Impacto do tratamento com Benznidazol na evolução da doença de

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Impacto do tratamento com Benznidazol na evolução da doença de
UNIVERSIDADE FEDERAL DE OURO PRETO
NÚCLEO DE PESQUISAS EM CIÊNCIAS BIOLÓGICAS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS BIOLÓGICAS
Impacto do tratamento com Benznidazol na evolução da doença de
Chagas experimental - análise imunopatológica e funcional
AUTOR: Ivo Santana Caldas
.ORIENTADORA:
Profa Maria Terezinha Bahia
CO-ORIENTADOR: Prof. André Talvani
Tese apresentada ao Programa de PósGraduação do Núcleo de Pesquisas em
Ciências Biológicas da Universidade
Federal de Ouro Preto, como parte
integrante dos requisitos para obtenção
do título de Doutor em Ciências
Biológicas,
área
de
concentração:
Imunobiologia de protozoários.
Ouro Preto
Novembro de 2011
II
Dedicatória
Dedico às pessoas que fazem parte da minha vida, umas por me ajudarem no crescimento
e pelo carinho, outras por me apresentarem projetos
e outras ainda porque me desafiaram
a desenvolvê-los.
III
Agradecimentos
Aos meus pais, Angelo e Helena, pelo amor e exemplo e aos meus irmãos, Sérgio e
Walace, pelo apoio e amizade.
À Professora Maria Terezinha Bahia, pela orientação oferecida, paciência nos
momentos difíceis e principalmente pela grande amizade.
Ao professor André Talvani, pela coorientação, pelos conhecimentos passados,
amizade, e bons momentos vividos.
Aos professores Wanderson Geraldo de Lima e Rosália Morais Torres pelas
colaborações referentes à histopatologia e análises eletrocardiográficas.
Ao professor George Luís Lins Machado Coelho pela contribuição nas análises
estatísticas e pela gentileza de estar sempre disposto a ajudar.
À professora Marta de Lana e ao professor Evandro Machado pela boa convivência e
colaborações.
Aos pesquisadores Olindo e Andréa do centro de Pesquisas René Rachou/FIOCRUZ,
pela colaboração referente aos experimentos de citometria.
Às grandes amigas Lívia e Tassiane, que sempre estiveram presentes em minha vida!
Ao Paulo Marcos da Matta Guedes, por ser um grande amigo e pelas colaborações
realizadas.
A todos os alunos do laboratório de Doença de Chagas, especialmente ao Álvaro,
que esteve sempre presente na realização deste trabalho.
À Ana e Ludmilla pelo auxílio e por serem tão prestativas.
A todos os colegas do Curso de Pós-Graduação.
Aos funcionários do Biotério e a todos que auxiliaram, direta ou indiretamente, na
realização deste trabalho.
IV
Índice
1 - Introdução................................................................................................16
1.1 A doença de Chagas.....................................................................................16
1.2 Alterações induzidas pela cardiopatia chagásica .........................................17
1.3 Benznidazol - quimioterapia específica para a doença de Chagas...............19
1.4 O cão como modelo experimental da doença de Chagas..............................24
2 - Justificativa..............................................................................................26
3 - Objetivos..................................................................................................28
3.1 Objetivo Geral.............................................................................................28
3.2 Objetivos específicos...................................................................................28
4 - Animais, material e métodos...................................................................30
4.1 Cepas de Trypanosoma cruzi........................................................................30
4.2 Animais.........................................................................................................30
4.3 Fármaco e esquema de tratamento................................................................31
4.4 Polimorfismo das formas tripomastigotas do Trypanosoma cruzi................31
4.5 Inoculação dos animais e confirmação da infecção......................................31
4.6 Curva de parasitemia.....................................................................................32
4.7 Avaliação de cura parasitológica após tratamento com Bz...........................32
4.8 Eletrocardiografia para avaliação funcional do miocárdio...........................36
4.9 Teste “in vitro” proliferação e avaliação do índice apoptótico de CMSP....37
4.10 Necrópsia.................................................................................................... 41
4.11 Expressão de mRNA de citocinas através da PCR ....................................42
4.12 Análise estatística........................................................................................45
.
5 – Resultados...............................................................................................46
5.1 Polimorfismo das formas tripomastigotas sanguíneas...............................46
5.2 Curvas de parasitemia................................................................................46
5.3 Histopatologia do miocárdio dos cães infectados......................................50
5.4 Determinação da susceptibilidade ao Benznidazol das cepas VL-10, AAS
e Berenice-78 do Trypanosoma cruzi......................................................52
5.5 Análise quantitativa da miocardite e da fibrose no miocárdio dos cães
infectados e tratados com Bz, nas fases aguda e crônica da infecção.....53
5.6 Alterações cardíacas avaliadas pela Eletrocardiografia..............................56
5.7 Parâmetros imunológicos...........................................................................65
5.7.1. Cinética de Imunoglobulina G (IgG) e isotipos (IgG1 e IgG2),
nos soros de cães inoculados com as cepas do T.cruzi.......................65
5.7.2 Influência da quimioterapia específica com Bz na produção de
anticorpos no soro de cães infectados pelo T. cruzi............................69
5.7.3 Avaliação da proliferação de células mononucleares do sangue
periférico.............................................................................................72
5.7.4 Avaliação da proporção de linfócitos TCD4+ e TCD8+ nas
CMSP..................................................................................................74
5.7.5 Avaliação da apoptose de CMSP................................................76
.
V
Índice
5.7.6 Quantificação dos níveis das citocinas IFN-γ, IL-10 e TNF-α no
sobrenadante das culturas de células mononucleares do sangue
periférico dos cães infectados pelo T.cruzi..............................78
5.7.7 Quantificação da expressão de mRNA das citocinas IFN-γ, IL10 e TNF-α no átrio direito dos cães infectados pelo T. cruzi.84
6 - Discussão.................................................................................................93
7 - Conclusões.............................................................................................112
8 - Referências bibliográficas......................................................................114
9 - Apêndice................................................................................................135
VI
Índice de Figuras
Figura 1 - Passos realizados para a análise dos dados por citometria de fluxo. A) e C)
Distribuição pontual de tamanho (FSC) versus granulosidade celular (SSC)
demonstrando a população de linfócitos contida na região R; B) Distribuição pontual de
FL1/CFSE versus FL4/Anti-CD4:Alexa Fluor® 647 e D) Distribuição pontual de
FL1:Anexina V versus FL4:Anti-CD4:Alexa Fluor® 647................................................40
Figura 2 - Miocardite observada nos cães inoculados com 2000 tripomastigotas
sangüíneos/kg de peso corporal das cepas VL-10, AAS e Berenice-78 do Trypanosoma
cruzi eutanasiados aos 90 (A) e 270 dias de infecção (B).................................................50
Figura 3 - Fibrose observada nos cães inoculados com 2000 tripomastigotas
sangüíneos/kg de peso corporal das cepas VL-10, AAS e Berenice-78 do Trypanosoma
cruzi sacrificados aos 90 (A) e 270dias de infecção (B). Imagens obtidas de lâminas com
cortes de átrio direito coradas pelo Tricrômico de Masson...............................................51
Figura 4 - Miocardite observada nos cães inoculados com 2000 tripomastigotas
sangüíneos/kg de peso corporal das cepas VL-10, AAS e Berenice-78 do Trypanosoma
cruzi sacrificados aos 90 (A) e 270 dias de infecção (B). Imagens obtidas de lâminas com
cortes de átrio direito coradas pela hematoxilina e eosina................................................54
Figura 5 - Fibrose observada nos cães inoculados com 2000 tripomastigotas
sangüíneos/kg de peso corporal das cepas VL-10, AAS e Berenice-78 do Trypanosoma
cruzi sacrificados aos 90 (A) e 270 dias de infecção (B). Imagens obtidas de lâminas com
cortes de átrio direito coradas pelo Tricrômico de Masson...............................................55
Figura 6 - Medidas de duração da onda P apresentadas por cães infectados por 2.000
tripomastigotas/kg das cepas VL-10 (A), AAS (B) e Berenice-78 (C) do T.cruzi. Os
exames foram realizados nos momentos antes (CNI), aos 120 dias (120DI) e aos 270 dias
após a infecção (270DI). (D) Correlação entre duração da onda P e fibrose observada no
átrio direito de todos os cães incluídos no estudo.............................................................57
Figura 7 - Medidas de duração do intervalo PR apresentadas por cães infectados por
2.000 tripomastigotas/kg das cepas VL-10 (A), AAS (B) e Berenice-78 (C) do T.cruzi.
(D) Correlação entre duração do intervalo PR e fibrose observada no átrio direito de
todos os cães incluídos no estudo......................................................................................59
Figura 8 - Medidas de duração do complexo QRS apresentadas por cães infectados por
2.000 tripomastigotas/kg das cepas VL-10 (A), AAS (B) e Berenice-78 (C) do T.cruzi.
Os exames foram realizados nos momentos antes (CNI), aos 120 dias (120DI) e aos 270
VII
Índice de Figuras
dias após a infecção (270DI). (D) Correlação entre duração do QRS e fibrose observada
no átrio direito de todos os cães incluídos no estudo........................................................60
Figura 9 - Traçados eletrocardiográficos de cães infectados por 2.000 tripomastigotas/kg
das cepas VL-10, AAS ou Berenice-78 do T.cruzi. (A) Aumento do intervalo PR (B)
Contrações ventriculares prematuras (C) Bloqueio sinoatrial (D) arritmia atrial (E)
Síndrome Bradi-taqui e (F) bloqueio completo do ramo direito do feixe de
Hiss....................................................................................................................................64
Figura 10 - Índices de reatividade de anticorpos da classe IgG, IgG1 e IgG2
determinados através de ELISA nos soros de cães inoculados com 2000 tripomastigotas
sanguíneos das cepas VL-10, AAS e Berenice-78 do Trypanosoma cruzi. A)
Imunoglobulinas da classe IgG, B) IgG1 e C) IgG2, sendo AI: antes da infecção, DI: dias
de infecção; CNI grupo controle não infectado. ...............................................................66
Figura 11 - Correlação entre miocardite e fibrose com os índices de reatividade de
anticorpos da classe IgG (A), IgG1 (B) e IgG2 (C) determinados através de ELISA nos
soros de cães inoculados com 2000 tripomastigotas sanguíneos das cepas VL-10, AAS e
Berenice-78 do Trypanosoma cruzi e que foram eutasiados aos 270 dias de
infecção..............................................................................................................................68
Figura 12 - Índices de reatividade de anticorpos da classe IgG, IgG1 e IgG2
determinados através de ELISA nos soros de cães inoculados com 2000 tripomastigotas
sanguíneos das cepas VL-10, AAS e Berenice-78 do Trypanosoma cruzi e tratados ou
não com o Benznidazol. A) Imunoglobulinas da classe IgG, B) IgG1 e C) IgG2............70
Figura 13 - Correlação entre miocardite e fibrose com os índices de reatividade de
anticorpos da classe IgG (A), IgG1 (B) e IgG2 (C) determinados através de ELISA nos
soros de cães inoculados com 2000 tripomastigotas sanguíneos das cepas VL-10, AAS e
Berenice-78 do Trypanosoma cruzi e que foram tratados ou não com Bz, eutasiados aos
270 dias de infecção..........................................................................................................71
Figura 14 - Análise representativa de proliferação de linfócitos do sangue periféricos de
cães infectados pelo Trypanosoma cruzi por meio de incorporação de CFSE, utilizando
citometria e software FlowJo. A) Células não marcadas B) Células marcadas com CFSE
VIII
Índice de Figuras
C) Células marcadas com CFSE e estimuladas com antígenos de Trypanosoma cruzi e D)
Células marcadas com CFSE e estimuladas com Concanavalina A.................................72
Figura 15 - Análise representativa de avaliação da proporção de linfócitos TCD4+ e
TCD8+ obtidas do sangue periféricos de cães infectados pelo Trypanosoma cruzi e
marcadas pelo CFSE, utilizando citometria e software FlowJo. Linfócitos marcados por
anticorpos anti-CD4+ (A) e anti-CD8+ (B).......................................................................74
Figura 16 - Razão entre a freqüência de linfócitos T CD4+ e T CD8+ encontrada em
cultura de células mononucleares do sangue periférico obtidas de cães infectados pelo
Trypanosoma cruzi aos 45 (A) e 90 dias de infecção (B).................................................75
Figura 17 - Análise representativa de avaliação da apoptose de linfócitos TCD4+ e
TCD8+ obtidos de cultura de células mononucleares do sangue periférico de cães
infectados pelo Trypanosoma cruzi, utilizando citometria e software FlowJo. Linfócitos
marcados por anticorpos anti-CD4+ (A) e anti-CD8+ (B).................................................76
Figura 18 - Quantificação de IFN-γ, através de ELISA, no sobrenadante de células
mononucleares do sangue periférico de cães infectados com 2000 tripomastigotas
sangüíneos/kg de peso corporal das cepas VL-10 (A), AAS (B) e Berenice-78 (C) do
Trypanosoma cruzi submetidos ao tratamento com Bz.....................................................80
Figura 19 - Quantificação de IL-10, através de ELISA, no sobrenadante de células
mononucleares do sangue periférico de cães infectados com 2000 tripomastigotas
sangüíneos/kg de peso corporal das cepas VL-10 (A), AAS (B) e Berenice-78 (C) do
Trypanosoma cruzi submetidos ao tratamento com Bz.....................................................82
Figura 20 - Quantificação de TNF-α, através de ELISA, no sobrenadante de células
mononucleares do sangue periférico de cães infectados com 2000 tripomastigotas
sangüíneos/kg de peso corporal das cepas VL-10 (A), AAS (B) e Berenice-78 (C) do
Trypanosoma cruzi submetidos ao tratamento com Bz.....................................................84
Figura 21 - Curvas padrão gerada com 7 diluições seriadas de uma mesma amostra de
cDNA para verificação das eficiências dos primers para IFN-γ (A), IL-10 (B), TNF-α(C)
e β-actina(D)......................................................................................................................85
Figura 22 - Ciclos de amplificação gerados com diluições seriadas de uma mesma
amostra de cDNA para verificação das eficiências dos primers para IFN-γ (A), IL-10 (B),
TNF-α(C) e β-actina(D).....................................................................................................86
IX
Índice de Figuras
Figura 23 - Curva de dissociação do cDNA amplificado dos mRNA para as citocinas
IFN-γ, IL-10, TNF-α e do controle endógeno β-actina, com picos em torno de 71oC,
75oC, 84oC e 74oC, respectivamente.................................................................................87
Figura 24 - Níveis de expressão de IFN-γ no átrio direito de cães infectados pelas cepas
VL-10, AAS e Berenice-78 do Trypanosoma cruzi, necropsisados aos 90 dias (A) e 270
dias de infecção (B)...........................................................................................................88
Figura 25 - Níveis de expressão de IL-10 no átrio direito de cães infectados pelas cepas
VL-10, AAS e Berenice-78 do Trypanosoma cruzi, necropsisados aos 90 dias (A) e 270
dias de infecção (B)...........................................................................................................90
Figura 26 - Níveis de expressão de TNF-α no átrio direito de cães infectados pelas cepas
VL-10, AAS e Berenice-78 do Trypanosoma cruzi, necropsisados aos 90 dias (A) e 270
dias de infecção (B)...........................................................................................................91
X
Índice de Tabelas
Tabela 1 - Alvo e iniciadores utilizados. As sequências foram determinadas com base na
sequência de nucleotídeos obtidas GenBank Database.....................................................44
Tabela 2 - Análise estatística descritiva dos valores estáveis da curva de coeficiente de
variação..............................................................................................................................49
Tabela 3 - Padrão de inflamação, fibrose e efeito do tratamento observado nos cães
infectados pelas cepas VL-10, AAS e Berenice-78 do Trypanosoma cruzi aos 90 dias de
infecção..............................................................................................................................56
Tabela 4 - Padrão de inflamação e fibrose observado nos cães infectados pelas cepas VL10, AAS e Berenice-78 do Trypanosoma cruzi aos 270 dias de infecção.........................56
Tabela 5 - Alterações eletrocardiográficas apresentadas por cães infectados por 2.000
tripomastigotas/kg das cepas VL-10, AAS e Berenice-78 do T.cruzi e entre os cães
infectados e tratados com Bz que apresentaram ou não redução de fibrose ....................62
XI
Índice de Gráficos
Gráfico 1 - Polimorfismo das formas tripomastigotas sanguíneas observadas durante os
picos de parasitemia em camundongos Swiss inoculados com 5000 tripomastigotas
sanguíneos das cepas Berenice-78, Y, AAS e VL-10 do Trypanosoma cruzi..................46
Gráfico 2 - Curvas de parasitemia obtidas de cães inoculados com 2000 tripomastigotas
sanguineos/kg de peso corporal das cepas VL-10, AAS e Berenice-78 do Trypanosoma
cruzi...................................................................................................................................47
Gráfico 3 - Resultado da análise para determinação do número mínimo de campos
representativos para quantificação da: A) Inflamação B) Fibrose; avaliada em
preparações de lâminas coradas pela Hematoxilina & Eosina e Tricrômico de Masson.
CV: coeficiente de variação...............................................................................................48
Gráfico 4 - Percentagem de testes sorológicos e parasitológico e/ou molecular –
hemocultura e PCR – positivos realizados no sangue de cães inoculados com 2000
tripomastigotas sangüíneas/kg de peso corporal das cepas VL-10, AAS e Berenice-78 do
Trypanosoma cruzi após o tratamento com 7mg de Bz/Kg por 60 dias............................52
Gráfico 5 - Alterações eletrocardiográficas apresentadas por cães infectados por 2.000
tripomastigotas/kg das cepas VL-10, AAS e Berenice-78 do T.cruzi. Os exames foram
realizados nos momentos antes (AI), aos 120 dias (120DI) e aos 270 dias após a infecção
(270DI)..............................................................................................................................65
Gráfico 6 - Reatividade das células mononucleares do sangue periférico obtidas de cães
experimentalmente infectados com 2000 tripomastigotas sangüíneos/kg de peso corporal
das cepas VL-10, AAS e Berenice-78 do Trypanosoma cruzi após estimulação in vitro.
Os resultados foram expressos como índice de estimulação.............................................73
Gráfico 7 - Análise da apoptose de linfócitos T CD4+ presentes em células
mononucleares do sangue periférico mantidas em cultura por 48 horas e estimulados com
antígeno de Trypanosoma cruzi, obtidas dos grupos não infectado (CNI) e infectado (CI)
com 2000 tripomastigotas sangüíneos/kg de peso corporal das cepas VL-10, AAS e
Berenice-78 do Trypanosoma cruzi...................................................................................77
Gráfico 8 - Análise da apoptose de linfócitos T CD8+ presentes em células
mononucleares do sangue periférico mantidas em cultura por 48 horas e estimulados com
antígeno de Trypanosoma cruzi, obtidas dos grupos não infectado (CNI) e infectado (CI)
XII
Índice de Gráficos
com 2000 tripomastigotas sangüíneos/kg de peso corporal das cepas VL-10, AAS e
Berenice-78 do Trypanosoma cruzi...................................................................................78
Gráfico 9 - Quantificação de IFN-γ, através de ELISA, no sobrenadante de células
mononucleares do sangue periférico de cães infectados com 2000 tripomastigotas
sangüíneos/kg de peso corporal das cepas VL-10, AAS e Berenice-78 do Trypanosoma
cruzi nos momentos antes (AI) 45 e 80 dias de infecção (DI)..........................................79
Gráfico 10 - Quantificação de IL-10, através de ELISA, no sobrenadante de células
mononucleares do sangue periférico de cães infectados com 2000 tripomastigotas
sangüíneos/kg de peso corporal das cepas VL-10, AAS e Berenice-78 do Trypanosoma
cruzi nos momentos antes (AI) 45 e 80 dias de infecção (DI)..........................................81
Gráfico 11 - Quantificação de TNF-α, através de ELISA, no sobrenadante de células
mononucleares do sangue periférico de cães infectados com 2000 tripomastigotas
sangüíneos/kg de peso corporal das cepas VL-10, AAS e Berenice-78 do Trypanosoma
cruzi nos momentos antes (AI) 45 e 80 dias de infecção (DI)..........................................83
XIII
Resumo
Considerando as controvérsias sobre a eficácia do tratamento específico com
Benznidazol (Bz) na prevenção ou redução das lesões cardíacas crônicas, este projeto
propôs avaliar a influência do tratamento específico na evolução da cardiopatia
chagásica, utilizando como modelo experimental cães infectados por cepas do
Trypanosoma cruzi sensíveis e resistentes ao Bz. As avaliações imunopatológicas e
clínicas foram realizadas utilizando: (i) a avaliação da área ocupada pela inflamação e
pela fibrose no músculo cardíaco (ii) avaliação dos níveis de expressão mRNA para
citocinas no tecido cardíaco; (iii) avaliação da resposta proliferativa e morte por apoptose
de células mononucleares do sangue periférico (CMSP) e quantificação da produção de
citocinas no sobrenadante das CMSP dos animais ao longo da infecção; (iv) avaliação
das possíveis interferências do tratamento com Bz sobre a evolução clínica da cardiopatia
experimental, através da detecção das alterações eletrocardiográficas, em cães chagásicos
tratados e não tratados.
Nossos resultados mostraram que o tratamento específico induziu 100% de cura
nos animais infectados pela cepa Berenice-78, e que não houve cura parasitológica entre
os infectados pelas cepas VL-10 e AAS. O tratamento específico, de maneira geral,
preveniu as lesões cardíacas dos animais curados, bem como as alterações
eletrocardiográficas. De forma interessante, entre os animais não curados foi observado
um padrão de resposta variável de acordo com a população do T. cruzi. Nos animais
infectados pela cepa AAS foi detectada redução significativa do processo inflamatório e
da
fibrose
no
tecido
cardíaco
acompanhado
de
ausência
de
alterações
eletrocardiográficas. De forma diferente, entre os animais infectados pela cepa VL-10, o
tratamento não foi eficaz em reduzir tanto as lesões cardíacas quanto as alterações
eletrocardiográficas. Os parâmetros imunológicos avaliados durante as fases aguda e
crônica da infecção foram marcadamente influenciados tanto pela cepa do parasito
quanto pelo tratamento específico. Foi possível correlacionar a intensidade das lesões
cardíacas e a produção de imunoglobulinas (IgG, IgG1, IgG2) no soro e de citocinas
(TNF-, IFN- e IL-10) no sobrenadante de CMSP, além da expressão de mRNA dessas
citocinas no tecido cardíaco dos animais submetidos ou não à quimioterapia com o Bz.
De forma geral, nossos resultados contribuirão para uma melhor compreensão do
benefício do tratamento específico na evolução clínica e nos mecanismos
imunopatológicos envolvidos na doença de Chagas.
XIV
Abstract
Based on the divergences concerning the efficacy of anti-Trypanosoma cruzi
treatment with Benznidazol (Bz) in the prevention and reduction of cardiac chronic
lesions, the aim of this study was evaluate the influence of Bz in the evolvement of the
Chagas cardiopathy using dog models infected with Bz-resistent and – susceptible strains
of parasites. Clinical and immunopathology parameters were performed through
evaluation of the: (i) inflammation and fibrosis area in cardiac muscle; (ii) mRNA
expression of cytokines in cardiac tissue; (iii) proliferative response, apoptosis and
quantification of cytokines in peripheral blood mononuclear cells (PBMC) and their
supernatant, respectively; and (iv) interferences of Bz on the clinical evolving thought
electrocardiography (ECG) alterations in infected dogs treated or not with Bz.
Our data showed that Bz-treatment induced 100% of cure in animals infected with
Berenice-78 strain and absence of cure in those infected with VL-10 and AAS strains of
parasite. In the presence of cure, there were prevention of cardiac lesions and ECG
alterations and, among not cured animals, it was observed a variable pattern of
immunopathology and clinical aspects according to the T. cruzi genetic population.
Interestingly, AAS strain was associated with reduction of inflammatory infiltration and
fibrosis in heart tissue as well as absence of ECG alterations while VL-10 strain was not
able to ameliorate these parameters. Immune aspects evaluated during acute and chronic
phases were influenced by parasite strains and by Bz-treatment. Following this, intensity
of cardiac lesions was correlated with high serum production of immunoglobulins (IgG,
IgG1, IgG2) and with the release and expression of cytokines (TNF-, IFN- e IL-10) in
CMSP supernatant and cardiac tissue, respectively, in those animals submitted or not to
Bz-treatment.
In summary, our data will contribute to define the benefits of Bz-treatment to the
clinical evolving as well as to comprehend the immunopahtological mechanisms
associated with Chagas disease.
XV
Introdução
1 - Introdução
1.1
A doença de Chagas
A doença de Chagas é um dos principais problemas médico-sociais
brasileiros, acometendo milhões de pessoas no país. No mundo são aproximadamente 10
milhões de pessoas infectadas pelo Trypanosoma cruzi com pelo menos 25 milhões de
indivíduos sob risco de infecção (WHO, 2010). A moléstia de Chagas é uma doença
crônica, incapacitante e debilitante, com grande impacto sócio-econômico e cultural.
Dentre as principais sintomatologias clínicas que acometem 20-30% dos indivíduos
infectados pelo parasito, destacam-se alterações na motilidade esofágica e intestinal e
alterações eletrofuncionais cardíacas, sendo o comprometimento cardíaco a causa morte
primária associada à doença (Prata 2001).
Costuma-se dividir a história natural da cardiopatia chagásica nas formas de
miocardite aguda e crônica, intercalada pela longa e enigmática forma indeterminada.
Excluíndo os casos inesperados de morte súbita (Prata et al., 1986), os demais casos
relatados sucedem uma forma de acometimento cardiovascular típico da doença, a
cardiopatia chagásica crônica (CCC), que apresenta como característica principal um
caráter progressivo e fibrosante. O que se compreende como caráter progressivo está,
muitas vezes, ligado à série crescente de eventos inflamatórios envolvendo o órgão
cardíaco infectado pelo T. cruzi. Observa-se, neste processo inflamatório, uma destruição
direta dos cardiomiócitos gerando no indivíduo chagásico quadros clínicos de
comprometimento do ritmo e da condução (síncopes e palpitações) ou da contratilidade
miocárdica (dispnéia, cansaço e edema). A compreensão dos principais mecanismos de
destruição destes cardiomiócitos propiciaria estratégias farmacológicas que atuariam no
remodelamento cardíaco ainda na fase aguda da doença (Andrade et al., 1997).
O diagnóstico precoce dos eventos associados à CCC conduz o paciente chagásico
ao tratamento dos sintomas e aqueles cujos exames clínicos sugerem elevada
probabilidade de falência cardíaca são, geralmente, conduzidos à aposentadoria por
invalidez. O afastamento das atividades esforço-dependentes, ao lado de um suporte
terapêutico específico, eleva as chances de sobrevida dos indivíduos portadores da CCC
(Rocha et al., 2007).
16
Introdução
Infelizmente, ainda pouco se sabe sobre estes fatores que predispõem a gravidade
da CCC, bem como aqueles que propiciam o caráter evolutivo da doença. Alguns fatores
parecem exercer importância no desenvolvimento progressivo da doença de Chagas,
como por exemplo, a cronologia da doença, a exposição às reinfecções, o padrão da
resposta imune do hospedeiro, os eventos apoptóticos e a variabilidade genética do
hospedeiro e do parasito (Dvorak, 1984; Andrade et al., 1990; Andrade et al.,1992;
Manuel-Caetano et al., 2007; Rocha et al., 2007).
1.2 Alterações induzidas pela cardiopatia
imunopatogênese na doença de Chagas
chagásica
-
Fatores gerados em resposta ao parasito possuem importância na patogênese
provocada pelo T.cruzi. A resposta imune é fundamental para redução do parasitismo,
todavia pode contribuir para geração das manifestações crônicas observadas em parte dos
indivíduos chagásicos. O tecido cardíaco é o principal alvo de infecção e inflamação em
ambas as fases da doença de Chagas e a integridade e o destino das células do hospedeiro
contribuem diretamente para determinar o curso desta infecção. O perfil celular, bem
como de citocinas, durante a fase aguda da doença de Chagas parece ser capaz de
determinar um padrão de resposta inflamatória durante a fase crônica (Guedes et al.,
2009). Citocinas apresentando um perfil inflamatório contribuem para a síntese de
inúmeras quimiocinas e seus respectivos receptores, além dos intermediários de oxigênio,
contribuindo para aumento do recrutamento celular durante o processo inflamatório e
suprimem o parasitismo, respectivamente. Ao contrário, citocinas com perfil regulatório
promovem redução na síntese de óxido nítrico por macrófagos e aumentam sua
susceptibilidade aos parasitos intracelulares (Gutierrez et al., 2009).
Durante a fase crônica da infecção os infiltrados inflamatórios são compostos
principalmente por macrófagos e linfócitos, embora ocasionalmente neutrófilos e
eosinófilos sejam também detectados (Reis et al.,1993; Higuchi et al.,1997; dos Santos et
al., 2001). Entre os linfócitos, os citotóxicos (TCD8+) podem se tornar tão prevalentes
quanto os auxiliares (TCD4+) nos focos inflamatórios de indivíduos com cardiopatia
chagásica crônica (Reis et al.,1993; Higuchi et al.,1997). Entretanto, os fatores que
interferem nesse balanço entre linfócitos TCD8+ e TCD4+, assim como a função dessas
17
Introdução
células inflamatórias no controle do parasitismo e na gênese da cardiopatia ainda são
pouco conhecidos (Lannes-Vieira et al., 2009).
É sabido que o T. cruzi, de forma similar a outros patógenos é capaz de evadir-se à
resposta imune através da simples modulação dos eventos apoptóticos nas células
hospedeiras (Heussler et al., 2001). O parasito redireciona a resposta apoptótica em
células imunes (células B, T e macrófagos) contribuindo desta forma para a perda de
células T CD4+ e depleção de timócitos, controle da resposta inflamatória e do
recrutamento celular no sítio da lesão devido à produção de fatores de crescimento pelas
células fagocíticas que internaliza células do hospedeiro em apoptose e/ou parasitos em
apoptose. Outro mecanismo de escape do parasito estaria na prevenção de apoptose do
cardiomiócito parasitado durante seu estágio de proliferação intracelular até sua liberação
para o meio extracelular, sem afetar sua sobrevivência e, assim, perpetuando a infecção
(Luder et al., 2001).
Apesar de intensivamente estudada, a patogênese da doença de Chagas continua
não muito bem esclarecida, os mecanismos imunopatológicos que promovem as lesões
nos tecidos não estão ainda bem elucidados. A dificuldade em detectar-se o parasito no
miocárdio levou a postulação de teorias auto-imunes para explicar o desenvolvimento
das lesões inflamatórias miocárdicas durante a fase crônica da doença. Estas lesões
poderiam ser resultado de uma reação de auto-imunidade causada por auto-anticorpos ou
por linfócitos T auto-reativos derivados de mimetismo molecular de antígenos do
parasito e do hospedeiro, ou ainda por ativação bystander não envolvendo antígenos do
T. cruzi sendo induzido por antígenos provenientes de lesões teciduais (Leon et. al.,
2001; Kierszenbaum, 1999; Cossio et. al., 1974; Anselmi et al., 1966). Recentemente foi
demonstrada a reatividade contra auto-antígeno Cha (proteína presente em mamíferos)
em humanos e camundongos infectados com o T. cruzi (Girones et al., 2001).
Entretanto, trabalhos mais recentes apontam para uma participação ativa do
parasito na patogênese da cardiopatia chagásica crônica (Higuchi, 1995; Higuchi et al.,
1993; Barbosa et al, 1986). Uma associação entre a inflamação e a presença de T. cruzi
no tecido cardíaco, assim como sua ausência em locais sem inflamação, foi descrita por
Belloti et al. 1996 e Higuchi et al.1995 utilizando a técnica de imunoperoxidase. A
presença de DNA nuclear do parasito também foi detectada em tecidos cardíacos de
pacientes com lesões inflamatórias severas através da reação em cadeia da polimerase
18
Introdução
(PCR) e hibridização com sondas internas específicas. Porém, não sendo detectadas
seqüências de DNA do T. cruzi em tecido cardíaco de pacientes assintomáticos ou
soronegativos (Jones et al., 1993). Resultados concordantes foram obtidos por LagesSilva et al. (2001) e Vago et al. (1996) utilizando amplificação de seqüências do DNA do
cinetoplasto (kDNA) do T. cruzi em tecidos do esôfago de pacientes com megaesôfago,
sendo observada uma relação direta entre a inflamação tecidual e a presença do parasito.
A presença do parasito parece ser importante para desencadear o processo de formação
da miocardite chagásica crônica.
Na maioria dos casos não é possível fazer correlação entre a intensidade da lesão e
a quantidade de antígeno e/ou DNA do parasito presente, sugerindo que o parasito
(envolvendo características genéticas inerentes à sua cepa) é responsável por disparar e
manter o processo de patogênese no miocárdio, e que este seria amplificado por
mecanismos auto-imunes que dependeriam da predisposição genética do hospedeiro
(Girones & Fresno, 2003; Ãnez et al. 1999; Belloti et al., 1996; Higuchi, 1995; Rowland
et al, 1995; Jones et al., 1993).
1.3 Benznidazol - quimioterapia específica para a doença de Chagas
O
Benznidazol
(Bz)
(N-benzil-2-nitro-imidazol-1-acetamida)
(Radanil®,
Rochagan®, Roche) foi descoberto empiricamente no início dos anos 70 após a partir de
1960 terem demonstrado que a nitrofurazona administrada em esquemas de longa
duração curava grande parte de camundongos infectados pelo T.cruzi. Adicionalmente,
quando este composto foi testado em pacientes, apesar de parte deles terem o parasito
encontrado pela técnica de xenodiagnóstico, os resultados foram considerados
satisfatórios (Cançado, et al, 1964). O Bz surge, assim, como uma nova perspectiva para
o tratamento da doença de Chagas, apresentando alto índice de cura na fase aguda e com
razoável tolerabilidade pelos pacientes. O Bz atua via formação de radicais livres, onde o
grupo nitro presente em sua molécula sofre redução por meio de enzimas do tipo
nitroredutases, com consequente formação de radicais nitroaniônicos. Estes radicais são
os responsáveis pela atividade anti-T. cruzi por formarem ligações covalentes com DNA,
RNA e proteínas do parasito. (Díaz de Toranzo et al 1988, Docampo, 1990; revisado por
Guedes et al., 2006).
19
Introdução
Vários estudos têm demonstrado que o tratamento com o Bz apresenta pequena
ou nenhuma atividade quando realizado na fase crônica da doença de Chagas, com
índices de cura variando entre 0% a 19,1% (Viotti et al, 1994, Lauria-Pires et al, 2000,
Cançado 2002). Entretanto, considerando o risco dos eventos deletérios cardíacos e da
morte súbita durante a fase crônica, o tratamento com drogas tripanocidas pode ser
importante na prevenção da progressão de alterações cardíacas severas. De acordo com
Viotti et al., (1994, 2005) e Suasnábar et al., (2002) o tratamento de indivíduos
chagásicos com Bz, durante a fase crônica, induz diminuição da progressão de alterações
eletrocardiográficas e da cardiopatia, em relação aos individuos não tratados. De acordo
com Andrade et al.,(2004) o tratamento efetivo, na fase crônica da doença, previniu a
progressão das alterações cardíacas retratada através do eletrocardiograma realizado ao
final do tratamento e durante o período de avaliação pós-tratamento.
Além disto, os indivíduos tratados apresentam a negativação da sorologia ou
mostram um decréscimo dos níveis de anticorpos mais frequentemente que os não
tratados (Andrade et al., 2004). Entretanto, Lauria-Pires et al. (2000) mostraram que a
infecção é persistente após o tratamento e que, alterações eletrocardiográficas
progressivas são observadas tanto em indivíduos tratados como naqueles não tratados e,
usando métodos moleculares, mostraram que os níveis de parasitemia não foram
significantemente diferentes entre os chagásicos crônicos tratados e não tratados. De
acordo com os autores estes achados e as progressivas alterações clínicas observadas em
ambos os grupos de pacientes indicam que o tratamento de infecção crônica parece não
induzir benefício (Lauria-Pires et al, 2000, Braga et al, 2000).
Correntemente, ensaios clínicos realizados em diferentes países mostram
evidências de sucesso na quimioterapia com Bz entre crianças e adolescentes (SosaEstani, 1998). Adicionalmente, foi demonstrado que o tratamento com Bz, apesar de
distante do ideal, conduz a benefícios concretos quando realizados em fases recentes da
doença. Ensaios clínicos realizados na Argentina e no Brasil mostraram índices de 62 a
87% de cura parasitológica em crianças tratadas com Bz (de Andrade et al, 1996, SosaEstani, 1998, 1999, Silveira et al, 2000, Straiger, 2004, de Andrade et al, 2004). Estes
estudos demonstraram que a negativação da sorologia ocorreu de forma consistente e
persistente, sugerindo a ausência do parasito nos indivíduos tratados e considerados
curados (Andrade et al, 2004, Sosa-Estani, 1998, Straiger, 2004). De acordo com de
20
Introdução
Andrade et al (1996) o tratamento efetivo, nesta fase da doença, pode prevenir a
progressão da doença e suas complicações porque o eletrocardiograma realizado no final
do tratamento e durante o período de avaliação pós-tratamento, mostrou 1 (1,7%) caso
incidente de bloqueio completo do ramo direito do feixe de Hiss no grupo tratado com
Bz, e 4 (6,9%) no grupo placebo. Entretanto, Silveira et al (2000) obtiveram apenas
8,35% de cura entre 12 crianças de 7 a 12 anos após o tratamento com Bz realizado
durante a fase crônica indeterminada da doença de Chagas. Durante a avaliação clínica
longitudinal (avaliação durante 8 a 20 anos) foi observada uma evolução clínica para as
formas cardíacas ou digestivas da doença em 4 (33,3%) dos pacientes tratados (Silveira
et al, 2000).
Também os ensaios clínicos realizados durante a fase aguda da infecção mostram
altos níveis de cura parasitológica, sendo observado índices variando entre 40% a 76% de
cura parasitológica, definida pela negativação da sorologia e dos testes parasitológicos
(Shikanai-Yasuda et al, 1990, Andrade et al, 1992, Bahia-Oliveira, 2000, Cançado,
2002).
Assim o tratamento de pacientes chagásicos em ambas as fases da doença com o
Bz têm fornecido resultados distintos, principalmente quando ensaios terapêuticos
realizados em diferentes áreas geográficas são comparados. Yun et al., (2009) mostraram
que o tratamento com Bz realizado em programas com crianças e jovens (menores de 18
anos) provenientes de duas regiões da Bolívia, uma de Honduras e uma da Guatemala
apresentaram diferentes resultados. Após 18 meses, foi observada soroconversão
negativa em 87,1%, 58,1% e em nenhum dos pacientes de Honduras, Guatemala e na
região de Sucre na Bolívia, respectivamente. Na região de Entre Rios na Bolívia, após 60
meses, foi observada sorologia negativa em apenas 5,4% dos pacientes.
Um dos fatores que contribui para os diferentes resultados obtidos com o
tratamento da doença humana seria o tipo de cepa do parasito predominante em algumas
áreas geográficas (Andrade et al., 1992). Foi sugerido que a resistência natural do T cruzi
aos nitroderivados seria a explicação para os baixos índices de cura detectados em
pacientes chagásicos tratados, pois foram descritas diferenças na susceptibilidade de
cepas do parasito a estes quimioterápicos (Brener et al., 1976; Filardi and Brener, 1987).
Mais recentemente, nosso grupo mostrou relação entre a divergência
filogenética entre populações do T. cruzi e a sua susceptibilidade a agentes
21
Introdução
quimioterápicos in vivo (Toledo et al., 2003 and 2004). Vinte clones representativos da
diversidade filogenética total do T. cruzi, incluindo os genótipos 19 e 20 (T. cruzi I) e os
genótipos 32 39 (T. cruzi II) (Miles et al., 1980, Tibayrenc & Ayala, 1988; Anonymous,
1999) foram analisados. Os resultados demonstraram diferenças importantes entre
estoques de T. cruzi que poderiam ser utilizadas como marcadores de comportamento
biológico. Membros do grupo T. cruzi I foram altamente resistentes, enquanto membros
do grupo T. cruzi II foram susceptíveis ou parcialmente resistentes ao Bz.
Camandaroba et al.(2003) determinaram a susceptibilidade ao Bz de sete clones
isolados da cepa Colombiana, altamente resistente ao Bz, e previamente classificada
como Biodema ou tipo III (Andrade & Magalhães, 1997), e T. cruzi I (Anonymous,
1999). Os resultados demonstraram uma alta resistência dos clones, sugerindo uma
predominância de clones altamente resistentes nesta cepa. De acordo com os autores
estes resultados indicam que aparentemente a possibilidade de cura é mínima para
pacientes infectados com este Biodema. A resposta à quimioterapia com Bz foi também
investigada por Campos et al., (2005) para quatro clones isolados da cepa do T. cruzi
21SF (Biodema Tipo I, T. cruzi II). A variação de 30% a 100% na taxa de cura de
populações clonadas de cepas pertencentes ao grupo T. cruzi II sugerem que esta seja
uma das explicações para a alta variação da resposta à quimioterapia da doença de
Chagas com Bz por cepas desta linhagem genética.
As falhas no tratamento de pacientes infectados com cepas do grupo T. cruzi I
podem ser devido à resistência de cepas deste tipo genético a drogas anti-chagásicas
(Camandaroba et al., 2003). Concordância entre resultados obtidos em pacientes e
camundongos infectados com a mesma cepa já foram descritos (Andrade et al., 1992;
Filardi & Brener, 1987). Também, o T. cruzi I (Cepa Colombiana), que é totalmente
resistente ao Bz no modelo murino (Camandaroba et al., 2003), também foi altamente
resistente em cães (Guedes et al., 2002). Além disso, os resultados controversos em
relação ao benefício do tratamento na prevenção da progressão das lesões cardíacas
podem estar relacionados, pelo menos parcialmente, com o nível de resistência das
populações do T. cruzi presentes. Neste contexto é importante a realização de estudos
experimentais que permitam a avaliação longitudinal sobre o benefício do tratamento
específico da doença de Chagas na evolução das lesões cardíacas em animais infectados
22
Introdução
com cepas que apresentem diferentes níveis de resistência ao Bz, a exemplo do que
provavelmente ocorre nas diversas regiões endêmicas.
De forma semelhante são poucos os estudos sobre as alterações induzidas pelo
tratamento específico, bem sucedido ou não, na resposta imune celular. A análise da
proliferação de células mononucleares do sangue periférico (CMSP) de pacientes
chagásicos crônicos, submetidos à quimioterapia específica, demonstrou que após cinco
anos as respostas médias de proliferação dos pacientes parasitologicamente curados
foram similares à de indivíduos não infectados. Pacientes submetidos ao tratamento e não
curados apresentaram altos índices de proliferação celular. Logo, sugere-se uma relação
entre a cura parasitológica e a normalização da reatividade celular frente a antígenos do
T. cruzi (Dutra et al., 1996). De modo concordante, foi demonstrada em um estudo
realizado pelo nosso grupo a normalização da reatividade das células mononucleares do
sangue periférico em cães submetidos ao tratamento com Bz após a cura parasitológica
(Guedes et al. 2004). Também foi observado um nível intermediário de reatividade
celular entre os animais tratados, mas não curados, assim como um perfil similar em
relação aos níveis de anticorpos específicos determinados pelo imunoensaio ELISA.
Neste contexto, apesar dos trabalhos focando resistência do parasito, resposta
imune e mecanismo inflamatório cardíaco, pouco se sabe sobre os efeitos do tratamento
com Bz na resposta inflamatória cardíaca na doença de Chagas. Interessantemente,
estudo in vitro mostrou que o Bz pode interferir na produção de citocinas e de óxido
nítrico por macrófagos, promovendo inibição da síntese de IL-6, IL-10 e inibindo
também a expressão do gene da iNOS (Revelli et al., 1999). Portanto o tratamento com
Bz supostamente pode influenciar o curso da infecção pelo T.cruzi, não somente pela
destruição direta do parasito, poderia interferir também na resposta imune frente ao
T.cruzi.
23
Introdução
1.4 O cão como modelo experimental da doença de Chagas
Cães experimentalmente infectados por determinadas cepas do T.cruzi
desenvolvem intensa miocardite com parasitismo acentuado de cardiomiócitos e lesões
necróticas de células cardíacas não parasitadas durante a fase aguda (Andrade et al.,
1997). Durante a fase aguda da infecção de cães podem ser observados, a partir de exame
eletrocardiográfico, bloqueios intraventriculares e hemi-bloqueios de ramo esquerdo, em
decorrência das lesões inflamatórias em áreas de condução nervosa. A participação do
sistema imune na fase aguda da infecção pode ser avaliada pela observação de parasitos
viáveis ou em apoptose, sugerindo mecanismo citotóxico e citolítico, mediado por
células imunes efetoras (Andrade et al., 1997). Durante a fase crônica indeterminada do
cão, assim como no homem, não são observados sintomas ou alterações
eletrocardiográficas graves, entretanto infiltrados inflamatórios e áreas de fibrose podem
ser observados no miocárdio em análise histopatológica, principalmente no átrio direito.
Na forma indeterminada da doença de Chagas, ao contrário do observado na fase aguda,
os linfócitos T apresentam a característica de não aderirem ao cardiomiócito, sugerindo
que não estavam exercendo ação citotóxica ao hospedeiro, além disso, apresentam
tendência a morte celular, indicando uma regulação da inflamação pelo processo de
apoptose (Andrade et al, 1997).
A utilização do modelo cão para estudos de quimioterapia experimental para as
fases aguda e crônica da doença de Chagas foi recentemente descrita pelo nosso grupo
(Guedes et al, 2002). Neste estudo cães infectados por cepas de T. cruzi sensíveis,
parcialmente sensíveis e resistentes ao Bz foram tratados com este fármaco e o
tratamento induziu índices de cura similares aos reportados em ensaios clínicos
realizadas em ambas as fases, aguda e crônica, da doença de Chagas. O cão tem sido
apontado como o modelo experimental ideal para quimioterapia da doença de Chagas por
duas importantes razões: a primeira é o fato de que cães experimentalmente infectados
pelo T. cruzi desenvolvem uma infecção com características similares à doença de
Chagas humana, tanto na fase aguda, como na fase crônica da doença (Lana et al, 1992;
Bahia et al, 2002). A segunda é que cães experimentalmente infectados e tratados com
Bz apresentam uma resposta similar à observada em humanos em termos de efetividade e
de índice de cura em ambas as fases da doença (Guedes et al, 2002).
24
Introdução
Recentemente temos buscado relacionar o padrão de resposta imune com o
desenvolvimento da patologia cardíaca observada em cães experimentalmente infectados,
e reforçar que o cão é um bom modelo para o estudo dos mecanismos imunopatológicos
da doença de Chagas, uma vez que reproduz os aspectos clínicos e imunológicos
observados em pacientes chagásicos. Utilizando cães da raça Beagle foi mostrada relação
direta entre presença de cardiomegalia e alta proliferação de células mononucleares do
sangue periférico associada a baixos níveis de IgG 1 (Guedes et al 2008). Demonstrou-se
a prevalência de uma resposta inflamatória durante a fase aguda nos animais que
apresentaram forma cardíaca durante a fase crônica e que animais que permaneceram na
forma indeterminada apresentam mistura de resposta Th1 e Th2, sugerindo que a
resposta imune durante a fase aguda da infecção é importante para o estabelecimento das
lesões cardíacas observadas durante a fase crônica (Guedes et al 2009). Mostramos
também que a severidade da doença cardíaca possivelmente está correlacionada com
aumento da expressão de quimiocinas que recrutam células pró-inflamatórias para o
miocárdio, enquanto o desenvolvimento da forma indeterminada estaria relacionado ao
aumento da expressão de quimiocinas com perfil inflamatório, antiinflamatório ou
regulatório, contribuindo para recrutamento de células T regulatórias para o miocárdio
durante as fases aguda e crônica da doença (Guedes et al 2010). Considerando estes
antecedentes, o presente trabalho avaliou a eficácia do tratamento específico com Bz
sobre a resposta imune celular em cães infectados por cepas do T.cruzi com diferentes
níveis de resistência ao Bz, selecionadas por terem sido isoladas de casos humanos na
região sudeste do Brasil e por induzirem diferentes padrões de lesões cardíacas, com o
objetivo de identificar marcadores que possam auxiliar na melhor definição sobre a
eficácia do tratamento específico na progressão da doença de Chagas.
25
Justificativa
2 - Justificativa
Durante a infecção pelo T. cruzi ocorre uma dinâmica interação parasitohospedeiro envolvendo múltiplos fatores que atuam na patogênese da doença de Chagas,
alguns inerentes ao parasito, tais como carga parasitária e genética do parasito
influenciando o tropismo, a virulência e a patogenicidade para o hospedeiro. Devem ser
considerados, também, aqueles relacionados ao hospedeiro, como idade, sexo e a
constituição genética, que irão determinar a formação e a atuação do sistema
imunológico.
Entretanto, apesar de intensamente estudada, a patogênese da doença de Chagas
ainda não é completamente entendida, os mecanismos imunopatológicos que promovem
as lesões nos tecidos não estão ainda bem elucidados. Trabalhos mais recentes vêm
apontando no sentido de que o parasito tenha participação ativa na patogênese da
cardiopatia chagásica crônica. Considerando os estudos que apontam à importância da
presença do parasito na progressão da doença de Chagas crônica e os resultados
controversos sobre o benefício do tratamento especifico com Bz na evolução da
cardiopatia chagásica crônica, é de grande importância a realização de estudos
experimentais para a avaliação do efeito do tratamento com Bz na resposta imune e na
progressão das alterações cardíacas de animais inoculados com cepas do parasito
resistentes a este fármaco.
Neste trabalho foi investigado as conseqüências da utilização do Bz nos casos de
falha terapêutica, nos casos de cura parasitológica, assim como a sua influência sobre o
sistema imune de um hospedeiro, devido aos estudos controversos realizados em
humanos sobre o benefício do tratamento. Neste trabalho foi acompanhada a progressão
das alterações eletrocardiográficas causadas pelo T. cruzi, desde a infecção até a
instalação da fase crônica da doença, em cães tratados com Bz, comparativamente aos
animais infectados e não tratados.
Elegemos o cão como modelo experimental por reproduzir a doença de Chagas
em sua fase aguda e, especificamente, em sua fase crônica, o mais próximo do padrão
observado na doença de Chagas humana. Este modelo experimental reproduz a fase
aguda com parasitemia patente, bem como as alterações do miocárdio que ocorrem nesta
26
Justificativa
fase. Reproduz também as formas crônica indeterminada e cardíaca da doença. Os
trabalhos do nosso grupo no modelo canino para doença de Chagas têm mostrado que
estes animais desenvolvem manifestações clínicas, resposta imune e resposta ao
tratamento específico que são idênticas a aquelas observadas em humanos. Desta forma,
este estudo avaliou a eficácia do tratamento específico com Bz na prevenção de lesões
cardíacas, na alteração da resposta imune e na evolução clínica dos animais tratados com
Bz, comparativamente a animais não tratados inoculados com as mesmas cepas do
T.cruzi.
27
Objetivos
3 - Objetivos
3.1 Objetivo Geral
Avaliar a influência do tratamento específico com Benznidazol (Bz) na evolução
da cardiopatia chagásica, utilizando como modelo experimental cães infectados por cepas
do parasito sensíveis e resistentes a esse fármaco.
3.2 Objetivos específicos
i Avaliar a evolução clínica dos animais infectados por diferentes cepas do
T.cruzi, submetidos ou não ao tratamento específico, através da eletrocardiografia, tanto
na fase aguda quanto na fase crônica da doença de Chagas experimental;
ii Quantificar o infiltrado inflamatório e a área de fibrose no miocárdio de cães
infectados por diferentes cepas do T.cruzi, submetidos ao tratamento específico com Bz
comparativamente aos animais não tratados infectados pelas mesmas cepas;
iii Avaliar a cinética de Imunoglobulina G (IgG) e isotipos (IgG1 e IgG2), por
meio de imunoensaio enzimático (ELISA), nos soros de cães tratados com Bz, em
relação aos animais controle infectados e não tratados;
iv Analisar a resposta imune celular por meio de linfoproliferação das células
mononucleares do sangue periférico (CMSP) em cães infectados por diferentes cepas do
T. cruzi, utilizando a citometria de fluxo;
v Avaliar a frequência de apoptose em CMSP de cães infectados por diferentes
cepas do T. cruzi, submetidos ou não ao tratamento específico com Bz durante a fase
aguda da infecção, também utilizando a citometria de fluxo;
28
Objetivos
vi Avaliar as alterações no perfil da resposta imune celular induzidas pelo
tratamento específico com Bz através da dosagem das citocinas IFN-γ, IL-10, TNF-α, no
sobrenadante de células mononucleares do sangue periférico através de ELISA;
vii Avaliar as alterações no perfil da expressão de RNAm das citocinas IFN-γ,
IL-10 e TNF-α induzidas pelo tratamento específico com Bz no tecido cardíaco de cães,
através da PCR em tempo real quantitativa;
viii Relacionar as alterações do padrão da resposta imune celular e humoral
com a intensidade da inflamação e fibrose no coração dos animais submetidos ao
tratamento específico, comparativamente aos animais não tratados.
29
Animais, Material e Métodos
4 - Animais, material e métodos
4.1 Cepas de Trypanosoma cruzi
i
Cepa VL-10 - Foi isolada de paciente na forma indeterminada da doença de
Chagas no estado de Minas Gerais (Schlemper et al., 1982). Esta cepa é considerada
resistente ao tratamento com Bz (Filardi & Brener, 1987, Caldas et al., 2008) e segundo
novo consenso de nomenclatura (Zingales et al, 2009) classificada como pertencente ao
discrete typing units II (DTU II) (Moreno et al., 2010).
ii Cepa AAS - A cepa AAS (T.cruzi II) foi isolada de um caso de infecção aguda
em humano no estado de Minas Gerais. Considerada parcialmente resistente ao
tratamento com Bz por Filardi & Brener, (1987), se mostrou resistente ao quimioterápico
por Caldas et al., (2008).
iii Cepa Berenice-78 - Foi isolada por Lana & Chiari, (1986) de um caso
humano no Brasil, esta cepa é considerada sensível à quimioterapia com Bz (Caldas et
al., 2008) e pertence ao DTU II (Moreno et al., 2010).
4.2 Animais
Foram utilizados cães sem raça definida, obtidos e mantidos no Canil da
Universidade Federal de Ouro Preto. Os animais foram alimentados com ração comercial
para cães e água ad libitum. Antes de inclusão no estudo os animais foram tratados com
anti-helmínticos e imunizados contra doenças infecciosas (Cinomose, Adenovírus Tipo
2, Coronavírus, Parainfluenza, Parvovirose e Leptospirose canina) usando a vacina
Vanguard HTLP. Todos os procedimentos com estes animais foram aprovados e
seguiram as normas estabelecidas pelo Comitê de Ética no uso de animais da UFOP.
(protocolo n0 2009/15)
30
Animais, Material e Métodos
4.3 Fármaco e esquema de tratamento
Neste projeto foi utilizado como quimioterápico o Benznidazol, um derivado 2nitroimidazol (N–benzil–2–nitro-1- imidazolacetamida) - Roche. Os cães foram tratados
com 7mg/kg de Bz/dia, durante 60 dias, divididos em duas doses diárias. O tratamento
foi iniciado a partir do primeiro dia em que o animal apresentou parasitemia patente pelo
exame de sangue a fresco.
4.4 Polimorfismo das formas tripomastigotas do Trypanosoma
cruzi
O polimorfismo das formas tripomastigotas sanguíneas foi realizado por meio de
análise de sangue a fresco de camundongos Swiss infectados pelo T. cruzi durante o pico
de parasitemia da fase aguda da infecção, pelas cepas VL-10, AAS e Berenice-78. Foi
realizada a coleta de 3l de sangue de vasos da ponta da cauda e contadas 200 formas
tripomastigotas aleatoriamente em microscopia óptica (400x), classificando-as como
fina, larga ou muito larga (Brener & Chiari, 1963).
4.5 Inoculação dos animais e confirmação da infecção
Foram inoculados com cada uma das cepas do T.cruzi, 20 cães. Os cães foram
inoculados aos 120 dias de idade, com 2.000 formas tripomastigotas sangüíneas/kg, via
intraperitoneal. Os animais infectados foram divididos, aleatoriamente, em 2 grupos
experimentais, sendo os animais do grupo 1 (n=10) tratados com Bz e os animais do
grupo 2 (n=10) mantidos sem tratamento. A partir do 10o dia de inoculação foi coletado
diariamente, sangue da veia marginal da orelha dos cães para a confirmação da infecção.
Para a avaliação das lesões cardíacas a metade dos animais de cada grupo foi eutanasiada
durante a fase aguda (imediatamente após o tratamento – aos 90 dias de infecção) e a
outra metade durante a fase crônica (6 meses após o término do tratamento – aos 270 dias
de infecção).
A infectividade de cada cepa foi verificada pela observação, através do exame de
sangue a fresco, de parasitos no sangue periférico dos cães inoculados. Os cães
31
Animais, Material e Métodos
apresentando exames de sangue a fresco persistentemente negativos foram submetidos à
hemocultura para a confirmação da infecção.
4.6 Curva de parasitemia
A parasitemia dos cães foi avaliada diariamente, por meio de coleta de 5L de
sangue da veia marginal da orelha e posteriormente, examinados ao microscópio para a
detecção dos parasitos. A quantificação dos parasitos foi realizada de acordo com a
técnica descrita por Brener (1962) até 10 dias após a negativação. As curvas representam
as médias diárias dos parasitos quantificados, por exame de sangue a fresco, nos animais
de cada grupo controle.
4.7 Avaliação de cura parasitológica após tratamento com
Benznidazol
Foi considerado curado todo animal que apresentou negativação dos testes
parasitológicos/moleculares e sorológicos. Os testes parasitológicos/moleculares
utilizados foram a hemocultura (Hc) e a PCR enquanto o teste sorológico foi o ELISA
(Enzyme Linked Immunosorbent Assay). Assim, os animais com resultados da sorologia
positivos e resultados da Hc negativos foram submetidos à investigação da cura por PCR.
Todos os animais que apresentaram resultados de Hc e PCR negativos foram
considerados curados.
Os testes parasitológicos empregados neste projeto foram:
4.7.1 Hemocultura
O teste de hemocultura foi realizado imediatamente antes da eutanásia nos
animais utilizados para os experimentos de fase aguda da infecção (90 dias) e nos cães
que foram sacrificados na fase crônica, foi realizado um teste 30 dias e outro 6 meses
após o tratamento. A técnica descrita por Chiari et al., (1989), com algumas
modificações foi utilizada, coletando-se 10 ml de sangue para imediata centrifugação. O
plasma foi removido e descartado e o tubo contendo as hemácias foi lavado com meio
LIT e novamente centrifugado (Camargo, 1964). Após a centrifugação, o sobrenadante
32
Animais, Material e Métodos
foi desprezado e a camada leucocitária removida para outro tubo e suspensa em meio
LIT. Posteriormente, as hemácias foram também suspensas em meio LIT e os tubos
incubados em estufa a 28oC e homogeneizados uma vez por semana. Cada preparação foi
examinada ao microscópio 30, 60, 90 e 120 dias depois de realizada a técnica, para a
detecção dos parasitos.
4.7.2 Reação em Cadeia da Polimerase
Para a realização da reação em cadeia da polimerase (PCR), foi coletado sangue
dos cães no primeiro e no sexto mês após o término do tratamento (animais necropsiados
durante a fase crônica). Utilizou-se a técnica de PCR descrita por Britto et al., (1993) e
otimizada por Gomes et al., (1998). Foram coletados 10mL de sangue de cada cão, e
colocados em tubos com igual volume de Guanidina-HCl 6M/EDTA 0,2M (Sigma
Chemical Company, USA) (Ávila et al., 1991). Essa mistura, sangue/guanidina/EDTA,
foi mantida à temperatura ambiente e após 15 dias fervida em banho-maria (Britto et al.,
1993). O lisado foi estocado à temperatura ambiente. A seguir, encontra-se a descrição
sucinta de cada etapa desta reação:
a) Extração do DNA - Foi utilizada a técnica proposta por Sambrook et al., (1989)
com algumas modificações realizadas por Gomes et al.,(1998). Alíquotas do lisado de
sangue foram transferidas para tubos de microcentrífuga, sendo em seguida
desproteinizado com igual volume de fenol-clorofórmio. A mistura foi homogeneizada
lentamente e centrifugada. O sobrenadante foi retirado e ao sedimento foram adicionados
H2O milli-Q estéril e novamente centrifugado. Em seguida, a fase aquosa foi purificada
com clorofórmio e o DNA presente nessa fase precipitado com dois volumes de etanol
absoluto gelado e 10mM de acetato de sódio em banho de gelo. Após centrifugação, o
sobrenadante foi descartado e após a volatilização do etanol, o DNA obtido
ressuspendido em água milli-Q estéril e estocado a 4oC.
b) Amplificação específica do T. cruzi - As reações de amplificação continham
Tris-HCl, Triton X-100, MgCl2, KCl, os diversos dNTP’s (Pharmacia Biotech), a Taq
DNA polimerase (Invitrogen), e cada iniciador [S35(5’AAATAATGTACGGG (T/G)
GAGATGCATGA3’)
e
36
(5’GGGTTCGATTGGGGTTGGTGT3’)
(OPERON
Technologies, INC)] descritos por Ávila et al., (1990). Foram realizados 35 ciclos de
33
Animais, Material e Métodos
amplificação em termociclador automático (MinCycler
TM
). As condições da reação
foram: desnaturação do DNA a 95ºC, anelamento dos iniciadores a 65º C e extensão a
72º C. As etapas de extração do DNA e a mistura da reação da PCR foram monitoradas
com controles negativos (amostras de sangue de cães não infectados) e positivos (cães
infectados na fase aguda da infecção). Além disso, para evitar contaminações, cada etapa
da reação foi realizada em ambientes separados, utilizando reagentes e equipamentos
destinados exclusivamente para cada uma das etapas.
c) Detecção dos produtos da PCR - Os produtos amplificados pela PCR foram
visualizados por eletroforese em gel de poliacrilamida e revelados pela prata (Santos et
al., 1993). O tamanho das bandas amplificadas foi monitorado pela utilização de
marcador de peso molecular. Após a eletroforese, o gel foi fixado em solução de etanol e
ácido acético, sob agitação. Em seguida esta solução foi desprezada e o gel foi corado
com uma solução de nitrato de prata sob agitação. Posteriormente, o gel foi lavado e
revelado em solução de NaOH e formaldeído, com agitação até o aparecimento das
bandas. Novamente o gel foi transferido para a solução fixadora e fotografado para
documentação.
4.7.3 Ensaio imunoenzimático
i- Dosagem de IgG total e subclasses IgG1 e IgG2:
Foram coletados, aproximadamente 5mL de sangue dos cães, através da veia
femural. As amostras de sangue foram centrifugadas e o sobrenadante (soro) foi coletado
e armazenado em tubos eppendorf a -20ºC. As coletas de sangue dos cães foram feitas
antes da inoculação, 15, 30, 45, 60, 90, 120, 150, 180, 210, 240 dias de infecção e no dia
da necropsia nos cães utilizados para realização dos experimentos de fase crônica e até a
coleta de 90 dias nos que foram eutanasiados na fase aguda da infecção. Foram utilizados
antígenos da forma epimastigota da cepa Y do T. cruzi, obtidos de cultivo acelular em
meio LIT. Como conjugado foram utilizadas anti-imunoglobulinas de cão da classe IgG
marcadas com peroxidase (Bethyl Laboratories, Montgomery, USA).
O ELISA foi realizado segundo a metodologia descrita por Voller et al., (1976),
modificada de acordo com o protocolo descrito a seguir. O teste foi executado em placas
de poliestireno com 96 poços de fundo chato. Cada poço da placa foi tratado com extrato
34
Animais, Material e Métodos
antigênico de epimastigotas, na concentração definida previamente por titulação em
bloco, diluído em solução tampão carbonato. As placas foram incubadas a 4oC por 18h e
após este intervalo de tempo foram bloqueadas com PBS + SFB e incubadas a 37ºC. A
próxima etapa consistiu na adição de soro de cada animal, e incubação a 37ºC.
Posteriormente foi adicionado o conjugado, diluído em PBS-Tween, conforme
titulação prévia, e as placas foram novamente incubadas a 37ºC. Finalmente, foi
adicionada a solução de substrato (O-fenilenodiamino-OPD, solução de ácido cítrico e
H202) e posteriormente a reação foi interrompida com a adição de ácido sulfúrico. A
leitura foi realizada em leitor de microplaca (BIO RAD, Modelo 3550) com filtro de
490nm. Em cada placa foram adicionados 10 soros controles negativos e quatro controles
positivos. A absorbância discriminante, em cada placa, foi calculada tomando-se a média
da absorbância dos 10 soros negativos somados a dois desvios padrões. Posteriormente
foi calculado o índice de reatividade, dividindo o valor da absorbância de cada amostra
encontrada pela absorbância discriminante, sendo os valores encontrados entre 0.9 e 1.1
considerados duvidosos, valores abaixo de 0.9, negativos e acima de 1.1, considerados
positivos.
ii- Dosagem das citocinas IFN-γ, TNF-α e IL-10:
Os ensaios imunoenzimáticos de ELISA sanduiche foram realizados utilizando-se
o sobrenadante da cultura de células mononucleares do sangue periférico dos cães
infectados ou não pelo T. cruzi. Para o procedimento do ensaio foram utilizados kits para
detecção das citocinas IFN-γ, TNF-α e IL-10 (R&D Systems Inc, Minneapolis, USA)
Para a sensibilização das microplacas de 96 poços foi adicionado 100L/poço dos
anticorpos monoclonais anti-IFN-γ (Cat: MAB781) anti-IL-10 (Cat: MAB7351) e antiTNF-α (Cat: MAB1507), usando diferentes diluições em PBS, segundo especificações do
fabricante. As placas foram incubadas over-night à temperatura ambiente para
sensibilização. Posteriormente, as placas foram lavadas três vezes com o PBS com 0,05%
Tween. Em seguida, as placas foram secas com o auxílio de papel toalha e posteriormente
bloqueadas utilizando PBS, pH 7.4, com 1% albumina bovina. Após adição de solução
de bloqueio, as placas foram incubadas a temperatura ambiente durante 1h e realizados
novamente três processos de lavagem. Após o bloqueio foram adicionados 100L das
35
Animais, Material e Métodos
amostras e dos padrões IFN-γ recombinante (Cat: 781-CG), TNF-α recombinante (Cat:
1507-CT-025) e IL-10 recombinante (Cat: 735-CL-010), da R&D Systems Inc,
Minneapolis, USA.
Após 2 horas de incubação foram realizados mais três
procedimentos de lavagem e adicionados 100L dos anticorpos biotinilados de detecção
anti IFN-γ (BAF781), anti-TNF-α (Cat: BAF1507) e anti-IL-10 (Cat: BAF735) usando
diferentes diluições em PBS, pH 7,4 com 1% de albumina bovina e incubadas durante 2h
a temperatura ambiente, seguindo-se três procedimentos de lavagem. Em seguida foram
adicionados 100L/poço de estreptoavidina HRP (Cat: DY998, R&D Systems Inc,
Minneapolis, USA) em diluição de 1:200 em PBS com 1% de albumina bovina, e
posterior incubação a temperatura ambiente durante 20min. As placas foram novamente
lavadas, e adicionado 100L da solução substrato por poço (mistura diluída 1:1 de
peróxido de hidrogênio e tetrametilbenzidina – Cat: DY999/R&D Systems Inc,
Minneapolis, USA), seguido de incubação por 20-30min em temperatura ambiente. A
reação foi interrompida acrescentando 50L de H2SO4 1M por poço. A densidade óptica
foi determinada utilizando leitor de microplacas com filtro de 450m. A quantificação
das citocinas presentes nas amostras foi determinada baseada na densidade óptica obtida
com a curva padrão de concentrações conhecidas das citocinas, analisadas pelo software
SOFTmax PRO 4.0.
4.8 Eletrocardiografia para avaliação funcional do miocárdio
Para a realização do eletrocardiograma (ECG), os cães foram anestesiados com
tiopental (15 mg/kg de peso corporal) por via endovenosa. O eletrocardiógrafo utilizado
foi do modelo ECG 06, ECAFIX-FUNBEC, São Paulo Brasil. A padronização foi de
1mV/cm e velocidade de 50 mm/seg. Os eletrodos foram adaptados em agulhas 25x7 mm
que foram introduzidas na pele dos animais durante o exame. Sempre foram registradas
as derivações periféricas (DI, DII, DIII, aVR, aVL e aVF) e as precordiais V10, CV5RL,
CV6RL e CV6LU. As leituras e interpretações foram feitas por um especialista que não
conhecia a situação clínica dos cães.
36
Animais, Material e Métodos
4.9 Teste “in vitro” de proliferação e avaliação do índice apoptótico
de células mononucleares do sangue periférico
Foram realizadas imunofenotipagens das células mononucleares do sangue
periférico (CMSP) dos cães experimentalmente infectados no momento antes da
infecção, 45 dias e 90 dias após inoculação, utilizando marcadores de superfície celular
para as subpopulações de linfócitos T (CD4+ e CD8+) em células CMSP submetidas à
cultura.
Para a obtenção das CMSP foram colhidos 15mL de sangue estéril, adicionado
10mL de RPMI acrescido de 100µL de heparina sódica, sendo, em seguida adicionado
Ficoll Hipaque (1:1). Após centrifugação a 1800rpm por 40 minutos a 4oC, o anel de
células foi retirado e transferido para tubo falcon contendo 15mL de RPMI heparinizado
que foi centrifugado a 1500 rpm por 10minutos a 4oC, sendo as células ressuspendidas
em 2ml de meio RPMI e contadas em câmara de Neubauer para ajuste da concentração
para 107 células por mL.
Após o ajuste da concentração, foi retirado 400µL da suspensão de células e foi
adicionado 400µL de solução de CFSE à 5µM (Vybrant® CFDA SE Cell Tracer Kit), e
os tubos foram incubados no escuro por 10 minutos em temperatura ambiente. Após a
incubação foi acrescentado RPMI (1:1) suplementado com 10% de soro fetal bovino e foi
aguardado 5 minutos para bloqueio da reação, com os tubos mantidos no gelo e
protegidos da luz. A suspensão celular foi lavada 3 vezes em meio MEM, usando
centrifugação a 1300rpm por 5 minutos a 4oC e a seguir as células foram ressuspendidas
com 400µL de RPMI.
A avaliação da capacidade proliferativa (índice de estimulação) foi realizada em
micro-placas de 96 poços. Em cada poço foi acrescentado 25µl de células ressuspendidas
(250.000 células) em 175µl de meio CTCM acrescido de 20% SFB. As células colhidas
de cada animal foram colocadas em oito poços, dois poços com células não marcadas
com CFSE, dois com células marcadas e não estimuladas, dois com células marcadas e
estimuladas com 25µl Concanavalina-A (80µg/ml) e dois com células marcadas e
estimuladas com 25µl de antígeno de T. cruzi (4x107 tripomastigotas/ml).
A leitura das amostras foi realizada no citômetro de fluxo modelo FACSCallibur
(Becton Dickinson Immunocytometry Systems, San Jose, CA, U.S.A.), através do
programa CELLQuest no sexto dia de cultivo. As células foram colhidas e transferidas
37
Animais, Material e Métodos
para tubo falcon 2054 e os poços da placa foram lavados com 200µL de PBS gelado,
para total transferência das células. Posteriormente foi adicionado 100µl de solução de
EDTA (20mM), e foi incubado por 10 minutos (temperatura ambiente). A seguir foram
adicionados 3 mL de PBS-W, e após homogeneização em vórtex os tubos foram
centrifugados a 1600rpm por 10 minutos. O sobrenadante foi vertido, os tubos foram
secos suavemente e o pellet foi dividido em dois tubos para marcação com 5µl dos
anticorpos monoclonais Rat Anti Dog CD8:Alexa Fluor® 647 e Rat Anti Dog CD4:Alexa
Fluor® 647 que foram adicionados diretamente ao pellet. Posteriormente os tubos foram
incubados por 30 minutos ao abrigo da luz, adicionado 2 mL de PBS-W e
homogeneizado em vórtex, para seguir serem centrifugados a 1600rpm por 10 minutos.
Posteriormente o sobrenadante foi descartado, adicionado 150µL de solução de fixação
MFF e realizada a leitura de 20000 eventos no citômetro de fluxo.
A avaliação do índice apoptótico das células mononucleares do sangue
periférico foi realizada utilizando o Kit ApoTarget™ Annexin-V FITC Apoptosis, da
Invitrogen. A anexina V, disponibilizada neste kit, detecta células apoptóticas em
decorrência de sua ligação preferencial a fosfolipídeos negativamente carregados,
principalmente a fosfatidilserina exposta no início do processo apoptótico. As células
foram incubadas em micro-placas de 48 poços. Em cada poço foram acrescentados 50µl
de células ressuspendidas (500.000 células) em meio CTCM acrescido de 20% de SFB.
As células de cada cão foram colocadas em três poços, um de células puras, um de
células estimuladas com antígeno de T. cruzi (4x107 tripomastigotas/ml), e um poço
suplementado com o tóxico Phorbol 12-myristate 13-acetate (PMA) na concentração de
25nM, para ser usado como controle positivo de apoptose.
A leitura no citômetro de fluxo foi realizada após 48 horas de cultivo. As células
foram colhidas e transferidas para tubo falcon 2054, sendo os poços lavados com 1000µL
de PBS pH 7,2 gelado. Posteriormente os tubos foram submetidos a uma centrifugação a
1200rpm por 7 minutos a 18oC, em seguida vertidos e secos suavemente em papel
toalha, sendo o pellet
dividido em dois tubos para
adição de 5µl do anticorpo
monoclonal Rat Anti Dog CD8:Alexa Fluor® 647 em um deles e Rat Anti Dog
CD4:Alexa Fluor® 647 no outro. Os tubos ficaram incubados por 30 minutos e em
seguida foi adicionado 2,0 mL de PBS pH 7,2 gelado e os tubos submetidos a nova
centrifugação a 1200rpm por 7 minutos. Em seguida o sobrenadante foi vertido e foi
38
Animais, Material e Métodos
adicionado 50µL Anexin binding buffer (fornecido no kit), 2µL de anexina e 4µL de
iodeto de propídio diretamente ao pellet de cada tubo, que ficou incubado por 15 minutos
ao abrigo da luz e em temperatura ambiente. Após este período, foi adicionado 250µL de
Anexin binding buffer e os tubos foram lidos em no máximo 1 hora no citômetro de
fluxo.
A aquisição e a subseqüente análise dos dados foram realizadas utilizando o
programa específico FlowJo, A figura 1 ilustra a estratégia empregada para as análises
por citometria de fluxo. Primeiramente, gráficos de distribuição pontual foram
construídos pela combinação dos parâmetros de tamanho e complexidade celular (FSC x
SSC) e a população de interesse, que se constituiu de linfócitos, foi selecionada dentro da
região R (figura 1A e 1C).
Em seguida, os eventos selecionados nesta região foram representados em
gráficos de distribuição pontual construídos com combinações de diferentes
fluorescências (FL), por exemplo, FL1/CFSE versus FL4/Anti-CD4:Alexa Fluor® 647.
Esses gráficos foram então, divididos em quatro quadrantes (Q1 a Q4) e as freqüências
dos eventos observados em cada quadrante foram determinadas pelo programa FlowJo.
Nas análises dos dados dos experimentos de proliferação celular, a reatividade da
população total de CMSP, ou seja, a freqüência das células que incorporaram CFSE, foi
calculada pela soma dos quadrantes Q1 e Q3 (figura 1B), já que as células que
apresentam menores fluorescências são as células proliferadas, tendo em vista que a cada
geração celular metade do CFSE permanece em cada célula-filha. Em seguida, a
reatividade foi determinada utilizando a seguinte abordagem: o percentual de linfócitos
reativos nas populações específicas das células estimuladas com o antígeno de T.cruzi foi
dividido pelo percentual de linfócitos reativos nas populações específicas das células não
estimuladas, portanto, dividindo o Q1 do estimulado pelo Q1 do não estimulado.
Para análise da apoptose de linfócitos T CD4+ e T CD8+, foi construído um gráfico
FL1:Anexina-V versus FL4:CD4 Alexafluor 647 ou FL1:Anexina-V versus FL4:CD8
Alexafluor 647, onde foi possível identificar em Q5 os linfócitos T CD4+ (ou T CD8+)
que não estavam em apoptose e em Q6 os marcados pela anexina-V e portanto
apoptóticos. (figura 1D)
.
39
Animais, Material e Métodos
A
B
C
D
Figura 1 - Passos realizados para a análise dos dados por citometria de fluxo. A) e C)
Distribuição pontual de tamanho (FSC) versus granulosidade celular (SSC) demonstrando a
população de linfócitos contida na região R; B) Distribuição pontual de FL1/CFSE versus
FL4/Anti-CD4:Alexa Fluor® 647, demonstrando diferentes populações celulares contidas nos
quatro quadrantes: Q1: linfócitos T CD4+ proliferado, Q2: linfócito T CD4+ não proliferado, Q3:
outras populações linfocitárias proliferadas e Q4: outras populações linfocitárias não proliferadas
e D) Distribuição pontual de FL1:Anexina V versus FL4:Anti-CD4:Alexa Fluor® 647.
A cultura de CMSP para a dosagem de citocinas (IFN-γ, IL-10 e TNF-α,) foi
realizada em placas de 48 poços. Para cada cão dois poços foram estimulados com
antígeno de T. cruzi (4x107 tripomastigotas/ml) e dois poços permaneceram sem
estímulo. Em cada poço foi acrescentado 50µl das células a 107 células/mL (500.000
células) ressuspendidas em meio CTCM suplementado com 20% de SFB. O
40
Animais, Material e Métodos
sobrenadante foi coletado após 24 e 72 horas de cultivo e congelado a -80oC até a
realização do teste de dosagem de citocinas.
4.10 Necrópsia
Os cães de cada grupo experimental foram necropsiados imediatamente e seis
meses após o término do tratamento. Os animais foram eutanasiados e posteriormente
necropsiados para avaliação macroscópica dos órgãos linfóides (baço e linfonodos
cervicais) e da área cardíaca, verificando a presença de linfadenopatia, esplenomegalia e
cardiomegalia. Os pesos dos órgãos foram ainda determinados e relacionados com o peso
de cada animal obtendo-se um índice de peso (IP) [(IP= Peso do órgão(g)  Peso do
cão(kg)]. Em seguida, um fragmento da parede atrial direita de todos os cães foram
coletados. O átrio direito é uma das regiões onde a miocardite chagásica apresenta-se
com maior intensidade (Tafuri et al., 1987), assim foram utilizados para o processamento
da histopatologia. Estes fragmentos foram conservados em gelo e fixados em formalina.
4.10.1 Avaliação microcoscópica do tecido cardíaco
i Técnica de Hematoxilina & Eosina (H&E)
Para análise e quantificação do infiltrado inflamatório, fragmentos do tecido
cardíaco foram corados pela H&E. Cortes seriados da parede atrial direita de cada cão
infectado foram desparafinizados em imersões em xilol, hidratados em soluções
alcoólicas de concentrações decrescentes e lavados em água corrente e em tampão
fosfato (PBS). Em seguida, os cortes foram corados pela hematoxilina, lavados em água
corrente e diferenciados rapidamente em álcool acidulado e corados pela Eosina. Após o
último processo de lavagem em água corrente, foram levados até a estufa para secagem.
Posteriormente colocados em banho de xilol e, então, montadas as lâminas com auxílio
de entellan.
Os núcleos celulares foram quantificados em 20 imagens (campos) aleatórias
(área total percorrida igual a 1,49  106 m2). As imagens visualizadas pela objetiva de
40 foram digitalizadas através de microcâmera Leica DM 5000 B (Leica Application
Suite, versão 2.4.0R1) e processadas por meio do programa analisador de imagens Leica
Qwin V3. A miocardite foi determinada pela média do número de núcleos celulares
41
Animais, Material e Métodos
presentes nas imagens dos animais controles não infectados mais dois desvios padrões,
assim, os cães infectados com o T. cruzi com valores da quantificação de núcleos
celulares acima desta média foram considerados com inflamação cardíaca.
ii Técnica de Tricrômico de Masson
Para observação de tecido conjuntivo fibroso e determinação da intensidade da
fibrose, fragmentos cardíacos foram corados pela técnica de Tricrômico de Masson. Após
desparafinização e hidratação de cortes da parede atrial direita dos cães, estes foram
corados com hematoxilina, lavados em água corrente e corados pela solução número 1
(Sudam, fucsina ácida e ácido acético glacial). Posteriormente foram lavados em água
corrente e corados pela solução número 2 (ácido fosfotúngstico, ácido fosfomolíbdico).
Em seguida, corados pela solução número 3 (azul de anilina, ácido acético glacial),
lavados e submetidos à solução de água acética. Realizado o último processo, os cortes
foram desidratados, secos em estufa e colocados em xilol, seguindo-se a montagem das
lâminas com auxílio de entellan.
Para a análise quantitativa de tecido conjuntivo fibroso, foi utilizado o analisador
de imagens, onde foram obtidas 20 imagens (campos) aleatórias (área total percorrida
igual a 1,49  106 m2) de cada lâmina com corte de átrio direito de cada cão. As
imagens foram visualizadas pela objetiva de 40 e digitalizadas através de microcâmera
Leica DM 5000 B (Leica Application Suite, versão 2.4.0R1) e processadas por meio do
programa analisador de imagens. Foram considerados com fibrose no miocárdio todos os
animais que apresentaram média das áreas de fibrose com valor superior ao encontrado
na média dos animais controles não infectados acrescidos de dois desvios padrões.
4.11 Expressão de mRNA de citocinas através da PCR em tempo real
quantitativa
i)
Extração do RNA
A extração do RNA foi realizada de acordo com as instruções do kit RNA- SV
Total RNA Isolation System – Promega. Um fragmento de aproximadamente 60 mg do
tecido cardíaco de cada cão foi macerado e completamente homogeneizado em 1 ml de
RNA Lysis Buffer. Posteriormente, foram transferidos 175µl desse lisado para um novo
42
Animais, Material e Métodos
tubo e adicionados 350µl de RNA Dilution Buffer. Essa mistura foi homogeneizada,
incubada a 70ºC por 3 minutos e então centrifugada a 13000xg durante 10 minutos, para
precipitação seletiva de proteínas celulares. A solução sobrenadante, a qual continha o
RNA, foi cuidadosamente pipetada e transferida para um novo tubo. 200µl de etanol 95%
foram adicionados com a finalidade de precipitar o RNA. Essa solução foi transferida
para a Spin Column Assembly e centrifugada a 12000xg por 1 minuto. Nessa etapa, o
RNA estava ligado à superfície sílica encontrada na Spin Basket. O líquido residual foi
descartado no tubo coletor e o RNA lavado com 600 µl de RNA Wash Solution. Após
centrifugação, foram adicionados à coluna contendo o RNA 50 µl do mix DNase (40 µl
de Yellow Core Buffer, 5 µl de 0,09M MnCl2 e 5µl de DNAse I enzyme), para digestão
do DNA genômico contaminante. Após incubação por 15 minutos a 20-25ºC, a reação foi
interrompida com 200µl de DNA Stop Solution e o tubo centrifugado a 12000xg por 1
minuto. Foram processadas então sucessivas lavagens utilizando a RNA Wash Solution a
fim de purificar o RNA, eliminando sais contaminantes, proteínas e impurezas celulares.
Finalmente, o RNA total foi eluído da membrana pela adição de Nuclease Free Water.
ii) Quantificação do RNA – Determinação de rendimento e pureza
A quantificação do RNA foi realizada através de leitura no aparelho NanoVue
PlusTM (GE Healthcare). O RNA puro deveria exibir razão de absorbância 260/280 de 1.7
a 2.1 e 260/230 de 1.8 a 2.2. Após comprovação da pureza, foi determinada a integridade
das moléculas através de eletroforese desnaturante em gel de agarose.
iii) Transcrição reversa
A transcrição reversa foi processada de acordo com as instruções do kit GeneAmp
RNA PCR – Applied Biosystems. Foi preparado o Mastermix contendo 5mM de MgCl2, 2
µl de 10XPCR Buffer, 1mM de cada deoxinucleotídeo (dATP, dGTP, dCTP e dTTP), 1
U de RNase Inhibitor, 2,5 µl de MuLV Reverse Transcriptase, 2,5 µl de oligo d(T)16, 1
µl de amostra (na concentração de 1 ug/µl) e água DEPC em quantidade suficiente para
um volume final de 20 µl. Os tubos foram incubados à temperatura ambiente por 10
minutos para permitir a extensão do Oligo d(T) pela transcriptase. Posteriormente, os
tubos foram submetidos a um ciclo de termociclagem com as seguintes temperaturas: 15
43
Animais, Material e Métodos
minutos a 42ºC, 5 minutos a 99ºC e 5 minutos a 5ºC. Após esse processo, o cDNA estava
disponível para realização da PCR.
iv) Amplificação
A quantificação relativa da expressão gênica por PCR em tempo real foi
processada no aparelho ABI 7300 (Applied Biosystems), utilizando o SYBR® Green
Master Mix para detecção dos amplicons. Foi analisada a expressão de mRNA das
citocinas IFN-γ, IL-10 e TNF-α através da PCR em tempo real quantitativa, utilizando os
iniciadores mostrados na tabela 1. Para cada reação, foi usado um mix contendo 12,5µl
de SYBR® Green Master Mix, 5µM de cada primer – sense e anti-sense, 2µl de cDNA e
água ultra pura em quantidade suficiente para um volume de 25 µl. As condições de
termociclagem foram as seguintes: 50ºC por 2 minutos, 95°C por 10 minutos; 40 ciclos
de 94°C por 30 segundos, 58°C por 30 segundos e 72°C por 1 min. Os valores médios de
Ct obtidos a partir de duplicatas foram utilizados para calcular a expressão do gene alvo,
normalizado por um controle interno (gene da β-actina). Posteriormente, foi verificada a
diferença do Ct observado entre as amostras testes e o Ct obtido na amplificação do pool
de cDNA provenientes de cães não infectados pelo T.cruzi, que foi utilizado em todo o
experimento. Dessa forma foi verificada quantas vezes mais as amostras testes
expressavam mRNA em relação a expressão que normalmente é presente em cães não
infectados, e para isso foi utilizada a fórmula 2–ΔΔCt.
Tabela 1 Alvo e iniciadores utilizados. As sequências foram determinadas com base na sequência
de nucleotídeos obtidas GenBank Database.
Alvo
Sequência dos iniciadores Sense e Antisense
IFN-
TTCAAAGGAGCATGGATACCA e TTAAGAACTTGCCAAGCATGTC
IL10
AAT GAA GGACAAGCTGGACAA e TTAAAGTCCTCCAGAAGGGA
TNF-α
TGTTGTAGCAAACCCCGAAG e ATCAGCTGGTTGTCTGTCAGCT
β-actina
CCACTTTCCTGTCTTACCCAA e AATTAACCACCCACGGTGTT
44
Animais, Material e Métodos
4.12 Análise estatística
Os dados da histopatologia, da eletrocardiografia e dos parâmetros imunológicos
foram analisados pelo teste não paramétrico de Newman-keuls. As correlações realizadas
entre a produção de imunoglobulinas e inflamação, bem como os de correlação entre
fibrose e alterações de parâmetros eletrocardiográficos foram realizadas utilizando o
Coeficiente de Correlação de Pearson. Para análise dos experimentos de quantificação
relativa de mRNA pelo PCR em tempo real, foi verificado se os valores eram diferentes
de 1, já que se a expressão em um animal infectado fosse igual à observada em um
controle não infectado a razão seria esta, através do Teste t de student, com hipótese nula
igual a 1. As diferenças foram consideradas significativas se o P foi igual ou menor que
0,05.
45
Resultados
5 - Resultados
5.1 Polimorfismo das formas tripomastigotas sanguíneas
Um dos fatores que poderia ser relacionado com a ação patogênica de uma
população do T.cruzi para o hospedeiro seria a característica morfológica do parasito.
Formas
finas
possivelmente
apresentam
tropismo
preferencial
para
células
mononucleares fagocitárias e são capazes de penetrar mais rapidamente nas células do
hospedeiro, entretanto são mais sensíveis à resposta imune do que as formas largas, que
diferentemente, apresentariam tropismo para cardiomiócitos (Brener, 1969).
O polimorfismo das formas tripomastigotas sanguíneas observadas durante o pico
de parasitemia na infecção de camundongos inoculados com as cepas VL-10, AAS e
Berenice-78 estão representados no Gráfico 1. Foi observado um predomínio de formas
largas ou muito largas para as cepas VL-10 (94±3%) e Berenice-78 (95±3%). A cepa
AAS do T.cruzi apresentou predomínio de formas finas (60±2%).
100
13+3%
80
5 +3%
40+2%
%
60
81+3%
90 +3%
40
60+2%
20
0
6+3%
VL-10
5+3%
AAS
muito larga
larga
Berenice-78
fina
Gráfico 1 - Polimorfismo das formas tripomastigotas sanguíneas observadas durante o pico de
parasitemia em camundongos Swiss inoculados com 5000 tripomastigotas sanguíneos das cepas
VL-10, AAS e Berenice-78 do Trypanosoma cruzi.
5.2 Curvas de parasitemia
46
Resultados
As curvas de parasitemia obtidas pela avaliação do exame de sangue a fresco dos
cães inoculados com as cepas VL-10, AAS e Berenice-78 do T.cruzi estão representadas
no gráfico 2.
VL 10
8000
No de tripomastigotas
/0,1 mL de sangue
AAS
Berenice-78
6000
4000
2000
0
5
10
15
20
25
30
35
40
45
Dias de infecção
Gráfico 2 - Curvas de parasitemia obtidas de cães inoculados com 2000 tripomastigotas
sanguineos/kg de peso corporal das cepas VL-10, AAS e Berenice-78 do Trypanosoma cruzi.
O período pré-patente variou de 11 a 17 dias nos cães inoculados com as cepas
Berenice-78 (11 dias) e VL-10 (17 dias). Os animais inoculados com a cepa AAS não
apresentaram parasitemia patente. O período patente observado nos animais inoculados
com a cepa Berenice-78 foi de oito dias, apresentando pico de parasitemia de 4.966
tripomastigotas/0,1mL de sangue no 15o dia de infecção. Os cães infectados pela cepa
VL-10 apresentaram longo período patente (21 dias), entretanto apresentaram curva de
parasitemia
sem
picos
definidos,
com
parasitemia
máxima
de
5.555
o
tripomastigotas/0,1mL de sangue no 32 dia após inoculação.
5.3 Histopatologia do miocárdio dos cães infectados
5.3.1 Padronização da metodologia utilizada na quantificação da inflamação e
fibrose.
Antes da quantificação dos núcleos celulares para determinação da miocardite e da
quantificação da área ocupada por tecido fibroso no tecido cardíaco, foi necessário
estabelecer o número mínimo de campos microscópicos que deveriam ser analisados para
47
Resultados
se obter representatividade estatística. Foi utilizado o método empregado por Rodrigues
et al., (2009), onde o coeficiente de variação (CV) é determinado a partir de contagens
sucessivas dos campos histológicos. O método consistiu na obtenção de subgrupos
menores de uma amostra de 30 campos aleatórios diferentes, avaliados de uma lâmina
escolhida ao acaso. Foram sorteados subgrupos com número crescente de campos, onde
os pontos 5, 8, 10, 12, 15, 18, 20, 23, 25 e 30 campos foram escolhidos. A análise dos
valores obtidos foi feita pelo cálculo estatístico descritivo do conjunto de valores obtidos
em cada subgrupo, foram determinados a média, o desvio padrão e o coeficiente de
variação dos resultados encontrados.
Os sucessivos CV foram analisados até a obtenção de resultados constantes. Esta
avaliação está representada no Gráfico 3. O número de campos considerado como
mínimo representativo foi definido quando o incremento de campos e não resultava em
alteração de +20% no valor do CV.
A
B
Gráfico 3 - Resultado da análise para determinação do número mínimo de campos
representativos para quantificação da: A) Inflamação B) Fibrose; avaliada em preparações de
lâminas coradas pela Hematoxilina & Eosina e Tricrômico de Masson. CV: coeficiente de
variação (CV= desvio padrão/média)
Analisando os gráficos acima, foi possível observar que a estabilidade de cada
variável analisada foi observada após a contagem de 20 campos microscópicos nos
gráficos de inflamação e fibrose. Entretanto para se confirmar a estabilidade da curva, a
variação entre coeficientes dentro do conjunto considerado estável deveria ser inferior a
20%. Na tabela 2 está apresentada a análise estatística descritiva dos valores 20, 23, 25 e
30 campos, considerados estáveis para inflamação e fibrose.
48
Resultados
Tabela 2 – Análise estatística descritiva dos valores estáveis da curva de coeficiente de variação.
Inflamação
Fibrose
Média
20,35
62,98
Desvio Padrão
0,43
0,82
Coeficiente de Variação (CV)
2,12%
1,3%
Conforme apresentado na tabela 2, o CV foi inferior aos 20% estabelecido, em
todas as avaliações. Dessa forma foi confirmada estabilidade da curva após a avaliação
de 20 campos nos gráficos de inflamação e fibrose.
5.3.2 Análise quantitativa do infiltrado inflamatório e da fibrose no miocárdio
dos cães infectados, durante as fases aguda e crônica da infecção.
A presença de inflamação e de fibrose no átrio direito dos cães infectados pelas
cepas VL-10, AAS e Berenice-78 do T.cruzi, necropsiados na fase aguda (90 dias de
infecção) e crônica (270 dias de infecção), foi determinada pela quantificação de núcleos
celulares e pela área ocupada por tecido conjuntivo fibroso. A avaliação da miocardite
revelou que todas as cepas estudadas induziram inflamação no átrio direito dos animais.
Foram quantificados em média 301 núcleos celulares na histopatologia realizada aos 90
dias de infecção nos animais infectados pela cepa VL-10, 293 nos infectados pela cepa
Berenice-78 e 221 nos inoculados com a cepa AAS (Figura 2A). Na avaliação realizada
mais tardiamente, aos 270 dias de infecção, também foi observado intenso processo
inflamatório no miocárdio dos animais, entretanto menor do que a encontrada na análise
realizada na fase mais recente da infecção, sendo observados em média 244 núcleos
celulares entre os animais infectados pela cepa VL-10, 198 pela cepa Berenice-78 e 176
nos infectados pela cepa AAS. É importante lembrar que a média do número de núcleos
celulares encontrados no miocárdio dos animais saudáveis, não infectados pelo T.cruzi,
foi de 105 núcleos em uma área de 74.931µm2 (Figura 2B).
A análise quantitativa da área ocupada pelo tecido fibroso nos animais infectados
pelas cepas VL-10 e Berenice-78 realizada aos 90 dias de infecção, mostrou níveis de
deposição de colágeno significativamente maiores do que o observado no miocárdio dos
animais não infectados. De forma diferente, a área ocupada pelo tecido conjuntivo no
miocárdio dos animais infectados pela cepa AAS foi similar a dos animais não infectados
pelo T.cruzi (Figura 3A).
49
Resultados
A



300
200
p<0,05
p<0,05
100
C
N
I
e7
8
0
B
AAS
400
A
A
S
VL-10
VL
-1
0
No de núcleos celulares / 74931m2
90 dias de infecção
Berenice-78
CNI
B



300
200
100
p<0,05
C
N
I
B
e7
8
0
A
A
S
Berenice-78
270 dias de infecção
400
VL
-1
0
AAS
No de núcleos celulares / 74931m2
VL-10
Figura 2 - Miocardite observada nos cães inoculados com 2000 tripomastigotas sangüíneos/kg
de peso corporal das cepas VL-10, AAS e Berenice-78 do Trypanosoma cruzi eutanasiados aos
90 (A) e 270 dias de infecção (B). Fotomicrografias obtidas de lâminas com cortes de átrio
direito coradas pela hematoxilina e eosina. Os resultados foram apresentados pela média dos
valores e analisados pelo teste não paramétrico de Newman Keuls. (∆) P<0,05 (diferença
significativa em relação ao grupo controle não infectado-CNI).
Todavia, na avaliação realizada aos 270 dias de infecção, todas as cepas
induziram aumento de áreas ocupadas por tecido fibroso e redução das áreas ocupadas
50
Resultados
por músculo cardíaco, principalmente entre os inoculados com a cepa VL-10, onde foi
quantificado em um cão, 7.480µm2 de fibrose na área total de 74.931µm2 avaliada por
campo microscópico. (Figura 3B).
A
90 dias de infecção

8000
Colágeno / 74931m2
VL-10
AAS

6000
4000
2000
I
N
C
78
B
e-
S
A
A
VL
-
10
0
Berenice-78
CNI
B
VL-10
270 dias de infecção

AAS
Berenice-78
Colágeno / 74931m2
8000


6000
4000
2000
I
N
C
78
B
e-
S
A
A
VL
-
10
0
Figura 3 - Fibrose observada nos cães inoculados com 2000 tripomastigotas sangüíneos/kg de
peso corporal das cepas VL-10, AAS e Berenice-78 do Trypanosoma cruzi sacrificados aos 90
(A) e 270dias de infecção (B). Imagens obtidas de lâminas com cortes de átrio direito coradas
pelo Tricrômico de Masson. Os resultados foram apresentados pela média dos valores e
analisados pelo teste não paramétrico de Newman Keuls. (∆) P<0,05 (diferença significativa em
relação ao grupo controle não infectado-CNI).
51
Resultados
5.4 Determinação da susceptibilidade ao Benznidazol das cepas
VL-10, AAS e Berenice-78 do Trypanosoma cruzi
Foi observado, através da avaliação diária do exame de sangue a fresco dos animais
tratados, que o Bz foi capaz de suprimir a parasitemia em todos os cães inoculados com
as diferentes cepas do T.cruzi, independente do grau de susceptibilidade ao Bz. Esta
redução da parasitemia, em decorrência do tratamento, foi confirmada pelos resultados da
hemocultura, que foram negativos em 100% (10/10), 90% (9/10) e 10% (1/10) dos cães
inoculados com as cepas Berenice-78, AAS e VL-10, respectivamente. Entretanto, o
kDNA do T. cruzi foi detectado no sangue de todos os animais inoculados com as cepas
AAS e VL-10 após o tratamento, enquanto a PCR realizada no sangue dos animais
infectados pela cepa Berenice-78 foi persistentemente negativa. É importante ressaltar
que os resultados da sorologia sempre foram concordantes com o dos testes
parasitológicos e/ou moleculares.
Os animais que apresentaram resultados de hemocultura, PCR e sorologia
convencional negativos foram considerados curados. Os resultados indicaram, portanto,
que o tratamento com Benznidazol foi eficaz em induzir cura em 100% dos cães
inoculados com a cepa Berenice-78. Por outro lado, o tratamento não induziu cura em
nenhum dos animais inoculados com as cepas VL-10 e AAS (gráfico 4).
Gráfico 4 - Porcentagem de testes sorológicos e parasitológico e/ou molecular – hemocultura e
PCR – positivos realizados no sangue de cães inoculados com 2000 tripomastigotas
sangüíneas/kg de peso corporal das cepas VL-10, AAS e Berenice-78 do Trypanosoma cruzi após
o tratamento com 7mg de Bz/Kg durante 60 dias.
52
Resultados
5.5 Análise quantitativa da miocardite e da fibrose no miocárdio
dos cães infectados e tratados com Benznidazol, durante as fases
aguda e crônica da infecção.
O número de núcleos presentes e a área ocupada por fibrose no tecido cardíaco
dos animais infectados e tratados com Bz foi comparado ao observado nos animais dos
grupos controle infectado e não infectado, com o objetivo de avaliar a influência do
tratamento na intensidade do processo inflamatório. Após o tratamento com Bz, nas
análises realizadas aos 90 e 270 dias após infecção, entre os animais inoculados com a
cepa susceptível Berenice-78, foi observado intensidade da miocardite e área ocupada
por tecido fibroso significativamente menor do que o observado no grupo controle
infectado e similar ao observado nos cães não infectados pelo T.cruzi (Figuras 4 e 5).
A resposta ao tratamento dos cães infectados pelas cepas resistentes foi diferente
entre os animais inoculados com as cepas VL-10 e AAS. Os cães infectados pela cepa
VL-10 não apresentaram diferença significativa no número de núcleos celulares e nem da
área ocupada por tecido fibroso em relação aos cães do grupo controle infectado.
Entretanto, o tratamento foi eficaz em reduzir a intensidade da miocardite e fibrose nos
cães inoculados com a cepa AAS, mesmo não sendo observada cura parasitológica entre
esses animais. É interessante ressaltar que os cães infectados pela cepa AAS
necropsiados aos 270 dias e tratados apresentaram redução de fibrose em relação aos cães
não tratados, mas ainda apresentaram aumento de área de tecido fibroso em relação aos
animais não infectados.
Assim o tratamento com Bz conduzindo a cura parasitológica dos animais
infectados pela cepa Berenice-78, previniu inflamação e fibrose no miocárdio e nos casos
de falha terapêutica, não preveniu a lesão cardíaca observada nos cães infectados pela
cepa VL-10, mas trouxe benefício para os infectados pela cepa AAS.
53
Resultados
90 dias de infecção
300
200
100
 
400
C
N
I
78
-B
e-
B
e-
 #

300
200
100
C
N
I
e-
78
78
e-
TN
CI
B
C
VL
C
B
-1
0
-1
VL
A
A
S
A
A
S
0
0
TN
Berenice-78
CNI
270 dias de infecção
No de núcleos celulares / 74931m2
AAS
TC
T-Bz
CI
B
78
0
Berenice-78
VL-10

TC
AAS
 #
A
TN AS
C
A
A
S
VL-10
 
400
VL
TN -10
C
VL
-1
0
No de núcleos celulares / 74931m2
A
T-Bz
CNI
Figura 4 - Miocardite observada nos cães inoculados com 2000 tripomastigotas sangüíneos/kg
de peso corporal das cepas VL-10, AAS e Berenice-78 do Trypanosoma cruzi sacrificados aos 90
(A) e 270 dias de infecção (B). Imagens obtidas de lâminas com cortes de átrio direito coradas
pela hematoxilina e eosina. Os resultados foram apresentados pela média dos valores e analisados
pelo teste não paramétrico de Newman Keuls. TNC: tratado com Benznidazol e não curado; TC:
tratado curado; T-Bz: grupo tratado com Bz (∆) P<0,05 (diferença significativa em relação ao
grupo controle não infectado-CNI).(#) diferença significativa de T-Bz em relação a TNC)
54
Resultados
90 dias de infecção
A
 
9000
Colágeno / 74931m2
VL-10
AAS
 #
6000
3000
C
N
I
78
e-
eB
-B
C
TN
270 dias de infecção
VL-10
 
9000
Colágeno / 74931m2
AAS
CNI
T-Bz
CI
B
TC
Berenice-78
78
A
A
S
A
A
S
10
VL
-
C
TN
VL
-
10
0
 #
 #
6000
3000
C
N
I
78
e-
78
eB
-B
TN
CI
TC
A
A
S
A
A
S
C
VL
TN
Berenice-78
C
VL
-1
0
-1
0
0
T-Bz
CNI
Figura 5 - Fibrose observada nos cães inoculados com 2000 tripomastigotas sangüíneos/kg de
peso corporal das cepas VL-10, AAS e Berenice-78 do Trypanosoma cruzi sacrificados aos 90
(A) e 270 dias de infecção (B). Imagens obtidas de lâminas com cortes de átrio direito coradas
pelo Tricrômico de Masson. Os resultados foram apresentados pela média dos valores e
analisados pelo teste não paramétrico de Tukey. TNC: tratado com Benznidazol e não curado;
TC: tratado curado; T-Bz: grupo tratado com Bz (∆) P<0,05 (diferença significativa em relação
ao grupo controle não infectado-CNI).(#) diferença significativa de T-Bz em relação a TNC)
55
Resultados
Com base nos resultados mostrados, as tabelas abaixo resumem os padrões de
lesões cardíacas observadas nos cães infectados e submetidos ou não ao tratamento
específico com Bz aos 90 dias (tabela 3) e aos 270 dias de infecção (tabela 4). A cor
cinza clara representa padrão intermediário de inflamação e fibrose observado nos
animais tratados infectados pela cepa AAS do T.cruzi.
Tabela 3 - Padrão de inflamação, fibrose e efeito do tratamento observado nos cães infectados
pelas cepas VL-10, AAS e Berenice-78 do Trypanosoma cruzi aos 90 dias de infecção.
Cepas do T.cruzi
Ausência de
Inflamação
Tratamento
Fibrose
Tratamento
com Bz
Efeito do
tratamento
VL- 10
AAS
Berenice-78
Inflamação
Fibrose
Susceptibilidade
Resistência
Tabela 4 - Padrão de inflamação e fibrose observado nos cães infectados pelas cepas VL-10,
AAS e Berenice-78 do Trypanosoma cruzi aos 270 dias de infecção.
Cepas do T.cruzi
Ausência de
Inflamação
tratamento
Fibrose
Tratamento
Inflamação
com Bz
Fibrose
VL- 10
AAS
Berenice-78
5.6 Alterações cardíacas avaliadas pela Eletrocardiografia
Neste trabalho a avaliação das alterações eletrocardiográficas apresentadas pelos
cães infectados pelas cepas VL-10, AAS e Berenice-78 do T.cruzi foi realizada pela
observação de sobrecargas atriais e ventriculares, ocorrência de alterações de condução
átrio-ventriculares e presença de arritmias.
Inicialmente foi realizada a análise das medidas de duração da onda P, duração
do intervalo PR e duração do complexo QRS no traçado eletrocardiográfico. A análise
comparativa da média da duração da onda P, que indica alterações no átrio esquerdo e
indiretamente de sobrecarga ventricular esquerda, entre os cães no momento antes de
serem infectados e após inoculação com as três cepas do T.cruzi, mostrou aumento dessa
medida no decorrer da infecção (figura 6). O tratamento com Bz apesar de não ter curado
56
Resultados
nenhum animal infectado pelas cepas VL-10 e AAS, foi eficaz em prevenir o aumento
dessa medida na avaliação realizada 120 dias após a infecção. Resultado semelhante foi
observado nos animais infectados pela cepa AAS aos 270 dias. De forma diferente, nos
animais infectados pela cepa VL-10 foi observado aumento significativo da duração da
onda P em relação aos valores detectados antes da infecção. Entre os cães inoculados
com a cepa Berenice-78, tratados e curados, a duração da onda P foi similar ao observado
em cães não infectados pelo T.cruzi.
Duração da onda P
A
B
VL-10

AAS


0.08
Duração da onda P (s)
0.06
0.04
0.02
0.00


0.06
0.04
0.02
I
70
D
I
TN
C
Tratados com Bz
CI
C
-2
20
D
I
TN
C
-1
I
N
C
C
Tratados com Bz
CI
27
0D
N
I
I
I
70
D
I
-2
C
TN
TN
C
-1
C
N
20
D
I
I
27
0D
I
12
0D
C
N
I
0.00
12
0D
Duração da onda P (s)
0.08
Berenice-78
Duração da onda P (s)
0.08

0.06
0.04
0.02
I
-2
20
D
TC
-1
TC
70
D
I
I
N
C
I
27
0D
I
12
0D
C
N
I
0.00
Tratados com Bz
CI
Figura 6 - Medidas de duração da onda P apresentadas por cães infectados por 2.000 formas
tripomastigotas/kg das cepas VL-10 (A), AAS (B) e Berenice-78 (C) do T.cruzi. Os exames
foram realizados nos momentos antes (CNI), aos 120 dias (120DI) e aos 270 dias após a infecção
(270DI). CI: Animais infectados e não tratados; TNC: Animais infectados pelo T.cruzi e não
curados após tratamento e TC: tratados e curados após tratamento com Benznidazol. (∆) P<0,05
(diferença significativa em relação ao grupo controle não infectado-CNI).
57
Resultados
A análise dos resultados relacionados à duração do intervalo PR, que reflete o
tempo de condução elétrica pelo nodo átrio ventricular, mostrou resultados variáveis em
relação aos animais infectados com as diferentes cepas do parasito. Nos animais
infectados pelas cepas VL-10 e AAS foi detectada uma alteração significativa desta
medida em relação à avaliação realizada antes da infecção. Nos animais infectados pela
cepa Berenice-78, foi observada uma tendência à elevação deste intervalo.
O tratamento específico preveniu a ocorrência de alterações no intervalo PR entre
os animais infectados pelas cepas Berenice-78 e AAS. Por outro lado, foi observado um
aumento progressivo do intervalo PR entre os animais infectados pela cepa VL-10
durante todo o período de avaliação, mostrando que nestes animais o tratamento não foi
eficaz em alterar a evolução da doença. Foi observada correlação significativa usando
Spearman rank test (p = 0,0051) entre duração do intervalo PR e presença de fibrose no
átrio direito dos cães tratados ou não e infectados pelas três cepas do T.cruzi (figura 7).
58
Resultados
Duração do intervalo PR
A
B
AAS
0.050
I
70
D
TN
C
-2
20
D
I
N
C
TN
C
Tratados com Bz
CI
D
Berenice-78
r = 0,469
p = 0,0051
0.175
Duração do intervalo PR (s)
0.150
0.125
0.100
0.075
0.050
I
-2
20
D
TC
-1
TC
CI
70
D
I
I
N
C
I
27
0D
12
0D
N
C
I
0.025
I
Duração do intervalo PR (s)
-1
N
70
D
I
C
TN
Tratados com Bz
CI
I
0.025
-2
20
D
I
I
TN
C
-1
C
N
I
27
0D
12
0D
N
C
I
0.025
0.075
C
0.050
0.100
I
0.075
0.125
I
0.100

27
0D
0.125

0.150
12
0D
#
I

0.150
0.175
C

Duração do intervalo PR (s)

I
Duração do intervalo PR (s)
VL-10
0.175
0.15
0.10
0.05
0
2000
4000
6000
8000
10000
2
Tratados com Bz
colágeno / 74931m
Figura 7 - Medidas de duração do intervalo PR apresentadas por cães infectados por 2.000
formas tripomastigotas/kg das cepas VL-10 (A), AAS (B) e Berenice-78 (C) do T.cruzi. Os
exames foram realizados nos momentos antes (CNI), aos 120 dias (120DI) e aos 270 dias após a
infecção (270DI). CI: Animais infectados e não tratados; TNC: Animais infectados pelo T.cruzi e
não curados após tratamento e TC: tratados e curados após tratamento com Benznidazol. (∆)
P<0,05 (diferença significativa em relação ao grupo controle não infectado-CNI).(#) P<0,05
(diferença significativa entre TNC 270DI e TNC 120DI (D) Correlação entre duração do
intervalo PR e fibrose observada no átrio direito de todos os cães incluídos no estudo.
A medida da duração do complexo QRS que pode refletir alargamento dos
ventrículos direito e esquerdo, bloqueio do ramo direito e esquerdo do feixe de Hiss,
além de contrações ventriculares prematuras, também mostrou ser uma boa medida para
indicar alterações entre os animais infectados pelo T.cruzi. Foi observada diferença
significativa de aumento da duração do QRS apenas entre os animais infectados pela
cepa VL-10 em relação aos animais no momento antes da infecção, entretanto foi
59
Resultados
observada tendência de aumento dessa medida entre os cães infectados por todas as cepas
estudadas (figura 8).
Duração do QRS
A
B
VL-10
AAS
0.10


Duração QRS (s)
0.08
0.06
0.04
0.02
0.08
0.06
0.04
I
C
-2
70
D
I
TN
Tratados com Bz
CI
C
TN
C
-1
C
N
20
D
I
I
I
N
C
Tratados com Bz
CI
27
0D
I
I
70
D
I
-2
C
TN
TN
C
-1
C
N
20
D
I
I
27
0D
I
12
0D
C
N
I
0.02
12
0D
Duração QRS (s)
0.10
Berenice-78
Duração QRS (s)
0.10
0.08
0.06
0.04
I
TC
-2
70
D
I
TC
-1
C
N
20
D
I
I
27
0D
I
12
0D
C
N
I
0.02
Tratados com Bz
CI
Figura 8 - Medidas de duração do complexo QRS apresentadas por cães infectados por 2.000
formas tripomastigotas/kg das cepas VL-10 (A), AAS (B) e Berenice-78 (C) do T.cruzi. Os
exames foram realizados nos momentos antes (CNI), aos 120 dias (120DI) e aos 270 dias após a
infecção (270DI). CI: Animais infectados e não tratados; TNC: Animais infectados pelo T.cruzi e
não curados após tratamento e TC: tratados e curados após tratamento com Benznidazol. (∆)
P<0,05 (diferença significativa em relação ao grupo controle não infectado-CNI).
Além
das
medidas
apresentadas,
foram
analisadas
outras
variáveis
eletrocardiográficos dos cães infectados pelo T.cruzi (Apêndice 1). As linhas pontilhadas
presentes nos gráficos indicam os valores de referência de normalidade descritos na
literatura (Tylley et al., 2002).
60
Resultados
As alterações qualitativas detectadas nos ECG dos animais infectados pelas cepas
VL-10, AAS e Berenice-78, bem como nos dos animais submetidos ao tratamento com
Bz então apresentados na Tabela 5.
Aos 120 dias de infecção foram observadas alterações ao ECG de 33,3% (5 de
15) dos animais infectados pelo T. cruzi, sendo detectadas alterações de condução em 3
dos 15 animais avaliados. A evolução da infecção pôde ser demonstrada pelo aumento do
número de animais que apresentaram alterações no ECG realizado 270 dias após a
infecção. Nesta avaliação, além de anormalidades relacionadas à condução, também
foram detectadas arritmias e aumento do número de animais apresentando sobrecargas
átrio-ventriculares. Foram consideradas como alterações de ritmo a presença de
contração ventricular prematura, presença de ondas P ectópicas, extrasístoles
ventriculares e a Síndrome bradi-taqui, que consiste em disfunção do nodo sinusal
promovendo variação rítmica com disfunção do intervalo QT, que se encontra
prolongado e variável. Considerando todas as alterações detectadas nesta avaliação,
73,3% (11 de 15) dos animais apresentaram anormalidades ao ECG.
Para
avaliação
da
eficácia
do
Bz
na
prevenção
de
anormalidades
eletrocardiográficas, os animais submetidos ao tratamento foram divididos em dois
grupos baseando-se na avaliação da fibrose do tecido cardíaco. O primeiro grupo foi
constituído pelos animais tratados que apresentaram redução de tecido conjuntivo fibroso
no átrio direito (cepas AAS e Berenice-78) e o segundo pelos tratados que não
apresentaram redução de fibrose (cepa VL-10).
Os resultados desta avaliação mostraram que quando o tratamento preveniu a
fibrose do tecido cardíaco também foi eficaz em prevenir as alterações ao ECG. Assim,
entre os animais infectados pelas cepas Berenice-78 e AAS foram detectadas alterações
ao ECG em apenas 1 animal na avaliação realizada 270 dias após a infecção. Além disso,
nestes animais, não foi detectada nenhuma anormalidade relacionada a distúrbios de
condução. Por outro lado, 75% dos animais tratados que não apresentaram redução da
fibrose no tecido cardíaco apresentaram anormalidade no ECG, índice semelhante ao
observado entre os animais não tratados (73,3%).
61
Resultados
Tabela 5 - Alterações eletrocardiográficas qualitativas apresentadas por cães infectados por 2.000
tripomastigotas/kg das cepas VL-10, AAS e Berenice-78 do Trypanosoma cruzi e entre os cães
infectados e tratados com benznidazol (Bz) que apresentaram ou não redução de fibrose. Os
exames foram realizados nos momentos antes (AI), aos 120 dias (120DI) e aos 270 dias após a
infecção (270DI).
Alterações
ECG
Cães infectados (n=15)
Tratados com Bz (n=14)
Sem redução fibrose
Com redução fibrose
AI
120DI 270DI
AI
120DI 270DI
AI
120DI
270DI
BIRD
0/15
1/15
0/15
0/4
0/4
0/4
0/10
0/10
0/10
BCRD
0/15
0/15
1/15
0/4
0/4
0/4
0/10
0/10
0/10
BAV 1o grau
0/15
2/15
1/15
0/4
0/4
2/4
0/10
0/10
0/10
BSA 1 o grau
0/15
0/15
1/15
0/4
0/4
0/4
0/10
0/10
0/10
BDAS
0/15
0/15
1/15
0/4
0/4
0/4
0/10
0/10
0/10
Alteração de
ritmo
0/15
0/15
5/15
0/4
0/4
0/4
0/10
0/10
0/10
Sobrecarga
de câmaras
0/15
5/15
8/15
0/4
1/4
3/4
0/10
0/10
1/10
11/15
(73,3%)
0/4
(0%)
1/4
(25%)
3/4
(75%)
0/10
(0%)
0/10
(0%)
1/10
(10%)
Alterações
ECG/ no de cães
0/15
(0%)
5/15
(33,3%)
Bz – Benznidazol, BIRD – Bloqueio inconpleto do Ramo direito, BCRD – Bloqueio completo do
Ramo direito, BAV– Bloqueio átrio ventricular, BSA – Bloqueio Sino-atrial e BDAS - Bloqueio
da divisão antero-superior esquerda
Na figura 9 estão mostrados traçados eletrocardiográficos representativos de
alterações encontradas. A figura 9A mostra um traçado eletrocardiográfico de um cão
infectado pela cepa VL-10 com aumento do intervalo PR, sendo este de 0,14 segundos,
caracterizando bloqueio atrioventricular de 1o grau (BAV 1o grau). Contrações
ventriculares prematuras (CVP) devido a distúrbios na formação do impulso ventricular,
onde batimentos iniciados no ventrículo ocorrem antes do ritmo normal esperado, foram
observadas em todas as derivações de um cão do grupo controle não tratado infectado
pela cepa AAS. Além disso, foi observado neste animal também, extrasístole
supraventricular com aberrância de condução (figura 9B).
62
Resultados
O traçado mostrado na figura 9C mostra, na derivação precordial V10, ondas P
ectópicas incidindo sobre a onda T e bloqueio sinoatrial em um cão infectado pela cepa
AAS não submetido ao tratamento específico com Bz e a figura 9D mostra o traçado de
um animal do grupo infectado pela cepa Berenice-78 apresentando também arritmia atrial
devido à presença de ondas P ectópicas.
A síndrome bradi-taqui foi observada em um cão pertencente ao grupo controle
infectado pela cepa AAS (figura 9E). Por fim foi observado bloqueio completo do ramo
direito do feixe de Hiss (BCRD) apenas em um animal não tratado infectado pela cepa
Berenice-78 (figura 9F).
Dessa forma, foi observado neste trabalho, alterações eletrocardiográficas em
60% dos animais infectados pela cepa VL-10, em 20% dos infectados pelas cepas AAS e
em 40% dos infectados pela cepa Berenice-78 aos 120 dias de infecção nos grupos
infectados não tratados com Bz. Aos 270 dias de infecção, 40% dos animais infectados
pela cepa VL-10 e 80% dos inoculados com as cepas AAS e Berenice-78 se encontravam
com anormalidades eletrocardiográficas.
Observou-se que o tratamento com Bz foi capaz de prevenir alterações
eletrocardiográficas aos 120 dias de infecção entre os cães infectados por todas as cepas.
Entretanto aos 270 dias de infecção, o tratamento não foi capaz de prevenir as alterações
entre os cães tratados não curados infectados pela cepa VL-10, mas foi capaz de reduzir
entre os infectados pela cepa AAS, mesmo na ausência de cura entre esses animais. O
tratamento preveniu as anormalidades eletrocardiográficas em todos os animais curados
infectados pela cepa Berenice-78 (gráfico 5).
63
Resultados
A
B
C
D
E
F
Figura 9 - Traçados eletrocardiográficos obtidos de cães infectados por 2.000 tripomastigotas/kg
das cepas VL-10, AAS ou Berenice-78 do T.cruzi. (A) Aumento do intervalo PR (B) Contrações
ventriculares prematuras (C) Bloqueio sinoatrial (D) arritmia atrial (E) Síndrome bradi-taqui e
(F) bloqueio completo do ramo direito do feixe de Hiss.
64
Resultados
VL-10
AAS
Berenice-78
% ECG alterados
100
80
60
40
20
TNC
CI
A
12 I
0D
27 I
0D
I
A
12 I
0D
27 I
0D
I
A
12 I
0D
27 I
0D
I
A
12 I
0D
27 I
0D
I
A
12 I
0D
27 I
0D
I
A
12 I
0D
27 I
0D
I
0
TC
Gráfico 5 - Alterações eletrocardiográficas apresentadas por cães infectados por 2.000 formas
tripomastigotas/kg das cepas VL-10, AAS e Berenice-78 do T.cruzi. Os exames foram realizados
nos momentos antes (AI), aos 120 dias (120DI) e aos 270 dias após a infecção (270DI). CI:
Animais infectados e não tratados; TNC: Animais infectados pelo Trypanosoma cruzi e não
curados após tratamento com Bz e TC: tratados e curados após tratamento com Benznidazol.
5.7 Parâmetros imunológicos
5.7.1. Cinética de Imunoglobulina G (IgG) e isotipos (IgG1 e IgG2) nos soros de
cães inoculados com as cepas VL-10, AAS e Berenice-78 do Trypanosoma cruzi
A figura 10 mostra os índices de reatividade de anticorpos da classe IgG e das
subclasses IgG1 e IgG2, detectados pela ELISA, nos soros de cães inoculados com as
cepas VL-10, AAS e Berenice-78 do T. cruzi que não foram submetidos ao tratamento
com o Bz e do grupo controle não infectado, em tempos similares aos avaliados nos
animais infectados. As dosagens realizadas até os 90 dias de infecção foram realizadas no
soro dos 10 cães infectados por cada cepa e mantidos sem tratamento. A partir da
dosagem realizada aos 120 dias, devido a eutanásia da metade dos animais aos 90 dias de
infecção, o soro dos cinco animais remanescentes foram utilizados para avaliação da
cinética de anticorpos nos períodos mais tardios.
65
Resultados
A
IgG total
D
índice de reatividade
2.5
VL-10
AAS
Berenice-78
CNI
2.0
1.5
1.0
0.5
B
T5
T4
T3
T2
T1
T0
IgG 1
D
4.0
índice de reatividade
A
45 I
D
90 I
D
12 I
0
D
21 I
0
D
27 I
0
D
I
A
45 I
D
90 I
D
12 I
0
D
21 I
0
D
27 I
0
D
I
A
45 I
D
90 I
D
12 I
0
D
21 I
0
D
27 I
0
D
I
0.0
VL-10
AAS
Berenice-78
CNI
3.5
3.0
2.5
2.0
1.5
1.0
0.5
C
índice de reatividade
D
T5
T4
T3
T2
T1
T0
A
45 I
D
90 I
12 DI
0
21 DI
0
27 DI
0
D
I
A
45 I
D
90 I
12 DI
0
21 DI
0
27 DI
0
D
I
A
45 I
D
90 I
12 DI
0
21 DI
0
27 DI
0
D
I
0.0
IgG 2
2.5
VL-10
AAS
Berenice-78
CNI
2.0
1.5
1.0
0.5
T5
T4
T3
T2
T1
T0
A
45 I
D
90 I
D
12 I
0
D
21 I
0
D
27 I
0
D
I
A
45 I
D
90 I
D
12 I
0
D
21 I
0
D
27 I
0
D
I
A
45 I
D
90 I
D
12 I
0
D
21 I
0
D
27 I
0
D
I
0.0
Figura 10- Índices de reatividade de anticorpos da classe IgG, IgG1 e IgG2 determinados através
de ELISA nos soros de cães inoculados com 2000 formas tripomastigotas sanguíneos das cepas
VL-10, AAS e Berenice-78 do Trypanosoma cruzi. A) Imunoglobulinas da classe IgG, B) IgG1 e
C) IgG2, sendo AI: antes da infecção, DI: dias de infecção; CNI grupo controle não infectado. As
linhas pontilhadas indicam o índice de reatividade discriminante, sendo de 0.9 a 1.1 considerada
zona duvidosa.
66
Resultados
Anticorpos específicos da classe IgG foram detectados no soro de todos os cães
infectados em torno do 15o dia de infecção (dados não mostrados), apresentando níveis
ascendentes até por volta do 45o dia nos cães infectados pelas cepas AAS e Berenice-78 e
até por volta do 90o dia nos infectados pela cepa VL-10, posteriormente se mantendo
estáveis, apresentando altos níveis até o final do período de observação (figura 10 A). É
interessante ressaltar que o soro dos animais infectados pela cepa AAS foram os que
apresentaram menores índices de reatividade em relação ao observado no soro dos cães
infectados pelas demais cepas. Em relação aos anticorpos específicos da subclasse IgG1 e
IgG2 (figura 10 B e figura 10 C), os cães inoculados com as cepas VL-10, AAS e
Berenice-78 do T.cruzi apresentaram perfis de produção dessas imunoglobulinas
similares e ascendentes durante o período de observação, sendo anticorpos dessa classe
também detectados a partir do 15o dia após inoculação no soro dos cães infectados pelas
três cepas.
Neste trabalho foi realizada a análise da correlação entre a intensidade do
processo inflamatório aos 90 e 270 dias de infecção, com os índices de reatividade dos
anticorpos da classe IgG e subclasses IgG1 e IgG2 também no mesmo período,
apresentados pelos animais infectados pelas cepas estudadas (figura 11A, B e C).
Foi possível observar correlação significativa entre a classe IgG e subtipos em
relação à miocardite apresentada aos 90 e 270 dias de infecção. Aos 90 dias a maior
correlação foi observada com o índice de reatividade da subclasse IgG (r = 0,77;
p<0,0001) seguida pela subclasse IgG1(r = 0,73; p<0,0001). Entretanto aos 270 dias de
infecção, a maior correlação foi observada entre inflamação e IgG1 (r = 0,94; p<0,0001).
67
Resultados
90 Dias de infecção
3
2
IgG total
IgG total
A3
1
270 dias de infecção
2
1
r = 0,77
p < 0,0001
0
50
r = 0,67
p =0,0004
0
100
150
200
250
300
100
Inflamação
B
200
250
300
Inflamação
270 Dias de infecção
90 Dias de infecção
3
150
3
2
IgG 1
IgG 1
2
1
1
r = 0,94
p <0,0001
r = 0,73
p <0,0001
0
50
0
100
150
200
250
300
100
Inflamação
C
3
150
200
250
300
Inflamação
90 Dias de infecção
3
2
270 dias de infecção
IgG 2
IgG 2
2
1
1
r = 0,63
p = 0,021
0
50
r = 0,64
p =0,0031
0
100
150
200
250
300
100
Inflamação
150
200
250
300
Inflamação
Figura 11 - Correlação entre miocardite e índices de reatividade de anticorpos da classe IgG (A),
IgG1 (B) e IgG2 (C) determinados através de ELISA nos soros de cães inoculados com 2000
formas tripomastigotas sanguíneos das cepas VL-10, AAS e Berenice-78 do Trypanosoma cruzi e
que foram eutanasiados aos 90 e 270 dias de infecção.
68
Resultados
5.7.2 Influência da quimioterapia específica com Bz na produção de anticorpos
no soro de cães infectados pelo Trypanosoma cruzi
Na figura 12 estão apresentados os níveis de anticorpos da classe IgG e subtipos
IgG1 e IgG2 determinados nos soros dos cães inoculados com as diferentes cepas
estudadas, e tratados ou não com Bz. A figura 12A mostra que os índices de reatividade
de anticorpos da classe IgG, detectados nos soros dos cães inoculados com a cepa
Berenice-78 tratados com Bz, foram similares aos detectados no soro dos cães não
infectados. Por outro lado, nos soros dos animais infectados pela cepa VL-10 e AAS os
índices de reatividade foram similares aos detectados nos soros de animais infectados e
não tratados.
O tratamento específico influenciou de forma mais marcante a evolução dos
níveis de IgG1 (figura 12B), onde foram observados dois padrões distintos e
relacionados à eficácia do tratamento com Bz. Nos cães infectados pela cepa Berenice78, tratados e curados, e nos infectados pela cepa AAS, tratados e não curados, o índice
de reatividade do subtipo IgG1 foi similar ao dos animais do grupo controle não
infectado. O segundo padrão foi observado nos animais inoculados com a cepa VL-10,
que não foram curados pelo tratamento específico com Bz, nos quais foi observada uma
redução do índice de reatividade em relação ao grupo controle, mas que permaneceu
sempre acima da absorbância discriminante.
A figura 12C apresenta o índice de reatividade dos anticorpos da classe IgG2,
determinados nos soros dos cães inoculados com as diferentes cepas estudadas e tratados
com Bz. Em todos os cães inoculados com as diferentes cepas, foi observado um perfil
de IgG2 similar ao perfil de IgG, descrito anteriormente.
69
Resultados
IgG total
A
índice de reatividade
D 2.5
TNC (VL-10)
TNC (AAS)
TC (Berenice-78)
CNI
2.0
1.5
1.0
0.5
T5
T4
T3
T2
T1
T0
IgG 1
B
D 4.0
índice de reatividade
A
45 I
D
90 I
D
12 I
0
D
21 I
0
D
27 I
0
D
I
A
45 I
D
90 I
D
12 I
0
D
21 I
0
D
27 I
0
D
I
A
45 I
D
90 I
D
12 I
0
D
21 I
0
D
27 I
0
D
I
0.0
TNC (VL-10)
TNC (AAS)
TC (Berenice-78)
CNI
3.5
3.0
2.5
2.0
1.5
1.0
0.5
T4
T5
T4
T5
T3
T2
T1
T0
IgG 2
C
D
2.5
índice de reatividade
A
45 I
D
90 I
D
12 I
0
D
21 I
0
D
27 I
0
D
I
A
45 I
D
90 I
D
12 I
0
D
21 I
0
D
27 I
0
D
I
A
45 I
D
90 I
D
12 I
0
D
21 I
0
D
27 I
0
D
I
0.0
TNC (VL-10)
TNC (AAS)
TC (Berenice-78)
CNI
2.0
1.5
1.0
0.5
T3
T2
T1
T0
A
45 I
D
90 I
D
12 I
0
D
21 I
0
D
27 I
0
D
I
A
45 I
D
90 I
D
12 I
0
D
21 I
0
D
27 I
0
D
I
A
45 I
D
90 I
D
12 I
0
D
21 I
0
D
27 I
0
D
I
0.0
Figura 12 - Índices de reatividade de anticorpos da classe IgG, IgG1 e IgG2 determinados
através de ELISA nos soros de cães inoculados com 2000 formas tripomastigotas sanguíneos das
cepas VL-10, AAS e Berenice-78 do Trypanosoma cruzi e tratados ou não com o Benznidazol.
A) Imunoglobulinas da classe IgG, B) IgG1 e C) IgG2. Sendo: TNC tratados com Benznidazol e
não curados, TC tratados com Benznidazol e curados e CNI controle não infectado. As linhas
pontilhadas indicam o índice de reatividade discriminante, sendo de 0.9 a 1.1 considerada zona
duvidosa.
70
Resultados
Foi possível também observar correlação significativa entre as classes IgG e
miocardite apresentada aos 90 e 270 dias de infecção, quando foram adicionados à
análise os cães submetidos ao tratamento com Bz. Aos 90 dias de infecção a maior
correlação entre inflamação foi observada em relação à IgG total (r =0,76; p<0,0001).
Aos 270 dias de infecção foi observada maior correlação de inflamação entre os
anticorpos do subtipo IgG1 (r = 0,79; p<0,0001) (figura 13).
3
90 Dias de infecção
3
270 Dias de infecção
2
IgG total
IgG total
A
1
2
1
r = 0,70
p < 0,0001
r = 0,76
p < 0,0001
0
0
100
200
300
400
100
Inflamação
B
3
200
300
400
Inflamação
90 Dias de infecção
4
270 Dias de infecção
3
IgG 1
IgG 1
2
2
1
1
r = 0,66
p <0,0001
0
100
200
300
r = 0,79
p < 0,0001
0
400
100
Inflamação
C
2.5
200
300
400
Inflamação
90 Dias de infecção
3
270 Dias de infecção
2
1.5
IgG 2
IgG 2
2.0
1.0
1
0.5
r = 0,70
p < 0,0001
r = 0,67
p < 0,0001
0
0.0
100
200
300
100
400
200
300
400
Inflamação
Inflamação
Figura 13 - Correlação entre miocardite e índices de reatividade de anticorpos da classe IgG (A),
IgG1 (B) e IgG2 (C) determinados através de ELISA nos soros de cães inoculados com 2000
formas tripomastigotas sanguíneos das cepas VL-10, AAS e Berenice-78 do Trypanosoma cruzi e
que foram tratados ou não com Bz, eutasiados aos 270 dias de infecção.
71
Resultados
5.7.3 Avaliação da proliferação de células mononucleares do sangue periférico
(CMSP)
Neste estudo foi avaliada a reatividade (proliferação) celular de CMSP isoladas dos
cães experimentalmente infectados pelas cepas VL-10, AAS e Berenice-78 do T.cruzi,
após estimulação in vitro por antígeno de formas tripomastigotas de T.cruzi. Os
resultados de reatividade celular foram expressos como índice de estimulação (IE), ou
seja, o quociente da divisão entre os valores obtidos para a cultura estimulada e os
valores obtidos para a cultura controle (figura 14).
A
B
C
D
Figura 14 - Análise representativa de proliferação de linfócitos do sangue periféricos de cães
infectados pelo Trypanosoma cruzi por meio de incorporação de CFSE, utilizando citometria de
fluxo. As análises foram realizadas através do software FlowJo. A) Células não marcadas B)
Células marcadas com CFSE C) Células marcadas com CFSE e estimuladas com antígenos de
T.cruzi e D) Células marcadas com CFSE e estimuladas com Concanavalina A.
72
Resultados
Os resultados mostraram que o tratamento com Bz foi capaz de prevenir a
reatividade celular durante o período de tratamento (45 dias de infecção), sendo a
resposta proliferativa das CMSP dos animais tratados significativamente menor (p<0,05)
do que a detectada nos animais infectados e não tratados e similar ao observado no grupo
controle não infectado pelo T.cruzi, no mesmo período de avaliação (gráfico 6).
Possivelmente esse fato se deve à redução da carga parasitária induzida pelo Bz neste
período, justificado pelo menos parcialmente, pela diminuição da estimulação celular.
Entretanto, quando esta mesma avaliação foi realizada aos 90 dias após a infecção dos
animais (imediatamente após o término do tratamento com Bz) foi observado que os
animais tratados apresentaram resposta proliferativa similar à observada no grupo
controle infectado e significativamente mais elevada à observada na avaliação de 45 dias
e à dos animais não infectados.
45 dias de infecção

4
índice de estimulação
90 dias de infecção

3


2
#
#

   
#
1
CNI
CI
TN VL10
C
(V
L10
)
A
TN
A
S
C
(
A
B
A
er
en S)
ic
TC e-7
(B 8
e78
)
C
N
I
TN VL10
C
(V
L10
)
TN AA
S
C
(A
B
A
er
en S)
ic
TC e-7
(B 8
e78
)
C
N
I
0
T-Bz
Gráfico 6 - Reatividade das células mononucleares do sangue periférico obtidas de cães
experimentalmente infectados com 2000 formas tripomastigotas sangüíneos/kg de peso corporal
das cepas VL-10, AAS e Berenice-78 do Trypanosoma cruzi após estimulação in vitro. Os
resultados foram expressos como índice de estimulação. CI) grupo controle infectado, T-Bz)
grupo tratado com Bz, TC) grupo tratado curado e TNC) grupo tratado e não curado (∆) P<0,05
(diferença significativa em relação CNI) (#)P<0,05 (diferença significativa em relação ao grupo
não tratado infectado com a respectiva cepa)
73
Resultados
5.7.4 Avaliação da proporção de linfócitos TCD4+ e TCD8+ nas células
mononucleares do sangue periférico
Visando investigar o balanço do envolvimento da resposta imune adaptativa
auxiliar e citotóxica durante o fase aguda da infecção, foi calculada a razão entre os
valores percentuais de linfócitos TCD4+ e TCD8+ do sangue periférico dos cães
infectados pelas cepas VL-10, AAS e Berenice-78 do T.cruzi. A avaliação foi realizada
pela soma dos quadrantes 1 e 2 do gráfico FL4:CD4+ versus FL1:CFSE e FL4:CD8+
versus FL1:CFSE da cultura que foi estimulada pelo antígeno do T.cruzi (figura 15).
A
B
Figura 15 - Análise representativa de avaliação da proporção de linfócitos TCD4+ e TCD8+
obtidas do sangue periférico de cães infectados pelo Trypanosoma cruzi e marcadas pelo CFSE,
utilizando citometria de fluxo. As análises foram realizadas através do software FlowJo.
Linfócitos marcados por anticorpos anti-CD4+ (A) e anti-CD8+ (B).
A proporção e a razão CD4/CD8 estão representados na figura 16. A análise dos
resultados permitiu observar que a proporção entre linfócitos TCD4+ e TCD8+ em cultura
estimulada de CMSP de cães não infectados é de aproximadamente 80:20, sendo a razão
CD4+/CD8 variante entre 3,6 e 3,8. Foi observado que no decorrer da infecção pelo
T.cruzi ocorre aumento da proporção de linfócitos TCD8+ em relação aos TCD4+, sendo
a razão diminuída da avaliação realizada aos 45 e 90 dias de infecção de 4,6 para 3,6
entre os animais infectados pela cepa VL-10 e de 2,5 para 1,6 entre os inoculados com a
cepa Berenice-78. A razão permaneceu constante na cultura de CMSP obtidas dos cães
infectados pela cepa AAS.
74
Resultados
Na cultura de CMSP obtidas dos cães submetidos ao tratamento com Bz foi
observado acúmulo ainda maior de linfócitos TCD8+ em relação aos TCD4+ sendo a
proporção de aproximadamente 60:40 (razão de 1,6) observada nas culturas obtidas dos
cães infectados pelas cepa AAS e Berenice-78 aos 90 dias de infecção e de 1,9 nos
inoculados com a cepa VL-10.
A
45 dias de infecção
Razão CD4+/CD8+
3,8
% Linfócitos TCD4/TCD8
100
4,6
2,6
2,7
2,0
2,5
2,5
80
60
40
20
er
en
ic
eer
78
en
ic
e78
)
A
S)
(A
TC
(B
B
TN
C
TN
C
A
A
S
10
)
-1
0
(V
L-
VL
C
N
I
0
T CD4+
B
T CD8+
90 dias de infecção
Razão CD4+/CD8+
3,6
% Linfócitos TCD4/TCD8
100
3,6
1,9
2,8
1,6
1,65
1,6
80
60
40
20
ni
er
e
(B
TC
B
er
en
i
ce
-7
8
ce
-7
8)
A
S)
(A
A
A
S
TN
C
(V
L10
)
-1
0
VL
TN
C
C
N
I
0
Figura 16 - Razão entre a freqüência de linfócitos TCD4+ e TCD8+ (Razão CD4+/CD8+)
encontrada em cultura de células mononucleares do sangue periférico estimulada, obtidas de cães
infectados pelo Trypanosoma cruzi aos 45 (A) e 90 dias de infecção (B). CNI: grupo controle não
infectado; TNC: grupo tratado com Bz e não curado; TC: grupo tratado e curado.
75
Resultados
5.7.5 Avaliação da apoptose de células mononucleares do sangue periférico
Para avaliação da apoptose de linfócitos TCD4+ e TCD8+ presentes em cultura de
CMSP obtidas dos cães infectados pelas cepas VL-10, AAS e Berenice-78 do T.cruzi,
estas foram marcadas com anexina-V e analisadas por citometria. A figura 17 mostra um
gráfico obtido pelo software FlowJo representativo de marcação por anticorpo antiCD4+Alexa Flúor647 e pela Anexina-V FITC, onde o quadrante mostrado especifica a
localização dos linfócitos TCD4+ (ou TCD8+, em outro tubo) em apoptose.
A
B
Figura 17 - Análise representativa de avaliação da apoptose de linfócitos TCD4+ e TCD8+
obtidos de cultura de células mononucleares do sangue periférico de cães infectados pelo
Trypanosoma cruzi, utilizando citometria e software FlowJo. Linfócitos marcados por anticorpos
anti-CD4+ (A) e anti-CD8+ (B).
No gráfico 7 estão representados os resultado da avaliação da apoptose dos
linfócitos T CD4+ avaliados após 48 horas de cultura. Os resultados foram obtidos do
número de linfócitos em apoptose quantificados na cultura estimulada pelo antígeno de
T.cruzi.
76
45 dias de infecção
90 dias de infecção
20


15
10

*
*

#
#
5
#
CNI
CI
78
)
-7
8
e-
A
TC
ic
e
en
(B
S)
S
B
er
0)
A
TN
C
(A
A
(V
L
-1
0
TN
C
VL
-1
I
N
C
TN VL10
C
(V
L10
)
T N AA
S
C
(A
B
A
er
en S)
ic
TC e-7
(B 8
e78
)
0
C
N
I
% de Linfócitos T CD4+ em apoptose
Resultados
T-Bz
Gráfico 7 - Análise da apoptose de linfócitos TCD4+ presentes em células mononucleares do
sangue periférico mantidas em cultura por 48 horas e estimulados com antígeno de Trypanosoma
cruzi, obtidas dos grupos não infectado (CNI) e infectado (CI) com 2000 formas tripomastigotas
sangüíneos/kg de peso corporal das cepas VL-10, AAS e Berenice-78 do T.cruzi. T-Bz: grupo
tratado com o Benznidazol, TC: grupo tratado curado e TNC: grupo tratado e não curado (∆)
P<0,05 (diferença significativa em relação ao CNI). (#)P<0,05 (diferença significativa em relação
ao grupo não tratado infectado com a respectiva cepa)
Aos 45 dias de infecção foi observada apoptose de linfócitos TCD4+ apenas nas
células obtidas dos cães infectados pela cepa AAS, entretanto aos 90 dias de infecção foi
observada apoptose nestas células obtidas dos cães infectados com as três cepas do
T.cruzi estudadas.
Interessantemente, o tratamento com Bz foi capaz de impedir que os linfócitos
TCD4+ em cultura entrassem em apoptose, já que foram observados índices similares de
apoptose de linfócitos TCD4+ nos animais tratados com Bz e nos não infectados, sendo
estes indices significativamente menores do que aqueles observados nos animais
infectados (não tratados) com as diversas cepas.
Em relação a apoptose de linfócitos TCD8+, entre as células obtidas dos cães
infectados e não tratados com Bz foi observada apoptose naquelas coletadas dos
infectados com as cepas AAS e Berenice-78, mas não nas dos infectados pela VL-10 em
ambos os momentos de avaliação. Em relação aos linfócitos dos cães submetidos à
quimioterapia não foi observada apoptose entre os infectados pela cepa AAS e Berenice-
77
Resultados
78, mas curiosamente foi observada maior perda de linfócitos TCD8+ naqueles infectados
45 dias de infecção
15

10
90 dias de infecção


*



*
#
5
CNI
CI
TN VL10
C
(V
L10
)
TN AA
S
C
(A
B
A
er
en S)
ic
TC e-7
(B 8
e78
)
I
N
C
TN VL10
C
(V
L10
)
TN AA
S
C
(A
B
A
er
en S)
ic
TC e-7
(B 8
e78
)
0
C
N
I
% de Linfócitos T CD8+ em apoptose
pela cepa VL-10 que foram tratados com Bz, mas que não foram curados (gráfico 8).
T-Bz
Gráfico 8 - Análise da apoptose de linfócitos TCD8+ presentes em células mononucleares do
sangue periférico mantidas em cultura por 48 horas e estimulados com antígeno de Trypanosoma
cruzi, obtidas dos grupos não infectado (CNI) e infectado (CI) com 2000 formas tripomastigotas
sangüíneos/kg de peso corporal das cepas VL-10, AAS e Berenice-78 do T.cruzi. T-Bz: grupo
tratado com o Benznidazol, TC: grupo tratado curado e TNC: grupo tratado e não curado (∆)
P<0,05 (diferença significativa em relação ao CNI). (#)P<0,05 (diferença significativa em relação
ao grupo não tratado infectado com a respectiva cepa)
5.7.6 Quantificação dos níveis das citocinas IFN-γ, IL-10 e TNF-α no
sobrenadante das culturas de células mononucleares do sangue periférico dos
cães infectados pelo Trypanosoma cruzi
Para avaliação da resposta imune celular dos cães experimentalmente infectados
pelas cepas VL-10, AAS e Berenice-78 do T.cruzi foram realizadas, através de ELISA,
as dosagens das citocinas IFN-γ, TNF-α e IL-10 no sobrenadante das culturas de CMSP.
Entre os cães infectados pelas cepas VL-10 e Berenice-78, os níveis de IFN-γ
aumentaram progressivamente no decorrer da infecção, atingindo maiores níveis na
cultura de CMSP dos cães infectados pela cepa VL-10 aos 90 dias de infecção. Na
cultura das células dos infectados pela cepa AAS foi observado aumento mais rápido
78
Resultados
dessa citocina, sendo que o máximo detectado foi na cultura realizada aos 45 dias de
infecção, se mantendo estável na avaliação seguinte (Gráfico 9).
p<0,05
2.0
p<0,05
p<0,05
*
IFN- ng/mL
*
1.5
*
*
*
*
1.0
p<0,05
p<0,05
0.5
B
er
en
ic
e78
B
er
A
en
I
ic
e78
B
45
er
D
en
I
ic
e78
90
D
I
90
D
I
A
A
S
A
I
45
D
I
A
A
S
A
A
S
90
D
I
VL
-
10
45
D
I
10
VL
-
VL
-
10
A
I
0.0
Gráfico 9 - Quantificação de IFN-γ, através do ELISA, no sobrenadante de células
mononucleares do sangue periférico de cães infectados com 2000 formas tripomastigotas
sangüíneos/kg de peso corporal das cepas VL-10, AAS e Berenice-78 do Trypanosoma cruzi nos
momentos antes (AI) 45 e 80 dias de infecção (DI) (*) P<0,05 (diferença significativa em relação
ao CNI).
A dosagem de IFN-γ no sobrenadante da cultura de células mononucleares dos
cães submetidos ao tratamento com Bz está representada na figura 18. O tratamento foi
capaz de reduzir a produção de IFN-γ nas culturas obtidas dos animais curados e nos não
curados infectados pelas cepas Berenice-78 e AAS, respectivamente (figuras 18B e C).
Entre as culturas obtidas dos animais não curados infectados pela cepa VL-10 não foi
observada diferença entre as culturas dos animais tratados ou não. Este fato poderia estar
correlacionado com o padrão de lesão cardíaca semelhantes entre estes animais,
mostrando o alto padrão de resistência ao quimioterápico apresentado por esta cepa
(figura 18A).
79
Resultados
A
B
VL-10
AAS
p<0,05
1.5
p<0,05
2.0
*
*
*
p<0,05
*
IFN- ng/mL
*
1.0
0.5
*
1.5
*
*
1.0
0.5
p<0,05
CI
TNC
I
I
D
90
I
D
45
A
I
D
90
D
I
A
I
D
I
90
I
D
45
A
I
I
D
90
I
D
45
A
CI
I
0.0
0.0
45
IFN- ng/mL
2.0
TNC
Berenice-78
C
2.0
p<0,05
p<0,05
IFN- ng/mL
*
1.5
*
*
*
1.0
0.5
CI
I
I
90
D
45
D
A
I
I
I
90
D
45
D
A
I
0.0
TC
Figura 18- Quantificação de IFN-γ, através do ELISA, no sobrenadante de células
mononucleares do sangue periférico de cães infectados com 2000 tripomastigotas sangüíneos/kg
de peso corporal das cepas VL-10 (A), AAS (B) e Berenice-78 (C) do Trypanosoma cruzi
submetidos ao tratamento com Bz. TNC Tratado com Benznidazol e não curado; CI: controle
infectado; TC: tratado curado (*) P<0,05 (diferença significativa em relação ao CNI).
Os níveis de IL-10 detectados nas culturas de CMSP obtidas dos animais do
grupo controle infectado estão mostrados no gráfico 10. Níveis mais altos e ascendentes
desta citocina também foram observados nas culturas obtidas dos cães infectados pela
cepa VL-10. Níveis intermediários foram detectados nas culturas dos animais infectados
pelas cepas AAS e Berenice-78 aos 45 e 90 dias de infecção. Nas culturas obtidas dos
animais infectados pela cepa Berenice-78 os níveis de IL-10 permaneceram estáveis nas
duas avaliações, sendo detectada uma redução significativa destes níveis nas culturas dos
animais infectados com a cepa AAS.
80
Resultados
Estes dados mostram que a IL-10 mesmo sendo uma citocina anti-inflamatória é
bastante produzida por linfócitos oriundos de infecção aguda com presença de intensa
miocardite, como foi o caso dos animais infectados pelas cepas VL-10 e Berenice-78 aos
90 dias de infecção, e menor entre os infectados pela cepa AAS.
p<0,05
30
*
*
IL-10 ng/mL
p<0,05
p<0,05
p<0,05
20
*
*
*
*
10
p<0,05
I
90
D
I
B
er
en
ic
e78
45
D
I
e78
er
en
ic
B
B
er
en
ic
S
e78
A
I
90
D
I
A
A
S
A
A
A
A
S
45
A
D
I
D
I
90
VL
-
10
45
10
VL
-
VL
-
10
A
I
D
I
0
Gráfico 10 - Quantificação de IL-10, através do ELISA, no sobrenadante de células
mononucleares do sangue periférico de cães infectados com 2000 tripomastigotas sangüíneos/kg
de peso corporal das cepas VL-10, AAS e Berenice-78 do Trypanosoma cruzi nos momentos
antes (AI) 45 e 90 dias de infecção (DI) (*) P<0,05 (diferença significativa em relação ao CNI).
A influência do tratamento nos níveis de IL-10 foi relacionada com a população
do T. cruzi. Nos animais infectados pela cepa VL-10 e tratados foi observada uma
redução significativa na produção desta citocina pelas CMSP em relação aos animais não
tratados. Padrão diverso foi observado nos cães tratados infectados pelas cepas Berenice78 e AAS, onde os níveis de IL-10 nas culturas de CMSP foram semelhantes aos dos
animais não tratados. Além disso, nas culturas de CMSP obtidas dos animais curados foi
observada uma elevação significativa da produção de IL-10 ao final do tratamento
(figura 19A, B e C).
81
Resultados
A
B
VL-10
AAS
p<0,05
*
*
IL-10 ng/mL
30
p<0,05
p<0,05
p<0,05
IL-10 ng/mL
30
20
*
*
10
p<0,05
20
*
*
*
*
10
p<0,05
I
I
90
D
I
A
CI
45
D
I
I
90
D
I
A
TNC
45
D
I
I
90
D
I
A
CI
45
D
I
90
D
45
D
A
I
0
I
0
TNC
Berenice-78
C
30
IL-10 ng/mL
p<0,05
p<0,05
20
*
*
*
*
10
CI
I
I
90
D
45
D
I
A
I
I
90
D
45
D
A
I
0
TC
Figura 19 - Quantificação de IL-10, através do ELISA, no sobrenadante de células
mononucleares do sangue periférico de cães infectados com 2000 formas tripomastigotas
sangüíneos/kg de peso corporal das cepas VL-10 (A), AAS (B) e Berenice-78 (C) do
Trypanosoma cruzi submetidos ao tratamento com Bz. TNC Tratado com Benznidazol e não
curado; CI: controle infectado; TC: tratado curado (*) P<0,05 (diferença significativa em relação
ao CNI).
A quantificação do TNF-α no sobrenadante das culturas de CMSP dos cães
infectados pelas cepas VL-10, AAS e Berenice-78 revelou similaridade nos níveis de
produção desta citocina nas culturas obtidas dos cães infectados pelas três cepas, sendo
observado aumento aos 45 dias de infecção e se mantendo estável até os 90 dias (gráfico
11).
.
82
Resultados
TNF- ng/mL
0.5
*
*
*
*
*
0.4
*
0.3
0.2
0.1
I
90
D
I
e78
45
D
er
en
ic
B
e78
er
en
ic
B
B
er
en
ic
S
e78
A
I
D
I
90
D
I
A
A
S
A
A
A
A
S
45
A
I
D
I
90
10
45
VL
-
10
VL
-
VL
-
10
A
I
D
I
0.0
Gráfico 11 - Quantificação de TNF-α, através do ELISA, no sobrenadante de células
mononucleares do sangue periférico de cães infectados com 2000 tripomastigotas sangüíneos/kg
de peso corporal das cepas VL-10, AAS e Berenice-78 do Trypanosoma cruzi nos momentos
antes (AI) 45 e 80 dias de infecção (DI) (*) P<0,05 (diferença significativa em relação ao CNI).
O tratamento com Bz induziu uma marcante redução na produção de TNF-α pelas
CMSP obtidas dos cães infectados pelas cepas VL-10, AAS e Berenice-78 do T.cruzi
(figura 20). Entre os animais infectados pelas três cepas, independente da eficácia
terapêutica do Bz, o pico de produção do TNF-α foi aos 45 dias de infecção, não sendo
observada redução, neste momento, associada à cepa VL-10 (figura 20A). Aos 90 dias de
infecção o Bz foi capaz de prevenir a produção desta citocina independente da
susceptibilidade da cepa envolvida. Entretanto os níveis foram significativamente
maiores do que aqueles detectados nas culturas dos animais não infectados na cultura de
CMSP dos cães infectados pelas cepas VL-10 e AAS, e similares na cultura dos cães
curados que foram infectados pela cepa Berenice-78 (figura 20A, B e C).
83
Resultados
A
B
VL-10
AAS
p<0,05
p<0,05
0.5
*
*
p<0,05
p<0,05
0.3
*
0.2
0.1
0.4
*
0.3
0.2
*
0.1
TNC
CI
I
I
90
D
I
45
D
A
I
90
D
I
I
A
45
D
I
I
90
D
I
A
CI
45
D
I
90
D
45
D
A
I
0.0
I
0.0
p<0,05
*
*
*
0.4
TNF- ng/mL
TNF- ng/mL
0.5
TNC
Berenice-78
C
TNF- ng/mL
0.5
p<0,05
*
0.4
p<0,05
*
p<0,05
0.3
*
0.2
0.1
I
I
90
D
I
A
CI
45
D
I
I
90
D
45
D
A
I
0.0
TC
Figura 20 - Quantificação de TNF-α, através do ELISA, no sobrenadante de células
mononucleares do sangue periférico de cães infectados com 2000 formas tripomastigotas
sangüíneos/kg de peso corporal das cepas VL-10 (A), AAS (B) e Berenice-78 (C) do
Trypanosoma cruzi submetidos ao tratamento com Bz. TNC Tratado com Benznidazol e não
curado; CI: controle infectado; TC: tratado curado (*) P<0,05 (diferença significativa em relação
ao CNI).
5.7.7 Quantificação da expressão de mRNA das citocinas IFN-γ, IL-10 e TNF-α no
átrio direito dos cães infectados pelo Trypanosoma cruzi
Para avaliação da expressão das citocinas IFN-γ, IL-10 e TNF-α no tecido cardíaco
dos cães, foi utilizada a PCR em tempo real usando a estratégia de quantificação relativa,
onde a expressão gênica de cada citocina foi determinada em relação a expressão
observada por cão não infectado pelo T.cruzi e normalizada pelo gene constitutivo β-
84
Resultados
actina. Assim, os resultados foram mostrados em quantas vezes mais, determinado
animal possui mRNA para a citocina do que os cães controles não infectados.
Para isso, inicialmente foi necessário um experimento de validação, mostrando que
as eficiências das amplificações do alvo e do gene de referência (β-actina) eram
aproximadamente iguais. A eficiência de amplificação é a taxa na qual uma molécula de
DNA é gerada, se a quantidade de cópias aumentar 10 vezes a cada 3,32 ciclos de
amplificação durante a fase geométrica, então a reação está ocorrendo com 100% de
eficiência. Essa eficiência é calculada baseando-se no slope de uma curva padrão, onde o
slope de -3,32 indica uma reação com 100% de eficiência (figura 21).
A
B
C
D
Figura 21 - Curvas padrão gerada com 7 diluições seriadas de uma mesma amostra de cDNA
para verificação das eficiências dos primers para IFN-γ (A), IL-10 (B), TNF-α(C) e β-actina(D)
85
Resultados
Para o calculo da eficiência foi utilizada a seguinte fórmula:
Eficiência = (10-1/slope – 1) x 100
Os resultados mostraram que os primers para amplificação das citocinas IFN- γ,
IL-10, TNF-α e β-actina escolhidos foram próximos de 100%, mostrando slopes de -3.2,
-3.26, -3,27 e -3,24, que correspondem às eficiências de 105%, 102%, 101% e 103%,
respectivamente. É interessante ressaltar também que os coeficientes de correlação (valor
R2) foram sempre próximos de 1 (figura 21).
Foi observado, ainda, se os ciclos de amplificação (CT) para cada cDNA das
citocinas se comportavam de forma semelhante após diluição seriada de uma mesma
amostra, verificando eventuais inibições que pudessem comprometer o experimento. A
figura 22 mostra uma uniformidade dos CT para os cDNA das citocinas se comportaram
após a diluição.
A
B
C
D
Figura 22 - Ciclos de amplificação gerados com diluições seriadas de uma mesma amostra de
cDNA para verificação das eficiências dos primers para IFN-γ (A), IL-10 (B), TNF-α(C) e βactina(D)
86
Resultados
É importante ressaltar que foram também plotados gráficos de log de quantidade
de entrada de cDNA (cada diluição) versus variação do CT das citocinas e do gene
constitutivo para comprovação matemática que permaneciam constantes após a diluição
da amostra, se mostrando na forma de uma reta, com equação do tipo y = ax + b, onde o
“a” corresponde a inclinação da reta, que não deveria sair do intervalo de -0,1 e 0,1. Os
valores encontrados foram de -0,007, -0,025. 0,0104 e -0,009 para o IFN-γ, IL-10, TNF-α
e β-actina respectivamente, confirmando não haver inibição da reação.
Ainda para maior confiabilidade da técnica foi importante observar as curvas de
dissociação (ou curva melt) para os cDNA correspondentes aos mRNA das citocinas
estudadas, para verificação de formação de dímeros de primers durante a reação. Na
figura 23 podem ser observadas as curvas de Melt para os cDNA dos mRNA das três
citocinas e da β-actina, mostrando os respectivos Tm.
Figura 23 - Curva de dissociação do cDNA amplificado dos mRNA para as citocinas IFN-γ, IL10, TNF-α e do controle endógeno β-actina, com picos em torno de 71oC, 75oC, 84oC e
74oC, respectivamente
Os resultados da padronização mostrados indicaram que a estratégia de
quantificação relativa poderia ser utilizada com segurança para a realização dos
experimentos de avaliação da expressão dos mRNA para as citocinas IFN-γ, IL-10, TNF-
87
Resultados
α no átrio direito dos cães infectados pelas cepas VL-10, AAS e Berenice-78 durante as
fases aguda (90 dias) e crônica da infecção (270 dias de infecção). A figura 24 mostra os
níveis de expressão de IFN- γ.
IFN- (90 dias de infecção)
A
expressão RNAm
4
*
*
3
p=0,002 p=0,034
*
p=0,018
2
p=0,06
p=0,063
p=0,615
1
(V
L10
TN
)
C
TC
(A
A
(B
S)
er
en
ic
e78
)
TN
C
A
A
B
S
er
en
ic
e78
VL
-
10
0
IFN- (270 dias de infecção)
B
*
p=0,022
18
expressão RNAm
9
4
3
*
p=0,041
2
p=0,162 p=0,144
p=0,669 p=0,963
1
(V
L10
TN
)
C
TC
(A
A
(B
S)
er
en
ic
e78
)
TN
C
A
A
B
S
er
en
ic
e78
VL
-
10
0
Figura 24 - Níveis de expressão de IFN-γ no átrio direito de cães infectados pelas cepas VL-10,
AAS e Berenice-78 do Trypanosoma cruzi, necropsiados aos 90 dias (A) e 270 dias de infecção
(B) TNC: Tratado com Benznidazol e não curado; TC: tratado curado (*) P<0,05 (diferença
significativa em relação a 1- linha pontilhada - teste t de student, com hipótese nula igual a 1).
88
Resultados
Foi possível observar aumento médio de 2,5 vezes mais expressão de mRNA
para IFN-γ no miocárdio dos animais infectados pelas cepas VL-10 e AAS e de 1,5 vez
naqueles infectados pela cepa Berenice-78 quando avaliados aos 90 dias de infecção.
Entre os cães submetidos ao tratamento com Bz não foi observada redução da expressão
entre os infectados pela cepa VL-10, mas sim entre os infectados tratados não curados
pela cepa AAS. Apesar de não haver diferença significativa na expressão entre os
tratados ou não, infectados pela cepa Berenice-78, naqueles tratados curados a expressão
foi semelhante à observada em cães não infectados, com razão próxima de 1 (Figura
24A).
Na avaliação realizada aos 270 dias de infecção foi observado aumento médio de
2,2 vezes na expressão entre os animais controles infectados pela cepa VL-10 e de cerca
de 1,4 vez entre os infectados pelas cepas AAS e Berenice-78. Esses níveis de expressão
podem ser correlacionados com o maior processo inflamatório observado nos cães
infectados pela cepa VL-10, nesse momento da infecção. Ainda, altos níveis de expressão
de IFN-γ foram observados nos animais tratados não curados infectados pela cepa VL10, e menores entre os tratados não curados infectados pela cepa AAS e curados
infectados pela cepa Berenice-78, correlacionando também com o fato do tratamento não
interferir na inflamação observada entre os animais infectados pela VL-10, mas sim nos
infectados pelas outras duas cepas (Figura 24B).
Aos 90 dias de infecção também os maiores níveis de expressão de mRNA para a
citocina IL-10 foram observados no átrio direito dos cães infectados pela cepa VL-10 do
T.cruzi, com expressão média de 2,5 vezes maior que aquela observada em animais não
infectados. Expressão significativa também foi observada entre os cães infectados pela
cepa Berenice-78, podendo também ser correlacionada com maior miocardite encontrada
nesse momento da infecção entre os cães inoculados com as cepas VL-10 e Berenice-78
e menores entre os infectados pela AAS. O tratamento com Bz preveniu a expressão para
IL-10 entre os cães infectados pela VL-10, mas interessantemente, apesar de não ter sido
diferença significativa, os animais curados infectados pela cepa Berenice-78 expressaram
2 vezes mais que os animais não infectados pelo T.cruzi, assim como apresentaram
aumento dessa citocina na cultura de CMSP, quantificada através do método de ELISA
(Figura 25A). Aos 270 dias de infecção os maiores níveis de expressão também foram
observados nos cães infectados pelas cepas VL-10 e Berenice-78 e, nos animais tratados
89
Resultados
com o Bz, expressão significativa foi encontrada somente nos animais não curados
inoculados com a cepa VL-10 (Figura 25B).
IL-10 (90 dias de infecção)
A
expressão RNAm
4
3
*
p=0,002
p=0,113
*
2
p=0,049
p=0,638
p=0,683
p=0,664
1
(V
L10
TN
)
C
TC
(A
A
(B
S)
er
en
ic
e78
)
TN
C
A
A
B
S
er
en
ic
e78
VL
-
10
0
IL-10 (270 dias de infecção)
B
4
expressão RNAm
*
p=0,046
3
p=0,078
p=0,236
2
p=0,412
p=0,515
p=0,644
1
(V
L10
TN
)
C
TC
(A
A
(B
S)
er
en
ic
e78
)
TN
C
A
A
B
S
er
en
ic
e78
VL
-
10
0
Figura 25 - Níveis de expressão de IL-10 no átrio direito de cães infectados pelas cepas
VL-10, AAS e Berenice-78 do Trypanosoma cruzi, necropsiados aos 90 dias (A) e 270
dias de infecção (B) TNC: Tratado com Benznidazol e não curado; TC: tratado curado (*)
P<0,05 (diferença significativa em relação a 1 - linha pontilhada - teste t de student, com hipótese
nula igual a 1).
A expressão de mRNA para a citocina TNF-α no miocárdio dos cães está
mostrada na Figura 26.
90
Resultados
TNF- (90 dias de infecção)
A
8
*
p=0,013
*
p=0,036
expressão RNAm
7
*
p=0,03
6
5
*
4
p=0,023
3
2
p=0,836
1
p=0,99
)
TC
(B
er
TN
C
en
ic
(A
e-
A
78
S)
0)
(V
L1
C
TN
A
A
S
er
en
ic
e78
B
VL
-
10
0
TNF- (270 dias de infecção)
B
*
p=0,047
expressão RNAm
16
8
8
7
6
*
p=0,047
5
p=0,052
4
3
p=0,205
2
p=0,364
p=0,98
1
)
-7
8
ce
er
(B
TC
TN
C
en
i
(A
A
S)
0)
(V
L1
C
TN
A
A
S
er
en
ic
e78
B
VL
-
10
0
Figura 26 - Níveis de expressão de TNF-α no átrio direito de cães infectados pelas cepas
VL-10, AAS e Berenice-78 do Trypanosoma cruzi, necropsiados aos 90 dias (A) e 270
dias de infecção (B) TNC: Tratado com Benznidazol e não curado; TC: tratado curado (*)
P<0,05 (diferença significativa em relação a 1 - linha pontilhada - teste t de student, com hipótese
nula igual a 1).
De forma geral, foi encontrado no miocárdio dos cães infectados pelas cepas VL10, AAS e Berenice-78 do T.cruzi elevados níveis de expressão para a citocina TNF-α
91
Resultados
aos 90 dias de infecção, variando de 5 a 6 vezes mais expressão em relação aos animais
não infectados. Nesse momento foi observado que o tratamento dos cães com Bz foi
capaz de prevenir a expressão de mRNA para TNF-α entre todos os grupos, independente
do grau de resistência das cepas (Figura 26 A). Aos 270 dias de infecção, maiores níveis
de expressão foram observados entre os grupos infectados pelas cepas VL-10 e Berenice78, com níveis de 4 e 3 vezes mais expressão que em cães não infectados,
respectivamente. Entre os grupos tratados com Bz, foi observada expressão de TNF-α
somente nos tratados não curados infectados pela cepa VL-10 (Figura 26B).
Nossos resultados mostraram que a intensidade da expressão de mRNA para
citocinas são marcadamente influenciados pelo grau de inflamação induzida por
diferentes cepas e pelo padrão de resistência ao Bz apresentado pelas cepas VL-10, AAS
e Berenice-78 do T.cruzi.
92
Discussão
6 - Discussão
Apesar de já passados 100 anos da descoberta do Trypanosoma cruzi e a doença
por este parasito causada, ainda permanece a falta de opções para um tratamento seguro e
efetivo, apesar de grande esforço por parte de pesquisadores e organizações para
desenvolvimento de novos fármacos, na esperança de aliviar o sofrimento de milhões de
pessoas que ainda são afetadas pela doença de Chagas. Na falta de opções, o Benznidazol
(Bz) continua sendo o fármaco de escolha para o tratamento, apesar de baixos índices de
cura serem observados quando a terapia é realizada durante a fase crônica da doença
Cançado et al., (2002). Maiores índices de cura são observados quando o tratamento com
Bz é realizado durante a fase aguda, mas é bastante controverso se há retardo na evolução
da doença quando é observada falha terapêutica (Andrade et al.,1992).
Na necessidade de estudos mais aprofundados relacionados à patogênese da
doença de Chagas, torna-se necessário a utilização de modelos experimentais que
reproduzam o mais fiel possível os eventos que são observados em pacientes chagásicos.
O camundongo é o animal mais utilizado em trabalhos de infecção experimental por ser
um animal de tamanho pequeno de fácil manutenção, entretanto pode apresentar
limitações por não reproduzir as formas clínicas observadas em humanos. No mais,
devido ao baixo tempo de vida do camundongo, experimentos de quimioterapia muitas
vezes são comprometidos pela necessidade de acompanhamento do animal de
experimentação por períodos mais longos.
Um bom modelo experimental deve permitir o isolamento do T.cruzi no decorrer
de toda infecção, além de apresentar as formas aguda sintomática, a forma indeterminada
e a cardiopatia chagásica fibrosante, deve também permitir que as peculiaridades dos
mecanismos de geração de lesões cardíacas e a avaliação de quimioterápicos sejam
estudados. Vários pesquisadores vêm apontando o cão como um excelente modelo
experimental, por reproduzir todas as fases da cardiopatia chagásica (Andrade &
Andrade, 1980; Andrade, et al., 1984; Lana et al.,1988; Barr et al., 1991; Lana et al.,
1992, Bahia et al., 2002), por apresentarem os mesmos índices de cura observados em
humanos em ambas as fases da doença (Guedes et al., 2002) e por permitirem estudos
para compreensão de mecanismos imunopatológicos da doença de Chagas (Guedes et al.,
2008, 2009 e 2010).
93
Discussão
Atenção especial deve ser dada na escolha de um modelo experimental, pois
hospedeiros de espécies diferentes podem ser cruciais para a determinação dos resultados
encontrados. Avaliação do comportamento de uma mesma cepa do T. cruzi em diferentes
modelos experimentais foi realizado por Lana et al. (1992) onde foi demonstrado que as
cepas Berenice-62 e Berenice-78 do T.cruzi se comportavam de forma variada quando
utilizados os modelos canino e murino. A cepa Berenice-78 foi considerada pouco
virulenta e patogênica em camundongos, entretanto foi capaz de determinar as formas
aguda sintomática, a forma indeterminada e a cardiopatia chagásica fibrosante quando
inoculada em cães. Ao contrário, a cepa Berenice-62 induziu alta parasitemia e 100% de
mortalidade em camundongos por volta do 13o dia de infecção, e quando inoculada em
cães induziu menores níveis de parasitemia e lesões teciduais em relação ao observado
nos animais inoculados com a cepa Berenice-78. Estes resultados contribuem para o
entendimento das discrepâncias de experimentos realizados em diferentes modelos
experimentais, já que diferentes hospedeiros podem determinar padrões de infecção
diversos, por supostamente não responder da mesma forma ao parasito.
Hospedeiros diferentes também podem influenciar no índice de cura após
tratamento quando se utiliza uma mesma população do T. cruzi. Filardi & Brener (1987)
descreveram que as cepas Basileu e MVC provenientes de pacientes que se encontravam
na fase aguda da infecção e que foram tratados com Bz e curados, também foram
totalmente sensíveis ao tratamento com esse fármaco quando inoculadas em
camundongos. Entretanto, pacientes naturalmente infectados pela cepa AAS, foram
submetidos ao tratamento específico durante a fase aguda da infecção, não sendo
observada a cura parasitológica e, após isolado o parasito e inoculado em camundongos,
foi observada 40 a 69% de cura. No presente trabalho a cepa AAS inoculada em cães, foi
100% resistente, indicando também maior similaridade ao que ocorre em pacientes.
De fato o hospedeiro é determinante em qualquer processo infeccioso, mas a busca
de conhecimento sempre foi maior em relação ao parasito. Inicialmente houve intenso
processo de tentativa de correlação entre as características morfológicas dos
tripomastigotas sanguíneos com seu comportamento biológico (Ferriolli et al., 1968;
Andrade et al., 1970; Coura et al., 1966 e Belda Neto, 1974), além da tentativa de se
determinar a forma do parasito que é predominante em determinadas regiões geográficas
(Schlemper et al, 1986). Acredita-se que cada população do T.cruzi apresente uma
94
Discussão
identidade morfológica, pois o mesmo padrão é conservado quando a cepa é mantida em
animais imunossuprimidos ou em cultura de células sem pressão do sistema imune
(Urdaneta-Morales, 1983). Existem evidências que demonstram que a morfologia do
parasito esteja relacionada à sua fisiologia (Pereira da Silva, 1959; Brener e Chiari, 1963
e Brener, 1965) determinando, por exemplo, o tropismo tecidual e sua taxa de
crescimento.
O comportamento das cepas do T. cruzi em animais de experimentação tem
mostrado diferenças quando se utilizam formas sanguíneas finas ou quando a cepa é
constituída predominantemente de formas largas. Segundo Brener (1969) as formas finas
são capazes de penetrar mais rapidamente nas células do hospedeiro do que as formas
largas e teriam ainda tropismo preferencial para células do sistema fagocitário
mononuclear. Por outro lado, as formas largas apresentariam tropismo para células
cardíacas e seriam mais resistentes à pressão pelo sistema imune. Além disso, alguns
autores relacionam o polimorfismo do T.cruzi com a presença de inflamação e fibrose em
determinados tecidos. Segundo Andrade et al.(1970) um dos vários fatores que
causariam alta variação na ação patogênica para o hospedeiro seriam as características
morfológicas do parasito.
As curvas de parasitemia obtidas pela análise diária do sangue periférico dos cães
infectados pelas cepas com predomínio de formas largas (VL-10 e Berenice-78)
mostraram maior número de parasitos que o encontrado nos cães infectados pela cepa
com predomínio de formas finas (AAS) que tiveram parasitemia sub-patente, sendo o
parasito detectado apenas após incessantes tentativas ou por meio de hemocultura.
Somando-se a isso, neste trabalho foi observado que a intensidade do processo
inflamatório no miocárdio dos cães necropsiados aos 90 e aos 270 dias de infecção foi
menor entre os animais que foram inoculados com a cepa AAS.
Todavia, em maior ou menor intensidade, a fase aguda da infecção chagásica é
caracterizada por acentuada miocardite, devido ao intenso processo de multiplicação do
T.cruzi, onde são observadas áreas de destruição de fibras cardíacas parasitadas com
liberação de formas tripomastigotas, amastigotas e restos celulares, além de inúmeros
fatores solúveis que são altamente imunogênicos (Andrade et al, 1994, Tafuri 1979). A
intensidade da miocardite é proporcional ao número de ninhos de amastigotas que são
rompidos.
95
Discussão
Por outro lado, no decorrer da infecção, com o surgimento da resposta imune
específica contra o T.cruzi, o exagerado processo de multiplicação é interrompido,
possivelmente com maior ou menor rapidez dependendo da forma do parasito envolvida
na infecção, o parasitismo sendo assim controlado, mas não erradicado. Focos
inflamatórios continuam a se formar progressivamente na tentativa de eliminação do
T.cruzi. Uma miocardite que conduz ao surgimento de fibrose vai se formando
progressivamente onde células do miocárdio destruídas vão sendo substituídas por
colágeno (Andrade et al, 1997).
A deposição de fibras colágenas e tecido adiposo nos espaços intersticiais
dificultam a passagem de nutrientes. Além disso, áreas ocupadas por tecido fibroso
modificam o funcionamento do miocárdio por alterar características estruturais do
arranjo de fibras colágenas em relação aos cardiomiócitos, já que as fibras colágenas
constitutivas sustentam e mantém a posição das células cardíacas para manutenção de
flexibilidade e rigidez exatas para perfeito funcionamento do órgão (Weber, 1989).
Devido à dificuldade de se encontrar o parasito na fase crônica e falta de
correlação entre a intensidade e/ou presença do parasito e o foco inflamatório, a
patogênese da doença de Chagas crônica ainda não está bem compreendida. Higuchi et
al.(1993) através da técnica de imuno-histoquímica, demonstraram correlação entre os
focos inflamatórios e a presença de antígenos do T.cruzi, defendendo a hipótese de que a
presença do parasito é importante na perpetuação da inflamação na fase crônica.
Entretanto, para diversos autores, devido à grandiosidade das lesões crônicas com
escassos parasitos, outros processos independentes da proliferação do parasito também
seriam importantes na miocardite fibrosante observada na fase crônica (Lopes et
al.,1995; Tafuri, 1979; Rossi et al.,1990; Andrade et al., 1999).
O encontro de anticorpos circulantes que se ligavam a antígenos do miocárdio de
humanos e camundongos cronicamente infectados com o T.cruzi conduziu à idéia de que
a autoimunidade poderia ter importância na patogenia da doença de Chagas. A resposta
auto-imune é baseada na presença de autoanticorpos e de linfócitos T auto-reativos,
decorrentes de mimetismo molecular entre antígenos do hospedeiro e do parasito, onde
auto-anticorpos contra antígenos do miocárdio, músculo esquelético e tecido nervoso
foram identificados (Kierzenbaum, 1999).
96
Discussão
Gironès & Fresno (2003) reportaram que a transferência de linfócitos T
purificados de baço de camundongos na fase crônica da infecção induz infiltrado
inflamatório em camundongos normais e produção de auto-anticorpos na ausência de
parasitos. Ribeiro-dos-Santos et al., (1992) mostraram que coração de camundongos
recém-nascidos transplantados em camundongos na fase crônica da infecção era
rejeitado, entretanto se o tratamento com anti-CD4 fosse empregado, a rejeição era
evitada. Por outro lado, Tarleton et al.(1997), também transplantando coração de
camundongos recém-nascidos em camundongos infectados pelo T.cruzi, mostrou que
estes não desenvolviam miocardite e nem eram rejeitados pela auto-imunidade,
entretanto, quando parasitos
vivos
eram
diretamente injetados,
os
corações
transplantados apresentavam inflamação similar àquela observada no coração natural,
sugerindo que a presença do parasito no miocárdio seria essencial para a ocorrência das
lesões observadas na doença de Chagas.
Considerando que a permanência do parasito é importante para a formação das
lesões características da fase crônica da doença, no presente estudo foi avaliada a
influência do tratamento específico realizado no primeiro dia de parasitemia patente do
animal, na evolução da doença crônica. O tratamento precoce de cães com Bz induziu a
cura parasitológica em todos os animais tratados infectados pela cepa Berenice-78.
Nestes animais o número de núcleos celulares detectados no miocárdio foi semelhante ao
observado nos animais do grupo controle não infectado, mostrando que a cura
parasitológica foi eficaz também na interrupção do processo inflamatório. Por outro lado,
apesar do tratamento precoce ter induzido uma permanente supressão da parasitemia nos
animais inoculados com as cepas resistentes AAS e VL-10, o tratamento não foi eficaz
em reduzir o processo inflamatório e aumento de área ocupada por tecido conjuntivo
fibroso no miocárdio dos cães necropsiados nas fases aguda e crônica que foram
infectados pela cepa VL-10. Contudo, o Bz foi eficaz em reduzir a intensidade da
miocardite e fibrose nos cães inoculados com a cepa AAS, que apresentaram níveis
intermediários aos observados nos animais do grupo controle infectado e ao quantificado
no grupo não infectado pelo T.cruzi.
Na literatura são encontrados vários estudos que foram realizados para verificar a
influência do tratamento na progressão da doença de Chagas, com resultados muitas
vezes discordantes. Alguns autores acreditam que o tratamento com Bz, mesmo quando
97
Discussão
administrado durante a fase aguda da infecção não é capaz de evitar ou amenizar as
lesões no miocárdio de pacientes em casos que a cura parasitológica não é alcançada
(Parada et al., 1997). Inglessis et al. (1998) também descreveram que pacientes tratados
na fase aguda apresentaram, através de biópsia no miocárdio, intensa miocardite depois
de meses ou anos após o término do tratamento com Bz, sugerindo que o tratamento com
Bz não previnia lesões cardíacas severas.
Sucesso do tratamento com Bz na prevenção da progressão da doença cardíaca foi
reportado por Fragata-Filho et al. (1994), onde chagásicos crônicos não tratados após
longos períodos de avaliação mostraram piora clínica (eletrocardiográfica) quando
comparados aos tratados. Ensaio clínico realizado na Argentina por Viotti et al. (2006),
também mostrou benefício do tratamento, em 283 pacientes tratados com Bz e 304
mantidos sem o tratamento. Estes pacientes foram comparados e observou-se redução da
progressão da doença cardíaca naqueles tratados, após tempo médio de acompanhamento
de 9.8 anos. Sosa-Estani et al.(1998) apesar de não terem observado diferença
significativa nas alterações eletrocardiográficas apresentadas entre pacientes tratados
durante a fase crônica recente e pacientes do grupo placebo três a quatro anos após a
quimioterapia, mostrou que o tratamento com Bz foi capaz de negativar a sorologia em
11,3% (5/44) dos pacientes.
Outros autores acreditam que o tratamento com Bz é eficaz na fase aguda ou em
infecções recentes. Andrade et al. (1996) relataram 55,8% de soroconversão negativa
após tratarem 64 crianças e adolescentes de sete a doze anos com este fármaco. Além
disso, acompanhando por seis anos 64 adolescentes, alterações eletrocardiográficas foram
observadas em quatro jovens que não receberam o tratamento, e em somente um que foi
tratado (Andrade et al., 2004). Estes dados sugerem que o tratamento de crianças e
jovens é uma necessidade, já que significativos índices de cura são observados em
indivíduos que se encontram na fase crônica recente. Ademais, Andrade et al. (1998)
mostraram prevalência de 11,3% (16/141) de anormalidades eletrocardiográficas entre
crianças de sete a doze anos infectadas pelo T.cruzi, ficando evidenciado que existem
áreas endêmicas onde a progressão da doença é rápida, mostrando que uma maior
atenção deve ser dada ao tratamento precoce com Bz, já que este poderia ser decisivo se a
cura dessas crianças fossem obtidas, ou se pelo menos prevenisse lesões severas.
98
Discussão
Muitos autores têm demonstrado a ocorrência de diferentes graus de
susceptibilidade entre cepas de T.cruzi que circulam nas diversas regiões geográficas e
em diferentes hospedeiros (Andrade et al., 1985; Filardi & Brener, 1987; Andrade et al.,
1992). Nestes trabalhos as cepas do T.cruzi foram classificadas como resistentes quando
os camundongos inoculados apresentavam índices de cura variando entre 0 e 40%,
parcialmente resistentes quando taxa de cura estava compreeendida entre 41 e 60% e
sensíveis quando os índices de cura nos camundongos tratados foram de 61 a 100%.
De acordo com esses autores, 35,58% das cepas estudadas eram resistentes,
5,77% eram parcialmente resistentes e 58,65% sensíveis ao tratamento com Bz (Andrade
et al., 1985; Filardi & Brener, 1987; Andrade et al., 1992). Estes resultados são
correspondentes com o índice de cura observado em ensaios clínicos realizados em
humanos durante a fase aguda da infecção, onde se observa de 60% a 70% de cura.
(Andrade et al., 1992; Galvão et al., 1993). Dessa forma a falha terapêutica e a presença
de alterações eletrocardiográficas observadas em parte dos pacientes chagásicos que se
encontram na fase crônica recente pode ser explicada pela existência de cepas
naturalmente resistentes aos quimioterápicos e com diferentes graus de virulência e
patogenicidade. Dessa forma, regiões endêmicas onde os chagásicos desenvolvem
rapidamente formas sintomáticas e, onde o tratamento com Bz é insatisfatório,
provavelmente predominam cepas do T.cruzi com altos graus de resistência ao fármaco.
Considerando essa variabilidade genética do T.cruzi, foi proposta no ano de 2004
a realização de um projeto onde pacientes crônicos de diversas regiões, incluindo o
Brasil, Colômbia, Venezuela, Argentina, Peru e Bolívia fossem tratados com Bz para
verificação definitiva da eficácia do Bz em previnir ou não a progressão das lesões
cardíacas observadas na doença de Chagas. Esse projeto foi denominado BENEFIT
(Benznidazole Evaluation for interrupting Trypanosomíasis) e englobará tratamento de
3000 pacientes, sendo metade tratada com 5mg/kg de peso corporal por 60 dias, e metade
constituindo o grupo placebo (Marin-Neto, et al, 2009). Este projeto visa determinar a
eficácia do Bz em reduzir a carga parasitária em pacientes crônicos, utilizando a PCR em
tempo real quantitativa, bem como avaliar a segurança e tolerabilidade do Bz.
Diante desses dados, onde se observa uma variedade de cepas com diversos graus
de sensibilidade ao Bz, e ainda essa grandiosa divergência de opniões a respeito se há ou
não benefício em casos de falha terapêutica, neste trabalho foram escolhidas cepas
99
Discussão
resistentes que após tratamento na fase inicial da doença induzem diferentes padrões de
lesão cardíaca na fase crônica. E considerando aquelas crianças de sete a doze anos
infectadas pelo T.cruzi que mostraram prevalência de 11,3% de anormalidades
eletrocardiográficas (Andrade et al,. 1998) ficando evidenciado que existem áreas
endêmicas onde a progressão da doença é rápida, a demonstração de presença de
alterações eletrocardiográficas em cães em fases recentes da doença é ainda mais um
indicativo que cães são bons modelos experimentais, e podem também ser úteis no
estudo da evolução clínica da doença de Chagas.
De fato, Lana et al, (1992) mostraram que 80% de cães experimentalmente
infectados pela cepa Berenice-78 apresentaram alteração eletrocardiográfica durante a
fase aguda da infecção, sendo observados distúrbios de repolarização, arritmias, bloqueio
átrio ventricular e até bloqueio completo do ramo direito do feixe de Hiss em 2,3% dos
cães. Interessantemente, após três meses de infecção houve tendência à normalização
eletrocardiográfica, momento onde apenas 33% dos animais apresentaram alterações.
Entretanto durante a fase crônica todos os animais apresentaram distúrbios
eletrocardiográficos, o que foi correlacionado com as lesões cardíacas observadas nesses
animais.
Andrade et al (1997), utilizando microscopia eletrônica, mostraram que cães em
fase recente da doença de Chagas apresentaram substituição de cardiomiócitos por tecido
conjuntivo fibroso em áreas de junção atrioventricular, regiões importantes no sistema de
condução do feixe de Hiss, mostrando que mesmo na forma indeterminada o
eletrocardiograma pode fornecer informações importantes da cardiopatia chagásica.
Certamente o ECG tem sido o recurso básico utilizado ao longo de décadas para o
diagnóstico clínico da cardiopatia chagásica em humanos, tanto na fase aguda como na
fase crônica da infecção sendo, portanto, aplicável ao estudo da patogênese da doença de
Chagas experimental.
A avaliação eletrocardiográfica é o principal método utilizado na determinação de
arritmias cardíacas, além de revelar alargamento e hipertrofia de câmaras cardíacas.
Além disso, as alterações gradativas de ondas permitem avaliar aumento progressivo da
câmara à medida que a cardiopatia evolui, mostrando ser um excelente método para
acompanhamento da evolução da infecção (Tilley et al., 2002). Foi possível observar
neste presente trabalho, que a infecção pelo T.cruzi induz alterações cardíacas
100
Discussão
progressivas no decorrer da infecção, e que a eletrocardiografia foi eficaz na monitoração
dessa evolução, uma vez que através da análise realizada aos 120 dias de infecção 33,3%
dos animais infectados pelas cepas VL-10, AAS e Berenice-78 apresentaram alterações
eletrocardiográficasdos passando para 73,3% na avaliação realizada aos 270 dias de
infecção. E assim como observado por Andrade et al (1997) usando a microscopia
óptica, neste trabalho foi observada correlação entre presença de fibrose no miocárdio
dos animais e de alterações no ECG. Ocorreram alterações principalmente em relação às
medidas de duração da onda P, que indica sobrecarga no átrio e ventrículo direito, e da
duração do intervalo PR, que é indicativo de bloqueios no nodo átrio ventricular, devido
substituição de células cardíacas nessa região por fibras colágenas, dificultando e
tornando lento o processo de condução de estímulos nervosos por essa área.
Esta progressão da doença pode ser exemplificada por um animal infectado pela
cepa Berenice-78 que, na avaliação realizada aos 120 dias de infecção, apresentou
bloqueio incompleto do ramo direito do feixe de Hiss e evoluiu para BCRD na avaliação
realizada aos 270 dias, mostrando alargamento da medida de duração do complexo QRS,
somados a desvio de eixo para a esquerda. O bloqueio completo do ramo direito do feixe
de Hiss (BCRD) é um acometimento prevalente e indicador de prognóstico desfavorável
na evolução da infecção (Viotti et al., 2005). Corroborando com esses resultados, Lana et
al., (1992) mostraram também BCRD entre os cães infectados pela cepa Berenice-78.
Outros achados nos exames eletrocardiográficos dos cães infectados pelas cepas VL-10,
AAS e Berenice-78 foram contrações ventriculares prematuras, arritmias atriais, extrasístoles supraventriculares e presença de ondas P ectópicas devido presença de áreas de
fibrose funcionarem como pontos de geração de impulsos nervosos, além de arritmias
diversas, como a Síndrome bradi-taqui, que consiste em intervalo QT variável e
prolongado, em um animal infectado pela cepa AAS.
Quando se avaliou os exames eletrocardiográficos dos cães tratados pelo Bz, foi
observado que entre os animais curados infectados pela cepa Berenice-78 não foram
observadas anormalidades eletrocardiográficas. Entretanto entre os animais tratados e
não curados, onde se encontram as maiores dúvidas a respeito da eficácia do Bz em
prevenir a evolução da infecção, foi observado que o tratamento foi benéfico em reduzir
alterações entre os animais infectados pela cepa AAS. Entretanto a prevalência das
alterações foi similar entre os grupos de animais infectados pela cepa VL-10, de forma
101
Discussão
que o tratamento não impediu o desenvolvimento das anormalidades. Entre estes
animais, 75% apresentaram alterações características nos estágios iniciais da forma
cardíaca da doença de Chagas, como presença de BAV de 1o grau, levando-se em
consideração que entre os animais infectados pela cepa VL-10 e não tratados, foi
observado 60% dos animais com alterações.
Nos últimos anos nosso grupo tem estudado a correlação entre o perfil de resposta
imune com o desenvolvimento da patogênese cardíaca observada em cães
experimentalmente infectados. Os resultados destes estudos mostram que o cão é um
bom modelo para o estudo dos mecanismos imunopatológicos da doença de Chagas,
reproduzindo os aspectos clínicos e imunológicos observados em pacientes chagásicos
(Guedes et al., 2009).
No contexto da imunopatologia, independente da natureza de um antígeno, o
sistema imune responde ativando e gerando expanção clonal de linfócitos específicos
contra esse determinado antígeno. Entretanto, na infecção causada pelo T.cruzi, é
observada intensa ativação policlonal de linfócitos B, com consequente produção de
imunoglobulinas de variadas especificidades, sendo que a maioria dos clones de
linfócitos B expandidos não são específicos a antígenos do T.cruzi. Estudos que
focalizam a correlação entre o desenvolvimento das diferentes formas clínicas em
pacientes portadores da doença de Chagas com o perfil de isotipos e subclasses de
imunoglobulinas são escassos e podem contribuir para o conhecimento do mecanismo da
patogênese da doença.
Estudos utilizando camundongos experimentalmente infectados têm demonstrado
que durante a infecção pelo T.cruzi participam do processo de eliminação do parasito as
imunoglobulinas da classe IgG, os subtipos IgG1, IgG2a, IgG2b e IgG3 e que a IgG2a e
IgG2b sendo as subclasses mais produzidas por esse modelo (Minoprio et al.,1988).
Takehara et al. (1981) demonstraram que as imunoglobulinas IgG2, preferencialmente a
IgG2b, teriam papel protetor para camundongos infectados pelo T. cruzi, por
apresentarem atividade lítica, entretanto alguns autores têm descrito que anticorpos da
subclasse IgG1 atuariam
também por mecanismo semelhante. Stefani et al. (1983)
mostraram que anticorpos responsáveis por atividades líticas no soro imune de
camundongos estão compreendidos no isotipo IgG, abrangendo as subclasses IgG1,
IgG2a, IgG2b. Alguns autores acreditam que a produção de IgG1 seja estimulada por
102
Discussão
citocinas anti-inflamatórias (Kawano et al., 1994). Experimentos in vitro mostraram que
a citocina IFN- inibe a produção de IgG1 e aumenta a secreção de IgG2 por antagonizar
a síntese de IgG1 mediada pela IL-6 e auxiliar a IL-6 na produção de IgG2 (Kawano et
al.,1994). Estes dados corroboram com Finkelman et al. (1990), que descreveram que o
IFN- pode suprimir IgG1 e estimular IgG2a, mas entretanto a citocina anti-inflamatória
IL-4 parece não ser requerida para a produção de IgG1 in vivo.
Estudos utilizando o cão como modelo experimental tem mostrado a ocorrência
das subclasses IgG1, IgG2, IgG3 e IgG4 (Deplazes et al.,1995), sendo que o controle na
produção destas subclasses é mediado por diferentes citocinas, assim como observado
em camundongos. Brière et al.(1994) descreveram que em resposta à IL-10, linfócitos B
secretam grande quantidade de IgM, IgG1 e IgG3, e não produzem IgG2 e IgG4. A
resposta mediada por anticorpos, estimulada por citocinas inflamatórias, leva
principalmente à produção de IgG2, capaz de opsonizar o parasito e auxiliar sua
destruição via complemento. Mosmann & Coffman, (1989) e Romagnani et al. (1991)
descreveram que a produção dos anticorpos das subclasses IgG1 e IgG4 é promovida por
citocinas anti-inflamatórias e que anticorpos dessas classes estariam envolvidos na
defesa do hospedeiro mediada por células efetoras não fagocitárias, como mastócitos e
eosinófilos. Essas células teriam mecanismo de ação via exocitose de grânulos protéicos
tóxicos para os parasitos.
Dessa forma, um dos principais interesses nos estudos dos perfis sorológicos
apresentados por humanos ou por modelos experimentais infectados pelo T.cruzi é a
procura de correlação entre a produção das subclasses de imunoglobulinas e a gravidade
da doença de Chagas. Morgan et al. (1996) descreveram níveis mais elevados de IgG2
nos soros dos pacientes portadores de formas clínicas, entretanto Cerban et al. (1993) não
observaram nenhuma correlação. Deplazes et al. (1995) mostraram que cães infectados
com Leishmania infantum, apresentavam produção de IgG1 mais elevada quando eram
sintomáticos ou quando não respondiam bem à quimioterapia, e IgG2 aumentada
naqueles assintomáticos. Padrão semelhante foi observado em cães infectados com
Toxoplasma gondii, sugerindo que IgG1 e IgG2 estariam relacionados com infecções
sintomáticas e assintomáticas, respectivamente, em infecções causadas por protozoários.
Ademais níveis elevados de IgG1 podem diminuir a resistência à infecção por competir
com IgG2 por sítios de ligação no parasito.
103
Discussão
Neste estudo foi observada a correlação entre a produção de imunoglobulinas e a
presença de inflamação no miocárdio dos animais infectados. Durante as fases mais
iniciais da infecção (90 dias de infecção) a maior correlação foi observada com o índice
de reatividade da classe IgG total (r = 0,77; p<0,0001) seguida pela subclasse IgG1(r =
0,73; p<0,0001). Este fato sugere ser um reflexo da grande quantidade de parasitos nesse
momento e que a forma de eliminação do parasito ocorra principalmente via opsonização
através de anticorpos da classe IgG. Esta hipótese pode ser explicada, ao menos
parcialmente, pelos menores índices de reatividade detectados nos soros dos animais
infectados pela cepa AAS, nos quais foram observados os menores níveis de parasitemia
(subpatente) e de inflamação no tecido cardíaco.
Contudo, aos 270 dias de infecção, elevada correlação foi observada entre a
inflamação e os anticorpos da subclasse IgG1 (r = 0,94; p<0,0001) entre os animais
infectados pelas três cepas. É importante lembrar que os grupos que desenvolveram
maior miocardite foram também os que apresentaram aumento de áreas ocupadas por
tecido fibroso aos 270 dias de infecção, permitindo também pontuar que houve
correlação entre índice de reatividade de anticorpos da subclasse IgG1 com fibrose no
átrio direito dos animais aos 270 dias de infecção (r = 0,56 ; p = 0,0120).
Neste trabalho foi avaliada também a evolução dos níveis de imunoglobulinas nos
animais submetidos ao tratamento específico com Bz, objetivando verificar a influência
do tratamento sobre a resposta imune humoral nos cães inoculados com cepas do T. cruzi
que apresentam diferentes níveis de resistência ao Bz. Foi observado que os cães
inoculados com a cepa Berenice-78 tratados com Bz e curados, apresentaram índices de
reatividade de IgG e IgG2 similares aos detectados no soro dos cães não infectados pelo
T.cruzi. Em contrapartida, o índice de reatividade apresentado pelos cães inoculados com
a cepa VL-10 tratados com Bz e não curados foi sempre próxima aos cães do grupo
controle infectado, entretanto nos infectados pela AAS houve tendência à diminuição do
índice, indicando que o tratamento com Bz apesar de não ter conduzido à cura,
influenciou nos níveis de IgG.
O tratamento específico influenciou de forma mais marcante nos níveis de IgG1,
independente da cepa envolvida, onde foram observados nos cães infectados pela cepa
Berenice-78 (tratados e curados) e nos infectados pela cepa AAS (tratados e não curados)
índice de reatividade similar ao observado no soro dos animais do grupo controle não
104
Discussão
infectado. Entretanto nos animais inoculados com a cepa VL-10, que não foram curados
pelo tratamento, foi observada uma redução do índice de reatividade em relação ao grupo
controle mas que permaneceu sempre acima da faixa que os classifica como reativos.
Apesar da tentativa de correlação do perfil de imunoglobulinas encontrados com
a patologia observada ser de grande relevância, a principal e mais direta aplicação do
estudo da cinética de imunoglobulinas em humanos ou em modelos experimentais
infectados pelo T.cruzi é a identificação de marcadores para a padronização de um
controle de cura efetivo após o tratamento da doença de Chagas. Indivíduos tratados
durante a fase crônica podem apresentar sorologia positiva por anos, mesmo após terem
alcançado a cura parasitológica. Entretanto quando seres humanos ou modelos
experimentais são tratados durante a fase aguda da infecção ou na fase crônica recente,
diversos autores têm considerado a sorologia negativa como indicativo de cura
parasitológica, com a soroconversão negativa ocorrendo nos primeiros anos após a cura
(Andrade et al., 1996, Sosa-Estani et al., 1998, Streiger et al., 2004).
A análise da cinética de IgG e suas subclasses IgG1, IgG2a e IgG2b no soro de
camundongos realizada por Caldas et al., 2008, mostrou que os níveis de IgG foram
decisivos para a verificação de cura parasitológica. Ao agrupar os animais inoculados
com as diferentes cepas do T.cruzi nos grupos controle infectado, tratado com Bz e não
curado, tratado com Bz e curado e controle não infectado, foi possível relacionar os
níveis de IgG com o resultado do tratamento. Os níveis de anticorpos detectados nos
soros dos animais curados foram similares aos dos animais não infectados 6 meses após o
tratamento, enquanto nos soros dos animais não curados estes níveis foram semelhantes
aos dos animais infectados e não tratados. Assim, foi possível afirmar que anticorpos da
classe IgG foram os que melhor separaram os animais tratados e curados daqueles
tratados e não curados, sendo portanto mais aplicável para o controle de cura.
Este estudo também mostrou que anticorpos da subclasse IgG podem ser
utilizados no controle de cura da doença de Chagas quando o tratamento específico é
realizado durante a fase aguda da infecção de cães experimentalmente infectados pelo
T.cruzi, já que os animais que apresentaram reatividade de IgG abaixo do valor
discriminante de 0.9, foram apenas os tratados com Bz que foram inoculados com a cepa
Berenice-78 com cura confirmada pelo teste de hemocultura e pela PCR.
105
Discussão
Entretanto, a resposta à infecção pelo T.cruzi envolve simultaneamente
mecanismos de resposta humoral e celular tanto na fase aguda como na fase crônica da
infecção. A presença de linfócitos nos infiltrados inflamatórios pode estar diretamente
relacionada ao processo de fibrose, à produção de citocinas e aos fatores de crescimento
que induziriam a lesão tecidual e ativariam a fibrogênese (Reis et al., 1993). Tanto na
fase aguda quanto na crônica é observado um infiltrado inflamatório constituído
predominantemente por linfócitos T e, que eles, a proporção de linfócitos auxiliares e
citotóxicos seriam próximas e dependentes da cepa do T.cruzi inoculada (Caliari et al.,
2001). A função protetora de linfócitos T auxiliares das linhagens Th1 e Th2 não está
bem definida devido ao fato das citocinas anti-inflamatórias e inflamatórias serem
amplamente produzidas durante a infecção. Assim não é claramente determinada,
também, a participação de diferentes imunoglobulinas no processo inflamatório já que a
produção dessas é influenciada pelo perfil de resposta Tipo1 ou Tipo2.
Entretanto existe um consenso de que uma resposta Th1 de maior intensidade na
fase aguda confere proteção e que em infecções crônicas ou prolongadas, ocorre
substituição da atividade Th1 pela Th2 para proteção do hospedeiro devido os danos
gerados pela intensa resposta inflamatória. Na fase crônica ocorre um predomínio da
atividade Th2 em relação à atividade Th1 e mesmo assim o hospedeiro continua
mantendo a parasitemia sob controle (Reis & Lopes, 2000). É possível que anticorpos
produzidos com o auxílio de células Th2 sejam também importantes para controle do
parasito durante a fase crônica.
A regulação da resposta imune é crucial na evolução da infecção e citocinas são
primordiais nessa regulação e no processo de resistência ao T.cruzi. Desde o início da
infecção, onde na resposta inata, as células fagocitárias são as primeiras a entrar em
contato com o parasito, citocinas já são produzidas pelos próprios macrófagos. A
fagocitose realizada por macrófagos é capaz de ativar a produção de IL-12 e TNF-α
nessas células (Aliberti et al., 1996) que, por sua vez, induzem a produção da citocina
IFN-γ por células NK. O IFN-γ é a principal citocina ativadora de macrófagos, sendo esta
importante para induzir a produção de óxido nítrico nessas células fagocíticas (Reed et
al, 1995). A citocina TNF-α, produzida por macrófagos, participa também desse processo
de ativação, juntamente com a IL-12 e o IFN-γ (Tarleton et al., 1992). Entretanto papel
tanto protetivo quanto deletérios foram atribuídos a essa citocina (Russo et al., 1989).
106
Discussão
Neste trabalho a produção de IFN-γ pelas células mononucleares do sangue
periférico em cães infectados pelas cepas VL-10, AAS e Berenice-78 e a expressão de
mRNA para essa citocina no tecido cardíaco mostrou que, durante a fase aguda da
infecção, o IFN-γ é altamente produzido, possivelmente devido à sua inquestionável
importância no controle do parasito, entretanto os maiores níveis foram observados entre
os animais infectados pela cepa VL-10, que são também os animais que apresentaram
miocardite mais acentuada. Entretanto a citocina IL-10 foi também bastante produzida na
fase aguda da infecção, proporcional à produção de IFN-γ, sendo também mais alta nos
cães com presença de miocardite mais intensa, mostrando que, durante as fases iniciais
da infecção pelo T.cruzi, parece que ocorre um misto de produção de citocinas pró e antiinflamatórias na tentativa de conciliar a destruição parasitária com menor lesão tecidual.
Contudo a produção de TNF-α pelas CMSP e sua expressão no tecido cardíaco mostrou
que essa citocina, durante a fase aguda da infecção, é abundante entre os animais
infectados pelas cepas que induzem diferentes graus de miocardite, não podendo ser
correlacionada com lesão tecidual.
A expressão mRNA para essas citocinas no miocárdio dos animais que foram
eutanasiados durante a fase crônica da infecção (270 dias) mostrou que aumento dessas
citocinas inflamatórias (IFN-γ e TNF-α) foi observado no miocárdio dos animais
infectados pela cepa VL-10 na presença de menor expressão de IL-10, indicando maior
produção de citocinas inflamatórias em cães com maior comprometimento cardíaco.
Interessantemente, foi demonstrado em um experimento realizado in vitro que o Bz
pode interferir na produção de citocinas e de óxido nítrico por macrófagos, promovendo
inibição da síntese de IL-6, IL-10 e inibindo também a expressão do gene da iNOS
(Revelli et al., 1999). Portanto o tratamento com Bz supostamente poderia influenciar o
curso da infecção pelo T.cruzi, não somente pela destruição direta do parasito, mas pela
interferência na resposta imune frente ao parasito. Estudando CMSP obtidas de pacientes
chagásicos que foram tratados com Bz durante a fase aguda da infecção, Bahia-Oliveira
et al., (1998) sugeriram papel duplo desempenhado pelo IFN-γ, podendo essa citocina
estar relacionada tanto na proteção quanto no desenvolvimento da patogênese da doença.
Os autores discutem que esta citocina, juntamente com o tratamento, conduziria a cura
parasitológica dos pacientes, ao observar níveis mais elevados na cultura de células
obtidas dos pacientes curados. Também mostraram que em casos mais graves o IFN-γ
107
Discussão
estimularia a resposta inflamatória, ao observar níveis elevados desta citocina tanto na
cultura de células obtidas dos pacientes curados quanto de pacientes crônicos com formas
mais graves da doença.
Resultados concordantes foram obtidos na dosagem das citocinas IFN-γ, IL-10 e
TNF-α no sobrenadante das CMSP e na quantificação da expressão de mRNA quando se
avaliou a influência do Bz aos 90 dias de infecção. O tratamento foi capaz de reduzir a
expressão de IFN-γ no tecido cardíaco e a produção desta citocina pelas células nas
culturas obtidas dos animais infectados pelas cepas Berenice-78 e AAS, mesmo não
tendo sido observada cura entre os infectados pela cepa AAS. Este mesmo efeito não foi
observado nos animais infectados pela cepa VL-10, o que pode ser correlacionado com o
padrão de lesão cardíaca semelhante entre os animais submetidos ou não ao tratamento,
mostrando que nesses casos de alta resistência, o tratamento também não influencia nos
níveis dessa citocina. Entretanto em relação à citocina TNF-α, foi observada queda da
produção entre todos os animais tratados com Bz, exceto nos cães infectados pela cepa
AAS, que apesar de terem apresentados baixos níveis dessa citocina no sobrenadante das
CMSP, tiveram elevada expressão de mRNA no tecido cardíaco.
Padrão interessante foi observado em relação à citocina IL-10, tanto na dosagem
realizada no sobrenadante quanto na expressão no miocárdio. Entre os animais tratados e
curados infectados pela cepa Berenice-78 foram observados altos níveis de IL-10 aos 90
dias de infecção, ao contrário do que foi observado entre os tratados e não curados
infectados pelas cepas VL-10 e AAS, nos quais os níveis de IL-10 foram menores. Estes
resultados indicam que quando o parasito é eliminado a atividade inflamatória é cessada,
permanecendo a produção de citocinas regulatórias por períodos mais prolongados. Estes
resultados são concordantes aos relatados por Talvani et al., (2000) que mostraram que
em casos de diminuição da carga parasitária ocorre redução da expressão de mRNA para
IFN-γ, entretanto a expressão de citocinas regulatórias como IL-4 e IL-10 permanece alta
após o parasitismo ser controlado.
Estudos que avaliam a resposta imune celular na infecção pelo T.cruzi
frequentemente tem sido realizados através da análise da reatividade in vitro de CMSP
frente à estimulação com antígenos de formas tripomastigotas. Espera-se que CMSP com
alta reatividade contra antígenos de T. cruzi provavelmente possuam grande número de
clones de linfócitos TCD4+ da linhagem Th1, ou seja, que produzam principalmente
108
Discussão
citocinas inflamatórias. De fato, os cães infectados pelas cepas VL-10, AAS e Berenice78 apresentaram grande produção de IFN-γ e TNF-α após estimulação in vitro e também
apresentaram elevada proliferação das CMSP tanto aos 45 quanto aos 90 dias de
infecção.
Ainda em relação ao TNF-α, Bowen & Bowen (1990) postularam que essa citocina
liberada por células inflamatórias, juntamente com outros fatores liberados na
inflamação, como Apo-2, poderiam servir como sinais extracelulares para indução de
apoptose. A apoptose de linfócitos tem sido descrita como assossiada à persistência do
parasito onde estes redirecionam a resposta apoptótica em células imunes (células B, T e
macrófagos) afetando assim o seu controle (Luder et al., 2001). A contribuição da
apoptose para supressão da resposta imune frente ao T.cruzi foi demonstrada por Lopes
et al (1995), onde a infecção levou à apoptose tanto de linfócitos TCD4+ quanto TCD8+
em experimentos in vivo. Entretanto esses autores mostraram que as células TCD8+ eram
mais propensas a apoptose espontânea in vitro, sendo esta decorrente de ausência de
citocinas como IL-2 importantes para manutenção dessas células, diferentemente ao que
ocorreu com os linfócitos TCD4+ que entraram em apoptose via AICD (morte celular
induzida por ativação) onde esses linfócitos ativados após reestimulação do TCR entram
em apoptose.
Além disso, Zhang et al.,(1997) reportaram que os linfócitos TCD4+ da linhagem
Th1 expressam mais rapidamente FasL que os da linhagem Th2. Sendo essa molécula
intimamente relacionada com a apoptose, acredita-se que ela preferencialmente induza a
apoptose em linfócitos produtores de citocinas inflamatórias, contribuindo para o escape
do parasito. Tarleton, (1995) mostrou que linfócitos TCD4+ são necessários para
produção de citocinas para estimulação de macrófagos e de linfócitos TCD8+ e,
considerando a importância desses dois tipos celulares, tem-se buscado correlação entre a
proporção dessas células com a patologia observada em indivíduos chagásicos.
Estudos mostram que indivíduos chagásicos na forma indeterminada da doença
possuem predominância de linfócitos TCD4+ e pacientes com forma sintomática
apresentam predominância de linfócitos TCD8+ (Cuna & Cuna, 1995). Considerando as
avaliações de proporção entre linfócitos TCD4+ e TCD8+ nos experimentos realizados
aos 45 e 90 dias de infecção dos cães infectados pelas cepas VL-10, AAS e Berenice-78,
a proporção de linfócitos TCD8+ aumentou em relação à população de linfócitos TCD4+
109
Discussão
quanto mais decorria a infecção. Estes dados corroboram com os resultados de Higuchi,
et al., (1997) e Santos et al., (2001), onde foram demonstrados predomínio de linfócitos
TCD8+ na fase crônica, principalmente nos casos de cardiopatia mais grave. Segundo
Fernandez-Presas et al (2000) após o pico de parasitemia ocorre diminuição da razão
CD4+/CD8+ e esse fenômeno pode ser atribuído a um mecanismo intrínseco das células
TCD8+ teriam para evadir da morte mediada pelo TCR, ou seja evadir da morte induzida
por ativação.
Em relação à apoptose das CMSP, foi observada entre a população de linfócitos
TCD4+, morte celular apenas associada aos animais infectados pela cepa AAS aos 45
dias de infecção, enquanto na avaliação posterior, aos 90 dias foi observada entre todas
as culturas de CMSP. Estes resultados mostram que realmente nesse momento da
infecção ocorre perda dessas células via AICD, pois provavelmente essas células estavam
ativadas, já que também foi observada intensa proliferação frente ao desafio com o
antígeno, antígeno este que também foi responsável pela reestimulação desses linfócitos
e por conduzi-los a apoptose.
Interessantemente, o único grupo que não apresentou linfócitos TCD8+ em
apoptose foi o dos cães infectados pela cepa VL-10, tanto aos 45 quanto aos 90 dias de
infecção. Se considerarmos que a morte por apoptose de linfócitos TCD8+ em cultura
ocorre principalmente por morte passiva como proposto por Lopes et al (1995), é de se
esperar que os linfócitos TCD8+ obtidos dos animais infectados por essa cepa estivessem
sendo mantidos vivos na cultura pela produção de fatores de crescimento por linfócitos T
auxiliares ali presentes. Considerando que os linfócitos TCD8+ são os principais
responsáveis no processo de dano tecidual, é de se esperar que realmente as células
originárias de cães infectados por essa cepa não entrassem em apoptose, uma vez que
nesses cães foram detectados maiores níveis de comprometimento cardíaco.
Olivieri et al.,(2002) avaliando a influência da quimioterapia com Bz no
compartimento linfóide de camundongos infectados pelo T.cruzi demonstraram que este
fármaco é capaz de promover a expansão de linfócitos em órgãos linfóides e que essa
expansão é maior entre linfócitos TCD8+ do que TCD4+, entretanto apesar da grande
expansão de TCD8+, esses não eram ativados e sim linfócitos de memória. Além disso,
mostrou que o tratamento com Bz é capaz de diminuir a taxa de apoptose, sendo
observada 14,2% de apoptose no grupo infectado e de 7,6% no grupo não infectado e,
110
Discussão
ainda que nos animais tratados com Bz a taxa de apoptose encontrada foi de 9,6%. Neste
trabalho foi também observada grande influência do Bz na proliferação, proporção e
apoptose de linfócitos. Assim como observado por Olivieri et al.,(2002), o Bz foi capaz
de intensificar a proporção de linfócitos TCD8+ em relação à de TCD4+, independente do
grau de resistência da cepa envolvida, chegando a ficar a proporção CD4:CD8 de 60:40
entre os animais tratados curados infectados pela cepa Berenice-78 e entre os tratados
não curados infectados pela cepa AAS, lembrando que a proporção normal é de
aproximadamente 80:20, como relatados por Caliari et al., (2002), onde também
mostraram proporção de 70-80% de TCD4+ e de 20-30% de linfócitos T CD8+ em análise
imunohistoquimica em cães não infectados pelo T.cruzi.
Em relação à capacidade do Bz em reduzir a apoptose de linfócitos obtidos dos
cães infectados pelo T.cruzi, assim como observado por Olivieri et al., (2002), o Bz foi
capaz de prevenir a apoptose entre os linfócitos TCD4+ e TCD8+ independente da cepa
envolvida na infecção. Possivelmente isso se deve ao fato de que mesmo quando cepas
resistentes ao Bz estejam envolvidas, o tratamento poderia ser eficaz em reduzir a carga
parasitária, e esta redução poderia estar relacionada com uma menor indução de citocinas
inflamatórias, como ocorreu com a produção diminuída de TNF-α, e por conseqüência,
com maior redução na taxa de apoptose.
Os resultados mostrados neste trabalho indicam que a infecção pelo T.cruzi é bem
variável e muito influenciada pela população do parasito envolvida, sendo observados
diferentes padrões de lesões no miocárdio dos animais assim como variados mecanismos
de resposta imune quando estes são infectados por diferentes populações do parasito.
Somando-se a isso, a eficácia do tratamento com o Bz na prevenção da evolução da
doença, nos casos de falha terapêutica, também se apresenta de forma bem variada, sendo
seu benefício e sua ineficácia mostrada em determinados casos.
111
Conclusões
7 - Conclusões
1 O polimorfismo das formas tripomastigotas sanguíneas foi correlacionado com as
curvas de parasitemia e com a intensidade das lesões cardíacas observadas nos
cães infectados pelas cepas VL-10, AAS e Berenice-78 do T.cruzi.
2 A infecção pelas cepas VL-10, AAS e Berenice-78 induz alterações
eletrocardiográficas progressivas no decorrer da infecção, mesmo se tratando de
fase recente, sendo correlacionada com a intensidade de fibrose induzida pelas
diferentes cepas.
3 Os níveis de IgG, IgG2 e principalmente IgG1 detectados nos soros dos cães
infectados pelas cepas VL-10, AAS e Berenice-78 do T.cruzi podem ser
relacionados com a intensidade do infiltrado inflamatório e com a intensidade do
tecido conjuntivo fibroso no átrio direito dos cães aos 270 dias de infecção.
4 Os níveis de IFN-γ, IL-10 foram correlacionados com a intensidade do processo
inflamatório no tecido cardíaco, sendo níveis maiores desta citocina detectados no
sobrenadante de CMSP obtidos de cães infectados pelas cepas VL-10 e Berenice78 (maior inflamação) em relação aos infectados pela cepa AAS (menor
inflamação).
5 Os níveis de TNF-α não foram relacionados com a intensidade das lesões
cardíacas, sendo detectado em altos níveis em todos os animais infectados.
6 O tratamento foi eficaz em prevenir lesões cardíacas apenas quando ocorre cura
(cepa Berenice-78), sendo observados distintos padrões de resposta quando não é
observada a cura, os seja, redução das lesões cardíacas (Cepa AAS) ou não
influencia no curso da infeccção (cepa VL-10).
7 O tratamento com Bz preveniu as alterações eletrocardiográficas entre os animais
curados infectados pela cepa Berenice-78 e, nos casos em que não conduziu à
cura, preveniu as anormalidades entre os cães infectados pela cepa AAS, mas não
entre os animais inoculados com a cepa VL-10 do T.cruzi.
112
Conclusões
8 O tratamento com Bz induziu a normalização da reatividade celular (final do
tratamento) independente da eficácia do tratamento.
9 No decorrer da infecção pelo T.cruzi é observado aumento gradativo de linfócitos
TCD8+ em relação aos TCD4+ e o tratamento com Bz é capaz de intensificar
ainda mais o acúmulo de linfócitos TCD8+.
10 A infecção de cães pelas cepas AAS e Berenice-78 induz aumento da apoptose de
linfócitos TCD4+ e TCD8+ na cultura CMSP, enquanto a cepa VL-10, que induz
maiores níveis de inflamação cardíaca, não ocorre apoptose de TCD8+.
11 O tratamento com Bz preveniu a apoptose de linfócitos TCD4+ e TCD8+ na
cultura de CMSP.
12 A influência do tratamento na produção das citocinas IFN-γ e IL-10 foi
relacionada com o resultado do tratamento, sendo detectada a redução do IFN-γ e
aumento de IL-10 nos animais curados, nos animais não curados foi observada
redução de IFN-γ e IL-10 nos que apresentaram redução de lesões cardíacas e
redução de IL-10, mas não de IFN-γ nos que não apresentaram redução das lesões
cardíacas.
13 A expressão de mRNA para as citocinas IFN-γ, IL-10 e TNF-α no tecido
cardíaco aos 90 dias de infecção foram concordantes com a produção das mesmas
pelas CMSP, ao se considerar o mesmo período de avaliação.
14 Aos 270 dias de infecção, a expressão de mRNA para as citocinas inflamatórias
IFN-γ e TNF-α se encontrava aumentada somente no miocárdio dos cães
infectados pela cepa VL-10 do T.cruzi e o tratamento com Bz não foi capaz de
prevenir essa elevação.
113
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Apêndice
9 - Apêndice
135
  
0.3
0.2
0.1
0
-100
3
2
1
C
N
I
VL
-1
0
A
er AS
en
ic
e78
TN
C
(V
L
TC TN -10
(B C (A )
er
en AS
ic )
e78
)
0
B
I
C
F 0.30
Intervalo QT (S)
0.0
120DI
270DI
0.25
0.20
0.15
VL
-1
0
A
er AS
en
ic
e78
TN
C
(V
L
TC TN -10
(B C (A )
er
en AS
ic )
e78
)
VL
-1
0
A
er AS
en
ic
e78
TN
C
(V
L
TC TN -10
(B C (A )
er
en AS
ic )
e78
)
B
B
VL
-1
0
A
er AS
en
ic
e78
TN
C
(V
L
TC TN -10
(B C (A )
er
en AS
ic )
e78
)
N
I
0.0
0.5
B
0.5
270DI
1.0
VL
-1
0
A
B
er AS
en
ic
e78
TN
C
(V
L
TC TN -10
(B C (A )
er
en AS
ic )
e78
)
1.0
120DI
I
1.5
1.5
N

E
C
270DI
Amplitude da onda Q (mv)
120DI
C
N
VL
-1
0
A
er AS
en
ic
e78
TN
C
(V
L
TC TN -10
(B C (A )
er
en AS
ic )
e78
)
B
B
VL
-1
0
A
er AS
en
ic
e78
TN
C
(V
L
TC TN -10
(B C (A )
er
en AS
ic )
e78
)
I
N
C
D2.0
VL
-1
0
A
B
er AS
en
ic
e78
TN
C
(V
L
TC TN -10
(B C (A )
er
en AS
ic )
e78
)
-200
0.0
Amplitude da onda S (mv)
100
270DI
VL
-1
0
A
B
er A S
en
ic
e78
TN
C
(V
L
TC TN -10
(B C (A )
er
en AS
ic )
e78
)
 
120DI
VL
-1
0
A
B
er AS
en
ic
e78
TN
C
(V
L
TC TN -10
(B C (A )
er
en AS
ic )
e78
)

4
VL
-1
0
A
B
er AS
en
ic
e78
TN
C
(V
L
TC TN -10
(B C (A )
er
en AS
ic )
e78
)

270DI
I

120DI
N

0.4
200
270DI
C
120DI
Amplitude da onda R (mv)
0.5
C
VL
-1
0
A
B
er A S
en
ic
e78
TN
C
(V
L
TC TN -10
(B C (A )
er
en AS
ic )
e78
)
B
Eixo QRS (graus)
Amplitude da onda P (mv)
A
Figura 9 - Medidas obtidas de traçado eletrocardiogáfico de cães infectados por 2.000 tripomastigotas/kg das cepas VL-10, AAS e Berenice-78 do T.cruzi. (A) amplitude da onda P; (B) eixo
QRS; (C) amplitude da onda R; (D) amplitude da onda S; (E) amplitude da onda Q e (F) duração do intervalo QT. Os exames foram realizados nos momentos antes (CNI), aos 120 dias (120DI) e
aos 270 dias após a infecção (270DI). CNI: Animais não infectados; TNC: Animais infectados pelo T.cruzi e não curados após tratamento e TC: tratados e curados após tratamento com
Benznidazol. (*) P<0,05 (diferença significativa em relação ao grupo controle não infectado-CNI)..........................................................................................................................................................
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