slowfood
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junho/julho edição 29 2010 R$ 10 BRASIL SUS T E N TÁV E L Impresso Especial 9912224192 3/8 - DR/RJ CEBDS CORREIOS u m a p u b l i c a ç ã o d o c o n s e l h o e m p R e s a R i a l b R a s i l e i R o pa R a o d e s e n v o lv i m e n t o s u s t e n t á v e l slow food o movimento pela alimentação sustentável queR ReduziR a velocidade do mundo Pequenas hidrelétricas: sustentáveis, mas nem tanto + euRopa queR impoRtaR energia solar do saaRa + ignacy sachs: é complicado distRibuiR Renda sem cResceR Av. das Américas, 1.155 - grupo 208, 22631-000, Rio de Janeiro, RJ, Brasil Tel.: 55 21 2483.2250, e-mail: [email protected], site: www.cebds.org v inc u l a d o a o WOR LD BUSINESS COUNCIL FOR SUSTA INA BLE DE V ELOPMEN T (W BC SD) PRESIDENTE EXECUTIVA CHAIR MAN PRESIDENTE DE HONR A Marina Grossi Marcos Bicudo Erling Sven Lorentzen C ONse L HO De a Dm i N ist r aç ãO Carlos eduardo Garrocho de almeida Holcim Franklin Feder Alcoa Gilbert Landsberg Shell Brasil sidnei Basile Abril João Batista Ferreira Dornellas Nestlé marco simões Coca-Cola antonio Carlos manssour Lacerda Basf Hélio ribeiro Duarte HSBC Di r e t Or i a Vânia somavilla Vale altair assumpção Grupo Santander Brasil Jorge soto Braskem Wilson santarosa Petrobras C â m a r a s t e m át iC a s ÁGUA P RESIDENTE: Yazmin trejos Amanco VICE-PRESIDENTE: maria Cláudia Grillo Petrobras VICE- PRESIDENTE: Josemar Picanço Coca-Cola B IODIVERSIDADE E B IOTECNOLOGIA P RESIDENTE: Gloverson moro Syngenta Seeds E NERGIA E M UDANÇA DO C LIMA P RESIDENTE: Luís César stano Petrobras L EGISLAÇÃO A MBIENTAL P RESIDENTE: enio Viterbo Junior Gerdau C OMUNICAÇÃO E E DUCAÇÃO PAR A A S USTENTABILIDADE P RESIDENTE: eraldo Carneiro Petrobras VICE-PRESIDENTE: David Canassa Votorantim Participações G ESTÃO S USTENTÁVEL P RESIDENTE: ana Lúcia suzuki Basf C ONSTRUÇÕES S USTENTÁVEIS P RESIDENTE: Carlos eduardo Garrocho de almeida Holcim FINANÇAS S USTENTÁVEIS P RESIDENTE: Wagner siqueira Banco do Brasil VICE-PRESIDENTE: Luiz Fernando Nery Petrobras eQU i Pe Ce BD s erica Fernandes Fernanda Gimenes Fernanda resende Juliana Queiroz Leandro Batista Lia Lombardi mara Braile Pablo Vázquez Phelipe Coutinho silvana Nocito soia shellard sueli mendes Verônica Oliveira a s sO Ci a D O s Ce BD s • 3m do Brasil Ltda. • abralatas • alcoa alumínio s.a. • amanco Brasil s.a. • amBev – Companhia de Bebidas das américas • arcelormittal Brasil • Bahia mineração • Banco do Brasil • Basf s.a. • Bayer s.a. • Bradesco s.a. • BP Brasil Ltda. • Braskem s.a. • Caixa econômica Federal • Chemtech • Cia. Brasileira de Petróleo ipiranga • Cia. energética de minas Gerais – Cemig • Coca-Cola • Copel • DNV • eBX • ecopart • eletronuclear – eletrobras termonuclear s.a. • energias do Brasil • Furnas – Centrais elétricas s.a. • Goodyear do Brasil • Gerdau açominas s.a. • Grupo abril • Grupo santander • HsBC • Holcim Brasil s.a. • itaú Unibanco • Lorentzen empreendimentos s.a. • michelin • monsanto do Brasil Ltda. • Natura Cosméticos • Nestlé Brasil Ltda. • Organização Odebrecht • Organizações Globo • Petrobras – Petróleo Brasileiro s.a. • Philips • shell Brasil Ltda. • souza Cruz s. a. • solvay do Brasil Ltda. • suzano Papel e Celulose • syngenta seeds Ltda. • tim • Usiminas – Usinas siderúrgicas de mG s.a. • Vale • Votorantim Participações s.a. • Walmart Brasil nesta edição bRasil sustentável 29 Jun/Jul 2010 foto de caPa: lysanne ooteman/sxc iMageM Vazamento de petróleo ameaça praias do alabama notas cidade ecológica, Índice de estados Falidos, negócios da china Vida noVa designer transForma objetos rejeitados em objetos desejados ferraMenta certiFicação liFe promoVe a gestão da biodiVersidade PanoraMa al gore, o barômetro da biodiVersidade e a direção econômica sustentáVel 2010 primeiro eVento da série discute o Futuro das cidades, no rio agenda prepare-se para os eVentos de agosto a setembro Pequenas hidrelétricas Várias usinas em peQuenos rios causam grandes problemas 6 8 12 14 16 18 22 24 32 36 38 40 42 46 48 50 boa alimentação para mudar o mundo congresso gife empresas aumentam inVestimentos sociais lideranÇa ignacy sachs, um dos pais da ideia do desenVolVimento sustentáVel deserto solar energia solar do saara abastecerá europa ano da BiodiVersidade conserVar e proteger serViços ambientais também dá lucro Vision 2050 Wbcsd discute os cenários do Futuro com empresários gri: noVa geraÇão congresso de amsterdã discute a direção Álvaro Almeida (MTB: 45384) Estevam Pereira (MTB: 21302) conselho editorial Ana Lúcia Suzuki (Basf) Carlos Eduardo Garrocho de Almeida (Holcim) Enio Viterbo Junior (Gerdau) Eraldo Carneiro (Petrobras) Luís César Stano (Petrobras) Luiz Fernando Nery (Petrobras) Yazmin Trejos (Amanco) Wagner Siqueira (Banco do Brasil) CEBDS Marina Grossi Lia Lombardi Fernanda Resende e Sueli Mendes (Assessoria) edição Ricardo Arnt (redator-chefe) Alessandra Pereira, Álvaro Penachioni, Beto Gomes, Daniela Vianna, Fernando Badô, Raquel Sabrina e Rita Nardy (editores) Conrado Loiola, Michele Silva, Paula Andregheto, Paulo César Pereira, Pedro Michepud e Silvia Wargaftig (repórteres) fotografia Ricardo Corrêa direção de arte e m uma única edição, a BRASIL SUSTENTÁVEL aborda três temas de extrema relevância para o nosso futuro, colocando em xeque verdades com as quais a sociedade tem convivido e apontando novas saídas. Na reportagem de capa, a revista traz aos leitores uma nova visão sobre a cultura global de produzir e consumir alimentos. O Slow Food, movimento que defende a preservação da biodiversidade alimentar, pode contribuir em escala como instrumento de combate à fome e ao inaceitável desperdício. Nos Estados Unidos, por exemplo, jogam-se no lixo, todos os dias, 22 toneladas de alimentos. Considerado um dos principais pensadores do desenvolvimento sustentável, o economista Ignacy Sachs faz uma interessante análise das três mais recentes etapas da humanidade. E vaticina: os países das regiões tropicais e semitropicais ganham um papel fundamental por deterem as maiores concentrações de comunicação para a sustentabilidade biomassa, invertendo o equilíbrio de poder global em termos de energia, insumo crucial do futuro. Também está em destaque nesta edição uma ampla discussão sobre as chamadas pequenas centrais hidrelétricas, à primeira vista sempre bem-vindas. Produzem energia elétrica sem emitir gases de efeito estufa e atendem, com menor investimento, a demandas locais para gerar renda e emprego. Contudo, ouvindo os mais diferentes segmentos envolvidos no setor, a reportagem alerta que, sejam grandes ou pequenas, as hidrelétricas devem passar por um cuidadoso crivo socioambiental. São três polêmicas com forte indução para refletirmos sobre a melhor maneira de produzir energia, combater a pobreza, preservar nossos ativos ambientais e, em última instância, traçar um caminho mais seguro para a construção do desenvolvimento sustentável. Marina Grossi controVérsia o cheFe deVe ser temido ou estimado? diReto do conselho EXPEDIENTE coordenação polêmicas opoRtunas rePortageM de caPa carlo petrini, do sloW Food, prega a BRASIL S U S T E N T ÁV E L R EPORT COMUNICAÇÃO Av. Brigadeiro Luís Antônio, 3.530 – 5.o andar – Jd. Paulista – São Paulo – SP – CEP 01 402-001 telefone: 55 11 3051.8400 e-mail: report@reportcomunicacao. com.br c a R ta d a p R e s i d e n t e MENTES DESIGN Marcel Votre Marcio Penna revisão Assertiva Produções Editoriais administrativo Cristina Almeida (diretora) Cícero Gomes financeiro Carlos Nascimento Publicidade SÓLIDA CONCEITUAL Telefone: 55 21 3154.9450, e-mail: [email protected] Marcia Alvaredo (diretora) Melissa Canero e Michel Santos (executivos de atendimento) Jefferson Eduardo (marketing) inventário de gees fórum carioca empresas em Bonn a divulgação dos inventários de emissões de gases de efeito estufa (gees) de 35 empresas, no im de junho, marca o primeiro resultado do programa brasileiro ghg protocol, iniciativa lançada pelo cebds em parceria com a Fundação getulio Vargas. a metodologia e as metas de sustentabilidade foram adaptadas ao país. a partir do inventário, as empresas estarão mais capacitadas para adotar medidas de redução de emissões. desenvolvido pelo World business council for sustainable development (Wbcsd) e pelo World resources institute (Wri), o ghg protocol é considerado a mais soisticada e precisa ferramenta para medir emissões. o cebds representará o setor empresarial no Fórum carioca de mudanças climáticas e desenvolvimento sustentável, criado recentemente pela prefeitura do rio de janeiro. o objetivo do fórum é conscientizar e mobilizar a sociedade para trabalhar junto com a administração municipal, abrindo espaço para a discussão sobre problemas decorrentes das mudanças do clima e sobre desenvolvimento sustentável em geral. o convite foi feito pela prefeitura durante o 1º encontro do sustentável-2010, realizado em maio, no rio. a representação empresarial presente na reunião preparatória para a cop-16 apresentou os estudos preliminares de um amplo projeto, o setor privado e a unFccc. a apresentação do estudo foi feita em um evento paralelo realizado no dia 10 de junho durante o climate change talks, da convenção-Quadro das nações unidas sobre mudança do clima, em bonn, alemanha. parte do conteúdo foi extraído de cinco workshops internacionais promovidos pelo Wbcsd em cinco grandes cidades: pequim (26 de março), hong Kong (29 de março), são paulo (14 de abril), Washington dc (27 de abril) e bruxelas (6 de maio). Denise Barreto (gerente inanceira) impressão Ediouro tiragem 5 mil exemplares A revista BRASIL SUSTENTÁVEL é uma publicação do Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável (CEBDS). Os artigos não reletem necessariamente a opinião do CEBDS, sendo de responsabilidade dos articulistas e entrevistados. assinaturas e números avulsos • Telefone: 55 2 1 2483.2250 • e-mail: [email protected] • www.cebds.org imaGem talVeZ fique ruiM Para nadar banhistas de dauphin island, alabama, tomam sol protegidos por uma barreira de feno instalada pela Guarda civil. milhares de defesas foram implantadas por voluntários, trabalhadores e militares para impedir que o óleo vazado de uma plataforma da british petroleum, no Golfo do méxico, em 20 de abril, atinja portos, praias, pesqueiros e reservas ecológicas, no pior vazamento de petróleo da história dos eua. o senado norte-americano quer aumentar de us$ 75 milhões para us$ 10 bilhões a multa às três empresas envolvidas no acidente: a bp, a halliburton e a transocean. foto: Brian snyder/reuters notas Publicidade sem greenwashing « e d i ç ão b e t o G o m e s » u r b a n i s m o • m a r K e t i n g • c a m pa n h a s obras serão concluídas em 2015 O Conselho Nacional de Autorregulamentação Publicitária (Conar) criou um grupo para debater a abordagem de sustentabilidade em anúncios publicitários. O objetivo é desenvolver propostas capazes de aperfeiçoar as recomendações do Código Brasileiro de Autorregulamentação Publicitária e reduzir a prática do greenwashing. Para desenvolver normas, o grupo vai aproveitar o fato de o Conar ser membro correspondente da Ease, entidade que reúne os órgãos de regulamentação europeus, para reunir ideias e informações. “Hoje, há espaço para aprimorar e detalhar a regra ética”, diz o presidente do Conar, Gilberto Leifert. [Pedro Michepud] 23.200.000 é o número de famílias atendidas pelos programas federais de proteção social – bolsa Família, aposentadoria Rural, benefício de prestação continuada – bpc-loas. com cerca de R$ 55 bilhões liberados em 2009 para o pagamento dos benefícios, os três programas atenderam 22,5% da população do país no período. de acordo com o instituto de pesquisa econômica aplicada, os atuais 32% de pobres e 12,6% de indigentes seriam 33% e 13,9%, respectivamente, se não existissem os programas. [conrado loyola] telhado Branco new songdo à noite 8 [ bs ] jun/jul 2010 cidade ecológica Já imaginou morar num lugar totalmente sustentável? O empresário norte-americano Stan Gale e sua empresa, a Gale Internacional, estão trabalhando em uma das obras mais ambiciosas do mundo: a construção de New Songdo, na Coreia do Sul, uma cidade totalmente racional. Os investimentos giram em torno de US$ 35 bilhões, e a meta é concluir o empreendimento até 2015. Todos os processos urbanos do local, construído para 65 mil habitantes, serão racionalizados, desde a transmissão de energia e o uso racional de água até a baixa emissão de carbono. A cidade dos sonhos emitirá um terço dos gases de efeito estufa das metrópoles do mesmo tamanho. A água usada em lagos e parques virá do mar e do reaproveitamento da chuva. Consultas médicas e serviços municipais serão marcados em monitores de tela plana instalados nos apartamentos. A cidade terá 25 quilômetros de ciclovias e os espaços ao ar livre ocuparão 40% da área total. Mais de 75% do material utilizado na construção de New Songdo será reciclado. [Paula andregheto] pintar o telhado de branco de pelo menos 40% das casas no mundo pode ser uma alternativa para reduzir o uso de ar-condicionado e contribuir com a redução da temperatura média do planeta em 1°c. de acordo com a ong green building council (gbc), cada 100 m2 pintados de branco compensam 10 toneladas de emissão de co2 por ano, pois as cores claras não absorvem o calor e refletem até 90% dos raios solares. no interior da casa, a temperatura pode baixar até 6°c. a ideia faz parte da campanha de combate ao aquecimento global one degree less, trazida para o brasil pela gbc-brasil. a versão brasileira da campanha contou com a participação voluntária de famosos como cristiane torloni, raí, Fernanda paes leme e sergio marone. [cl] Raí: tinta branca no telhado notas Falsa g u er r a ciVi l • m er ca d o F i n a n cei r o • g lo ba liz ação stR new/Reuters retranca bandos armados vivem em guerra civil na somália desde 1991. não há governo central abr/mai 2010 10 [ bs ] A ONG Bank Track, rede internacional de monitoramento do setor bancário, lançou o relatório Close the Gap, que avalia a qualidade das políticas de crédito e investimentos desenvolvidas por 49 bancos, de 17 países. O levantamento indica que os bancos anunciam cada vez mais compromissos com a sustentabilidade, mas, muitas vezes, não os colocam em prática. De acordo com o estudo, existem lacunas que precisam ser preenchidas: a falta de políticas de crédito e de investimento adequadas; o fato de as questões socioambientais estarem resumidas aos direitos das comunidades locais e à necessidade de preservar o meio ambiente; e a falta de apoio de várias instituições aos Princípios do Equador. Banco do Brasil, Itaú e Bradesco aparecem mais bem colocados na comparação com os mercados emergentes (Índia, Rússia e China). Segundo o coordenador do programa de Ecofinanças da ONG Amigos da Terra, Roland Widmer, as empresas brasileiras carecem de políticas capazes de orientar a atuação na área de sustentabilidade. [Pa] o quintal do vizinho Índice de países falidos Tensões históricas e culturais, ingovernabilidade e corrupção generalizada são fatores que podem levar as nações a entrar em processo de falência, tornando-se incapazes de garantir os serviços básicos para o povo. Para mensurar tais condições, o Fundo da Paz e a revista norteamericana Foreign Policy publicam, anualmente, o Índice dos Estados Bancos: pouca ação Falidos, avaliando os países que mais sofrem com a debilidade de governo. Em 2010, cinco nações africanas ficaram entre os dez primeiros da lista: Somália, Chade, Sudão, Zimbábue e República Democrática do Congo. Na outra ponta da tabela, a dos governos eficientes, estão Noruega, Finlândia, Suécia, Suíça e Irlanda. O Brasil ocupa a 119ª posição. Para fazer a classificação, os organizadores utilizam 12 tipos de indicadores, atribuindo notas de 0 a 10 para cada um (sendo 10 o pior). Na primeira lista, publicada em 2004, apenas sete países superavam os 100 pontos. Hoje, a lista contém 15. O mundo piorou. Veja a tabela completa no link http://bit.ly/bm5pdr. [PM] países com poucas terras para a agricultura estão de olho no quintal do vizinho – que, em muitos casos, fica a milhares de quilômetros de distância. com pouco espaço para cultivar e abastecer o mercado interno, governos e corporações estrangeiras estão comprando terras em outras paragens. a arábia saudita e o catar fizeram acordos com países como camboja, sudão, Vietnã e indonésia. o grupo sul-coreano daewoo arrendou 1,3 milhão de hectares em madagáscar. no brasil, a estatal chinesa chongqing grain group anunciou investimentos de us$ 300 milhões na compra de 100 mil hectares de terra, para produzir soja na bahia e exportar para os dez piores em 2010 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 somália zimbábue sudão chade rep. democrática do congo iraque afganistão rep. centro-africana guiné paquistão 6 7 10 2 3 9 1 8 5 4 negócio da china: estatais chinesas compram terras na bahia para plantar soja e exportar para pequim sem intermediários pequim, sem intermediários. além dessa, as principais empreitadas no brasil, até o momento, são do grupo hyundai, da coreia do sul, que quer adquirir 10 mil hectares, e de um grupo japonês, que adquiriu 100 mil hectares de terras no maranhão, em minas gerais e na bahia. para limitar as aquisições, a comissão de constituição e justiça da câmara dos deputados aprovou um projeto que limita a 1.140 hectares o tamanho das propriedades rurais que podem ser compradas por estrangeiros na amazônia legal. o projeto ainda será votado no senado. em angola, além de adquirir terras, a china quer transferir 2 milhões de chineses para trabalhar nelas. [PM] vida nova capa RadaR eneRGia « e d i ç ão R i c a R d o a R n t» i n i c i at i Va s p e s s o a i s t r a n s F o r m a d o r a s BoM e Bonito por meio do design, nido campolongo propõe uma noVa Forma de Ver os resÍduos e de se relacionar com diFerentes públicos 12 [ bs ] jun/jul 2010 o que, paRa muitos, é liXo, para Nido Campolongo, pode ser o componente estrutural de uma mesa. O designer visita indústrias, favelas, lojas e cooperativas de reciclagem em busca de inspiração para novas peças, que podem ser funcionais ou meramente ornamentais. “O que me guia são as belezas dos materiais, a possibilidade de unir pequenas peças idênticas e transformá-las em outras coisas. São pedacinhos iguais e não são nada, como um cone, que é só um cone, mas pode compor uma mesa”, explica. A mesa em questão fica bem na entrada de seu escritório e é composta por 360 cones de linha. O componente, ele explica, é chamado de tubete e utilizado em bobinas de máquinas rotativas, para dar suporte a materiais como plástico, linha e papel em processos de produção. Os tubetes, de diferentes tamanhos, são encontrados em várias obras de Campolongo, como a cama acomodada em outra sala do escritório. Um grande lustre esférico, feito de módulos de garrafas pet desenvolvidos por uma cooperativa de reciclagem, compõe o ambiente. “Com meu trabalho, acho que consigo mostrar para as pessoas que aquele material que elas veem como resíduo pode ser visto de outra forma. Ele tem uma virtude estética, dependendo da forma como é organizado”. A trajetória recriadora do designer começou cedo. Quanto tinha 1 ano de idade, sua família montou uma tipografia ao lado de casa. “Cresci ajudando meu pai, e o barulho das máquinas era meu despertador”, lembra-se. O negócio era vol- marcelo min RepoRtaGem silvia WaRGaFtiG campolongo à vontade no seu quarto de dormir singular: a cama é feita de tubetes e a luminária de garrafas pet tado para abastecer o comércio local, com cartões de visita e panfletos. Aos 17 anos, ele decidiu pesquisar novos suportes para desenvolver produtos diferenciados e prospectar mais clientes. Assim começou o hábito de visitar fábricas, conhecer os processos e, principalmente, observar os resíduos. “Entrei na faculdade de engenharia civil no fim dos anos 1970 e, na época, já tinha uma preocupação ambiental. Fazia parte de um grupo que brigava pela não implantação das usinas atômicas Angra 1 e Angra 2. Ao mesmo tempo, eu vivia um conflito, porque trabalhava com papel e achava os panfletos comerciais uma bobagem. Então, pensei se poderia transformar as sobras de papel em algo interessante. Foi assim que minha veia artística me fez perceber que, por meio do belo, é possível conscientizar e transformar. Desde então, venho fazendo isso”, conta. Depois de três anos, Campolongo deixou a faculdade, mas nunca parou de estudar. Consolidou-se como designer gráfico até que, aos 35 anos, criou uma obra que marcou sua transição do mundo bidimensional para o tridimensional: um manto feito com as sobras de papelão da tipografia, que guardara durante anos. Os pedaços foram costurados um a um com fio parafinado. A partir dessa obra, passou a ousar mais, com novos materiais, como plástico, metal e vidro, concebendo objetos voltados para casa. Mas a preocupação ambiental se manteve. “Quando uso madeira, é de reflorestamento, que já tem uma característica sustentável”, destaca. E acrescenta: “A sustentabilidade não é só a questão do material. Abrange também o modelo de produção, os licenciamentos, a remuneração dos funcionários. Porém não se fala muito de estética, e eu entro com isso, porque acho que se trata de um instrumento transformador e, também, sedutor. Se você acha um objeto bonito, começa a refletir sobre ele”. Foi durante as visitas às fábricas que Campolongo aprendeu a observar todos esses aspectos. Certa vez, visitando uma indústria de papel, descobriu que a produção gera um resíduo semelhante a um lodo e decidiu procurar formas de aproveitá-lo também. Levou o material ao Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT), na Universidade de São Paulo, e descobriu uma maneira de produzir tijolos com 15% de lodo na composição, reduzindo o uso do barro, e impermeabilizados com pet reciclado. Além dos benefícios ambientais, o produto se encaixa em outro projeto, de moradia de baixo custo. Resta, agora, captar recursos que financiem os testes de qualidade do tijolo e a produção em larga escala. A pesquisa de novos materiais também levou Campolongo a cooperativas de reciclagem e organizações não governamentais, onde, atualmente, mantém projetos de inclusão social por meio do design. Na favela do Jaguaré, em São Paulo, trabalha com uma cooperativa que produz casas de cachorro a partir de caixas de madeira. “Mostrei a eles que podem fazer outros objetos, como móveis e até sua própria casa, e que esses produtos podem ser mais bem acabados. O objetivo é despertá-los para novas oportunidades de mercado, aumentando a geração de renda”. Isso, é claro, respeitando a cultura dos moradores. “É preciso trabalhar no contexto deles, preservando seus hábitos. Moradia é isso”, enfatiza. “A estética da favela é interessante, porque se baseia em colagem de diferentes materiais recolhidos nas ruas. Por sua condição social, essas pessoas são naturalmente recicladoras, e, se as construções fossem orga[bs] nizadas, a favela seria muito bonita”. nova madeira de uso milenar, o bambu nunca foi tão moderno. versátil, barato e mais resistente que o aço, conquista cada vez mais espaço na construção civil, como as casas resistentes a terremotos, construídas na colômbia e no equador. na informática, já foi transformado em revestimento de notebook pela asus, em 2007. no brasil, o material ainda é pouco explorado, mas entra no mercado por meio do design sustentável. marcas como etna e tok&stok apostam na matéria-prima para agregar valor aos produtos por meio dos benefícios em sustentabilidade. por crescer rapidamente, a planta sequestra muito gás carbônico da atmosfera e tem alta produtividade por hectare. sua leveza é outro importante atributo, que permite o transporte de grandes quantidades com redução do consumo de combustível. o bambu já está sendo considerado a “madeira do século 21”. licitações sustentáveis consumo consciente, agora, é assunto federal. o ministério do planejamento, orçamento e Gestão criou o programa contratações públicas sustentáveis, que leva em conta critérios sociais e ambientais nos processos de licitação. a iniciativa contempla, principalmente, computadores e equipamentos eletrônicos, materiais de escritório, alimentos orgânicos e energia gerada de fontes renováveis. ainda que os itens sejam mais caros, a iniciativa visa melhorar a qualidade dos gastos públicos e proporcionar compensação inanceira em longo prazo, redução de impactos no meio ambiente e desenvolvimento socioeconômico. o governo quer inluenciar o padrão de consumo do mercado, já que suas compras representam de 10 e 15% do pib nacional. FeRRamenta capa eneRGia « R e p o R taG e m c o n R a d o l oYo l a » indicadores, selos, normas, guias, certiFicados e m é t o d o s d e F o m e n t o à i n oVaç ão n a s c o r p o r aç õ e s ceRtiFicação liFe gestão da BiodiVersidade 14 [ bs ] quais as vantagens? A Convenção da ONU Sobre Diversidade Biológica realizada na Alemanha, em 2008, colocou o engajamento empresarial no centro da discussão sobre conservação da biodiversidade. Recentemente, o órgão internacional calculou que a perda anual de florestas custa entre US$ 2 trilhões e US$ 5 trilhões à economia mundial – ao passo que a última crise financeira global provocou prejuízos estimados entre US$ 1 trilhão e US$ 1,5 trilhão. Em resposta a essa abordagem, que classifica a proteção aos serviços ambientais como parte dos negócios, a Certificação Life (Lasting Initiative For Earth, Iniciativa Duradoura Pela Terra, em português), lançada em julho de 2009, visa medir, qualificar e reconhecer as empresas que desenvolvem ações voluntárias em prol da biodiversidade. A iniciativa foi elaborada por um grupo multidisciplinar de pesquisadores do Instituto Life, entidade criada a partir dos recursos e dos conhecimentos da Fundação Avina, da Fundação O Boticário de Proteção à Natureza, da Gráfica Posigraf e da Sociedade de Pesquisa em Vida Selvagem e Educação Ambiental (SPVS). O Instituto Tecnológico do Paraná (Tecpar) também apoia a elaboração da norma. Segundo Clovis Borges, presidente do Conselho Diretor do Instituto Life, uma das vantagens da certificação é sua flexibilidade, uma vez que o instituto parte da premissa de que a perda de biodiversidade afeta todos. Investindo na manutenção dos serviços ambientais, uma empresa de qualquer setor pode ser certificada, mesmo que não seja responsável direta por impactos à natureza. “A Certificação Life mede os impactos daquele negócio e gera índices. Então, ela possibilita a qualquer tipo de empresa, da padaria à montadora de veículos, realizar investimentos de acordo com seu porte e os impactos de sua operação”, afirma Borges. como funciona? Entre as ações que asseguram a obtenção do certificado estão investimentos em implantação de Reservas Particulares do Patrimônio Natural (RPPN) e de Unidades de Conservação públicas, apoio a políticas públicas relacionadas ao tema e ações de combate a espécies invasoras ou de proteção de espécies ameaçadas. O processo de obtenção é semelhante ao de outras certificações: a empresa interessada é avaliada por uma auditoria independente credenciada pelo Instituto Life. De acordo com Borges, a análise da auditoria leva em conta o atendimento à legislação, mas verifica também a gestão ambiental da companhia, o que resulta em “soluções” individuais, respeitando as especificidades de cada empresa. “Se duas empresas do mesmo setor e do mesmo porte possuírem processos de gestão ambiental diferentes, a que possui o melhor processo não precisa necessariamente investir em biodiversidade o mesmo que a outra, já que os impactos são menores”, exemplifica Borges. Em seguida, a auditoria avalia se há algum portfólio de ações de conservação da biodiversidade e, finalmente, define que medidas a empresa deve adotar para ser certificada. Atualmente, O Boticário, MPX Mineração e Energia, Posigraf e a hidrelétrica de Itaipu estão em processo de obtenção do selo. Segundo Borges, o objetivo do Instituto Life é ampliar o selo de mesmo nome com uma referência internacional. “Estamos prospectando outras empresas, e nossa intenção a curto prazo é levar a Certificação Life a elas, já na condição de protagonistas, apresentado-as em Nagoya, no Japão, onde ocorrerá, em outubro, a próxima Convenção da ONU Sobre Biodiversidade. As organizações que assumirem esse compromisso estarão na vanguarda.” Segundo Borges, já existem sondagens para levar a certificação a empresas do Paraguai, considerando a legislação e os biomas locais. Borges acredita que a popularização da ferramenta contribuirá para dar mais foco aos investimentos das empresas. “Grande parte dos esforços de conservação da biodiversidade ainda é feita de forma aleatória. Embora o certificado tenha tido boa aceitação – respaldado pela ONU e pelo Ministério do Meio Ambiente –, convencer o setor empresarial de que a queda de qualidade dos serviços ambientais acarreta impactos sobre os negócios ainda é um desafio. “A reação inicial, normalmente, é o famoso ‘o que eu tenho a ver com isso?’”, afirma o presidente do Instituto Life. A gestão ambiental tem avançado, mas a conservação da biodiversidade ainda está em estágio inicial. É necessário que as empresas percebam que os serviços ambientais têm custo e que não podem ser tra[bs] tados como uma coisa descartável. [ bs ] 15 o que é? jun/jul 2010 jun/jul 2010 c e r t i F i c aç ão l i F e r eco n h ec e e r eco m p e n sa açõ e s Vo lu n tá r i a s d e co n s e rVaç ão d e s e rV i ço s a m b i e n ta i s a perda da biodiversidade afeta a sociedade toda panoRama retranca Falsa «edição daniela vianna» quanto custa a degradação? clima • biodiVersidade • mobilidade • comunicação determinação coletiva “se quiser ir rápido, vá sozinho; se quiser ir longe, vá em grupo.” com esse provérbio africano, o ex-vicepresidente dos estados unidos e prêmio nobel da paz, al gore, introduz seu novo livro, cuja versão em português já está disponível no brasil. nossa escolha – um plano para solucionar a crise climática estabelece uma discussão sobre temas essenciais, como energia solar, biocombustíveis, crescimento populacional, poluição e, como não poderia deixar de ser, aquecimento global. “já está mais do que claro que temos ao nosso alcance todas as ferramentas necessárias para solucionar a crise climática. o único ingrediente que ainda falta é a determinação coletiva”, sentencia o autor. 16 [ bs ] sustentabilidade em tempo real nossa escolha – um Plano para solucionar a crise climática [ r e l at o e m p r e s a r i a l ] autor: al gore editora: amarilys páginas: 416 preço: r$ 79,00 [ pesQuisa ] brasileiros estão mais antenados sobre as questões ligadas à biodiversidade na comparação com consumidores de outros países, como a França, onde a biodiversidade é confundida com produtos orgânicos; e os estados unidos, onde é relacionada com questões energéticas, como a dos biocombustíveis. apenas 60% dos norte-americanos e europeus “ouviram falar” de biodiversidade, contra 94% dos brasileiros. Barômetro da Biodiversidade 2010 organizadora: uebt site: www.ethicalbiotrade.org direção econômica [ jogo ] a Volkswagen lançou o game VW tem de tank?, um jogo de corrida com elementos em três dimensões, cujo principal objetivo não é chegar em primeiro lugar, mas sim conduzir um VW polo de maneira econômica, sem desperdiçar combustível. Quem tiver o melhor desempenho ganha um VW polo blue motion. para participar, basta se cadastrar no site www.volkswagen.nl/temdetank. a navegação é amigável e o prêmio é bom, mas as instruções estão todas em holandês. com o objetivo de ampliar a transparência, o jornal britânico the guardian transformou o seu tradicional relatório de responsabilidade socioambiental em uma plataforma interativa na web (www. guardian.co.uk). intitulado living our Values, o relatório do the guardian foi o primeiro de uma empresa de mídia publicado no mundo. a mudança para o novo formato começou a se conigurar há dois anos, quando jo conio, responsável pelos relatórios do grupo, passou a questionar o modelo até então utilizado. “como é possível fazer um relatório anual e dizer que existe interação, já que tudo muda o tempo todo?”, questiona conio. o jornalista apresentou o novo modelo durante a conferência global sobre sustentabilidade e transparência promovida pela global reporting initiative (gri), em maio, na holanda. a plataforma procura reproduzir a interação e a dinâmica do processo de construção da sustentabilidade nas empresas. por meio dela, o jornal criou um novo canal de comunicação com os leitores. “o diálogo permite absorver diversos pontos de vista e criar um luxo colaborativo de informações para curar a cegueira que as empresas têm em relação a si mesmas”, conclui. [rita nardy] [ bs ] 17 em 2010, o brasil foi incluído, pela primeira vez, na pesquisa barômetro da biodiversidade, que mede a percepção dos consumidores, da mídia e das empresas sobre a biodiversidade mundial. a pesquisa, elaborada pela uebt (union for ethical biotrade) – união para o biocomércio ético –, foi apresentada no país durante um encontro realizado na sede da empresa de cosméticos natura, em cajamar (sp), em maio deste ano. a pesquisa apontou, por exemplo, que os consumidores próximo, em nagoya. liderado pelo programa das nações unidas para o meio ambiente, o estudo traça paralelos entre os custos da perda de biodiversidade – e a consequente piora dos serviços ambientais – e os gastos necessários para a conservação e o uso sustentável dos recursos naturais. o objetivo é mostrar que a economia pode ser um poderoso instrumento de conservação da biodiversidade, a partir da integração dos saberes ecológicos e econômicos. jun/jul 2010 jun/jul 2010 radar planetário [ liVro ] no ano internacional da biodiversidade, um grupo de pesquisadores, coordenado pelo banqueiro sênior do deutsche bank, pavan sukhdev, está na fase inal de elaboração do estudo the economics of ecosystems & biodiversity. o passo a passo do processo pode ser acompanhado no site www.teebweb.org. o resultado inal do trabalho, iniciado em 2007 e apoiado pelo G8, será apresentado na 10ª conferência de estados para a convenção da diversidade biológica, em outubro [site] r e p o r ta g e m sustentável 2010 plinares e requerem a integração permanente de um conjunto de ações em vários setores da economia, envolvendo a parceria e participação de todos os segmentos sociais, da iniciativa privada e pública”. Ao mesmo tempo, o governo municipal propôs uma nova Lei de Mudanças Climáticas, que está em tramitação na Câmara dos Vereadores, como parte do Planejamento Estratégico da Prefeitura. Para Muniz, o licenciamento não é o maior desafio, e sim a gestão do planejamento de cada investimento. “É preciso que cada iniciativa esteja adequada à legislação, de modo que venha a causar o menor impacto ambiental possível.” Uma das metas da Política Municipal de Mudanças Climáticas Rio Sustentável é reduzir as emissões de gases de efeito estufa em 8%, até 2012. Para 2016, a meta é atingir 16% de redução, e, em 2020, 20%. desaFio climático cidades RepoRtaGem mauRette bRandt o Fechamento ao tRáFeGo encontro Sustentável 2010, realizado em maio pelo Conda Avenida Rio Branco e a revitalização do centro do Rio de Janeiro, algumas das metas do Projeto Rio Verde para transformar a metrópole carioca em cidade sustentável, foi um dos temas de destaque do primeiro selho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável (CEBDS). Organizado em torno do tema Cidades e Mudanças Climáticas, o evento contou com a presença de lideranças empresariais, pesquisadores e auto- ridades e discutiu os principais desafios urbanos, como o lixo, a construção civil, a vulnerabilidade dos litorais e a renovação da infraestrutura necessária para a Copa do Mundo de 2014 e os Jogos Olímpicos de 2016. Adaptar as cidades aos desafios climáticos não é tarefa fácil. Para realizá-la, Carlos Alberto Vieira Muniz, vice-prefeito do Rio, aposta no poder mobilizador do Fórum Carioca de Mudanças Climáticas e Desenvolvimento Sustentável. Criado em 2009, o órgão se reúne mensalmente para tratar das questões associadas ao aquecimento global, que “são complexas, multidisci- [ bs ] 19 18 [ bs ] a parceria entre o goVerno e as empresas abre o caminho mais curto para as cidades se adaptarem às mudanças climáticas jun/jul 2010 jun/jul 2010 pRevisíveis da esquerda para a direita, bjorn sitgson (Wbcsd), branca americano (ministério do meio ambiente), marina Grossi (cebds), claudio muniz (vice-prefeito do Rio de Janeiro) e sue Wolter (petrobras) Em todas as cidades há urgente necessidade de adaptação do setor de transportes para reduzir impactos ambientais e emissões de gases de efeito estufa. Suzana Kahn, professora da Coppe-UFRJ e ex-secretária de Mudanças Climáticas do Ministério do Meio Ambiente, ressaltou que, apesar dos avanços da tecnologia e dos combustíveis, o esforço de mitigação exige dos governos a elaboração de uma legislação fortemente restritiva, pois a quantidade de veículos em circulação só tende a aumentar. “É necessário unir três aspectos: governança (comprometimento), cooperação (otimização, priorização e complementaridade nos programas) e liderança (coordenação comum), de forma a compartilhar responsabilidades”, disse a pesquisadora. Para tanto, torna-se essencial a existência de um órgão que coordene as ações de mitigação e de adaptação, capaz de otimizar o desenvolvimento urbano e planejar cidades mais previsíveis, salientou a arquiteta Andrea Young, pesquisadora do Instituto Nacional de Pesquisa Espacial. “Com o aumento das chuvas, em consequência da elevação da temperatura no nível do mar registrada entre 1960 e 1990, o risco das cidades aumentou, pois o solo não consegue absorver toda essa água em tempo hábil, o que favorece deslizamentos de terra como os que aconteceram no Rio”, afirmou Young. Outros agravantes são o aumento r e p o r ta g e m sustentável 2010 O segundo painel do encontro, Primeira Jornada de Construção Sustentável, permitiu aprofundar os debates da parte da manhã, discutindo a sustentabilidade da construção civil. Carlos Eduardo Garrocho de Almeida, Diretor Comercial e de Assuntos Corporativos da Holcim Brasil e presidente da Câmara Temática de Construção Sustentável do CEBDS, destacou a publicação, pela instituição, do Guia da Construção Sustentável, destinado a promover uma mudança de cultu- suzana Khan, da coppe-uFRJ: legislação deve ser mais restritiva para automóveis Garrocho, da holcim: é preciso capacitar os profissionais da construção civil a pesquisa desafios urbanos e mudanças climáticas, desenvolvida pela empresa market analysis em parceria com o cebds, entre 26 de março e 15 de abril, e apresentada no sustentável 2010, entrevistou 258 pessoas e 41 formadores de opinião, traçando um perfil das expectativas sobre os problemas e as necessidades do rio de janeiro. mais de 34% dos entrevistados apontaram a segurança como o maior problema da cidade daqui a cinco anos, enquanto 28% dos formadores de opinião identificaram os transportes. a violência foi apontada por ambos os grupos de entrevistados como o maior problema do rio hoje e no futuro. o governo se destaca como o agente de maior competência e credibilidade para lidar com o aquecimento global, na opinião de 33% do público e de 17% dos formadores de opinião. o trabalho das lideranças empresariais no combate ao aquecimento global é considerado bom por 53% do público, mas apenas 39% dos formadores de opinião concordam. dentre as soluções, 90% do público e 98% dos formadores de opinião acreditam que a primeira atitude a ser tomada, nas empresas, é encontrar formas menos poluidoras de gerar produtos e serviços. a segunda alternativa é uma mudança de atitude pessoal e social para diminuir a emissão de gases poluidores, escolhida por 88% do público e 90% dos formadores de opinião. a força da lei é a terceira ação mais importante. na opinião de 87% do público e de 96% dos formadores de opinião, o governo deve limitar severamente as emissões de gases das empresas. mais de 61% dos entrevistados acreditam que a preocupação com as mudanças climáticas vai crescer. [ bs ] 21 20 [ bs ] constRução sustentável goVerno Protagonista ra na construção civil. Já Marcelo Takaoka, presidente da Câmara Brasileira da Indústria da Construção, mostrou os esforços da entidade para conscientizar os sindicatos e as construtoras para a transformação sustentável do setor. Houve consenso entre os participantes do encontro que os próximos eventos globais programados para o Brasil e o Rio de Janeiro, a Copa do Mundo e a Olimpíada, abrem oportunidades de renovação. Maria Salete de Carvalho Weber, coordenadora geral do Programa Brasileiro da Qualidade e Produtividade do Habitat (PBQPH), da Secretaria Nacional de Habitação do Ministério das Cidades, informou que o governo investirá 7 bilhões na infraestrutura das cidades-sede da Copa e da Olimpíada, além de 11 bilhões repassados a estados e municípios. “Para o ministério, os investimentos em transportes públicos devem ter caráter de perenidade. A questão da sustentabilidade vem sendo incorporada a todas as ações. Nossos parceiros privados têm a responsabilidade de cumpri-la”, afirmou. O Rio de Janeiro está no foco dos investimentos. No caso do Projeto Rio Verde, apresentado por Altamirando Reis, subsecretário de Meio Ambiente do Rio, as ações incluem a reformulação do sistema de transportes metropolitano e a preservação do centro, com o fechamento da Avenida Rio Branco ao tráfego e a revitalização de áreas históricas, como a Praça Tiradentes e a Praça XV. Também será fechado o lixão de Gramacho, em Duque de Caxias (condenado há 20 anos), que ameaça ruir sobre a baía de Guanabara. “O projeto é amplo e segue o exemplo de várias capitais mundiais”, disse Reis. “A tendência é proteger as áreas centrais, muitas com significativos conjuntos arquitetônicos históricos, o que implica otimizar os transportes e implantar o bilhete único metropolitano.” A racionalização das linhas de ônibus é essencial para diminuir a concentração em regiões e servir melhor a todas as áreas da cidade. Reis lembrou que 36% das emissões do Rio vêm de dióxido de carbono e outros 36% são provenientes do lixo. “Só a reformulação do sistema de transportes representará uma redução de 8% já em 2012”, comemora. Na conclusão dos debates, Marina Grossi, presidenteexecutiva do CEBDS, reafirmou a postura da instituição de fomentar o diálogo sobre os desafios prementes das cidades diante dos impactos previsíveis. “Indivíduos, governo e empresas devem melhorar sua atuação no combate às mudanças climáticas; faremos tudo para [bs] dar suporte a esse processo”, afirmou. jun/jul 2010 jun/jul 2010 da área impermeável, o esgotamento dos lixões e a expansão do desmatamento. “O prolongamento das áreas periféricas, no Rio, já atinge os manguezais da Baía da Guanabara, que deveriam ser preservados”, ressaltou a pesquisadora. Em São Paulo a situação mais grave é a da bacia do Rio Tietê, que envolve 39 municípios e está se transformando numa ilha de calor em decorrência da impermeabilização crescente. Na visão das companhias de seguro, as áreas de maior risco do planeta são as zonas costeiras. Cláudio Neves, doutor em Engenharia Oceanográfica e Costeira pela Universidade da Flórida, advertiu que as mudanças climáticas tendem a agravar o vazio urbano deixado pela tendência de desativação dos portos. “No Brasil, as cidades portuárias detêm 14% das maiores rendas per capita”, disse. Soluções de engenharia, não mitigações, são necessárias com urgência, pois a vulnerabilidade é enorme, apesar de a situação brasileira ser menos arriscada do que a de muitos outros países. O aquecimento global encurta o tempo do planejamento urbano. Sérgio Besserman Vianna, presidente da Câmara Técnica de Desenvolvimento Sustentável e de Governança Metropolitana da Prefeitura do Rio de Janeiro alertou que “do jeito que o mundo caminha, são mínimas as chances de não ultrapassarmos o limite de aquecimento global de 2ºC até o fim do século 21. Qualquer coisa além disso será um pesadelo”. O economista aposta na produção de conhecimento – dados, estatísticas, análises de risco – e na participação da sociedade para gerar uma análise mais realista da situação. É fundamental apoiar a projeção de mudanças climáticas em territórios cada vez menores, através de políticas e planos municipais. “O Brasil tem imensas vantagens competitivas, por ser autossuficiente em energia, pela logística e pelo impacto dos biomas. Há muito a fazer ainda, mas as possibilidades são boas”, concluiu. retranca Falsa aGenda «edição FeRnando badô | teXto pedRo michepud» m ercad o • ág ua • ed u cação • n eg ó ci os 25 a 27 aGosto realiZaÇão: associação dos analistas profissionais de investimento do mercado de capitais (apimec) local: ouro minas palace hotel - belo horizonte (mG) Mais inforMaÇões: [tel] (31) 3213.0693 [site] www.21congressoapimec.com.br [e-mail] [email protected] 5 a 11 de setembro 31 de agosto a 2 de setembro 31 de agosto 2º encontro sustentável 2010 realiZaÇão: conselho empresarial brasileiro para o desenvolvimento sustentável (cebds) local: hotel sheraton – porto alegre (Rs) Mais inforMaÇões: [site] www.sustentavel.org.br eco Business 2010 - feira e congresso internacional de econegócios e sustentabilidade realiZaÇão: mes – eventos para o Futuro local: centro de exposições imigrantes, pavilhão de convenções – são paulo (sp) Mais inforMaÇões: [tel] (11) 3060.2270 [site] www.ecobusiness.net.br [e-mail] [email protected] semana Mundial da água realiZaÇão: stockholm international Water institute (siwi) local: stockholm international Fairs estocolmo (suécia) Mais inforMaÇões: [tel] +46 852 21 39 60 [site] www.worldwaterweek.org [e-mail] [email protected] 21º congresso nacional apimec Realizado a cada dois anos, o congresso nacional apimec reúne profissionais e empresas relacionadas ao mercado de capitais para debater o desenvolvimento do setor e a economia global. neste ano, a programação tem como tema central o papel do mercado de capitais em um mundo sustentável e discute desde a adoção de mecanismos sustentáveis até a neutralização da emissão de carbono do próprio evento. estão previstos painéis para debates entre analistas de investimentos e profissionais das áreas de relações com investidores. uma feira também será montada, para que as empresas exponham seus produtos e serviços. as inscrições podem ser feitas com preços especiais até o dia 25 de junho. o 2º encontro sustentável – ciclo de encontros sustentável 2010 – tem como tema comunicação e educação para a sustentabilidade e irá debater, entre outros assuntos, a inserção do tema na grade das universidades. a discussão também será aberta à participação de lideranças locais, para que exemplos aplicados regionalmente possam ser ampliados a outras comunidades. as inscrições, gratuitas, estão abertas para acadêmicos, ongs, e representantes dos governos estaduais e municipais e do setor privado. o terceiro e último encontro do sustentável 2010 ocorre em novembro, em salvador (ba). é possível gerar negócios e, ao mesmo tempo, disseminar conceitos e práticas sustentáveis? para responder a essa pergunta, a eco business 2010 promove, desde 2008, uma feira para integrar empresas que desenvolvem projetos sustentáveis e ecoprodutos, estimulando a troca de informações para gerar conhecimento no tripé social, ambiental e econômico. além disso, é realizado o congresso negócios e cidades sustentáveis, que discute projetos adotados por governos, empresas, ongs e universidades para gerar riqueza e lucratividade com menos impacto no meio ambiente. o desafio da Qualidade da água é o tema da semana mundial da água, que ocorre em estocolmo, na suécia. o evento proporciona um intercâmbio entre os setores civis, empresariais, políticos e acadêmicos de todo o mundo e procura soluções concretas com relação ao uso do recurso escasso. o evento, que debateu o acesso à água para o bem comum em 2009, debaterá o desafio urbano e a alimentação global, em 2011 e 2012, respectivamente. para acompanhar a programação, que conta com workshops, seminários, cerimônias de premiação e plenários, os internautas contarão com o watercube.tv, um podcast criado pela organização para veicular os debates. r e p o r ta g e m inFRaestRutuRa e divulgação naturatins nquanto os olhares de governantes e ambientalistas se voltam para as grandes hidrelétricas da Amazônia, o país vira um autêntico canteiro de obras para outro aproveitamento hídrico. A construção de pequenas centrais hidrelétricas (PCHs) – usinas com reservatórios de até 3 km2 e potência de até 30 MW –, toma conta dos rios, de norte a sul. Desde 2004, quando o governo lançou o Programa de Incentivo às Fontes Alternativas (Proinfa), garantindo a compra da energia gerada pelo prazo de 20 anos, a preços de fazer o olho de qualquer investidor brilhar, as PCHs proliferam, algumas vezes sem controle e, não raro, com várias no mesmo rio. a bucólica pch dianópolis, no rio manuel alvinho, em tocantins Pch S : sustentáVeis, rePortageM Julio santos Outro exemplo negativo acontece no Rio Palmeiras, no município de Dianópolis, no Tocantins. Nessa região, um dos portões para o Parque Estadual do Jalapão, vizinha da Estação Ecológica da Serra Geral e do Parque Nacional das Nascentes do Rio Parnaíba, já existem oito PCHs, das quais seis em funcionamento. Outras duas, as usinas Areia e Água Limpa, estão em construção – todas as oito situadas num trecho de apenas 150 quilômetros. A proliferação de construções no rio interferiu na topografia das cachoeiras e corredeiras, eliminou cavernas e grutas e acabou com a prática do rafting turístico no Rio Palmeiras. O problema acontece porque em quase 95% dos empreendimentos é necessário fazer pequenas elevações de nível para que haja altura suficiente para garantir a geração de energia. Nas usinas com reservatórios para acumulação de água, é construído um canal ou uma adutora para que a água caia do ponto mais alto com força para passar pela turbina e produzir energia. Nas PCHs a fio d’água, que não formam reservatórios, esse tipo de intervenção não acontece. Uma das alternativas para moderar o impacto ambiental e impedir que a construção de pequenas usinas sobrecarregue os rios é a elaboração da Avaliação Ambiental Integrada das bacias hidrográficas. O estudo avalia a situação socioambiental de toda a bacia do rio, considerando os empreendimentos hidrelétricos em operação e os planejados, segundo a Empresa de Pesquisa Energética (EPE), responsável pelo planejamento do setor de energia. Teoricamente, a ava- [ bs ] 25 apesaR de seRem uma alteRnativa limpa e de menoR impacto ambiental, as pequenas centRais hidRelétRicas estão deiXando um RastRo neGativo pela Falta de uma avaliação ambiental inteGRada de bacias hidRoGRáFicas e de RiGoR no licenciamento ambiental cascata de impactos jun/jul 2010 Mas neM tanto O subsídio governamental às PCHs – desconto de até 50% no pagamento da tarifa de transmissão e distribuição de energia, isenção de royalties nos municípios, mais financiamento do BNDES e garantia de compra de energia por 20 anos – ajudou a ampliar enormemente a participação dessa fonte na matriz energética. Hoje há 368 usinas em operação, geradoras de 3.171 MW, quase 3% da capacidade do país. Para os próximos dez anos, o Plano Decenal de Energia projeta para as PCHs um salto de participação na matriz para a faixa de 7 mil MW. Segundo a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), há mais 64 usinas em construção e 149 em fase de outorga. Além disso, a Aneel tem cerca de 800 estudos de inventário e mais de mil projetos básicos de PCHs em análise. Se todos esses projetos se concretizarem, serão pelo menos 2.381 PCHs. A corrida para a construção de usinas, em alguns casos, tem passado dos limites exatamente em um dos quesitos fundamentais do conceito das pequenas hidrelétricas: o menor impacto ambiental. A ausência de Avaliação Ambiental Integrada (AAI) das bacias hidrográficas e a falta de rigor dos órgãos ambientais dos estados na hora de aprovar o licenciamento estão criando situações surrealistas. Na Bacia do Alto Paraguai, no Mato Grosso do Sul, está prevista a instalação de 116 PCHs. Desse total, 29 já estão em operação. A bióloga Débora Calheiros, da Embrapa Pantanal, é uma das pesquisadoras que alertam para os riscos de construção em massa das pequenas usinas em rios de pequeno porte: impactos nas comunidades, na pesca, na agricultura familiar, na criação de gado, no turismo pesqueiro e no assoreamento dos rios. ca r epa o r ta g e m Fotos: divulgação naturatins biocombustíveis inFRaestRutuRa bacias inteiRas Cabe à Agência Nacional de Águas (ANA) a tarefa de regular o curso das águas dos rios para seus múltiplos usos, como geração de energia, produção de alimentos, abastecimento da população, irrigação e lazer. A agência responde pela emissão da Declaração de Reserva de Disponibilidade Hídrica, que determina se a vazão estabelecida para a geração de energia por uma determinada PCH vai limitar a quantidade tolmasquim: a avaliação ambiental integrada refinará o licenciamento ambiental zar problemas em relação ao uso dos recursos hídricos. Cabe à AAI verificar quantas represas o rio pode ter. “Não há dúvida nenhuma de que a análise integrada da bacia é a melhor solução. É melhor do que o EIA/Rima (Estudo de Impacto Ambiental/Relatório de Impacto no Meio Ambiente), embora não dispense tais estudos”, comenta Viana, frisando que é o setor de energia que propõe a divisão de quedas ou cascata a ser explorada do ponto de vista energético. Além da Avaliação Ambiental Integrada, o consultor Daniel Araujo Carneiro defende maior atenção por parte dos órgãos ambientais na análise dos estudos de inventário e projetos básicos das pequenas centrais. Autor do livro PCH: Aspectos Jurídicos, Técnicos e Comerciais, o especialista também diz que é preciso mais robustez nos estudos de EIA/Rima. Ele aponta como fator determinante para evitar impactos ambientais a necessidade de obtenção das Licenças Pré- bom neGócio Na definição da Aneel, o inventário é a etapa de engenharia em que se avalia a capacidade de geração hidrelétrica de uma bacia ou de um rio, buscandose compatibilizar o máximo de energia, ao menor custo, com o mínimo de impactos sobre o meio ambiente, em conformidade com os cenários de utilização múltipla dos recursos hídricos. Após a aprovação, os estudos de inventário servem de base para o desenvolvimento posterior de projetos mais detalhados, com vistas à efetiva instalação dos aproveitamentos hidrelétricos identificados. “os eMPreendiMentos anteriores à necessidade de aPresentaÇão de licenÇa PréVia PodeM ter tido uM desenVolViMento inadequado” daniel caRneiRo [ bs ] 27 26 [ bs ] de água para outros usos. Posteriormente, cabe ao órgão ambiental verificar se aquela diminuição de vazão da cachoeira vai criar algum dano ambiental ou vai alterar a biologia do ambiente. Para Francisco Lopes Viana, superintendente de Outorga e Fiscalização da ANA, a avaliação integrada de bacia é a melhor solução para evitar ou minimi- jun/jul 2010 jun/jul 2010 liação deve levar em conta “os efeitos cumulativos e sinérgicos dos projetos sobre os recursos naturais, as populações residentes e as atividades econômicas, assim como os usos atuais e potenciais dos recursos hídricos no horizonte atual e futuro de planejamento”. No caso da Bacia do Alto Paraguai, no Mato Grosso do Sul, segundo Mauricio Tolmasquim, presidente da EPE, a licitação para contratar a empresa que fará os estudos amplos está em fase de elaboração. “A Avaliação Ambiental Integrada será feita para atender precisamente a essa demanda”, garante Tolmasquim, sem precisar quando a licitação acontecerá. De 2006 para cá, a entidade ligada ao Ministério de Minas e Energia já desenvolveu estudos para sete bacias: dos rios Teles Pires (MT/PA), Tibagi (PR), Parnaíba (PI/ MA/CE), Paraíba do Sul (SP/RJ), Doce (MG/ES), Tocantins (TO) e Uruguai (RS/SC). pch areia, outra usina em construção no rio palmeiras pch água limpa, em construção, também no rio palmeiras divulgação epe pch porto Franco, no rio palmeiras (to), já em funcionamento vias, tanto para fazer os estudos de inventário quanto para iniciar a instalação do projeto. “Acredito que os empreendimentos anteriores à necessidade de apresentação de licença prévia podem, de certa forma, ter tido um desenvolvimento inadequado em relação às regras ambientais”, ressalta Carneiro. Sobre a construção de uma série de usinas num mesmo rio, o que na linguagem do setor de energia é chamado de “cascata”, o consultor explica que no inventário se busca, dentro da legislação ambiental, encontrar o aproveitamento ótimo para geração de energia num determinado rio. Segundo Fábio Dias, diretor-executivo da APMPE, associação que reúne os pequenos e médios produtores de energia elétrica, a construção de uma sequência de usinas num mesmo rio visa otimizar o seu potencial. “Com a cascata de usinas, o objetivo é buscar os efeitos sinérgicos para otimizar o potencial para geração de energia, sem gerar impactos para o meio ambiente”, comenta. Segundo Dias, o processo de aprovação de um projeto está ficando mais longo, o que tem afetado a atratividade das PCHs, em decorrência do aumento de custos provocado pelos estudos necessários e pela maior exigência ambiental. r e p o r ta g e m inFRaestRutuRa 28 [ bs ] jun/jul 2010 Um fator novo no mercado das PCHs foi a aprovação, em janeiro de 2009, da resolução 343 da Aneel, que, para limitar a especulação com os projetos, impôs uma série de exigências à solicitação de registro de um empreendimento. Antes dela, muitos empreendedores registravam o projeto no Proinfa, mas não desenvolviam o licenciamento prévio, esperando vendê-lo a terceiros. O consultor conta que a nova resolução adotou o critério de vantagem competitiva para quem desenvolve os estudos de inventário. “Com isso, a qualidade dos inventários está, inclusive, ficando melhor”, avalia Daniel Carneiro. Após a publicação da resolução, o número de inventários cresceu vertiginosamente. O relatório de atividades de 2009 da Aneel, elaborado pela Superintendência de Gestão e Estudos Hidroenergéticos, mostra uma significativa evolução. No caso dos estudos de inventário, que registravam uma média mensal de pouco mais de 30 novas solicitações, o número foi elevado para 60 em novembro e dezembro. Segundo o relatório, em 2009 foram publicados 1.935 despachos relativos à questão de registro e concedidos 1.156 registros ativos para desenvolvimento de estudos e projetos. Em contraste, no mesmo ano a Aneel analisou apenas 98 projetos básicos de PCHs, dos quais 63 foram aprovados e homologados, perfazendo um total de 778 MW de potência. A evolução regulatória apertou a marcação sobre quem pretende investir em pequenas centrais hidrelétricas para especular. Hoje, o desenvolvimento do projeto é acompanhado trimestralmente, tanto pelos órgãos ambientais como pela própria Aneel. Daniel Carneiro ressalta que, se não forem apresentados o licenciamento ambiental pertinente e o termo de referência na elaboração de impacto ambiental (EIA/Rima), por exemplo, não se tem como dar andamento aos estudos de projetos básicos. “A partir do momento em que o licenciamento prévio passou a ser exigido como condição para se obter a outorga, não tenho a menor dúvida de que os projetos banco de dados – ana eM 2009, foraM concedidos 1.156 registros Para PchS, Mas aPenas 98 chegaraM a ser ProJetadas, das quais 63 foraM aProVadas e hoMologadas no rio paraíba do sul já foi feita a avaliação ambiental integrada da bacia de PCHs ganharam um contorno ambiental sustentável”, aponta o consultor. Com acesso garantido ao financiamento do BNDES, uma PCH custa, em média, cerca de R$ 100 milhões, rende cerca de R$ 5 milhões por mês e tem garantia de compra de energia por 20 anos. Além do desconto na transmissão, não pagam royalties aos municípios onde se instalam, embora paguem impostos estaduais e federais. Um bom negócio. Por isso, o aperto da regulação e da legislação ambiental chega mais do que na hora para um país que tem nas fontes renováveis uma vantagem competitiva. Muitos problemas ainda persistem no licenciamento ambiental, como a falta de pessoal qualificado para avaliar a qualidade dos estudos ambientais e fiscalizar a construção das usinas. Sem falar na falta de agilidade no desenvolvimento das avaliações ambientais integradas. Esses são fatores cruciais para que o país explore de maneira correta e racional o seu potencial hídrico, sem deixar um rastro de destruição ambiental rio abaixo. [bs] entRevista Valo riz ar a cu ltu ra e o pró pri o territó ri o é o p o nto d e partida d o reQ u inte gastrô n o m i co carlo petrini entRevista maRia da paz tReFaut alberto peroli “para comer bem não é necessário muito esforço” Brasil sustentáVel como o senhor avalia a presença do Brasil no movimento do slow food ? carlo Petrini O Brasil, país com uma grande biodiversidade agrícola, gastronômica, cultural e linguística, é um dos principais interlocutores do Slow Food. Um dos primeiros projetos internacionais de apoio aos pequenos produtores brasileiros foi realizado no país em 2002, quando nasceu a fortaleza do Guaraná Nativo dos Sateré-Mawé, da Amazônia. Ao longo dos últimos anos, a mobilização da sociedade brasilei- Bs qual a principal contribuição que os brasileiros podem dar? cP Conhecer e valorizar o próprio território é o ponto de partida. Os chefs de cozinha que atuam no Brasil possuem um papel-chave na promoção dos produtos regionais. Já a universidade, quando próxima ao mundo rural, pode contribuir para o reconhecimento e a valorização de técnicas de produção e produtos autóctones. Os consumidores brasileiros possuem o poder de motivar os pequenos produtores a prosseguirem com suas atividades realizando compras de maneira responsável. Pequenas produções tradicionais somente continuarão a existir enquanto existirem consumidores sensíveis e conscientes. Bs algumas das técnicas culinárias mais importantes nasceram nas classes mais pobres. Mas a gastronomia sempre foi de elite. será sempre assim? cP Sempre existiram a cozinha popular e a aristocrática, das cortes. Depois, a Revolução Francesa mudou as coisas, também nesse campo. Hoje, o que realmente conta é a tomada de consciência ecogastronômica. Trata-se de entender que o futuro da terra depende também e, sobretudo, do modo com que nos alimentamos todos os dias. Bs o senhor costuma dizer que o slow food é uma revolução doce e tranquila. o que essa revolução tem de diferente? cP É uma revolução lenta e pacífica, que parte de [ bs ] 33 GastRonomia símbolo do caracol se espalhou por 153 países, significando, mais do que uma antítese à velocidade da globalização, uma adaptação para a alimentação do conhecido slogan “Pense globalmente e atue localmente”. A ideia de repensar o que cada país tem de único, junto com a percepção de que comer também é um ato agrícola, deu origem ao que hoje se chama de ecogastronomia. Trata-se da tomada de consciência de que o alimento, do modo de produção ao consumo, incluindo o desperdício e o dejeto, é um elemento da sensibilidade ambiental, sustenta o jornalista italiano Carlo Petrini, 61 anos, fundador e presidente do movimento. Graças ao seu empenho, o Slow Food nasceu em Bra, no Piemonte, terra de tradições culinárias que influenciaram o mundo, também ameaçadas pela globalização. Mais de 150 mil pessoas em cinco continentes trabalham para a educação do gosto e a preservação da biodiversidade alimentar, organizando eventos e publicando livros e revistas. Em abril, Brasília sediou a segunda edição do Terra Madre – Encontro Nacional de Ecogastronomia, uma das manifestações do movimento, que reuniu produtores, chefs de cozinha e pesquisadores brasileiros. Carlo Petrini esteve lá, experimentou culinárias regionais, viu de perto como resistem as “fortalezas” – os núcleos Slow Food de defesa de produtos ameaçados – e conversou com a BRASIL SUSTENTÁVEL. ra tem sido fundamental para o crescimento do movimento. Atualmente, a Associação Slow Food conta com quase mil sócios no país, que promovem iniciativas locais, regionais e nacionais em prol da biodiversidade alimentar. O Slow Food conta ainda com o apoio da Secretaria de Desenvolvimento Territorial do Ministério do Desenvolvimento Agrário e da Secretaria da Diversidade e Identidade Cultural do Ministério da Cultura para realizar a segunda edição do Terra Madre, neste ano. jun/jul 2010 eco em pouco mais de 20 anos o entRevista b i o d iV ers i da d e • g lo ba liz ação baixo, da nossa atitude alimentar cotidiana. Todos nós comemos e podemos escolher algo melhor para comer, sempre de acordo com a dimensão do nosso bolso. Para comer bem, produtos que satisfaçam o paladar e que respeitem o ambiente e o trabalho dos camponeses, não é necessário muito sacrifício. Basta comprar produtos locais, da estação, e conhecer quem os cultiva e os vende. É preciso conhecer o nosso alimento para lhe dar o justo valor. Se todos fizéssemos nossa parte, o sistema mundial de alimentos – que está destruindo o equilíbrio ambiental do planeta, o trabalho de milhões de agricultores e a saúde de tantos cidadãos – não seria tão invasivo e perigoso para o futuro. É uma coisa que se pode e se deve fazer, sobretudo porque é muito agradável e demanda pouco sacrifício: basta um pouco de educação alimentar e empenho na hora de consumir. 34 [ bs ] “compre produtos locais, da estação, e conheça quem os cultiva e vende” nizar espaços de mercado nas cidades e estimular a criação de cooperativas são experiências que valorizam o alimento dentro dos limites regionais. Tratar todos os alimentos como commodities, pensar em aplicar o modo de produção da indústria numa atividade natural como a agricultura, que envolve um sistema ecológico complexo, é uma loucura. Depois, existem alguns produtos, como café, vinho e especiarias, que desde tempos imemoriais percorrem longas distâncias. Isso é normal, pois só podem se desenvolver em determinadas condições de ambiente e clima. Bs que alimentos estão em sua lista negra? cP Tudo o que gera desperdício. Você sabe que na Itália se joga fora, todos os dias, 4 mil toneladas de comida boa para se comer? Nos Estados Unidos, esse número chega a 22 mil toneladas. um é realmente um sinal inequívoco de um sistema que não funciona mais. Enquanto falamos de 1 bilhão de pessoas no mundo que passam fome, há uma quan- Bs os ecologistas são pessimistas quanto ao futuro da humanidade. o senhor parece não ser. Por quê? cP Porque, no fim das contas, acredito na humanidade. As previsões, de fato, são muito pessimistas, mas só se concretizarão se continuarmos na mesma estrada que trilhamos até aqui. Mas podemos mudar e podemos fazê-lo buscando nosso prazer, celebrando nossa cultura e nosso desejo de ampliar a vida comunitária e conviver com nossos irmãos. O fato inacreditável é que podemos fazer essa mudança a partir do sabor do alimento. Acre[bs] dito nela porque não é difícil. fortaleZas Brasileiras um dos principais projetos da Fundação slow Food para a biodiversidade é difundir e viabilizar comercialmente alimentos artesanais ameaçados de extinção. para isso, foram identificadas em todos países “fortalezas do gosto”, que credenciam produtores de sabores em risco, muitas vezes esquecidos, ligados à identidade das comunidades. Veja alguns dos produtos brasileiros classificados como fortalezas. castanha de Baru (castanha do cerrado): coletada por 32 coletores das comunidades de caxambu, santo antônio e bom jesus, em pirenópolis, goiás. guaraná sateré-Mawé: energético em forma de bastão, ralado na língua do pirarucu, produzido por 500 famílias da etnia sateré-mawé, na terra indígena andirá marau, no pará. aratu: o crustáceo saboroso é pescado por 50 famílias da comunidade de cajazeiras, no município de santa luzia do itanhy, em sergipe. néctar de aBelhas natiVas: Quarenta famílias participam da produção desse mel menos doce, também na terra indígena andirá marau, no pará. arroZ VerMelho: plantado em santana dos garrotes, Vale do piancó, na paraíba, foi introduzido no brasil pelos portugueses no início do século 16. é produzido por 63 rizicultores. PalMito JuÇara: cinquenta famílias realizam o cultivo da palmeira em viveiro. também há plantações nas reservas silveira e boa Vista, dos índios guarani do litoral norte de são paulo. [ bs ] 35 Bs o que é o melhor e o pior da gastronomia sem fronteiras? cP A comida não deve percorrer milhares de quilômetros sem que haja real necessidade. Muitas milhas alimentares inúteis e danosas, que redundam em produção de gás carbônico, poderiam ser evitadas privilegiando-se os alimentos frescos e locais, fruto de uma economia de pequena escala para o abastecimento. Dar aos produtores a possibilidade de vender diretamente, ajudá-los a orga- Bs o sr. acredita que o fast food está condenado, apesar do poder econômico das marcas globais? cP Cedo ou tarde, a insustentabilidade econômica, social e ecológica desse modelo de alimentação emergirá de maneira tão veemente que ele não será mais reproduzido nem mesmo por quem o pratica. Não sei quando isso acontecerá, mas espero que seja o mais rápido possível, porque o sistema não é sustentável. O poder econômico que as multinacionais acumularam é imenso, e elas, de fato, apropriaram-se da nossa soberania alimentar. Controlam as sementes, a terra, as transformações e até a distribuição da nossa comida. O problema é que em breve os custos sociais e ambientais serão tão altos que precisarão modificar sua estratégia. Esperemos apenas que isso não venha tarde demais. jun/jul 2010 jun/jul 2010 Bs que consequências devemos esperar dessa revolução? cP Um renascimento da cozinha tradicional, mas não numa ótica de museu ou passadista. As tradições vivas já contêm, em sua essência, uma adaptação às exigências modernas das pessoas. É preciso entender que, com produtos locais e de estação, defende-se a biodiversidade, se respeita o ambiente, se consegue gastar menos e se avança na direção do reconhecimento do bom e do belo como um direito democrático, ao alcance de todos. Isso tudo é parte do conceito de soberania alimentar. Uma coisa que devemos reconquistar neste planeta. Tanto aqueles que têm pouco para comer como os mais ricos, que podem se permitir qualquer alimento, mas que não sabem dizer de onde provém, o que contém e quem produziu o que estão comendo. tidade de comida muito superior à demanda mundial desperdiçada. A fome não é uma questão de escassez, mas de injustiça. r e p o r ta g e m Responsabilidade social adeel halim / Reuters mais investimento social pRivado os inVestimentos sociais das empresas Voltaram a crescer em 2010, Focando, sobretudo, projetos de educação, cultura e capacitação Fernando Rossetti: investimento social corporativo cresce em 2010 rePortageM patricia moreira a té o fiM do ano, as empresas brasileiras empregarão R$ 2,012 bilhões em investimento social privado (ISP), a maior parte em projetos de educação, cultura e arte, formação para o trabalho, esportes e comunicação, o que representa um crescimento de 6,23% sobre 2009. Os números foram revelados pelo secretário-geral do Gife (Grupo de Institutos, Fundações e Empresas), Fernando Rossetti, durante o sexto congresso da entidade, no Rio, e integram a quinta edição do Censo Gife, elaborado em parceria com o Ibope Inteligência, o Instituto Paulo Montenegro e o Instituto Itaú Cultural. do setor, uma vez que certas culturas não mudam de uma hora para a outra, a exemplo das leis. “O Gife só tem 15 anos de vida, e, neste período, já obteve conquistas importantes para a sociedade. Pensar em mudanças estruturais requer esse tempo. Nossa meta é estabelecer um setor de investimento social privado relevante e legítimo, que abranja diversos temas, regiões e públicos, formado por um conjunto sustentável e diversificado de investidores”, afirma. los das emissões do evento e irá neutralizá-las por meio do Programa de Desmatamento Evitado, da Sociedade de Pesquisa em Vida Selvagem e Educação Ambiental (SPVS). Para isso, todos os participantes receberam uma ficha para informar a cidade de origem e o meio de transporte utilizado. Outras medidas em prol da sustentabilidade foram obtidas através da economia na impressão de papel e da redução dos descartáveis. 2020 Durante o 6º Congresso Gife foi apresentada a Visão do Investimento Social Privado para 2020. O documento, apesar de ainda estar em fase de elaboração, já aponta quais são os principais desafios, as linhas de ação e os indicadores propostos para o aprimoramento e a expansão do setor no Brasil. Com a participação dos associados da rede Gife e de organizações sociais convidadas, foram organizados quatro encontros para a elaboração do material. A visão para o setor foi montada a partir de três grandes eixos temáticos: relevância e legitimidade; abrangência (temática e geográfica); e diversidade de investidores. Segundo Rossetti, são necessários dez anos para se tentar estabelecer um panorama completo novidades Além das plenárias e mesas de debate, o 6º Congresso Gife ofereceu aos participantes atividades paralelas realizadas pelas organizações parceiras da entidade, como Instituto Votorantim, Instituto Rogério Steinberg, Instituto C&A, Instituto Desiderata e Fundação Vale. O objetivo das iniciativas foi proporcionar debates qualificados e atuais que pudessem enriquecer e complementar as discussões promovidas pelo evento. Outra novidade foi a realização de visitas guiadas a projetos, permitindo que os participantes conhecessem in loco algumas ações sociais no Rio de Janeiro. Foram disponibilizadas visitas às seguintes organizações: Nós do Morro, Espaço Criança Esperança do Cantagalo, Residência Cultural – Teatro Escola Sesc e Instituto Tear. Com a finalidade de neutralizar os gases do efeito estufa emitidos pelo congresso, o Gife fez uma parceria com O Boticário, que efetuará o levantamento e os cálcu- O encerramento do evento contou com uma atividade inusitada, o bem-humorado julgamento “Qual o impacto do ISP na realidade brasileira”. Simulando um tribunal, o consultor Francisco Tancredi assumiu o papel de juiz. Fernando Rossetti foi o réu, representando o ISP, e os promotores foram encenados por Cenise Monte Vicente, coordenadora institucional da Oficina de Ideias e Marketing Cultural, e Wellington Moreira, coordenador-geral do Doutores da Alegria. Os advogados de defesa foram o superintendente de Atividades Culturais do Itaú Cultural, Eduardo Saron, e a socióloga e diretora do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), Anna Peliano. O julgamento terminou com a absolvição do ISP, que apesar de ser considerado culpado de vários delitos “não oferece riscos graves à sociedade”. Segundo o juiz, o réu deve se apresentar no próximo congresso do Gife, em [bs] 2012, para passar por uma nova avaliação. [ bs ] 37 36 [ bs ] setor é fazer com que o ISP não permaneça apenas nos locais e regiões em que são geradas as riquezas.” jun/jul 2010 jun/jul 2010 JulGamento Cerca de 800 lideranças nacionais e internacionais participaram do sexto congresso da instituição – cujo tema foi Visões para 2020 –, confirmando o baixo impacto da crise financeira mundial de 2008 sobre o ISP no país. Em 2009, os investimentos tiveram uma redução de 6% em relação ao ano anterior, mas em 2010 o ISP voltou a crescer. Segundo Fernando Rossetti, o país está vivendo uma época de reorganização de ambientes que favorece o crescimento da sociedade civil: “O terceiro setor triplicou de tamanho, e as empresas cada vez mais têm alinhado seus interesses corporativos com as ações sociais”, disse o secretário do Gife. A maior concentração do investimento social privado, conforme demonstra o estudo, está nas regiões Sudeste e Sul. A Região Norte foi a que apresentou o menor volume de investimentos. Esse dado reforça, na opinião do secretário-geral, a importância de buscar estratégias para nacionalizar os investimentos. “Um dos desafios do terceiro lideRança capa eneRGia « R e p o R taG e m á lva R o a l m e i da » e x em p los i n s pi r a d o r e s pa r a m u da r o m u n d o iGnacY sachs a usar fontes de energia fóssil. Agora, devemos realizar uma saída ordenada da era do petróleo e construir uma biocivilização baseada na transformação da biomassa.” quem? economista polonês, refugiado no brasil e naturalizado francês, autor de mais de 20 livros sobre desenvolvimento e meio ambiente. civilização da biomassa o quê? ajudou a formular o conceito de ecodesenvolvimento na conferência de meio ambiente e desenvolvimento da onu de 1972, mais tarde transformado em desenvolvimento sustentável. poR quê? conhece a realidade dos países emergentes, acumulou anos de trabalho no brasil e na Índia e é um dos raros economistas capazes de conjugar crescimento econômico com desenvolvimento social e conservação ambiental. 38 [ bs ] pRaGmatismo Sachs tem uma visão pragmática sobre temas polêmicos que despertam reações apaixonadas dos ativistas no Brasil. Ele considera, por exemplo, inevitável que o país aproveite o potencial hídrico das bacias da região amazônica para a geração de energia. “Acho difícil ignorar o potencial hidrelétrico da Amazônia”, afirma com ironia. Acredita também que o Brasil deveria utilizar os recursos provenientes da exploração do Pré-sal para justamente financiar a saída da era do petróleo. “É muito difícil encobrir as riquezas que já foram descobertas”, justifica. Embora alerte para os possíveis efeitos nas finanças brasileiras da atual crise econômica europeia no médio e longo prazos, Sachs é taxativo a respeito da mudança no peso político dos países emergentes, em especial do Brasil, no cenário internacional. “O país tem uma grande oportunidade de assumir efetivamente uma posição de liderança”, afirma. Esse protagonismo não se dá apenas no atual âmbito do G20, mas do “G200”. “Não acredito no futuro do G20, e sim numa reconstrução séria do G200, ou seja, das Na[bs] ções Unidas.” [ bs ] 39 para a construção do pensamento sobre o desenvolvimento sustentável. Participou da organização da Conferência de Estocolmo, em 1972, reconhecida por conjugar, pela primeira vez, uma visão de desenvolvimento com preocupação econômica, social e ambiental. Foi conselheiro especial da Rio-92, que deu continuidade a essa evolução e lançou a Agenda 21. Agora, lança sua atenção para a Rio+20, que acontecerá em 2012. “Neste momento, em que o mito dos mercados que se autorregulam está mal das pernas, esse encontro pode redesenhar o futuro da discussão sobre desenvolvimento”, afirma. “O Brasil, como país-sede, deve bombardear a conferência com propostas articuladas com outros emergentes”, aconselha. Para o professorpensador, autor de mais de 20 livros, os brasileiros estão atrasados. É necessário acelerar o debate nacional nos próximos dois anos e articular um bloco com os países que têm as mesmas preocupações. “Aprendi que fóruns paralelos são animados, mas não impactam no que é discutido nas conferências da ONU. Para serem efetivos, devem acontecer antes, como eventos preparatórios”, ressalta. Que futuro o sábio de 83 anos vislumbra? “Estamos no começo da terceira grande transição da coexistência da espécie humana com o planeta. A primeira foi quando domesticamos os animais e nos estabelecemos em comunidades. A segunda, quando passamos Nesse contexto, os países das regiões tropicais e semitropicais ganham um papel fundamental por deterem as maiores concentrações de biomassa, invertendo o equilíbrio de poder global em termos de energia, insumo crucial do futuro. “Inverte-se a tese de inferioridade dos trópicos”, afirma. Sachs aponta também para uma “Revolução Azul”, com o uso sustentável dos recursos do mar e dos sistemas semiaquáticos. “Hoje, estamos caçando os peixes em vez de cultivá-los. Das águas, podemos tirar a proteína necessária para nos alimentar e avançar nas tecnologias, como a da utilização das algas como fonte de biocombustível.” Sustentabilidade, para o professor franco-polonês-brasileiro, não significa apenas responder à crise climática. “Criamos um mundo cheio de desigualdades sociais”, resume Sachs. “O relatório do IPCC deixa uma mensagem central clara. Temos algumas décadas para modificar nossas estratégias de desenvolvimento, pois do contrário teremos de conviver com o gigantesco impacto social das mudanças climáticas, que afetará, sobretudo, os mais fracos.” Ao longo de sua trajetória acadêmica e diplomática, Sachs construiu uma visão globalizada. Nascido em Varsóvia, na Polônia, veio para o Brasil com a família, aos 14 anos, como refugiado da Segunda Guerra Mundial. Formou-se em Economia no Rio de Janeiro. Voltou à Polônia em 1954, trabalhou como diplomata na Índia e consolidou a carreira acadêmica na França, na Escola de Altos Estudos em Ciências Sociais. Em Paris, criou o Centro de Pesquisas sobre o Brasil Contemporâneo. Com essa bagagem incomum, que inclui um sólido conhecimento sobre o mundo emergente e suas desigualdades, contraria os pensadores que pregam o fim do crescimento como saída para a atual crise da civilização. “Distribuir renda já é uma tarefa difícil, em termos políticos. Sem crescimento econômico, é muito mais.” Sua proposta é de um desenvolvimento includente, sustentável e sustentado, que possibilite a distribuição de renda e a consequente redução das injustiças sociais. O economista confia também na ampliação de redes sociais universais que enfrentem os déficits de saúde, educação e moradia entre as populações desfavorecidas e na evolução de mecanismos de economia solidária que permitam a inclusão no mundo do trabalho. jun/jul 2010 jun/jul 2010 iGnacY sachs contribui há 40 anos “distriBuir renda Já é uMa tarefa difÍcil, eM terMos PolÍticos. seM cresciMento econôMico, é Muito Mais” r e p o r ta g e m eneRGia eneRGia dodeseRto o projeto desertec quer construir uma vasta estrutura de produção e captação de energia solar da áfrica e do oriente médio para a europa megaprojeto de 400 bilhões de euros preVê a construção de usinas solares no norte da áFrica para abastecer paÍses da região e atender a 15% da demanda da europa rePortageM beto gomes 40 [ bs ] tenções em julho de 2009, em conjunto com 11 empresas de diferentes setores. Os gastos, estimados em 400 bilhões de euros, são tão superlativos quanto o tamanho do empreendimento: uma vez funcionando a pleno vapor, a expectativa é de que o Desertec tenha 100 GW de capacidade instalada – o suficiente para abastecer o Brasil inteiro durante seis meses. Uma das principais metas do projeto é atender a 15% da demanda da Europa no ano de 2050. meGaestRutuRa Para atingir esse objetivo, uma enorme estrutura precisa ser erguida nos dois lados do Mar Mediterrâneo: usinas solares e uma complexa rede de transmissão, que prevê a colocação de cabos sob o oceano que separa a África da Europa, instaladas em uma área de seis mil quilômetros quadrados. A primeira experiência deve acontecer no Marrocos. A ideia é que o país receba as primeiras usinas, equipadas com milhares de painéis solares e espelhos refletores, desenvolvidos especialmente para captar o calor do Sol e alimentar um sistema que o transforma em eletricidade. O maior desafio, no entanto, não é logístico. Embora os desertos do norte da África recebam uma quantidade generosa de radiação solar, eles não são tão fartos em superfícies planas – o que dificulta a construção das plantas e não ajuda na captação de energia. Outras questões complicadas são as do plano político. “Cada país tem suas próprias leis e regulamentações, com diferentes formas de subsídios e diferentes regulações para a exportação e importação de energia elétrica”, acrescenta Gerhard Hofmann, vice-presidente sênior da Desertec Industries, a empresa responsável pela parte de desenvolvimento do programa. Paralelamente, a Desertec Foundation atua para divulgar o projeto e encontrar parceiros e investidores. Existem, ainda, outros obstáculos que podem esfriar os ânimos dos cientistas. A realidade de mercados tão distintos na Eumena fatalmente trará retornos diferentes de investimentos, compondo um cenário de incertezas que não agradam aos financiadores. Outra questão é a tecnologia. O melhor mix de matrizes ainda não foi determinado, e todas as possibilidades são consideradas pelos especialistas. solaR com eólicas Alguns estudos já foram conduzidos, e o projeto mais cotado, até o momento, é a utilização de energia solar contínua (CSP, na sigla em inglês) apoiada por usinas eólicas para conduzi-la ainda em terras africanas. Da costa norte da África, cabos especiais cruzariam o Mediterrâneo e levariam a eletricidade para a Europa, atravessando o oceano em diferentes pontos. “Todas as tecnologias essenciais para o Desertec já existem. Temos projetos na China e na Índia que demonstraram a viabilidade da transmissão de eletricidade em longas distâncias, com baixas perdas”, comenta Bernd Utz, porta-voz para o Desertec na Siemens, uma das empresas que integram o programa. Dessa forma, a meta é criar um ambiente político e regulatório favorável até 2012, enquanto os técnicos trabalham em paralelo com análises concretas de projetos de referência. Acredita-se que as medidas necessárias para levantar toda a estrutura e colocá-la em funcionamento levem, pelo menos, duas décadas. “Ainda estamos em fase de desenvolvimento. Definimos os problemas que têm de ser resolvidos e estamos em fase de captação de shareholders e parceiros associados”, comenta Gerhard Hofmann. Ele é cauteloso ao falar do futuro, mas está otimista com a possibilidade de o projeto sair do papel. “Quanto mais companhias aderirem ao programa e mais governos apoiá-lo, maiores serão as chances de sucesso”, avalia o executivo da Desertec Industries. A chanceler alemã, Angela Merkel, e o presidente da Comissão Europeia, José Manuel Barroso, já manifestaram seu apoio. Gigantes do setor elétrico na Alemanha, como a RWE e a E.ON, além de seguradoras do porte da Münchner Rück, também aderiram. Resta ultrapassar a maior fronteira que separa a África da Europa: o abismo político e econômico que há séculos divide o mundo [bs] desenvolvido dos países mais pobres do planeta. [ bs ] 41 do norte da África e do Oriente Médio podem virar uma importante fonte de energia para os países dessas regiões e de toda a Europa. Até 2050, a eletricidade de milhões de casas africanas e europeias pode ser gerada pelos raios de sol que incidem sobre as areias tórridas do Saara. Nessa faixa de nove milhões de quilômetros quadrados, o astro brilha durante cinco mil horas por ano. É uma quantidade formidável de calor, que alimenta a imaginação de um seleto grupo de especialistas. Eles são os mentores do Desertec, um ambicioso projeto, idealizado em 2003, que pretende pôr em prática o que já se sabe na teoria: a energia provida pelo Sol é dez mil vezes maior do que a necessária para abastecer toda a humanidade. Usar o sol do deserto é o óbvio que ninguém percebera. Aplicada à realidade local, a conta significa aproveitar apenas 0,3% da superfície dos desertos africanos para fornecer energia elétrica para toda a Eumena (sigla em inglês para a região que abrange a Europa, o Oriente Médio e o norte da África). Munidos dessa informação, os técnicos do Desertec imaginaram uma extensa rede para levar a energia solar das areias do Saara a três mil quilômetros de distância, no coração da Europa, já em forma de eletricidade. A iniciativa atraiu gigantes corporativos do porte do Deutsche Bank e milionários ilustrados como o príncipe da Jordânia, Hassan bin Talal, que assinaram uma carta de in- jun/jul 2010 jun/jul 2010 os deseRtos série ano da biodiveRsidade haroldo palo Jr. conseRvaR Florestas conservadas protegem a biodiversidade da fauna e da flora, a polinização e a manutenção de estoques genéticos dá lucRo um hectaRe de mata atlântica conseRvada vale de R$ 370 a R$ 930 poR ano. a pRimeiRa lei estadual de paGamento poR seRviços ambientais do bRasil Já está Funcionando, no espíRito santo 42 [ bs ] a superar, mas temos de reconhecer as contribuições importantes dessa iniciativa, como a mobilização dos proprietários. Também temos buscado inspirar políticas públicas para a conservação dos recursos naturais”, afirma a executiva. Partindo do conceito de serviço ambiental e dos benefícios derivados, tais como garantia de água doce, alimentos e matérias-primas diferenciadas, além de proteção da diversidade biológica, regulação do clima e controle de erosão, a fundação fez um cálculo e chegou a uma conclusão de valoração. Segundo a sua metodologia, um hectare de área florestal bem conservada na região da Bacia Guarapiranga pode valer até R$ 370, por ano, pela manutenção da qualidade da água, que garante a sobrevivência de inúmeras espécies e o abastecimento da Grande São Paulo. O dado é considerado essencial como referência de remuneração dos proprietários. Atualmente, o projeto paulista beneficia 13 proprietários de terras, que compreenderam a importância de manter protegidas as matas nativas, ameaçadas por muita pressão urbana. A experiência está sendo replicada no Oásis Apucarana, no Paraná, pela organização ambientalista Sociedade de Pesquisa em Vida Selvagem e Educação Ambiental (SPVS). Pelo menos 63 proprietários de terras do município, localizado na região norte do estado, começaram a ser remunerados, com valores que variam de R$ 850 a R$ 7 mil por ano. A Prefeitura de Apucarana é parceira da iniciativa. [ bs ] 43 além de estocar carbono e conservar espécies, as florestas da mata atlântica absorvem a água da chuva que se infiltra no solo e abastece lençóis freáticos e nascentes A falta de um marco legal e a carência de recursos financeiros são as principais barreiras à ampliação dos projetos de Pagamento por Serviços Ambientais (PSA) no Brasil. Na contramão das dificuldades, no entanto, algumas experiências bem-sucedidas demonstram a viabilidade desse mecanismo inovador, que concilia geração de renda e mobilização pela conservação da biodiversidade e de outros recursos naturais. No Dia Mundial do Meio Ambiente, 5 de junho, são positivas as mensagens de quem assumiu a vanguarda dessas iniciativas neste Ano Internacional da Biodiversidade da Organização das Nações Unidas (ONU). A Fundação O Boticário de Proteção à Natureza foi pioneira no desenvolvimento de uma metodologia que tornou possível a aplicação prática do mecanismo de PSA no Brasil. Tudo começou em 2004, quando foi criado o Projeto Oásis, ajustado e lançado em 2006 com o objetivo de premiar proprietários que mantenham áreas florestais conservadas na região da Bacia Guarapiranga, na Região Metropolitana de São Paulo. A área apoiada é considerada estratégica para a proteção de remanescentes de biodiversidade da Mata Atlântica e de importantes fontes de água, que abastecem cerca de 5 milhões de habitantes. Segundo a gerente da fundação, Leide Takahashi, no ano em que a organização faz 20 anos e se comemora o Ano Internacional da Biodiversidade, o Projeto Oásis se firma como exemplo de iniciativa que tem tudo para dar certo em países detentores de megadiversidade, como o Brasil. “Ainda existem muitos desafios jun/jul 2010 jun/jul 2010 RepoRtaGem elizabeth oliveiRa série ano da biodiveRsidade a falta de uM Marco legal e de garantias financeiras traVaM o PagaMento Pelos serViÇos aMBientais sessenta e um proprietários de terra, em cinco municípios, estão sendo pagos para conservar as matas e as águas cristalinas da bacia do Rio benevente, no espírito santo Na Grande São Paulo, o Projeto Oásis ajuda a proteger 657 hectares de áreas florestais bem conservadas, onde estão localizadas 82 nascentes de rios e outros corpos d´água que alimentam a Bacia Guarapiranga. “Estamos estudando a possibilidade de ampliar essa área, e buscamos parcerias”, adianta Takahashi. A Fundação O Boticario já investiu US$ 450 mil nos últimos cinco anos nessa iniciativa. O Projeto Oásis tem patrocínio da Mitsubishi Corporation Foundation e é apoiado pelo escritório Losso, Tomasetti e Leonardo de advocacia, que, voluntariamente, trata de toda as questões legais relacionadas às propriedades particulares participantes. Outros apoiadores institucionais da iniciativa são a Secretaria Estadual do Meio Ambiente de São Paulo e a Secretaria Municipal do Verde e do Meio Ambiente de São Paulo, além da Fundação Agência da Bacia Hidrográfica do Alto Tietê (Fabhat). 44 [ bs ] Partindo do princípio de que a proteção das florestas é fundamental para assegurar a oferta de água, além da manutenção da biodiversidade e outros benefícios ecológicos, o projeto Produtor de Água, que já beneficia produtores rurais de Extrema (MG) e Rio Claro (RJ), foi estendido para Joanópolis e Nazaré Paulista (SP), como ação de remuneração por serviços ambientais no âmbito das bacias hidrográficas dos rios Piracicaba, Capivari e Jundiaí. As atividades são lideradas pela organização ambientalista The Nature Conservancy (TNC), com apoio de uma rede de parceiros. A solução é viável do ponto de vista econômico, assegura Fernando Veiga, coordenador de Serviços Ambientais da TNC. “Na medida em que o PSA internaliza os benefícios da proteção ambiental, ele certamente gera um incentivo econômico positivo que pode ser uma poderosa ferramenta para frear a degradação ambiental.” No Rio de Janeiro, os produtores que recebem os pagamentos são responsáveis pela restauração florestal de aproximadamente 60 hectares e pela conservação florestal de 920 hectares. A remuneração anual varia de R$ 20 a R$ 60 por hectare. Em São Paulo, nove produtores assinaram contrato para a execução das atividades, que estão sendo iniciadas. Eles receberão aproximadamente R$ 28,9 mil, em valores que podem variar de R$ 75 a R$ 125 por hectare, ao ano. Em caráter pioneiro, os recursos [ bs ] 45 O Governo do Espírito Santo saiu na frente e criou a primeira lei estadual de pagamento por serviços ambientais no Brasil, em julho de 2008. Para tornar a legislação aplicável na prática, foi criado o Fundo de Recursos Hídricos (Fundágua), destinado à captação de recursos financeiros, que estão assegurando as ações de remuneração de 61 proprietários, em cinco municípios capixabas, participantes do projeto ProdutorES de Água. Eles ajudam a preservar 763 hectares de matas. Outros 35 processos estão em tramitação. Os investimentos nas ações de remuneração somam R$ 121,1 mil. FloResta e áGua jun/jul 2010 jun/jul 2010 leGislação inovadoRa Os primeiros pagamentos foram realizados em março de 2009, para proprietários do município de Alfredo Chaves, na bacia do rio Benevente. Gradativamente, outras regiões do estado estão sendo incorporadas ao projeto, que atua, também, nas cidades de Brejetuba e Afonso Cláudio, na bacia do rio Guandu, além de Mantenópolis e Alto Rio Novo, na bacia do rio São José. Os valores pagos podem chegar s R$ 930, por hectare, e dependem de critérios técnicos, tais como o estágio de conservação das florestas. Os contratos são de três anos. “Temos alcançado bons resultados com o ProdutorES de Água porque conseguimos superar dois grandes gargalos que impedem a ampliação do uso de PSA no Brasil: a falta de um marco legal específico e a garantia de recursos financeiros para dar suporte às ações de remuneração dos proprietários de áreas florestais”, explica Robson Monteiro, gerente de Recursos Hídricos do Instituto Estadual de Meio Ambiente (Iema). O gerente destaca que os recursos disponibilizados são oriundos da parcela de 3% do total dos royalties do petróleo e gás natural contabilizado no estado e da compensação financeira do setor hidrelétrico, podendo ser complementados com o orçamento do governo. “Temos uma fonte segura de recursos para manter o projeto.” Apesar disso, Monteiro ainda considera como desafio o envolvimento da iniciativa privada em ações desse tipo no Brasil. Pela experiência no Espírito Santo, os gestores estaduais foram convidados a colaborar para a criação de leis semelhantes em Pernambuco, Santa Catarina e no sul da Bahia. Enquanto estados e municípios se articulam para criar legislação específica, o gerente do IAB destaca que está tramitando no Congresso, desde meados de 2009, um projeto de lei que propõe a criação da Política Nacional dos Serviços Ambientais, cujo relator é o deputado federal Jorge Khoury (DEM-BA). para remuneração dos participantes do projeto Produtor de Água vêm da cobrança pelo uso da água direcionados pelo Comitê das Bacias Hidrográficas dos rios Piracicaba, Capivari e Jundiaí. A iniciativa também tem apoio da empresa Caterpillar. A expectativa em São Paulo é de estimular técnicas de conservação de solo em 390 hectares, além de recuperar outros 208 hectares de Áreas de Preservação Permanente e de conservar 540 hectares de floresta. As ações vão contribuir para proteger a biodiversidade de espécies da Mata Atlântica na região, além de promover a melhoria da qualidade dos mananciais de recursos hídricos que contribuem para o Sistema Cantareira, responsável pelo suprimento de 50% da água da Grande São Paulo. Em Minas Gerais, os projetos de restauração florestal estão sendo implementados integralmente em parceria com o Instituto Estadual de Florestas e com as ONGs Amanhágua, AMA Juiz de Fora e Quatro Cantos do Mundo. Esses parceiros estão se mobilizando para integrar o primeiro edital do Programa Bolsa Verde, iniciativa de Pagamento por Serviços Ambientais criada pelo governo do estado. Para Fernando Veiga, o aumento da percepção da sociedade leva a crer que a conservação da biodiversidade passará a ser vista não apenas como uma preocupação de ambientalistas, mas como condição essencial à garantia da própria sobrevivência humana. “Assim, podemos passar da oposição meio ambiente versus desenvolvimento para uma situação em que o meio ambiente saudável seja condição para o desenvolvimento”, conclui. [bs] r e p o r ta g e m planeJamento eM 2050, dois terÇos da PoPulaÇão Mundial ViVerá eM cidades, auMentando a deManda Por infraestrutura, qualidade de Vida e MoBilidade björn stigson: brasil deve começar a mudar a sua base produtiva como cabeR no FutuRo há grandes desaFios a eQuacionar até 2050 para criar um mundo sustentáVel com os recursos disponÍVeis no planeta rePortageM e foto pedro michepud 46 [ bs ] O Vision 2050 é dividido em cinco capítulos: Perspectivas de Negócios para 2050, Visão, Caminhos para 2050, Oportunidades e Conclusão. Neles, são sugeridos passos para que a sociedade consiga se sustentar até 2050. De acordo com o estudo, a população mundial vai se estabilizar nesse ano, em decorrência da expansão da educação, da urbanização e da equalização da participação das mulheres no mercado de trabalho. Dois terços da população viverão em cidades, o que exigirá adaptações e avanços em infraestrutura, qualidade de vida e mobilidade. Só na China, 600 milhões de pessoas vão se transferir do campo para a cidade nos próximos 30 anos, aumentando a demanda de infraestrutura e de bens de consumo. Apesar de a adaptação à urbanização ser imperativa para a sobrevivência das empresas, haverá, também, grandes oportunidades de crescimento. “A tempestade que vemos pela frente trará muitas possibilidades. O caminho para o mundo sustentável contém oportunidades e riscos, e vai mudar radicalmente as formas pelas quais as empresas fazem negócio. Muitas empresas vão coRRida veRde De acordo com Björn Stigson, os países que se tornarem sustentáveis serão os líderes da nova ordem mundial. No entanto, nenhum encontrou, ainda, o equilíbrio entre sua pegada ecológica e o nível de desenvolvimento humano (IDH) necessário para um mundo sustentável em 2050. “Se o Brasil quiser ser um líder global, deve se apressar”, afirma o presidente do WBCSD. A participação brasileira é tímida diante do seu potencial, muito atrás do empenho dos países da União Europeia, dos Estados Unidos e da China, nação empenhada em tornar-se a maior exportadora de tecnologia verde. A Índia também está adiantada, preparando soluções locais para melhorar a vida de sua população. “Se o Brasil quiser ser líder, precisa começar a mudar a base produtiva”, afirmou Stigson. “Este documento representa o primeiro passo de uma jornada de 40 anos”, afirma a conclusão do Vision 2050. “Trata-se de um chamado para o diálogo, um convite à ação. Colaboração, convicção e coragem serão necessárias para visualizar e implementar as mudanças para a prosperidade a longo prazo. Os empresários irão querer e terão necessidade de liderar a busca pela sustentabilidade. Convidamos os líderes políticos e a socie[bs] dade civil a se juntar a nós nessa jornada.” para ver o documento completo online, acesse o link (em inglês) http://tinyurl.com/38rlpme [ bs ] 47 dia e energia, sem danos à biodiversidade e ao ecossistema. É, também, uma ferramenta para auxiliar as empresas a desenvolver estratégias para uma economia de baixo carbono. “Precisamos de uma revolução verde”, resume Björn Stigson, presidente do WBCSD. Segundo ele, “o mundo está em transição para a sustentabilidade, a economia e a sociedade estão evoluindo e os desafios são enormes. Se não nos envolvermos, não será fácil realizar a mudança”. Segundo Stigson, há uma corrida verde global pela liderança das iniciativas de refor- pessoas e planeta mudar e se adaptar, enquanto outras serão desafiadas a fazer a transição”, diz o estudo. A longo prazo, o mundo precisa duplicar a produção agrícola sem expandir as áreas agriculturáveis, eliminar o desmatamento, aumentar o número de florestas e reduzir em 50% o nível de emissão de carbono em relação aos níveis de 2005. É preciso incorporar a sustentabilidade em todos os produtos, serviços e estilos de vida e, ao mesmo tempo, retirar 3 bilhões de pessoas da linha da pobreza. jun/jul 2010 jun/jul 2010 nove bilhões de pessoas vivendo bem com os recursos disponíveis no planeta em 2050. Essa é a missão do estudo Vision 2050, publicado pelo World Business Council For Sustainable Development (WBCSD) e lançado, em fevereiro, na Índia, e em maio, no Brasil, destinado a mobilizar as empresas para repensar seu papel em busca de uma sociedade sustentável. O relatório apresenta um panorama sobre os programas necessários para garantir que, nos próximos 40 anos, todas as pessoas tenham acesso a serviços básicos, como saúde, educação, alimentação, mora- ma. A Comunidade Europeia está na vanguarda, mas os EUA e a China estão avançando na transição para uma economia de baixo carbono, diz o executivo. Stigson não poupa elogios ao Brasil. “Vocês estão entre os países que mais investem em infraestrutura urbana. Além disso, têm uma ótima situação energética e uma grande biocapacidade, ou seja, a capacidade territorial de satisfazer as necessidades de consumo e de assimilar os resíduos dos seus habitantes. Só isso já representa um potencial substancial de liderança”, explicou. Para o executivo, o empresariado tem um papel fundamental na transição pela qual o planeta está passando, dado que os governos não conseguirão realizar a tarefa sozinhos. “O mundo não será bem-sucedido se o empresariado não oferecer soluções para o planeta, e as empresas não serão bem-sucedidas em sociedades fracassadas”, afirma. r e p o r ta g e m GRi Rita nardy tereza Fogelberg anunciou uma nova geração de indicadores GRi para promover a sustentabilidade novas ideias, velhos dilemas conFerência da global reporting initiatiVe propõe integrar relatórios Financeiros e de sustentabilidade para aumentar a transparência das empresas seis tendências para o futuro dos relatórios, nos próximos dez anos: • traceabilidade – que representa a capacidade de ampliar o alcance da informação ao longo da cadeia de valor; • integração de dados econômicos, sociais e ambientais; • liderança em iniciativas de governo (regulação); • novas fronteiras ambientais; • ratings e rankings (filtros para a sustentabilidade); • economias obscuras (o enfrentamento das práticas e dos setores ilegais). os vencedores do the gri readers´ choice awards 2010 Prêmio engajamento (engage award) banco do brasil Prêmio sociedade civil (civil society award) Vale Prêmio cadeia de Valor (Value chain award) natura cosméticos Prêmio investidor (investor award) banco do brasil Prêmio relatório Mais eficaz (Most effective report award) bradesco Vencedor geral (gri readers’ choice award) banco do brasil A presença do Brasil foi marcante, e não apenas na plateia. Os vencedores do prêmio GRI Reader’s Choice Awards 2010, que registra a opinião dos leitores sobre os relatórios, foram todos brasileiros. Banco do Brasil, Vale, Natura e Bradesco arremataram prêmios em seis categorias (veja box), refletindo o intenso engajamento das empresas e dos seus públicos internos na premiação. Para se ter uma ideia, dos 5.277 participantes de 40 países entrevistados pela pesquisa The Readers Report Survey, 3.724 eram brasileiros (71%). Mesmo assim, Nelmara Arbex, do GRI, considera que os relatórios de sustentabilidade no Brasil estão avançando. Segundo ela, não só aumentou o número de empresas que relatam utilizando as diretrizes GRI, como os processos de preparação estão mais estruturados. “Muita gente no Brasil se interessa pelos relatórios, e isso cria um ciclo de produção e participação útil para a sociedade e para o futuro da sustentabilidade”, diz Nelmara. Seguindo a mesma linha, Kumi Naidoo, diretor-executivo do Greenpeace, fez um apelo aos participantes para que não desistam do trabalho em prol da construção de uma agenda de sustentabilidade. Para Naidoo, é fundamental manter a confiança e encarar os desafios como o início de uma longa batalha. O ambientalista sul-africano disse que o Greenpeace continua firme em suas crenças, e que acredita na necessidade de ampliar o diálogo com as empresas para criar um modelo de desenvolvimento baseado na sustentabilidade. É preciso apostar em parcerias e ideias novas para vencer os velhos desafios. [bs] [ bs ] 49 48 [ bs ] s oB os ecos da recessão euroPeia, foi realizada, em maio, em Amsterdã, a terceira Conferência Global sobre Sustentabilidade e Transparência, promovida pela Global Reporting Initiative (GRI). Lideranças empresariais, especialistas e diversas organizações da sociedade civil discutiram os rumos da gestão e dos relatos da sustentabilidade. Três dias de evento reuniram 200 palestrantes e 1.200 participantes de 73 países. Vários prêmios foram conquistados por empresas brasileiras – Banco do Brasil, Vale, Natura e Bradesco – pelo engajamento de stakeholders nos relatos. econoMia Mais transParente os Melhores Para os leitores jun/jul 2010 jun/jul 2010 rePortageM rita nardy, de amsterdã “Precisamos repensar nosso modelo de produção para adequá-lo à biocapacidade do planeta. Como relatórios de sustentabilidade vão nos ajudar a construir a nova economia sustentável que desejamos?”, perguntou Ernst Ligteringen, diretor-executivo do GRI, durante a abertura da conferência. Para responder à pergunta, a organização lançou a publicação A Economia Transparente, elaborada em parceria com a consultoria Volans, de John Elkington. O estudo apresenta seis tendências para os relatórios nos próximos dez anos (veja box) e integra um novo programa, que estuda os cenários futuros no campo da sustentabilidade. Ligteringen apresentou duas metas da organização para a próxima década, que foram debatidas no evento. Em primeiro lugar, converter em prática obrigatória o relato público de desempenho em sustentabilidade para todas as grandes e médias empresas de países desenvolvidos e emergentes, até 2015. As empresas que optarem por não relatar seu desempenho deveriam explicar seus motivos publicamente, sugere a proposta. Na França, a obrigatoriedade existe desde 2001. O GRI também propôs integrar relatórios financeiros e de sustentabilidade em um único produto, testando o modelo até 2020. A ideia, segundo Teresa Fogelberg, diretora-executiva de Relações Externas do GRI, será desenvolvida por um Comitê Internacional com a participação de outras organizações relacionadas ao mercado financeiro e a práticas de responsabilidade social corporativa. O GRI abriu ainda a discussão sobre a necessidade de iniciar o desenvolvimento de uma nova geração de indicadores (G4) para suprir as demandas atuais. Falsa contRovéRsia retranca « R e p o R taG e m s i lv i a Wa R G a F t i G » opiniões diVergentes sobre temas polêmicos o cheFe deve seR temido ou estimado? jun/jul 2010 teMido Por definição, a posição de chefia é dotada do poder inerente, instituído pela organização, de despedir ou de promover um funcionário, o que, por si só, é suficiente como instrumento de pressão. Portanto, o chefe não precisa ser “linha dura”. Precisa ser ele mesmo, apostar no seu estilo pessoal e dar espaço para o subordinado contribuir com a organização. Todo ser humano gosta e precisa dar a sua contribuição, o que se consegue somente se houver liberdade para atuar, esforçar-se ao máximo e sentir-se gratificado pelo resultado, como pessoa e como trabalhador. A premissa vale para todos os empregados, dos menos aos mais qualificados. Dentro do conceito de sustentabilidade, o que se discute é que os recursos humanos não devem ser vistos como recursos abundantes, mas sim escassos, para que cada indivíduo seja valorizado e se sinta confortável para se manifestar e discutir questões referentes ao trabalho. Evidentemente, a própria organização se beneficia com isso. A missão do chefe como líder é, sobretudo, importar-se com as pessoas e facilitar as condições para que seus coordenados ajudem uns ao outros. Esse é o sentido de construir uma equipe, que se caracteriza por um grupo em que os membros cooperam mutuamente. Enquanto a sociedade, em geral, estimula a competição e o individualismo, cabe ao líder motivar a cooperação, gerenciar eventuais conflitos e emancipar seus funcionários, ensinando-os a se responsabilizar por si mesmos. Para tanto, é fundamental que utilize seu poder de referência, e não o de força. Segundo pesquisas, em grande parte das organizações a estratégia de gestão de pessoas não está alinhada à estratégia de resultados. Como consequência, as empresas não promovem o aculturamento de seus funcionários no tocante a missões, visões e valores, e o público interno, por sua vez, não adquire consciência da importância de se ajustar aos processos e às necessidades de resultado do negócio. Disso resulta, frequentemente, uma postura descomprometida e individualista, o que induz as empresas a valorizarem gestores e líderes com um perfil comportamental “linha dura”, capaz de garantir a produtividade diária. Caso contrário, não se sustentam. Na prática, o chefe linha dura é aquele que orienta constantemente o trabalho de cada funcionário, de acordo com o planejamento prévio e eventuais intervenções estratégicas. Deve ter a visão macro do negócio e conhecer o papel de cada um para cobrar o desempenho, separando o emocional do profissional e deixando de lado aspectos sentimentais para exigir o cumprimento das metas. Isso significa ser direto e objetivo, com foco nos resultados. Em organizações que ainda não realizaram nenhuma iniciativa de aculturamento, o chefe linha dura pode ser visto como alguém cruel, mais temido do que respeitado. Já em empresas que iniciam esse trabalho, ele passa a ser visto como um estrategista que está cumprindo sua função para assegurar que todos os demais também façam sua parte. Para tanto, é importante que a política de Recursos Humanos torne as estratégias da empresa transparente para todos. 50 [ bs ] estiMado e d ua r d o b a s t o s , consultor de recursos humanos e professor de psicologia do trabalho e saúde do trabalhador na universidade metodista de são paulo e l i s a n g e l a l i m a F a V a r o, consultora e coach de recursos humanos