAP): criado pelo Programa Arpa,
o FAP é um fundo de capitalização permanente que deverá ter
um capital principal suficiente para gerar rendimentos líquidos
capazes de cobrir parte das despesas correntes das unidades
de conservação que integram o Programa. A meta do FAP é ter
um capital de US$ 240 milhões até 2012.
-Concessões florestais: o governo federal planeja submeter 13
milhões de hectares de florestas na Amazônia à exploração
sustentável, o que deverá gerar, em dez anos, uma receita
de R$ 187 milhões em impostos decorrentes da concessão
de uso. Outros R$ 1,9 bilhão anuais deverão ser arrecadados
em impostos cobrados da cadeia produtiva. Um percentual do
Fundo Nacional de Desenvolvimento Florestal, formado com
recursos vindos das concessões, poderá render ao SNUC, no
prazo de 10 anos, R$ 31 milhões.
-Cobrança por serviços hídricos prestados pelas áreas protegidas:
o SNUC impõe aos órgãos ou empresas que façam uso dos
recursos hídricos protegidos por unidades de conservação
o pagamento de contribuição financeira “para a proteção e
implementação da unidade, de acordo com o disposto em
regulamentação específica” (artigos 47 e 28). Alguns estados
e bacias hidrográficas já implantaram a cobrança pela
utilização da água, cujos recursos devem ser repassados à
bacia de origem de acordo com um plano de recursos hídricos.
O GT sugere a regulamentação dos artigos 47 e 48 do SNUC
e que a elaboração de planos de recursos hídricos contemple
a destinação de um percentual dos recursos arrecadados para
investimentos em unidades de conservação localizadas na
bacia.
-Carbono: no âmbito das discussões globais sobre medidas
para remediar as mudanças climáticas, há forte pressão
de um grupo de países pela adoção de mecanismos que
incentivem a redução das emissões por desmatamento ou
por mudanças no uso do solo. A proposta está baseada em
projetos a serem formulados segundo regras definidas por
cada país, tomando como referência os registros históricos do
112
desmatamento, prevendo ainda meios de compensar os países
pelo desmatamento evitado. Se esse regime vier a ser adotado,
haverá benefícios para políticas de conservação de florestas.
-Bioprospecção: a exploração dos recursos genéticos in situ,
segundo regras de acesso adequadas e com justa repartição
de benefícios, é apontada pelo GT como uma alternativa para
gerar receitas para a manutenção de unidades de conservação.
Como um exemplo concreto, o Grupo aponta contratos de
bioprospecção celebrados na Costa Rica que, entre o início
da década de 199º e 2002, geraram cerca de US$ 2,5
milhões, dos quais US$ 710 foram destinados às unidades de
conservação.
-Extrativismo: o extrativismo em unidades de conservação
de uso sustentável é descrito pelo GT como “uma fonte de
recursos para a consolidação das áreas, dada que as atividades
econômicas ainda são restritas e seu retorno econômico, ainda
pequeno, tem sido revertido para a melhoria das condições de
vida das populações” extrativistas. O Grupo recomenda uma
investigação mais detalhada sobre a questão.
O GT conclui seu trabalho afirmando ser previsível uma “crise de
sustentabilidade econômica do SNUC”, face aos problemas atuais e à
expectativa de ampliação do Sistema com a planejada criação de novas
unidades federais e estaduais. Para evitar esse colapso, o GT faz as seguintes
recomendações: a) investir na consolidação da base de dados do SNUC,
especialmente os referentes às unidades estaduais e municipais, para
possibilitar um planejamento mais realista do Sistema; b) resolver o déficit
de funcionários do órgão gestor federal, adotando medidas para ampliar
especialmente o número de pessoal designado para as funções de campo,
como guarda-parques; c) consolidar os fundos ambientais existentes;
regularizar e aprimorar a gestão das fontes de receita já existentes, como
concessões e multas, e potenciais, tomando como referência o Fundo de
Áreas Protegidas do Programa Arpa; regulamentar fontes de receita que
demandam essa medida para adquirem efetividade; d) dar continuidade ao
esforço para estruturar o ecoturismo em parques nacionais, aprimorando
a gestão da arrecadação decorrente da visitação; e) revisar o modelo de
gestão administrativa e financeira da parte federal do Sistema, de forma a
aumentar a eficiência da gestão e reduzir custos.
113
5.5 - Cooperação financeira e assistência técnica internacional para as
áreas protegidas
5.5.1 – O Programa Áreas Protegidas da Amazônia (Arpa)
Originado do compromisso do Governo Federal de assegurar proteção a pelo
menos 10% dos ecossistemas amazônicos situados em território brasileiro,
o Programa Áreas Protegidas da Amazônia (Arpa) é uma parceria da qual
fazem parte o governo federal, o Fundo Global para o Meio Ambiente
(GEF), gerido pelo Banco Mundial; o Banco Alemão de Desenvolvimento
(KfW) e a Agência de Cooperação Técnica da Alemanha (GTZ); a rede
conservacionista WWF, o Fundo Brasileiro para a Biodiversidade (Funbio),
governos estaduais da Amazônia e, mais recentemente, duas instituições
privadas brasileiras – a Fundação O Boticário e a Natura.
Criado em agosto de 2002 e coordenado pelo Ministério do Meio Ambiente,
o Arpa tem como objetivo viabilizar a implantação de uma rede de 50
milhões de hectares de unidades de conservação de forma a proteger
amostras ecologicamente representativas da diversidade biológica do
bioma Amazônia. O Programa trabalha com cinco das 12 categorias do
SNUC: Parque, Reserva Biológica, Estação Ecológica, Reserva Extrativista
e Reserva de Desenvolvimento Sustentável.
Metas do Programa Arpa (2003-2012)
- Criação e implementação de 37,5 milhões de hectares de
unidades de conservação de uso sustentável e de proteção
integral;
- Consolidação de 12,5 milhões de hectares de unidades de
conservação federais de proteção integral existentes em março
de 2000 e das novas unidades de proteção integral criadas no
âmbito do Programa;
- Estabelecimento de um fundo fiduciário de capitalização
permanente destinado a financiar em perpetuidade custos
de manutenção e proteção das unidades de conservação
consolidadas pelo Programa ARPA e atividades de vigilância e
proteção nas unidades de uso sustentável;
- Implementação de um sistema de monitoramento da
biodiversidade nas unidades de conservação.
114
Os investimentos necessários para atingir as metas fixadas estão calculados
em US$ 395 milhões, provenientes de compromissos de doação feitos pelo
Banco Mundial, pelo KfW, de fundos captados dentro e fora do Brasil pelo
WWF-Brasil, da Fundação O Boticário e da Natura, aos quais se somam
contrapartidas do governo federal e dos estados que o integram.
Uma parte desses recursos é destinada diretamente ao custeio de atividades
vinculadas à criação de novas unidades de conservação e ao atendimento
das demandas necessárias para consolidar as unidades de conservação de
proteção integral beneficiadas. Após consolidadas, essas unidades passam
a ter acesso ao Fundo de Áreas Protegidas (FAP), fundo fiduciário de
capitalização permanente criado para cobrir parte das despesas recorrentes
das unidades de conservação atendidas pelo Programa. A execução das
atividades cabe aos órgãos gestores das unidades de conservação e ao
Funbio - uma associação civil sem fins lucrativos criada em 1995 para
apoiar projetos de conservação e uso sustentável da biodiversidade no
Brasil -, responsável pela gerência financeira do Programa.
O Arpa está estruturado em três fases a serem executadas ao longo de
10 anos. Os resultados referentes à primeira fase (2003-2008), que
demandaram gastos de R$ 81,5 milhões44, são:
- Criação e implementação de unidades de conservação: Os participantes do
Arpa haviam planejado a criação de 18 milhões de hectares de novas áreas
protegidas, sendo nove milhões de hectares de unidades de conservação
de proteção integral e nove milhões de hectares de uso sustentável. Em
2006, as metas desse componente haviam sido superadas: foram criados
22,87 milhões de hectares de unidades de conservação com o apoio do
Programa (veja Quadro 17 - Unidades de conservação criadas pelo Arpa).
Quadro 17 - Unidades de conservação criadas pelo Arpa
Fonte: Unidade de Coordenação do Programa Arpa
- Consolidação de Unidades de Conservação de Proteção Integral
Existentes: O Programa estabeleceu como meta, para a primeira fase,
investir na consolidação de sete milhões de hectares de unidades de
proteção integral já existentes. Para isso, um grupo de 20 unidades de
conservação foi selecionado segundo critérios técnicos, 12 das quais são
áreas federais indicadas pelo órgão gestor e oito são estaduais, escolhidas
pelo Comitê do Programa em 2004. Além desses sete milhões de hectares,
o componente investe na consolidação das unidades de proteção integral
criadas pelo Programa em sua primeira fase. Os investimentos são feitos
Sistema Arpa/ Funbio, 14/06/2007. Devido às intensas variações da taxa de câmbio no período,
não foi possível converter esse valor para dólar americano (US$).
44
115
em atividades como demarcação e sinalização das unidades, fiscalização,
elaboração de plano de manejo, instalação de conselhos consultivos ou
deliberativos. Adicionalmente, estão sendo apoiados “subprojetos de
participação social”, destinados a incentivar as populações residentes no
entorno das unidades de proteção integral a integrarem seus conselhos
consultivos, participarem da formulação dos planos de manejo e como
desenvolver atividades econômicas compatíveis com a existência da unidade
de conservação. O componente apóia também atividades de capacitação
para aprimorar a gestão dessas mesmas unidades.
- Mecanismos de financiamento do Arpa: Uma das inovações trazidas
pelo Programa no âmbito do financiamento da conservação no Brasil foi
a criação de um fundo de capitalização permanente (endowment fund), o
FAP. A estratégia desse fundo prevê a manutenção de um capital principal
suficiente para gerar rendimentos líquidos destinados a cobrir parte das
despesas de manutenção de unidades de proteção integral e atividades de
vigilância e proteção das unidades de uso sustentável beneficiadas. São
elegíveis para receber recursos do FAP apenas as unidades de conservação
consideradas consolidadas45. Esse mecanismo deverá ser complementado
por outras iniciativas de financiamento baseadas em uma visão de mercado
para as unidades de proteção integral.
- Monitoramento da biodiversidade: O Programa iniciou a estruturação
de um sistema de monitoramento e avaliação ambiental georreferenciado
para as unidades de conservação apoiadas e seus respectivos entornos
denominado Sistema de Monitoramento da Biodiversidade (Simbio), que
está em fase de testes e aprimoramento. O Simbio será abastecido com
dados sobre clima, indicadores biológicos, solos, situação dos recursos
hídricos, pressões antrópicas, entre outros, referentes a 56 unidades de
conservação que compõem o escopo do Arpa. Quando estiver em operação,
propiciará avaliar os efeitos das ações implantadas pelo Programa e auxiliará
a tomada de decisões visando assegurar a efetiva proteção das unidades de
conservação na região. A implantação e funcionamento do Simbio contam
com a assessoria de um grupo de especialistas em conservação da natureza
e em desenvolvimento sustentável que integram o Painel Científico de
Aconselhamento.
No âmbito da capacitação, o Arpa realizou, no último ano, seis cursos
como parte de seu Programa de Capacitação de Gestores de Unidades de
Conservação, um dos quais em parceria com duas ONGs conservacionistas
e cinco com a GTZ. Foram capacitadas nesse período 131 pessoas entre
Segundo as diretrizes do Arpa, uma unidade de proteção integral será considerada consolidada
quanto tiver limites definidos; análise fundiária realizada; plano básico de proteção em
funcionamento; estrutura física e equipamentos mínimos; existência de cinco funcionários alocados
pelo governo; plano operativo sintonizado com o plano de manejo, definido em conjunto com o
conselho consultivo; plano de manejo sendo implantado, inclusive no entorno; conselho consultivo
operante; constar no Cadastro Nacional de Unidades de Conservação; proposta de sustentabilidade
financeira; conservação de pelo menos 90% da área; alocação orçamentária governamental anual.
45
116
2006 e 2007 nos temas plano de manejo, formação de conselhos gestores
e gestão para resultados. Em sua missão de meio termo, ocorrida em
2006, as instituições que integram o Programa recomendaram o apoio a
programas de capacitação dirigidos às comunidades e ONGs locais como
meio de fomentar uma participação mais efetiva na gestão das unidades.
De acordo com a Estratégia de Conservação e Investimento do Arpa,
documento que orienta as ações do Programa, entre 2007 e 2008 será
apoiado um total de 57 unidades de conservação e elaborados sete
estudos para a criação de novas áreas, abrangendo uma área estimada em
13 milhões de hectares de unidades de proteção integral e 11,7 milhões
de hectares de uso sustentável. Para isso está previsto, em 2007, um
desembolso de R$ 61.620.780,00 (aproximadamente US$ 31 milhões),
a serem aplicados tanto na implementação das novas unidades como na
consolidação das unidades existentes.
5.5.2 - Programa Piloto para a Proteção das Florestas Tropicais do
Brasil
Lançado oficialmente em 1992, durante a Conferência das Nações Unidas
para o Meio Ambiente e o Desenvolvimento, realizada no Rio de Janeiro,
Brasil, o Programa Piloto é financiado por doações dos países integrantes
do então Grupo dos Sete (G-7), da União Européia e dos Países Baixos,
complementadas por contrapartidas do governo brasileiro, dos governos
estaduais e de organizações da sociedade civil. Os recursos são oriundos
do Fundo Fiduciário de Florestas Tropicais (RFT), mecanismo criado para
canalizar as contribuições dos doadores e que é administrado pelo Banco
Mundial. Os primeiros projetos foram aprovados em 1994 e tiveram sua
execução iniciada em 1995.
O objetivo do Programa é contribuir para a formulação e a implantação
de políticas que resultem na conservação dos recursos naturais e na
promoção do desenvolvimento sustentável na Amazônia brasileira e no
domínio do bioma Mata Atlântica. O Programa está estruturado em torno
de subprogramas e projetos com focos que vão do fomento a iniciativas
voltadas para o manejo sustentável dos recursos naturais ao aprimoramento
da capacidade institucional dos órgãos estaduais de meio ambiente para
executarem satisfatoriamente a gestão ambiental.
Alguns dos projetos executados tiveram impactos diretos sobre as
áreas protegidas - terras indígenas e SNUC -, como o Projeto Reservas
Extrativistas, que investiu em ações necessárias para a implementação
de 2,1 milhões de hectares de unidades dessa categoria na Amazônia, e
o Projeto Corredores Ecológicos, cujos resultados estão relatados no item
3.9.2 - Projeto Corredores Ecológicos. Outros resultados relevantes para as
áreas protegidas estão a seguir.
117
5.5.2.1 – Subprograma Mata Atlântica46
As ações para a Mata Atlântica estão concentradas num Subprograma
específico que traz, entre seus objetivos, aumentar a quantidade de
hectares de áreas protegida no bioma; realizar ações de capacitação,
proteção e regularização fundiária das terras das populações tradicionais
e indígenas da região; integrar o manejo à ocupação urbana nas áreas de
influência ou de amortecimento de unidades de conservação. Os recursos
do Subprograma, fixados em US$ 1,1 milhão para o período 2004-2008,
são provenientes do RFT, administrado pelo Banco Mundial.
No âmbito do componente “Unidades de Conservação”, o Subprograma
financiou as etapas necessárias para a criação de oito unidades de
conservação na Região Sul do país, com destaque para as sete unidades
que protegem remanescentes da Floresta Ombrófila Mista e campos
associados, seis delas criadas entre 2005 e 2006 (mais detalhes no item
3.2.2 - Incremento das unidades de conservação entre 1997 e 2007). No
total, as sete áreas criadas correspondem a 138.810 hectares de unidades
de proteção integral.
Ainda no âmbito do Subprograma, em julho de 2007 havia mais 10
unidades de conservação prontas para serem criadas em várias regiões
cobertas pelo bioma Mata Atlântica e outras 12 áreas com estudos e outras
exigências sendo cumpridas.
5.5.2.2 - Subprograma Projetos Demonstrativos (PDA)
Criado em 1995 e iniciado no ano seguinte, o PDA tem como objetivo
testar experiências sobre a viabilidade de novos modelos de preservação,
conservação e utilização dos recursos naturais, visando a melhoria da
qualidade de vida das populações locais. Em sua primeira fase (1995-2003)
o subprograma investiu em 194 projetos – 147 na Amazônia e 47 na Mata
Atlântica – executados por organizações da sociedade civil e associações
de trabalhadores ou de populações locais nas áreas de recuperação de
áreas degradadas, manejo de recursos florestais e aquáticos e fomento à
conservação da diversidade biológica.
A fase atualmente em curso tem como finalidade a implantação de
projetos que possibilitem a redução do uso do fogo no manejo agrícola
na Amazônia, com 49 projetos em execução; a consolidação de grandes
projetos apoiados na fase anterior, 12 dos quais na Mata Atlântica e 19
na Amazônia; e ações direcionadas para a conservação da Mata Atlântica.
Este último componente tem projetos destinados a financiar estudos para
a criação ou ampliação de 53 unidades de conservação, das quais 15
são RPPN, 26 são unidades municipais e 12 federais e estaduais. Foram
também destinados recursos para 11 planos de manejo e para projetos
Os dados desse item foram repassados pelo Núcleo Assessor de Planejamento da Mata Atlântica,
do Ministério do Meio Ambiente.
46
118
destinados a incrementar oito corredores ecológicos nesse bioma (MMA
2007). O PDA é executado com apoio técnico e financeiro da cooperação
alemã.
5.5.2.3 - Projeto Integrado de Proteção às Populações e Terras Indígenas
da Amazônia Legal (PPTAL)47
Componente do Programa Piloto destinado a executar ações de proteção
às terras indígenas, o PPTAL propiciou à Funai - o órgão indigenista federal
- os recursos técnicos e financeiros para que cumprisse o dispositivo
constitucional que determina à União demarcar as terras tradicionalmente
ocupadas pelos índios e proteger todos os seus bens. O Projeto tem um
orçamento de US$ 21 milhões, sendo que desse total já foram executados
US$ 14,5 milhões – US$ 10,4 milhões do governo da Alemanha e US$
1,89 milhão do RFT, complementados por US$ 2,2 milhões do governo
brasileiro.
Iniciado em 1996, o Projeto inovou o processo de reconhecimento oficial
das terras indígenas ao integrar à demarcação medidas destinadas a
fomentar o controle e fiscalização dos limites das terras beneficiadas. Uma
das medidas adotadas foi adequar o calendário da demarcação ao modo de
vida dos povos indígenas, de forma que, sempre que possível, pudessem
participar de todas as etapas do processo.
Como parte do processo de fortalecimento das atividades de demarcação
e proteção das terras indígenas, o Projeto produziu estudos e manuais
técnicos, elaborados paralelamente a um esforço de capacitação e de
melhoria técnica e operacional do órgão indigenista. Inicialmente aplicados
como experiência-piloto somente para as terras indígenas listada pelo
Projeto, os resultados positivos dessas ações estão sendo aplicados na
demarcação das demais terras indígenas. Ao final de 2006, o PPTAL
contabilizava 97 terras indígenas demarcadas, com cerca de 38 milhões
de hectares protegidos na Amazônia Legal.
5.5.2.4 – Projetos Demonstrativos dos Povos Indígenas (PDPI)
Inspirado na experiência do PDA, o PDPI foi formulado para atender
projetos apresentados por organizações de povos indígenas da Amazônia
Legal cujas terras estejam demarcadas ou que tenham sido declaradas
como indígenas por ato do Ministério da Justiça. Iniciado em 2002, esse
componente do Programa Piloto apóia projetos com foco no monitoramento
de terras indígenas, visando assegurar a proteção das fronteiras de terras já
demarcadas; em atividades econômicas sustentáveis, que visem a produção
voltada para o mercado e iniciativas que disseminem conhecimentos
tradicionais sobre o manejo dos recursos indígenas; no resgate e na
Os dados desse item foram extraídos do documento “Texto Informativo sobre o Projeto Integrado
de Proteção às Populações e Terras Indígenas da Amazônia Legal – PPTAL, fornecido ao consultor,
pela coordenação do Projeto no âmbito da Funai, em julho de 2007.
47
119
valorização cultural, visando estimular a manutenção e a reprodução de
práticas e conhecimentos indígenas (GTZ s/d).
O PDPI conta com um montante de US$ 11 milhões para a implantação
dos projetos aprovados, oriundos de doação da cooperação alemã e
complementados por uma contrapartida de US$ 2 milhões do Ministério
do Meio Ambiente. A etapa de elaboração do componente foi custeada
pela cooperação japonesa, que investiu US$ 500 mil. O PDPI tem, ainda,
um componente destinado ao fortalecimento das organizações indígenas,
apoiado pelo Departamento para o Desenvolvimento Internacional do Reino
Unido (DFID) no valor de dois milhões de libras48.
5.5.3 – Outros projetos apoiados pela cooperação internacional
- Programa para o Desenvolvimento do Ecoturismo na Amazônia Legal
(Proecotur): resultado de um acordo firmado entre o governo brasileiro
e o BID, o Proecotur tem o intuito de estabelecer condições para que os
nove estados da Amazônia Legal possam administrar o ecoturismo de
forma responsável e eficiente. A fase 1 do Programa, que está perto de
ser concluída, prevê investimentos de US$ 13,8 - US$ 11 milhões em
empréstimos do Banco e US$ 2,8 milhões de desembolsos do Brasil no planejamento estratégico dos investimentos a serem feitos na fase 2,
calculados em US$ 200 milhões.
- Projeto de Conservação Efetiva e Uso Sustentável dos Manguezais no
Brasil em Áreas Protegidas: o chamado “GEF Mangue” objetiva desenvolver
uma rede de áreas protegidas para o ecossistema de mangues, por meio de
mecanismos políticos, financeiros e regulatórios; do manejo ecossistêmico
da pesca; da coordenação dos instrumentos de planejamento territorial com
a gestão das unidades de conservação e da disseminação de informações
sobre os manguezais. Pretende-se aprimorar, no longo prazo, a conservação
e uso sustentável dos 13.400 km2 de manguezais do país. O projeto
ainda prevê a criação de áreas de exclusão de pesca como instrumento da
gestão pesqueira. O Projeto está orçado em US$ 20 milhões, sendo US$
5 milhões provenientes do GEF e os demais US$ 15 milhões de fontes
governamentais brasileiras, federais e estaduais, e de ONGs.
- Projeto Recifes Costeiros: o projeto tem como um de seus objetivos
fornecer a base científica e assistência técnica para a elaboração do plano
de manejo da Área de Proteção Ambiental Costa dos Corais, a primeira
unidade de conservação federal a incluir recifes costeiros e a maior unidade
marinha do país, com 423.563 hectares situados no litoral nordeste
do Brasil. Executado com recursos de doação do BID, no valor de US$
1,750 milhão para oito anos, o projeto resulta de um esforço conjunto de
instituições governamentais federais, estaduais e municipais, incluindo a
48
120
Informações extraídas de http://www.socioambiental.org/pib/portugues/org/pdpi.shtm
Universidade Federal de Pernambuco, que está provendo US$ 350 mil a
título de contrapartida.
- Programa de Desenvolvimento do Turismo no Nordeste (Prodetur):
resultado de parceria entre o Banco do Nordeste do Brasil – banco de
desenvolvimento regional da Região Nordeste - e o BID, o Programa
objetiva a melhoria da qualidade de vida da população residente nas áreas
priorizadas por meio do estímulo à cadeia produtiva do turismo, do aumento
das receitas provenientes das atividades turísticas e da capacitação gerencial
para estados e municípios. Sua primeira etapa contou com investimentos
de US$ 670 milhões.
- Projeto Campanha de Conduta Consciente em Ambientes Recifais: seu
objetivo é esclarecer como os turistas podem contribuir para a conservação
dos recifes ao realizar atividades nessas áreas. O material de divulgação é
composto por impressos e um vídeo de oito minutos sobre a importância
dos corais e quais os princípios de conduta que devem ser seguidos ao
visitar esses ambientes. Financiado majoritariamente pelo Ministério do
Meio Ambiente, o projeto conta com recursos doados pela National Fish and
Wild Foundation. A fase I, já concluída, investiu US$ 58 mil, enquanto a
fase II, em andamento, tem US$ 126 mil reservados para investimentos.
- Projeto Fortalecimento de capacidade institucional para a consolidação
dos Sítios Ramsar brasileiros: tem como objetivo construir um plano de
ação a partir da visão de gestores governamentais e não-governamentais,
representantes de movimentos sociais e da academia. Estão sendo definidos
alvos de conservação para cada área, identificadas suas fontes de impacto e
estabelecidas as estratégias e ações prioritárias. O projeto, em andamento,
é financiado pelo Small Grants Fund da Convenção de Ramsar, no valor de
40 mil francos suíços, com aportes complementares do governo brasileiro
e da TNC.
- Projeto Ecoturismo na Mata Atlântica: Em 2005 o governo do estado de
São Paulo obteve financiamento junto ao BID para viabilizar o “Projeto de
Desenvolvimento do Ecoturismo na Região da Mata Atlântica”, orçado em
US$ 15 milhões – US$ 9 milhões do acordo de empréstimo e US$ 6 milhões
de contrapartidas do governo estadual. O Projeto contempla investimentos
em seis Parques Estaduais – Carlos Botelho, Turístico do Alto Ribeira,
Intervales, Ilha do Cardoso, Jacupiranga e de Ilhabela – para “consolidar
o turismo sustentável como forma de desenvolvimento socioeconômico
regional, aliado à estratégia de conservação da natureza”.
121
Fontes cartográficas e bibliográficas
As fontes bibliográficas abaixo descritas estão referenciadas entre parênteses
ao longo do documento; outras fontes utilizadas, descritas nas notas de
rodapé, não constam da lista publicada a seguir.
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Siglas utilizadas neste documento
Arpa - Programa Áreas Protegidas da Amazônia
BID - Banco Interamericano de Desenvolvimento
CDB - Convenção sobre Diversidade Biológica
CI - Conservação Internacional - Brasil
CNRPPN - Confederação Nacional de Reservas Particulares do Patrimônio
Natural
Coiab - Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira
Conabio - Conselho Nacional de Biodiversidade
Conama - Conselho Nacional do Meio Ambiente
DAP/MMA - Departamento de Áreas Protegidas do Ministério do Meio
Ambiente
FAO - Organização das Nações Unidas para a Agricultura e Alimentação
FNMA - Fundo Nacional do Meio Ambiente
Funbio - Fundo Brasileiro para a Biodiversidade
Funai - Fundação Nacional do Índio
GEF - Fundo Global para o Meio Ambiente
GTI - Grupo de trabalho interministerial
Ibama - Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais
Renováveis
IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
IEB - Instituto Internacional de Educação do Brasil
IIRSA - Iniciativa de Integração da Infra-Estrutura Regional Sul-Americana
INCAPER - Instituto de Pesquisa, Assistência Técnica e Extensão Rural
Incra - Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária
Inesc - Instituto de Estudos Socioeconômicos
Ipam - Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia
ISA - Instituto Socioambiental
IUCN - União Mundial para a Natureza
MMA - Ministério do Meio Ambiente
OTCA - Organização do Tratado de Cooperação Amazônica
PNAP - Plano Estratégico Nacional de Áreas Protegidas
PCTUC - Programa de Consolidação Territorial de Unidades de
Conservação
Rappam - Avaliação Rápida e Priorização da Gestão de Unidades de
Conservação
RFT - Fundo Fiduciário de Florestas Tropicais
RPPN - Reserva Particular do Patrimônio Natural
SBF/MMA - Secretaria de Biodiversidade e Florestas
Sesc - Serviço Social do Comércio
Sisnama - Sistema Nacional do Meio Ambiente
SNUC - Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza
TNC - The Nature Conservancy
Unesco - Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e
Cultura
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ÁREAS PROTEGIDAS DO BRASIL
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129
Apoio :
ABEMA - Associação Brasileira de Entidades Estaduais de Meio Ambiente
CNRPPN - Confederação Nacional de Reservas Particulares do
Patrimônio Natural
FUNAI - Fundação Nacional do Índio
IBAMA - Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais
Renováveis
ISA - Instituto Socioambiental
IUCN - União Mundial para a Natureza
Esta publicação foi realizada com o apoio do Escritório de Desenvolvimento
Sustentável Regional, Divisão da América Latina e Caribe, Agencia NorteAmericana para o Desenvolvimento Internacional e The Nature Conservancy,
conforme as condições do Acordo de Doação Nº. EDG-A-00-01-00023 do
Programa Parques em Perigo. As opiniões aqui expressas não refletem,
necessariamente, as da Agência Norte-Americana para o Desenvolvimento
Internacional e da The Nature Conservancy.
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