conceito de sujeito e a homeopatia
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conceito de sujeito e a homeopatia
UNIVERSIDADE VEIGA DE ALMEIDA CARLA PALMIERI ZARUR CONCEITO DE SUJEITO E A HOMEOPATIA Rio de Janeiro 2012 Carla Palmieri Zarur CONCEITO DE SUJEITO E A HOMEOPATIA Dissertação apresentada ao Curso de Mestrado em Psicanálise, Saúde e Sociedade da Universidade Veiga de Almeida por CARLA PALMIERI ZARUR, como requisito para obtenção do título de Mestre. Área de concentração: Psicanálise e Saúde. Linha de Pesquisa: Subjetividade nas Práticas das Ciências da Saúde. Orientadora: Profª Drª Maria Anita Carneiro Ribeiro Rio de Janeiro 2012 DIRETORIA DOS PROGRAMAS DE PÓS-GRADUAÇÃO STRICTU SENSU E DE PESQUISA Rua Ibituruna, 108 – Maracanã 20271-020 – Rio de Janeiro – RJ Tel.: (21) 2574-8871 - (21) 2574-8922 FICHA CATALOGRÁFICA Z38c Zarur, Carla Palmieri Conceito de sujeito e a homeopatia / Carla Palmieri Zarur, 2013. 82f : il. ; 30 cm. Dissertação (Mestrado) – Universidade Veiga de Almeida, Mestrado Profissional em Psicanálise, Saúde e Sociedade, Rio de Janeiro, 2013. Orientação: Profa. Dra Maria Anita Carneiro Ribeiro 1. Psicanálise. 2. Homeopatia. 3. Assistência centrada no paciente. I. Ribeiro, Maria Anita Carneiro. II. Universidade Veiga de Almeida, Mestrado Profissional em Psicanálise, Saúde e Sociedade. III. Título. CDD – 616.89 Decs Ficha Catalográfica elaborada pelo Sistema de Bibliotecas da UVA Biblioteca Maria Anunciação Almeida de Carvalho Carla Palmieri Zarur Conceito de sujeito e a homeopatia Dissertação apresentada ao Curso de Mestrado em Psicanálise, Saúde e Sociedade da Universidade Veiga de Almeida por CARLA PALMIERI ZARUR, como requisito para obtenção do título de Mestre. Área de concentração: Psicanálise e Saúde. Linha de Pesquisa: Subjetividade nas Práticas das Ciências da Saúde. Data da Defesa: 12 de dezembro de 2012. Banca Examinadora _______________________________________________________________ Profª Drª Maria Anita Carneiro Ribeiro Pós-doutora em Psicologia (PUC/RJ) Professora do Mestrado em Psicanálise, Saúde e Sociedade da UVA _______________________________________________________________ Profª Drª Sheila Abramovitch Doutora em Medicina (UERJ) Professora da PUC/RJ _______________________________________________________________ Profª Drª Vera Pollo Doutora em Psicologia (PUC/RJ) Professor do Mestrado em Psicanálise, Saúde e Sociedade da UVA Dedicatória Para meus pais, Francisco e Olinda, minhas filhas, Fabiana e Gabriela, meus sogros, Dahas Zarur e Lourdes Zarur, meu irmão Paulo, por tornarem meu percurso suave e cheio de amor. Para meu marido, em especial, Cláudio Zarur (in memoriam), por compartilhar melhores momentos da minha vida. os Agradecimentos À minha orientadora Maria Anita Carneiro Ribeiro que me guiou brilhantemente. À professora Glória Sadala, pelo acolhimento e oportunidade de acompanhar o curso de mestrado, desde a primeira tentativa, como aluna especial. Aos professores do Programa de Mestrado em Psicanálise, Saúde e Sociedade da Universidade Veiga de Almeida, pelas inúmeras e inestimáveis contribuições. Aos professores de homeopatia do Instituto Hahnemanianno do Brasil e da Santa Casa, pelas grandiosas disponibilidade e generosidade. Aos colegas, por partilhar trilhamentos e escolhas. À Julie Travassos Gallina, pelo auxílio no decorrer da construção desta dissertação. O segredo da existência não consiste somente em viver, mas em saber para que se vive. Dostoievski RESUMO Nesta dissertação, ressalta-se a importância do discurso do paciente no decorrer do tratamento, sendo este direcionado não aos sintomas como de hábito e sim à verdadeira cura do sofrimento exposto, como observamos na psicanálise e também na homeopatia. Palavras-chave: Sujeito, psicanálise, homeopatia, ciência. ABSTRACT This dissertation highlights the importance of the speech of the patient during treatment, which is directed not to the symptoms as usual, but the true healing of suffering exposed, as shown in psychoanalysis and also in homeopathy. Keywords: Subject, psychology, homeopathy, science. SUMÁRIO INTRODUÇÃO ............................................................................................... 10 1 CONCEITO DE SUJEITO .............................................................. 19 1.1 O nascimento do conceito de sujeito ................................. 19 1.2 O sujeito do inconsciente ..................................................... 24 1.3 Sujeito da linguagem ............................................................. 27 1.4 O sujeito e o poder médico .................................................. 30 1.4.1 Relação médico-paciente ........................................ 32 2 O SUJEITO E A HOMEOPATIA ................................................ 41 2.1 Considerações gerais sobre a homeopatia ..................... 41 2.2 Fundamentos da homeopatia .............................................. 44 2.3 O médico homeopático ......................................................... 45 2.4 Homeopatia e psicanálise como terapias do sujeito ...... 49 3 A CONSULTA MÉDICA EM HOMEOPATIA ....................... 52 3.1 O tratamento com a homeopatia ........................................ 56 3.2 Estudo de caso ....................................................................... 59 CONCLUSÃO ................................................................................................. 63 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ................................................... 70 APÊNDICE Homeopatia A – Curso de extensão: Introdução ....................................................................................... 72 APÊNDICE B – Caso clínico em homeopatia à ..................... 75 10 INTRODUÇÃO “O conceito de sujeito e a homeopatia”, é uma dissertação na qual defendo a ideia de que o discurso do paciente, a fala, não só pode como deve ser priorizado no curso do tratamento médico, não se tornando, portanto, excluída pelo tratamento somente voltado para o sintoma no corpo. E para tal, faço sugestões de tratamentos com a homeopatia e psicanálise em conjunto com a medicina clássica a fim de alcançar tal intenção provando então a eficácia de ambos. Também aqui exponho como objetivo final do meu trabalho, a divulgação de um melhor atendimento médico, centrado no doente e não na doença como podemos observar hoje em geral e também contribuir nos meios acadêmicos através de cursos de extensão em homeopatia, conceitos e práticas centrados na escuta do relato do paciente, que vem sempre com algo além de uma demanda de cura dos sintomas. Este trabalho, portanto, se dedica ao estudo do aparecimento do sujeito desde os primórdios da civilização, detendo-se na época dos grandes filósofos ao final da Idade Média até hoje, expondo sua subjetividade no tratamento homeopático e citando a homeopatia como uma ciência que surgiu a mais de duzentos anos já colocando seu foco no discurso do paciente, enfatizando a fala deste no decorrer 11 das consultas e usando-a como elemento de vital importância na prescrição do melhor remédio. Para tanto, no primeiro capítulo abordei o conceito de sujeito, primordial para o entendimento da posição subjetiva que este ocupa que é levada em conta tanto para a psicanálise quanto para a homeopatia e para isso tracei uma investigação histórica acerca do surgimento do conceito de sujeito e alinhavei esta ideia ao sítio que o paciente é inserido na prática médica. A relação médico-paciente passa necessariamente pela esfera do corpo e por isso consideramos a teoria de René Descartes e Sigmund Freud no que tange o corpo. E da mesma forma, talvez porque as causas das doenças sejam muito complexas, termina-se em um enigma que passa aos profissionais de saúde um poder quase absoluto sobre o corpo, impondo o Discurso do Mestre como proposto por Lacan, onde nota-se a mesma relação entre senhor e escravo semelhante à relação médico-paciente. Estando o homem submetido aos cuidados do médico, não há como tratar o paciente sem pensar numa boa relação médico-paciente e até mesmo pensar no processo da transferência, estabelecendo-se assim uma maior confiança e adesão ao processo terapêutico. Busquei na história, desde o final da Idade Média até os dias atuais, como os filósofos, a ciência e os médicos vêm posicionando esta questão a fim de entender e provar que dentro do processo terapêutico, a fala deste também se coloca como um instrumento de acesso às vias de cura. Sabe-se que desde o início da civilização o homem submeteu-se às regras e costumes a fim de conseguir ingressar nos laços sociais. O homem primitivo, no qual o impulso selvagem predominava, vivia em pequenos grupos e já exercia seu poder, dominando o outro para salvar sua própria sobrevivência. À medida que houve um 12 crescimento populacional e subsequente aglomeração de grupos (adequação mais indicada no processo da civilização), o homem primevo iniciou seu sofrimento pela dificuldade de adaptação à própria civilização. Nesta época, teve início uma medicina totalmente baseada em feitiços, magias e crenças, onde a doença aparecia como consequência e punição de atos, como resultado de magia e inveja ou pelas inadequações ambientais e os pajés e feiticeiros eram encarregados da manutenção da saúde do grupo ou tribo. Posteriormente, na Antiga Grécia, as Escolas Médicas eram conhecidas de acordo com sua forma de pensar e tratar o paciente. A Escola de Cóes, onde Hipócrates foi professor, já olhava o paciente não como doença e sim como um doente, ou seja, não estabelecia seu foco unicamente no sintoma, colocando a doença como resultado de uma reação do homem às demandas da vida. Observa-se no decurso da história, que a medicina passa por diversas etapas em diferentes culturas até que, na Grécia da Idade Média, o seu aspecto mágico foi substituído pelo investigatório e desenvolvia-se então paralelamente à filosofia. No século XVI, o filósofo francês René Descartes, introduziu através do discurso do método, o Cogito, ergo sun, onde ao promover o distanciamento entre corpo e pensamento, possibilitou a inauguração da ciência e o avanço da prática médica. Ao pensar o “cogito”, fundou o sujeito do conhecimento, que é também o sujeito da verdade. Chegou a isto pela dúvida, postulando que “quem duvida não pode duvidar que duvida”, sendo esta então sua única certeza, pensamento que embasou a filosofia reflexiva. Este sujeito é universal e pode ser representado empiricamente por qualquer um que pense, que tenha ideias. Para Descartes, no ato de pensar o que importa é 13 investigar o pensamento, sendo as ideias, representações claras e distintas da mente humana. A ciência, então, teve seu grande avanço e desenvolvimento, o que foi essencial para chegarmos ao grau de tecnologia e especificidade que possuímos hoje, extremamente importantes no tratamento de doenças graves, assim como o aumento e melhora da sobrevida de pacientes com doenças crônicas e também propiciou uma qualidade de vida superior com o advento de exames e tratamentos preventivos. No entanto, a subdivisão na área médica se fez presente a fim de estabelecerem-se estudos específicos de cada parte do ser humano. Com este enfoque no corpo, foram excluídos a palavra e o discurso do paciente como reveladores dos fatos causadores de desequilíbrio deste, desequilíbrio que aumenta a cada dia e está totalmente submetido à inadaptação do homem às situações ditadas pelo decurso de sua própria vida e podemos perceber isto ao analisarmos a história de alguns pacientes, onde percebemos que ao medicalizar um sintoma, pouco tempo após constatamos o surgimento de outro, denotando com isso a existência de algum fator desencadeante que não foi devidamente resolvido. Quando surge Freud com os conceitos de representações e afetos na mente humana, percebe-se que estes diferem dos de Descartes. No “Penso, logo sou” de Descartes, ele identifica o ato de pensar à consciência enquanto Freud diz o oposto, afirmando que, quando o inconsciente se manifesta a consciência perde a certeza de si, ocorrendo então um conflito entre eles (consciente e inconsciente). Este conflito tem como resolução final o sintoma, que aparece como um termo de compromisso, garantindo a existência do sujeito. 14 Lacan vem posteriormente colocar que “quando o inconsciente se manifesta já não tenho certeza do que sou” (ou seja, ali onde o inconsciente pensa, não sou, portanto sou onde não penso) movido pela certeza de que o inconsciente é constituído pela verdade do Outro. Distinguem-se então dois sujeitos: o sujeito do conhecimento (ou da filosofia), identificado por Descartes e o sujeito do pensamento inconsciente (sujeito da psicanálise) que está implícito quando Freud escreve sobre sua descoberta do inconsciente pelo relato do “Sonho de Irma”. Em Freud, podemos observar que o sujeito vem barrado, pois foi submetido ao recalque (Édipo), sendo então a clivagem do sujeito (sujeito dividido) uma singularidade de Freud assim como a singularidade do pensamento psicanalítico e é neste sujeito que devemos operar. Quando apresenta o inconsciente, Freud vincula-se às representações que foram recalcadas (barradas, proibidas) e que retornam posteriormente através das formações do inconsciente apresentando-se em forma de lapsos, atos falhos, chistes, sonhos e do sintoma. Segundo Lacan, este sujeito constitui-se pelo seu assujeitamento à linguagem, aparecendo na fala, na intercessão entre dois significantes. Quando prioriza-se o discurso do sujeito, pode-se operar nele e com isso diminuir seu nível de conflito perante a vida e os acontecimentos decorrentes dela, já que o homem para viver na civilização abre mão de suas pulsões mais primitivas o que gera angústia, a qual sabemos que vai sempre existir. Vai sempre existir, pois não temos como suprir totalmente a demanda ditada pelo desejo, desejo este que se instala pela falta, sendo assim por natureza insatisfeito e evocando que quando aparece um sintoma, ele denota um desejo 15 (infantil e sexual) não realizado, pois foi recalcado, barrado , podendo retornar sob a forma do sintoma. Observamos que a realização do desejo nunca é total, mas as realizações parciais existem, como por exemplo, escrever um livro, interpretar uma música, fazer um curso, uma faculdade e geram um tipo de satisfação momentânea que deve ser estimulada, satisfação esta que advém pelo direcionamento correto das pulsões, evitando muitas vezes a autoagressão, como nas doenças autoimunes, no câncer e outras tantas doenças onde podemos perceber que a parte psíquica funciona como gatilho para o surgimento das mesmas. A psicanálise vem, portanto, dar um novo destino ao tratamento de neuroses e psicoses até então somente submetidas à medicalização e internação. Com o advento da psicanálise, que ocorre pelo método da associação livre, verifica-se que se pode operar neste sujeito do inconsciente e que neste redirecionamento, na sua mudança de atitude, ele segue ressignificando sua dor e conseguindo lidar melhor com seus limites e com a vida. O objetivo é que consiga diminuir seu grau de angústia e de adoecimento, tornando-se mais apto a enfrentar os problemas que venham a surgir ao longo de sua existência. No segundo capítulo enfoco o tratamento médico, que na maioria das vezes aparece como única opção, colocando o paciente ao dispor da comercialização de novos fármacos. O fato é que a “saúde perfeita”, ideal, apontada e divulgada pela mídia, vem acompanhada obsessivamente pelo “não adoecer”, onde o envelhecimento torna-se quase uma doença e não um processo natural da vida, e com isso acaba consolidando uma cultura extremamente narcísica, buscando um corpo perfeito o qual sabemos não existir e colocando nesta busca muitas vezes 16 intervenções e procedimentos cirúrgicos desnecessários e até prejudiciais sem conseguir, no entanto, abrandar a angústia existencial. No terceiro capítulo, coloco meu foco sobre a homeopatia que semelhante à psicanálise, propõe tratar as verdadeiras “causas” das doenças, tratar o que vem antes, enfocar o que desencadeou o processo de adoecimento do paciente. Descrevo seu surgimento no século XVIII com o médico alemão Hahnemann, que insatisfeito com a medicina da época, desenvolve um novo método de tratamento, o qual chama de Homeopatia (chamada por ele de “a arte de curar”). Baseado na Lei Hipocrática de tratar o mal com o mal, ou seja, a lei da similitude, Hanhemann iniciou sua longa jornada de experimentações em vivo, direcionando seu tratamento ao sujeito, sendo a homeopatia também chamada de “A medicina do sujeito”, pelo seu enfoque no relato espontâneo do paciente e a busca do remédio que o trata por completo baseada na observação dos significantes do seu discurso. Hahnemann, em sua busca pelo detalhe, já que a minuciosidade lhe era uma característica peculiar, fazia uma anamnese bem rica em sinais e sintomas, mas baseava-se no descuido, no resvalo, no detalhe diferente de todo o quadro sintomático para a prescrição do remédio único, que abrangia a totalidade. Usava para tal prescrição somente as palavras ditas pelo paciente. O detalhe ou peculiaridade ao qual refiro é algo comparativamente igualado ao ato falho, no qual se denota a manifestação do próprio sujeito do inconsciente, como observamos num sintoma particular, aquele que denota a individualidade da doença e também do tratamento. Com a prescrição do remédio único, o simmillimum, mimetiza- se uma doença artificial mais forte, que ao provocar uma reação como um todo, serve como 17 fator propulsor ao redirecionamento do equilíbrio da força vital, o que pode levar a uma reação de cura. Isto equivale à própria mudança de atitude do paciente diante de uma situação de estresse, por exemplo, conseguindo este, portanto cumprir seus objetivos sem precisar adoecer. Essa reação de cura se dá pela própria readaptação do paciente aos fatores desencadeantes de desequilíbrio, sejam eles ao nível físico ou psíquico possibilitando este conviver melhor com seus limites e com a própria vida, o que o torna capaz de cumprir com os mais altos fins de sua existência, conforme o próprio Hahnemann cita como objetivos da Homeopatia em seu livro “O Organon”. Coloco também com detalhes o que Checchinato cita em seu livro “Psicanálise e Homeopatia”, onde descreve esta reação de estabelecimento de equilíbrio da força vital pelo medicamento homeopático como equivalente ao redirecionamento de pulsões, o que possibilita melhor qualidade de vida e transforma muitas vezes um sentimento ou emoção ruim no “belo”, no aceitável, tanto para o paciente quanto para a sociedade em que ele vive. Descrevo ao final, situações bem concluídas pela homeopatia e um caso clínico comprovadamente resolvido a fim de mostrar o desenrolar do tratamento homeopático, seus benefícios e o processo de cura que se segue ao tratamento. Na conclusão coloco como a homeopatia individualiza o tratamento e opera no sujeito, assim como a psicanálise. Proponho que tanto a homeopatia como a psicanálise podem ser incentivos à prática médica voltada para o tratamento centrado na abordagem do sujeito e para tanto, sugiro seu estabelecimento ao lado da medicina clássica a fim de um caminho mais rápido e eficiente à cura, além da sua contribuição à melhora da qualidade de vida dos pacientes. 18 Torna-se importante ressaltar que a Homeopatia consta desde 2006 como Medicina Complementar presente nas Clinicas da Família (SUS), estando presente por sua abordagem centrada na pessoa, porque fortalece a relação médico-paciente sendo este um dos elementos fundamentais da terapêutica, promove a humanização na atenção, um maior bem estar físico e social e é possuidora de medicamentos baseados na natureza e de fácil acesso econômico à população. 19 1 CONCEITO DE SUJEITO 1.1 O nascimento do conceito de sujeito Desde a Antiguidade, a existência de uma atividade do funcionamento de uma consciência sempre foi objeto de múltiplas reflexões. A ciência moderna foi inaugurada graças ao filósofo René Descartes com a criação do “Cogito, ergo sum” e representa “um momento do sujeito, historicamente definido e correlato essencial da ciência” (LACAN, 1965, p.870). René Descartes (1596-1650) postulou o princípio de um dualismo entre o corpo e a mente, que levou a fazer da consciência (cogito) o lugar da razão. René Descartes, através de sua pesquisa filosófica movida pelo seu desejo de saber, criou um novo método de reflexão filosófico: a dúvida, que pertence a um campo do saber científico que diz respeito somente ao homem na busca de suas verdades, já que Deus não duvida, é o saber supremo segundo a filosofia dogmática desta época. “Identificado como res cogitans, o pensamento emergiu como única garantia de existência, embora não absoluta, tratava-se de buscar a certeza por meio da razão pura”. (POLLO, 2004, p.15). “Cogito, ergo sum” constituiu-se então, numa reflexão sobre as condições da ciência, a afirmação do sujeito existente com sua transparência transcendental, 20 embora requintes importantes tenham sido feitos por filósofos à medida que considerações foram introduzidas a esta primeira colocação. No século XVII, existia um racionalismo dogmático que significava a presença de Deus como o grande outro divino, acima da razão, garantindo o eu, a natureza, etc. Já no final do século XVIII, o homem já não parte da premissa que o conhecimento é divino e sim fruto do interesse da razão humana. Immanuel Kant (1724-1804) é o primeiro filósofo racionalista a dizer que não há nada acima da razão. Na segunda metade do século XVIII, inova com a filosofia crítica, onde assume a ideia de que o sistema de cultura como um todo é a expressão de interesses puramente racionais. Para Immanuel Kant, os fins da razão humana aparecem estampados na cultura e coloca Deus como uma ideia da razão humana. O sujeito então tornou-se princípio absoluto não devendo mais sua alteridade a um ser supremo e com isso Deus aparece como crença a partir do fato que não podemos conhecê-lo, só se conhece o mundo fenomênico (MACIEL, aulas do mestrado, UVA, 2011). Com este novo método de pensar, ocorre no século XVIII a destruição das substâncias (pensante, extensa e divina) propostas por René Descartes. Observa-se com Immanuel Kant, que o ser humano só acredita no que surge para ele como fenômeno (origem da fenomenologia), ou seja, tudo o que um sujeito absorve do mundo é através da percepção ou sensibilidade, colocando este como um conjunto de fenômenos materializados. Para René Descartes, o eu é uma coisa pensante, para Immanuel Kant, surge da seguinte forma: penso que sou, mas não sei quem sou. Só posso saber me conhecendo e só conheço a mim mesmo como fenômeno, ou melhor, é somente 21 através do que percebo e não realmente como sou. É como se dissesse: "Eu sou um outro". Com isso chega-se à conclusão que não sabe-se da alma tal como ela é em si, o que identificamos são representações ou vivências do sujeito, que foram colocadas pelo Outro. Este sujeito torna-se então uma função, não é mais visto como uma substância pensante. Filósofos empiristas como David Hume, Oskar Becker e John Locke, ajudam Immanuel Kant a desconstruir a ideia dogmática através dos conceitos de Isaac Newton sobre a adição psíquica, ou seja, que construímos através das informações psíquicas que recebemos, como por exemplo, ocorre com a cor que é uma adição psíquica à luz. Conclui-se que, se tudo que existe depende da percepção, o que não se percebe, não existe, ou seja, tudo que existe é representação na mente, é ideia. Observa-se com isso a dessubstancialização da matéria para a construção do sujeito e a era de que o sujeito é quem reina e a psicanálise vem daí. Entretanto, segundo a psicanálise este sujeito é barrado, diferindo da filosofia. O sujeito já não pode ser pensado como constituinte e sim constituído pela experiência da linguagem. Para David Hume, filósofo empirista, não nascemos humanos, nos tornamos humanos, formamos ideias a partir das impressões, que são repetitivas e acabam se fundindo. É pela repetição das impressões que o mundo se torna regular e também é pela repetição das impressões (ou representações) que surge o sujeito, ou seja, pela inclusão de hábitos no espírito, “regrando” a imaginação, pois se não fosse deste modo teríamos o caos ou o trânsito livre da imaginação (MACIEL, aulas do mestrado, UVA, 2011). 22 Com este posicionamento, a ciência então toma para sua competência conhecer e operar sobre a matéria (corpo), exilando, portanto o corpo do seu pensamento e identificando-o com a res extensa (nas suas atribuições de comprimento, largura e profundidade). Trezentos anos após, a psicanálise assim como a homeopatia, partem para uma operação que ocorre numa realidade psíquica, ou seja, vão atuar no sujeito que conhece a matéria (no sujeito que faz ciência, no pensamento) identificada anteriormente como “res cogitans”. Freud propôs acolher e decifrar a forma de pensar “excluída” por René Descartes, o pensar capaz de englobar todo tipo de ato psíquico: “desejos, tentações, impulsos, proibições, reflexões, dúvidas e ordens” (FREUD, 1909b, p.224), promovendo com isso o retorno do exílio do corpo em relação ao pensamento. Na sua trajetória da descoberta do inconsciente, Freud percebe a manifestação do desejo inconsciente no sonho, no sintoma e esse desejo nada mais é que o sujeito, sujeito da psicanálise (FREUD, 1905). Sobre o lugar de sujeito barrado podemos dizer que com o recalque, introduzido pela metáfora paterna, a criança sai do status de puro objeto do Outro para o status de sujeito, o que coincide com a entrada do sujeito na linguagem. O tal sujeito do qual falamos (...) é uma coisa muito estranha, que tanto mais existe e se realiza quanto mais ele é abolido, elidido, barrado. Esse é seu modo próprio de existir (ELIA, 2007, p.69). É o seu “Point de Capiton”, ou seja, o que dá amarração e ao mesmo tempo insere uma barra, o qual podemos diferenciar do eu, que está totalmente ligado à ideia de corpo, uma vez que “o eu é, primeiro e acima de tudo, um eu corporal”. (FREUD, 1923, p.40). 23 Diferente do pensamento psicanalítico, a filosofia entende o cogito como sendo o centro que torna o homem moderno muito seguro de ser devoto a tornar-se aquilo que pensa que é, ou seja, no que há de vir a ser e é aí mesmo nessa busca que se faz presente. Para Lacan, a existência do fato que naquilo que penso (cogitans), não é senão constituir-se como objeto (cogitarum), o resultado de uma depuração do sujeito transcendental. Assim, para a fórmula de René Descartes: “cogito, ergo sum”, Lacan coloca a sua própria interpretação: "cogito, ergo sum ubi cogito, ibi sum”, ou seja, se limita a dizer que: “só o meu ser aí está, na medida em que penso que (estou) sou em meu pensamento, e isso só diz respeito a mim mesmo”. (LACAN, 1949, p.520). Quando Freud fez seu discurso a respeito do inconsciente, postulou o fato de que não se trata de saber se ao falarmos de nós mesmos conforme somos, se realmente somos idênticos àquele de quem estamos falando e neste fato colocamos em jogo elementos que estão em nosso inconsciente, nos mecanismos significantes dele. Falamos no sujeito como correlato ativo da falta, da espécie de um “buraco em nossa alma”, que existe pelo ato do nosso ingresso na cultura, “buraco existente pela morte do Pai Natureza, que insere a falta, e só há falta do ser se houver sujeito, e esse sujeito é correlato ativo da falta”. (ELIA, 2004, p.48). Na obra de Freud, vemos o sujeito emergir quando ele identificou o inconsciente, embora o termo “sujeito” não integre o vocabulário da mesma. A noção de sujeito surge de uma forma permanente e sempre constante, embora implícita. Em toda a literatura freudiana, evidenciamos somente um parágrafo que é mencionado de maneira explícita esse conceito, embora a subjetividade seja o 24 essencial de sua obra. Esta que, sem dúvida foi um marco na sinalização de que a introdução do sujeito é uma condição absolutamente necessária para a natureza do ato humano. Podemos dizer que, enquanto o inconsciente é freudiano, o sujeito é lacaniano. Para Lacan, o sujeito compõe, juntamente com o sintoma, o saber e o objeto, os quatro pontos de apoio que sustentam a noção de estrutura, seus suportes materiais. A partir daí, temos condições de nos direcionar para a discussão do termo sujeito. 1.2 O sujeito do inconsciente Freud introduziu o sujeito através da descoberta do inconsciente, observando sua manifestação em sonhos, atos falhos, chistes, no sintoma e serviu de ponto de partida para Lacan que o situou através da linguagem (inconsciente estruturado como linguagem). Não podemos falar no sujeito em relação à Freud e não falar no sintoma, o qual ele colocou com estatuto de embaixador do “Isso” junto ao governo da consciência, um estranho interior. Freud importou-se com suas variações, detalhes e manifestações, porque sabia que onde estava o sintoma também estava o sujeito. Percebemos então que teremos que retornar ao sujeito como causa do sintoma, a fim de partirmos para sua verdadeira cura. Para Freud, o sujeito é a enunciação de sua obra, é a própria descoberta do inconsciente, como podemos observar na análise do “Sonho de Irma”, o qual na sua interpretação revela o desejo manifesto no sonho. 25 Este sujeito, o que invoca o desejo, apresenta-se como um estranho e estrangeiro ao “Eu”. Estranho porque é inconsciente e estrangeiro porque seria originário da pulsão. Se o sujeito freudiano fosse “algo”, seria algo que se define em relação ao “Isso”. E, poderíamos chegar ao ponto de dizer que, em relação ao sujeito freudiano, se fosse “alguém” diria: “Isso sou”! Temos como exemplo os sonhos, pois sabemos que na cena do sonho é o inconsciente quem comanda, é seu autor, e podemos dizer também que o desejo é o inconsciente manifestado nos sonhos, mas vem cifrado. Quanto ao desejo (do qual o “Eu” nada sabe) é o próprio sujeito, sujeito do inconsciente, sujeito da psicanálise. Freud conclui que em relação ao sintoma, se o inconsciente quer, a pulsão também quer, e temos aí a instalação de um conflito inteiramente paradoxal, como por exemplo, enquanto o “Eu” pretendia ser sádico, se resolve como masoquista, e o sujeito se revela como o avesso do “Eu”. Quando Freud diz “tornar consciente o inconsciente”, abraçamos a tarefa de assumir o desejo inconsciente e, para isso, teremos o trabalho de subjetivá-lo, cuja operação se dá o nome de perlaboração (Durcharbertung). Teremos que reconhecer então os interesses pulsionais que animam e sustentam as representações inconscientes, desmentindo a suposição de que noção de sujeito não faz parte dos ditos de Freud. Portanto, é na própria formação do sintoma que o desejo inconsciente se faz presente, se coloca entre a culpa e o desejo, como um “castigo” imposto para abafar a verdade inconsciente. Verdade essa que é o próprio desejo, que na realização somática aparece revelando o objeto da satisfação pulsional desgarrado e quem encarna esse desgarramento é o próprio sujeito. 26 Nas posições freudianas de 1900, observam-se nos escritos de Freud o sujeito surgir como desejo, sendo o desejo um dos nomes do sujeito em questão. Através das conclusões freudianas chegamos ao fato de que o sujeito freudiano é o resultado do órgão do qual se deriva a pulsão, com suas consequências, sendo a principal delas a seguinte: o que dá consistência material ao sujeito é um órgão regido pela satisfação que o governa. Teremos que considerar o excesso sofrido pelo desejo inconsciente e o sujeito nele incluso, o que termina por consolidar a estruturação do sintoma. Fazendo a análise das formações do inconsciente podemos concluir que o desejo é a mola propulsora, o sujeito propriamente dito e a análise dos sintomas prova que o movimento das pulsões é a causa material do inconsciente e também da vida psíquica em geral, podendo finalmente chegar ao fato que o correlato material do sujeito freudiano é um órgão que se define por ser nada menos que a fonte da pulsão. Sabe-se que a pulsão se encontra em um conceito limítrofe entre o psíquico e o somático, não necessita de inscrição, ingressando no mundo psíquico através de um representante que a inscreve no simbólico, donde se deduz que a pulsão é causa do simbólico, do inconsciente, do desejo e, portanto, do sujeito suposto (RIBEIRO, aulas do mestrado, UVA, 2011). Freud, em sua descoberta sobre a raiz pulsional do sintoma, admitiu que a formação sintomática nada mais é que um compromisso, o produto de uma transação entre a satisfação da pulsão e o caminho que o recalque permite e tolera, ou seja, é o desejo barrado pelo recalque. Por isso, o sintoma é uma formação elaborada para dar caminho à exigência da satisfação (Idem). 27 Verificamos, então, que nosso corpo fala, fazendo-se repórter das significações de nosso inconsciente, sendo sua via de acesso ao que o sujeito do inconsciente quer exprimir. Aos poucos vai se tornando evidente que o sujeito freudiano é um correlato da pulsão, um efeito do gozo, que o lugar do sujeito é diretamente ligado à fonte pulsional, “que sua materialidade nos evoca um buraco, sua substância um furo e, por tudo isso, o sujeito freudiano se apresenta como um dos efeitos do real”. (CABAS, 2009, p.73). 1.3 Sujeito da linguagem Lacan posteriormente vem colocar o sujeito do inconsciente à luz da linguística, manifestado metafórica e metonimicamente na linguagem (Simbólico) através de seu discurso e revelando seu desejo inconsciente, cifrado, abolido por trás do significante e através de sua obra consegue-se, enfim, localizar conceitualmente este sujeito e com ele operar na prática clínica da psicanálise. O Simbólico é o registro em que se marca a ligação do desejo com a lei e a falta, através do complexo de castração, operador do complexo de Édipo. Para Lacan, "a lei e o desejo recalcado são uma só e a mesma coisa”. (LACAN, 1966, p.72). Vemos, portanto, o sujeito do inconsciente, do desejo, ser simultaneamente o sujeito da ciência e o da psicanálise, embora a ciência o foraclua ao medicalizar o sintoma, promovendo o esquartejamento do corpo, tornando-se difícil depois olharmos o todo. Acompanhando a ideia de Lacan ao dizer que sujeito é uma categoria igualmente moderna e seu surgimento é contemporâneo ao da ciência, 28 conclui-se na sua jornada, o discurso do saber voltando-se para o agente do saber, tornando-se ele próprio questão de saber. Temos então o desdobramento do sujeito no qual ele aparece no ato de conhecer não mais como objeto notório. Na decorrência do discurso analítico, o sujeito é uma função e não uma substância, o sujeito não é material, não é uma persona. A noção de sujeito, no âmbito lacaniano, aparece como um cruzamento das tendências imaginárias (do Eu ideal), com as cadeias simbólicas (Supereu) e as linhas de força do real (gozo). Lacan em seu ensino afirma que o sujeito se constitui no trabalho da análise e somente por este, pois é no relato dos sonhos, atos falhos, lapsos, na fala, que evidencia-se o inconsciente constituindo – se então o sujeito, estruturado como linguagem. Pode-se colocar que a partir da análise podemos configurar o sujeito, a fim de sua realização, descortinando o que há de mais oculto, difícil de suportar, por isso, inconsciente. “Para Lacan, o sujeito se constitui no trabalho da análise e só pelo trabalho da análise. Em outras palavras, isso quer dizer que ele não é uma realidade já constituída”. (CABAS, 2009, p.139). A realização do sujeito conserva para Lacan a virtualidade de representar uma meta capaz de direcionar a cura. Lacan, servindo-se já da metapsicologia, situa onde Freud revelou as manifestações do inconsciente (sobretudo os sonhos) a emergência do sujeito, que surge como sujeito desejante. Dentro desta perspectiva, Lacan evidencia que há algo além do enunciado, há a própria enunciação, que se revela como um dizer inconsciente, uma verdade que se refere a uma falta e que vem recoberta por uma fantasia. Lacan postula que o inconsciente é linguagem e para ele o sujeito do inconsciente se constrói a partir do seu assujeitamento à linguagem e é estruturado como linguagem. 29 Se o inconsciente fala, se “Isso” quer dizer alguma coisa é na medida em que depende da linguagem como estrutura, como discurso do Outro, que podemos situar o sujeito do inconsciente, que vem sujeitado diretamente ao desejo do Outro, falando muitas vezes sem saber o que diz, deixando escapar equívocos onde se revela o desejo inconsciente. Freud descobre o inconsciente pela via da histeria, da questão sexual. Diferentemente, Lacan chega a ele através da psicose, revelando-se o “outro” do inconsciente como um imperativo: “tu deves”. Sendo então o inconsciente o discurso do Outro, nele o sujeito se encontra com sua mensagem de forma invertida, por isso quando nos referimos ao discurso do Outro, estamos na verdade nos referindo ao próprio sujeito do inconsciente. Segundo Lacan, “o Outro é o lugar no qual se situa a cadeia do significante que comanda tudo que vai poder presentificar-se do sujeito”. (LACAN, 1964, p. 193-194). Na sua relação com o Outro, identificamos o sujeito como sujeito do significante que se constitui a partir de sua relação com outro significante, pois em si mesmo, ele não significa nada. Lacan buscou recursos na antropologia e na linguística para estabelecer a autonomia do significante, que na verdade também é a autonomia do simbólico, separando o significante e o significado por uma barreira – a da significação – cabendo à cadeia de significantes ser a produtora dos significados, já que um significante só existe em relação a outro e é dessa relação entre significantes que surge o sujeito da linguagem. 30 1.4 O sujeito e o poder médico No ocidente, a prática clínica valoriza mais as doenças e como consequência, acontece uma crescente desvalorização da escuta. Esse é um dos motivos pelos quais a sociedade vem exigindo o retorno do "médico da família" e mesmo o direito a serviços médicos não alopáticos. A superespecialização, acompanhando o progresso da tecnologia e o crescente fenômeno da medicalização da sociedade, faz com que o paciente se sinta pressionado a visitar diversos profissionais para o acompanhamento de determinado sintoma. Por fim, o paciente torna-se cada vez mais carente e ao final da consulta fica claro a quase exigência de uma receita médica ou pedido de exame. A questão do resultado rápido e eficiente do tratamento já está tão difundida entre os pacientes que o profissional pouco se dedica às outras questões relevantes no estabelecimento da enfermidade em questão: os fatores sociais, ambientais, hereditários, psicológicos, culturais, religiosos e políticos, ou seja, a demanda que se apresenta não é somente a simples cura dos sintomas. Esta questão, de alguma forma, já vem progredindo. Aqui no Brasil, por exemplo, o cenário já apresenta mudanças com a instalação das Clínicas da Família onde se pode observar uma visão diferente, sedimentada na nova “Abordagem Centrada na Pessoa”. Nestes cenários, o paciente transita por alguns setores como a Clinica da Família onde se pode observar uma visão diferente na “nova psicologia” e a homeopatia que se encontram incluídas (NASF), assim como a acupuntura, já tendo então um acesso maior a falar sobre seus problemas e se colocar como pessoa. 31 Esse resgate do indivíduo como pessoa se fez necessário tendo em vista a quantidade de especificidades ao qual estava sendo submetido, o que o tornava algo não mais que “partes” de um corpo. Pode-se observar que desde o início da medicina, nas primeiras Escolas Médicas, por exemplo, a Escola de Cóes, onde Hipócrates (considerado o Patrono da medicina) lecionava, já abordava a doença como um fator reacional à adaptação do homem às diversidades encontradas em sua trajetória de vida e o próprio Hipócrates ocupava-se de tratar o doente e não a doença. Estando o homem submetido aos cuidados do médico, não há como tratar o paciente sem pensar numa boa relação médico-paciente e até mesmo pensar no processo da transferência, estabelecendo-se assim uma maior confiança e adesão ao processo terapêutico. Em casos de doenças graves como o câncer, AIDS, algumas doenças autoimunes e outras situações que demandam um comprometimento total da psique do paciente, observa-se que a participação da fala do paciente, da expressão de seus sentimentos durante o tratamento torna-se essencial ao processo de cura. Nesta nova política de abordagem na pessoa, o profissional médico muitas vezes vai até a residência do paciente a fim de saber o que realmente está acontecendo com ele e sua família, ou seja, mostra que todo o contexto implicado na situação está sendo colocado em pauta, o que já é um avanço grande no sentido da resolução de problemas que abrangem também um aspecto social, cultural e até mesmo econômico. O médico generalista, agora em pauta, vem no lugar do antigo “médico da família”, aquele que ouvia a todos, visitava o doente em casa e participava de seus problemas tratando-o de forma mais abrangente. Pensamos que a perspectiva é 32 favorável no momento à implantação de tratamentos que envolvam a inclusão da homeopatia e da psicanálise no seu decurso contribuindo, assim, para uma maior humanização da medicina. 1.4.1 Relação médico-paciente Na relação médico-paciente, os aspectos psicodinâmicos devem ser percebidos pelo médico a fim de que ele possa compreender que tais fenômenos interferem direta e profundamente na mesma. O sujeito que necessita de cuidados traz para o médico uma série de expectativas e fantasias quanto à figura do mesmo e quanto ao desenvolvimento da consulta. Existe uma grande importância nesta relação (transferência, contratransferência e mecanismos de defesa, tais como, negação, projeção, racionalização, repressão). Um exemplo é o sistema de emergência, onde o paciente está debilitado, onde a relação é por si só assimétrica. O paciente pouco participa (paciente passivo, submisso) e o profissional assume uma posição de superioridade, sem consultar o paciente para qualquer procedimento. Quando o paciente “acorda" para a situação, mesmo sabendo que alguns procedimentos eram necessários naquele momento para sua sobrevivência, pode ser difícil admiti-la. O sujeito, dependendo de seus relacionamentos, estrutura e identificações, usa estratégias para enfrentar sua angústia, desde as corporais, mais apropriada para as crianças de berço, passando pelas cognitivas ou mentais, ao se adquirir capacidade de representar psiquicamente os objetos até chegar a um nível evoluído de estratégias reflexivas, com o amadurecimento e a capacidade de abstração e de raciocínio. Numa tentativa de desdobramento, pode-se dizer que um enfrentamento de angústia é do tipo somático, quando o recurso encontrado pelo sujeito é o 33 adoecer com manifestações físicas; aditivo, ao extrapolar na comida, bebida, sexo, fumo e trabalho; atitudinal, ao se isolar, exibir, arriscar e brincar; emocional, ao se culpar ou culpar os outros, deprimir, agredir, chorar e gritar; mental, ao negar, racionalizar, rezar e fantasiar; e do tipo reflexivo ao se valer da fala, argumentação, debate, reflexão ou de outros recursos mais elaborados no sentido de aceitar e superar as dificuldades. Somente a partir da inserção do dispositivo analítico ao trabalho clínico dos médicos, tendo como ferramenta a escuta do que o sujeito do inconsciente vem dizer com sua linguagem, sintomas e através do deciframento desses, é que podese reorientar a prática clínica de neuroses e psicoses. A clínica médica se caracteriza por um processo onde o médico é detentor de um saber sobre o corpo do paciente que ele não possui, o paciente busca um tipo de informação sobre o funcionamento do seu corpo, um conhecimento do qual só o médico é possuidor. O que ocorre é que a demanda lançada ao médico, assim como a dirigida ao analista, não é puramente de cura e no momento que o médico não percebe isso algo escapa ao tratamento. Operando-se somente na matéria como na medicina clássica, alienamos o ser pensante que nela habita não excluindo-a de sofrimentos, já que estes são subjugados a esta realidade psíquica que no corpo vem manifestar-se. Sabemos que o sofrimento humano não tem como ser totalmente abolido, pois é gerado inicialmente pela própria aceitação da realidade pelo ser humano quando este iniciou a convivência nos laços sociais e ingressou na civilização, abrindo mão de suas pulsões mais primitivas, já que a civilização exige um enquadramento destas. 34 Diante da tentativa do homem da ciência ao longo dos anos de aliviar a dor e curar os males do corpo, porque não pensar em uma medicina que possa aliviar também o sofrimento psíquico do homem para que este possa conviver melhor com sua angústia, consigo mesmo e com seu próximo? O que o paciente espera do médico não é simplesmente ser curado, ele espera que o médico o tire de uma condição de doente na qual ele se encontra. É onde encontramos a diferença entre a demanda e o desejo. O que Lacan denota é que o fato de o sujeito querer algo não significa que se trate de seu desejo, mas sim de uma manifestação que o sujeito remete ao médico sob a forma de um pedido. O corpo acometido de uma somatização aparece como delimitador do saber médico, o “esquartejamento” cartesiano recorta-o e compartimentaliza-o, este é exilado (LACAN). No entanto, a partir da falha epistemo-somática o corpo como que “retorna do exílio”, ele não é meramente uma extensão física, mas algo que goza, goza de si mesmo, e sua dimensão, que não está situada no real das vísceras, não cabe em qualquer setorização proposta pelo saber médico. Lacan nos diz, num texto que conhecemos como “Psicanálise e medicina” (1966), que se a ciência moderna continuar a ignorar o “efeito sujeito”: Cada vez mais se abriria a falha epistemo-somática entre o saber científico do corpo e o que seria possível a esse corpo, habitado por um sujeito do desejo e do gozo e ignorado pela ciência, apresentar como fenômeno. (RIBEIRO, 2004, p.49). Outro ponto de grande relevância para se pensar essa falha são os chamados efeitos placebo e nocebo. No uso de diversos de tipos de medicamentos e terapêuticas, os médicos se depararam com um tipo de “aceitação/rejeição” por parte dos sujeitos que é simplesmente inexplicável dentro da teoria biológica médica. São pessoas tomando pílulas de farinha e tendo seus sintomas aliviados e outras 35 tomando suas medicações, sendo submetidas aos procedimentos e simplesmente não demonstrando qualquer espécie de melhora significativa. O discurso médico se depara com esses e outros pontos de interrogação que começam a eclodir em sua clínica e são obrigados a reconhecê-los, uma vez que sua presença se faz frequente. No entanto, sua atitude perante isso é a de fuga: os médicos reconhecem que há de fato algo que escapa às intervenções certeiras que visam o corpo, mas não sabem como lidar com isso, não conseguem acolhê-lo clinicamente. Este ponto de cisão demarca o lugar que os médicos atribuem aos serviços prestados por outras áreas. A partir da divisão entre as patologias fisiológicas e as chamadas psicossomáticas está demarcado o alcance da medicina e essa faceta do sujeito que a medicina não alcança é território por excelência do saber psi. A existência desse buraco no saber médico é o que possibilita a emergência da psicanálise enquanto prática inserida no contexto da saúde. A teoria médica não prossegue a uma reflexão sobre seus limites, a uma reinvenção da teoria numa articulação com os novos desdobramentos do humano, com as problemáticas que surgem. Frente à falha no saber a medicina recua, numa espécie de recusa a uma revisão epistemológica de seu saber. O surgimento da falta na teoria médica parece ser recalcado, tirado da dimensão da consciência. Retomando a posição do sujeito Lacan avança, afirmando que “a ciência sabe o que pode, mas apenas o sujeito decide o que quer”. (LACAN, 1966, p.8). O autor retorna a essa questão como forma de esboçar um “embate” que toma parte na clínica médica, onde o médico possui um saber científico, um saber sobre o corpo, que permite a ele intervir no mesmo da “melhor maneira”. Já o paciente, por sua vez, 36 sabe de si e cabe a ele enquanto sujeito decidir se quer ou não aderir à proposta terapêutica indicada pelo médico. É importante ressaltar a forma como as teias quase invisíveis da biopolítica influenciam essa decisão dos pacientes sobre o querer ou não o tratamento. Não se trata meramente de uma escolha de sua inteira e completa vontade, pois há como que um impulso a um apassivamento, o sujeito é rebaixado em detrimento de um saber que o desimplica numa proposta constante de melhoramento do corpo, aprimoramento da vida. O sujeito é convidado a gozar de seu corpo plenamente, a recuperar aquilo que julga ter perdido. Mas ainda há algo que foge a essa equação, mas que aparece frequentemente, algo que está além do princípio do prazer (FREUD, 1920). A dimensão de gozo atravessa a relação médico/paciente como algo que está além da demanda do sujeito de cura, de ser tirado da posição de doente, um obstáculo ao estabelecimento do tratamento médico, onde a demanda apresentada pelo doente é ultrapassada, pois há um gozo do corpo e o sujeito pode simplesmente não estar disposto a abdicar dele. Situa-se no campo do gozo a propensão a um usufruto ilimitado do corpo, o uso do corpo passa a um abuso, como um movimento da pulsão do sujeito que é desmedido, que desorganiza sua economia de gozo lançando-o num movimento constante de busca de um encontro com algo que ele busca, com o objeto perdido. O gozo não está na dimensão do prazer e sim no desprazer e o encaminhamento do sujeito por uma via gozosa pode levá-lo a seu fim. Fato importante que denota o conhecimento da ciência acerca dessa dimensão de gozo é a criação dos psicofármacos. A intervenção da ciência sobre o gozo se dá a partir dos psicofármacos, numa medicalização do sintoma sendo que 37 este pode ser a única via de salvação do sujeito, seu “grito de socorro”. Ao serem tratados com remédios, eles passam a ser os próprios dispositivos de intervenção médica que procuram “curar” o corpo, se tornar mantenedores de um gozo que vai num sentido contrário à cura, já que a angústia permanece presente, pois ela não é abolida com a medicação de um sintoma. Por isso, na maioria das vezes, o que observamos é a troca de um sintoma por outro e com isso um acúmulo de sucessivos fármacos no tratamento médico. A angústia causa sofrimento, principalmente quando não se sabe como lidar com ela e na construção do sujeito ela já se manifesta como fator determinante de sua estrutura psíquica. Lacan explica no texto “Estádio do espelho” (1949) sobre esse momento importante do sujeito e suas construções, que ocorre entre os seis e dezoito meses, situado no registro do “Imaginário”, juntamente com fenômenos como amor, ódio, agressividade. É o lugar das identificações e das relações duais, onde se estabelece o “Eu” e quando ocorre a identificação com o corpo. O ser humano tende a passar a vida toda ajustando sua imagem ao modelo ideal, a uma imagem ortopédica ditada pelo Ideal do Eu (Outro) e esse ajuste também é causa de sofrimento, pois gera angústia, como ocorre no leito de Procusto. O leito de Procusto é uma metáfora acerca da medida única: se sobra, corta; se falta, estica, na tentativa de fazer caber em uma única cama o que, por natureza, não tem medida única, de tornar pessoas de diferentes tamanhos aleijados funcionais. A angústia vem pelo descompasso e vai sempre existir, pois é comandada pela instância crítica constituída pelo Supereu, que aparece como herdeiro do complexo de Édipo. 38 Atualmente, podemos observar uma busca desenfreada pela aquisição da saúde ideal, do corpo ideal, que vem ditado pela mídia na contemporaneidade, sempre mudando seu padrão de acordo com a época, mas não podemos deixar de resgatar o sujeito, que se expressa na linguagem, que grita por socorro através dos sintomas para que sejam decifrados e não emudecidos. A experiência humana não merece se transformar numa “máquina” feita ou desfeita de acordo com a demanda ditada pela globalização e o Discurso do Capitalismo, transformando o desejo do sujeito em aquisições exibidas e oferecidas pela mídia (objetos de consumo, novos fármacos, etc.), totalmente manipulado e submetido à ciência como seu único mestre ou senhor. Respeitando-se o corpo, podemos dar a ele a chance de voltar do “exílio” ao qual foi atirado quando o homem esqueceu que não é somente matéria (corpo), é também possuidor de uma realidade psíquica que se expressa pelo pensamento e então ressignificando sua dor pode vir a lidar melhor com seus limites sem transformar-se em um ser robotizado. Por isso, cabe ao dispositivo analítico a tarefa de contribuir ao saber médico, colocando o sintoma muitas vezes não como sinal de doença, mas como manifestação do sujeito do inconsciente, do desejo, que aparece cifrado, não é explícito como a demanda do paciente, que é a de cura. A medicina ocupa hoje uma posição de saber científico, um saber sobre o corpo que permite a ela a realização de diversas intervenções. O que o olhar psicanalítico evidencia é que esse fazer é marcado por um olhar cartesiano que, procurando incidir diretamente sobre o real do corpo, na localização dos sintomas, rebaixa o sujeito ali presente, desprovendo o paciente simbólica e imaginariamente. 39 É aí que a psicanálise aparece, promovendo um corte na prática médica, denunciando a falha em seu saber. O olhar psicanalítico e também o do médico homeopata, promovem a emergência do sujeito, a convocação a tomar parte, a implicação dos corpos (a) sujeitados. Nesse sentido, é imprescindível que se pense sobre a posição em que a teoria médica situa os sujeitos, de modo a perceber mais significativamente o modo como se apresenta o doente, expressando no corpo muitas vezes o que não consegue resolver psiquicamente ou exprimir emoções guardadas, contidas, muitas vezes amarguradas que vem à tona sob a forma de doenças. Um exemplo clássico é o aparecimento de uma doença autoimune, (ex: psoríase), cuja causa não se consegue elucidar e o componente emocional é por certo um grande fator de desencadeamento, sendo seu tratamento hoje já direcionado pelos próprios médicos dermatologistas para a homeopatia e também para a psicanálise haja vista que a agravação do quadro é totalmente ligada ao descontrole da ansiedade. Outra situação em que a homeopatia obtém muito sucesso, muitas vezes até remissão completa (eu mesma tenho vários casos), é a situação dos asmáticos. A asma é considerada uma doença grave que pode inclusive levar ao óbito, mas se tratada pode estabilizar-se e pela minha experiência de atendimento durante dez anos em ambulatório do SUS na SCMRJ, pude observar que o tratamento teria que controlar principalmente o fator que “sufoca” o paciente, o qual despertaria sua grande ansiedade e, por conseguinte as crises, além de evidentemente agir no controle dos fatores causadores da reação alérgica. A palavra asma vem do grego e significa “sufocar”, portanto percebe-se na própria demanda de cura do paciente o que ele quer dizer quando chega ao consultório: “Dra., eu vim porque quero tratar a minha asma”. Por mais antialérgicos e corticóides que a medicina clássica 40 prescreva, não atinge a causa principal e as recidivas são constantes, mostrando a dificuldade do paciente em lidar com as situações que geram “sufoco” a ele. 41 2 O SUJEITO E A HOMEOPATIA 2.1 Considerações gerais sobre a homeopatia Hipócrates, que foi considerado o “pai da medicina”, ao elaborar os conceitos de cura, desenvolveu a lei dos contrários (a cura pela administração dos contrários, ou seja, para uma inflamação, uma substância antiinflamatória, para febre, um antitérmico e assim por diante). Também descobriu a cura pelo semelhante, a lei da semelhança; aquilo que causou o mal, também pode curá-lo. A medicina tradicional seguiu a corrente da cura pelos contrários, ficando a cura pela semelhança com pouca atuação. Hahnemann, médico alemão, insatisfeito com a medicina da época, descobriu um processo terapêutico baseado na correlação clínica da doença com o fenômeno da reação à droga. Essa terapêutica, seguindo a lei da semelhança (já desenvolvida antes por Hipócrates), representa um método científico com normas de conduta e foi chamada de homeopatia. A palavra homeopatia vem do grego homoios que significa semelhante e pathos equivale a doença ou sofrimento e designa a ciência terapêutica baseada na lei natural de cura “similia similibus curentur”, ou seja, os semelhantes curados pelos semelhantes. 42 Demarque, Kollitsch, Fortier-Bernoville e Martiney, conjuntamente propõem que: As substâncias que, em doses ponderáveis, tóxicas ou fisiológicas, são capazes de provocar no indivíduo aparentemente sadio, porém sensível, um conjunto sintomático determinado, podem igualmente, em outros indivíduos doentes e sensíveis, fazer desaparecer os sintomas semelhantes, se prescritos em doses hipofisiológicas. (KOSSAK-ROMANACH, 1993, p.263). Coube a Hahnemann, cognominado “criador da homeopatia”, nascido em 1755 em Meissen, na Alemanha e falecido em 1843 em Paris, não somente fundamentar a “lei dos semelhantes” como método de tratamento sob o nome de homeopatia, mas também a prioridade do método experimental, o estudo clínicopatológico do efeito secundário das drogas, a valorização dos sintomas mentais na gênese das doenças somáticas, a descoberta do poder dinâmico das doses infinitesimais das drogas e o reconhecimento do estado de sensibilização do organismo pela doença. De todas as suas contribuições, a mais revolucionária e polêmica, foi a descoberta do poder energético medicamentoso contido nas doses mínimas dinamizadas, inclusive de substâncias consideradas farmacologicamente inertes. A homeopatia está baseada na determinação do remédio que, absorvido pelo indivíduo são, produz os sintomas que desejamos fazer desaparecer no doente. Esse remédio é então chamado de “simillimum”. Este remédio deve ser o reflexo do doente, sua imagem no espelho. Por isso, o médico homeopata “personaliza” o remédio. A homeopatia trata o paciente de uma forma holística, trata o doente, não somente a doença, percebe o indivíduo como um todo, englobando sintomas não só físicos, mas também mentais, psíquicos e emocionais, aborda fatores que podem ter 43 contribuído para o aparecimento dos mesmos, valoriza sintomas particulares, desejos, aversões, fobias, sono, sonhos, etc. Os homeopatas consideram a doença como uma desarmonia que precede à alteração em toda parte do organismo, fornecendo-o as sensações desagradáveis e o impele a atividade irregular. Hahnemann, ao descobrir o princípio da semelhança como estrutura da clínica homeopática, privilegiou ao máximo o sintoma. Valorizando este, vemos o sinal de que o paciente está doente não podendo viver sua vida com tranquilidade, ou seja, o sintoma significa algo, quer nos dizer algo, por isso deve ser pesquisada a sua verdadeira causa, pelo sinal na homeopatia, podemos até supor qual bloqueio emocional o sujeito apresenta. Hanhemann falou muitas vezes na “totalidade dos sintomas". A homeopatia é uma legítima medicina, porque tanto em sua doutrina quanto em sua prática visa um único fim: intervir por meio do organismo, mediante o medicamento específico, despertar uma reação neste organismo e obter a cura do sujeito e não somente a medicalização do indício sintomal. Segundo os ensinamentos de Hahnemann, a única e elevada missão do médico é a de restabelecer a saúde dos pacientes, ou seja, curá-los das suas enfermidades. O autor chama a homeopatia de “Heilkunst”, a arte de curar. Trata-se de uma arte, pois efetua-se uma reorganização dos “objetos” psíquicos, surgindo uma ordem em que o belo se faz presente, porquanto o inominado ou o insuportável, passam a ter uma configuração não só aceitável, mas integrada. Cabe salientar que Hahnemann não publicou uma teoria, mas sim tudo aquilo que já tinha experimentado e observado em vários anos de atividade com seu novo método terapêutico. 44 2.2 Fundamentos da homeopatia A Homeopatia está fundamentada em: 1 º - Lei dos semelhantes É uma aplicação do princípio geral da analogia em farmacologia. “Similia similibus curentur”, isto é, que os semelhantes sejam curados pelos semelhantes. É uma lei onde se compara os sinais e sintomas observados nos indivíduos doentes com os descritos na experimentação medicamentosa no homem são, nos animais e complementados pelos dados da toxicologia, bem como da experiência clínica e mesmo da medicina popular. 2º - Experientia in homini sano Samuel Hahnemann desenvolveu esta ideia na prática, passando a experimentar ele mesmo e em alguns de seus amigos e familiares as mais variadas substâncias das quais foram observados e anotados todos os efeitos produzidos no organismo. Mais tarde, deu início ao seu método aplicando aquelas substâncias em doentes que apresentaram os mesmos sinais estudados. 3º - Dosis minimae Os remédios são diluídos a fim de não provocar toxicidade. Sabendo do perigo do uso de grandes quantidades de plantas tóxicas e venenos, Hahnemann preferiu usar sempre doses bem pequenas de medicamentos, para que somente o efeito benéfico aparecesse durante o tratamento. 4º - Unitas remedii Hahnemann e seus voluntários experimentavam uma droga de cada vez, para não mascarar seus efeitos no organismo sadio. Ele não admitia que no processo curativo o médico misturasse duas ou mais substâncias ao mesmo tempo, pois 45 achava que o resultado era imprevisível, uma vez que o doente já estava bastante enfraquecido pela doença em si. Hanhemann preconizou que o processo de saúde, doença e cura é dinâmico, logo o remédio homeopático também deveria sê-lo. Assim, toda vez que este é preparado, ele passa pela dinamização, ou seja, diluições seguidas de cem sucussões (batidas fortes e ritmadas) para despertar a energia contida na substância presente. Segundo a concepção filosófica homeopática, a origem primária de qualquer doença está na perturbação da força vital, entendida como uma forma de energia primordial e fundamental responsável pela manutenção da vida e do equilíbrio orgânico. Portanto, a essência do desequilíbrio da saúde encontra-se num nível imaterial (energético) no qual interagem nossas forças psíquicas (pensamentos e sentimentos) e que retrata os fatores íntimos a que cada ser é suscetível. 2.3 O medicamento homeopático O medicamento homeopático atua, principalmente ou exclusivamente, dependendo da dinamização, não por ação química, mas sim física (eletromagnética). Hoje a física quântica pode explicar facilmente os mecanismos de atuação dos remédios homeopáticos. O mecanismo de ação destes, em termos de neurofisiologia, é o nêurico reflexo. Atua geralmente como um estímulo-terapia oral. Esses medicamentos agem sobre os interoceptores da boca (sublingual) e/ou esôfago e estômago e pelas vias 46 aferentes estimulam o córtex cerebral que envia respostas, estímulos aos órgãos e estruturas orgânicas doentes. Desta forma, o medicamento homeopático desperta uma reação vital orgânica contrária aos sintomas do desequilíbrio vigente, funcionando como um direcionador do processo de cura interior. Acreditamos que caberá à física, futuramente, a mensuração desta forma de energia sutil (energia ou força vital), assim como o fez no passado com a eletricidade, o magnetismo, as radiações, etc. Sobre a força vital, Hahnemann escreveu: No estado de saúde, a força vital imaterial, que dinamicamente anima o corpo material, reina com poder ilimitado e mantém todas as suas partes em admirável atividade harmônica, nas suas sensações e funções, de maneira que o espírito dotado de razão que reside em nós possa livremente dispor desse instrumento vivo e são para atender aos mais altos fins de nossa existência. (IDEM, 1996, p. 9). Pensamos que é apenas através da medicina que chegaremos a alguns conhecimentos positivos sobre a natureza humana, mas com a condição de abranger a própria medicina em sua verdadeira generalidade. Do contrário, parecenos que estamos bem longe de tais conhecimentos, ou seja, de saber o que é o homem, porque razões ele subsiste. Assim, segundo Hipócrates, todo médico deve estudar a natureza humana e procurar com cuidado, se quiser cumprir suas obrigações, quais são as relações dos homens com seus alimentos, com suas bebidas, com todo o seu modo de vida e quais influências cada coisa exerce sobre cada um. Para atuar nesta natureza imaterial do homem, a homeopatia utiliza medicamentos em doses infinitesimais, preparados segundo o processo farmacotécnico da dinamização (diluições e agitações sucessivas), através do qual 47 busca-se a liberação dos poderes energéticos vitais contidos nas substâncias, respaldado no conceito universal de que “toda matéria é energia condensada”, baseado na Teoria da Relatividade, de Albert Einstein. Cada medicamento homeopático, experimentado no indivíduo sadio, provocou uma série de sintomas (mentais, gerais ou locais), que devem ser semelhantes aos sintomas do indivíduo enfermo, para conseguirmos trazê-lo ao estado de saúde. Em vista disso, torna-se indispensável o conhecimento dos sinais e sintomas objetivos e subjetivos do paciente, a fim de podermos encontrar o remédio que mais se lhe assemelhe. Disso denota o interesse do médico homeopata por particularidades do indivíduo, que pode ser considerado estranho por aqueles que não entendam o modelo homeopático. Daí a necessidade de um interrogatório profundo, no qual se busca a compreensão da totalidade sintomática característica do indivíduo, manifesta na forma de ser e reagir frente ao meio e às pessoas que o cercam. Tudo que diga respeito ao paciente exprime o estado de sua força vital, desde os conteúdos imaginários e fantásticos, passando por sonhos, sensações, sentimentos e pensamentos, até as características gerais e físicas que o caracterizam. O homeopata espera que os sofrimentos físicos e morais sejam expressos de uma forma espontânea, sincera e detalhada, a fim de que num clima de compreensão recíproca entre médico e paciente possa desenvolver-se o trabalho de equipe na busca do medicamento correto. Para isso, torna-se fundamental ao paciente e aos que o acompanham, a observação constante do seu modo de pensar, sentir e agir, procurando entender as 48 causas profundas que o fizeram adoecer e renovando em si mesmo o diálogo interior na prática do ensinamento grego: “conheça-te a si mesmo". Devemos frisar que o entendimento íntimo do ser humano é um trabalho árduo e que deve ser adquirido gradativamente, segundo o esforço que cada um empregar nesta tarefa de autoanálise, estando neste conteúdo de conflitos, de modo geral, o fator desencadeante para a instalação de grande parte das enfermidades. Para os sintomas locais ou físicos com os quais estamos mais familiarizados, devemos observar todas as particularidades que os tornam característicos a cada indivíduo (modalizações): tipo de dor ou sensação, localização e irradiação, época e hora do surgimento, fatores de melhora ou piora, sintomas ou sensações concomitantes etc. Quanto a sintomatologia geral, que representam as características generalizantes do organismo ou que se relacionam a outros, melhorando-os ou agravando-os, devemos valorizar as seguintes modalidades: posições ou movimentos; temperatura, clima ou estação do ano; condições atmosféricas e do tempo; comidas e bebidas; transpiração, eliminações, evacuações, etc. A grande importância dada por Hahneman aos sintomas mentais, ou seja, às características relacionadas ao pensar e sentir, ao caráter e à moral, mostra a compreensão ampla que ele tinha das doenças, por abordar um tema que só agora começa a ser aceito pela medicina (psicossomática). São estes os mais difíceis de serem relatados por constituírem um plano mais importante da individualidade e por delatarem nossas limitações e fraquezas que, por defesa, buscamos esconder. É de fundamental importância que se observe o aparecimento de qualquer mudança significativa após a ingestão do medicamento, em todos os níveis, 49 anotando suas características particulares, época de surgimento, duração, intensidade, etc. Geralmente estas reações são breves acompanhadas de uma melhora geral do quadro. 2.4 Homeopatia e psicanálise como terapias do sujeito Tanto a homeopatia quanto a psicanálise buscam a cura dos pacientes. Ambas visam a cura do sujeito, mas agem unicamente por meio da palavra, distintamente dos outros tipo de terapias e da medicina clássica. Stiefelmann, (2009) em sua obra “Thesaurus Homeopático”, salienta a relevância das palavras utilizadas pelos pacientes em uma consulta homeopática. Segundo ele, esta é uma técnica utilizada desde Hahnemann, o criador da homeopatia. De acordo com essa premissa, o medicamento é prescrito conforme uma combinação específica que tem como base os significantes que o paciente utiliza em seu discurso. “Devemos reforçar nossa busca pelo texto do paciente, e não mais utilizar-se da técnica ‘cirúrgica’ a que fomos treinados no início da nossa prática”. (STIEFELMANN, 2009, p.17). Um importante conceito freudiano que aproxima mais uma vez a homeopatia da psicanálise, é o de pulsão. Freud usou o termo Trieb (pulsão) para exprimir a energia que movimenta o ser humano. Para ele, a pulsão representa uma "força constante” que mantém em vida e em funcionamento o organismo e o psiquismo. Força vital, para Hahnemann, é o que mantém em perfeita ordem e harmonia o ser vivo e é sempre concretizada em um sujeito. Esta força vital pode variar em sua intensidade e seu desequilíbrio pode provocar doenças. 50 Assim como a homeopatia, a psicanálise supõe uma “força constante” e trabalha com seus representantes através da fala, que constitui o sujeito. Falando-se do sujeito, não podemos deixar de citar o sintoma, expressão do próprio sujeito que é para a homeopatia a própria doença e a “totalidade dos sintomas” forma a especificidade de cada sujeito. Em psicanálise, o sintoma é uma formação de compromisso entre o “Isso, Eu e Supereu”, que possibilita ao sujeito sua sobrevivência diante de fatos inconscientes e insuportáveis à ele. Segundo Lacan, o sintoma significa uma metáfora do núcleo patógeno, constituindo-se como a única saída de saúde que o sujeito encontra diante de seu conflito interno. (CHECCHINATO, 2006, p.20). A homeopatia trabalha no sentido de destravar os impedimentos ao bom funcionamento da energia vital do sujeito, fazendo que esses impedimentos ou núcleos patógenos sejam ressignificados pelo sujeito, ou seja, ela provoca uma reação dinâmica capaz de desencadear a desfeitura dos nós ou núcleos patógenos. Hahnemann chamou a atenção para a sensibilidade do homeopata no intuito de captar o que no sujeito diz e com isso alcançar a forma como ele deve ser curado, rearranjado, fazendo com que na versão de sua história o sujeito mude seu olhar e consiga assumir aspectos antes insuportáveis e por isso causadores de sofrimento. Sendo assim, a homeopatia ao destacar o papel da linguagem, a centralidade da palavra e o uso dos recursos discursivos e simbólicos no processo semiológico terapêutico resgata a questão ética do sujeito, não abole o sujeito simplesmente porque não age diretamente no sintoma e sim no restabelecimento da energia que está em desequilíbrio sendo, portanto, considerada a medicina do sujeito. Com a centralização nos sujeitos e através da interpretação de suas narrativas na prática clínica, a homeopatia vem privilegiar a situação de adoecimento 51 destes assumindo-os como sujeitos portadores de necessidades e expectativas, conferindo características específicas à sua abordagem e, com isso, permitindo uma maior consciência com relação ao processo de adoecimento, onde será capaz de resgatar a dimensão do cuidado na ação e na especificidade do processo terapêutico. 52 3 A CONSULTA MÉDICA EM HOMEOPATIA Considerando-se que na homeopatia devemos conhecer o que é o homem, o pensamento do homem e também sua linguagem para poder medicá-lo, verifica-se que há primariamente, um desequilíbrio no seu Governo Central e deste primário desequilíbrio é que partem as alterações que posteriormente vamos observar nos tecidos e não somente estas alterações como sendo a própria doença. O médico homeopata tem por meta colocar em ordem o interior da economia, isto é, induzir uma reação do próprio paciente, através dos remédios prescritos para que ele próprio reorganize sua vontade e entendimento, de forma que possam soar em uníssono e assim o homem por ele próprio recuperando o equilíbrio de sua energia vital, acionará o estado de harmonia em seus tecidos e funções. Hanhemann utilizando-se de informações obtidas no decurso de suas experimentações de medicamentos com o homem são, afirmou que “a mente é a chave para a compreensão do homem e que os sintomas mentais são os mais importantes a serem considerados no curso de uma doença crônica”. (KENT, 2002, p.31). Em seu livro “Organon da arte de curar” (1996), Hanhemann cita logo nos primeiros parágrafos a importância da cura do doente e não somente dos sintomas, 53 ou seja, coloca o fato de que o restabelecimento da saúde não se limita a suprimir os sintomas. “O próprio “paciente” deveria ser capaz de se dar conta através de suas sensações e de poder continuar a dizer que é ele quem está recuperando sua saúde toda vez que um sintoma é eliminado”. (KENT, 2002, p.34). Podemos perceber então, que a cura na homeopatia se dá em um processo centrípeto, ou seja, a partir do interior para o exterior do corpo do homem. O centro do corpo é o cérebro, é dele que toda ação parte e é a partir dele que a doença se inicia, o mesmo ocorrendo com o processo curativo. Assim sendo, o homem, adoece por si mesmo, não é devido somente a bactérias ou ao meio ambiente exposto unicamente; senão como poderíamos explicar que em uma epidemia muitos adoecem, mas não todos? Se a economia vital está em desordem, segue-se a manifestação de sinais e sintomas desencadeados inicialmente por esta. Hanhemann cita no seu “Organon”: “Numa palavra, a totalidade dos sintomas deve ser a principal e de fato a única coisa que o médico deve considerar em cada caso de doença, removendo-a por meio de sua arte, para que a doença seja curada e transformada em saúde”. (KENT, 2002, p.81). Esta é a transformação da desordem interna em ordem e se processa da seguinte forma, de cima para baixo, de dentro para fora e na ordem inversa do aparecimento de sintomas. Em homeopatia, sabemos que algo precede o corpo. Dizemos que o homem sente, vê, saboreia, ouve, pensa e vive, mas sabemos que estas são manifestações exteriores do pensamento e da vida. A vontade e o entendimento sendo constituintes do homem que presidem à formação de seu corpo, estando em ordem, teremos um corpo saudável. O que precede é o que pode ser modificado, o que vem 54 antes. Fica claro que devemos partir da vida para o corpo e não do corpo para a vida. O processo de adaptação do homem ao meio ambiente e ao meio social em que vive, ou melhor, à própria civilização é por si mesmo um fator desencadeante de desequilíbrio interno com posterior formação de sintomas e doenças. A maneira como um indivíduo reage diante das diversas situações às quais é submetido a vivenciar varia muito, é um processo adaptativo completamente individual interferindo por isso mais ou menos na sua economia vital, na manutenção de seu equilíbrio. Se ele consegue manter este equilíbrio diante da sua adaptação ao seu meio e nas diversas situações a que é submetido a fatores desencadeantes de estresse, consegue produzir mais, ser capaz de maiores realizações e também consegue manter seu corpo sadio por um tempo maior. Se, no entanto sua adaptação procede inadequadamente, seu corpo reage informando que algo não está funcionando como deveria, o que gera um mal-estar. Na maior parte das vezes, estes sintomas são tratados e medicalizados, obviamente estando o médico fazendo seu papel de prestar socorro ao paciente, mas o que ocorre é que muitas vezes, se o mal-estar existe e persiste, os sintomas retornam de outra forma, em outro sistema do organismo informando que ainda resta uma desarmonia, como se fosse uma disfunção de uma força interna. Freud usou o termo pulsão – Trieb – para melhor designar a força que movimenta a vida do homem. Definiu-a como um conceito limite: “Um conceito limite entre o psíquico e o somático”. (idem, 1915, p.17). Descreveu-a como uma força constante, um impulso procurando saída, realização, satisfação. 55 Satisfação esta que se apresenta de forma ininterrupta, ou seja, a pulsão procura incessantemente sua satisfação, a qual não é específica, é pura energia à procura de saída, de forma versátil e pode tomar vários caminhos diferentes de se representar (CHECCHINATO, 2006, p.91). A pulsão então pode vir a representar-se na arte, religião, ciência, em um processo ao qual denominamos sublimação, sendo este especificamente inerente ao ser humano, na medida em que procura incessantemente uma representação. Representação esta que não para nem quando dormimos, logo podemos observar isso no processo dos sonhos. Outra maneira de representação é a fala, porque concebe o homem como ser em si, o nomeia, o coloca na posição de ser homem, ou seja, coloca-o na sua posição de racionalidade. Também podemos observar que no processo do adoecimento há outra maneira de representação, trata-se de um processo patológico. É patológico porque o faz sofrer e onde há sofrimento há fala. Colocando-se desta forma, encontramos, por exemplo, os sintomas mentais de medo: medo da morte, medo de doença, etc. Como manifestações da pulsão que foram representadas de forma inadequada, pois seus significantes causam sofrimento ao sujeito. Só podemos conhecê-la indiretamente, através de suas manifestações. Freud em sua obra “Além do princípio do prazer” (1920), classificou-a segundo dois eixos: pulsão de vida e pulsão de morte. Isto não traduz o fato de ser boa ou não, só iremos verificar isso através da sua representação. Se esta não denotar sofrimento, entendemos que não é ruim. A pulsão, portanto depende de uma estrutura de educação, limite e integração com o meio para ser melhor representada tendo como base neste processo a educação que forma a criança e a coloca na sociedade como ser consciente (de si, do próximo e do meio em vive) e futuramente ser capaz de cuidar de si. 56 Reconstituir a história de um sujeito através de sua fala, a maneira como foi representado ao longo da vida, seus apegos, inseguranças, amores, terrores, etc. nos permite intervir no que o sujeito traz enquanto sofrimento, ou seja, no redirecionamento da pulsão que foi mal representada, que fica como se fosse uma força interna mal direcionada. Hahnemann fala em força e “força vital”, sendo que esta nada tem a ver com a concepção filosófica do vitalismo. Força vital para Hanhemann é algo vivo e sempre concretizado em um sujeito. Aquilo que mantém a vida humana em admirável harmonia. Ela preside a todas as funções do ser vivo. Parece-me que ‘força constante’ (pulsão) e ‘força vital’ em múltiplos aspectos se recobrem. Tanto a homeopatia quanto a psicanálise têm nela os fulcros que as sustentam. (CHECCHINATO, 2006, p.18). Na consulta homeopática, o médico abre um espaço para o paciente falar de sua vida, seus problemas e tudo que o aflige, o que além de permitir que o sujeito se manifeste, também favorece o processo da transferência. No seu discurso, durante a consulta, o médico homeopata como bom observador, presta atenção à linguagem usada pelo sujeito, levando em conta o que foi proferido. O paciente pode ter trazido à tona significantes que podem ajudar na prescrição do medicamento e que irá dar início ao seu processo de ativação interna na busca de sua cura. Ora, penso e tenho provas disso, que a homeopatia com os meios que lhe são próprios, pode possibilitar mudanças e permitir que o paciente encontre outras saídas de vida que a de passar sob a condenação de seus núcleos patógenos. (idem, ibidem, p.102). 3.1 O tratamento com a homeopatia Durante o tratamento podemos nos deter nos temas, na “tematização” usada pelo sujeito falante, o que serve para dar nomes aos conteúdos psíquicos e físicos, imaginários ou não. Sabemos que a comunicação se realiza por meios de signos 57 linguísticos como foi visto por Saussure, em seu afamado “Curso de linguística geral” (1915). Os signos são possuidores de duas partes sendo elas: o significante, que traz a informação e o significado, a mensagem, ou seja, aquilo que o signo quer dizer. Em seu livro “A medicina do sujeito”, o autor Paulo Rosenbaum cita que para Hahnemann, o médico homeopata deverá ser sempre um “observador atento e livre de preconceitos” (idem, 2004, p.27), o que torna o médico uma espécie de arquivo amigável equiparando-se ao que Lacan se refere quando afirma que o paciente deposita a palavra no terapeuta, o que produz alívio. Também na consulta homeopática seguimos a regra de não intervir no relato do paciente, sendo o ideal este relato se dar de uma forma bem espontânea, sem o médico fazer perguntas diretas ou tampouco obter respostas direcionando o discurso. O relato espontâneo, observando-se as palavras usadas pelo paciente e fiel aos seus significantes, vai constituir o parâmetro mais fidedigno para a melhor prescrição homeopática. Um aspecto de importância vital em uma clínica mediada por palavras mostra que Hahnemann não estava nem um pouco interessado em recortar seu objeto de estudo no quesito “íntegra do sintoma apresentado originalmente” ou “processos verbais”. Ou seja, a preservação na íntegra no contexto frasal, também nesta versão prototípica de repertório, vaticinava a importância das palavras. (ROSEMBAUM, 2006, p.27). Podemos dizer que o paciente, no seu relato espontâneo, expõe as questões que impedem o livre fluir de sua existência, cabendo ao médico homeopata saber ouvir e dar espaço a esse ser falante para que possa se manifestar, o que possibilita ao sujeito em questão o reencontro consigo mesmo. “O médico permanece em silêncio, permitindo que (os pacientes) falem tudo quanto têm a dizer, sem 58 interromper. Cada interrupção quebra a ilação do pensamento do narrador, já não mais irá falar o que teria dito antes disso”. (HAHNEMANN, 1996, p. 167-169). Na anamnese homeopática, durante o relato espontâneo do paciente, o médico homeopata direcionará sua atenção ao inesperado, o que destoa, o desfocado, o que lhe é peculiar, o que não tem justificativa, o inusitado, que sinaliza a modalização do sintoma. Importante ressaltar que além de modalizar os sintomas, também procuramos sua causalidade, o que desencadeou o quadro, não nos detendo apenas no aparecimento do sintoma. Durante o tratamento homeopático, fazemos uma analogia: é como se fosse o ato de descascar uma cebola, pois à medida que ocorre a evolução do tratamento, o núcleo vai se expondo até somente restar a parte interna, justamente a que contém as informações iniciais, ou seja, os significantes necessários para o deciframento do início do processo de adoecimento do indivíduo, seja este físico, mental ou ambos. Ao instigarmos uma reação com a prescrição do medicamento homeopático, o processo de cura pode ser acionado, não significando, porém que este paciente fique livre imediatamente de sintomas. O que se pode perceber são modificações como melhora da qualidade de vida, sono, percepção, vontade, nível de ansiedade, etc. Como a reação de cada um é individual e também dependente do grau de acometimento da economia interna (poder de reação mais estado lesional), o processo de cura varia em cada um, podendo ocorrer totalmente ou não. A situação que deflagrou o quadro é a que nos interessa assim como o que no relato do paciente, o que lhe é peculiar, podendo esta prescrição variar muito de indivíduo para indivíduo, o que não ocorre com a maneira clássica de prescrição mostrando assim que a individualização é primordial e importantíssima no tratamento. A 59 homeopatia, portanto, trata o sujeito, trata o que precede a lesão operando no que vem antes da doença como manifestação física e atua no que deve ser tratado além da alma. 3.2 Estudo de caso Este estudo clínico tem como objetivo relatar um caso de dermatose que ocorreu em um paciente do sexo masculino, de cinqüenta e quatro anos, tratado com sucesso por meio da homeopatia após falha de diferentes esquemas terapêuticos convencionais. Após diversas consultas com vários especialistas foi estabelecido eczema de contato como uma das hipóteses diagnósticas. Durante três anos utilizou diversas drogas como corticoides tópicos, queratolíticos e hidratantes, obtendo pouca ou nenhuma resposta terapêutica, quando foi então encaminhado à homeopatia. Em maio de 2010, atendi um paciente em meu consultório no Centro do Rio de Janeiro com as características que descreverei em seguida. Logo quando entrou na sala, percebi pela sua postura que havia algo diferente nele. Não cumprimentou, mantendo ambas as mãos sob as axilas com os braços cruzados, posição que manteve durante o relato na consulta. No início, como de praxe, fiz a ficha com seus dados pessoais, etc. Logo após, indaguei o motivo da consulta e no que poderia auxiliá-lo com a homeopatia. Com isso deu-se início ao relato: contou-me que durante três anos e meio mantém um tratamento no setor de Dermatologia a fim de melhorar a situação de suas mãos, mas não obteve praticamente nenhuma melhora, tendo então sua última dermatologista sugerido que procurasse ajuda na homeopatia. 60 Descreveu-me que há quatro anos atrás, no local de seu trabalho (plataforma da Petrobrás), onde atua há quinze anos, ocorreu um grave acidente, pelo qual tomou para si toda a responsabilidade, tendo até mesmo respondido em juízo pelo ocorrido (não citou vítimas). Sentiu-se seriamente abalado e tenso com a situação, mas não procurou ajuda nem desabafou com ninguém, guardando para si o conteúdo emocional decorrido do fato. Seis meses após, relatou que suas mãos começaram a apresentar “fissuras profundas e extremamente dolorosas” e a pele das mesmas encontrava-se espessa e enegrecida, algo como se estivesse “suja”, com áreas de relevante ressecamento. Com este quadro de “fissuras nas mãos”, procurou tratamento médico onde fez diversos testes e exames, tendo procurado ajuda até no Instituto Oswaldo Cruz para biópsia. Mostra-me então as mãos, as duas ao mesmo tempo, no que pude contemplar que realmente apresentavam as lesões descritas sendo as mesmas profundas e em grande número, não somente na palma das mãos como também nos dedos. Fez menção à dor que sentia nas mãos, que o impedia de exercer suas funções no trabalho. O que fez com que fosse transferido para outro setor no qual não estava adaptando-se. Com base em uma anamnese voltada principalmente para os aspectos psicológicos, mentais e emocionais assim como uma análise da personalidade do paciente, foi iniciado tratamento com Petroleum e Staphysagria, obtendo melhora evidente das lesões em aproximadamente duas semanas. Após dois meses em tratamento, este paciente retornou apresentando sensível melhora do quadro embora não tivesse “levado fé” quando eu falei que 61 dentro de duas semanas ele estaria bem melhor. Neste retorno, apresentou-se mais alegre, falando mais e observei que várias fissuras já haviam regredido embora não todas. Continuei com a mesma prescrição apenas alterando a potência das mesmas. No seu segundo retorno, solicitei que falasse um pouco mais sobre o período em que esteve sob tratamento homeopático, abrindo assim um espaço na consulta para que ele pudesse expor melhor seu lado emocional. Contou-me que ficou muito feliz ao notar que suas mãos estavam apresentando considerável melhora, surpreso com o fato, achando que poderia ser um milagre. Durante este relato, mencionou claramente a preocupação com sua vida sexual, principalmente a extra-conjugal, onde sentia-se culpado por procurar “distrações” fora do casamento e a relacionava com o aparecimento das lesões. Não dei muita importância, apenas mencionei que deveria tentar administrar sua vida de modo a não causar danos. Saiu bem da consulta retornando em dois meses. Após seis meses de tratamento encontrava-se bem solto e alegre, feliz pelo desaparecimento da maioria das lesões e pelo aspecto de sua pele que tornara-se menos espessa. Prescrevi-lhe também um gliceróleo com medicamentos homeopáticos a fim de hidratar e melhorar ainda mais o aspecto da pele e elevei a potência dos medicamentos novamente. Durante as consultas subsequentes, o paciente apresentou bastante melhora, seu semblante estava menos tenso, mais alegre e animado, manifestando até o desejo de entrar para aulas de dança, o que incentivei. Mesmo apresentando melhoras no âmbito emocional, pude observar pelo seu relato que a culpa aparecia, principalmente em relação à sua vida sexual e também sua preocupação que esta interferisse nas lesões. 62 Baseada na observação de sua fala prescrevi-lhe um medicamento que lhe ajudasse nas ideias fixas, ou seja, na ruminação mental do paciente (Arboris Vitae 200 CH). Ele tomou várias doses e de potências diferentes. Foi ótimo, pois voltou totalmente sem lesões e com a pele pouquíssimo espessada e escura, já havia se passado mais de um ano de tratamento. Seguiram-se mais seis meses e ele retornou, alegando que tinha repetido a receita, mas queria uma nova avaliação. Queixou-se desta vez de que as lesões somente abriam quando encontra-se inseguro. Também fez menção ao fato que estava sentindo desejo de se masturbar e se era normal este fato se apresentar em um homem de sessenta anos. Abstendo-me de uma reposta direta, apenas mencionei que hoje em dia sexo se fazia até pela internet deixando as conclusões para ele próprio. Ele não retornou na última consulta marcada alegando que estava muito bem, não tinha mais fissuras, estava fazendo aulas de dança e muito ocupado com seu trabalho, exercendo novamente a função da qual havia sido afastado e se poderia repetir o remédio se necessário. 63 CONCLUSÃO Conclui-se então que tanto no tratamento homeopático como no psicanalítico, observamos a melhora dos pacientes de uma forma suave e duradoura, que já se inicia no momento em que são acolhidos para observação e escuta de seus pesares, podendo caminhar para uma verdadeira cura. A procura pela homeopatia e também pela psicanálise se tem feito notar significativamente nos últimos anos, até mesmo no SUS, nas Clínicas da Família, pois por estatística temos esta comprovação de dados. Na psicanálise, vemos crescer a cada dia a procura da escuta em consultórios e Serviços de Apoio, a fim muitas vezes até para resolver situações que a medicina por si só declinou. Psicanálise, clínica da palavra, da fala e homeopatia, clínica o semelhante. Ciência da fala, da escuta do sujeito. São impressionantes os pontos de encontro entre a homeopatia e a psicanálise e como estas resgatam o sujeito, dignificando-o. O sintoma, tanto para a homeopatia quanto para a psicanálise é algo precioso, é o caminho para chegarmos ao sujeito. O sintoma é a melhor saída encontrada por ele para poder sobreviver psiquicamente a uma invasão demasiado forte do real. A homeopatia não suprime o sintoma e sim reequilibra o sujeito a fim 64 de conseguir conviver melhor com suas fraquezas e limitações diante da vida sem precisar adoecer tanto. A homeopatia é um saber científico segundo seu método de pesquisa e sua clínica. Trata-se de um método terapêutico que não compartimenta o ser humano, encarando-o e tratando-o como sujeito. Segundo Checchinato, sua cura vai além das soluções das queixas sintomáticas, trata-se de um resgate do sujeito, de sua libertação para a sublimação e a criatividade. Estamos, portanto, diante de uma clínica da escuta, mas não de uma escuta em que o livre fluxo do pensamento do paciente e suas associações de ideias e atos falhos são o foco do terapeuta como na psicanálise, por exemplo. Trata-se de uma escuta que, através do relato espontâneo do paciente, visa preencher uma série de quesitos necessários à construção de uma unidade a ser tratada, o sujeito doente (LUZ, CAMPELLO & VELLOSO, 2008). A relação médico-paciente, a meu ver, é o ponto chave desta racionalidade, ponto de convergência de noções e representações sociais de médicos e pacientes acerca do “adoecimento” como sofrimento e impedimento de realizações pessoais. Profissionais da “saúde” como (re) equilíbrio físico, mental, emocional aliado a um conhecimento de si, com reconhecimento das próprias limitações e capacidades, que proporciona ao sujeito retomar a marcha da própria vida, em harmonia com o meio (físico, social, familiar) e da noção de “indivíduo” como sujeito único e complexo. O vínculo estabelecido nesta relação médico-paciente possibilita uma “aliança terapêutica” entre o médico e seu cliente e torna-se um requisito para o êxito do tratamento, pois sem o estabelecimento da transferência, o processo terapêutico torna-se inviável. Este é outro ponto em comum entre a homeopatia e a psicanálise. 65 Ambas são “clínicas da escuta”, lidam com o discurso de seus pacientes, a partir do qual os sujeitos falam de si, manifestando suas características intelectuais e afetivas que podem ou não ser tomadas como sintomas. Alguns destes sentidos compartilhados trazem um redimensionamento dos processos vitais, impregnandoos, de algum modo, com o que poderia ser entendido como “significado transcendente”, algo para além do momento presente, pleno de significações a serem descobertas e a cura como a “realização dos mais altos fins da existência” como preconizava Hanhemann, fundador da homeopatia (CAMPELLO, 2001). Assim como Freud colocou a pulsão (trieb) como a energia que movimenta o ser humano, no limite entre o psíquico e o somático fazendo-se presente através de um “representante” (sintoma, significante) daquilo que ele chama de “força”, “força constante”, pois ela mantém a vida, o funcionamento do organismo e do psiquismo numa perfeita unidade, Hahnemann definiu paralelamente força vital como – aquilo que mantém a vida em admirável harmonia – a força vital, dinamicamente anima o corpo material (organismo) e mantém todas as partes em admirável atividade harmônica, nas suas sensações e funções (CHECHINATTO, 2006, p. 12). René Descartes, ao pensar o cogito, rompeu definitivamente com os vitalistas da época, ao separar corpo de pensamento. Ao contrário, Hahnemann, no processo de desenvolvimento da homeopatia, cita que a doença “é uma desarmonia que precede à alteração em toda parte do organismo, fornece ao organismo as sensações desagradáveis e o impele à atividade irregular à qual chamamos doença” (Organon, 1810). O que Hahnemann coloca na realidade é que a representação do desequilíbrio da força vital (por diversos fatores) se traduz na manifestação do quadro sintomático apresentado pelo paciente, com suas peculiaridades individuais, o que na psicanálise equivale dizer que a pulsão pode se representar em um sintoma se não estiver bem direcionada, como uma forma de “pedir por socorro”. 66 Se quando a pulsão se representa por um sintoma ou significante em um processo repetitivo, nada mais quer que nos informar que algo está acontecendo diferente do que deveria, ou seja, esta pulsão precisa de ajuda para se redirecionar e de uma forma mais aproveitável, ficando então desimpedido o sintoma. Podemos observar uma semelhança com a força vital, que quando bloqueada, necessita de ajuda para rearrumar seu núcleos patógenos e fluir livremente. Na homeopatia, só podemos tratar o paciente, ao observarmos com muita atenção no seu discurso, sua fala, perceber no contexto da sua história, no seu tema, os significantes que vão nos levar à prescrição do melhor remédio, além do conjunto de sinais e sintomas apresentado. Este conjunto se apresenta como uma melodia individual. Podemos pensar que deveria ter um remédio para cada paciente na natureza, mas como isso não é possível, a prescrição se dá pela escolha do remédio existente que mais vai apresentar similitude com o quadro do paciente (como a melodia descrita), e este é exclusivo, individual, não existem dois iguais no mundo. Ao medicá-lo pela Lei da Semelhança, a fim de despertarmos sua reação e possível cura, observamos que esta se inicia pelo redirecionamento desta energia vital antes bloqueada impedindo o livre fluxo de energia do paciente, ou seja, equivale a dizermos na psicanálise que estamos diante de um nó. À medida que esta energia se desbloqueia, os nós se desfazem e durante o processo muitas vezes podemos observar a emergência do sujeito. Os homeopatas podem aproveitar os conhecimentos da psicanálise para potencializar as possibilidades da homeopatia e vice-versa, podendo até mesmo os dois tratamentos caminhar em paralelo. Muitas vezes pude observar um paciente relatar que melhorou muito com a administração do remédio homeopático, 67 conseguindo dar grandes avanços em seu processo de análise. Possuidoras da mesma finalidade, a de curar os pacientes, por que não trabalharem juntas a fim de um melhor resultado para os pacientes? Vemos atualmente em encontros, congressos, simpósios de psicanálise e de homeopatia, em âmbito nacional e internacional, o relato de sucesso da terapêutica em ambas as modalidades e grandes avanços na indicação da psicanálise e da homeopatia como opções de tratamento solo ou coadjuvantes em diversas enfermidades e com ótimos resultados. Em 3 de maio de 2006, o Ministério da Saúde aprovou o PNPIC (Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares no SUS), levando em consideração a noção de integralidade da atenção à saúde (diretriz do SUS) e vemos a homeopatia fazer parte então, da Clínica da Família (NASF), cujas ações são destinadas às pessoas e à coletividade visando o bem-estar físico, mental e social como fatores determinantes e condicionantes da saúde. A OMS também vem estimulando o uso da medicina complementar/alternativa nos sistemas de saúde e compõe entre estas práticas a homeopatia. O texto da lei é assim descrito: Gabinete do Ministro PORTARIA No- 971, DE 3 DE MAIO DE 2006 Aprova a Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares (PNPIC) No Sistema Único de Saúde. POLÍTICA NACIONAL DE PRÁTICAS INTEGRATIVAS COMPLEMENTARES NO SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE - SUS 1. INTRODUÇÃO E 68 O campo das Práticas Integrativas e Complementares contempla sistemas médicos complexos e recursos terapêuticos, os quais são também denominados pela Organização Mundial da Saúde (OMS) de medicina tradicional e complementar/alternativa (MT/MCA), conforme WHO, 2002. Tais sistemas e recursos envolvem abordagens que buscam estimular os mecanismos naturais de prevenção de agravos e recuperação da saúde por meio de tecnologias eficazes e seguras, com ênfase na escuta acolhedora, no desenvolvimento do vínculo terapêutico e na integração do ser humano com o meio ambiente e a sociedade. Outros pontos compartilhados pelas diversas abordagens abrangidas nesse campo são a visão ampliada do processo saúde-doença e a promoção global do cuidado humano, especialmente do autocuidado. A implementação da homeopatia no SUS representa uma importante estratégia para a construção de um modelo de atenção centrado na saúde uma vez que: - recoloca o sujeito no centro do paradigma da atenção, compreendendo-o nas dimensões física, psicológica, social e cultural. Na homeopatia o adoecimento é a expressão da ruptura da harmonia dessas diferentes dimensões. Dessa forma, essa concepção contribui para o fortalecimento da integralidade da atenção à saúde; - fortalece a relação médico-paciente como um dos elementos fundamentais da terapêutica, promovendo a humanização na atenção, estimulando o autocuidado e a autonomia do indivíduo; - atua em diversas situações clínicas do adoecimento como, por exemplo, nas doenças crônicas não-transmissíveis, nas doenças respiratórias e alérgicas, nos transtornos psicossomáticos, reduzindo a demanda por intervenções hospitalares e emergenciais, contribuindo para a melhoria da qualidade de vida dos usuários; e 69 - contribui para o uso racional de medicamentos, podendo reduzir a fármacodependência. 70 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ABRAMOVITCH, Sheila; MOREIRA, Maria Lúcia. Transtornos psiquiátricos. In: Saúde do adolescente: competências e habilidades. Brasília: Ministério da Saúde, 2008, p. 136-144. CABAS, Antonio Godino. O sujeito na psicanálise de Freud a Lacan. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2009. 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Cultura, saúde e tecnologias médicas: perspectiva antropológica saúde, doença e terapias. Salvador: EDUFBA, 2008, p.54-73. MACIEL, Auterives. Aulas do Programa de Mestrado de Psicanálise, Saúde e Sociedade. Universidade Veiga de Almeida, 2010-2012. 72 POLLO, Vera. Exílio e retorno do corpo: Descartes e a psicanálise. In: ALBERTI, Sonia e RIBEIRO, Maria Anita Carneiro. Retorno do exílio: o corpo entre a psicanálise e a ciência. Rio de Janeiro: Contracapa, 2004, 15-28. QUINET, Antonio. (org.) Psicanálise e psiquiatria: Controvérsias e convergências. Rio de Janeiro: Rios Ambiciosos, 2001. ROSENBAUM, Paulo. A medicina do sujeito. Rio de Janeiro: Luz Menescal, 2004. ______. Entre arte e ciências: fundamentos hermenêuticos da medicina. Rio de Janeiro: Hucitec, 2006. STIEFELMANN, Henrique. Thesaurus homeopático. São Paulo: Santos Editora, 2006. 73 APÊNDICE A – Curso de extensão: Introdução à homeopatia Este curso se propõe à divulgação de um melhor atendimento médico, centrado no doente e não na doença como podemos observar hoje em geral e também contribuir nos meios acadêmicos, disseminando conceitos e práticas centrados na escuta do relato do paciente e no tratamento do sujeito, que vem sempre com algo além de uma demanda de cura dos sintomas. Portanto, nos dedicaremos ao estudo do aparecimento do sujeito desde os primórdios da civilização, detendo-se na época dos grandes filósofos ao final da Idade Média até hoje, expondo sua subjetividade no tratamento homeopático e citando a homeopatia como uma ciência que surgiu a mais de duzentos anos já colocando seu foco no discurso do paciente, enfatizando a fala deste no decorrer das consultas e usando-a como elemento de vital importância na prescrição do melhor remédio. Para tanto, enfocaremos como a psicanálise vem dar um novo destino ao tratamento de neuroses e psicoses até então somente submetidas à medicalização e internação. Com o advento da psicanálise, que ocorre pelo método da associação livre, verifica-se que se pode operar neste sujeito do inconsciente, redirecionando 74 suas pulsões, ressignificando sua dor e fazendo com que ele saiba lidar melhor com seus limites e com a vida, diminuindo seu grau de angústia. Local: Universidade Veiga de Almeida – Campus Barra da Tijuca. Público Alvo: Psicanalistas, médicos, profissionais ou estudantes e áreas afins. Programação: Aulas teóricas e práticas realizadas aos sábados de 8:00 às 17:00. I - Estudo teórico sobre o tema: - Introdução ao universo da filosofia, psicanálise e homeopatia definindo seus principais conceitos e aplicações na área da saúde; - História da civilização e da medicina; - Conceituação de sujeito na filosofia, psicanálise e homeopatia; - Informação sobre o funcionamento, benefícios, indicações, estudos científicos e comprovações terapêuticas em homeopatia (fundamentos e bases da homeopatia); - Capacitação para a realização de uma consulta com base na Abordagem Central da Pessoa (usando conceitos da psicanálise e da homeopatia ou Medicina do Sujeito). II - Estudo prático sobre o tema: - Farmacotécnica homeopática; - Estudo dos principais medicamentos da matéria médica homeopática (Policrestos de Hahnemann); 75 - Estudo de repertório e dos sintomas homeopáticos; - Capacitação para o uso do repertório na seleção do medicamento; - Técnicas de prescrição e conduta em casos agudos e crônicos; - Aulas de prática ambulatorial. Carga horária: 60 horas. Certificado: O aluno que preencher de forma satisfatória os quesitos assiduidade e aproveitamento terá direito a certificado. 76 APÊNDICE B – Caso clínico em homeopatia 77 78 79 80 81 82