Impacto do tratamento com Benznidazol na evolução da doença de
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Impacto do tratamento com Benznidazol na evolução da doença de
UNIVERSIDADE FEDERAL DE OURO PRETO NÚCLEO DE PESQUISAS EM CIÊNCIAS BIOLÓGICAS PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS BIOLÓGICAS Impacto do tratamento com Benznidazol na evolução da doença de Chagas experimental - análise imunopatológica e funcional AUTOR: Ivo Santana Caldas .ORIENTADORA: Profa Maria Terezinha Bahia CO-ORIENTADOR: Prof. André Talvani Tese apresentada ao Programa de PósGraduação do Núcleo de Pesquisas em Ciências Biológicas da Universidade Federal de Ouro Preto, como parte integrante dos requisitos para obtenção do título de Doutor em Ciências Biológicas, área de concentração: Imunobiologia de protozoários. Ouro Preto Novembro de 2011 II Dedicatória Dedico às pessoas que fazem parte da minha vida, umas por me ajudarem no crescimento e pelo carinho, outras por me apresentarem projetos e outras ainda porque me desafiaram a desenvolvê-los. III Agradecimentos Aos meus pais, Angelo e Helena, pelo amor e exemplo e aos meus irmãos, Sérgio e Walace, pelo apoio e amizade. À Professora Maria Terezinha Bahia, pela orientação oferecida, paciência nos momentos difíceis e principalmente pela grande amizade. Ao professor André Talvani, pela coorientação, pelos conhecimentos passados, amizade, e bons momentos vividos. Aos professores Wanderson Geraldo de Lima e Rosália Morais Torres pelas colaborações referentes à histopatologia e análises eletrocardiográficas. Ao professor George Luís Lins Machado Coelho pela contribuição nas análises estatísticas e pela gentileza de estar sempre disposto a ajudar. À professora Marta de Lana e ao professor Evandro Machado pela boa convivência e colaborações. Aos pesquisadores Olindo e Andréa do centro de Pesquisas René Rachou/FIOCRUZ, pela colaboração referente aos experimentos de citometria. Às grandes amigas Lívia e Tassiane, que sempre estiveram presentes em minha vida! Ao Paulo Marcos da Matta Guedes, por ser um grande amigo e pelas colaborações realizadas. A todos os alunos do laboratório de Doença de Chagas, especialmente ao Álvaro, que esteve sempre presente na realização deste trabalho. À Ana e Ludmilla pelo auxílio e por serem tão prestativas. A todos os colegas do Curso de Pós-Graduação. Aos funcionários do Biotério e a todos que auxiliaram, direta ou indiretamente, na realização deste trabalho. IV Índice 1 - Introdução................................................................................................16 1.1 A doença de Chagas.....................................................................................16 1.2 Alterações induzidas pela cardiopatia chagásica .........................................17 1.3 Benznidazol - quimioterapia específica para a doença de Chagas...............19 1.4 O cão como modelo experimental da doença de Chagas..............................24 2 - Justificativa..............................................................................................26 3 - Objetivos..................................................................................................28 3.1 Objetivo Geral.............................................................................................28 3.2 Objetivos específicos...................................................................................28 4 - Animais, material e métodos...................................................................30 4.1 Cepas de Trypanosoma cruzi........................................................................30 4.2 Animais.........................................................................................................30 4.3 Fármaco e esquema de tratamento................................................................31 4.4 Polimorfismo das formas tripomastigotas do Trypanosoma cruzi................31 4.5 Inoculação dos animais e confirmação da infecção......................................31 4.6 Curva de parasitemia.....................................................................................32 4.7 Avaliação de cura parasitológica após tratamento com Bz...........................32 4.8 Eletrocardiografia para avaliação funcional do miocárdio...........................36 4.9 Teste “in vitro” proliferação e avaliação do índice apoptótico de CMSP....37 4.10 Necrópsia.................................................................................................... 41 4.11 Expressão de mRNA de citocinas através da PCR ....................................42 4.12 Análise estatística........................................................................................45 . 5 – Resultados...............................................................................................46 5.1 Polimorfismo das formas tripomastigotas sanguíneas...............................46 5.2 Curvas de parasitemia................................................................................46 5.3 Histopatologia do miocárdio dos cães infectados......................................50 5.4 Determinação da susceptibilidade ao Benznidazol das cepas VL-10, AAS e Berenice-78 do Trypanosoma cruzi......................................................52 5.5 Análise quantitativa da miocardite e da fibrose no miocárdio dos cães infectados e tratados com Bz, nas fases aguda e crônica da infecção.....53 5.6 Alterações cardíacas avaliadas pela Eletrocardiografia..............................56 5.7 Parâmetros imunológicos...........................................................................65 5.7.1. Cinética de Imunoglobulina G (IgG) e isotipos (IgG1 e IgG2), nos soros de cães inoculados com as cepas do T.cruzi.......................65 5.7.2 Influência da quimioterapia específica com Bz na produção de anticorpos no soro de cães infectados pelo T. cruzi............................69 5.7.3 Avaliação da proliferação de células mononucleares do sangue periférico.............................................................................................72 5.7.4 Avaliação da proporção de linfócitos TCD4+ e TCD8+ nas CMSP..................................................................................................74 5.7.5 Avaliação da apoptose de CMSP................................................76 . V Índice 5.7.6 Quantificação dos níveis das citocinas IFN-γ, IL-10 e TNF-α no sobrenadante das culturas de células mononucleares do sangue periférico dos cães infectados pelo T.cruzi..............................78 5.7.7 Quantificação da expressão de mRNA das citocinas IFN-γ, IL10 e TNF-α no átrio direito dos cães infectados pelo T. cruzi.84 6 - Discussão.................................................................................................93 7 - Conclusões.............................................................................................112 8 - Referências bibliográficas......................................................................114 9 - Apêndice................................................................................................135 VI Índice de Figuras Figura 1 - Passos realizados para a análise dos dados por citometria de fluxo. A) e C) Distribuição pontual de tamanho (FSC) versus granulosidade celular (SSC) demonstrando a população de linfócitos contida na região R; B) Distribuição pontual de FL1/CFSE versus FL4/Anti-CD4:Alexa Fluor® 647 e D) Distribuição pontual de FL1:Anexina V versus FL4:Anti-CD4:Alexa Fluor® 647................................................40 Figura 2 - Miocardite observada nos cães inoculados com 2000 tripomastigotas sangüíneos/kg de peso corporal das cepas VL-10, AAS e Berenice-78 do Trypanosoma cruzi eutanasiados aos 90 (A) e 270 dias de infecção (B).................................................50 Figura 3 - Fibrose observada nos cães inoculados com 2000 tripomastigotas sangüíneos/kg de peso corporal das cepas VL-10, AAS e Berenice-78 do Trypanosoma cruzi sacrificados aos 90 (A) e 270dias de infecção (B). Imagens obtidas de lâminas com cortes de átrio direito coradas pelo Tricrômico de Masson...............................................51 Figura 4 - Miocardite observada nos cães inoculados com 2000 tripomastigotas sangüíneos/kg de peso corporal das cepas VL-10, AAS e Berenice-78 do Trypanosoma cruzi sacrificados aos 90 (A) e 270 dias de infecção (B). Imagens obtidas de lâminas com cortes de átrio direito coradas pela hematoxilina e eosina................................................54 Figura 5 - Fibrose observada nos cães inoculados com 2000 tripomastigotas sangüíneos/kg de peso corporal das cepas VL-10, AAS e Berenice-78 do Trypanosoma cruzi sacrificados aos 90 (A) e 270 dias de infecção (B). Imagens obtidas de lâminas com cortes de átrio direito coradas pelo Tricrômico de Masson...............................................55 Figura 6 - Medidas de duração da onda P apresentadas por cães infectados por 2.000 tripomastigotas/kg das cepas VL-10 (A), AAS (B) e Berenice-78 (C) do T.cruzi. Os exames foram realizados nos momentos antes (CNI), aos 120 dias (120DI) e aos 270 dias após a infecção (270DI). (D) Correlação entre duração da onda P e fibrose observada no átrio direito de todos os cães incluídos no estudo.............................................................57 Figura 7 - Medidas de duração do intervalo PR apresentadas por cães infectados por 2.000 tripomastigotas/kg das cepas VL-10 (A), AAS (B) e Berenice-78 (C) do T.cruzi. (D) Correlação entre duração do intervalo PR e fibrose observada no átrio direito de todos os cães incluídos no estudo......................................................................................59 Figura 8 - Medidas de duração do complexo QRS apresentadas por cães infectados por 2.000 tripomastigotas/kg das cepas VL-10 (A), AAS (B) e Berenice-78 (C) do T.cruzi. Os exames foram realizados nos momentos antes (CNI), aos 120 dias (120DI) e aos 270 VII Índice de Figuras dias após a infecção (270DI). (D) Correlação entre duração do QRS e fibrose observada no átrio direito de todos os cães incluídos no estudo........................................................60 Figura 9 - Traçados eletrocardiográficos de cães infectados por 2.000 tripomastigotas/kg das cepas VL-10, AAS ou Berenice-78 do T.cruzi. (A) Aumento do intervalo PR (B) Contrações ventriculares prematuras (C) Bloqueio sinoatrial (D) arritmia atrial (E) Síndrome Bradi-taqui e (F) bloqueio completo do ramo direito do feixe de Hiss....................................................................................................................................64 Figura 10 - Índices de reatividade de anticorpos da classe IgG, IgG1 e IgG2 determinados através de ELISA nos soros de cães inoculados com 2000 tripomastigotas sanguíneos das cepas VL-10, AAS e Berenice-78 do Trypanosoma cruzi. A) Imunoglobulinas da classe IgG, B) IgG1 e C) IgG2, sendo AI: antes da infecção, DI: dias de infecção; CNI grupo controle não infectado. ...............................................................66 Figura 11 - Correlação entre miocardite e fibrose com os índices de reatividade de anticorpos da classe IgG (A), IgG1 (B) e IgG2 (C) determinados através de ELISA nos soros de cães inoculados com 2000 tripomastigotas sanguíneos das cepas VL-10, AAS e Berenice-78 do Trypanosoma cruzi e que foram eutasiados aos 270 dias de infecção..............................................................................................................................68 Figura 12 - Índices de reatividade de anticorpos da classe IgG, IgG1 e IgG2 determinados através de ELISA nos soros de cães inoculados com 2000 tripomastigotas sanguíneos das cepas VL-10, AAS e Berenice-78 do Trypanosoma cruzi e tratados ou não com o Benznidazol. A) Imunoglobulinas da classe IgG, B) IgG1 e C) IgG2............70 Figura 13 - Correlação entre miocardite e fibrose com os índices de reatividade de anticorpos da classe IgG (A), IgG1 (B) e IgG2 (C) determinados através de ELISA nos soros de cães inoculados com 2000 tripomastigotas sanguíneos das cepas VL-10, AAS e Berenice-78 do Trypanosoma cruzi e que foram tratados ou não com Bz, eutasiados aos 270 dias de infecção..........................................................................................................71 Figura 14 - Análise representativa de proliferação de linfócitos do sangue periféricos de cães infectados pelo Trypanosoma cruzi por meio de incorporação de CFSE, utilizando citometria e software FlowJo. A) Células não marcadas B) Células marcadas com CFSE VIII Índice de Figuras C) Células marcadas com CFSE e estimuladas com antígenos de Trypanosoma cruzi e D) Células marcadas com CFSE e estimuladas com Concanavalina A.................................72 Figura 15 - Análise representativa de avaliação da proporção de linfócitos TCD4+ e TCD8+ obtidas do sangue periféricos de cães infectados pelo Trypanosoma cruzi e marcadas pelo CFSE, utilizando citometria e software FlowJo. Linfócitos marcados por anticorpos anti-CD4+ (A) e anti-CD8+ (B).......................................................................74 Figura 16 - Razão entre a freqüência de linfócitos T CD4+ e T CD8+ encontrada em cultura de células mononucleares do sangue periférico obtidas de cães infectados pelo Trypanosoma cruzi aos 45 (A) e 90 dias de infecção (B).................................................75 Figura 17 - Análise representativa de avaliação da apoptose de linfócitos TCD4+ e TCD8+ obtidos de cultura de células mononucleares do sangue periférico de cães infectados pelo Trypanosoma cruzi, utilizando citometria e software FlowJo. Linfócitos marcados por anticorpos anti-CD4+ (A) e anti-CD8+ (B).................................................76 Figura 18 - Quantificação de IFN-γ, através de ELISA, no sobrenadante de células mononucleares do sangue periférico de cães infectados com 2000 tripomastigotas sangüíneos/kg de peso corporal das cepas VL-10 (A), AAS (B) e Berenice-78 (C) do Trypanosoma cruzi submetidos ao tratamento com Bz.....................................................80 Figura 19 - Quantificação de IL-10, através de ELISA, no sobrenadante de células mononucleares do sangue periférico de cães infectados com 2000 tripomastigotas sangüíneos/kg de peso corporal das cepas VL-10 (A), AAS (B) e Berenice-78 (C) do Trypanosoma cruzi submetidos ao tratamento com Bz.....................................................82 Figura 20 - Quantificação de TNF-α, através de ELISA, no sobrenadante de células mononucleares do sangue periférico de cães infectados com 2000 tripomastigotas sangüíneos/kg de peso corporal das cepas VL-10 (A), AAS (B) e Berenice-78 (C) do Trypanosoma cruzi submetidos ao tratamento com Bz.....................................................84 Figura 21 - Curvas padrão gerada com 7 diluições seriadas de uma mesma amostra de cDNA para verificação das eficiências dos primers para IFN-γ (A), IL-10 (B), TNF-α(C) e β-actina(D)......................................................................................................................85 Figura 22 - Ciclos de amplificação gerados com diluições seriadas de uma mesma amostra de cDNA para verificação das eficiências dos primers para IFN-γ (A), IL-10 (B), TNF-α(C) e β-actina(D).....................................................................................................86 IX Índice de Figuras Figura 23 - Curva de dissociação do cDNA amplificado dos mRNA para as citocinas IFN-γ, IL-10, TNF-α e do controle endógeno β-actina, com picos em torno de 71oC, 75oC, 84oC e 74oC, respectivamente.................................................................................87 Figura 24 - Níveis de expressão de IFN-γ no átrio direito de cães infectados pelas cepas VL-10, AAS e Berenice-78 do Trypanosoma cruzi, necropsisados aos 90 dias (A) e 270 dias de infecção (B)...........................................................................................................88 Figura 25 - Níveis de expressão de IL-10 no átrio direito de cães infectados pelas cepas VL-10, AAS e Berenice-78 do Trypanosoma cruzi, necropsisados aos 90 dias (A) e 270 dias de infecção (B)...........................................................................................................90 Figura 26 - Níveis de expressão de TNF-α no átrio direito de cães infectados pelas cepas VL-10, AAS e Berenice-78 do Trypanosoma cruzi, necropsisados aos 90 dias (A) e 270 dias de infecção (B)...........................................................................................................91 X Índice de Tabelas Tabela 1 - Alvo e iniciadores utilizados. As sequências foram determinadas com base na sequência de nucleotídeos obtidas GenBank Database.....................................................44 Tabela 2 - Análise estatística descritiva dos valores estáveis da curva de coeficiente de variação..............................................................................................................................49 Tabela 3 - Padrão de inflamação, fibrose e efeito do tratamento observado nos cães infectados pelas cepas VL-10, AAS e Berenice-78 do Trypanosoma cruzi aos 90 dias de infecção..............................................................................................................................56 Tabela 4 - Padrão de inflamação e fibrose observado nos cães infectados pelas cepas VL10, AAS e Berenice-78 do Trypanosoma cruzi aos 270 dias de infecção.........................56 Tabela 5 - Alterações eletrocardiográficas apresentadas por cães infectados por 2.000 tripomastigotas/kg das cepas VL-10, AAS e Berenice-78 do T.cruzi e entre os cães infectados e tratados com Bz que apresentaram ou não redução de fibrose ....................62 XI Índice de Gráficos Gráfico 1 - Polimorfismo das formas tripomastigotas sanguíneas observadas durante os picos de parasitemia em camundongos Swiss inoculados com 5000 tripomastigotas sanguíneos das cepas Berenice-78, Y, AAS e VL-10 do Trypanosoma cruzi..................46 Gráfico 2 - Curvas de parasitemia obtidas de cães inoculados com 2000 tripomastigotas sanguineos/kg de peso corporal das cepas VL-10, AAS e Berenice-78 do Trypanosoma cruzi...................................................................................................................................47 Gráfico 3 - Resultado da análise para determinação do número mínimo de campos representativos para quantificação da: A) Inflamação B) Fibrose; avaliada em preparações de lâminas coradas pela Hematoxilina & Eosina e Tricrômico de Masson. CV: coeficiente de variação...............................................................................................48 Gráfico 4 - Percentagem de testes sorológicos e parasitológico e/ou molecular – hemocultura e PCR – positivos realizados no sangue de cães inoculados com 2000 tripomastigotas sangüíneas/kg de peso corporal das cepas VL-10, AAS e Berenice-78 do Trypanosoma cruzi após o tratamento com 7mg de Bz/Kg por 60 dias............................52 Gráfico 5 - Alterações eletrocardiográficas apresentadas por cães infectados por 2.000 tripomastigotas/kg das cepas VL-10, AAS e Berenice-78 do T.cruzi. Os exames foram realizados nos momentos antes (AI), aos 120 dias (120DI) e aos 270 dias após a infecção (270DI)..............................................................................................................................65 Gráfico 6 - Reatividade das células mononucleares do sangue periférico obtidas de cães experimentalmente infectados com 2000 tripomastigotas sangüíneos/kg de peso corporal das cepas VL-10, AAS e Berenice-78 do Trypanosoma cruzi após estimulação in vitro. Os resultados foram expressos como índice de estimulação.............................................73 Gráfico 7 - Análise da apoptose de linfócitos T CD4+ presentes em células mononucleares do sangue periférico mantidas em cultura por 48 horas e estimulados com antígeno de Trypanosoma cruzi, obtidas dos grupos não infectado (CNI) e infectado (CI) com 2000 tripomastigotas sangüíneos/kg de peso corporal das cepas VL-10, AAS e Berenice-78 do Trypanosoma cruzi...................................................................................77 Gráfico 8 - Análise da apoptose de linfócitos T CD8+ presentes em células mononucleares do sangue periférico mantidas em cultura por 48 horas e estimulados com antígeno de Trypanosoma cruzi, obtidas dos grupos não infectado (CNI) e infectado (CI) XII Índice de Gráficos com 2000 tripomastigotas sangüíneos/kg de peso corporal das cepas VL-10, AAS e Berenice-78 do Trypanosoma cruzi...................................................................................78 Gráfico 9 - Quantificação de IFN-γ, através de ELISA, no sobrenadante de células mononucleares do sangue periférico de cães infectados com 2000 tripomastigotas sangüíneos/kg de peso corporal das cepas VL-10, AAS e Berenice-78 do Trypanosoma cruzi nos momentos antes (AI) 45 e 80 dias de infecção (DI)..........................................79 Gráfico 10 - Quantificação de IL-10, através de ELISA, no sobrenadante de células mononucleares do sangue periférico de cães infectados com 2000 tripomastigotas sangüíneos/kg de peso corporal das cepas VL-10, AAS e Berenice-78 do Trypanosoma cruzi nos momentos antes (AI) 45 e 80 dias de infecção (DI)..........................................81 Gráfico 11 - Quantificação de TNF-α, através de ELISA, no sobrenadante de células mononucleares do sangue periférico de cães infectados com 2000 tripomastigotas sangüíneos/kg de peso corporal das cepas VL-10, AAS e Berenice-78 do Trypanosoma cruzi nos momentos antes (AI) 45 e 80 dias de infecção (DI)..........................................83 XIII Resumo Considerando as controvérsias sobre a eficácia do tratamento específico com Benznidazol (Bz) na prevenção ou redução das lesões cardíacas crônicas, este projeto propôs avaliar a influência do tratamento específico na evolução da cardiopatia chagásica, utilizando como modelo experimental cães infectados por cepas do Trypanosoma cruzi sensíveis e resistentes ao Bz. As avaliações imunopatológicas e clínicas foram realizadas utilizando: (i) a avaliação da área ocupada pela inflamação e pela fibrose no músculo cardíaco (ii) avaliação dos níveis de expressão mRNA para citocinas no tecido cardíaco; (iii) avaliação da resposta proliferativa e morte por apoptose de células mononucleares do sangue periférico (CMSP) e quantificação da produção de citocinas no sobrenadante das CMSP dos animais ao longo da infecção; (iv) avaliação das possíveis interferências do tratamento com Bz sobre a evolução clínica da cardiopatia experimental, através da detecção das alterações eletrocardiográficas, em cães chagásicos tratados e não tratados. Nossos resultados mostraram que o tratamento específico induziu 100% de cura nos animais infectados pela cepa Berenice-78, e que não houve cura parasitológica entre os infectados pelas cepas VL-10 e AAS. O tratamento específico, de maneira geral, preveniu as lesões cardíacas dos animais curados, bem como as alterações eletrocardiográficas. De forma interessante, entre os animais não curados foi observado um padrão de resposta variável de acordo com a população do T. cruzi. Nos animais infectados pela cepa AAS foi detectada redução significativa do processo inflamatório e da fibrose no tecido cardíaco acompanhado de ausência de alterações eletrocardiográficas. De forma diferente, entre os animais infectados pela cepa VL-10, o tratamento não foi eficaz em reduzir tanto as lesões cardíacas quanto as alterações eletrocardiográficas. Os parâmetros imunológicos avaliados durante as fases aguda e crônica da infecção foram marcadamente influenciados tanto pela cepa do parasito quanto pelo tratamento específico. Foi possível correlacionar a intensidade das lesões cardíacas e a produção de imunoglobulinas (IgG, IgG1, IgG2) no soro e de citocinas (TNF-, IFN- e IL-10) no sobrenadante de CMSP, além da expressão de mRNA dessas citocinas no tecido cardíaco dos animais submetidos ou não à quimioterapia com o Bz. De forma geral, nossos resultados contribuirão para uma melhor compreensão do benefício do tratamento específico na evolução clínica e nos mecanismos imunopatológicos envolvidos na doença de Chagas. XIV Abstract Based on the divergences concerning the efficacy of anti-Trypanosoma cruzi treatment with Benznidazol (Bz) in the prevention and reduction of cardiac chronic lesions, the aim of this study was evaluate the influence of Bz in the evolvement of the Chagas cardiopathy using dog models infected with Bz-resistent and – susceptible strains of parasites. Clinical and immunopathology parameters were performed through evaluation of the: (i) inflammation and fibrosis area in cardiac muscle; (ii) mRNA expression of cytokines in cardiac tissue; (iii) proliferative response, apoptosis and quantification of cytokines in peripheral blood mononuclear cells (PBMC) and their supernatant, respectively; and (iv) interferences of Bz on the clinical evolving thought electrocardiography (ECG) alterations in infected dogs treated or not with Bz. Our data showed that Bz-treatment induced 100% of cure in animals infected with Berenice-78 strain and absence of cure in those infected with VL-10 and AAS strains of parasite. In the presence of cure, there were prevention of cardiac lesions and ECG alterations and, among not cured animals, it was observed a variable pattern of immunopathology and clinical aspects according to the T. cruzi genetic population. Interestingly, AAS strain was associated with reduction of inflammatory infiltration and fibrosis in heart tissue as well as absence of ECG alterations while VL-10 strain was not able to ameliorate these parameters. Immune aspects evaluated during acute and chronic phases were influenced by parasite strains and by Bz-treatment. Following this, intensity of cardiac lesions was correlated with high serum production of immunoglobulins (IgG, IgG1, IgG2) and with the release and expression of cytokines (TNF-, IFN- e IL-10) in CMSP supernatant and cardiac tissue, respectively, in those animals submitted or not to Bz-treatment. In summary, our data will contribute to define the benefits of Bz-treatment to the clinical evolving as well as to comprehend the immunopahtological mechanisms associated with Chagas disease. XV Introdução 1 - Introdução 1.1 A doença de Chagas A doença de Chagas é um dos principais problemas médico-sociais brasileiros, acometendo milhões de pessoas no país. No mundo são aproximadamente 10 milhões de pessoas infectadas pelo Trypanosoma cruzi com pelo menos 25 milhões de indivíduos sob risco de infecção (WHO, 2010). A moléstia de Chagas é uma doença crônica, incapacitante e debilitante, com grande impacto sócio-econômico e cultural. Dentre as principais sintomatologias clínicas que acometem 20-30% dos indivíduos infectados pelo parasito, destacam-se alterações na motilidade esofágica e intestinal e alterações eletrofuncionais cardíacas, sendo o comprometimento cardíaco a causa morte primária associada à doença (Prata 2001). Costuma-se dividir a história natural da cardiopatia chagásica nas formas de miocardite aguda e crônica, intercalada pela longa e enigmática forma indeterminada. Excluíndo os casos inesperados de morte súbita (Prata et al., 1986), os demais casos relatados sucedem uma forma de acometimento cardiovascular típico da doença, a cardiopatia chagásica crônica (CCC), que apresenta como característica principal um caráter progressivo e fibrosante. O que se compreende como caráter progressivo está, muitas vezes, ligado à série crescente de eventos inflamatórios envolvendo o órgão cardíaco infectado pelo T. cruzi. Observa-se, neste processo inflamatório, uma destruição direta dos cardiomiócitos gerando no indivíduo chagásico quadros clínicos de comprometimento do ritmo e da condução (síncopes e palpitações) ou da contratilidade miocárdica (dispnéia, cansaço e edema). A compreensão dos principais mecanismos de destruição destes cardiomiócitos propiciaria estratégias farmacológicas que atuariam no remodelamento cardíaco ainda na fase aguda da doença (Andrade et al., 1997). O diagnóstico precoce dos eventos associados à CCC conduz o paciente chagásico ao tratamento dos sintomas e aqueles cujos exames clínicos sugerem elevada probabilidade de falência cardíaca são, geralmente, conduzidos à aposentadoria por invalidez. O afastamento das atividades esforço-dependentes, ao lado de um suporte terapêutico específico, eleva as chances de sobrevida dos indivíduos portadores da CCC (Rocha et al., 2007). 16 Introdução Infelizmente, ainda pouco se sabe sobre estes fatores que predispõem a gravidade da CCC, bem como aqueles que propiciam o caráter evolutivo da doença. Alguns fatores parecem exercer importância no desenvolvimento progressivo da doença de Chagas, como por exemplo, a cronologia da doença, a exposição às reinfecções, o padrão da resposta imune do hospedeiro, os eventos apoptóticos e a variabilidade genética do hospedeiro e do parasito (Dvorak, 1984; Andrade et al., 1990; Andrade et al.,1992; Manuel-Caetano et al., 2007; Rocha et al., 2007). 1.2 Alterações induzidas pela cardiopatia imunopatogênese na doença de Chagas chagásica - Fatores gerados em resposta ao parasito possuem importância na patogênese provocada pelo T.cruzi. A resposta imune é fundamental para redução do parasitismo, todavia pode contribuir para geração das manifestações crônicas observadas em parte dos indivíduos chagásicos. O tecido cardíaco é o principal alvo de infecção e inflamação em ambas as fases da doença de Chagas e a integridade e o destino das células do hospedeiro contribuem diretamente para determinar o curso desta infecção. O perfil celular, bem como de citocinas, durante a fase aguda da doença de Chagas parece ser capaz de determinar um padrão de resposta inflamatória durante a fase crônica (Guedes et al., 2009). Citocinas apresentando um perfil inflamatório contribuem para a síntese de inúmeras quimiocinas e seus respectivos receptores, além dos intermediários de oxigênio, contribuindo para aumento do recrutamento celular durante o processo inflamatório e suprimem o parasitismo, respectivamente. Ao contrário, citocinas com perfil regulatório promovem redução na síntese de óxido nítrico por macrófagos e aumentam sua susceptibilidade aos parasitos intracelulares (Gutierrez et al., 2009). Durante a fase crônica da infecção os infiltrados inflamatórios são compostos principalmente por macrófagos e linfócitos, embora ocasionalmente neutrófilos e eosinófilos sejam também detectados (Reis et al.,1993; Higuchi et al.,1997; dos Santos et al., 2001). Entre os linfócitos, os citotóxicos (TCD8+) podem se tornar tão prevalentes quanto os auxiliares (TCD4+) nos focos inflamatórios de indivíduos com cardiopatia chagásica crônica (Reis et al.,1993; Higuchi et al.,1997). Entretanto, os fatores que interferem nesse balanço entre linfócitos TCD8+ e TCD4+, assim como a função dessas 17 Introdução células inflamatórias no controle do parasitismo e na gênese da cardiopatia ainda são pouco conhecidos (Lannes-Vieira et al., 2009). É sabido que o T. cruzi, de forma similar a outros patógenos é capaz de evadir-se à resposta imune através da simples modulação dos eventos apoptóticos nas células hospedeiras (Heussler et al., 2001). O parasito redireciona a resposta apoptótica em células imunes (células B, T e macrófagos) contribuindo desta forma para a perda de células T CD4+ e depleção de timócitos, controle da resposta inflamatória e do recrutamento celular no sítio da lesão devido à produção de fatores de crescimento pelas células fagocíticas que internaliza células do hospedeiro em apoptose e/ou parasitos em apoptose. Outro mecanismo de escape do parasito estaria na prevenção de apoptose do cardiomiócito parasitado durante seu estágio de proliferação intracelular até sua liberação para o meio extracelular, sem afetar sua sobrevivência e, assim, perpetuando a infecção (Luder et al., 2001). Apesar de intensivamente estudada, a patogênese da doença de Chagas continua não muito bem esclarecida, os mecanismos imunopatológicos que promovem as lesões nos tecidos não estão ainda bem elucidados. A dificuldade em detectar-se o parasito no miocárdio levou a postulação de teorias auto-imunes para explicar o desenvolvimento das lesões inflamatórias miocárdicas durante a fase crônica da doença. Estas lesões poderiam ser resultado de uma reação de auto-imunidade causada por auto-anticorpos ou por linfócitos T auto-reativos derivados de mimetismo molecular de antígenos do parasito e do hospedeiro, ou ainda por ativação bystander não envolvendo antígenos do T. cruzi sendo induzido por antígenos provenientes de lesões teciduais (Leon et. al., 2001; Kierszenbaum, 1999; Cossio et. al., 1974; Anselmi et al., 1966). Recentemente foi demonstrada a reatividade contra auto-antígeno Cha (proteína presente em mamíferos) em humanos e camundongos infectados com o T. cruzi (Girones et al., 2001). Entretanto, trabalhos mais recentes apontam para uma participação ativa do parasito na patogênese da cardiopatia chagásica crônica (Higuchi, 1995; Higuchi et al., 1993; Barbosa et al, 1986). Uma associação entre a inflamação e a presença de T. cruzi no tecido cardíaco, assim como sua ausência em locais sem inflamação, foi descrita por Belloti et al. 1996 e Higuchi et al.1995 utilizando a técnica de imunoperoxidase. A presença de DNA nuclear do parasito também foi detectada em tecidos cardíacos de pacientes com lesões inflamatórias severas através da reação em cadeia da polimerase 18 Introdução (PCR) e hibridização com sondas internas específicas. Porém, não sendo detectadas seqüências de DNA do T. cruzi em tecido cardíaco de pacientes assintomáticos ou soronegativos (Jones et al., 1993). Resultados concordantes foram obtidos por LagesSilva et al. (2001) e Vago et al. (1996) utilizando amplificação de seqüências do DNA do cinetoplasto (kDNA) do T. cruzi em tecidos do esôfago de pacientes com megaesôfago, sendo observada uma relação direta entre a inflamação tecidual e a presença do parasito. A presença do parasito parece ser importante para desencadear o processo de formação da miocardite chagásica crônica. Na maioria dos casos não é possível fazer correlação entre a intensidade da lesão e a quantidade de antígeno e/ou DNA do parasito presente, sugerindo que o parasito (envolvendo características genéticas inerentes à sua cepa) é responsável por disparar e manter o processo de patogênese no miocárdio, e que este seria amplificado por mecanismos auto-imunes que dependeriam da predisposição genética do hospedeiro (Girones & Fresno, 2003; Ãnez et al. 1999; Belloti et al., 1996; Higuchi, 1995; Rowland et al, 1995; Jones et al., 1993). 1.3 Benznidazol - quimioterapia específica para a doença de Chagas O Benznidazol (Bz) (N-benzil-2-nitro-imidazol-1-acetamida) (Radanil®, Rochagan®, Roche) foi descoberto empiricamente no início dos anos 70 após a partir de 1960 terem demonstrado que a nitrofurazona administrada em esquemas de longa duração curava grande parte de camundongos infectados pelo T.cruzi. Adicionalmente, quando este composto foi testado em pacientes, apesar de parte deles terem o parasito encontrado pela técnica de xenodiagnóstico, os resultados foram considerados satisfatórios (Cançado, et al, 1964). O Bz surge, assim, como uma nova perspectiva para o tratamento da doença de Chagas, apresentando alto índice de cura na fase aguda e com razoável tolerabilidade pelos pacientes. O Bz atua via formação de radicais livres, onde o grupo nitro presente em sua molécula sofre redução por meio de enzimas do tipo nitroredutases, com consequente formação de radicais nitroaniônicos. Estes radicais são os responsáveis pela atividade anti-T. cruzi por formarem ligações covalentes com DNA, RNA e proteínas do parasito. (Díaz de Toranzo et al 1988, Docampo, 1990; revisado por Guedes et al., 2006). 19 Introdução Vários estudos têm demonstrado que o tratamento com o Bz apresenta pequena ou nenhuma atividade quando realizado na fase crônica da doença de Chagas, com índices de cura variando entre 0% a 19,1% (Viotti et al, 1994, Lauria-Pires et al, 2000, Cançado 2002). Entretanto, considerando o risco dos eventos deletérios cardíacos e da morte súbita durante a fase crônica, o tratamento com drogas tripanocidas pode ser importante na prevenção da progressão de alterações cardíacas severas. De acordo com Viotti et al., (1994, 2005) e Suasnábar et al., (2002) o tratamento de indivíduos chagásicos com Bz, durante a fase crônica, induz diminuição da progressão de alterações eletrocardiográficas e da cardiopatia, em relação aos individuos não tratados. De acordo com Andrade et al.,(2004) o tratamento efetivo, na fase crônica da doença, previniu a progressão das alterações cardíacas retratada através do eletrocardiograma realizado ao final do tratamento e durante o período de avaliação pós-tratamento. Além disto, os indivíduos tratados apresentam a negativação da sorologia ou mostram um decréscimo dos níveis de anticorpos mais frequentemente que os não tratados (Andrade et al., 2004). Entretanto, Lauria-Pires et al. (2000) mostraram que a infecção é persistente após o tratamento e que, alterações eletrocardiográficas progressivas são observadas tanto em indivíduos tratados como naqueles não tratados e, usando métodos moleculares, mostraram que os níveis de parasitemia não foram significantemente diferentes entre os chagásicos crônicos tratados e não tratados. De acordo com os autores estes achados e as progressivas alterações clínicas observadas em ambos os grupos de pacientes indicam que o tratamento de infecção crônica parece não induzir benefício (Lauria-Pires et al, 2000, Braga et al, 2000). Correntemente, ensaios clínicos realizados em diferentes países mostram evidências de sucesso na quimioterapia com Bz entre crianças e adolescentes (SosaEstani, 1998). Adicionalmente, foi demonstrado que o tratamento com Bz, apesar de distante do ideal, conduz a benefícios concretos quando realizados em fases recentes da doença. Ensaios clínicos realizados na Argentina e no Brasil mostraram índices de 62 a 87% de cura parasitológica em crianças tratadas com Bz (de Andrade et al, 1996, SosaEstani, 1998, 1999, Silveira et al, 2000, Straiger, 2004, de Andrade et al, 2004). Estes estudos demonstraram que a negativação da sorologia ocorreu de forma consistente e persistente, sugerindo a ausência do parasito nos indivíduos tratados e considerados curados (Andrade et al, 2004, Sosa-Estani, 1998, Straiger, 2004). De acordo com de 20 Introdução Andrade et al (1996) o tratamento efetivo, nesta fase da doença, pode prevenir a progressão da doença e suas complicações porque o eletrocardiograma realizado no final do tratamento e durante o período de avaliação pós-tratamento, mostrou 1 (1,7%) caso incidente de bloqueio completo do ramo direito do feixe de Hiss no grupo tratado com Bz, e 4 (6,9%) no grupo placebo. Entretanto, Silveira et al (2000) obtiveram apenas 8,35% de cura entre 12 crianças de 7 a 12 anos após o tratamento com Bz realizado durante a fase crônica indeterminada da doença de Chagas. Durante a avaliação clínica longitudinal (avaliação durante 8 a 20 anos) foi observada uma evolução clínica para as formas cardíacas ou digestivas da doença em 4 (33,3%) dos pacientes tratados (Silveira et al, 2000). Também os ensaios clínicos realizados durante a fase aguda da infecção mostram altos níveis de cura parasitológica, sendo observado índices variando entre 40% a 76% de cura parasitológica, definida pela negativação da sorologia e dos testes parasitológicos (Shikanai-Yasuda et al, 1990, Andrade et al, 1992, Bahia-Oliveira, 2000, Cançado, 2002). Assim o tratamento de pacientes chagásicos em ambas as fases da doença com o Bz têm fornecido resultados distintos, principalmente quando ensaios terapêuticos realizados em diferentes áreas geográficas são comparados. Yun et al., (2009) mostraram que o tratamento com Bz realizado em programas com crianças e jovens (menores de 18 anos) provenientes de duas regiões da Bolívia, uma de Honduras e uma da Guatemala apresentaram diferentes resultados. Após 18 meses, foi observada soroconversão negativa em 87,1%, 58,1% e em nenhum dos pacientes de Honduras, Guatemala e na região de Sucre na Bolívia, respectivamente. Na região de Entre Rios na Bolívia, após 60 meses, foi observada sorologia negativa em apenas 5,4% dos pacientes. Um dos fatores que contribui para os diferentes resultados obtidos com o tratamento da doença humana seria o tipo de cepa do parasito predominante em algumas áreas geográficas (Andrade et al., 1992). Foi sugerido que a resistência natural do T cruzi aos nitroderivados seria a explicação para os baixos índices de cura detectados em pacientes chagásicos tratados, pois foram descritas diferenças na susceptibilidade de cepas do parasito a estes quimioterápicos (Brener et al., 1976; Filardi and Brener, 1987). Mais recentemente, nosso grupo mostrou relação entre a divergência filogenética entre populações do T. cruzi e a sua susceptibilidade a agentes 21 Introdução quimioterápicos in vivo (Toledo et al., 2003 and 2004). Vinte clones representativos da diversidade filogenética total do T. cruzi, incluindo os genótipos 19 e 20 (T. cruzi I) e os genótipos 32 39 (T. cruzi II) (Miles et al., 1980, Tibayrenc & Ayala, 1988; Anonymous, 1999) foram analisados. Os resultados demonstraram diferenças importantes entre estoques de T. cruzi que poderiam ser utilizadas como marcadores de comportamento biológico. Membros do grupo T. cruzi I foram altamente resistentes, enquanto membros do grupo T. cruzi II foram susceptíveis ou parcialmente resistentes ao Bz. Camandaroba et al.(2003) determinaram a susceptibilidade ao Bz de sete clones isolados da cepa Colombiana, altamente resistente ao Bz, e previamente classificada como Biodema ou tipo III (Andrade & Magalhães, 1997), e T. cruzi I (Anonymous, 1999). Os resultados demonstraram uma alta resistência dos clones, sugerindo uma predominância de clones altamente resistentes nesta cepa. De acordo com os autores estes resultados indicam que aparentemente a possibilidade de cura é mínima para pacientes infectados com este Biodema. A resposta à quimioterapia com Bz foi também investigada por Campos et al., (2005) para quatro clones isolados da cepa do T. cruzi 21SF (Biodema Tipo I, T. cruzi II). A variação de 30% a 100% na taxa de cura de populações clonadas de cepas pertencentes ao grupo T. cruzi II sugerem que esta seja uma das explicações para a alta variação da resposta à quimioterapia da doença de Chagas com Bz por cepas desta linhagem genética. As falhas no tratamento de pacientes infectados com cepas do grupo T. cruzi I podem ser devido à resistência de cepas deste tipo genético a drogas anti-chagásicas (Camandaroba et al., 2003). Concordância entre resultados obtidos em pacientes e camundongos infectados com a mesma cepa já foram descritos (Andrade et al., 1992; Filardi & Brener, 1987). Também, o T. cruzi I (Cepa Colombiana), que é totalmente resistente ao Bz no modelo murino (Camandaroba et al., 2003), também foi altamente resistente em cães (Guedes et al., 2002). Além disso, os resultados controversos em relação ao benefício do tratamento na prevenção da progressão das lesões cardíacas podem estar relacionados, pelo menos parcialmente, com o nível de resistência das populações do T. cruzi presentes. Neste contexto é importante a realização de estudos experimentais que permitam a avaliação longitudinal sobre o benefício do tratamento específico da doença de Chagas na evolução das lesões cardíacas em animais infectados 22 Introdução com cepas que apresentem diferentes níveis de resistência ao Bz, a exemplo do que provavelmente ocorre nas diversas regiões endêmicas. De forma semelhante são poucos os estudos sobre as alterações induzidas pelo tratamento específico, bem sucedido ou não, na resposta imune celular. A análise da proliferação de células mononucleares do sangue periférico (CMSP) de pacientes chagásicos crônicos, submetidos à quimioterapia específica, demonstrou que após cinco anos as respostas médias de proliferação dos pacientes parasitologicamente curados foram similares à de indivíduos não infectados. Pacientes submetidos ao tratamento e não curados apresentaram altos índices de proliferação celular. Logo, sugere-se uma relação entre a cura parasitológica e a normalização da reatividade celular frente a antígenos do T. cruzi (Dutra et al., 1996). De modo concordante, foi demonstrada em um estudo realizado pelo nosso grupo a normalização da reatividade das células mononucleares do sangue periférico em cães submetidos ao tratamento com Bz após a cura parasitológica (Guedes et al. 2004). Também foi observado um nível intermediário de reatividade celular entre os animais tratados, mas não curados, assim como um perfil similar em relação aos níveis de anticorpos específicos determinados pelo imunoensaio ELISA. Neste contexto, apesar dos trabalhos focando resistência do parasito, resposta imune e mecanismo inflamatório cardíaco, pouco se sabe sobre os efeitos do tratamento com Bz na resposta inflamatória cardíaca na doença de Chagas. Interessantemente, estudo in vitro mostrou que o Bz pode interferir na produção de citocinas e de óxido nítrico por macrófagos, promovendo inibição da síntese de IL-6, IL-10 e inibindo também a expressão do gene da iNOS (Revelli et al., 1999). Portanto o tratamento com Bz supostamente pode influenciar o curso da infecção pelo T.cruzi, não somente pela destruição direta do parasito, poderia interferir também na resposta imune frente ao T.cruzi. 23 Introdução 1.4 O cão como modelo experimental da doença de Chagas Cães experimentalmente infectados por determinadas cepas do T.cruzi desenvolvem intensa miocardite com parasitismo acentuado de cardiomiócitos e lesões necróticas de células cardíacas não parasitadas durante a fase aguda (Andrade et al., 1997). Durante a fase aguda da infecção de cães podem ser observados, a partir de exame eletrocardiográfico, bloqueios intraventriculares e hemi-bloqueios de ramo esquerdo, em decorrência das lesões inflamatórias em áreas de condução nervosa. A participação do sistema imune na fase aguda da infecção pode ser avaliada pela observação de parasitos viáveis ou em apoptose, sugerindo mecanismo citotóxico e citolítico, mediado por células imunes efetoras (Andrade et al., 1997). Durante a fase crônica indeterminada do cão, assim como no homem, não são observados sintomas ou alterações eletrocardiográficas graves, entretanto infiltrados inflamatórios e áreas de fibrose podem ser observados no miocárdio em análise histopatológica, principalmente no átrio direito. Na forma indeterminada da doença de Chagas, ao contrário do observado na fase aguda, os linfócitos T apresentam a característica de não aderirem ao cardiomiócito, sugerindo que não estavam exercendo ação citotóxica ao hospedeiro, além disso, apresentam tendência a morte celular, indicando uma regulação da inflamação pelo processo de apoptose (Andrade et al, 1997). A utilização do modelo cão para estudos de quimioterapia experimental para as fases aguda e crônica da doença de Chagas foi recentemente descrita pelo nosso grupo (Guedes et al, 2002). Neste estudo cães infectados por cepas de T. cruzi sensíveis, parcialmente sensíveis e resistentes ao Bz foram tratados com este fármaco e o tratamento induziu índices de cura similares aos reportados em ensaios clínicos realizadas em ambas as fases, aguda e crônica, da doença de Chagas. O cão tem sido apontado como o modelo experimental ideal para quimioterapia da doença de Chagas por duas importantes razões: a primeira é o fato de que cães experimentalmente infectados pelo T. cruzi desenvolvem uma infecção com características similares à doença de Chagas humana, tanto na fase aguda, como na fase crônica da doença (Lana et al, 1992; Bahia et al, 2002). A segunda é que cães experimentalmente infectados e tratados com Bz apresentam uma resposta similar à observada em humanos em termos de efetividade e de índice de cura em ambas as fases da doença (Guedes et al, 2002). 24 Introdução Recentemente temos buscado relacionar o padrão de resposta imune com o desenvolvimento da patologia cardíaca observada em cães experimentalmente infectados, e reforçar que o cão é um bom modelo para o estudo dos mecanismos imunopatológicos da doença de Chagas, uma vez que reproduz os aspectos clínicos e imunológicos observados em pacientes chagásicos. Utilizando cães da raça Beagle foi mostrada relação direta entre presença de cardiomegalia e alta proliferação de células mononucleares do sangue periférico associada a baixos níveis de IgG 1 (Guedes et al 2008). Demonstrou-se a prevalência de uma resposta inflamatória durante a fase aguda nos animais que apresentaram forma cardíaca durante a fase crônica e que animais que permaneceram na forma indeterminada apresentam mistura de resposta Th1 e Th2, sugerindo que a resposta imune durante a fase aguda da infecção é importante para o estabelecimento das lesões cardíacas observadas durante a fase crônica (Guedes et al 2009). Mostramos também que a severidade da doença cardíaca possivelmente está correlacionada com aumento da expressão de quimiocinas que recrutam células pró-inflamatórias para o miocárdio, enquanto o desenvolvimento da forma indeterminada estaria relacionado ao aumento da expressão de quimiocinas com perfil inflamatório, antiinflamatório ou regulatório, contribuindo para recrutamento de células T regulatórias para o miocárdio durante as fases aguda e crônica da doença (Guedes et al 2010). Considerando estes antecedentes, o presente trabalho avaliou a eficácia do tratamento específico com Bz sobre a resposta imune celular em cães infectados por cepas do T.cruzi com diferentes níveis de resistência ao Bz, selecionadas por terem sido isoladas de casos humanos na região sudeste do Brasil e por induzirem diferentes padrões de lesões cardíacas, com o objetivo de identificar marcadores que possam auxiliar na melhor definição sobre a eficácia do tratamento específico na progressão da doença de Chagas. 25 Justificativa 2 - Justificativa Durante a infecção pelo T. cruzi ocorre uma dinâmica interação parasitohospedeiro envolvendo múltiplos fatores que atuam na patogênese da doença de Chagas, alguns inerentes ao parasito, tais como carga parasitária e genética do parasito influenciando o tropismo, a virulência e a patogenicidade para o hospedeiro. Devem ser considerados, também, aqueles relacionados ao hospedeiro, como idade, sexo e a constituição genética, que irão determinar a formação e a atuação do sistema imunológico. Entretanto, apesar de intensamente estudada, a patogênese da doença de Chagas ainda não é completamente entendida, os mecanismos imunopatológicos que promovem as lesões nos tecidos não estão ainda bem elucidados. Trabalhos mais recentes vêm apontando no sentido de que o parasito tenha participação ativa na patogênese da cardiopatia chagásica crônica. Considerando os estudos que apontam à importância da presença do parasito na progressão da doença de Chagas crônica e os resultados controversos sobre o benefício do tratamento especifico com Bz na evolução da cardiopatia chagásica crônica, é de grande importância a realização de estudos experimentais para a avaliação do efeito do tratamento com Bz na resposta imune e na progressão das alterações cardíacas de animais inoculados com cepas do parasito resistentes a este fármaco. Neste trabalho foi investigado as conseqüências da utilização do Bz nos casos de falha terapêutica, nos casos de cura parasitológica, assim como a sua influência sobre o sistema imune de um hospedeiro, devido aos estudos controversos realizados em humanos sobre o benefício do tratamento. Neste trabalho foi acompanhada a progressão das alterações eletrocardiográficas causadas pelo T. cruzi, desde a infecção até a instalação da fase crônica da doença, em cães tratados com Bz, comparativamente aos animais infectados e não tratados. Elegemos o cão como modelo experimental por reproduzir a doença de Chagas em sua fase aguda e, especificamente, em sua fase crônica, o mais próximo do padrão observado na doença de Chagas humana. Este modelo experimental reproduz a fase aguda com parasitemia patente, bem como as alterações do miocárdio que ocorrem nesta 26 Justificativa fase. Reproduz também as formas crônica indeterminada e cardíaca da doença. Os trabalhos do nosso grupo no modelo canino para doença de Chagas têm mostrado que estes animais desenvolvem manifestações clínicas, resposta imune e resposta ao tratamento específico que são idênticas a aquelas observadas em humanos. Desta forma, este estudo avaliou a eficácia do tratamento específico com Bz na prevenção de lesões cardíacas, na alteração da resposta imune e na evolução clínica dos animais tratados com Bz, comparativamente a animais não tratados inoculados com as mesmas cepas do T.cruzi. 27 Objetivos 3 - Objetivos 3.1 Objetivo Geral Avaliar a influência do tratamento específico com Benznidazol (Bz) na evolução da cardiopatia chagásica, utilizando como modelo experimental cães infectados por cepas do parasito sensíveis e resistentes a esse fármaco. 3.2 Objetivos específicos i Avaliar a evolução clínica dos animais infectados por diferentes cepas do T.cruzi, submetidos ou não ao tratamento específico, através da eletrocardiografia, tanto na fase aguda quanto na fase crônica da doença de Chagas experimental; ii Quantificar o infiltrado inflamatório e a área de fibrose no miocárdio de cães infectados por diferentes cepas do T.cruzi, submetidos ao tratamento específico com Bz comparativamente aos animais não tratados infectados pelas mesmas cepas; iii Avaliar a cinética de Imunoglobulina G (IgG) e isotipos (IgG1 e IgG2), por meio de imunoensaio enzimático (ELISA), nos soros de cães tratados com Bz, em relação aos animais controle infectados e não tratados; iv Analisar a resposta imune celular por meio de linfoproliferação das células mononucleares do sangue periférico (CMSP) em cães infectados por diferentes cepas do T. cruzi, utilizando a citometria de fluxo; v Avaliar a frequência de apoptose em CMSP de cães infectados por diferentes cepas do T. cruzi, submetidos ou não ao tratamento específico com Bz durante a fase aguda da infecção, também utilizando a citometria de fluxo; 28 Objetivos vi Avaliar as alterações no perfil da resposta imune celular induzidas pelo tratamento específico com Bz através da dosagem das citocinas IFN-γ, IL-10, TNF-α, no sobrenadante de células mononucleares do sangue periférico através de ELISA; vii Avaliar as alterações no perfil da expressão de RNAm das citocinas IFN-γ, IL-10 e TNF-α induzidas pelo tratamento específico com Bz no tecido cardíaco de cães, através da PCR em tempo real quantitativa; viii Relacionar as alterações do padrão da resposta imune celular e humoral com a intensidade da inflamação e fibrose no coração dos animais submetidos ao tratamento específico, comparativamente aos animais não tratados. 29 Animais, Material e Métodos 4 - Animais, material e métodos 4.1 Cepas de Trypanosoma cruzi i Cepa VL-10 - Foi isolada de paciente na forma indeterminada da doença de Chagas no estado de Minas Gerais (Schlemper et al., 1982). Esta cepa é considerada resistente ao tratamento com Bz (Filardi & Brener, 1987, Caldas et al., 2008) e segundo novo consenso de nomenclatura (Zingales et al, 2009) classificada como pertencente ao discrete typing units II (DTU II) (Moreno et al., 2010). ii Cepa AAS - A cepa AAS (T.cruzi II) foi isolada de um caso de infecção aguda em humano no estado de Minas Gerais. Considerada parcialmente resistente ao tratamento com Bz por Filardi & Brener, (1987), se mostrou resistente ao quimioterápico por Caldas et al., (2008). iii Cepa Berenice-78 - Foi isolada por Lana & Chiari, (1986) de um caso humano no Brasil, esta cepa é considerada sensível à quimioterapia com Bz (Caldas et al., 2008) e pertence ao DTU II (Moreno et al., 2010). 4.2 Animais Foram utilizados cães sem raça definida, obtidos e mantidos no Canil da Universidade Federal de Ouro Preto. Os animais foram alimentados com ração comercial para cães e água ad libitum. Antes de inclusão no estudo os animais foram tratados com anti-helmínticos e imunizados contra doenças infecciosas (Cinomose, Adenovírus Tipo 2, Coronavírus, Parainfluenza, Parvovirose e Leptospirose canina) usando a vacina Vanguard HTLP. Todos os procedimentos com estes animais foram aprovados e seguiram as normas estabelecidas pelo Comitê de Ética no uso de animais da UFOP. (protocolo n0 2009/15) 30 Animais, Material e Métodos 4.3 Fármaco e esquema de tratamento Neste projeto foi utilizado como quimioterápico o Benznidazol, um derivado 2nitroimidazol (N–benzil–2–nitro-1- imidazolacetamida) - Roche. Os cães foram tratados com 7mg/kg de Bz/dia, durante 60 dias, divididos em duas doses diárias. O tratamento foi iniciado a partir do primeiro dia em que o animal apresentou parasitemia patente pelo exame de sangue a fresco. 4.4 Polimorfismo das formas tripomastigotas do Trypanosoma cruzi O polimorfismo das formas tripomastigotas sanguíneas foi realizado por meio de análise de sangue a fresco de camundongos Swiss infectados pelo T. cruzi durante o pico de parasitemia da fase aguda da infecção, pelas cepas VL-10, AAS e Berenice-78. Foi realizada a coleta de 3l de sangue de vasos da ponta da cauda e contadas 200 formas tripomastigotas aleatoriamente em microscopia óptica (400x), classificando-as como fina, larga ou muito larga (Brener & Chiari, 1963). 4.5 Inoculação dos animais e confirmação da infecção Foram inoculados com cada uma das cepas do T.cruzi, 20 cães. Os cães foram inoculados aos 120 dias de idade, com 2.000 formas tripomastigotas sangüíneas/kg, via intraperitoneal. Os animais infectados foram divididos, aleatoriamente, em 2 grupos experimentais, sendo os animais do grupo 1 (n=10) tratados com Bz e os animais do grupo 2 (n=10) mantidos sem tratamento. A partir do 10o dia de inoculação foi coletado diariamente, sangue da veia marginal da orelha dos cães para a confirmação da infecção. Para a avaliação das lesões cardíacas a metade dos animais de cada grupo foi eutanasiada durante a fase aguda (imediatamente após o tratamento – aos 90 dias de infecção) e a outra metade durante a fase crônica (6 meses após o término do tratamento – aos 270 dias de infecção). A infectividade de cada cepa foi verificada pela observação, através do exame de sangue a fresco, de parasitos no sangue periférico dos cães inoculados. Os cães 31 Animais, Material e Métodos apresentando exames de sangue a fresco persistentemente negativos foram submetidos à hemocultura para a confirmação da infecção. 4.6 Curva de parasitemia A parasitemia dos cães foi avaliada diariamente, por meio de coleta de 5L de sangue da veia marginal da orelha e posteriormente, examinados ao microscópio para a detecção dos parasitos. A quantificação dos parasitos foi realizada de acordo com a técnica descrita por Brener (1962) até 10 dias após a negativação. As curvas representam as médias diárias dos parasitos quantificados, por exame de sangue a fresco, nos animais de cada grupo controle. 4.7 Avaliação de cura parasitológica após tratamento com Benznidazol Foi considerado curado todo animal que apresentou negativação dos testes parasitológicos/moleculares e sorológicos. Os testes parasitológicos/moleculares utilizados foram a hemocultura (Hc) e a PCR enquanto o teste sorológico foi o ELISA (Enzyme Linked Immunosorbent Assay). Assim, os animais com resultados da sorologia positivos e resultados da Hc negativos foram submetidos à investigação da cura por PCR. Todos os animais que apresentaram resultados de Hc e PCR negativos foram considerados curados. Os testes parasitológicos empregados neste projeto foram: 4.7.1 Hemocultura O teste de hemocultura foi realizado imediatamente antes da eutanásia nos animais utilizados para os experimentos de fase aguda da infecção (90 dias) e nos cães que foram sacrificados na fase crônica, foi realizado um teste 30 dias e outro 6 meses após o tratamento. A técnica descrita por Chiari et al., (1989), com algumas modificações foi utilizada, coletando-se 10 ml de sangue para imediata centrifugação. O plasma foi removido e descartado e o tubo contendo as hemácias foi lavado com meio LIT e novamente centrifugado (Camargo, 1964). Após a centrifugação, o sobrenadante 32 Animais, Material e Métodos foi desprezado e a camada leucocitária removida para outro tubo e suspensa em meio LIT. Posteriormente, as hemácias foram também suspensas em meio LIT e os tubos incubados em estufa a 28oC e homogeneizados uma vez por semana. Cada preparação foi examinada ao microscópio 30, 60, 90 e 120 dias depois de realizada a técnica, para a detecção dos parasitos. 4.7.2 Reação em Cadeia da Polimerase Para a realização da reação em cadeia da polimerase (PCR), foi coletado sangue dos cães no primeiro e no sexto mês após o término do tratamento (animais necropsiados durante a fase crônica). Utilizou-se a técnica de PCR descrita por Britto et al., (1993) e otimizada por Gomes et al., (1998). Foram coletados 10mL de sangue de cada cão, e colocados em tubos com igual volume de Guanidina-HCl 6M/EDTA 0,2M (Sigma Chemical Company, USA) (Ávila et al., 1991). Essa mistura, sangue/guanidina/EDTA, foi mantida à temperatura ambiente e após 15 dias fervida em banho-maria (Britto et al., 1993). O lisado foi estocado à temperatura ambiente. A seguir, encontra-se a descrição sucinta de cada etapa desta reação: a) Extração do DNA - Foi utilizada a técnica proposta por Sambrook et al., (1989) com algumas modificações realizadas por Gomes et al.,(1998). Alíquotas do lisado de sangue foram transferidas para tubos de microcentrífuga, sendo em seguida desproteinizado com igual volume de fenol-clorofórmio. A mistura foi homogeneizada lentamente e centrifugada. O sobrenadante foi retirado e ao sedimento foram adicionados H2O milli-Q estéril e novamente centrifugado. Em seguida, a fase aquosa foi purificada com clorofórmio e o DNA presente nessa fase precipitado com dois volumes de etanol absoluto gelado e 10mM de acetato de sódio em banho de gelo. Após centrifugação, o sobrenadante foi descartado e após a volatilização do etanol, o DNA obtido ressuspendido em água milli-Q estéril e estocado a 4oC. b) Amplificação específica do T. cruzi - As reações de amplificação continham Tris-HCl, Triton X-100, MgCl2, KCl, os diversos dNTP’s (Pharmacia Biotech), a Taq DNA polimerase (Invitrogen), e cada iniciador [S35(5’AAATAATGTACGGG (T/G) GAGATGCATGA3’) e 36 (5’GGGTTCGATTGGGGTTGGTGT3’) (OPERON Technologies, INC)] descritos por Ávila et al., (1990). Foram realizados 35 ciclos de 33 Animais, Material e Métodos amplificação em termociclador automático (MinCycler TM ). As condições da reação foram: desnaturação do DNA a 95ºC, anelamento dos iniciadores a 65º C e extensão a 72º C. As etapas de extração do DNA e a mistura da reação da PCR foram monitoradas com controles negativos (amostras de sangue de cães não infectados) e positivos (cães infectados na fase aguda da infecção). Além disso, para evitar contaminações, cada etapa da reação foi realizada em ambientes separados, utilizando reagentes e equipamentos destinados exclusivamente para cada uma das etapas. c) Detecção dos produtos da PCR - Os produtos amplificados pela PCR foram visualizados por eletroforese em gel de poliacrilamida e revelados pela prata (Santos et al., 1993). O tamanho das bandas amplificadas foi monitorado pela utilização de marcador de peso molecular. Após a eletroforese, o gel foi fixado em solução de etanol e ácido acético, sob agitação. Em seguida esta solução foi desprezada e o gel foi corado com uma solução de nitrato de prata sob agitação. Posteriormente, o gel foi lavado e revelado em solução de NaOH e formaldeído, com agitação até o aparecimento das bandas. Novamente o gel foi transferido para a solução fixadora e fotografado para documentação. 4.7.3 Ensaio imunoenzimático i- Dosagem de IgG total e subclasses IgG1 e IgG2: Foram coletados, aproximadamente 5mL de sangue dos cães, através da veia femural. As amostras de sangue foram centrifugadas e o sobrenadante (soro) foi coletado e armazenado em tubos eppendorf a -20ºC. As coletas de sangue dos cães foram feitas antes da inoculação, 15, 30, 45, 60, 90, 120, 150, 180, 210, 240 dias de infecção e no dia da necropsia nos cães utilizados para realização dos experimentos de fase crônica e até a coleta de 90 dias nos que foram eutanasiados na fase aguda da infecção. Foram utilizados antígenos da forma epimastigota da cepa Y do T. cruzi, obtidos de cultivo acelular em meio LIT. Como conjugado foram utilizadas anti-imunoglobulinas de cão da classe IgG marcadas com peroxidase (Bethyl Laboratories, Montgomery, USA). O ELISA foi realizado segundo a metodologia descrita por Voller et al., (1976), modificada de acordo com o protocolo descrito a seguir. O teste foi executado em placas de poliestireno com 96 poços de fundo chato. Cada poço da placa foi tratado com extrato 34 Animais, Material e Métodos antigênico de epimastigotas, na concentração definida previamente por titulação em bloco, diluído em solução tampão carbonato. As placas foram incubadas a 4oC por 18h e após este intervalo de tempo foram bloqueadas com PBS + SFB e incubadas a 37ºC. A próxima etapa consistiu na adição de soro de cada animal, e incubação a 37ºC. Posteriormente foi adicionado o conjugado, diluído em PBS-Tween, conforme titulação prévia, e as placas foram novamente incubadas a 37ºC. Finalmente, foi adicionada a solução de substrato (O-fenilenodiamino-OPD, solução de ácido cítrico e H202) e posteriormente a reação foi interrompida com a adição de ácido sulfúrico. A leitura foi realizada em leitor de microplaca (BIO RAD, Modelo 3550) com filtro de 490nm. Em cada placa foram adicionados 10 soros controles negativos e quatro controles positivos. A absorbância discriminante, em cada placa, foi calculada tomando-se a média da absorbância dos 10 soros negativos somados a dois desvios padrões. Posteriormente foi calculado o índice de reatividade, dividindo o valor da absorbância de cada amostra encontrada pela absorbância discriminante, sendo os valores encontrados entre 0.9 e 1.1 considerados duvidosos, valores abaixo de 0.9, negativos e acima de 1.1, considerados positivos. ii- Dosagem das citocinas IFN-γ, TNF-α e IL-10: Os ensaios imunoenzimáticos de ELISA sanduiche foram realizados utilizando-se o sobrenadante da cultura de células mononucleares do sangue periférico dos cães infectados ou não pelo T. cruzi. Para o procedimento do ensaio foram utilizados kits para detecção das citocinas IFN-γ, TNF-α e IL-10 (R&D Systems Inc, Minneapolis, USA) Para a sensibilização das microplacas de 96 poços foi adicionado 100L/poço dos anticorpos monoclonais anti-IFN-γ (Cat: MAB781) anti-IL-10 (Cat: MAB7351) e antiTNF-α (Cat: MAB1507), usando diferentes diluições em PBS, segundo especificações do fabricante. As placas foram incubadas over-night à temperatura ambiente para sensibilização. Posteriormente, as placas foram lavadas três vezes com o PBS com 0,05% Tween. Em seguida, as placas foram secas com o auxílio de papel toalha e posteriormente bloqueadas utilizando PBS, pH 7.4, com 1% albumina bovina. Após adição de solução de bloqueio, as placas foram incubadas a temperatura ambiente durante 1h e realizados novamente três processos de lavagem. Após o bloqueio foram adicionados 100L das 35 Animais, Material e Métodos amostras e dos padrões IFN-γ recombinante (Cat: 781-CG), TNF-α recombinante (Cat: 1507-CT-025) e IL-10 recombinante (Cat: 735-CL-010), da R&D Systems Inc, Minneapolis, USA. Após 2 horas de incubação foram realizados mais três procedimentos de lavagem e adicionados 100L dos anticorpos biotinilados de detecção anti IFN-γ (BAF781), anti-TNF-α (Cat: BAF1507) e anti-IL-10 (Cat: BAF735) usando diferentes diluições em PBS, pH 7,4 com 1% de albumina bovina e incubadas durante 2h a temperatura ambiente, seguindo-se três procedimentos de lavagem. Em seguida foram adicionados 100L/poço de estreptoavidina HRP (Cat: DY998, R&D Systems Inc, Minneapolis, USA) em diluição de 1:200 em PBS com 1% de albumina bovina, e posterior incubação a temperatura ambiente durante 20min. As placas foram novamente lavadas, e adicionado 100L da solução substrato por poço (mistura diluída 1:1 de peróxido de hidrogênio e tetrametilbenzidina – Cat: DY999/R&D Systems Inc, Minneapolis, USA), seguido de incubação por 20-30min em temperatura ambiente. A reação foi interrompida acrescentando 50L de H2SO4 1M por poço. A densidade óptica foi determinada utilizando leitor de microplacas com filtro de 450m. A quantificação das citocinas presentes nas amostras foi determinada baseada na densidade óptica obtida com a curva padrão de concentrações conhecidas das citocinas, analisadas pelo software SOFTmax PRO 4.0. 4.8 Eletrocardiografia para avaliação funcional do miocárdio Para a realização do eletrocardiograma (ECG), os cães foram anestesiados com tiopental (15 mg/kg de peso corporal) por via endovenosa. O eletrocardiógrafo utilizado foi do modelo ECG 06, ECAFIX-FUNBEC, São Paulo Brasil. A padronização foi de 1mV/cm e velocidade de 50 mm/seg. Os eletrodos foram adaptados em agulhas 25x7 mm que foram introduzidas na pele dos animais durante o exame. Sempre foram registradas as derivações periféricas (DI, DII, DIII, aVR, aVL e aVF) e as precordiais V10, CV5RL, CV6RL e CV6LU. As leituras e interpretações foram feitas por um especialista que não conhecia a situação clínica dos cães. 36 Animais, Material e Métodos 4.9 Teste “in vitro” de proliferação e avaliação do índice apoptótico de células mononucleares do sangue periférico Foram realizadas imunofenotipagens das células mononucleares do sangue periférico (CMSP) dos cães experimentalmente infectados no momento antes da infecção, 45 dias e 90 dias após inoculação, utilizando marcadores de superfície celular para as subpopulações de linfócitos T (CD4+ e CD8+) em células CMSP submetidas à cultura. Para a obtenção das CMSP foram colhidos 15mL de sangue estéril, adicionado 10mL de RPMI acrescido de 100µL de heparina sódica, sendo, em seguida adicionado Ficoll Hipaque (1:1). Após centrifugação a 1800rpm por 40 minutos a 4oC, o anel de células foi retirado e transferido para tubo falcon contendo 15mL de RPMI heparinizado que foi centrifugado a 1500 rpm por 10minutos a 4oC, sendo as células ressuspendidas em 2ml de meio RPMI e contadas em câmara de Neubauer para ajuste da concentração para 107 células por mL. Após o ajuste da concentração, foi retirado 400µL da suspensão de células e foi adicionado 400µL de solução de CFSE à 5µM (Vybrant® CFDA SE Cell Tracer Kit), e os tubos foram incubados no escuro por 10 minutos em temperatura ambiente. Após a incubação foi acrescentado RPMI (1:1) suplementado com 10% de soro fetal bovino e foi aguardado 5 minutos para bloqueio da reação, com os tubos mantidos no gelo e protegidos da luz. A suspensão celular foi lavada 3 vezes em meio MEM, usando centrifugação a 1300rpm por 5 minutos a 4oC e a seguir as células foram ressuspendidas com 400µL de RPMI. A avaliação da capacidade proliferativa (índice de estimulação) foi realizada em micro-placas de 96 poços. Em cada poço foi acrescentado 25µl de células ressuspendidas (250.000 células) em 175µl de meio CTCM acrescido de 20% SFB. As células colhidas de cada animal foram colocadas em oito poços, dois poços com células não marcadas com CFSE, dois com células marcadas e não estimuladas, dois com células marcadas e estimuladas com 25µl Concanavalina-A (80µg/ml) e dois com células marcadas e estimuladas com 25µl de antígeno de T. cruzi (4x107 tripomastigotas/ml). A leitura das amostras foi realizada no citômetro de fluxo modelo FACSCallibur (Becton Dickinson Immunocytometry Systems, San Jose, CA, U.S.A.), através do programa CELLQuest no sexto dia de cultivo. As células foram colhidas e transferidas 37 Animais, Material e Métodos para tubo falcon 2054 e os poços da placa foram lavados com 200µL de PBS gelado, para total transferência das células. Posteriormente foi adicionado 100µl de solução de EDTA (20mM), e foi incubado por 10 minutos (temperatura ambiente). A seguir foram adicionados 3 mL de PBS-W, e após homogeneização em vórtex os tubos foram centrifugados a 1600rpm por 10 minutos. O sobrenadante foi vertido, os tubos foram secos suavemente e o pellet foi dividido em dois tubos para marcação com 5µl dos anticorpos monoclonais Rat Anti Dog CD8:Alexa Fluor® 647 e Rat Anti Dog CD4:Alexa Fluor® 647 que foram adicionados diretamente ao pellet. Posteriormente os tubos foram incubados por 30 minutos ao abrigo da luz, adicionado 2 mL de PBS-W e homogeneizado em vórtex, para seguir serem centrifugados a 1600rpm por 10 minutos. Posteriormente o sobrenadante foi descartado, adicionado 150µL de solução de fixação MFF e realizada a leitura de 20000 eventos no citômetro de fluxo. A avaliação do índice apoptótico das células mononucleares do sangue periférico foi realizada utilizando o Kit ApoTarget™ Annexin-V FITC Apoptosis, da Invitrogen. A anexina V, disponibilizada neste kit, detecta células apoptóticas em decorrência de sua ligação preferencial a fosfolipídeos negativamente carregados, principalmente a fosfatidilserina exposta no início do processo apoptótico. As células foram incubadas em micro-placas de 48 poços. Em cada poço foram acrescentados 50µl de células ressuspendidas (500.000 células) em meio CTCM acrescido de 20% de SFB. As células de cada cão foram colocadas em três poços, um de células puras, um de células estimuladas com antígeno de T. cruzi (4x107 tripomastigotas/ml), e um poço suplementado com o tóxico Phorbol 12-myristate 13-acetate (PMA) na concentração de 25nM, para ser usado como controle positivo de apoptose. A leitura no citômetro de fluxo foi realizada após 48 horas de cultivo. As células foram colhidas e transferidas para tubo falcon 2054, sendo os poços lavados com 1000µL de PBS pH 7,2 gelado. Posteriormente os tubos foram submetidos a uma centrifugação a 1200rpm por 7 minutos a 18oC, em seguida vertidos e secos suavemente em papel toalha, sendo o pellet dividido em dois tubos para adição de 5µl do anticorpo monoclonal Rat Anti Dog CD8:Alexa Fluor® 647 em um deles e Rat Anti Dog CD4:Alexa Fluor® 647 no outro. Os tubos ficaram incubados por 30 minutos e em seguida foi adicionado 2,0 mL de PBS pH 7,2 gelado e os tubos submetidos a nova centrifugação a 1200rpm por 7 minutos. Em seguida o sobrenadante foi vertido e foi 38 Animais, Material e Métodos adicionado 50µL Anexin binding buffer (fornecido no kit), 2µL de anexina e 4µL de iodeto de propídio diretamente ao pellet de cada tubo, que ficou incubado por 15 minutos ao abrigo da luz e em temperatura ambiente. Após este período, foi adicionado 250µL de Anexin binding buffer e os tubos foram lidos em no máximo 1 hora no citômetro de fluxo. A aquisição e a subseqüente análise dos dados foram realizadas utilizando o programa específico FlowJo, A figura 1 ilustra a estratégia empregada para as análises por citometria de fluxo. Primeiramente, gráficos de distribuição pontual foram construídos pela combinação dos parâmetros de tamanho e complexidade celular (FSC x SSC) e a população de interesse, que se constituiu de linfócitos, foi selecionada dentro da região R (figura 1A e 1C). Em seguida, os eventos selecionados nesta região foram representados em gráficos de distribuição pontual construídos com combinações de diferentes fluorescências (FL), por exemplo, FL1/CFSE versus FL4/Anti-CD4:Alexa Fluor® 647. Esses gráficos foram então, divididos em quatro quadrantes (Q1 a Q4) e as freqüências dos eventos observados em cada quadrante foram determinadas pelo programa FlowJo. Nas análises dos dados dos experimentos de proliferação celular, a reatividade da população total de CMSP, ou seja, a freqüência das células que incorporaram CFSE, foi calculada pela soma dos quadrantes Q1 e Q3 (figura 1B), já que as células que apresentam menores fluorescências são as células proliferadas, tendo em vista que a cada geração celular metade do CFSE permanece em cada célula-filha. Em seguida, a reatividade foi determinada utilizando a seguinte abordagem: o percentual de linfócitos reativos nas populações específicas das células estimuladas com o antígeno de T.cruzi foi dividido pelo percentual de linfócitos reativos nas populações específicas das células não estimuladas, portanto, dividindo o Q1 do estimulado pelo Q1 do não estimulado. Para análise da apoptose de linfócitos T CD4+ e T CD8+, foi construído um gráfico FL1:Anexina-V versus FL4:CD4 Alexafluor 647 ou FL1:Anexina-V versus FL4:CD8 Alexafluor 647, onde foi possível identificar em Q5 os linfócitos T CD4+ (ou T CD8+) que não estavam em apoptose e em Q6 os marcados pela anexina-V e portanto apoptóticos. (figura 1D) . 39 Animais, Material e Métodos A B C D Figura 1 - Passos realizados para a análise dos dados por citometria de fluxo. A) e C) Distribuição pontual de tamanho (FSC) versus granulosidade celular (SSC) demonstrando a população de linfócitos contida na região R; B) Distribuição pontual de FL1/CFSE versus FL4/Anti-CD4:Alexa Fluor® 647, demonstrando diferentes populações celulares contidas nos quatro quadrantes: Q1: linfócitos T CD4+ proliferado, Q2: linfócito T CD4+ não proliferado, Q3: outras populações linfocitárias proliferadas e Q4: outras populações linfocitárias não proliferadas e D) Distribuição pontual de FL1:Anexina V versus FL4:Anti-CD4:Alexa Fluor® 647. A cultura de CMSP para a dosagem de citocinas (IFN-γ, IL-10 e TNF-α,) foi realizada em placas de 48 poços. Para cada cão dois poços foram estimulados com antígeno de T. cruzi (4x107 tripomastigotas/ml) e dois poços permaneceram sem estímulo. Em cada poço foi acrescentado 50µl das células a 107 células/mL (500.000 células) ressuspendidas em meio CTCM suplementado com 20% de SFB. O 40 Animais, Material e Métodos sobrenadante foi coletado após 24 e 72 horas de cultivo e congelado a -80oC até a realização do teste de dosagem de citocinas. 4.10 Necrópsia Os cães de cada grupo experimental foram necropsiados imediatamente e seis meses após o término do tratamento. Os animais foram eutanasiados e posteriormente necropsiados para avaliação macroscópica dos órgãos linfóides (baço e linfonodos cervicais) e da área cardíaca, verificando a presença de linfadenopatia, esplenomegalia e cardiomegalia. Os pesos dos órgãos foram ainda determinados e relacionados com o peso de cada animal obtendo-se um índice de peso (IP) [(IP= Peso do órgão(g) Peso do cão(kg)]. Em seguida, um fragmento da parede atrial direita de todos os cães foram coletados. O átrio direito é uma das regiões onde a miocardite chagásica apresenta-se com maior intensidade (Tafuri et al., 1987), assim foram utilizados para o processamento da histopatologia. Estes fragmentos foram conservados em gelo e fixados em formalina. 4.10.1 Avaliação microcoscópica do tecido cardíaco i Técnica de Hematoxilina & Eosina (H&E) Para análise e quantificação do infiltrado inflamatório, fragmentos do tecido cardíaco foram corados pela H&E. Cortes seriados da parede atrial direita de cada cão infectado foram desparafinizados em imersões em xilol, hidratados em soluções alcoólicas de concentrações decrescentes e lavados em água corrente e em tampão fosfato (PBS). Em seguida, os cortes foram corados pela hematoxilina, lavados em água corrente e diferenciados rapidamente em álcool acidulado e corados pela Eosina. Após o último processo de lavagem em água corrente, foram levados até a estufa para secagem. Posteriormente colocados em banho de xilol e, então, montadas as lâminas com auxílio de entellan. Os núcleos celulares foram quantificados em 20 imagens (campos) aleatórias (área total percorrida igual a 1,49 106 m2). As imagens visualizadas pela objetiva de 40 foram digitalizadas através de microcâmera Leica DM 5000 B (Leica Application Suite, versão 2.4.0R1) e processadas por meio do programa analisador de imagens Leica Qwin V3. A miocardite foi determinada pela média do número de núcleos celulares 41 Animais, Material e Métodos presentes nas imagens dos animais controles não infectados mais dois desvios padrões, assim, os cães infectados com o T. cruzi com valores da quantificação de núcleos celulares acima desta média foram considerados com inflamação cardíaca. ii Técnica de Tricrômico de Masson Para observação de tecido conjuntivo fibroso e determinação da intensidade da fibrose, fragmentos cardíacos foram corados pela técnica de Tricrômico de Masson. Após desparafinização e hidratação de cortes da parede atrial direita dos cães, estes foram corados com hematoxilina, lavados em água corrente e corados pela solução número 1 (Sudam, fucsina ácida e ácido acético glacial). Posteriormente foram lavados em água corrente e corados pela solução número 2 (ácido fosfotúngstico, ácido fosfomolíbdico). Em seguida, corados pela solução número 3 (azul de anilina, ácido acético glacial), lavados e submetidos à solução de água acética. Realizado o último processo, os cortes foram desidratados, secos em estufa e colocados em xilol, seguindo-se a montagem das lâminas com auxílio de entellan. Para a análise quantitativa de tecido conjuntivo fibroso, foi utilizado o analisador de imagens, onde foram obtidas 20 imagens (campos) aleatórias (área total percorrida igual a 1,49 106 m2) de cada lâmina com corte de átrio direito de cada cão. As imagens foram visualizadas pela objetiva de 40 e digitalizadas através de microcâmera Leica DM 5000 B (Leica Application Suite, versão 2.4.0R1) e processadas por meio do programa analisador de imagens. Foram considerados com fibrose no miocárdio todos os animais que apresentaram média das áreas de fibrose com valor superior ao encontrado na média dos animais controles não infectados acrescidos de dois desvios padrões. 4.11 Expressão de mRNA de citocinas através da PCR em tempo real quantitativa i) Extração do RNA A extração do RNA foi realizada de acordo com as instruções do kit RNA- SV Total RNA Isolation System – Promega. Um fragmento de aproximadamente 60 mg do tecido cardíaco de cada cão foi macerado e completamente homogeneizado em 1 ml de RNA Lysis Buffer. Posteriormente, foram transferidos 175µl desse lisado para um novo 42 Animais, Material e Métodos tubo e adicionados 350µl de RNA Dilution Buffer. Essa mistura foi homogeneizada, incubada a 70ºC por 3 minutos e então centrifugada a 13000xg durante 10 minutos, para precipitação seletiva de proteínas celulares. A solução sobrenadante, a qual continha o RNA, foi cuidadosamente pipetada e transferida para um novo tubo. 200µl de etanol 95% foram adicionados com a finalidade de precipitar o RNA. Essa solução foi transferida para a Spin Column Assembly e centrifugada a 12000xg por 1 minuto. Nessa etapa, o RNA estava ligado à superfície sílica encontrada na Spin Basket. O líquido residual foi descartado no tubo coletor e o RNA lavado com 600 µl de RNA Wash Solution. Após centrifugação, foram adicionados à coluna contendo o RNA 50 µl do mix DNase (40 µl de Yellow Core Buffer, 5 µl de 0,09M MnCl2 e 5µl de DNAse I enzyme), para digestão do DNA genômico contaminante. Após incubação por 15 minutos a 20-25ºC, a reação foi interrompida com 200µl de DNA Stop Solution e o tubo centrifugado a 12000xg por 1 minuto. Foram processadas então sucessivas lavagens utilizando a RNA Wash Solution a fim de purificar o RNA, eliminando sais contaminantes, proteínas e impurezas celulares. Finalmente, o RNA total foi eluído da membrana pela adição de Nuclease Free Water. ii) Quantificação do RNA – Determinação de rendimento e pureza A quantificação do RNA foi realizada através de leitura no aparelho NanoVue PlusTM (GE Healthcare). O RNA puro deveria exibir razão de absorbância 260/280 de 1.7 a 2.1 e 260/230 de 1.8 a 2.2. Após comprovação da pureza, foi determinada a integridade das moléculas através de eletroforese desnaturante em gel de agarose. iii) Transcrição reversa A transcrição reversa foi processada de acordo com as instruções do kit GeneAmp RNA PCR – Applied Biosystems. Foi preparado o Mastermix contendo 5mM de MgCl2, 2 µl de 10XPCR Buffer, 1mM de cada deoxinucleotídeo (dATP, dGTP, dCTP e dTTP), 1 U de RNase Inhibitor, 2,5 µl de MuLV Reverse Transcriptase, 2,5 µl de oligo d(T)16, 1 µl de amostra (na concentração de 1 ug/µl) e água DEPC em quantidade suficiente para um volume final de 20 µl. Os tubos foram incubados à temperatura ambiente por 10 minutos para permitir a extensão do Oligo d(T) pela transcriptase. Posteriormente, os tubos foram submetidos a um ciclo de termociclagem com as seguintes temperaturas: 15 43 Animais, Material e Métodos minutos a 42ºC, 5 minutos a 99ºC e 5 minutos a 5ºC. Após esse processo, o cDNA estava disponível para realização da PCR. iv) Amplificação A quantificação relativa da expressão gênica por PCR em tempo real foi processada no aparelho ABI 7300 (Applied Biosystems), utilizando o SYBR® Green Master Mix para detecção dos amplicons. Foi analisada a expressão de mRNA das citocinas IFN-γ, IL-10 e TNF-α através da PCR em tempo real quantitativa, utilizando os iniciadores mostrados na tabela 1. Para cada reação, foi usado um mix contendo 12,5µl de SYBR® Green Master Mix, 5µM de cada primer – sense e anti-sense, 2µl de cDNA e água ultra pura em quantidade suficiente para um volume de 25 µl. As condições de termociclagem foram as seguintes: 50ºC por 2 minutos, 95°C por 10 minutos; 40 ciclos de 94°C por 30 segundos, 58°C por 30 segundos e 72°C por 1 min. Os valores médios de Ct obtidos a partir de duplicatas foram utilizados para calcular a expressão do gene alvo, normalizado por um controle interno (gene da β-actina). Posteriormente, foi verificada a diferença do Ct observado entre as amostras testes e o Ct obtido na amplificação do pool de cDNA provenientes de cães não infectados pelo T.cruzi, que foi utilizado em todo o experimento. Dessa forma foi verificada quantas vezes mais as amostras testes expressavam mRNA em relação a expressão que normalmente é presente em cães não infectados, e para isso foi utilizada a fórmula 2–ΔΔCt. Tabela 1 Alvo e iniciadores utilizados. As sequências foram determinadas com base na sequência de nucleotídeos obtidas GenBank Database. Alvo Sequência dos iniciadores Sense e Antisense IFN- TTCAAAGGAGCATGGATACCA e TTAAGAACTTGCCAAGCATGTC IL10 AAT GAA GGACAAGCTGGACAA e TTAAAGTCCTCCAGAAGGGA TNF-α TGTTGTAGCAAACCCCGAAG e ATCAGCTGGTTGTCTGTCAGCT β-actina CCACTTTCCTGTCTTACCCAA e AATTAACCACCCACGGTGTT 44 Animais, Material e Métodos 4.12 Análise estatística Os dados da histopatologia, da eletrocardiografia e dos parâmetros imunológicos foram analisados pelo teste não paramétrico de Newman-keuls. As correlações realizadas entre a produção de imunoglobulinas e inflamação, bem como os de correlação entre fibrose e alterações de parâmetros eletrocardiográficos foram realizadas utilizando o Coeficiente de Correlação de Pearson. Para análise dos experimentos de quantificação relativa de mRNA pelo PCR em tempo real, foi verificado se os valores eram diferentes de 1, já que se a expressão em um animal infectado fosse igual à observada em um controle não infectado a razão seria esta, através do Teste t de student, com hipótese nula igual a 1. As diferenças foram consideradas significativas se o P foi igual ou menor que 0,05. 45 Resultados 5 - Resultados 5.1 Polimorfismo das formas tripomastigotas sanguíneas Um dos fatores que poderia ser relacionado com a ação patogênica de uma população do T.cruzi para o hospedeiro seria a característica morfológica do parasito. Formas finas possivelmente apresentam tropismo preferencial para células mononucleares fagocitárias e são capazes de penetrar mais rapidamente nas células do hospedeiro, entretanto são mais sensíveis à resposta imune do que as formas largas, que diferentemente, apresentariam tropismo para cardiomiócitos (Brener, 1969). O polimorfismo das formas tripomastigotas sanguíneas observadas durante o pico de parasitemia na infecção de camundongos inoculados com as cepas VL-10, AAS e Berenice-78 estão representados no Gráfico 1. Foi observado um predomínio de formas largas ou muito largas para as cepas VL-10 (94±3%) e Berenice-78 (95±3%). A cepa AAS do T.cruzi apresentou predomínio de formas finas (60±2%). 100 13+3% 80 5 +3% 40+2% % 60 81+3% 90 +3% 40 60+2% 20 0 6+3% VL-10 5+3% AAS muito larga larga Berenice-78 fina Gráfico 1 - Polimorfismo das formas tripomastigotas sanguíneas observadas durante o pico de parasitemia em camundongos Swiss inoculados com 5000 tripomastigotas sanguíneos das cepas VL-10, AAS e Berenice-78 do Trypanosoma cruzi. 5.2 Curvas de parasitemia 46 Resultados As curvas de parasitemia obtidas pela avaliação do exame de sangue a fresco dos cães inoculados com as cepas VL-10, AAS e Berenice-78 do T.cruzi estão representadas no gráfico 2. VL 10 8000 No de tripomastigotas /0,1 mL de sangue AAS Berenice-78 6000 4000 2000 0 5 10 15 20 25 30 35 40 45 Dias de infecção Gráfico 2 - Curvas de parasitemia obtidas de cães inoculados com 2000 tripomastigotas sanguineos/kg de peso corporal das cepas VL-10, AAS e Berenice-78 do Trypanosoma cruzi. O período pré-patente variou de 11 a 17 dias nos cães inoculados com as cepas Berenice-78 (11 dias) e VL-10 (17 dias). Os animais inoculados com a cepa AAS não apresentaram parasitemia patente. O período patente observado nos animais inoculados com a cepa Berenice-78 foi de oito dias, apresentando pico de parasitemia de 4.966 tripomastigotas/0,1mL de sangue no 15o dia de infecção. Os cães infectados pela cepa VL-10 apresentaram longo período patente (21 dias), entretanto apresentaram curva de parasitemia sem picos definidos, com parasitemia máxima de 5.555 o tripomastigotas/0,1mL de sangue no 32 dia após inoculação. 5.3 Histopatologia do miocárdio dos cães infectados 5.3.1 Padronização da metodologia utilizada na quantificação da inflamação e fibrose. Antes da quantificação dos núcleos celulares para determinação da miocardite e da quantificação da área ocupada por tecido fibroso no tecido cardíaco, foi necessário estabelecer o número mínimo de campos microscópicos que deveriam ser analisados para 47 Resultados se obter representatividade estatística. Foi utilizado o método empregado por Rodrigues et al., (2009), onde o coeficiente de variação (CV) é determinado a partir de contagens sucessivas dos campos histológicos. O método consistiu na obtenção de subgrupos menores de uma amostra de 30 campos aleatórios diferentes, avaliados de uma lâmina escolhida ao acaso. Foram sorteados subgrupos com número crescente de campos, onde os pontos 5, 8, 10, 12, 15, 18, 20, 23, 25 e 30 campos foram escolhidos. A análise dos valores obtidos foi feita pelo cálculo estatístico descritivo do conjunto de valores obtidos em cada subgrupo, foram determinados a média, o desvio padrão e o coeficiente de variação dos resultados encontrados. Os sucessivos CV foram analisados até a obtenção de resultados constantes. Esta avaliação está representada no Gráfico 3. O número de campos considerado como mínimo representativo foi definido quando o incremento de campos e não resultava em alteração de +20% no valor do CV. A B Gráfico 3 - Resultado da análise para determinação do número mínimo de campos representativos para quantificação da: A) Inflamação B) Fibrose; avaliada em preparações de lâminas coradas pela Hematoxilina & Eosina e Tricrômico de Masson. CV: coeficiente de variação (CV= desvio padrão/média) Analisando os gráficos acima, foi possível observar que a estabilidade de cada variável analisada foi observada após a contagem de 20 campos microscópicos nos gráficos de inflamação e fibrose. Entretanto para se confirmar a estabilidade da curva, a variação entre coeficientes dentro do conjunto considerado estável deveria ser inferior a 20%. Na tabela 2 está apresentada a análise estatística descritiva dos valores 20, 23, 25 e 30 campos, considerados estáveis para inflamação e fibrose. 48 Resultados Tabela 2 – Análise estatística descritiva dos valores estáveis da curva de coeficiente de variação. Inflamação Fibrose Média 20,35 62,98 Desvio Padrão 0,43 0,82 Coeficiente de Variação (CV) 2,12% 1,3% Conforme apresentado na tabela 2, o CV foi inferior aos 20% estabelecido, em todas as avaliações. Dessa forma foi confirmada estabilidade da curva após a avaliação de 20 campos nos gráficos de inflamação e fibrose. 5.3.2 Análise quantitativa do infiltrado inflamatório e da fibrose no miocárdio dos cães infectados, durante as fases aguda e crônica da infecção. A presença de inflamação e de fibrose no átrio direito dos cães infectados pelas cepas VL-10, AAS e Berenice-78 do T.cruzi, necropsiados na fase aguda (90 dias de infecção) e crônica (270 dias de infecção), foi determinada pela quantificação de núcleos celulares e pela área ocupada por tecido conjuntivo fibroso. A avaliação da miocardite revelou que todas as cepas estudadas induziram inflamação no átrio direito dos animais. Foram quantificados em média 301 núcleos celulares na histopatologia realizada aos 90 dias de infecção nos animais infectados pela cepa VL-10, 293 nos infectados pela cepa Berenice-78 e 221 nos inoculados com a cepa AAS (Figura 2A). Na avaliação realizada mais tardiamente, aos 270 dias de infecção, também foi observado intenso processo inflamatório no miocárdio dos animais, entretanto menor do que a encontrada na análise realizada na fase mais recente da infecção, sendo observados em média 244 núcleos celulares entre os animais infectados pela cepa VL-10, 198 pela cepa Berenice-78 e 176 nos infectados pela cepa AAS. É importante lembrar que a média do número de núcleos celulares encontrados no miocárdio dos animais saudáveis, não infectados pelo T.cruzi, foi de 105 núcleos em uma área de 74.931µm2 (Figura 2B). A análise quantitativa da área ocupada pelo tecido fibroso nos animais infectados pelas cepas VL-10 e Berenice-78 realizada aos 90 dias de infecção, mostrou níveis de deposição de colágeno significativamente maiores do que o observado no miocárdio dos animais não infectados. De forma diferente, a área ocupada pelo tecido conjuntivo no miocárdio dos animais infectados pela cepa AAS foi similar a dos animais não infectados pelo T.cruzi (Figura 3A). 49 Resultados A 300 200 p<0,05 p<0,05 100 C N I e7 8 0 B AAS 400 A A S VL-10 VL -1 0 No de núcleos celulares / 74931m2 90 dias de infecção Berenice-78 CNI B 300 200 100 p<0,05 C N I B e7 8 0 A A S Berenice-78 270 dias de infecção 400 VL -1 0 AAS No de núcleos celulares / 74931m2 VL-10 Figura 2 - Miocardite observada nos cães inoculados com 2000 tripomastigotas sangüíneos/kg de peso corporal das cepas VL-10, AAS e Berenice-78 do Trypanosoma cruzi eutanasiados aos 90 (A) e 270 dias de infecção (B). Fotomicrografias obtidas de lâminas com cortes de átrio direito coradas pela hematoxilina e eosina. Os resultados foram apresentados pela média dos valores e analisados pelo teste não paramétrico de Newman Keuls. (∆) P<0,05 (diferença significativa em relação ao grupo controle não infectado-CNI). Todavia, na avaliação realizada aos 270 dias de infecção, todas as cepas induziram aumento de áreas ocupadas por tecido fibroso e redução das áreas ocupadas 50 Resultados por músculo cardíaco, principalmente entre os inoculados com a cepa VL-10, onde foi quantificado em um cão, 7.480µm2 de fibrose na área total de 74.931µm2 avaliada por campo microscópico. (Figura 3B). A 90 dias de infecção 8000 Colágeno / 74931m2 VL-10 AAS 6000 4000 2000 I N C 78 B e- S A A VL - 10 0 Berenice-78 CNI B VL-10 270 dias de infecção AAS Berenice-78 Colágeno / 74931m2 8000 6000 4000 2000 I N C 78 B e- S A A VL - 10 0 Figura 3 - Fibrose observada nos cães inoculados com 2000 tripomastigotas sangüíneos/kg de peso corporal das cepas VL-10, AAS e Berenice-78 do Trypanosoma cruzi sacrificados aos 90 (A) e 270dias de infecção (B). Imagens obtidas de lâminas com cortes de átrio direito coradas pelo Tricrômico de Masson. Os resultados foram apresentados pela média dos valores e analisados pelo teste não paramétrico de Newman Keuls. (∆) P<0,05 (diferença significativa em relação ao grupo controle não infectado-CNI). 51 Resultados 5.4 Determinação da susceptibilidade ao Benznidazol das cepas VL-10, AAS e Berenice-78 do Trypanosoma cruzi Foi observado, através da avaliação diária do exame de sangue a fresco dos animais tratados, que o Bz foi capaz de suprimir a parasitemia em todos os cães inoculados com as diferentes cepas do T.cruzi, independente do grau de susceptibilidade ao Bz. Esta redução da parasitemia, em decorrência do tratamento, foi confirmada pelos resultados da hemocultura, que foram negativos em 100% (10/10), 90% (9/10) e 10% (1/10) dos cães inoculados com as cepas Berenice-78, AAS e VL-10, respectivamente. Entretanto, o kDNA do T. cruzi foi detectado no sangue de todos os animais inoculados com as cepas AAS e VL-10 após o tratamento, enquanto a PCR realizada no sangue dos animais infectados pela cepa Berenice-78 foi persistentemente negativa. É importante ressaltar que os resultados da sorologia sempre foram concordantes com o dos testes parasitológicos e/ou moleculares. Os animais que apresentaram resultados de hemocultura, PCR e sorologia convencional negativos foram considerados curados. Os resultados indicaram, portanto, que o tratamento com Benznidazol foi eficaz em induzir cura em 100% dos cães inoculados com a cepa Berenice-78. Por outro lado, o tratamento não induziu cura em nenhum dos animais inoculados com as cepas VL-10 e AAS (gráfico 4). Gráfico 4 - Porcentagem de testes sorológicos e parasitológico e/ou molecular – hemocultura e PCR – positivos realizados no sangue de cães inoculados com 2000 tripomastigotas sangüíneas/kg de peso corporal das cepas VL-10, AAS e Berenice-78 do Trypanosoma cruzi após o tratamento com 7mg de Bz/Kg durante 60 dias. 52 Resultados 5.5 Análise quantitativa da miocardite e da fibrose no miocárdio dos cães infectados e tratados com Benznidazol, durante as fases aguda e crônica da infecção. O número de núcleos presentes e a área ocupada por fibrose no tecido cardíaco dos animais infectados e tratados com Bz foi comparado ao observado nos animais dos grupos controle infectado e não infectado, com o objetivo de avaliar a influência do tratamento na intensidade do processo inflamatório. Após o tratamento com Bz, nas análises realizadas aos 90 e 270 dias após infecção, entre os animais inoculados com a cepa susceptível Berenice-78, foi observado intensidade da miocardite e área ocupada por tecido fibroso significativamente menor do que o observado no grupo controle infectado e similar ao observado nos cães não infectados pelo T.cruzi (Figuras 4 e 5). A resposta ao tratamento dos cães infectados pelas cepas resistentes foi diferente entre os animais inoculados com as cepas VL-10 e AAS. Os cães infectados pela cepa VL-10 não apresentaram diferença significativa no número de núcleos celulares e nem da área ocupada por tecido fibroso em relação aos cães do grupo controle infectado. Entretanto, o tratamento foi eficaz em reduzir a intensidade da miocardite e fibrose nos cães inoculados com a cepa AAS, mesmo não sendo observada cura parasitológica entre esses animais. É interessante ressaltar que os cães infectados pela cepa AAS necropsiados aos 270 dias e tratados apresentaram redução de fibrose em relação aos cães não tratados, mas ainda apresentaram aumento de área de tecido fibroso em relação aos animais não infectados. Assim o tratamento com Bz conduzindo a cura parasitológica dos animais infectados pela cepa Berenice-78, previniu inflamação e fibrose no miocárdio e nos casos de falha terapêutica, não preveniu a lesão cardíaca observada nos cães infectados pela cepa VL-10, mas trouxe benefício para os infectados pela cepa AAS. 53 Resultados 90 dias de infecção 300 200 100 400 C N I 78 -B e- B e- # 300 200 100 C N I e- 78 78 e- TN CI B C VL C B -1 0 -1 VL A A S A A S 0 0 TN Berenice-78 CNI 270 dias de infecção No de núcleos celulares / 74931m2 AAS TC T-Bz CI B 78 0 Berenice-78 VL-10 TC AAS # A TN AS C A A S VL-10 400 VL TN -10 C VL -1 0 No de núcleos celulares / 74931m2 A T-Bz CNI Figura 4 - Miocardite observada nos cães inoculados com 2000 tripomastigotas sangüíneos/kg de peso corporal das cepas VL-10, AAS e Berenice-78 do Trypanosoma cruzi sacrificados aos 90 (A) e 270 dias de infecção (B). Imagens obtidas de lâminas com cortes de átrio direito coradas pela hematoxilina e eosina. Os resultados foram apresentados pela média dos valores e analisados pelo teste não paramétrico de Newman Keuls. TNC: tratado com Benznidazol e não curado; TC: tratado curado; T-Bz: grupo tratado com Bz (∆) P<0,05 (diferença significativa em relação ao grupo controle não infectado-CNI).(#) diferença significativa de T-Bz em relação a TNC) 54 Resultados 90 dias de infecção A 9000 Colágeno / 74931m2 VL-10 AAS # 6000 3000 C N I 78 e- eB -B C TN 270 dias de infecção VL-10 9000 Colágeno / 74931m2 AAS CNI T-Bz CI B TC Berenice-78 78 A A S A A S 10 VL - C TN VL - 10 0 # # 6000 3000 C N I 78 e- 78 eB -B TN CI TC A A S A A S C VL TN Berenice-78 C VL -1 0 -1 0 0 T-Bz CNI Figura 5 - Fibrose observada nos cães inoculados com 2000 tripomastigotas sangüíneos/kg de peso corporal das cepas VL-10, AAS e Berenice-78 do Trypanosoma cruzi sacrificados aos 90 (A) e 270 dias de infecção (B). Imagens obtidas de lâminas com cortes de átrio direito coradas pelo Tricrômico de Masson. Os resultados foram apresentados pela média dos valores e analisados pelo teste não paramétrico de Tukey. TNC: tratado com Benznidazol e não curado; TC: tratado curado; T-Bz: grupo tratado com Bz (∆) P<0,05 (diferença significativa em relação ao grupo controle não infectado-CNI).(#) diferença significativa de T-Bz em relação a TNC) 55 Resultados Com base nos resultados mostrados, as tabelas abaixo resumem os padrões de lesões cardíacas observadas nos cães infectados e submetidos ou não ao tratamento específico com Bz aos 90 dias (tabela 3) e aos 270 dias de infecção (tabela 4). A cor cinza clara representa padrão intermediário de inflamação e fibrose observado nos animais tratados infectados pela cepa AAS do T.cruzi. Tabela 3 - Padrão de inflamação, fibrose e efeito do tratamento observado nos cães infectados pelas cepas VL-10, AAS e Berenice-78 do Trypanosoma cruzi aos 90 dias de infecção. Cepas do T.cruzi Ausência de Inflamação Tratamento Fibrose Tratamento com Bz Efeito do tratamento VL- 10 AAS Berenice-78 Inflamação Fibrose Susceptibilidade Resistência Tabela 4 - Padrão de inflamação e fibrose observado nos cães infectados pelas cepas VL-10, AAS e Berenice-78 do Trypanosoma cruzi aos 270 dias de infecção. Cepas do T.cruzi Ausência de Inflamação tratamento Fibrose Tratamento Inflamação com Bz Fibrose VL- 10 AAS Berenice-78 5.6 Alterações cardíacas avaliadas pela Eletrocardiografia Neste trabalho a avaliação das alterações eletrocardiográficas apresentadas pelos cães infectados pelas cepas VL-10, AAS e Berenice-78 do T.cruzi foi realizada pela observação de sobrecargas atriais e ventriculares, ocorrência de alterações de condução átrio-ventriculares e presença de arritmias. Inicialmente foi realizada a análise das medidas de duração da onda P, duração do intervalo PR e duração do complexo QRS no traçado eletrocardiográfico. A análise comparativa da média da duração da onda P, que indica alterações no átrio esquerdo e indiretamente de sobrecarga ventricular esquerda, entre os cães no momento antes de serem infectados e após inoculação com as três cepas do T.cruzi, mostrou aumento dessa medida no decorrer da infecção (figura 6). O tratamento com Bz apesar de não ter curado 56 Resultados nenhum animal infectado pelas cepas VL-10 e AAS, foi eficaz em prevenir o aumento dessa medida na avaliação realizada 120 dias após a infecção. Resultado semelhante foi observado nos animais infectados pela cepa AAS aos 270 dias. De forma diferente, nos animais infectados pela cepa VL-10 foi observado aumento significativo da duração da onda P em relação aos valores detectados antes da infecção. Entre os cães inoculados com a cepa Berenice-78, tratados e curados, a duração da onda P foi similar ao observado em cães não infectados pelo T.cruzi. Duração da onda P A B VL-10 AAS 0.08 Duração da onda P (s) 0.06 0.04 0.02 0.00 0.06 0.04 0.02 I 70 D I TN C Tratados com Bz CI C -2 20 D I TN C -1 I N C C Tratados com Bz CI 27 0D N I I I 70 D I -2 C TN TN C -1 C N 20 D I I 27 0D I 12 0D C N I 0.00 12 0D Duração da onda P (s) 0.08 Berenice-78 Duração da onda P (s) 0.08 0.06 0.04 0.02 I -2 20 D TC -1 TC 70 D I I N C I 27 0D I 12 0D C N I 0.00 Tratados com Bz CI Figura 6 - Medidas de duração da onda P apresentadas por cães infectados por 2.000 formas tripomastigotas/kg das cepas VL-10 (A), AAS (B) e Berenice-78 (C) do T.cruzi. Os exames foram realizados nos momentos antes (CNI), aos 120 dias (120DI) e aos 270 dias após a infecção (270DI). CI: Animais infectados e não tratados; TNC: Animais infectados pelo T.cruzi e não curados após tratamento e TC: tratados e curados após tratamento com Benznidazol. (∆) P<0,05 (diferença significativa em relação ao grupo controle não infectado-CNI). 57 Resultados A análise dos resultados relacionados à duração do intervalo PR, que reflete o tempo de condução elétrica pelo nodo átrio ventricular, mostrou resultados variáveis em relação aos animais infectados com as diferentes cepas do parasito. Nos animais infectados pelas cepas VL-10 e AAS foi detectada uma alteração significativa desta medida em relação à avaliação realizada antes da infecção. Nos animais infectados pela cepa Berenice-78, foi observada uma tendência à elevação deste intervalo. O tratamento específico preveniu a ocorrência de alterações no intervalo PR entre os animais infectados pelas cepas Berenice-78 e AAS. Por outro lado, foi observado um aumento progressivo do intervalo PR entre os animais infectados pela cepa VL-10 durante todo o período de avaliação, mostrando que nestes animais o tratamento não foi eficaz em alterar a evolução da doença. Foi observada correlação significativa usando Spearman rank test (p = 0,0051) entre duração do intervalo PR e presença de fibrose no átrio direito dos cães tratados ou não e infectados pelas três cepas do T.cruzi (figura 7). 58 Resultados Duração do intervalo PR A B AAS 0.050 I 70 D TN C -2 20 D I N C TN C Tratados com Bz CI D Berenice-78 r = 0,469 p = 0,0051 0.175 Duração do intervalo PR (s) 0.150 0.125 0.100 0.075 0.050 I -2 20 D TC -1 TC CI 70 D I I N C I 27 0D 12 0D N C I 0.025 I Duração do intervalo PR (s) -1 N 70 D I C TN Tratados com Bz CI I 0.025 -2 20 D I I TN C -1 C N I 27 0D 12 0D N C I 0.025 0.075 C 0.050 0.100 I 0.075 0.125 I 0.100 27 0D 0.125 0.150 12 0D # I 0.150 0.175 C Duração do intervalo PR (s) I Duração do intervalo PR (s) VL-10 0.175 0.15 0.10 0.05 0 2000 4000 6000 8000 10000 2 Tratados com Bz colágeno / 74931m Figura 7 - Medidas de duração do intervalo PR apresentadas por cães infectados por 2.000 formas tripomastigotas/kg das cepas VL-10 (A), AAS (B) e Berenice-78 (C) do T.cruzi. Os exames foram realizados nos momentos antes (CNI), aos 120 dias (120DI) e aos 270 dias após a infecção (270DI). CI: Animais infectados e não tratados; TNC: Animais infectados pelo T.cruzi e não curados após tratamento e TC: tratados e curados após tratamento com Benznidazol. (∆) P<0,05 (diferença significativa em relação ao grupo controle não infectado-CNI).(#) P<0,05 (diferença significativa entre TNC 270DI e TNC 120DI (D) Correlação entre duração do intervalo PR e fibrose observada no átrio direito de todos os cães incluídos no estudo. A medida da duração do complexo QRS que pode refletir alargamento dos ventrículos direito e esquerdo, bloqueio do ramo direito e esquerdo do feixe de Hiss, além de contrações ventriculares prematuras, também mostrou ser uma boa medida para indicar alterações entre os animais infectados pelo T.cruzi. Foi observada diferença significativa de aumento da duração do QRS apenas entre os animais infectados pela cepa VL-10 em relação aos animais no momento antes da infecção, entretanto foi 59 Resultados observada tendência de aumento dessa medida entre os cães infectados por todas as cepas estudadas (figura 8). Duração do QRS A B VL-10 AAS 0.10 Duração QRS (s) 0.08 0.06 0.04 0.02 0.08 0.06 0.04 I C -2 70 D I TN Tratados com Bz CI C TN C -1 C N 20 D I I I N C Tratados com Bz CI 27 0D I I 70 D I -2 C TN TN C -1 C N 20 D I I 27 0D I 12 0D C N I 0.02 12 0D Duração QRS (s) 0.10 Berenice-78 Duração QRS (s) 0.10 0.08 0.06 0.04 I TC -2 70 D I TC -1 C N 20 D I I 27 0D I 12 0D C N I 0.02 Tratados com Bz CI Figura 8 - Medidas de duração do complexo QRS apresentadas por cães infectados por 2.000 formas tripomastigotas/kg das cepas VL-10 (A), AAS (B) e Berenice-78 (C) do T.cruzi. Os exames foram realizados nos momentos antes (CNI), aos 120 dias (120DI) e aos 270 dias após a infecção (270DI). CI: Animais infectados e não tratados; TNC: Animais infectados pelo T.cruzi e não curados após tratamento e TC: tratados e curados após tratamento com Benznidazol. (∆) P<0,05 (diferença significativa em relação ao grupo controle não infectado-CNI). Além das medidas apresentadas, foram analisadas outras variáveis eletrocardiográficos dos cães infectados pelo T.cruzi (Apêndice 1). As linhas pontilhadas presentes nos gráficos indicam os valores de referência de normalidade descritos na literatura (Tylley et al., 2002). 60 Resultados As alterações qualitativas detectadas nos ECG dos animais infectados pelas cepas VL-10, AAS e Berenice-78, bem como nos dos animais submetidos ao tratamento com Bz então apresentados na Tabela 5. Aos 120 dias de infecção foram observadas alterações ao ECG de 33,3% (5 de 15) dos animais infectados pelo T. cruzi, sendo detectadas alterações de condução em 3 dos 15 animais avaliados. A evolução da infecção pôde ser demonstrada pelo aumento do número de animais que apresentaram alterações no ECG realizado 270 dias após a infecção. Nesta avaliação, além de anormalidades relacionadas à condução, também foram detectadas arritmias e aumento do número de animais apresentando sobrecargas átrio-ventriculares. Foram consideradas como alterações de ritmo a presença de contração ventricular prematura, presença de ondas P ectópicas, extrasístoles ventriculares e a Síndrome bradi-taqui, que consiste em disfunção do nodo sinusal promovendo variação rítmica com disfunção do intervalo QT, que se encontra prolongado e variável. Considerando todas as alterações detectadas nesta avaliação, 73,3% (11 de 15) dos animais apresentaram anormalidades ao ECG. Para avaliação da eficácia do Bz na prevenção de anormalidades eletrocardiográficas, os animais submetidos ao tratamento foram divididos em dois grupos baseando-se na avaliação da fibrose do tecido cardíaco. O primeiro grupo foi constituído pelos animais tratados que apresentaram redução de tecido conjuntivo fibroso no átrio direito (cepas AAS e Berenice-78) e o segundo pelos tratados que não apresentaram redução de fibrose (cepa VL-10). Os resultados desta avaliação mostraram que quando o tratamento preveniu a fibrose do tecido cardíaco também foi eficaz em prevenir as alterações ao ECG. Assim, entre os animais infectados pelas cepas Berenice-78 e AAS foram detectadas alterações ao ECG em apenas 1 animal na avaliação realizada 270 dias após a infecção. Além disso, nestes animais, não foi detectada nenhuma anormalidade relacionada a distúrbios de condução. Por outro lado, 75% dos animais tratados que não apresentaram redução da fibrose no tecido cardíaco apresentaram anormalidade no ECG, índice semelhante ao observado entre os animais não tratados (73,3%). 61 Resultados Tabela 5 - Alterações eletrocardiográficas qualitativas apresentadas por cães infectados por 2.000 tripomastigotas/kg das cepas VL-10, AAS e Berenice-78 do Trypanosoma cruzi e entre os cães infectados e tratados com benznidazol (Bz) que apresentaram ou não redução de fibrose. Os exames foram realizados nos momentos antes (AI), aos 120 dias (120DI) e aos 270 dias após a infecção (270DI). Alterações ECG Cães infectados (n=15) Tratados com Bz (n=14) Sem redução fibrose Com redução fibrose AI 120DI 270DI AI 120DI 270DI AI 120DI 270DI BIRD 0/15 1/15 0/15 0/4 0/4 0/4 0/10 0/10 0/10 BCRD 0/15 0/15 1/15 0/4 0/4 0/4 0/10 0/10 0/10 BAV 1o grau 0/15 2/15 1/15 0/4 0/4 2/4 0/10 0/10 0/10 BSA 1 o grau 0/15 0/15 1/15 0/4 0/4 0/4 0/10 0/10 0/10 BDAS 0/15 0/15 1/15 0/4 0/4 0/4 0/10 0/10 0/10 Alteração de ritmo 0/15 0/15 5/15 0/4 0/4 0/4 0/10 0/10 0/10 Sobrecarga de câmaras 0/15 5/15 8/15 0/4 1/4 3/4 0/10 0/10 1/10 11/15 (73,3%) 0/4 (0%) 1/4 (25%) 3/4 (75%) 0/10 (0%) 0/10 (0%) 1/10 (10%) Alterações ECG/ no de cães 0/15 (0%) 5/15 (33,3%) Bz – Benznidazol, BIRD – Bloqueio inconpleto do Ramo direito, BCRD – Bloqueio completo do Ramo direito, BAV– Bloqueio átrio ventricular, BSA – Bloqueio Sino-atrial e BDAS - Bloqueio da divisão antero-superior esquerda Na figura 9 estão mostrados traçados eletrocardiográficos representativos de alterações encontradas. A figura 9A mostra um traçado eletrocardiográfico de um cão infectado pela cepa VL-10 com aumento do intervalo PR, sendo este de 0,14 segundos, caracterizando bloqueio atrioventricular de 1o grau (BAV 1o grau). Contrações ventriculares prematuras (CVP) devido a distúrbios na formação do impulso ventricular, onde batimentos iniciados no ventrículo ocorrem antes do ritmo normal esperado, foram observadas em todas as derivações de um cão do grupo controle não tratado infectado pela cepa AAS. Além disso, foi observado neste animal também, extrasístole supraventricular com aberrância de condução (figura 9B). 62 Resultados O traçado mostrado na figura 9C mostra, na derivação precordial V10, ondas P ectópicas incidindo sobre a onda T e bloqueio sinoatrial em um cão infectado pela cepa AAS não submetido ao tratamento específico com Bz e a figura 9D mostra o traçado de um animal do grupo infectado pela cepa Berenice-78 apresentando também arritmia atrial devido à presença de ondas P ectópicas. A síndrome bradi-taqui foi observada em um cão pertencente ao grupo controle infectado pela cepa AAS (figura 9E). Por fim foi observado bloqueio completo do ramo direito do feixe de Hiss (BCRD) apenas em um animal não tratado infectado pela cepa Berenice-78 (figura 9F). Dessa forma, foi observado neste trabalho, alterações eletrocardiográficas em 60% dos animais infectados pela cepa VL-10, em 20% dos infectados pelas cepas AAS e em 40% dos infectados pela cepa Berenice-78 aos 120 dias de infecção nos grupos infectados não tratados com Bz. Aos 270 dias de infecção, 40% dos animais infectados pela cepa VL-10 e 80% dos inoculados com as cepas AAS e Berenice-78 se encontravam com anormalidades eletrocardiográficas. Observou-se que o tratamento com Bz foi capaz de prevenir alterações eletrocardiográficas aos 120 dias de infecção entre os cães infectados por todas as cepas. Entretanto aos 270 dias de infecção, o tratamento não foi capaz de prevenir as alterações entre os cães tratados não curados infectados pela cepa VL-10, mas foi capaz de reduzir entre os infectados pela cepa AAS, mesmo na ausência de cura entre esses animais. O tratamento preveniu as anormalidades eletrocardiográficas em todos os animais curados infectados pela cepa Berenice-78 (gráfico 5). 63 Resultados A B C D E F Figura 9 - Traçados eletrocardiográficos obtidos de cães infectados por 2.000 tripomastigotas/kg das cepas VL-10, AAS ou Berenice-78 do T.cruzi. (A) Aumento do intervalo PR (B) Contrações ventriculares prematuras (C) Bloqueio sinoatrial (D) arritmia atrial (E) Síndrome bradi-taqui e (F) bloqueio completo do ramo direito do feixe de Hiss. 64 Resultados VL-10 AAS Berenice-78 % ECG alterados 100 80 60 40 20 TNC CI A 12 I 0D 27 I 0D I A 12 I 0D 27 I 0D I A 12 I 0D 27 I 0D I A 12 I 0D 27 I 0D I A 12 I 0D 27 I 0D I A 12 I 0D 27 I 0D I 0 TC Gráfico 5 - Alterações eletrocardiográficas apresentadas por cães infectados por 2.000 formas tripomastigotas/kg das cepas VL-10, AAS e Berenice-78 do T.cruzi. Os exames foram realizados nos momentos antes (AI), aos 120 dias (120DI) e aos 270 dias após a infecção (270DI). CI: Animais infectados e não tratados; TNC: Animais infectados pelo Trypanosoma cruzi e não curados após tratamento com Bz e TC: tratados e curados após tratamento com Benznidazol. 5.7 Parâmetros imunológicos 5.7.1. Cinética de Imunoglobulina G (IgG) e isotipos (IgG1 e IgG2) nos soros de cães inoculados com as cepas VL-10, AAS e Berenice-78 do Trypanosoma cruzi A figura 10 mostra os índices de reatividade de anticorpos da classe IgG e das subclasses IgG1 e IgG2, detectados pela ELISA, nos soros de cães inoculados com as cepas VL-10, AAS e Berenice-78 do T. cruzi que não foram submetidos ao tratamento com o Bz e do grupo controle não infectado, em tempos similares aos avaliados nos animais infectados. As dosagens realizadas até os 90 dias de infecção foram realizadas no soro dos 10 cães infectados por cada cepa e mantidos sem tratamento. A partir da dosagem realizada aos 120 dias, devido a eutanásia da metade dos animais aos 90 dias de infecção, o soro dos cinco animais remanescentes foram utilizados para avaliação da cinética de anticorpos nos períodos mais tardios. 65 Resultados A IgG total D índice de reatividade 2.5 VL-10 AAS Berenice-78 CNI 2.0 1.5 1.0 0.5 B T5 T4 T3 T2 T1 T0 IgG 1 D 4.0 índice de reatividade A 45 I D 90 I D 12 I 0 D 21 I 0 D 27 I 0 D I A 45 I D 90 I D 12 I 0 D 21 I 0 D 27 I 0 D I A 45 I D 90 I D 12 I 0 D 21 I 0 D 27 I 0 D I 0.0 VL-10 AAS Berenice-78 CNI 3.5 3.0 2.5 2.0 1.5 1.0 0.5 C índice de reatividade D T5 T4 T3 T2 T1 T0 A 45 I D 90 I 12 DI 0 21 DI 0 27 DI 0 D I A 45 I D 90 I 12 DI 0 21 DI 0 27 DI 0 D I A 45 I D 90 I 12 DI 0 21 DI 0 27 DI 0 D I 0.0 IgG 2 2.5 VL-10 AAS Berenice-78 CNI 2.0 1.5 1.0 0.5 T5 T4 T3 T2 T1 T0 A 45 I D 90 I D 12 I 0 D 21 I 0 D 27 I 0 D I A 45 I D 90 I D 12 I 0 D 21 I 0 D 27 I 0 D I A 45 I D 90 I D 12 I 0 D 21 I 0 D 27 I 0 D I 0.0 Figura 10- Índices de reatividade de anticorpos da classe IgG, IgG1 e IgG2 determinados através de ELISA nos soros de cães inoculados com 2000 formas tripomastigotas sanguíneos das cepas VL-10, AAS e Berenice-78 do Trypanosoma cruzi. A) Imunoglobulinas da classe IgG, B) IgG1 e C) IgG2, sendo AI: antes da infecção, DI: dias de infecção; CNI grupo controle não infectado. As linhas pontilhadas indicam o índice de reatividade discriminante, sendo de 0.9 a 1.1 considerada zona duvidosa. 66 Resultados Anticorpos específicos da classe IgG foram detectados no soro de todos os cães infectados em torno do 15o dia de infecção (dados não mostrados), apresentando níveis ascendentes até por volta do 45o dia nos cães infectados pelas cepas AAS e Berenice-78 e até por volta do 90o dia nos infectados pela cepa VL-10, posteriormente se mantendo estáveis, apresentando altos níveis até o final do período de observação (figura 10 A). É interessante ressaltar que o soro dos animais infectados pela cepa AAS foram os que apresentaram menores índices de reatividade em relação ao observado no soro dos cães infectados pelas demais cepas. Em relação aos anticorpos específicos da subclasse IgG1 e IgG2 (figura 10 B e figura 10 C), os cães inoculados com as cepas VL-10, AAS e Berenice-78 do T.cruzi apresentaram perfis de produção dessas imunoglobulinas similares e ascendentes durante o período de observação, sendo anticorpos dessa classe também detectados a partir do 15o dia após inoculação no soro dos cães infectados pelas três cepas. Neste trabalho foi realizada a análise da correlação entre a intensidade do processo inflamatório aos 90 e 270 dias de infecção, com os índices de reatividade dos anticorpos da classe IgG e subclasses IgG1 e IgG2 também no mesmo período, apresentados pelos animais infectados pelas cepas estudadas (figura 11A, B e C). Foi possível observar correlação significativa entre a classe IgG e subtipos em relação à miocardite apresentada aos 90 e 270 dias de infecção. Aos 90 dias a maior correlação foi observada com o índice de reatividade da subclasse IgG (r = 0,77; p<0,0001) seguida pela subclasse IgG1(r = 0,73; p<0,0001). Entretanto aos 270 dias de infecção, a maior correlação foi observada entre inflamação e IgG1 (r = 0,94; p<0,0001). 67 Resultados 90 Dias de infecção 3 2 IgG total IgG total A3 1 270 dias de infecção 2 1 r = 0,77 p < 0,0001 0 50 r = 0,67 p =0,0004 0 100 150 200 250 300 100 Inflamação B 200 250 300 Inflamação 270 Dias de infecção 90 Dias de infecção 3 150 3 2 IgG 1 IgG 1 2 1 1 r = 0,94 p <0,0001 r = 0,73 p <0,0001 0 50 0 100 150 200 250 300 100 Inflamação C 3 150 200 250 300 Inflamação 90 Dias de infecção 3 2 270 dias de infecção IgG 2 IgG 2 2 1 1 r = 0,63 p = 0,021 0 50 r = 0,64 p =0,0031 0 100 150 200 250 300 100 Inflamação 150 200 250 300 Inflamação Figura 11 - Correlação entre miocardite e índices de reatividade de anticorpos da classe IgG (A), IgG1 (B) e IgG2 (C) determinados através de ELISA nos soros de cães inoculados com 2000 formas tripomastigotas sanguíneos das cepas VL-10, AAS e Berenice-78 do Trypanosoma cruzi e que foram eutanasiados aos 90 e 270 dias de infecção. 68 Resultados 5.7.2 Influência da quimioterapia específica com Bz na produção de anticorpos no soro de cães infectados pelo Trypanosoma cruzi Na figura 12 estão apresentados os níveis de anticorpos da classe IgG e subtipos IgG1 e IgG2 determinados nos soros dos cães inoculados com as diferentes cepas estudadas, e tratados ou não com Bz. A figura 12A mostra que os índices de reatividade de anticorpos da classe IgG, detectados nos soros dos cães inoculados com a cepa Berenice-78 tratados com Bz, foram similares aos detectados no soro dos cães não infectados. Por outro lado, nos soros dos animais infectados pela cepa VL-10 e AAS os índices de reatividade foram similares aos detectados nos soros de animais infectados e não tratados. O tratamento específico influenciou de forma mais marcante a evolução dos níveis de IgG1 (figura 12B), onde foram observados dois padrões distintos e relacionados à eficácia do tratamento com Bz. Nos cães infectados pela cepa Berenice78, tratados e curados, e nos infectados pela cepa AAS, tratados e não curados, o índice de reatividade do subtipo IgG1 foi similar ao dos animais do grupo controle não infectado. O segundo padrão foi observado nos animais inoculados com a cepa VL-10, que não foram curados pelo tratamento específico com Bz, nos quais foi observada uma redução do índice de reatividade em relação ao grupo controle, mas que permaneceu sempre acima da absorbância discriminante. A figura 12C apresenta o índice de reatividade dos anticorpos da classe IgG2, determinados nos soros dos cães inoculados com as diferentes cepas estudadas e tratados com Bz. Em todos os cães inoculados com as diferentes cepas, foi observado um perfil de IgG2 similar ao perfil de IgG, descrito anteriormente. 69 Resultados IgG total A índice de reatividade D 2.5 TNC (VL-10) TNC (AAS) TC (Berenice-78) CNI 2.0 1.5 1.0 0.5 T5 T4 T3 T2 T1 T0 IgG 1 B D 4.0 índice de reatividade A 45 I D 90 I D 12 I 0 D 21 I 0 D 27 I 0 D I A 45 I D 90 I D 12 I 0 D 21 I 0 D 27 I 0 D I A 45 I D 90 I D 12 I 0 D 21 I 0 D 27 I 0 D I 0.0 TNC (VL-10) TNC (AAS) TC (Berenice-78) CNI 3.5 3.0 2.5 2.0 1.5 1.0 0.5 T4 T5 T4 T5 T3 T2 T1 T0 IgG 2 C D 2.5 índice de reatividade A 45 I D 90 I D 12 I 0 D 21 I 0 D 27 I 0 D I A 45 I D 90 I D 12 I 0 D 21 I 0 D 27 I 0 D I A 45 I D 90 I D 12 I 0 D 21 I 0 D 27 I 0 D I 0.0 TNC (VL-10) TNC (AAS) TC (Berenice-78) CNI 2.0 1.5 1.0 0.5 T3 T2 T1 T0 A 45 I D 90 I D 12 I 0 D 21 I 0 D 27 I 0 D I A 45 I D 90 I D 12 I 0 D 21 I 0 D 27 I 0 D I A 45 I D 90 I D 12 I 0 D 21 I 0 D 27 I 0 D I 0.0 Figura 12 - Índices de reatividade de anticorpos da classe IgG, IgG1 e IgG2 determinados através de ELISA nos soros de cães inoculados com 2000 formas tripomastigotas sanguíneos das cepas VL-10, AAS e Berenice-78 do Trypanosoma cruzi e tratados ou não com o Benznidazol. A) Imunoglobulinas da classe IgG, B) IgG1 e C) IgG2. Sendo: TNC tratados com Benznidazol e não curados, TC tratados com Benznidazol e curados e CNI controle não infectado. As linhas pontilhadas indicam o índice de reatividade discriminante, sendo de 0.9 a 1.1 considerada zona duvidosa. 70 Resultados Foi possível também observar correlação significativa entre as classes IgG e miocardite apresentada aos 90 e 270 dias de infecção, quando foram adicionados à análise os cães submetidos ao tratamento com Bz. Aos 90 dias de infecção a maior correlação entre inflamação foi observada em relação à IgG total (r =0,76; p<0,0001). Aos 270 dias de infecção foi observada maior correlação de inflamação entre os anticorpos do subtipo IgG1 (r = 0,79; p<0,0001) (figura 13). 3 90 Dias de infecção 3 270 Dias de infecção 2 IgG total IgG total A 1 2 1 r = 0,70 p < 0,0001 r = 0,76 p < 0,0001 0 0 100 200 300 400 100 Inflamação B 3 200 300 400 Inflamação 90 Dias de infecção 4 270 Dias de infecção 3 IgG 1 IgG 1 2 2 1 1 r = 0,66 p <0,0001 0 100 200 300 r = 0,79 p < 0,0001 0 400 100 Inflamação C 2.5 200 300 400 Inflamação 90 Dias de infecção 3 270 Dias de infecção 2 1.5 IgG 2 IgG 2 2.0 1.0 1 0.5 r = 0,70 p < 0,0001 r = 0,67 p < 0,0001 0 0.0 100 200 300 100 400 200 300 400 Inflamação Inflamação Figura 13 - Correlação entre miocardite e índices de reatividade de anticorpos da classe IgG (A), IgG1 (B) e IgG2 (C) determinados através de ELISA nos soros de cães inoculados com 2000 formas tripomastigotas sanguíneos das cepas VL-10, AAS e Berenice-78 do Trypanosoma cruzi e que foram tratados ou não com Bz, eutasiados aos 270 dias de infecção. 71 Resultados 5.7.3 Avaliação da proliferação de células mononucleares do sangue periférico (CMSP) Neste estudo foi avaliada a reatividade (proliferação) celular de CMSP isoladas dos cães experimentalmente infectados pelas cepas VL-10, AAS e Berenice-78 do T.cruzi, após estimulação in vitro por antígeno de formas tripomastigotas de T.cruzi. Os resultados de reatividade celular foram expressos como índice de estimulação (IE), ou seja, o quociente da divisão entre os valores obtidos para a cultura estimulada e os valores obtidos para a cultura controle (figura 14). A B C D Figura 14 - Análise representativa de proliferação de linfócitos do sangue periféricos de cães infectados pelo Trypanosoma cruzi por meio de incorporação de CFSE, utilizando citometria de fluxo. As análises foram realizadas através do software FlowJo. A) Células não marcadas B) Células marcadas com CFSE C) Células marcadas com CFSE e estimuladas com antígenos de T.cruzi e D) Células marcadas com CFSE e estimuladas com Concanavalina A. 72 Resultados Os resultados mostraram que o tratamento com Bz foi capaz de prevenir a reatividade celular durante o período de tratamento (45 dias de infecção), sendo a resposta proliferativa das CMSP dos animais tratados significativamente menor (p<0,05) do que a detectada nos animais infectados e não tratados e similar ao observado no grupo controle não infectado pelo T.cruzi, no mesmo período de avaliação (gráfico 6). Possivelmente esse fato se deve à redução da carga parasitária induzida pelo Bz neste período, justificado pelo menos parcialmente, pela diminuição da estimulação celular. Entretanto, quando esta mesma avaliação foi realizada aos 90 dias após a infecção dos animais (imediatamente após o término do tratamento com Bz) foi observado que os animais tratados apresentaram resposta proliferativa similar à observada no grupo controle infectado e significativamente mais elevada à observada na avaliação de 45 dias e à dos animais não infectados. 45 dias de infecção 4 índice de estimulação 90 dias de infecção 3 2 # # # 1 CNI CI TN VL10 C (V L10 ) A TN A S C ( A B A er en S) ic TC e-7 (B 8 e78 ) C N I TN VL10 C (V L10 ) TN AA S C (A B A er en S) ic TC e-7 (B 8 e78 ) C N I 0 T-Bz Gráfico 6 - Reatividade das células mononucleares do sangue periférico obtidas de cães experimentalmente infectados com 2000 formas tripomastigotas sangüíneos/kg de peso corporal das cepas VL-10, AAS e Berenice-78 do Trypanosoma cruzi após estimulação in vitro. Os resultados foram expressos como índice de estimulação. CI) grupo controle infectado, T-Bz) grupo tratado com Bz, TC) grupo tratado curado e TNC) grupo tratado e não curado (∆) P<0,05 (diferença significativa em relação CNI) (#)P<0,05 (diferença significativa em relação ao grupo não tratado infectado com a respectiva cepa) 73 Resultados 5.7.4 Avaliação da proporção de linfócitos TCD4+ e TCD8+ nas células mononucleares do sangue periférico Visando investigar o balanço do envolvimento da resposta imune adaptativa auxiliar e citotóxica durante o fase aguda da infecção, foi calculada a razão entre os valores percentuais de linfócitos TCD4+ e TCD8+ do sangue periférico dos cães infectados pelas cepas VL-10, AAS e Berenice-78 do T.cruzi. A avaliação foi realizada pela soma dos quadrantes 1 e 2 do gráfico FL4:CD4+ versus FL1:CFSE e FL4:CD8+ versus FL1:CFSE da cultura que foi estimulada pelo antígeno do T.cruzi (figura 15). A B Figura 15 - Análise representativa de avaliação da proporção de linfócitos TCD4+ e TCD8+ obtidas do sangue periférico de cães infectados pelo Trypanosoma cruzi e marcadas pelo CFSE, utilizando citometria de fluxo. As análises foram realizadas através do software FlowJo. Linfócitos marcados por anticorpos anti-CD4+ (A) e anti-CD8+ (B). A proporção e a razão CD4/CD8 estão representados na figura 16. A análise dos resultados permitiu observar que a proporção entre linfócitos TCD4+ e TCD8+ em cultura estimulada de CMSP de cães não infectados é de aproximadamente 80:20, sendo a razão CD4+/CD8 variante entre 3,6 e 3,8. Foi observado que no decorrer da infecção pelo T.cruzi ocorre aumento da proporção de linfócitos TCD8+ em relação aos TCD4+, sendo a razão diminuída da avaliação realizada aos 45 e 90 dias de infecção de 4,6 para 3,6 entre os animais infectados pela cepa VL-10 e de 2,5 para 1,6 entre os inoculados com a cepa Berenice-78. A razão permaneceu constante na cultura de CMSP obtidas dos cães infectados pela cepa AAS. 74 Resultados Na cultura de CMSP obtidas dos cães submetidos ao tratamento com Bz foi observado acúmulo ainda maior de linfócitos TCD8+ em relação aos TCD4+ sendo a proporção de aproximadamente 60:40 (razão de 1,6) observada nas culturas obtidas dos cães infectados pelas cepa AAS e Berenice-78 aos 90 dias de infecção e de 1,9 nos inoculados com a cepa VL-10. A 45 dias de infecção Razão CD4+/CD8+ 3,8 % Linfócitos TCD4/TCD8 100 4,6 2,6 2,7 2,0 2,5 2,5 80 60 40 20 er en ic eer 78 en ic e78 ) A S) (A TC (B B TN C TN C A A S 10 ) -1 0 (V L- VL C N I 0 T CD4+ B T CD8+ 90 dias de infecção Razão CD4+/CD8+ 3,6 % Linfócitos TCD4/TCD8 100 3,6 1,9 2,8 1,6 1,65 1,6 80 60 40 20 ni er e (B TC B er en i ce -7 8 ce -7 8) A S) (A A A S TN C (V L10 ) -1 0 VL TN C C N I 0 Figura 16 - Razão entre a freqüência de linfócitos TCD4+ e TCD8+ (Razão CD4+/CD8+) encontrada em cultura de células mononucleares do sangue periférico estimulada, obtidas de cães infectados pelo Trypanosoma cruzi aos 45 (A) e 90 dias de infecção (B). CNI: grupo controle não infectado; TNC: grupo tratado com Bz e não curado; TC: grupo tratado e curado. 75 Resultados 5.7.5 Avaliação da apoptose de células mononucleares do sangue periférico Para avaliação da apoptose de linfócitos TCD4+ e TCD8+ presentes em cultura de CMSP obtidas dos cães infectados pelas cepas VL-10, AAS e Berenice-78 do T.cruzi, estas foram marcadas com anexina-V e analisadas por citometria. A figura 17 mostra um gráfico obtido pelo software FlowJo representativo de marcação por anticorpo antiCD4+Alexa Flúor647 e pela Anexina-V FITC, onde o quadrante mostrado especifica a localização dos linfócitos TCD4+ (ou TCD8+, em outro tubo) em apoptose. A B Figura 17 - Análise representativa de avaliação da apoptose de linfócitos TCD4+ e TCD8+ obtidos de cultura de células mononucleares do sangue periférico de cães infectados pelo Trypanosoma cruzi, utilizando citometria e software FlowJo. Linfócitos marcados por anticorpos anti-CD4+ (A) e anti-CD8+ (B). No gráfico 7 estão representados os resultado da avaliação da apoptose dos linfócitos T CD4+ avaliados após 48 horas de cultura. Os resultados foram obtidos do número de linfócitos em apoptose quantificados na cultura estimulada pelo antígeno de T.cruzi. 76 45 dias de infecção 90 dias de infecção 20 15 10 * * # # 5 # CNI CI 78 ) -7 8 e- A TC ic e en (B S) S B er 0) A TN C (A A (V L -1 0 TN C VL -1 I N C TN VL10 C (V L10 ) T N AA S C (A B A er en S) ic TC e-7 (B 8 e78 ) 0 C N I % de Linfócitos T CD4+ em apoptose Resultados T-Bz Gráfico 7 - Análise da apoptose de linfócitos TCD4+ presentes em células mononucleares do sangue periférico mantidas em cultura por 48 horas e estimulados com antígeno de Trypanosoma cruzi, obtidas dos grupos não infectado (CNI) e infectado (CI) com 2000 formas tripomastigotas sangüíneos/kg de peso corporal das cepas VL-10, AAS e Berenice-78 do T.cruzi. T-Bz: grupo tratado com o Benznidazol, TC: grupo tratado curado e TNC: grupo tratado e não curado (∆) P<0,05 (diferença significativa em relação ao CNI). (#)P<0,05 (diferença significativa em relação ao grupo não tratado infectado com a respectiva cepa) Aos 45 dias de infecção foi observada apoptose de linfócitos TCD4+ apenas nas células obtidas dos cães infectados pela cepa AAS, entretanto aos 90 dias de infecção foi observada apoptose nestas células obtidas dos cães infectados com as três cepas do T.cruzi estudadas. Interessantemente, o tratamento com Bz foi capaz de impedir que os linfócitos TCD4+ em cultura entrassem em apoptose, já que foram observados índices similares de apoptose de linfócitos TCD4+ nos animais tratados com Bz e nos não infectados, sendo estes indices significativamente menores do que aqueles observados nos animais infectados (não tratados) com as diversas cepas. Em relação a apoptose de linfócitos TCD8+, entre as células obtidas dos cães infectados e não tratados com Bz foi observada apoptose naquelas coletadas dos infectados com as cepas AAS e Berenice-78, mas não nas dos infectados pela VL-10 em ambos os momentos de avaliação. Em relação aos linfócitos dos cães submetidos à quimioterapia não foi observada apoptose entre os infectados pela cepa AAS e Berenice- 77 Resultados 78, mas curiosamente foi observada maior perda de linfócitos TCD8+ naqueles infectados 45 dias de infecção 15 10 90 dias de infecção * * # 5 CNI CI TN VL10 C (V L10 ) TN AA S C (A B A er en S) ic TC e-7 (B 8 e78 ) I N C TN VL10 C (V L10 ) TN AA S C (A B A er en S) ic TC e-7 (B 8 e78 ) 0 C N I % de Linfócitos T CD8+ em apoptose pela cepa VL-10 que foram tratados com Bz, mas que não foram curados (gráfico 8). T-Bz Gráfico 8 - Análise da apoptose de linfócitos TCD8+ presentes em células mononucleares do sangue periférico mantidas em cultura por 48 horas e estimulados com antígeno de Trypanosoma cruzi, obtidas dos grupos não infectado (CNI) e infectado (CI) com 2000 formas tripomastigotas sangüíneos/kg de peso corporal das cepas VL-10, AAS e Berenice-78 do T.cruzi. T-Bz: grupo tratado com o Benznidazol, TC: grupo tratado curado e TNC: grupo tratado e não curado (∆) P<0,05 (diferença significativa em relação ao CNI). (#)P<0,05 (diferença significativa em relação ao grupo não tratado infectado com a respectiva cepa) 5.7.6 Quantificação dos níveis das citocinas IFN-γ, IL-10 e TNF-α no sobrenadante das culturas de células mononucleares do sangue periférico dos cães infectados pelo Trypanosoma cruzi Para avaliação da resposta imune celular dos cães experimentalmente infectados pelas cepas VL-10, AAS e Berenice-78 do T.cruzi foram realizadas, através de ELISA, as dosagens das citocinas IFN-γ, TNF-α e IL-10 no sobrenadante das culturas de CMSP. Entre os cães infectados pelas cepas VL-10 e Berenice-78, os níveis de IFN-γ aumentaram progressivamente no decorrer da infecção, atingindo maiores níveis na cultura de CMSP dos cães infectados pela cepa VL-10 aos 90 dias de infecção. Na cultura das células dos infectados pela cepa AAS foi observado aumento mais rápido 78 Resultados dessa citocina, sendo que o máximo detectado foi na cultura realizada aos 45 dias de infecção, se mantendo estável na avaliação seguinte (Gráfico 9). p<0,05 2.0 p<0,05 p<0,05 * IFN- ng/mL * 1.5 * * * * 1.0 p<0,05 p<0,05 0.5 B er en ic e78 B er A en I ic e78 B 45 er D en I ic e78 90 D I 90 D I A A S A I 45 D I A A S A A S 90 D I VL - 10 45 D I 10 VL - VL - 10 A I 0.0 Gráfico 9 - Quantificação de IFN-γ, através do ELISA, no sobrenadante de células mononucleares do sangue periférico de cães infectados com 2000 formas tripomastigotas sangüíneos/kg de peso corporal das cepas VL-10, AAS e Berenice-78 do Trypanosoma cruzi nos momentos antes (AI) 45 e 80 dias de infecção (DI) (*) P<0,05 (diferença significativa em relação ao CNI). A dosagem de IFN-γ no sobrenadante da cultura de células mononucleares dos cães submetidos ao tratamento com Bz está representada na figura 18. O tratamento foi capaz de reduzir a produção de IFN-γ nas culturas obtidas dos animais curados e nos não curados infectados pelas cepas Berenice-78 e AAS, respectivamente (figuras 18B e C). Entre as culturas obtidas dos animais não curados infectados pela cepa VL-10 não foi observada diferença entre as culturas dos animais tratados ou não. Este fato poderia estar correlacionado com o padrão de lesão cardíaca semelhantes entre estes animais, mostrando o alto padrão de resistência ao quimioterápico apresentado por esta cepa (figura 18A). 79 Resultados A B VL-10 AAS p<0,05 1.5 p<0,05 2.0 * * * p<0,05 * IFN- ng/mL * 1.0 0.5 * 1.5 * * 1.0 0.5 p<0,05 CI TNC I I D 90 I D 45 A I D 90 D I A I D I 90 I D 45 A I I D 90 I D 45 A CI I 0.0 0.0 45 IFN- ng/mL 2.0 TNC Berenice-78 C 2.0 p<0,05 p<0,05 IFN- ng/mL * 1.5 * * * 1.0 0.5 CI I I 90 D 45 D A I I I 90 D 45 D A I 0.0 TC Figura 18- Quantificação de IFN-γ, através do ELISA, no sobrenadante de células mononucleares do sangue periférico de cães infectados com 2000 tripomastigotas sangüíneos/kg de peso corporal das cepas VL-10 (A), AAS (B) e Berenice-78 (C) do Trypanosoma cruzi submetidos ao tratamento com Bz. TNC Tratado com Benznidazol e não curado; CI: controle infectado; TC: tratado curado (*) P<0,05 (diferença significativa em relação ao CNI). Os níveis de IL-10 detectados nas culturas de CMSP obtidas dos animais do grupo controle infectado estão mostrados no gráfico 10. Níveis mais altos e ascendentes desta citocina também foram observados nas culturas obtidas dos cães infectados pela cepa VL-10. Níveis intermediários foram detectados nas culturas dos animais infectados pelas cepas AAS e Berenice-78 aos 45 e 90 dias de infecção. Nas culturas obtidas dos animais infectados pela cepa Berenice-78 os níveis de IL-10 permaneceram estáveis nas duas avaliações, sendo detectada uma redução significativa destes níveis nas culturas dos animais infectados com a cepa AAS. 80 Resultados Estes dados mostram que a IL-10 mesmo sendo uma citocina anti-inflamatória é bastante produzida por linfócitos oriundos de infecção aguda com presença de intensa miocardite, como foi o caso dos animais infectados pelas cepas VL-10 e Berenice-78 aos 90 dias de infecção, e menor entre os infectados pela cepa AAS. p<0,05 30 * * IL-10 ng/mL p<0,05 p<0,05 p<0,05 20 * * * * 10 p<0,05 I 90 D I B er en ic e78 45 D I e78 er en ic B B er en ic S e78 A I 90 D I A A S A A A A S 45 A D I D I 90 VL - 10 45 10 VL - VL - 10 A I D I 0 Gráfico 10 - Quantificação de IL-10, através do ELISA, no sobrenadante de células mononucleares do sangue periférico de cães infectados com 2000 tripomastigotas sangüíneos/kg de peso corporal das cepas VL-10, AAS e Berenice-78 do Trypanosoma cruzi nos momentos antes (AI) 45 e 90 dias de infecção (DI) (*) P<0,05 (diferença significativa em relação ao CNI). A influência do tratamento nos níveis de IL-10 foi relacionada com a população do T. cruzi. Nos animais infectados pela cepa VL-10 e tratados foi observada uma redução significativa na produção desta citocina pelas CMSP em relação aos animais não tratados. Padrão diverso foi observado nos cães tratados infectados pelas cepas Berenice78 e AAS, onde os níveis de IL-10 nas culturas de CMSP foram semelhantes aos dos animais não tratados. Além disso, nas culturas de CMSP obtidas dos animais curados foi observada uma elevação significativa da produção de IL-10 ao final do tratamento (figura 19A, B e C). 81 Resultados A B VL-10 AAS p<0,05 * * IL-10 ng/mL 30 p<0,05 p<0,05 p<0,05 IL-10 ng/mL 30 20 * * 10 p<0,05 20 * * * * 10 p<0,05 I I 90 D I A CI 45 D I I 90 D I A TNC 45 D I I 90 D I A CI 45 D I 90 D 45 D A I 0 I 0 TNC Berenice-78 C 30 IL-10 ng/mL p<0,05 p<0,05 20 * * * * 10 CI I I 90 D 45 D I A I I 90 D 45 D A I 0 TC Figura 19 - Quantificação de IL-10, através do ELISA, no sobrenadante de células mononucleares do sangue periférico de cães infectados com 2000 formas tripomastigotas sangüíneos/kg de peso corporal das cepas VL-10 (A), AAS (B) e Berenice-78 (C) do Trypanosoma cruzi submetidos ao tratamento com Bz. TNC Tratado com Benznidazol e não curado; CI: controle infectado; TC: tratado curado (*) P<0,05 (diferença significativa em relação ao CNI). A quantificação do TNF-α no sobrenadante das culturas de CMSP dos cães infectados pelas cepas VL-10, AAS e Berenice-78 revelou similaridade nos níveis de produção desta citocina nas culturas obtidas dos cães infectados pelas três cepas, sendo observado aumento aos 45 dias de infecção e se mantendo estável até os 90 dias (gráfico 11). . 82 Resultados TNF- ng/mL 0.5 * * * * * 0.4 * 0.3 0.2 0.1 I 90 D I e78 45 D er en ic B e78 er en ic B B er en ic S e78 A I D I 90 D I A A S A A A A S 45 A I D I 90 10 45 VL - 10 VL - VL - 10 A I D I 0.0 Gráfico 11 - Quantificação de TNF-α, através do ELISA, no sobrenadante de células mononucleares do sangue periférico de cães infectados com 2000 tripomastigotas sangüíneos/kg de peso corporal das cepas VL-10, AAS e Berenice-78 do Trypanosoma cruzi nos momentos antes (AI) 45 e 80 dias de infecção (DI) (*) P<0,05 (diferença significativa em relação ao CNI). O tratamento com Bz induziu uma marcante redução na produção de TNF-α pelas CMSP obtidas dos cães infectados pelas cepas VL-10, AAS e Berenice-78 do T.cruzi (figura 20). Entre os animais infectados pelas três cepas, independente da eficácia terapêutica do Bz, o pico de produção do TNF-α foi aos 45 dias de infecção, não sendo observada redução, neste momento, associada à cepa VL-10 (figura 20A). Aos 90 dias de infecção o Bz foi capaz de prevenir a produção desta citocina independente da susceptibilidade da cepa envolvida. Entretanto os níveis foram significativamente maiores do que aqueles detectados nas culturas dos animais não infectados na cultura de CMSP dos cães infectados pelas cepas VL-10 e AAS, e similares na cultura dos cães curados que foram infectados pela cepa Berenice-78 (figura 20A, B e C). 83 Resultados A B VL-10 AAS p<0,05 p<0,05 0.5 * * p<0,05 p<0,05 0.3 * 0.2 0.1 0.4 * 0.3 0.2 * 0.1 TNC CI I I 90 D I 45 D A I 90 D I I A 45 D I I 90 D I A CI 45 D I 90 D 45 D A I 0.0 I 0.0 p<0,05 * * * 0.4 TNF- ng/mL TNF- ng/mL 0.5 TNC Berenice-78 C TNF- ng/mL 0.5 p<0,05 * 0.4 p<0,05 * p<0,05 0.3 * 0.2 0.1 I I 90 D I A CI 45 D I I 90 D 45 D A I 0.0 TC Figura 20 - Quantificação de TNF-α, através do ELISA, no sobrenadante de células mononucleares do sangue periférico de cães infectados com 2000 formas tripomastigotas sangüíneos/kg de peso corporal das cepas VL-10 (A), AAS (B) e Berenice-78 (C) do Trypanosoma cruzi submetidos ao tratamento com Bz. TNC Tratado com Benznidazol e não curado; CI: controle infectado; TC: tratado curado (*) P<0,05 (diferença significativa em relação ao CNI). 5.7.7 Quantificação da expressão de mRNA das citocinas IFN-γ, IL-10 e TNF-α no átrio direito dos cães infectados pelo Trypanosoma cruzi Para avaliação da expressão das citocinas IFN-γ, IL-10 e TNF-α no tecido cardíaco dos cães, foi utilizada a PCR em tempo real usando a estratégia de quantificação relativa, onde a expressão gênica de cada citocina foi determinada em relação a expressão observada por cão não infectado pelo T.cruzi e normalizada pelo gene constitutivo β- 84 Resultados actina. Assim, os resultados foram mostrados em quantas vezes mais, determinado animal possui mRNA para a citocina do que os cães controles não infectados. Para isso, inicialmente foi necessário um experimento de validação, mostrando que as eficiências das amplificações do alvo e do gene de referência (β-actina) eram aproximadamente iguais. A eficiência de amplificação é a taxa na qual uma molécula de DNA é gerada, se a quantidade de cópias aumentar 10 vezes a cada 3,32 ciclos de amplificação durante a fase geométrica, então a reação está ocorrendo com 100% de eficiência. Essa eficiência é calculada baseando-se no slope de uma curva padrão, onde o slope de -3,32 indica uma reação com 100% de eficiência (figura 21). A B C D Figura 21 - Curvas padrão gerada com 7 diluições seriadas de uma mesma amostra de cDNA para verificação das eficiências dos primers para IFN-γ (A), IL-10 (B), TNF-α(C) e β-actina(D) 85 Resultados Para o calculo da eficiência foi utilizada a seguinte fórmula: Eficiência = (10-1/slope – 1) x 100 Os resultados mostraram que os primers para amplificação das citocinas IFN- γ, IL-10, TNF-α e β-actina escolhidos foram próximos de 100%, mostrando slopes de -3.2, -3.26, -3,27 e -3,24, que correspondem às eficiências de 105%, 102%, 101% e 103%, respectivamente. É interessante ressaltar também que os coeficientes de correlação (valor R2) foram sempre próximos de 1 (figura 21). Foi observado, ainda, se os ciclos de amplificação (CT) para cada cDNA das citocinas se comportavam de forma semelhante após diluição seriada de uma mesma amostra, verificando eventuais inibições que pudessem comprometer o experimento. A figura 22 mostra uma uniformidade dos CT para os cDNA das citocinas se comportaram após a diluição. A B C D Figura 22 - Ciclos de amplificação gerados com diluições seriadas de uma mesma amostra de cDNA para verificação das eficiências dos primers para IFN-γ (A), IL-10 (B), TNF-α(C) e βactina(D) 86 Resultados É importante ressaltar que foram também plotados gráficos de log de quantidade de entrada de cDNA (cada diluição) versus variação do CT das citocinas e do gene constitutivo para comprovação matemática que permaneciam constantes após a diluição da amostra, se mostrando na forma de uma reta, com equação do tipo y = ax + b, onde o “a” corresponde a inclinação da reta, que não deveria sair do intervalo de -0,1 e 0,1. Os valores encontrados foram de -0,007, -0,025. 0,0104 e -0,009 para o IFN-γ, IL-10, TNF-α e β-actina respectivamente, confirmando não haver inibição da reação. Ainda para maior confiabilidade da técnica foi importante observar as curvas de dissociação (ou curva melt) para os cDNA correspondentes aos mRNA das citocinas estudadas, para verificação de formação de dímeros de primers durante a reação. Na figura 23 podem ser observadas as curvas de Melt para os cDNA dos mRNA das três citocinas e da β-actina, mostrando os respectivos Tm. Figura 23 - Curva de dissociação do cDNA amplificado dos mRNA para as citocinas IFN-γ, IL10, TNF-α e do controle endógeno β-actina, com picos em torno de 71oC, 75oC, 84oC e 74oC, respectivamente Os resultados da padronização mostrados indicaram que a estratégia de quantificação relativa poderia ser utilizada com segurança para a realização dos experimentos de avaliação da expressão dos mRNA para as citocinas IFN-γ, IL-10, TNF- 87 Resultados α no átrio direito dos cães infectados pelas cepas VL-10, AAS e Berenice-78 durante as fases aguda (90 dias) e crônica da infecção (270 dias de infecção). A figura 24 mostra os níveis de expressão de IFN- γ. IFN- (90 dias de infecção) A expressão RNAm 4 * * 3 p=0,002 p=0,034 * p=0,018 2 p=0,06 p=0,063 p=0,615 1 (V L10 TN ) C TC (A A (B S) er en ic e78 ) TN C A A B S er en ic e78 VL - 10 0 IFN- (270 dias de infecção) B * p=0,022 18 expressão RNAm 9 4 3 * p=0,041 2 p=0,162 p=0,144 p=0,669 p=0,963 1 (V L10 TN ) C TC (A A (B S) er en ic e78 ) TN C A A B S er en ic e78 VL - 10 0 Figura 24 - Níveis de expressão de IFN-γ no átrio direito de cães infectados pelas cepas VL-10, AAS e Berenice-78 do Trypanosoma cruzi, necropsiados aos 90 dias (A) e 270 dias de infecção (B) TNC: Tratado com Benznidazol e não curado; TC: tratado curado (*) P<0,05 (diferença significativa em relação a 1- linha pontilhada - teste t de student, com hipótese nula igual a 1). 88 Resultados Foi possível observar aumento médio de 2,5 vezes mais expressão de mRNA para IFN-γ no miocárdio dos animais infectados pelas cepas VL-10 e AAS e de 1,5 vez naqueles infectados pela cepa Berenice-78 quando avaliados aos 90 dias de infecção. Entre os cães submetidos ao tratamento com Bz não foi observada redução da expressão entre os infectados pela cepa VL-10, mas sim entre os infectados tratados não curados pela cepa AAS. Apesar de não haver diferença significativa na expressão entre os tratados ou não, infectados pela cepa Berenice-78, naqueles tratados curados a expressão foi semelhante à observada em cães não infectados, com razão próxima de 1 (Figura 24A). Na avaliação realizada aos 270 dias de infecção foi observado aumento médio de 2,2 vezes na expressão entre os animais controles infectados pela cepa VL-10 e de cerca de 1,4 vez entre os infectados pelas cepas AAS e Berenice-78. Esses níveis de expressão podem ser correlacionados com o maior processo inflamatório observado nos cães infectados pela cepa VL-10, nesse momento da infecção. Ainda, altos níveis de expressão de IFN-γ foram observados nos animais tratados não curados infectados pela cepa VL10, e menores entre os tratados não curados infectados pela cepa AAS e curados infectados pela cepa Berenice-78, correlacionando também com o fato do tratamento não interferir na inflamação observada entre os animais infectados pela VL-10, mas sim nos infectados pelas outras duas cepas (Figura 24B). Aos 90 dias de infecção também os maiores níveis de expressão de mRNA para a citocina IL-10 foram observados no átrio direito dos cães infectados pela cepa VL-10 do T.cruzi, com expressão média de 2,5 vezes maior que aquela observada em animais não infectados. Expressão significativa também foi observada entre os cães infectados pela cepa Berenice-78, podendo também ser correlacionada com maior miocardite encontrada nesse momento da infecção entre os cães inoculados com as cepas VL-10 e Berenice-78 e menores entre os infectados pela AAS. O tratamento com Bz preveniu a expressão para IL-10 entre os cães infectados pela VL-10, mas interessantemente, apesar de não ter sido diferença significativa, os animais curados infectados pela cepa Berenice-78 expressaram 2 vezes mais que os animais não infectados pelo T.cruzi, assim como apresentaram aumento dessa citocina na cultura de CMSP, quantificada através do método de ELISA (Figura 25A). Aos 270 dias de infecção os maiores níveis de expressão também foram observados nos cães infectados pelas cepas VL-10 e Berenice-78 e, nos animais tratados 89 Resultados com o Bz, expressão significativa foi encontrada somente nos animais não curados inoculados com a cepa VL-10 (Figura 25B). IL-10 (90 dias de infecção) A expressão RNAm 4 3 * p=0,002 p=0,113 * 2 p=0,049 p=0,638 p=0,683 p=0,664 1 (V L10 TN ) C TC (A A (B S) er en ic e78 ) TN C A A B S er en ic e78 VL - 10 0 IL-10 (270 dias de infecção) B 4 expressão RNAm * p=0,046 3 p=0,078 p=0,236 2 p=0,412 p=0,515 p=0,644 1 (V L10 TN ) C TC (A A (B S) er en ic e78 ) TN C A A B S er en ic e78 VL - 10 0 Figura 25 - Níveis de expressão de IL-10 no átrio direito de cães infectados pelas cepas VL-10, AAS e Berenice-78 do Trypanosoma cruzi, necropsiados aos 90 dias (A) e 270 dias de infecção (B) TNC: Tratado com Benznidazol e não curado; TC: tratado curado (*) P<0,05 (diferença significativa em relação a 1 - linha pontilhada - teste t de student, com hipótese nula igual a 1). A expressão de mRNA para a citocina TNF-α no miocárdio dos cães está mostrada na Figura 26. 90 Resultados TNF- (90 dias de infecção) A 8 * p=0,013 * p=0,036 expressão RNAm 7 * p=0,03 6 5 * 4 p=0,023 3 2 p=0,836 1 p=0,99 ) TC (B er TN C en ic (A e- A 78 S) 0) (V L1 C TN A A S er en ic e78 B VL - 10 0 TNF- (270 dias de infecção) B * p=0,047 expressão RNAm 16 8 8 7 6 * p=0,047 5 p=0,052 4 3 p=0,205 2 p=0,364 p=0,98 1 ) -7 8 ce er (B TC TN C en i (A A S) 0) (V L1 C TN A A S er en ic e78 B VL - 10 0 Figura 26 - Níveis de expressão de TNF-α no átrio direito de cães infectados pelas cepas VL-10, AAS e Berenice-78 do Trypanosoma cruzi, necropsiados aos 90 dias (A) e 270 dias de infecção (B) TNC: Tratado com Benznidazol e não curado; TC: tratado curado (*) P<0,05 (diferença significativa em relação a 1 - linha pontilhada - teste t de student, com hipótese nula igual a 1). De forma geral, foi encontrado no miocárdio dos cães infectados pelas cepas VL10, AAS e Berenice-78 do T.cruzi elevados níveis de expressão para a citocina TNF-α 91 Resultados aos 90 dias de infecção, variando de 5 a 6 vezes mais expressão em relação aos animais não infectados. Nesse momento foi observado que o tratamento dos cães com Bz foi capaz de prevenir a expressão de mRNA para TNF-α entre todos os grupos, independente do grau de resistência das cepas (Figura 26 A). Aos 270 dias de infecção, maiores níveis de expressão foram observados entre os grupos infectados pelas cepas VL-10 e Berenice78, com níveis de 4 e 3 vezes mais expressão que em cães não infectados, respectivamente. Entre os grupos tratados com Bz, foi observada expressão de TNF-α somente nos tratados não curados infectados pela cepa VL-10 (Figura 26B). Nossos resultados mostraram que a intensidade da expressão de mRNA para citocinas são marcadamente influenciados pelo grau de inflamação induzida por diferentes cepas e pelo padrão de resistência ao Bz apresentado pelas cepas VL-10, AAS e Berenice-78 do T.cruzi. 92 Discussão 6 - Discussão Apesar de já passados 100 anos da descoberta do Trypanosoma cruzi e a doença por este parasito causada, ainda permanece a falta de opções para um tratamento seguro e efetivo, apesar de grande esforço por parte de pesquisadores e organizações para desenvolvimento de novos fármacos, na esperança de aliviar o sofrimento de milhões de pessoas que ainda são afetadas pela doença de Chagas. Na falta de opções, o Benznidazol (Bz) continua sendo o fármaco de escolha para o tratamento, apesar de baixos índices de cura serem observados quando a terapia é realizada durante a fase crônica da doença Cançado et al., (2002). Maiores índices de cura são observados quando o tratamento com Bz é realizado durante a fase aguda, mas é bastante controverso se há retardo na evolução da doença quando é observada falha terapêutica (Andrade et al.,1992). Na necessidade de estudos mais aprofundados relacionados à patogênese da doença de Chagas, torna-se necessário a utilização de modelos experimentais que reproduzam o mais fiel possível os eventos que são observados em pacientes chagásicos. O camundongo é o animal mais utilizado em trabalhos de infecção experimental por ser um animal de tamanho pequeno de fácil manutenção, entretanto pode apresentar limitações por não reproduzir as formas clínicas observadas em humanos. No mais, devido ao baixo tempo de vida do camundongo, experimentos de quimioterapia muitas vezes são comprometidos pela necessidade de acompanhamento do animal de experimentação por períodos mais longos. Um bom modelo experimental deve permitir o isolamento do T.cruzi no decorrer de toda infecção, além de apresentar as formas aguda sintomática, a forma indeterminada e a cardiopatia chagásica fibrosante, deve também permitir que as peculiaridades dos mecanismos de geração de lesões cardíacas e a avaliação de quimioterápicos sejam estudados. Vários pesquisadores vêm apontando o cão como um excelente modelo experimental, por reproduzir todas as fases da cardiopatia chagásica (Andrade & Andrade, 1980; Andrade, et al., 1984; Lana et al.,1988; Barr et al., 1991; Lana et al., 1992, Bahia et al., 2002), por apresentarem os mesmos índices de cura observados em humanos em ambas as fases da doença (Guedes et al., 2002) e por permitirem estudos para compreensão de mecanismos imunopatológicos da doença de Chagas (Guedes et al., 2008, 2009 e 2010). 93 Discussão Atenção especial deve ser dada na escolha de um modelo experimental, pois hospedeiros de espécies diferentes podem ser cruciais para a determinação dos resultados encontrados. Avaliação do comportamento de uma mesma cepa do T. cruzi em diferentes modelos experimentais foi realizado por Lana et al. (1992) onde foi demonstrado que as cepas Berenice-62 e Berenice-78 do T.cruzi se comportavam de forma variada quando utilizados os modelos canino e murino. A cepa Berenice-78 foi considerada pouco virulenta e patogênica em camundongos, entretanto foi capaz de determinar as formas aguda sintomática, a forma indeterminada e a cardiopatia chagásica fibrosante quando inoculada em cães. Ao contrário, a cepa Berenice-62 induziu alta parasitemia e 100% de mortalidade em camundongos por volta do 13o dia de infecção, e quando inoculada em cães induziu menores níveis de parasitemia e lesões teciduais em relação ao observado nos animais inoculados com a cepa Berenice-78. Estes resultados contribuem para o entendimento das discrepâncias de experimentos realizados em diferentes modelos experimentais, já que diferentes hospedeiros podem determinar padrões de infecção diversos, por supostamente não responder da mesma forma ao parasito. Hospedeiros diferentes também podem influenciar no índice de cura após tratamento quando se utiliza uma mesma população do T. cruzi. Filardi & Brener (1987) descreveram que as cepas Basileu e MVC provenientes de pacientes que se encontravam na fase aguda da infecção e que foram tratados com Bz e curados, também foram totalmente sensíveis ao tratamento com esse fármaco quando inoculadas em camundongos. Entretanto, pacientes naturalmente infectados pela cepa AAS, foram submetidos ao tratamento específico durante a fase aguda da infecção, não sendo observada a cura parasitológica e, após isolado o parasito e inoculado em camundongos, foi observada 40 a 69% de cura. No presente trabalho a cepa AAS inoculada em cães, foi 100% resistente, indicando também maior similaridade ao que ocorre em pacientes. De fato o hospedeiro é determinante em qualquer processo infeccioso, mas a busca de conhecimento sempre foi maior em relação ao parasito. Inicialmente houve intenso processo de tentativa de correlação entre as características morfológicas dos tripomastigotas sanguíneos com seu comportamento biológico (Ferriolli et al., 1968; Andrade et al., 1970; Coura et al., 1966 e Belda Neto, 1974), além da tentativa de se determinar a forma do parasito que é predominante em determinadas regiões geográficas (Schlemper et al, 1986). Acredita-se que cada população do T.cruzi apresente uma 94 Discussão identidade morfológica, pois o mesmo padrão é conservado quando a cepa é mantida em animais imunossuprimidos ou em cultura de células sem pressão do sistema imune (Urdaneta-Morales, 1983). Existem evidências que demonstram que a morfologia do parasito esteja relacionada à sua fisiologia (Pereira da Silva, 1959; Brener e Chiari, 1963 e Brener, 1965) determinando, por exemplo, o tropismo tecidual e sua taxa de crescimento. O comportamento das cepas do T. cruzi em animais de experimentação tem mostrado diferenças quando se utilizam formas sanguíneas finas ou quando a cepa é constituída predominantemente de formas largas. Segundo Brener (1969) as formas finas são capazes de penetrar mais rapidamente nas células do hospedeiro do que as formas largas e teriam ainda tropismo preferencial para células do sistema fagocitário mononuclear. Por outro lado, as formas largas apresentariam tropismo para células cardíacas e seriam mais resistentes à pressão pelo sistema imune. Além disso, alguns autores relacionam o polimorfismo do T.cruzi com a presença de inflamação e fibrose em determinados tecidos. Segundo Andrade et al.(1970) um dos vários fatores que causariam alta variação na ação patogênica para o hospedeiro seriam as características morfológicas do parasito. As curvas de parasitemia obtidas pela análise diária do sangue periférico dos cães infectados pelas cepas com predomínio de formas largas (VL-10 e Berenice-78) mostraram maior número de parasitos que o encontrado nos cães infectados pela cepa com predomínio de formas finas (AAS) que tiveram parasitemia sub-patente, sendo o parasito detectado apenas após incessantes tentativas ou por meio de hemocultura. Somando-se a isso, neste trabalho foi observado que a intensidade do processo inflamatório no miocárdio dos cães necropsiados aos 90 e aos 270 dias de infecção foi menor entre os animais que foram inoculados com a cepa AAS. Todavia, em maior ou menor intensidade, a fase aguda da infecção chagásica é caracterizada por acentuada miocardite, devido ao intenso processo de multiplicação do T.cruzi, onde são observadas áreas de destruição de fibras cardíacas parasitadas com liberação de formas tripomastigotas, amastigotas e restos celulares, além de inúmeros fatores solúveis que são altamente imunogênicos (Andrade et al, 1994, Tafuri 1979). A intensidade da miocardite é proporcional ao número de ninhos de amastigotas que são rompidos. 95 Discussão Por outro lado, no decorrer da infecção, com o surgimento da resposta imune específica contra o T.cruzi, o exagerado processo de multiplicação é interrompido, possivelmente com maior ou menor rapidez dependendo da forma do parasito envolvida na infecção, o parasitismo sendo assim controlado, mas não erradicado. Focos inflamatórios continuam a se formar progressivamente na tentativa de eliminação do T.cruzi. Uma miocardite que conduz ao surgimento de fibrose vai se formando progressivamente onde células do miocárdio destruídas vão sendo substituídas por colágeno (Andrade et al, 1997). A deposição de fibras colágenas e tecido adiposo nos espaços intersticiais dificultam a passagem de nutrientes. Além disso, áreas ocupadas por tecido fibroso modificam o funcionamento do miocárdio por alterar características estruturais do arranjo de fibras colágenas em relação aos cardiomiócitos, já que as fibras colágenas constitutivas sustentam e mantém a posição das células cardíacas para manutenção de flexibilidade e rigidez exatas para perfeito funcionamento do órgão (Weber, 1989). Devido à dificuldade de se encontrar o parasito na fase crônica e falta de correlação entre a intensidade e/ou presença do parasito e o foco inflamatório, a patogênese da doença de Chagas crônica ainda não está bem compreendida. Higuchi et al.(1993) através da técnica de imuno-histoquímica, demonstraram correlação entre os focos inflamatórios e a presença de antígenos do T.cruzi, defendendo a hipótese de que a presença do parasito é importante na perpetuação da inflamação na fase crônica. Entretanto, para diversos autores, devido à grandiosidade das lesões crônicas com escassos parasitos, outros processos independentes da proliferação do parasito também seriam importantes na miocardite fibrosante observada na fase crônica (Lopes et al.,1995; Tafuri, 1979; Rossi et al.,1990; Andrade et al., 1999). O encontro de anticorpos circulantes que se ligavam a antígenos do miocárdio de humanos e camundongos cronicamente infectados com o T.cruzi conduziu à idéia de que a autoimunidade poderia ter importância na patogenia da doença de Chagas. A resposta auto-imune é baseada na presença de autoanticorpos e de linfócitos T auto-reativos, decorrentes de mimetismo molecular entre antígenos do hospedeiro e do parasito, onde auto-anticorpos contra antígenos do miocárdio, músculo esquelético e tecido nervoso foram identificados (Kierzenbaum, 1999). 96 Discussão Gironès & Fresno (2003) reportaram que a transferência de linfócitos T purificados de baço de camundongos na fase crônica da infecção induz infiltrado inflamatório em camundongos normais e produção de auto-anticorpos na ausência de parasitos. Ribeiro-dos-Santos et al., (1992) mostraram que coração de camundongos recém-nascidos transplantados em camundongos na fase crônica da infecção era rejeitado, entretanto se o tratamento com anti-CD4 fosse empregado, a rejeição era evitada. Por outro lado, Tarleton et al.(1997), também transplantando coração de camundongos recém-nascidos em camundongos infectados pelo T.cruzi, mostrou que estes não desenvolviam miocardite e nem eram rejeitados pela auto-imunidade, entretanto, quando parasitos vivos eram diretamente injetados, os corações transplantados apresentavam inflamação similar àquela observada no coração natural, sugerindo que a presença do parasito no miocárdio seria essencial para a ocorrência das lesões observadas na doença de Chagas. Considerando que a permanência do parasito é importante para a formação das lesões características da fase crônica da doença, no presente estudo foi avaliada a influência do tratamento específico realizado no primeiro dia de parasitemia patente do animal, na evolução da doença crônica. O tratamento precoce de cães com Bz induziu a cura parasitológica em todos os animais tratados infectados pela cepa Berenice-78. Nestes animais o número de núcleos celulares detectados no miocárdio foi semelhante ao observado nos animais do grupo controle não infectado, mostrando que a cura parasitológica foi eficaz também na interrupção do processo inflamatório. Por outro lado, apesar do tratamento precoce ter induzido uma permanente supressão da parasitemia nos animais inoculados com as cepas resistentes AAS e VL-10, o tratamento não foi eficaz em reduzir o processo inflamatório e aumento de área ocupada por tecido conjuntivo fibroso no miocárdio dos cães necropsiados nas fases aguda e crônica que foram infectados pela cepa VL-10. Contudo, o Bz foi eficaz em reduzir a intensidade da miocardite e fibrose nos cães inoculados com a cepa AAS, que apresentaram níveis intermediários aos observados nos animais do grupo controle infectado e ao quantificado no grupo não infectado pelo T.cruzi. Na literatura são encontrados vários estudos que foram realizados para verificar a influência do tratamento na progressão da doença de Chagas, com resultados muitas vezes discordantes. Alguns autores acreditam que o tratamento com Bz, mesmo quando 97 Discussão administrado durante a fase aguda da infecção não é capaz de evitar ou amenizar as lesões no miocárdio de pacientes em casos que a cura parasitológica não é alcançada (Parada et al., 1997). Inglessis et al. (1998) também descreveram que pacientes tratados na fase aguda apresentaram, através de biópsia no miocárdio, intensa miocardite depois de meses ou anos após o término do tratamento com Bz, sugerindo que o tratamento com Bz não previnia lesões cardíacas severas. Sucesso do tratamento com Bz na prevenção da progressão da doença cardíaca foi reportado por Fragata-Filho et al. (1994), onde chagásicos crônicos não tratados após longos períodos de avaliação mostraram piora clínica (eletrocardiográfica) quando comparados aos tratados. Ensaio clínico realizado na Argentina por Viotti et al. (2006), também mostrou benefício do tratamento, em 283 pacientes tratados com Bz e 304 mantidos sem o tratamento. Estes pacientes foram comparados e observou-se redução da progressão da doença cardíaca naqueles tratados, após tempo médio de acompanhamento de 9.8 anos. Sosa-Estani et al.(1998) apesar de não terem observado diferença significativa nas alterações eletrocardiográficas apresentadas entre pacientes tratados durante a fase crônica recente e pacientes do grupo placebo três a quatro anos após a quimioterapia, mostrou que o tratamento com Bz foi capaz de negativar a sorologia em 11,3% (5/44) dos pacientes. Outros autores acreditam que o tratamento com Bz é eficaz na fase aguda ou em infecções recentes. Andrade et al. (1996) relataram 55,8% de soroconversão negativa após tratarem 64 crianças e adolescentes de sete a doze anos com este fármaco. Além disso, acompanhando por seis anos 64 adolescentes, alterações eletrocardiográficas foram observadas em quatro jovens que não receberam o tratamento, e em somente um que foi tratado (Andrade et al., 2004). Estes dados sugerem que o tratamento de crianças e jovens é uma necessidade, já que significativos índices de cura são observados em indivíduos que se encontram na fase crônica recente. Ademais, Andrade et al. (1998) mostraram prevalência de 11,3% (16/141) de anormalidades eletrocardiográficas entre crianças de sete a doze anos infectadas pelo T.cruzi, ficando evidenciado que existem áreas endêmicas onde a progressão da doença é rápida, mostrando que uma maior atenção deve ser dada ao tratamento precoce com Bz, já que este poderia ser decisivo se a cura dessas crianças fossem obtidas, ou se pelo menos prevenisse lesões severas. 98 Discussão Muitos autores têm demonstrado a ocorrência de diferentes graus de susceptibilidade entre cepas de T.cruzi que circulam nas diversas regiões geográficas e em diferentes hospedeiros (Andrade et al., 1985; Filardi & Brener, 1987; Andrade et al., 1992). Nestes trabalhos as cepas do T.cruzi foram classificadas como resistentes quando os camundongos inoculados apresentavam índices de cura variando entre 0 e 40%, parcialmente resistentes quando taxa de cura estava compreeendida entre 41 e 60% e sensíveis quando os índices de cura nos camundongos tratados foram de 61 a 100%. De acordo com esses autores, 35,58% das cepas estudadas eram resistentes, 5,77% eram parcialmente resistentes e 58,65% sensíveis ao tratamento com Bz (Andrade et al., 1985; Filardi & Brener, 1987; Andrade et al., 1992). Estes resultados são correspondentes com o índice de cura observado em ensaios clínicos realizados em humanos durante a fase aguda da infecção, onde se observa de 60% a 70% de cura. (Andrade et al., 1992; Galvão et al., 1993). Dessa forma a falha terapêutica e a presença de alterações eletrocardiográficas observadas em parte dos pacientes chagásicos que se encontram na fase crônica recente pode ser explicada pela existência de cepas naturalmente resistentes aos quimioterápicos e com diferentes graus de virulência e patogenicidade. Dessa forma, regiões endêmicas onde os chagásicos desenvolvem rapidamente formas sintomáticas e, onde o tratamento com Bz é insatisfatório, provavelmente predominam cepas do T.cruzi com altos graus de resistência ao fármaco. Considerando essa variabilidade genética do T.cruzi, foi proposta no ano de 2004 a realização de um projeto onde pacientes crônicos de diversas regiões, incluindo o Brasil, Colômbia, Venezuela, Argentina, Peru e Bolívia fossem tratados com Bz para verificação definitiva da eficácia do Bz em previnir ou não a progressão das lesões cardíacas observadas na doença de Chagas. Esse projeto foi denominado BENEFIT (Benznidazole Evaluation for interrupting Trypanosomíasis) e englobará tratamento de 3000 pacientes, sendo metade tratada com 5mg/kg de peso corporal por 60 dias, e metade constituindo o grupo placebo (Marin-Neto, et al, 2009). Este projeto visa determinar a eficácia do Bz em reduzir a carga parasitária em pacientes crônicos, utilizando a PCR em tempo real quantitativa, bem como avaliar a segurança e tolerabilidade do Bz. Diante desses dados, onde se observa uma variedade de cepas com diversos graus de sensibilidade ao Bz, e ainda essa grandiosa divergência de opniões a respeito se há ou não benefício em casos de falha terapêutica, neste trabalho foram escolhidas cepas 99 Discussão resistentes que após tratamento na fase inicial da doença induzem diferentes padrões de lesão cardíaca na fase crônica. E considerando aquelas crianças de sete a doze anos infectadas pelo T.cruzi que mostraram prevalência de 11,3% de anormalidades eletrocardiográficas (Andrade et al,. 1998) ficando evidenciado que existem áreas endêmicas onde a progressão da doença é rápida, a demonstração de presença de alterações eletrocardiográficas em cães em fases recentes da doença é ainda mais um indicativo que cães são bons modelos experimentais, e podem também ser úteis no estudo da evolução clínica da doença de Chagas. De fato, Lana et al, (1992) mostraram que 80% de cães experimentalmente infectados pela cepa Berenice-78 apresentaram alteração eletrocardiográfica durante a fase aguda da infecção, sendo observados distúrbios de repolarização, arritmias, bloqueio átrio ventricular e até bloqueio completo do ramo direito do feixe de Hiss em 2,3% dos cães. Interessantemente, após três meses de infecção houve tendência à normalização eletrocardiográfica, momento onde apenas 33% dos animais apresentaram alterações. Entretanto durante a fase crônica todos os animais apresentaram distúrbios eletrocardiográficos, o que foi correlacionado com as lesões cardíacas observadas nesses animais. Andrade et al (1997), utilizando microscopia eletrônica, mostraram que cães em fase recente da doença de Chagas apresentaram substituição de cardiomiócitos por tecido conjuntivo fibroso em áreas de junção atrioventricular, regiões importantes no sistema de condução do feixe de Hiss, mostrando que mesmo na forma indeterminada o eletrocardiograma pode fornecer informações importantes da cardiopatia chagásica. Certamente o ECG tem sido o recurso básico utilizado ao longo de décadas para o diagnóstico clínico da cardiopatia chagásica em humanos, tanto na fase aguda como na fase crônica da infecção sendo, portanto, aplicável ao estudo da patogênese da doença de Chagas experimental. A avaliação eletrocardiográfica é o principal método utilizado na determinação de arritmias cardíacas, além de revelar alargamento e hipertrofia de câmaras cardíacas. Além disso, as alterações gradativas de ondas permitem avaliar aumento progressivo da câmara à medida que a cardiopatia evolui, mostrando ser um excelente método para acompanhamento da evolução da infecção (Tilley et al., 2002). Foi possível observar neste presente trabalho, que a infecção pelo T.cruzi induz alterações cardíacas 100 Discussão progressivas no decorrer da infecção, e que a eletrocardiografia foi eficaz na monitoração dessa evolução, uma vez que através da análise realizada aos 120 dias de infecção 33,3% dos animais infectados pelas cepas VL-10, AAS e Berenice-78 apresentaram alterações eletrocardiográficasdos passando para 73,3% na avaliação realizada aos 270 dias de infecção. E assim como observado por Andrade et al (1997) usando a microscopia óptica, neste trabalho foi observada correlação entre presença de fibrose no miocárdio dos animais e de alterações no ECG. Ocorreram alterações principalmente em relação às medidas de duração da onda P, que indica sobrecarga no átrio e ventrículo direito, e da duração do intervalo PR, que é indicativo de bloqueios no nodo átrio ventricular, devido substituição de células cardíacas nessa região por fibras colágenas, dificultando e tornando lento o processo de condução de estímulos nervosos por essa área. Esta progressão da doença pode ser exemplificada por um animal infectado pela cepa Berenice-78 que, na avaliação realizada aos 120 dias de infecção, apresentou bloqueio incompleto do ramo direito do feixe de Hiss e evoluiu para BCRD na avaliação realizada aos 270 dias, mostrando alargamento da medida de duração do complexo QRS, somados a desvio de eixo para a esquerda. O bloqueio completo do ramo direito do feixe de Hiss (BCRD) é um acometimento prevalente e indicador de prognóstico desfavorável na evolução da infecção (Viotti et al., 2005). Corroborando com esses resultados, Lana et al., (1992) mostraram também BCRD entre os cães infectados pela cepa Berenice-78. Outros achados nos exames eletrocardiográficos dos cães infectados pelas cepas VL-10, AAS e Berenice-78 foram contrações ventriculares prematuras, arritmias atriais, extrasístoles supraventriculares e presença de ondas P ectópicas devido presença de áreas de fibrose funcionarem como pontos de geração de impulsos nervosos, além de arritmias diversas, como a Síndrome bradi-taqui, que consiste em intervalo QT variável e prolongado, em um animal infectado pela cepa AAS. Quando se avaliou os exames eletrocardiográficos dos cães tratados pelo Bz, foi observado que entre os animais curados infectados pela cepa Berenice-78 não foram observadas anormalidades eletrocardiográficas. Entretanto entre os animais tratados e não curados, onde se encontram as maiores dúvidas a respeito da eficácia do Bz em prevenir a evolução da infecção, foi observado que o tratamento foi benéfico em reduzir alterações entre os animais infectados pela cepa AAS. Entretanto a prevalência das alterações foi similar entre os grupos de animais infectados pela cepa VL-10, de forma 101 Discussão que o tratamento não impediu o desenvolvimento das anormalidades. Entre estes animais, 75% apresentaram alterações características nos estágios iniciais da forma cardíaca da doença de Chagas, como presença de BAV de 1o grau, levando-se em consideração que entre os animais infectados pela cepa VL-10 e não tratados, foi observado 60% dos animais com alterações. Nos últimos anos nosso grupo tem estudado a correlação entre o perfil de resposta imune com o desenvolvimento da patogênese cardíaca observada em cães experimentalmente infectados. Os resultados destes estudos mostram que o cão é um bom modelo para o estudo dos mecanismos imunopatológicos da doença de Chagas, reproduzindo os aspectos clínicos e imunológicos observados em pacientes chagásicos (Guedes et al., 2009). No contexto da imunopatologia, independente da natureza de um antígeno, o sistema imune responde ativando e gerando expanção clonal de linfócitos específicos contra esse determinado antígeno. Entretanto, na infecção causada pelo T.cruzi, é observada intensa ativação policlonal de linfócitos B, com consequente produção de imunoglobulinas de variadas especificidades, sendo que a maioria dos clones de linfócitos B expandidos não são específicos a antígenos do T.cruzi. Estudos que focalizam a correlação entre o desenvolvimento das diferentes formas clínicas em pacientes portadores da doença de Chagas com o perfil de isotipos e subclasses de imunoglobulinas são escassos e podem contribuir para o conhecimento do mecanismo da patogênese da doença. Estudos utilizando camundongos experimentalmente infectados têm demonstrado que durante a infecção pelo T.cruzi participam do processo de eliminação do parasito as imunoglobulinas da classe IgG, os subtipos IgG1, IgG2a, IgG2b e IgG3 e que a IgG2a e IgG2b sendo as subclasses mais produzidas por esse modelo (Minoprio et al.,1988). Takehara et al. (1981) demonstraram que as imunoglobulinas IgG2, preferencialmente a IgG2b, teriam papel protetor para camundongos infectados pelo T. cruzi, por apresentarem atividade lítica, entretanto alguns autores têm descrito que anticorpos da subclasse IgG1 atuariam também por mecanismo semelhante. Stefani et al. (1983) mostraram que anticorpos responsáveis por atividades líticas no soro imune de camundongos estão compreendidos no isotipo IgG, abrangendo as subclasses IgG1, IgG2a, IgG2b. Alguns autores acreditam que a produção de IgG1 seja estimulada por 102 Discussão citocinas anti-inflamatórias (Kawano et al., 1994). Experimentos in vitro mostraram que a citocina IFN- inibe a produção de IgG1 e aumenta a secreção de IgG2 por antagonizar a síntese de IgG1 mediada pela IL-6 e auxiliar a IL-6 na produção de IgG2 (Kawano et al.,1994). Estes dados corroboram com Finkelman et al. (1990), que descreveram que o IFN- pode suprimir IgG1 e estimular IgG2a, mas entretanto a citocina anti-inflamatória IL-4 parece não ser requerida para a produção de IgG1 in vivo. Estudos utilizando o cão como modelo experimental tem mostrado a ocorrência das subclasses IgG1, IgG2, IgG3 e IgG4 (Deplazes et al.,1995), sendo que o controle na produção destas subclasses é mediado por diferentes citocinas, assim como observado em camundongos. Brière et al.(1994) descreveram que em resposta à IL-10, linfócitos B secretam grande quantidade de IgM, IgG1 e IgG3, e não produzem IgG2 e IgG4. A resposta mediada por anticorpos, estimulada por citocinas inflamatórias, leva principalmente à produção de IgG2, capaz de opsonizar o parasito e auxiliar sua destruição via complemento. Mosmann & Coffman, (1989) e Romagnani et al. (1991) descreveram que a produção dos anticorpos das subclasses IgG1 e IgG4 é promovida por citocinas anti-inflamatórias e que anticorpos dessas classes estariam envolvidos na defesa do hospedeiro mediada por células efetoras não fagocitárias, como mastócitos e eosinófilos. Essas células teriam mecanismo de ação via exocitose de grânulos protéicos tóxicos para os parasitos. Dessa forma, um dos principais interesses nos estudos dos perfis sorológicos apresentados por humanos ou por modelos experimentais infectados pelo T.cruzi é a procura de correlação entre a produção das subclasses de imunoglobulinas e a gravidade da doença de Chagas. Morgan et al. (1996) descreveram níveis mais elevados de IgG2 nos soros dos pacientes portadores de formas clínicas, entretanto Cerban et al. (1993) não observaram nenhuma correlação. Deplazes et al. (1995) mostraram que cães infectados com Leishmania infantum, apresentavam produção de IgG1 mais elevada quando eram sintomáticos ou quando não respondiam bem à quimioterapia, e IgG2 aumentada naqueles assintomáticos. Padrão semelhante foi observado em cães infectados com Toxoplasma gondii, sugerindo que IgG1 e IgG2 estariam relacionados com infecções sintomáticas e assintomáticas, respectivamente, em infecções causadas por protozoários. Ademais níveis elevados de IgG1 podem diminuir a resistência à infecção por competir com IgG2 por sítios de ligação no parasito. 103 Discussão Neste estudo foi observada a correlação entre a produção de imunoglobulinas e a presença de inflamação no miocárdio dos animais infectados. Durante as fases mais iniciais da infecção (90 dias de infecção) a maior correlação foi observada com o índice de reatividade da classe IgG total (r = 0,77; p<0,0001) seguida pela subclasse IgG1(r = 0,73; p<0,0001). Este fato sugere ser um reflexo da grande quantidade de parasitos nesse momento e que a forma de eliminação do parasito ocorra principalmente via opsonização através de anticorpos da classe IgG. Esta hipótese pode ser explicada, ao menos parcialmente, pelos menores índices de reatividade detectados nos soros dos animais infectados pela cepa AAS, nos quais foram observados os menores níveis de parasitemia (subpatente) e de inflamação no tecido cardíaco. Contudo, aos 270 dias de infecção, elevada correlação foi observada entre a inflamação e os anticorpos da subclasse IgG1 (r = 0,94; p<0,0001) entre os animais infectados pelas três cepas. É importante lembrar que os grupos que desenvolveram maior miocardite foram também os que apresentaram aumento de áreas ocupadas por tecido fibroso aos 270 dias de infecção, permitindo também pontuar que houve correlação entre índice de reatividade de anticorpos da subclasse IgG1 com fibrose no átrio direito dos animais aos 270 dias de infecção (r = 0,56 ; p = 0,0120). Neste trabalho foi avaliada também a evolução dos níveis de imunoglobulinas nos animais submetidos ao tratamento específico com Bz, objetivando verificar a influência do tratamento sobre a resposta imune humoral nos cães inoculados com cepas do T. cruzi que apresentam diferentes níveis de resistência ao Bz. Foi observado que os cães inoculados com a cepa Berenice-78 tratados com Bz e curados, apresentaram índices de reatividade de IgG e IgG2 similares aos detectados no soro dos cães não infectados pelo T.cruzi. Em contrapartida, o índice de reatividade apresentado pelos cães inoculados com a cepa VL-10 tratados com Bz e não curados foi sempre próxima aos cães do grupo controle infectado, entretanto nos infectados pela AAS houve tendência à diminuição do índice, indicando que o tratamento com Bz apesar de não ter conduzido à cura, influenciou nos níveis de IgG. O tratamento específico influenciou de forma mais marcante nos níveis de IgG1, independente da cepa envolvida, onde foram observados nos cães infectados pela cepa Berenice-78 (tratados e curados) e nos infectados pela cepa AAS (tratados e não curados) índice de reatividade similar ao observado no soro dos animais do grupo controle não 104 Discussão infectado. Entretanto nos animais inoculados com a cepa VL-10, que não foram curados pelo tratamento, foi observada uma redução do índice de reatividade em relação ao grupo controle mas que permaneceu sempre acima da faixa que os classifica como reativos. Apesar da tentativa de correlação do perfil de imunoglobulinas encontrados com a patologia observada ser de grande relevância, a principal e mais direta aplicação do estudo da cinética de imunoglobulinas em humanos ou em modelos experimentais infectados pelo T.cruzi é a identificação de marcadores para a padronização de um controle de cura efetivo após o tratamento da doença de Chagas. Indivíduos tratados durante a fase crônica podem apresentar sorologia positiva por anos, mesmo após terem alcançado a cura parasitológica. Entretanto quando seres humanos ou modelos experimentais são tratados durante a fase aguda da infecção ou na fase crônica recente, diversos autores têm considerado a sorologia negativa como indicativo de cura parasitológica, com a soroconversão negativa ocorrendo nos primeiros anos após a cura (Andrade et al., 1996, Sosa-Estani et al., 1998, Streiger et al., 2004). A análise da cinética de IgG e suas subclasses IgG1, IgG2a e IgG2b no soro de camundongos realizada por Caldas et al., 2008, mostrou que os níveis de IgG foram decisivos para a verificação de cura parasitológica. Ao agrupar os animais inoculados com as diferentes cepas do T.cruzi nos grupos controle infectado, tratado com Bz e não curado, tratado com Bz e curado e controle não infectado, foi possível relacionar os níveis de IgG com o resultado do tratamento. Os níveis de anticorpos detectados nos soros dos animais curados foram similares aos dos animais não infectados 6 meses após o tratamento, enquanto nos soros dos animais não curados estes níveis foram semelhantes aos dos animais infectados e não tratados. Assim, foi possível afirmar que anticorpos da classe IgG foram os que melhor separaram os animais tratados e curados daqueles tratados e não curados, sendo portanto mais aplicável para o controle de cura. Este estudo também mostrou que anticorpos da subclasse IgG podem ser utilizados no controle de cura da doença de Chagas quando o tratamento específico é realizado durante a fase aguda da infecção de cães experimentalmente infectados pelo T.cruzi, já que os animais que apresentaram reatividade de IgG abaixo do valor discriminante de 0.9, foram apenas os tratados com Bz que foram inoculados com a cepa Berenice-78 com cura confirmada pelo teste de hemocultura e pela PCR. 105 Discussão Entretanto, a resposta à infecção pelo T.cruzi envolve simultaneamente mecanismos de resposta humoral e celular tanto na fase aguda como na fase crônica da infecção. A presença de linfócitos nos infiltrados inflamatórios pode estar diretamente relacionada ao processo de fibrose, à produção de citocinas e aos fatores de crescimento que induziriam a lesão tecidual e ativariam a fibrogênese (Reis et al., 1993). Tanto na fase aguda quanto na crônica é observado um infiltrado inflamatório constituído predominantemente por linfócitos T e, que eles, a proporção de linfócitos auxiliares e citotóxicos seriam próximas e dependentes da cepa do T.cruzi inoculada (Caliari et al., 2001). A função protetora de linfócitos T auxiliares das linhagens Th1 e Th2 não está bem definida devido ao fato das citocinas anti-inflamatórias e inflamatórias serem amplamente produzidas durante a infecção. Assim não é claramente determinada, também, a participação de diferentes imunoglobulinas no processo inflamatório já que a produção dessas é influenciada pelo perfil de resposta Tipo1 ou Tipo2. Entretanto existe um consenso de que uma resposta Th1 de maior intensidade na fase aguda confere proteção e que em infecções crônicas ou prolongadas, ocorre substituição da atividade Th1 pela Th2 para proteção do hospedeiro devido os danos gerados pela intensa resposta inflamatória. Na fase crônica ocorre um predomínio da atividade Th2 em relação à atividade Th1 e mesmo assim o hospedeiro continua mantendo a parasitemia sob controle (Reis & Lopes, 2000). É possível que anticorpos produzidos com o auxílio de células Th2 sejam também importantes para controle do parasito durante a fase crônica. A regulação da resposta imune é crucial na evolução da infecção e citocinas são primordiais nessa regulação e no processo de resistência ao T.cruzi. Desde o início da infecção, onde na resposta inata, as células fagocitárias são as primeiras a entrar em contato com o parasito, citocinas já são produzidas pelos próprios macrófagos. A fagocitose realizada por macrófagos é capaz de ativar a produção de IL-12 e TNF-α nessas células (Aliberti et al., 1996) que, por sua vez, induzem a produção da citocina IFN-γ por células NK. O IFN-γ é a principal citocina ativadora de macrófagos, sendo esta importante para induzir a produção de óxido nítrico nessas células fagocíticas (Reed et al, 1995). A citocina TNF-α, produzida por macrófagos, participa também desse processo de ativação, juntamente com a IL-12 e o IFN-γ (Tarleton et al., 1992). Entretanto papel tanto protetivo quanto deletérios foram atribuídos a essa citocina (Russo et al., 1989). 106 Discussão Neste trabalho a produção de IFN-γ pelas células mononucleares do sangue periférico em cães infectados pelas cepas VL-10, AAS e Berenice-78 e a expressão de mRNA para essa citocina no tecido cardíaco mostrou que, durante a fase aguda da infecção, o IFN-γ é altamente produzido, possivelmente devido à sua inquestionável importância no controle do parasito, entretanto os maiores níveis foram observados entre os animais infectados pela cepa VL-10, que são também os animais que apresentaram miocardite mais acentuada. Entretanto a citocina IL-10 foi também bastante produzida na fase aguda da infecção, proporcional à produção de IFN-γ, sendo também mais alta nos cães com presença de miocardite mais intensa, mostrando que, durante as fases iniciais da infecção pelo T.cruzi, parece que ocorre um misto de produção de citocinas pró e antiinflamatórias na tentativa de conciliar a destruição parasitária com menor lesão tecidual. Contudo a produção de TNF-α pelas CMSP e sua expressão no tecido cardíaco mostrou que essa citocina, durante a fase aguda da infecção, é abundante entre os animais infectados pelas cepas que induzem diferentes graus de miocardite, não podendo ser correlacionada com lesão tecidual. A expressão mRNA para essas citocinas no miocárdio dos animais que foram eutanasiados durante a fase crônica da infecção (270 dias) mostrou que aumento dessas citocinas inflamatórias (IFN-γ e TNF-α) foi observado no miocárdio dos animais infectados pela cepa VL-10 na presença de menor expressão de IL-10, indicando maior produção de citocinas inflamatórias em cães com maior comprometimento cardíaco. Interessantemente, foi demonstrado em um experimento realizado in vitro que o Bz pode interferir na produção de citocinas e de óxido nítrico por macrófagos, promovendo inibição da síntese de IL-6, IL-10 e inibindo também a expressão do gene da iNOS (Revelli et al., 1999). Portanto o tratamento com Bz supostamente poderia influenciar o curso da infecção pelo T.cruzi, não somente pela destruição direta do parasito, mas pela interferência na resposta imune frente ao parasito. Estudando CMSP obtidas de pacientes chagásicos que foram tratados com Bz durante a fase aguda da infecção, Bahia-Oliveira et al., (1998) sugeriram papel duplo desempenhado pelo IFN-γ, podendo essa citocina estar relacionada tanto na proteção quanto no desenvolvimento da patogênese da doença. Os autores discutem que esta citocina, juntamente com o tratamento, conduziria a cura parasitológica dos pacientes, ao observar níveis mais elevados na cultura de células obtidas dos pacientes curados. Também mostraram que em casos mais graves o IFN-γ 107 Discussão estimularia a resposta inflamatória, ao observar níveis elevados desta citocina tanto na cultura de células obtidas dos pacientes curados quanto de pacientes crônicos com formas mais graves da doença. Resultados concordantes foram obtidos na dosagem das citocinas IFN-γ, IL-10 e TNF-α no sobrenadante das CMSP e na quantificação da expressão de mRNA quando se avaliou a influência do Bz aos 90 dias de infecção. O tratamento foi capaz de reduzir a expressão de IFN-γ no tecido cardíaco e a produção desta citocina pelas células nas culturas obtidas dos animais infectados pelas cepas Berenice-78 e AAS, mesmo não tendo sido observada cura entre os infectados pela cepa AAS. Este mesmo efeito não foi observado nos animais infectados pela cepa VL-10, o que pode ser correlacionado com o padrão de lesão cardíaca semelhante entre os animais submetidos ou não ao tratamento, mostrando que nesses casos de alta resistência, o tratamento também não influencia nos níveis dessa citocina. Entretanto em relação à citocina TNF-α, foi observada queda da produção entre todos os animais tratados com Bz, exceto nos cães infectados pela cepa AAS, que apesar de terem apresentados baixos níveis dessa citocina no sobrenadante das CMSP, tiveram elevada expressão de mRNA no tecido cardíaco. Padrão interessante foi observado em relação à citocina IL-10, tanto na dosagem realizada no sobrenadante quanto na expressão no miocárdio. Entre os animais tratados e curados infectados pela cepa Berenice-78 foram observados altos níveis de IL-10 aos 90 dias de infecção, ao contrário do que foi observado entre os tratados e não curados infectados pelas cepas VL-10 e AAS, nos quais os níveis de IL-10 foram menores. Estes resultados indicam que quando o parasito é eliminado a atividade inflamatória é cessada, permanecendo a produção de citocinas regulatórias por períodos mais prolongados. Estes resultados são concordantes aos relatados por Talvani et al., (2000) que mostraram que em casos de diminuição da carga parasitária ocorre redução da expressão de mRNA para IFN-γ, entretanto a expressão de citocinas regulatórias como IL-4 e IL-10 permanece alta após o parasitismo ser controlado. Estudos que avaliam a resposta imune celular na infecção pelo T.cruzi frequentemente tem sido realizados através da análise da reatividade in vitro de CMSP frente à estimulação com antígenos de formas tripomastigotas. Espera-se que CMSP com alta reatividade contra antígenos de T. cruzi provavelmente possuam grande número de clones de linfócitos TCD4+ da linhagem Th1, ou seja, que produzam principalmente 108 Discussão citocinas inflamatórias. De fato, os cães infectados pelas cepas VL-10, AAS e Berenice78 apresentaram grande produção de IFN-γ e TNF-α após estimulação in vitro e também apresentaram elevada proliferação das CMSP tanto aos 45 quanto aos 90 dias de infecção. Ainda em relação ao TNF-α, Bowen & Bowen (1990) postularam que essa citocina liberada por células inflamatórias, juntamente com outros fatores liberados na inflamação, como Apo-2, poderiam servir como sinais extracelulares para indução de apoptose. A apoptose de linfócitos tem sido descrita como assossiada à persistência do parasito onde estes redirecionam a resposta apoptótica em células imunes (células B, T e macrófagos) afetando assim o seu controle (Luder et al., 2001). A contribuição da apoptose para supressão da resposta imune frente ao T.cruzi foi demonstrada por Lopes et al (1995), onde a infecção levou à apoptose tanto de linfócitos TCD4+ quanto TCD8+ em experimentos in vivo. Entretanto esses autores mostraram que as células TCD8+ eram mais propensas a apoptose espontânea in vitro, sendo esta decorrente de ausência de citocinas como IL-2 importantes para manutenção dessas células, diferentemente ao que ocorreu com os linfócitos TCD4+ que entraram em apoptose via AICD (morte celular induzida por ativação) onde esses linfócitos ativados após reestimulação do TCR entram em apoptose. Além disso, Zhang et al.,(1997) reportaram que os linfócitos TCD4+ da linhagem Th1 expressam mais rapidamente FasL que os da linhagem Th2. Sendo essa molécula intimamente relacionada com a apoptose, acredita-se que ela preferencialmente induza a apoptose em linfócitos produtores de citocinas inflamatórias, contribuindo para o escape do parasito. Tarleton, (1995) mostrou que linfócitos TCD4+ são necessários para produção de citocinas para estimulação de macrófagos e de linfócitos TCD8+ e, considerando a importância desses dois tipos celulares, tem-se buscado correlação entre a proporção dessas células com a patologia observada em indivíduos chagásicos. Estudos mostram que indivíduos chagásicos na forma indeterminada da doença possuem predominância de linfócitos TCD4+ e pacientes com forma sintomática apresentam predominância de linfócitos TCD8+ (Cuna & Cuna, 1995). Considerando as avaliações de proporção entre linfócitos TCD4+ e TCD8+ nos experimentos realizados aos 45 e 90 dias de infecção dos cães infectados pelas cepas VL-10, AAS e Berenice-78, a proporção de linfócitos TCD8+ aumentou em relação à população de linfócitos TCD4+ 109 Discussão quanto mais decorria a infecção. Estes dados corroboram com os resultados de Higuchi, et al., (1997) e Santos et al., (2001), onde foram demonstrados predomínio de linfócitos TCD8+ na fase crônica, principalmente nos casos de cardiopatia mais grave. Segundo Fernandez-Presas et al (2000) após o pico de parasitemia ocorre diminuição da razão CD4+/CD8+ e esse fenômeno pode ser atribuído a um mecanismo intrínseco das células TCD8+ teriam para evadir da morte mediada pelo TCR, ou seja evadir da morte induzida por ativação. Em relação à apoptose das CMSP, foi observada entre a população de linfócitos TCD4+, morte celular apenas associada aos animais infectados pela cepa AAS aos 45 dias de infecção, enquanto na avaliação posterior, aos 90 dias foi observada entre todas as culturas de CMSP. Estes resultados mostram que realmente nesse momento da infecção ocorre perda dessas células via AICD, pois provavelmente essas células estavam ativadas, já que também foi observada intensa proliferação frente ao desafio com o antígeno, antígeno este que também foi responsável pela reestimulação desses linfócitos e por conduzi-los a apoptose. Interessantemente, o único grupo que não apresentou linfócitos TCD8+ em apoptose foi o dos cães infectados pela cepa VL-10, tanto aos 45 quanto aos 90 dias de infecção. Se considerarmos que a morte por apoptose de linfócitos TCD8+ em cultura ocorre principalmente por morte passiva como proposto por Lopes et al (1995), é de se esperar que os linfócitos TCD8+ obtidos dos animais infectados por essa cepa estivessem sendo mantidos vivos na cultura pela produção de fatores de crescimento por linfócitos T auxiliares ali presentes. Considerando que os linfócitos TCD8+ são os principais responsáveis no processo de dano tecidual, é de se esperar que realmente as células originárias de cães infectados por essa cepa não entrassem em apoptose, uma vez que nesses cães foram detectados maiores níveis de comprometimento cardíaco. Olivieri et al.,(2002) avaliando a influência da quimioterapia com Bz no compartimento linfóide de camundongos infectados pelo T.cruzi demonstraram que este fármaco é capaz de promover a expansão de linfócitos em órgãos linfóides e que essa expansão é maior entre linfócitos TCD8+ do que TCD4+, entretanto apesar da grande expansão de TCD8+, esses não eram ativados e sim linfócitos de memória. Além disso, mostrou que o tratamento com Bz é capaz de diminuir a taxa de apoptose, sendo observada 14,2% de apoptose no grupo infectado e de 7,6% no grupo não infectado e, 110 Discussão ainda que nos animais tratados com Bz a taxa de apoptose encontrada foi de 9,6%. Neste trabalho foi também observada grande influência do Bz na proliferação, proporção e apoptose de linfócitos. Assim como observado por Olivieri et al.,(2002), o Bz foi capaz de intensificar a proporção de linfócitos TCD8+ em relação à de TCD4+, independente do grau de resistência da cepa envolvida, chegando a ficar a proporção CD4:CD8 de 60:40 entre os animais tratados curados infectados pela cepa Berenice-78 e entre os tratados não curados infectados pela cepa AAS, lembrando que a proporção normal é de aproximadamente 80:20, como relatados por Caliari et al., (2002), onde também mostraram proporção de 70-80% de TCD4+ e de 20-30% de linfócitos T CD8+ em análise imunohistoquimica em cães não infectados pelo T.cruzi. Em relação à capacidade do Bz em reduzir a apoptose de linfócitos obtidos dos cães infectados pelo T.cruzi, assim como observado por Olivieri et al., (2002), o Bz foi capaz de prevenir a apoptose entre os linfócitos TCD4+ e TCD8+ independente da cepa envolvida na infecção. Possivelmente isso se deve ao fato de que mesmo quando cepas resistentes ao Bz estejam envolvidas, o tratamento poderia ser eficaz em reduzir a carga parasitária, e esta redução poderia estar relacionada com uma menor indução de citocinas inflamatórias, como ocorreu com a produção diminuída de TNF-α, e por conseqüência, com maior redução na taxa de apoptose. Os resultados mostrados neste trabalho indicam que a infecção pelo T.cruzi é bem variável e muito influenciada pela população do parasito envolvida, sendo observados diferentes padrões de lesões no miocárdio dos animais assim como variados mecanismos de resposta imune quando estes são infectados por diferentes populações do parasito. Somando-se a isso, a eficácia do tratamento com o Bz na prevenção da evolução da doença, nos casos de falha terapêutica, também se apresenta de forma bem variada, sendo seu benefício e sua ineficácia mostrada em determinados casos. 111 Conclusões 7 - Conclusões 1 O polimorfismo das formas tripomastigotas sanguíneas foi correlacionado com as curvas de parasitemia e com a intensidade das lesões cardíacas observadas nos cães infectados pelas cepas VL-10, AAS e Berenice-78 do T.cruzi. 2 A infecção pelas cepas VL-10, AAS e Berenice-78 induz alterações eletrocardiográficas progressivas no decorrer da infecção, mesmo se tratando de fase recente, sendo correlacionada com a intensidade de fibrose induzida pelas diferentes cepas. 3 Os níveis de IgG, IgG2 e principalmente IgG1 detectados nos soros dos cães infectados pelas cepas VL-10, AAS e Berenice-78 do T.cruzi podem ser relacionados com a intensidade do infiltrado inflamatório e com a intensidade do tecido conjuntivo fibroso no átrio direito dos cães aos 270 dias de infecção. 4 Os níveis de IFN-γ, IL-10 foram correlacionados com a intensidade do processo inflamatório no tecido cardíaco, sendo níveis maiores desta citocina detectados no sobrenadante de CMSP obtidos de cães infectados pelas cepas VL-10 e Berenice78 (maior inflamação) em relação aos infectados pela cepa AAS (menor inflamação). 5 Os níveis de TNF-α não foram relacionados com a intensidade das lesões cardíacas, sendo detectado em altos níveis em todos os animais infectados. 6 O tratamento foi eficaz em prevenir lesões cardíacas apenas quando ocorre cura (cepa Berenice-78), sendo observados distintos padrões de resposta quando não é observada a cura, os seja, redução das lesões cardíacas (Cepa AAS) ou não influencia no curso da infeccção (cepa VL-10). 7 O tratamento com Bz preveniu as alterações eletrocardiográficas entre os animais curados infectados pela cepa Berenice-78 e, nos casos em que não conduziu à cura, preveniu as anormalidades entre os cães infectados pela cepa AAS, mas não entre os animais inoculados com a cepa VL-10 do T.cruzi. 112 Conclusões 8 O tratamento com Bz induziu a normalização da reatividade celular (final do tratamento) independente da eficácia do tratamento. 9 No decorrer da infecção pelo T.cruzi é observado aumento gradativo de linfócitos TCD8+ em relação aos TCD4+ e o tratamento com Bz é capaz de intensificar ainda mais o acúmulo de linfócitos TCD8+. 10 A infecção de cães pelas cepas AAS e Berenice-78 induz aumento da apoptose de linfócitos TCD4+ e TCD8+ na cultura CMSP, enquanto a cepa VL-10, que induz maiores níveis de inflamação cardíaca, não ocorre apoptose de TCD8+. 11 O tratamento com Bz preveniu a apoptose de linfócitos TCD4+ e TCD8+ na cultura de CMSP. 12 A influência do tratamento na produção das citocinas IFN-γ e IL-10 foi relacionada com o resultado do tratamento, sendo detectada a redução do IFN-γ e aumento de IL-10 nos animais curados, nos animais não curados foi observada redução de IFN-γ e IL-10 nos que apresentaram redução de lesões cardíacas e redução de IL-10, mas não de IFN-γ nos que não apresentaram redução das lesões cardíacas. 13 A expressão de mRNA para as citocinas IFN-γ, IL-10 e TNF-α no tecido cardíaco aos 90 dias de infecção foram concordantes com a produção das mesmas pelas CMSP, ao se considerar o mesmo período de avaliação. 14 Aos 270 dias de infecção, a expressão de mRNA para as citocinas inflamatórias IFN-γ e TNF-α se encontrava aumentada somente no miocárdio dos cães infectados pela cepa VL-10 do T.cruzi e o tratamento com Bz não foi capaz de prevenir essa elevação. 113 Referências bibliográficas 8 - Referências bibliográficas ALIBERTI J.C., CARDOSO M.A., MARTINS G.A., GAZZINELLI R.T., VIEIRA L.Q. & SILVA J.S. 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(A) amplitude da onda P; (B) eixo QRS; (C) amplitude da onda R; (D) amplitude da onda S; (E) amplitude da onda Q e (F) duração do intervalo QT. Os exames foram realizados nos momentos antes (CNI), aos 120 dias (120DI) e aos 270 dias após a infecção (270DI). CNI: Animais não infectados; TNC: Animais infectados pelo T.cruzi e não curados após tratamento e TC: tratados e curados após tratamento com Benznidazol. (*) P<0,05 (diferença significativa em relação ao grupo controle não infectado-CNI).......................................................................................................................................................... 136 137
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