INSOLAÇÃO, RADIAÇÃO SOLAR GLOBAL E

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INSOLAÇÃO, RADIAÇÃO SOLAR GLOBAL E
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INSOLAÇÃO, RADIAÇÃO SOLAR GLOBAL E RADIAÇÃO LíQUIDA NO BRASIL
Frederico Luiz Funari 1
José Roberto Tarifa
2
RESUMO
Foi realizado um estudo com os seguintes objetivos:
- Contribuir para o conhecimento da insolação, radiação solar
global e radiação líquida no Brasil;
- Determinar a potencialidade regional do nosso país quanto a
estes parãrnetros climáticos;
- Estimativa do balanço de radiação por intermédio de urna
metodologia geográfica, com ênfase na elaboração e análise
espacial a nível de território brasileiro.
Foram usados dados meteorológicos de 204 estações. Na ausência
de dados medidos de radiação solar, foi empregada urna equação
do tipo Angstr6m (1). Para a estimativa da radiação efetiva
terrestre foi usada a formulação de Linacre (3).
Os resultados são apresentados em cartogramas anuais, para cada
elemento estudado.
A análise dos resultados permitiu as seguintes constatações:
- As equações de Angstr6m e Linacre mostraram-se dentro da
precisão exigida pelas escalas temporal e espacial empregadas.
- Através das cartas foi constatada a influência dos fatores
geográficos.
- Embora possuindo áreas de índices baixos, o potencial geral
médio do Brasil é elevado: 2522 hs/ano de insolação (~7,O hs/
dia); 427 ly/dia de radiação solar global e 237 ly/dia de
radiação líquida.
- Os resultados deste estudo poderão ser aplicados para o
planejamento dos espaços urbanos e agrários, no nível
regional.
1.
INTRODUÇÃO
A energia provinda do Sol, que atinge a superfície da Terra e
o fator mais importante no desenvolvimento dos processos
físicos que geram o tempo meteorológico e o clima.
A insolação vem a ser o número de horas de brilho solar
enquanto a radiação solar global representa a sorna da radiação
vinda diretamente do Sol, acrescida da radiação difundida pelas
partículas e gases da atmosfera.
A radiação líquida é o saldo do balanço de radiação, ou seja,
é o resultado das trocas de energia que se estabelecem na
atmosfera condicionadas pelo fluxo de radiação emitida pelo
Sol, predominantemente em ondas curtas, e pela radiação
1) Dept9 de Meteorologia -Instituto Astronõmico e Geofísico-USP
2) Laboratório de Climatologia - Instituto de Geografia - USP
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terrestre, de ondas longas emitidas pela sua superfície.
Os estudos de insolação e radiação solar existentes no Brasil
são poucos, incompletos e de data relativamente recente: SERRA
(8) estudou em nível sazonal e anual a insolação; RATISBONA
(7) elaborou uma carta anual de horas de brilho solar usando
estações selecionadas; e SERRA (9), em trabalho sobre o clima
do Brasil, estabeleceu a localização das regiões de valores
extremos para as horas de brilho solar.
Para a radiação solar global há o trabalho de NUNES et alii.
(4), apresentado na forma de mapas mensais e calcado em dados
estimados.
Não existe ainda qualquer estudo sobre radiação líquida
abrangendo todo o Brasil.
Há, portanto, necessidade de suprir a falta de conhecimento dos
elementos estudados na escala espacial do nosso território.
Em virtude de suas dimensões continentais, aliado ao fato do
custo relativamente elevado, há grande dificuldade de se
instalar instrumental para as medidas de insolação, radiação
solar global e radiação líquida.
Os objetivos principais deste trabalho são:
- Contribuir para o conhecimento da insolação, radiação solar
global e do balanço de radiação no Brasil;
- Determinar a potencialidade regional do nosso país quanto a
estes parãmetros.climáticos;
- Estimativa do balanço de radiação por intermédio de uma
metodologia geográfica, com ênfase na elaboração e análise
espacial a nível de território brasileiro.
O nosso estudo tem algumas limitações, principalmente decorrentes
da baixa e irregular densidade da rede coletora e heterogeneidade
dos períodos de observação.
Alguns elementos meteorológicos, como temperatura do ar, umidade
relativa do ar e radiação solar global, têm registros falhos e
ausentes em muitas es~ações.
As causas principais dessas dificuldades são o elevado preço do
instrumental, geralmente importado, sua operação e manutenção,
e também a correta interpretação e análise dos registros
obtidos.
2.
METODOLOGIA
Neste trabalho foram usados dados de 204 estações meteorológicas,
do INEMET e outras entidades. Além dos valores de insolação e
radiação solar global, foram empregados dados de temperatura do
ar medidos ou estimados sega VASCONCELLOS & TARIFA (10).
Na ausência de dados de radiação solar global medidos, a
estimativa se baseou em dados de insolação utilizando-se de uma
técnica proposta por ANGSTRCM (1).
A equação tipo ANGSTRCM utilizada foi a seguinte:
Qg = Qo
(la +b -n)
N
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onde Qg é a radiação solar ao nível do solo
(ly/dia); Qo e
a radiação solar no topo da atmosfera (ly/dia)
n/N é a razão
de insolação; "a" e "b" são parâmetros da reta de regressão.
A radiação líquida é geralmente estimada a partir de elementos
meteorológicos usualmente medidos pela rede de estações e
postos. A formulação mais empregada é a estabelecida por BRUNT
e ajustada por PENMAN (6) que, no nosso caso, devido à pequena
quantidade de dados de umidade relativa registrados, não pode
ser usada:
Rb
=
a T ~ (0,56 - O, O9
-J ed
j [O ,1 + O, 9
~ J
(ly/dia)
onde Rb é a radiação efetiva terrestre (ly/dia); a é a constante
de Stefan-Boltzman (l,191xlO- 7 cal.cm- 2 dia- 1 .K) i Ta é a
temperatura média do ar (K); ed é a tensão atual do vapor d'água
(mm Hg); n/N é a razão de insolação.
A solução encontrada foi o emprego da equação de LINACRE (3),
de uso mais fácil, pois não necessita de dados de umidade
relativa, e com precisão igual o~ ligeiramente superior à de
BRUNT-PENMAN (6), na escala temporal e espacial em que foi
utilizada.
A formulação de LINACRE (1967) para obter a radiação líquida e
a seguinte:
Q
n
= Q
g
(1 - a)
-
R
b
onde Qn é a radiação líquida (ly/dia) i ~ é o albedo;
Rb = 0,00032 (1 + 4 n/N) (lOO-T) .1440 (ly/dia).
Pa~a a estimativa da radiação líquida, foram adotados valores
de albedo, obtidos da bibliografia.
Em nosso país existem poucas séries de medidas de radiação
líquida.
Uma delas é a obtida por OMETTO (5), para PiracicabaSP, no ano agrícola 1966/67. Adotando o albedo de 0,20
empregado por aquele autor, aplicamos a fórmula de LINACRE (3)
aos dados de Piracicaba do citado ano. A correlação encontrada
foi 0,95, entre a estimativa e os dados medidos de radiação
líquida; a figo 4 apresenta a comparação entre a estimativa
pela equação de Linacre (1967) e as medidas obtidas por OMETTO
(1968). Com os mesmos dados e utilizando a equação de Brunt
modificada por PENMAN (6), foi encontrado um coeficiente de
correlação de 0,94.
Os valores de insolação, radiação solar slobal e radiação
líquida, foram plotados em uma carta de 1:5.000.000. No traçado
das isolinhas, considerou-se os aspectos geográficos tais como:
vegetação, hidrografia, orografia, geomorfologiai assim como
os elementos climáticos: nebulosidade e chuva (FUNARI, (2)).
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3.
RESULTADOS
As cartas de insolação, radiação solar global e radiação
líquida (Fig. 1,2 e 3) permitiram a visualização da distribuição
espacial desses elementos e sua relação com os vários atributos
regionais do Brasil.
Na região norte, a insolação é menor (1800 hs/ano) nas áreas
com maiores indices de precipitação. A radiação solar global
apresenta valores altos (450 ly/dia) e com pouca variação
devido a transmissividade elevada da atmosfera. Em virtude da
uniformidade do relevo e albedo, a radiação líquida apresenta
também yalores elevados (250 ly/dia).
No nordeste, os índices elevados da insolação (3000 hs/ano) são
explicados pela baixa nebulosidade, principalmente no sertão.
A radiação solar global e a radiação líquida apresenta também
valores máximos de 450 e 250 ly/dia respectivamente.
Na região centro-oeste, nas áreas onde ocorrem maiores
precipitações, os valores de insolação são mais baixos (2200 hs/
ano). A radiação solar global e radiação líquida apresentam-se
com índices semelhantes à região norte.
No sudeste brasileiro, a distribuição da insolação é
condicionada aos fatores relevo, nebulosidade e precipitação.
A radiação solar global e a radiação líquida se distribuem mais
irregularmente devido também à nebulosidade, como é o caso
da Bacia do Rio Doce, onde os índices são bastante baixos,
sendo de 250-300 ly/dia para a radiação global e de menos de
200 ly/dia para a radiação líquida. Na radiação líquida deve
ser considerado ainda o albedo, que é variado devido ao intenso
uso do solo.
Na região sul, todos os elementos sofrem o efeito orográfico,
que produz um forte gradiente no sentido do litoral para o
interior.
Através da distribui~ão espacial da insolação, radiação solar
global e radiação líquida pode-se verificar a potencialidade
do Brasil quanto à energia solar.
4.
CONCLUSÕES
Com base nos resultados obtidos sao válidas as seguintes
conclusões:
1 - A equação de ANGSTRÓM(l) , para a estimativa da radiação
solar global, apresentou-se dentro da precisão exigida pelas
escalas temporal e espacial empregadas.
2 - Quando utilizada, a fórmula de LINACRE (3) para determinação
da radiação efetiva terrestre (Rb = 0,00032 (1+4 n/N) (lOO-T).
1440 ly/dia) mostrou-se comparável à equação de BRUNTPENMAN (6) (Rb= OT a4 (0,56-0.09 -J'"'éQ) (0,1+0,9 n/N) ly/dia)
3 - De modo geral, as regiões que se destacam por possuírem
valores altos de insolação, radiação solar global e
radiação líquida, são a norte e nordeste, bem como em
grande parte da região centro-oeste.
4 - Embora possuindo áreas de baixos índices, o potencial geral
do nosso país é bem elevado: 2522 hs/ano de insolação
11O
(~7,0 hs/dia); 427 ly/dia de radiação solar global e 237
ly/dia de radiação líquida (valores médios de todas as
estações.
5 - Os valores do balanço de radiação são variados de um local
para outro e no decorrer do ano nas regiões sudeste e sul,
devido à ação antrópica (uso diferenciado do solo).
REFER~NCIAS
BIBLIOGRÁFICAS
1. ANGSTRÓM, A.
Solar and terrestrial radiation. Quart. J.R.
Met. Soe., London, 50: 121-126, 1924.
2. FUNARI, F.L.
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líquida no Brasil. Ed. do autor. S. Paulo, 1984. 69p +
pranchas e tabelas. (Dissertação de Mestrado - Dept9
Geografia - F.F.L.C.H. - USP)
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of the Irrigation and Drainage Division. Proceedings of
the American Society of Civil Engineers, 93 (IR 4):
61-79, 1967.
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(Relatório INPE - 1190 - NTE/llO)
5. OMETTO, J.C. Estudo das relações entre: radiação solar
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Scient. Publ. So. Vol. 12, 1976. p. 219-293.
8. SERRA, A.B. Atlas Climatológico do Brasil (Mapas
selecionados), Rio de Janeiro. Escritório de Meteorologia,
1969, 100p.
9.
Climatologia do Brasil. Edição mimeografada.
Rio de Janeiro. Conselho Nacional de Pesquisas-CNPq.
Fase. 21, 1977.
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Revista de Geografia, S. Paulo, 1983 (no prelo)
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Fig.4 - COMPARAÇÃO
ENTRE A ESTIMATIVA PELA EQUAÇÃO DE L1NACRE,
(1967) E AS MEDIDAS OBTIDAS POR OMETTO(1968),PARAPIRACICA8A - SP.