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Universidade de São Paulo Escola de Artes, Ciências e Humanidades Projeto de Formatura I CARACTERIZAÇÃO E TAXA DE ENTRADA DE PELLETS PLÁSTICOS NA PRAIA DO TOMBO DO MUNICÍPIO DE GUARUJÁ - SP Gabriel Hirata de Lima Orientador: Ednilson Viana São Paulo 2012 Sumário 1. Introdução .................................................................................................................. 03 2. Objetivos .................................................................................................................... 12 3. Área de Estudo ........................................................................................................... 13 4. Metodologia ............................................................................................................... 17 5. Resultados e Discussão .............................................................................................. 21 6. Conclusão .................................................................................................................. 43 7. Referências Bibliográficas ......................................................................................... 46 1. Introdução O que é Lixo Marinho: Os oceanos, que já foram considerados o berço da vida, hoje, sofrem com as ações antrópicas na Terra. A atual forma de consumo desenfreado praticado pela sociedade gera toneladas de lixo por dia espalhadas pelo mundo, e pela falta de um descarte final ambientalmente adequado, muitos materiais acabam indo para os mares, degradando a paisagem costeira e a vida marítima. De acordo com as autoras Araújo e Costa (2003), os mares tem sido usados como depósito de resíduos humanos, desde efluentes líquidos sanitários ou industriais até as mais diversas classes de lixo, como plásticos, vidros e materiais radioativos ou tóxicos, há muito tempo, sem a consciência de que os oceanos não tem capacidade ilimitada de assimilação desses rejeitos. A United Nations Environment Programme (UNEP), 2005, define o lixo marinho como qualquer resíduo sólido manufaturado ou industrializado que tenha sido descartado, depositado ou abandonado em ambiente marinho ou costeiro, por qualquer fonte. O lixo que atinge as referidas áreas pode ser de fontes terrestres, que incluem os resíduos deixados pelos freqüentadores das praias, os provenientes de drenagem de rios e lançamento de esgotos e a própria geração de resíduos nas cidades costeiras, ou de fontes marinhas representadas pelas plataformas oceânicas e por navios e barcos de pesca (IVAR DO SUL, 2005). Como exemplo dessas últimas fontes citadas, temos materiais de pescas perdidos em alto mar como linhas, redes e outros artefatos, que além da contaminação, trazem riscos a fauna aquática (ARAÚJO & COSTA, 2003), e a perda ou vazamento da própria carga dos navios (UNEP, 2005). Frequentemente, o lixo marinho é encontrado próximo a sua fonte, mas também pode ser transportado por longas distâncias pelos ventos e correntes marítimas, no substrato dos oceanos e das águas costeiras ou flutuando na coluna d’água. Isso explica sua ocorrência em locais aparentemente improváveis, como praias desertas, ilhas oceânicas ou recifes costeiros (UNEP, 2005). A maior parte da população mundial vive em zonas costeiras, e a tendência é o aumento dessa concentração demográfica. Consequentemente cresce o volume de lixo gerado, que aliado ao rápido aumento da produção de materiais sintéticos persistentes, devido ao culto ao “descartável”, à ineficiência dos sistemas de coleta municipais e à baixa taxa de reaproveitamento e reciclagem, fazem aumentar a quantidade e tipo de lixo que terão seu descarte inadequado (ARAÚJO & COSTA, 2003). Todos esses fatores reunidos evidenciam que as principais fontes de lixo marinho são terrestres, segundo a autora J. Ivar do Sul (2005), representam 80% do lixo presente nos oceanos. Não há dados recentes precisos sobre a quantidade de lixo marinho que existe no mundo. Mas, existem estimativas de que 8 milhões de partículas de lixo marinho são lançados no mar todo dia. E que destes, 5 milhões são provenientes de navios (UNEP, 2005). Outro dado de escala global, afirma que até 80% do lixo encontrado nas praias chega à costa através dos rios próximos. Os resíduos chegam com facilidade à rede hidrográfica, pela ação do vento e das fortes chuvas ou são lançados diretamente nela, e então chegam ao ambiente costeiro (ARAÚJO & COSTA, 2003). O Brasil, país de 7.408 km de extensão de linha de costa e cerca de 442 mil km² de zonas costeiras possui 5 das 9 maiores regiões metropolitanas situadas à beira-mar, e grande parte da população não dispõe de redes de esgotos, nem de sistema de coleta de lixo, o que torna os efeitos ambientais dessa concentração ainda maior (ARAÚJO & COSTA, 2003). No país ainda são escassos os estudos específicos sobre lixo marinho. Os Estados que concentram os principais estudos realizados são Rio Grande do Sul, Pernambuco e Rio de Janeiro. Há necessidade de ampliar os trabalhos qualiquantitativos, que caracterizem a composição, tamanho e local de ocorrência dos resíduos (IVAR DO SUL, 2005). Impactos do lixo marinho: No passado, o lixo acumulado nas zonas costeiras era considerado desagradável aos olhos, mas pouco associado a questões ambientais ou de saúde. Os primeiros trabalhos relacionados ao lixo no ambiente marinho foram motivados, provavelmente, pelo impacto estético na paisagem (OLIVEIRA, 2008). Hoje, já se sabe que, além das perdas estéticas, o lixo pode trazer sérios prejuízos, tanto econômicos quanto biológicos, ao ambiente marinho (ARAÚJO & COSTA, 2003). O lixo marinho tornou-se um problema severo, que afeta os oceanos do mundo inteiro. É a causa da morte e de lesões de inúmeros animais marinhos e aves, que ingerem ou ficam enroscados nos resíduos, ao confundi-los com alimentos. Estes configuram os principais impactos diretos à vida marinha (ALLSOPP et al., 2005). Em pesquisa realizada por Tourinho (2007), 100% das tartarugas marinhas que tiveram seus tratos gastrointestinais analisados estavam contaminados com resíduos sólidos. Muitas vezes estes resíduos são aqueles materiais perdidos ou abandonados pela atividade pesqueira, que embora tenham sido descartadas ainda desempenham sua função, capturando animais que não serão consumidos ou comercializados, como peixes e tartarugas. Esse fato é conhecido como pesca-fantasma (SCHNEIDER, 2009). A dispersão de espécies invasoras é outro risco potencial associado ao lixo marinho. Os resíduos que flutuam, o plástico, por exemplo, podem servir como meio de transporte para espécies de animais que se fixam em sua estrutura e são levadas para outra região, onde podem se instalar, ameaçando os ecossistemas locais (OLIVEIRA, 2008). Esses materiais, podem eventualmente afundar, e seu acúmulo no solo oceânico pode afetar os organismos ali presentes, impedindo que haja trocas gasosas entre a água superficial com a água dos poros dos sedimentos, resultando na diminuição dos níveis de oxigênio (ALLSOPP et al., 2005). Nos recifes o lixo pode impedir ou dificultar a penetração de luz e as trocas gasosas, afetando principalmente organismos fixos (ARAÚJO & COSTA, 2003). Segundo Nash (1992), os prejuízos para atividade pesqueira decorrentes da ocorrência de lixo marinho podem ser diretos ou indiretos, através da diminuição da captura de pescado ou causando danos aos equipamentos de pesca e aos motores dos barcos, o que torna a atividade mais onerosa. Os pescadores artesanais também sofrem as conseqüências, pois a presença de resíduos flutuantes e a ocorrência de lixo nas redes e anzóis de pesca diminuem a produção e até impedem a própria atividade, pela falta de equipamento (ARAÚJO & COSTA, 2003; IVAR DO SUL, 2005). O lixo marinho também causa a degradação da beleza cênica e dos aspectos estéticos dos ambientes costeiros e, consequentemente, traz prejuízos econômicos à indústria do turismo dessas regiões. As pessoas que procuram estes destinos são cada vez mais exigentes quanto a sua qualidade (IVAR DO SUL, 2005). A necessidade de limpeza contínua das praias agrava a situação, pois gera um grande gasto financeiro para o município, o qual poderia ser evitado (ARAÚJO & COSTA, 2003). O lixo marinho não é um risco só para os organismos aquáticos. Pode ser tratado também como um problema de Saúde Pública (OLIVEIRA, 2008). O acúmulo desses materiais nas praias favorece o desenvolvimento de microorganismos patogênicos e oferece abrigo a animais vetores de doenças, como ratos e baratas (ARAÚJO & COSTA, 2003). Além da saúde, causa problemas também nas propriedades e sustento das pessoas, como: impossibilidade da pesca, incrustação e enredamento nas hélices das embarcações e contaminação de marinas e portos comerciais (UNEP, 2005) Os significativos impactos do lixo marinho indicam a necessidade da diminuição dos níveis de poluição por estes resíduos nos oceanos. Deve-se adotar medidas de prevenção eficientes, para que os prejuízos ambientais e econômicos não se agravem (ARAÚJO & COSTA, 2003). Tipos de lixo marinho: Os resíduos sólidos que são levados ao ambiente marinho, de diversas formas, causam prejuízos à biota e às atividades econômicas locais, como turismo e pesca. O lixo marinho resulta de lançamento proposital, manipulação ou eliminação descuidada. De acordo com Araújo e Costa (2003) os fatores que mais influenciam a produção de lixo marinho são o número de habitantes no território, seu nível educacional e poder aquisitivo, além da eficiência do sistema de coleta. A introdução destas substâncias no ambiente marinho propicia diversos efeitos deletérios que se associam aos principais poluentes conhecidos neste ambiente, como metais pesados, hidrocarbonetos (derivados de petróleo), esgoto, pesticidas, compostos orgânicos sintéticos, sedimentos antrópicos e resíduos sólidos (WINDOM, 1992). Os derivados de petróleo como plásticos, nylon e isopor, são de difícil degradação natural e são amplamente usados em produtos industrializados. São oriundos principalmente dos países mais desenvolvidos, e sua geração aumentou drasticamente nos últimos 50 anos, devido ao atual estilo de vida das populações humanas (ARAÚJO & COSTA, 2003). A abundância de produtos plásticos tem criado sérios problemas ambientais. Eles chegam aos oceanos sob diferentes formas, desde sacolas plásticas e garrafas até grânulos de 1 mm de diâmetro, os chamados pellets, que são a forma básica de comercialização dessa matéria-prima. Os plásticos não degradam rapidamente no ambiente porque são resistentes ao calor, ao ar e à água. A degradação provocada pela ação das radiações solares transforma os plásticos em partículas cada vez menores, mas todas mantêm as características originais – continuam sendo plásticos. Por essas razões, a quantidade desse resíduo nos oceanos cresce continuamente (TURRA; MALUF; MANZANO, 2008). Uma pesquisa realizada pela U. S. Commission on Ocean Policy (2004) constatou que a maioria do lixo marinho tinha sua origem nas atividades recreacionais e litorâneas, como são as sacolas plásticas, canudinhos, embalagens de alimentos e latinhas de alumínio. O lixo associado ao tabagismo ficou em segundo lugar. Segundo Araújo (2003) os resíduos encontrados com maior freqüência estão relacionados à alimentação, pesca, limpeza doméstica e esgoto/higiene pessoal, indicando a forte contribuição de fontes baseadas em terra. Alguns resíduos encontrados no mar podem ser indicadores de ineficiência nos serviços públicos de recolhimento, disposição e tratamento do lixo, como é o caso de itens utilizados na limpeza doméstica, higiene pessoal e esgoto, os quais dificilmente são deixados por banhistas nas praias (ARAÚJO, 2003). Resíduos de serviços de saúde provenientes de hospitais, clínicas e laboratórios, também já foram encontrados no ambiente marinho. Descartados de forma incorreta, esses materiais podem causar sérios riscos à população por serem bastante perigosos, tais como materiais perfurocortantes, frascos de remédios e restos cirúrgicos. Os mesmos deveriam ser incinerados em local apropriado (ARAÚJO & COSTA, 2003). O lixo de fonte marinha é constituído pelos despejos de embarcações (que podem ser intencionais ou acidentais), incluindo as atividades pesqueiras, e as atividades de plataformas de óleo e gás. Os resíduos sólidos das atividades pesqueiras, em particular, são facilmente identificados, pois são bem característicos: redes de pesca, anzóis, armadilhas e recipientes de combustível (TOURINHO, 2007; SCHNEIDER, 2009). A atividade no mar é potencial geradora de impactos em função de suas necessidades operacionais básicas: geração de lixo doméstico e esgoto, queima de combustíveis fósseis, uso de água potável e água do mar. Em relação aos petroleiros e navios químicos, a geração de impactos se deve principalmente ao transporte de cargas perigosas (MARTINS, 2006). Segundo Martins (2006), metade da produção anual de petróleo, 1,5 bilhões ton/ano, é transportada por via marítima. Esse quantitativo tem levado à conseqüências que resultam no lançamento de cerca de 500.000 ton/ano de hidrocarbonetos no mar, provenientes de vazamentos acidentais provocados por navios, pelas atividades de exploração e pelas atividades de produção. Em 70% dos casos o lançamento ocorre durante as operações de carga e descarga desses navios nos portos e terminais. O petróleo possui componentes como o benzeno, tolueno e xileno, o BTX, que é a parcela mais tóxica para os moluscos marinhos e outros peixes quando ocorre um derramamento de petróleo no oceano. Os hidrocarbonetos de maior peso molecular formam gotas pegajosas semelhantes ao alcatrão que grudam nos pássaros, nos mamíferos marinhos, nas rochas e em outros objetos que entram em contato com o produto derramado (MARTINS, 2006). No Brasil, as indústrias do complexo químico, as mais importantes para a economia do país, estão localizadas na zona costeira e podem trazer sérios problemas à fauna aquática, caso não haja tratamento eficiente dos dejetos lançados. As indústrias de adubos e fertilizantes são as maiores responsáveis pelo aporte de nutrientes com metais pesados no litoral (CEMBRA, 1998). Os metais pesados, em escala global, não causam grande ameaça ao ambiente marinho. Ao contrário dos resíduos sólidos, das descargas de esgoto e dos derramamentos de óleo, que causam significativo impacto. Há estudos e conhecimento suficientes, sobre suas fontes, destinos e impactos no ambiente, para se desenvolver estratégias de gestão mais eficazes (WINDOM, 1992). Os pellets e seus impactos: A poluição marinha é uma das principais preocupações atuais relacionadas ao meio ambiente. O plástico é um dos vários poluentes que ameaçam os oceanos, e está distribuído virtualmente por toda a sociedade moderna e seu uso continua a se expandir devido à sua resistência à degradação (TURRA, MALUF, MANZANO, 2008). As características que o torna tão usado - baixa densidade e durabilidade também lhe asseguram ser um poluente persistente, tanto no meio aquático, quanto no terrestre (HOLMES, TURNER, THOMPSON, 2012). A matéria prima plástica é comercializada em forma de pellets. Plastic Pellets são grânulos de plásticos que correspondem à forma principal com que as resinas plásticas são produzidas e comercializadas para serem usadas como matéria prima para a criação dos mais variados objetos. São produzidos de várias formas (esféricas, ovóides e cilíndricas), tamanhos (de 1 a 5 mm) e cores (geralmente claras, brancas ou transparentes), dependendo de sua composição química e de seu propósito final. As resinas mais utilizadas no mercado, normalmente contem polietileno, polipropileno e poliestireno (EPA, 1993). Figura 1: Variedade de pellets (Fonte: Manzano, 2009). Na produção destes grânulos, conhecidos no Brasil como “lágrimas de Sereia”, também são adicionados compostos que alteram suas propriedades estéticas (cor e forma) e físicas (resistência térmica e dureza), ou características relacionadas com o processamento posterior (por exemplo: porosidade). Os aditivos apenas misturados com o polímero são em geral removidos/ lixiviados com maior facilidade, enquanto os incorporados quimicamente só são liberados se o plástico for degradado por processos químicos (TURRA, MALUF, MANZANO, 2008). Depois de produzidos, os grânulos são embalados e transportados até as indústrias de transformação para serem moldados das mais varáveis formas. Em vários pontos da cadeia produtiva do plástico, os pellets podem ser perdidos, de maneira não intencional, na natureza e chegar até os oceanos. O caminho até o ambiente aquático pode ser feito por meio das tubulações de efluentes urbanos e industriais, no caso dos produtores e processadores de grânulos; de vazamentos em caminhões, vagões de trem e barcos durante o transporte; como rejeitos de atividades realizadas em mar aberto (lavagem de porões de navios e despejos de resíduos de barcaças); além de eventuais acidentes com navios cargueiros durante as operações de manuseio de carga nos portos ou durante o transporte de carga pelo mar. (EPA, 2003; HESKETT et al., 2011; TURNER & HOLMES, 2011; TURRA, MALUF, MANZANO, 2008). Plastic Pellets tem sido encontrados em várias praias ao redor do mundo pela sua capacidade de se transportar por longas distâncias, pela durabilidade dos polímeros do plástico e pelo aumento de sua produção (HESKETT et al., 2011). E hoje é um importante componente da poluição marinha por resíduos sólidos. Por serem bem pequenos e translúcidos, geralmente são imperceptíveis na areia da praia, e embora não tenha a aparência desagradável de outros resíduos, adquirem relevância por sua quantidade e persistência no ambiente marinho, e pelos impactos ambientais e econômicos que causam (TURRA, MALUF, MANZANO, 2008). No ambiente marítimo, os pellets que são mais pesados que a água descerão para o fundo oceânico, e os mais leves, podem flutuar ou ficar em suspensão na coluna d’água. Assim, podem ser ingeridos por animais costeiros e marinhos, acidentalmente, ou por se confundirem com algas, ovos e larvas, ou mesmo com organismos de pequeno porte, colocando suas vidas em risco. Eles podem causar bloqueio do trato intestinal, reduzir a absorção de nutrientes ou ainda criar falsa sensação de saciedade em animais, como peixes e aves, reduzindo a busca por alimento e levando-os à morte por inanição (ENDO et al., 2005; EPA, 1993; TURNER & HOLMES, 2011; TURRA, MALUF, MANZANO, 2008). Segundo a Environmental Protection Agency (EPA) (1993), as aves marinhas são os animais que mais ingerem pellets. Cerca de ¼ das espécies de aves marinhas tiveram sua ingestão comprovada. Os grânulos causam a falsa sensação de saciedade nas aves, diminuindo seu apetite por comida, o que diminui suas reservas de energia e suas habilidades de viver em ambientes adversos. Além disso, os pellets podem servir como veículos para alguns compostos químicos tóxicos, pois adsorvem compostos orgânicos hidrofóbicos, como os poluentes orgânicos persistentes (POPs): o diclorodifeniltricloroetano (DDT), bifenil policlorado (PCB) e monofenóis. Essas substâncias aderem aos grânulos (levando a uma acumulação que pode alcançar um milhão de vezes o nível que normalmente apresentam quando dispersas na água), de forma que sua ingestão pode acarretar problemas hormonais nos organismos marinhos que os consomem, e, indiretamente, em humanos, já que muitos desses organismos, em especial os peixes, são comuns na dieta humana. (ENDO et al., 2005; HESKETT et al., 2011; HOLMES, TURNER, THOMPSON, 2012; TURRA, MALUF, MANZANO, 2008). Os pellets flutuantes podem, ainda, estar associados a outro problema: a migração de espécies exóticas, através da incrustação de propágulos, bactérias e algas, que podem causar desequilíbrios ecológicos para ecossistemas de outras regiões (MANZANO, 2009). Os grânulos também têm impactos econômicos, pois o derramamento dos grânulos durante sua cadeia produtiva representa perda de matéria prima (PIANOWSKI, 1997). O estudo sobre os plastic pellets é importante para entendermos os riscos associados às substâncias químicas encontradas nos lixos plásticos dos oceanos, e para possível identificação das fontes destes materiais. Podendo auxiliar os governos, os órgãos responsáveis pela proteção ambiental e o setor privado envolvido, na avaliação dos métodos de produção, processamento e transporte dos grânulos e na determinação de medidas consistentes para controlar e prevenir sua liberação para o ambiente. 2. Objetivos Objetivo Geral: O objetivo geral deste trabalho é estimar a quantidade de grânulos plásticos (pellets) que chegam diariamente à Praia do Tombo, Guarujá (SP) e caracterizá-los. Objetivos específicos: • Calcular a taxa de entrada dos grânulos plásticos utilizando a quantidade na linha de deixa como marcador; Análise quantitativa por ponto de coleta. Análise quantitativa por dia. • Analisar morfologicamente os pellets encontrados na praia estudada; • Contribuir com os dados gerados para o programa de monitoramento global de Poluentes Orgânicos Persistentes (POPs), o International Pellet Watch. 3. Área de estudo A área estudada foi a Praia do Tombo, localizada no município de Guarujá, litoral sul de São Paulo (Figura 2). Figura 2: Mapa do município de Guarujá (Fonte: Prefeitura Municipal de Guarujá). O Município de Guarujá localiza-se na Ilha de Santo Amaro, litoral do Estado de São Paulo, e é uma das nove cidades pertencentes à Região Metropolitana da Baixada Santista (RMBS). Sua população atinge 290.752 habitantes em uma área territorial de aproximadamente 143 km² dentro do bioma Mata Atlântica, e distante 84km da capital paulista (IBGE). Seus limites geográficos são o Canal de Bertioga, ao Norte, o Canal do Estuário de Santos, a Oeste, e o Oceano Atlântico ao Sul e Leste. As principais vias de acesso terrestre à cidade são: a Rodovia Cônego Domenico Rangoni (SP-55) (antiga Rodovia Piaçaguera Guarujá), a partir do entroncamento da Via Anchieta, em Cubatão, a Rodovia dos Imigrantes (SP-160) e as Rodovias RioSantos (BR-101) e Guarujá-Bertioga (SP-61) para quem vem do litoral norte do estado de São Paulo. Também é possível chegar à cidade via marítima através do Ferry Boat (Balsa) que parte das cidades de Santos e Bertioga. Guarujá é umas das 15 cidades consideradas como Estância Balneária pelo Estado de São Paulo por cumprir determinados pré-requisitos definidos por Lei Estadual, por possuir vocação turística e ter um histórico de atração de visitantes durante o ano inteiro. Isso lhe garante uma verba anual concedida pelo DADE (Departamento de Apoio ao Desenvolvimento das Estâncias), que deve ser investida em infraestrutura voltada ao turismo regional (GOVERNO DO ESTADO DE SÃO PAULO). O município de Guarujá, e mais especificamente, a Praia do Tombo, foram escolhidas para o presente trabalho por se situarem próximas ao Porto de Santos, o principal porto do Brasil, instalado no Canal do Estuário de Santos (figura 3). Figura 3: Em destaque: a Praia do Tombo e o Porto de Santos (Fonte: Google Earth). Santos é o polo da RMBS, mas todas as áreas urbanas dos municípios que a constituem são limítrofes e interdependentes. A Enseada de Santos sofre forte influência de Guarujá e também de Cubatão, onde há grande concentração de indústrias petroquímicas (MANZANO, 2009). O Porto de Santos possui uma área de 7,7 milhões de m², 3,7 milhões de m² na Margem Direita e 4,0 milhões m² na Margem Esquerda. Possui 13km de extensão de cais e um total de 59 berços, dos quais 49 são públicos e 10 privados (CODESP, 2012). Nessa área e em todo seu entorno, onde existem armazéns, depósitos, silos e pátios de manobras, ocorrem diversas emissões de poluentes para o ambiente estuarino e marinho, principalmente relacionado com perdas de produtos nas operações de carga e descarga, e lavagens de contêineres e porões de navios (MANZANO, 2009). Segundo a Companhia Docas do Estado de São Paulo (CODESP), o Complexo Portuário Santista responde por mais de um quarto da movimentação da balança comercial brasileira e inclui na pauta de suas principais cargas o açúcar, o complexo soja, cargas conteinerizadas, café, milho, trigo, sal, polpa cítrica, suco de laranja, papel, automóveis, álcool e outros granéis líquidos. A carga movimentada no Porto de Santos nos cinco primeiros meses de 2012 foi 5,7% maior do que o registrado no mesmo período do ano passado. A previsão para 2012 é movimentar em torno de 44,5 milhões de toneladas de granéis sólidos. Um navio cargueiro, por exemplo, o Angelic Power, que atracou no Porto de Santos no dia 28 de Outubro de 2012, tem capacidade para transportar 65.000 toneladas de pellets (CEDESP, 2012; PORTAL BRASIL, 2012). A grande movimentação de embarcações aliada à grande presença de indústrias petroquímicas na região possibilitam a emissão de pellets e outros resíduos no ambiente (MANZANO, 2009). Praia do Tombo: 24°00’50’’S; 46°16’22’’W A praia tem 856 metros de extensão e fica situada entre o Morro da Caixa d’Água e o Morro do Forte, em uma área urbanizada (Figura 4). A Praia do Tombo recebeu este nome devido à sua formação geológica, que junto com as fortes ondulações, formam alguns buracos na areia que podem provocar “tombos” aos banhistas. No ano de 2010 a praia recebeu o certificado internacional Bandeira Azul concedido pela organização não-governamental dinamarquesa Foundation for Environmental Education (FEE). Esta instituição é vinculada junto à União Européia e à United Nations Environment Programme (UNEP) e concede este selo às praias segundo critérios de Educação e Informação Ambiental, Qualidade da Água, Gestão Ambiental e Segurança e Acessibilidade (FEE, 2012). Para atender às exigências da ONG, a prefeitura do município tratou as fontes de poluição do local, inclusive o esgoto residencial e criou o Núcleo de Informação e Educação Ambiental de Guarujá e o Comitê Gestor da Praia do Tombo, formados por representantes de vários segmentos da sociedade. Também dotou a praia de infraestrutura com acessibilidade, banheiros públicos com água potável e monitoramento por câmeras de vigilância para a segurança (PREFEITURA DE GUARUJÁ, 2010). Figura 4: Praia do Tombo, Guarujá - SP (Fonte: Arquivo pessoal). 4. Metodologia a) Calcular a taxa de entrada dos grânulos plásticos Para estimar a quantidade de pellets que chegam diariamente na Praia do Tombo foi realizada uma avaliação direcionada à zona de deixa da maré, entre os dias 15 e 19 de outubro de 2012. A metodologia foi parcialmente adaptada do trabalho de Manzano (2009). Foram estabelecidos cinco pontos de coleta (2 no canto esquerdo da praia, 2 no canto direito e 1 no meio) (Figura 5) que foram visitados diariamente durante o período da amostragem, respeitando a Tábua de Marés do Porto de Santos (Figura 6), fornecida pela Diretoria de Hidrografia e Navegação (DHN), onde constam as previsões dos horários das marés, preamares (maré alta) e baixa-mares (maré baixa), e suas respectivas alturas. Figura 5: Em destaque, os pontos de amostragem D1, D2, M, E1 e E2 (Fonte: Google Earth). Figura 6: Tábua de Marés do mês de Outubro/2012 do Porto de Santos (Fonte: DHN). Maré é a oscilação vertical da superfície do mar ou outra grande massa d’água sobre a Terra, causada primariamente pelas diferenças na atração gravitacional da Lua e, em menor extensão, do Sol sobre os diversos pontos da Terra (MIGUENS, 1993). Como pode ser observado na Tábua de Marés, o padrão normal de marés é a ocorrência de 2 preamares e 2 baixa-mares durante o período de 1 dia lunar, sendo o intervalo de tempo entre uma preamar e a baixa-mar consecutiva de pouco mais de 6 horas (Figura 7). E, devido ao fato de 1 dia lunar ter aproximadamente 24h 50min, em oposição ao dia solar de 24h, as marés não ocorrem todos os dias à mesma hora num mesmo local (DHN; MIGUENS, 1993). Figura 7: Esquema de variação da maré durante 1 dia (Fonte: Miguens, 1993). Estas informações são de grande importância para se identificar a zona de deixa da maré, que representa a altura máxima que a água do mar avançou em direção ao continente durante a preamar superior, trazendo consigo os “novos” pellets e outros resíduos à praia. Um método simples para averiguar essa altura máxima que a água atingiu, consiste em fazer um traçado na areia da praia em direção perpendicular ao mar, durante a última baixa-mar do dia anterior a cada coleta. Desse modo, à medida que a maré sobe, durante o dia seguinte, ela vai “apagando” a linha tracejada na areia. Então, a linha de deixa da maré pode ser identificada a partir da altura em que a linha tracejada não foi apagada, pois isto significa que a água não atingiu tal ponto. Assim, em cada um dos pontos de coleta, era estabelecido um transecto de 1m² na linha de deixa da maré, onde eram recolhidos todos os pellets encontrados para posterior quantificação e caracterização. Este processo foi repetido durante os 5 dias de amostragem. Recomenda-se lavar as mãos com sabão neutro antes de recolher os grânulos plásticos da areia, a fim de não interferir na análise de possíveis poluentes encontrados. b) Análise morfológica dos grânulos plásticos Essa abordagem teve o intuito de comparar as características dos pellets encontrados nos diferentes pontos de coleta, segundo o formato e cor. Para isso, dentre o total coletado no item anterior, foram sorteados aleatoriamente 100 pellets de cada um dos pontos para serem analisados morfologicamente. No caso de em alguma dessas áreas não fossem recolhidos 100 unidades, todas seriam analisadas. c) Contribuição com os dados gerados para o programa de monitoramento global de Poluentes Orgânicos Persistentes (POPs), o International Pellet Watch Os grânulos plásticos que não foram utilizados no item (b) foram embrulhados em papel alumínio e enviados via aérea dentro de um envelope ao Laboratory of Organic Geochemistry, que pertence a Universidade de Agricultura e Tecnologia de Tóquio, no Japão, onde se concentram as pesquisas sobre o monitoramento global de POPs em pellets do programa International Pellet Watch (IPW). Através dos grânulos, o laboratório analisará a concentração média dos micropoluentes que chegam à Praia do Tombo e, a partir destes dados, fazer o mapeamento qualitativo dos micropoluentes orgânicos ao redor do mundo. 5. Resultados e Discussão a) Cálculo da taxa de entrada dos grânulos plásticos Durante o período de coleta, de 15 a 19 de Outubro, foram recolhidos um total de 1106 grânulos plásticos, distribuídos entre os 5 pontos de amostragem da Praia do Tombo (Quadro 1). Quadro 1: número de pellets/m² encontrados por dia, em cada ponto de coleta. 15/out* 16/out 17/out 18/out 19/out Total/ponto E1 59 25 23 26 21 154 E2 122 145 88 78 72 505 M 11 43 69 83 75 281 D1 19 21 34 12 17 103 D2 15 13 16 8 11 63 Total/dia 226 247 230 207 196 Total=1106 * n° de pellets coletados no dia 15 de Outubro e que não serão considerados na estimativa de taxa de entrada. Como o objetivo do trabalho foi calcular a taxa de entrada dos grânulos plásticos, ou seja, a quantidade que chega diariamente na praia, o número de pellets coletados no primeiro dia de amostragem, dia 15 de Outubro, foi desconsiderado desta análise, pois este número não representava a quantidade que havia chegado à praia de um dia para o outro, e sim a quantidade acumulada ao longo do tempo (Quadro 2). Quadro 2: número de pellets/m² encontrados em cada ponto de coleta, durante os 4 dias analisados. 16/out 17/out 18/out 19/out Total/ponto E1 25 23 26 21 95 E2 145 88 78 72 383 M 43 69 83 75 270 D1 21 34 12 17 84 D2 13 16 8 11 48 Total/dia 247 230 207 196 Total=880 Análise quantitativa por ponto de coleta Os resultados obtidos no presente trabalho foram analisados de forma a facilitar a visualização dos padrões existentes encontrados e, portanto, estão apresentados na forma de gráficos divididos entre os 5 pontos de coleta estudados na Praia do Tombo. • Ponto de coleta E1 No ponto E1 houve uma média de deposição de aproximadamente 23 pellets/dia, sem muita variação na deposição durante os 4 dias de estudo (Figura 8). Figura 8: n° de pellets coletados por dia no ponto de coleta E1. • Ponto de coleta E2 No primeiro dia houve uma deposição de 145 pellets, a maior neste ponto de coleta e uma uniformidade na quantidade depositada ao longo dos outros 3 dias (Figura 9). Figura 9: n° de pellets coletados por dia no ponto de coleta E2. • Ponto de coleta M No ponto de coleta M, as maiores deposições ocorreram nos últimos dois dias de amostragem, com uma quantidade de 83 e 75 pellets/m², respectivamente. Figura 10: n° de pellets coletados por dia no ponto de coleta M. • Ponto de coleta D1 No dia 17 de Outubro houve a maior taxa de entrada de pellets no ponto D1, com 34 unidades por m², e no dia 18 de Outubro, a menor, com 12 pellets coletados. Figura 11: n° de pellets coletados por dia no ponto de coleta D1. • Ponto de coleta D2 No dia 17 de Outubro houve a maior taxa de entrada de pellets no ponto D1, com 16 unidades por m², e no dia 18 de Outubro, a menor, com 8 pellets coletados. Figura 12: n° de pellets coletados por dia no ponto de coleta D2. A variação máxima encontrada durante esta análise foi de 8 a 145 pellets/m². O ponto de coleta E2 foi o lugar onde se observou a maior concentração de pellets no total (Figura 13). Entre os 4 dias considerados do período de amostragem foram recolhidos 383 unidades do material neste ponto, sendo que 145 destes em um só dia (16/Out). Nos demais dias houve pequena variação, de 72 a 88 pellets. Figura 13: n° total de pellets coletados em cada ponto de coleta. A maior concentração de pellets/m² no ponto de coleta E2 pode ser explicada por dois motivos: o primeiro porque este ponto está localizado em uma área menos acessível aos banhistas (Figura 14), isso evita que os grânulos sejam soterrados pelo pisoteio, e o segundo considera a direção das ondas durante o período de análise, que foi predominantemente de origem sudeste (Quadro 3), o que leva os resíduos sólidos que estão no mar a se concentrarem no canto esquerdo da praia. Segundo, Pianowski (1997), quando as praias são mais “preservadas”, os pellets são encontrados mais facilmente. Figura 14: Foto da área do ponto de coleta E2, pequena faixa de areia situada entre o costão rochoso e outras rochas, que dificultam seu acesso (Fonte: Arquivo pessoal). Quadro 3: Tamanho da Ondulação em metros e Direção das Ondas no Guarujá (Fonte: WindGuru). O segundo ponto com maior concentração de pellets foi o M, ao todo foram coletados 270 unidades. A variação neste ponto foi de 43 a 83 pellets/m². Juntos, os pontos E2 e M representam aproximadamente 75% do total de pellets recolhidos. No ponto de coleta M se observou o fato de existirem placas de sinalização do Corpo de Bombeiros nesta área com indicação de forte correnteza do mar no local e risco de afogamento (Figura 15). Se neste ponto a força do mar for realmente mais forte que nos outros, isto pode explicar a grande taxa de entrada de pellets encontrada no ponto em questão. Figura 15: Em destaque vermelho, as placas de sinalização próximas ao ponto de coleta M, e em azul, a demarcação feita na areia para se identificar a linha de deixa da maré (Fonte: Arquivo pessoal). O ponto E1, o mais próximo do ponto de maior concentração de pellets (E2), não seguiu a mesma tendência observada no ponto E2, provavelmente porque nessa área havia banhistas, ao contrário da outra (Figura 16). Figura 16: Em destaque, as localizações dos pontos de coleta E1 e E2 (Fonte: Google Earth). Os pontos de coleta E1 e D1 apresentaram resultados finais próximos, com um total de, respectivamente, 95 e 84 pellets recolhidos ao final da amostragem. O ponto E1 foi onde se observou a maior homogeneidade de taxa de entrada dos grânulos, com variação de 21 a 26 pellets/m². No ponto D2, apesar de ter o menor número de grânulos coletados durante a amostragem, também foi possível observar pequena variação do número de pellets recolhidos por dia, de 8 a 16 unidades por m². Através da análise das Figuras 11 e 12, correspondentes aos pontos de coleta D1 e D2, ambos localizados no canto direito da praia, pode-se notar que houve um padrão na taxa de entrada de pellets nesta área. Houveram maiores deposições deste resíduo no dia 17 de Outubro, e as menores no dia 18 de Outubro. Assim como no trabalho realizado por Manzano (2009), a taxa de entrada de grânulos plásticos na Praia do Tombo pode estar subestimada porque a praia estudada tem grande frequência de banhistas e praticantes de esportes que podem soterrar os pellets, e também porque existe trabalho de limpeza com rastelos na linha de deixa para a retirada de resíduos deixados pelos frequentadores da praia, mas que podem retirar ou deslocar os pellets. Análise quantitativa por dia Os dias considerados nesta análise foram de 16 a 19 de Outubro. A figura 17 mostra em forma de gráficos qual foi a variação da quantidade de pellets que chegaram à Praia do Tombo e também a contribuição de cada um dos pontos de coleta para se chegar a esses números. Figura 17: Número total de pellets recolhidos por dia, e a respectiva participação de cada ponto de coleta neste número. Em 16 de Outubro foi coletada a maior quantidade de grânulos plásticos desta pesquisa, foram 247 no total. Neste dia, e em todos os outros, os pontos de coleta E2 e M foram os locais que receberam maior aporte deste material, assim, foram os que mais contribuíram para o resultado final. Nos dias que se seguiram pode-se observar que a taxa de entrada de pellets diminuiu dia a dia. A quantidade total coletada dos dias 17 a 19 de Outubro foram, respectivamente, 230, 207 e 196 pellets por dia. Durante este período a agitação do mar estava fraca, com ondas que não ultrapassaram 1,5m de altura, observadas no Quadro 3. Em dias que a agitação do mar está mais forte, com ondas maiores que 2m, podem ocorrer maior taxa de entrada de pellets, como ocorreu na pesquisa de Manzano (2009) realizada na Enseada de Santos. O referido trabalho verificou que após um período de agitação forte no mar houve um aumento significativo de deposição de pellets, chegando a 377 pellets/m² onde a média era de 102 pellets/m². Willians e Simons (1997 apud Manzano, 2009) também relataram que nos dias seguintes a períodos de chuvas intensas há um maior acúmulo de resíduos sólidos nas praias. Durante os dias de coleta dos pellets, choveu intensamente na Praia do Tombo no dia 17 de Outubro, das 6h até as 8h da manhã. Porém, como pode ser visto nos resultados não houve um aumento da taxa de entrada de pellets neste dia. Por outro lado, foi percebido um grande acúmulo de algas marinhas na linha de deixa. A variação da taxa de entrada de pellets nos pontos de coleta durante os dias analisados foi pequena, de 196 a 247 pellets no total, resultando em média 220 unidades por dia. Como este resultado leva em conta os cinco pontos de coleta somados, o correto é afirmar que em média chegam 220 pellets por dia em uma área de 5m² na Praia do Tombo do Guarujá. Em caso hipotético, se extrapolarmos esse resultado para toda a praia, que tem 856m de extensão, há a hipótese de que chega diariamente uma média de 37.664 grânulos plásticos por dia nesta praia. Assim, em 1 mês chagariam 1.129.920 pellets, e ao final de 1 ano essa quantidade seria de 13.559.040. Para que este número acima tenha maior credibilidade seria necessário realizar amostragens em outros períodos do ano, pois pode haver flutuação sazonal de abundância deste material. Manzano (2009) encontrou diferenças, em termos de quantidade, em relação as estações do ano. Segundo a pesquisadora, no Outono e Inverno, quando normalmente os ventos e as ondas ficam mais intensos, pode haver maior deposição de pellets nas praias, enquanto na Primavera e Verão foram observadas as menores taxas de entrada durante o ano, pois há menor variação de eventos meteorológicos. De toda maneira, a Praia do Tombo no Guarujá está recebendo quantidade significativa de pellets, o que pode ser traduzido como perda de matéria-prima e que ainda pode causar impactos aos organismos da região, devido à toxicidade que este material apresenta, inclusive ao homem. A abundância de produtos plásticos tem criado sérios problemas ambientais, pois estes não degradam rapidamente no ambiente devido à sua resistência ao calor, ao ar e à água. Estima-se que um quatrilhão de grânulos plásticos é produzido a cada ano, só nos Estados Unidos, desde o início da década de 1990 (TURRA, MALUF, MANZANO, 2008). O controle de pellets assim como a gestão de sua cadeia produtiva é de responsabilidade das indústrias plásticas. Os pellets são resíduos diferenciados, com morfologia típica e particularidades quanto à dinâmica de perda para o mar, comportamento hidrodinâmico e potencial de impacto ambiental em relação a outros resíduos, além disso, se encontram na etapa pré-consumo, por isso exige o controle de toda a cadeia produtiva. Para que o espalhamento destes grânulos no oceano e litoral seja minimizado, deve haver mudanças na estocagem, manuseio e transporte deste material (MANZANO, 2009; PEREIRA, OLIVEIRA, TURRA, 2011; PIANOWSKI, 1997). b) Análise morfológica dos grânulos plásticos Foi analisada uma amostra de 463 pellets para se comparar as características morfológicas e verificar a ocorrência de alguma característica padrão, referente ao formato e cor, entre os diferentes pontos de coleta do material. Estes resultados podem servir de auxílio para uma futura identificação das fontes de descarga deste material para o ambiente e também para avaliação cronológica destes despejos. Formato Foram observados 8 formatos recorrentes (Figura 18) nos pellets recolhidos na Praia do Tombo: retangular, cúbico, cilíndrico grosso, cilíndrico fino, cilíndrico achatado, esférico achatado, ovóide e disforme. Figura 18: Principais formatos dos pellets coletados na Praia do Tombo: a) retangular; b) cúbico; c) cilíndrico grosso; d) cilíndrico fino; e) cilíndrico achatado, f) esférico achatado; g) ovoide e h) disforme (Fonte: Arquivo pessoal). Dos 463 pellets analisados, 304 tinham formato cilíndrico achatado. Na análise este formato foi o mais encontrado, passando de 60% em todos os pontos de coleta, com destaque para os pontos E2 e M, que apresentaram respectivamente 73% e 71%. Já o formato retangular não representou número significativo na amostragem realizada, não passou de 1% do total analisado. Esta característica só foi encontrada nas amostras dos pontos E1 e D2. O formato cúbico representou 9% do total analisado, ficando em segundo lugar em ocorrência. Este formato teve significativa representação no ponto M, com 18 unidades, nos demais pontos variaram de 4 a 7. Os pellets esféricos achatados e ovóides somaram, cada um, 7% do total analisado. Os esféricos achatados foram encontrados em maior número nas amostras dos pontos E1 e D1, com, respectivamente, 11 e 12 unidades. Já a quantidade de grânulos plásticos ovóides teve pequena variação de um ponto de coleta para outro, com exceção do ponto M, onde só foram encontrados 2 pellets na amostra estudada. O formato cilíndrico grosso, com 16 unidades, e o cilíndrico fino com 17, representaram ambos, 3% do número total analisado. Os pellets cilíndricos grossos foram encontrados em maior quantidade (6 unidades) na amostra do ponto D1, nas demais variaram de 2 a 3 grânulos. Por outro lado, os de formato cilíndrico fino variaram bastante, de 1 pellet no ponto M a 7 pellets no ponto E1. Os grânulos plásticos considerados de formato disforme, são os que não se enquadravam em nenhum dos formatos anteriores, seja por desgaste ou defeito de fabricação. Na amostra analisada foram encontrados 15 pellets com essa característica. Essa variação de formatos indica a existência de fontes variadas desse material (MANZANO, 2009). Na Figura 19 estão representadas as porcentagens dos formatos encontrados na amostra de cada ponto de coleta e também a porcentagem referente ao total analisado. E o Quadro 4 mostra o resultado da análise em números concretos. Figura 19: Porcentagem dos formatos de pellets encontrados na amostra de cada ponto de coleta e na amostra total analisada. Quadro 4: Resultado da análise de formato dos pellets. Formato Ponto Retangular Cúbico Cilíndrico grosso Cilíndrico fino Cilíndrico achatado Esférico achatado Ovóide Disforme E1 E2 M D1 D2 Total 04 0 0 0 01 05 07 04 18 07 07 43 03 02 02 06 03 16 07 04 01 02 03 17 61 73 71 61 38 304 11 03 04 12 03 33 06 08 02 09 05 30 01 06 02 03 03 15 O formato cilíndrico achatado representou 66% da amostra analisada. Este significativo número sugere que deve haver uma maior demanda de pellets neste formato por parte do mercado consumidor e, portanto grande parte das indústrias de plásticos produz sua matéria-prima nesta forma. Pianowski (1997) e Manzano (2009) também observaram que a maior parte dos grânulos encontrados apresentava formato cilíndrico achatado. No trabalho mais recente, a porcentagem desta forma foi de 80%. Cor Na análise de coloração dos grânulos plásticos foram observados 7 principais padrões de cores: branco opaco, branco translúcido, bege translúcido, amarelo translúcido, laranja translúcido, marrom translúcido e preto opaco (Figura 20). Figura 20: Principais colorações dos pellets coletados na Praia do Tombo: a) branco opaco; b) branco translúcido; c) bege translúcido; d) amarelo translúcido; e) laranja translúcido; f) marrom translúcido e g) preto opaco (Fonte: Arquivo pessoal). A coloração branca translúcida foi a de maior ocorrência nas amostras de todos os pontos de coleta. Dos 463 pellets analisados, 162 tinham essa característica, ou seja, 35%. Os grânulos plásticos de cor bege translúcido representaram 27% da amostra analisada, embora sua porcentagem relativa em cada um dos pontos tenha variado bastante, de 18% no ponto D2, a 34% no ponto E2. A porcentagem de pellets de cor amarela translúcida variou pouco entre os diferentes pontos de coleta, foi de 13% a 17%, com exceção do ponto M, onde foram encontradas apenas 8 unidades com essa coloração. No entanto, neste mesmo ponto foi encontrado o maior número de pellets de cor laranja translúcida, 12 unidades. Nos demais pontos a quantidade dessa cor variou de 4 a 9 unidades. Os pellets de cor marrom translúcida representaram 5% do total analisado. Na amostra do ponto de coleta D1 não foi encontrado nenhuma unidade com tal característica. Os de cor branca opaca tiveram baixa representatividade, apenas 3%. A quantidade de grânulos dessa cor encontrados na amostra analisada foi de 16 unidades. Outra cor que teve número pouco significativo na análise foi à preta opaca, com 3 unidades. Alguns pellets da amostra analisada tinham suas superfícies recobertas por outro material (Figura 21), geralmente de cor preta, que impossibilitou a identificação de sua cor original, por isso foram identificados como de coloração indefinida. Foram encontrados 35 grânulos com essa particularidade, principalmente nos pontos M, D1 e D2. Figura 21: Pellets recobertos por substância preta, caracterizados como de coloração indefinida (Fonte: Arquivo pessoal). As porcentagens de cada cor em cada um dos pontos de coleta e na análise da amostra total estão representadas na Figura 22. O Quadro 5 resume o resultado da análise com números concretos. Figura 22: Porcentagem das colorações dos pellets encontrados na amostra de cada ponto de coleta e na amostra total analisada. Quadro 5: Resultado da análise da coloração dos pellets. Cor Branco Branco Bege Amarelo Laranja Marrom Preto Indefinido trans. trans. trans. opaco Ponto opaco translúcido trans. 05 36 30 15 04 06 01 03 E1 03 37 34 13 08 04 01 0 E2 02 38 20 08 12 09 0 11 M 02 32 29 17 09 0 01 10 D1 04 19 11 09 04 05 0 11 D2 Total 16 162 124 62 37 24 03 35 Os pellets com coloração branca translúcida e bege translúcida representaram juntos, 62% da quantidade total analisada. Essas características de coloração indicam que estes são materiais produzidos recentemente e/ou que foram perdidos no ambiente há pouco tempo. Quando este material passa mais tempo flutuando nos mares ele adquire cor mais amarelada, pois sofre processo foto-oxidativo causado pela exposição à radiação ultravioleta. Assim, alguns pellets tem coloração que vai do amarelo ao marrom, de acordo com o tempo de exposição ao meio ambiente (ENDO, 2005; MANZANO, 2009; TURNER e HOLMES, 2011). Pellets com essas características representaram 26% do total analisado neste estudo. Devido ao maior tempo que estão no ambiente marinho estes pellets adsorvem também maior quantidade de poluentes, como os PCBs (ENDO, 2005; TURNER e HOLMES, 2011). A substância que recobria alguns grânulos plásticos impedindo a identificação de suas cores era, possivelmente, óleo combustível liberado por navios e barcos. Estes grânulos foram encontrados em todos os pontos de coleta, exceto no ponto E2. Há referência de caso parecido no trabalho realizado por Turner e Holmes (2011), que encontraram ocasionalmente piche em alguns pellets. O padrão de cores observado neste trabalho foi semelhante aos resultados de obtidos por outros pesquisadores, como Manzano (2009), que classificou 60% dos pellets de sua análise como de tons claros e transparentes. Nas coletas realizadas por Turner e Holmes (2011) verificou-se que em todas as amostras a porcentagem de material de cor mais clara foi maioria. c) Contribuição com os dados gerados para o programa de monitoramento global de Poluentes Orgânicos Persistentes (POPs), o International Pellet Watch (IPW) O resultado da análise de POPs existentes nos pellets recolhidos na Praia do Tombo e enviados ao Laboratory of Organic Geochemistry, infelizmente não contribuirá com o presente trabalho, pois só estará disponível no segundo semestre do ano de 2013. Segundo o responsável pelo laboratório, Dr. Hideshige Takada, cada análise leva em média 1 ano para ser concluída e divulgada. No momento, sua equipe está finalizando as análises de amostras enviadas em 2010. Com estes dados, o programa IPW já realizou um mapeamento global com a concentração dos micropoluentes PCB (bifenil policlorado), DDT (diclorodifeniltricloroetano) e HCH (hexaclorociclohexano) (Figura 23). Figura 23: Mapas da Poluição Global dos micropoluentes PCB, DDT e HCH (Fonte: IPW). O mapeamento divulgado pelo IPW contem o resultado da análise de 3 praias do Brasil: Morro de São Paulo – BA, Itaúnas – RJ e Baía de Santos – SP, local muito próximo da Praia do Tombo, estudada neste projeto (Figura 24). Figura 24: Concentração dos micropoluentes em ng/g-pellet nas praias brasileiras analisadas pelo IPW (Fonte: IPW). Estas substâncias fazem parte da lista de poluentes orgânicos persistentes (POPs) estabelecida na Convenção de Estocolmo, realizada em 2001, um tratado internacional que visa à eliminação segura destes poluentes e a limitação de sua produção e uso, e do qual o Brasil é signatário (ALMEIDA et al., 2007; CETESB). Os POPs tem como características em comum alta hidrofobicidade, baixa reatividade no meio ambiente e grande tendência para se acumular, ou bioconcentrar, nos tecidos dos organismos vivos através da cadeia alimentar, que chega até o homem. Nos seres humanos estes poluentes atuam como interferentes endócrinos e alguns são classificados como prováveis carcinógenos humanos (ALMEIDA et al., 2007; CETESB; ENDO, 2005). O HCH é um inseticida organoclorado composto de vários isômeros. Os principais usos identificados para produtos contendo HCH são baseados na atividade inseticida, para tratamento de madeira e grãos, do isômero gama-HCH, comumente denominado lindano. Também já foi utilizado no combate aos vetores das doenças da malária e de Chagas e no tratamento de sarnas e piolhos. O uso do lindano ainda é permitido no Brasil para a preservação de madeiras (ALMEIDA et al., 2007; CETESB). O DDT, assim como o HCH, é um agrotóxico organoclorado que foi usado extensivamente como inseticida, principalmente após a Segunda Guerra Mundial, para o combate de mosquitos vetores de malária e tifo. Embora tenha salvado várias vidas no controle de pragas como a malária, sua persistência e lipofilicidade (capacidade de se dissolver em lipídios, como gordura e óleo vegetal) causou a morte de vários animais. Assim, na década de 1970, seu uso foi banido em vários países. No Brasil o DDT teve sua fabricação, importação, exportação, manutenção em estoque, comercialização e uso proibidos pela Lei nº. 11.936 de 14 de maio de 2009 (ALMEIDA et al., 2007; BRASIL; CETESB; RIOS et al., 2007). No mapeamento elaborado pelo IPW pode-se observar que a maior concentração encontrada desta substância e dos produtos de sua degradação, o DDE e DDD, foram no Brasil, nos pellets do litoral do Estado da Bahia. Esse resultado sugere que, provavelmente no passado, quando seu uso era legal, este inseticida tenha sido bastante usado na região. Hoje em dia, uma das possíveis fontes de DDT para o meio ambiente é a produção do pesticida dicofol, o qual pode conter DDT como impureza (ALMEIDA et al., 2007). Por último, os PCBs, do inglês polychlorinated biphenyls, são compostos orgânicos aromáticos clorados artificiais, caracterizados pela presença de anéis aromáticos halogenados. Foram utilizadas em vários setores industriais devido às suas propriedades físico-químicas, em especial, a alta constante dielétrica e elevada estabilidade térmica. As misturas técnicas contendo PCB possibilitam seu emprego como capacitores dielétricos, fluidos hidráulicos, fluidos de transferência de calor e plastificantes (ALMEIDA et al., 2007; CETESB, ENDO, 2005). O uso do PCB está proibido em todo o mundo, no Brasil desde 1981, devido aos potenciais efeitos nocivos à saúde humana e ao ambiente. Apesar disso, acredita-se que, pelo menos, metade dos equipamentos produzidos com este composto, ainda está em uso, em antigos equipamentos elétricos, ou podem ser encontrados armazenados. Assim, mesmo com a proibição de seu uso, existe grande quantidade de PCB em reservatórios com potencial de ser liberada ao meio ambiente (CETESB; RIOS et al., 2007). O mapeamento das concentrações de PCB apresentado pelo IPW corrobora com o resultado obtido por Endo (2005), que afirmou que os pellets coletados em áreas industrializadas apresentavam maiores concentrações de PCB do que os coletados em regiões mais remotas. Assim, foi o caso dos pellets coletados na Baía de Santos, região onde se encontra o Porto de Santos e o pólo industrial de Cubatão, que apresentaram os níveis mais altos desse poluente em comparação com as outras praias brasileiras analisadas. 6. Conclusões Os plásticos estão entre os poluentes que mais ameaçam o ambiente marinho nos dias de hoje. Consequência do culto ao descartável da sociedade moderna, a produção destes materiais sintéticos persistentes, aumentou drasticamente nos últimos 50 anos. O plástico chega aos oceanos em diferentes formas, desde produtos finais, como sacos e garrafas, até a forma básica de comercialização dessa matéria-prima, chamada pellet, que foram o foco desta pesquisa. Este tipo de material, grânulos plásticos de aproximadamente 5 mm de diâmetro, é liberado na natureza devido a perdas nos processos de produção, transporte e manuseio, assim alcança os oceanos e deposita-se em grande quantidade nas praias, causando impactos ambientais, estéticos e econômicos. Pellets estão presentes em todos os oceanos e em diversas praias do mundo e têm sido relatados desde a década de 1970. Estes pellets foram encontrados em grande quantidade na Praia do Tombo, na cidade de Guarujá, área de estudo deste trabalho. Na tentativa de estimar a quantidade desse resíduo que chega diariamente nesta praia, foram realizadas coletas diárias entre os dias 16 e 19 de Outubro. Em média chegaram 220 pellets por dia, somadas as quantidades encontradas nos 5 pontos de coleta préestabelecidos que tinham 1m² cada. Se essa taxa de entrada for extrapolada para 1 ano, a quantidade de pellets que poderiam chegar nesta praia seria de 13.559.040, representando prejuízo econômico, devido à perda de matéria-prima e à necessidade gastos com limpeza pública. A poluição pode diminuir a atração de turistas e banhistas, o que também prejudica a economia local e causa efeitos negativos à estética da paisagem e à aos organismos costeiros. Quanto às características morfológicas, a maioria dos pellets encontrados tinha formato cúbico achatado, mais precisamente, 66%. Em relação à coloração, 62% tinham tons mais claros, como branco e bege translúcidos, o que indica uma entrada recente no ambiente. É importante reunir um banco de dados junto às indústrias produtoras para se saber que tipo de pellet cada uma produz, assim seria possível identificar as prováveis fontes de descarga, e posteriormente propiciar um monitoramento e fiscalização mais efetivos. Neste caso a provável fonte de emissão dos grânulos plásticos para a Praia do Tombo é o Porto de Santos devido à sua proximidade. Os pellets coletados nesta praia e enviados ao Internatioanal Pellet Watch (IPW) servirão como fonte de análise para se verificar quais poluentes estão presentes nas águas próximas a esta praia. Através da literatura, sabe-se que estes grânulos plásticos funcionam como veículos para alguns compostos tóxicos que não se dissolvem na água do mar, como o DDT, o PCB e o HCH. Estes Poluentes Orgânicos Persistentes são adsorvidos pelos pellets, que podem concentrar até um milhão de vezes a mais o nível que normalmente apresentam quando dispersos na água. Assim, quando são ingeridos por organismos marinhos, que confundem os pellets com larvas ou ovos, podem acarretar problemas hormonais nestes organismos e, indiretamente, nos humanos, que possuem, por exemplo, peixes em suas dietas. Apesar de não possuir a aparência desagradável como as de outros resíduos, os grânulos plásticos adquirem relevância por sua quantidade e persistência no ambiente (PEREIRA, OLIVEIRA, TURRA, 2011). O controle dos pellets é responsabilidade das indústrias plásticas que parecem desconhecer os impactos negativos originados pelos plásticos no ambiente assim como os benefícios econômicos na redução das perdas e na reciclagem do material “perdido” (MANZANO, 2009). No Brasil, pouco se conhece sobre estratégias de gestão direcionadas para enfrentar este problema. Isso se reflete na escassez de práticas e políticas, públicas e/ou privadas, desenvolvidas e na falta de marcos legais acerca do assunto. Segundo a Environmental Protection Agency (EPA), a identificação das fontes de emissão dos pellets para o ambiente se faz necessária para a adoção de estratégias adequadas para lidar com este problema. Além disso, a EPA elaborou, junto com a SPI (Society of the Plastics Industry), recomendações para o controle e prevenção de descargas de pellets, que envolvem desde a educação e treinamento dos funcionários das indústrias até o tipo de equipamentos que devem ser adotados para se atingir a meta de “perda zero”, passando por todas as etapas da cadeia produtiva: produção, embalagem, transporte e armazenamento. Também é necessário que ocorra uma mudança na forma de produção e consumo de materiais, deve-se inserir a sustentabilidade como norteadora destes processos, com a união de interesses econômicos e interesses ambientais, pois a consequência do atual padrão de consumo aliado com o culto ao descartável é a geração cada vez maior de resíduos sólidos, sem a devida consideração à capacidade de suporte da Terra. 7. Referências ALLSOPP, Michelle, et al. Plastic Debris in the World’s Oceans. Greenpeace International. Amsterdam, 2005. ALMEIDA, Fernanda V., et al. Substâncias Tóxicas Persistentes (STP) no Brasil. Química Nova, Vol. 30, No. 8, páginas 1976-1985, 2007. ARAÚJO, Maria C. B. Resíduos Sólidos em praias do Litoral Sul de Pernambuco: Origens e Consequencias. Universidade Federal de Pernambuco. Programa de PósGraduação em Oceanografia. Recife, 2003. ARAÚJO, Maria C. B.; COSTA, Mônica F. Lixo no ambiente marinho. Ciência Hoje 32, 2003. BRASIL. Lei nº. 11.936 de 14 de maio de 2009. 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