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Residência
médica
Para exercer plenamente o nobre ofício da medicina são necessários muitos anos de preparação. E nesse longo percurso, a residência médica é a
etapa mais delicada. É neste momento que o futuro médico define a sua
área de especialização e faz a ponte entre a vida de estudante e a vida
profissional. Os desafios são muitos a começar pela prova de seleção para
as poucas vagas oferecidas pelos hospitais. Depois vem a rotina de esforço e dedicação exigida e as dificuldades estruturais encontradas em
muitas unidades de saúde. É esse universo que esta edição do Berro traz
ao leitor num momento em que as questões referentes à saúde brasileira
estão na pauta do dia.
Foto e Produção: Thiago Jefferson e Marhyana Lemos
Recife | Abril de 2013
O BERRO
2 | Recife, abril de 2013
LUIZA FALCÃO
Quando se fala sobre a
preparação para um processo seletivo que acontece
todos os anos no Brasil, a
primeira palavra que vem à
cabeça é o vestibular, mas
existe uma seleção que pode
ser tão árdua quanto entrar
em uma universidade: ingressar em uma residência
médica. Segundo o Conselho Nacional de Residência
Médica (CNRM), por ano,
são cerca de sete mil vagas
oferecidas para residências
no Brasil enquanto são despejados no mercado cerca
de dez mil profissionais.
Assim, a prova da residência – na qual o médico
escolhe a área de especialização desejada - se torna
uma nova “peneira” para
os recém-formados. De cirurgia geral a acupuntura: o
Brasil conta, hoje, com 53
especialidades que os médicos podem fazer na residência. Além do “acesso direto”
- quando os médicos ainda
não têm nenhuma residência
feita – existem especialidades com pré-requisitos. Se
um médico quiser se especializar em cirurgia cardiovascular, por exemplo, ele
terá de passar, antes, por
uma residência em cirurgia.
Os médicos que escolhem fazer uma residência
vão atuar profissionalmente em instituições de saúde
com o acompanhamento de
médicos especialistas. Para
entrar, os candidatos passam
por prova teórica, prática e
entrevista em processos que
são realizados normalmente
entre os meses de novembro
e dezembro. No processo
seletivo feito em 2012, a Se-
cretaria Estadual de Saúde
(SES) lançou 430 vagas em
Pernambuco. Em 2013, estão disponíveis 653 vagas
para novos residentes.
Apesar do número de vagas ser aparentemente alto, a
quantidade varia de acordo
com a especialização, como
explica a recém-formada Talita Siqueira pela Universidade
de Pernambuco (UPE). “É
difícil de passar porque depende do que você quer fazer.
Eu escolhi dermatologia e, na
minha área, só há, em Pernambuco, sete vagas. Por isso
fiz a prova em outros Estados, mas é um processo muito
complicado. Psiquiatria, por
exemplo, só tem duas vagas”.
Em Pernambuco, existem
três processos seletivos dentro do programa da Secretaria
Estadual de Saúde: o primeiro é realizado pela Universidade Federal de Pernambuco e seleciona estudantes
para as vagas na residência
no Hospital das Clínicas; o
segundo tem a seleção feita
pela Universidade Federal do
Vale do São Francisco (Univasf) para vagas no Hospital
de Traumas de Petrolina e
outras unidades da região; e
o terceiro é feito através do
Instituto de Apoio à Universidade de Pernambuco (IAUPE) e preenche vagas nas demais instituições, a exemplo
do Hospital da Restauração e
do IMIP.
DISPUTA
Dependendo do número
de vagas oferecido em cada
instituição a concorrência pode tornar-se até mais
alta que a do vestibular. No
processo seletivo deste ano,
da Universidade Federal de
Pernambuco, por exemplo,
Foto: Luiza Assis
Residência médica é uma nova peneira
RESULTADO Larissa Costa comemora a aprovação na Unicamp
otorrinolaringologia foi a
residência mais disputada:
30 concorrentes por vaga,
número próximo ao de inscritos para uma vaga no vestibular de medicina também
na instituição (35,3).
A médica Débora Coutinho, formada desde 2011,
está estudando para tentar
a residência neste ano: “eu
fiz a seleção em 2011, passei
em algumas no interior do
Estado, mas não me interessei porque não queria sair
do Recife. Tentei novamente
em 2012, mas não consegui
passar e agora vou tentar de
novo”. A médica escolheu
como especialidade cirurgia
geral e definiu o processo
como exaustivo. “Além dos
dois anos de cirurgia geral
eu ainda quero me especializar em cirurgia cardiovascular, são mais quatro anos
e este processo deixa muita
gente esgotada”, conta.
A preparação para esta
nova peneira começa normalmente no último ano
da faculdade e já existem
cursos de apoio à formação
dos alunos. A médica recémformada Larissa Costa começou a estudar com mais
de um ano de antecedência:
“eu resolvi me preparar antes porque queria tentar residências fora do Estado”,
conta. “A maioria dos estudantes, porém, só vai atrás
no ano final da graduação e
quase todo mundo procura
os cursinhos” completa. O
resultado do esforço de Larissa veio com a aprovação
na residência de anestesiologia na Universidade Estadual de Campinas.
PREPARACÃO
Entre as empresas que
atuam no mercado atual-
mente, a mais conhecida é
o Medgrupo, rede de ensino
preparatório para a prova
da residência presente em
diversas cidades do país. O
professor Alberto Moraes, vinculado à instituição,
acredita que os cursos são
essenciais: “Hoje, praticamente todo mundo faz. O
Medgrupo domina o mercado, nove a cada dez vagas
são ocupadas por alunos da
rede”.
Mas esta preparação
pode pesar no bolso dos
estudantes. O Medgrupo,
por exemplo, oferece duas
modalidades: medcurso –
indicado para alunos que
estão no último ano de medicina – e o MED, para uma
formação mais intensa. As
mensalidades vão de R$ 768
para ter acesso ao medcurso até R$ 1.088, preço da
modalidade MED. A taxa
de inscrição também é mais
alta do que a média dos
vestibulares. Para se inscrever, o candidato precisa desembolsar cerca de R$
200 em Pernambuco e essa
taxa pode chegar a R$ 620
para quem tenta uma vaga
no Hospital das Clínicas de
São Paulo.
O médico Thiago Souza e Silva decidiu procurar
o cursinho. Formado em
2011, conseguiu passar neste ano para a especialização
da Universidade Federal de
Pernambuco em cirurgia
geral. “No primeiro ano,
estudei sozinho por uma
questão financeira e, no segundo ano, acabei fazendo
o cursinho. A diferença é
grande porque há macetes
e coisas que a gente só encontra em lugares assim, é
como o vestibular”.
EXPEDIENTE
Coordenador do Curso
de Jornalismo
Juliano Domingues
O BERRO é uma publicação da
Disciplina Jornal-Laboratório do Curso de Jornalismo da
Universidade Católica de Pernambuco.
Rua do Príncipe, 526 - Boa Vista - Recife-PE 50.050-900
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Fax: 81 2119.4222 | site: www.unicap.br/oberro
Professor Orientador
Alexandre Figueirôa
Repórteres
Alexandre Cavalcanti
Asaph Saboia
Camila Barros
Eder Rommel
Elton Ponce
Itthallyne Marques
Joelli Azevedo
Junior Aguiar
Kelly C. Soares
Luciana Amorim
Luciana Specht
Luiza Falcão
Malu Silveira
Natássia Almeida
Priscila Miranda
Raíza Araújo
Rebeca Buarque
Rudá Cabral
Thiago Jefferson
Tiago Freitas
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Revisão
Fernando Castim
Diagramação
Flávio Santos
Impressão
FASA
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O BERRO
Recife, abril de 2013 | 3
Hospital das Clínicas, Hospital da Restauração (HR), HosA responsabilidade da se- pital Getúlio Vargas, IMIP,
leção dos profissionais recém- Hospital Oswaldo Cruz, Hosformados para a residência pital Agamenon Magalhães,
médica é da Secretaria Es- Procape e CISAM. Cada um
tadual de Saúde de Pernam- oferece diferentes especialibuco por meio de concurso dades em residência médica e
público. Os aprovados pas- enfermagem.
A residênsam a trabalhar
cia médica é
em um grande Na residência
uma modalidahospital, cha- o profissional
de de ensino de
mado Hospi- é submetido a
pós-graduação
tal de Ensino,
(curso de espedentro da es- aulas teóricas
cialização), cap e c i a l i d a d e e práticas
racterizada por
que escolheu.
Segundo o portal da educa- treinamento em serviço, função, essas unidades de saúde cionando sob a responsabilisão instituições que se carac- dade de instituições de saúde,
terizam por ser um prolonga- com a orientação de médicos
mento de um estabelecimen- de elevada qualificação profisto de ensino em saúde. Esses sional.
O programa é cumprido
centros médicos só são reconhecidos oficialmente como integralmente dentro de uma
Hospitais de Ensino, após determinada especialidade, o
submetidos a uma supervisão que confere ao médico residende autoridades e profissionais te o título de especialista. A expressão “residência médica” só
competentes.
Atualmente, o Recife pos- pode ser empregada para prosui oito Hospitais de Ensino: gramas que sejam credenciados
LUCIANA SPECHT
Foto: Luciana Specht
Recife possui oito hospitais de ensino
DESTAQUE Hospital das Clínicas é referência no Estado
pela Comissão Nacional de Residência Médica. Na residência,
o profissional é submetido a
aulas teóricas e práticas. Fernando Cabral, vice presidente
do Sindicato do Médicos de
Pernambuco, Simepe, explica a
importância que esse programa
traz aos futuros médicos:“É
a primeira pós de um médico recém-formado. Um curso
reconhecido pelo Ministério
da Educação é de fato muito
importante. É através da residência que nos especializamos
numa área na medicina. A residência é considerada uma pósgraduação que garante a titulação ao profissional”.
O processo seletivo para
cursar uma residência é anual e o tempo de capacitação
varia de acordo com a especialidade escolhida pelo
aluno. O estudante escolhe
a área de especialização, faz
uma prova e, sendo aprovado, a Secretaria de Saúde encaminha para um dos Hospitais de Ensino que atenda
a residência escolhida e paga
uma bolsa de estudo mensal
no valor de R$ 2.384,82.
REBECA BUARQUE, LUCIANA AMORIM, RUDÁ CABRAL E ASAPH SABOIA
A qualidade do aprendizado de médicos residentes está ameaçada nos
dois principais Hospitais
de Ensino de Pernambuco - o Hospital das Clínicas (HC), da Universidade
Federal de Pernambuco
(UFPE), e o Hospital Universitário Oswaldo Cruz
(HUOC), da Universidade de Pernambuco (UPE).
A falta de recursos, de
apoio estadual e federal
e de mão de obra são alguns dos problemas já conhecidos nas instituições
de saúde da cidade. Para
completar, os alunos ainda têm que lidar com esgotos a céu aberto dentro
dos hospitais escolas, materiais inadequados para o
trabalho e a falta de segurança. O desmantelo é tão
grande que o HUOC teve
que fechar, no final do
ano passado, 112 dos seus
407 leitos por falta de
profissionais e decadência
da estrutura física.
O estudante do 10º período de medicina da UPE,
Vitor Estênio, reclama da
falta de equipamentos e estrutura do HUOC. “Muitas vezes quando vamos
acompanhar os professores ou estamos de plantão
com os médicos, não podemos participar de alguns
procedimentos porque não
há equipamentos de proteção e higiene suficientes”,
reclamou. Segundo o estudante, os próprios tutores
se mostram desestimulados com a situação do
hospital.
André Ayalla está no
12º período e também
passou por más experiências.. “Lembro de cirurgias sem equipamentos
adequados, fechamento de
leitos e alagamento durante o período de chuvas”.
Foto: Luciana Amorim
Falta de recursos atrapalha alunos
PRECARIEDADE Hospitais escola estão abandonados
Ayalla diz que, por causa
disso, a maioria dos seus
colegas planeja trabalhar
no setor privado. “A tendência é buscar menos
estresse e boa remuneração”, afirma.
O governo do Estado
anunciou uma série de medidas para melhorar a situação em que se encontra o
HUOC. Foram anunciadas
mudanças no sistema de
administração da unidade
e investimento de R$ 21
milhões. “Esperamos que
com as mudanças anunciadas pelo governo, venham
melhorias e avanços para o
Hospital Oswaldo Cruz”,
diz o médico residente
Marco Cruz.
Os problemas não são
diferentes na esfera federal. Quando entramos no
Hospital das Clínicas, o
quadro de precariedade se
repete. Para a estudante
do 11º período de medicina da UFPE, Mariana Lacerda, o “sucateamento”
dos hospitais desestimula
os alunos. “Não podemos
exercer uma medicina de
qualidade”, lamenta.
Elton Albuquerque, aluno do 8º período, pede auxílio para melhorar a estrutura do hospital. “Faço parte
do Diretório Acadêmico
(DA), e luto por melhorias,
mas ninguém parece estar
preocupado com nosso situação”, reclama. “Gostaríamos de ver, nos hospitais
públicos, as mesmas condições particulares”.
O vice-presidente do
Sindicato dos Médicos
de Pernambuco (Simepe), Fernando Henrique
Cabral, critica a situação.
“Existe um abandono por
parte dos governos federal e estadual, a valorização dos hospitais universitários não pode mais
esperar”, afirma.
O BERRO
4 | Recife, abril de 2013
RAÍZA ARAÚJO
Abordar o dia a dia de um residente é sinônimo de falar sobre tempo,
ou melhor, da falta dele, e também
do amor e da dedicação de médicos
recém-saídos da universidade que
optaram em investir em mais conhecimento e especialização. Essa opção,
porém, é acompanhada por alguns sacrifícios, começando pelo salário, até
cinco vezes menor do que o de um
médico fora da residência. Já a carga
de trabalho é muito maior, cerca de 60
horas semanais, inclusive, com a exigência do residente abdicar de um dia
do final de semana para dar plantão.
Sem falar nas horas de estudo fora do
hospital, da cobrança dos superiores e
desconfiança de alguns dos pacientes.
Tarciana Mendonça de Souza Almeida, de 25 anos, está há um ano
fazendo a residência na área de pediatria do Instituto de Medicina Integral de Pernambuco (IMIP). Para ela,
o dia começa às 6h da manhã, quando acorda para ir ao hospital.“Minha
sorte é que eu moro perto. Eu chego lá às 7h, aí normalmente, há uma
reunião clínica até às 8h, quando a
gente estuda os casos. Depois vou
atender aos pacientes, com uma pessoa me supervisionando. Às 12h, eu
saio para almoçar, e às vezes, às 13h,
temos que voltar para discutir o quadro dos doentes. Vamos para a enfermaria às 14h para providenciar as
internações dos casos mais graves”.
Pelo menos um dia no final de semana, Tarciana dá plantão. “A gente
tem que se virar nos 30 para trocar os
plantões quando precisar. Mas sempre tem que ficar dois residentes de
plantão de manhã e à noite, nos sábados e domingos”, explicou. Na ala
de pediatria do IMIP, Tarciana conta
que cada residente fica responsável
por 24 pacientes internados. “O hospital escola tem uma hierarquia própria. Tem o chefe, que é o staff, uma
pessoa que já fez a residência e possui mais experiência; o doutourando,
que ainda não é médico e está ali para
aprender; e o médico residente, que
está no meio disso tudo, que somos
nós”, afirmou.
Por volta das 17h, Tarciana volta
para casa, mas o dia dela como residente ainda não acabou. Quando
chega a casa ainda estuda por cerca
Foto: Camila Albuquerqre
Uma rotina de esforço e dedicação
PEDIATRIA Tarciana Mendonça faz residência há um ano no Imip
de três horas. “É muita coisa para
estudar porque temos muita coisa
nova para aprender. Três horas ainda
é pouco, a gente estava acostumado
com o ritmo de estudo da faculdade, já que não podíamos trabalhar,
sobrava tempo”, disse. Nessas condições, ter uma vida pessoal fora da
residência é um desafio à parte para
cada um deles. Mas, apesar de todo
esse ritmo corrido, Tarciana arruma
tempo para ter aulas de inglês, fazer
hidroginástica e balé. “Segunda é dia
de inglês, terça e quinta balé e quarta
e sexta hidroginástica. E eu ainda tenho namorado”. Embora a dedicação
seja grande, ela não se arrepende de
ter optado por medicina e pela residência. “Eu sou muito feliz. Não me
imagino fazendo outra coisa”.
A satisfação do paciente é a maior recompensa
CAMILA BARROS
Após se formar em medicina
pela UFPE em 2011, Carolina Barbosa Pereira, de 26 anos, passou
seis meses dando plantão em uma
policlínica da Prefeitura do Recife
e estudando para o concurso da residência, para o qual foi aprovada
no final do mesmo ano. Ela escolheu a residência em clínica médica, no Instituto de Medicina Integral de Pernambuco (IMIP), que
tem duração de dois anos. “Por
ser uma área básica e pré-requisito
obrigatório para várias especialidades, a concorrência é grande, porém o número de vagas também
é”, explicou. Isso porque ela ainda
pretende fazer outra especialização, ou em cardiologia ou em nefrologia, área que estuda o funcionamento do sistema urinário.
Na residência, Carolina assume a responsabilidade de trabalhar
como médica, mas é supervisionada na maioria das atividades por
preceptores. “Minha rotina consiste em trabalhar diariamente na enfermaria e no ambulatório, além de
fazer diversos rodízios externos e
estágio obrigatório em emergência nal de 12h por fora da residência,
e na Unidade de Terapia Intensi- tornando a carga horária semanal
va (UTI) por dois anos”, contou. de trabalho maior do que 72h. Às
A carga horária de sessenta horas vezes ela chega a passar 12h sesemanais muitas vezes é extrapo- guidas trabalhando. É muita delada por conta do plantão obriga- dicação, para pouca recompensa.
tório semanal, das evoluções em A bolsa fornecida pela Secretaria
finais de semana e feriados e das de Saúde custa em torno de R$ 2
diversas pendências nas enferma- mil por mês, sem direito a ganhar
o décimo terceiro.
rias. Além da parte
“Nós já passamos por
prática, há também “É muito bom
seis anos de faculdaa teórica. Carolina
quando
consigo
de mais alguns anos
conta que participa
de clube de revista prestar um bom de pós-graduação: no
grosso são em torsemanal, atividade atendimento.
no de dez anos de
em que os residen- Compensa
formação. Levando
tes e internos levam
todos os
em conta que muitos
artigos
científicos
entram na faculdapara discutir sobre anos de
de após alguns vesas atualizações e as investimento”,
tibulares, no fim das
novidades do ramo. diz Carolina
contas entramos na
“Também tem reuniresidência com idade
ões clínicas semanais
nas quais o residente prepara uma entre 25 e 30 anos, muitos já caapresentação de um caso clínico sados, com filhos, planejando uma
difícil de solucionar para discussão casa própria, outros ajudando os
com todos os preceptores. Como o pais com as despesas de casa. É
ambiente é acadêmico, o estudo é muito complicado financeiramente se manter exclusivamente com a
contínuo”, afirmou.
Para complementar a renda, bolsa da residência”, disse. Carolina dá mais um plantão semaAo perguntar sobre os desa-
fios, Carolina não cita as horas
mal dormidas, os fins de semana
sacrificados pelo trabalho, nem o
investimento que só tem retorno a
longo prazo. “O desafio principal
certamente é a condição precária
da assistência à saúde, enquanto
não se investir pesadamente em
atenção básica, prevenção primária e educação, as emergências serão sempre uma panaceia.
Enquanto as pessoas não souberem nem ler o que está escrito
na receita médica, como vão tomar as medicações e manter suas
doenças compensadas, evitando
idas constantes às emergências?”,
questionou. Apesar do trabalho
exaustivo, Carolina não desanima. A maior recompensa para ela
está na gratidão do aperto de mão
de um paciente. “É muito bom
quando consigo prestar um bom
atendimento, seja em termos de
diagnóstico, tratamento ou oferecendo simplesmente qualidade de
vida. Compensa todos os anos de
investimento, as noites acordadas
e os feriados dentro de um hospital enquanto a família está viajando. Vale a pena, sim” finalizou.
O BERRO
Recife, abril de 2013 | 5
PRISCILA MIRANDA
A experiência adquirida
numa residência médica é
única e vale para a vida profissional inteira de um médico. É após a conclusão do
curso de medicina, quando
o estudante ganha o direito
de tornar-se “médico geral”,
que ele sai de baixo do jaleco
dos professores e deixa os livros de anatomia na estante
para, de fato, pôr em prática
todos os ensinamentos teóricos obtidos ao longo de seis
anos na academia.
Mas encarar pela primeira
vez procedimentos que serão
hábitos no futuro nem sempre é tarefa fácil. As vivências
são enriquecedoras – sejam
elas boas ou ruins – e, no fim
das contas, cabe aos próprios
alunos aprender maneiras de
lidar com os desafios do trabalho médico, seja apoiandose na fé em si próprio ou em
alguma crença.
Atualmente
fazendo
Foto: Priscila Miranda
Primeiras experiências marcam residentes
CRENÇA Acompanha os residentes nos procedimentos
os primeiros meses da residência em ginecologia e
obstetrícia, a estudante da
Universidade de Pernambuco (UPE) Fernanda Maria
Campelo, de 24 anos, conta
que, desde pequena, tinha
certeza que queria seguir
a carreira de médica. Mas
viver a realidade do curso é uma experiência mais
desafiadora que o imaginado. “Na teoria tudo é muito pontuado, a sequência é
bem clara. Mas, na prática,
tudo é diferente”, observa.
LEMBRANÇAS
Nas suas memórias de estudante, Fernanda relembra a
primeira experiência com um
procedimento fundamental
em sua futura especialidade
médica: o parto normal. “Em
pleno 10ª período, tive o prazer de realizar o meu primeiro
parto normal. Uma cena que
fez surgir em mim uma mis-
tura de sentimentos. Medo,
alegria, realização... tudo junto”, recorda. Durante o nascimento do bebê, a residente
contou apenas com o auxílio
de uma tutora dentro da sala.
“Não havia outros estudantes comigo. Era eu sozinha
fazendo o parto com o apoio
da médica. Foi no Hospital
Agamenon Magalhães”. Ao
final do procedimento, a futura médica teve mais certeza
de que estava indo pelo caminho certo. “O que ficou dessa
experiência foi o quanto isso
é importante no curso, pois
é só na prática que, de fato,
entendemos o que é ser médico”, enfatiza.
Além do conhecimento
adquirido, Fernanda conta
também com o apoio espiritual. “Leio sempre a Bíblia, me
ajuda muito quando estou desanimada, mas também quando consigo algo importante.
Sempre que posso frequento
a igreja”, diz a residente, que
acompanha cultos na Igreja
Episcopal Carismática de Boa
Viagem.
MORTE
A morte é um fato comum
no dia a dia dos hospitais e,
por isso mesmo, precisa ser
tratada com profissionalismo e atenção. O residente
do primeiro ano de urologia
Denis Waked, 27 anos, admite que já encarou a morte
de pacientes, após a graduação e a primeira residência
em clínica geral, ambas feitas
na UPE. “Não é uma experiência agradável, mas nunca
tive problemas, procuro levar com naturalidade e não
me envolver profundamente
com os pacientes”, conta.
O estudante se lembra da
primeira vez que teve que encarar um falecimento dentro
do hospital. “Foi um paciente
que estava na UTI há um certo tempo. A gente fica com a
sensação de incapacidade na
hora, mas depois supera”,
descreve Denis.
Um “vilão” chamado desconfiança
ELTON PONCE
Desconfiança é um
sentimento que assomba
qualquer tipo de relação
humana. No trabalho, essa
sensação pode causar muitos prejuízos e até inviabilizar o rendimento. Obviamente, não seria diferente
no caso dos médicos. Particularmente dos residentes.
Muitos precisam superar
as situações inusitadas e
de alta complexidade que
surgem, sem contar com o
mais grave: a descredibilidade do seu trabalho junto ao
paciente, apenas por ser um
médico jovem. Para quem
acha que o estetoscópio e
o jaleco torna-os senhores
de tudo, mal sabem que a
juventude é o maior vilão
daqueles que escolheram a
profissão.
Não é difícil encontrar
um médico residente pernambucano - ou um recémformado - que já tenha
sofrido com esse tipo de
conduta. Muitos preferem
não falar. Já outros encaram a desconfiança com
naturalidade, e mostram
que, com o trabalho bem
executado, esse tipo de
conduta escorre pelo ralo.
Oscar Capistrano, 28 anos,
é um exemplo. Recémformado, ele é Clínico no
Hospital Jesus Menino em
Bezerros, Agreste do Estado. Ele foi enfático aos
ser questionado sobre se
já sofreu preconceito pela
idade. “Você não imagina,
já sofri bastante”, enfatiza. “Mas, geralmente, essa
visão estigmatizada se vai
conforme a consulta vai
sendo realizada.” . Mesmo
com a queda da discriminação ao decorrer do atendimento, Oscar acredita
que muito precisa melhorar. E que o ponto chave
para isso é a educação.
“Muitos dos que olham
para os médicos residentes
ou recém-formados com
desconfiança são pessoas
que não tiveram a oportunidade de estudar. Pessoas
que não sabem o quão sérias são as nossas escolas
formadores de médicos.
Já escutei muitas vezes paciente dizer que ‘queria ser
atendido por um doutor
de cabelo branco” lamenta. Mas eu costumo dizer
que preconceito nenhum
resiste a um trabalho bem
Pouca idade
dos residentes
e recémformados é
vista como
problema por
pacientes
feito”
Janete Costa, 59, precisou recorrer a um médico
residente no Hospital das
Clínicas da Universidade
Federal de Pernambuco
(UFPE). A dor nas costas
a consumia. “Cheguei lá
toda desconfiada. Como
é que um médico novinho daquele iria resolver o
meu problema?”, confessa. Mas Janete sucumbiu
à boa conduta do médico.
“Mesmo com aquela cara
de menino ele me atendeu
superbem!”, diz.
No interior, a relação de
respeito do paciente com o
médico é mais acentuada.
A médica Marta Vasconcelos, 27 anos, formada há
3, e que trabalha em hospitais no Recife e em Vitória de Santo Antão, diz
que, no interior, acontece
com mais frequência esse
tipo de desconfiança. “No
Hospital das Clínicas nunca percebi, mas no João
Murilo (em Vitória), sim.
As pessoas te olham de um
jeito diferente, mas depois
ficam mais tranquilas com
o passar do tempo” .
Mesmo com a frequente
queda da discriminação no
decorrer do atendimento,
Oscar ainda acredita que
muito precisa melhorar.
E que o ponto chave para
isso é a educação. “Muitos
dos que olham para os médicos residentes ou recémformados com desconfiança são pessoas que não
tiveram a oportunidade de
estudar e que não sabem o
quanto nos especializamos,
nem tampouco o quão sérias são nossas escolas formadores” diz.
É difícil imaginar que
um profissional que estuda por vários anos e passa
nos vestibulares mais concorridos, apesar de estar
na residência - que já o
habilita a realizar procedimentos - sofra com a desconfiança de pessoas que
chegam aos consultórios
precisando de auxílio
Apesar do preconceito,
os residentes e recém-formados seguem ocupando
os seus postos seguros de
que a desconfiança pode
ser superada com um pouco mais de esclarecimento.
O BERRO
6 | Recife, abril de 2013
Onde estão os futuros pediatras?
porcionar uma expectativa de
vida saudável para a fase adulta”, falou a profissional. O entusiasmo de Ana, todavia, não
é compartilhado por outros
colegas. O pediatra do IMIP,
Ruben Maggi, afirma que há
um crescente desinteresse dos
médicos jovens em seguir essa
especialidade. “Atualmente, a
pediatria no Brasil apresenta
uma circunstância especial.
Uma das explicações é que
se trata de uma especialidade
pouco atrativa do ponto de
vista financeiro”, ponderou.
A médica pediatra Maria
de Fátima Ribeiro é especialista há mais de trinta anos e
não se faz de rogada quando
o assunto é “desvantagens”.
“Eu sou realizada como pediatra, mas é inegável que
existem fatos que, às vezes,
desestimulam. Receber ligações fora de hora é apenas
uma das razões. O pediatra
trabalha muito, recebe telefonema em casa, tem que estar à
disposição da família e ganha
Após seis anos em uma
faculdade de medicina, é chegada a hora de escolher uma
especialidade. E é na residência médica que a vida desse
profissional começa a tomar
um rumo que marcará toda a
sua trajetória. Existem as especialidades que nunca saem
de moda. Otorrinolaringologia, oftalmologia, intervenções cardíacas e medicina estética são as mais procuradas.
Essa última, por exemplo, que
inclui a dermatologia, é cada
vez mais demandada graças
ao culto à beleza. No outro
extremo, está a pediatria, hoje
pouco procurada como afirma os próprios candidatos
às residências. Segundo eles,
a especialidade médica dedicada à assistência à criança e
ao adolescente é a que oferece
menos vantagens financeiras.
O mercado que dita as regras.
Apesar do desinteresse
pela pediatria, Pernambuco
Foto: Eder Rommel
EDER ROMMEL
PEDIATRIA A saúde do adulto nasce na infância
tem um centro de excelência nesta área, o Instituto de
Medicina Integral Professor
Fernando Figueira, mais conhecido como IMIP. O antigo Instituto Materno Infantil
de Pernambuco é uma referência na área pediátrica. Ele
é a única instituição do país a
oferecer curso de mestrado e
doutorado em saúde materno-infantil. Lá são oferecidas
vagas para outras áreas que
vão muito além do campo
da pediatria, mas o lidar com
crianças virou a sua marca.
Para a médica residente em
pediatria do IMIP, Ana Cristina Germano, a escolha da
especialidade e, sobretudo,
da instituição, não ocorreu
por acaso. “A saúde do adulto
começa na infância; e isso eu
aprendi na faculdade. Assim
como na educação familiar e
escolar, os cuidados e acompanhamento constantes na
vida de uma criança irão pro-
pouco”, disparou a médica.
O médico e orientador do
Programa de Mestrado em
Saúde Materno Infantil do
IMIP, Edvaldo da Silva Souza,
falou que o aluno busca algo
mais complexo. “Ele quer trabalhar com procedimentos,
porque isso leva a uma melhor
remuneração”, justificou. Atualmente, menos de 10% dos
médicos escolhem a pediatria
como especialidade. Entretanto, os hospitais e maternidades
estão com uma demanda muito alta por esses profissionais.
O papel da pediatria é
fundamental quando o assunto é saúde de uma nação.
“Após o nascimento, e até o
final da adolescência, numa
fase fundamental de formação, crescimento e desenvolvimento, não só do corpo
como também dos valores, é
o pediatra, juntamente com a
família e os professores, que
passa a ter ativa participação
no cuidado com a criança”,
concluiu Souza.
IT THALLYNE MARQUES
Desde fevereiro do ano
passado, o programa de residência médica do Hospital-Escola de Veterinária da
Universidade Federal Rural
de Pernambuco (UFRPE),
no bairro de Dois Irmãos,
Zona Norte do Recife, foi
desativado. O Ministério
da Educação (MEC), para
autorizar o retorno do programa, exige o modelo de
residência vigente nos hospitais com plantão 24 horas, mas a clínica da UFRPE só funciona de segunda
a sexta, das 7h às 18h e não
faz internamento. Para que
os residentes voltem ao local, o MEC também exige
melhorias na parte física e
locação de pessoas.
Apesar da extinção do
programa de residência e
da deficiência no quadro
de funcionários e estrutura, o Hospital-Escola da
UFRPE permanece funcionando e conta com seis
médicos veterinários e 13
estagiários do curso. “É
muito importante para os
alunos terem essa vivência
prática, se preparando para
o mercado. Embora nós tenhamos deficiências, aqui
eles são preparados para
o dia a dia na profissão e
até os médicos que não são
professores da Universidade têm o hábito de orientar os estudantes”, afirmou
Acácio Teófilo, 49, Técnico
Administrativo do Hospital Veterinário da UFRPE.
Além da experiência, alguns desses alunos também
recebem uma bolsa.
Os “pacientes” são animais domésticos, como
cães e gatos, e de produção,
como bois e cavalos. No
hospital, são feitos atendimentos clínicos, cirúrgicos,
exames laboratoriais, e a
vantagem é que a consulta é gratuita. Atrativo que
faz com que o prédio esteja
sempre cheio, atendendo,
em média, a trinta animais
por dia.
A estudante de Medicina Veterinária da UFRPE,
Nayara Bezerra, 23, trabalha no ambulatório da clínica desde janeiro deste ano
e já faz curativos, dá anestesias, etc. Ela contou que,
apesar da estrutura física
do hospital ser precária,
o lugar é uma escola para
a carreira e a vida. “Estagiando nós conhecemos
gente de outros períodos
e trocamos vivências. Sem
contar que há coisas que a
gente nem viu na faculdade
e aprende na prática”, afirma a jovem.
Se Nayara ainda é uma
recém-chegada ao Hospital, o estudante do 11°
período de Veterinária, Sebastião Barbosa, 26, estagiou lá por dois anos e hoje
está fazendo o Estagio Supervisionado Obrigatório
(ESO) no Assentamento
Chico Mendes, em São
Lourenço da Mata. O jovem quer trabalhar na aca-
Foto: Itthallyne Marques
Residência veterinária está desativada
ALUNA Nayara estagia na parte ambulatorial da clínica
demia ou seguir a extensão
rural. Confessou não ter
perfil para a clínica, mas
considerou esses dois anos
muito válidos para sua for-
mação. “Essa experiência é
essencial, porque nos mostra a realidade do serviço
público, suas qualidades e
seus defeitos”, disse.
O BERRO
Recife, abril de 2013 | 7
saram na hora de correr atrás de um
emprego, mesmo sem a residência.
“Eu tinha acabado a faculdade e
sentia que precisava me testar como
médico. Além disso, queria ajudar a
família no pagamento das contas”,
ressalta.
O jovem médico exercia a profissão em dois hospitais não muito conhecidos, distantes da região metropolitana - os quais o rapaz não quis
identificar. Em paralelo com as horas
que dedicava aos seus pacientes, o jovem médico estudava para conseguir
uma vaga na residência médica legal.
Atualmente, José conseguiu espaço
em um centro reconhecido na medicina no Estado.
“Hoje tenho uma estabilidade financeira bem interessante. Tenho a
certeza de que toda aquela correria
no início da carreira me ajudou. Não
posso dizer jamais que me arrependi. Foi um passo para frente”, finaliza o médico. A reportagem do Berro
foi atrás do Conselho Regional de
Medicina de Pernambuco (CREMEPE) para receber uma resposta oficial sobre o assunto. O retorno veio
em nota oficial: “O exercício ilegal
TIAGO FREITAS
A Constituição Brasileira não deixa margem para interpretações. Médico que não passou pela residência não
está apto a exercer a função de forma
plena - ele só pode atuar como clínico
geral. Contudo, as leis não são respeitadas. Durante a produção desta matéria, a reportagem do Berro identificou
e tentou o contato com diversas pessoas que já praticaram a medicina como
especialistas na área sem ter passado
por um período como residente, que
integraram o universo clandestino dos
hospitais em Pernambuco.
Apesar desta prática ilegal ser um
fato incontestável, poucos se dispõem
a falar sobre o assunto. De todos os
rapazes que foram procurados para
comentar o assunto, apenas um resolveu abrir o jogo. Para termos de identificação, este médico, que não quis
revelar o nome, será chamado de José.
Ele não se utiliza mais da residência
ilegal, porém admitiu que esteve por
dentro deste mundo durante os anos
de 2006 e 2007.
José explica que a experiência
profissional e o fator financeiro pe-
Foto: Gustavo Cunha
Ilegalidade compromete formação
CREMEPE Entidade trata clandestinidade como segredo de estado
é exercido quando não existe inscrição no Conselho Regional de Medicina. O médico residente é médico
inscrito no Conselho e pode atuar
com legalidade. O Cremepe instaura
sindicância em relação aos fatos, encaminhando às instâncias jurídicas
legais e competentes, assim como
faz denúncia junto ao Tribunal de
Contas do Estado”.
De fato, o Cremepe não se mostrou muito disposto a entrar em detalhes sobre os casos de residência
ilegal. Uma reação esperada, segundo pessoas ligadas à entidade. Informações de bastidores dão conta
de que o problema é levado muito
a sério no Conselho Regional e que
os processos são encarados como
segredo de estado.
Entidades fiscalizam normas
MALU SILVEIRA
Como em qualquer profissão, a
união de uma classe trabalhadora faz
a força, e com os médicos residentes
não é diferente. Os jovens que escolhem especializar-se têm o amparo da
Comissão de Residência Médica (Coreme), da Comissão Estadual de Residência Médica (Cerem) que irão fazer
cumprir as normas da Comissão Nacional de Residência Médica (CNRM),
válidas para o Brasil todo.
Se um residente tem um problema
disciplinar, o caso é enviado à Coreme. Se há algum problema estrutural,
como a falta de dormitórios, e a entidade não consegue resolver, a demanda será encaminhada para a Cerem.
Se a situação não for resolvida, ou for
muito grave, será encaminhado para a
CNRM. Os residentes pernambucanos
também contam com a Associação
dos Médicos Residentes de Pernambuco (APMR), do Sindicato dos
Médicos de Pernambuco (Simepe) e
do Conselho Regional de Medicina
(Cremepe). A Associação é formada apenas
Foto: Divulgação
JOELLI AZEVEDO
LUTA Residentes reinvidicam melhorias nas condições de trabalho
por residentes, enquanto o Simepe
por profissionais já formados que lutam pelos direitos da classe. Quando
não há solução, entra o Conselho de
Medicina de Pernambuco (Cremepe), que atua na garantia do exercício ético da medicina, com assessoria
jurídica. O conselho também pode
fiscalizar unidades de saúde e tem o
poder de realizar interdições éticas
nas unidades.
O presidente da APRMR, Carlos
Tadeu, lamenta os problemas, mas
comemora também algumas vitórias
dos residentes. “Depois de uma greve
em 2010, conseguimos ratificar muitas
coisas que a gente reivindicava, como
o ajuste de bolsa da residência médica
e a legalização da questão da licença
maternidade”. O grupo também levantou uma bandeira importante no
final de 2012: os problemas enfrentados pelo Hospital Oswaldo Cruz.
A principal dificuldade, porém,
está na incompatibilidade de horários
dos associados. “O residente tem mais
dificuldade de ir à associação, então
temos problema em dar continuidade
a uma pauta; nosso trabalho termina
sendo muito pontual”.
O residente de pediatria, Ricardo
Gurgel, atua no Hospital das Clíni-
cas da Universidade Federal de Pernambuco (HC) e denuncia a falta de
profissionais na unidade, apesar de
alas suficientes (maternidade, pediatria e sala de parto). Segundo o
residente, quando o médico neonatologista vai para a sala de parto ou
assume algum caso específico, a ala
da pediatria fica desassistida, apenas
o residente assume os pacientes. “O
problema é que é muito importante para o residente ter um pediatra
para discutir os casos e assumir um
paciente mais complicado”, ressaltou. Gurgel também pontuou que os
médicos da especialidade já se reuniram com a direção do hospital. “Já
fizemos um ofício e falamos com o
supervisor da Coreme, cobrando a
contratação de um médico plantonista, mas não tivemos resposta”.
Sem a resposta, o residente resolveu
ir até a sede do Sindicato dos Médicos de Pernambuco (Simepe), em
busca de soluções para o caso.
Com a pressão das entidades, o governo do Estado abriu concurso para
contratação de 248 médicos em 2013
que podem ser chamados em até dois
anos: destas oportunidades 26 vagas
são para pediatras.
O BERRO
8 | Recife, abril de 2013
KELLY C. SOARES ALEXANDRE CAVALCANTI
Inicialmente limitada à
área médica, o desenvolvimento da sociedade provocou
a ampliação da residência para
outras áreas de saúde, como
psicologia, nutrição, fonoaudiologia, educação física,
medicina veterinária, com a
criação, em 2005, da residência multiprofissional.
O processo de ingresso
é semelhante ao da residência médica. Para fazer parte
do programa de capacitação
profissional promovido pelo
Governo de Pernambuco, o
profissional tem que aguardar o lançamento do edital,
que normalmente acontece
no mês de novembro, fazer a
prova em janeiro, a matrícula em fevereiro, se aprovado,
e, enfim, iniciar as atividades
em março, acompanhado de
um preceptor – professor que
acompanha o aluno no dia a
dia de aulas práticas.
Para este ano foram aprovados 222 multiprofissionais,
que precisam cumprir uma
carga horária de 60 horas
mensais, por um período de
dois a três anos – a depender
da área de atuação -, em diversas instituições de saúde.
A residência não se restringe aos hospitais. Além
das turmas serem multiprofissionais, é possível se deparar com o que chamam
de grupo da saúde coletiva.
Dos 27 aprovados, 12 vão
estudar na Faculdade de Ciências Médicas na Universidade de Pernambuco (FCM/
UPE), enquanto que 15, vão
para o Núcleo de Saúde Coletiva, do Centro de Pesquisa
Aggeu Magalhães, a Fundação Oswaldo Cruz (NESC/
CpqAM/FIOCRUZ).
Nas duas instituições,
os estudantes vão trabalhar
com o estudo das doenças no
campo da estatística - origem,
causas, dados demográficos,
história -, como também com
o Sistema Único de Saúde
(SUS), visando à criação, às
reformas necessárias, o planejamento de gestão e à implementação de políticas assistenciais.
“É muito difícil alguém se
interessar pela saúde coletiva.
Na graduação, quase não se
fala disso”, diz Juliana Gon-
Foto: Divulgação
Multiprofissional ganha espaço
JUNIOR AGUIAR
RESIDENTE Juliana Gondim (E) com a preceptora Ana Paula (D)
dim, 34 anos, fisioterapeuta.
A escolha por uma especialização tão pouco difundida foi
fruto do seu interesse natural
de conhecer como funciona a
saúde pública, na prevenção e
combate das doenças comuns
na sociedade.
Juliana começou a residência em 2011, com aulas
teóricas, no NESC/CpqAM/
FIOCRUZ, em uma turma
multiprofissional. No meio
do ano passou para as aulas
práticas no Distrito Sanitário
V, ligado à Prefeitura do Recife. Em 2012, foi transferida
para a Secretaria de Saúde do
Estado, primeiro na Diretoria
de Planejamento e, atualmen-
te, na de Educação em Saúde,
onde recebe orientações da
preceptora Ana Paula. “Estudamos a informação sanitária
e todas as áreas de vigilância,
de educação em saúde, a regulação e o trâmite interno
do sistema único de saúde”,
relata.
Caminhando para conclusão da residência, a estudante
conta que pretende seguir carreira na saúde coletiva. “Muita gente fica dividido entre a
profissão original ou ser sanitarista. Eu me encontrei com
a saúde coletiva e não vou
voltar a clinicar, desencanteime com a fisioterapia.”
THIAGO JEFFERSON
O Hospital das Clínicas
(HC) em parceria com a
UFPE oferece o Programa
de Residência em Enfermagem (Prenf). O Programa existe desde 1993, conta com uma carga horária
de 5.760 h sendo 4.600 h
de prática. São oferecidas
dez vagas por ano, duas
para cada especialidade,
enfermagem cirúrgica, nefrologia, saúde da mulher,
saúde da criança e UTI.
As vagas mais concorridas
são para nefrologia e saúde da mulher.
A residência tem duração de dois anos com 60
h/semanais. Para ingressar
no programa é necessário
ser graduado em enfermagem e prestar concurso
que é realizado uma vez ao
ano e aberto para o todo
Brasil.
Durante a residência
80% é de prática onde os
enfermeiros desenvolvem
atividades ligadas direta
e indiretamente ao atendimento dos pacientes e
20% de teoria. Mesmo
depois de graduados eles
tem outras sete disciplinas que são obrigatórias.
Participam de simpósios,
seminários, análises de pacientes externos, entre outras atividades. Enquanto
os enfermeiros estiverem
participando do programa eles não podem exercer nenhum outro tipo de
atividade. Atualmente em
Recife existem quinze programas de residência em
enfermagem, sendo o HC
o mais concorrido.
Para muitos residentes
o começo é muito difícil,
Foto: Raitza Vieira
Experiência é positiva para enfermeiros
NATÁSSIA ALMEIDA
Vivência
em saúde
pública
DEDICAÇÃO Patrícia coordena residência em Enfermagem
pois tem que abdicar da
vida pessoal e se entregar
totalmente ao trabalho. De
acordo com Patrícia Madruga, coordenadora da
residência de enfermagem
do HC “O aluno que pensa
em fazer residência precisa
estar muito focado, procurar saber como as residências funcionam, como
essa carga horária é dis-
tribuída porque são dois
anos de abnegação, você
deixa de estar com sua família porque trabalha final
de semana e feriado”.
A residência não é obrigatória para quem faz graduação em enfermagem,
“mas é valiosa para a vida
profissional”, como atesta
Melissa Castro, enfermeira
residentes do HC.
Antes de se formar e concorrer a vagas para a residência
multiprofissional, os estudante que desejam ser um bom
profissional na área de saúde
pública podem participar do
programa Vivências e Estágios na Realidade do Sistema
Único de Saúde (VER-SUS).
Criado em 2002, a iniciativa é
uma proposta do Governo Federal junto às Secretariais Municipais de Saúde tendo como
objetivo oferecer estágios de
quinze a vinte dias para que
os estudantes experimentem o
cotidiano de trabalho das organizações de redes e sistemas de
saúde, ficando por dentro do
funcionamento das unidades
públicas além dos subsídios de
reforço na formação de trabalhadores comprometidos.
O VER-SUS acontece anualmente em todo o Brasil. Aqui
no Estado, a escolha dos estudantes para a vivência é feita
por meio de uma seleção realizada no mês de julho na Universidade Federal de Pernambuco (UFPE).Para o professor
de enfermagem Itamar Lajes
da Universidade de Pernambuco, o programa é um momento
em que se propicia sensibilização dos futuros profissionais
para que eles se aproximem e
se interessem cada vez mais
pela assistência pública. “É um
processo de imersão de pessoas com interesse no serviço de
saúde municipal. O VER-SUS
não é muito conhecido, mas
traz uma importância muito
grande para o futuro da saúde
pública porque motivamos os
discentes para atuar no cargo
público”, disse Lajes, um dos
avaliadores da seleção aqui em
Recife.
O universitário Pedro Domingos, 21 anos, do curso de
Farmácia pela UFPE, explica
que sua participação no estágio em 2012 foi de grande
importância na formação. “A
oportunidade para mim foi
ótima já que estou prestes a
me formar e pretendo fazer
concursos públicos na área”,
comentou.