exposição a organoclorados e alterações em caracteres sexuais
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exposição a organoclorados e alterações em caracteres sexuais
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO CENTRO DE CIÊNCIAS DA SAÚDE INSTITUTO DE ESTUDOS EM SAÚDE COLETIVA EXPOSIÇÃO A ORGANOCLORADOS E ALTERAÇÕES EM CARACTERES SEXUAIS PRIMÁRIOS E SECUNDÁRIOS NA POPULAÇÃO EXPOSTA EM CIDADE DOS MENINOS, BRASIL POR RAPHAEL MENDONÇA GUIMARÃES ORIENTAÇÃO: DRA. CARMEN ILDES RODRIGUES FRÓESASMUS RIO DE JANEIRO SETEMBRO/2011 UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO CENTRO DE CIÊNCIAS DA SAÚDE INSTITUTO DE ESTUDOS EM SAÚDE COLETIVA EXPOSIÇÃO A ORGANOCLORADOS E ALTERAÇÕES EM CARACTERES SEXUAIS PRIMÁRIOS E SECUNDÁRIOS NA POPULAÇÃO EXPOSTA EM CIDADE DOS MENINOS, BRASIL POR RAPHAEL MENDONÇA GUIMARÃES TESE APRESENTADA AO INSTITUTO DE ESTUDOS EM SAÚDE COLETIVA COMO REQUISITO PARCIAL PARA OBTENÇÃO DO TÍTULO DE DOUTOR EM SAÚDE COLETIVA ORIENTAÇÃO: DRA. CARMEN ILDES RODRIGUES FRÓESASMUS RIO DE JANEIRO SETEMBRO/2011 FICHA CATALOGRÁFICA G963e Guimarães, Raphael Mendonça. Exposição a organoclorados e alterações em caracteres sexuais primários e secundários na população exposta em Cidade dos Meninos, Brasil / Raphael Mendonça Guimarães. – Rio de Janeiro: UFRJ/Instituto de Estudos em Saúde Coletiva, 2011. 240f.; 30cm. Orientador: Carmen Ildes Rodrigues Fróes Asmus. Tese (doutorado): UFRJ/Instituto de Estudos em Saúde Coletiva, 2011. Inclui bibliografia. 1. Saúde ambiental. 2. Inseticidas Organoclorados. 3. Saúde do adolescente. 4. Medicina reprodutiva. 5. Epidemiologia. I. Asmus, Carmen Ildes Rodrigues Fróes. II. Universidade Federal do Rio de Janeiro, Instituto de Estudos em Saúde Coletiva. III. Título. CDD 615.9 FOLHA DE APROVAÇÃO EXPOSIÇÃO A ORGANOCLORADOS E EFEITOS DE EIXO ENDÓCRINO-REPRODUTOR EM CRIANÇAS E ADOLESCENTES EM CIDADE DOS MENINOS, BRASIL DISSERTAÇÃO SUBMETIDA AO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM SAÚDE COLETIVA DA UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO - UFRJ, APROVADA PELA BANCA EXAMINADORA COMPOSTA PELOS SEGUINTES MEMBROS: _________________________________________ PROF. DRA. CARMEN ILDES RODRIGUES FRÓESASMUS PROFESSORAADJUNTA DO INSTITUTO DE ESTUDOS EM SAÚDE COLETIVA/UFRJ _________________________________________ PROF. DR. RONIRRAGGIO LUIZ PROFESSOR ASSOCIADO DO INSTITUTO DE ESTUDOS EM SAÚDE COLETIVA/UFRJ __________________________________________ PROFA. DRA. GULNAR AZEVEDO E SILVA PROFESSORA ADJUNTA DO INSTITUTO DE MEDICINA SOCIAL/UERJ _________________________________________ PROF. DR. W ASHINGTON LEITE JUNGER PROFESSOR ADJUNTO DO INSTITUTO DE MEDICINA SOCIAL/UERJ __________________________________________ PROF. DR. HERLING GREGÓRIO AGUILAR ALONZO PROFESSOR ADJUNTO DA FACULDADE DE MEDICINA/UNICAMP Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães NOTA INTRODUTÓRIA Esta tese sintetiza dados referentes a três estudos realizados em Cidade dos Meninos, Duque de Caxias, Rio de Janeiro, local onde, há cerca de 60 anos, há exposição a resíduos de pesticidas organoclorados. O primeiro estudo, realizado pelo Ministério da Saúde, coletou dados clínicos e informações em saúde da população moradora; um estudo de coorte retrospectiva que objetivou coletar informações sobre padrões de exposição ambiental aos compostos de contaminação local; e um estudo transversal menor, conduzido especificamente com adolescentes moradores do local. A literatura, embora de forma não consistente, aponta para a associação entre a exposição a compostos organoclorados e diversos desfechos de ordem reprodutora. Não se tem claro, ainda, se a ocorrência destes desfechos guarda relação com a idade dos indivíduos ou o momento da vida em que esta exposição se iniciou. Neste sentido, o escopo desta tese se baseia em: 1. Uma introdução descrevendo os pesticidas organoclorados, seus mecanismos de desregulação endócrina, e uma narração breve sobre a história da Cidade dos Meninos; 2. Objetivos; 3. Um capítulo sobre o referencial teórico, que é subdividido em três artigos: um primeiro sobre os mecanismos fisiológicos de interferência endócrina por parte dos compostos organoclorados; um segundo sobre os principais efeitos em adolescentes, grupo considerado de grande vulnerabilidade a interferentes com atividade estrogênica; e um último que disserta sobre a importância do estudo da Saúde Ambiental Infantil, considerando a infância como uma janela de suscetibilidade; 4. Um capítulo referente ao detalhamento dos materiais e métodos utilizados para contemplar os objetivos específicos; 5. Um capítulo de apresentação dos resultados sob a forma de três artigos: um primeiro, que avaliou a série histórica de nascimentos no local e a composição populacional segundo sexo (avaliando, assim, a razão de sexos ao nascimento); um segundo, que avaliou o padrão de desenvolvimento puberal dos i Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães adolescentes moradores do local; e um terceiro, investigando a associação entre a ocorrência de atraso puberal com a exposição local a organoclorados; 6. Uma conclusão. Desta forma, a estrutura desta tese previa a construção de 6 (seis), dos quais 3 (três) são artigos de revisão narrativa, já publicados; e outros 3 (três) com os resultados pra cada um dos objetivos específicos que serão apresentados na sequência. ii Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães AGRADECIMENTOS Talvez esta não seja a melhor forma de contar uma história, mas eu não poderia perder a oportunidade. Então, com exageros, eu vou ser bem sucinto. Eu fui uma criança saudável. Apesar dos meus terríveis maus hábitos sobre alimentação e meu sobrepeso desde o útero dissessem o contrário, gozei de boa saúde desde o início da vida. E desde o início da vida vi - e vivi - as mesmas dificuldades que muitas outras crianças também viviam. Era filho de pais separados, fui criado pelos meus avós. Minha mãe se distanciou ainda cedo, ao se casar de novo, ter a minha irmã e se mudar prá longe com seu novo marido. Enquanto estava por aqui, pude ter uma boa educação (embora tivéssemos todo tipo de dificuldades financeiras), e sempre fui cercado de amor. Lá em casa, a cada domingo e a cada programa que fazia junto com a minha tiamãe e minhas primas-irmãs, via que eu pertencia a uma típica família não-típica. Cresci, deixei de ser criança, continuei dando algum trabalho com a alimentação (acreditem, Nuggets e coca-cola não são privilégios só das crianças de hoje). Tive uma adolescência normal, típica de um menino "criado por vó": sem maior amor por esporte, com gosto duvidoso (?) pelas coisas e usando a suposta inteligência para cativar algumas pessoas e causar o distanciamento de outras. Passei alguns anos vivendo com essa timidez característica, até entrar para o antigo segundo grau. Fiz minha turma na Fiocruz. Para isso, usei os mesmos atributos de antes, mas agora eles foram bem mais eficientes. São amigos de verdade, parceiros da vida, que cultivo há 15 anos (Rafael, Fábio e Paula). E, a esta altura da vida, estes amigos já agregaram outros amigos (Vivi e Glauco), e com isso temos um grupão que não faz feio nem ao Ross, Chandler, Phoebe, Monica, Rachel e Joey. Aqueles anos foram cruciais. Foi ali que descobri uma grande parte das melhores coisas da vida. Foi ali também que decidi muitas coisas da vida, como, por exemplo, que carreira eu teria. Eu sei que muitos de vocês podem ser mais ortodoxos, céticos, mas dentre as muitas dúvidas que eu tive na época sobre que curso e que faculdade cursar (pública, obviamente, porque o din din lá de casa continuava apertado), eu tive a resposta de amigos não-vivos que foram, à época, bastante enfáticos com a minha grande dúvida: "Passei prá enfermagem sem estudar com afinco, sempre gostei de ciências exatas e, seguindo carreira na área da saúde poderia estar matando um potencial bacana. O que fazer?" . A resposta foi curta e grossa: "Faça Enfermagem. Suas habilidades com a matemática serão muito úteis na carreira que você está prestes a começar". Nem teimei. iii Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães Fui lá e destranquei a matrícula, e comecei a cursar a faculdade. Foram muitos os obstáculos. Muitos livros (caros), despesas de trajeto e permanência na faculdade... e lá fui batalhando, período por período, para construir o meu conhecimento, só meu, e que por herança da criação de vó, achava que sendo meu ele seria o melhor conhecimento de todos. Pois bem. Fui monitor desde o segundo período, fui estagiário bolsista, bolsista de iniciação científica, acadêmico bolsista... devagarzinho, aproveitando todas as oportunidades e pinçando o que eu julgava ser melhor pro que eu já estava gostando de fazer: pesquisar e ensinar. Neste período, meus avós morreram, minha irmã engravidou aos 15 anos (e em seguida, novamente aos 18), e eu finalmente sentia que voltava prá casa: fui morar com os meus tios-pais e com as minhas primas-irmãs. Minha mãe foi morar com minha irmã, com o seu namorado que se tornou marido, e com a criança que ainda estava por nascer. E ali definitivamente eu escolhi e fui escolhido pela família que eu queria ter. Eu me formei, briguei com metade dos meus professores, decidi fincar pé na saúde pública, comecei a estudar saúde do trabalhador, consolidei mais um grupo de bons amigos com quem tenho contato até hoje (Cristina, Vanessa, Renata e Jaqueline) e arrumei a maior e melhor preciosidade que eu poderia ter naqueles anos de faculdade e que eu espero que dure prá sempre (em meio a muitas confusões, é verdade, mas todas valeram a pena, e eu me lembro disso a cada dia que eu acordo e a vejo ao meu lado a Camila). Foram muitos os desencontros, muitas as brigas, mais ainda os momentos felizes. E agora, nessa reta final, a poucos dias de casarmos, vejo o quanto somos parceiros em todas as coisas. Retomamos, depois de muitos desacertos, o mesmo nível de cumplicidade que fez a gente se aproximar tanto desde o início da faculdade, e o que nos segurará um ao lado do outro até sermos bem velhinhos, e que vai fazê-la levar meu copo de coca-cola (não curto café) no portão enquanto eu estarei sublimando o nada, como qualquer idoso que se sente confortável por ter vivido tudo que precisava. Parti, já formado, para a residência. E lá, além de trabalhar com saúde pública, que àquela altura já era a minha paixão profissional, experimentei um pouco do que 5 anos antes os meus amigos não-vivos disseram que seria muito útil: minha habilidade com a matemática. Comecei a estudar mais a epidemiologia, sem deixar de estudar a saúde do trabalhador. Conheci duas pessoas que fizeram a diferença prá que eu escolhesse a epidemiologia: Enirtes e Rosane. São daquelas que você nem acredita que sejam enfermeiras. Fora dos padrões convencionais, são tão boas que você quer ser igual a elas. iv Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães E aí foi um pulo. Entrei pro mestrado, num híbrido de saúde ambiental (que conheci indiretamente pela saúde do trabalhador) e epidemiologia. Conheci uma grande amiga, a Carmen (Pitonisa – piada interna), que tomou gosto pelo meu ritmo acelerado e resolveu continuar me querendo ao lado dela prá depois retomarmos o doutorado. Uma grande amiga, com a qual fui construindo uma parceria tão prazerosa, tão sólida, que só fez crescer a minha vontade de estar sempre pelo IESC, fazendo-me sentir como seu eu realmente tivesse alguma chance de progredir nesta área. Percorri um ano e meio no mestrado, e depois disso fui trabalhar na Fiocruz, com pessoas fantásticas (Dóra, Marília, Rosane, Maria, Claudia, Márcia, Letícia e Valéria), que me faziam chutar cachorros na rua todos os dias (BTW: Paula, força de expressão), mas me ensinaram muito mais do que eu achei que fosse aprender em tão pouco tempo. Fiquei lá por 1 ano. E neste período também, prá não deixar a história ficar monótona, eu ganhei mais dois irmãos que bagunçaram um pouco a família não típica: eu morava com meus tios-pais e minhas primas-irmãs; e agora meus tios-pais, por entenderem que não tínhamos estrutura para lidar com todos os problemas sociais que vieram após o nascimento dos meus sobrinhos, resolveram adotá-los. Um de cada vez. Primeiro veio a Bia, e 3 anos depois o Alvinho. E aí todos nós lá em casa, apesar de nunca termos imaginado que isso aconteceria (até porque regularmente nos preveníamos contra isso), viramos um pouco pais de duas crianças com menos de 25 anos. Trocamos fraldas, dedicamos tempo (mesmo não tendo), demos carinho (sempre na mesma intensidade que recebemos quando éramos assim pequenos) e passamos a dividir o pouco (prá mim já não era tão pouco) que tínhamos. Revendo as contas: agora lá em casa éramos eu, tio-pai, tia-mãe, duas primas-irmãs, duas crianças, e a Camila, que mesmo não morando conosco, foi prontamente adotada por todo mundo lá em casa, tornando-se a única cunhada e nora que transitava por lá. Nessa época comecei a trabalhar também no Aprimore. E de lá sai um grupo todo especial de pessoas com quem eu convivo faz um tempo e de quem eu constantemente ouço dizer: “pena que o módulo de saúde pública não é maior”: Adriana, Patrícia, Andréia, Zé, Tatiane, Ivy, Karine, Valéria, Débora, Beth, Raquel e Marco Aurélio. Bem, depois daquele ano na Fioca, concorri e entrei pro doutorado. A esta altura, a Clara havia casado, a Leca havia se aprumado prá casar e eu continuava enrolando a Camila (já parecíamos o Rui e a Vani, éramos noivos há 5 anos). Mas sempre com uma meta comum: queríamos, prá casar de verdade, comprar nossa casa, fazer uma super viagem de lua de mel, e uma comemoração pela data. E lá se foram estes tais 5 anos. v Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães Muitas noites não dormidas e muitos dias estressantes (esqueci de comentar, em meio a todas as atividades que fazia no que eu realmente gostava de trabalhar, o ensino e a pesquisa, eu acumulei, ao longo de 5 anos, passagem por 1 hospital privado, dois federais, e dois estaduais, além da residência e do mestrado). Com a Camila não foi diferente: residência, mestrado, 2 instituições privadas, 2 federais e 1 estadual. Em cada um destes lugares, apesar de problemas com as equipes, problemas com chefias difíceis, e com inúmeras dificuldades no trabalho, fiz amigos especiais. No meu mestrado (Lessa e Denise, um psicólogo e uma psiquiatra... porque não poderia ser diferente), no mestrado da Camila (Letícia, querida amiga que não me deixa esquecer que nunca é tarde prá recomeçar; Lívia, minha grande amiga epidemiologista e agora companheira de UFRJ; Vivi e Herval, meu casal de padrinhos doidos preferido; Laércio, Dani e Cléber – mamãããããããããããããão), no Gaffrée (Luzia, Elaines, Milena, Solange, Silvana, Paula, Cristiane e Heloísa. Especialmente o Ronaldo, que por ser grande e estourado como eu foi, por algum tempo, dito “meu pai” no HUGG; e a Déia, que só pode ter sido separada de mim na maternidade. Como pode ser tão parecida? E melhor, ainda me deu de presente 4 grandes presentes: o Sandro, o Sandrinho, a Isa e o Pedrinho) e na SESDEC (Renata, Kamile, Dudu, Sérgio, Pedro e Lise). Agreguei ainda ao meu círculo a família e os amigos da Camila (tenho a mania de roubá-los para mim, porque sou mais simpático que ela): respectivamente, Tia Gerci, Tio João, Denise, Patrícia, Bruno, Bárbaras, Aninha – que não gosta de mim não sei pq, deve ser coisa de outras vidas – Humberto, Gizelle, Humbertão; e Ana, Aurélio, Rebecca, Pedro, Marquinho, Renato, Bernardo, Paola, Nelson, Aline e Raquel. Ao longo do doutorado, tive os eventos mais importantes da minha vida. Finalmente compramos nosso apartamento, conseguimos fazer o pé de meia, nos aprumamos prá casar de verdade (BTW: esta tese foi escrita entre convites de palha, tafetás, votos de casamento e bem casados), viajamos, as crianças continuaram crescendo, minhas irmãs continuaram bem casadas com o Dani e com o Rafa (que foram as melhores aquisições para a família); meus sobrinhos estudando: Bia, quando pequena, pedia prá levar o livro do "Tio Medronho" prá escola. Agora só quer saber do caderno da Tinker Bell (que no meu tempo e no de todo mundo que está lendo isso aqui se chamava Sininho); já o Alvinho, menos ambicioso, só quer saber mesmo do Ben 10 e do Relâmpago Mc Queen. Ou ele vai ser engenheiro ou vai virar super-herói, ele ainda não decidiu. Tive ainda uma surpresa inusitada, que me fez reescrever uma linha desta história vi Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães familiar depois de entregar a tese à banca: serei titio! Minha irmã caçula resolveu furar a fila e, numa manobra ninja, resolveu provar que definitivamente estamos ficando velhos e que outra geração está por vir! Conheci as Américas, parte da Europa, até na Coréia eu fui parar. Fui conhecer a IARC, e lá me apaixonei pela Epidemiologia do Câncer, curiosamente a área de interesse também da marida (e eu que lutei tanto prá que isso não acontecesse). Vi também a própria marida ter seu sonho realizado, e se tornar MCT (como ela mesma diz) no INCa. Então, juntos, conquistamos nossos maiores desejos profissionais. O que vem pela frente é construir prá cima. Fui levado pela Déia a conhecer duas pessoas especiais: a Claudinha Soares e a Gulnar. De todo o trabalho que tivemos para montar os cursos do Ministério, ficou tanto carinho e respeito acadêmico que decidimos repetir a dose para os próximos anos, certo, Gulnar? Finalmente realizei o meu sonho: passei pro concurso de professor. Primeiro, da faculdade de enfermagem da maior universidade do Brasil. Trabalhei com pessoas ótimas (Bete, Marluci, Graciele, Francimar, Gefé, Cecília, Jane). Lá, ainda, enquanto estive na EEAN, tive alunos na graduação incríveis, do quais nunca vou esquecer: Marcelle, Nathy, Samuca, Zé, Dudu, Renan, Carol, Daniel, Mariana Freitas, Ana Paula, Olga, Thay, Samyra, Yasmin, Paulo, Bruna, Aninha, Mariana Cabral, Vívian, Aloir, Camila, Laís, Patrícia, Monique, Joana, Tuane, Bárbara, Fabíola. Tive, ainda, companheiros na pós-graduação, novos amigos: Rafael Jomar e Genesis. E agora, finalmente, fui aprovado para um concurso no próprio IESC, no qual tenho o maior orgulho de ter criado uma trajetória, como mestrando, doutorando, e agora professor. Curiosamente, para a área de saúde do trabalhador, que foi a razão pela qual eu fui para lá, anos atrás, em busca do mestrado. E aí finalmente passei a trabalhar com pessoas que eu já admirava desde o início do mestrado, como a Carmen, o Volney, a Anamaria, o Armando, a Márcia, a Izabel, o Ivisson, o Ronir, a Claudia, a Mônica, a Lúcia e o Medronho. Ainda me lembro de uma conversa em Belém em que estávamos eu, Carmen, Volney e Anamaria Tambelini. E feliz percebi que ali estavam 4 gerações acadêmicas: Ana orientou Volney, que orientou Carmen, que me orientou. Como ver aquilo foi acolhedor! E agreguei a eles pessoas inusitadas que haviam passado pela minha vida anos antes, ainda na graduação, como a Jacqueline, e pessoas novas que, junto comigo, entraram no IESC prá fortalecer a SAT: Thatianna, Paula, Gabriel, Antônio e vii Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães Márcia. Poder ver no rosto das pessoas a satisfação de me ver agora como colega não tem preço. O trabalho no IESC também me proporcionou conhecer o Alonzo, cativado pelo Brasil e ainda em dívida com a gente para ir até a Lapa e se ambientar melhor por aqui... Formamos a Liga da Justiça Brasil (Cris “Reed Richards” Boccolini, Patrícia “WW” Boccolini, Bila – a Kós, Gesiele – dispensa comentários, Maíra - ném, Isabel “Totoca” Braga, Bruno Silva – o engenheiro da UFF, Ana Luiza – igualmente totoca, Juju Chrisman – a única coerente nesse hospício, Angélica – jura juradinho?), e decidimos que dela brotará a nova saga de heróis da ciência tupiniquim. E já quase nos 45 minutos do segundo tempo veio o Marco Aurélio, roots de Santa Tereza, que passou a também ser um ném... E hoje a vida está assim: aquele gordinho criado pela vó, com todas as dificuldades na vida, venceu mais esta etapa. Eu finalmente estou onde eu queria estar. E eu estou me sentindo tão bem com isso que achei que, quem quer que fosse ler esta tese, deveria saber que concluir o doutorado tem um sabor especial prá alguém que tinha tudo prá não dar certo e conseguiu não ficar preso ao que tinha de ruim (e, acreditem, não eram poucas coisas). Escrevo isso porque esta é a hora de mostrar que não há dificuldade maior que a nossa própria não-vontade de fazer as coisas serem melhores. Escrevo isso porque acabei de ler uma frase do Gandhi que diz que "A força não provém da capacidade física e sim de uma vontade indomável." E curiosamente essa frase veio ao encontro do lema de um dos super-heróis que eu mais gosto: o Lanterna Verde. Terminar este doutorado com 30 anos, já ser um professor universitário e ter ainda uns 30 anos prá continuar conquistando meu prestígio acadêmico é a prova de que isto é possível. Primeiro meus avós, depois meus pais, minhas irmãs, e mesmo a minha marida, talvez não conheçam esta frase. Mas mesmo assim me provaram diariamente estes anos todos que ela era a maior verdade em que eu poderia - e deveria - acreditar. E é a eles que eu dedico esta tese. viii Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães BAZINGA! SHELDON COOPER ix Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães E NÃO ADIANTA VIR ME DETETIZAR POIS NEM O DDT PODE ASSIM ME EXTERMINAR PORQUE VOCÊ MATA UMA E VEM OUTRA EM MEU LUGAR... RAUL SEIXAS x Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães AS PESSOAS GRANDES ADORAM OS NÚMEROS. QUANDO A GENTE LHES FALA DE UM NOVO AMIGO, ELAS JAMAIS SE INFORMAM DO ESSENCIAL. NÃO PERGUNTAM NUNCA: « QUAL É O SOM DA SUA VOZ ? QUAIS OS BRINQUEDOS QUE PREFERE ? SERÁ QUE ELE COLECIONA BORBOLETAS ? ». MAS PERGUNTAM : « QUAL A SUA IDADE ? QUANTOS IRMÃOS ELE TEM ? QUANTO PESA ? QUANTO GANHA SEU PAI ? ». SOMENTE ENTÃO É QUE ELAS JULGAM CONHECÊLO. ANTONIE DE SAINT-EXUPÉRIE xi Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães A PHYSICIST, AN ENGINEER AND A STATISTICIAN GO HUNTING. 50M AWAY FROM THEM THEY SPOT A DEER. THE PHYSICIST CALCULATES THE TRAJECTORY OF THE BULLET IN A VACUUM, RAISES HIS RIFLE AND SHOOTS. LANDS 5M SHORT. THE THE BULLET ENGINEER ADDS A TERM TO ACCOUNT FOR AIR RESISTANCE, LIFTS HIS RIFLE A LITTLE HIGHER AND SHOOTS. THE BULLET LANDS 5M LONG. THE STATISTICIAN YELLS “WE GOT HIM!”. AUTOR DESCONHECIDO xii Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães IN BRIGHTEST DAY, IN BLACKEST NIGHT, NO EVIL SHALL ESCAPE MY SIGHT LET THOSE WHO WORSHIP EVIL'S MIGHT, BEWARE MY POWER... GREEN LANTERN'S LIGHT! HAL JORDAN xiii Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães RESUMO Esta tese teve como objetivos descrever e analisar a tendência temporal da proporção entre os sexos no nascimento na Cidade dos Meninos/Rio de Janeiro/Brasil; avaliar o padrão de desenvolvimento puberal de adolescentes expostos a pesticidas organoclorados no Brasil; e estimar a magnitude da associação entre exposição a organoclorados e atraso puberal. Para atender a esses objetivos, foram utilizados dados de nascimentos entre 1937 e 2007 da população local residente, estratificado por ter ou não nascido na área. Foi realizada regressão polinomial para avaliar a tendência nas razões de sexo, e para calcular o incremento anual da razão de sexos (APC), bem como a variação dos últimos 5 e 10 anos (AAPC), utilizou-se o método joinpoint. Realizou-se um estudo descritivo com os 104 adolescentes moradores do local comparando o padrão de desenvolvimento puberal de acordo com a condição de ter ou não nascido no local. Além disto, os resultados desta população foram comparados com os de 362 outros adolescentes de uma população controle, externa à área, que reunia características sócio demográficas semelhantes. O padrão de desenvolvimento puberal incluiu as idades da menarca, telarca e pubarca para as meninas; e semenarca, pubarca, e orquimetria para meninos. O estadiamento puberal foi avaliado, segundo os critérios de desenvolvimento puberal de Tanner. As relações entre o atraso puberal e as variáveis independentes foram exploradas por razões de chance (OR) com intervalos de confiança (IC) de 95%. A análise multivariada foi efetuada por meio de regressão de Poisson, considerando as variáveis que mostraram associação com a variável dependente “atraso puberal” na análise bivariada. Para efetuar as análises do estudo foram utilizados os pacotes estatísticos SPSS 19.0 for Windows e SE Stata 11. Observou-se, na análise da série de 70 anos, que há uma tendência linear de aumento da razão de sexos com significância estatística no subconjunto da população de Cidade dos Meninos não nascida na área. Já a análise por Joinpoints apresenta variação significativa para o intervalo entre 1961 e 1999, com aumento da razão de sexos. Já no sub-conjunto da população nascida na área, há uma tendência ao declínio da proporção de nascimentos masculinos, com significância estatística. E ainda, a análise por joinpoints apresenta três períodos em que a variação foi estatisticamente significativa: entre 1937 e 1977, e entre 1995 e 2007, com queda da razão de sexos; e entre 1979 e 1993, com aumento da razão de sexos A investigação do desenvolvimento puberal nos adolescentes de CM, em comparação com a população controle, mostrou uma diferença estatísticamente significativa entre as 2 populações em relação as idades de ocorrência da menarca, telarca, pubarca e semenarca e ao tamanho dos testículos. A população exposta apresenta uma idade de ocorrência destes eventos mais tardia e um volume testicular médio menor em relação a população controle. Foi encontrada uma associação estatisticamente significativa para a condição de morar em Cidade dos Meninos (e portanto estar exposto a organoclorados) e a ocorrência de atraso puberal (OR 2,06; IC 95% 1,31 – 3,24; p=0,003 para meninas, e OR 2,28; IC 95% 1,25 – 4,15; p=0,013 para meninos). No modelo da regressão logística, a associação se manteve ao ajustar por idade (OR 1,98; IC 95% 1,27 – 3,01; p=0,009 para meninas, e OR 2,03; IC 95% 1,16 – 3,99; p=0,039 para meninos), e quando ajustado por idade, raça e IMC (OR 1,67; IC 95% 1,13 – 2,88; p=0,025 para meninas e OR 1,79; IC 95% 1,06 – 3,67; p=0,043 para meninos). Os resultados desta tese indicam que a razão de sexos é uma medida que mostra a diferenciação sexual no período da concepção e a sobrevivência até o nascimento. Conclui-se, também, que é uma medida sensível à exposição ambiental a compostos que interferem no metabolismo hormonal, como os compostos organoclorados. Os dados apontam para uma associação entre a exposição aos orgaloclorados e a ocorrência de atraso puberal, tanto em meninos quanto em meninas. Portanto, recomenda-se que estudos futuros considerem este período do ciclo vital como de suscetibilidade para a exposição a organoclorados. Palavras –Chave: Saúde ambiental, Inseticidas Organoclorados, Saúde do adolescente, Medicina reprodutiva, Epidemiologia. xiv Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães ABSTRACT This thesis aimed to describe and analyze the trend of sex ratio at birth in the Cidade dos Meninos/ Rio de Janeiro / Brazil; to evaluate the pattern of pubertal development in adolescents exposed to organochlorine pesticides in Brazil and to estimate the magnitude of association between exposure to organochlorines and pubertal delay. To meet these objectives, we used data for births between 1937 and 2007 the local resident population, stratified by whether or not born in the area. Polynomial regression was performed to assess the trend in sex ratios, and to calculate the annual increase in the sex ratio (APC) as well as the variation of the last 5 and 10 years (AAPC), we used the method joinpoint. In addition, we compared the 104 young residents of the site with 362 other teens in a control population, outside the area, bringing together similar sociodemographic characteristics, among which there was a descriptive study that compared the pattern of development within the population exposed, according to the condition of having or not born there. Besides, we compared to the local population with the control population of similar sociodemographic characteristics. The stage of pubertal development took into account age at menarche, thelarche and pubarche for girls, and semenarche, pubarche, and orquimetria for boys. The pubertal stage was assessed according to the criteria of Tanner pubertal development. The relationship between health and pubertal delay the independent variables were explored as odds ratios (OR) with confidence intervals (CI) of 95%. Multivariate analysis was performed by Poisson regression, considering the variables associated with the dependent variable "pubertal delay" in the bivariate analysis. To make the analysis of the study used statistical packages SPSS 19.0 for Windows and Stata SE 11. It was observed in the analysis of series of 70 years, there is a linear trend of increasing sex ratios with statistical significance in the subset of the population of the Cidade dos Meninos who do not born in the area. The analysis shows significant variation by Joinpoints for the interval between 1961 and 1999, an increase in the sex ratio. In the subset of the population born in the area, there is a declining trend in the proportion of male births, with statistical significance. And yet, the analysis shows joinpoints three periods in which the change was statistically significant: between 1937 and 1977 and between 1995 and 2007, falling sex ratios, and between 1979 and 1993, an increase in the sex ratio. Since the raw data pointed to differences when comparing the populations considering exposure on the spot. However, there seems no difference with in utero exposure, considering the birth site as a proxy for this condition. Regarding this result, the hypothesis is that the influence on pubertal development does not occur by exposure in utero, but by postnatal exposure. And yet, found a statistically significant association between the condition of living in Cidade dos Meninos (and thus be exposed to organochlorines) and the occurrence of delayed puberty (OR 2.06, 95% CI 1.31 to 3.24, p = 0.003 for girls, and OR 2.28, 95% CI 1.25 to 4.15, p = 0.013 for boys). The Poisson regression model the association remained when adjusting for age (OR 1.98, 95% CI 1.27 to 3.01, p = 0.009 for girls, and OR 2.03, 95% CI 1.16 - 3.99, p = 0.039 for boys), and when adjusted for age, race and BMI (OR 1.67, 95% CI 1.13 to 2.88, p = 0.025 for girls and OR 1.79, 95 % 1.06 to 3.67, p = 0.043 for boys). This thesis suggests the following findings: the sex ratio is a measure that shows the sexual differentiation and survival time of conception until birth. We conclude for now that is a measure sensitive to the ambient exposure to compounds that interfere with hormone metabolism, such as organochlorine compounds. The data show an association between exposure to orgaloclorados and the occurrence of delayed puberty, both boys and girls. Therefore, it is recommended that future studies consider this period of the life cycle and susceptibility to exposure to organochlorines, to estimate the magnitude of association between exposure to the compound and problems in pubertal development, is precocious puberty or delayed puberty. Keywords: Environmental Health, Organochlorine Pesticides, Adolescent Health, Reproductive EMdicine, Epidemiology. xv Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães LISTA DE SIGLAS E ABREVIAÇÕES Anvisa Agência Nacional de Vigilância Sanitária ALA-D Alamina amina-transferase ATSDR Agency for Toxic Substances and Disease Registry (Agência de Registro de Substâncias Tóxicas e de Doenças) BHC Hexaclorobenzeno CaO Óxido de Cálcio CESTEH Centro de Estudos de Saúde do Trabalhador e Ecologia Humana CETESB Companhia de Tecnologia de Saneamento Ambiental do Estado de São Paulo cm Centímetro DDT Diclorodifeniltricloroetano EPA Environmental Protection Agency (Agência de Proteção Ambiental) FAO Food and Agriculture Organization Feema Fundação Estadual de Engenharia do Meio Ambiente Funasa Fundação Nacional de Saúde GABA Ácido gama-amino-butírico Gama GT Gama-glutamil-transferase HCB Hexaclorobenzeno HCH Hexaclorociclohexano -HCH Isômero Alfa do Hexaclorociclohexano -HCH Isômero Beta do Hexaclorociclohexano -HCH Isômero Gama do Hexaclorociclohexano -HCH Isômero Delta do Hexaclorociclohexano IARC International Agency Research of Cancer (Agência Internacional de Pesquisa em Câncer) Ibama Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis IPCS International Programe on Chemical Safety OMS Organização Mundial da Saúde OPAS Organização Pan-Americana da Saúde op’-DDD Isômero Orto, para, do Composto Diclorodifeniltricloroetano op’-DDE Isômero Orto, para, do Composto Diclorodifeniltricloroetano op’-DDT Isômero Orto, para, do Composto Diclorodifeniltricloroetano PCB Polycholrinated biphenyl (Bifenilas policloradas) PCDD Policlorados dibenzodioxina PCDF Policlorados dibenzeno furano PCF Pentaclorofenol p/p Peso por Peso ppb Partes por Bilhão (µg/Kg, µg/L) pp’-DDD Isômero para, Para, do Composto Diclorodifeniltricloroetano pp’-DDE Isômero para, Para, do Composto Diclorodifeniltricloroetano pp’-DDT Isômero para, Para, do Composto Diclorodifeniltricloroetano ppm Partes por Milhão (mg/Kg, mg/L) SNC Sistema Nervoso Central TCB Triclorobenzeno 1,2,4 - TCB Isômero 1, 2, 4 do Triclorobenzeno TCF e TCP Triclorofenol 2,4,5 - TCF Isômero 2, 4, 5 do Triclorofenol 2,4,6 - TCF Isômero 2, 4, 6 do Triclorofenol WHO World Health Organization xvi Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães LISTA DE QUADROS E FIGURAS FIGURAS PÁGINA FIGURA 01: ESTRUTURA QUÍMICA DOS ESTRÓGENOS NATURAIS E SINTÉTICOS 4 FIGURA 02: PRINCIPAIS MECANISMOS POTENCIAIS DE DISRUPÇÃO ENDÓCRINA 18 FIGURA 03: FÁBRICA DE INSETICIDAS CONSTRUÍDA NO TERRENO DE CIDADE DOS MENINOS. 23 FIGURA 04: VISTA AÉREA DA FUNDAÇÃO ABRIGO CRISTO REDENTOR 24 FIGURA 05: INSTITUTO PROFISSIONAL GETÚLIO VARGAS 24 FIGURA 06: VILA MALÁRIA 25 FIGURA 07: NOTÍCIA VEICULADA SOBRE A PROPOSTA DE INTERVENÇÃO DO MINISTÉRIO DA 35 SAÚDE EM CIDADE DOS MENINOS. QUADROS QUADRO 01: CLASSIFICAÇÃO DAS SUBSTÂNCIAS QUANTO À CARCINOGENICIDADE SEGUNDO A IARC, 1999 QUADRO 02: CONTAMINANTES DE INTERESSE CLÍNICO E TOXICOLÓGICO DE ACORDO COM SUA ORIGEM. QUADRO 03: MECANISMOS DE DISRUPÇÃO ENDÓCRINA PROVOCADA POR ORGANOCLORADOS E DISTÚRBIOS ENDÓCRINOS QUADRO 04: DESFECHOS REPRODUTORES ASSOCIADOS A ORGANOCLORADOS ESPECÍFICOS. PÁGINA 14 15 19 20 xvii Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães xvii SUMÁRIO Seção Nota Introdutória Agradecimentos Resumo Abstract Lista de Siglas e Abreviações Lista de Figuras, Quadros e Tabelas Pág i iii xiv Xv xvi xvii Introdução 1 Justificativa 40 Objetivos 42 Capítulo 1: Referencial Teórico Artigo 1: Janelas críticas para o sistema endócrino-reprodutor: utilização de períodos fisiológicos para a mensuração de risco à saúde humana por exposição a organoclorados. Cad. Saúde Colet., 2009, Rio de Janeiro, 17 (2): 375 - 390 Artigo 2: Desreguladores endócrinos e efeitos reprodutores em adolescentes. Cad. Saúde Colet., 2010, Rio de Janeiro, 18 (2): 203-8 Artigo 3: Por quê uma saúde ambiental infantil? Avaliação da vulnerabilidade de crianças a contaminantes ambientais. Pediatria (São Paulo) 2010;32(4):239-45 Capítulo 2: Materiais e Métodos 43 60 74 87 Capítulo 3: Resultados Artigo 4: Exposição a organoclorados e razão de sexos ao nascimento: série histórica em Cidade dos Meninos/Brasil Artigo 5: Desenvolvimento puberal de adolescentes expostos a organoclorados. Artigo 6: Atraso puberal associado à contaminação por pesticidas organoclorados no Brasil 114 Conclusão 151 Referências 153 Anexos 94 133 INTRODUÇÃO Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães DESREGULAÇÃO ENDÓCRINA POR POLUENTES A origem da hipótese da ação dos desreguladores endócrinos deve-se a acontecimentos importantes, tais como, o aparecimento de câncer no sistema reprodutivo de filhas de mulheres que usaram DES (dietilestilbestrol) na gravidez, entre os anos de 1940 a 1970 (Birkett et al, 2003); anomalias no sistema reprodutivo observadas em jacarés que habitavam um lago na Flórida contaminado com o pesticida DDT e seu metabólito DDE (Guillette et al, 1996) e um estudo na Dinamarca que relata o declínio da qualidade do sêmen de homens durante aproximadamente 50 anos, entre os anos de 1938 e 1990 (Carlsen et al, 1992). Atualmente, as maiores preocupações em relação à exposição de humanos e outros animais aos desreguladores endócrinos são: se essas substâncias podem produzir efeitos tóxicos em baixas concentrações; quais substâncias estão associadas aos efeitos tóxicos a baixas concentrações; se essas substâncias estão presentes em concentrações ambientalmente relevantes que possam ser uma ameaça à saúde de humanos e animais; se existe uma concentração limiar abaixo da qual essas substâncias químicas podem ser consideradas como seguras; se os novos tipos de ensaios, usados para prever os efeitos causados em organismos expostos, podem realmente fornecer ferramentas para o entendimento do mecanismo de ação dessas substâncias e, se esses ensaios podem ser facilmente usados em larga escala para monitorar seus efeitos no meio ambiente. Várias são as substâncias que possuem a capacidade de afetar o sistema endócrino, tais como, substâncias sintéticas (alquilfenóis, pesticidas, ftalatos, policlorados de bifenilas (PCB), bisfenol A, substâncias farmacêuticas, entre outras) e substâncias naturais (estrogênios naturais e fitoestrogênios). Desreguladores Endócrinos (DE) As substâncias denominadas desreguladores endócrinos são uma categoria recente de poluentes ambientais que interferem nas funções do sistema endócrino. Essas substâncias são encontradas no meio ambiente em concentrações da ordem de µg L-1 e ng L-1 e são suspeitas de causarem efeitos adversos à saúde humana e animal. 1 Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães Alguns efeitos citados na literatura, tais como diminuição na eclosão de ovos de pássaros, peixes e tartarugas; feminização de peixes machos; problemas no sistema reprodutivo em peixes, répteis, pássaros e mamíferos e, alterações no sistema imunológico de mamíferos marinhos, têm sido associados à exposição de espécies de animais aos desreguladores endócrinos. Em alguns casos esses efeitos podem conduzir ao declínio da população. Em seres humanos esses efeitos incluem a redução da quantidade de esperma, o aumento da incidência de câncer de mama, de testículo e de próstata e, a endometriose (Louie, 2003). Os DE abrangem uma grande faixa de classe de substâncias com estruturas distintas, incluindo hormônios sintéticos e naturais, substâncias naturais e uma grande quantidade de substâncias sintéticas. Definição Algumas definições são propostas para essas substâncias, denominadas em inglês "Endocrine Disrupting Chemicals" (EDCs). Alguns autores entendem que são considerados "endocrine disrupting chemicals" somente as substâncias que interagem com sítios receptores de hormônios, enquanto outros entendem como qualquer substância que cause desequilíbrio, interferência ou alteração no sistema endócrino, independentemente se atua diretamente no sítio receptor ou não. De acordo com a "Environmental Protection Agency" (EPA), um desregulador endócrino é definido como um16 agente exógeno que interfere com síntese, secreção, transporte, ligação, ação ou eliminação de hormônio natural no corpo que são responsáveis pela manutenção, reprodução, desenvolvimento e/ou comportamento dos organismos. (U.S. EPA, 1997). O Programa Internacional de Segurança Química (IPCS), em conjunto com o Japão, os EUA, o Canadá, a OECD e a União Européia, adotou a seguinte definição: um desregulador endócrino é uma substância ou um composto exógeno que altera uma ou várias funções do sistema endócrino e tem, conseqüentemente, efeitos adversos sobre a saúde num organismo intacto, sua descendência, ou (sub) populações (IPCS, 1999). A tradução do termo "endocrine disrupting chemicals" também não é simples, sendo que existem cinco possíveis traduções: perturbadores endócrinos, interferentes 2 Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães endócrinos, desreguladores endócrinos, disruptores endócrinos e interferentes hormonais. Mesmos os termos em inglês geram dúvidas em relação aos seus efeitos e a existência de vários termos confirma isso. Na literatura podem ser encontrados "endocrine disrupting", "endocrine modulator", "environmental estrogen", sendo o primeiro termo o mais usado. Segundo"o "American Council on Science and Health" (ACSH,1999), o termo "endocrine disrupting" sugestiona que os efeitos de tais substâncias são negativos, sendo no entanto concebível que a exposição a essas substâncias hormonalmente ativas pode conduzir a resultados benéficos. Já, segundo a ACHS, as substâncias "endocrine modulator" referem-se às substâncias químicas industriais, tais como, policlorados de bifenilas e pesticidas. Existem ainda outras definições para as substâncias estrogênicas presentes no meio ambiente. Freqüentemente, são referidos como estrogênios ambientais, estrogênios exógenos ou exoestrogênios. Exoestrogênios são diversos grupos de substâncias que não necessariamente apresentam alguma semelhança com a estrutura química do 17β-estradiol, mas causam respostas antagônicas e agônicas, possivelmente através de mecanismos de ação via receptores hormonais. A atividade agonista é a capacidade de uma substância acoplar-se ao receptor de hormônios esteróides e desencadear uma resposta. Em contrapartida, a atividade antagonista é a habilidade de uma substância acoplar-se ao receptor de estrogênio e bloquear a ação do ligante natural (estrogênio) e, assim, sua resposta não será desencadeada. Essas substâncias podem ser identificadas por sua capacidade de ligar-se ao receptor de estrogênios (RE) e induzir ou atenuar uma resposta hormonal (Zacharewski,et al, 1997). Os estrogênios endógenos são produzidos naturalmente pelo corpo humano, como por ex., o 17β-estradiol e a estrona. A Figura 2 apresenta as estruturas químicas de alguns estrogênios naturais e sintéticos. As substâncias sintéticas com atividade estrogênica também são denominadas de xenoestrogênios por alguns autores (Desbrow et al, 1998; Nogueira, 2003; Safe, 2004; Soto et al, 1995). Os termos estrogênios ambientais ou eco-estrogênios também geram controvérsias no meio científico, pois omitem a possibilidade de substâncias que não sejam estrogênicas, como por ex., andrógenos (hormônios masculinos), anti–andrógenos e antiestrogênicas, poderem afetar o sistema endócrino. Outros autores usam o termo 3 Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães substância estrogênica para quaisquer substâncias que interagem com receptores de hormônios esteróides, sendo ele receptor de estrogênio ou não. Outras definições também geram confusões, que alguns autores tentam esclarecer (Gray et al, 1997). Substância estrogênica refere-se à substância cujo efeito se dá através do receptor de estrogênio, iniciando uma cascata de efeitos específicos no tecido/célula similar aos iniciados pelo 17β-estradiol. Os termos anti-andrógeno e anti-estrogênico não são especificamente limitados às interações através dos RA e RE, respectivamente. Anti-hormônios podem atuar via receptores de hormônios esteróides, inibição da síntese dos hormônios esteróides, diminuição da biodisponibilidade pela redução da quantidade de hormônios livres no sangue, aumento do metabolismo dos hormônios que conduz a uma redução dos níveis desses hormônios no sangue, entre outros mecanismos (Gray et al, 1997) FIGURA 1: ESTRUTURA QUÍMICA DOS ESTRÓGENOS NATURAIS E SINTÉTICOS Fonte: Casarett, 2003 Assim, apesar dos chamados "endocrine disrupting chemicals" originalmente terem sido relacionados com substâncias que mimetizam a ação dos estrogênios naturais, a descoberta de outros mecanismos de ação gerou uma confusão na nomenclatura. Com isso, o que se percebe é que a comunidade científica ainda não entrou em consenso sobre qual a nomenclatura correta que deve ser empregada para 4 Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães essa classe de substâncias, no que se refere a todos os seus efeitos causados. Histórico e Estado da Arte O caso mais famoso sobre os desreguladores endócrinos é o do DDT e seus subprodutos, um pesticida muito utilizado em todo mundo durante as décadas de 50 e 60, e que ainda hoje é usado em alguns países. Estudos mostraram que o DDT é persistente no meio ambiente, apresenta atividade estrogênica e pode afetar o sistema reprodutivo de mamíferos e pássaros. Exemplo disso são as anomalias detectadas no sistema reprodutivo de jacarés em vários lagos da Flórida contaminados com DDT. Segundo Safe (1995), em 1962, Rachel Carson publicou o livro "Silent Spring", que foi um dos primeiros relatos sobre a ligação da presença do pesticida DDT no meio ambiente e o declínio na população de algumas espécies de animais. Uma fase bastante crítica à exposição de desreguladores endócrinos é a do desenvolvimento fetal; o exemplo mais claro dos efeitos causados em fetos foi o uso do potente estrogênio sintético DES em mulheres grávidas, entre os anos de 1948 a 1970. Este fármaco era prescrito por médicos para evitar abortos e promover o crescimento fetal. Mais tarde observou-se que as crianças nascidas de mulheres que fizeram uso desse medicamento, quando atingiam a puberdade apresentaram disfunção no sistema reprodutivo, gravidez anormal, redução na fertilidade, desordem no sistema imunológico e muitas desenvolveram câncer vaginal (Colborn 1993; Birkitt et al, 2003). Os efeitos relatados a curto, médio e longo prazo do DES têm servido como exemplo e de comparação para os efeitos da exposição de seres humanos aos desreguladores endócrinos. Este é o primeiro exemplo documentado de uma substância química que, quando administrada à mãe, pode causar câncer na filha. Colborn et al (2003) publicaram uma revisão sobre anomalias em pássaros e peixes associadas à exposição de subprodutos industriais (dioxinas e bifenilas policloradas) e pesticidas (DDT), em áreas como os Grandes Lagos na América do Norte. Também relataram que a exposição humana ao DES ocorrida no passado serve como um modelo para a exposição a substâncias estrogênicas durante o estágio prematuro da vida. 5 Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães Em 1996, Colborn e colaboradores publicaram o livro Our Future Stolen que também relatou a possibilidade de efeitos no sistema endócrino de humanos e outros animais serem causados por substâncias presentes no meio ambiente. Este livro faz um levantamento detalhado de problemas ambientais causados por substâncias químicas que, mesmo em baixas concentrações, podem causar efeitos adversos ao sistema reprodutivo de animais. Substâncias classificadas como desreguladores endócrinos Com base em informações disponíveis na literatura foram elaboradoas, por várias organizações mundiais, listas de substâncias químicas suspeitas de causar desregulação do sistema endócrino (Birkett et al, 2003; Colucci et al, 2001; Lai et al, 2000; CEC, 1996; CEC, 2001). Contudo, ainda são necessários mais dados científicos para uma investigação mais profunda a fim de identificar os critérios de seleção utilizados para agrupar as substâncias nestas listas. Para tal, a UE lançou um estudo que é o primeiro passo para estabelecimento de uma lista de substâncias para a futura avaliação do seu papel na desregulação endócrina. As substâncias classificadas como DE, incluindo substâncias naturais e sintéticas, usadas ou produzidas para uma infinidade de finalidades podem ser agrupadas em duas classes: 1. substâncias sintéticas - utilizadas na agricultura e seus subprodutos, como pesticidas, herbicidas, fungicidas e molusquicidas; utilizadas nas indústrias e seus subprodutos, como dioxinas, PCB, alquilfenóis e seus subprodutos, HAP, ftalatos, bisfenol A, metais pesados, entre outros; compostos farmacêuticos, como os estrogênios sintéticos DES e 17α-etinilestradiol e, 2. Substâncias naturais fitoestrogênios, tais como, genisteína e metaresinol e estrogênios naturais 17βestradiol, estrona e estriol (Santodonato et al, 1999). Resíduos de vários pesticidas vêm sendo encontrados em alimentos, água potável e corpos hídricos. Os pesticidas foram e ainda estão sendo largamente utilizados no mundo, sendo o maior grupo de substâncias classificadas como desreguladores endócrinos. Na classe dos pesticidas, estão inclusos inseticidas, herbicidas e fungicidas, que são utilizados na agricultura, na aqüicultura e no uso domiciliar. 6 Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães Os hidrocarbonetos aromáticos policíclicos (HAP) são substâncias que apresentam potencial de bioacumulação e atividade estrogênica (Santodonato et al, 1999). e podem ser encontrados na indústria petroquímica e na queima de gasolina e óleo diesel. Alguns subprodutos dos processos de combustão são suspeitos de serem desreguladores endócrinos, como os PCDD (policlorodibenzo-p-dioxinas) e PCDF (policlorodibenzofuranos), comumente chamados de dioxinas e furanos, respectivamente. Esses organoclorados podem ser produzidos durante a incineração de hidrocarbonetos clorados e do papel, na produção de PVC e de compostos aromáticos clorados, como o 2,4,5-triclorofenol. Pesquisas mostram que essas substâncias persistem e bioacumulam no meio ambiente (Birkett et al, 2003) Outros organoclorados, como as bifenilas policloradas (PCB) também apresentam atividade estrogênica. No passado, eram utilizados em várias aplicações, como fluidos de transferência de calor em transformadores e como fluidos dielétricos em capacitores. Contudo, ainda que não estejam mais sendo usados, estão presentes em algumas instalações antigas (Birkett et al, 2003). Desreguladores endócrinos também são encontrados na indústria química, como detergentes, resinas, alguns aditivos e monômeros utilizados na produção de plásticos. Os ftalatos são usados como aditivos (plastificantes) em alguns plásticos, principalmente na produção de PVC. Podem ser encontrados em brinquedos infantis, embalagens de produtos alimentícios e equipamentos médicos. Devido a sua persistência no meio ambiente, os ftalatos são comumente encontrados em águas superficiais e de subsolo (Hutchins et al, 1984; Fromme et al, 2002). Os surfactantes alquilfenóis e seus etoxilados (APEO), particularmente o nonilfenol (NP), apresentam uma variedade de aplicações, incluindo detergentes industriais e domésticos, lubrificantes, emulsificantes e estão presentes em formulações de pesticidas, de tintas e de produtos de uso pessoal (maquiagem, cremes de pele, produtos para cabelo e banho) (Birkett et al, 2003). As possíveis rotas de entrada dessas substâncias no meio ambiente são durante sua produção, uso e disposição (Hutchins et al, 1984; Fromme et al, 2002). O bisfenol A é extensamente usado na produção de plásticos, em particular os policarbonatos, como o heptaclor e resinas epóxi (Biles et al, 1997; Fürhacker, 2000). 7 Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães Pode ainda ser encontrado em adesivos, papéis para fax, tubulações, painéis de carros e produtos eletrônicos. Também estão presentes em revestimentos de latas de conservas e frascos de alimentos para bebês, podendo ser liberado destes causando problemas para a saúde humana. Alguns polímeros usados no tratamento dentário também contêm bisfenol A. A exposição humana a esse composto é considerável (Biles et al, 1997; Fromme et al, 2002) e sua atividade estrogênica tem sido muito relatada (Beresford, 2000; De Boeyer et al, 2001; Gaido et al, 1997). Os retardadores de chama bromados (BFR), os chamados difenil-éteres polibromados (PBDE), são um grupo de substâncias químicas adicionadas em alguns produtos, como computadores, TV e tecidos domésticos para atrasar a combustão. Essas substâncias são persistentes, lipofílicas e bioacumulativas (Birkett et al, 2003). Os parabenos são ésteres de alquil de ácido para-hidrobenzóico, compostos utilizados como conservantes em cosméticos e em algumas pastas dentárias. Vários compostos deste grupo apresentam atividade estrogênica (Reys et al, 2001). Alguns agentes terapêuticos e farmacêuticos também estão na lista das substâncias classificadas como desreguladores endócrinos. São estrogênios sintéticos usados como contraceptivos orais, na reposição terapêutica na menopausa ou na prevenção do aborto, tais como, DES e o 17α-etinilestradiol (Beausse, 2004). A maior aplicação médica do 17α-etinilestradiol tem sido no desenvolvimento de pílulas contraceptivas, que contêm de 30 a 50 µg de 17α-etinilestradiol por pílula. O DES foi muito usado nos anos 70 na prevenção do aborto (Birkett et al, 2003). Uma variedade de hormônios naturais é encontrada em plantas e são chamados de fitoestrogênios. Uma grande quantidade dessas substâncias é absorvida através da dieta alimentar. Alimentos como grãos integrais, ervilhas, feijão, alguns vegetais e frutas contêm fitoestrogênios. A soja e os alimentos baseados em soja, como tofu, são alguns dos alimentos que possuem essas substâncias. Os fitoestrogênios mais estudados são da classe dos lignanos e das isoflavonas. Os fitoestrogênios são compostos naturais mais fracos que os estrogênios endógenos. Estudos indicam que essas substâncias podem se acoplar aos RE e podem funcionar como agonistas ou antagonistas no sistema endócrino2. Cabe ressaltar que algumas dessas substâncias tiveram seus usos proibidos ou não são mais produzidas, porém ainda podem ser encontradas no meio ambiente dada 8 Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães sua longa persistência. O Eixo Regulador do Corpo: interações neuro-endócrino-imunológicas O eixo neuro-endócrino-imunológico é um campo decorrentes de novas visões sobre a conexão entre os principais sistemas reguladores do corpo. Observações interessantes a partir do comportamento das infecções e doenças humanas permitiram desenvolver sistemas experimentais para proporcionar uma sólida base científica para uma nova compreensão e abordagem do processo de regulação do funcionamento do organismo humano (Aller et al, 1996) . Recentemente, tem havido um grande esforço para compreender as influências do sistema nervoso sobre as respostas imunes e inflamatórias, por exemplo, a inervação do sistema imunológico, as vias de comunicação molecular, e os fenômenos complexos, tais como o condicionamento das respostas imune e mecanismos de defesas do hospedeiro. Desequilíbrios no circuito neuro-endócrinoimunológicosão relevantes às defesas do hospedeiro e na evolução dos ferimentos e sua reparação. Exemplos são observados em vários modelos hospedeiro-parasita de inflamação neurogênica, as respostas de hipersensibilidade imediata e formação de granulomas. Efeitos causados pela exposição aos desreguladores endócrinos Os riscos em potencial dos desreguladores endócrinos têm sido tema de vários debates internacionais e pesquisas científicas (U.S.EPA, 1997; ACSH, 1999; Colborn et al, 1993; Goldman et al, 2000). O ponto principal desta questão é se há evidências significativas de que essas substâncias possam causar efeitos danosos em humanos e outros animais e se há níveis suficientes de desreguladores endócrinos no meio ambiente para exercerem esses efeitos. Efeitos relatados em humanos Uma variedade de substâncias químicas é suspeita de causar efeitos adversos na saúde humana, resultando em alterações no sistema endócrino, incluindo efeitos no 9 Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães sistema reprodutivo feminino (diferenciação sexual, função dos ovários, aumento no risco de câncer de mama e de vagina, ovários policísticos e endometriose) e no sistema reprodutivo masculino (redução na produção de esperma, aumento do risco de câncer testicular e de próstata, infertilidade e alterações nos níveis hormonais da tireóide). Esses e outros efeitos foram revisados em alguns estudos (U.S.EPA, 1997; (Daston et al, 1997; Harrisson et al, 1997; Weber et al, 2002). No que diz respeito aos efeitos na saúde humana, o Comitê Científico da Toxicidade, Ecotoxicidade e Ambiente (CSTEE, 1999) concluiu que há relação entre alguns desreguladores endócrinos e alterações na saúde humana, como o câncer de testículo, de mama e de próstata, o declínio das taxas de espermatozóides, deformidades dos órgãos reprodutivos e disfunção da tiróide. Os esteróides podem, em alguns casos, estar envolvidos na iniciação de um tumor e induzirem eventos críticos na "progressão" maligna destes cânceres (Dickson & Lippman, 1986). Alguns tipos de câncer podem estar ligados à exposição inadequada e/ou prolongada a hormônios endógenos ou substâncias estrogênicas. A proliferação celular aumenta devido à indução por estrogênios, o que leva ao aumento da probabilidade de ocorrerem mutações durante a síntese de DNA. O desenvolvimento e as funções do sistema reprodutivo feminino dependem do balanço e das concentrações dos hormônios (estrogênios, andrógenos e tireoidianos), assim, uma disfunção no sistema endócrino pode resultar em algumas anomalias, tais como, irregularidades no ciclo menstrual, prejuízos na fertilidade, endometriose e ovários policísticos (Nicolopoulou-Stamati & Pitsos, 2001). Sabe-se que os desreguladores endócrinos têm a capacidade de modular ou alterar a intensidade dos hormônios, no entanto, resta saber se essas substâncias podem realmente afetar as funções do sistema reprodutivo feminino. Contudo, alguns fatos demonstram que isso pode realmente ocorrer, como o desenvolvimento de anomalias no sistema reprodutivo feminino de meninas nascidas de mães que fizeram uso de DES durante a gravidez, tais como, câncer vaginal, gravidez anormal e redução na fertilidade. Este fato é, sem dúvida, uma evidência dos efeitos da exposição aos desreguladores endócrinos. Vários grupos de pesquisas acreditam que grande parte da população sofre com o decréscimo na qualidade do sêmen nas últimas décadas. De 1973 a 1992, Auger et al 10 Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães (1995) analisaram a qualidade do sêmen de um grupo de homens férteis saudáveis, levando em conta o volume do fluido seminal, a concentração de esperma e a mobilidade e morfologia dos espermatozóides. Os autores observaram um declínio na concentração e mobilidade dos espermas nos homens por um período de 20 anos, e esse decréscimo da qualidade do sêmen coincide um aumento na incidência de anomalias no sistema reprodutivo masculino, incluindo câncer testicular. O aumento da incidência de câncer testicular também tem sido relatado por outros autores (Weber et al, 2002). Apesar de alguns pesquisadores sugerirem que pode não haver relação entre a exposição aos desreguladores endócrinos e alguns efeitos danosos em humanos, tal como a incidência de câncer de mama (Safe, 1995), revisões indicam que há claras evidências experimentais e epidemiológicas do papel dessas substâncias na disfunção no sistema reprodutivo humano (Guimarães, 2007), em especial para o grupo dos pesticidas organoclorados. ORGANOCLORADOS Os organoclorados fazem parte do grupo de desreguladores endócrinos, e são compostos de carbono, hidrogênio e cloro. Os compostos organoclorados são hidrocarbonetos clorados sintetizados pelo homem, portanto, não ocorrem naturalmente no ambiente. Podem ser divididos em dois grupos: baixo e alto peso molecular. Os pesticidas organoclorados e bifenilas policloradas (PCBs) enquadram-se na classificação de alto peso molecular. Além disso, fazem parte de um grupo de compostos classificados como poluentes orgânicos persistentes (POPs). Tal atribuição deve-se a três características básicas: persistência ambiental, bioacumulação (com conseqüente biomagnificação na cadeia trófica) e alta toxicidade. (Casarett, 2001). A persistência no ambiente é definida pelo tempo que o produto químico leva para perder pelo menos 95% de sua atividade, ou seja, para se decompor em estruturas mais simples, basicamente CO2 e H2O, sob condições ambientais e usos habituais. Aqueles que não são persistentes levam de uma a três semanas para serem degradados, os de persistência moderada, de 1 a 18 meses e os persistentes, dois ou mais anos. (La Dou, 2004) 11 Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães Em 1874, foi sintetizado o primeiro inseticida organoclorado, o 2,2,bis (pclorofenil) 1,1,1- tricloroetano, mundialmente conhecido como DDT, mas somente em 1939 que Paul Müller descobriu suas propriedades inseticidas. Após sua introdução na Inglaterra, no começo da década de 40, o DDT apresentou resultados tão magníficos no controle de pragas que chegou a ser comparado à penicilina e ao radar em termos de benefícios para a humanidade, motivo pelo qual foi considerado a maior descoberta científica da época (La Dou, 2004). Já o HCH (1,2,3,4,5,6 - hexaclorociclohexano) foi primeiramente sintetizado por Michael Faraday em 1825, através da reação entre cloro e benzeno na presença de luz solar. No ano de 1912, van der Linden demonstrou a existência de 4 isômeros do HCH. Durante a II Guerra Mundial os pesticidas organoclorados salvaram populações inteiras do tifo e outras doenças provenientes de insetos. Na época, não havia nenhuma preocupação com possíveis danos à saúde humana. (Casarett, 2001) No início dos anos 60, o composto milagroso começou a despertar desconfiança e preocupação quando Raquel Carson acusou em sua obra intitulada “Primavera Silenciosa” graves problemas ambientais, como o enfraquecimento das cascas de ovos de várias espécies de pássaros, como pelicano, falcão e águia, provocado pela contaminação por DDT e seus metabólitos. Atualmente sabe-se que esses compostos afetam o metabolismo do cálcio (Casarett, 2001). Inúmeros trabalhos foram produzidos posteriormente ficando definitivamente comprovada a ação nociva dessas substâncias para o meio ambiente e a saúde pública, o que levou à restrição de uso, e até proibição, em diversos países. Propriedades tais como baixa volatilidade, estabilidade química, solubilidade lipídica, baixa taxa de biotransformação e degradação, que fizeram com que esses químicos se tornassem inseticidas tão eficientes, também os baniram por causa de sua extrema persistência no meio ambiente, bioconcentração e biomagnificação* dentro das variadas cadeias alimentares (Ecobichon, 1996). A maioria dos organoclorados é classificada como persistente. Devido à característica de persistência no ambiente, os organoclorados têm maior chance de penetrar nas diversas cadeias alimentares e permanecer, por tempo indeterminado, no 12 Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães ecossistema. O que torna esses compostos danosos, além de sua persistência, é o fato de serem lipossolúveis e de difícil eliminação. Eles ficam estocados no tecido adiposo da cadeia animal, o que faz com que os animais constituam-se em verdadeiros compartimentos de reserva desses produtos. Há referência de que cerca de 96% da exposição humana aos organoclorados e dioxinas dá-se por meio da ingestão de alimentos, principalmente de origem animal como peixes, carnes, ovos, leite e seus derivados (Nakagawa et al., 1999). Toxicologia dos Organoclorados Seguindo as orientações da metodologia de avaliação de risco proposta pela ATSDR (1992), a escolha dos contaminantes de interesse foi baseada nos seguintes critérios: ter sido originalmente produzido, manipulado ou formulado no local da antiga fábrica de HCH; ser um importante e conhecido intermediário de degradação de um composto parental que foi produzido, manipulado ou formulado na fábrica que funcionou na Cidade dos Meninos; ser um provável produto de degradação das substâncias encontradas nos resíduos da fabricação de pesticidas nos ambientes alcalinos decorrentes da adição de cal, em 1995; e apresentar concentrações superiores às normas estabelecidas em qualquer dos compartimentos analisados. Utilizando os critérios acima expostos e os dados analíticos dos estudos realizados, foi determinada a seguinte relação de compostos a ser analisados na seleção dos contaminantes de interesse para o processo de avaliação de riscos à saúde humana, descrita no quadro 2. Já o quadro 3 sintetiza informações acerca das características gerais, ação tóxica, atividade carcinogênica e metabolismo e eliminação dos compostos encontrados em Cidade dos Meninos. 13 Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães 14 QUADRO 01: CONTAMINANTES DE INTERESSE CLÍNICO E TOXICOLÓGICO DE ACORDO COM SUA ORIGEM. Compostos produzidos, Intermediários conhecidos de Prováveis compostos de manipulados ou formulados no degradação degradação local • hexaclorociclohexano – HCH • dicloro-bis-(clorofenil)-eteno • hexaclorobenzeno; – DDE (isômeros o,o- e o,p-); e • triclorobenzeno; (isômeros a, b, g e d); • clorofenóis (triclorofenol e • tricloro-bis-(clorofenil)-etano –• dicloro-bis-(clorofenil)-etano pentaclorofenol; e – DDD (isômeros o,o- e o,p-) DDT (isômeros o, o- e o, p-). • dibenzo-p-dioxinas e dibenzo furanos policlorados. Fonte: Brasil, 2003 _______________________________________________________________________ * Bioconcentração é o progressivo aumento da quantidade de uma substância química em um organismo ou parte de um organismo, que ocorre por que a taxa de ingestão excede a habilidade do organismo remover a substância do corpo (USEPA, 1989). Já a biomagnificação é o acumulativo aumento da concentração de um contaminante persistente em sucessivos níveis tróficos superiores da cadeia alimentar. Assim, estando o homem no topo da cadeia, ele tende a acumular em seu organismo maiores quantidades de pesticidas organoclorados. e DDT isômeros TCP e HCH isômeros Grupo de compostos com 19 isômeros, cada um contendo de 1 a 5 átomos de cloro. Todos são derivados do fenol, como o álcool aromático mais simples, e podem surgir da decomposição de outros produtos mais complexos, como o hexaclorobenzeno (HCB) e o HCH. Eles possuem toxicidade aguda e crônica, dependendo do número de átomos de cloros presentes na molécula. Na Cidade dos Meninos foram identificados o 2,4,5 TCP e o 2,4,6-TCP. Leva cerca de 12 anos para ser degradado, pode dispersar-se durante muito tempo através da água, ar e sobretudo carreado no ambiente por organismos vivos. Sua definição espacial permite a presença de isômeros, sendo o mais comum deles o gama (g), conhecido comercialmente como lindano. Outros isômeros mais conhecidos são o alfa (a), beta (b) e delta (d), sendo que o isômero a-HCH apresenta dois enantiômeros. O isômero g-HCH é o mais persistente no ambiente, provavelmente devido à sua configuração mais estável, dificultando a quebra da molécula. O isômero g -HCH é o que apresenta o maior potencial pesticida. Características Gerais Há evidências experimentais de que o DDT e seus metabólitos têm atividades estrogênicas ou antiandrogênicas. São classificados como disruptores endócrinos e podendo estar envolvidos em mecanismos de imunossupressão, distúrbios neurocomportamentais e disfunções sexuais. Podem ainda estar envolvidos em mecanismos de indução do câncer de mama, de testículos e de próstata e ainda na endometriose; efeitos para o SNC (pele fria e sensível ao contato, tremores, perspiração, parestesias da língua, lábios e face, tonturas, cefaléia, náuseas, vômitos, confusão mental e convulsões tônico-clônicas quando em altas doses); aumento de histamina e taquipnéia em trabalhadores expostos; danos hepáticos (hiperplasia e hipertrofia de tecidos). O mecanismo de toxicidade é baseado em alterações provocadas na fosforilação oxidativa nas mitocôndrias (aumento relativo de ATPase provocando respiração do tipo repouso; em concentrações elevadas, haveria inibição significativa da respiração celular associada com a quebra de transporte ativo de íons e diminuição da atividade da ATPase, danificando a estrutura mitocondrial). O 2,4,6-TCP apresenta atividade aneugênica e clastogênica fraca; alterações respiratórias como tosse e dor torácica; porfiria cutânea tardia em Sistema Nervoso Central (há hipóteses que sugerem haver mecanismo de inibição do neurotransmissor GABA e outros efeitos de estimulação e inibição do SNC). Outros sistemas como o renal, hepático, hematológico e o de homeostase bioquímica seriam alvo de ação do HCH e seus isômeros (lesão tubular renal; aumento e degeneração gordurosa do fígado; diminuição na contagem de hemáceas e leucócitos e no hematócrito; aumento da fosfatase alcalina e da ALA-D; aumento das atividades do citocromo P450; efeitos reprodutivos) Ação Tóxica 2b 2b 2b Atividade Carcinogênica (IARC) Em doses baixas e repetidas, há acumulação progressiva até que se atinja um plateau ou nível de equilíbrio com o meio, o que ocorre em geral no ser humano ao redor de um ano. Em doses elevadas, a acumulação é relativamente mais baixa, devido à excreção também ser maior e, caso interrompida a exposição, há eliminação lenta do composto acumulado nos tecidos. Alguns estudos experimentais sugerem que, embora ocorra transferência placentária de DDT e DDE, a excreção através do leite humano parece ser mais importante. Há isomerização com outros triclorofenóis e conjugação com o ácido dá-se glicorônico. A eliminação predominantemente pela urina. Pessoas com alterações das funções hepática, renal e endócrina por outros motivos são mais sensíveis aos compostos desse grupo, como também crianças e pessoas com deficiências nutricionais importantes. A eliminação de se dá, em média, em um período de 7,2 anos, (sangue total), e de 7,6 anos, (concentração em lipídios circulantes). O percentual de gordura total no corpo mostrou ser o fator que mais interfere na taxa de eliminação. A eliminação se faz principalmente pela excreção urinária dos produtos de biotransformação, tanto em forma livre (WHO/IPCS, 1991). Metabolismo e Eliminação QUADRO 02: CONTAMINANTES DE INTERESSE DE ACORDO COM CARACTERÍSTICAS GERAIS, AÇÃO TÓXICA, ATIVIDADE CARCINOGÊNICA E METABOLISMO E ELIMINAÇÃO Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães 15 Sofre processo de bioacumulação e é persistente no ambiente, sendo fortemente adsorvido ao solo que contém matéria orgânica. A contaminação de águas subterrâneas pode ocorrer quando camadas mais profundas do solo são atingidas. No ar, o TCB reage com radicais hidroxilas, apresentando meiavida de 18,8 dias e, na água, apresenta processo importante de bioacumulação em peixes, sendo a evaporação um meio ineficaz de eliminação. O ambiente domiciliar apresenta geralmente os mesmos níveis encontrados no meio externo, com exceção das casas próximas de depósitos químicos. PCDDs e PCDFs sempre aparecem como mistura de congêneres e são lipofílicos, semivoláteis e tóxicos, principalmente para os animais, havendo transporte de longa distância no ambiente. As propriedades físico-químicas e a toxicidade variam entre os congêneres em muitas ordens de magnitude. No total são 75 possibilidades de arranjos para PCDDs e 135 para PCDFs. Acumulamse em tecidos gordurosos e em matrizes ricas de carbono, como solo e sedimentos .Dioxinas e furanos são contaminantes indesejáveis de inúmeros processos químicos industriais e seus produtos, ou subprodutos da combustão incompleta de lixo químico em incineradores, não havendo qualquer uso para os mesmos. Há acumulação na cadeia alimentar associada principalmente à presença de gordura. Alguns grupos populacionais estão, entretanto, mais sujeitos à exposição de níveis elevados de dioxinas, como crianças em amamentação e grandes consumidores de peixes em áreas contaminadas. Os efeitos potenciais da exposição ao 2,3,7,8 - PCDD para a saúde incluem alterações dermatológicas, gastrointestinais, urogenitais, imunológicas, reprodutivas, hormonais, teratogenicidade e carcinogenicidade; atrofia do timo, hipertrofia/ hiperplasia hepática, atrofia de gônadas, edema subcutâneo e hemorragia sistêmica. A 2,3,7,8 - PCDD é classificada como grupo 1. As demais dioxinas são classificadas como grupo 3, ou seja, as evidências de carcinogenicidade para humanos não são suficientes ou são inadequadas. 3 Na maioria das espécies animais estudadas, a 2,3,7,8 - PCDD é a que mais sofre bioacumulação, principalmente no fígado e no tecido adiposo. Em altas doses, pode ocorrer seqüestro hepático. A meia-vida da PCDD em seres humanos tem sido estimada em 5 a 11 anos. Sabese, porém, que a meia vida aumenta com a idade, provavelmente devido ao aumento de tecido adiposo e diminuição do metabolismo basal. Embora haja grande variação de meias-vidas dentre os diferentes congêneres, a meia vida da PCDD pode ser usada em caso de exposição crônica para efeitos práticos. Seu metabolismo é mediado por enzimas microssomais quebrando-se em clorofenóis que são então conjugados com glutations, sulfatos e ácido glicorônico. A excreção ocorre por via urinária e pelas fezes. A meia-vida, calculada através de experimentos animais, é de cerca de 90 dias FONTE: ATSDR (1989; 1990; 1992; 1998a; 1998b; 1999a; 1999b; 2002; 2005); Brasil (2003); Casarett(2001); IARC(1991); IPCS(1999; 2000); USEPA ( 1989; 1992) Dioxinas/ Furanos TCB expostos à 2,4,5-TCP (eliminação de porfirinas urinárias e elevação de enzimas hepáticas, evidenciando dano celular). É altamente absorvido através das vias digestiva e respiratória e menos eficazmente absorvido pela pele. Nos organismos, acumula-se predominantemente no tecido gorduroso e, em menor extensão, no fígado.Há efeitos como hemoptise grave em trabalhador; é irritação para os olhos e para as vias respiratórias; alteração de enzimas hepáticas; porfiria hepática; cloracne; dermatite; anemia; alterações anatômicas e funcionais de fígado, rins e fetotoxidade Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães 16 Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães Propriedades de Desregulação Endócrina dos Organoclorados Os efeitos estrogênicos e anti-androgênicos dos organoclorados, quando estudados individualmente, apresentam pouca influência sobre os sistemas biológicos. No entanto, estudos in vitro utilizando a combinação de dois destes disruptores ambientais fracos, como o dieldrin, endossulfan, clordane ou toxafeno, mostraram que estes compostos apresentaram-se de 150 a 1.600 vezes mais potentes do que eram isoladamente como agentes estrogênicos (Wade et al, 1997). Este fato é justificado pelo fenômeno de bioacumulação do composto. Os mecanismos bioquímicos de toxicidade dos compostos organoclorados incluem a ação agonista ou antagonista em receptores de hormônios esteróides, a modulação de enzimas envolvidas na síntese ou no metabolismo dos hormônios e a modulação de eventos bioquímicos e moleculares, incluindo sinalizações de vias de expressão gênica. Receptores de hormônios celulares são membros da superfamília dos receptores nucleares que agem como fatores de transcrição que regulam a expressão gênica (Arnold et al, 1996; Brodie et al, 1999; Dickerson & Gore, 2007; Kaminuma et al, 2000; Sanderson e van den Berg, 2003). A figura 2 mostra os principais mecanismos potenciais de disrupção endócrina provocada por organoclorados. Já o quadro 4 destaca os mecanismos de disrupção endócrina provocada por organoclorados. As interações hormonais desempenham um papel essencial na coordenação das múltiplas atividades das células, tecidos e órgãos, através da regulação de funções biológicas como metabolismo, crescimento, desenvolvimento, equilíbrio hidroeletrolítico e reprodução (Guyton & Hall, 2002). Esta cadeia de eventos, no entanto, pode se tornar suscetível a ação de fatores de origem endógena ou exógena, os quais podem lhe conferir alterações indesejadas, interrompendo a homeostase e conferindo agravos à saúde. 17 Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães FIGURA 2: PRINCIPAIS MECANISMOS POTENCIAIS DE DISRUPÇÃO ENDÓCRINA Legenda: ER – receptores de estrogênio; AR – receptores de androgênio; AhR – receptores aril-carboneto 18 Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães Efeitos Endócrino-Reprodutores dos Organoclorados Substâncias como as bifenilas policloradas (PCB's) que eram utilizadas até pouco tempo atrás como isolantes em equipamentos elétricos e plastificantes, foram posteriormente proibidas em virtude dos seus efeitos sobre a saúde humana e animal. No entanto, as dificuldades com desativação e destruição de estoques causam ainda hoje problemas de contaminação ambiental e humana (Safe et al, 1985). As dioxinas juntamente com os furanos pertencem a uma classe de hidrocarbonetos produzidos involuntariamente a partir de uma série de reações termoquímicas. São compostos altamente cancerígenos, teratogênicos e persistentes, com efeitos tóxicos ao sistema endócrino através do bloqueio hormonal e ação antiestrogênica (IPCS, 1993). Outro exemplo trata-se de subprodutos de processos industriais, a exemplo dos originados involuntariamente da síntese de compostos clorados como o PVC e o agrotóxico ácido 2,4,5triclorofenoxiacético (Birnbaum, 1994). QUADRO 3: MECANISMOS DE DISRUPÇÃO ENDÓCRINA PROVOCADA POR ORGANOCLORADOS. Organoclorado PCB Dioxinas e Furanos DDT/DDE Clordano Dieldrin Pentaclorofenol Hexaclorociclo-hexano (HCH) e isômeros Mirex Toxafeno Mecanismo - Antagonista de receptores de estrogênio - Antagonista de receptores de androgênio - Agonista de receptores Aril-Hdrocarbono (AhR) - Envolvimento com Metabolismo - Antagonista de receptores de estrogênio - Agonista de receptores Aril-Hdrocarbono (AhR) - Inibidor da aromatase - Agonista de receptores de androgênio - Antagonista de receptores de androgênio - Competição pelos sítios de estrogênio - Antagonista de receptores de androgênio - Agonista de receptores de estrogênio - Antagonista de receptores de androgênio - Agonista de receptores de estrogênio - Antagonista de receptores de androgênio - Agonista de receptores de estrogênio - Agonista de receptores de estrogênio, inibição da síntese de ACTH 19 Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães Outro grande exemplo é o Dicloro-Difenil-Tricloroetano, o DDT, uma das substâncias mais estudadas sob o aspecto de desregulação endócrina. Embora já tivesse sido proibido em mais de 80 países em meados da década de 70, no Brasil o seu uso tornou-se restrito a campanhas de combate a Malária em 1982 e, apenas recentemente em 1994, sua utilização foi completamente proibida. Por ser uma substância altamente persistente no ambiente, ainda hoje é possível encontrá-lo em altos níveis no leite materno e tecido adiposo, sobretudo, em indivíduos residentes de áreas endêmicas de Malária na Amazônia, onde as campanhas de combate ao vetor foram intensas (Guimarães, Asmus & Meyer , 2007; Kelce et al, 1995). Mesmo nas regiões mais distantes como as regiões polares, é possível detectar resíduos de inseticidas organoclorados como o DDT e o dicloro-difenil etilcloro (DDE), seu principal metabólito, em tecido adiposo de leões marinhos e outros mamíferos aquáticos (Richardson & Bowron, 1985). O quadro 5 cita alguns dos prováveis desfechos para a exposição por certos tipos de organoclorados. QUADRO 4: DESFECHOS REPRODUTORES ASSOCIADOS A ORGANOCLORADOS ESPECÍFICOS. COMPOSTO PCB DDT/DDE Dioxinas (TCDD, PCDD)/Furanos (PCDF) HCH Dieldrin/Aldrin Heptaclor-Epóxido EFEITOS Retardo puberal, ↑ Time to Pregnancy*, Alterações de Esperma (volume, morfologia, motilidade), Prematuridade, Baixo Peso ao Nascer, menarca precoce. ↑ Time to Pregnancy*, Alterações de Esperma (volume, morfologia, motilidade), Prematuridade, Baixo Peso ao Nascer, Abortamento Espontâneo, menarca precoce, malformação congênita, Criptorquidia e Hipospádia Retardo puberal, irregularidade de fluxo menstrual, menopausa precoce, Prematuridade, Baixo Peso ao Nascer Baixo Peso ao Nascer, malformação congênita, Prematuridade, Baixo Peso ao Nascer malformação congênita, Prematuridade, Baixo Peso ao Nascer Prematuridade, Baixo Peso ao Nascer * Time to Pregnancy: tempo entre momento do início da tentativa de gravidez e da gravidez propriamente. 20 Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães A CIDADE DOS MENINOS A Cidade dos Meninos é uma área federal, de 19 hectares, localizada no distrito de Pilar, município de Duque de Caxias, Baixada Fluminense, na área metropolitana do Rio de Janeiro. A Baixada Fluminense situa-se numa região geográfica que margeia o fundo da Baía da Guanabara, é irrigada por 35 rios e apresenta vários trechos de aterramento. É composta por 8 municípios (São João do Meriti, Queimados, Belford Roxo, Nova Iguaçu, Nilópolis, Guapimirim, Magé e Duque de Caxias) conhecidos como cidades dormitórios. É uma zona densamente povoada, só em Duque de Caxias habitam 872.762 habitantes segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) para 2009, sendo considerada violenta e onde faltam serviços públicos básicos (saneamento, escolas, pavimentação de ruas, hospitais). Além do mais, é predominantemente ocupada por loteamentos clandestinos. A ocupação da Baixada Fluminense começa em 1565, com a distribuição das primeiras sesmarias. Em 1591, o proprietário de uma dessas sesmarias, a fazenda de Iguaçu, a doou à Ordem de São Bento. Durante mais de um século, a produção dessa fazenda representava a maior renda do mosteiro e em 1697, o solo passou a apresentar sinais de esgotamento, sem contar com o fato de que se tratava de uma região de manguezais, o que dificultava a lavoura e a criação de gado. Os monges, ao libertar seus escravos em 1871, passaram a enfrentar novos problemas na administração da fazenda, devido à dificuldade de recrutar mão de obra (MS, 2002). Abandonados à própria sorte, os negros libertos pela Lei Áurea foram para os manguezais locais, não ocupados, tentar sobreviver com a extração de lenha. Por se tratar de manguezais localizados em região de clima tropical, essa zona era endêmica de malária desde o século XVI, e com a devastação das matas e a erosão de solos, começou a proliferação do mosquito vetor da malária e os primeiros relatos de epidemias. Devido à extensão do problema,e seguindo o processo de modernização da capital federal, em 1915, o presidente do estado do Rio de Janeiro traçou uma política que incluía obras de saneamento básico, aterro dos manguezais e canalização dos curso de água (Herculano, 2002). Com essas medidas, a fazenda dos beneditinos que estava praticamente abandonada, retomou sua exploração econômica. Em 1931, a 21 Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães extensão da área chegava a mais de 10 mil hectares e passou ao domínio da União. Foi denominado Núcleo Colonial São Bento, porque abrigaria um grande projeto de colonização. Mesmo antes de terminadas as obras de saneamento já estavam sendo construídos prédios e iniciadas plantações. Dando continuidade ao processo de modernização da capital federal, agora as reformas avançavam na direção de áreas que precisavam ser ocupadas e incorporadas ao processo produtivo (MS, 2002). Com o passar dos anos, a região passou a ser habitada pelos descendentes dos escravos, por migrantes e pela população de baixa renda. Até 1950, período que marca o amadurecimento do processo de industrialização brasileira, a Baixada Fluminense permaneceu como uma área predominantemente rural, voltada à produção agrícola, quando então assou a ocorrer a transformação para zona industrial da área metropolitana do Rio de Janeiro. Fundação Abrigo Cristo Redentor Em 1934, a primeira dama Darcy Vargas, comandou um projeto de albergue para meninas desvalidas no que antes era conhecido como Fazenda da Camboaba do Núcleo São Bento. Nessa região seriam construídos pavilhões para moradia, escolas, cursos profissionalizantes, e à medida que elas se tornassem adultas, obteriam casa lá. O local foi chamado de Cidade das Meninas. Em 1943, o Presidente Getulio Vargas criou a Fundação Abrigo Cristo Redentor que absorveu a associação civil Abrigo Redentor, que existia desde 1923, com a finalidade de assistir mendigos e menores desamparados no Rio de Janeiro. Em 1946, sob a presidência do Marechal Eurico Gaspar Dutra, Dona Darcy Vargas entregou o albergue para direção de Levi Miranda, desta fundação. Nesse momento havia 4 institutos: Provedora Margarida de Araújo, Nossa Senhora da Paz, Dom Bosco e Profissional Getulio Vargas. Além de duas escolas, uma da rede estadual e outra da rede municipal, que atendiam não apenas às crianças internadas, mas também aos filhos dos funcionários que lá moravam (Herculano, 2002). O Sr Levi teria transferido as meninas para a Escola Quinze, fora do complexo, permitindo que elas ficassem no Instituto Provedora Margarida de Araújo até completarem 12 anos. Ele orquestrou a transformação do lugar, passando a ser 22 Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães conhecido como Cidade dos Meninos, com a construção de pavilhões (total de 40 com capacidade para 50 crianças cada), padaria, escola de pescas, oficinas de marcenaria, cestaria, mecânica, vassouraria, entre outras para a educação profissionalizante de meninos e rapazes, que lá residiam em regime de internato. Existia ainda horta, pomar, avicultura, suinocultura, bovinos, não apenas para treinamento dos alunos, como para a sua própria alimentação (MS, 2002). As figuras 1-4 mostram imagens do,local. FIGURA 03: FÁBRICA DE INSETICIDAS CONSTRUÍDA NO TERRENO DE CIDADE DOS MENINOS. FONTE: MS, 2010 23 Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães FIGURA 04: VISTA AÉREA DA FUNDAÇÃO ABRIGO CRISTO REDENTOR FONTE: MS, 2010 FIGURA 05: INSTITUTO PROFISSIONAL GETÚLIO VARGAS FONTE: MS, 2010 24 Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães FIGURA 06: VILA MALÁRIA FONTE: MS, 2010 Ministério de Educação e de Saúde Pública O ministério da Educação e Saúde Pública (MES) foi criado em 1930, durante o Estado Novo, apresentando um caráter centralizador, normatizando e uniformizando as estruturas estaduais. A estrutura administrativa da saúde pública instituída durante o Estado Novo permaneceu quase inalterada até a criação do Ministério da Saúde, em 1953. O período ficou marcado pela separação entre saúde pública - centrada na erradicação de doenças infectocontagiosas, endemias ou epidemias - e assistência médica previdenciária, de caráter individual, destinada aos indivíduos acometidos por doenças que lhes impediam de trabalhar. A assistência individual não estava sob o controle do MES e sim do Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio (Escorel, 2008). As atividades do MES, relativas à saúde pública, à assistência social, à educação escolar e à educação extra-escolar ficariam sob responsabilidade de dois órgãos especializados, entre eles o Departamento Nacional de Saúde (DNS). Este teria três divisões, dentre as quais a de saúde pública, dedicada à prevenção de doenças e à melhoria da saúde (Santos, 2003). A reforma implementada por meio da Lei n. 378, de 13 de janeiro de 1937, representou uma grande mudança na estrutura de organização e nas finalidades do 25 Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães ministério. Mais do que uma reforma administrativa, o ministro Gustavo Capanema apresentou um plano geral de ação governamental que seria operacionalizada com base na nova estrutura. Foi ela que definiu a política de saúde pública, reformulando e consolidando a estrutura administrativa do ministério e adequando aos princípios básicos que orientaram a política social do Governo Vargas, permanecendo quase inalterada até a criação do Ministério da Saúde em 1953 (Santos, 2003). O ano de 1941 marcaria a criação dos serviços nacionais de saúde vinculados ao DNS e que no âmbito de suas ações estavam os esforços que deveriam ser empreendidos no campo da organização sanitária e do combate às grandes endemias, como a lepra, a tuberculose, a malária e a febre amarela (Santos, 2003). De 1946 a 1950, em relação à saúde pública prevaleceu o sanitarismo campanhista (tradicional), centralizador e autoritário. Entretanto, a redução de novos casos de malária e de outras doenças transmitidas por insetos pareceu ter mais relação com a disponibilidade de inseticidas de ação residual e de antibióticos, além do desenvolvimento do país, do que ser conseqüência das campanhas sanitárias (Escorel, 2008). A partir dos anos 50 do século XX, temos a substituição clara do modelo sanitarista campanhista pelo modelo médico assistencial. Ocorre em 1953 a criação do MS. O importante já não era mais sanear o espaço de circulação de mercadorias, mas atuar no corpo, restaurando a capacidade produtiva (Escorel, 2008). Tal assertiva ia de encontro ao modelo capitalista conhecido como Taylorista-Fordista. Após 1966, com o regime militar, houve diminuição de gastos com a saúde pública e um grande aumento de gastos com medicina curativa (Escorel, 2008). O Serviço Nacional de Malária Um dos instrumentos decisivos de intervenção federal no campo da saúde pública e base institucional para os novos experimentos de combate às endemias rurais na década de 1940, foi o Serviço Nacional de Malária (SNM). Este era subordinado ao DNS. Criado em abril de 1941, o SNM foi instituído pelo Decreto-Lei n. 3.171 de 02/04/1941, que reorganizou o DNS (Santos, 2003). É importante salientar que em 26 Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães 1939 a Fundação Rockfeller financiava o Serviço de Malária do Nordeste e que em 1940, havia sido criado o Serviço de Malária da Baixada Fluminense. Posteriormente, estes seriam incorporados pelo SNM (Santos, 2003). O SNM foi aos poucos ampliando seu raio de ação, seus recursos orçamentários e a abrangência de suas campanhas. Juntamente com os outros serviços, permitiu que as campanhas existentes àquela época se tornassem permanentes. Assim, no mesmo período, em 1942, durante a Segunda Guerra, foi criado o Serviço Especial de Saúde Pública (SESP), como decorrência do acordo firmado entre os governos brasileiro e norte-americano durante a 3ª Reunião de Consulta aos Ministérios das Relações Exteriores das Repúblicas Americanas, realizada no Rio de Janeiro. O SESP que tinha como atribuição realizar uma grande obra de saneamento, teve sua área de atuação centrada exclusivamente no combate à malária e à assistência médica nas duas áreas que forneciam matéria-prima estratégica para o esforço de guerra norte-americano: a borracha em alguns pontos de maior relevância da Amazônia e o minério de ferro no Vale do Rio Doce. Note aqui a preocupação, em primeiro lugar, com a manutenção do afluxo de matéria prima para os grandes centros. Em 1947, o SNM iniciou uma grande campanha de controle da malária na região da Baixada Fluminense, que durante dois meses alcançou 1.821 localidades em trinta municípios de norte a sul do estado do Rio de Janeiro. O sucesso de suas ações na Baixada Fluminense e no Vale do São Francisco levaram em 1949, o SNM a assumir a luta contra a malária na Amazônia que vinha sendo feita pelo SESP (Escorel, 2008). Inseticidas No campo da saúde, da década de 40 do século XX, se traduzia pelo entusiasmo com a possibilidade de controle e até mesmo erradicação de insetos vetores dos agentes causadores de algumas doenças endêmicas, graças aos novos inseticidas e drogas desenvolvidas durante a guerra. Era a chamada Revolução Verde, tida literalmente como “a salvação da lavoura”. A toxicidade dos agentes ainda não era conhecida. As duas principais substâncias usadas nessa época foram o HCH e o DDT. 27 Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães O HCH é um pesticida organoclorado, isolado por Faraday em 1825, que teve suas propriedades inseticidas descobertas em 1942, na França e na Inglaterra. Seu isômero, gama-HCH recebeu o nome de Lindano. Este é um inseticida de amplo espectro usado para tratamento de sementes e do solo, para aplicações sobre folhas, em florestas, no material orgânico guardado, em animais e na saúde pública. Porém seu uso tornou-se restrito em alguns países e totalmente proibido em outros, como no Japão, desde 1971. No Brasil, teve sua utilização na agricultura proibida por Portaria Ministerial de 1985, mas continua sendo utilizado em campanhas de saúde pública, na tentativa de erradicação e/ou controle de vários vetores de doenças transmissíveis e endêmicas. O DDT foi descoberto pelo químico suíço Paul Muller em 1939 e tido como potente inseticida. A substância química já havia sido descrita na literatura especializada em 1874, mas desconhecia-se sua grande utilidade para a agricultura e saúde pública. A sua baixa solubilidade aquosa evitou problemas de toxicidade para o homem e os animais domésticos, mas intoxicou e matou insetos e muitos invertebrados. Seu emprego foi decisivo em várias frentes, por exemplo nas operações militares durante a Segunda Guerra (Paulini, 2004). É um inseticida barato e altamente eficiente a curto prazo, mas a longo prazo tem efeitos prejudiciais à saúde humana, como demonstrou a bióloga norte-americana Rachel Carson, em seu livro Primavera Silenciosa. Nesta obra, a autora relata o aumento de mortalidade entre os pássaros numa região dos Estados Unidos. Foi usado largamente durante a Segunda Guerra para o combate de endemias. Instituto de Malariologia Durante a primeira metade do século XX, uma das endemias de maior relevância da saúde pública brasileira foi a malária (FERRIERA, 2010). Dentre as muitas iniciativas do sanitarismo campanhista em combatê-la está a criação do Instituto de Malariologia do Ministério da Educação e Saúde Pública. Não há como falar do Instituto de Malariologia sem antes citar o doutor Mario Pinotti. Médico formado pela Faculdade Nacional de Medicina do Rio de Janeiro (1918) com passagens pelos serviços de Profilaxia Rural do Distrito Federal e Estado do Rio de Janeiro, Fundação 28 Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães Rockefeller e Serviço de Febre Amarela. Entre 1938 e 1941, foi designado diretor geral do Departamento de Saúde do Estado do Rio de Janeiro. No ano seguinte, assumiu a direção do SNM, onde permaneceu até 1954. Considerado um personagem polêmico e controvertido do cenário da saúde pública nas décadas de 1940 e 1950, exerceu a função de administrador ligado a outros nomes importantes do sanitarismo, como João Barros Barreto e Samuel Pessoa e soube ao mesmo tempo, reunir em torno de seus projetos um grupo de colaboradores que contava com René Rachou, Fernando Bustamante, Ernest Paulini, Rostan Soares, entre outros. O Instituto de Malariologia, cuja concepção se baseava na aliança entre os interesses da produção de conhecimento com os problemas de saúde pública, orientando a investigação científica para a busca de soluções, foi um desses projetos (Santos, 2003). O Instituto de Malariologia foi criado em 1946 com o objetivo de realizar pesquisas científicas que se adicionariam às estruturas dos serviços de campo do SNM, ao qual estava vinculado. Concebido com o desejo de alcançar o mesmo sucesso e prestígio internacional que desfrutava o Instituto de Malariologia de Maracay da Venezuela, foi estruturado como escola e centro especializado de estudos no terreno da malária, formando técnicos e aprimorando os métodos de trabalho, em bases científicas, na direção do progresso, do desenvolvimento e da mudança (Santos, 2003). O novo instituto expressava a íntima relação que se buscava estabelecer entre a saúde da população e o desenvolvimento nacional. Em 1947, Mário Pinotti, diretor do SNM, solicitou ao MES o uso de metade dos pavilhões da Cidade dos Meninos. Como o combate à malária era um projeto prioritário para o governo federal, principalmente por ser endêmica na Baixada Fluminense, o MES fez um acordo com a Fundação Abrigo Cristo Redentor e 08 pavilhões foram cedidos. Eles só possuíam prontos os esqueletos. Neste acordo, os pavilhões seriam devolvidos a ela, à razão de 2 por ano, a partir de 1952. Inicialmente, esses seriam utilizados para biotério, necrotério, laboratório, restaurante e administração. A partir desta época, a Cidade dos Meninos passou a ter três categorias de habitantes: os meninos abrigados nos quatros institutos, os funcionários da Cidade dos Meninos e os funcionários federais de saúde, do Instituto de Malariologia, que ocupavam casas a eles cedidas (casas brancas com janelas azuis para os funcionários 29 Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães do abrigo Cristo Redentor e marrom com janelas vermelhas, na vila Mário Pinotti, para os funcionários da malária). Além destes, as professoras da rede publica de ensino, que ali lecionavam, freqüentavam a área. O Instituto de Malariologia teve suas atribuições ampliadas para combater outras endemias ditas rurais como a febre amarela, a esquistossomose e a doença de Chagas em 1949, quando tiveram início as obras para construção da fábrica de inseticidas (MS, 2002). No ano seguinte, ela foi inaugurada juntamente com uma fundição de gelo, usado para fundir o cloro ao benzeno. Por sugestão do engenheiro químico holandês detentor do processo industrial de fabricação de HCH por catálise química a baixa temperatura, Henk Kemp, em visita a Cidade dos Meninos, iniciaramse a síntese e a formulação do inseticida HCH, também conhecido pela sigla inglesa BHC, que era usado no combate ao transmissor da doença de Chagas. Embora, na época, o inseticida de preferência em ações contra vetores de doenças fosse o DDT, sua fabricação implicava um grau de complexidade tecnológica além das possibilidades do país naquele momento (MS, 2002). A opção pelo HCH deveu-se: à disponibilidade de uma tecnologia relativamente simples e de custo reduzido, trazida por Kemp; a disponibilidade de matéria prima em território nacional; ao fato da comprovada eficácia deste inseticida no combate ao vetor da doença de Chagas, aplicação em que o DDT apresentava desempenho inferior; ao atendimento à demanda gerada pela aplicação intensiva na lavoura; ao atendimento à demanda do MES, independente dos prazos e condições impostas pelo mercado; a adequação da composição química do produto ás exigências de cada região afetada, e; a garantia de uniformidade e controle rigoroso do produto (MS, 2002). Durante cinco anos, o HCH foi produzido, utilizando como matérias primas o benzeno fornecido pela Companhia Siderúrgica Nacional, de Volta Redonda e o cloro pela Companhia Eletroquímica Fluminense, de São Gonçalo. Além do HCH, a fábrica também desenvolvia pesquisas com outros pesticidas como o arsenito de cobre, também conhecido como verde Paris e o diclorodifeniltricloroetano (DDT). Contudo, em torno de 1955, a Companhia Eletroquímica Fluminense deixou de produzir o cloro, que passaria a ser fornecido pelas empresas Matarazzo, de São Paulo, o que comprometia a produção do HCH, devido ao alto custo e ao aumento do risco de 30 Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães transporte. Além disso, outro inseticida, o Lindano (gama-HCH), passou a ser oferecido a baixo custo pelas empresas Elclor e também pelas empresas Matarazzo, tornando deficitário o funcionamento da fábrica. Adicionando a tal fato, as pressões da Fundação Abrigo Cristo Redentor para que ocorresse a devolução dos pavilhões, a política de regionalização das pesquisas sobre doenças endêmicas e a precariedade as instalações do Instituto de Malariologia levaram à transferência deste para Belo Horizonte em fins de 1955, com o apoio do chefe da Divisão de Organização Sanitária do MS Amílcar Barca Pellon. Permaneceram no Rio de Janeiro a fábrica de inseticidas e um pequeno núcleo central, enquanto os equipamentos e trinta e cinco funcionários foram transferidos para o prédio do Barro Preto, em Belo Horizonte (Paulini, 2004). Serviço de Produtos Profiláticos Em 1956, foi criado pelo Ministro da Saúde, Prof. Maurício Medeiros, o Departamento Nacional de Endemias Rurais (DNERu), dirigido pelo Dr. Mário Pinotti, e o Instituto de Malariologia foi desmembrado em Instituto de Endemias Rurais e Serviço de Produtos Profiláticos (SPP), dirigido pelo Brigadeiro Dr. Gerardo Majella Bijos. A sede da diretoria, as chefias da Seção Industrial e da Seção Técnica e administração do SPP ficaram no bairro de São Cristovão. A fábrica, nomeada de Fábrica de Produtos Profiláticos, localizava-se na Cidade dos Meninos e o seu funcionamento ocorreu até agosto de 1960, com a produção de pasta de DDT, pasta de BHC (isomero alfa, enriquecido com gama-HCH) emulsionáveis - DDT, mosquicidas DDT + Lindano (gama-HCH) rodenticidas, composto 1080 (monofluoroacetato de sódio) e cianeto de cálcio (MS, 2002). Vale a pena ressaltar que os pavilhões desocupados pelo Instituto de Malariologia não foram devolvidos à Fundação Abrigo Cristo Redentor e continuaram fazendo parte das instalações da fábrica, onde inseticidas voltaram a ser produzidos. A não devolução foi devida à solicitação feita pelo diretor do SPP ao DNERu. Na exposição dos motivos, ele ressaltava que dos 42 pavilhões existentes, somente 17 eram usados pela fundação e que o seu serviço só ocupava 1% da área. Além do mais, a SPP realizava ações assistenciais, prestação de assistência médica, recreação 31 Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães esportiva, escola primária e biblioteca volante. Informava também que as condições de tráfego e a eliminação dos focos de mosquitos nas estradas de acesso à Cidade dos Meninos se deviam ao capeamento delas com isômero alfa do HCH (MS, 2002). O MS em colaboração com a Legião Brasileira de Assistência (LBA) implementaram melhorias na região com a instalação do Hospital Mario Pinotti, a transformação de um pavilhão em residência multifamiliar, a construção de uma casa para mais 3 famílias e a edificação de 12 casas novas destinadas aos funcionários do SPP (MS, 2002). Apesar das melhorias realizadas, a fundação reiterava seus direitos sobre os pavilhões e áreas ocupadas pelo DNERu. Finalmente, após constantes pressões e pelos argumentos do diretor do SPP favoráveis à transferência para Manguinhos, os pavilhões foram progressivamente sendo devolvidos, a partir de 1962, 10 anos depois do previsto. Segundo o relatório final de gestão do Brigadeiro Dr. Bijos teriam restado em estoque, em janeiro de 1961, com a cessação definitiva das atividades da fabrica, os seguintes produtos, 240.760 rodenticidas, 112.407 litros de Triton X-151, um detergente potentíssimo; 109 tambores de Xilol, e “grande resíduo de produção” de Pó anti-Culex (BHC) em tonéis de papelão. (Herculano, 2002). Desativação da Fábrica de Produtos Profiláticos O processo de desativação da fábrica da Cidade dos Meninos não foi controlado e todo acervo foi abandonado no local, incluindo móveis, maquinaria, estoques de HCH, matérias primas e subprodutos. A má administração desse processo de desativação deixou que cerca de 300 toneladas de produtos tóxicos fossem largamente disseminados de forma heterogênea por toda a área (Ecocidade, 2010). Desconhecendo o perigo, a Fundação Abrigo Cristo Redentor manteve suas atividades sociais na área. Durante o período de 1970 a 1979, a essa fundação firmou convênios com a Fundação Nacional do Bem-Estar do Menor (FUNABEM), a Fundação Estadual do Menor, a LBA, o Juizado de Menores do Rio de Janeiro, para promover a educação de menores carentes, e, finalmente, com o Instituto Nacional de Previdência Social, para a prestação de serviços médicos. Chega a atender 800 menores. 32 Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães O Ministério da Agricultura proíbe a comercialização e uso do HCH por causa dos efeitos nocivos à saúde humana, em 1985. Para se ter uma idéia, tal proibição já se encontrava em vigor em outros países desde a década de 70 do século XX. Em 1987, inúmeros conflitos administrativos culminaram na incorporação da Fundação Abrigo Cristo Redentor e todas suas unidades pela LBA. Pelo decreto que determinou essa incorporação, todo o patrimônio imobiliário da fundação foi transferido para a LBA, inclusive a gleba de cerca de 19 400 000 m2 correspondente à Cidade dos Meninos. Além do fato de levar à aposentadoria muitos funcionários da Cidade dos Meninos. Como consequência, para defender os direitos de permanência de cerca de 40 funcionários aposentados, que iriam ser despejados de suas casas, foi fundada a Associação de Moradores e Amigos da Fundação Abrigo Cristo Redentor. A partir de 1989, passa a ser vinculado na mídia, a situação de contaminação ambiental da região, com várias propostas para resolução do caso. O eminente ambientalista José Lutzenberger, responsável pela Secretaria Especial de Meio Ambiente da Presidência da República, prometia uma ação cabal em um mês. O Presidente Collor sancionou o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA 1990), que, dentre outras coisas, passava a proibir o internato de menores carentes. Tal fato provocou o esvaziamento da Cidade dos Meninos. Houve um processo de “desinternação gradativa” e os internos que ali viviam foram sendo redistribuídos por “unidades de retaguarda” ou devolvidos as suas famílias Assim, quando o caso da contaminação veio a conhecimento público, restavam na Cidade dos Meninos apenas cerca de 250 crianças. Um projeto idealizado pela primeira-dama, Rosanne Collor, à frente da LBA, resolvera implantar na Cidade dos Meninos o “Projeto Minha Gente”, que contaria com 60 mil casas populares, shopping rural e piscina, enquanto que o político Moreira Franco, candidato ao governo do Estado do Rio de Janeiro, prometia ali a construção de uma represa. Em agosto de 1991, a LBA comunicou à Secretaria Nacional de Vigilância Sanitária que fora abandonada a proposta de construção de uma cidade-modelo. (MS, 2002) O período de 1990 a 1992 foi marcado por falta de entrosamento entre as várias instâncias comprometidas com a solução da contaminação ambiental na Cidade 33 Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães dos Meninos. A Procuradoria Geral do Rio de Janeiro instaura inquérito civil e conclui que o Ministério da Saúde é culpado pelo abandono da área e pede a remoção das famílias. O início da intervenção mais direta do Ministério da Saúde se dá neste momento, conforme ilustra a figura 5. Em 1993, com a assinatura do Termo de Compromisso de Ajustamento de Conduta e de Obrigações perante o Ministério Público Federal, o Ministério da Saúde, do Meio Ambiente e outros órgãos se comprometem a solucionar o caso. O Ministério da Saúde assume o processo de remediação do local. Nesse mesmo ano, Alceni Guerra, ministro da Saúde, tentaria minimizar a questão, dizendo tratar-se apenas de 10 toneladas de resíduos e que bastava que as cobrisse com argila para resolver a questão da contaminação. Ainda em 1993, os Institutos da Cidade dos Meninos, já bastante esvaziados, foram interditados pela Juíza da Infância e Adolescência, Maria Luíza Miguel, da Comarca de Caxias, com base em laudo da Fundação Oswaldo Cruz sobre a contaminação do sangue das crianças por BHC. Tal ação provocou o fechamento também das escolas municipal e estadual, fazendo com que os filhos das famílias remanescentes não mais tivessem onde estudar. Em 1995, a Nortox Agroindústria do Paraná, contratada pelo Ministério da Saúde (Ministro Adib Jatene), foi à Cidade dos Meninos, derrubou o esqueleto da fábrica e derramou cal (hidrato de carbono) por sobre a área onde anteriormente se erguia a Fábrica de Produtos Profiláticos, na tentativa de neutralizar o “pó-de-broca”. Segundo depoimentos de moradores, uma pá mecânica deslocou o material formando um monte de 10 metros de altura, o correspondente a 8 carretas ou 140 toneladas, e jogou cal por cima. O efeito desta solução foi a produção de novos compostos tóxicos, manutenção da presença de compostos organoclorados e ampliação da área contaminada em 16 vezes. 34 Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães FIGURA 07: NOTÍCIA VEICULADA SOBRE A PROPOSTA DE INTERVENÇÃO DO MINISTÉRIO DA SAÚDE EM CIDADE DOS MENINOS. FONTE: MS, 2010 Em 1999, a área onde ficava a fábrica, foi cercada e colocado um cartaz proibindo a entrada por ser uma “área em processo de descontaminação” (figura 3). No mesmo ano, é criado o Comitê Técnico Cidade dos Meninos, no âmbito do gabinete do ministro da Saúde. Em 2001, dez casas são demolidas porque estavam contaminadas devido à proximidade do foco principal de contaminação. Moradores são removidos para casas alugadas pelo Ministério da Saúde fora da Cidade dos Meninos. Três anos depois, em 2004, o Ministério da Saúde assume a responsabilidade pela contaminação da área e decide pagar R$ 50 mil de indenização por família e remover imediatamente as famílias. Projeto de lei é encaminhado ao Congresso com previsão de pagamento de R$ 50 mil de indenização por família ou R$ 10 mil por pessoa ''pelos danos morais e materiais relativos à exposição a compostos organoclorados''. A associação reivindica que o valor seja de R$ 150 mil por família. Isso porque o recebimento da indenização, segundo o projeto, está condicionado à 35 Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães assinatura de um termo de renúncia ''a qualquer direito ou ação no futuro, relativa à exposição ao meio ambiente contaminado''. Cerca de 350 famílias ainda moram na região (Correio Brasiliense, 2006). O seguimento da área pós anos 2000: Avaliação de risco e monitoramento de saúde Desde o final da década de 90 , a questão de Cidade dos Meninos é coordenada pelo Ministério da Saúde. Os estudos realizados sobre avaliação de risco à saúde humana, avaliação sobre a identificação de focos secundários e relatório de exposição humana a resíduos organoclorados, subsidiaram o Ministério da Saúde na tomada de decisões diante das situações mais emergenciais (AMBIOS, 2002). Esses estudos serviram de base na coordenação de um processo a médio e longo prazo para equacionamento da contaminação ambiental e da exposição humana. Em 2001, as dez famílias que residiam nas imediações do foco principal foram transferidas para casas alugadas, pelo Ministério da Saúde, no município de Duque de Caxias. Até que se alcance uma solução geral para o problema da exposição humana, o Ministério da Saúde paga o aluguel destas dez famílias mensalmente. As casas que eram localizadas, na área do foco principal, foram demolidas, com a orientação da Companhia de Tecnologia de Saneamento Ambiental - CETESB. (CETESB, 2001) A partir da Avaliação de Risco à Saúde Humana de 2002, os contaminantes de interesse existentes na Cidade dos Meninos foram selecionados: Hexaclorociclohexano (HCH) e seus isômeros; diclorodifeniltricloroetano (DDT) e seus metabólitos (DDD e DDE); Triclorobenzenos (TCB); Triclorofenóis (TCB) e Policlorados dibenzodioxina e policlorados dibenzeno furano (DDD e DDE). Conforme estudo da CETESB realizado em 2002, as maiores concentrações no foco principal foram registradas para os isómeros de HCH, com valores muito acima dos níveis exigidos de intervenção. As concentrações de DDT e seus metabólitos, bem como os clorofenóis e clorobenzenos encontradas superam os limites de Risco Máximo Tolerável em todos os pontos de amostragem onde estes compostos foram detectados. (CETESB, 2002) Os compostos organoclorados existentes na Cidade dos Meninos podem representar risco à saúde humana e por terem sido identificadas rotas completas e potenciais de exposição humana por vias de exposição pela cadeia alimentar 36 Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães (digestiva), respiratória e dérmica, considera-se que essa população foi e continua exposta a compostos organoclorados (Buosi, 2006). O foco principal de contaminação está cercado, possui monitoramento com vigilância e placas de sinalização alertando para o perigo de contaminação. Apesar disso, a cerca é ocasionalmente violada e o gado da região é colocado para pastar no local pelos produtores agropecuários que existem na Cidade dos Meninos (Oliveira, 2010). Em 2003, por meio de um convênio entre o Ministério da Saúde e a Fiocruz, foi realizada uma pesquisa para dosar os níveis de HCH no sangue da população residente na Cidade dos Meninos. Os resultados desta pesquisa revelaram que 97,3% da população pesquisada apresentaram algum dos resíduos dos contaminantes de interesse analisados e que os níveis de contaminação por esses resíduos organoclorados estavam acima dos valores de referências internacionais permitidos pela Organização Mundial da Saúde (Brilhante e Franco, 2006). Ainda em 2003, o Ministério da Saúde realizou um cadastro com a finalidade de fazer um levantamento populacional em Cidade dos Meninos, para planejamento de ações futuras. Nesse cadastro constam 1.346 indivíduos agrupados em 382 famílias. A estratégia de cadastramento teve por finalidade estabelecer critérios de avaliação acerca do monitoramento da saúde da população e coibir novas ocupações irregulares na Área, além de identificar o quantitativo populacional que deve ser removido da Área antes da remediação ambiental (Oliveira, 2010). Em junho de 2003, o Ministério da Saúde requisitou Licença Prévia, junto ao órgão estadual de meio ambiente do Rio de Janeiro, para iniciar processo de licenciamento para remedição ambiental na Cidade dos Meninos. Em resposta, a FEEMA solicitou ao Ministério da Saúde a complementação do diagnóstico ambiental para toda a área de Cidade dos Meninos. O "Plano de Estudos Complementares para Procedimentos de Remediação nas Áreas de Contaminação por Compostos Organoclorados em Cidade dos Meninos - município de Duque de Caxias - RJ" foi realizado em 2004 e, não alterou o conhecimento já existente, permanecendo os mesmos focos já conhecidos (Oliveira, 2010; AMBIOS, 2004). Os relatórios técnicos indicam que, para iniciar a remediação ambiental da área, é necessária a retirada de toda a população cadastrada, já que os focos de 37 Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães contaminação estão nas proximidades das residências que se localizam em torno da Estrada da Camboaba (principal acesso à Cidade dos Meninos, hoje camada Avenida Darcy Vargas) (UFF, 2010). Em 2009, A prefeitura recadastrou a população identificando 750 famílias residentes na área (Oliveira, 2010). Ainda, apontou-se a necessidade da interrupção das atividades agropecuárias em Cidade dos Meninos o que eliminaria a principal rota de exposição da população residente e, ainda, de populações humanas que residam fora de Cidade dos Meninos e que consumam produtos agropecuários produzidos na área. Em 2005, foi firmado um convênio entre o Ministério da Saúde e o Instituto Nacional de Câncer - INCA e, em 21 de fevereiro de 2006, foi instituído um Grupo de Trabalho por meio de Portaria nº 06 composto pela Coordenação Geral de Vigilância em Saúde Ambiental, INCA, Agência Nacional de Vigilância Sanitária, Departamento de Atenção Básica, Departamento de Ciência e Tecnologia, Secretaria de Estado da Saúde do Rio de Janeiro e Secretaria Municipal de Saúde de Duque de Caxias com a finalidade de elaborar um protocolo clínico para acompanhamento e monitoramento da saúde da população exposta a resíduos de compostos organoclorados (OLIVEIRA, 2010). Para realizar o monitoramento da saúde da população exposta em Cidade dos Meninos, o Ministério da Saúde instituiu, em 2002, uma Comissão Técnica Assessora, com a missão de fazer recomendações quanto às ações de saúde a serem desenvolvidas junto à população. Essa Comissão elaborou relatório técnico denominado "Exposição Humana a Resíduos Organoclorados na Cidade dos Meninos município de Duque de Caxias, Rio de Janeiro" que subsidiou a definição da atuação do setor saúde no monitoramento da saúde da população de Cidade dos Meninos. Para tanto, foi repassado pelo Ministério da Saúde ao INCA, recursos necessários à implementação de algumas das recomendações do relatório da Comissão Assessora (MS, 2003). Com a finalidade de coordenar as ações do "Plano de Ação Cidade dos Meninos", os Ministros de Estado da Saúde; das Cidades; da Agricultura, Pecuária e Abastecimento; da Justiça; do Meio Ambiente e do Planejamento Orçamento e Gestão criaram um Grupo de Trabalho Interministerial (GTI); Portaria Interministerial nº 1.557, de 1 de agosto de 2008 (Brasil, 2008; Brasil, 2009). 38 Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães Em 2007, após elaboração das fichas clinicas foi realizada avaliação geral de saúde da população de Cidade dos Meninos, com investigações clínicas e laboratoriais para alguns órgãos/sistemas alvo como fígado, sistema nervoso, hematopoiético, endócrino e reprodutor. O objetivo dos dados gerados nesta avaliação geral era utilizálos para dar continuidade ao acompanhamento à saúde da população (OLIVEIRA, 2010). A localidade possui uma unidade de Saúde da Família com população 100% cadastrada, especialmente estruturada para atender ao monitoramento da saúde daquela população. Entretanto, a finalização do relatório de avaliação de saúde da população de Cidade dos Meninos ainda persiste. Para esta finalidade, foi estabelecida nova parceria entre Ministério da Saúde e o Instituto de Estudos em Saúde Coletiva da UFRJ em 2010. 39 JUSTIFICATIVA Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães A literatura, embora de forma não consistente, aponta para a associação entre a exposição a compostos organoclorados e diversos desfechos de ordem reprodutora. No entanto, ainda não esta claro se a ocorrência destes desfechos guarda relação com a idade dos indivíduos, ou o momento da vida em que esta exposição se iniciou. Particularmente com relação aos caracteres sexuais primários e secundários, acredita-se podem ser alterados e/ou modificados por quaisquer eventos ocorridos, respectivamente, na fase intra-útero e pré-púbere (que coincide com a fase conhecida como adrenarca). Para a caracterização sexual primária, eventos como a alteração na ocorrência de nascimentos masculinos é um desfecho de interesse dos grupos de investigação em epidemiologia ambiental, particularmente daqueles que estudam poluentes orgânicos persistentes, como é o caso dos organoclorados. Com relação aos adolescentes, alterações no desenvolvimento puberal e seu consequente atraso podem estar envolvidos no mecanismo de interferência dos organoclorados na ação gonadal por estrógenos e andrógenos. Para ambos os casos, ainda é incipiente a evidência de tais interações orgânicas, e com vistas a isso, cabe ressaltar a necessidade de estudos que comprovem e ratifiquem esta associação. A proporção entre os sexos no nascimento é uma medida padrão usada para avaliar a relação quantitativa entre os sexos no nascimento, através da divisão do número de bebês do sexo masculino nascidos vivos, pelo número de bebês do sexo feminino nascidos vivos, em um dado ano e área geográfica. Os valores freqüentes apresentados na literatura são por volta de 1.06, que significa 106 nascimentos de meninos para cada 100 nascimentos de meninas, ou, em termos de proporção de nascimentos de meninos: 51.5%. No contexto global, a proporção entre os sexos no nascimento tem mostrado uma tendência ao declínio, em diferentes países nas décadas recentes, que é o motivo de ter atraído de forma crescente o interesse da comunidade acadêmica 22,24,25 . Por grande parte do século XXI a proporção entre os sexos secundária (nascimentos de meninos/todos os nascimentos) veio caindo em muitos países. Tem-se especulado que este decréscimo é um indicador de contaminação ambiental. 40 Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães Os mecanismos de desregulação do tempo de puberdade são caracterizados como central (com a desregulação causando retardo na maturação do hipotálamo e da hipófise) ou periférico (com a desregulação atuando diretamente sobre as gônadas ou mama independente do eixo hipotálamo-hipófise). Muitos estudos e relatórios sugerem uma associação entre a exposição aos compostos desreguladores endócrinos (EDC) e alterações no tempo de início da puberdade. Entretanto, poucos estudos epidemiológicos confirmam esta hipótese. Em muitos destes estudos, a informação sobre a idade de início da puberdade, menarca, telarca, pubarca e semenarca são autorreferidos. O tamanho populacional também é muito variável. As variações do desenvolvimento puberal são associadas à dose pré-natal de exposição e a exposição pré-púbere. No entanto, estudos em humanos são escassos e ambíguos. Considerando que a população de estudo é uma exposição inteira exposta à resíduos de pesticidas organoclorados há cerca de 70 anos, ainda por estabelecer estudos mais focais sobre a associação entre a contaminação local e desfechos para a saúde, justifica-se este estudo por apontar uma possível interferência na endocrinologia reprodutiva causada pelos compostos dispersos na área. 41 OBJETIVOS Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães OBJETIVO GERAL Estimar a associação entre a exposição a organoclorados e alterações relacionadas às manifestações dos caracteres sexuais primários e secundários na população de Cidade dos Meninos/Brasil. OBJETIVOS ESPECÍFICOS 1. Analisar a série histórica de nascimentos no local e avaliar a composição populacional segundo sexo e local de nascimento; 2. Avaliar o padrão de desenvolvimento puberal dos adolescentes moradores do local; 3. Estimar a magnitude da associação entre exposição a organoclorados e atraso puberal. 42 REFERENCIAL TEÓRICO Cad. Saúde Colet., 2009, Rio de Janeiro, 17 (2): 375 - 390 Artigo 1: Janelas críticas para o sistema endócrinoreprodutor: utilização de períodos fisiológicos para a mensuração de risco à saúde humana por exposição a organoclorados. Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães JANELAS CRÍTICAS PARA O SISTEMA ENDÓCRINO-REPRODUTOR: UTILIZAÇÃO DE PERÍODOS FISIOLÓGICOS PARA A MENSURAÇÃO DE RISCO À SAÚDE HUMANA POR EXPOSIÇÃO A ORGANOCLORADOS. CRITICAL WINDOWS TO ENDOCRINE-REPRODUCTIVE SYSTEM: PHYSIOLOCIGAL PERIODS TO MEASURE HUMAN HEALT RISKS FROM ORGANOCHLORINE EXPOSURE GUIMARÃES, Raphael Mendonça ASMUS, Carmen Ildes Rodrigues Fróes COELI, Cláudia Medina MEYER, Armando RESUMO Os compostos organoclorados são praguicidas que foram usados na agricultura, no controle de vetores biológicos e de ectoparasitas. Apesar de seu uso proibido no Brasil, estes compostos ainda são encontrados no ambiente, dada sua persistência no solo e em águas subterrâneas. Considera-se, de uma forma geral, que toda a população global é ou foi exposta a organoclorados. Entretanto, pensa-se que esta exposição é diferenciada quanto ao tempo e à dose (intensidade) em que a pessoa se expõe. E ainda, que é importante considerar em que momento da vida esta exposição foi iniciada, uma vez que há períodos de desenvolvimento a serem considerados mais críticos sob o ponto de vista de sofrerem intensa atividade organogênica, histogênica e de secreção hormonal. Os objetivos deste artigo são: revisar as propriedades, mecanismos de ação e efeitos toxicológicos dos organoclorados, e identificar os períodos do desenvolvimento do sistema endócrino-reprodutivo considerados como vulneráveis à ação dos compostos organoclorados. Palvras-Chave: Sistema endócrino-reprodutor, Organoclorados, Janelas Críticas de Exposição. ABSTRACT Organochlorine compounds are pesticides used in agriculture, for the control of biological vectors of diseases and of ectoparasites. Despite of their use be prohibited in Brazil, residues of such compounds can still be found in the environment, because of their persistence ground and underground water. It is considered, generally, that all global people are or were exposed to organochlorines. However, this exposure is differentiated according to intensity (dosis) and time of exposure. And more, that is important to consider in which moment of life this exposure has began, because there are some development periods that need to be considered more critical according to organogenesis, histogenesis and hormonal secretion. The aims of this review are: to review organochlorine properties, mechanisms of action and toxicological effects, and to to identify which are the critical windows to reproductive system development. Keywords: Reproductive System, Organochlorine, Critical Windows of Exposure 43 Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães INTRODUÇÃO Nos últimos anos, muito se tem discutido na área da toxicologia clínica e ambiental sobre a capacidade que alguns químicos de uso cotidiano pela sociedade apresentam de interferir sobre o funcionamento do sistema endócrino (Gúzman & Zambrano, 2007). Sabe-se que estes compostos xenobióticos, quando ministrados em doses suficientes, e em períodos críticos do processo de desenvolvimento, podem interagir com uma série de sistemas endócrinos, inclusive com o eixo hipotalâmicohipofisário, função tireóide e órgãos sexuais. Os desreguladores endócrinos, como são conhecidos, foram definidos como "qualquer substância exógena que interfere com a síntese, armazenamento/liberação, transporte, metabolismo, atividade conjugadora ou eliminação de hormônios naturais na corrente sangüínea que são responsáveis pela regulação da homeostase e pelo desenvolvimento" ou "qualquer substância exógena que causa efeitos adversos à saúde, secundários a alterações da função endócrina em organismos intactos, ou na sua prole" (Koifman & Paumggartten, 2002) . Uma variedade de substâncias químicas é suspeita de causar tais efeitos adversos. Uma classe importante destes agentes químicos é intitulada organoclorados, compostos formados por átomos de carbono, hidrogênio e cloro (Flores et a, 2004). São extremamente persistentes no meio ambiente e se acumulam em diversos compartimentos ambientais. Estes compostos produzem uma ampla gama de efeitos tóxicos em animais e seres humanos, especialmente nos sistemas reprodutivo, nervoso e imunológico, além de possuírem algumas evidências sugerindo sua associação com certos tipos de câncer (Guimarães, Asmus & Meyer, 2007; Birnbaum & Fenton, 2003). Muitos desses efeitos ocorrem porque certos organoclorados são capazes de mimetizar ou inibir a ação de determinados hormônios, particularmente aqueles atuantes no processo de diferenciação e maturação sexual. Além disso, alguns organoclorados afetam enzimas que controlam as reações bioquímicas no organismo (Domenice et al, 2002). O desenvolvimento dos caracteres anatômicos e fisiológicos dos sistemas reprodutores masculino e feminino pode ser dividido em diversos estágios que representam uma seqüência de eventos. Estes se iniciam na fase pré-natal, evoluem ao longo da infância e puberdade e terminam no organismo adulto (Pryor et al, 2000). 44 Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães A diferenciação pré-natal correta dos tecidos ovarianos e testiculares é crítica para mudanças pós-natais e peripuberais que conduzem ao funcionamento do sistema reprodutivo e a fertilidade depois da puberdade (Domenice et al, 2002). Em adultos, a gametogênese e a esteroidogênese em ambos os sexos é regulada pelo eixo hipotálamo-hipófise-gonadal (George et al, 1994). O desenvolvimento apropriado de cada porção desse eixo é essência para o funcionamento correto do sistema reprodutor. (Johnson & Everitt, 1980). Cada estágio do desenvolvimento reprodutivo pode, assim, ser pensado como uma janela de vulnerabilidade para a exposição a resíduos tóxicos (Damastra et al, 2002). A exposição a agentes químicos durante o período pré-natal ou perinatal, por exemplo, pode gerar impactos não só nas mudanças de desenvolvimento que ocorrem durante aqueles intervalos de tempo, mas também ter conseqüências tardias relacionadas à fertilidade na vida adulta 9Duvivedi & Iannacone, 1998). Pelo fato de cada classe de compostos tóxicos ter mecanismos variados de ação, cada um deles afeta o sistema reprodutivo de maneiras diferentes, por exemplo, mimetizando a ação estrogênica ou antagonizando a ação androgênica, e gerando efeitos diversos, sobre a diferenciação sexual, o desenvolvimento gonadal, a contagem de espermatozóides, a fecundidade, a fertilidade, o comportamento sexual, dentre outros (Flores et al, 2004; Duvivedi & Iannacone, 1998). Os objetivos deste artigo são: revisar as propriedades, mecanismos de ação e efeitos toxicológicos dos organoclorados, e identificar os períodos do desenvolvimento do sistema endócrino-reprodutivo considerados como vulneráveis à ação dos compostos organoclorados. PROPRIEDADES E MECANISMOS DE AÇÃO TÓXICA DOS ORGANOCLORADOS NO SISTEMA ENDÓCRINO-REPRODUTOR Os praguicidas organoclorados foram utilizados nos Estados Unidos e Europa desde os anos 50 até final da década de 80, mas a preocupação acerca de seu potencial carcinogênico e prejuízos ambientais acabaram restringindo ou até mesmo banindo seu uso em muitos países. No Brasil, a Portaria no 329, de 02 de setembro de 1985 proíbe a comercialização, o uso e a distribuição dos produtos agrotóxicos 45 Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães organoclorados, destinados à agropecuária, em todo território nacional (ANVISA, 1985). Os compostos organoclorados encontram-se presentes em quase todo ambiente e armazenam-se em plantas e em tecidos animais. As restrições à sua utilização originam-se da grande capacidade residual dos mesmos (Flores et al, 2004; Nunes e& Tajara, 1998) e da possível ação carcinogênica, de acordo com os critérios de classificação da Agência Internacional de Pesquisa em Câncer (IARC, 2002). Acredita-se que a população de uma forma geral está exposta a eles, seja pela água, ar ou alimentos. Uma vez que as vias de absorção são variadas e apresentam capacidade de acumulação (Flores et al, 2004) no organismo humano, torna-se difícil estabelecer relações entre causa e efeito, pois sinais e sintomas clínicos podem surgir após longo período (Nunes & Tajara, 1998). Os organoclorados estão sujeitos à degradação no meio ambiente, e suas concentrações variam muito dependendo do composto, de suas características e das condições ambientais. Esta classe de agrotóxicos foi, no passado, um grupo de compostos muito populares e utilizados principalmente como inseticidas, fungicidas para proteção de sementes e herbicidas (Kaushik & Kaushik, 2007). As propriedades físicas de lipossolubilidade, resistência à metabolização e persistência no ambiente, conferem a estes compostos a capacidade de se depositarem nos tecidos lipídicos dos organismos vivos, sofrendo biomagnificação, alcançando concentrações mais elevadas em animais de níveis tróficos superiores, como os seres humanos. Mesmo que alguns praguicidas não mostrem um efeito imediato in vivo nas concentrações normalmente usadas na agricultura, podem ter um efeito não desejado significativo, a longo prazo, no organismo humano (Kaushik & Kaushik, 2007). Os organoclorados são capazes de atravessar a barreira placentária, atingindo um valor médio no sangue do feto de um terço daquele encontrado no sangue materno, e têm níveis mais elevados no leite do que no sangue da mãe (Flores et al, 2004; Ecobichon, 2003). Os efeitos estrogênicos e anti-androgênicos dos organoclorados, quando estudados individualmente, apresentam pouca influência sobre os sistemas biológicos. No entanto, estudos in vitro utilizando a combinação de dois destes disruptores 46 Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães ambientais fracos, como o dieldrin, endossulfan, clordane ou toxafeno, mostraram que estes compostos apresentaram-se de 150 a 1.600 vezes mais potentes do que eram isoladamente como agentes estrogênicos (Wade et al, 1997). Este fato é justificado pelo fenômeno de bioacumulação do composto. Os mecanismos bioquímicos de toxicidade dos compostos organoclorados incluem a ação agonista ou antagonista em receptores de hormônios esteróides, a modulação de enzimas envolvidas na síntese ou no metabolismo dos hormônios e a modulação de eventos bioquímicos e moleculares, incluindo sinalizações de vias de expressão gênica. Receptores de hormônios celulares são membros da superfamília dos receptores nucleares que agem como fatores de transcrição que regulam a expressão gênica (Arnold et al, 1996; Brodie et al, 1999; Dickerson & Gore, 2007; Kaminuma et al, 2000; Sanderson e van den Berg, 2003). A figura 1 mostra os principais mecanismos potenciais de disrupção endócrina provocada por organoclorados. Já o quadro 1 destaca os mecanismos de disrupção endócrina provocada por organoclorados e distúrbios endócrinos. ASPECTOS TOXICOLÓGICOS DOS ORGANOCLORADOS As interações hormonais desempenham um papel essencial na coordenação das múltiplas atividades das células, tecidos e órgãos, através da regulação de funções biológicas como metabolismo, crescimento, desenvolvimento, equilíbrio hidroeletrolítico e reprodução (Guyton & Hall, 2002). Esta cadeia de eventos, no entanto, pode se tornar suscetível a ação de fatores de origem endógena ou exógena, os quais podem lhe conferir alterações indesejadas, interrompendo a homeostase e conferindo agravos à saúde. Substâncias como as bifenilas policloradas (PCB's) que eram utilizadas até pouco tempo atrás como isolantes em equipamentos elétricos e plastificantes, foram posteriormente proibidas em virtude dos seus efeitos sobre a saúde humana e animal. No entanto, as dificuldades com desativação e destruição de estoques causam ainda hoje problemas de contaminação ambiental e humana (Safe et al, 1985). As dioxinas juntamente com os furanos pertencem a uma classe de hidrocarbonetos produzidos involuntariamente a partir de uma série de reações termoquímicas. São compostos altamente cancerígenos, teratogênicos e persistentes, com efeitos tóxicos ao sistema endócrino através do bloqueio hormonal e ação antiestrogênica (IPCS, 1993). Outro 47 Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães exemplo trata-se de subprodutos de processos industriais, a exemplo dos originados involuntariamente da síntese de compostos clorados como o PVC e o agrotóxico ácido 2,4,5-triclorofenoxiacético (Birnbaum, 1994). Figura 1: principais mecanismos potenciais de disrupção endócrina provocada por organoclorados. Legenda: ER – receptores de estrogênio; AR – receptores de androgênio; AhR – receptores aril-carboneto QUADRO 1: MECANISMOS DE DISRUPÇÃO ENDÓCRINA PROVOCADA POR ORGANOCLORADOS E DISTÚRBIOS ENDÓCRINOS 48 Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães Organoclorado PCB Dioxinas e Furanos DDT/DDE Clordano Dieldrin Pentaclorofenol Hexaclorociclo-hexano (HCH) e isômeros Mirex Mecanismo - Antagonista de receptores de estrogênio Antagonista de receptores de androgênio Agonista de receptores Aril-Hdrocarbono (AhR) Envolvimento com Metabolismo Antagonista de receptores de estrogênio Agonista de receptores Aril-Hdrocarbono (AhR) Inibidor da aromatase Agonista de receptores de androgênio Antagonista de receptores de androgênio - Competição pelos sítios de estrogênio - Antagonista de receptores de androgênio Agonista de receptores de estrogênio Antagonista de receptores de androgênio Agonista de receptores de estrogênio - Antagonista de receptores de androgênio - Agonista de receptores de estrogênio Toxafeno - Agonista de receptores de estrogênio, inibição da síntese de ACTH Outro grande exemplo é o Dicloro-Difenil-Tricloroetano, o DDT, uma das substâncias mais estudadas sob o aspecto de desregulação endócrina. Embora já tivesse sido proibido em mais de 80 países em meados da década de 70, no Brasil o seu uso tornou-se restrito a campanhas de combate a Malária em 1982 e, apenas recentemente em 1994, sua utilização foi completamente proibida. Por ser uma substância altamente persistente no ambiente, ainda hoje é possível encontrá-lo em altos níveis no leite materno e tecido adiposo, sobretudo, em indivíduos residentes de áreas endêmicas de Malária na Amazônia, onde as campanhas de combate ao vetor foram intensas (Guimarães, Asmus & Meyer , 2007; Kelce et al, 1995). Mesmo nas regiões mais distantes como as regiões polares, é possível detectar resíduos de inseticidas organoclorados como o DDT e o dicloro-difenil etilcloro (DDE), seu principal metabólito, em tecido adiposo de leões marinhos e outros mamíferos aquáticos (Richardson & Bowron, 1985). 49 Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães O quadro 2 cita alguns dos prováveis desfechos para a exposição por certos tipos de organoclorados. Em seguida, alguns dos possívelis efeitos toxicológicos dos organoclorados. QUADRO2: DESFECHOS REPRODUTORES ASSOCIADOS A ORGANOCLORADOS ESPECÍFICOS. COMPOSTO EFEITOS Retardo puberal, ↑ Time to Pregnancy*, Alterações de Esperma (volume, morfologia, motilidade), PCB Prematuridade, Baixo Peso ao Nascer, menarca precoce. ↑ Time to Pregnancy*, Alterações de Esperma DDT/DDE (volume, morfologia, motilidade), Prematuridade, Baixo Peso ao Nascer, Abortamento Espontâneo, menarca precoce, malformação congênita, Criptorquidia e Hipospádia Dioxinas (TCDD, Retardo puberal, irregularidade de fluxo menstrual, PCDD)/Furanos (PCDF) menopausa precoce, Prematuridade, Baixo Peso ao Nascer HCH Baixo Peso ao Nascer, malformação congênita, Prematuridade, Baixo Peso ao Nascer Dieldrin/Aldrin malformação congênita, Prematuridade, Baixo Peso ao Nascer Heptaclor-Epóxido Prematuridade, Baixo Peso ao Nascer * Time to Pregnancy: tempo entre momento do início da tentativa de gravidez e da gravidez propriamente. DESENVOLVIMENTO REPRODUTOR Eventos relacionados à formação, ao crescimento e ao desenvolvimento reprodutor consistem em inúmeras etapas que vão desde a fase embrionária até a senescência. Em todos eles, a ação hormonal é imprescindível para sua regulação, em ordem de eventos e tempo definidos. Toxicantes reprodutivos considerados desreguladores endócrinos podem afetar eventos críticos no desenvolvimento do sistema reprodutor, desde a formação do eixo hipotálamo-hipofisário, passando à determinação da célula germinativa primordial para diferenciação gonadal, desenvolvimento gonadal, gametogênese, formação da genitália externa ou eventos reguladores do comportamento sexual (Pryor et al, 2000). A identificação dos períodos 50 Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães em que o funcionamento deste sistema se dá de forma mais intensa, permite supor que estes seriam também mais suscetíveis, portanto, aos efeitos que qualquer agente interveniente possa provocar. Pelo fato do desenvolvimento do sistema reprodutor ser contínuo, é difícil a subdivisão precisa em janelas do período imediatamente após o nascimento até a fase pré-púbere, que corresponde à infância. Uma divisão muito utilizada para o período pós-natal até o início da puberdade é a da primeira infância, correspondente ao intervalo entre o nascimento e os três anos de idade; a segunda infância, dos 4 aos 6 anos; a terceira infância, entre 7 e 10 anos, quando iniciam-se eventos fisiológicos que preparam o corpo para a puberdade (Damstra et al, 2002). Toxicantes reprodutivos podem afetar eventos críticos no desenvolvimento do sistema reprodutivo, desde a determinação da célula germinativa primordial para diferenciação gonadal, gametogênese, formação da genitália externa ou eventos reguladores do comportamento sexual (Pryor et al, 2000) Os quadros 2,3 e 4apresentam os principais fenômenos da formação e desenvolvimento do sistema reprodutivo dependentes de ação endócrina, respectivamente, no período intra-útero, pós-neonatal e no período correspondente à fase pré-púbere e púbere. Durante a infância, a rede neuronal hipotalâmica responsável pela descarga pulsátil de GnRH para o sistema porta-hipofisário e reguladora da secreção de gonadotrofina é denominada de gerador de pulso hipotalâmico de GnRH. No desenvolvimento fetal, o principal estímulo para a liberação das gonadotrofinas é fornecido por um padrão intermitente de descarga de GnRH pelo hipotálamo. A concentração de gonadotrofinas alcança níveis de adulto no segundo trimestre da gestação, sugerindo que o pulso gerador de GnRH é completamente funcionante nesta época (Klein, 1999). As gonadotrofinas caem consideravelmente durante o último trimestre sob efeito do feedback negativo feito pelos esteróides placentários, e a atividade do pulso gerador é diminuído (Glenister &Hamilton, 2005). No parto, esta inibição é perdida, e a atividade do pulso gerador de GnRH é retomada durante a fase lactente, e os níveis de gonadotrofina se elevam novamente., até cerca de 2-3 anos, quando começam a ter seus níveis reduzidos até a fase pré-púbere (Chaim & Mazor, 1998). 51 Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães Do segundo ano de vida até o início da puberdade, há um hiato pré-puberal, durante o qual o sistema hipotálamo-hipofisário mantém a secreção de FSH e LH em níveis baixos. Meninas na fase pré-puberal podem ter episódios de atividade folicular não-ovulatória, mas o E2 circulante permanece baixo (Guyton & Hall, 2002). Em meninos, as células de Leydig e os túbulos seminíferos são relativamente inativos, e a testosterona sérica se apresenta igualmente em níveis baixos. O mecanismo de atenuação pré-puberal da pulsatilidade de GnRH e decréscimo da estimulação de gonadotrófos pelo hipotálamo não é totalmente compreendido. Um possível mediador deste sinal inibitório para o GnRH seria o ácido gama- amino butírico (GABA), o maior neurotransmissor inibitório do cérebro (Molina, 2006). O principal sinal da proximidade da puberdade é o crescimento da secreção de androgênios a partir das adrenais. Este período é conhecido como adrenarca (Guyton & Hall, 2003). A adrenarca ocorre bem antes da ativação puberal do eixo reprodutor, por volta dos 6 a 9 anos de idade, e resulta em um aumento do nível de uma variedade de estrogênios, incluindo a androstenediona, a diidroepiandrosterona (DHEA) e o diidroepiandrosterona-sulfato (DHEA-S). Os andrógenos adrenais humanos estão associados ao crescimento de pêlos axilares e púbicos, e o aumento dos ossos e crescimento do esqueleto. Já o início da puberdade não é dependente da maturação da hipófise ou das gônadas, já que elas são capazes de responder a estímulos em qualquer idade. Ao invés disso, os eventos da puberdade se originam com a habilidade do hipotálamo em produzir GnRH em um ritmo pulsátil com freqüência e amplitude específicas. Da mesma forma que o mecanismo pelo qual o gerador de pulso de GnRH é reprimido durante o hiato pré-púbere ainda é desconhecido, o evento, neurológico ou não, que leva à remoção desta pausa ainda é fruto de investigação (Klein, 1999). Dois processos provavelmente envolvidos incluem: 1) dessensibilização do gonadostato do hipotálamo para o feedback negativo por esteróides gonadais; e 2) um decréscimo na inibição intrínseca central da secreção de GnRH (Molina, 2006). 52 4 3 2 1 adaptado de Pryor et al, 2000 Organogênese Histogênese Maturação Funcional Gametogênese Migração de Células. Germinativas Ovogênese Espermatogênese Gonadogênese Gônada indiferenciada Diferenciação Condensação do Tubérculo Cérebro e Hipófise Hipófise e Hipotálamo Dimorfismo Sexual Sistema Urogenital Diferenciação Sexual Descida do Testículo Caracteres Sexuais Secundários Glândula Mamária Formação dos canalículos mamários Estímulo Glandular Retomada da Maturação Glandular Eventos Embrionário 24 23 22 21 20 19 18 17 16 15 5 Período de Desenvolvimento (em semanas) Fetal 32 31 30 29 28 27 26 25 14 13 12 11 10 9 8 7 6 QUADRO 3: PRINCIPAIS EVENTOS ASSOCIADOS À FORMAÇÃO DO SISTEMA REPRODUTIVO QUE OCORREM NO PERÍODO INTRA-ÚTERO. 37 36 35 34 33 Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães 38 53 Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães 54 QUADRO 4: PRINCIPAIS FENÔMENOS DA FORMAÇÃO DO SISTEMA REPRODUTIVO QUE OCORREM NO PERÍODO PÓS-NATAL 0 1 2 3 4 5 Adolescência PréPuberdade Pré-Escolar Eventos de Desenvolvimento Primeira Infância Lactente Fase de Desenvolvimento 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15 16 17 18 Organogênese Histogênese Maturação Funcional Migração de Células. Germinativas Ovogênese Espermatogênese Gônada indiferenciada Diferenciação Condensação do Tubérculo Hipófise e Hipotálamo Dimorfismo Sexual Diferenciação Sexual Descida do Testículo Caracteres Sexuais Secundários Formação dos canalículos mamários Estímulo Glandular Retomada da Maturação Glandular adaptado de Pryor et al, 2000 QUADRO 5: ESTÁGIOS DE DESENVOLVIMENTO SEXUAL DA ADOLESCÊNCIA DE ACORDO COM A IDADE. Mamas estágio 2 Mamas estágio 4 Pêlos Pubianos tipo 2 Feminino Pêlos Pubianos tipo 4 Menarca Pico de crescimento Adrenarca Genitália estágio 2 Pêlos Pubianos tipo 4 Genitália estágio 4 Masculino Genitália estágio 2 Volume testicular (VT)= 4ml VT= 12ml 8 9 10 11 adaptado de Pryor et al, 2000 12 13 14 Pico de crescimento 15 16 17 18 (idade) 19 20 Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães CONCLUSÃO É preciso compreender em que períodos o funcionamento do sistema reprodutor se dá de forma mais intensa, e mais suscetível, portanto, aos efeitos que qualquer agente interveniente possa provocar. Diversos são os efeitos apontados como conseqüência da desregulação endócrina em humanos, como alteração das razões de sexo, atraso puberal, alteração do ciclo menstrual, menopausa precoce, qualidade do sêmen, alteração na formação do órgão sexual masculino (como por exemplo criptorquidia e hipospádia) e o aumento do número de ciclos entre a interrupçao de métodos contraceptivos e a gravidez do casal (conhecido como time to pregnancy)(Colborn et al, 1996; Sharpe & Irvine, 2004; Cravedi et al, 2007; Guillette, 2006; Pombo & Castro-Feijó, 2005) . A revisão do desenvolvimento do sistema reprodutor em humanos indica que o período intra-útero (embrionário e fetal), a infância precoce (do nascimento aos 2 anos), a pré-puberdade (6 a 9 anos) e a adolescência (10 a 19 anos) são períodos fisiológicos que podem ser descritos como janelas críticas para a exposição a esta classe de poluentes. Entretanto, não é possível determinar o peso de cada um destes períodos na probabilidade de ocorrência de eventos mórbidos futuros, ou seja, se a exposição a estes compostos em um determinado período fisiológico (por exemplo, intrauterino) pode corresponder a um risco superior do que em outro período (por exemplo, na adolescência). Há uma carência de estudos epidemiológicos analíticos para que se estabeleçam evidências com alto grau de confiança sobre a magnitude dos riscos de exposição a estes compostos e certos desfechos, como os reprodutivos. Percebe-se, portanto, que é necessário, dentro dos programas de investigação, que sejam feitas revisões sistemáticas e estudos de meta-análise para mensurar este risco, e a partir deles se consiga estabelecer medidas de controle e avaliação de populações expostas. REFERÊNCIAS 1. ANVISA. Portaria nº 329, de 02 de setembro de 1985. 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Houve uma tendência secular, durante o século passado, da puberdade se apresentar cada vez mais cedo. Cada vez mais este fenômeno tem sido associado à exposição aos chamados desreguladores endócrinos. Embora seja muito plausível que os desreguladores endócrinos podem perturbar o desenvolvimento puberal, há muito poucas investigações sobre este e, portanto, ainda não tem nenhuma causa clara sobre o efeito e a magnitude desta associação. Nesta revisão de literatura, investigações epidemiológicas que estudaram estudar o efeito dos desreguladores endócrinos no início da puberdade são apresentadas. Grande parte dos resultados encontrados em estudos populacionais estão em conformidade com os experimentais No entanto, a mistura de diferentes componentes com antagonistas efeitos (estrogênicos, anti-estrogênica, anti-androgênica) e limitado conhecimento sobre a janela mais críticos para a exposição (pré-natal, Perinatal e púberes) podem dificultar a interpretação das avaliações. Palavras-Chave: Desreguladores Endócrinos, Saúde do Adolescente, Saúde Ambiental ABSTRACT Pubertal development is regulated by sex hormones and gonadotropins. During the last century, secular trend showed puberty was present at an earlier age. Increasingly, this phenomenon has been associated with exposure to so-called endocrine disrupters. Although it is very plausible that endocrine disrupters may disturb pubertal development, there is very little research on this and therefore still have no clear cause established and effect on the magnitude of this association. In this literature review, epidemiological investigations which have studied the effect of endocrine disrupters in early puberty are presented. Most results found in population studies are in accordance with the experimental one. However, the mixing of different compounds with antagonic effects (estrogenic, anti-estrogenic, anti-androgen) and limited knowledge about the most critical windows for exposure (pre-natal, perinatal and pubertal) may complicate the interpretation of evaluations. Keywords: Endocrine Disruptors, Adolescents Health, Environmental Health. 60 Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães INTRODUÇÃO Observações em seres humanos e animais nos últimos 40 anos mostram uma tendência preocupante em termos de impactos negativos sobre o desenvolvimento do sistema reprodutivo. Nas últimas décadas, tendências seculares da puberdade precoce têm sido observadas (Parent et al, 2003). Tal fato não só pode aumentar os impactos na sociedade devido a maiores riscos de gestações precoces, como também mudanças na temporalidade do desenvolvimento puberal podem influenciar o risco de uso de drogas, comportamentos anti-sociais, distúrbios alimentares e estresse emocional. A maturação sexual precoce em adolescentes tem sido associada a uma maior prevalência de uso de álcool e tabaco no final da adolescência (Palton & Viner, 2007). Este período vulnerável de transição para a idade adulta é ajustado por mecanismos endócrino-reguladores (Terasawa & Fernandez, 2001). Desreguladores endócrinos estão associados a diversos processos fisiológicos que afetam a saúde reprodutiva normal em seres humanos e animais (McLachlan, 2001). Em seres humanos, a diminuição da contagem de espermatozóides, aumento da incidência de doenças como a criptorquidia e hipospadia em crianças, bem como o aumento da incidência de câncer relacionado a hormônios, tais como câncer de mama e câncer de testículo têm sido observados (Toppari et al, 1996; De Rosa et al, 1998). Cientistas especializados especulam que estas tendências podem derivar dos efeitos dos baixos níveis de substâncias químicas no meio ambiente que interferem ou alteram o sistema endócrino do organismo. Estes produtos químicos, conhecidos como desreguladores endócrinos, podem atuar por meio de diferentes mecanismos. Determinados desreguladores endócrinos imitam os efeitos dos hormônios naturais acionando seus receptores específicos, enquanto outros se unem a receptores hormonais e bloqueiam a atuação dos hormônios naturais. Eles também podem interferir na produção, transporte, metabolismo e excreção de hormônios que ocorrem naturalmente (Goldman et al, 2000; Stoker et al, 2000). A puberdade é um processo neuroendócrino complexo cujo principal mecanismo ainda não está claro (Parent et al, 2003). O crescimento na adolescência é impulsionado pela influência contínua de hormônios de crescimento a partir do período pré-puberal, com a influência adicional de esteróides sexuais na adolescência. Durante a puberdade, há um rápido crescimento em termos de altura e tamanho 61 Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães muscular, com aumento dos volumes pulmonares. Outras mudanças importantes são o desenvolvimento de características sexuais primárias e secundárias, como o crescimento de pelos pubianos, e aumento no tamanho da mama e dos testículos (Karlberg, 2002). Há uma lacuna nas produções nacionais e internacionais sobre a consolidação do conhecimento sobre os efeitos que estes desreguladores endócrinos exercem sobre os adolescentes, considerando esta faixa etária como um período crítico do desenvolvimento reprodutor. Neste breve panorama da literatura, analisou-se especificamente o efeito dos desreguladores endócrinos sobre as características sexuais secundárias. MÉTODOS Foi realizada uma revisão da literatura a partir de um levantamento bibliográfico nas bases de dados eletrônicas: Scientific Eletronic Library On-line (SciELO), Literatura Latino-Americana e do Caribe em Ciências da Saúde (LILACS) e Medical Literature Analysis and Retrieval System Online (MEDLINE). Os descritores em português empregados na revisão bibliográfica foram: “organoclorados”, “disruptores endócrinos”, e “adolescentes”. Os seus correspondentes em inglês foram: “organochlorine”, “endocrine disruptors”, e “adolescents”. O período abordado neste artigo refere-se à literatura publicada nas duas últimas década (1990 – 2010), dada a escassez de artigos sobre esta temática específica com adolescentes. A revisão priorizou estudos de seguimento (coorte e caso-controle), dado que ensaios clínicos randomizados não são factíveis para estudos toxicológicos em humanos. Foram selecionados estudos epidemiológicos que estudaram a idade na menarca em meninas, aumento do volume testicular nos meninos e/ou estágios puberais de Tanner (Marshal & Tanner, 1969; ___________, 1970) nos dois sexos. DISRUPTORES ENDÓCRINOS De acordo com uma definição amplamente aceita, um desregulador endócrino é uma substância exógena que causa efeitos adversos à saúde em organismos intactos, ou sua progenia, de forma secundária a alterações na função endócrina. Um potencial 62 Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães 63 desregulador endócrino é uma substância exógena que possui propriedades que podem levar à desregulação endócrina em um organismo intacto, ou sua progenia (Bergman et al, 1996). Constatou-se que uma lista crescente de produtos químicos influenciam o sistema endócrino, seja in vitro ou in vivo, porém, até o momento somente alguns estão associados com o desenvolvimento puberal alterado (Mc Lachlan, 2001). Desreguladores endócrinos podem exercer tanto efeitos diretos quanto indiretos sobre os neurônios secretores de GnRH hipotalâmico, uma vez que receptores de estrogênio estão presentes em neurônios que se projetam em neurônios GnRH, tendo sido localizados dentro dos próprios neurônios GnRH (Skynner et al, 1999) (fig. 1). Estudos in vivo e in vitro revelaram receptores de estrogênio e receptores de andrógenos no cérebro imaturo. Observações preliminares (Rasier et al, 2006) indicam que o diclorodifeniltricloroetano pode ter efeito estimulante sobre a secreção de GnRH com o envolvimento de receptores de estrogênio e receptor de glutamato, bem como receptores órfãos (Ohtake et al, 2003). Constatou-se que duas misturas de PCB, Aroclor 1221 (A1221) e A1254 influenciam a transcrição de GnRH e os níveis de peptídeo após a exposição das células neuronais hipotalâmicas GT1-7 in vitro (Gore et al, 2002). Por outro lado, sabe-se que alguns compostos como o DDT interferem na aromatase no cérebro, que converte a testosterona em estrogênio no cérebro imaturo (Kuhl et al, 2005). A conversão da testosterona em estradiol desempenha um papel importante na diferenciação sexual do cérebro de roedores (Roselli et al, 1993). Substâncias desreguladoras endócrinas também podem afetar os níveis de circulação de esteróides interferindo na produção de esteróides por gônadas ou no metabolismo de esteróides ou em seus transportadores ou receptores. Em ratos imaturos, maiores níveis de atividade de estrogênio podem suprimir o GnRH e gonadotrofinas pituitárias por um mecanismo de controle de feedback negativo (Grumbach e Styne, 2003). Na mulher madura, um feedback positivo (estimulante) pode levar a um aumento do GnRH pré-ovulatório e liberação de gonadotrofinas (FSH e LH) (Levine, 1997; Terasawa & fernandez, 2001), podendo intensificar o início da puberdade (fig. 1). Dados sobre animais tendem a comprovar os efeitos dos desreguladores Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães endócrinos sobre o eixo hipotalâmico-pituitário-gonadal que influencia a maturação sexual e a reprodução em roedores do sexo feminino. Observam-se os efeitos diretos e indiretos através de mecanismos de feedback sobre as funções secretoras hipotalâmicas e pituitárias. FIGURA 1: ALVOS PERINATAIS E PRÉ-PÚBERES DOS DISRUPTORES ENDÓCRINOS EM RELAÇÃO A POSSÍVEIS DESFECHOS PARA A SAÚDE. Além disso, os efeitos diretos sobre as funções gonadal e adrenal podem contribuir para alterações no desenvolvimento da puberdade (fig. 1). O impacto sobre o início da puberdade pode ser diferente de acordo com o tempo de exposição. 64 Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães EFEITOS PARA A SAÚDE DOS ADOLESCENTES Efeitos em meninas A exposição intra-uterina a PBB por bebês nascidos após a exposição acidental ao polibromobifenilo (PBB) em uma coorte em Michigan foi estimada a partir de medições de PBB no soro materno feitas nos anos seguintes à gestação por meio de um modelo de taxa de decaimento materno. Em 1997, 26 anos após o acidente, as mães cadastradas e seus descendentes do sexo feminino com idade entre 5 e 24 anos foram contatados para fornecer informações sobre a duração da amamentação, sobre o desenvolvimento puberal (auto-relato da idade na menarca e estágio de Tanner) e possíveis fatores de confusão. O nível médio de PBB foi 17.3 ppb (faixa: 0–1142 ppb); o nível médio de bifenil policlorado (PCB) foi 5.6 ppb (faixa: 0–78 ppb). Revelou-se que filhas amamentadas por mães com estimativa de nível sérico PBB elevado (ppb ≥ 7) teriam tido menarca mais cedo (11,6 anos, n = 16) que as meninas que não foram amamentadas com baixa (<1 ppb) exposição (12,5 anos, n = 61). A taxa de risco foi 3,4 (95% IC: 1.3-9.0). Além disso, altos níveis de exposição perinatal ao PBB estiveram associados a estágios de nascimento de pelos pubianos anteriores em meninas não amamentadas. A idade na menarca e estágio de Tanner tiveram pouca associação com a exposição ao PCB (Blanck et al, 2000). Em uma análise retrospectiva entre pessoas submetidas à exposição acidental à dioxina em Seveso (Warner et al, 2004), 282 mulheres que estavam na fase prémenarca no momento da explosão (idade média: 6.9 anos, faixa: 0–17 anos) foram entrevistadas por uma enfermeira treinada para determinar a idade na menarca de forma retrospectiva. Os níveis de TCDD foram medidos em soros armazenados. O nível médio de TCDD no soro foi de 140.3 ppt (faixa: 3.6–56 000 ppt). A taxa de risco associada a um aumento de 10 vezes nos níveis de TCDD foi de 0.95 (95% IC: 0.83– 1.09), o que significa que não houve mudança significativa no início da menarca. As conclusões foram semelhantes quanto a considerar o TCDD como uma variável categórica ou se a análise se restringiu a mulheres com menos de 8 anos de idade na ocasião da explosão. Os autores tomaram como pressuposto que a exposição pósnatal, porém pré-puberal, ao TCDD nesta coorte, embora em dose substancial, provavelmente ignorou a janela crítica para os efeitos da exposição. 65 Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães Scaglioni et al (1978) observaram desenvolvimento precoce de mamas em crianças italianas, tendo mais tarde, em estudo com as mesmas crianças, Fara et al (1979) detectaram discreto aumento nos níveis de 17-b-estradiol destas crianças, presumindo que o desenvolvimento mamário foi causado por consumo de alimentos contaminados por estrógeno. Comas (1982) avaliou, em Porto Rico, aumento da incidência de telarca, pubarca e puberdade precoce em crianças. Outros autores, como Saenz-de-Rodríguez & Toro-Sola (1982) realizaram estudos com pacientes com telarca precoce e estudaram a sua associação com cistos ovarianos. Finalmente, um estudo de coorte realizado em Jerusalém com crianças apresentando desenvolvimento sexual precoce entre 1974 e 1983 mostrou que a incidência de telarca precoce foi elevada no primeiro ano de vida. Em 2004, foram relatados resultados de um grupo de 151 meninas nascidas entre 1950 e 1980 de mães pertencentes à coorte de pescadores de Michigan (Vasiliu et al, 2004). As concentrações de PCB e Diclorodifenil Dicloroetileno (DDE) no soro materno na época da gestação foram retroextrapolados a partir de repetidas medições do soro materno, entre 1973 e 1991. A idade das filhas na menarca e possíveis fatores de confusão foram adquiridos por meio de entrevistas telefônicas. A menarca foi alcançada entre a idade de 9 e 17 anos. Na análise multivariada, o DDE (p = 0.04) causou uma menarca mais precoce, ao contrário do PCB (p = 0.08). Um aumento na exposição intra-uterina ao DDE, de 15 μg/L, reduziu a idade na menarca em 1 ano. Em oposição aos resultados da coorte de pescadores de Michigan, não foram encontrados efeitos significativos do PCB ou DDE na idade da menarca ou estágio puberal em 316 meninas selecionadas a partir do North Carolina Infant Feeding Study (Gladen et al, 2000). Houve uma tendência de amadurecimento precoce entre as meninas na categoria de maior exposição transplacentária (PCB> 4 ppm ou DDE> 4 ppm), porém essas diferenças não foram significativas. Efeitos em meninos Em um estudo no norte da Índia (Saiyed et al, 2003), habitantes de um vale isolado estiveram expostos ao endosulfan por mais de 20 anos devido a pulverizações aéreas de endosulfan que ocorriam duas ou três vezes por ano como o único pesticida 66 Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães aplicado em plantações de cajueiros situadas no topo das colinas circunvizinhas. Os níveis médios de endosulfan em 117 meninos da região com idade entre 10 e 19 anos eram significativamente mais altos do que 90 meninos da mesma faixa etária que viviam em um povoado a aproximadamente 20 km (7.47 ± 1.19 ppb vs. 1.37 ± 0.40 ppb). O estadiamento puberal de acordo com Tanner foi avaliado por um médico e os níveis séricos hormonais foram medidos. Após a realização de controles de idade, níveis séricos de testosterona e maturidade sexual, os escores atribuídos aos pelos pubianos, testículos e ao pênis estiveram significativamente e negativamente relacionados à exposição ao endosulfan. Em uma coorte de 196 meninos nascidos entre 1986 e 1987 nas Ilhas Faroé, a exposição pré-natal aos PCBs foi estimada a partir de níveis de PCB dos congêneres 138, 153 e 180 em cordões umbilicais (Mol et al, 2002). Aos 14 anos, estágios de Tanner, volume testicular e níveis séricos hormonais foram determinados em exames clínicos. Apesar da grande exposição aos PCBs, os resultados não revelaram qualquer associação definitiva com o desenvolvimento da puberdade. Da mesma forma, não foram encontrados efeitos do PCB ou DDE sobre o estágio puberal auto-relatado em 278 meninos selecionados a partir do North Carolina Infant Feeding Study (Gladen et al, 2000). DISCUSSÃO A partir da publicação de Silent Spring (Carson, 1962), houve uma crescente conscientização de que produtos químicos, quando presentes no meio ambiente, podem exercer efeitos profundos e nocivos sobre plantas e animais, e que a saúde humana está indissoluvelmente ligada à saúde do meio ambiente. Principalmente nas duas últimas décadas, observamos um crescente interesse nos meios científicos, na sociedade e maior atenção da mídia sobre os possíveis efeitos nocivos em seres humanos e na vida selvagem que podem resultar da exposição a produtos químicos que têm o potencial de interferir no sistema endócrino. A intensificação desse interesse e a falta de consenso entre os cientistas podem ser amenizados fazendo-se uma avaliação objetiva dos dados científicos disponíveis sobre os possíveis efeitos adversos destes produtos químicos a partir de uma perspectiva global. Países que não possuem a 67 Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães infraestrutura necessária para monitorar e avaliar esses produtos químicos manifestaram a necessidade de uma avaliação internacional mais objetiva . Os desreguladores endócrinos englobam uma variedade de classes de produtos químicos que incluem hormônios naturais e sintéticos, componentes vegetais e pesticidas, compostos utilizados na indústria de plásticos e em produtos de consumo, e outros derivados e poluentes industriais. Geralmente, esses desreguladores encontramse amplamente dispersos no meio ambiente. Alguns são persistentes, podendo ser transportados por longas distâncias cruzando as fronteiras nacionais e podem ser encontrados em praticamente todas as regiões do mundo. Outros são rapidamente degradados no meio ambiente ou no corpo humano ou podem estar presentes apenas por curtos períodos, porém em períodos críticos de desenvolvimento. A puberdade marca a transição entre a infância e a fase adulta reprodutiva. É uma etapa vulnerável da vida e a desregulação tem estado associada ao aumento de problemas de saúde e problemas psicossociais. O desenvolvimento da puberdade é um processo multifacetado que está sob o controle de diferentes mecanismos de regulação hormonal. Os fatores causadores ainda não foram elucidados com precisão. Experimentos epidemiológicos e animais mostram evidências do papel das mudanças pré-puberais nos mecanismos de controle hormonal, mas também revelam evidências que corroboram janelas de programação perinatal precoce. Existem diversas evidências quanto ao fato de que desreguladores hormonais exógenos podem antecipar ou retardar a puberdade. Foram constatadas associações entre nascimentos, crescimento pós-natal e desenvolvimento da puberdade, porém as relações causais estão longe de ser compreendidas ainda. Estudos experimentais sugerem que substâncias químicas exógenas que interferem nas metas quanto a crescimento, metabolismo de lipídeos, diferenciação e funcionamento do cérebro, gônadas e glândulas suprarrenais também exercem seu papel. Estudos epidemiológicos cuidadosamente desenvolvidos por meio da utilização de marcadores de exposição para substâncias químicas desreguladoras do sistema endócrino ocorrendo próximo e/ou após o nascimento e no estágio pré-puberal em combinação com marcadores de status endócrino e metabólico são necessários para se chegar a eventuais caminhos que levem aos cenários ambientais. 68 Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães O DDT, DDE, vários congêneres de PCB, congêneres de PBB e ésteres ftálicos têm sido descritos como agentes estrogênicos ou antiandrogênicos em estudos com animais (Grisp et al, 1998; Hansen, 1998). Alguns dos resultados relatados em estudos de coorte estão de acordo com esta teoria: uma menarca em idade precoce esteve associada com maior nível de exposição pré-natal ao PBB na coorte de Michigan (Vasiliu et al, 2004); com maior exposição pré-natal ao DDE entre a prole de progenitores que consumiam peixe em Michigan (Blanck et al, 2000); com maior exposição ao DDE na fase puberal de imigrantes que se mudaram para a Bélgica (Krstevska-konstantinova et al, 2001) e com maior exposição a ésteres ftálicos na fase puberal em Porto Rico (Colon et al, 2000). No entanto, em nenhum dos estudos a idade na menarca esteve associada com exposição ao DDE na Coorte da Carolina do Norte (Gladen et al, 2000) ou com PCBs (Blanck et al, 200; Gladen et al, 2000; Den Hond et al, 2002). Uma das razões para os resultados negativos nos PCBs, é que muitas vezes as concentrações totais de PCB no soro são medidas, ao passo que diversos congêneres de PCB podem causar efeitos diferentes e às vezes antagônicos (Hansen, 1998). Nenhum dos estudos que avaliou o desenvolvimento das mamas no estágio de Tanner encontrou uma associação significativa com PBBs (Blanck et al, 2000), PCBs (Blanck et al, 200; Gladen et al, 2000; Den Hord et al, 2002) ou DDEs (Gladen et al, 2000). Dioxinas e PCBs com características de dioxinas foram descritos como antiestrogênicos em animais (Brouwer et al, 1995). Os resultados do desenvolvimento tardio das mamas em adolescentes com taxas mais elevadas de compostos de dioxina no soro (Den Hond et al, 2002) corroboram esta teoria. Contudo, na mesma população, não foram observados efeitos na idade na menarca. A exposição pós-natal, porém prépuberal, à TCDD não demonstrou efeitos significativos na idade na menarca na população de Seveso (Warner et al, 2004). CONCLUSÃO Em comparação com as meninas, o número de estudos que avalia o efeito dos desreguladores endócrinos no desenvolvimento puberal em meninos é muito menor. A pesquisa em meninos é mais focada na qualidade do sêmen, que está muito mais 69 Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães relacionada à fertilidade. Os resultados sobre a puberdade tardia em meninos expostos a PCB, PCDF e endosulfan estão em consonância com o conceito geral de que esses compostos funcionam como xenoestrogênios. Vale ressaltar que não é a exposição a uma substância química isolada, mas a exposição cumulativa a diversos xeno-hormônios que irá definir o impacto final. O acompanhamento das mudanças no desenvolvimento da puberdade deve ser visto, portanto, como uma forma de vigiar o impacto das mudanças ambientais sobre o desenvolvimento dos indivíduos e sua saúde reprodutora. Recomenda-se, pois, que os programa de investigação no mundo realizem estudos epidemiológicos prospectivos e estudos de bancada sobre metabolismo hormonal com animais a título de esclarecer os principais efeitos dos disruptores endócrinos em pré-púberes e adolescentes. REFERÊNCIAS 1. Parent AS, Teilmann G, Juul A, Skakkebaek NE, Toppari J, Bourguignon JP. The timing of normal puberty and the age limits of sexual precocity: variations around the world, secular trends, and changes after migration. Endocrine Reviews. 2003, 24: 668–693. 2. Patton GC, Viner R. Pubertal transitions in health. Lancet 2007; 396:1130–39. 3. Terasawa E, Fernandez DL. Neurobiological mechanisms of the onset of puberty in primates. Endocr Rev. 2001, 22:111–51. 4. McLachlan JA. 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Raphael Mendonça Guimarães1 Carmen Ildes Rodrigues Fróes Asmus2 RESUMO Apesar de adultos e crianças estarem em risco de desenvolver doenças a partir de exposições perigosas, as crianças têm vulnerabilidades específicas em relação às suas posições e respostas para o ambiente. Desta forma, o objetivo do presente estudo é descrever o estado da arte sobre a suscetibilidade diferenciada de criançasa para as exposições ambientais, com o intuito de subsidiar a revisão das abordagens atuais da vigilância ambiental, dos testes de toxicidade e da avaliação dos riscos. O fundamento para a defesa desta teoria é de que as crianças têm exposições desproporcionais para muitos agentes ambientais; as vias metabólicas infantil, especialmente na vida fetal e nos primeiros meses após o nascimento, são imaturas; e os processos de desenvolvimento são facilmente perturbados durante o rápido crescimento e desenvolvimento antes e depois do nascimento. Entretanto, historicamente, a avaliação de risco centrada na exposição de adultos e toxicidades e mostrando pouca preocupação com as fases da vida mais vulneráveis, como o desenvolvimento fetal e a primeira infância. Portanto, o aumento dos conhecimentos e informações sobre crianças e suas janelas de susceptibilidade aos agentes ambientais irão ajudar a identificar subgrupos e idades sensíveis para planejar ações preventivas específicas. Palavras Chave: Saúde Ambiental Infantil; Vigilância Ambiental, Vulnerabilidade infantil. ABSTRACT Although adults and children are at risk of developing diseases from hazardous exposures, children have specific vulnerabilities in relation to their positions and responses to the environment. Thus, the purpose of this study is to describe the state of the art on the differentiated susceptibility of children to environmental exposures, in order to support the review of current approaches to environmental surveillance, toxicity testing and risk assessment. The foundation for the defense of this theory is that children have disproportionate exposure to many environmental agents; the metabolic pathways for children, particularly in fetal life and the first months after birth, are immature; and developmental processes are easily disrupted during the rapid growth and development before and after birth. However, historically, the risk assessment focuses on toxicity and exposure of adults and gave little consideration to the most vulnerable stages of life, such as fetal development and infancy. Therefore, the increase of knowledge and information about children and their windows of susceptibility to environmental agents will help identify susceptible subgroups and ages to plan specific preventive actions. Keywords: Children Environmental Health, Environmental Surveillance, Children Vulnerability 74 Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães INTRODUÇÃO Na última década, tem crescido o reconhecimento de que as crianças são um grupo dentro da população que exposições únicas e vulnerabilidades especiais a tóxicos ambientais. Compreende-se que as crianças necessitam de uma abordagem de avaliação de risco que considere as suas características particulares1. Atualmente, crianças em todo o mundo enfrentam os riscos ambientais que, há décadas atrás, não eram conhecidos ou mesmos suspeitados. Mais de 80.000 novas drogas sintéticas e compostos químicos têm sido desenvolvidos nos últimos 50 anos. Crianças são especialmente vulneráveis à exposição a pelo menos 15.000 dessas substâncias químicas, produzidas em quantidades de 4.500 kg ou mais por ano2. Estes compostos de grande produtos químicos mais amplamente dispersos pelo ar, água, alimentos culturas, comunidades, locais de resíduos e casas 3. Estima-se que, ao redor do mundo, anualmente mais de 84.000 mortes ocorrem em conseqüência do envenenamento, com a maioria sendo entre crianças e adolescentes após a exposição acidental. Centenas de produtos químicos como estes foram testadas para a sua toxicidade potencial humano, mas menos de 20% foram examinados quanto ao seu potencial para causar efeitos tóxicos no desenvolvimento para os fetos, bebês e crianças2,3. Até cerca de dez anos atrás, a exposição química era principalmente um problema para crianças nos países desenvolvidos. No entanto, ele está se tornando um problema para os países em desenvolvimento, com indústrias perigosas que lá são instaladas como conseqüência da globalização e, em um esforço para escapar de leis de trabalho e ambientais cada vez mais rigorosas em vigor nos países desenvolvidos. Além dos riscos de novas substâncias químicas, as crianças em todo o mundo enfrentam tradicionais riscos ambientais, incluindo má qualidade da água e saneamento, poluição do ar interior e exterior, doenças transmitidas por vetores, lesões não intencionais, habitação inadequada e os efeitos da variabilidade e mudanças climáticas3. Diante disso, o objetivo deste artigo é descrever o estado da arte sobre a suscetibilidade diferenciada de criançasa para as exposições ambientais, com o intuito 75 Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães de subsidiar a revisão das abordagens atuais da vigilância ambiental, dos testes de toxicidade e da avaliação dos riscos. PARTICULARIDADES NA SUSCETIBILIDADE INFANTIL As crianças são altamente vulneráveis aos riscos ambientais por diversas razões1,4: as crianças têm exposições excessivas a tóxicos ambientais; em relação à massa corporal, as crianças bebem mais água, comem mais, e respiram mais volume de ar que os adultos; crianças, nos primeiros 6 meses de vida, bebem sete vezes mais água por quilograma de peso corporal e as crianças de 1-5 anos comem 3-4 vezes mais comida por quilo do que o adulto médio; a entrada de ar de uma criança em repouso é proporcionalmente o dobro de um adulto. Como resultado, as crianças possuem exposições sensivelmente mais pesadas do que os adultos a qualquer tóxico presentes na água, alimento ou ar. Duas características adicionais das crianças ampliam ainda mais sua vulnerabilidade: seu comportamento “mão-a-boca”, e o fato de que eles vivem e brincam junto ao chão4-6. As vias metabólicas infantis, especialmente nos primeiros meses após o nascimento, são imaturas. Portanto, a habilidade das crianças de metabolizar, detoxificar e excretar substâncias tóxicas é diferente da dos adultos. Em alguns casos, as crianças podem ser melhor que adultos na capacidade de lidar com algumas substâncias tóxicas que adultos, como por exemplo, paracetamol. No entanto, eles são bem menos capazes de lidar com produtos químicos tóxicos e, portanto, são mais vulneráveis a eles. As crianças sofrem um rápido crescimento e desenvolvimento, e seus processos são facilmente perturbáveis. Os sistemas orgânicos de bebês e crianças mudam muito rapidamente antes do nascimento, bem como nos primeiros meses e anos de vida. Estes sistemas em desenvolvimento são muito delicados e não são capazes de reparar adequadamente danos causados por toxinas ambientais. Assim, se as células em um cérebro de bebê são destruídas por produtos químicos, como chumbo, mercúrio ou solventes, ou se falsos sinais são enviados para os órgãos reprodutivos em desenvolvimento por desreguladores endócrinos, existe um elevado risco de que a disfunção resultante será permanente e irreversível4,5,7. 76 Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães O fato de as crianças em geral terem mais anos de vida futura do que os adultos, faz com que eles tenham mais tempo de desenvolvimento de doenças crônicas desencadeadas pela exposição precoce. Muitas doenças que são causadas por substâncias tóxicas no ambiente requerem décadas para se desenvolver. Muitas dessas doenças, incluindo câncer e doenças neurodegenerativas, são atualmente supostos surgir através de uma série de etapas que requerem anos ou mesmo décadas desde o início a manifestação real da doença. Desta forma, exposições tóxicas e cancerígenas ocorridas no início da vida, incluindo a exposição pré-natal, possuem maior potencial para causar doenças do que exposições similares ocorridas anos mais tarde5,6. TOXICIDADE SUBCLÍNICA Um passo extremamente importante no desenvolvimento da compreensão da sensibilidade especial das crianças para as toxinas químicas foi o reconhecimento de que toxinas ambientais podem causar uma série de efeitos adversos em crianças. Alguns destes efeitos são clinicamente evidentes, mas outros só podem ser discernidos através de testes especiais e não são evidentes no exame padrão. Para tal, usa-se o termo "subclínica". O conceito subjacente é de que existe um continuum dose-dependente de efeitos tóxicos, em que efeitos clinicamente evidentes têm homólogos subclínicos7,8. O conceito de toxicidade subclínica tem suas origens nos estudos pioneiros de intoxicação por chumbo em clinicamente assintomáticos realizados por crianças Herbert Needleman e colaboradores9. Needleman et al mostrou que a exposição das crianças ao chumbo pode causar diminuição da inteligência e comportamento alterado, mesmo na ausência de sintomas clínicos de intoxicação por chumbo. A toxicidade subclínica do chumbo em crianças foi posteriormente confirmada em estudo epidemiológico prospectivo10. De maneira análoga, efeitos subclínicos neurotóxicos similares têm sido documentados em criança expostas no útero a bifenilas policloradas (PCB)11 e metilmercúrio12. 77 Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães JANELAS DE SUSCETIBILIDADE PARA A EXPOSIÇÃO AMBIENTAL EM CRIANÇAS As crianças têm uma sensibilidade peculiar a agentes químicos, biológicos e físicos ameaças ambientais. Seus tecidos e órgãos crescem rapidamente, desenvolvem-se e diferenciam-se até o nascimento. Os processos de desenvolvimento e crescimento do feto, bebê, criança e adolescente pode definir os períodos de grande vulnerabilidade para tóxicos ambientais. Além disso, padrões de exposição e comportamentos das crianças são muito diferentes dos adultos, e por isso pode resultar em exposição maior. Um grande número de alterações anatômicas, bioquímicas e fisiológicas correm a partir do início da vida intra-uterina até a adolescência7. As etapas de maturação podem ser alteradas por processos físicos, biológicos e fatores químicos e ambientais em vários pontos no tempo. Além disso, as mudanças com a maturação podem modificar substancialmente a absorção, distribuição, metabolismo e eliminação de produtos químicos presentes no ambiente. Quanto mais jovens e imaturas são as crianças, mais diferentes de um adulto podem ser as respostas às exposições ambientais. Além disso, evidências recentes sugerem que a exposição embrionária, fetal ou na primeira infância pode afetar o aparecimento de doenças na fase adulta, como por exemplo, doenças cardiovasculares, neurodegenerativas e câncer. Esses períodos sensíveis do desenvolvimento, chamados de "janelas de suscetibilidade", podem ser particularmente sensíveis para determinados produtos químicos e fatores físicos quando uma série de sistemas, incluindo o sistema endócrino, reprodutor, sistema imunológico, respiratório e nervoso, são expostos a eles5,7. TEMPO DE EXPOSIÇÃO Não só os níveis de exposição, mas também o tempo, podem afetar a saúde das crianças. Durante os períodos altamente suscetíveis de formação do órgão, o tempo de exposição é extremamente importante. Por exemplo, no caso da exposição prénatal, o mesmo tipo de exposição que ocorre em diferentes vezes é susceptível de produzir um espectro variado de malformações específicas com o resultados 78 Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães observados dependente do sistema do(s) órgão(s) mais vulnerável (is) no tempo de exposição13. Além de janelas altamente sensível para alterações morfológicas e defeitos no nascimento, também existem janelas de suscertibilidade importantes para o desenvolvimento de defeitos fisiológicos e alterações morfológicas no tecido e nos níveis celular e subcelular14. A maioria dos dados existentes estão relacionados à exposição pré- concepcional e pré-natal. Os dados sobre exposições pré-natal são baseados principalmente em estudos da exposição materna à fármacos (por exemplo, o dietilestilbestrol, e a talidomida) e uso de álcool pelos pais, tabagismo e exposições ocupacionais. Informações sobre a janela crítica para a exposição durante o período pós-natal são escassas. A exposição pós-natal foi analisada em detalhes para apenas alguns agentes ambientais, incluindo chumbo, mercúrio, alguns pesticidas, e por radiação7,15. Devido à variedade de fatores biológicos mencionados acima, há um maior potencial de efeitos adversos à saúde em crianças que em adultos. Crianças ainda estão se desenvolvendo de várias maneiras e podem ser mais vulneráveis às exposições ambientais. Podem ser menos capazes de evitar a exposição por causa de mecanismos de desintoxicação imaturos. Diferenças no metabolismo, tamanho e comportamento podem significar que eles têm maiores níveis de exposição do que os adultos no mesmo ambiente. É, portanto, crucial identificar e entender a importância da "Janelas de suscetibilidade" em crianças e as relações entre exposições e resultados de desenvolvimento. Isso requer conhecimento dos períodos-chave da susceptibilidade para resultados específicos. Informações sobre essas janelas crítica são descritas em uma série de relatos 13,5,7 . No entanto, um dos principais desafios em identificar janelas crítica é a pouca informação sobre o momento exato e sensibilidade dos diferentes estágios de desenvolvimento. Isso ressalta a importância de coleta de informações de casos específicos e avaliações da exposição detalhada em crianças. Várias questões que estão intimamente relacionadas com as janelas de susceptibilidade em crianças requerem maior atenção: as consequências dos riscos de 79 Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães desenvolvimento que se manifestam em idade adulta e velhice devem ser considerados, ou seja, a cascata potencial de eventos que podem resultar em efeitos sobre a saúde no adulto é mal compreendido (por exemplo, se a restrição de crescimento intra-uterino – RCIU – é associada com exposição a um agente particular, ele tem os mesmos efeitos na vida mais tarde, como RCIU nutricionalmente induzida?); dados disponíveis são limitados em interações gene-ambiente, uma área identificada como importantes para pesquisas futuras (são aqueles com certas genética traços mais propensos a desenvolver câncer ou outras condições de saúde associados com exposições de desenvolvimento? Será que estas características genéticas conferir desenvolvimento?); maior vulnerabilidade particular durante as fases de o período peripuberal/adolescência é sub-representados em estudos de exposição e desfechos na literatura atual, apesar de muitos sistemas orgânicos, especialmente o sistema endócrino – sofrer desenvolvimento significativo durante este período. Exposições nos períodos críticos de desenvolvimento podem resultar em efeitos à saúde observados: nos períodos pré-natal e no parto, aborto espontâneo, natimortos, baixo peso ao nascer e pequenos para a idade gestacional, mortalidade infantil, e malformações15-18; na infância, asma, câncer, doenças neurológicas e efeitos comportamentais19-22; na puberdade, tais como alterações no desenvolvimento normal e capacidade reprodutiva deficiente23,24; em adultos, câncer, doenças cardíacas, neurológicas e degenerativas e distúrbios comportamentais25-28. Há, ainda, dificuldades nos estudos de exposição de crianças, pois estas podem variar enormemente ao longo do tempo. Em diferentes estágios de desenvolvimento, a biologia, comportamento, definições, e as atividades das crianças pode resultar em exposições variáveis que também podem ser bastante diferentes daqueles dos adultos no mesmo ambiente. Por exemplo, a razão de superfície de massa corporal em crianças é aproximadamente 2,7 vezes maior que nos adultos; a taxa de ventilação respiratória por minuto é mais de 65 vezes maior29, e do consumo de água potável mais de duas vezes a dos adultos em relação ao peso corporal 30. A tabela 1 apresenta exemplos de diferença entre crianças e adultos para alguns indicadores fisiológicos. 80 < 1 ano 43,5 Ingesta média de água (ml/kg por dia) Ingesta de solo (mg/dia) 2 -5 anos Extradomiciliar 50 Intradomiciliar 60 Diferenças na absorção de chumbo 30 – 40% 2 * em ml/kg de peso corporal por m de área de superfície alveolar, por minuto. Crianças 10 3 40 133 0,067 Recém Nascido Taxas Respiratórias Volume respiratório (ml/kg por inspiração) Área de superfície alveolar (m2) Incursões respiratórias (irpm) Razão ventilatória-minuto* Parâmetros Área Superficial (m2/kg) 3-5 anos 35,5 11-19 anos 18,2 Ciclo da Vida Primeira Segunda Infância Infância 0,047 0,033 Tabela 1: Diferenças entre crianças e adultos em certos parâmetros que afetam a exposição ambiental Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães Adultos 20 0,4 18 – 24% 20-64 anos 19,9 Adultos 10 75 15 2 0,025 Adultos 81 Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães Portanto, mesmo durante o relativamente curto intervalo de tempo da infância, os níveis de exposição podem variar muito. CONSIDERAÇÕES FINAIS A proteção das crianças contra os produtos químicos tóxicos no ambiente é um grande desafio para a sociedade moderna (Schaefer 1994). As crianças não são apenas um grupo especial vulneráveis da nossa população, mas os atuais habitantes de um estágio de desenvolvimento através do qual todas as gerações futuras devem passar. Desta forma, a proteção da saúde dos fetos, bebês e as crianças é essencial para a sustentabilidade da espécie humana. O desafio atual para avaliação do risco deriva de dois fatos: a) centenas de novos produtos químicos são desenvolvidos a cada ano, liberado em quantidades variáveis para o ambiente, e absorvidos os corpos de muitas crianças ; e b) a maioria dos essas substâncias não são adequadamente avaliadas para seu alto potencial de toxicidade, efeitos potenciais sobre o desenvolvimento, ou seus possíveis efeitos interativos com outros produtos químicos, antes da introdução comercial. A necessidade, neste contexto, é a concepção de abordagens de avaliação de risco que representam para as posições originais e sensibilidades das crianças e que a investigação também vai estimular o reforço da toxicidade de desenvolvimento. A médio e longo prazo, a meta é formular políticas que protejam as crianças contra potenciais agentes tóxicos e permitir-lhes crescer, desenvolver e atingir a maturidade, sem incorrer em prejuízo neurocomportamental, disfunção imunológica, danos reprodutivos, ou um aumento dos riscos de câncer como conseqüência da exposição ambiental, no início de a vida. Ou seja, o aumento dos conhecimentos e informações sobre crianças e suas janelas de susceptibilidade aos agentes ambientais irão ajudar a identificar subgrupos e idades sensíveis para planejar ações preventivas específicas. O aumento do diálogo entre os cientistas de várias disciplinas irão ajudar a preencher as lacunas de dados, melhorar a medição dos riscos, e aumentar o uso de informações para tratar e prevenir os efeitos negativos das ameaças ambientais na saúde das crianças. A proteção das crianças contra os produtos químicos tóxicos no ambiente exige, a revisão profunda das abordagens atuais da vigilância ambiental, dos testes de 82 Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães toxicidade e da avaliação dos riscos. Percebe-se, portanto, que são necessárias mais informações sobre as janelas de suscetibilidade a fim de melhorar avaliação dos riscos de potenciais ameaças para a saúde ambiental para crianças, adolescentes e adultos. Isso requer maior interação entre diferentes disciplinas, desde a toxicologia a epidemiologia. Por exemplo, dados de animais de laboratório podem ajudar os médicos e epidemiologistas identificar áreas de interesse potencial em seres humanos. Dados epidemiológicos podem aumentar o interesse entre os pesquisadores do laboratório para o desenvolvimento mecanicista e explorar as interações agente-alvo. Os clínicos podem contribuir caso relatórios que geram hipóteses para o acompanhamento por outros cientistas. Essas interações poderia ajudar a desenvolver métodos mais sensíveis para clínicos e pesquisadores para a validação de toda espécie, e para a valorização dos futuros estudos sobre a saúde ambiental das crianças. REFERÊNCIAS 1. World Health Organization. Healthy environments for children. Geneva, 2002 (WHO/SDE/PHE/02.05). 2. National Academy of Sciences. Pesticides in the diets of infants and children. Washington, DC, National Academy Press, 1993. 3. US Environmental Protection Agency. Chemicals-in-commerce information system. Chemical update system database, 1998. 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Gonzalez-Cossio T, Peterson KE, Sanin LH, Fishbein E, Palazuelos E, Aro A, Hernandez- Avila M, Hu H. Decrease in birth weight in relation to maternal bonelead burden. Pediatrics, 1997, 100(5):856–62. 19. Hu FB, Persky V, Flay BR, Zelli A, Cooksey J, Richardson J. Prevalence of asthma and wheezing in public schoolchildren: association with maternal smoking during pregnancy. Annals of allergy, asthma and immunology, 1997, 79(1):80– 4. 20. Drews CD, Murphy CC, Yeargin-Allsopp M, Decoufle P. The relationship between idiopathic mental retardation and maternal smoking during pregnancy. Pediatrics, 1996, 97:547–53. 21. van Duijn CM, van Steensel-Moll HA, Coebergh JW, van Zanen GE. Risk factors for childhood acute non-lymphocytic leukemia: an association with maternal alcohol consumption during pregnancy? Cancer epidemiology, biomarkers and prevention, 1994, 3:457–60. 22. Daniels JL, Olshan AF, Savitz DA. Pesticides and childhood cancers. 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Childhood influences on adult health: a review of recent work from the British 1946 national birth cohort study, the MRC National Survey of Health and Development. Paediatric and perinatal epidemiology, 1997, 11:2–20. 85 Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães 28. Osmond C, Barker DJP, Winter PD, Fall CHD, Simmons SJ. Early growth and death from cardiovascular disease in women. British medical journal, 1993, 307:1519–24. 29. ]Silvaggio T, Mattison DR. Comparative approach to toxicokinetics. In: Paul M, ed. Occupational and environmental reproductive hazards: a guide for clinicians. Baltimore, MD, Williams & Wilkins, 1993:25–36. 30. US Environmental Protection Agency. Exposure factors handbook. Vol 1: General factors. Washington, DC, 1997:3–7 (EPA/600/P-95/002Fa). 86 MATERIAIS E MÉTODOS Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães BASE POPULACIONAL DO ESTUDO População Exposta População atualmente residente ao longo da estrada da Camboaba, em Cidade dos Meninos – Município de Duque de Caxias/ RJ, na faixa etária de 12 a 21 anos (104 adolescentes, 81 meninas e 23 meninos). Com antecedência prévia foram realizadas reuniões com a Associação de Moradores e os profissionais da equipe da Estratégia de Saúde da Família (ESF) da área e com os responsáveis legais dos adolescentes, para informação quanto ao projeto. Paralelamente, foi entregue aos últimos um termo de consentimento para a participação do adolescente e um questionário, com as variáveis a serem investigadas, para ciência e esclarecimentos de quaisquer dúvidas. O atendimento contou com entrevista com questionário e avaliação do desenvolvimento puberal. Todos estes procedimentos foram realizados por profissionais capacitados e com experiência no trabalho com adolescentes. População Controle Foi ainda recrutada população controle (364 sujeitos, 283 meninas e 81 meninos) que reunia características sócio-demográficas e de saúde (potenciais confundidores) semelhantes às da população de Cidade dos Meninos. COLETA DE DADOS Foi realizada avaliação individual através da mensuração do peso e altura com cálculo do índice de massa corporal (IMC), utilizando balança digital de precisão e estadiômetro portátil. Foi mensurado o volume testicular com um Orquidômetro de Prader. Os adolescentes foram classificados pelo seu nível de desenvolvimento através do estadiamento de Tanner. Foi utilizado um questionário estruturado para a obtenção dos dados sóciodemográficos (Anexo 3). O questionário constava de dados individuais dos adolescentes, como sexo, raça e escolaridade; padrões de renda e consumo; idade da menarca/pubarca, sexarca, telarca, semenarca, padrão do ciclo menstrual, e comportamentos sexuais, como o uso de anticoncepcionais. 87 Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães VARIÁVEIS DO ESTUDO 1. Exposição: Moradia em Cidade dos Meninos; Condição de ter nascido ou não em Cidade dos Meninos; 2. Confusão (ou modificador de efeito): variáveis clínicas e sócio demográficas; 3. Desfechos: alterações no desenvolvimento puberal (idade de menarca, telarca, pubarca, semenarca, orquimetria), modificações no padrão de nascimentos, segundo sexo. ANÁLISE DE DADOS Objetivo: Analisar a série histórica de nascimentos no local e avaliar a composição populacional segundo sexo e local de nascimento Desenho do estudo Trata-se de um estudo de coorte retrospectivo que analisou os nascimentos entre 1937 e 2007 na Cidade dos Meninos/Rio de Janeiro/Brasil. Análise Estatística A análise da tendência utilizou o modelo de regressão polinominal. Primeiro, segundo e terceiro modelos foram testados utilizando a proporção entre os sexos como uma variável dependente (x) e os anos de estudo como uma variável independente (y). A variável independente foi centrada pelo ponto médio da série de tempos a fim de evitar a colinearidade entre os termos de regressão da equação. O melhor modelo foi escolhido de acordo com três critérios: (1) nível de significância estatística obtida pelo valor de p da análise da variância (ANOVA), (2) o coeficiente de determinação, e (3) a análise dos resíduos. Para calcular o incremento anual da razão de sexos (APC), bem como a variação dos últimos 5 e 10 anos (AAPC), utilizou-se o método joinpoint (ponto de inflexão), que permite o ajuste de dados de uma série a partir do menor número possível de joinpoints (zero, ou seja, uma reta sem pontos de inflexão) e testa se a inclusão de mais joinpoints é estatisticamente significativa. Os testes de significância utilizados 88 Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães baseiam-se no método de permutação de Monte Carlo e no cálculo da variação percentual anual da razão, utilizando o logaritmo da razão. Cada ponto significativo que indica uma mudança na queda (se houver alguma) é mantido no modelo final. Para descrever a tendência linear por período, a porcentagem anual estimada de mudanças e o intervalo de confiança de 95% (IC 95%) foram depois computados para cada uma de suas tendências, compondo uma linha de regressão de acordo com o logaritmo natural dos índices, utilizando o calendário anual como a variável de regressão. A análise estatística foi feita com uso dos programas Stata (versão 11.0), SPSS (versão 19.0) e Joinpoint Regression Program (versão 3.4.3). Admitiu-se nível de significância estatística p < 0,05. Objetivo: Avaliar o padrão de desenvolvimento puberal dos adolescentes moradores do local. População de Estudo Uma população de 104 adolescentes (81 meninas e 23 meninos) moradora de Cidade dos Meninos foi avaliada segundo critérios clínicos e sócio demográficos. Além disso, outros 364 adolescentes (81 meninos e 283 meninas), oriundos de uma comunidade controle de características sócio demográficas semelhantes à população em Cidade dos Meninos, foram avaliados segundo os mesmos critérios. Avaliação Clínica Antes de se submeter a um exame clínico, cada participante recebeu um questionário sobre as características demográficas e de saúde e desenvolvimento físico. As características demográficas foram idade, sexo e renda. O índice de massa corporal (IMC) foi calculado como peso em kg dividido pela altura em metros ao quadrado. A ocorrência da menarca e a idade correspondente foram auto-relatados. O estágio de maturação sexual foi avaliado por meio de desenhos com descrições explicativas das fases do desenvolvimento sexual, alterada por Morris e Udry. Estes incluíram os cinco estágios de desenvolvimento da genitália e pêlos pubianos em meninos, e desenvolvimento mamário e dos pêlos pubianos em meninas. Cada participante foi 89 Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães orientado a ler as explicações e analisar os desenhos para cada um dos cinco estágios de desenvolvimento, e depois de escolher o estágio que estava mais próximo do seu estágio atual de desenvolvimento. Após o questionário ter sido concluído, o peso de cada adolescente e a altura foram medidos através de uma escala padronizada digital e um estadiômetro, com o paciente trajando roupas leves, mas sem sapatos. A medição foi realizada uma vez. O IMC foi calculado como o peso em quilos dividido pela altura em metros ao quadrado. Duas enfermeiras treinadas e com experiência em avaliação de estadiamento de Tanner realizaram exame físico completo das meninas, incluindo o estadiamento de Tanner. O exame das mamas foi realizado por inspeção visual e palpação da mama para diferenciar lipomastia. Para os meninos, dois enfermeiros foram selecionados para avaliação, igualmente treinados e com experiência em avaliação pelo estadiamento de Tanner. Análise de Dados De forma estratificada por sexo, o estadiamento puberal foi avaliado, segundo os critérios de desenvolvimento puberal de Tanner (Tanner, 1962) agrupado conforme Vitalle (Vitalleet al., 1994), em: sem desenvolvimento puberal (G 1P1 ou M1P1) - SD; com desenvolvimento puberal incipiente (G2-3 P2-3 ou M2-3 P2-3) - DI; com desenvolvimento puberal avançado (G3-4 P2-3 ou M3 P3-4) - DA; com desenvolvimento puberal completo (G4-5 P4-5 ou M4-5 P4-5) - DC; A avaliação do desenvolvimento puberal levou em conta a idade dos adolescentes no momento dos principais episódios relacionados à puberdade (idades de menarca, telarca e pubarca para as meninas; e semenarca, pubarca, e orquimetria para meninos), bem como o estágio de desenvolvimento de Tanner (Tanner, 1962). A classificação de atraso puberal foi realizada mediante as seguintes características: meninos em que ocorreu a pubarca após os 14 anos, a semenarca após os 14 anos ou o desenvolvimento de genitália (pênis e testículos, estágio G3 da classificação de Tanner) após os 13 anos de idade; e meninas em que ocorreu a menarca após os 15 anos, a telarca após os 13 anos ou a pubarca após os 13 anos. (Greenspan & Gardner, 2004) . 90 Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães Finalmente a avaliação do desenvolvimento puberal foi relacionada ao nascimento ou não em Cidade dos Meninos. Estatísticas descritivas foram utilizadas de forma a avaliar o padrão de distribuição das idades por evento. Para varíaveis contínuas foi utilizado o teste T de Student; para variáveis categóricas, foi utilizado o qui quadrado de Pearson, quando n>5; quando n≤5, utilizou-se o teste exato de Fisher. Objetivo: Estimar a magnitude da associação entre exposição a organoclorados e atraso puberal. População de Estudo Uma população de 104 adolescentes (81 meninas e 23 meninos) moradora de Cidade dos Meninos foi avaliada segundo critérios clínicos e sócio demográficos. Além disso, outros 364 adolescentes (81 meninos e 283 meninas), oriundos de uma comunidade controle de características sócio demográficas semelhantes à população em Cidade dos Meninos, foram avaliados segundo os mesmos critérios. Avaliação Clínica Antes de se submeter a um exame clínico, cada participante recebeu um questionário sobre as características demográficas e de saúde e desenvolvimento físico. As características demográficas foram idade, sexo e renda. Como varíavel de saúde foi considerado o índice de massa corporal (IMC), calculado como peso em kg dividido pela altura em metros ao quadrado. O estágio de maturação sexual foi avaliado por meio de desenhos com descrições explicativas das fases do desenvolvimento sexual, alterada pela Morris e Udry4. Análise de Dados Foram comparados os adolescentes moradores do local com população controle, externa à área, que reunia características sócio demográficas semelhantes. A avaliação do desenvolvimento puberal levou em conta a idade dos adolescentes no momento dos principais episódios relacionados à puberdade (idades 91 Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães de menarca, telarca e pubarca para as meninas; e semenarca, pubarca, e orquimetria para meninos), bem como o estágio de desenvolvimento de Tanner (Tanner, 1962). A classificação de atraso puberal foi realizada mediante as seguintes características: meninos que vivenciaram a pubarca após os 14 anos, a semenarca após os 14 anos ou o desenvolvimento de genitália (pênis e testículos, estágio G3 da classificação de Tanner) após os 13 anos de idade; e meninas que experimentaram a menarca após os 15 anos, a telarca após os 13 anos ou a pubarca após os 13 anos. (Greenspan & Gardner, 2004) Efetuou-se a análise descritiva das variáveis sócio-econômicas e demográficas, de estilo de vida e relacionadas à saúde, por distribuição de frequências, e utilizou-se, para varíaveis contínuas foi utilizado o teste T de Student; para variáveis categóricas, foi utilizado o qui quadrado de Pearson, quando n>5; quando n≤5, utilizou-se o teste exato de Fisher. As relações entre saúde o atraso puberal e as variáveis independentes foram exploradas por razões de prevalência (RP) com intervalos de confiança (IC) de 95%. A análise multivariada foi efetuada por meio de regressão de Poisson, considerando as variáveis que mostraram associação com a variável dependente atraso puberal na análise bivariada (dados não apresentados), sendo a retirada ou permanência de cada variável definida com base na sua significância estatística (p ≤ 0,05). Para efetuar as análises do estudo foram utilizados os pacotes estatísticos SPSS 19.0 for Windows e SE Stata 11. ASPECTOS ÉTICOS Os procedimentos nesta pesquisa respeitaram os procedimentos éticos da Declaração de Helsinque e da Resolução 196/96 do Conselho Nacional de Saúde sobre Pesquisa Envolvendo Seres Humanos que exige aprovação do projeto por um Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) institucionalmente formalizado e que incorpore um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido a ser assinado pelos sujeitos da pesquisa. Seguindo as normas de realização de pesquisa da Instituição proponente (Instituto de Saúde Coletiva da UFRJ), o projeto de pesquisa foi encaminhado e aprovado pelo Comitê de Ética do IESC sob o protocolo número 025/2009. 92 Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães No tocante à análise crítica dos riscos e benefícios, tratou-se de uma área em que as pessoas estão expostas a compostos organoclorados, de forma direta ou indireta, com a possibilidade de ocorrência de efeitos nocivos sobre a saúde conforme relatos na bibliografia técnica existente. 93 RESULTADOS nascimento: série histórica em Cidade dos Meninos/Brasil Artigo 4: Exposição a organoclorados e razão de sexos ao Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães EXPOSIÇÃO A ORGANOCLORADOS E RAZÃO DE SEXOS AO NASCIMENTO: SÉRIE HISTÓRICA DE 70 ANOS EM CIDADE DOS MENINOS/BRASIL Raphael M. Guimarães; Carmen I. R. F. Asmus RESUMO OBJETIVO: O objetivo deste estudo é descrever e analisar a tendência temporal da proporção entre os sexos nos nascimentos ocorridos em uma população exposta a compostos organoclorados, Rio de Janeiro/Brasil. MATERIAIS E MÉTODOS: Foram utilizados dados de nascimentos entre 1937 e 2007 da população local residente, estratificados pelo nascimento na área. Foi realizada regressão polinomial para avaliar a tendência nas razões de sexo, e para calcular o incremento anual da razão de sexos (APC), e utilizado o método joinpoint,para avaliar a variação dos últimos 5 e 10 anos (AAPC). RESULTADOS: Na análise da série de 70 anos há uma tendência linear de aumento da razão de sexos, com significância estatística, no subconjunto da população de Cidade dos Meninos não nascida na área, com a análise por Joinpoints apresentando variação significativa para o intervalo entre 1961 e 1999, com aumento da razão de sexos. No subconjunto da população nascida na área, há uma tendência ao declínio da proporção de nascimentos masculinos, com significância estatística, com a análise por joinpoints apresentando três períodos em que a variação foi estatisticamente significativa: entre 1937 e 1977, e entre 1995 e 2007, com queda da razão de sexos; e entre 1979 e 1993, com aumento da razão de sexos. CONCLUSÃO: a razão de sexos é uma medida que mostra a diferenciação sexual no período da concepção e a sobrevivência até o nascimento. Conclui-se, por ora, de que é uma medida sensitiva à exposição do ambiente a compostos que interferem no metabolismo hormonal, como os compostos organoclorados. Palavras-chave: Razão de Sexos, Desregulador Endócrino, Organoclorados, Epidemiologia Ambiental ABSTRACT OBJECTIVE: The aim of this study is to describe and analyze the trend of sex ratio at birth in the City of Boys / Rio de Janeiro / Brazil. MATERIALS AND METHODS: We used data on births between 1937 and 2007 the local resident population, stratified by whether or not born in the area. Polynomial regression was performed to assess the trend in sex ratios, and to calculate the annual increase in the sex ratio (APC) as well as the variation of the last 5 and 10 years (AAPC), we used the method joinpoint. RESULTS: There was, in considering the range of 70 years, there is a linear trend of increasing sex ratios with statistical significance in the subset of the population of the City of Boys Do not born in the area. The analysis shows significant variation by Joinpoints for the interval between 1961 and 1999, an increase in the sex ratio. In the subset of the population born in the area, there is a declining trend in the proportion of male births, with statistical significance. And yet, the analysis shows joinpoints three periods in which the change was statistically significant: between 1937 and 1977 and between 1995 and 2007, falling sex ratios, and between 1979 and 1993, an increase in the sex ratio. CONCLUSION: The sex ratio is a measure that shows the sexual differentiation and survival time of conception until birth. We conclude for now that is a measure sensitive to the ambient exposure to compounds that interfere with hormone metabolism, such as organochlorine compounds. Keywords: sex ratio, endocrine disruptors, organochlorine, environmental epidemiology 94 Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães INTRODUCÃO O maior número de nascimentos de meninos observado nas populações humanas é um processo natural resultante do desenvolvimento de mecanismos adaptativos da natureza, para compensar a alta expectativa de vida entre mulheres e o alto índice de mortalidade entre homens 1,2. Desta maneira, os valores prevalentes na determinação da proporção de nascimentos entre mulheres e homens são de naturezas diferentes, tais como fatores genéticos, exposição a poluentes químicos no meio ambiente, e fatores demográficos e sociais. 1,3,4. O perfil hormonal dos pais na concepção também é considerado um fator extremamente importante, visto que ele é fortemente ligado ao sexo do embrião a ser desenvolvido. A partir desta idéia, pode-se concluir que a relação entre os sexos no nascimento depende do sistema endócrino dos pais, que deve estar com sua integridade preservada numa dada população de um estudo de coorte 5,6,7 . Neste sentido, os dados da literatura têm mostrado que altas concentrações de gonadotrofina e progesterona aumentam a probabilidade de uma criança do sexo feminino nascer, que implica numa redução da proporção entre os sexos, enquanto altas concentrações de estrogênio e testosterona implicam em uma maior chance de nascer uma criança do sexo masculino 5,6. Alguns autores atribuem este declínio da proporção entre os sexos no nascimento à crescente exposição a elementos químicos no ambiente que interferem na atividade do sistema endócrino. Estes elementos químicos vêm de resíduos de atividades industriais, majoritariamente da agricultura8,9. A exposição a tais substâncias é apontada como causa deste declínio, uma vez que muitas dessas substâncias têm a habilidade de interferir na homeostase do sistema endócrino e podem causar problemas na saúde reprodutiva de populações sob esta exposição, eventualmente interferindo na estabilidade da proporção entre os sexos no nascimento10,11. Esta hipótese é reforçada quando analisamos o histórico de intenso desenvolvimento industrial e econômico, especialmente o crescimento da indústria farmacêutica e química, e a famosa Revolução Verde, que causou um aumento da liberação de substâncias químicas no meio-ambiente, principalmente no final do século passado10. Isto tem levado muitos autores a considerar a proporção entre os 95 Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães sexos no nascimento um sinalizador da exposição ambiental a desreguladores endócrinos12,13, como os componentes organoclorados. No Brasil, a localidade chamada Cidade dos Meninos é uma área de 1900 hectares (19 km²), de propriedade do governo federal, hoje sob a responsabilidade patrimonial do Ministério de Previdência Social, estruturada inicialmente para abrigar jovens desvalidos. A partir de 1950, ali se instalou o Instituto de Malariologia e sua fábrica de pesticidas. Contudo, em torno de 1955 o funcionamento da fábrica tornouse antieconômico, em razão de dificuldades de obtenção da matéria prima e da concorrência de empresas paulistas. Em 1961, a fábrica cessou definitivamente suas atividades, deixando um estoque de toneladas de material tóxico, para o qual a população, ao longo dos anos, deu diferentes usos ao material abandonado: era usado domesticamente para matar piolhos e como inseticida de casas e quintais; foi também utilizado como pavimentação da estrada interna e era também recolhido do chão pelos moradores e vendido nas feiras livres locais. A substância persiste no ambiente até os dias atuais, e após a denúncia realizada no final dos anos 80, diversos estudos tem sido conduzidos na área, avaliando os mais diversos desfechos em saúde, inclusive de ordem reprodutiva. Desta forma, o objetivo deste estudo é descrever e analisar a tendência temporal da proporção entre os sexos nos nascimentos na Cidade dos Meninos/Rio de Janeiro/Brasil. MATERIAIS E MÉTODOS Desenho do estudo Trata-se de um estudo de coorte retrospectivo que analisou os nascimentos entre 1937 e 2007 na Cidade dos Meninos/Rio de Janeiro/Brasil. População do Estudo Cidade dos Meninos é uma área de 20 hectares localizada no Km 13 da Avenida Presidente Kennedy, na cidade de Duque de Caxias, Rio de Janeiro. Em 1950, esta área recebeu a fábrica que sintetizava e produzia o pesticida hexaclorociclohexano (HCH) e o dicloro-difeniltricloroetano (DDT), para controlar vetores da doença de Chagas e 96 Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães malária, entre outros 14. Estes pesticidas eram produzidos na forma de pasta de DDT, pasta de BHC (isomero alfa, enriquecido com gama-HCH) emulsionáveis - DDT, mosquicidas - DDT + Lindano (gama-HCH) rodenticidas, composto 1080 (monofluoroacetato de sódio) e cianeto de cálcio 17. O HCH era sintetizado através de sucessivas adições de cloro em benzeno, gerando os isômeros a-, b-, g-, e d-HCH em diferentes porcentagens estequiométricas. O isômero g-HCH, de maior ação inseticida, era sintetizado com uma porcentagem de 14% a 15% da mistura técnica. A fábrica foi fechada em 1960 15. Resíduos do HCH foram deixados no local da antiga fábrica 16 e eram feitos principalmente dos isômeros a-, b- e d-HCH, formados na reação de síntese, não sendo usados como inseticida. Estes resíduos estiveram expostos in natura no solo até 1989, através das ruínas da antiga fábrica, cobrindo uma área diretamente afetada de 13,000m², localizada no Km 2 da Estrada Camboaba, a única via de acesso à Cidade dos Meninos. Em 1989, a contaminação ambiental da Cidade dos Meninos foi oficialmente notada. Desde então, isômeros HCH foram também detectados no soro sanguíneo da população local. A contaminação na Cidade dos Meninos foi reconhecida como um problema ambiental de saúde pública. Em 1991, estudos iniciaram-se para melhor caracterizar o problema e descontaminar o local e monitorar a saúde da população afetada. 16,18. Em 1995, uma companhia privada fez uma tentativa de corrigir o problema na maior área afetada, através da correção química no local com a adição de óxido de cálcio (cal) sobre o solo contaminado 19 . A área tratada com o cal foi isolada, totalizando 33,000m², duas vezes e meia maior que a área originalmente estimada pela Fundação Estadual de Engenharia e Meio Ambiente – FEEMA. A companhia planejou descontaminar a área após noventa dias usando cal. Somente o isômero gHCH foi monitorado a fim de emitir o relatório de descontaminação 15. Todavia, mesmo após tal tratamento, o odor de mofo, característico do HCH, permaneceu na maior parte da área afetada, um sinal de que o processo não produziu os efeitos desejados. Ademais, considerando a estabilidade química do HCH, era improvável que a reação química da degradação do HCH para triclorobenzeno (TCB) na presença do cal, ocorresse em condições ambientais amenas e sem qualquer controle 97 Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães de reação. Isto por que, em laboratórios, a desalogenação de tal classe de componentes requer condições difíceis e controladas 20. Os resultados mostraram, entre outros achados, que a metodologia utilizada não levou aos resultados esperados e que a área permaneceu contaminada com os quatro isômeros de HCH, DDT e seus metabólitos. Além disso, substâncias potencialmente mais tóxicas, como as dioxinas e furanos foram produzidos, aumentando quantitativa e qualitativamente a contaminação local. A Tabela 1 mostra as concentrações dos contaminantes no principal foco de contaminação e nos focos secundários. Na Cidade dos Meninos, exposições ao DDT e dioxina excederam de forma aguda, intermediária e crônica os níveis de risco mínimo. Para isômeros do HCH, os níveis de risco mínimo, agudos e crônicos estão excedidos pela dose de exposição estimada nas crianças. Análise Estatística A análise da tendência utilizou o modelo de regressão polinominal. Primeiro, segundo e terceiro modelos foram testados utilizando a proporção entre os sexos como uma variável dependente (x) e os anos de estudo como uma variável independente (y). A variável independente foi centrada pelo ponto médio da série de tempos a fim de evitar a colinearidade entre os termos de regressão da equação. O melhor modelo foi escolhido de acordo com três critérios: (1) nível de significância estatística obtida pelo valor de p da análise da variância (ANOVA), (2) o coeficiente de determinação, e (3) a análise dos resíduos. Para calcular o incremento anual da razão de sexos (APC), bem como a variação dos últimos 5 e 10 anos (AAPC), utilizou-se o método joinpoint (ponto de inflexão), que permite o ajuste de dados de uma série a partir do menor número possível de joinpoints (zero, ou seja, uma reta sem pontos de inflexão) e testa se a inclusão de mais joinpoints é estatisticamente significativa10. Os testes de significância utilizados baseiam-se no método de permutação de Monte Carlo e no cálculo da variação percentual anual da razão, utilizando o logaritmo da razão. Cada ponto significativo que indica uma mudança na queda (se houver alguma) é mantido no modelo final. Para descrever a tendência linear por período, a porcentagem anual estimada de 98 Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães 99 mudanças e o intervalo de confiança de 95% (IC 95%) foram depois computados para cada uma de suas tendências, compondo uma linha de regressão de acordo com o logaritmo natural dos índices, utilizando o calendário anual como a variável de regressão. Tabela 01: Concentração de pesticida nos solos no principal foco de emissão e valores de referência de contaminação para solos (mg/kg). Cidade dos Meninos, Duque de Caxias, Rio de Janeiro, Brasil, 2002. Componente Foco principal Máxima Média EstradaCamboaba Máxima TMR Média Valores de MGAA Referência de (mg/kg) Intervenção* 1,2,4-TCB 4.001 564 390 95 30.000 20 2,4,6-TCF 220 51 1.742 174.9 150 2,4,5-TCF 19 5. 35 120 18.7 150 89.47 15.46 1.104.29 224.34 0 0 0 0 b-HCH 45.429 1.0249 242.15 g-HCH 32.24 10.08 d-HCH 22.27 PCF 290 2.000 400 24.30 920 2.000 30 109.56 10.98 230 2.000 5 4008 32.87 3.31 2.000 7 0 6 1 5.000 o,p-DDE 17 3 3 1 9 4.000 p,p-DDE 393 89 95 16 9 4.000 o,p-DDD 124 24 10 2 9 4.000 p,p-DDD 627 105 52 10 9 4.000 o,p-DDT 242 58 235 38 9 4.000 p,p-DDT 1.095 246 932 143 9 4.000 25 Dioxinas máximo: 13.900 1.000 ppt. 50.000 a-HCH HCH ppt. TMR: tolerância máxima de risco 7; MGAA: Média segundo Guia de Avaliação Ambiental 3; ppt.: partes por trilhão. * Valor de intervenção Fonte: Asmus, 200821 50 ppt. Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães A análise estatística foi feita com uso dos programas Stata (versão 11.0), SPSS (versão 19.0) e Joinpoint Regression Program (versão 3.4.3). Admitiu-se nível de significância estatística p < 0,05. RESULTADOS Tendência da proporção entre os sexos O Gráfico 1 apresenta a proporção de nascimentos masculinos ao nascimento na população estudada entre 1937 e 2007, sendo estratificada pela característica de ter nascido em Cidade dos Meninos. Já a tabela 2 apresenta os parâmetros da modelagem por Joinpoints para ambos os subconjuntos da população (nascidos e não nascidos na área). Há um total, ao longo dos 70 anos, de 1067 nascimentos (510 masculinos e 557 femininos), sendo 589 no subconjunto de nascidos no local (251 masculinos e 338 femininos) e 478 no subconjunto de não nascidos (261 masculinos e 217 femininos). 100 0,00 10,00 20,00 30,00 40,00 50,00 Ano y = 0,310x + 57,620 R² = 0,134 p=0,028 y = -0,528x + 59,935 R² = 0,279 p=0,001 1997 60,00 1999 70,00 2001 Proporção de Nascimentos Masculinos 80,00 2003 90,00 2005 1955 1953 1951 1949 1947 1945 1943 1941 1939 1937 Duque de Caxias, Rio de Janeiro, Brasil, 2011. 1995 1993 1991 1989 1987 1985 1983 1981 1979 1977 1975 1973 1971 1969 1967 1965 1963 1961 1959 1957 101 Nascidos Não Nascidos Gráfico 01: Tendência temporal da proporção de nascimentos masculinos estratificado pelo local de nascimento. Cidade dos Meninos, Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães 2007 Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães 102 Tabela 02: Estatísticas da Regressão Polinomial para os subgrupos de nascidos e não nascidos em Cidade dos Meninos/Brasil. Estatísticas Nascidos NãoNascidos Coeficiente de Correlação 0,528 0,366 Coeficiente de Determinação 0,279 0,134 b (IC 95%) - 0,528 (- 0,758; - 0,214) 0,310 (0,035; 0,584) p valor 0,001 0,028 Tabela 03: Tendência temporal do nascimentos masculinos por joinpoints, segundo subgrupos. Subgrupo Período APC Nascidos 1937 - 1977 1979 - 1993 1995 - 2007 -1.7 2.7 -1.9 Não Nascidos 1937 - 1959 1961 - 1999 2001 - 2007 -0.7 0.7 -2.4 AnáliseporJoinpoint LI 95% LS 95% p valor Índice AAPC APC APC -2.1 -1.2 0.5 4.9 0,002 Últimos 5 anos -3.9 - 0.2 Últimos 10 anos -1.9 0.2 -7.7 0.5 1.3 3.2 0,352 Últimos 5 anos Últimos 10 anos AAPC LI 95% LS 95% AAPC AAPC -1.9 -0.9 -3.8 -2.5 - 0.1 0.7 -2.4 -0.7 -7.5 -3.0 3.0 1.7 Observa-se, na análise da série de 70 anos, que há uma tendência linear de aumento da razão de sexos com significância estatística no subconjunto da população de Cidade dos Meninos não nascida na área. Já a análise por Joinpoints apresenta variação significativa para o intervalo entre 1961 e 1999, com aumento da razão de sexos. Já no subconjunto da população nascida na área, há uma tendência ao declínio da proporção de nascimentos masculinos, com significância estatística. E ainda, a análise por joinpoints apresenta três períodos em que a variação foi estatisticamente significativa: entre 1937 e 1977, e entre 1995 e 2007, com queda da razão de sexos; e entre 1979 e 1993, com aumento da razão de sexos. Estes três períodos são diferentes uns dos outros pelas suas características de exposição aos organoclorados. No primeiro, inclui-se o tempo de funcionamento da fábrica, o abandono de cerca de 340 toneladas de resíduos de pesticida na fábrica, e os Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães relatos históricos de invasão da área pelos moradores, com consequente intenso consumo do pesticida, de forma intra e extradomiciliar, como exterminador de pragas, constituinte de massa para pavimentação de ruas e paredes de alvenaria, nas plantações e em aplicação nos animais. O segundo momento, já com o aumento da tendência da razão de sexos, tem incluída a queda do uso do resíduo pela população, exatamente no momento em que a população local inicia a comercialização do produto. Acrescenta-se, a esse período, o momento em que essa comercialização é descoberta, no final da década de 80, e a partir de quando o Ministério da Saúde passa a manter vigilância na área e guarita nos focos principal e secundários. Já o terceiro momento é diferente porque ele vem após a tentativa de corrigir o solo através da adição de óxido de cálcio, que gerou não somente um volume maior de resíduos, como também aumentou a quantidade de outros produtos potencialmente mais tóxicos, como dioxinas e furanos. Desta forma, a exposição nestes períodos foi diferente, e especula-se que tal diferença na exposição foi responsável pelo declínio da proporção entre os sexos. Acrescenta-se, ainda, que a análise por joinpoints, de uma forma geral, não apresentou significância estatística para o subgrupo de não nascidos no local (p=0,352). Ao contrário, apresentou forte significância estatística para o grupo nascido em Cidade dos Meninos (p=0,002). DISCUSSÃO A proporção entre os sexos no nascimento é uma medida padrão usada para avaliar a relação quantitativa entre os sexos no nascimento, através da divisão do número de bebês do sexo masculino nascidos vivos, pelo número de bebês do sexo feminino nascidos vivos, em um dado ano e área geográfica. Os valores freqüentes apresentados na literatura são por volta de 1.06, que significa 106 nascimentos de meninos para cada 100 nascimentos de meninas, ou, em termos de proporção de nascimentos de meninos: 51.5% 22,23. No contexto global, a proporção entre os sexos no nascimento tem mostrado uma tendência ao declínio, em diferentes países nas décadas recentes, que é o motivo de ter atraído de forma crescente o interesse da comunidade acadêmica 22,24,25 . Por grande parte do século XXI a proporção entre os sexos secundária (nascimentos de 103 Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães meninos/todos os nascimentos) veio caindo em muitos países 18,26. Tem-se especulado que este decréscimo é um indicador de contaminação ambiental 13. Entretanto, outros têm argumentado que, sobre um nível populacional, este não é o caso 18,26,27-29,30 . De acordo com esta hipótese, altos níveis de gonadotropinas mudam a proporção para mais meninas. O fenômeno é amplamente observado em países que passaram pelo processo de industrialização associado com a apresentação à sociedade de novos pesticidas e drogas hormonais 26 , após as duas Grandes Guerras Mundiais. Finlândia, Canadá, Estados Unidos, Inglaterra, País de Gales e Itália confirmaram esta tendência ao declínio em publicações recentes 8,22,24,31. Há evidências de que níveis hormonais próximos ao período de concepção são associados com a proporção entre os sexos dos bebês 32, e há evidências convincentes de que a exposição a elementos químicos particulares leva a mudanças nesta proporção33-37, como visto, por exemplo, com a exposição a dioxinas após uma explosão em uma fábrica de herbicida em Seveso, Itália. Após a explosão química que resultou em contaminação por dioxina de áreas residenciais em Seveso, na Itália, uma queda de nascimentos do sexo masculino de casais com exposições elevadas foi observada36,37. Estudos com animais têm sugerido que exposições a PCBs diminuem a proporção entre os sexos dos bebês 38-40. Estudos entre populações humanas expostas a PCBs em ambientes diferentes têm sugerido, entretanto, aumentos 41, declínios 42,43, ou nenhuma mudança 44,45 na proporção entre os sexos. Estudos anteriores têm mostrado diferenças na proporção entre os sexos após a exposição a componentes hormonalmente ativos, e que diferentes efeitos de elementos químicos nas mães e pais podem causar efeitos opostos na proporção entre os sexos 32,46 . A ovulação induzida por hormônios leva a uma clara redução na proporção entre os sexos dos bebês 47 , um resultado que também tem sido encontrado após a exposição dos pais ao dibromocloropropanonematocida 33,34. A Exposição paterna, mas não materna, a dioxina após a explosão em uma fábrica herbicida em Seveso, Itália levou a redução da proporção entre os sexos 36,37 . Em contraste, entre veteranos da Operação “Ranch Hand”, a unidade responsável por pulverizar “Orange Agent” e outras herbicidas que continham dioxina no Vietnan, níveis de dioxina paternais maiores que 10ppt eram associados com um percentual de maior nascimento de meninos48. Entretanto, no estudo posterior, níveis de dioxina 104 Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães maternais não foram mensurados (embora fosse esperado que este não estivesse acima do anterior), e os níveis paternos eram provavelmente um pouco menores que os níveis em homens após o incidente em Seveso. Similarmente, um estudo desenvolvido por Talamanca et al64 encontrou uma significante queda no nascimento de bebês do sexo masculino em uma coorte exposta a dioxina durante o acidente em Seveso. Este efeito foi observado por um período de mais de 8 anos após o acidente (1977-1984) 64 . O mesmo aconteceu em uma coorte com trabalhadores expostos a gasolina, onde foi vista uma significante queda na proporção entre os sexos nos nascimentos dos descendentes do grupo exposto comparado ao grupo não exposto 65. Achados na proporção entre os sexos são controversos. Wiseet al 66 , em uma análise do grupo de homens que participavam de um estudo de coorte acompanhado que avaliou a exposição pré-natal da mãe a DES (dietilestilbestrol) não encontraram nenhum resultado estatisticamente significante (proporção do sexo masculino 0.92, IC 95% 0.80-1.04). Weisskopf et al 67 , através do exame da concentração de bifenilpoliclorados (PCBs) no sangue de casais, em comparação com a proporção entre os sexos das crianças nascidas nos Grandes Lagos da América do Norte, encontraram uma associação significante para quintils de grande exposição medida para PCB (OR = 0.18, IC 95%: 0.06-0.59), sugerindo uma associação entre exposição materna aos PCBs e declínio na proporção entre os sexos. Um estudo com consumidores dos peixes dos Grandes Lagos da América do Norte em Michigan, também não encontrou relação alguma entre concentrações séricas de DDE e a proporção entre os sexos, mas identificou que pais com concentrações sanguíneas de PCB maiores que 8.1 ng/mL tinham uma porcentagem maior de filhos do sexo masculino (OR para filhos do sexo masculino:2.29; 95% IC: 1.11–4.74) do que pais com baixa concentração 41 . A proporção entre os sexos de nascidos vivos pode ter sido afetada como resultado dos efeitos dos PCBs após a concepção. Tem sido relatado que o consumo de peixe contaminado do Lago Ontário reduz a duração do ciclo menstrual e o tempo de gravidez 58-60 . A proporção entre os sexos dos nascidos vivos pode ter sido reduzida se a fecundidade entre mulheres que consumiram peixe contaminado dos Grandes Lagos é reduzida devido ao aumento do número de abortos de fetos masculinos38-40. É levantada a hipótese também de níveis paternos de estrogênio, antes da concepção, afetarem a proporção entre os sexos de 105 Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães nascidos vivos32, e que dadas ações estrogênicas e anti-estrogênicas de diferentes congêneres dos PCBs61,62 podem ser um outro mecanismo pelo qual a exposição paterna aos PCBs altera a proporção entre os sexos. Os casos mais dramáticos de exposição ao PCB foram os envenenamentos de Yucheng e Yusho, quando óleo de arroz utilizado para cozinhar alimentos foi contaminado pela degradação por calor dos PCBs durante o processo de fabricação 4953 . Após este incidente nenhuma alteração na proporção entre os sexos de filhos de mães expostas foi encontrada42, 44,45, embora a proporção entre o sexo de crianças de pais menores que 20 anos no período da exposição tenha sido encontrada reduzida por aproximadamente 10 anos após a exposição42. Os congêneres específicos dos PCBs dos quais as pessoas foram expostas após os incidentes de Yucheng e Yusho devem ser de, alguma maneira, diferentes daqueles encontrados nos peixes dos Grandes Lagos da América do Norte e nos consumidores destes peixes49,51,54-57, e, diferente da exposição aos PCBs dos peixes dos Grandes Lagos, os acontecimentos em Yucheng e Yusho também envolveram significativa exposição a policlorodibenzofuranos (PCDBFs) como um resultado do aquecimento do óleo contaminado para cozinhar 49, 51, 55. Hertz-Picciotoo63 observou uma redução nas razões entre nascimentos de meninos e meninas em relação às concentrações maternas de PCB totais nesta população. Associações inversas entre todos os nove congêneres dos PCBs e a proporção entre os sexos secundária foram também observadas, ainda que nem todas tenham sido estatisticamente significantes no nível 0.05. Em modelos ajustados para medicações hormonais tomadas no período próximo da concepção e inicial da gravidez, maiores concentrações de PCBs total foram associadas significativamente com taxa de nascimento de meninos (p = 0.22) Houve ainda um declínio da proporção entre os sexos entre as crianças nascidas de homens expostos à TCDD em uma idade relativamente jovem em comparação com os homens não expostos, relatado em Ufa, na Rússia 68. Outros estudos, ao contrário, não encontraram nenhuma associação significativa entre os níveis séricos de TCDD dos pais e a razão de sexos dos filhos nos Estados Unidos 69. Finalmente, Cocco et al avaliou a história reprodutiva, incluindo o número total de crianças, distribuição por sexo, o tempo de gravidez, e o número de abortos 106 Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães espontâneos e natimortos, dos cônjuges de 105 primeiros homens expostos ao DDT na campanha contra a malária na Sardenha, Itália, entre 1946 e 1950 . Entre aplicadores de DDT, a razão de sexos diminuiu o tercil de exposição ao DDT cumulativos. A razão entre o total de descendentes no estudo foi de 1,06 (IC 95% 0,86 – 1,30); foi menor entre os expostos (0,94, IC 95% 0,71 –1,25) em comparação com os indivíduos não expostos (1,20, IC 95% 0,89 – 1,63)70. CONCLUSÃO O presente estudo encontrou diferenças significativas quanto à queda na proporção de nascimentos masculinos na população nascida na área contaminada por organoclorados, em períodos coincidentes com a maior dispersão e consumo de contaminantes no ambiente; e ainda com a produção de novas substâncias tóxicas derivadas de interações químicas na tentativa de neutralização dos compostos. De forma semelhante, outros estudos anteriores encontraram mudanças na proporção entre os sexos devido à exposição a compostos que ativam hormônios, e diferentes efeitos destes compostos nos pais e mães podem produzir efeitos opostos à proporção entre os sexos. Finalmente, a razão de sexos medida demonstra indiretamente a diferenciação sexual no período da concepção (razão de sexos primária) e a sobrevivência até o nascimento (razão de sexos secundária) indicando que é uma medida sensitiva à exposição do ambiente a compostos que interferem no metabolismo hormonal. 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Part 2.Reproduction and infant findings.Food ChemToxicol. 1995, 33:457-74 39 James WH The sex ratio of offspring of female rhesus monkeys exposed to Aroclor 1254. Food ChemToxicol. 1998, 36:451-3 40 James WH Rejoinder to the letter of Drs Arnold and Hayward. Food ChemToxicol. 1998, 36:541 110 Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães 41 Karmaus W, Huang S and Cameron L Parental concentration of dichlorodiphenyldichloroethene and polychlorinated biphenyls in Michigan fish eaters and sex ratio in offspring. J Occup Environ Med 2002, 44:8-13 42 del Rio Gomez I, Marshall T, Tsai P, Shao YS, Guo YL. Number of boys born to men exposed to polychlorinated byphenyls. Lancet.2002, 360:143-4. 43 Travers M, Buck G and Vena J Paternal fish consumption and secondary sex ratio [Abstract]. Epidemiology. 2000, 11:S61 44 Yoshimura T, Kaneko S, Hayabuchi H. 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A cohort study of in utero polychlorinated biphenyl (PCB) exposures in relation to secondary sex ratio. Archives of Environmental Health. 2008, 7:37 112 Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães 64 Figa-Talamanca I, Tarquini M, Lauria L. Is it possible to use sex ratio at birth as indicator of the presence of endocrine disrupters in environmental pollution? G Ital. Med. Lav Erg. 2003, 25 (3): 52-53. 65 Ansari-Lari M, Saadat M, Hadi N. Influence of GSTT1 null genotype on the offspring sex ratio of gasoline filling station workers. Journal Epidemiol Community Health.2004, 58:393-394. 66 Wise LA et al. Time to Pregnancy and Secondary Sex Ratio in Men Exposed Prenatally to Diethylstilbestrol. Am J Epidemiol 2007;166:765-774 67 Weisskopf MG, Anderson HA, Hanrahan LP, the Great Lakes Consortium. 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Environmental Research 98 (2005) 120–126. 113 Artigo 5: Desenvolvimento expostos a organoclorados. puberal de adolescentes Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães DESENVOLVIMENTO PUBERAL DE ADOLESCENTES EXPOSTOS A ORGANOCLORADOS Pubertal development in adolescents exposed to organochlorine pesticides Raphael Mendonça Guimarães, Carmen Ildes Rodrigues Fróes Asmus RESUMO Objetivo: avaliar o padrão de desenvolvimento puberal de adolescentes expostos a pesticidas organoclorados no Brasil. Materiais e Métodos: Trata-se de estudo descritivo que comparou o padrão de desenvolvimento da população exposta, de acordo com a condição de ter ou não nascido no local, e com uma população controle, de características sócio demográficas semelhantes. O padrão de desenvolvimento puberal incluiu: idades de menarca, telarca e pubarca para as meninas; e semenarca, pubarca, e orquimetria para meninos. O estadiamento puberal foi avaliado segundo os critérios de desenvolvimento puberal de Tanner. Resultados: Os dados apontam para diferenças ao se comparar as populações considerando a exposição in loco. Entretanto, não parece haver diferenças para a exposição intra-útero, considerando o nascimento no local como uma proxy desta condição. Os dados mostram uma diferença estatísticamente significativa entre as 2 populações em relação as idades de ocorrência da menarca, telarca, pubarca e semenarca e ao tamanho dos testículos. A população exposta apresenta uma idade de ocorrência destes eventos mais tardia e um volume testicular médio menor em relação a população controle. Conclusão: Recomenda-se que estudos futuros considerem a puberdade como um período do ciclo vital de suscetibilidade para a exposição a organoclorados. Palavras-Chave: Organoclorados, Adolescentes, Desreguladores Endócrinos, puberdade, epidemiologia ambiental. ABSTRACT Objective: To evaluate the pattern of pubertal development in adolescents exposed to organochlorine pesticides in Brazil. Materials and Methods: This was a descriptive study that compared the pattern of development within the exposed population, according to the condition of having or not born there. Besides, they have been compared to the local population with the control population of similar sociodemographic characteristics. The stage of pubertal development took into account age at menarche, thelarche and pubarche for girls, and semenarche, pubarche, and orquimetric for boys. The pubertal stage was assessed according to the criteria of Tanner pubertal development. Results: The data indicate differences when comparing the populations considering exposure on the spot. However, there seems no differences for the in utero exposure, given birth on the site as a proxy for this condition. Regarding this result, the hypothesis is that the influence on pubertal development does not occur by exposure in utero, but by postnatal exposure. Conclusion: It is recommended that future studies consider this period of the life cycle and susceptibility to exposure to organochlorines, to estimate the magnitude of association between exposure to the compound and problems in pubertal development, whether it is precocious puberty or delayed puberty. Keywords:Organochlorine, Adolescents, Endocrine Disrputors, puberty, environmental epidemiology 114 Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães INTRODUÇÃO A puberdade é um processo neuroendócrino complexo cujo principal mecanismo ainda não está claro (Parentet al, 2003). O crescimento na adolescência é impulsionado pela influência contínua de hormônios do crescimento a partir do período pré-puberal, com a influência adicional dos esteróides sexuais na adolescência. Durante a puberdade, há um rápido crescimento em termos de altura e tamanho muscular, com aumento dos volumes pulmonares e de outros órgãos. Outras mudanças importantes são o desenvolvimento dos caracteres sexuais primários e secundários, como o crescimento dos pelos pubianos e o aumento no tamanho da mama e dos testículos1. A partir da publicação de Silent Spring, de Rachel Carson, em 1962, houve uma crescente conscientização de que produtos químicos, quando presentes no meio ambiente, podem exercer efeitos profundos e nocivos sobre plantas e animais, e que a saúde humana está indissoluvelmente ligada à saúde do meio ambiente 2. Os desreguladores endócrinos englobam uma variedade de classes de produtos químicos que incluem hormônios naturais e sintéticos, componentes vegetais e pesticidas, compostos utilizados na indústria de plásticos e em produtos de consumo, e outros derivados, e de poluentes industriais. Geralmente, esses desreguladores encontram-se amplamente dispersos no meio ambiente3-5. Determinados desreguladores endócrinos imitam os efeitos dos hormônios naturais acionando seus receptores específicos, enquanto outros se unem a receptores hormonais e bloqueiam a atuação dos hormônios naturais. Eles também podem interferir na produção, transporte, metabolismo e excreção de hormônios que ocorrem naturalmente6, 7. Os compostos organoclorados são hidrocarbonetos clorados sintetizados pelo homem, portanto, não ocorrem naturalmente no ambiente. Podem ser divididos em dois grupos: baixo e alto peso molecular. Os pesticidas organoclorados e as bifenilas policloradas (PCBs) enquadram-se na classificação de alto peso molecular. Além disso, fazem parte de um grupo de compostos classificados como poluentes orgânicos persistentes (POPs). Tal atribuição deve-se a três características básicas: persistência 115 Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães ambiental, bioacumulação (com conseqüente biomagnificação na cadeia trófica) e alta toxicidade8. Os mecanismos bioquímicos de toxicidade dos compostos organoclorados incluem a ação agonista, ou antagonista, em receptores de hormônios esteróides, a modulação de enzimas envolvidas na síntese ou no metabolismo dos hormônios e a modulação de eventos bioquímicos e moleculares, incluindo sinalizações de vias de expressão gênica. Receptores de hormônios celulares são membros da superfamília dos receptores nucleares que agem como fatores de transcrição que regulam a expressão gênica9-13. A puberdade marca a transição entre a infância e a fase adulta reprodutiva. É uma etapa vulnerável da vida em que alterações na sua ocorrência têm estado associadas a problemas de saúde e problemas psicossociais. O desenvolvimento da puberdade é um processo multifacetado que está sob o controle de diferentes mecanismos de regulação hormonal 14. Existem diversas evidências quanto ao fato de que desreguladores hormonais exógenos podem antecipar ou retardar a puberdade 15. Experimentos epidemiológicos e em animais sugerem que a ação destes compostos exógenos possa ocorrer durante o processo de mudanças pré-puberais, nos mecanismos de controle hormonal, ou precocemente, durante a concepção e gestação (janelas de programação perinatal). Estudos experimentais indicam que substâncias químicas exógenas interferem nas metas quanto ao crescimento, metabolismo dos lipídios, diferenciação e funcionamento do cérebro, gônadas e glândulas suprarrenais. Vários autores têm apontado a necessidade de estudos epidemiológicos cuidadosamente desenvolvidos por meio da utilização de marcadores de exposição para substâncias químicas desreguladoras do sistema endócrino, e de marcadores de status endócrino e metabólico. Estes estudos deveriam avaliar a exposição nos dois momentos, ocorrendo próximo e/ou após o nascimento e no estágio pré-puberal. 1-4,10-13,16,17. Sendo assim, o objetivo do presente estudo é avaliar o padrão de desenvolvimento puberal de adolescentes expostos a pesticidas organoclorados no Brasil. 116 Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães METERIAIS E MÉTODOS População de Estudo A Cidade dos Meninos é uma área de 1900 hectares (19 km²), de propriedade federal, hoje sob a responsabilidade patrimonial do Ministério de Previdência Social, estruturada inicialmente para abrigar jovens desvalidos. A partir de 1950, ali se instalou o Instituto de Malariologia e sua fábrica de pesticidas. Contudo, em torno de 1955 o funcionamento da fábrica tornou-se antieconômico, em razão de dificuldades de obtenção de matéria prima e da concorrência de empresas paulistas. Em 1961, a fábrica cessou definitivamente suas atividades, deixando um estoque de toneladas de material tóxico, para o qual a população, ao longo dos anos, deu diferentes usos ao material abandonado, domesticamente para matar piolhos e como inseticida de casas e quintais, para pavimentação da estrada interna e vendido nas feiras livres locais18. Uma população de 104 adolescentes (81 meninas e 23 meninos) moradora de Cidade dos Meninos foi avaliada segundo critérios clínicos e sócio demográficos. Além disso, outros 364 adolescentes (81 meninos e 283 meninas), oriundos de uma comunidade controle de características sócio demográficas semelhantes à população em Cidade dos Meninos, foram avaliados segundo os mesmos critérios. Avaliação Clínica Antes de se submeter a um exame clínico, cada participante recebeu um questionário sobre as características demográficas e de saúde e desenvolvimento físico. As características demográficas foram idade, sexo e renda. O índice de massa corporal (IMC) foi calculado como peso em kg dividido pela altura em metros ao quadrado. Perguntou-se ainda sobre hábito de tabagismo e etilismo, atual ou no passado. A ocorrência da menarca e a idade da menarca foram auto-relatados. O estágio de maturação sexual foi avaliado por meio de desenhos com descrições explicativas das fases do desenvolvimento sexual, alterada por Morris e Udry4. Estes incluíram os cinco estágios de desenvolvimento da genitália e pêlos pubianos em meninos, e desenvolvimento mamário e dos pêlos pubianos em meninas. Cada participante foi orientado a ler as explicações e analisar os desenhos para cada um dos 117 Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães cinco estágios de desenvolvimento, e depois a escolher o estágio que estava mais próximo do seu estágio atual de desenvolvimento. Após o questionário ter sido concluído, o peso de cada adolescente e a altura foram medidos através de uma escala padronizada digital e um estadiômetro, com o paciente trajando roupas leves, mas sem sapatos. A medição foi realizada uma vez. O IMC foi calculado como o peso em quilos dividido pela altura em metros ao quadrado. Duas enfermeiras treinadas e com experiência em avaliação de estadiamento de Tanner realizaram o exame físico completo das meninas, incluindo o estadiamento de Tanner. O exame das mamas foi realizado por inspeção visual e palpação da mama para diferenciar lipomastia. Para os meninos, dois enfermeiros foram selecionados para avaliação, igualmente treinados e com experiência em avaliação pelo estadiamento de Tanner. Análise de Dados De forma estratificada por sexo, o estadiamento puberal foi avaliado, segundo os critérios de desenvolvimento puberal de Tanner19 agrupados em: sem desenvolvimento puberal (G1P1 ou M1P1) - SD; com desenvolvimento puberal incipiente (G2-3 P2-3 ou M2-3 P2-3) - DI; com desenvolvimento puberal avançado (G3-4 P2-3 ou M3 P3-4) - DA; com desenvolvimento puberal completo (G4-5 P4-5 ou M4-5 P4-5) – DC. O padrão de desenvolvimento puberal levou em conta a idade dos adolescentes no momento dos principais episódios relacionados ao desenvolvimento puberal (idades da menarca, telarca e pubarca para as meninas; e semenarca, pubarca, e orquimetria para meninos). Além disso, foram comparados com a característica de ter nascido ou não em Cidade dos Meninos, igualmente sob a hipótese de que os adolescentes nascidos em Cidade dos Meninos (e, portanto, expostos aos resíduos de organoclorados durante o período intra-útero) possuem uma exposição diferenciada, do ponto de vista quantitativo e qualitativo. Estatísticas descritivas foram utilizadas de forma a avaliar o padrão de distribuição das idades por evento. Para variáveis contínuas foi utilizado o teste T de Student; para variáveis categóricas, foi utilizado o qui quadrado de Pearson, quando n>5; quando n≤5, utilizou-se o teste exato de Fisher. 118 Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães Aspectos Éticos Os procedimentos nesta pesquisa respeitaram os procedimentos éticos da Declaração de Helsinque e da Resolução 196/96 do Conselho Nacional de Saúde sobre Pesquisa Envolvendo Seres Humanos que exige aprovação do projeto por um Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) institucionalmente formalizado e que incorpore um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido a ser assinado pelos sujeitos da pesquisa. Seguindo as normas de realização de pesquisa da Instituição proponente (Instituto de Saúde Coletiva da UFRJ), o projeto de pesquisa foi encaminhado e aprovado pelo Comitê de Ética do IESC sob o protocolo número 025/2009. RESULTADOS A tabela 1 apresenta a distribuição das características sócio demográficas e de saúde da população local (nascidos e não nascidos) e da população controle. Observase que todas elas apresentam características sem diferenças estatisticamente significativas, demonstrando serem populações comparáveis. Não foi encontrada diferença estatisticamente significativa, dentro da população local, entre o grupo de nascidos e não nascidos no local. Entretanto, ao comparar a população local com a população controle, foi encontrada diferença estatisticamente significativa para graus de desenvolvimento puberal (tabelas 2 e 3) e marcadores de puberdade, como menarca, telarca, pubarca, semenarca e orquimetria (Tabela 4). Os dados mostram uma diferença estatisticamente significativa entre as 2 populações em relação as idades de ocorrência da menarca, telarca, pubarca e semenarca e ao tamanho dos testículos. A população exposta apresenta uma idade de ocorrência destes eventos mais tardia e um volume testicular médio menor em relação a população controle. Observa-se, após análise, que as diferenças estatisticamente significativas apontam para diferenças entre as populações considerando a exposição in loco. Entretanto, não parece haver diferenças para a população quanto a exposição intraútero, considerando o nascimento no local como uma proxy desta condição. 119 Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães DISCUSSÃO Muitos estudos e relatórios sugerem uma associação entre a exposição aos compostos desreguladores endócrinos (EDC) e alterações no tempo de início da puberdade. Entretanto, poucos estudos epidemiológicos confirmam esta hipótese. Em muitos destes estudos, a informação sobre a idade de início da puberdade, menarca, telarca, pubarca e semenarca são autorreferidos. O tamanho populacional também é muito variável. As variações do desenvolvimento puberal são associadas à dose prénatal de exposição e a exposição pré-púbere. As bifenilas policloradas têm sido descritas como tendo atividades estrogênica, anti-estrogênica e anti-androgênica 20 . Existem vários estudos epidemiológicos que avaliaram a exposição aos PCBs em relação ao início da puberdade. Em um estudo comparando crianças belgas (120 meninas e 80 meninos) de áreas rurais e urbanas, os congêneres de PCB 138, 153 e 180 foram medidos no soro, e o estágio puberal foi avaliado por médicos21,22. Nenhuma associação dos níveis de PCB para o desenvolvimento puberal em meninas foi observado, enquanto que nos meninos, um atraso significativo da puberdade foi encontrado em áreas urbanas e em associação com altos níveis de PCB. Em um estudo recente em Flandres, incluindo 1.600 adolescentes, o maior crescimento de pêlos púbicos com maior desenvolvimento genital têm sido observados nos meninos em relação aos níveis de p, p'-DDE e PCB no soro. No Estudo de Alimentação Infantil da Carolina do Norte, nenhuma associação foi encontrada entre a exposição as PCBs e o tempo da puberdade auto-relatado (incluindo a idade da menarca) entre 316 meninas e 278 meninos, embora tenha havido uma tendência não-significativa a maturação precoce nas meninas no grupo com maior exposição pré-natal23. Dois estudos da área dos Grandes Lagos, em Michigan nos EUA, não encontraram nenhuma correlação entre a exposição a PCBs e o início da puberdade (auto-referida) em 327 meninas24 ou 151 meninas25. Resultados semelhantes foram encontrados em uma coorte de meninos (196 meninos) de Ilhas Faroe 26 . Em Yucheng, 55 meninos que foram acidentalmente expostos a altas concentrações de PCBs e dibenzofuranos policlorados (PCDF) foram relatados ter menor comprimento do pênis, do que os meninos do grupo controle na mesma idade, sugerindo atraso puberal27. 120 Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães Na Bélgica, altos níveis de 1,1-dicloro-2 ,2-bis (p-clorofenil) etileno (p, p'-DDE) foram encontrados em 26 jovens imigrantes (adotados e não adotados) com puberdade precoce28. O inseticida 1,1,1-tricloro-2 ,2-bis (p-clorofenil) etano (DDT) pode se comportar como um agonista de estrogênio e seu principal metabólito p, p'-DDE tem potencial anti-androgênico, como demonstrado por estudos in vitro e em animais2930 . Na coorte de pescadores de Michigan, a exposição intra-útero a altos níveis de DDE foi associada com a idade avançada da menarca, medida em 151 filhas de mães consumidoras dos peixes contaminados, em relação aos controles25. Este achado não foi confirmado na coorte de Carolina do Norte, em que a auto-relatada idade da menarca, ou estágio puberal, em 316 meninas e 278 meninos não foi associada com os níveis de DDE23. Com relação às dioxinas, elas agem através do receptor de hidrocarboneto aromático (AhR) e tem efeitos anti-estrogênicos in vitro31. Efeitos estrogênicos, no entanto, têm sido relatados igualmente através da interação da dioxina AhR-nuclear com receptores de estrogênio32. Um estudo retrospectivo de meninas expostas a dioxinas em Seveso, em 1976, não encontrou nenhuma associação com a idade da menarca33. Em um estudo belga de crianças da zona rural e de duas áreas urbanas, a exposição à dioxinas foi estimada através de um ensaio que mede a atividade de dioxina total no soro. Não houve correlação da atividade com a idade da menarca ou o desenvolvimento de pêlos pubianos, mas a atividade alta foi associada a um atraso no desenvolvimento da mama. Nos meninos, não houve correlação da forma de dioxina atividade com o desenvolvimento puberal21,22. Apesar do longo lapso de tempo entre o nascimento e o início da puberdade, alguns estudos relatados têm mostrado uma influência da exposição perinatal no tempo de desenvolvimento puberal. Além disso, a exposição à época da puberdade tem sido associada com alterações no desenvolvimento puberal. Os dados existentes não permitem uma identificação clara da janela(s) de tempo sensível (is), porque os compostos persistentes estudados já estão presentes no início da vida e a exposição continua ao longo da vida. Estudos de seguimento de série, incluindo medidas de soro no momento do nascimento e do desenvolvimento puberal seriam úteis. Outra limitação inerente aos estudos epidemiológicos é que os seres humanos não são expostos exclusivamente ao produto químico investigado, mas sim a uma mistura de 121 Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães produtos químicos, alguns deles atuando através de vias comuns. Além disso, nenhum único composto pode atuar como um substituto ou marcador para os outros, porque o perfil de contaminantes varia entre os indivíduos. Os mecanismos de desregulação do tempo de puberdade são caracterizados como central (com a desregulação causando retardo na maturação do hipotálamo e da hipófise) ou periférico (com a desregulação atuando diretamente sobre as gônadas ou mama independente do eixo hipotálamo-hipófise)34. Em estudos com animais, a exposição a poluentes organoclorados persistentes (POPs) no útero e através do leite materno tem sugerido interferência no início da puberdade. No entanto, estudos em humanos são escassos e ambíguos. Cabe ressaltar que a idade da menarca pode ser encontrada reduzida em meninas expostas a organoclorados estrogênicos, mas a contribuição exata de organoclorados a menarca precoce é desconhecida, devido à inúmeras variáveis ambientais que influenciam a menarca. Um estudo de mulheres expostas à DDE (um produto da degradação do DDT) através do consumo de peixes dos Grandes Lagos encontraram uma redução de 1 ano na idade da menarca para cada aumento de 15 mg / L de soro DDE35, e um estudo de trabalhadores têxteis chineses determinou que a 10 mg / L de soro aumentar DDT foi associada com redução de 0,2 anos na idade da menarca36. No estudo de Axmon37 a informação sobre a idade da menarca foi coletado de 545 mulheres que haviam sido criadas em uma aldeia de pescadores na costa leste da Suécia, ao largo do Mar Báltico e, para os quais assumiu-se de terem sido expostos a poluentes orgânicos persistentes intra-útero, através da amamentação, e/ou através de hábitos alimentares durante a infância. A idade média da menarca para essas mulheres foi comparada à de três grupos de referência: (a) 1.252 mulheres que também tinha sido criado em uma aldeia de pescadores, mas na costa oeste da Suécia, onde o peixe tinha sido consideravelmente menos contaminados; (b) 634 mulheres da costa leste, mas que não haviam crescido em uma vila de pescadores; e (c) 869 mulheres da costa oeste que não tinha crescido em uma vila de pescadores. Baseado em estudos anteriores, todos os grupos foram consideradas como semelhantes circunstâncias socioeconômicas. Mulheres expostas possuíam idade média de menarca pouco mais velhas do que as mulheres referente da mesma área costeira (idade média 122 Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães de 13,0 vs 12,8 anos). Não foram encontradas diferenças entre as mulheres expostas e os dois outros grupos referentes (média de idade de 13,0 anos em todos os grupos). Finalmente, cabe ressaltar que, em comparação com os estudos com meninas, o número de estudos que avaliam o efeito dos desreguladores endócrinos no desenvolvimento puberal em rapazes é muito mais limitado. Pesquisas em meninos são mais focadas na qualidade do sêmen, o que é muito mais próximamente relacionado com a fertilidade. Os achados sobre atraso puberal em meninos expostos a PCBs, PCDFs e endossulfan estão em consonância com a concepção geral de que estes compostos operam como xeno-estrógenos. Korrick et al38 investigaram a associação da concentração de dioxinas, furanos e PCBs com início da puberdade entre os meninos em uma região contaminada com dioxinas. A mediana da concentração sérica total de dioxinas foi de aproximadamente três vezes superior aos valores em crianças européias. Concentrações maiores dos compostos reunidos foram associados com o início da puberdade tardia, avaliada pelo volume testicular (RR = 0,68 IC 95% 0,49-0,95). Em contraste, os resultados têm sido inconsistentes entre os estudos epidemiológicos anteriores que examinaram marcos tardios de puberdade, em vez de puberdade precoce (potencialmente um ponto final mais sensível) e têm-se limitado, quer por pequeno tamanho da amostra, desenho transversal, auto-relatados de preparação da puberdade, ou falta de um biomarcador de exposição. Por exemplo, 80 meninos belgas adolescentes que vivem perto de um incinerador (a fonte de exposição presumida dioxinas) possuíam idade de maturidade sexual maiores, incluindo menor volume testicular, em comparação com os meninos em uma cidade sem poluição 39. Por outro lado, posteriormente, em um grande estudo transversal (n = 887) com meninos de 14 a 15 anos, também na Bélgica, os níveis séricos de organoclorados (PCB, p, p'-DDE e hexaclorobenzeno) foram associados desenvolvimento genital precoce (maior chance do estágio G3 de Tanner), em exames de saúde de rotina escolar realizado40. Entre meninos de 14-18 anos holandeses, a maturação puberal, incluindo o volume testicular, não foi associada com níveis de dioxinas perinatais ou puberais. Havia apenas 15 meninos neste estudo, no entanto, assim como com os estudos belgas, as avaliações foram focada em fases tardias da puberdade 41. 123 Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães Finalmente, entre 244 (principalmente meninos entre 12 e 14 anos) meninos da Carolina do Norte, a idade do auto-relato dos estágios púberes não foi associado a medidas de exposição pré-natal de DDE ou PCB42. Embora maior do que a maioria dos outros estudos, as avaliações da Carolina do Norte não incluíram medidas de dioxina, volume testicular ou início da puberdade. Embora a idade média de início da puberdade dos meninos pelo volume testicular (10,5 anos) seja consistente com outros estudos43,44 mais observou-se inicio tardio nos meninos dinamarqueses45; e a idade média de início de puberdade em meninos de Chapaevsk (9,4 anos, avaliado pela categoria G2 de Tanner) é mais jovem do que o registrado em outros lugares. CONCLUSÃO O objetivo do presente estudo foi avaliar o padrão de desenvolvimento puberal de adolescentes expostos a pesticidas organoclorados no Brasil. Comparou-se o padrão de desenvolvimento, dentro da população exposta, de acordo com a condição de ter ou não nascido no local. E ainda, comparou-se a população local com uma população controle, de características sócio demográficas semelhantes. As diferenças estatisticamente significativas apontam para diferenças entre as populações considerando a exposição in loco. Entretanto, não parece haver diferenças para a exposição intra-útero, considerando o nascimento no local como uma proxy desta condição. A respeito deste resultado, a hipótese levantada é de que a influência no desenvolvimento puberal não se dá pela exposição intra-útero, e sim pela exposição pós-natal. Ainda sobre esta condição, e considerando o modelo teórico subjacente, acredita-se que o período conhecido como adrenarca seja particularmente o período pré-pubere de maior vulnerabilidade a compostos que mimetizem hormônios esteroides. Recomenda-se, portanto, que estudos futuros apontem rumo a considerar este período do ciclo vital como de suscetibilidade para a exposição a organoclorados, para que se estime a magnitude da associação entre a exposição a este composto e eventuais problemas no desenvolvimento puberal, seja no sentido de puberdade precoce, seja de atraso puberal. 124 Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães REFERÊNCIAS 1. Brusiah et al. Diagnostic des retards pubertaires. Archives de pédiatrie 14 (2007) 1101-1110. 2. Din Hond and Schoeters G. Endocrine disrupters and human puberty. Int J Andrology 29 (2006): 264-271. 3. Dorn LD, Bero FM. Puberty and its heasurements: A decade in Review. Jornal of Research on adolescence, 21 (1), 180-195, 2011. 4. Edouard T, Tauber M. Retard pubertaire. Archives de pédiatrie. 17 (2010) 195200. 5. Jacobson-Dickman E; Lee, MM. 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1 7 4 3 3 6 3 3 Tanner Pênis Estágio 1 Estágio 2 Estágio 3 Estágio 4 Estágio 5 Tanner Pêlos Estágio 1 Estágio 2 Estágio 3 Estágio 4 Estágio 5 n 20,0 40,0 20,0 20,0 6,7 26,7 41,1 17,5 - % Nascidos Tanner Mama Estágio 1 Estágio 2 Estágio 3 Estágio 4 Estágio 5 Variáveis 1 3 1 3 1 3 3 1 - 12,5 37,5 12,5 25,0 12,5 37,5 37,5 12,5 - 0,81 0,87 - Expostos Não p Nascidos valor n % 4 9 4 6 2 10 7 4 - n 17,4 39,1 17,4 26,1 8,7 43,5 30,4 17,4 - % Total Masculino Tabela 02: Estadiamento puberal da população estudada segundo sexo. 8 39 28 6 21 16 35 9 - n 9,9 48,1 34,6 7,4 25,9 19,7 43,2 11,2 - % Não Expostos 0,01 0,05 - p valor 2 24 24 14 - 2 24 20 18 n 3,1 37,5 37,5 20,9 - 3,1 37,5 31,0 27,4 % Nascidos 1 8 6 2 - 1 6 6 3 5,8 47,2 35,3 11,7 - 5,9 35,1 35,1 17,6 0,72 - 0,73 Expostos Não P Nascidos valor n % 3 32 30 16 - 3 30 27 21 n 3,7 39,5 37,0 19,8 - 3,7 37,0 33,3 26,0 % Total Feminino 31 98 133 21 - 34 102 109 38 n 10,9 34,7 47,0 7,4 - - % Não Expostos 0,002 - 0,012 p valor Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães 130 26 21 17 Desenvolvimento puberal incipiente (M2-3 P2-3) Desenvolvimento puberal avançado (M3 P3-4) Desenvolvimento puberal completo (M4-5 P4-5) 6 5 4 Sem desenvolvimento puberal (G1P1) Desenvolvimento puberal incipiente (G2-3 P2-3) Desenvolvimento puberal avançado (G3-4 P2-3) Desenvolvimento puberal completo (G4-5 P4-5) Meninos - n 26,7 33,3 40,0 - 26,6 32,8 40,6 - % Nascidos Sem desenvolvimento puberal (M1P1) Meninas Variáveis Tabela 03: Classificação do estágio puberal da população estudada segundo sexo. 2 3 3 - 4 7 6 - 25,0 37,5 37,5 - 23,5 41,2 35,3 - 0,98 0,81 Expostos Não p Nascidos valor n % 6 8 9 - 21 28 32 - n 26,1 34,8 39,1 - 25,9 34,6 39,5 - % Total 43 25 13 - 89 123 71 - n 53,1 30,9 16,0 - 31,4 43,5 25,1 - % Não Expostos 0,03 0,04 p valor Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães 131 16,7 1,9 13,8 2,1 12,5 2,1 Idade de Semenarca Média Desvio padrão Idade de Pubarca Média Desvio padrão - Idade de Telarca Média Desvio padrão Orquimetria Média Desvio padrão - Idade de Menarca Média Desvio padrão Variáveis 12,1 4,2 13,4 2,2 17,2 4,9 - - Expostos Não Nascidos Nascidos 0,75 0,99 0,78 - - p valor 12,3 4,2 13,7 2,3 15,8 3,0 - - Total Masculino 10,2 1,8 12,1 2,7 17,3 3,3 - - Não Expostos 0,026 0,035 0,004 - - p valor 12,1 1,4 - - 12,0 2,5 13,2 1,4 11,8 2,9 - - 11,7 3,8 13,7 2,3 Expostos Não Nascidos Nascidos Tabela 04:Descrição dos parâmetros clínicos de avaliação de desenvolvimento puberal na população estudada segundo sexo. 0,69 - - 0,67 0,91 p valor 12,0 1,7 - - 11,9 2,6 13,6 1,4 Total Feminino 10,3 2,1 - - 9,8 2,1 11,8 1,6 Não Expostos <0,001 - - <0,001 <0,001 p valor Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães 132 Artigo 6: Atraso puberal associado à contaminação por pesticidas organoclorados no Brasil Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães ATRASO PUBERAL ASSOCIADO À CONTAMINAÇÃO POR PESTICIDAS ORGANOCLORADOS NO BRASIL Delayed puberty associated to organochlorine pesticide in Brazil Raphael Mendonça Guimarães; Carmen Ildes Rodrigues Fróes Asmus RESUMO Objetivo: Estimar a magnitude da associação entre exposição a organoclorados e atraso puberal. Material e Métodos: Foram comparados os 104 adolescentes moradores do local com 362 outros adolescentes de uma população controle, externa à área, que reunia características sócio demográficas semelhantes. As relações entre o atraso puberal e as variáveis independentes foram exploradas por razões de chance (OR) com intervalos de confiança (IC) de 95%. A análise multivariada foi efetuada por meio de regressão logística, considerando as variáveis que mostraram associação com a variável dependente “atraso puberal” na análise bivariada. Resultados: Foi encontrada uma associação estatisticamente significativa para a condição de morar em Cidade dos Meninos (e portanto estar exposto a organoclorados) e a ocorrência de atraso puberal (OR 2,06; IC 95% 1,31 – 3,24; p=0,003 para meninas, e OR 2,28; IC 95% 1,25 – 4,15; p=0,013 para meninos). No modelo da regressão logística a associação se manteve ao ajustar por idade (OR 1,98; IC 95% 1,27 – 3,01; p=0,009 para meninas, e OR 2,03; IC 95% 1,16 – 3,99; p=0,039 para meninos), e quando ajustado por idade, raça e IMC (OR 1,67; IC 95% 1,13 – 2,88; p=0,025 para meninas e OR 1,79; IC 95% 1,06 – 3,67; p=0,043 para meninos). Conclusão: Os dados apontam para uma associação entre exposição a organoclorados e a ocorrência de atraso puberal, tanto em meninos quanto em meninas. Palavras-Chave: Organoclorados, Atraso Puberal, Epidemiologia Ambiental ABSTRACT Objective: To estimate the magnitude of association between exposure to organochlorines and delayed puberty. Methods: We compared 104 teenagers with 362 local residents of other teens in a control population, outside the area, bringing together similar sociodemographic characteristics. The relationship between health and pubertal delay the independent variables were explored as prevalence ratios (PR) with confidence intervals (CI) of 95%. Multivariate analysis was performed by logistic regression, considering the variables associated with the dependent variable "delayed puberty" in the bivariate analysis. To make the analysis of the study used statistical packages SPSS 19.0 for Windows and Stata SE 11. Results: We found a statistically significant association between the condition of living in Cidade dos Meninos (and thus be exposed to organochlorines) and the occurrence of delayed puberty (OR 2.06, 95% CI 1.31 to 3.24, p = 0.003 for girls, and OR 2.28, 95% CI 1.25 to 4.15, p = 0.013 for boys). The logistic regression model the association remained when adjusting for age (OR 1.98, 95% CI 1.27 to 3.01, p = 0.009 for girls, and OR 2.03, 95% CI 1.16 - 3.99, p = 0.039 for boys), and when adjusted for age, race and BMI (OR 1.67, 95% CI 1.13 to 2.88, p = 0.025 for girls and PR 1.79, 95 % 1.06 to 3.67, p = 0.043 for boys). Conclusion: These data demonstrate an association between exposure to organochlorine and the occurrence of delayed puberty, both boys and girls. Keywords: Organochlorines, delayed puberty, Environmental Epidemiology 133 Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães INTRODUÇÃO O desenvolvimento e maturação do sistema reprodutivo começa na vida fetal, e é um processo ativo durante os primeiros meses pós-parto, tornando -se inativo durante a infância, até sua reativação para o desenvolvimento puberal. A puberdade começa com o aumento da secreção pulsátil de hormônio liberador de gonadotrofinas (GnRH) pelo hipotálamo, o aumento da capacidade de resposta da hipófise ao GnRH, o aumento da secreção de gonadotrofinas, a maturação gonadal, e o aumento na produção de esteróides sexuais. O aumento das concentrações de esteróides sexuais induzem o desenvolvimento dos caracteres sexuais secundários, aceleração do crescimento e fertilidade final. Fatores que determinam o momento do início da puberdade ainda são pouco compreendidos e objeto de intensa investigação 1-3. Os critérios diagnósticos para atraso puberal estão baseados em um atraso de mais de 2 a 3 desvio-padrão a partir da idade média de início da puberdade. A puberdade é considerada clinicamente atrasada se a maturação sexual não se tornou evidente até a idade de 14 anos nos meninos ou 13 anos nas meninas. Este diagnóstico clínico também é feito na ausência de menarca aos 16 anos ou, na ausência de menarca no prazo de 5 anos do início da puberdade. Utilizando estes critérios, aproximadamente 2,5% dos adolescentes saudáveis serão identificados como tendo atraso puberal. A maioria são meninos. Quando a puberdade se inicia, é inteiramente normal4,5. Existe uma variedade de outras causas para explicar atraso puberal. As mais prováveis são, entre causas genéticas (síndrome de Turner, Klinefelter), alterações anátomo-funcionais (falência gonadal bilateral, anorquidia, falência ovariana e testicular), fatores deficiência de constitucionais (disfunção hipotalâmica, gonadotropinas, defeitos enzimáticos) e hipopituitarismo, fatores ambientais (desnutrição, exercícios físicos extenuantes, distúrbios alimentares, obesidade severa)6-10. Particularmente com relação aos fatores ambientais, tem crescido na comunidade científica o estudo da relação entre atraso puberal e a exposição ao conjunto de substâncias conhecido como desreguladoras endócrinas, capazes de mimetizar hormônios esteróides e, com isso, interferir no metabolismo e ação dos 134 Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães hormônios endógenos. Especialmente sobre o estrogênio e a testosterona, fundamentais para o desenvolvimento puberal, seja pela atuação como sinalizadores que iniciam o processo de maturação sexual, seja pela manutenção do desenvolvimento ao longo da adolescência. Dentre estas substâncias, destacam-se os organoclorados, poluentes orgânicos persistentes usados em larga escala no século passado como pesticidas no controle de endemias tropicais, e que por possuírem meia vida longa, ainda hoje são objeto de investigação para diversos desfechos em saúde das populações expostas11-17. A Cidade dos Meninos é uma área de 1900 hectares (19 km²), de propriedade federal, hoje sob a responsabilidade patrimonial do Ministério de Previdência Social, estruturada inicialmente para abrigar jovens desvalidos. A partir de 1950, ali se instalou o Instituto de Malariologia e sua fábrica de pesticidas (fabricação de HCH e seus isômeros e manipulação de DDT). Contudo, em torno de 1955 o funcionamento da fábrica tornou-se antieconômico, em razão de dificuldades de obtenção de matéria prima e da concorrência de empresas paulistas. Em 1961, a fábrica cessou definitivamente suas atividades, deixando um estoque toneladas de material tóxico, para o qual a população, ao longo dos anos, deu diferentes usos: era usado domesticamente para matar piolhos e como inseticida de casas e quintais; como pavimentação da estrada interna; e vendido nas feiras livres locais. Mais de vinte anos se passaram, e após sucessivas tentativas de neutralização mal sucedidas do composto, o quadro atual é de contaminação em toda a área, tendo, a partir do final do século passado, a criação, por interação química, de novos compostos, como as dioxinas e os furanos. Atualmente, na tentativa de se avaliar a ocorrência de desfechos à saúde na população moradora do local, o Ministério da Saúde brasileiro, em conjunto com a Universidade Federal do Rio de Janeiro, após cuidadosa avaliação e caracterização do processo de contaminação ambiental da área, realizou um inquérito para avaliar o estado de saúde da população 18. O objetivo do presente trabalho é estimar a magnitude da associação entre a exposição a organoclorados e atraso puberal. 135 Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães MATERIAIS E MÉTODOS População de Estudo Uma população de 104 adolescentes (81 meninas e 23 meninos) moradora de Cidade dos Meninos foi avaliada segundo critérios clínicos e sócio demográficos. Além disso, outros 364 adolescentes (81 meninos e 283 meninas), oriundos de uma comunidade controle de características sócio demográficas semelhantes à população de Cidade dos Meninos, foram avaliados segundo os mesmos critérios. Avaliação Clínica Antes de se submeter a um exame clínico, cada participante recebeu um questionário sobre as características demográficas e de saúde e desenvolvimento físico. As características demográficas foram idade, sexo e renda. Como variável de saúde foi considerado o índice de massa corporal (IMC), calculado como peso em kg dividido pela altura em metros ao quadrado. O estágio de maturação sexual foi avaliado por meio de desenhos com descrições explicativas das fases do desenvolvimento sexual de Tanner19. Análise de Dados Foram comparados os adolescentes moradores do local com população controle, externa à área, que reunia características sócio demográficas semelhantes. A avaliação do desenvolvimento puberal levou em conta a idade dos adolescentes no momento dos principais episódios relacionados à puberdade (idades de menarca, telarca e pubarca para as meninas; e semenarca e pubarca para meninos), bem como o estágio de desenvolvimento de Tanner. A classificação de atraso puberal foi realizada mediante os seguintes critérios: meninos em que ocorreu a pubarca após os 14 anos, a semenarca após os 14 anos ou o desenvolvimento de genitália (pênis e testículos, estágio G3 da classificação de Tanner) após os 13 anos de idade; e meninas em que ocorreu a menarca após os 15 anos, a telarca após os 13 anos ou a pubarca após os 13 anos4,5,20. Efetuou-se a análise descritiva das variáveis sócio-econômicas e demográficas, de estilo de vida e relacionadas à saúde, por distribuição de frequências, e utilizou-se, 136 Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães para variáveis contínuas o teste T de Student; para variáveis categóricas, foi utilizado o qui quadrado de Pearson, quando n>5; quando n≤5, utilizou-se o teste exato de Fisher. As relações entre o atraso puberal e as variáveis independentes foram exploradas por razões de chance (OR) com intervalos de confiança (IC) de 95%. A análise multivariada foi efetuada por meio de regressão logística, considerando as variáveis que mostraram associação com a variável dependente atraso puberal na análise bivariada (dados não apresentados), sendo a retirada ou permanência de cada variável definida com base na sua significância estatística (p ≤ 0,05). Para efetuar as análises do estudo foram utilizados os pacotes estatísticos SPSS 19.0 for Windows e SE Stata 11. RESULTADOS Contaminação ambiental A Tabela 01 mostra as concentrações dos contaminantes no principal foco de contaminação e nos focos secundários. Na Cidade dos Meninos, exposições ao DDT e dioxina excederam de forma aguda, intermediária e crônica os níveis de risco mínimo. Para isômeros do HCH, os níveis de risco mínimo, agudos e crônicos estão excedidos pela dose de exposição estimada nas crianças. Avaliação populacional A tabela 02 apresenta a distribuição das variáveis sócio-demográficas e de Saúde avaliados na população exposta e na população controle do estudo. Observa-se que não há diferenças estatisticamente significativas para nenhuma das variáveis potencialmente confundidoras, o que as torna populações comparáveis. A tabela 03 apresenta a análise bivariada dos critérios de atraso puberal relacionados à condição de exposição a organoclorados (ou seja, morar em Cidade dos Meninos). A população residente na área contaminada possui uma frequência significativamente maior de alterações no tempo de desenvolvimento puberal do que a população controle. No caso dos meninos, tomou-se em consideração que o estudo possuía um N pequeno de adolescentes moradores do local (N=23) e optou-se por ampliar a margem de tolerância dos valores de p para 0,10 (p<0,10). Apesar disso, a 137 Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães razão de chance só se mostrou significativa para a avaliação gonadal (G3>13 anos). Para semenarca e pubarca, os intervalos de confiança não foram significativos, o que em parte pode ser explicado pelo pequeno número da população estudada. Já para as meninas, todos os critérios de atraso puberal avaliados (idade da menarca, telarca e pubarca) apresentam diferença significativa para as incidências na população de estudo e na população controle. Finalmente, ao realizar análise multivariada utilizando-se regressão logística (tabela 04), reclassificando o status de atraso puberal (os critérios não mais sendo observados separadamente, mas num critério amplo), observa-se que a população da área contaminada possui maior ocorrência de atraso puberal. Adotou-se como atraso puberal o fato de o adolescente possuir pelo menos um dos critérios descritos anteriormente. Ao ajustar a medida, primeiramente, pela idade, a associação manteve-se estatisticamente significativa, embora tenha perdido um pouco de sua magnitude. Relação semelhante foi encontrada ao realizar o ajuste por idade, renda e IMC. Apesar disso, a significância estatística se manteve, tanto para meninos quanto para meninas. DISCUSSÃO O início e o desenvolvimento da puberdade são regulados pelo sistema neuroendócrino. Estudos de base populacional em todo o mundo têm procurado explicar certas mudanças nesse padrão a partir de fatores ambientais, condições socioeconômicas estado nutricional, entre outros. Entre os fatores ambientais, vários estudos epidemiológicos investigam a associação com a exposição aos poluentes conhecidos como desreguladores endócrinos (EDC) em particular com bifenilas policloradas (PCB), DDT, hexaclorociclohexano (HCH), ftalatos, dioxinas e furanos. Estes estudos têm investigado esta associação a partir de vários momentos da exposição do organismo humano a diferentes produtos químicos com ações endócrinas suspeitas, seja na puberdade ou na fase pré-natal. Algumas investigações mostram efeitos dos EDC, enquanto outras não. No entanto, vários deles apoiam a hipótese de que os compostos exógenos podem ter provocado efeitos clínicos, especialmente em crianças pré-púberes com níveis baixos ou indetectáveis de hormônios sexuais endógenos. Estes incluem exemplos de surtos de puberdade 138 Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães precoce em sub-populações em que houve exposição a hormônios exógenos ou produtos químicos que são fortemente suspeitos de possuir tal atividade22-29. A puberdade de meninas e meninos apresenta várias diferenças interessantes. Meninas entram na puberdade 1-2 anos antes do que os meninos. Além disso, a puberdade precoce é muito mais comum em meninas do que em meninos 30 e o atraso da puberdade é mais freqüentemente vista em meninos31. Teoricamente, algumas dessas diferenças podem ser resultantes de ações de diferentes fatores ambientais, incluindo os EDCs nos dois sexos. Uma possível explicação vem do fato de que a soma combinada dos efeitos dos EDC parece ser estrogênica e anti-androgênica. As meninas têm maiores níveis pré-púberais de estradiol do que os meninos e, portanto, a exposição ao estrogênio ambiental pode ter efeito mais pronunciado para os órgãos hormônio-sensíveis do que em meninos. Múltiplos fatores genéticos e ambientais influenciam o tempo da puberdade32 . A alta correlação da idade da menarca nas famílias, e entre gêmeos monozigóticos, em comparação com gêmeos dizigóticos, sugerem uma forte influência genética no tempo da puberdade33-35, o que é um dos fatores intervenientes nos resultados dos diversos estudos.. Muitos estudos em humanos têm demonstrado uma relação positiva entre o IMC pré-puberdade e o início tardio da velocidade de crescimento de pico ou da menarca36. Estes estudos sugerem que o tempo da puberdade, em ambos os sexos, pode ser influenciada pela composição corporal37-39. A diminuição da sensibilidade à insulina, como resultado da baixa atividade física, e mudanças de hábitos alimentares, também podem estar envolvidos nas tendências observadas secularmente40. Teoricamente, hormônios ou substâncias com capacidade de desregulação hormonal podem interferir com o desenvolvimento puberal por ações em diferentes níveis, incluindo o eixo neuroendócrino hipotálamo-hipofisário, as gônadas e órgãosalvo periféricos, tais como mama, folículos capilares e genitais. No cérebro, os EDC podem agir por estimulação de células estrógeno-sensíveis, incluindo os núcleos de neurônios do hipotálamo, liberando alguns peptídeos e promovendo a maturação do hipotálamo com início mais precoce da puberdade. No entanto, outros compostos poderiam agir por inibição da gonadotrofina através do feedback negativo. Também é possível que EDC tenham efeitos diretos sobre o peso corporal e este sobre o eixo 139 Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães hipotálamo-hipofisário-gonadal41. Os esteróides produzidos pelas glândulas suprarenais também atuam na progressão normal da puberdade, incluindo o desenvolvimento de pêlos pubianos. Potencialmente, uma disfunção da glândula adrenal causada por EDC, especialmente no período conhecido por adrenarca, imediatamente anterior à puberdade, também influenciaria o desenvolvimento puberal42. Poucos estudos têm observado um atraso puberal em associação com a exposição aos desreguladores endócrinos. O desenvolvimento puberal tardio foi associado com maior exposição às bifenilas policloradas (PCB) em meninos e atraso no desenvolvimento da mama na exposição a maiores níveis de dioxina nas meninas 25. O atraso no desenvolvimento mamário e na idade da primeira ejaculação foi observada após a exposição ao PCCD e furanos43, e o atraso no desenvolvimento sexual em meninos relacionado à exposição ao endosulfan26. No estudo de Leijs43, a exposição pré-natal às dioxinas e furanos apresentou uma relação com a telarca (Estágio de Tanner M2/M3). Mulheres com maior exposição perinatal às dioxinas e furanos apresentaram retardo na telarca, comparadas às meninas com menor exposição. Outro achado interessante foi a demora na idade em primeira ejaculação nos meninos com maior concentração de organoclorado sérica. Entretanto, o pequeno número de indivíduos nos obriga a interpretar a última descoberta com cautela. O retardo do início de desenvolvimento mamário encontrado neste estudo é comparável com os resultados de um estudo belga. Den Hond 25 mensurou a concentração sérica de dioxinas em 200 adolescentes, e correlacionada negativamente relacionada com o desenvolvimento de mamas em meninas. O achado de retardo na primeira ejaculação em meninos com maior dose sérica de organoclorados poderia ser um alerta; no entanto, o número de indivíduos é muito pequeno. Há poucos estudos comparativos. Leijs et al43 não encontraram relação entre o volume testicular e a exposição às dioxinas e furanos. Estudos semelhantes também não conseguiram encontrar uma relação com este desfecho25,44. Ainda, Leijs et al43 não encontraram nenhuma relação com o desenvolvimento gonadal e os compostos medidos. Em outro estudo, realizados entre 55 pares de meninos Yucheng e seus controles, com idades entre 11-14, que nasceram nos primeiros anos após a intoxicação das mães (óleo de arroz contaminado com PCBs e PCDD/Fs), um 140 Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães comprimento reduzido do pênis foi encontrado em comparação com o grupo controle4,45. Finalmente, Leijs et al43 não encontraram nenhum efeito sobre a menarca. A menarca é iniciado pelo estímulo estrogênico. Estudos sobre a idade da menarca em áreas diferentes, como a Carolina do Norte e Seveso, não apresentaram diferenças na idade da menarca em relação à exposição à dioxina, em comparação com a média normal24,44. No entanto, na população contaminada de Michigan, o DDT reduziu a idade da menarca46 . Os achados são controversos. Por exemplo, a China usou DDT até relativamente pouco tempo e não há, portanto, potencial para exposições mais elevadas lá. Ouyang et al47 estudaram 466 trabalhadoras recém-casadas da indústria têxtil com idade entre 20-34 em 1996 - 1998. Eles perguntaram às mulheres sobre a idade da menarca e duração do ciclo e mediram simultaneamente DDT e DDE séricos. Eles descobriram que as mulheres no quartil mais elevado de DDT total / DDE relataram menarca 1,1 anos mais cedo do que aqueles no quartil inferior. Mulheres com exposições mais elevadas também relataram ciclos mais curtos. Os resultados do nosso estudo encontram associação para exposição a organoclorados e atraso puberal, tanto em meninas quanto em meninos. A literatura, conforme observado, não possui evidência consistente nem a favor de atraso, nem a favor da puberdade precoce. Fato é que os estudos são muito diversos com relação ao período fisiológico em que os sujeitos se encontravam quando do início da exposição. Especificamente nossa população traz sujeitos que moram em Cidade dos Meninos, e embora não todos, uma grande maioria nasceu lá. Logo tiveram exposição desde intrautero, inclusive via amamentação que é uma das mais importantes formas de transmissão destes compostos48. E ainda,cabe ressaltar que, ainda os que não nasceram lá, residem lá há bastante tempo, tendo ainda sofrido contaminação no período pré-púbere da adrenarca, onde o corpo já se mostra mais sensível à ação de estrógenos e, portanto, à poluentes ambientais que sejam capazes de imitar tal efeito. CONCLUSÃO Este estudo apresentou associação entre exposição a organoclorados e atraso puberal, o que também se verificou na análise separada do desenvolvimento dos 141 Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães caracteres sexuais secundários (menarca > 15 anos; telarca e pubarca > 13 anos; semenarca e pubarca > 14 anos; desenvolvimento gonadal masculino > 13 anos). As evidências sobre a associação entre exposição a organoclorados e alterações no tempo de puberdade ainda não são consensuadas na literatura. As razões para isso são diversas: não há estudos com grandes populações, não há estudos que associam, concomitantemente, fatores ambientais e hormonais, etc. O que se tem, ao contrário, são evidências conflitantes, que ora apontam para puberdade precoce, ora para atraso puberal. Os resultados da nossa investigação prouveram evidências para os programas de investigação, a fim de esclarecer a base dessa associação. REFERÊNCIAS 1. Edouard T, Tauber M. Retard pubertaire. Archives de pédiatrie. 17 (2010) 195200. 2. Jacobson-Dickman E; Lee, MM. The Influence of endocrine disruptors on pubertal timing. Current opinion in Endocrinology , Diabetes and Obesity. 2009, 16: 25-30. 3. Brusiah et al. Diagnostic des retards pubertaires. Archives de pédiatrie 14 (2007) 1101-1110. 4. Rogan WJ, Ragan NB. Some evidence of effects on environmental chemicals on the endocrine system in children. Int J Hyg Environ Health 2007; 210(5): 659667. 5. Din Hond and Schoeters G. Endocrine disrupters and human puberty. Int J Andrology 29 (2006): 264-271. 6. Dorn LD, Bero FM. Puberty and its heasurements: A decade in Review. Jornal of Research on adolescence, 21 (1), 180-195, 2011. 7. Teilman G, Jucel A, Skakkebalk, NE. 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Componente Foco principal Máxima Média EstradaCamboaba Máxima TMR Média Valores de MGAA Referência de (mg/kg) Intervenção* 1,2,4-TCB 4.001 564 390 95 30.000 20 2,4,6-TCF 220 51 1.742 174.9 150 2,4,5-TCF 19 5. 35 120 18.7 150 89.47 15.46 1.104.29 224.34 0 0 0 0 b-HCH 45.429 1.0249 242.15 g-HCH 32.24 10.08 d-HCH 22.27 PCF 290 2.000 400 24.30 920 2.000 30 109.56 10.98 230 2.000 5 4008 32.87 3.31 2.000 7 0 6 1 5.000 o,p-DDE 17 3 3 1 9 4.000 p,p-DDE 393 89 95 16 9 4.000 o,p-DDD 124 24 10 2 9 4.000 p,p-DDD 627 105 52 10 9 4.000 o,p-DDT 242 58 235 38 9 4.000 p,p-DDT 1.095 246 932 143 9 4.000 25 1.000 ppt. 50.000 ppt. a-HCH HCH Dioxinas máximo: 13.900 ppt. TMR: tolerância máxima de risco 7; MGAA: Média segundo Guia de Avaliação Ambiental 3; ppt.: partes por trilhão. * Valor de intervenção Fonte: Asmus, 200821 50 18-19 anos 10 13 Etilismo Sim Não 15-17 anos 5 18 Tabagismo Sim Não 10-14 anos 2 11 6 4 IMC e Magro f Eutrófico g Sobrepeso h Obeso c 10 5 2 6 Renda d < 1 SM 1 – 2 SM 3 – 4 SM 5 SM ou mais b 6 17 Raça Branco Preto/Pardo a 10 7 6 d 38 43 21 60 9 36 19 17 34 14 7 26 21 60 35 24 22 Salário Mínimo 43,5 56,5 21,7 78,3 8,7 47,8 26,1 17,4 43,5 21,7 8,7 26,1 26,1 73,9 43,5 30,5 26,0 Expostos n % Idade a Adolescência Inicial b Adolescência Intermediária c Adolescência Final Variáveis e <18,5 46,9 53,1 25,9 74,1 11,2 44,4 23,5 20,9 41,9 17,3 8,7 32,1 25,9 74,1 43,2 29,6 27,2 Masculino Não expostos n % Tabela 01: Distribuição das variáveis sócio-demográficas e de saúde dos adolescentes. Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães 0,96 0,91 0,95 0,93 0,98 0,99 p valor f 18,5 – 24,9 27 54 11 70 8 34 20 19 34 30 10 7 20 61 36 32 13 g 91 192 42 241 28 135 61 59 129 105 32 17 75 208 121 112 50 25,0 – 29,9 33,3 66,7 13,6 86,4 9,9 42,0 24,7 23,4 42,0 37,0 12,3 8,7 24,7 75,3 44,4 39,6 16,0 Expostos n % h 0,94 0,93 0,91 0,92 0,94 0,93 p valor 30,0 e mais 32,1 67,9 14,8 85,2 9,9 47,7 21,6 20,8 45,6 37,1 11,3 6,0 26,5 73,5 42,7 39,6 17,7 Feminino Não expostos n % 148 Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães 149 Tabela 02: Análise bivariada dos critérios de atraso puberal relacionados à condição de exposição a organoclorados. Sexo Feminino Masculino Critérios de Atraso Puberal n Menarca > 15 anos Sim Não Total 8 73 81 Telarca > 13 anos Sim Não Total Grupos Expostos Não expostos Incidência n Incidência Razão de Chance (IC 95%) p valor 9,8 11 272 283 3,8 2,71 (1,05 – 6,98) 0,04 12 69 81 14,8 19 264 283 6,7 2,42 (1,12 – 5,22) 0,02 Pubarca > 13 anos Sim Não Total 19 62 81 23,4 34 249 283 13,6 2,24 (1,20 – 4,20) 0,01 G3 > 13 anos Sim Não Total 9 14 23 39,1 16 65 81 19,7 2,61 (0,96 – 7,1) 0,06 Semenarca > 14 anos Sim Não Total 5 18 23 21,7 7 74 81 8,6 2,93 (0,84 – 10,30) 0,08 Pubarca > 14 anos Sim Não Total 4 19 23 17,4 5 76 81 6,2 3,20 (0,79 – 13,07) 0,07 Masculino Feminino Sexo a 11 Sim 64 12 244 Não 58 47,8 28,4 20,9 13,8 Incidência de Atraso Puberal Não Expostos Expostos Modelo 1 Bruto 2,99 (1,21 – 3,87) p=0,039 p=0,013 p=0,009 3,45 (1,29 – 9,17) p=0,003 2,31 (1,27 – 4,01) Modelo 3 Ajustadob p=0,043 2,85 (1,06 – 3,61) p=0,025 1,89 (1,13 – 2,98) Razões de Chance (IC 95%) Modelo 2 Ajustadoa 2,48 (1,38 – 4,47) ajustado por idade; b ajustado por idade, renda, IMC, tabagismo e etilismo 17 39 Não Não Sim 23 Atraso Puberal Sim Categoria de Exposição Tabela 03: Resultado final da análise multivariada de Regressão Logística para a exposição ambiental a organoclorados e atraso puberal. Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães 150 CONCLUSÃO Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães Os resultados desta tese evidenciam que a exposição aos resíduos de pesticidas organoclorados pode estar associada a alterações no desenvolvimento dos caracteres sexuais primários e secundários na população de Cidade dos Meninos, Brasil. Os achados do primeiro artigo sustentam a hipótese de que a razão de sexos ao nascimento – e portanto, o desenvolvimento sexual intrauterino – são influenciados pela exposição dos progenitores. Este é um achado relevante, por duas razões: a primeira, porque ratifica a ação dos organoclorados como interferentes endócrinos, especialmente para endocrinologia reprodutiva; a segunda, porque demonstra uma janela de suscetibilidade a ser considerada uma janela crítica para o desenvolvimento sexual, a pré-natal. Os resultados do segundo artigo reforçam a hipótese de que há diferenças no desenvolvimento puberal de adolescentes expostos aos organoclorados, comparados a adolescentes cujo perfil sócio-econômico seja semelhante. Acrescente-se a isso o fato de que este artigo evidencia que há significância estatística quando os grupos comparados são os que vivem ou não em Cidade dos Meninos; porém, este resultado não se sustenta quando comparados os grupos de nascimento e não-nascimento dos adolescentes residentes da área. Este resultado suscita a hipótese de que o desenvolvimento puberal é possivelmente influenciado não pela exposição pré-natal, mas pela exposição pós-natal, possivelmente no período conhecido como adrenarca, anterior à fase púbere, em que a regulação hormonal por esteróides, como sinalizadora do início da puberdade, parece sofrer interferência direta de contaminantes ambientais. Finalmente, os achados do terceiro artigo avaliam a associação entre atraso puberal e a exposição a organoclorados, encontrando associação positiva para estes achados, após modelagem estatística por regressão de Poisson. Estes resultados parecem indicar que há períodos de vulnerabilidade diferenciada para exposição a xenoestrógenos, já assinalado nos três artigos de revisão anteriores aos três artigos de resultados descritos. . Certos grupos populacionais de exposição a resíduos de pesticidas organoclorados apresentam uma série de características socioeconômicas e 151 Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães demográficas similares às encontradas em Cidade dos Meninos, sendo possível que os achados destes estudos reflitam, em parte, a mesma realidade. Na literatura existem outros estudos nacionais e internacionais que avaliam a associação entre a exposição a pesticidas orgânicos persistentes, em especial os organoclorados e alterações do desenvolvimento reprodutivo. Entretanto, não foram encontrados estudos voltados especificamente para adolescentes, ou que avaliassem a tendência temporal para populações especificamente expostas a tais substâncias. Algumas outras questões se colocam: os estudos muitas vezes não são comparáveis, por diversidade de métodos, de utilização de diferentes biomarcadores e matrizes biológicas, de escolha de variáveis potencialmente confundidoras usadas na modelagem estatística; há algumas vezes contradição entre os estudos; alguns estudos tratam de exposições pontuais ou acidentes, outros de exposição prolongada. Nesse sentido, essa investigação se constitui em uma primeira abordagem desse tema e busca contribuir para aumentar o conhecimento científico acerca deste tema, atual e relevante. 152 REFERÊNCIAS Exposição a Organoclorados e Alterações em Caracteres Sexuais Primários e Secundários em Cidade dos Meninos, Brasil Raphael Mendonça Guimarães REFERÊNCIAS · Anderson CA, Duffy DL, Martin NG & Visscher PM. (2007) Estimation of variance components for age at menarche in twin families. Behav Genet 37, 668–677. · Anderson SE, Dallal GE & Must A. 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Sex ratio in offspring of those affected by dioxin and dioxin-like compounds: the Yusho, Seveso, and Yucheng incidents. Occup Environ Med. 2001, 58:540-1. 167 ANEXOS ANEXO 1 – CRONOGRAMA Defesa de tese Elaboração de Relatório Final Qualificação Análise de Dados Elaboração do Banco de Dados Elaboração de Relatório Parcial CNPq e FAPERJ Coleta de Dados Negociações com a SMS- Duque de Caxias Submissão ao CEP Elaboração do projeto Etapas ANEXO 1 - CRONOGRAMA JanMar 2009 AbrJulJun Set OutDez JanMar 2010 AbrJulJun Set OutDez JanMar 2011 AbrJulJun Set OutDez ANEXO 2 – INSTRUMENTO DE COLETA DE DADOS DOS ADOLESCENTES Exposição a Organoclorados e Efeitos de Eixo Regulador em Adolescentes e Crianças Exposição a Organoclorados e Efeitos de Eixo Regulador em Adolescentes e Crianças Coordenação: Dra. Carmen Ildes Rodrigues Fróes Asmus Financiamento: 1 Exposição a Organoclorados e Efeitos de Eixo Regulador em Adolescentes e Crianças FASE 1: COM O RESPONSÁVEL BLOCO A: INFORMAÇÕES SOBRE EXPOSIÇÃO A1- Quantos cômodos tem a sua casa? (Considere como cômodos os espaços fechados delimitados por paredes, mesmo fora de casa, desde que usados como local para dormir, sala, cozinha ou banheiro) A2- De que tipo de material são feitas as paredes da sua casa? [ ] Alvenaria com reboco por fora [ ] Alvenaria com rebouco por dentro [ ] Alvenaria com rebouco por dentro e por fora [ ] Alvenaria sem reboco [ ] Outro tipo A3- Qual o tipo de cobertura ou telhado de sua casa? [ ] Só Laje [ ] Telha de barro [ ] Telha de cimento-amianto [ ] Outro tipo A4- De onde vem a água utilizada na sua casa? [ ] CEDAE [ ] Poço [ ] Outros A5. Para onde vai o esgoto da sua casa? [ ] Rede pluvial [ ] Vala negra [ ] Outros [ ] Não tem instalações sanitárias A6. Antes da coleta na porta da casa, qual era o destino do lixo da sua casa? [ ] É queimado [ ] É enterrado [ ] É jogado em terreno baldio [ ] Outros A7. Como é a pavimentação do terreno da sua casa? [ ] Cimento [ ] Grmamado [ ] Terra [ ] Misto [ ] Outro A8- Ocorre alagamento da rua onde se situa a sua casa quando chove? [ ] Frequentemente [ ] Ás vezes [ ] Raramente [ ] Nunca A9- Ocorre alagamento do terreno da sua casa quando chove? [ ] Frequentemente [ ] Ás vezes [ ] Raramente [ ] Nunca ou quase nunca A10 – Existia alguma plantação no seu terreno? [ ] Sim [ ] Não A11. O que era cultivado? [ ] Mandioca [ ] Cana de Açúcar [ ] Verduras [ ] Legumes [ ] Grãos A12. Existiam/Existem árvores frutíferas no seu terreno [ ] Sim 2 Exposição a Organoclorados e Efeitos de Eixo Regulador em Adolescentes e Crianças [ ] Não A13 – O Sr/Sra. Cria, ou já criou animais em sua casa para consumo? [ ] Sim [ ] Não A14 – O que é / era criado? [ ] Gado/bovino [ [ [ [ ] Cabras ] Porcos ] Aves ] Outros A15. O Sr/Sra. já guardou pó de broca em sua casa [ ] Sim [ ] Não A16. O Sr/Sra. Usava pó de broca em seu domicílio [ ] Sim [ ] Não BLOCO B: CARACTERÍSTICAS FAMILIARES B1. Qual é o seu grau de instrução? [ ] 1º grau incompleto [ ] 1º grau completo [ ] 2º grau incompleto [ ] 2º grau completo [ ] Universitário incompleto [ ] Universitário completo [ ] Pós-graduação B2. No MÊS PASSADO, qual foi aproximadamente sua renda familiar LÍQUIDA, isto é, a soma de rendimentos, já com descontos, de todas as pessoas que contribuem regularmente para as despesas de sua casa? [ ] Até 1 SM [ ] 2 – 3 SM [ ] 4 – 5 SM [ ] mais de 5 SM B3. Quantas pessoas (adultos e crianças), INCLUINDO VOCÊ, dependem dessa renda para viver? Se for o caso, inclua dependentes que recebem pensão alimentícia. NÃO INCLUA empregados domésticos para os quais você paga salário. |_|_| pessoas B3. Quantos banheiros existem em sua casa? |_|_| banheiros B4. Em relação aos bens abaixo, marque SIM, para os que existem na sua casa ou NÃO para os que não existem. Para cada item que você responder SIM, por favor, mencione a quantidade: Posse de bens Não tem 1 Automóvel Carroça Cavalos Celular Computador Geladeira duplex ou freezer Geladeira simples Máquina de lavar roupa Rádio (não considerar rádio de automóvel) Telefone Televisão em cores Vídeo-cassete / DVD 3 2 Tem (Qtde) 3 4 5 Exposição a Organoclorados e Efeitos de Eixo Regulador em Adolescentes e Crianças FASE 2: COM O ADOLESCENTE BLOCO A: INFORMAÇÕES GERAIS A1. Qual o seu nome completo ? A2. Qual o nome completo da sua mãe: A3. Qual o seu sexo? [ ] Masculino [ ] Feminino A4. Qual a data de seu nascimento? |__|__|/|__|__|/|__|__|__|__| A5. Qual a data em que você se mudou para Cidade dos Meninos (se nasceu aqui, considerar a data de nascimento) ? |__|__|/|__|__|/|__|__|__|__| A6. Qual seu grau de instrução? [ ] 1º grau incompleto [ ] 1º grau completo [ ] 2º grau incompleto [ ] 2º grau completo [ ] Universitário incompleto [ ] Universitário completo [ ] Pós-graduação BLOCO B: ANTECEDENTES DA INFÂNCIA (PODE SER RESPONDIDO PELO ADOLESCENTE OU PELO RESPONSÁVEL) B1. Você foi um bebê prematuro, isto é, nasceu antes do previsto? [ ] Sim [ ] Não [ ] Não sabe informar B2. De acordo com a informação que você tem, qual o seu peso ao nascer? [ ] Abaixo de 2.500 gramas [ ] Entre 2.500 e 4.000 gramas [ ] Acima de 4.000 gramas B3. Você foi amamentado ? [ ] sim [ ] não 4 Exposição a Organoclorados e Efeitos de Eixo Regulador em Adolescentes e Crianças B4. Se sim, por quanto tempo? [ ] menos de 6 meses [ ] 6 meses ou mais BLOCO C: HISTÓRIA REPRODUTIVA Padrão menstrual e menarca C1. Que idade você tinha quando menstruou pela primeira vez? |_|_| anos [ ] Nunca menstruei C2. De quanto em quanto tempo costuma ficar menstruada? (se não menstrua mais considere o intervalo habitual na maior parte da sua vida) [ ] Menos de 25 dias [ ] Entre 25 e 35 dias [ ] Entre 35 e 60 dias [ ] Entre 60 dias e 6 meses [ ] Entre 6 meses e um ano [ ] Mais de um ano C3. Você sente dor ao ficar menstruada? [ ] sim [ ] não C4. Em que fase do ciclo você sente dor? [ ] antes de menstruar [ ]durante a fase da menstruação [ ] após o término da menstruação C5. Você sente dores nas mamas quando menstrua (antes, durante ou após) ? [ ] sim [ ] não C6. Com que idade você percebeu que seu corpo estava mudando: Aumento das mamas: anos - Aumento do pênis: anos - Aparecimento de pêlos nas axilas: anos - Aparecimento de pêlos no rosto (barba ou bigode): anos - Aparecimento de pêlos na genitália: anos C7. Você alguma vez já ejaculou? 5 Exposição a Organoclorados e Efeitos de Eixo Regulador em Adolescentes e Crianças [ ] sim [ ] não C8. Com que idade? anos C9. Você alguma vez já acordou pela manhã ou de madrugada com sua cueca umedecida, mas que não parecia urina? [ ] sim [ ] não C10. Com que idade? anos C11. Você já teve relações sexuais alguma vez? [ ] sim [ ] não C12. Com que idade você teve sua primeira relação sexual ? anos Gravidez C13. Você já esteve grávida? (considerar todas as gestações, incluindo aquelas que resultaram em filho nascido vivo ou morto, em aborto espontâneo/perda, aborto provocado e gravidez ectópica/nas trompas) [ ] sim [ ] não C14. Que idade você tinha quando engravidou pela primeira vez? anos C15. Considerando todas as suas gestações, quantas terminaram com: |_|_| Nascidos- vivos |_|_| Nascidos-mortos |_|_| Abortos |_|_| Outras (gravidez tubária, mola,etc.) C16. O número total de gravidezes foi |_|_| C17. Em alguma gravidez, parto ou pós-parto, você teve pré-eclâmpsia/eclâmpsia? [ ] Sim. Em quantas gestações? |_|_| [ ] Não C18. Em alguma gravidez, você teve ganho de peso maior do que 30 kg? 6 Exposição a Organoclorados e Efeitos de Eixo Regulador em Adolescentes e Crianças [ ] Sim. Em quantas gestações? |_|_| [ ] Não C19. Que idade você tinha quando nasceu seu primeiro filho? anos C20. Mantendo relações sexuais com freqüência, alguma vez você já tentou engravidar por um ano completo ou mais e, durante este período, não conseguiu? [ ] Sim [ ] Não C21. Quando você engravidou, a sua gravidez foi planejada? [ ] Sim [ ] Não C22. Se foi uma gravidez planejada, quanto tempo você levou entre a decisão de engravidar e o resultado positivo da gravidez ? (em meses) Anticoncepção C23. ATUALMENTE, você usa algum método para evitar a gravidez? [ ] Sim [ ] Não C24. Qual método para evitar a gravidez você usa atualmente? (marque quantos forem necessários) Pílula (comprimido oral) Injeções contraceptivas Norplant (implante) Anel (contraceptivo hormonal intravaginal) DIU com hormônio Camisinha masculina Ligadura/laqueadura de trompas (esterilização feminina) Parceiro fez vasectomia (esterilização masculina) Outro (especifique) _________________________ C25. Que idade você tinha quando começou a usar o método hormonal atual (pílula, injeções contraceptivas, Norplant (implante), anel (contraceptivo hormonal intravaginal) ou DIU com hormônio? anos BLOCO D: HÁBITOS DE VIDA D1. ATUALMENTE, você fuma? [ ] Sim [ ] Não D2. Você alguma vez já fumou? [ ] Sim [ ] Não D3. Se sim, por quanto tempo? __________ anos 7 Exposição a Organoclorados e Efeitos de Eixo Regulador em Adolescentes e Crianças D4. ATUALMENTE, você bebe? [ ] Sim [ ] Não D5. Você alguma vez já bebeu? [ ] Sim [ ] Não D6. Se sim, por quanto tempo? __________ anos BLOCO E: MEDIDAS ANTROPOMÉTRICAS Altura em pé Peso , , cm kg 8 Exposição a Organoclorados e Efeitos de Eixo Regulador em Adolescentes e Crianças BLOCO F: ESTADIAMENTO DE TANNER - ENTREVISTADOR 9 Exposição a Organoclorados e Efeitos de Eixo Regulador em Adolescentes e Crianças 10 Exposição a Organoclorados e Efeitos de Eixo Regulador em Adolescentes e Crianças BLOCO G: ESTADIAMENTO DE TANNER - ENTREVISTADOR 11 Exposição a Organoclorados e Efeitos de Eixo Regulador em Adolescentes e Crianças 12 ANEXO 3 – TCLE PARA ADOLESCENTES Termo de consentimento para os adolescentes participantes do projeto Exposição a Organoclorados e Efeitos de Eixo Regulador em Adolescentes e Crianças . Declaro que estou esclarecido(a) que: 1. Este projeto de pesquisa está sob a responsabilidade dos pesquisadores Carmen Ildes Rodrigues Fróes Asmus (médica) e Raphael Mendonça (enfermeiro). A Dra. Carmen Fróes é professora da Faculdade de Medicina e trabalha no Instituto de Estudos de Saúde Coletiva da Universidade Federal do Rio de Janeiro. O Enf. Raphael Mendonça é aluno de doutorado da Universidade Federal do Rio de Janeiro. 2. O objetivo deste trabalho é investigar a ocorrência de alterações sobre o processo de crescimento, desenvolvimento puberal e capacidade reprodutiva dos adolescentes na faixa etária de 12 a 21 anos, moradores na comunidade de Cidade dos Meninos. 3. Para cumprir este objetivo, serão coletadas com informações por questionário, dados de peso, altura e desenvolvimento das mamas e pênis e crescimento dos pêlos pubianos e axilares e amostras de esperma (exclusiavamente para os adolescentes entre 16 e 21 anos). A coleta destas amostras será realizada pelos pesquisadores, responsáveis, bem como por alunos de graduação da Faculdade de Medicina, sob a coordenação da Professora Carmen Fróes e do pesquisador Raphael Mendonça, nas residências dos adolescentes. A coleta de espermograma será realizada em laboratório contratado para a confecção dos exames. O uso do material biológico da pesquisa destina-se exclusivamente aos fins previstos no estudo 4. Será realizado um questionário (em anexo) com perguntas sobre tempo de residência na Cidade dos Meninos, possíveis exposições ambientais e ocupacionais, características da residência, hábitos pessoais como tipo de alimentação, dentre outros, e ainda dados sobre a história reprodutiva. Estes dados auxiliarão na análise e interpretação dos resultados. Serão ainda avaliadas informações contidas nos prontuários da Unidade de Saúde da Família local. 5. Os exames complementares a serem realizados serão: - Esperma: contagem total dos espermatozóide (para meninos entre 16 e 21 anos) ; avaliação da morfologia e mobilidade; identificação de formas anômalas. Todos estes exames serão realizados na rede de laboratórios Diagnósticos da América, empresa tradicional em análises clínicas com longo tempo de experiência com projetos de pesquisa. Os resultados serão mantidos em confidencialidade, e serão armazenados por até 15 anos pela empresa responsável pela coleta e análise do material biológico. 6. A qualquer momento os pesquisadores responsáveis poderão ser acionados e estarão disponíveis para novos esclarecimentos. 7. A realização desta pesquisa não oferece riscos para a sua saúde e a qualquer momento você pode recusar a participação e contatar o Comitê de Pesquisa do IESC através do telefone: (21) 2598-9328. 8. As identidades dos sujeitos envolvidos (adolescentes e familiares) serão mantidas sob a guarda exclusiva da equipe de pesquisa. Não obstante, a divulgação dos resultados da pesquisa deverá ser pública e, em primeiro lugar, endereçada aos sujeitos da pesquisa. 9. Será marcada uma data para entrega individual dos resultados e esclarecimento quanto ao seu significado. Caso seja detectada alguma anormalidade, você será encaminhado (a) para avaliação médica, de acordo com a sua concordância. Nome: Identidade: Rio de Janeiro, _____ de ____________________ de 2009. ANEXO 4 – TCLE PARA PAIS Termo de consentimento para pais ou responsáveis dos adolescentes participantes do projeto Exposição a Organoclorados e Efeitos de Eixo Regulador em Adolescentes e Crianças Declaro que estou esclarecido(a) que: 1. Este projeto de pesquisa está sob a responsabilidade dos pesquisadores Carmen Ildes Rodrigues Fróes Asmus (médica) e Raphael Mendonça (enfermeiro). A Dra. Carmen Fróes é professora da Faculdade de Medicina e trabalha no Instituto de Estudos de Saúde Coletiva da Universidade Federal do Rio de Janeiro. O Enf. Raphael Mendonça é aluno de doutorado da Universidade Federal do Rio de Janeiro. 2. O objetivo deste trabalho é investigar a ocorrência de alterações sobre o processo de crescimento, desenvolvimento puberal e capacidade reprodutiva dos adolescentes na faixa etária de 12 a 21 anos, moradores na comunidade de Cidade dos Meninos. 3. Para cumprir este objetivo, serão coletadas com os adolescentes informações por questionário, dados de peso, altura e desenvolvimento das mamas e pênis e crescimento dos pêlos pubianos e axilares e amostras de esperma (exclusiavamente para os adolescentes entre 16 e 21 anos). A coleta destas amostras será realizada pelos pesquisadores, responsáveis, bem como por alunos de graduação da Faculdade de Medicina, sob a coordenação da Professora Carmen Fróes e do pesquisador Raphael Mendonça, nas residências dos adolescentes. A coleta de espermograma será realizada em laboratório contratado para a confecção dos exames. O uso do material biológico da pesquisa destina-se exclusivamente aos fins previstos no estudo. 4. Antes da coleta do material, será apresentado ao(s) responsável(is) pelo adolescente o referido questionário (em anexo) com perguntas sobre tempo de residência na Cidade dos Meninos, possíveis exposições ambientais e ocupacionais, características da residência, hábitos pessoais como tipo de alimentação, dentre outros, e ainda dados sobre a história reprodutiva. Estes dados auxiliarão na análise e interpretação dos resultados. Serão ainda avaliadas informações contidas nos prontuários da Unidade de Saúde da Família local. 5. Os exames complementares a serem realizados serão: - Esperma: contagem total dos espermatozóide ; avaliação da morfologia e mobilidade; identificação de formas anômalas. Todos estes exames serão realizados na rede de laboratórios Diagnósticos da América, empresa tradicional em análises clínicas com longo tempo de experiência com projetos de pesquisa. Os resultados serão mantidos em confidencialidade, e serão armazenados por até 15 anos pela empresa responsável pela coleta e análise do material biológico. 6. A qualquer momento os pesquisadores responsáveis poderão ser acionados e estarão disponíveis para novos esclarecimentos. 7. A realização desta pesquisa não oferece riscos para a saúde do seu (sua) filho (a) e a qualquer momento o Sr. (a) pode recusar a participação dele(a) e contatar o Comitê de Pesquisa do IESC através do telefone: (21) 2598-9328. 8. As identidades dos sujeitos envolvidos (adolescentes e familiares) serão mantidas sob a guarda exclusiva da equipe de pesquisa. Não obstante, a divulgação dos resultados da pesquisa deverá ser pública e, em primeiro lugar, endereçada aos sujeitos da pesquisa. 9. Será marcada uma data para entrega individual dos resultados e esclarecimento quanto ao seu significado. Caso seja detectada alguma anormalidade, seu (sua) filho (a) será encaminhado (a) para avaliação médica, de acordo com a sua concordância. 10. O nome do (a) meu (minha) filho (a) é: Nome do pai / mãe ou responsável legal: Identidade: Rio de Janeiro, _____ de ____________________ de 2009. Área: Situação da Entrevista: Término (Horas e Minutos): Casa: Completa.01 Parcialmente Realizada.02 Domicílio desocupado.03 Informante Incapaz.04 Recusa.05 Início (Horas e minutos): Data da Entrevista (DDMMAAAA): Número da Família: Nome: Nome: Nome: Nome: Nome: Nome: Nome: Entrevistador Supervisor Revisor Digitador I Digitador II Supervisão Digitação Coordenador Data: Data: Data: Data: Data: Data: Data: Código/Rubrica: Código/Rubrica: Código/Rubrica: Código/Rubrica: Código/Rubrica: Código/Rubrica: Código/Rubrica: Área: Administração.01 Foco.02 Malária.03 Olaria/Lixão.04 Igreja.05 Guarita/Entrada.06 Posto de Saúde.07 Igreja Evangélica/Ponte de Ferro.08 Ponto de Referência: Localização do Domicílio: Número Entrevistado Número de Visitas: QUESTIONÁRIO DOMICILIAR Pesquisa Vigilância em Saúde da População Exposta a Resíduos de Pesticidas Organoclorados na Localidade de Cidade dos Meninos (Duque de Caxias, RJ) ANEXO 5 – ICD DA LINHA DE BASE Neto(a).08 Genro/Nora.09 Irmão(ã).10 Filho(a).03 Enteado(a).04 Pai ou Mãe.05 2° Grau Completo.05 2° Grau Incompleto.04 1° Grau Completo.03 Pós-Graduação.08 Universitário Completo.07 Universitário Incompleto.06 (Antes de passar para a próxima questão, repita a lista para o informante e certifique-se se todos os moradores foram listados) Parente do Empregado(a).15 Empregado(a).14 Agregado(a).13 1° Grau Incompleto.02 Analfabeto.01 Avô(ó).07 Cônjuge.02 Outros Parentes.12 Sogro(a).06 Chefe.01 Cunhado(a).11 Escolaridade: Parentesco Chefe do Domicílio: 01 02 03 04 05 06 07 08 09 10 11 12 13 14 15 o Feminino.02 Masculino.01 Sexo A. Lista de Moradores do Domicílio: Para começar, eu gostaria de saber algumas informações sobre as pessoas que moram neste domicílio. Por favor, inclua as pessoas que moram neste domicílio mas que estejam hospitalizadas em função de algum problema de saúde (por um período curto ou longo) ou que estejam ausentes por motivo de viagem . Inicie o fornecendo os seus dados, passando a seguir a fornecer os dados dos outros moradores. N Parentes Nome Nome da Mãe Data de Nascimento Sexo Escolaridade Ano de Ano de (DD/MM/AAAA) Início de Início de o co Chefe Moradia no Moradia em Domicílio CM . do (AAAA) (AAAA) Domicíli do . Neto(a).08 Genro/Nora.09 Irmão(ã).10 Filho(a).03 Enteado(a).04 Pai ou Mãe.05 2° Grau Completo.05 Outra Relação.16 Sexo Escolaridade Pós-Graduação.08 Universitário Completo.07 Universitário Incompleto.06 Data de Nascimento (DD/MM/AAAA) (Antes de passar para a próxima questão, repita a lista para o informante e certifique-se se todos os moradores foram listados) Situação: Óbito.01 Vive em outro domicílio em CM.02 Vive em outro domicílio fora de CM mas no Estado do Rio de Janeiro.03 Vive em outro domicílio fora do Estado do Rio de Janeiro.04 2° Grau Completo.05 2° Grau Incompleto.04 1° Grau Completo.03 Parente do Empregado(a).15 Empregado(a).14 Agregado(a).13 1° Grau Incompleto.02 Analfabeto.01 Avô(ó).07 Outros Parentes.12 Sogro(a).06 Cônjuge.02 Nome da Mãe Chefe.01 Cunhado(a).11 Nome Escolaridade: o Situação Parentesco Chefe do Domicílio: 16 17 18 19 20 21 22 23 24 co Chefe o Domicíli Parentes N Feminino.02 Masculino.01 Sexo Ano de Início de Moradia no Domicílio (AAAA) (AAAA) Ano de Término Moradia no Domicílio B. Lista de Moradores Antigos do Domicílio: Agora , eu gostaria de saber algumas informações sobre pessoas que você conhece que algum dia moraram neste domicílio, mas que deixaram de morar por motivo de óbito ou mudança de endereço. C5. Para onde vai o esgoto da sua casa? C4.3. Outros C4.2. Poço C4.1. CEDAE Laje.01 Telha de barro.02 Telha de cimento-amianto.03 Outro tipo.04 Alvenaria com reboco por fora.01 Alvenaria com rebouco por dentro.02 Alvenaria com rebouco por dentro e por fora.03 Alvenaria sem reboco.04 Outro tipo.05 Rede eeral.01 Rede pluvial outra rede.02 Direto para a rua.03 Vala negra .04 Outros.05 Não tem instalações sanitárias C4- De onde vem a água utilizada na sua casa? Sim.01 Não.02 C3- Qual o tipo de cobertura ou telhado de sua casa? C2- De que tipo de material são feitas as paredes da sua casa? C5. [___ ___] C4.3. [___ ___] C4.2 [___ ___] C4.1. [___ ___] C3. [___ ___] C2. [___ ___] C1- Quantos cômodos tem a sua casa? Considere como cômodos os espaços fechados delimitados por paredes C1. [___ ___] (mesmo fora de casa), desde que usados como local para dormir, sala, cozinha ou banheiro. ( Completar os itens com 77, nos casos de recusa em dar informação e 99, nos casos em que a informação solicitada for ignorada) As próximas perguntas são sobre a sua moradia e a rua onde ela se localiza. C. Características do domicílio C10- Ocorre alagamento da rua onde se situa a sua casa quando chove? C9. Como é a pavimentação do terreno da sua casa? C8. A sua casa se situa próxima a? C7. Qual é o destino do lixo da sua casa? C6. Qual o tipo de cobertura ou telhado de sua casa? Frequentemente.01 Ás vezes.02 Raramente.03 Nunca ou quase nunca.04 Outro.05 Cimento.01 Grmamado.02 Terra.03 Misto.04 Vala negra.01 Lixão.02 Ambos.03 Outro tipo.04 Outros.06 É jogado em terreno baldio.05 Coletado na porta de casa.01 Coletado na caçamba.02 É queimado.03 É enterrado.04 Laje.01 Telha de barro.02 Telha de cimento-amianto.03 Outro tipo.04 C10. [___ ___] C9. [___ ___] C8. [___ ___] C7. [___ ___] C6. [___ ___] C15 – O Sr/Sra. Cria animais em sua casa? C14. Existem árvores frutíferas no seu terreno C13. O que é cultivado? EM CASO DE RESPOSTA SIM, FAÇA A PERGUNTA C.13 EM CASO DE RESPOSTA NÃO, FAÇA A PERGUNTA C.14 C12 – Existe alguma plantação no seu terreno C11- Ocorre alagamento do terreno da sua casa quando chove? Sim.01 C13.3. [___ ___] C13.4. [___ ___] C13.5. [___ ___] C13.3 – Verduras C13.3 – Legumes C13.4 – Grãos Sim.01 Não.02 Sim.01 Não.02 C13.2. [___ ___] C13.2 – Cana de Açúcar C15. [___ ___] C14. [___ ___] C13.1. [___ ___] Não cultiva.99 C12. [___ ___] C13.1 – Mandicoca Não.02 Sim.01 Nãp.02 Raramente.03 Nunca ou quase nunca.04 Frequentemente.01 Ás vezes.02 Raramente.03 Nunca ou quase nunca.04 C11. [___ ___] C21. Quando EM CASO DE RESPOSTA SIM, FAÇA A PERGUNTA C21 EM CASO DE RESPOSTA NÃO, FAÇA A PERGUNTA D1 C20. O Sr / Sra. sente cheiro de pó de broca em sua casa? C19. Com que finalidade: ___________________________________________ EM CASO DE RESPOSTA SIM, FAÇA A PERGUNTA C19 EM CASO DE RESPOSTA NÃO, FAÇA A PERGUNTA C20 C18. O Sr/Sra. Usava pó de broca em seu domicílio C17. O Sr/Sra. já guardou pó de broca em sua casa C16 – A criação é de? EM CASO DE RESPOSTA SIM, FAÇA A PERGUNTA C16 EM CASO DE RESPOSTA NÃO, FAÇA A PERGUNTA C17 C16.4. [___ ___] C16.5. [___ ___] C16.3 – Aves C16.4 – Outros Chove.01 Está muito seco.02 Sim.01 Não.02 Sim.01 Não.02 Sim.01 Não.02 C16.3. [___ ___] C16.3 – Porcos C21. [___ ___] C20. [___ ___] C18. [___ ___] C18. [___ ___] [___ ___] C16.2. [___ ___] C16.2 – Cabras C17. C16.1. [___ ___] C16.1 – Gado/bovino D2. Na sua casa existe algum dos bens listados abaixo (Sim.01 Não.02)? Se SIM, mencione a quantidade Para terminar, eu gostaria de fazer algumas perguntas sobre a sua família. Lembre-se que garantimos o sigilo de todas as informações fornecidas por você. D1. D1. No mês passado, qual foi aproximadamente a renda líquida da sua família, isto é, a soma de rendimentos, já com os descontos, de todas as pessoas que contribuem regularmente para as despesas de sua casa: [___ ___].[___] Valor total da renda R$: _________________________________ D. Informações sobre renda familiar e bens de consumo: Outra.06 Em mais de uma situação.05 Faz frio.03 Faz calor.04 D2.1. [___ ___] D2.2. [___ ___] D2.3. [___ ___] D2.4. [___ ___] D2.5. [___ ___] D2.6. [___ ___] D2.7. [___ ___] D2.8. [___ ___] D2.9. [___ ___] C2.10. [___ ___] D11.2. [___ ___] D2.1. Televisão em Cores D2.2. Geladeira Simples D2.3. Geladeira Duplex ou Freezer D2.4 . Máquina de Lavar Roupa D2.5. Aspirador de Pó D2.6. Bicicleta D2.7. Telefone fixo D2.8. Celular D2.9. Videocassete D2.10. DVD player D2.11. Automóvel Se Sim, Quantos D12.1B. [___ ___] Se Sim, Quantos D2.10.B. [___ ___] Se Sim, Quantos D2.9B. [___ ___] Se Sim, Quantos D2.8.B. [___ ___] Se Sim, Quantos D2.7.B. [___ ___] Se Sim, Quantos D2.6.B. [___ ___] Se Sim, Quantos D2.5.B. [___ ___] Se Sim, Quantos D2.4.B. [___ ___] Se Sim, Quantos D2.3B. [___ ___] Se Sim, Quantos D2.2B. [___ ___] Se Sim, Quantos D2.1B [___ ___] ANEXO 6 – TCLE PARA LINHA DE BASE TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO Você esta sendo convidado a participar desse estudo: Logo que você se sinta esclarecido deverá assinar esse termo e para tanto deve ler com atenção todas as informações aqui contidas e solicitar esclarecimentos sempre que necessário. TERMO DE CONSENTIMENTO Declaro que estou esclarecido (a) que: 1- O objetivo desse trabalho é verificar o conhecimento que os moradores da Cidade dos Meninos, tem sobre os possíveis problemas de saúde decorrentes da exposição ao Hexaclorociclohexano, sendo coordenado pela Pesquisadora Maria Izabel de Freitas Filhote, do NESC/UFRJ 2- Para cumprir esse objetivo serão realizadas entrevistas, a fim de levantar informações sobre o seu local de moradia, dados pessoais, hábitos alimentares e de conhecimento de possíveis sinais e sintomas relativos a saúde. 3- Nesse sentido a minha participação será através de entrevistas, que serão realizadas pelos Agentes Comunitários do Programa de Saúde da Família da Cidade dos Meninos. 4- Todas as informações coletadas serão mantidas em sigilo e serão divulgadas apenas em relatórios consolidados, isto é, os dados não citarão nomes e informações que possam identificar o entrevistado. 5- Os questionários serão codificados pela coordenadora da pesquisa e nem mesmo os entrevistadores ficarão sabendo os códigos. 6- Esta atividade não oferece risco para minha saúde e a qualquer momento posso recusar a minha participação e contatar a Comissão de Pesquisa do NESC/UFRJ, através dos telefones: (012) 25626225 e 2562 6245. 7- Será marcada uma data para a divulgação dos resultados da pesquisa e eu serei avisado (a). O meu nome é................................................................................. Assinatura:...................................................................................... Doc. de Identidade Caxias/RJ..........de novembro de 2004.